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Quarta-feira, 11 de novembro de 2015 I Série — Número 4
XIII LEGISLATURA 1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2015-2016)
REUNIÃOPLENÁRIADE10DENOVEMBRODE 2015
Presidente: Ex.mo Sr. Eduardo Luís Barreto Ferro Rodrigues
Secretários: Ex.mos
Srs. Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco Idália Maria Marques Salvador Serrão
S U M Á R I O
O Presidente declarou aberta a sessão às 10 horas. Prosseguiu o debate do Programa do XX Governo
Constitucional, tendo usado da palavra, a diverso título, além da Ministra de Estado e das Finanças (Maria Luís Albuquerque), do Vice-Primeiro-Ministro (Paulo Portas) e do Ministro da Modernização Administrativa (Rui Medeiros), os Deputados Pedro Filipe Soares (BE), António Leitão Amaro (PSD), João Oliveira (PCP), Miguel Santos (PSD), Francisco Mendes da Silva (CDS-PP), André Silva (PAN), Eduardo Cabrita (PS), Mariana Mortágua (BE), Duarte Pacheco (PSD), Paulo Sá (PCP), Cecília Meireles (CDS-PP), Paulino Ascenção (BE), José Luís Ferreira (Os Verdes), Heitor Sousa (BE), Mário Centeno (PS), Luís Leite Ramos (PSD), Carlos César (PS), Filipe Lobo d'Ávila (CDS-PP), Berta Cabral (PSD), Paula Santos (PCP) e Filipe Anacoreta Correia (CDS-PP).
Entretanto, deram entrada na Mesa as moções de
rejeição n.os
1 a 4/XIII (1.ª). A encerrar o debate intervieram, além do Primeiro-
Ministro (Pedro Passos Coelho), os Deputados André Silva (PAN), José Luís Ferreira (Os Verdes), Jerónimo de Sousa (PCP), Telmo Correia (CDS-PP), Catarina Martins (BE), António Costa (PS) e Luís Montenegro (PSD).
No final, após interpelações à Mesa dos Deputados João Oliveira (PCP), Nuno Magalhães (CDS-PP), Hugo Lopes Soares (PSD), Ana Catarina Mendonça (PS) e Luís Montenegro (PSD), a Câmara aprovou a moção de rejeição n.º 1/XIII (1.ª) — Do Programa do XX Governo Constitucional (PS).
Deu-se conta da apresentação dos projetos de lei n.os
24 e 25/XIII (1.ª).
O Presidente encerrou a sessão eram 17 horas e 20 minutos.
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O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo, está aberta a sessão.
Eram 10 horas.
Solicito às autoridades policiais que abram as galerias, por favor.
Desejo cumprimentar o Sr. Primeiro-Ministro, os membros do Governo, as Sr.as
e os Srs. Deputados, as
Sr.as
e os Srs. Jornalistas, as Sr.as
e os Srs. Funcionários.
Como sabem, a nossa ordem do dia de hoje consta da continuação do debate do Programa do XX Governo
Constitucional.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Filipe Soares, do Bloco de Esquerda.
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as
e Srs. Deputados: A
campanha eleitoral já era, mas ontem, neste debate, ainda se ouviu falar muito da campanha eleitoral.
Estranhamente, até parece existir da direita uma vontade de negar o resultado eleitoral. E percebo porquê:
porque não foi famoso para o PSD e para o CDS-PP — nós sabemos.
O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Não foi para si!
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Sempre dissemos que se elegeriam Deputados para a Assembleia da
República. São eleições legislativas, que não elegem nem primeiros-ministros, nem governos, mas, sim,
deputados.
Aplausos do BE.
Por isso, quando o PSD e o CDS-PP perderam mais de 750 000 votos, perderam também 25 Deputados. E
passaram, até, de 132 Deputados, uma maioria absoluta e confortável neste Parlamento, para 107 Deputadas
e Deputados. Percebemos, portanto, os motivos da inquietação do PSD e do CDS-PP.
Mas, mesmo assim, quem ouvisse os discursos de ontem poderia achar que eles eram capazes até de
amolecer os corações mais empedernidos e, porventura, até de fazer chorar algumas pedras da calçada.
Falou-se de golpe irreversível nas regras e convenções da nossa democracia — disse o Sr. Primeiro-Ministro
— e de usurpação eleitoral, de falta de humildade democrática e da tentativa de inverter o resultado eleitoral
— disseram as bancadas do PSD e do CDS-PP.
Mas é estranho como aqueles que fazem estas acusações não conhecem sequer o mínimo da sua história
enquanto grupos parlamentares. Olhemos para um passado recente, exatamente para aquele para onde PSD
e CDS-PP, enquanto Governo, atiraram o nosso PIB, a riqueza do nosso País.
Em 1999, tinha o Bloco de Esquerda acabado de chegar à Assembleia da República e tinha o PS ganho as
eleições com 115 Deputados. O que é que aconteceu naquele momento? O que é que o PSD fez naquele
momento? Exatamente aquilo de que está agora a acusar os partidos da oposição: de incumprirem a tradição.
Veja-se: o PSD apresentou uma moção de rejeição a um Governo que tinha uma base de apoio de 115
Deputados, dizendo que tinha perdido as eleições, que tinha sido incapaz de garantir uma maioria social de
apoio e que, por isso, merecia ser rejeitado.
É esta a demagogia do PSD e do CDS-PP, que só lembram as tradições quando lhes convém. Afinal,
reconhece-se que, para eles, a história é a sua memória, e aí têm uma memória muito seletiva: só se lembram
daquilo que lhes convém!
É esta a realidade de quem está desesperado porque, de facto, perdeu as eleições, porque não percebe o
que aconteceu com o resultado eleitoral e porque, ao olhar para as eleições, apenas parece que quer fazer o
papel de Calimero! A demagogia é esta, a da direita, que, não conhecendo a sua história, também não diz
bem ao que vem nem reconhece que a austeridade que defende foi a derrotada nas eleições.
Vejamos o debate que a direita não quer fazer, o que aconteceu nas eleições passadas, o que aconteceu
ao longo de quatro anos e como é agora possível que uma alternativa se esteja a levantar. É que aquele arco
que tanto embandeiram, o tal arco da governação, foi suplantado pelo arco da Constituição, aquela que não
conheceram durante quatro anos e contra a qual governaram continuadamente. Quatro anos! Quatro anos
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sempre contra a Constituição! Só não foram quatro Orçamentos do Estado porque, no último, o PSD e o CDS-
PP fizeram uma espécie de jogada de antecipação e atiraram as medidas para o Tribunal Constitucional ainda
antes de as colocarem no Orçamento do Estado. Se assim não fosse, teriam sido quatro Orçamentos do
Estado apresentados pelo PSD e pelo CDS-PP que «batiam» na Constituição.
Ora, todas e todos nós sabemos que se há um texto unificador de um país é a Constituição. Se há
documento que diz como se organiza uma sociedade é a Constituição de um país. Por isso, os extremistas
são aqueles que, apoiando-se num governo e numa maioria parlamentar, governam contra esse regime
instituído, governam contra essa palavra de um país, que é a Constituição. Esses extremistas são exatamente
o PSD e o CDS-PP.
Aplausos do BE.
Sabemos bem como a austeridade é ideológica, como ela foi o Programa do Governo durante quatro anos
e é ainda o Programa do Governo para os próximos quatro anos. A austeridade promove a concentração das
fortunas e foi por isso que, ao mesmo tempo que o País empobreceu, vimos o número de milionários
aumentar; promove a desigualdade social — cresceu a cada ano do mandato do PSD e do CDS-PP; destrói a
solidariedade no nosso País, e é por isso que a pobreza aumentou ao mesmo tempo que os apoios sociais
foram cortados; e destrói essa solidariedade entre as gerações, entre aqueles que construíram um Estado
social que agora esta direita quer desmantelar.
E porque sabemos que a Constituição é aquilo que une esta alternativa sabemos também como há uma
Europa que não pode ser uma «camisa de forças» para a Constituição, porque não há, na Europa,
Constituições de primeira nem Constituições de segunda. A Constituição alemã não é mais importante do que
a Constituição portuguesa, e é exatamente isso que afirma a alternativa que se está a constituir.
O futuro que passa por esta Assembleia, o futuro que passa por este País é o futuro de quebrar o ciclo de
empobrecimento que PSD e CDS-PP querem continuar. Esse é o verdadeiro plano do Governo.
Queremos mudar a vida do País depois do desastre social que foi a governação do PSD e do CDS-PP. A
única maioria que se expressa no Parlamento é a maioria que rejeitará que PSD e CDS-PP continuem no
Governo. A única maioria que se expressa no Governo é a que tem a legitimidade dos votos de um povo que,
votando em Deputados e Deputadas, retiraram a maioria ao PSD e ao CDS-PP, exigindo que eles não
continuem no Governo.
Aplausos do BE.
Por isso, Sr. Presidente da Assembleia da República, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros de Governo,
Sr.as
e Srs. Deputados, na antecipação da rejeição, deixo ao Sr. Primeiro-Ministro — que o vai deixar de ser —
um simples e humilde conselho: diga ao seu futuro eu que não seja piegas, que saia da sua zona de conforto.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente: — Inscreveu-se, para um pedido de esclarecimento, o Sr. Deputado António Leitão
Amaro, do PSD, a quem dou a palavra.
O Sr. António Leitão Amaro (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Sr.as
e Srs. Membros do
Governo, Sr.as
e Srs. Deputados, Sr. Deputado Pedro Filipe Soares, queria fazer uma pequena viagem, se me
permite.
No dia 10 de novembro de 2016, Catarina Martins, a Sr.ª Deputada, aterra no aeroporto da Portela, num
avião da Aeroflot, com o seu simpático sorriso,…
A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Da Aeroflot?!
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O Sr. António Leitão Amaro (PSD): — …vinda do lado do território do Muro, mas preocupada, porque
nem ali conseguiu resolver ou encontrar quem lhe resolvesse os problemas de falta de dinheiro para pagar as
contas do Estado, os salários dos funcionários públicos, as pensões…
Mas Catarina, nesse dia, está feliz, porque já decretou a nacionalização da banca, das empresas de
energia e de transportes, já reestruturou a dívida pública unilateralmente com 60% de corte, já decretou
impostos para tudo e, já agora, pensa em taxar o ar que respiram as pessoas com alguns rendimentos, um
património, mesmo que sejam as poupanças do seu trabalho. Mas também já fez a legislação laboral andar 30
anos para trás, já congelou as rendas, já fixou administrativamente os preços da energia e os preços
agrícolas,…
O Sr. Pedro Soares (BE): — Isso é o canal Panda?!
O Sr. António Leitão Amaro (PSD): — … já decretou a gratuitidade absoluta de tudo o que o Estado
produza, embora ainda hesite sobre qual é o novo imposto que irá criar para pagar a conta. Já encerrou todos
os estabelecimentos de ensino, de saúde e de apoio social que não sejam propriedade e de gestão pública.
A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Já foi longe demais, Sr. Deputado!
O Sr. António Leitão Amaro (PSD): — O que é isso, para Catarina, de livre iniciativa económica das
pessoas? Das instituições particulares de solidariedade social? Das misericórdias? E mesmo nos
estabelecimentos públicos, como as escolas, decretou a gestão coletiva. Correu com esses malvados
negociantes das IPSS e das Misericórdias, porque não percebe como é possível que alguém queira ajudar os
outros sem ter um rendimento com isso. Mas cada vez que o desemprego aumenta, contrata mais alguns
milhares de pessoas para a máquina do Estado. Cortou também os laços atlânticos, saiu da NATO, decretou
que Portugal deixa de fazer e de participar no livre comércio internacional. E se o povo se queixa proclama-lhe
mais um rol de direitos abstratos, como se os seres humanos vivessem de proclamações vazias.
Sei que isto vos parece um sonho, mas não é! Para poder concretizar esse fantasioso caminho, basta
aplicar o programa do Bloco de Esquerda que foi a eleições. A mim parece-me um pesadelo. Mas hoje, a esta
hora, na manhã de 10 de novembro, este ainda é um pesadelo evitável. E, Sr. Deputado Pedro Filipe Soares,
a verdade é que os portugueses também já falaram deste pesadelo, ou programa, e 10% escolheram-no e
90% disseram que não. Amanhã, na verdade, não sei.
Mas, espere, se calhar, o Bloco de Esquerda mudou, tal como Catarina mudou! Porque, há poucas
semanas, dizia que governava quem tivesse o maior número de Deputados no Parlamento, que a maior
bancada parlamentar governava. Mas mudou! Ou, espere, se calhar é por conveniência. Terão aprendido bem
com o vosso novo parceiro de caminho: quando são as horas difíceis, «está quieto»; veja-se o líder anterior:
fez o caminho difícil, o caminho das pedras e quando dobrou o cabo das tormentas, «dá cá, é a minha hora»!
Exatamente a mesma coisa, a mesma conveniência para o País. Nós pegámos no País numa situação
dificílima, recuperámo-lo, devolvemos-lhe autonomia para decidir e quando mandámos embora a troica, eles
chamaram: «Dá cá,…» — conveniência — «…é a minha hora»!
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Talvez seja nessa conveniência que se vê a «farinha do mesmo saco».
Mas, Sr.as
e Srs. Deputados, esse programa em que o Bloco de Esquerda acreditava não foi escolhido. Os
portugueses falaram! É verdade que aqui, ontem, também falaram e já vimos a primeira discussão entre
Catarina e Mário Centeno… Srs. Deputados, obviamente, isto não é nenhuma falta de respeito, mas os
portugueses, cada um com a sua opção, escolheram um caminho de recuperação sustentável, de criação de
emprego, que estava a acontecer e que continua a acontecer. Os portugueses falaram e escolheram que
quem governava era Pedro Passos Coelho, e o Sr. Deputado, mais uma vez, quer transformar 10 em 100,
quer transformar a sua micromaioria, que não é uma maioria, na vontade do povo, e a vontade do povo não foi
essa. Mas o povo sabe e estará cá para os julgar da próxima vez!
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Aplausos do PSD e do CDS-PP.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Filipe Soares.
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Leitão Amaro, devo dizer que estava à
espera que iniciasse a sua pergunta por um mea culpa, dizendo «nós, PSD e CDS, estivemos não só no
Governo a aldrabar o País,…
Protestos do PSD e do CDS-PP.
… mas toda a nossa narrativa sobre a tradição, a legitimidade de governação e aquilo que nós, enquanto
partido, fizemos é mentira».
Sobre a moção de rejeição n.º 2/VIII, da VIII Legislatura, em 1999, dizia o PSD ao Partido Socialista — que
tinha 115 Deputados, mais oito do que tem a soma da bancada do PSD com a do CDS, que tinha passado de
112 para 115, o que traduz um crescimento, ao contrário do PSD e do CDS-PP, que passaram de 132 para
107 — que o Programa do Governo do Partido Socialista era exatamente o mesmo que o programa eleitoral
que tinham apresentado, que não mereceu a adesão maioritária dos portugueses, e que isso apenas os
responsabilizava a eles. Logo, o PSD e o CDS rejeitavam aquele governo.
Ora, o que nós vemos é que essa aldrabice é o desconhecimento da sua própria história.
Sobre essa matéria, Sr. Deputado, nem uma palavra! Seria de esperar que o PSD e o CDS, com toda a
pose de Estado que ainda teriam neste momento, dissessem: «Não, é verdade, afinal estamos a dar
argumentos que não são válidos e toda a ideia da tradição é apenas uma falácia que não tem qualquer adesão
à realidade». Sobre isso, zero, Sr. Deputado!
Sobre a ideia de que agora temos 10% a condicionar os 90%, coloco a questão ao contrário: o Sr.
Deputado quer que 38% de Deputados desta Assembleia, ou seja, 107 de 230, condicionem todos os
restantes. Isso não é um pouco exagerado, Sr. Deputado?! Não é exagerar um pouco nas contas da
matemática?!
Aplausos do BE.
E porquê? Só porque PSD e CDS não convivem bem com o resultado eleitoral. Só por isso, Sr. Deputado!
Só por isso!
Risos do PSD.
Devo dizer que até poderia ficar sensibilizado com a matéria se não tivesse sabido o que fizeram ao País
durante quatro anos. Mas, sabendo isso, sei que foi justa a derrota eleitoral que tiveram nas urnas, e a única
conclusão que podemos retirar é a de que, de facto, uma alternativa é desejável e bem-vinda ao País.
Para terminar, Sr. Deputado António Leitão Amaro, quero dizer-lhe que a democracia se exprime pelo
resultado da eleição dos Deputados e das Deputadas nesta Assembleia. O que sempre dissemos e o que
consta da Constituição da República Portuguesa — que só agora parecem ler, na verdade tresler, porque
nunca a conheceram durante quatro anos — é que se elegem Deputadas e Deputados da Nação, não de
distritos ou de regiões da Nação, e que a sua responsabilidade é perante os seus eleitos, sendo aqui que o
Governo tem de vir buscar a legitimidade para governar. Se for rejeitado o seu Programa do Governo, ele cai.
Ora, é exatamente essa democracia que está a ser hoje, aqui, construída, aquela que a Constituição prevê
e, já agora, aquela que foi constituída na base de uma aliança muito melhor do que esta autoproclamada
equipa da governação. É o «arco da Constituição», onde até o PSD já esteve um dia, mas que já esqueceu há
muito tempo!
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado João Oliveira.
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O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados, Sr.as
e Srs. Membros do Governo: Foi
a luta dos trabalhadores e do povo que nos trouxe até aqui. Foi a luta corajosa e determinada que os
trabalhadores e o povo português travaram ao longo de quatro penosos anos que conduziu o Governo
PSD/CDS ao isolamento político e social.
Foi essa luta que tornou evidente a ilegitimidade das suas políticas, que denunciou o caráter injusto e
desigual das suas opções e a dimensão dramática das suas consequências.
Foi essa luta que juntou aqueles que se sentiram atingidos nos seus direitos e ofendidos na sua dignidade,
criando as condições para a derrota eleitoral infligida a PSD e CDS, com a perda da sua maioria absoluta.
Mal de nós se agora fechássemos a porta que a luta do povo abriu!
Vozes do PCP: — Exatamente!
O Sr. João Oliveira (PCP): — Nos últimos quatro anos, assistimos neste País a um enorme esforço
nacional que todos temos o dever de reconhecer e valorizar: o esforço de milhões de portugueses que não
regatearam forças para defender os seus direitos, enfrentando o Governo que os espezinhava; de
trabalhadores e reformados, que lutaram para defender salários, pensões e outros direitos que lhes foram
cortados; de desempregados, jovens e trabalhadores precários, que, querendo construir o futuro das suas
vidas e dispondo apenas da sua força de trabalho, lutaram pelo emprego, por um contrato efetivo, por salários
e horários dignos ou horas de descanso; de pequenos e médios empresários, agricultores e pescadores, que
lutaram para manter as suas atividades e o seu sustento; de intelectuais, artistas, investigadores, que lutaram
pela valorização social e profissional das suas profissões; de populações, que lutaram para defender as suas
escolas, os seus postos de saúde, as suas freguesias e tantos outros bens fundamentais para as suas
comunidades.
Foram esses milhões de portugueses que derrotaram o Governo PSD/CDS, afirmando a unidade onde o
Governo procurou semear a divisão, fazendo vencer a esperança onde o Governo usou a ameaça e quis
impor o medo, derrotando com a ação e a luta as tentativas de impor o conformismo e a resignação.
Foram esses milhões de portugueses que construíram na luta e confirmaram no voto aquilo que
pretendiam: derrotar o Governo PSD/CDS e afirmar a sua aspiração a uma política que dê resposta aos seus
problemas concretos.
A derrota eleitoral de PSD/CDS, com o fim da sua maioria absoluta em resultado da perda de 700 000
votos e 25 deputados, foi a confirmação eleitoral de que, há muito, este era um Governo derrotado.
Protestos do Deputado do PSD Jorge Paulo Oliveira.
Há muito que o Governo PSD/CDS era um Governo sem legitimidade. Por violar compromissos eleitorais,
por governar contra o povo e a Constituição, por não dispor de base política e social de apoio que lhe
permitisse prosseguir a sua política de exploração e empobrecimento, há muito que era um Governo isolado e
derrotado.
E há muito que apenas se mantinha no poder porque se agarrava a uma maioria parlamentar que não tinha
correspondência política e social e porque contava com a conivência do Presidente da República.
Aplausos do PCP.
Depois das eleições do passado dia 4 de outubro, PSD e CDS contam apenas com a conivência do
Presidente da República. Mas como isso não é suficiente para manter um Governo contra a vontade do povo,
teremos hoje mesmo de confirmar a derrota do seu Programa e impedir a sua entrada em funções,
confirmando a vontade popular.
Aplausos do PCP.
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A forma como o Governo PSD/CDS se apresenta neste debate é, de resto, a melhor confirmação de que se
trata de um Governo consciente da sua derrota e de que não pode continuar a governar.
Apresentaram um Programa que nem se atrevem a defender, tão evidente é a constatação de que se
propõem, afinal, manter e agravar a mesma política que vinham fazendo, sem prejuízo de um arrazoado de
contradições com a sua prática política que deixa a nu a sua falta de credibilidade.
Recusam-se a responder a qualquer problema concreto, procuram a todo o custo fazer a discussão
desligada daquilo que deviam ser as suas preocupações centrais — a vida das pessoas e o destino do País —
e fazem toda a discussão política num plano abstrato recorrendo aos únicos argumentos que utilizaram ao
longo de quatro anos: a ameaça, a chantagem, o drama e o medo.
A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Muito bem!
O Sr. João Oliveira (PCP): — Não discutem o seu próprio Programa, querendo convencer-nos da sua
bondade. Querem apenas, com este debate, fixar a narrativa que têm preparada para o futuro e que assenta
em sete ideias falsas.
Primeira ideia falsa: a de que, nos últimos quatro anos, o Governo PSD/CDS resolveu os graves problemas
estruturais do País.
Afirmam isto num País que deixam com um fardo de 220 mil milhões de euros de dívida pública; com um
desemprego real a atingir mais de 1,1 milhões de trabalhadores; em que 80% dos novos contratos de trabalho
são precários e 20% dos trabalhadores por conta de outrem auferem um salário inferior ao salário mínimo
nacional; onde há 2,8 milhões de pessoas em risco de pobreza; um país de onde saíram 500 000 portugueses,
na sua maioria jovens e dos mais qualificados, que se viram obrigados a emigrar.
Segunda ideia falsa: a de que agora é que vinha aí o tempo bom em que se iam colher os frutos do que foi
feito para trás.
Os dados ontem revelados pelo INE relativos ao comércio externo de mercadorias até setembro apontam
para uma redução do saldo global de 11% no período homólogo e, se excluirmos os combustíveis, o saldo
agravou-se em 36%. O crescimento económico apontado para 1,7% resulta em 1% exclusivamente da
redução do preço do petróleo. Ou seja, é o preço do petróleo que está a camuflar a real evolução económica.
Por outro lado, ninguém percebe que frutos se podem colher do elevado nível de endividamento público e
externo do País, do controlo dos centros de decisão nacionais pelo capital estrangeiro em empresas e setores
estratégicos, que frutos podem resultar do BANIF ou do BES que pesam como espadas sobre as nossas
cabeças ou de uma execução orçamental em 2015 cada vez mais incerta.
O Ministro Mota Soares fazia ontem referência a instituições nacionais com 500 anos de história. Pois, pela
primeira vez em 500 anos, o Estado não dispõe de um serviço público de correios porque o Governo
PSD/CDS vendeu os CTT a uma empresa estrangeira.
Aplausos do PCP.
De árvores destas não se colhem grandes frutos!
Terceira ideia falsa: a de que, apesar de ter governado durante quatro anos a esmagar direitos e a destruir
o País, agora é que o Governo PSD/CDS estava disponível para ser sensível à pobreza e à miséria que
espalhou aos sete ventos e a mudar de atitude relativamente à defesa do interesse nacional.
Com maioria absoluta, referiam-se ao envelhecimento da população como a «peste grisalha»; agora, que
perderam essa maioria, falam do «inverno demográfico».
Depois de terem evitado até onde puderam a atribuição de um tratamento adequado aos doentes com
hepatite C, de terem desvalorizado o sofrimento de doentes que se acumulavam em corredores e salas de
espera de urgências hospitalares, de terem aprovado cortes definitivos nas pensões, que acabaram
chumbados pelo Tribunal Constitucional, planeando logo a seguir outros cortes de 600 milhões na segurança
social, querem agora que acreditemos que se encheram de sensibilidade social.
Insistem na venda da TAP mesmo que fiquem em gestão; envolveram o Estado como avalista de dívidas
que venham a resultar do ruinoso processo de entrega dessa empresa; atribuíram uma subconcessão dos
STCP por ajuste direto já depois das eleições; enxamearam a estrutura do Estado com boys nomeados em
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tempo recorde; contrataram para vender o Novo Banco um especialista em desmantelar e vender património
público cujo lugar de ex-Secretário de Estado ainda nem tinha arrefecido e querem convencer-nos de que
daqui em diante é que defenderiam ferreamente o interesse nacional.
O simples teste de tais proclamações teria um custo insuportável em vidas e retrocesso do País que não
podemos aceitar.
Aplausos do PCP.
Quarta ideia falsa: a de que ganharam as eleições porque se tratava de eleger um Primeiro-Ministro.
Tentam reduzir as eleições a uma falsa disputa para Primeiro-Ministro, para partido mais votado ou para o
governo, mas o critério que escolheram para afirmar essa vitória tem dois problemas de fundo: primeiro, não
existe esse tipo de eleição e, segundo, a vontade maioritariamente expressa pelo povo português não foi essa.
Aquilo que verdadeiramente se decidiu foi o número de Deputados que cada força política elegeu, as
maiorias parlamentares que se podem formar na Assembleia da República e a base institucional que se criou
para suportar uma determinada política e o Governo que pode entrar em funções.
Por muito que custe a PSD e CDS, o critério para a formação dos governos está na Constituição e resulta
da composição da Assembleia da República, não está nos supostos pódios eleitorais das folhas de jornais
aqui brandidas ontem pelo CDS.
Aplausos do CDS-PP:
Quinta ideia falsa: a de que só um Governo PSD/CDS é um governo legítimo e que qualquer outra solução
governativa é ilegítima, sobretudo uma que não resulte de uma coligação pré-eleitoral.
Num quadro em que nem sequer dispõem de condições para entrar em funções, acusam de ilegítimas
outras soluções governativas que possam reunir essas condições na sequência e no respeito da vontade
expressa pelo povo português a partir da composição da Assembleia da República.
Depois de terem passado quatro anos a justificar que, apesar de isolado política e socialmente, o Governo
PSD/CDS se devia manter no poder porque dispunha de uma maioria na Assembleia da República, agora que
já não dispõem dessa maioria tentam arranjar um critério diferente para justificar um resultado idêntico.
A sexta ideia falsa é a de que, para que haja uma alternativa ao Governo PSD/CDS, alguém tem de
prescindir do seu programa e da sua coerência política.
Risos do CDS-PP.
Neste aspeto, regista-se a influência do CDS — daí as suas gargalhadas! —, que não conseguiu ainda
compreender que contribuir para a formação de uma determinada solução governativa não tem de implicar
que se prescinda do Programa, da independência, dos objetivos políticos ou da coerência.
Nem todos os partidos sentem a pressão de passar de eurocéticos a euroconvictos, como o CDS fez em
2002 a troco de uns lugares no Governo de Durão Barroso.
Aplausos do PCP.
E nem todos os partidos aceitam passar de partido dos contribuintes, dos pensionistas e da lavoura a
partido carrasco das pensões, dos agricultores e dos contribuintes, como o CDS fez em 2011 para integrar o
Governo de Passos Coelho.
Aplausos do PCP.
Por fim, a sétima ideia falsa é a de que só há uma escolha: um Governo PàF ou o caos.
O tremendismo e o medo com que PSD e CDS procuram caraterizar as consequências de um Governo que
não o seu corresponde à linguagem de ameaça e de chantagem com que se relacionaram com os
portugueses nos últimos quatro anos.
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De resto, nesse aspeto, há pelo menos uma escolha adequada no Governo. O hoje Ministro Costa Neves,
há um ano Deputado do PSD, comparava uma proposta de renegociação da dívida ao fim da ligação da
Internet com o exterior e ao fim do acesso ao YouTube. Talvez acabe considerado um moderado neste elenco
governamental!…
Aplausos do PCP.
Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Membros do Governo Sr.as
e Srs. Deputados, como já se disse anteriormente, o
Programa do Governo é uma proposta de continuidade e intensificação da política com que PSD e CDS
agravaram a exploração e o empobrecimento, aprofundaram as injustiças e desigualdades e impuseram a
degradação do regime democrático, misturada agora por conveniência com um arrazoado de contradições
com a sua prática política e sem ponta de credibilidade.
O Programa do Governo confirma as muitas e fortes razões para que o Governo PSD/CDS não entre em
funções, não apenas pelos prejuízos que tem causado, mas também pelos que pretendia continuar a causar
aos trabalhadores, ao povo e ao País.
Rejeitar o Programa e derrotar o Governo PSD/CDS são os primeiros passos para concretizar a vontade do
povo. Recuperar direitos retirados, alcançar avanços que correspondam às aspirações dos trabalhadores e do
povo são objetivos para os quais as decisões desta Assembleia da República não são suficientes mas para
cuja concretização podem dar um importante contributo.
A hora não é de pôr o povo à defesa, é de avançar para concretizar tais objetivos. É esta a
responsabilidade que se impõe assumir e a qual o PCP assumirá.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado João Oliveira, a Mesa registou a inscrição, para pedir esclarecimentos,
dos Srs. Deputados Miguel Santos, do PSD, e Francisco Mendes da Silva, do CDS-PP.
Entretanto, o Sr. Deputado João Oliveira informou a Mesa que pretende responder em conjunto aos dois
Srs. Deputados.
Tem, então, a palavra o Sr. Deputado Miguel Santos.
O Sr. Miguel Santos (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Deputado João Oliveira, o PCP perdeu as eleições, e
perdeu-as com menos votos do que aqueles que obteve há quatro anos.
Protestos do PCP.
Se bem que a doutrina oficial do PCP, desde o 25 de Abril, não regista nenhuma derrota eleitoral. Para o
PCP, desde o 25 de Abril, de alguma forma sempre ganhou as eleições.
Mas o PS também perdeu as eleições. O PS apresentou-se a pedir uma vitória, e perdeu. O PS apresentou
um candidato a primeiro-ministro, e perdeu. Os portugueses não quiseram o Deputado António Costa como
primeiro-ministro — perdeu em toda a linha! — e, agora, promove um arranjo circunstancial para ultrapassar a
derrota. Não soube ganhar e não sabe perder. Perdeu, mas quer ganhar à força; perdeu, mas tem de arranjar
forma de ganhar. E como é que o PS arranja forma de ganhar? Através de uma solução de extrema-esquerda,
colocando-se na posição de refém dos partidos da extrema-esquerda, porque é a única via de o Sr. Deputado
António Costa poder concretizar a sua vontade de, eventualmente, ser primeiro-ministro, arrastando com isso
todo o Partido Socialista atrás, razão que é justificada pelo facto que todos nós sabemos: o de que este é o
único meio de o Deputado António Costa se manter tranquilamente a liderar o Partido Socialista.
O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — Muito bem!
O Sr. Miguel Santos (PSD): — Já todos percebemos, e o País também percebeu, que os senhores estão
todos de acordo. O BE, o PCP, Os Verdes e o PS estão todos de acordo em derrubar o atual Governo. Mas a
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questão coloca-se no dia seguinte e, no dia seguinte, sabemos o que quer o Sr. Deputado António Costa: quer
ser primeiro-ministro.
Sr. Deputado João Oliveira, o seu camarada Deputado Jerónimo de Sousa, no dia 27 de setembro de
2015, afirmou o seguinte: «O PS insiste um pouco na ideia de que a gente…» — o Partido Comunista — «…
devia dar um jeitinho. “Escolham lá onde é que poderiam ceder”. Cedermos em relação à renegociação da
dívida, ao tratado orçamental? Se é sobre isto, nem tentem, nem vale a pena».
O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Bem lembrado!
O Sr. Miguel Santos (PSD): — Sr. Deputado João Oliveira, afinal, quem é que dá o jeitinho? Há jeitinho ou
não há jeitinho? É que é preciso perceber o que é o que o PCP quer, pois há aqui uma nebulosa.
O PCP — e o Sr. Deputado é a prova disso — mantém um discurso dogmático, ortodoxo, inalterado,
inamovível.
O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Muito bem!
O Sr. Miguel Santos (PSD): — Interrogo-me: e agora? E sobre aquilo que os senhores não querem falar,
ou seja, os eixos principais, como o euro e o tratado orçamental?
Sr. Deputado, vou dar-lhe três exemplos.
O projeto de resolução n.º 354/XII (1.ª), que propõe a renegociação da dívida pública, da autoria do PCP,
foi rejeitado com votos contra do PSD, do PS e do CDS-PP. O que é que os senhores vão fazer com ele? Vão
metê-lo na gaveta.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Vai ter muitas desilusões!
O Sr. Miguel Santos (PSD): — O projeto de resolução n.º 1063/XII (3.ª), que recomenda ao Governo que
inicie o processo de desvinculação de Portugal do tratado orçamental, da autoria do Partido Comunista
Português, obteve votos contra do PSD, do PS e do CDS-PP. O que é que os senhores vão fazer com ele?
Vão metê-lo na gaveta.
Para terminar, o projeto de resolução n.º 1112/XII (4.ª), da autoria do Partido Comunista Português, propõe
o aumento do salário mínimo nacional para os 600 € em janeiro de 2016, que, é como quem diz, está já aí.
Sr. Deputado, em que é que ficamos? O que é que o PCP vai meter na gaveta?
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Mendes da Silva.
Sr. Deputado, sendo a sua primeira intervenção em Plenário, desejo-lhe as maiores felicidades.
O Sr. Francisco Mendes da Silva (CDS-PP): — Sr. Presidente, muito obrigado. É, de facto, a primeira vez
que uso da palavra neste Plenário, por isso cabe-me endereçar um cumprimento muito especial a todos os
presentes na Câmara, incluindo ao Sr. Presidente, obviamente, ao Sr. Primeiro-Ministro, aos Srs. Membros do
Governo e aos Srs. Deputados.
Tenho uma pergunta breve para fazer ao Sr. Deputado João Oliveira, mas cuja resposta poderá, por
definição de um contraste, sublinhar qual é a legitimidade do Programa do Governo que aqui é apresentado
por permitir saber se este é ou não aquele Programa que melhor respeita o centro político saído das eleições
e, nesse sentido, aquele que melhor respeita os resultados eleitorais. É uma pergunta sobre a tal «posição
comum» que o Partido Comunista Português se prepara para assinar com o Partido Socialista. Ou seja, ao
contrário do que nos foi prometido, é menos do que um acordo e muito menos do que uma coligação.
Sr. Deputado, pergunto-lhe: o que é que essa «posição comum» diz sobre Semestre Europeu, euro, tratado
orçamental e, de modo crucial, o que é que diz sobre orçamento ou orçamentos do Estado? Diz que existe
uma obrigação de negociação mas sem uma obrigação de resultado ou diz, pelo contrário, que há uma
obrigação de viabilização, a única que garante o valor da estabilidade?
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Aplausos do CDS-PP e do PSD.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado João Oliveira.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados Miguel Santos e Francisco Mendes da Silva,
agradeço as questões que me colocaram, não sem antes fazer um lamento e deixar uma nota de regozijo.
O lamento tem a ver com o facto de os Srs. Deputados, apesar da intervenção que fiz, insistirem em não
discutir aspeto rigorosamente nenhum do Programa do Governo.
Vozes do PSD: — Oh!…
O Sr. João Oliveira (PCP): — Não procuram contrariar nenhuma das ideias a propósito da situação do
País, da vossa propaganda mentirosa, das vossas ilusões, do mal que fizeram aos portugueses durante quatro
anos. Não tentam rebater nada disso!
Protestos do PSD e do CDS-PP.
A única coisa que aqui nos trazem é uma perspetiva desesperada de se manterem agarrados ao poder
porque sim, sem justificação nenhuma.
Em nome da resolução dos problemas das vidas das pessoas, este é um lamento que tenho de deixar aqui,
porque o debate do Programa do Governo devia ser em torno dos problemas que os portugueses têm nas
suas vidas, dando-lhes resposta.
Deixo também uma nota de regozijo relativa aos pedidos de esclarecimento que me foram feitos. Julgo que
devemos sentir-nos lisonjeados com a preocupação que o PSD e o CDS manifestaram com a manutenção da
nossa natureza e identidade, sobretudo no contexto da campanha anticomunista e verdadeiramente
cavernícola que tem sido desenvolvida contra o PCP.
Aplausos do PCP.
Regozijo-me por haver preocupação, da parte do PSD e do CDS, em que mantenhamos a nossa natureza
e a nossa identidade.
Sr.as
e Srs. Deputados do PSD e do CDS, se calhar, essa é a única matéria em que vos posso tranquilizar.
Podem estar descansados: o PCP não se vai colocar nunca numa posição de incoerência como aquelas que
eu já vou vos descobrir.
Aplausos do PCP.
Protestos do PSD e do CDS-PP.
A propósito do dia seguinte, da posição comum e dos compromissos, o Sr. Deputado Miguel Santos
perguntou se o PCP dá o «jeitinho» e o Sr. Deputado Francisco Mendes da Silva formulou a sua questão com
aspetos mais concretos.
Srs. Deputados, quero dizer-vos que, com o que se vai passar hoje e nas próximas semanas, talvez se
possa criar uma outra perspetiva dos contributos dos partidos para a formação de soluções governativas que
não passem por uma lógica de convidar companheiros para o percurso procurando liquidá-los ou procurando
partir-lhes a espinha.
Srs. Deputados do PSD e do CDS, há uma diferença grande que foi visível na discussão feita nas últimas
semanas entre o PS e o PCP: nem o PCP tentou convencer o Partido Socialista a abandonar as suas
posições, nem o PS tentou convencer o PCP a desistir do seu Programa.
Risos do PSD e do CDS-PP.
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Já percebemos que isso causa um grande incómodo, porque os senhores habituaram-se a construir
soluções governativas na base de coligações, partindo a espinha ao CDS, que, de alguma forma, tinha de
justificar que aceitava ficar com a espinha partida e perder a coerência relativamente às posições que
assumia.
Protestos do PSD e do CDS-PP.
Os Srs. Deputados quiseram fazer perguntas, mas não estão interessados na resposta. Fica apenas
registado em ata e para quem nos está a ouvir.
O processo de discussão entre o PS e o PCP foi sério e empenhado na procura de respostas políticas para
os problemas do País, para os problemas dos portugueses, para os problemas imediatos que se colocam aos
trabalhadores e ao povo, assumindo que, em relação ao que havia convergência, essa convergência
registava-se e, quando ela não existia, obviamente que não se registava, e nenhum tentou quebrar a espinha
ao outro por causa disso.
Sabem, Sr.as
e Srs. Deputados, ao contrário do que os senhores têm feito neste debate do Programa do
Governo, discutiram-se naquelas reuniões, de forma muito aprofundada, soluções para os problemas
concretos e imediatos dos trabalhadores e do povo, as quais, no tempo em que nós decidirmos e não no
tempo em que os senhores querem para desviar o centro deste debate, vão ter oportunidade de conhecer.
Aplausos do PCP.
Para terminar, dirijo-me em particular ao Sr. Deputado Miguel Santos, que decidiu citar uma afirmação do
Deputado Jerónimo de Sousa, mas podia ter citado tantas outras em que disse, com muita clareza, os
objetivos com os quais o PCP se apresentou ao combate eleitoral.
O primeiro objetivo era derrotar este Governo do PSD e do CDS e o segundo objetivo era criar condições
para contribuir para uma política que desse, de facto, resposta aos problemas dos trabalhadores, do povo e do
País. Sr. Deputado Miguel Santos, estes objetivos não estão desligados entre si.
Nós sabemos que uma política que responda aos problemas dos trabalhadores e do povo pode depender
de muita coisa, e depende de uma logo à cabeça: interromper o ciclo de governação do PSD e do CDS,
derrotar e demitir este Governo de forma a criarem-se condições para que uma outra política possa ser
concretizada. E esse primeiro objetivo foi alcançado.
Quanto ao segundo objetivo, estamos a trabalhar para ele,…
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Ah, ainda não há acordo!
O Sr. João Oliveira (PCP): — … e foi com esse objetivo que fizemos esta discussão.
O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Então, ainda não há acordo?
O Sr. João Oliveira (PCP): — Obviamente, essa é uma matéria em que a disponibilidade de cada um é
decisiva. E sabe porquê, Sr. Deputado Miguel Santos? O Sr. Deputado queria — e nós percebemos porquê —
que no desafio que lançámos ao Partido Socialista colocássemos à cabeça as matérias de divergência e
disséssemos «sem isto não há nada, sem isto não há possibilidade de responder a problema nenhum do
País!» E a partir daí estavam registadas as divergências e os senhores mantinham-se no poder.
Mas nós fizemos o contrário. Olhando para a correlação de forças nesta Assembleia da República,
percebendo que dela podia sair uma solução governativa diferente da do PSD e do CDS-PP e que estavam
criadas condições para que se pudesse adotar uma política que responda aos problemas dos trabalhadores e
do povo e do País e que seja, de facto, uma solução duradoira, percebendo isso, disponibilizámo-nos a dar o
nosso contributo, e é isso que estamos a fazer para vossa irritação e para vosso incómodo.
Para terminar, Sr. Deputado Miguel Santos, um bocadinho mais de rigor nas afirmações que aqui faz. Olhe
que a CDU não perdeu votos, aumentou votos em relação às eleições legislativas de 2011.
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Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado André Silva.
O Sr. André Silva (PAN): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Sr.as
e Srs.
Deputados e demais presentes nesta Sala: Gostaria de continuar a debater algumas questões do Programa do
Governo que ontem não vi esclarecidas ou que não foram respondidas.
Gostaria de abordar uma questão que está no Programa do Governo, que se prende com a continuação da
aposta no setor na energia renovável.
Queria dizer que nem todo o renovável é positivo do ponto de vista dos impactes ambientais, queria falar
de aspetos depreciativos que encerram a energia hidroelétrica e falar do Plano Nacional de Barragens.
Para o PAN, é incompreensível como é que o Plano Nacional de Barragens ainda não foi suspenso ou,
pelo menos, como é que ainda não houve uma ponderação ou uma possibilidade de ponderação relativamente
à sua continuidade.
As metas deste Plano já foram ultrapassadas e a produtividade destas barragens é marginal no sistema
energético português — estamos a falar de 0,7% da energia primária.
Para a potência que é produzida por estas barragens previstas no Plano Nacional de Barragens existem
outras soluções: um investimento cerca de dez vezes inferior em eficiência energética produziria o mesmo
impacto que este Plano; um investimento cinco vezes inferior no aumento de potência das barragens
existentes faria com que alcançássemos os mesmos objetivos.
Relativamente à Barragem de Foz Tua, que ainda não está concluída — muitas pessoas esquecem-se
disso —, o PAN gostaria de dizer que ela constitui um atentado cultural, um atentado ambiental, um atentado
social, um crime de lesa-pátria.
Sei que nesta fase do debate o Governo não é obrigado a responder a perguntas, mas eu deixo na mesma
a pergunta já feita ao Sr. Primeiro-Ministro e ao Governo: se eu me sentasse com vocês uma hora e vos
comprovasse que, financeiramente, é mais viável suspender e parar a Barragem de Foz Tua, os senhores
mandavam suspender a sua construção para não alagarmos um vale milenar?
Relativamente às questões das terapias não convencionais, a que não foi dada resposta no dia de ontem,
gostaria de dizer que estas terapias só estão disponíveis no setor privado. Os cidadãos portugueses anseiam
por ter acesso à liberdade de escolha consignada na Constituição da República Portuguesa, na Lei de Bases
da Saúde e nas leis relativas às diferentes terapias e aos terapeutas.
Os profissionais de saúde estão isentos do pagamento de IVA, contudo isso não acontece com os
especialistas das terapias não convencionais. Ora, mais uma vez, isto coloca os utentes e os profissionais das
terapias não convencionais em desvantagem relativamente ao recurso às outras áreas de saúde, acarretando
prejuízos para uns, para outros ou para todos. Quando é que se prevê que esta área da saúde passe a estar
em igualdade e a par de todas as outras?
Uma outra questão que também não foi respondida e que foi abordada pelo PAN tem a ver com os
transgénicos, com os organismos geneticamente modificados (OGM).
Os transgénicos são seres vivos criados artificialmente em laboratório que vêm trazer muitos perigos
desnecessários: perigos de saúde para as pessoas, desequilíbrios para a natureza, impactos para a
agricultura convencional e biológica devido à contaminação e prejuízo para a economia, pois aumentam o
controlo corporativo sobre a alimentação, entre outros.
Muitos são os riscos e os impactos que já se conhecem sem que haja qualquer vantagem para o
consumidor, para o ambiente ou para as gerações futuras.
Deve imperar o princípio da precaução, no mínimo, e até lá os OGM, os transgénicos devem ser proibidos.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças.
A Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças (Maria Luís Albuquerque): — Sr. Presidente da Assembleia da
República, Srs. Deputados: Em 2011, o último Governo socialista levou o País a uma situação de pré-
bancarrota sem capacidade para assegurar o pagamento de salários e pensões.
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Portugal está hoje inegavelmente melhor, depois dos sacrifícios feitos por todos os portugueses nos últimos
quatro anos. Todos os indicadores o comprovam: o desemprego desce para valores inferiores aos que
herdámos; o emprego aumenta; a confiança de consumidores e empresários está em máximos de muitos
anos; o índice de bem-estar continua a aumentar; as exportações têm no PIB o maior peso de sempre; o
turismo cresce em número de turistas e em receitas ano após ano; a escolaridade obrigatória chegou ao 12.º
ano e o insucesso escolar recuou; o número de alunos que entraram no ensino superior neste ano letivo
aumentou significativamente.
Estes são apenas alguns exemplos que espelham a realidade do nosso País, cuja evolução positiva é
reconhecida por todos quantos acompanham Portugal. Só a oposição não o quer reconhecer.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
A consolidação das contas públicas desempenha neste quadro de melhoria e de recuperação da confiança
um papel central. Sem contas públicas controladas, sem uma trajetória consistente e credível de diminuição da
dívida pública e de redução do défice, a confiança e a credibilidade perdem-se, a economia ressente-se e com
ela as finanças públicas, o investimento cai, o desemprego aumenta e voltamos ao ponto de partida e aos
inevitáveis sacrifícios.
Nos últimos quatro anos, a atenção dos portugueses esteve como nunca focada na evolução do défice e da
dívida pública, nas variações das taxas de juro, nas avaliações das agências de rating internacionais. Isto
aconteceu porque os portugueses tomaram dolorosamente consciência dos efeitos nas suas vidas destas
variáveis a que antes davam tão pouca atenção.
À atenção da comunicação social e dos cidadãos, ao escrutínio crescente dos nossos credores, sejam eles
os parceiros europeus, o FMI ou os mercados, o Governo PSD/CDS respondeu com um caminho determinado
de controlo das contas públicas e de total transparência quanto à evolução de despesas e receitas.
As sucessivas reclassificações de empresas públicas, integrando-as no perímetro das administrações
públicas, responsáveis pela maior parte do aumento da dívida pública, acabaram em definitivo com práticas
passadas de desorçamentação que tantos efeitos negativos tiveram. O valor registado da dívida é hoje mais
alto, mas é representativo das reais obrigações do Estado e já não apenas da parte que se queria dar a
conhecer.
Vozes do PSD: — É verdade!
A Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças: — Qualquer Governo tem hoje a possibilidade de iniciar o seu
mandato com o conhecimento pleno da realidade orçamental, sem receios de surpresas que o impeçam de
alcançar os resultados prometidos, mas, sobretudo, sem desculpas para os seus próprios fracassos. Só a
oposição não o quer reconhecer.
Os dados da execução orçamental estão disponíveis diretamente para a Unidade Técnica de Apoio
Orçamental, que funciona aqui mesmo, no Parlamento.
O Conselho das Finanças Públicas, criado por exigência de Pedro Passos Coelho, ainda enquanto líder da
oposição, avalia também, de forma independente, a evolução das contas públicas e as perspetivas que
servem de base aos compromissos futuros.
A Comissão Europeia, o FMI e o BCE, tal como o Mecanismo Europeu de Estabilidade, seguem
atentamente a evolução das contas nacionais a cada seis meses, com missões de monitorização pós-
programa em Portugal e em permanência no contexto do Semestre Europeu, para assegurar a nossa
capacidade de pagar a dívida contraída, a nossa capacidade de cumprir os compromissos do Tratado
Orçamental, mas também, e sobretudo, para detetar e corrigir atempadamente os desvios da trajetória de
consolidação e crescimento que evitará a repetição das ameaças de bancarrota.
Todos acreditam já ser alcançável a saída de Portugal do Procedimento de Défices Excessivos este ano,
com um défice não superior a 3%. Só a oposição não o quer reconhecer.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
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A necessidade de consolidação das contas públicas não é uma questão ideológica; é uma questão de
realismo e, sobretudo, de responsabilidade! O rigor na gestão dos dinheiros públicos é exigido pelo respeito
pelo esforço dos contribuintes e pelo interesse nacional, muito mais que pelos compromissos internacionais.
É verdade que o Tratado Orçamental impõe metas e comportamentos exigentes, mas não é menos
verdade que mereceu a adesão voluntária e convicta de uma esmagadora maioria dos Deputados eleitos, aqui
mesmo, neste Parlamento. E foi assim porque todos reconheceram que é no interesse dos portugueses de
hoje e de amanhã que os esforços são feitos e porque todos sabemos bem demais que os desvios da
trajetória de consolidação, por aqueles que procuram ganhos políticos de curto prazo, serão pagos por nós,
pelos nossos impostos, com a perda dos nossos postos de trabalho, com a redução de oportunidades para os
nossos filhos, condenando as próximas gerações à precariedade e à incerteza.
A indisciplina das contas públicas mina a confiança e a credibilidade que, sabemos bem, se perde tão
rapidamente e é tão difícil de reconquistar. Sem confiança, sem estabilidade política, as empresas não
investem, sem previsibilidade fiscal os investidores internacionais optam por outros destinos para criar riqueza
e emprego e as desigualdades sociais que persistem serão mais agravadas, a segurança social será mais
insustentável e o Serviço Nacional de Saúde estará ameaçado.
Este Governo não decide e não trabalha para os mercados!
O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Muito bem!
A Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças: — O que fizemos nos últimos quatro anos foi trabalhar para os
portugueses para que sejamos cada vez menos dependentes dos mercados, das suas perceções e dos seus
comportamentos, que escondem durante muito tempo os riscos que corremos e que abruptamente nos retiram
a confiança e nos penalizam.
Mas a importância dos mercados não se diminui com retórica, acusando-os de serem apenas uma
agremiação de especuladores mal-intencionados.
Os mercados representam as poupanças de outros cidadãos e empresas, de outros países que procuram
oportunidades de investimento. Os mercados são a fonte de financiamento que nos permite reduzir
gradualmente o défice, evitando os custos brutais, inimagináveis, para os portugueses de um forçado equilíbrio
orçamental imediato.
Mas os mercados são também o que permite ao sistema financeiro obter fundos externos para dar crédito
às nossas famílias e às nossas empresas, já que a poupança nacional não é suficiente para financiar o
crescimento económico.
Reduzir a dependência dos mercados consegue-se reduzindo o défice e a dívida pública, consegue-se
honrando os compromissos assumidos e gerando confiança, consegue-se com a redução da taxa de juro e da
perceção de risco. Tal não é, infelizmente, o que estamos a ver nos últimos dias.
A redução das taxas de juro liberta recursos para as funções do Estado social, para a proteção dos mais
desfavorecidos, para a educação e a saúde, para o investimento produtivo. Sempre que a confiança se
quebra, sempre que os investidores receiam que não tenhamos vontade ou capacidade de pagar a dívida,
deixam de estar disponíveis para nos ceder os seus fundos e a ameaça de bancarrota volta a ser real.
Que ninguém duvide: se Portugal se voltar a ver forçado a recorrer a um programa de assistência — um
quarto resgate, não um segundo, em menos de 40 anos —, os sacrifícios por que todos teremos de passar
seriam bem mais duros do que aqueles que ficaram para trás.
E não é preciso, sequer, imaginar o que aconteceria. Basta ver o que tristemente tem sido a história
recente de um dos nossos parceiros do euro, a Grécia, e o custo que o pretenso fim da austeridade e a revolta
contra as regras da Europa tem e terá para os gregos de hoje e de amanhã.
O que ganharam com essa experiência? Mais recessão, mais pobreza, mais desemprego e aumento da
dependência das instituições europeias e do FMI, os únicos ainda dispostos a conceder o crédito de que o
País necessita para evitar a miséria absoluta do seu povo.
O Programa do Governo que ontem apresentámos neste Parlamento coloca, como sempre fizemos, acima
de tudo o superior interesse nacional. Continua o caminho já iniciado de recuperação dos rendimentos e de
redução da carga fiscal sobre trabalhadores e empresas. Fá-lo com o gradualismo que a responsabilidade
exige, assume o compromisso de devolver rendimentos mais rapidamente, se tal for possível, sem
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comprometer o que já se conseguiu, e assegura que o rendimento recuperado permite planear com segurança
e confiança o amanhã, que o que agora se recupera não nos será retirado mais tarde, em dobro, sempre de
forma mais penosa para, mais uma vez, corrigir os erros de quem promete o que não pode cumprir e de quem
coloca interesses particulares à frente dos interesses de Portugal.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
O Programa do Governo que apresentamos define um caminho de consolidação do que já foi alcançado,
coloca prioridade máxima no combate às desigualdades sociais, que as crises sempre agravam, sustenta a
mudança de paradigma alcançada na última Legislatura de uma economia mais aberta e competitiva mais
capaz de enfrentar o mundo globalizado. Contém medidas para o combate aos desafios de médio e longo
prazo, como a demografia e a sustentabilidade da segurança social, a saúde, a educação e a formação, a
competitividade da economia e a sustentabilidade do modelo social europeu em que nos revemos. Contém as
medidas que ao longo da legislatura nos colocam, com segurança, nesse caminho. Enquadra Portugal na
Europa e no mundo, potenciando o nosso papel e as nossas oportunidades na dinâmica global.
O Programa do Governo assegura estabilidade, responsabilidade e compromisso perante os nossos
parceiros europeus, perante as instituições de que Portugal faz parte, perante aqueles cujos valores
partilhamos e que também nos cabe defender. Mas mais do que tudo assegura estabilidade, responsabilidade
e compromisso perante os portugueses que hoje trabalham ou que já não estão na vida ativa e perante os
portugueses de amanhã, que exigem de nós que entreguemos o País em melhores condições do que o
recebemos.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
A democracia em que justamente nos orgulhamos de viver defende as diferenças de opinião, as diferenças
de visão sobre o modelo de sociedade que devemos ter, as diferenças de visão sobre a economia que
queremos, mas defende, acima de tudo, o respeito pelo voto soberano dos portugueses.
Saibamos todos honrar a responsabilidade que nos foi confiada.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Entretanto, assumiu a presidência o Vice-Presidente José de Matos Correia.
O Sr. Presidente: — Inscreveram-se, para formular pedidos de esclarecimento à Sr.ª Ministra de Estado e
das Finanças, oito Srs. Deputados e a Sr.ª Ministra informou a Mesa que responderá em grupos de quatro.
Tem, desde já, a palavra o Sr. Deputado Eduardo Cabrita.
O Sr. Eduardo Cabrita (PS): — Sr. Presidente — a quem saúdo pelo seu primeiro momento de
presidência destes trabalhos —, Sr.ª Ministra das Finanças, Portugal precisa de compromisso, precisa de
estabilidade, precisa de previsibilidade para os cidadãos, para as famílias, para as empresas. E foi por isso
que os portugueses a 4 de outubro disseram «não» à instabilidade, à fratura social, ao desastre económico
que significou a governação que a Sr.ª Ministra aqui representa.
A estabilidade de que nos fala foi marcada por três Orçamentos inconstitucionais. A marca da instabilidade
permanente é a instabilidade fiscal pelo enorme aumento de impostos, por 80 alterações fiscais. Aquilo que
neste momento é o legado da sua governação é o segundo maior défice de toda a União Europeia, 7,2%, e a
terceira maior dívida pública, 130% do PIB, no final de 2014.
O desafio para a construção de um horizonte de confiança é o apoio às pequenas e médias empresas, é a
salvaguarda do emprego, tão atacado pela tributação a 23% das empresas do setor da restauração, é a
salvaguarda da justiça na tributação do rendimento, é a defesa da casa de morada de família daqueles que
são objeto de execuções e do aumento, sem limite, do IVA.
Acabou o tempo da instabilidade, dos Orçamentos retificativos, do confronto permanente com a
Constituição. Chegou o tempo da construção, da confiança, da justiça e da recuperação do rendimento.
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Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (José de Matos Correia): — Sr. Deputado Eduardo Cabrita, agradeço as palavras que me
dirigiu.
Para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra a Sr.ª Deputada Mariana Mortágua.
A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra das Finanças, nos últimos quatro anos este
País assistiu à arrogância de uma maioria e de um Governo convencidos de que, para além de si mesmo, só
existe o caos. E tudo serviu para convencer o povo de que só há o caos para além da direita. Serviu a
chantagem das agências de rating à Comissão Europeia, às bolsas, ao investimento externo — ainda hoje,
ouvimos aqui esses argumentos —, serviu o engano e serviu a manipulação.
Não nos esquecemos de ouvir a Sr.ª Ministra dizer-nos aqui, nesta Casa, que seria possível um corte de
600 milhões na segurança social. Pois nunca mais, nem em campanha nem na apresentação do Programa,
conseguimos discutir, ou saber, qual é o real plano da direita para a segurança social. Engano e manipulação!
Não nos esquecemos — e a Sr.ª Ministra veio aqui apresentar uma lista de bons indicadores e nós
teríamos os mesmos, mas maus, para apresentarmos, se quiséssemos — como tentaram esconder do País os
dados do desemprego e da emigração, chegando mesmo ao ponto de cortar, e soubemos isso hoje, o
financiamento ao Observatório, que teve a coragem e a ousadia de divulgar os dados da emigração antes das
eleições.
O Sr. Jorge Duarte Costa (BE): — Uma vergonha!
A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Quebra de confiança política foi aquilo que o Governo justificou.
Aplausos do BE.
Queriam fazer com os dados da emigração a mesma aldrabice que fizeram com o indicador mensal da
sobretaxa. Antes das eleições, a devolução da sobretaxa era de 35%; no mês a seguir às eleições, os
portugueses ficaram a saber que a devolução da sobretaxa, afinal, era 9,7%.
O Sr. Jorge Duarte Costa (BE): — Bem lembrado!
A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Diga, Sr.ª Ministra, qual é, afinal, a previsão dos dados da sobretaxa,
agora que vem apresentar um Programa que sabe que vai ser chumbado e que não será Governo.
A manipulação deste Governo é necessária por um motivo: só a manipulação pode sustentar ilusões. A Sr.ª
Ministra disse-nos aqui, hoje, que a consolidação orçamental não é ideológica. É, sim, ideológica! É ideológica
na dimensão como é feita, no desemprego que causa, na pobreza que causa e a quem causa essa pobreza e
é ideológica na forma como é feita e nas escolhas políticas que se fazem para essa consolidação orçamental.
Vozes do BE: — Muito bem!
A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — O Programa que aqui nos apresentam escolhe manter cortes de
pensões e aumento da sobretaxa até 2019 — apesar de o Tribunal Constitucional ter dito que os salários eram
para devolver no próximo ano —, mas, ao mesmo tempo, diminui os impostos sobre os lucros das grandes
empresas em 20%. Isto é ou não é uma escolha ideológica, Sr.ª Ministra? É lógico que isto é uma escolha:
castigar o trabalho e levantar impostos sobre grandes empresas, como aconteceu e como continuará a
acontecer.
A Sr.ª Ministra veio aqui dar-nos lições sobre disciplina, seriedade, verdade… Mas nós também nos
lembramos como este Governo garantiu aos portugueses que o BES não traria 1 cêntimo de custos para os
contribuintes, bem nos lembramos como saiu cara a este Governo a campanha eleitoral antecipada. Agora
sabemos que não só o Novo Banco vai precisar de mais capital, a juntar aos 3900 milhões de euros — e os
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bancos já disseram que não vão pagar esse aumento de capital —, como a fatura do BANIF vai sair mais cara
do que aquilo que se pensava.
Qual é a fatura, Sr.ª Ministra, desta gestão tão disciplinada, destas promessas de que nem o Novo Banco
nem o BANIF trariam custos para os contribuintes?
O Sr. Jorge Duarte Costa (BE): — Muito bem!
A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Sr.ª Ministra, esta será a última vez que aqui debatemos neste modelo,
e eu não consigo esconder o meu entusiasmo por isso mesmo. Isto não acontece por má vontade do Bloco de
Esquerda, acontece porque mais de 700 000 pessoas deixaram de confiar no seu Governo para defender o
interesse nacional, preferiram confiar noutros Deputados, noutras Deputadas, que têm igual legitimidade para
construir uma alternativa em que a estabilidade não vem da chantagem contra os pobres, em que a segurança
vem da estabilidade dos rendimentos, da devolução dos salários, da estabilidade da dignidade e da
estabilidade que só a esperança pode dar às pessoas.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente (José de Matos Correia): — Para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr.
Deputado Duarte Pacheco.
O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra das Finanças, começo por cumprimentá-la.
Permita-me que lhe coloque duas questões.
A primeira é a de saber se é verdade ou não que este Governo herdou, em 2010, um défice superior a
11%,…
O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Bem lembrado!
O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — … que Portugal está em vias de ter um défice inferior a 3% e, por isso
mesmo, sair do procedimento por défice excessivo, se isso não significa juros mais baixos para o Estado, para
as empresas, para as famílias e se, por isso mesmo, não seria criminoso que qualquer governo não fizesse o
necessário para que este objetivo fosse alcançado em 2015.
O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Muito bem!
O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — Sr.ª Ministra, gostava de lhe perguntar, concreta e diretamente, se está
em condições de nos garantir que este Governo fará todos os possíveis para que a meta dos 3% não seja
ultrapassada.
Segunda questão: factos são factos. É verdade que o Programa do Partido Socialista apresentado aos
eleitores previa uma dívida superior ao do próprio Governo em mais de 30 000 milhões em 2019. Mas agora o
programa das esquerdas consegue esta coisa espantosa: mais despesa, menos receita e o défice baixa.
O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — Milagre!
O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — Perante isto que é espantoso, Sr.ª Ministra, vejo aqui três possibilidades.
Primeira possibilidade: o milagre. Sabemos que eles existem. Será que nas contas públicas existem
milagres? Deixo-lhe a pergunta.
Segunda possibilidade: será que o Excel dos socialistas ainda é o mesmo do do Eng.º Sócrates que, antes
das eleições, em 2009, baixava impostos, aumentava salários e que nos conduziu à bancarrota? Porventura,
pode ser uma possibilidade.
Terceira possibilidade: será que, em 2016, os socialistas já estão a prever um crescimento superior àquele
que estava inicialmente previsto, resultado, portanto, da atuação deste Governo e do bom caminho da nossa
economia?
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É porque, Sr.ª Ministra, perante estes cenários e perante estas alternativas, se fosse verdade que menos
receita e mais despesa dá menos défice, proponho que este Plenário aprove a candidatura do PS ao prémio
Nobel da Economia e que se vá pelos cinco cantos do mundo apregoar esta nova novidade. O PS sabe como
se pode fazer melhor, melhor e melhor. Com menos receita, mais despesa e menos défice, o prémio Nobel é
para eles, de certeza.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
O Sr. Presidente (José de Matos Correia): — Para formular pedidos de esclarecimento, antes da resposta
da Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças, tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Sá.
O Sr. Paulo Sá (PCP): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra das Finanças, este Governo foi responsável pelo
mais brutal e mais profundo ataque fiscal aos rendimentos do trabalho de que há memória.
Por via da redução do número de escalões de IRS, do aumento significativo da taxa de imposto em cada
escalão, incluindo no escalão mais baixo, da limitação das deduções na saúde, educação e habitação e,
ainda, da sobretaxa extraordinária, num só ano o Governo aumentou a carga fiscal que incide sobre os
rendimentos dos trabalhadores em 3200 milhões de euros. Um brutal aumento de impostos que foi
apresentado na altura como temporário, mas que o Governo pretende perpetuar.
Além da promessa de eliminação da sobretaxa extraordinária no longínquo ano de 2019, não encontramos
no Programa do recauchutado Governo qualquer intenção de reverter o colossal aumento de impostos que
incide sobre os rendimentos de trabalho.
Este é um Governo que, tendo sido derrotado pela luta dos trabalhadores e nas urnas, insiste na
perpetuação da política, condena os trabalhadores e o povo português ao empobrecimento e Portugal à
regressão social.
Sr.ª Ministra das Finanças, o Governo afirma não haver folga orçamental para reverter o brutal aumento de
impostos que recai sobre os rendimentos do trabalho, mas já há folga orçamental para reduzir durante seis
anos consecutivos, repito, seis anos consecutivos, a taxa do imposto que incide sobre os lucros das empresas.
Sr.ª Ministra, explique aos portugueses esta opção do Governo de esmagar os trabalhadores com uma
insuportável carga fiscal, ao mesmo tempo que reduz os impostos às grandes empresas e aos grupos
económicos.
Sr.ª Ministra das Finanças, explique, ainda, por que é que na véspera das eleições disse aos portugueses
que iria devolver 35% da sobretaxa de IRS, para logo a seguir às eleições reduzir esse valor para menos 10%.
Reconheça, Sr.ª Ministra, que a ação do Governo assentou, durante estes quatro anos, e continua a
assentar, na mentira e no embuste.
No Programa do Governo, Sr.ª Ministra, não há uma palavra sobre a situação no BANIF e no BES/Novo
Banco. A Sr.ª Ministra não pode sair daqui sem dizer qual vai ser o impacto orçamental e na vida dos
portugueses da situação existente nestes dois bancos.
Por fim, Sr.ª Ministra, aproveite a sua derradeira presença na bancada do Governo para esclarecer os
portugueses sobre a borla fiscal que o Governo deu, recentemente, ao Novo Banco de forma ilegal e obscura.
Pelos nossos cálculos, essa borla fiscal foi de, pelo menos, 445 milhões de euros. Sr.ª Ministra, confirma este
valor?
Sr.ª Ministra, há dinheiro para dar perdões fiscais aos banqueiros, mas não há dinheiro para reduzir os
impostos de quem vive do seu trabalho.
Sr.ª Ministra, onde estão, no Programa do Governo, as medidas para pôr fim às mordomias e benesses da
banca e do grande capital?!
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente (José de Matos Correia): — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Ministra de Estado e
das Finanças.
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A Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Eduardo Cabrita, não me
colocou nenhuma questão, mas, em todo o caso, gostaria de relembrar ao Sr. Deputado que o desempenho
de Portugal em matéria de défice e de dívida é, infelizmente, muito negativo, porque assim o herdámos do
Governo anterior. Basta pensar, Sr. Deputado, num défice de 11,2% que este ano ficará abaixo de 3% para
percebermos quem é que, de facto, tem responsabilidade nesse triste registo que as nossas contas públicas
têm tido.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Quanto aos Srs. Deputados Mariana Mortágua e Paulo Sá, como algumas questões são comuns, opto por
responder a ambos em conjunto.
Relativamente ao custo para os contribuintes do caso do Novo Banco, sugiro que perguntem ao vosso
novo parceiro de coligação, que, aparentemente, terá intenção de pôr dinheiro dos contribuintes no Novo
Banco. Não foi isso que nós fizemos e connosco não é isso que vai acontecer.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Protestos do PCP e de Os Verdes.
Quanto à matéria fiscal, Srs. Deputados, aquilo que temos vindo a fazer é, efetivamente, baixar impostos.
Não é verdade que não se baixem os impostos sobre o trabalho, há uma reforma do IRS que visa,
nomeadamente, aliviar as famílias com dependentes a cargo, sejam descendentes ou ascendentes, e isto é
muito importante para todas as famílias que possam beneficiar. Há a redução do IMI, nas câmaras que
optaram por fazê-lo, também para as famílias com filhos, e esta é uma alteração que beneficia diretamente
quem trabalha.
Sim, Sr.ª Deputada Mariana Mortágua, nós acreditamos que as empresas criam riqueza, criam emprego,
criam valor para o País. Por isso mesmo é que foi possível baixar o IRC e, ainda assim, aumentar a receita do
IRC, o que só comprova que a nossa estratégia está, de facto, certa. E não vale a pena vir dizer que é para as
grandes empresas e para o grande capital, porque para essas empresas continua a existir a sobretaxa de IRC,
em sede de derrama, que está no Código do IRC, e que não se prevê reduzir em nenhum ponto do nosso
Programa.
As PME beneficiam, já hoje, de uma taxa de IRC mais baixa, de 17%, Sr.ª Deputada. Não é verdade que
estejamos a beneficiar as grandes empresas, agora que acreditamos que baixar a carga fiscal sobre as
empresas, em sede de IRC, é a forma adequada de promover a criação de riqueza e de emprego, sim, Sr.ª
Deputada, acreditamos, e os resultados que estamos a ver quer no crescimento do investimento, quer no
aumento da receita de IRC comprovam que temos razão,…
A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Não, não!
A Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças: — … por muito que lhe custe a aceitar, Sr.ª Deputada.
No que diz respeito às folgas orçamentais para reduzir outras matérias, Srs. Deputados, aquela que é a
nossa preocupação maior é não andar para trás, é devolver o que pode ser devolvido sem pôr em causa o que
já se conseguiu, porque, como disse na minha intervenção, a última coisa que queremos é voltar à experiência
anterior, de, em cima das eleições, termos um aumento salarial de 2,9% para, três meses depois, nos
cortarem 10%. Não queremos isso! Devolvemos aquilo que puder ser devolvido, para que as pessoas, com
confiança, possam programar o seu futuro e não tenham de sofrer os sobressaltos de andar sempre a pagar
os erros que se fazem.
Sr. Deputado Duarte Pacheco, reafirmamos o nosso compromisso de ter este ano um défice abaixo de 3%.
Seria, de facto, como diz, criminoso que alguém que viesse a tomar conta das finanças públicas antes do final
do ano fizesse alguma coisa para pôr em causa esta meta, porque é em benefício dos portugueses e no
interesse dos portugueses que esta meta será alcançada. É nessas circunstâncias que temos as contas
públicas, com informação transparente e que todos poderão consultar, ou seja, não precisarão apenas de
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acreditar na nossa palavra, há muitas formas de o verificar, de modo completamente independente e
autónomo.
Quanto à questão de saber como é possível fazer esta quadratura do círculo — mais despesa, menos
receita e crescimento —, de facto, Sr. Deputado, na literatura, sou uma apreciadora do realismo mágico, gosto
muito de muitos escritores latino-americanos, mas realismo mágico em cenários macroeconómicos parece-me
um exercício que, para além de não ter nada de lúdico, tem muito de perigoso.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Protestos do Deputado do PS João Galamba.
Mas veremos como é possível conseguir aquilo que não se consegue. Receio, Sr. Deputado, que só será
conseguido no papel, porque a realidade se encarregará de demonstrar que, de facto, não é possível.
Sr. Deputada Mariana Mortágua, diz que «sem nós é o caos», mas espero, sinceramente, que não seja.
Nós somos portugueses, trabalhamos cá, vivemos cá, criamos cá os nossos filhos e tenho muita esperança de
que não seja o caos. Espero, sinceramente, que quem vier a assumir responsabilidades não provoque o caos,
porque não deixaremos de alertar de quem é essa responsabilidade.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
O Sr. Presidente (José de Matos Correia): — Srs. Deputados, iniciamos agora a segunda ronda de
pedidos de esclarecimento à Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças.
Tem a palavra a Sr.ª Deputada Cecília Meireles.
A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças, de facto, a
evolução financeira de Portugal nos últimos anos foi muito significativa, mas este é um lado da história, o outro
lado é o de que ela foi também muito, muito difícil.
Aquilo que foi conseguido foi com esforço, com sacrifício e foi, sobretudo, construído com a esperança de
todos os portugueses ou de muitos portugueses. Com a esperança de que era possível ultrapassarmos os
problemas, com a esperança de que era possível não voltarmos a passar por aquilo que estávamos a passar,
com a esperança de que Portugal não estava condenado a ser sistematicamente um País entre os mais
pobres da Europa, um País com crónicos problemas financeiros, um País sempre assolado por instabilidade
ou problemas. Foi essa esperança e é essa esperança que muitos portugueses conseguiram materializar e é
essa esperança que importa não perder agora, porque estamos, de facto, num novo ciclo e, obviamente,
ninguém o questiona, como também ninguém questiona a recuperação de rendimentos.
Aquilo que muitas vezes ouvimos neste Hemiciclo é uma coisa tão absurda que chega a ser inacreditável.
Não há nenhum Governo que tenha prazer em fazer cortes, não há ninguém que tenha prazer em fazer cortes,
muito pelo contrário, todos queremos não apenas a recuperação de rendimentos mas que Portugal tenha cada
vez mais meios, que seja possível não apenas recuperar mas aumentar rendimentos. O que importa é discutir
como o fazemos, para que isso seja para sempre, porque, como a Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças
disse, e bem, todos temos na memória momentos de recuperação de rendimentos antes de eleições que
rapidamente se transformaram em cortes de rendimentos depois das eleições.
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Muito bem!
A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Nós queremos uma recuperação gradual de rendimentos, porque
queremos uma recuperação de rendimentos para sempre, não queremos uma recuperação de rendimentos
até às próximas eleições. É esta diferença abissal que nos separa!
Importa também dizer que ouvi falar aqui, muitas vezes, ao longo dos últimos anos, em Estado social,
como já ouvi muito neste debate do Programa do Governo. Gostava de lhe dizer, Sr.ª Ministra, que falar é uma
coisa, fazer é outra, completamente diferente. Creio que quem mais defende o Estado social é quem garante
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as condições para que ele continue a funcionar, não é quem muito fala nele, mas, depois, deixa o País no
estado de não conseguir pagar pensões nem salários. Isso não é defender o Estado social!
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Falir o Estado é o maior ataque ao Estado social que se pode fazer, e
isto aconteceu em Portugal!
Por último, Sr.ª Ministra, gostava de lhe dizer o seguinte: podemos discutir aqui se o défice é ou não uma
questão ideológica — certamente, será uma discussão muito interessante —, mas há um facto que é
indiscutível que é o de que ter défice significa que temos despesa do Estado que não é paga com recurso a
impostos e, portanto, o dinheiro para a pagar tem de vir de algum lado. Isto não é uma questão ideológica, é
um facto. Não deixa de ser a suprema ironia que aqueles que, na retórica, mais são contra os mercados sejam
precisamente aqueles que, pelo aumento do défice, mais querem que Portugal continue a depender dos
mercados e do estrangeiro.
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
Esta é a suprema ironia e é a suprema ironia que muitos partidos, aqui, terão de explicar! Sim, porque fazer
um acordo de Governo e uma coligação de Governo torna necessário sair da posição confortável daqueles
que sempre comentam e sempre criticam para a posição de responsabilidade daqueles que explicam aquilo
que estão a fazer.
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Ora bem!
A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Veremos, então, quem estará à altura das responsabilidades, mas,
neste debate, aquilo que vi foram muitas críticas, muito dizer como deveria ser feito e muito pouco assumir as
responsabilidades sobre como será feito.
A minha questão é muito concreta, Sr.ª Ministra: se nos desviarmos deste caminho que o Programa do
Governo prevê, que é um caminho de recuperação económica — por mais que a retórica queira dizer o
contrário, este caminho é de recuperação económica e de recuperação gradual de rendimentos —, se
voltarmos àquilo que é, para alguns, a festa orçamental e, para outros, o absoluto descontrolo orçamental, o
que é que isso significará, do ponto de vista de andarmos para trás e de podermos estar a pôr em causa não
os rendimentos deste ano mas os rendimentos dos próximos 10 anos?
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
O Sr. Presidente (José de Matos Correia): — Para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr.
Deputado Paulino Ascenção.
O Sr. Paulino Ascenção (BE): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças, o desespero com
que a direita se apresenta neste debate, face ao entendimento do PS com os partidos à sua esquerda, faz
lembrar a situação de uma noiva que foi trocada por outra nas vésperas da boda e agora vem exibir a sua
frustração, proclamando que o desejado não vai ser feliz com a esquerda e que só poderia ser feliz com a
direita.
O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Muito bem!
O Sr. Paulino Ascenção (BE): — Quero também assinalar aqui outro namoro, outra intimidade do Sr.
Primeiro-Ministro com o Presidente do Governo Regional da Madeira.
Para atender à ambição pessoal de poder do Dr. Albuquerque e a pretexto da dívida oculta da Madeira, foi
combinado entre os dois, e aplicado, um plano duríssimo, uma dupla austeridade. Esta foi a região do País
onde ocorreu o maior aumento de impostos e é, atualmente, a região do País onde a taxa de desemprego é
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mais alta. Quem sofreu foram os madeirenses e as responsabilidades pela ocultação da dívida, essas,
continuam por apurar.
O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Muito bem!
O Sr. Paulino Ascenção (BE): — O Primeiro-Ministro, este ano, já visitou a Madeira por duas vezes, ao
contrário do que sucedeu nos quatro anos anteriores do seu mandato, em que desprezou completamente os
madeirenses e nunca lá pôs os pés.
A Madeira defronta-se com uma dívida enorme e insustentável.
Para 2016, 30% do Orçamento regional serão consumidos pelo serviço da dívida. Não há Orçamento que
aguente nem há serviços públicos que aguentem tamanhos encargos! Este Programa do Governo não diz
nada quanto a este problema. Quanto a renegociação da dívida, é tabu para VV. Ex.as
. Pagar a dívida, sim,
senhor, custe o que custar; salvar a vida das pessoas, isso, não.
Do Governo Regional da Madeira e do PSD da Madeira também não vos chegará qualquer reivindicação a
este nível, como é óbvio. Como o Dr. Albuquerque deve favores ao Primeiro-Ministro, pela ajuda que recebeu
para ascender ao poder, agora, tem de pagar esses favores e a forma de o fazer é estar calado, não levantar
ondas, não defender os interesses da Madeira.
Aplausos do BE.
Outra questão importante, Sr.ª Ministra, é o financiamento do Estado para o novo hospital do Funchal, pois
o Orçamento regional, dado o que já expus, não tem margem para investimento.
O PSD-Madeira, durante a campanha, dava o hospital por construído, só pela circunstância de estar
inscrito no programa eleitoral, o Sr. Vice-Primeiro-Ministro, Paulo Portas, foi à Madeira, em campanha, garantir
que o hospital iria mesmo ser construído, mas agora — pasme-se! — olhamos para o Programa do Governo e
nada diz, constando apenas uma expressão vaga, no sentido de que se vai promover a reavaliação das
prioridades na construção ou ampliação de hospitais.
O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Pois é!
O Sr. Paulino Ascenção (BE): — Portanto, o novo hospital do Funchal esfumou-se neste Programa do
Governo e o que vale aos madeirenses é que este Governo também se vai esfumar rapidamente.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente (José de Matos Correia): — Para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr.
Deputado José Luís Ferreira, a quem peço desculpa por não ter concedido a palavra anteriormente.
O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra das Finanças, pelos vistos, não
adianta nada questioná-la sobre a borla fiscal ao Novo Banco porque, decididamente, a Sr.ª Ministra não quer
falar sobre o assunto, o que nos deixa ainda mais preocupados.
Mas diz a Sr.ª Ministra das Finanças que estiveram quatro anos a trabalhar para os portugueses. Sr.ª
Ministra, a verdade é que os últimos quatro anos vão ficar marcados pela mais grave e monstruosa injustiça
fiscal de que há memória.
Vejamos: enquanto, para quem trabalha, o Governo foi aumentando brutalmente os impostos em sede de
IRS para valores, aliás, absolutamente imorais, para as grandes empresas não se cansou de aliviar os
impostos — primeiro, baixou o IRC, de 25% para 23%, e, depois, de 23% para 21% —, uma baixa de
impostos, registe-se, que apenas veio beneficiar as grandes empresas.
Enquanto, para quem trabalha, o Governo não se cansou de reduzir os montantes, em sede de IRS, no que
diz respeito às deduções, seja da educação, seja da saúde, mas também da habitação, para os grandes
grupos económicos e financeiros ofereceu volumosos e imorais benefícios fiscais. Por exemplo, alargaram a
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isenção das mais-valias e dos lucros transferidos para o estrangeiro; reduziram a participação social de 10%
para 5%; e aumentaram o prazo de reporte de prejuízos de 5 para 12 anos.
Enquanto o Governo aplicou uma sobretaxa extraordinária a quem trabalha, não foi capaz de aplicar o
imposto sobre transações financeiras, que estava, aliás, previsto no Orçamento do Estado para 2014 — e
tinha autorização desta Assembleia para o aplicar —, de apenas 0,5%. Para isso, o Governo não foi capaz de
aplicar esse imposto, porque o que interessava era mexer nos rendimentos do trabalho.
Aliás, a carga fiscal sobre quem trabalha e sobre os pensionistas foi de tal ordem que o Governo se viu
obrigado a procurar fórmulas para esconder a real dimensão do embate fiscal. E a fórmula encontrada foi
pagar o 13.º mês em duodécimos, com um objetivo muito claro: para que os portugueses não sentissem o
verdadeiro embate e a exata dimensão da carga fiscal.
Sr.ª Ministra, o Governo diz que a baixa do IRC para as grandes empresas é feita em nome da
competitividade. Mas sabemos, e a Sr.ª Ministra certamente também saberá, que tanto o Banco de Portugal
como o Instituto Nacional de Estatística, nos estudos que fizeram, dizem que os obstáculos ao investimento
nada têm a ver com questões de natureza fiscal.
O grande obstáculo ao investimento chama-se «procura». Se não há procura, não há investimento. E
sabemos por que é que não há procura. Porque o Governo PSD/CDS, na última Legislatura, passou quatro
anos, literalmente, a depenar as famílias. Portanto, não há procura, logo, não há investimento.
Gostaria, Sr.ª Ministra, que pudesse adiantar alguma coisa sobre o balanço que o Governo faz sobre esta
baixa do IRC para as grandes empresas em 5 pontos percentuais. E digo que é para as grandes empresas,
pois sabemos que essa baixa do IRC é apenas para as grandes empresas porque as pequenas e médias
empresas não chegam lá.
Sr.ª Ministra, é curioso que, neste Programa do Governo, não encontremos uma única palavra sobre os
offshore. Parece-nos que não faz muito sentido que haja lugares no planeta que continuem fora da alçada dos
Estados e onde o poder judicial não entra. E, assim, permite-se que enquanto continua a reinar a imoralidade
para uns poderem viver em verdadeiros paraísos fiscais, a generalidade vive num verdadeiro inferno fiscal.
Bem sabemos que isso não depende apenas do Governo português, mas também sabemos que o Governo
português, se quiser, pode colocar a questão e levantar o problema tanto nas instâncias europeias como nos
organismos internacionais de que faz parte.
Uma vez que o Programa do Governo nada refere sobre os offshore, gostaria que a Sr.ª Ministra, se
pudesse, nos dissesse algo sobre este assunto, que é um verdadeiro atentado à moralidade fiscal.
Aplausos de Os Verdes e do PCP.
O Sr. Presidente (José de Matos Correia): — Para formular pedidos de esclarecimento à Sr.ª Ministra de
Estado e das Finanças, tem a palavra o Sr. Deputado Heitor Sousa.
O Sr. Heitor Sousa (BE): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra das Finanças, num debate sobre o Programa
deste Governo, devo começar por confessar alguma frustração pelo facto de me ver forçado a dirigir as duas
perguntas que trago apenas à Sr.ª Ministra das Finanças, Maria Luís Albuquerque.
Na verdade, gostava de poder confrontar estas questões, para além da Sr.ª Ministra, com os outros dois
elementos que, no Governo anterior, configuraram uma verdadeira troica hooliganista, que tentou arrumar a
questão das privatizações das empresas de transporte até ao passado dia 4 de outubro. Falo do ex-Ministro
da Economia, Pires de Lima, e do ex-Secretário de Estado dos Transportes, Sérgio Monteiro.
Seja por não terem tido a coragem de assumir as suas responsabilidades e de se sentarem ao seu lado,
seja por se terem recusado a fazer o papel da recriação histórica da figura de Egas Moniz, qual mensageiro
pronto para o sacrifício — neste caso, com as privatizações ao pescoço —, a verdade é que foram tratar da
sua vidinha aceitando a mão amiga do Estado, restando, por isso, a Sr.ª Ministra para responder a duas
questões muito simples.
A primeira é esta: depois de ter acompanhado o Secretário de Estado dos Transportes numa espécie de
cruzada contra as PPP rodoviárias e de este ter invocado os efeitos negativos que trazem para as finanças
públicas, considera a Sr.ª Ministra que os atuais processos de subconcessão são o quê? São as boas PPP
contra as más PPP — e tivemos o ex-Secretário de Estado a negociar essas PPP do lado dos bancos e, logo
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depois, passaram a ser más PPP — ou teremos a repetição dos contratos swap que a Sr.ª Ministra bem
conhece e que mais não são do que PPP financeiras? Será que temos aqui uma reedição da história do banco
bom e do banco mau?
Isto leva-me à segunda questão: o risco da operação. Sr.ª Ministra, qual é o risco dos privados neste
negócio? Há alguma hipótese de a Avanza vir a receber menos do que está estabelecido nas cláusulas
mínimas de salvaguarda? Poupo-lhe a resposta: não há!
A Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças: — Ora viu?!
O Sr. Heitor Sousa (BE): — Como é que se conta esta narrativa dos falsos avestruzes? De forma simples
e como se fosse um motor a dois tempos.
Num primeiro tempo, faz-se o jogo sujo da destruição das empresas, a coberto de um suposto processo de
reestruturação sob a ação de uma brigada hooliganista, colocada à frente dessas empresas, cuja única
preocupação foi a de colocar os seus homens de mão, destruir processos de trabalho consolidados e levar
muitos trabalhadores à demissão, sujeitando-os a um revoltante assédio moral, atirados para alas de empresa,
funcionando como guetos, até assinarem a sua demissão.
Depois, para garantir a segurança máxima no recebimento das rendas, aprovam-se portarias onde estão
penhoradas as receitas dos transportes para os próximos oito anos. Essa será a mínima parte, porque o resto
vem dos pagamentos por disponibilidade, ou seja, pagamentos com um risco nulo, de que se desconhece ao
certo o montante, mas que podem representar, pelo menos, um quarto do total.
Como explica a Sr.ª Ministra que, por exemplo, nas receitas a entregar ao concessionário, uma subida do
gasóleo valha 20% de um fator de correção dessas receitas a entregar ao concessionário?
Como explica, por exemplo, que uma subida do nível geral da remuneração média do trabalho no País
equivalha a uma correção de cerca de 50% do valor a pagar à concessionária pelos chamados «pagamentos
por disponibilidade»?
Se não fosse o hooliganismo radical da fúria privatizadora deste Governo, que, pelos vistos, pretende
estender a empresa pública Infraestruturas de Portugal com as infraestruturas rodoviárias e ferroviárias,
qualquer pessoa que defenda o interesse público só acabará por agradecer a um futuro governo alternativo a
travagem imediata deste saque dos cofres públicos e a gestão pública de um bem que é de todos e ao serviço
de todos.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente (José de Matos Correia): — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Ministra de Estado e
das Finanças.
A Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças: — Sr. Presidente, Srs. Deputados, muito rapidamente,
começaria por responder ao Sr. Deputado Heitor Sousa que não tenho nenhuma dúvida de que a História se
encarregará de agradecer a quem defendeu o País de uma situação de bancarrota e a quem colocou o País
de volta num roteiro de crescimento.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Quanto à reestruturação das empresas de transportes, Sr. Deputado, depois das múltiplas explicações que
foram dadas neste Parlamento, acho que é tão evidente a necessidade absoluta de reestruturação que essas
empresas tinham que podemos gastar o tempo do nosso debate a explicar outras matérias.
No que diz respeito a uma questão concreta que o Sr. Deputado José Luís Ferreira me colocou e à qual
ainda não respondi, a do imposto sobre transações financeiras, importa, de facto, esclarecer.
Quanto à chamada «borla fiscal» ao Novo Banco, Sr. Deputado, já respondi a isso, até à exaustão. Até já
tivemos uma comissão de inquérito ao processo de resolução do Banco Espírito Santo.
Protestos do PCP e de Os Verdes.
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Sei que a repetição tem os seus méritos, mas, no interesse do tempo, peço ao Sr. Deputado para fazer o
favor de rever as múltiplas vezes em que o expliquei.
Protestos do PCP e de Os Verdes.
Mas, de facto, o imposto sobre transações financeiras é uma questão que importa esclarecer.
Portugal faz parte dos 11 países da área do euro que estão a pôr em prática aquilo a que se chama
«modelo de cooperação intergovernamental» e que permitirá a criação do imposto sobre transações
financeiras nestes 11 países. No âmbito do ECOFIN e do Eurogrupo, tenho participado em reuniões destes 11
países para discutir esta matéria. Inclusivamente, quem está hoje à frente da discussão técnica deste ponto é
um técnico português da REPER que está a colaborar diretamente com a Comissão Europeia para poder levar
este processo por diante.
Portanto, Sr. Deputado, o imposto sobre transações financeiras será posto em prática quando houver
acordo entre estes 11 países, porque é esse o compromisso que temos estabelecido.
Quanto à questão das offshore, aguardo, com ansiedade, para ver, num futuro programa do Governo de
um futuro e hipotético Governo de esquerda, o que é que lá efetivamente aparece.
Ao Sr. Deputado Paulino Ascenção, que questionou sobre o hospital da Madeira, direi que está, de facto,
previsto investimento na próxima legislatura e isso consta do Programa do Governo.
Mas, Sr. Deputado, só para esclarecer, relativamente a essa repetida acusação de que apenas nos
preocupamos com a dívida e com os mercados e não nos preocupamos com a vida das pessoas, é preciso
não perceber que são as pessoas que pagam os desmandos de quem não tem cuidado, de quem não tem a
responsabilidade de assegurar o financiamento.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
E todas as pessoas em Portugal sabem-mo bem demais, Sr. Deputado.
Por último, Sr.ª Deputada Cecília Meireles, relativamente aos riscos de um desvio deste caminho de
expansão, direi o seguinte: neste momento, o que temos é uma situação consolidada. Temos, neste momento,
a esta data, uma margem financeira, uma reserva financeira — um cofre cheio, para que saibam do que eu
estou a falar! — com quase 7800 milhões de euros, que nos permitem fazer face aos reembolsos do próximo
ano, de dívida que foi contraída muito antes de cá chegarmos. Isso, de facto, dá uma grande tranquilidade aos
portugueses.
O desvio desta rota, quando estas margens não acontecerem, teria um preço muitíssimo mais elevado —
aliás, já o pagámos no passado e sabemos muito bem como é.
Quanto à questão da recuperação de rendimentos, fica-me apenas uma dúvida que, eventualmente, o
Partido Socialista poderá esclarecer: se é possível repor os salários da Administração Pública conseguindo até
melhor resultado no défice, por que é que o PS não começou por o prometer? Por que razão é que, se era
possível, não o fizeram logo de início? E somos nós que temos problemas ideológicos, Srs. Deputados?
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
O Sr. Presidente (José de Matos Correia): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Mário
Centeno.
O Sr. Mário Centeno (PS): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Sr.as
e Srs. Deputados: Depois do que
observámos nos últimos quatro anos, a forma mais simples para definir a visão da economia apresentada no
Programa do Governo é a do cinismo em forma de vazio.
O Programa do Governo é uma mão cheia de nada e outra de coisa nenhuma. Não há compromissos, por
exemplo, acerca do salário mínimo; é vago no que se diz acerca da Europa; tem poucos números e os poucos
que tem não estão certos.
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A dívida pública, no final de 2015, estará em 125% do PIB, Sr.ª Ministra das Finanças? Já vendeu o Novo
Banco? Ou terá o Dr. Sérgio Monteiro, com a sua remuneração milionária — mais uma saída limpa —, vendido
o Banco na semana passada sem que de tal nos tenhamos dado conta?
Aplausos do PS e do BE.
Sr. Primeiro-Ministro, falta a troica ao seu Governo. Durante quatro anos, com a desculpa da troica,
instrumentalizaram as instituições da República, viveram na ditadura do «não há alternativa». A direita
portuguesa sempre confundiu a fiscalização democrática com forças de bloqueio. Pretende «suspender a
democracia».
Recorro a uma brilhante frase de Mia Couto para o Governo de que agora nos despedimos: «A diferença
entre a recessão e a expansão é que na recessão os pobres são os primeiros a perder; na expansão os
pobres são os primeiros a não ganhar».
Aplausos do PS.
Por isso temos hoje um País mais pequeno. Somos menos. Desde 2011 emigraram 350 000 portugueses.
No terceiro trimestre de 2015, perdemos mais 55 000 portugueses trabalhadores.
Voltei a ouvir a voz de Adriano Correia de Oliveira: «Este parte, aquele parte, e todos, todos se vão». Hoje,
temos um País mais pobre.
Protestos do Deputado do PSD Carlos Abreu Amorim.
Quase 1 milhão de portugueses recebem o salário mínimo, um salário mínimo degradado. Mas os outros
portugueses com trabalho também viram os seus rendimentos cair, uma realidade que este Governo tentou
esconder para justificar o corte no salário mínimo. Sim, porque num ato de propaganda «vendeu» ao FMI um
gráfico de onde eliminava os portugueses cujo salário tinha sido cortado em mais de 5%. Meus Senhores,
mais de 25% de todos os trabalhadores foram eliminados desse gráfico. Não é assim que se faz política na
Europa.
Aplausos do PS.
Sr. Primeiro-Ministro, ontem queixou-se de que a austeridade lhe tinha sido imposta, mas a austeridade,
quando é ideologia, é uma escolha, um destino para si.
Foi, ou não, o Sr. Primeiro-Ministro que se lamentou recentemente por apenas ter falhado na redução dos
custos salariais? Isto é austeridade ou é redenção?
Aplausos do PS.
Mas a vontade destruidora não se ficou pelo mercado de trabalho. Os milhares de pequenas empresas que
fecharam nos últimos quatro anos são disso testemunho. Lamento dizer-lhe, Sr. Primeiro-Ministro, mas estas
empresas não tiveram uma saída limpa. Foram empresas para quem o seu liberalismo significou aumentos de
impostos e das rendas energéticas, fechando-lhes o mercado nacional apenas por uma crença de que o
pecado morava aqui.
Por isso é que entre 2013 e 2015 as importações de bens de consumo cresceram 30% — as importações
— e a produção interna destes bens dirigida ao mercado nacional caiu — caiu, ouviram bem — 5,3%. Hoje, as
importações estão em máximos históricos, mas a economia é mais pequena.
Os tiques de autoritarismo que revelou ao longo destes últimos anos não os perdeu no dia 4 de outubro.
Apenas, porque foi a isso obrigado, encenou uma farsa a que gosta de chamar «negociação».
É falso, repito, é falso que o Partido Socialista não se tenha disposto a saber mais acerca das vossas
intenções programáticas. Confrontados com 58 perguntas, não responderam a nenhuma.
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Aplausos do PS.
E continuamos sem encontrar respostas no documento a que chamam «Programa de Governo».
Os senhores deixaram o sistema financeiro inoperante, os bancos descapitalizados e incapazes de apoiar
o investimento, o incumprimento bancário das famílias e empresas nos níveis mais altos de toda a história da
democracia portuguesa.
Aplausos do PS.
Protestos do PSD.
Menos de um mês depois do maior embuste político e económico montado em Portugal com a saída limpa,
em maio de 2014, caía com enorme estrondo o segundo maior banco privado português. Em nenhum outro
sistema financeiro de um país europeu se viu tamanha irresponsabilidade, mas o Sr. Primeiro-Ministro e a Sr.ª
Ministra das Finanças não tiveram nada a ver com isto.
Protestos do PSD e do CDS-PP.
Afinal, era apenas o Governo, e estava a prazo. Estavam mesmo, Meus Senhores. A maioria nesta
Assembleia não é vossa.
Aplausos do PS.
Srs. Deputados, a ideia de Europa que trazemos connosco é a de uma Europa solidária, em que os países
não se segmentam pelo rendimento, mas interagem por um ideal comum de prosperidade e direitos cívicos.
Portugal regrediu nos indicadores de pobreza, de exclusão social, de precariedade laboral, de emprego mal
remunerado, de educação. Portugal perdeu Europa nos últimos quatro anos.
O Programa do Governo que hoje despedimos com justa causa não resolve estes problemas.
Aplausos do PS.
O Partido Socialista considera que a economia só pode crescer num contexto de responsabilidade
financeira e no cumprimento das suas obrigações. O Partido Socialista assume as suas responsabilidades
europeias e honrará todos os compromissos do País.
Portugal precisa de outra política.
Portugal terá outra política.
Aplausos do PS, de pé.
Entretanto, reassumiu a presidência o Presidente, Ferro Rodrigues.
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado Mário Centeno, aproveito para o cumprimentar pela sua primeira
intervenção neste Plenário e informar que não tem pedidos de esclarecimento.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado André Silva.
O Sr. André Silva (PAN): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Srs.
Deputados e Sr.as
Deputadas e demais presentes na Sala: Da leitura que fiz do Programa do Governo,
gostava de abordar um aspeto que se prende com a proteção de menores e sobre uma certa violência que é
exercida sobre crianças, ou seja, a violência que é praticada na tauromaquia.
A classificação etária de espetáculos é meramente indicativa, pelo que não garante a proteção efetiva das
crianças e o cumprimento da Declaração dos Direitos da Criança.
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Além disso, têm acesso às bancadas das praças de touros crianças de todas as idades, incluindo menores
de três anos, em clara violação com o disposto no artigo 26.º do Decreto-Lei n.º 23/2014, de 14 de fevereiro,
que assistem a inúmeros episódios de grande violência não só com animais, cavalos e touros, mas também
com os artistas.
O regime de acesso e de exercício da atividade de artista tauromáquico e de auxiliar de espetáculo
tauromáquico, que estabelece o limite mínimo de 16 anos para tourear, abre uma exceção para a atuação de
forcados e amadores de todas as modalidades, permitindo a participação de menores de idade, mediante uma
autorização da Comissão Nacional de Proteção de Crianças e Jovens em Risco.
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, já ultrapassou o tempo que lhe estava atribuído.
O Sr. André Silva (PAN): — Termino, Sr. Presidente, dizendo que a exceção foi criticada pela própria
Amnistia Internacional, através do Cogrupo sobre os Direitos das Crianças, que considerou que este diploma
viola a Convenção sobre os Direitos das Crianças.
Aplausos de Deputados do PS.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Vice-Primeiro-Ministro.
O Sr. Vice-Primeiro-Ministro (Paulo Portas): — Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: Cumprimento o Sr.
Presidente, os membros da Mesa e todos os parlamentares que iniciam funções nesta Legislatura, uma
Legislatura, já todos o percebemos, absolutamente invulgar.
Comecemos exatamente por aí.
No espaço de um mês, que é quase nada no tempo histórico, foram decapitadas e reduzidas a pó todas as
convenções que permitiram, ao longo de 40 anos, um código de vida em comum nesta Câmara, um acervo de
regras de tolerância mútua e cordialidade democrática entre todos e para todos a benefício das instituições e
da sua fidelidade ao povo,…
A Sr.ª Conceição Bessa Ruão (PSD): — Muito bem!
O Sr. Vice-Primeiro-Ministro: — … um conjunto de convenções simples, mas sábias, escritas ou
praticadas, mas nunca antes ignoradas ou subvertidas que permitiram ao longo dos tempos ao regime
funcionar, aos governos governar, às oposições fiscalizar, cada qual na decorrência linear da vontade popular,
que é o primeiro fundamento para todos aqui estarmos.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Dir-se-á — e um conservador não tem dificuldade em admitir isso — que as tradições evoluem e que as
sociedades mudam. Nada mais certo. Mas, como provam as melhores democracias do mundo — e um
progressista não devia ter dificuldade em reconhecer isso —, as regras das instituições devem ser estáveis e
devem ser perenes. Uma convenção não é uma mera tradição que o tempo pode transformar em objeto de
museu ou curiosidade exótica. As convenções são o vade mecum das instituições, garantem que cada um tem
a sua função e que nenhuma é exercida em contramão do povo, que é o soberano.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
A todas e a todos se aplicam tanto na vitória como na derrota e nelas todos se comprometem tanto em
maioria como em minoria.
Há um mês o povo votou. Um mês depois, o funcionamento das nossas instituições tornou-se
irreconhecível. Quebraram-se, pelo menos, cinco convenções que nada tinham de superficiais ou acessórias.
Em primeiro lugar, a convenção de que quem ganha as eleições governará o País.
Em segundo lugar, a convenção de que quem tem mais Deputados preside à Câmara.
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Em terceiro lugar, a convenção de que um Governo saído de eleições tem o benefício da dúvida e vê o seu
programa não rejeitado.
Em quarto lugar, a convenção de que o nosso regime é semipresidencial de jure, não é meramente
parlamentar de facto.
O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Muito bem!
O Sr. Vice-Primeiro-Ministro: — Em quinto lugar, a convenção de que um país do euro não coloca o
epicentro da governabilidade na dependência de partidos ou coligações que legitimamente não acreditam no
euro ou que querem sair do euro na primeira esquina.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Quebrar tudo isto pode satisfazer os que acham que estão a experimentar o seu peculiar 1917 ou a viver o
que julgam ser o seu privativo assalto ao Palácio de Inverno.
Risos do PS.
Com todo o respeito, a esmagadora maioria dos portugueses não votou em nenhuma dessas aventuras no
dia 4 de outubro.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Recorrendo ao direito à indignação, é preciso dizer que esta instrumentalização das instituições para servir
objetivos de curtíssimo prazo e com natureza de fação é matematicamente possível, até pode ser formalmente
constitucional, mas é, seguramente, politicamente ilegítima.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Essa ilegitimidade consiste em impedir que governe a maioria relativa que venceu as eleições para forçar
um Governo da minoria relativa que perdeu as eleições.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
O povo não se reconhece nesta fratura,…
O Sr. João Oliveira (PCP): — Como é que sabe?
O Sr. Vice-Primeiro-Ministro: — … muitos democratas com opções de voto diferentes estão horrorizados
ou simplesmente angustiados com as consequências. Os que sabem alguma coisa de História percebem que
o eixo da roda do regime mudou, deixando de estar levemente à esquerda do centro ou levemente à direita do
centro para aterrar vertiginosamente à esquerda da esquerda e claramente na periferia ou até em oposição às
opções internacionais fundamentais que caracterizam o Portugal livre, democrático e europeu.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Adelino Amaro da Costa dizia, e bem, que os moderados se servem da mudança para evitar a rutura. O
caminho escolhido pelo Secretário-Geral do Partido Socialista foi exatamente o oposto: não aceitou a derrota;
não tirou da derrota qualquer consequência; não negociou de boa-fé com quem, por acaso, até venceu as
eleições;…
O Sr. Carlos César (PS): — Não é verdade!
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O Sr. Vice-Primeiro-Ministro: — … dissipou a possibilidade de marcar, com as suas ideias ou propostas,
uma maioria de compromisso; preferiu pôr o País insolitamente à espera do comité central do PCP, agora, e,
se calhar, nos tempos que aí vêm!
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Só o PCP?!
O Sr. Vice-Primeiro-Ministro: — Desperdiçou a oportunidade de dar aos portugueses o sossego e a
esperança de pôr o Governo, esse, sim, legítimo, na dependência razoável do que para os socialistas fosse,
em cada momento, aceitável. E, curiosamente, neste debate, que serviu como primeiro debate daquilo que
tem designado como «novo paradigma», o Secretário-Geral do Partido Socialista não deu o corpo ao
manifesto, revelando até onde a ferida da ilegitimidade o assusta e até onde o retrai a perceção de que a
vontade real do povo foi defraudada pela vontade declarada dos diretórios.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Do que não há memória, ninguém conhece o fim. Mas recomenda a prudência e até o facto de ser o líder
partidário há mais tempo em funções que vos deixe algum pressentimento do que este experimentalismo
encerra. Quebrar todas as convenções sem propor outras que, prestável e legivelmente, as substituam é uma
imprudência, mas abre um precedente. Não consigo acreditar ainda naqueles que acusam o Secretário-Geral
do Partido Socialista de ter sido subitamente acometido por uma espécie de «síndrome de Gusmão»: antes
primeiro-ministro por uns tempos, do que líder da oposição para toda a vida!
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Mas, se isso for verdade, então um dia acabará por suceder-lhe manobra igual ou semelhante e de tão alto
cairá como a tão alto se quis guindar sem que para tal o povo o elevasse.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
E é até possível que isso suceda pela mão dos que o ajudaram, perante a impassível coerência dos que
agora estão a submeter-se a escrutínio porque ganharam as eleições. Podem os senhores concordar ou
discordar, mas sejam, ao menos, consequentes. O Secretário-Geral do Partido Socialista escolheu o caminho,
repito, do que é matematicamente possível, do que é formalmente constitucional, mas do que é politicamente
ilegítimo. Escolheu, também, os seus companheiros de viagem. Se esse caminho prevalecer, conte apenas
com a nossa coerência.
O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Muito bem!
O Sr. Vice-Primeiro-Ministro: — E, se mais à frente, se vir aflito, se mais adiante não conseguir gerir a
pressão explosiva — podem crer que será explosiva — da demagogia em competição entre o BE e o PCP, de
um lado, e do realismo e dos compromissos em Bruxelas, do outro, não venha, depois, pedir socorro.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Para nós, com respeito pessoal, mas com frontalidade política, será, se o conseguir ser, um primeiro-
ministro politicamente ilegítimo e é tamanha a irresponsabilidade do que está a fazer que terá de resolver os
seus problemas com a frente dos perdedores.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
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Nós já fomos os bombeiros do vosso resgate, duas vezes.
Vozes do PSD e do CDS-PP: — Uma grande verdade!
O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — É verdade!
O Sr. Vice-Primeiro-Ministro: — A vossa conduta assemelha-se à dos pirómanos do regime. Não
seremos cúmplices dessa consequência!
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
A vós pode bastar — e parece que basta — o conchavo dos diretórios. Por nós, basta a legitimidade que o
povo nos deu.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados, para além da questão da legitimidade, há outras duas que merecem
uma anotação breve: a da estabilidade e a da confiança.
Da estabilidade — nós, que ganhámos as eleições mas que não dispomos de maioria absoluta,
procurámos a estabilidade dentro da coerência dos fundamentais, com cedências, com transigências, com
compromissos, com abertura e, sobretudo, com disposição positiva de compromisso.
Pedirei emprestada a Vasco Pulido Valente a definição da vossa manobra: não é bem um governo, é uma
geringonça!
Risos do PSD e do CDS-PP.
Não é uma coligação — isso já se viu! —, tão-pouco será um acordo, porque haverá vários. Supõe-se que,
para haver vários, é porque nenhum será exatamente igual; se nenhum for exatamente igual, é porque as
partes não se comprometem da mesma forma. É tal a dificuldade em conciliar o inconciliável que até nas
moções de rejeição tiveram dificuldade em fazer uma só.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
E todos percebemos que nos modos parlamentares vos custa muito aplaudirem-se uns aos outros,…
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
… embora dizendo isto estou, certamente, a favorecer que o Dr. António Costa, quando já não houver
ocasião para lhe fazer perguntas, mereça uma salva de palmas.
Risos do PSD e do CDS-PP.
Será muito curioso verificar o que diz a tal posição comum entre o PS e o PCP. Contém uma obrigação de
viabilização dos orçamentos, dos programas de estabilidade ou das regras do tratado orçamental? Logo
saberemos, porque é aí que está o cerne da estabilidade.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Está mortinho por saber!
O Sr. Vice-Primeiro-Ministro: — Obrigação de procurar apoio previamente teria qualquer governo sem
maioria absoluta, mas uma obrigação de resultados e de viabilização é o que se esperaria de uma maioria que
não fosse meramente negativa, porque só isso contém os elementos suficientes de estabilidade e de
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consistência. Se houvesse tal, o PCP teria deixado de ser quem é, embora para tal o PS parecesse disponível
a deixar de ser tudo o que foi.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Porém, se ainda tardam em mostrar o acordo político, é porque alguma fragilidade terá. Temo que a
geringonça deixe Portugal, a sua credibilidade, a sua economia, a sorte dos nossos compatriotas, à mercê das
reuniões semestrais do comité central na Soeiro Pereira Gomes,…
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
… inteiramente respeitável, mas que estranha ironia no século XXI!
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Da confiança — o anterior Governo foi o da superação do resgate e do fim da troica. Com o extraordinário
esforço dos portugueses e a inestimável ajuda, nunca suficientemente agradecida, ao País e aos portugueses,
dos parceiros sociais e dos parceiros da economia social.
O Governo, cujo Programa vai hoje a votos, é o da recuperação gradual de rendimentos, gradual para ser
viável; é o da moderação progressiva dos impostos, progressiva para ser possível; é o da aposta no
investimento e nas exportações, como vanguarda de uma economia saudável, sem desprezar, como os
números já indicam, a parcela do consumo. Em alternativa, o que a vossa geringonça nos oferece é uma
espécie de bebedeira de medidas, tudo a correr e, de preferência, ao mesmo tempo. Ora, como todos
sabemos, as bebedeiras têm um só problema, chama-se ressaca.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
O Sr. Jorge Duarte Costa (BE): — A vossa ressaca!
O Sr. Vice-Primeiro-Ministro: — O que têm para apresentar é exclusivamente orientado para o consumo.
Ora, essa é uma ilusão de curto prazo, que não chega para fazer de Portugal um País próspero.
O que o vosso projeto não contabiliza é o poderoso impacto que a desconfiança pode ter no crescimento a
prazo, no investimento mais depressa, e, portanto, na criação de emprego, que é o primeiro desiderato de
todos.
Em globalização, a confiança evapora-se, porque há outros países preparados para receber a confiança
que nós perdermos. Em globalização, o investimento e, portanto, o emprego deslocalizam-se num instante,
porque há outros países preparados para receber o investimento e o emprego que nós perdermos.
Acresce que, na retórica que nos trazem, haverá uma Europa nova à espera de uma nova política. E eu,
que vejo a Europa «engripada» na crise dos refugiados, ameaçada pelo fenómeno do terrorismo, em risco
pelo referendo no Reino Unido, duramente testada pelo que sucedeu na Grécia, apenas para citar a agenda
previsível, lamento dizer-vos, mas não vejo muito espaço para compreender um Portugal que seja reincidente
nos défices excessivos e no descontrolo da dívida pública.
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Muito bem!
O Sr. Vice-Primeiro-Ministro: — Pode ser que me engane e desejo estar equivocado, mas vejo na vossa
retórica mais a ilusão do primeiro SYRIZA do que o choque de realidade do segundo SYRIZA.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Estou absolutamente preocupado com o dano de credibilidade que tudo isto pode fazer ao nosso País e ao
nosso povo.
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Protestos do PS.
Ontem, ao ler um título internacional, cito, «Portugal, a nova Grécia?», arrepiei-me.
Protestos do PCP.
Sr.as
e Srs. Deputados do PSD, do PS, do CDS e do PAN, estávamos, estamos, muito perto de conseguir.
Deitar tudo a perder é deitar fora os sacrifícios que tantos portugueses fizeram. Hoje, tendes a oportunidade
de viabilizar um governo que é politicamente legítimo. Aguardamos, serenamente, a vossa decisão. E porquê?
Porque, a nós, o eleitorado já julgou; a alguns de vós, a História julgará.
Aplausos, de pé, do PSD e do CDS-PP.
O Sr. Presidente: — O Sr. Vice-Primeiro-Ministro tem duas inscrições para pedir esclarecimentos, que
serão respondidos em conjunto.
Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Leite Ramos.
O Sr. Luís Leite Ramos (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Vice-Primeiro-Ministro, Portugal, e lembrou-o há
pouco, percorreu nos últimos quatro anos um caminho difícil, exigente, mas de esperança. Deixou para trás a
pré-bancarrota socialista, a troica e um programa draconiano de assistência financeira, sem programa
cautelar, sem segundo resgate, sem espiral recessiva e reencontrou o caminho da retoma económica, da
estabilidade política e da confiança internacional que permitiu devolver aos portugueses a esperança no futuro.
Os sinais inequívocos de recuperação económica multiplicam-se. A economia voltou a crescer e a ter no
seu horizonte ainda melhores perspetivas de crescimento.
As exportações das empresas portuguesas batem recordes; o desemprego caiu para taxas inferiores às de
2011; os índices de confiança dos consumidores, dos empresários e dos investidores aumentaram, estando
hoje em níveis que o País se desabituara durante mais de uma década. Mas, apesar dos enormes progressos
registados, Portugal continua a ter diante de si desafios muito complexos e perante os quais não pode haver
nem adiamentos, nem retrocessos. Se não queremos desbaratar os sacrifícios dos portugueses e arriscar tudo
o que o País conseguiu nos últimos quatro anos, temos de enfrentar e vencer esses desafios. E há um desafio
em particular que merece especial atenção, aliás, como o Sr. Vice-Primeiro-Ministro fez questão de o sublinhar
na sua intervenção, que é o da credibilidade e da confiança de Portugal perante os seus parceiros
internacionais, perante os mercados e os investidores, perante os seus credores e financiadores.
V. Ex.ª conhece bem o valor incomensurável desta credibilidade e desta confiança internacional, porque
sabe quão difícil foi recuperá-la e sabe, também, quão fácil é perdê-la. Por isso, pergunto-lhe o que fará o
Governo para preservar, consolidar e valorizar esta credibilidade e confiança, ou, melhor, o que não pode,
nem deve, fazer para não destruir e lançar de novo o País nas mãos de uma qualquer troica e pedir, de novo,
um novo resgate.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos César.
O Sr. Carlos César (PS): — Sr. Presidente, Sr. Vice-Primeiro-Ministro Paulo Portas, os portugueses já
estão habituados aos seus exercícios lúdicos à volta dos temas políticos e das soluções de governo, mas
perguntar-se-ão hoje, nas suas casas, ao ouvi-lo, se V. Ex.ª terá ou não um défice de perceção política sobre
o que realmente se passou nas últimas eleições.
Risos do PSD e do CDS-PP.
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É que, Sr. Vice-Primeiro-Ministro, nós, socialistas, sabemos o que valemos, sabemos quantos somos. V.
Ex.ª, como líder do PP, sabe apenas que o seu partido é uma presunção, mas não sabe se é uma realidade.
Aplausos do PS.
Protestos do PSD e do CDS-PP.
Os portugueses interrogam-se, também, sobre aquilo que aludiu como «pressão explosiva do PCP, do
Bloco de Esquerda e de Os Verdes», e os portugueses, em casa, pensarão: mas este nosso Vice-Primeiro-
Ministro não terá também um défice de memória?! Pressão explosiva maior não foi aquela que V. Ex.ª
desenvolveu na Legislatura que agora terminou?!
Vozes do PS: — Muito bem!
O Sr. Carlos César (PS): — Perigo maior não foi para os investidores e para os mercados aquilo que o
senhor então fez?! É que a espera pela decisão do Comité Central do PCP provocou menos prejuízos nesses
sectores do que a perturbação que o senhor introduziu quando estava no Governo.
Aplausos do PS, do BE e do PCP.
E, por fim, Sr. Vice-Primeiro-Ministro, os portugueses, nas suas casas, pensaram assim: mas como pode
ele dizer, se o governo de Portugal estiver em dificuldades, «não venham cá pedir socorro»?!
Risos do PSD.
É como quem diz: ou estamos no governo, ou vai tudo abaixo! Prometemos ressaca!
Aplausos do PS.
Protestos do PSD e do CDS-PP.
É esse o seu último défice, o seu défice é a falta de sentido do interesse nacional.
Aplausos do PS.
Protestos do PSD e do CDS-PP, tendo alguns Deputados batido com as mãos nas bancadas.
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, a conjugação de apartes faz com que não se consiga perceber
nenhum deles.
O Sr. Luís Montenegro (PSD): — É uma anedota!
O Sr. Presidente: — Também para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Filipe Lobo
d’Ávila.
O Sr. Filipe Lobo d’Ávila (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Vice-Primeiro-Ministro, é verdade que este
debate vai longo e, até aqui, faz lembrar-me uma outra história, a história do sapo e do escorpião.
Nessa outra história — mais lúdica, é verdade, Sr. Deputado Carlos César —, pede o escorpião ao sapo
que o leve até à outra margem do rio. Responde o sapo, dizendo que não, que não o levaria até à outra
margem, com receio de levar uma picada mortal. Fazendo mil juras de que não o picaria, o escorpião acaba
por convencer o sapo, picando-o, mesmo ao chegar à outra margem. E perante o porquê, em sofrimento, do
sapo, responde o escorpião: está na minha natureza.
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Risos.
Sr. Vice-Primeiro-Ministro, neste debate já percebemos que o PS faz de sapo.
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
Só falta saber…
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Quem é o escorpião!
O Sr. Filipe Lobo d’Ávila (CDS-PP): — … quem será o escorpião, se o Bloco de Esquerda, se o PCP, se
até o próprio Partido Socialista, ou mesmo os três ao mesmo tempo.
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
Sr. Vice-Primeiro-Ministro, com o esforço dos portugueses, Portugal atravessou já para a outra margem.
Portugal cresce economicamente mais do que a zona euro, a confiança dos consumidores subiu a níveis do
princípio do século e o desemprego desce, de forma lenta e consistente.
O Sr. João Oliveira (PCP): — O desemprego desce de forma lenta e consistente?!
O Sr. Filipe Lobo d’Ávila (CDS-PP): — A pergunta que eu gostaria de fazer, Sr. Vice-Primeiro-Ministro, é
curta e clara.
No passado fim de semana ouvimos o Sr. Deputado António Costa fazer acusações ao CDS, dizendo que
o CDS tinha mudado de posição sobre a Europa em 24 horas para poder entrar naquele que seria o governo
do Primeiro-Ministro Durão Barroso. Mas disse mais, disse, também, que o acordo das esquerdas, este
aparente acordo das esquerdas, teria a mesma legitimidade que o acordo pós-eleitoral de 2011.
Sr. Vice-Primeiro-Ministro, eu gostaria que comentasse,…
O Sr. João Oliveira (PCP): — Que comentasse?!
O Sr. Filipe Lobo d’Ávila (CDS-PP): — … esclarecendo aqueles que, como é demais evidente, falam, de
facto, sem conhecerem o que é o CDS.
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Vice-Primeiro-Ministro.
O Sr. Vice-Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Luís Ramos, a função deste Governo é
preservar a confiança que foi conquistada. Essa confiança considera hoje Portugal um país de referência do
ponto de vista da superação de um resgate e de uma crise financeira e económica — crise associada a esse
resgate e, evidentemente, consequência dele —, como aquela que nós vivemos.
A confiança manifesta-se nos indicadores que são conhecidos. Os melhores indicadores de confiança,
desde 2001, é o dos consumidores, não é preciso nenhum choque de consumo. Os melhores indicadores de
confiança nos empreendedores, desde 2008, revela-se no crescimento do investimento, que é, porventura, o
indicador mais crítico para a economia portuguesa, e na transformação que sofreram, de uma forma virtuosa,
as nossas empresas que se viraram para o exterior quando detetaram demasiada recessão ou estagnação
nos mercados tradicionais, o interno e alguns europeus.
Hoje, as exportações representam 43,5% do PIB a preços constantes; há uns anos, representavam 28%.
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Tudo isto é mais fácil pela confiança e tudo isto fica em risco com a desconfiança. Apenas quero dizer, em
nome daquilo em que acredito, que um governo que fique dependente dos estados de alma do Partido
Comunista Português não inspira confiança à economia, ao investimento e à criação de emprego.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Protestos do Deputado do PCP João Oliveira.
Ao Sr. Deputado Carlos César quero começar por corrigi-lo levemente, saudando, naturalmente, a sua
eleição para essa função.
Diz o Sr. Deputado: «Nós, os socialistas, sabemos quantos somos, o senhor, o que sabe é que o seu
partido é uma presunção». Bem, contados os votos no dia 4 de outubro, nós, coligação, somos 38,5%;…
O Sr. Carlos César (PS): — Com o CDS-PP!
O Sr. Vice-Primeiro-Ministro: — … VV. Ex.as
, Partido Socialista, são 32%. Ou seja, nós ganhámos e não
foi por poucochinho. VV. Ex.as
perderam e não foi por poucochinho.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
O Sr. Pedro Nuno Santos (PS): — Havia de ter ido a votos!
O Sr. Carlos César (PS): — Isso é com o CDS!
O Sr. Vice-Primeiro-Ministro: — Mas se querem comparar os blocos políticos, então, tenham a humildade
de avisar o povo…
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Sr. Vice-Primeiro-Ministro: — … e, da próxima vez, candidatemo-nos, nós, em coligação e, vocês, em
frente esquerda e vamos ver quem ganha! Vamos ver quem ganha!
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Já agora, Sr. Dr. Carlos César, Sr. Presidente do Grupo Parlamentar, quero dizer-lhe o seguinte: sim, esta
coligação teve problemas difíceis, como tem qualquer coligação, e os senhores já fizeram várias. Sim, nós
superámos os problemas difíceis que tivemos. Sim, esta coligação foi a primeira a terminar o seu mandato e a
candidatar-se, enquanto tal, ao mandato seguinte. Sim, esta coligação orgulha-se de ter recebido o voto
maioritário do povo português, frase que os senhores não podem dizer.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Por fim, permita-me uma levíssima correção. Diz o senhor «ou somos nós a governar, ou vai tudo abaixo».
Eu peço muita desculpa, mas a atitude do Partido Socialista, que faz lembrar aqueles meninos que só jogam
futebol se a bola for deles, é esta: nós perdemos, mas ou somos nós a governar ou não governa quem o povo
quis escolher!
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Ao Sr. Deputado Filipe Lobo d’Ávila quero apenas agradecer a oportunidade de clarificar, porque achei
estranho. Eu conheço o Secretário-Geral do Partido Socialista há muito tempo e achei estranho que ele
utilizasse argumentos que não têm sustentabilidade nos factos.
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Sim, o CDS defendeu um referendo ao Tratado de Maastricht e, a meu ver, logicamente, porque foi o
Tratado que mudou a natureza da construção europeia.
Protestos do BE e do PCP.
Sim, o CDS teve posições eurocéticas.
Não, e é radicalmente falso que tenha mudado de opinião ou tenha evoluído na sua posição para poder
obter, como o senhor disse, lugares no Governo de Durão Barroso.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. Vice-Primeiro-Ministro: — Porquê, Sr. Deputado? Porque a revisão da posição do CDS nessa
matéria foi feita em 1998. Eu candidatei-me a líder do CDS para recentrar a posição do Partido na Europa,
para aceitar a moeda única antes de ela começar. Houve congressos, houve moções, houve votações, houve
vencidos e vencedores, houve até dissidências. É o que acontece num partido democrático.
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Claro!
O Sr. Vice-Primeiro-Ministro: — A frase que sai do congresso, quatro anos antes e duas eleições antes
do Governo de Durão Barroso, é esta: «O CDS respeitará a moeda única e não proporá a saída de Portugal
da moeda única»!
O senhor, nas negociações que anda a fazer, não consegue o mesmo — agora, sim, em 24 horas! — nem
do Partido Comunista Português, nem do Bloco de Esquerda.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Escusava de ter feito uma elipse na argumentação, porque não lhe fica bem — pura e simplesmente, quem
consulte os documentos, sabe que não foi assim.
Mas, em qualquer caso, para terminar, Sr. Deputado, há realmente, como já aqui tem sido sugerido, duas
pequenas — pequenas do ponto de vista daqueles que acham que ganharam as eleições, tendo, por acaso,
perdido — diferenças substanciais entre 2011 e 2015. Em 2011, quem formou governo foi o partido que
venceu as eleições. Em 2015, o que o Partido Socialista quer é que o governo seja formado por aqueles que
perderam as eleições.
Protestos do PS.
Não estou a dizer mais do que isto, que é inteiramente legível.
Mas, mais, é que, em 2011, por causa do resgate que vocês pediram, por causa da troica que vocês
chamaram, por causa do Memorando que vocês assinaram, tanto o PSD como o CDS disseram ao povo
português que estavam disponíveis para fazer uma coligação a seguir às eleições.
Diga-me um momento — exceto no tal Partido Livre, que não elegeu ninguém — em que os três líderes
dos três partidos da frente esquerda, ou da geringonça, tenham dito ao povo português previamente que iam
fazer uma coligação.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
São duas diferenças, e não são pequenas. Forma governo, como sempre aconteceu em 40 anos, quem
ganhou as eleições. E as coligações foram previamente admitidas pelos dois partidos que as podiam formar.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
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O Sr. Presidente: — Srs. Deputado, informo a Câmara que, de acordo com o Regimento, as moções de
rejeição teriam de ser entregues até ao final do debate, o que já sucedeu.
Foram entregues quatro moções de rejeição do Programa do XX Governo Constitucional, a saber: a moção
de rejeição n.º 1/XII (1.ª), apresentada pelo PS; a moção de rejeição n.º 2/XIII (1.ª), apresentada pelo BE; a
moção de rejeição n.º 3/XIII (1.ª), apresentada pelo PCP; e a moção de rejeição n.º 4/XIII (1.ª), apresentada
por Os Verdes, que, certamente, já foram todas distribuídas.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Ministro da Modernização Administrativa.
O Sr. Ministro da Modernização Administrativa (Rui Medeiros): — Sr. Presidente, Sr.as
e Srs.
Deputados: Antes de mais, gostaria, nesta ocasião em que me dirijo ao Parlamento pela primeira vez, de
cumprimentar, de forma sincera, os membros desta Assembleia da República e formular votos de bom
trabalho na Legislatura que agora se inicia.
Cabe-me apresentar as linhas gerais e orientadoras da estratégia do novo Governo para a área da
modernização administrativa. Estamos a falar de uma das prioridades políticas que consta do programa
eleitoral da coligação Portugal à Frente.
O programa, sufragado nas urnas no passado dia 4 de outubro, assume expressamente como um dos
desafios fundamentais para a nova Legislatura a promoção da eficiência da Administração, de forma a torná-la
mais próxima dos cidadãos e mais amiga das empresas.
Não se trata de um chavão político desprovido de conteúdo. A política de modernização administrativa
deve ser um instrumento focado e orientado para a resolução dos problemas concretos com que as pessoas e
as empresas se deparam diariamente na sua relação com a Administração. Justamente por isso, é uma
prioridade política.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Antes de prosseguir, porém, não posso deixar de sublinhar aqui, nesta Assembleia, que a preocupação
com a modernização administrativa tem sido uma constante, tanto dos governos do PSD e do CDS como dos
governos do Partido Socialista, fossem eles maioritários ou minoritários.
Foi essa continuidade, aliás, que permitiu que Portugal desse passos sólidos nesta área e garantisse uma
continuidade das políticas reformistas.
Estou a falar de factos, não de opiniões. Desde o velho Secretariado para a Modernização Administrativa,
criado em 1991, até ao mais recente programa Simplex, tudo prova esta linha de continuidade.
O mesmo se diga em relação ao último Governo. O anterior Executivo procedeu a uma profunda revisão do
Portal do Cidadão e do Balcão do Empreendedor, criou o Mapa do Cidadão e lançou o programa Aproximar,
garantindo hoje o funcionamento de mais de 325 Espaços do Cidadão espalhados pelo País. É importante
notar que muitas destas decisões tiveram o apoio expresso dos Deputados do Partido Socialista. Por isso, foi
sem surpresa que verificámos que nos programas eleitorais dos partidos que integram o arco europeu há uma
clara convergência no que diz respeito à preocupação com a modernização administrativa e com a Agenda
Digital para a Europa. O mesmo não se pode dizer dos programas eleitorais da CDU e do Bloco de Esquerda,
porque este tema da modernização administrativa passa largamente despercebido.
Seja como for, o que eu sei, o que este Governo sabe é que a modernização administrativa é um domínio
em que os portugueses, todos os portugueses sem exceção, querem e exigem o mesmo: uma Administração
eficiente, não burocrática e ao serviço das pessoas e das empresas.
É tempo, no entanto, de olhar para o futuro. Se é verdade que já muito foi feito, é também verdade que há
muito por fazer. É preciso alterar, e alterar muito, o modo como a nossa Administração funciona e se relaciona
com os cidadãos e os agentes económicos e sociais.
A criação, na orgânica deste Governo, de um ministro ou de uma pasta da modernização administrativa é
disso mesmo sintomático. Pela primeira vez, existe uma pasta que tem como principal tarefa definir e executar
uma política de modernização administrativa única e integrada, supra-sectorial e transversal a todas as áreas
da governação.
O motivo desta opção é óbvio: o estudo e a experiência acumulada revelam que não é possível uma efetiva
modernização dos serviços públicos com uma perspetiva meramente sectorial. Ninguém contesta e é
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amplamente reconhecido a nível internacional que temos hoje medidas de excelência em vários sectores,
mas, para modernizar plenamente a Administração, é necessário uma perspetiva transversal. Só assim, com
uma coordenação ao mais alto nível, será possível, de forma articulada e integrada, construir um melhor
Estado, isto é, construir um Estado mais eficiente e eficaz, capaz de fazer mais e melhor, com os mesmos
recursos.
É esta a aposta que apresentamos, hoje, à Assembleia da República: construir uma Administração, capaz
de fazer mais e melhor, com os mesmos recursos.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: Passemos ao País real. Em termos práticos, o que é que isto
significa? A resposta para nós é clara e assenta em três pilares estruturais. Queremos uma Administração
próxima, uma Administração simples e uma Administração digital.
Proximidade significa, além de uma Administração que leva a sério o princípio da descentralização, uma
Administração que chega a todos e que não deixa ninguém para trás. Ou seja, um Estado próximo dos
cidadãos, próximo da população mais desprotegida e próximo dos agentes económicos e sociais.
A proximidade passa por apostar em lojas do cidadão efetivas em cada município de Portugal. A
proximidade requer inclusão social, requer uma Administração que seja capaz de chegar às zonas mais
afastadas e às pessoas que, mesmo nas grandes zonas urbanas, vivem em isolamento.
Mas proximidade significa também uma Administração próxima das empresas e dos empreendedores. É
preciso, para além do Balcão do Empreendedor e do Gestor do Contribuinte, criar a figura do Gestor do
Empreendedor, assegurando, em articulação com as associações empresariais, um atendimento
personalizado aos agentes económicos, garantindo que as boas ideias e os grandes projetos não se perdem
em procedimentos burocráticos infindáveis.
O Sr. António Leitão Amaro (PSD): — Muito bem!
O Sr. Ministro da Modernização Administrativa: — Mas não basta uma Administração próxima, é preciso
uma Administração simples. E uma Administração simples é uma Administração que confia, que confia nos
particulares e que confia na iniciativa privada.
Todos sabemos, por experiência própria, que não há nada mais complicado do que fazer coisas simples. É
preciso, desde logo, combater a tentação do excesso de leis e levar a sério o desafio da simplificação
legislativa e regulatória. Um tal objetivo, para não ser um mero jogo de palavras, impõe uma avaliação rigorosa
do impacto das leis projetadas e adotadas. Impõe também que se simplifiquem os procedimentos. Não faz
sentido que os serviços públicos exijam aos cidadãos ou às empresas documentos que já estão na sua posse.
É impensável que a mesma pessoa tenha de apresentar, várias vezes, em diferentes serviços, os documentos
que já apresentou uma vez.
Uma Administração simples, uma Administração que confia tem de mudar o paradigma e alargar o
Licenciamento Zero até onde for possível.
Mas a modernização administrativa é também digital. Em plena era da globalização tecnológica, a própria
Agenda Digital para a Europa exige uma Administração que aposte na inovação tecnológica e na digitalização.
O princípio digital tem de ser mais do que um PowerPoint sofisticado; o princípio digital tem de entrar nos
serviços públicos.
Mais, o digital postula e conduz à transparência. É preciso apostar na transparência, é preciso apostar
numa Administração responsável, em que cidadãos e agentes económicos e sociais saibam, a cada momento,
qual o grau de desempenho dos serviços públicos.
Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: É tempo de concluir. Quero deixar apenas duas notas finais. A
primeira para referir que a modernização administrativa só se faz com os funcionários públicos. Os
funcionários públicos são a pedra angular neste processo de reforma. Por isso, neste momento em que o
Governo apresenta o seu Programa na Assembleia, é importante que não haja quaisquer equívocos: este
Programa não só conta com os trabalhadores em funções públicas como aposta na sua capacitação e
valorização.
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Segunda e última nota: fizemos o que tínhamos de fazer nestes 10 dias. Temos uma visão estratégica para
a modernização administrativa em Portugal. Estamos certos de que este é o caminho. A palavra cabe agora
aos Srs. Deputados, cabe a todos e a cada um decidir em consciência se pretendem ajudar a concretizar esta
ambição ou se, pelo contrário, preferem uma rutura artificial numa área em que os partidos do arco europeu
sempre convergiram.
Aplausos do PSD do CDS-PP e de alguns Deputados do PS.
O Sr. Presidente: — Sr. Ministro, antes de mais aproveito para o cumprimentar pela sua primeira
intervenção neste Plenário, e informo que se inscreveram para pedir esclarecimentos os Srs. Deputados Berta
Cabral, do PSD, Paula Santos, do PCP, e Filipe Anacoreta Correia, do CDS-PP.
Como é que pretende responder, Sr. Ministro?
O Sr. Ministro da Modernização Administrativa: — Em bloco, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: — Sendo assim, tem a palavra a Sr.ª Deputada Berta Cabral.
A Sr.ª Berta Cabral (PSD): — Antes de mais, Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do
Governo e Sr.as
e Srs. Deputados, é a primeira vez que me encontro nesta Assembleia e, por isso, uma
saudação a todos e votos de bom trabalho.
Vivemos tempos singulares e invulgares. Tempos em que a verdade deu lugar à meia verdade, em que a
ética já não é o que era, em que a democracia passou a ser uma realidade de geometria variável onde se
transformam derrotas em vitórias, em nome de interesses inconfessáveis, passando por cima da vontade dos
eleitores. Tempos em que prevalece a razão da força e não a força da razão!
O Sr. Duarte Filipe Marques (PSD): — Muito bem!
A Sr.ª Berta Cabral (PSD): — Os portugueses votaram e disseram claramente que a coligação PSD/CDS-
PP deveria continuar a governar e que o Sr. Primeiro-Ministro Pedro Passos Coelho deveria continuar a liderar
o Governo de Portugal. Esta foi a sua vontade expressa nas urnas em eleições livres e democráticas, por mais
que outros queiram dizer o contrário.
O Sr. Duarte Filipe Marques (PSD): — Muito bem!
A Sr.ª Berta Cabral (PSD): — Foi o reconhecimento do mérito, da coragem e da determinação do Governo
que os portugueses reconheceram.
O PSD e o CDS-PP, ao longo dos últimos quatro anos, estiveram sempre à altura dos acontecimentos e,
sem lamúrias, assumiram o desígnio nacional de resgatar o País e de promover o equilíbrio das contas
públicas.
O Governo que agora inicia funções e que hoje tem o seu Programa em discussão promove a continuação
de uma política do Governo que cessou funções e que levou ao equilíbrio das contas públicas, que levou ao
crescimento económico, que levou à criação de emprego, que conduziu ao aumento das exportações e que
conduziu, natural e sequencialmente, à recuperação do rendimento dos portugueses e das suas famílias.
Os portugueses reconheceram o esforço feito, compreenderam o sentido das reformas e dos sacrifícios e
manifestaram, inequivocamente, que querem um Portugal moderno livre e democrático e que honre os seus
compromissos orçamentais europeus e internacionais.
Continuar as reformas já encetadas e promover a desburocratização e a descentralização com vista a
tornar a Administração mais próxima e amigável das pessoas e das empresas é, como diz o Sr. Ministro, uma
prioridade política deste Governo e deste Programa.
O Sr. Duarte Filipe Marques (PSD): — Muito bem!
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A Sr.ª Berta Cabral (PSD): — Reduzir os custos de contexto, promover a coesão social e territorial,
modernizar o tecido produtivo, promover a participação dos cidadãos na vida pública e política é essencial
para revigorar o tecido económico e social e fortalecer a democracia.
É uma tarefa iniciada, mas nunca acabada! Por isso, Sr. Ministro da Modernização Administrativa, desejo-
lhe os maiores sucessos nas suas funções.
Vozes do PSD: — Muito bem!
Protestos do PCP.
A Sr.ª Berta Cabral (PSD): — Por fim, quero deixar-lhe uma questão: gostaria que esclarecesse esta
Câmara sobre a relação que pretende estabelecer entre a área que tutela e a administração local, que também
está sob a sua orientação e tutela.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
O Sr. Presidente: — Sr.ª Deputada, estou habituado a vê-la aqui, no Hemiciclo, embora noutras funções,
pelo que não me lembrei de que esta era a sua primeira intervenção no Plenário como Deputada. Assim,
saúdo-a por esse facto, tal como fiz com todos os outros Srs. Deputados.
Tem a palavra a Sr.ª Deputada Paula Santos, para pedir esclarecimentos.
A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro Rui Medeiros, não deixa de ser curioso que,
depois deste longo período de debate, tenha sido preciso o Governo ficar somente com 10 minutos para o Sr.
Ministro vir falar um pouco sobre algumas propostas que apresenta no Programa do Governo.
O Sr. Ministro, na sua intervenção, procurou falar-nos de modernidade, mas de modernidade com velhas
opções, propostas e medidas que já foram rejeitadas e que nos últimos quatro anos levaram à destruição de
serviços públicos e de emprego público.
Este Governo fala de modernização administrativa e justifica-a com argumentos de proximidade, de
eficiência. Sr. Ministro, pergunto: onde esteve a proximidade e a eficiência da administração pública quando o
PSD e o CDS-PP decidiram encerrar escolas? Onde esteve a proximidade e a eficiência dos serviços públicos
quando decidiram encerrar centros de saúde, serviços e valências em muitos hospitais? Onde esteve a
proximidade e a eficiência dos serviços públicos quando encerraram postos dos CTT, quando encerraram
serviços desconcentrados na área dos sectores produtivos, quando encerraram Laboratórios do Estado na
área da agricultura ou até quando extinguiram freguesias? Onde esteve a proximidade e a eficiência dos
serviços públicos quando, agora, no Programa — e a isso não se referiu — apresenta como proposta a
extinção de municípios? Como se já não fosse penalizador empobrecer o nosso regime democrático e
penalizar as populações, também agora quer extinguir municípios no nosso País.
A modernização administrativa de que nos falou mais não é do que uma desresponsabilização do Governo
por aquelas que são as suas atribuições e competências. E isto é bem visível no que diz respeito às propostas
de descentralização de competências para os municípios na área da saúde, da educação, da ação social,
onde há uma clara desresponsabilização do Governo por aqueles que são os direitos fundamentais dos
cidadãos.
O Sr. Presidente: — Sr.ª Deputada, faça favor de concluir, pois já ultrapassou o tempo do seu Grupo
Parlamentar.
A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Vou terminar, Sr. Presidente, com uma última questão, que não posso
deixar de colocar.
Não deixa também de ser curioso, Sr. Ministro, que venha aqui, à Assembleia da República, falar na
valorização dos trabalhadores quando o PSD e CDS-PP, no anterior Governo, aquilo que fizeram foi retirar
direitos, foi destruir postos de trabalho,…
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O Sr. Presidente: — Tem mesmo de concluir, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Paula Santos (PCP): — … foi encerrar serviços, foi pôr a administração pública com menos 70 000
trabalhadores.
Sr. Ministro, de facto, não é desta forma que prestamos melhores serviços aos cidadãos.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Filipe Anacoreta Correia, a
quem também cumprimento pela primeira intervenção em Plenário.
O Sr. Filipe Anacoreta Correia (CDS-PP): — Muito obrigado, Sr. Presidente.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr. Ministro da Modernização Administrativa e Sr.as
e Srs.
Deputados, aproveito, também, esta minha primeira intervenção para os cumprimentar e desejar-lhes as
maiores felicidades nesta Legislatura.
Sr. Ministro da Modernização Administrativa, começo por cumprimentá-lo e, através de si, todo o Governo
pelas suas palavras na apresentação que aqui fez do Programa do Governo e, sobretudo, por esta prioridade
política que o Governo assumiu na criação deste Ministério da Modernização Administrativa.
Ao ouvi-lo, lembrei-me de alguém que também teve presença importante no Parlamento: Francisco Lucas
Pires. Dizia ele: «Ao princípio não ‘era’ o Estado mas o Homem — ‘era’ o Homem, o espírito e o barro… É esta
uma verdade em função da qual será o Estado a ter de se humanizar — não o homem quem tem de se
estadualizar».
Humanizar, modernizar, é justamente esta a prioridade que os portugueses esperam de nós. É
precisamente isto que os portugueses esperam de nós neste debate, que, hoje, tem a atenção e a
preocupação de tantos por más razões.
Muito longe daquilo que tanto se tem falado e que hoje já foi apelidado de «um acordo reacionário», uma
triste união de forças conservadoras, que tem como único objetivo manter o status quo que o País já não
consegue pagar. E isto é tanto mais estranho, ao falarmos da modernização administrativa, porque,
precisamente, é uma área que vai muito para além da preocupação exclusiva desta coligação. Por que não
reconhecê-lo? Também nesta área, o Partido Socialista teve uma intervenção e deu um contributo importante
e que nós reconhecemos em tantos que, hoje, estão nessa bancada. E não deverá ser, precisamente, nesta
preocupação, que tanto nos reuniu, de humanizar, de modernizar e de simplificar o Estado, que devemos
responder aos portugueses?!
Termino, Sr. Ministro, com esta pergunta: não acha que é fundamental este propósito alargado continuar a
seguir o seu caminho, ou agora ele deverá ser posto em causa apenas por um acordo reacionário?
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da Modernização Administrativa, Rui
Medeiros.
O Sr. Ministro da Modernização Administrativa: — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Berta Cabral, antes de
mais, quero agradecer as suas palavras e gostava de sublinhar três notas que me pareceram muito
importantes, no quadro do que foram os seus pedidos de esclarecimento.
Primeira nota, penso que tem toda a razão, porque, além de uma administração de proximidade, é
fundamental prosseguir o trabalho. Não haja ilusões, a modernização administrativa não se faz por decreto. A
modernização administrativa é um trabalho que demora muito e que exige um investimento de muito tempo e
de muita gente.
Portanto, a ideia de que nós não inventámos a roda, mas que ainda há muito a fazer para que a roda
funcione e funcione plenamente, é absolutamente certeira.
A segunda nota não se prende com o que me perguntou mas com o ter-me desejado o maior sucesso, o
que foi objeto de riso e de comentário. De facto, é como quem diz, dentro de horas este Governo verá,
certamente e com probabilidade, aprovada uma moção de rejeição do seu Programa.
Gostava que ficasse claro o seguinte: nós entrámos não vergados e cairemos, se cairmos, de pé!
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Aplausos do PSD e do CDS-PP.
A terceira e última nota prende-se com a administração local. A administração local é, de facto, um
problema central, uma preocupação absolutamente determinante deste Programa do Governo e, devo dizer,
aqui muito se fez nos últimos quatro anos. Desde 1999 que há um quadro de descentralização que se
manteve intacto até que este Governo ousou avançar, e ousou avançar como deveria avançar: em ligação
com os municípios e não de forma impositiva e unilateral.
Portanto, se há domínio em que se avançou e em que seria importante continuar a avançar, contra a
resistência de algumas autarquias e de alguns autarcas, é no domínio da administração local.
Sr.ª Deputada Paula Santos, apenas quatro notas em relação ao que me disse.
Primeiro, quando me refere, e articulando com a administração local, uma Administração que não esteve
próxima, que se afastou, retomo o que disse em relação à descentralização: a Administração dos últimos
quatro anos foi uma Administração que se aproximou, e não estou a falar apenas dos espaços do cidadão,
estou a falar, por exemplo, dos centros de saúde. Alguns centros de saúde acabaram, mas, certamente, o que
houve foi racionalização, e, se for fazer a contabilização final, perceberá que no final houve mais centros de
saúde do que havia.
Portanto, o balanço é positivo, não é um balanço negativo.
Segunda nota em relação ao que disse. As suas palavras começaram assim: «Curioso só agora falar do
Programa do Governo!».
Deixe-me dizer-lhe que estive aqui ontem e hoje e ao que assisti, fundamentalmente, não foi à discussão
do Programa do Governo. Estive aqui para discutir o Programa do Governo e estou aqui a discutir o Programa
do Governo!
Terceiro: repare que, como não há discussão do Programa do Governo, o tema dos funcionários públicos
não é o do Programa do Governo, o tema dos funcionários públicos é o passado, é aquilo de que acusam o
anterior Executivo, porque se lerem este Programa do Governo é claro que se diz que a aposta é na
valorização dos funcionários públicos, na diferenciação do mérito. Isso está «preto no branco» no Programa do
Governo.
Protestos do PCP.
Já agora, deixo uma quarta e última nota. Uma vez que estamos a falar do Programa do Governo — é
disso que deveríamos falar, é nisso que me estou a centrar —, para quem quer falar do Programa do Governo,
não fale de extinção dos municípios, porque não há no Programa do Governo nenhuma referência à extinção
dos municípios. O que se diz é que se deve promover a interação entre os municípios e que se,
voluntariamente, os municípios o quiserem, poderá haver.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Está lá a agregação!
O Sr. Ministro da Modernização Administrativa: — As últimas palavras são dirigidas ao Sr. Deputado
Filipe Anacoreta Correia, a quem agradeço, desde logo, por recordar as palavras de Francisco Lucas Pires, de
quem sou um aprendiz e que admiro profundamente.
Devo dizer que a sua afirmação de que não é o Estado que está no centro mas é a pessoa, de que é
preciso humanizar o Estado e olhar para as pessoas de carne e osso é uma preocupação que preside a este
Programa do Governo. É um aproximar das pessoas de carne e osso e, portanto, também das pessoas mais
afastadas, da pessoas mais desprotegidas.
A segunda nota, que subscrevemos totalmente, é a de que é pena que se perca a dimensão transversal,
porque, verdadeiramente, este tema da modernização administrativa sempre foi um tema em que convergiram
os partidos do arco europeu. E aqui não haja dúvidas: os partidos do arco europeu são o PSD, o CDS e o PS.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
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O Sr. Presidente: — Sr. Ministro, não havendo mais inscrições, vamos interromper os trabalhos, que
retomaremos às 15 horas, com a fase de encerramento do debate e com a votação das moções de rejeição.
Eram 13 horas e 3 minutos.
Srs. Deputados, está reaberta a sessão.
Eram 15 horas e 1 minuto.
Peço às autoridades policiais no favor de abrirem as galerias ao público.
Srs. Deputados, vamos proceder ao debate de encerramento Programa do XX Governo Constitucional,
após o que haverá lugar à votação das moções de rejeição.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado André Silva, do PAN.
O Sr. André Silva (PAN): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros de Governo, Sr.as
e Srs.
Deputados e todos os presentes na Sala: Neste momento de encerramento do debate sobre o Programa do
Governo é importante que se faça um balanço adequado e justo destes dois dias de trabalho, ajustando-os ao
imperativo de mudança que os portugueses têm vindo a pedir.
O Programa traz algumas propostas que indicam ligeiros ajustes ao desagravamento dos sacrifícios que
nos foram pedidos. Contudo, ao aprofundarmos com mais detalhe, não podemos deixar de considerar que o
mesmo Programa dá continuidade ao rumo seguido pelo Governo durante os quatro anos anteriores.
Verificamos que este Programa do Governo acentua cada vez mais a intenção de substituir a noção de Estado
social por uma noção mais assistencialista.
Tal como já tive oportunidade de referir, é com agrado que constatamos que existe a preocupação do
Governo em propor medidas que vão ao encontro do bem-estar animal. Ainda assim, algumas propostas
assentam em contradições. Isto é, o Programa do Governo tanto confirma que se deve melhorar o bem-estar
dos animais como, noutro ponto, beneficia o lucro dos produtores, agilizando procedimentos comerciais
relacionados, por exemplo, com o transporte de animais, sem especificar as condições de bem-estar exigidas
por tais práticas. Privilegia-se a lógica de mercado, através do lucro fácil, em detrimento da proteção desejável
para estes animais.
No que à nossa casa comum, a natureza, diz respeito, concluímos que o seu valor continua associado ao
valor comercial que possa gerar. Não encontrámos preocupações com a questão da utilização de
agroquímicos ou do cultivo de transgénicos, para além de não termos observado quaisquer indicações de que
o Plano Nacional de Barragens, tal como está definido, seja para acabar ou ser reavaliado, por contribuir para
um conjunto de atentados ambientais, culturais e sociais e não melhorar a qualidade de vida dos portugueses.
Sentimos também a ausência de medidas concretas no âmbito do incentivo aos modos de produção
biológicos.
De um governo, o PAN espera um novo rumo que não se limite a mitigar as questões ligadas ao
agravamento das condições de vida dos portugueses mas que inicie um novo paradigma de relações
económico-sociais que não assente na velha dicotomia entre exploração capitalista e luta de classes, não
devendo a sua realização e felicidade dos portugueses ser apenas proporcional à sua capacidade produtiva.
Do debate aqui realizado realço a importância de uma consciência político-partidária responsável no
alinhamento de agendas, deliberações e prioridades.
Existem medidas aqui debatidas que só podem avançar com o audacioso compromisso de um vasto
acordo entre protagonistas e forças políticas que partilhem o desejo genuíno de criar alternativas sustentáveis
nos vários eixos governativos.
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado já ultrapassou o seu tempo.
O Sr. André Silva (PAN): — Vou já terminar, Sr. Presidente.
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O PAN está disposto a contribuir o mais possível para estas soluções com um único critério: o de despertar
consciências para valores sociais, éticos e ecológicos fundamentais, sem os quais o nosso futuro é colocado
em risco, bem como o dos animais que connosco partilham o planeta e a natureza.
O ser humano não é a medida de todas as coisas. É nosso dever assegurar que contribuímos todos para
uma evolução civilizacional, através das nossas ações, para uma melhoria do bem-estar das pessoas, dos
animais e da natureza.
Aplausos de Deputados do PS.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção final, tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Ferreira.
O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Sr.as
e Srs. Membros do
Governo, Sr.as
e Srs. Deputados: A vida tem destas coisas. Um Governo que generalizou a precariedade vive
agora uma situação verdadeiramente precária. Um Governo a prazo, que os portugueses revogaram no
passado dia 4 de outubro, apresenta-nos agora um Programa repleto de pressupostos falsos e a partir de
premissas completamente erradas.
Logo no primeiro parágrafo do Programa, afirma-se: «De uma forma clara, os portugueses disseram que
queriam que o PSD e o CDS prosseguissem na sua missão e levassem adiante o seu compromisso de
trabalho nesta Legislatura». Sucede que os portugueses não disseram nada disso, não foram os portugueses
que disseram isso.
Quem quis que o PSD e o CDS continuassem as suas desastrosas políticas foi o Presidente da República.
Os portugueses disseram uma coisa completamente diferente. Aquilo que os portugueses disseram no dia 4
de outubro foi: «vamos eleger 230 Deputados à Assembleia da Republica, criando uma nova correlação de
forças no Parlamento, de forma a impedir que o PSD e o CDS continuem no Governo. Vamos criar as
condições para quebrar este ciclo de políticas de direita, que destruíram a nossa capacidade produtiva,
aumentaram as desigualdades sociais, alargaram o fosso entre ricos e pobres, agravaram as injustiças sociais
e colocaram a generalidade dos portugueses, praticamente, a ‘pão e agua’».
Foi isto que os portugueses disseram no dia 4 de outubro: «não queremos continuar a ser vítimas das
políticas do PSD e o CDS».
É preciso que agora se façam traduzir estes resultados eleitorais. É a democracia a funcionar. Quer se
goste, quer se não goste, são estas as regras da democracia e com elas teremos de saber conviver.
Mas os portugueses não só condenaram de forma muito clara as políticas de austeridade e de
empobrecimento prosseguidas pela coligação de direita, como também expressaram uma firme vontade de
mudança de políticas.
Seria assim irresponsável não atender a este novo quadro parlamentar, como se não tivesse havido
eleições e como se tudo se mantivesse igual.
Bem sabemos que os partidos que se comprometeram perante os eleitores com as políticas de mudança
assentam em propostas políticas diferentes, têm programas eleitorais diferenciados e avançam de pontos de
partida também diferentes.
Ainda assim, face à emergência de pôr fim às políticas de austeridade e procurando ir ao encontro da
vontade dos portugueses, Os Verdes envolveram-se com seriedade e responsabilidade na discussão de um
Programa do Governo sustentado em políticas alternativas, capazes de quebrar o ciclo de empobrecimento e
o travão ao desenvolvimento ambiental, social e económico do País.
Sr.as
e Srs. Deputados, como se previa, o Programa do Governo PSD/CDS é marcado, essencialmente,
pela continuidade disfarçada do «agora é que vai ser». Em bom rigor, o que o PSD e o CDS agora prometem
é combater os resultados das políticas que impuseram ao longo dos últimos quatro anos.
De facto, olhando para os cinco objetivos fundamentais sobre os quais assenta o Programa do Governo, a
novidade é apenas o descaramento.
Vejamos: andaram quatro anos a convidar ou a forçar os nossos jovens a emigrar e prometem agora
combater o «inverno demográfico». Andaram quatro anos a castigar as pessoas e a semear pobreza e
prometem agora valorizar as pessoas e combater a pobreza. Andaram quatro anos a destruir o Estado social e
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a agravar as desigualdades sociais e agora prometem defender e revigorar o Estado social e combater as
desigualdades sociais.
Andaram quatro anos a destruir as micro, pequenas e médias empresas, a fomentar o desemprego, a
diminuir os rendimentos das famílias e o seu poder de compra e vêm agora prometer fortalecer a economia, a
criação de emprego, o aumento dos rendimentos das famílias e o seu poder de compra.
Andaram quatro anos a encerrar e a fragilizar os serviços públicos para agora virem prometer a
qualificação dos serviços públicos.
E são estes os cinco objetivos do Programa do Governo, cuja única novidade é, como já disse, o
descaramento, o mesmo Programa que, em matérias fundamentais, como o setor da água, reafirma a intenção
de continuar a reestruturação deste sector, tornando-a mais apetecível para o negócio do sector privado,
constituindo, portanto, uma ameaça de privatização deste bem essencial à vida.
Ao nível da conservação da natureza, fica tudo igual, continua o desinvestimento e a «nova organização»,
que foram os fatores que mais prejudicaram a conservação e a proteção da natureza.
No combate às alterações climáticas, continua a inação em relação a um dos sectores que mais
contribuem para a emissão de gases com efeito estufa, os transportes. Neste sector, a única preocupação do
Governo, para variar, é a da privatização.
Não faltam, por isso, motivos para Os Verdes, com sentido de responsabilidade, rejeitarem este Programa
do Governo.
Para isso, Os Verdes apresentaram, hoje, uma moção de rejeição ao Programa do Governo PSD/CDS,
como forma de quebrar este ciclo de políticas que tanto tem vindo a infernizar a vida dos portugueses.
Aplausos de Os Verdes, do PS, do BE e do PCP.
O Sr. Presidente: — Para fazer uma intervenção, neste período de encerramento, em nome do PCP, tem a
palavra o Sr. Deputado Jerónimo Sousa.
O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro- Ministro, Srs. Deputados: Hoje cumpre-
se um importante passo. Milhões de portugueses respirarão de alívio pelo fim de um Governo que, ao longo de
mais de quatro anos, com a maior arrogância e frieza, lhes infernizou a vida e tinha como objetivo prosseguir a
sua obra destruidora.
O Sr. António Filipe (PCP): — Exatamente!
O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — A derrota da coligação PSD/CDS é inseparável da luta que os
trabalhadores e o povo travaram contra a política de retrocesso social e de declínio económico.
Os resultados das eleições legislativas do passado dia 4 de outubro, em que a coligação PSD/CDS perdeu
mais de 700 000 votos, viu reduzida a sua votação em 12 pontos percentuais, perdeu 25 Deputados e perdeu
a maioria absoluta, exprimem uma clara condenação à política prosseguida nos últimos quatro anos pelo
Governo PSD/CDS.
Não podemos deixar de assinalar o significado e a dimensão dessa condenação num quadro em que o
Governo e os partidos que lhe deram suporte chantagearam o povo português com o medo, desencadearam
uma operação de instrumentalização do aparelho do Estado ao serviço dos seus interesses eleitorais e
mantiveram escondida a sua verdadeira agenda e programa político.
Aplausos do PCP, do PS e do BE.
O PSD e o CDS não querem que se diga a verdade e que se fale da realidade.
O Governo PSD/CDS deixa um enorme rasto de destruição: o desemprego real a atingir mais de 1,1
milhões de portugueses; a precariedade generalizada; a dura realidade dos baixos salários dos trabalhadores
por conta de outrem e, em particular, dos que auferem o salário mínimo nacional ou um valor ainda mais
baixo; a esmagadora maioria das reformas inferior ao limiar de pobreza; o brutal subfinanciamento da saúde e
da educação, negando o direito ao seu acesso pleno a milhões de portugueses; os sucessivos cortes nas
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prestações sociais, como se verificou este ano, com mais cerca de 520 milhões de euros suprimidos; os 2,8
milhões de portugueses em risco de pobreza. Esta é uma situação marcada por níveis dramáticos de
desemprego, de pobreza e de crescentes desigualdades sociais.
Este é um País a braços com uma crise demográfica, sangrado em vida pela emigração de centenas de
milhares de jovens, em parte significativa, altamente qualificados.
Este é um País com um elevado grau de enfraquecimento do aparelho produtivo, com crescente
dominação dos centros de decisão estratégica no estrangeiro, com a fragilização de um tecido económico já
de si débil, com um encerramento recorde de empresas e com uma situação de endividamento brutal das que
restam. É um Estado desfeito em muitos dos seus centros de competência e saber, empobrecido de recursos
humanos, desestruturado e desanimado.
Este é um País que viu, nestes últimos quatro anos, a sua economia recuar década e meia, com a
produção a cair 10 000 milhões de euros, o investimento global e público a recuar dramaticamente com
pesadas e graves consequências futuras e a dívida pública a aumentar 50 000 milhões de euros.
Não, Sr. Primeiro-Ministro, não diga mais que os portugueses foram compreensivos perante os sacrifícios
que os senhores lhes impuseram.
O trabalhador, com o seu salário, o seu rendimento e os seus direitos cortados, o pensionista ou o
reformado, com a reforma ou a pensão cortada ou congelada, a família confiscada ou que perdeu a sua casa,
o desempregado sem emprego nem subsídio, o pequeno empresário arruinado, o pequeno agricultor e o
pescador impedidos de cultivar ou pescar, os homens e mulheres da cultura e da ciência desvalorizados,
todos eles sentiram não compreensão mas indignação perante tanto esbulho, confisco e sacrifício, sabendo,
ainda por cima, que o resultado seria para cobrir os desmandos da banca, para os grandes grupos
económicos e não para resgatar o País.
Aplausos do PCP, do PS e do BE.
Esta é uma realidade social e económica que era vontade do PSD e do CDS-PP manter e agravar, aspeto
que ficou claro pelo conteúdo do Programa do Governo, aqui tão mal e tão pouco defendido pelos seus
autores.
O Governo aqui se apresentou ignorando os graves problemas estruturais do País que persistem, insistindo
na falsa ideia de que a sua política conduziu a um caminho de recuperação económica, repetindo
proclamações vazias quanto à resolução dos problemas sociais como o desemprego e a pobreza e
procurando iludir a realidade das crescentes dificuldades que atingem os trabalhadores e o povo.
O que o Governo PSD/CDS-PP deixou claro foi a perspetiva de continuidade e intensificação da política de
agravamento da exploração, de empobrecimento, de assalto aos rendimentos dos trabalhadores e do povo, da
injustiça fiscal, da destruição das funções sociais do Estado e dos serviços públicos, do confronto com a
soberania e a degradação do regime democrático.
O PSD e o CDS-PP conduziram o nosso País a uma situação de retrocesso económico e social jamais
vivida depois do 25 de Abril. Procuram, agora, resgatar-se a si próprios da derrota eleitoral que sofreram
integrando no Programa do Governo medidas e promessas destinadas a criar a ilusão de que estariam em
condições e na disposição de inverter o rumo da sua política, revertendo algumas das decisões com que
atingiram os trabalhadores e o povo ao longo dos últimos quatro anos.
O Programa do Governo mostra o objetivo claro de assegurar os eixos essenciais da política de desastre
nacional seguida nos últimos anos e coloca ainda mais a necessidade de pôr termo ao novo/velho Governo
PSD/CDS pelos prejuízos que tem causado e pelos que pretendia continuar a causar aos trabalhadores, ao
povo e ao País.
É neste contexto que o Programa do Governo da coligação PSD/CDS apenas serve para confirmar aquilo
que sempre dissemos aos portugueses: com o PSD e o CDS-PP no poder, a política de exploração e
empobrecimento para os trabalhadores e para o povo iria prosseguir, porque o PSD e o CDS-PP não têm
outra forma de governar que não passe pela destruição de direitos económicos, sociais e laborais das classes
trabalhadoras.
Se já muito foi destruído, mais ainda queriam destruir no domínio laboral e nas áreas da educação, da
saúde e da segurança social. Assim o PSD e o CDS-PP tivessem a oportunidade de continuar a prosseguir no
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poder as suas políticas, como, aliás, desejariam todos aqueles que, intocáveis no alto dos seus privilégios,
beneficiaram com as opções tomadas nestes anos, esses mesmos que, na iminência da derrota deste
Governo e perante a real possibilidade da nova correlação de forças na Assembleia da República, em vez de
reverterem os roubos de direitos e rendimentos do nosso povo, não só se lançam numa odiosa campanha de
medo e chantagem como procuram, desde já, proteger os seus mesquinhos interesses, como revela a
distribuição antecipada de dividendos que alguns grupos económicos têm em curso, visando evitar a justa
tributação fiscal a que deveriam estar sujeitos A esse exercício do cinismo de classe, em que se fala em nome
do País para proteger interesses de uma pequena minoria, nós queremos dizer basta!
Aplausos do PCP, do PS, do BE e de Os Verdes.
A opção do povo português expressa no resultado das últimas eleições legislativas permite impedir essa
coligação de prolongar, uma vez mais, a sua política de mentiras e permite travar este caminho de degradação
contínua das condições de vida dos portugueses.
Por tudo isto, o PCP rejeita o Programa do Governo PSD/CDS-PP e, em conjunto com outros partidos,
criou as condições para que ele seja rejeitado, pondo termo à sua nefasta ação. A posição conjunta do PS e
do PCP sobre solução política expressa os termos dessa opção.
Aplausos do PCP, do PS, do BE e de Os Verdes.
Estão criadas condições institucionais e políticas para outra solução governativa.
Existe na Assembleia da República uma base institucional que permitirá ir tão longe quanto for a disposição
de cada força política que a compõe, para suportar o caminho da reposição dos salários e dos rendimentos, da
devolução dos direitos, do reforço do acesso à saúde, à educação e à segurança social, do apoio às micro,
pequenas e médias empresas, do apoio aos reformados e aos jovens, e que pode permitir a concretização de
um conjunto de medidas e soluções que deem resposta a interesses imediatos dos trabalhadores e do povo.
É este o nosso compromisso, indissociável da indispensável política patriótica e de esquerda, dessa nossa
aspiração profunda de uma política alicerçada nos valores de Abril, por um Portugal com futuro.
O tempo, Sr. Presidente, Srs. Deputados, não é de expetativa, nem de atentismo. É tempo de participação,
de ação e de construção de um futuro melhor!
Aplausos do PCP, do PS e do BE.
Neste momento, o Deputado do PSD António Costa Silva exibiu um cartaz com a mensagem «não à
moção de rejeição».
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Telmo Correia, do CDS-PP.
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Sr. Vice-Primeiro-Ministro, Srs.
Membros do Governo, Sr.as
e Srs. Deputados: Chegados ao final deste debate existem conclusões óbvias a
retirar e a primeira conclusão é a de que a coligação Portugal à Frente, que já tinha ganho a campanha
eleitoral e que ganhou as eleições no dia 4 de outubro, voltou a ganhar, hoje e ontem, este debate do
Programa do Governo.
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
Protestos do BE e do PCP.
Ficou claro, Srs. Deputados, que existe uma maioria e um Governo que têm um rumo para Portugal, como
ficou igualmente claríssimo que, em Portugal, só há um político preparado para liderar esse Governo, e esse
político é o Primeiro-Ministro, chama-se Pedro Passos Coelho.
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Aplausos do CDS-PP e do PSD.
É exatamente aquele que os portugueses escolheram. Escolheram bem e não se enganaram.
O Governo está a conduzir Portugal no caminho da recuperação económica, recuperação que se sente e é
real. É por isso este debate demonstrou, mais uma vez, que os portugueses, quando escolheram este
Governo e estes líderes, Pedro Passos Coelho e Paulo Portas, não se enganaram.
Por outro lado, não ignoramos que desde o primeiro momento, desde o início deste debate, pairou sempre,
qual gigantesco elefante vermelho sentado no meio da Sala, o espetro das moções de rejeição previamente
anunciadas. Não o ignoramos! Esteve sempre no meio da Sala, ainda que o principal responsável desse facto,
o Secretário-Geral do Partido Socialista, só o tenha comentado nos corredores, não tendo, até este momento,
vindo a esta tribuna assumir as suas responsabilidades, como era sua obrigação, perante a Câmara e perante
a democracia.
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
Dizer que este debate é uma perda de tempo, como disse ontem o Dr. António Costa, é um desrespeito por
esta Câmara, mas, sobretudo, é um desrespeito pelo voto dos portugueses.
Não posso também deixar de registar o enorme exercício de hipocrisia daqueles que, tendo anunciado
mesmo antes deste debate a rejeição do Programa do Governo, vieram aqui criticar as intervenções que
fizemos sobre esse facto, acusando-nos de não querermos discutir, de esconder ou mesmo de estarmos
envergonhados do Programa que aqui apresentámos, como fez ontem, em resposta a uma pergunta que lhe
dirigi, o líder parlamentar do Partido Socialista, Carlos César.
Que fique muito claro: não só não estamos envergonhados como temos todos muito orgulho no trabalho
que fizemos e no Programa do Governo que apresentámos.
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
Temos todos muito orgulho, mas, em particular, quem esteve aqui nos últimos quatro anos tem muito
orgulho em ter começado uma Legislatura com o País em estado de pré-bancarrota, por culpa da governação
do Partido Socialista, e termos conseguido, ao fim de quatro anos, recuperar a credibilidade de Portugal,
controlar o défice, pôr a economia a crescer e pôr o desemprego a descer. Temos muito orgulho nisso!
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
Protestos do BE e do PCP.
Sabemos que não conseguimos evitar muitos sacrifícios que foi necessário pedir aos portugueses, mas
conseguimos evitar ruturas, conseguimos, sobretudo, fazer a nossa maior obrigação: proteger os rendimentos
dos portugueses, evitar ruturas sociais, responder à emergência social. Temos muito orgulho nisso, e é por
isso que também temos orgulho no Programa que agora apresentamos.
O Programa que apresentamos é a decorrência lógica do trabalho e do que fizemos enquanto povo e
enquanto Nação. É, como dissemos na campanha eleitoral, um Programa que demonstra que agora podemos
mais, é um Programa que, mantendo a consolidação das contas públicas, mantendo o rigor e a estabilidade,
quer ir mais longe, e já não falamos agora em excecionalidade. Queremos eliminar a excecionalidade.
Trata-se de um Programa que consolida o crescimento económico e o investimento, baixando impostos, e
que, ao mesmo tempo, já não fala em emergência social mas, sim, em desenvolvimento social, porque agora
Portugal pode mais, como dissemos na campanha eleitoral.
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
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Temos muito orgulho neste Programa e neste Governo, como temos a certeza que só prosseguindo este
caminho Portugal não correrá riscos desnecessários e continuará a proteger os resultados que temos
conseguido, não voltando para trás.
Se alguém aqui, Srs. Deputados, poderia estar envergonhado é quem deixou o País na bancarrota, quem
não ajudou em nada a resolver o problema que criou e, agora, quer chegar ao poder a qualquer custo, usando
uma qualquer manigância, pondo em risco tudo o que conseguimos até agora.
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
Não são os interesses do País que podem ser subordinados ao interesse de uma maioria conjuntural, aos
interesses partidários ou, mesmo, à sobrevivência política de um secretário-geral. Bem pelo contrário; é o
Parlamento que deve responder às necessidades do País e as necessidades do País o que nos exigiam era
uma maioria sólida que continuasse o caminho que estamos a trilhar.
O Partido Socialista faltou a essa chamada. O Partido Socialista faltou porque não teve a humildade
democrática de ler a vontade dos portugueses, de recordar o que aconteceu em 2011 e perceber que não
devemos repetir os erros que nos levaram a essa situação dramática.
O Partido Socialista preferiu escolher um caminho inédito na nossa democracia, impedindo de governar
quem venceu as eleições. Ao fazê-lo, escolheu o caminho do radicalismo e do aventureirismo, lançando a
governação do País numa solução que não só não é legítima como não garante estabilidade. É muito
poucochinho, Srs. Deputados!
Permitam-me que vos diga, Sr.as
e Srs. Deputados, que, tendo ouvido falar ao longo destes dois dias em
expressões como seja «o desespero da direita», vos esclareça: nós, no centro-direita, somos gente tolerante.
Vozes do PCP: — Oh!…
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Sabemos há muitos anos que o povo é sereno, repito, sabemos há
muitos anos que o povo é sereno. O desespero não faz parte da nossa cultura nem faz parte da nossa ética.
Nós, tal como os 2 086 165 portugueses que votaram na coligação, não estamos desesperados mas
estamos indignados. Indignados porque aquilo que esta nova troica da esquerda está a fazer, impedindo o
Governo legítimo de governar, é uma indignidade e é por isso que estamos indignados.
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
Substituir um Governo legítimo pode até ser formalmente possível e formalmente constitucional, mas não é
aceitável.
Sempre, na democracia portuguesa, quem venceu as eleições pode governar: foi assim com Mário Soares;
foi assim com Cavaco Silva; foi assim com António Guterres; foi assim com José Sócrates. Sempre quem
ganhou pode governar.
Mário Soares, de resto, referindo-se a posteriori a um hipotético governo formado na altura por uma soma
de partidos que não tinham ganho as eleições — e, na altura, estávamos a falar do PS, do PRD e do PCP –,
foi claríssimo e disse, e cito: «uns tipos que queriam ir a toda a força para o Governo». Na altura, estava a
referir-se a esses partidos. Mas que belo retrato para VV. Ex.as
, Srs. Deputados! Que belo retrato para VV.
Ex.as
!….
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
É muito poucochinho!
Podia também recordar aqui Jorge Sampaio, a propósito nas eleições nos Açores, quando disse: «É
inaceitável, é impensável que quem não ganhou queira governar!» Não é assim, Dr. Carlos César? Lembra-se
disso?
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
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O Sr. Carlos César (PS): — Isso não é verdade! Não foi assim!
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Mas existe também uma questão de estabilidade.
A estabilidade resulta do facto de esta soma negativa que agora quer governar não ter ido a votos com
esse programa. Ou seja, pelo que percebemos, não mudaram sequer de opinião: o Bloco de Esquerda
continua a defender o fim do Tratado Orçamental e a renegociação da dívida, e, aparentemente, o PS não; o
PCP continua a defender a saída do euro e nacionalizações, como consta na moção que apresentaram —
aliás, pela primeira vez, não falam em pacto de agressão, o que já não é mau, já é um progresso —,…
Risos do CDS e do PSD.
… mas o PS também não o defende; PCP e Bloco defendem a saída da NATO, e esperemos que o PS não
o defenda também.
Ou seja, no limite, continuam diferentes e aquilo que poderíamos até acusar o PCP e o BE é de se estarem
a aproveitar, despudoradamente, do estado de necessidade de um secretário-geral do Partido Socialista. Pode
ser legal, mas não é bonito!
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
Cheguei a dizer que tinham mudado em 24 horas, mas faço-vos a justiça de dizer que, afinal, não
mudaram. Agora, o risco que temos com esta troica das esquerdas é o regresso ao despesismo e é o regresso
da outra troica. Este é que é o risco sério e é esse o risco que enfrentamos.
Legitimidade, quando não foram a votos com um programa conjunto, tem esse problema. Espera-vos, Sr.
Deputado João Oliveira, um choque com a realidade. Vamos ver como é que se saem desse choque com a
realidade.
É, de resto, simbólico que ao longo deste mês de reuniões de equipas técnicas, de reuniões à porta
fechada, de reuniões secretas, tanto quanto sabemos, nunca se sentaram ao mesmo tempo os três à mesma
mesa…
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP: — Nem se conhecem!
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Hoje mesmo, pelo que sabemos, a assinatura dos acordos foi feita à
vez e à porta fechada, não fossem correr o risco de aparecerem os três juntos na fotografia!. Não fossem
correr o risco de aparecerem todos juntos na fotografia… Isto diz muito sobre a estabilidade.
A partir daqui, a pergunta é clara e é óbvia, e o Comité Central conhece-a bem. É a célebre pergunta de
Vladimir Ilyich Ulyanov: o que fazer? A partir daqui, o que fazer?
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
Nós respondemos de forma clara: nós não desistimos porque sabemos bem o que foi necessário fazer para
tirar o País da bancarrota e proteger os portugueses. Nós não desistimos porque o que está em causa é o
futuro de Portugal e das suas novas gerações. Nós não desistimos porque fomos avaliados pelos portugueses,
ganhámos as eleições e temos legitimidade popular, eleitoral e democrática. E não só não desistimos como
ganhamos, com esta realidade, um suplemento de alma adicional, que resulta de um dos mais fortes
sentimentos que se pode ter em política: o da injustiça.
O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Muito bem!
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — A decisão que vão tomar é ilegítima e é injusta, mas isso só nos dá
mais força para continuar, em nome dos nossos valores e em nome de Portugal.
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Aplausos do CDS-PP e do PSD.
Podem até derrubar-nos, mas uma coisa resulta muito clara: caímos, mas caímos de pé e quem cai de pé
não morre!
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
O que conta não é o lugar onde nos vamos sentar, o que conta não é sequer o tamanho de uma maioria
aritmética e artificial, o que conta mesmo é o tamanho da nossa razão e é com ela que continuaremos a
combater.
Aplausos do CDS-PP e do PSD, de pé.
O Sr. Presidente: — Para a intervenção de encerramento, tem a palavra a Sr.ª Deputada Catarina Martins.
A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: No debate destes dois dias, foi
repetido à exaustão e em diversos formatos que nunca aconteceu o que está a acontecer. Eu não podia
concordar mais. Estamos a fazer o que nunca foi feito. Ainda bem! Estava mais do que na hora!
Aplausos do BE, do PS, do PCP e de Os Verdes.
Fazer como mandam as convenções seria o pior de tudo, porque faltaria à resposta à vida das pessoas,
como sempre tem faltado, e porque faltaria à verdade dos resultados eleitorais.
Não é no Parlamento que está a acontecer o que nunca aconteceu antes, foi no País. E nós, eleitos e
eleitas com a mesma legitimidade, representamos essa mudança. Ilegítimo seria deixar que permanecesse no
Governo a direita que a maioria do povo rejeitou.
Vamos, portanto, aos resultados eleitorais, que, aparentemente, a direita tem dificuldade em compreender.
Protestos do PSD e do CDS-PP.
Em 2011, o PSD, sozinho, elegeu 108 Deputados e Deputadas. Não chegava para formar um governo com
apoio maioritário no Parlamento, mas coligou-se com o CDS, que tinha eleito 24 Deputados, e conseguiram
uma maioria de 132 Deputados e Deputadas.
Hoje, PSD e CDS juntos têm apenas 107 Deputados, menos do que teve PSD sozinho em 2011, ou seja,
perderam 700 000 votos e 25 Deputados.
Protestos do PSD e do CDS-PP.
Para serem governo precisam que outra força política os apoie no Parlamento. E, como está à vista, não
têm esse apoio e é por isso que o vosso Governo é rejeitado, porque não têm os votos suficientes no País e
na Assembleia da República. Não os tiveram no 4 de outubro! Não elegeram Deputados e Deputadas
suficientes.
Aplausos do BE, do PS, do PCP.
PSD e CDS estão em choque e parecem achar que a obrigação das outras forças políticas é apoiá-los,
contra o compromisso eleitoral que os elegeu, contra tudo o que dissemos na campanha e nestes quatro anos
de oposição.
PSD e CDS querem que quem concorreu contra o seu Governo, agora, suporte o seu Governo, porque
sim, porque se convenceram que as soluções de governo só podem ser as mesmas de sempre e que nenhum
resultado eleitoral pode mudar verdadeiramente nada. Nunca se viu um Paulo Portas tão cavaquista como o
do dia em que perdeu o poder.
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Aplausos do BE, do PS, do PCP e de Os Verdes.
Sr.as
e Srs. Deputados: O dia de hoje marca uma mudança política no nosso País que não é pequena, que
não é fruto nem de meros jogos aritméticos conjunturais nem do voluntarismo de bancadas parlamentares.
Perceber o momento que vivemos exige compreender como cresceram as condições para esta mudança,
quem foram os seus obreiros e em que se traduz para o futuro.
Ao longo dos últimos quatro anos existiu uma reconfiguração do País que não foi pequena. A sucessão de
orçamentos inconstitucionais foi apenas a ponta do iceberg das alterações que a direita impôs contra os
pilares da democracia em Portugal.
Não há democracia sem condições de igualdade e liberdade. E por isso o acesso à educação, como à
saúde, e, desde logo, os direitos laborais são pilares de democracia. Uma escola pública e um Serviço
Nacional de Saúde fragilizados e desarticulados são condições de desigualdade. O ataque à contratação
coletiva, a precariedade e o desemprego massivos são condições do medo de quase todos, em nome da
prepotência de uns poucos.
Se hoje a direita está isolada no Parlamento foi porque se isolou nos últimos anos para atacar o País, para
quebrar o contrato social em que se funda a democracia. Quem pôs geração contra geração, trabalhadores
contra trabalhadores, pobres contra pobres, para que o ressentimento abrisse espaço à quebra do contrato
social em que se funda a democracia, acabou isolado, e ainda bem.
Aplausos do BE, do PS, do PCP e de Os Verdes.
O que a direita lê hoje como um ataque à democracia é, de facto, o resgate da democracia.
A enorme crise social que a direita impôs ao País acabou por criar novas condições políticas concretas. A
relação de forças que temos hoje na Assembleia da República corresponde ao desejo de mudança e à
esperança no País e na democracia. Se quem governou até agora não teve maioria, não é menos verdade
que a alternância do costume também não é já opção. Os resultados eleitorais exigem muito mais de todos
nós.
O milhão de pessoas que se expressou à esquerda do «centrão» representa a prioridade da resposta à
emergência social. Esse milhão é a força que mudou tudo.
E o que significa esta mudança? Desde logo, a recusa da mentira e do permanente jogo de sombras.
Vejam bem a gigantesca campanha da direita de que tudo estava melhor: das pancadinhas nas costas dos
mercados e de Berlim, à sobretaxa que ia ser devolvida, a direita teve todo o horário nobre, todos os meios de
comunicação social, para falar do seu sucesso e das suas promessas enquanto escondia o que fez e o que
tinha no Programa. E mesmo assim perdeu, perdeu 700 000 votos e perdeu a maioria porque mentiu e já não
sabe fazer mais do que mentir.
Aplausos do BE e do PS.
Protestos do PSD e do CDS-PP.
Sr.as
e Srs. Deputados: «Não se esqueça de mim. Não se esqueça de nós. Não se esqueça.» foram as
frases que mais ouvi nesta campanha eleitoral. Há todo um País que se sente esquecido. O País das pensões
cortadas, dos salários de miséria, do desemprego e do estágio, do velho demais para trabalhar e novo demais
para a reforma, da vida toda pela frente que só existe se for lá fora, no estrangeiro.
Um povo inteiro ouve falar dos compromissos internacionais, da instabilidade dos mercados, do perigo da
fuga de capitais, e pergunta-se: e quando terá a minha vida um segundo que seja da atenção de quem decide
das nossas vidas?
Haverá um momento para se ponderar o compromisso do Estado com quem contribuiu toda a vida e hoje
não tem sequer dinheiro para os medicamentos? De quem trabalha cada vez mais horas e só vê o salário
encolher? Quando entrará na política a preocupação tremenda com a instabilidade de quem perdeu o
emprego, de quem perdeu a casa, de quem não consegue sequer comprar os iogurtes para os miúdos?
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Haverá um momento para começarmos a preocupar-nos a sério com a fuga das pessoas do nosso País? Com
a fuga de 110 000 em idade ativa por ano, por não encontraram aqui um emprego digno?
Já sei! Aqui, neste Plenário, para a direita, falar de mercados é preocupação de gente séria; falar da fome e
do desespero, é demagogia insuportável.
Aplausos do BE, do PS e do PCP.
E, mais, repetiu a direita ao longo de todo o debate como ao longo dos últimos anos: se os mercados não
estiverem felizes e bem alimentados, ninguém no País terá o que comer. E enquanto cuidam zelosamente dos
sempre insaciáveis e irascíveis mercados nem se dão conta que o País se esvazia de gente e se esvazia de
futuro.
Eu não me esqueço! Nós não nos esquecemos!
Protestos do PSD.
O Bloco de Esquerda não se esquece e é por isso que rejeitamos este Governo, é por isso que
construímos a alternativa, um compromisso em nome das pessoas, um compromisso de quem não se demite
de responder à emergência, de quem não esquece.
Logo na pré-campanha eleitoral, o Bloco de Esquerda assumiu esse compromisso da disponibilidade para
uma maioria que respondesse à emergência. Anunciámo-lo publicamente: cá estaríamos para debater uma
solução para o País com um Partido Socialista que se comprometesse com medidas essenciais pelo emprego,
salários, pensões. E cumprimos com o nosso compromisso.
Vozes do BE: — Muito bem!
A Sr.ª Catarina Martins (BE): — A recuperação de rendimentos prevista no acordo é tímida face a tudo o
que se perdeu nestes anos; a proteção social fica aquém da emergência criada pela destruição da direita; a
capacidade de investimento é curta face à absoluta necessidade de reconstrução da capacidade produtiva e
do emprego, mas são os passos possíveis…
Vozes do PSD: — Ah!…
A Sr.ª Catarina Martins (BE): — … nos constrangimentos de que o Partido Socialista não abdica. Não
concordamos, mas sabemos que os passos que fomos capazes de dar juntos são a diferença entre continuar
a empobrecer ou responder pela vida das pessoas, e não faltamos à responsabilidade.
Aplausos do BE, do PS e do PCP.
A clareza de quem sempre disse ao que vem e nunca baixa os braços é a maior garantia de estabilidade
de quem não falha ao compromisso que faz.
Quem transformou linhas vermelhas em linhas laranjas para ser vice-primeiro-ministro pode não
compreender que a estabilidade radique, antes de tudo o mais, no compromisso político claro com o País.
Também essa é uma mudança que hoje fazemos e de que nos orgulhamos.
Sr.as
e Srs. Deputados, nestas eleições trabalhámos afincadamente para uma convergência o mais ampla
possível, que garanta estabilidade à vida das pessoas e que, por isso, permita uma solução de governo para a
legislatura. E foi possível. Há compromissos sobre a recuperação de rendimentos da função pública, do salário
mínimo, da reposição de pensões, do alívio fiscal de quem vive do seu trabalho, da proteção da habitação e de
cobrar impostos a quem nunca pagou e tem sempre ganho nestes anos. Compromissos com a contratação
coletiva e a proteção contra o abuso e a precariedade; compromissos com feriados e horas de trabalho;
compromissos contra privatizações, porque um país não se vende, compromissos com a escola e o Serviço
Nacional de Saúde.
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O Sr. Presidente: — Peço-lhe que conclua, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Concluo, Sr. Presidente.
Compromissos com a cultura e com a ciência, porque sem elas não há futuro.
Sr.as
e Srs. Deputados, dentro de momentos rejeitaremos o Governo do empobrecimento. Quando fizermos
essa votação, não estaremos apenas a livrar o País de um Governo que foi recusado pela maioria nas urnas,
estaremos também, e sobretudo, a concretizar a esperança dessa mesma maioria numa mudança que
responda pela vida concreta das pessoas.
Nos últimos dias, por todo o País, toda a gente discute política — o que foi, o que será. Ainda bem! Votar
deixou de ser um ritual com resultado pré definido.
O Sr. Presidente: — Peço-lhe que conclua, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Concluo já, Sr. Presidente.
A política —, ou seja, o País, as escolhas sobre a vida desta comunidade que é a nossa — é agora assunto
de todos e convoca cada um e cada uma de nós. A democracia é todos os dias e é agora.
Aplausos do BE, de pé, do PS, do PCP e de Os Verdes.
Protestos do PSD.
O Sr. Presidente: — Para encerrar o debate, em nome do Partido Socialista, tem a palavra o Sr. Deputado
António Costa.
Aplausos do PS, de pé.
Risos do PSD e do CDS-PP.
Vozes do PSD e do CDS-PP: — Levantem-se! De pé!
O Sr. António Costa (PS): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Sr. Vice-Primeiro-Ministro, Sr.as
e Srs.
Membros do Governo, Sr.as
e Srs. Deputados: A coligação PSD/CDS perdeu a maioria e está agora em
minoria nesta Assembleia da República.
Protestos do PSD.
Esta é a expressão aritmética e política da vontade de mudança que os cidadãos manifestaram nas urnas e
que nos compete, a nós, respeitar e fazer cumprir.
Aplausos do PS, do BE, do PCP e de Os Verdes.
Risos do PSD e do CDS-PP.
O Programa do Governo que nos foi apresentado não traduz esta vontade de mudança, pelo contrário, é
um programa de continuidade sem evolução. Um Programa que prossegue a austeridade para além da troica,
que defende um modelo de desenvolvimento assente no empobrecimento e na destruição de direitos, que
aposta no enfraquecimento do Estado social e na privatização dos serviços públicos, que se conforma com
uma postura submissa na União Europeia, sem se bater, na defesa dos interesses nacionais, por um reforço
da coesão e um novo impulso à convergência.
Em suma, este é um Programa do Governo que não responde à vontade de mudança dos portugueses.
Dissemos e repetimos que ninguém contasse com o PS para apoiar a continuação das políticas da
coligação PSD/CDS.
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Aplausos do PS.
Palavra dada tem de ser palavra honrada…
Protestos e risos do PSD e do CDS-PP.
O Sr. Presidente: — Sr.as
e Srs. Deputados do PSD e do CDS-PP, peço-vos que tenham o mesmo
comportamento durante intervenção do Secretário-Geral do PS que o PS teve durante as intervenções do
Primeiro-Ministro e dos vossos representantes.
Aplausos do PS.
Protestos do PSD e do CDS-PP.
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Não seja parcial!
O Sr. António Costa (PS): — Vou repetir. Dissemos e repetimos que ninguém contasse com o PS para
apoiar a continuação das políticas da coligação PSD/CDS. Palavra dada tem de ser palavra honrada e esta é
a primeira razão.
Aplausos do PS e do BE.
A coligação PSD/CDS tem menos Deputados que as restantes bancadas porque teve menos votos que os
demais partidos aqui representados. Quem colocou a maioria em minoria foram os votos livres e soberanos
dos cidadãos eleitores que elegeram os 230 Deputados que compõem a Assembleia da República.
Este é um quadro político novo. A antiga maioria deixou de ser maioria e não pode pretender continuar a
ser o que já deixou de ser.
Aplausos do PS, do BE e do PCP.
Agora, já não se basta a si própria, nem para formar governo, nem para fazer aprovar a legislação da sua
iniciativa, nem tão pouco para aqui impedir aqui a aprovação de legislação que contrarie o seu Programa.
Neste novo quadro parlamentar, a coligação PSD/CDS, para ter maioria, carece sempre de obter o apoio
ou a abstenção tolerante de pelo menos uma, de duas ou mesmo das três outras bancadas.
O ónus de criar condições estáveis de governabilidade cabia, em primeiro lugar, à força política com maior
representação parlamentar, no caso o PSD, que tem mais três Deputados que o PS.
O PSD não conseguiu mais do que renovar a coligação com o CDS. Bem sei que é exatamente o mesmo
que há quatro anos, mas com uma diferença fundamental: é que há quatro anos PSD e CDS formavam só por
si uma maioria e agora PSD e CDS estão em minoria.
Aplausos do PS, do BE e do PCP.
O PSD não foi, por isso, capaz de formar um Governo com apoio parlamentar maioritário. O que aqui nos
apresenta é um Executivo minoritário, que não criou condições de governação estável e duradoura.
Portugal precisa de estabilidade e a coligação PSD/CDS não a assegura. Por isso, este seu Governo não
serve as necessidades do País, Portugal precisa de um outro Governo.
A nossa Constituição ainda não consagra, porque o PSD nunca o permitiu, a figura da moção de censura
construtiva.
Não somos, como a coligação PSD/CDS já demonstrou ser, incapazes de construir uma solução de
maioria, mas não somos mesmo uma oposição como o PSD e o CDS já anunciaram ir ser, animada pelo
revanchismo e focada na obstrução.
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Aplausos do PS, do BE, do PCP e de Os Verdes.
Protestos do PSD e do CDS-PP.
O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Vocês são-no hoje!
O Sr. António Costa (PS): — Srs. Deputados, estavam tão ansiosos por me ouvir, agora, ouçam-me!
Aplausos do PS, do BE, do PCP e de Os Verdes.
Por isso, o PS anunciou, responsavelmente, na própria noite das eleições, que não inviabilizaria a
formação deste Governo PSD/CDS se não existissem condições para formar um Governo que fosse uma
alternativa real e credível.
Este novo quadro político é também particularmente exigente e responsabilizante para o PS e para todas
as outras forças políticas, que, opondo-se à coligação PSD/CDS, têm de assumir o ónus que o PSD se revelou
incapaz de satisfazer.
Nestas circunstâncias, os portugueses interpelam o conjunto das bancadas que se opõem à coligação
PSD/CDS: estão em condições de viabilizar a formação de outro Governo no atual quadro parlamentar? Pode
esse Governo ter a consistência que só um programa de Governo coerente assegura? Pode esse Governo
beneficiar de condições de governabilidade contra moções de rejeição ou de censura? Pode esse Governo ter
perspetivas de estabilidade ao longo da Legislatura, porque a maioria que o viabiliza também se dispõe a
apreciar conjuntamente os instrumentos fundamentais da ação governativa, como sejam os Orçamentos do
Estado em cada ano?
O Sr. António Leitão Amaro (PSD): — Com este acordo, não!
O Sr. António Costa (PS): — Hoje, já conhecemos as respostas a estas perguntas. As bancadas
parlamentares do Partido Socialista, do Bloco de Esquerda, do Partido Comunista Português e do Partido
Ecologista «Os Verdes» garantem o suporte parlamentar maioritário que permite a formação de um Governo
do PS, na coerência do seu programa de Governo, com condições de governação estável no horizonte da
Legislatura.
Aplausos do PS, do BE, do PCP e de Os Verdes.
Pela parte do PS, sabemos que não ganhámos as eleições,…
Vozes do PSD e do CDS-PP: — Ah!…
O Sr. António Costa (PS): — … mas sabemos também que não temos o direito de nos furtar à
responsabilidade de procurar assegurar a Portugal aquilo de que Portugal precisa nem de trair a vontade de
mudança daqueles que em nós votaram.
A aprovação da moção de rejeição não é a expressão de uma mera maioria negativa contra o Governo
PSD/CDS, …
Vozes do PSD e do CDS-PP: — Não!…
O Sr. António Costa (PS): — … nem conduz o País ao impasse ou à ingovernabilidade. Pelo contrário, é a
resposta construtiva que viabiliza um outro Governo, com um programa coerente, credível e consistente, com
condições estáveis de execução ao longo da Legislatura.
Aplausos do PS, do BE e do PCP.
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Nós não nos antecipámos nem impedimos aquilo que cabia ao PSD fazer; nós conseguimos cumprir aquilo
que o PSD não foi capaz de fazer.
Aplausos do PS.
Há uma alternativa com suporte maioritário a este Governo minoritário, há uma alternativa à precariedade
de um Governo sem capacidade de executar o seu Programa, há uma alternativa à instabilidade de um
Governo em contradição com a maioria que se lhe opõe, há, em suma, uma alternativa que serve Portugal.
É verdade que não seria a primeira vez que Portugal teria um Governo minoritário, mas seria a primeira vez
que se formaria um Governo minoritário contra a vontade maioritária de uma maioria parlamentar que
permitisse viabilizar um Governo alternativo.
Aplausos do PS, do BE e do PCP.
No passado, os Governos minoritários só se formaram porque as oposições, no seu conjunto, não lograram
formar um Governo alternativo…
O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Eram sempre do PS!
O Sr. António Costa (PS): — … e, no passado, os Governos minoritários só subsistiram enquanto essas
oposições não somaram o seu voto para inviabilizar a sua governação.
E esta não é também a primeira vez que diferentes forças políticas acordam entre si soluções pós-eleitorais
que viabilizem a formação de um Governo. Para não ir mais longe, foi assim que PSD e CDS formaram o seu
anterior Governo.
Protestos do PSD e do CDS-PP.
Mas já tinha sido assim com dois dos Governos de Mário Soares, com os Governos de Durão Barroso e de
Pedro Santana Lopes.
Protestos do PSD e do CDS-PP.
A principal novidade é que, desta vez,…
O Sr. António Leitão Amaro (PSD): — Os senhores perderam!
O Sr. António Costa (PS): — … e pela primeira vez, nem PSD, nem CDS concorrem para a maioria que
viabiliza o Governo a formar.
Aplausos do PS, do BE e do PCP.
Mas é também chegado o momento de perceberem, de uma vez por todas, que não gozam do direito
natural a governar e que todas as forças políticas representadas nesta Câmara gozam de igual legitimidade
para apoiar e participar nas soluções de Governo.
Aplausos do PS, do BE e do PCP.
Que, pela primeira vez, possa haver um Governo resultante de acordos parlamentares entre o PS, o Bloco
de Esquerda, o PCP e Os Verdes é, de facto, uma novidade. Uma novidade que valoriza o pluralismo
parlamentar, fortalece a democracia e enriquece as alternativas de Governo. E quero aqui saudar o sentido de
responsabilidade patriótica que o permitiu, garantindo simultaneamente a Portugal a estabilidade governativa
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de que o País carece e assegurando aos portugueses a mudança que maioritariamente disseram querer nas
últimas eleições.
Aplausos do PS, do BE e do PCP.
A política é feita de escolhas e a escolha que fazemos dá uma solução governativa ao País e mostra que,
em democracia, há sempre alternativas, sendo nosso o dever de as construir.
O que é novo é que, desta vez, as oposições foram capazes de assegurar, à partida, uma alternativa
maioritária na formação do Governo.
Acabou um tabu, derrubou-se um muro, venceu-se mais um preconceito. Aqui, nesta Assembleia da
República, somos todos diferentes nas nossas ideias, mas todos iguais na nossa legitimidade.
Aplausos do PS, do BE, do PCP e de Os Verdes.
Ninguém desconhece a identidade plural desta base parlamentar. Nenhuma destas bancadas se dispõe a
abdicar ou a disfarçar as diferenças doutrinárias e programáticas que as distinguem. A esquerda é e deseja
continuar a ser plural e diversa e, para construirmos em conjunto, nenhum de nós tem de revogar o que é
irrevogável.
Aplausos do PS, do BE e do PCP.
O Sr. Presidente: — Peço-lhe que conclua, Sr. Deputado.
O Sr. António Costa (PS): — O que permite esta solução é a capacidade que cada um teve de,
respeitando as diferenças identitárias, partilhar um conjunto de prioridades para o horizonte da Legislatura,
não com base num acordo para a fotografia, mas assente num compromisso para fazer aquilo que é
necessário.
Aplausos do PS, do BE e do PCP.
Protestos do PSD e do CDS-PP.
Vou terminar, Sr. Presidente.
Sim, é possível aliviar a asfixia fiscal da classe média, não obstante divergirmos sobre a nacionalização do
setor energético!
Sim, é possível melhorar o rendimento das famílias sem que tenhamos de partilhar a opinião sobre a
NATO!
Sim, é possível defender o Estado social, malgrado termos diferentes visões sobre a nossa participação no
euro!
Sim, é possível combater o desemprego e a precariedade laboral, apesar de pensarmos diferentemente
sobre a União Europeia!
Sim, é possível dizer que chegou o momento de romper com o radicalismo ideológico, a arrogância e a
autossuficiência que animou a governação da coligação PSD/CDS.
Este é o momento de pôr termo à governação da coligação, para abrir um novo ciclo governativo. Só assim
podemos virar a página, dando, novamente, aos portugueses um tempo de esperança e a Portugal um futuro
de confiança.
Aplausos do PS, de pé, do BE, do PCP e de Os Verdes.
O Sr. Presidente: — Para a intervenção de encerramento do debate, em nome do Grupo Parlamentar do
PSD, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Montenegro.
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O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro e Srs. Membros do Governo, Sr.as
e
Srs. Deputados: Finalmente, ouvimos o Dr. António Costa. Mas quero começar por lhe dizer que fugiu à maior
nobreza do debate democrático: o contraditório, a salutar confrontação democrática de posições. E este não
era um debate qualquer!
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. Luís Montenegro (PSD): — O Dr. António Costa preferiu as reuniões secretas com os seus novos
camaradas, preferiu cozinhar nas costas do povo e ao arrepio da vontade dos portugueses uma nova hipótese
de Governo.
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Uma aldrabice!
O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Os resultados eleitorais, o debate plural e contraditório, isso, é coisa
pouca.
Este comportamento arrogante, esta prepotência democrática, esta soberba definiu-a, em tempos, António
José Seguro. E passo a citar: «Costa é uma desilusão para os que o acharam um D. Sebastião».
Mas o Dr. António Costa lá apareceu e está cá hoje. Diz o povo «mais vale tarde que nunca». Falou para
explicar o inexplicável, falou para defender o indefensável, falou para assumir um acordo mínimo e também a
irresponsabilidade máxima. Mas, em política, não se pode fugir ao escrutínio da autenticidade, da
democraticidade, da sustentação das escolhas e da coerência.
O Dr. António Costa perdeu as eleições, mas quer ser Primeiro-Ministro. Será coerente? Os portugueses
perguntam-se: será coerente esta vontade do Dr. António Costa?
Esqueçamo-nos, por momentos, das tradições e das convenções da nossa democracia. Vejamos o próprio,
o político, o aspirante a Primeiro-Ministro.
Em 26 de maio de 2014, disse: «Nas legislativas, o PS não pode ter uma vitória que sabe a pouco. Para
ganhar eleições em condições de governabilidade, ao PS não basta ganhar por um voto. O PS tem de crescer
muito.» — citei António Costa.
Ora, um ano e meio depois, o PS não teve uma vitória que soube a pouco; perdeu! Não ganhou por um
voto, perdeu por mais de 340 000 votos! Não cresceu muito; cresceu 1% neste período, quando, em igual
período, a coligação do PSD/CDS-PP cresceu 11,5%.
Onde está a coerência do Dr. António Costa?
«Palavra dada é palavra honrada!»
Risos e aplausos do PSD e do CDS-PP.
Em 9 de setembro de 2014, disse: «Eu não quero ser desagradável, mas há um equívoco na leitura que
fazes do resultado das europeias. Toda a gente percebeu que dificilmente o PS ganharia as legislativas. Se o
PS tivesse tido o resultado que eu desejava, não dava este passo» — disse António Costa para António José
Seguro.
Ó Dr. António Costa, eu também não quero ser desagradável, mas veja o ridículo do seu equívoco agora! A
gente não percebeu que o PS dificilmente ganharia. Toda a gente percebeu, o povo votou, e o PS perdeu
mesmo! Que passo dá o Dr. António Costa, agora?!…
Mas, vamos dar mais um salto, vamos até 29 de março de 2015, ao Teatro Rivoli, no Porto. Disse António
Costa: «Quando o PS apela a uma maioria «não o faz pela mesquinha vontade de ter mais Deputados do que
os outros; fá-lo porque quer que o Governo seja formado por decisão dos portugueses e não por jogos
políticos na Assembleia da República».
Vozes do PSD e do CDS-PP: — Oh!…
O Sr. Luís Montenegro (PSD): — «Palavra dada, palavra honrada»!
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Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Que «pérola» da incoerência política! Foi o Dr. António Costa que o disse e é o Dr. António Costa que está
a fazer o contrário! É esta a sua credibilidade?!
Já agora, vamos também a 9 de abril de 2015, quando disse: «Não podemos deixar nem aos jogos
partidários nem à vontade do Presidente da República a escolha do novo Governo. No País de Abril, quem
vota e quem escolhe os Governos é o povo e vai ser o povo a escolher o próximo Governo.»
Deixem-me dizer, simpaticamente: Elementar, meu caro Costa, é o povo que escolhe o Governo.
Risos de Deputados do PSD.
É, aliás, da ética republicana — que tantas vezes invocam aqui! Ou não é, Srs. Deputados do Partido
Socialista?
«Palavra dada é palavra honrada!»
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
E, sobre os novos «camaradas de viagem», vamos mais perto, só há dois meses, ao dia 4 de setembro.
Disse António Costa: «Quem ouvir o PCP e o Bloco de Esquerda percebe que os dois partidos só têm um
objetivo — combater o Partido Socialista. São meros partidos de protesto. Querem estar nas manifestações,
mas não no Governo, a resolver o problema das pessoas». É mais ou menos o que está a acontecer por estes
dias, na tal palavra dada que é a palavra honrada.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
E disse também: «Há uma radical diferença entre o PS e a dupla PCP/Bloco de Esquerda, que tem a ver
com a Europa: para nós a Europa e o euro são inegociáveis». Portanto, alguém capitulou, neste domínio,
alguém perdeu de vista as suas convicções.
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Exatamente!
O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Para terminar estas citações, vamos, por assim dizer, à mais «costista»
das palavras, numa derradeira citação: a palavra «poucochinho».
Estamos, ainda mais perto do dia de hoje, foi em Odivelas, a 19 de setembro de 2015: «Para que haja
estabilidade, é necessário que não ganhemos por poucochinho, porque, como já disse uma vez, quem ganha
por poucochinho só pode fazer poucochinho. Precisamos de uma vitória clara que seja inequívoca, que nos dê
uma maioria».
É António Costa que o diz: «Quem ganha por poucochinho só pode fazer poucochinho». E o País pergunta:
então, se é assim, quem perde por muito o que é que pode fazer?
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Arranjinhos à la carte? É isso que pode fazer?
Vozes do CDS-PP: — Uma golpada!
O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Ficar refém de programas despesistas, ideologicamente fanáticos? É
isso que pode fazer?
Sr.as
e Srs. Deputados: O PS vai derrubar o Governo que ganhou porque quer ser o Governo que perdeu.
Que oposição mais bota-abaixista pode haver maior do que esta, Dr. António Costa? Estava, há pouco, a
querer antecipar aquilo que poderá ser hipoteticamente a oposição do PSD e do CDS? Mas já viu a sua
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oposição? Nem um dia de execução do Programa do Governo e já está a deitar abaixo o Governo? E veio
aqui invocar os exemplos de 2002 e de 2011 como se fossem similares?!
Já ontem tive a ocasião de lhe dizer — o Sr. Deputado não quis participar no debate e, portanto, não
pudemos cruzar posições — que é de facto, confundir o inconfundível. É que há uma outra coisa que o Sr.
Deputado não disse, ou seja, que todos os Governos minoritários, até agora, não foram derrubados com a
aprovação de moções de rejeição, e nenhum Governo do Partido Socialista teve o PSD a fazer aquilo que o
Sr. Dr. António Costa e o Partido Socialista estão, hoje, a fazer a este Governo, legitimado nas urnas.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Nunca aconteceu, nunca aconteceu! Perguntem a Mário Soares! Perguntem a António Guterres! E
perguntem, mesmo, a José Sócrates!
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
O essencial deste debate, Srs. Deputados, é, portanto, simples ou relativamente simples: havia um líder
que era para ganhar eleições por muito, «muitinho», porque o anterior ganhava por «poucochinho». Depois,
perdeu, perdeu por muito.
Risos de Deputados do PSD.
E, qual náufrago político, estava a ir ao fundo, a afogar-se no mar e na viagem que ele próprio escolheu.
Eis senão quando avistou duas boias. A distância para as boias era enorme, programaticamente era mesmo
quase irrecuperável. E, por isso, aquilo que nós hoje aqui temos, neste dia, não é um acordo tripartido, não é
um Governo formado a três, com membros do Governo de todos os partidos. Aliás, nem é um acordo, parece
que é uma posição política comum, que é, agora, um novo conceito.
Mas há uma coisa que é inequívoca: esta solução é frouxa, é incoerente, está carregada de imprecisões,
de incompatibilidades, de incertezas.
Até porque havia um outro problema: é que a salvação não era possível só com uma boia. Uma boia não
chegava, eram precisas as duas. E, por isso, os portugueses, admitindo-se constitucionalmente a solução,
ainda poderiam pensar: bom, mas se eles se juntarem os três, se eles tiverem um programa único, se eles
forem os três para o Governo, talvez possam dar garantias de execução do seu programa.
Mas, não, não foi nada disso que aconteceu!
Até para a apresentação das moções de rejeição tiveram que apresentar cada um a sua. E, assim, este
«afogado político» teve de agarrar-se às duas boias, com uma pequena grande questão: é que vai ser
obrigado a seguir o caminho que essas boias lhe indicarem, porque, no dia em que não tiver o apoio de uma
das boias, não vai ter salvação na maioria parlamentar.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Claro que esta é uma escolha, é uma escolha firme, e os Srs. Deputados do PCP e do Bloco de Esquerda,
quais boias salvadoras, estão aqui para garantir que a boia não se vai furar. Nós vamos ver e vamos aguardar.
Mas, Sr.as
e Srs. Deputados, no encerramento deste debate, eu gostava de dizer também, de forma muito
clara e frontal, que hoje, nesta Assembleia da República, assistiremos à adulteração da vontade popular
expressa nas últimas eleições legislativas.
Vozes do PS: — Oh!…
O Sr. Luís Montenegro (PSD): — O PSD e o CDS governaram quatro anos, e, com os portugueses,
retomámos o crescimento a e a criação de emprego, prestámos contas, fomos a votos e ganhámos,
claramente, as eleições.
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Trouxemos para aqui um Programa, sim, de continuidade, e, sim, para continuar a transformar Portugal, já
não num contexto de emergência, mas num contexto de crescimento que é o atual.
O Sr. João Oliveira (PCP): — É o crescimento para baixo!
O Sr. Luís Montenegro (PSD): — A nossa economia está a crescer, as nossas contas públicas estão
equilibradas, o desemprego está a diminuir,…
Protestos do Deputado do PCP João Oliveira.
… sem demagogias, com realismo!
Trata-se de um Programa que assegura a saúde financeira do Estado, que combate as desigualdades
sociais, que quer modernizar a Administração Pública, que quer cumprir as nossas principais obrigações
internacionais e europeias. Um Programa que quer preservar o Estado social e quer dar, cada vez mais, uma
oportunidade a todos os portugueses para fazerem vingar o seu projeto de vida pessoal e profissional.
Os portugueses sabem que o caminho dos últimos anos foi de grande esforço, e estou convencido de que
não querem, de maneira nenhuma, desperdiçá-lo!
Os portugueses sabem que se hoje invertermos este caminho a responsabilidade é de quem vai aprovar as
moções de rejeição, mas é, em particular, do maior partido da oposição.
Quero, em nome do PSD, afirmar aqui, mais uma vez, que não vamos abandonar Portugal.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Não fomos nós que dividimos os portugueses entre «o nós» e «o eles».
Não fomos nós, repito, que dividimos os portugueses entre «o nós» e «o eles»!
Temos muito respeito pelo esforço e pelo sacrifício das pessoas!
Temos respeito por quem ainda não tem emprego!
Temos respeito também por quem, na sociedade, nas empresas, nos serviços públicos, nas instituições de
solidariedade social constrói a força de um País justo, solidário e ambicioso!
Um futuro Governo liderado pelo PS, se existir, não é de facto, fruto da vontade popular.
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Não!…
O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Mas os portugueses sabem quem impediu este Governo legítimo de
governar e, naturalmente, no momento próprio, não vão deixar de atribuir essa responsabilidade.
Hoje, derruba-se o Governo do povo.
Risos do PS, do BE e do PCP.
Talvez venha a haver um Governo de alguns Deputados, mas hoje derruba-se o Governo que o povo
escolheu.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Os vossos Deputados foram escolhidos pelo povo. E os nossos não?
O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Quero terminar dizendo que nenhuma, mas nenhuma mesmo, jogada
parlamentar derrubará as nossas convicções e as nossas responsabilidades.
Aplausos do PSD e do CDS-PP, de pé.
O Sr. Presidente: — Em nome do Governo, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.
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O Sr. Primeiro-Ministro (Pedro Passos Coelho): — Sr. Presidente da Assembleia da República, Sr.as
e
Srs. Deputados: Ao encerrar, pela parte do Governo, este debate do Programa do Governo, quero começar
por destacar que o Governo se apresentou a esta Câmara com um Programa que é de coerência.
Houve quem lhe tivesse chamado de continuidade. Na verdade, o Governo não mudou nem de atitude,
nem de posição. O que mudou foram os problemas e a situação do País. E mudaram bem, porque mudaram
em razão da ação a que procedemos durante quatro anos.
Disse-o na abertura desta discussão ontem e foi realmente com ansiedade e angústia que iniciámos o
nosso mandato em 2011. O País estava à beira da bancarrota, tinha, durante quase 10 anos, duplicado a sua
dívida externa e o Estado tinha as contas descontroladas, não conseguindo ter acesso a financiamento e, por
isso, não conseguindo fornecer o que era indispensável para cumprimento das suas obrigações externas e
internas.
Por isso mesmo, começámos o nosso mandato a executar um Memorando de Entendimento que não foi
por nós negociado,…
O Sr. João Oliveira (PCP): — Não?!
O Sr. Primeiro-Ministro: — … mas que foi por nós concluído.
Hoje, esse Programa de coerência com que nos apresentamos ao Parlamento evidencia a recuperação das
finanças públicas e a recuperação da economia, evidencia o equilíbrio externo que persiste há três anos e
exibe o desendividamento progressivo quer do Estado, quer dos privados.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Como é que pode dizer uma coisa dessas?!
O Sr. Primeiro-Ministro: — Temos, hoje, uma taxa de desemprego inferior àquela que conhecemos
quando iniciámos funções em 2011. Em virtude disso, criámos condições para defender e até reforçar o
Estado social. E já aqui o disse: o Estado social que não é financiável por um Estado falido ameaça todos os
portugueses.
Os portugueses, hoje, sabem que podem confiar no seu Estado social porque se esforçaram muito e
sacrificaram muito para que esse Estado social fosse defendido.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Tivemos também a possibilidade de defender o serviço público e aproveito para recordar aqui que, apesar
de haver, ao fim de todos estes anos, quem confunda serviço público com propriedade pública, na verdade
nunca os confundimos e sempre defendemos o interesse público e o serviço público, mesmo quando fizemos
privatizações em Portugal.
Aplausos do PSD e do CDS-PP
O Programa com que nos apresentámos é, portanto, um Programa que pode atacar problemas sérios que
subsistem com outro domínio de possibilidades. Quando colocámos uma nova prioridade na ação política do
Governo, sabíamos que não era possível realizar tudo em quatro anos e que havia mesmo instrumentos que
não estavam disponíveis quando iniciámos esse caminho há quatro anos.
Não temos, portanto, em Portugal, à nossa frente, nestes quatro anos, o quadro negativo de que partimos
em 2011. O nosso Programa reflete a obediência à estabilidade e à responsabilidade para com os sacrifícios
que os portugueses fizeram, e que lhes pedimos, e, ao mesmo tempo, apresentámo-lo de uma forma
antidemagógica, de uma forma não eleitoralista, enfim, de uma forma determinada e realista.
A oposição, devo dizer, as oposições foram derrotadas por estes factos. Não esqueço que ao longo destes
quatro anos as oposições profetizaram que não cumpriríamos as nossas metas, que não conseguiríamos
evitar um segundo resgate, que não conseguiríamos sobreviver à emergência financeira e económica e que
iríamos colapsar numa emergência social. E nada disto aconteceu em Portugal nestes quatro anos!
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Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Mas a oposição não foi apenas derrotada pelos factos,…
O Sr. João Galamba (PS): — Factos que o Sr. Primeiro-Ministro inventa!
O Sr. Primeiro-Ministro: — … foi também derrotada nas eleições. Quem considera que a oposição
ganhou pressupõe que ela se apresentou com uma unidade que ela não tem.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Outra vez esta história?!
O Sr. Primeiro-Ministro: — E, de facto, não há unidade nas oposições derrotadas nas eleições. Basta
olhar o programa de cada uma das oposições e ver o quão incompatível entre si é esse conjunto de
programas.
Quando agora se propõem derrubar o Governo que ganhou as eleições, como, de resto, ficou bem patente
ao longo deste debate, as oposições só manifestaram um propósito, um único propósito: reescrever o
resultado eleitoral e converter uma soma de derrotas numa maioria negativa para afastar o Governo que
ganhou as eleições.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
E, até agora, essa maioria negativa ainda não passou disso mesmo, ou seja, de uma maioria negativa.
Evidentemente, esta circunstância só se apresenta possível porque essa é a vontade do Partido Socialista.
Isto é iniludível. De facto, não é a vontade do Partido Comunista Português, do Partido Ecologista «Os
Verdes» e do Bloco de Esquerda que determinarão o chumbo deste Programa. Estes partidos não fizeram
outra coisa durante os últimos quatro anos que não fosse pedir a demissão de um Governo de maioria
absoluta.
Realmente, o resultado democrático nunca impediu estes partidos de desrespeitarem a vontade popular, a
não ser que a vontade popular fosse a sua própria.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Setecentas mil vontades populares!
O Sr. Primeiro-Ministro: — O PS, portanto, faz aqui a diferença. O PS afirmou com antecedência que
apresentaria uma moção de rejeição do Programa do Governo e que viabilizaria essa rejeição, depois de ter
dito que só o faria se tivesse uma maioria alternativa, uma maioria estável, duradoura e consistente, maioria
essa que ainda não apresentou, até este momento, nenhuma solução política que garanta estabilidade.
O Sr. António Costa (PS): — Ora essa!
O Sr. Primeiro-Ministro: — E foi penoso ouvir o Secretário-Geral do Partido Socialista explicar ao País, ao
fim de tantas semanas depois das eleições, que a plataforma de que dispõe para derrubar este Governo nem
sequer salva ou garante o Governo que aí vem de uma maioria que o derrote neste Parlamento, porque nem
sequer tem garantido um acordo que inviabilize a rejeição do seu Governo, no futuro.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Protestos da Deputada do PS Isabel Alves Moreira.
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Por que razão procede assim, então, o Partido Socialista? Atrevo-me a dizer, do que ouvimos no debate,
que as diferenças que foram assinaladas face ao Programa do Governo e que justificariam um chumbo do
próprio Governo são, em muitos aspetos, ou artificiais ou propositadamente empoladas. É verdade que
também há diferenças sensíveis em algumas matérias económicas e essas diferenças são saudáveis, mas
não justificam só por si o derrube de um Governo que tenha saído das eleições.
O Partido Socialista veio aqui falar-nos, então, de austeridade, justificando com a política de austeridade a
necessidade de derrubar este Governo, mas parece-me que a questão da política de austeridade é uma falsa
questão. De facto, foi um Governo do Partido Socialista que começou em Portugal por cortar salários, congelar
pensões, subir impostos, criar contribuições extraordinárias, propor cortes em pensões em pagamento
equivalentes aos que se aplicaram em salários, acabar com prestações de abono de família, entre muitas
outras.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Isto a que hoje o Partido Socialista chama «o radicalismo e o abandono do centro» foi iniciado pelo Partido
Socialista ainda em 2010.
Vozes do PSD e do CDS-PP: — Muito bem!
O Sr. Primeiro-Ministro: — Então, devemos dar razão ao Partido Socialista? É esta uma política de
radicalismo que nos afasta do centro político? Devo dizer que não. De facto, estas medidas e estas políticas
que o Partido Socialista iniciou não foram mais do que a consequência da irresponsabilidade do Governo que
liderou durante seis anos.
A verdade é que o Partido Socialista teve de adotar todas estas medidas depois de ter, desde 2005,
conduzido a política nacional, em primeiro lugar, com uma maioria absoluta e, depois, com uma minoria
parlamentar sustentada pelos outros partidos neste Parlamento.
Então, se é assim, por que escolheu o Partido Socialista agora chumbar o Governo, inviabilizando o seu
Programa?
Parece-me evidente que o Partido Socialista recusou associar-se à maioria maior desta Câmara e do País,
que é uma maioria de matriz europeia, e preferiu juntar-se às minorias que o têm combatido desde sempre e a
quem, que se saiba, não o ligam quaisquer laços importantes quer em matérias de fundo, quer em matérias de
soberania. Aliás, convém recordar que o que de mais estruturante o Portugal democrático fez foi feito, seja ao
nível das revisões constitucionais, seja ao nível da adesão à União Europeia, contra essas minorias e com o
Partido Socialista, com o Partido Social Democrata e com o CDS-PP.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
E foi assim, evidentemente, porque aqueles que sempre combateram o Partido Socialista sempre se
colocaram fora desse consenso em matéria nacional. E, a menos que o atual Partido Socialista nos venha
revelar proximamente diferenças essenciais na sua matriz programática, nós não podemos concluir outra coisa
que não seja, o que é legítimo supor, que o que move a liderança do Partido Socialista, hoje, não é senão o
apetite pelo poder.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
O que o PS nos oferece como explicação não é convincente. Conforme está prometido, se vier a derrubar,
hoje, este Governo por vontade do Partido Socialista é bom não esquecer que essa vontade se formulou não
porque o Partido Socialista tivesse sido ostracizado, mas porque fez uma escolha radical.
Quando propus ao Dr. António Costa que se associasse a esta maioria maior, até integrando-a, se fosse
caso disso, no Governo, fi-lo diretamente por achar que isso era importante para o futuro do País. Ao ter
recusado essa proposta para dizer ao Sr. Presidente da República: «Não perca tempo a nomear este
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Governo, que não tem estabilidade», poderia ter acrescentado: «Não tem estabilidade porque eu não estou
disponível para lha conferir».
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Mas, então, Sr.as
e Srs. Deputados, Sr. Presidente da Assembleia da República, se esta maioria negativa
que hoje se propõe derrubar o Governo o fizer, ela tem moralmente a obrigação de se converter numa maioria
positiva. É assim que ela deve ser conduzida, com sentido de responsabilidade perante o Sr. Presidente da
República. O que conhecemos hoje, dos acordos políticos que foram realizados, não sustenta essa visão de
maioria positiva.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Se fosse, como diz o líder do Partido Socialista, pedra de toque para avaliar a estabilidade de um governo
pôr questões fundamentais de lado, metê-las na gaveta ou em suspenso, para não inviabilizar o derrube de
um governo nem a posse do seguinte, se para isso bastasse um processo de consultas antes que moções de
censura sejam apresentadas ou que orçamentos venham a ser apresentados, por que razão não estaria o
Partido Socialista disposto a oferecer esse mínimo de condições a quem ganhou as eleições?
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
O que se passará, então, neste Parlamento, não é normal. Nunca foi normal em 40 anos e não pode ser
entendido como normal por ninguém. Os representantes do povo no Parlamento não têm uma missão
mandatória estrita,…
O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Muito bem!
O Sr. Primeiro-Ministro: — … podem sempre interpretar o voto do povo. Sempre defendi que o mandato
representativo não é limitado nem mandatório e, às vezes, é mesmo preciso interpretar a nossa representação
em função daquilo que entendemos ser o mais adequado. Por isso, respondemos perante aqueles que
representamos nas eleições, mesmo quando podemos ou devemos ir contra aquilo que parece ser a vontade
de quem nos escolheu, mas temos de concordar na audácia de fazer uma tão rápida reinterpretação da
vontade popular, quando as eleições tiveram lugar ainda há algumas semanas no País.
Portanto, a reinterpretação que está a ser feita significa, ao contrário do que é normal e do que foi normal
em 40 anos, que o Partido Socialista, em função da sua ambição de poder, não se importa de revogar o
mandato que foi conferido a este Governo nas eleições para que ele próprio possa assumir as funções de
Governo.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Mas, então, há realmente um imperativo de clarificação que devemos respeitar. Que fique muito claro: não
só esta maioria negativa tem ainda de evoluir mais para poder ser uma verdadeira maioria positiva — o que
vimos, até hoje, não é uma maioria positiva —, mas tem também de ser suficiente. Esta maioria que derruba
hoje o Governo está, de facto, obrigada à suficiência parlamentar, seja para a ação e a atividade corrente do
Governo, seja para as questões maiores de governação e que são indispensáveis a qualquer governo, a
saber, Orçamentos do Estado, apresentação de programas de estabilidade, execução de reformas estruturais,
cumprimento de regras europeias e de tratados internacionais.
O Sr. António Leitão Amaro (PSD): — É isso mesmo!
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O Sr. Primeiro-Ministro: — Quem hoje votar pelo derrube do Governo legítimo não tem legitimidade para
mais tarde vir reclamar sentido de responsabilidade, de patriotismo ou de europeísmo a quem hoje se negou
todos estes atributos.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Não há, aqui, Sr.as
e Srs. Deputados, ao contrário do que há pouco ouvi, nenhum revanchismo,…
Risos do PCP.
… o que há é uma questão de ética, e de ética republicana também.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Espero que as circunstâncias que se vão seguir a esta votação não venham confirmar aquilo que vai sendo
avançado nas notícias, isto é, de que dela emergirá um Governo minoritário do Partido Socialista, apoiado por
três minorias parlamentares radicais que sempre combateram o Partido Socialista. Porque assim se
confirmaria, se acontecesse, que, na visão da democracia do Secretário-Geral do Partido Socialista, só
governos minoritários socialistas é que podem ser admissíveis dentro da Casa da democracia. Se não forem
do Partido Socialista, a eles se deve exigir a maioria absoluta.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados, não acredito na coesão desta nova maioria que se anuncia.
Desconfio que o País também não. Falta-lhe identidade, falta-lhe cimento.
A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Vocês acabaram com a Cimpor!
O Sr. Primeiro-Ministro: — Por isso, o que se anuncia é, realmente, um Governo minoritário e que se
constitui em cima de uma soma de vontades minoritárias e, como sabemos, a soma das partes é sempre
diferente do todo. E o todo do Governo que está a pré-anunciar-se, neste caso, não vai além da soma das
partes, permanece aquém da soma das partes.
Desconfio também do que se está a prometer e, sobretudo, de que o prometido seja compatível com as
nossas obrigações europeias e com o interesse próprio de tirar o País da pressão da dívida e do défice, sem o
que não é possível aliviar a pressão dos impostos e atrair investimento que sustente crescimento e emprego,
como até aqui.
Sei, por experiência própria, e não apenas dos livros, que ganhar autonomia financeira e política não se faz
lançando dúvidas sobre a capacidade de cumprir. E, como, de resto, o que se promete hoje em matéria de
alívio fiscal ou de rendimentos tem sempre um preço, porque, se o não tivesse, todos nós, hoje, estaríamos a
fazer as mesmas promessas, cá aguardaremos pela fatura correspondente.
É evidente que o que podemos aliviar agora resulta do esforço duro que fizemos nestes anos. Espero que
o que nos prometem agora para futuro não se tenha de pagar em dobro amanhã.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. Primeiro-Ministro: — Como disse o Governador do Banco de Portugal, os erros de política
económica que se fizerem agora serão pagos com mais dor no futuro. E não será apenas assim…
O Sr. João Galamba (PS): — Foi encomendado para o seu discurso?!
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O Sr. Primeiro-Ministro: — Eu sei que o Sr. Deputado tem sempre grande consideração e respeito pelas
figuras da democracia portuguesa e pelo Sr. Governador do Banco de Portugal… Eu respeito-os sempre,
independentemente das minhas simpatias.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Mas, como diz o Governador do Banco de Portugal, se os erros de política económica que se fizerem hoje
pagam-se com mais dor no futuro, a verdade é que foi sempre assim no passado, não é só no futuro que será
assim, foi sempre assim no passado e, infelizmente, preservamos boa memória desse passado — ou má
memória, em melhor razão.
De resto, ainda não iniciou funções um tal governo e já temos a desconfiança dos investidores a expressar-
se no anormal alargamento dos spreads da dívida pública e nos credit default swaps, que medem, justamente,
o risco de incumprimento da dívida pública.
Concluo, Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados, dizendo que, no que me diz respeito, no que nos diz
respeito, não estamos nem nunca estivemos agarrados ao poder.
Vozes do PS e do PCP: — Ah!
O Sr. Primeiro-Ministro: — Temos, do poder, uma noção de serviço e, portanto, que deceção para as
oposições deleitar-se com uma ideia falsa, que é a de que nos custará muito sair do Governo. Não é todos os
dias que se sai do Governo com o voto do eleitorado.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Poucos políticos se poderão orgulhar dessa circunstância. Nós cá estaremos a lutar por Portugal, como, de
resto, estamos habituados a fazer, em coerência e fiéis aos nossos princípios. Sempre disse que não
abandonava o meu País, e não o abandono. Se não me deixam lutar por ele à frente do Governo, como
quiseram os eleitores, lutarei no Parlamento, por que me orgulho de ter muito respeito.
Aplausos, de pé, do PSD e do CDS-PP.
O Sr. Presidente: — Obrigado, Sr. Primeiro-Ministro.
Srs. Deputados, vamos passar à votação da moção de rejeição n.º 1/XIII (1.ª) — Do Programa do XX
Governo Constitucional (PS).
Esta é uma votação com recurso a voto eletrónico e, portanto, para os Srs. Deputados que não estão
familiarizados com o sistema, vou tentar, rapidamente, explicar: as Sr.as
e os Srs. Deputados que quiserem
votar contra a moção de rejeição levantam-se quando eu perguntar «quem vota contra» e pressionam a tecla
vermelha, que é o «não»; os que quiserem abster-se levantam-se quando eu perguntar «quem se abstém» e
pressionam a tecla branca, que é a da «abstenção»; e os que quiserem votar a favor da moção de rejeição
levantam-se quando eu perguntar «quem vota a favor» e pressionam a tecla verde, que é o «sim».
Mas, primeiro, vamos proceder à verificação de quórum, apesar de sabermos que existe. Peço aos Srs.
Deputados que tiverem problemas em se registar no sistema eletrónico que informem a Mesa desse facto,
para que os serviços possam corrigir alguma falha.
Pausa.
Srs. Deputados, penso que podemos passar à verificação de quórum, utilizando os meios eletrónicos, pois
não podemos esperar mais tempo.
Pausa.
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O quadro eletrónico regista a presença de 220 Deputados, dos quais 86 são do PSD, mas suponho que
estejam mais do que 86 Deputados na Sala… Dizem-me que há três Srs. Deputados do PSD que não
conseguiram registar-se.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Peço a palavra para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr. Presidente, como julgo que é fácil de contar, estão presentes 15
Deputados do PCP e, no resultado da verificação de quórum, só aparecem 13 e julgo que todos fizeram o
registo eletrónico.
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Sr. Presidente, peço a palavra também para uma interpelação à
Mesa.
O Sr. Presidente: — Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Sr. Presidente, é notório e fácil de perceber que estão presentes os
18 Deputados do CDS-PP. Simplesmente, os Srs. Deputados João Rebelo, Manuel Isaac e, creio, Filipe Lobo
d’Ávila não conseguiram registar-se no sistema eletrónico. Por isso, ou repetimos ou, então, contamos com a
presença deles, que é pública e notória. É como o Sr. Presidente entender.
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, penso que podemos proceder à votação — já se viu que há quórum
de votação —, esperando que os problemas eletrónicos sejam, entretanto, solucionados.
O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Sr. Presidente, a bancada do PSD regista, na verificação de quórum,
86 Sr.as
e Srs. Deputados e pelas informações que temos estão presentes os 89 Deputados.
De qualquer forma, tratando-se de uma votação que é especial e que, além disso, carece de maioria
absoluta dos Deputados em exercício de funções ou repetimos a verificação de quórum para que todos
possam registar-se, o que nem sempre acontece por força dos problemas informáticos, ou, então, a votação
terá de ser nominal ou por fila para que se possa verificar que cada um dos Srs. Deputados pôde exercer o
seu direito de voto, tanto mais quando se trata de uma matéria como esta.
Sr. Presidente, esta é a sugestão que a bancada do Partido Social Democrata faz.
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, vamos, então, tentar, de novo, proceder ao registo de todos os Srs.
Deputados. Peço aos serviços que voltem a pôr o sistema a zeros, para que se possa recomeçar o processo
de registo dos Srs. Deputados.
Pausa.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: — Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr. Presidente, julgo que no Grupo Parlamentar do PCP o problema está
identificado. O sistema eletrónico não regista o Sr. Deputado Francisco Lopes e a Sr.ª Deputada Rita Rato
aparece associada ao Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda, o que é manifestamente incorreto.
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Risos.
A Sr.ª Ana Catarina Mendonça (PS): — Sr. Presidente, peço a palavra.
O Sr. Presidente: — Faça favor, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Ana Catarina Mendonça (PS): — Sr. Presidente, pedi a palavra para dizer que os Srs. Deputados
José Manuel Carpinteira e Maria Antónia Almeida Santos, apesar de estarem no Hemiciclo, não conseguem
fazer os seus registos. Mas temos presentes os 86 Deputados.
O Sr. Presidente: — Há vários Srs. Deputados que não conseguem registar-se eletronicamente, mas
vamos proceder à votação.
O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Sr. Presidente, peço a palavra.
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado Luís Montenegro, faça favor.
O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Sr. Presidente, numa interpelação à Mesa, para tentar ajudar a
solucionar este problema, porque se há dia em que estas imperfeições informáticas não podem deixar margem
para dúvidas, para interesse de todos os que querem aprovar e os que querem rejeitar a moção ou as moções
que vão a votação, é hoje, sugiro, creio que não é difícil, que se faça uma votação por fila. São seis filas, são
seis contagens, é só somar os votos a favor, os votos contra e as abstenções e proclamar o resultado. É a
forma mais fácil de ultrapassar esta dificuldade informática e de termos uma votação fidedigna, face à
presença de Deputados na Sala.
O Sr. Presidente: — Obrigado pelo seu contributo, Sr. Deputado Luís Montenegro. Penso que essa é uma
boa solução.
Vamos, então, proceder à votação, por fila, da moção de rejeição n.º 1/XIII (1.ª) — Do Programa do XX
Governo Constitucional (PS), sendo que a sua aprovação exige maioria absoluta dos Deputados em
efetividade de funções.
Submetida à votação, obteve os votos da maioria absoluta dos Deputados em efetividade de funções,
tendo-se registado 123 votos a favor (86 do PS, 19 do BE, 15 do PCP, 2 de Os Verdes e 1 do PAN) e 107
votos contra (89 do PSD e 18 do CDS-PP).
Aplausos, de pé, do PS, do BE, do PCP e de Os Verdes.
A solicitação dos partidos que entregaram outras moções de rejeição, considera-se que o objetivo da
primeira moção de rejeição completa este exercício e que não vale a pena votar mais três moções de rejeição.
Assim sendo, as consequências políticas são estas: a moção de rejeição foi aprovada e, consequentemente,
de acordo com o artigo 217.º do Regimento da Assembleia da República — Rejeição do programa do Governo
e voto de confiança —, n.º 6, o Presidente da Assembleia da República comunicará ao Presidente da
República, para efeitos do artigo 195.º da Constituição, a aprovação desta moção de rejeição. O artigo 195.º
da Constituição é o artigo sobre a demissão do Governo.
Os grupos parlamentares, querendo, dispõem de 5 minutos para produzir declarações de voto.
Pausa.
Não havendo pedidos de palavra, o Sr. Secretário, Deputado Duarte Pacheco, vai proceder à leitura do
expediente.
Tem a palavra.
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11 DE NOVEMBRO DE 2015
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O Sr. Secretário (Duarte Pacheco): — Sr. Presidente e Srs. Deputados, deram entrada na Mesa, e foram
admitidos, os projetos de lei n.os
24/XIII (1.ª) — Determina o cancelamento e a reversão do processo de fusão
da Rede Ferroviária Nacional (REFER, EPE) com a EP — Estradas de Portugal, SA, e sua transformação na
sociedade anónima com a denominação Infraestruturas de Portugal, SA (PCP) e 25/XIII (1.ª) — Determina o
cancelamento e a reversão do ajuste direto e do processo de «subconcessão» a privados da STCP e Metro do
Porto (PCP).
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, terminados os nossos trabalhos, informo que a próxima sessão
plenária terá lugar amanhã, pelas 15 horas, tendo como ordem do dia a apreciação e votação do projeto de
deliberação n.º 1/XIII (1.ª) — Elenco e composição das comissões parlamentares permanentes (Presidente da
AR).
Está encerrada a sessão.
Eram 17 horas e 20 minutos.
———
Declaração de voto enviada à Mesa, para publicação, relativa ao Programa do XX Governo Constitucional
Após o encerramento do debate sobre o Programa do Governo da coligação Portugal à Frente e a
consequente apresentação da primeira moção de rejeição apresentada no Parlamento, o PAN — Pessoas-
Animais-Natureza apresenta uma declaração de voto.
O sentido de voto teve como primeiro critério de decisão as causas e valores do partido, recordando que o
PAN não se revê nos enquadramentos deterministas à esquerda, centro ou direita — os quais serão sempre
reducionistas — e que este voto prende-se exclusivamente com a análise das propostas do atual Programa do
Governo, à luz daqueles que são os princípios que organizam as causas e valores do PAN.
Apesar da proteção animal ter merecido uma nova atenção no Programa apresentado pelo Governo, o
PAN identificou várias lacunas, omissões e pontos nos quais o partido não se revê.
Foram colocadas no momento de debate oito perguntas concretas pelo PAN com o objetivo de obter
respostas claras, o que, infelizmente, não aconteceu. O Sr. Primeiro-Ministro não respondeu à nossa pergunta
sobre a inclusão das terapias não convencionais no Serviço Nacional de Saúde (SNS), nem à nossa questão
sobre organismos geneticamente modificados (OGM), o mesmo acontecendo com o pedido de esclarecimento
que fizemos sobre a eventual privatização do sector das águas.
Questionámos ainda o Sr. Primeiro-Ministro sobre o estatuto jurídico dos animais, deixando de os
considerar como coisas, bem como da possibilidade de dedução das despesas médico-veterinárias em sede
de IRS. As respostas aqui prestadas limitaram-se a remeter para o quadro vigente (das despesas gerais),
equiparando os animais de companhia a outros artigos do quotidiano, como, por exemplo, relógios de pulso ou
peças de vestuário.
Nestes dias de discussão do Programa, verificou-se uma evidente ausência de resposta por parte do
Governo quanto às questões relacionadas com o impacto da violência a que as crianças estão sujeitas
aquando da participação e assistência em espetáculos de tauromaquia.
Pedimos também esclarecimentos sobre as propostas para procurar o problema do desemprego estrutural
e tecnológico, que se reporta a cerca de 1 milhão de portugueses que se encontram excluídos do mercado de
trabalho de forma permanente.
Foram também colocadas questões que demostram as nossas reservas quanto ao modo como o Programa
do Governo pretende mitigar o problema das emissões de gases de efeito de estufa, mais especificamente
relacionados com o controlo das emissões de metano, cujo impacto é predominante para o aquecimento
global.
O PAN reconhece que o Programa traz algumas propostas que indicam ligeiros ajustes ao desagravamento
dos sacrifícios que foram pedidos aos portugueses. Contudo, ao aprofundar com mais detalhe, é manifesta a
linha de continuidade com o rumo seguido pelo Governo durante os quatro anos anteriores, acentuando-se
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I SÉRIE — NÚMERO 4
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cada vez mais a preponderância da lógica de mercado em detrimento da qualidade de vida das pessoas, do
bem-estar animal e da sustentabilidade da natureza.
O PAN esclarece que está na Assembleia da República para fazer parte da solução e não para dividir e
que, por este motivo, viabilizará ou rejeitará propostas do Governo, de acordo com o reconhecimento, ou não,
de um compromisso sério e responsável com as causas e valores que defende e quer trazer ao debate
parlamentar.
Neste sentido, após os argumentos explanados e um cuidado trabalho de análise e deliberação criteriosa
ao Programa do Governo, o partido Pessoas-Animais-Natureza tomou a decisão de votar favoravelmente a
moção de rejeição apresentada.
O Deputado do PAN, André Silva.
———
Presenças e faltas dos Deputados à reunião plenária.
A DIVISÃO DE REDAÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL.