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Quinta-feira, 3 de dezembro de 2015 I Série — Número 12
XIII LEGISLATURA 1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2015-2016)
REUNIÃOPLENÁRIADE2DEDEZEMBRODE 2015
Presidente: Ex.mo Sr. Eduardo Luís Barreto Ferro Rodrigues
Secretários: Ex.mos
Srs. Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco Idália Maria Marques Salvador Serrão Moisés Salvador Coelho Ferreira
S U M Á R I O
O Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 10
minutos. Deram entrada na Mesa os projetos de resolução n.
os 19
a 28/XIII (1.ª) e projetos de lei n.os
56 a 58/XIII (1.ª). Após saudar o Presidente e os Deputados, o Primeiro-
Ministro (António Costa) apresentou o Programa do XXI Governo Constitucional, tendo, depois, dado resposta a questões colocadas pelos Deputados Luís Montenegro (PSD), Carlos César (PS), Catarina Martins (BE), Nuno Magalhães (CDS-PP), Jerónimo de Sousa (PCP), Heloísa Apolónia (Os Verdes), André Silva (PAN), Hugo Lopes Soares (PSD) — que também usou da palavra sob a forma de interpelação à Mesa —, João Torres (PS), Pedro Soares (BE), Ana Rita Bessa (CDS-PP), António Filipe (PCP), Adão Silva (PSD), Susana Amador (PS), Moisés Ferreira (BE), Patrícia Fonseca (CDS-PP), Paula Santos (PCP), Sara
Madruga da Costa (PSD), Filipe Neto Brandão (PS), Jorge Falcato Simões (BE), Berta Cabral (PSD) e Inês de Medeiros (PS), tendo ainda os Deputados Nuno Magalhães (CDS-PP), Luís Montenegro (PSD) e Carlos César (PS) usado da palavra em interpelação à Mesa.
No debate que se seguiu, intervieram, a diverso título, além do Ministro das Finanças (Mário Centeno), os Deputados Marco António Costa (PSD), Pedro Delgado Alves e Helena Freitas (PS), Mariana Mortágua (BE), António Leitão Amaro (PSD), Cecília Meireles (CDS-PP), Paulo Sá (PCP), Heloísa Apolónia (Os Verdes), Miguel Morgado (PSD), Paulino Ascenção (BE), Filipe Lobo d’Ávila (CDS-PP), Miguel Tiago (PCP), Duarte Pacheco (PSD), Joana Mortágua (BE) e Paulo Trigo Pereira (PS).
O Presidente encerrou a sessão eram 20 horas e 55 minutos.
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O Sr. Presidente: — Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Sr.as
e Srs. Deputados, Sr.as
e Srs.
Jornalistas, Sr.as
e Srs. Funcionários, declaro aberta a sessão.
Eram 15 horas e 10 minutos.
Solicito às autoridades que abram as galerias.
Começo por dar a palavra ao Sr. Secretário para a leitura do expediente.
O Sr. Secretário (Duarte Pacheco): — Sr. Presidente e Srs. Deputados, deram entrada na Mesa, e foram
admitidos, as seguintes iniciativas: os projetos de resolução n.os
19/XIII (1.ª) — Construção urgente da escola
secundária na Quinta do Conde, concelho de Sesimbra, distrito de Setúbal (PCP), que baixa à 8.ª Comissão,
20/XIII (1.ª) — Pela reabertura do Pólo de Saúde de Caldelas da Unidade de Cuidados de Saúde
Personalizados Viver Mais (PCP), que baixa à 9.ª Comissão, 21/XIII (1.ª) — Recomenda ao Governo medidas
sobre praxes académicas (BE), que baixa à 8.ª Comissão, 22/XIII (1.ª) — Urgente construção integral do IC35
(PCP), 23/XIII (1.ª) — Recomenda ao Governo a necessidade de construção de um novo hospital para a
Madeira (PSD), que baixa à 9.ª Comissão, 24/XIII (1.ª) — Pela reposição do direito dos ferroviários às
concessões de transportes (PCP), que baixa à 10.ª Comissão, 25/XIII (1.ª) — Eliminação das portagens na
A23 (PCP), que baixa à 6.ª Comissão, 26/XIII (1.ª) — Recomenda o reconhecimento e o reforço das entidades
da economia social (PSD e CDS-PP), 27/XIII (1.ª) — Pela resolução urgente dos problemas do Hospital de S.
João de Deus e em defesa da melhoria dos cuidados de saúde no concelho de Vila Nova de Famalicão (PCP),
que baixa à 9.ª Comissão, e 28/XIII (1.ª) — Pela reposição do direito dos ferroviários e dos seus familiares às
concessões de transportes (BE), que baixa à 10.ª Comissão; e projetos de lei n.os
56/XIII (1.ª) — Alarga o
acesso às pensões de invalidez e velhice dos trabalhadores da Empresa Nacional de Urânio e consagra o
direito a uma indemnização emergente de doença profissional ou por morte (BE), que baixa à 10.ª Comissão,
57/XIII (1.ª) — Altera o Decreto-lei n.º 152/2014, de 15 de outubro, relativo à Casa do Douro (PCP), que baixa
à 7.ª Comissão, e 58/XIII (1.ª) — Promoção do acesso a produtos da agricultura de produção local às cantinas
públicas (BE), que baixa à 5.ª Comissão.
Em termos de expediente, é tudo, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr. Secretário.
Srs. Deputados, como sabem a ordem do dia de hoje consiste na apreciação do Programa do XXI Governo
Constitucional.
Assim, para fazer a sua apresentação, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.
O Sr. Primeiro-Ministro (António Costa): — Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados, Colegas de Governo:
Começo, em nome do XXI Governo Constitucional, por cumprimentar respeitosamente VV. Ex.as
, ciente que é
perante vós que o Governo responde politicamente e que é através de vós que recebemos a legitimidade
democrática para governar.
Este é um momento central do funcionamento do nosso sistema político.
Diz a Constituição: «A Assembleia da República é a assembleia representativa de todos os cidadãos
portugueses.», que detém a competência exclusiva de apreciar o Programa do Governo e de cuja apreciação
depende o futuro do Governo: a sua demissão ou a investidura na plenitude das suas funções.
Este é, assim, um momento de excecional responsabilidade para o Governo. Por isso, fizemos o que nos
cumpria para garantir a viabilização do Programa do Governo e a estabilidade na sua execução ao longo da
Legislatura.
O conjunto das bancadas parlamentares do Partido Socialista, do Bloco de Esquerda, do Partido
Comunista Português e do Partido Ecologista «Os Verdes», que asseguraram um suporte parlamentar
maioritário ao Governo, provaram que em democracia há sempre alternativas e que não estávamos
condenados a ver prosseguir as políticas que não tinham apoio maioritário nesta Assembleia, porque,
maioritariamente, tinham sido rejeitadas pelos cidadãos que as Sr.as
e Srs. Deputados representam.
Aplausos do PS, do BE, do PCP, de Os Verdes e do PAN.
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É, pois, confiante na solidariedade deste apoio maioritário que o XXI Governo se apresenta nesta
Assembleia. Mas é também com o orgulho de a solução política que o viabiliza ter contribuído para enriquecer
a democracia ao valorizar o pluralismo e diversificar as alternativas, garantindo que a maioria eleitoral que
votou pela mudança de políticas não se frustrava na incapacidade de gerar uma mudança da maioria de
governo.
Mas quero deixar claro que ao derrubar este muro, velho de 40 anos, não quisemos abrir uma nova
trincheira de confrontação que exclua do diálogo democrático as restantes bancadas parlamentares, como
bem prova a inclusão no Programa do Governo de contributos do partido Pessoas-Animais-Natureza, com
quem contamos para aprofundar o debate civilizacional sobre o bem-estar animal.
Aplausos do PS, do BE, do PCP, de Os Verdes e do PAN.
É com esta postura de abertura ao diálogo e ao compromisso que o XXI Governo se relacionará com esta
Assembleia. E é com o mesmo esforço persistente de diálogo e concertação social que nos relacionaremos
com os parceiros sociais e com a sociedade.
A concertação social é, para nós, hoje, como no passado, um espaço decisivo para a afirmação de uma
cidadania plena e para a defesa do moderno estado social.
Aplausos do PS.
Seja no plano da concertação estratégica, seja no plano de acordos sectoriais específicos, o Governo
trabalhará em estreita articulação com a Comissão Permanente de Concertação Social, assim como
dinamizará o diálogo social desbloqueando a contratação coletiva.
O Governo não decidirá sem o contributo indispensável da concertação em todos os domínios em que ela é
relevante, mas também quero deixar claro que nunca se escudará na concertação para deixar de decidir ou
protelar as decisões que se imponham para cumprir o nosso Programa.
Aplausos do PS e do BE.
Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: Como tive ocasião de dizer aquando da minha tomada de posse,
devemos confiar à História a discussão sobre o passado e concentrarmo-nos no que nos é exigido hoje para
construir o futuro.
A informação esta semana divulgada pelo Instituto Nacional de Estatística (INE) marca e define o nosso
ponto de partida: um País empobrecido, em que a atividade económica recuou mais de uma década, para
valores de 2004, onde o emprego recuou cerca de duas décadas, para valores de 1995, e onde o investimento
recuou mais de três décadas. É isto que nos confirmam os números anteontem divulgados, ou seja, a
atividade económica em estagnação, o investimento a abrandar, o emprego sem conseguir a anunciada
recuperação.
Estes dados confirmam o pleno sentido do triplo desígnio do tempo novo que queremos iniciar: mais
crescimento, melhor emprego, maior igualdade!
Aplausos do PS e de Deputados do PCP.
O relançamento do crescimento económico exige a melhoria do rendimento disponível das famílias. Já
estão em apreciação parlamentar iniciativas sobre a reposição integral em 2016 dos vencimentos devidos aos
funcionários públicos e a eliminação progressiva da sobretaxa de IRS, de modo a iniciar o alívio da asfixia
fiscal da classe média.
Hoje mesmo, convoquei para a próxima semana uma reunião da Comissão Permanente de Concertação
Social para, entre outras matérias, apreciar a proposta do Governo do aumento do salário mínimo nacional
para 600 euros mensais ao longo da Legislatura.
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Aplausos do PS, do BE e de Deputados do PCP.
Mas, a par com a melhoria do rendimento das famílias, é essencial para o relançamento da economia criar
condições de investimento das empresas. As presentes condições financeiras exigem que o investimento
assente, por um lado, na mobilização do investimento privado e, por outro, na aceleração da execução dos
fundos comunitários e na sincronização do ciclo de planeamento de infraestruturas com o ciclo de definição
das perspetivas financeiras da União Europeia.
Neste sentido, recordo, propomo-nos apresentar à Assembleia da República, em 2018, um programa de
investimento em infraestruturas, que aqui possa ser discutido e votado por uma maioria de dois terços, de
modo a assegurar um consenso alargado que transcenda a maioria desta Legislatura e a tempo de enquadrar
as negociações das perspetivas financeiras da União Europeia entre 2020 e 2027.
Aplausos do PS.
Hoje, decorridos cerca de oito meses após o arranque do financiamento de projetos empresariais, o
Portugal 2020, em todos os seus programas operacionais, disponibilizou apoios a 15 empresas ou
associações empresariais. Foi esta a dimensão do contributo do novo ciclo de fundos europeus para o
incentivo ao investimento de que tanto carece a economia portuguesa.
Por isso, propomo-nos alterar substancialmente a situação atual, tomando medidas de imediato, para que,
no final dos primeiros 100 dias deste Governo, sejam ultrapassados os 100 milhões de euros de pagamentos
efetivos às empresas, colocando, assim, em pleno funcionamento os sistemas de incentivos a pleno vapor.
Aplausos do PS.
Para o efeito, tomaremos medidas concretas para eliminar os estrangulamentos já detetados. Por exemplo,
reforçaremos em 35 milhões de euros os fundos de apoio ao Sistema de Garantia Mútua, mitigando deste
modo as dificuldades de obtenção das garantias necessárias ao recebimento dos apoios por parte das
pequenas empresas.
Mas o investimento empresarial depende da resolução de um problema central: o baixo nível de autonomia
financeira da generalidade das empresas, que impede o investimento com capitais próprios e o acesso ao
crédito, sobretudo num contexto crescentemente exigente dos rácios exigidos ao sistema bancário.
A criação de um Fundo de Capitalização, a melhoria do tratamento fiscal do financiamento e capitalização
das empresas pelos sócios, a duplicação do âmbito e do montante do crédito fiscal ao investimento e a criação
de uma linha de adiantamento do crédito fiscal aos investimentos em investigação e desenvolvimento, visam
melhorar as condições de investimento das empresas.
Especial incentivo é o que prevemos com o Programa Semente dirigido ao empreendedorismo e à criação
de start-up, favorecendo um ecossistema dinâmico de iniciativa e inovação que se tem desenvolvido em
contraciclo e que importa acarinhar.
O programa de relançamento da economia que apresentamos acompanha, assim, do lado da oferta a
desejada melhoria do lado da procura interna.
Aplausos do PS.
Mas gostava de ser claro, num ponto: as funções do Estado não se esgotam, para nós, nas essenciais
funções de soberania (a defesa nacional, a diplomacia, a segurança interna, a administração da justiça e a
arrecadação de impostos). Não podemos ignorar, nem desprezar, o papel decisivo que as políticas públicas
podem, e devem, desempenhar na criação de condições para a atração, incentivo e potenciação do
investimento privado.
Por um lado, na internacionalização, apoiada por uma ação externa integrada com a nossa diplomacia, da
promoção da língua à defesa da economia, a partir da posição de Portugal no mundo e do enorme potencial
das comunidades portuguesas, quer na atração do investimento, quer no acesso a mercados onde estão
implantadas.
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Por outro lado, na valorização do nosso território, com o investimento diversificado em sectores como a
agricultura, a floresta ou o turismo; uma abordagem integrada da política do mar, que permita potenciar o
chamado «crescimento azul», da aquacultura à logística portuária, das tecnologias de sistemas offshore à
manutenção e reparação navais, das pescas à defesa da biodiversidade, da náutica de recreio à biotecnologia
marinha, mas, sobretudo, com uma nova visão sobre o nosso território continental e a sua faixa raiana,
passando a olhar o que nos habituámos a abandonar como interior, como a plataforma de excelência para a
afirmação da nossa economia no mercado ibérico.
Aplausos do PS.
Em terceiro lugar, o regresso em força do Simplex, alargando-o a sectores cruciais, como o da justiça, e
uma atitude proactiva de redução da legislação e de melhoria do processo legislativo de modo a melhorar a
previsibilidade e a reduzir os custos de contexto, do investimento e do funcionamento das empresas.
Aplausos do PS.
Por fim, e decisivo, o alinhamento dos incentivos para a prioridade que a inovação tem de ter numa
estratégia apostada na melhoria da produtividade pelo aumento do valor dos produtos e serviços, o que exige,
a par com os incentivos ao investimento empresarial em investigação e desenvolvimento, melhorar os
processos de transferência de conhecimento e tecnologia para a economia e a valorização da inovação
através da procura pública e da capacitação das PME (pequenas e médias empresas), inovadoras no acesso
aos mercados públicos.
Aplausos do PS.
O Estado eficiente é o Estado que confia na descentralização e na governação aos vários níveis, pelo que
contamos com as autarquias locais e as regiões autónomas nesta parceria para o desenvolvimento.
As autonomias regionais são um importante ativo no nosso País e na nossa projeção atlântica. O Governo,
em articulação com os governos regionais dos Açores e da Madeira, procurará exercer as suas competências,
beneficiando açorianos e madeirenses e, desse modo, valorizando todos, ou seja, Portugal.
Esta estratégia implica, definitivamente, romper com a ilusão de um modelo de desenvolvimento assente
no empobrecimento e na precarização do trabalho e apostar, decisivamente, nos fatores cruciais de
desenvolvimento, que são a cultura, a ciência e a educação.
Aplausos do PS.
Ciência, cultura e educação são os pilares da sociedade do conhecimento, condição de cidadania, fator de
segurança da capacidade de adaptação às incertezas do futuro e a base de modernização da economia, por
via de um tecido empresarial inovador, competitivo e internacionalizado. Para isto se concretizar é essencial
dar máxima prioridade ao combate à precariedade. Só assim daremos perspetivas de futuro às novas
gerações, que não nos podemos resignar a ver partir para a emigração; só assim incentivamos o investimento
na formação profissional; e só assim valorizamos a dignidade do trabalho e a melhoria da produtividade das
empresas.
Por isso, melhor emprego é essencial para termos mais crescimento.
Aplausos do PS e do Deputado do BE José Manuel Pureza.
É esta opção estratégica que exige repor no centro das prioridades das nossas políticas públicas a
educação de adultos e a formação ao longo da vida, porque não podemos prescindir da geração da meia-
idade, que não teve oportunidade de adquirir os níveis de qualificação indispensáveis às novas exigências de
empregabilidade para os desempregados de longa duração.
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A criação do contrato de geração, permitindo o acesso à reforma a tempo parcial, com contrapartida da
contratação de jovens a tempo inteiro, tem, também, este objetivo: fortalecer a solidariedade entre gerações e
uma harmoniosa conjugação de saberes, formais e informais, indispensáveis às empresas e à transição de
gerações.
As políticas ativas de emprego devem, por isso, ser também mais efetivas e seletivas. Mais efetivas, pondo
termo às políticas de subsidiação à precariedade no preenchimento de postos de trabalho que devem dar
lugar a ocupação efetiva.
Por outro lado, assumindo duas prioridades claras: a integração de jovens qualificados no mercado de
trabalho, condição de modernização acelerada do tecido empresarial e a melhor forma de transferir
conhecimentos, a par com as políticas direcionadas a sectores com forte capacidade de criação de postos de
trabalho, como os serviços de apoio pessoal à infância ou aos idosos, em parceria com o sector social, ou o
relançamento da fileira da construção civil, com um amplo programa de reabilitação urbana, que dê suporte a
uma nova geração de políticas de habitação…
Aplausos do PS.
…ou à restauração, para o que é decisiva a redução da taxa do IVA para 13%.
Aplausos do PS e do BE.
Nos últimos anos, Portugal foi capaz de cumprir uma agenda ambiciosa nas políticas de igualdade, que
favoreceram a integração das comunidades imigrantes, a garantia da liberdade religiosa, o combate às
discriminações em função da orientação sexual ou de género.
Aplausos do PS, do BE e de alguns Deputados do PCP.
Não devemos ignorar que a eliminação das discriminações legais não prescinde da continuidade de um
combate cultural contra o preconceito, nem a subsistência de discriminações de facto, com que não nos
podemos conformar, como as diferenças remuneratórias em função do género.
Aplausos do PS e do BE.
Mas, sobretudo, não podemos adiar mais a prioridade que temos de dar à inclusão de pessoas com
deficiência, que exige uma ação transversal de uma escola inclusiva a um território sem barreiras, ao
aperfeiçoamento de mecanismos de apoio social e a uma estratégia de emprego e de trabalho para todos.
Aplausos do PS.
A inclusão das pessoas com deficiência deve ser, por isso, a nova prioridade central da agenda para a
igualdade.
Os novos desafios à igualdade não substituem a persistência do combate às desigualdades económicas e
sociais, que a crise e a execução do programa de ajustamento agravaram de modo chocante.
Ao longo dos últimos quatro anos a pobreza e as desigualdades acentuaram-se, interrompendo um
caminho de continuada correção, como nos mostra a taxa de risco de pobreza, que atinge, em 2013, os 20%.
Aplausos do PS.
Este agravamento é especialmente intolerável no caso da pobreza infantil, onde a taxa de risco de pobreza
atinge os 26% — uma, em cada cinco crianças portuguesas, está em risco de pobreza — e nada atinge de
forma mais dramática a igualdade e o futuro de um país como a pobreza das suas crianças e jovens.
É, por isso, necessário pôr termo à política fraturante, que rompeu o consenso em torno do modelo social,
que fomos coletivamente criando e desenvolvendo em sucessivos governos, após o 25 de Abril, e que assenta
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em três pilares essenciais: a valorização da escola pública; o desenvolvimento do Serviço Nacional de Saúde
(SNS) e a sustentabilidade de uma segurança social pública e para todos.
Aplausos do PS e do BE.
A reposição de mínimos sociais cortados nos últimos anos, como o Complemento Solidário para Idosos
(CSI) e o Rendimento Social de Inserção (RSI), deve ser acompanhada de duas novas prioridades: a
dignificação do trabalho, com a criação de um crédito fiscal negativo que assegure que todos os que declaram
rendimentos do trabalho possam vencer o limiar da pobreza e uma estratégia integrada de combate à pobreza
infantil e juvenil, centrada no território e articulada em torno da escola, que permita a melhor sinergia na
inclusão do segmento da população mais atingida pelo aumento da pobreza e que mais compromete o nosso
futuro.
Aplausos do PS.
Crescimento, emprego e igualdade são, por isso, três desígnios que se articulam entre si e reforçam
mutuamente, e todos, no seu conjunto, permitem uma consolidação saudável e sustentável das nossas
finanças públicas, com uma consecutiva redução do défice orçamental e da dívida pública, de acordo com a
estratégia orçamental que assumimos no nosso Programa do Governo e que a nossa política económica e
social favorece e potencia.
Aplausos do PS.
Sr. Presidente e Sr.as
e Srs. Deputados, as crises que atingiram a Europa desde 2008 feriram o projeto
europeu e fortaleceram os seus adversários. Precisamos de relançar o projeto europeu em Portugal e de
relançar Portugal no projeto europeu.
Por isso, temos uma prioridade clara, neste ano em que celebramos o 30.º aniversário da adesão de
Portugal à CEE: um novo impulso à convergência com a Europa.
Precisamos de aprofundar a Europa não apenas para defender Portugal mas também para defender o
futuro do próprio projeto europeu, cujos ideais de prosperidade e progresso partilhamos.
Este Governo participará na construção de uma Europa que responda às ambições legítimas dos
portugueses, de uma Europa que crie as condições para que Portugal seja mais próspero e mais igual.
A União Europeia sabe que encontrará, neste Governo, um parceiro responsável, capaz de se bater pela
defesa dos interesses dos seus cidadãos e dos valores e instituições do projeto europeu. Este Governo não
servirá os cidadãos portugueses contra ou apesar da Europa mas com a Europa;…
Aplausos do PS.
… e não servirá a Europa contra os cidadãos portugueses mas, antes, mobilizando-os para participarem
nas mudanças que a Europa, fiel aos seus valores fundadores, necessita de concretizar.
Em suma, com a União Europeia queremos um novo impulso à convergência que garanta os três desígnios
para que nos convocamos neste novo tempo: mais crescimento, melhor emprego e maior igualdade.
Aplausos do PS, de pé, do BE, do PCP e de Os Verdes.
O Sr. Presidente: — Vamos, agora, passar à fase dos pedidos de esclarecimento. A ordem das perguntas,
como sabem, será a seguinte: PSD, PS, BE, CDS-PP, PCP, Os Verdes e o PAN.
Assim, para o efeito, tem a palavra, em primeiro lugar, o Sr. Deputado Luís Montenegro.
O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Dr. António Costa, queria
cumprimentá-lo nesta ocasião, em que se senta, pela terceira vez, nessa bancada.
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Esteve aí com António Guterres, depois de o Partido Socialista ter vencido as eleições em 1995, e
contribuiu para deixar o País num pântano.
Vozes do PSD e CDS-PP: — Muito bem!
Protestos do PS.
O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Esteve aí com José Sócrates, depois de o Partido Socialista ter vencido
as eleições legislativas de 2005, e contribuiu para deixar o País com a troica e num estado de pré-bancarrota.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Está aí hoje, em 2015, depois de o Partido Socialista ter perdido
categoricamente as eleições legislativas de 2015, e logo veremos em que estado é que vai deixar o País.
Dr. António Costa, ao contrário do que aconteceu há 10 e há 20 anos, este Governo socialista e este
Primeiro-Ministro estão diminuídos na sua autoridade política e feridos de morte na sua legitimidade popular. O
povo não escolheu o Dr. António Costa para exercer as funções de Primeiro-Ministro.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
O povo não escolheu o programa do Partido Socialista e muito menos o programa do Bloco de Esquerda
ou do PCP para serem a base da ação governativa no próximo quadriénio. O povo escolheu, livre,
democrática e conscientemente, um outro programa, o programa da coligação que juntou o PSD e o CDS-PP.
O Dr. António Costa e o programa do Partido Socialista foram rejeitados pela vontade do povo português e
foram viabilizados pela votação cúmplice, consciente, voluntária dos Deputados eleitos pelos partidos que
perderam as eleições.
O Sr. António Filipe (PCP): — Eleitos! Muito bem!
O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Com uma agravante: fizeram tudo isto um pouco às escondidas e não
disseram antes das eleições o que congeminaram entre si, sabe-se lá desde quando.
Vozes do PSD: — Muito bem!
Protestos do PS, do BE e do PCP.
O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Rejeitar este programa na Assembleia da República não é, portanto,
mais do que expressar a genuína vontade popular manifestada pelos portugueses nas últimas eleições.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Mas nós sabemos que os senhores estão juntos e votarão unidos contra a moção de rejeição que o PSD e
o CDS-PP irão apresentar.
Vozes do PS, do BE e do PCP: — Oh!…
O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Não temos dúvidas algumas sobre isso, aliás, isso até pesou na nossa
decisão.
Risos do PCP.
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Mas, Dr. António Costa, como Primeiro-Ministro, pergunto, em jeito de desafio: por que não apresenta uma
moção de confiança a este Parlamento?
Vozes do PSD: — Exatamente!
Vozes do PS: — Oh!…
O Sr. Luís Montenegro (PSD): — É que não aprovar uma moção de rejeição, no contexto em que o seu
Governo inicia funções, é diferente de aprovar uma moção de confiança. E, Dr. António Costa, Sr. Primeiro-
Ministro, o meu desafio é construtivo.
Vozes do PS: — Ah!
O Sr. Luís Montenegro (PSD): — O senhor e o Partido Socialista perderam as eleições legislativas. O
senhor e o Partido Socialista entenderam-se bilateralmente, mano a mano, com o Bloco de Esquerda, com o
PCP e com o Partido Ecologista «Os Verdes». O senhor e o Partido Socialista, instados pelo Sr. Presidente da
República a clarificar alguns eixos estratégicos do vosso Programa e dos respetivos entendimentos,
responderam com secretismo.
Por isso, pergunto: o Sr. Primeiro-Ministro não acha que o País e aqueles que nos seguem do exterior
veriam, nesse voto de confiança, um fator de tranquilidade, um fator de estabilidade?! Foi, aliás, o senhor
quem prometeu ao País uma solução estável, coerente e duradoura.
Se o seu Governo e o seu Programa saíram do voto dos Deputados e do acordo parlamentar
bilateralmente subscrito com os outros partidos, se o seu Governo é minoritário, representa sozinho menos
Deputados do que aqueles que representa a bancada a que pertenço, Sr. Primeiro-Ministro, pergunto-lhe se,
de facto, não é do interesse do País e do seu próprio interesse, como Primeiro-Ministro, ter garantida essa
confiança do Parlamento.
Creio que é justo pedir a todos aqueles que contribuíram para esta solução que não se juntem só para
destruir, que tenham a capacidade, e não tenham vergonha, de construir conjuntamente.
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Este é o vosso projeto comum, o vosso projeto conjunto, a democracia
agradece que o assumam sem hesitações e que acabem com esse secretismo!
Sr. Primeiro-Ministro, uma última palavra para deixar claro o seguinte: o senhor inicia funções, mesmo
perdendo as eleições, como Primeiro-Ministro de Portugal, lidera o Governo de um País que deixou para trás a
troica, a recessão económica, o descontrolo financeiro, o aumento do desemprego, as contas externas
deficitárias e juros incomportáveis.
Protestos do PS.
É este o País que nós deixámos para trás. É um País que está a remover a austeridade de forma gradual e
a recuperar rendimentos. É um País que promoveu várias reformas estruturais para garantir a competitividade
da nossa economia, para garantir o aumento das nossas exportações, para garantir a atratividade do
investimento e, em particular, do investimento externo. É um Estado mais fiável, um Estado que, hoje, paga a
tempo e horas, um Estado que salvaguardou os principais sistemas públicos e garantiu, de facto, mais justiça
e mais equidade social.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Não se esqueçam, Sr.as
e Srs. Deputados e também Srs. Membros do
Governo, de que nas políticas fiscais, nas tarifas sociais, até mesmo nos sacrifícios, o caminho que
percorremos protegeu sempre os mais fracos…
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O Sr. João Galamba (PS): — Falso!
O Sr. Luís Montenegro (PSD): — … e pediu sempre um esforço maior aos mais fortes. Isto é indiscutível,
Srs. Deputados!
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Protestos do PS, do BE e do PCP.
Para além disso, Portugal é hoje um País credível…
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, informo-o de que já ultrapassou largamente os 5 minutos, mas, como
está a descontar no tempo do seu partido, é um problema de gestão interna.
O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Muito bem, Sr. Presidente, vou caminhar para terminar.
Como eu dizia, para além disso, Sr. Presidente, Srs. Deputados e Srs. Membros do Governo, Portugal é
hoje um País credível, um País respeitado e elogiado no exterior, um País que cumpre os seus compromissos.
O Programa que os derrotados, unidos, hoje, aqui nos apresentam põe muitas destas conquistas em
causa.
Protestos do PS.
Traz medidas económicas erradas, traz políticas públicas arriscadas e, sobretudo, não traz, para já, uma
coisa: a fatura.
A Sr.ª Isabel Alves Moreira (PS): — Ah!…
O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Mas ela virá! A fatura de uma dívida, que vai crescer; a fatura de um
défice, que não se percebe como é que não vai aumentar; a fatura de afastar investimento, em vez de atrair
investimento que gere emprego; a fatura do vosso acordo cúmplice, consciente e voluntário; a fatura desta
aventura e de um experimentalismo, que é, de facto, perigoso.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, realmente, como consta da nossa agenda, e todos sabem, a primeira
pergunta poderá ter a duração de 5 minutos, mas, como desconta no tempo de que dispõem, o que fiz agora
farei em relação às demais bancadas. Ou seja, o que exceder os 5 minutos será descontado no tempo global
do respetivo grupo parlamentar.
Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.
O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Luís Montenegro, começo por saudar, na sua
pessoa, toda a bancada do PPD/PSD e por agradecer-lhe a amabilidade das questões que colocou.
Risos do PS, do BE, do PCP e de Os Verdes.
Primeiro, colocou uma questão verdadeiramente importante: «Por que é que não apresenta uma moção de
confiança?». Dou-lhe uma resposta que creio ser simples e clara: só precisa de pedir confiança quem não tem
confiança.
Aplausos do PS, do BE, do PCP e de Os Verdes.
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E este, Sr. Deputado, lamento desiludi-lo, é um Governo que se apresenta nesta Assembleia da República
confiante, e confiante, desde logo, no suporte parlamentar maioritário que lhe dá legitimidade para estar aqui.
Aplausos do PS e do Deputado do BE José Moura Soeiro.
Isto porque a democracia assenta em regras simples:…
Protestos do PSD e do CDS-PP.
… a igualdade do voto e igual legitimidade de quem representa os cidadãos eleitores. Aquilo que temos
nesta Assembleia da República são 230 Deputados, que não foram nomeados por mim, nem foram escolhidos
por si, foram todos eleitos pelos cidadãos portugueses.
Aplausos do PS, do BE, do PCP e de Os Verdes.
O Sr. Deputado pode achar estranho, mas a razão pela qual as bancadas do PSD e do CDS não são hoje
maioritárias nesta Câmara é porque não são maioritárias no País e porque as outras bancadas tiveram mais
votos, aliás, é por isso que têm mais Deputados.
Aplausos do PS e do BE.
Na noite das eleições, como Secretário-Geral do Partido Socialista, tive oportunidade de dizer aquilo que
era óbvio: tendo a bancada do PSD mais três Deputados do que a bancada do PS, cabia, naturalmente, ao Dr.
Pedro Passos Coelho, ou a quem o PPD/PSD entendesse, o esforço de procurar construir uma solução
governativa estável, coerente e duradoura. Era, aliás, uma exigência que decorria da própria expressão
pública de S. Ex.ª o Sr. Presidente da República. E, naturalmente, respeitámos a indicação que o Sr.
Presidente da República fez, o encargo que deu ao Dr. Pedro Passos Coelho para procurar construir essa
solução. Acontece que o Dr. Pedro Passos Coelho falhou nessa tentativa e não conseguiu construir uma
solução maioritária, estável e duradoura nesta Assembleia da República.
Aplausos do PS.
Por que razão é que existe o XXI Governo Constitucional?
O Sr. Pedro do Ó Ramos (PSD): — Por que será?
O Sr. Miguel Santos (PSD): — Porque o senhor queria ser Primeiro-Ministro!
O Sr. Primeiro-Ministro: — Porque o XX Governo Constitucional confrontou-se com uma maioria contra,
nesta Assembleia da República, e não foi capaz de encontrar uma solução maioritária. Em alternativa, as
bancadas que rejeitaram o XX Governo não se limitaram, ao contrário do que disse, a votar «contra», a ser
oposição…
Vozes do PS: — Exatamente!
O Sr. Primeiro-Ministro: — … a ser uma maioria negativa. Não! As bancadas que derrubaram o XX
Governo Constitucional encontraram também a solução de viabilizar um governo alternativo, que é este
Governo que está aqui está, o XXI Governo Constitucional.
Aplausos do PS, do BE e do PCP.
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E o entendimento é, de facto, uma novidade. É verdade que, entre estas bancadas, há muitos anos que se
tinha estabelecido o tabu de que não era possível haver diálogo, de que não era possível haver entendimento
e de que não era possível viabilizarem uma maioria alternativa. E, porventura, VV. Ex.as
fiaram-se nesse tabu e
confiaram na sorte.
Aplausos do PS, do BE e do PCP.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Saiu-vos a fava!
O Sr. Primeiro-Ministro: — Mas, Sr. Deputado, aquilo que estas bancadas responsavelmente fizeram foi
dar tradução e responder aos dois desafios que resultaram das eleições: em primeiro lugar, corresponder à
vontade esmagadora do povo português, de pôr termo à austeridade, virar a página e encontrar uma nova
política assente no crescimento, no emprego e na igualdade.
Aplausos do PS, do BE e do PCP.
Em segundo lugar, dotar o País de estabilidade, pôr termo à incerteza e à instabilidade, que,
necessariamente, existiria com um governo que não foi capaz de encontrar uma solução maioritária nesta
Assembleia da República.
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Isso dependia de si!
O Sr. Primeiro-Ministro: — Por isso, Sr.as
e Srs. Deputados, como disse: dependia de mim e dos demais
229 Deputados. Agora, o que os Srs. Deputados do PSD e do CDS, num exercício de humildade, talvez um
dia, possam fazer…
Risos do PSD e do CDS-PP.
Há uma coisa que têm de perceber: na anterior Legislatura, tinham maioria; nesta Legislatura, não têm
maioria.
Protestos do PSD e do CDS-PP.
E não podem entender que o dever dos outros é oferecer-vos a maioria, que os eleitores vos retirou,
porque não queria a prossecução das vossas políticas.
Aplausos do PS, do BE, do PCP e de Os Verdes.
O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos César.
O Sr. Carlos César (PS): — Sr. Presidente, começo por saudar V. Ex.ª, Sr. Primeiro-Ministro, e todos os
Membros do seu Governo, estimando, naturalmente, que tenham os maiores sucessos. O nosso entendimento
é o de que o sucesso do Governo é o sucesso de Portugal.
Aplausos do PS.
Cumprimento-o também, Sr. Primeiro-Ministro, salientando o contributo de V. Ex.ª ao longo destes 40 anos
de democracia.
V. Ex.ª é bem um exemplo daquilo que, ao longo destas quatro décadas, foi, e é, o Partido Socialista,…
Protestos do PSD e do CDS-PP.
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… um partido que nunca se refugiou atrás da porta para espreitar o melhor momento partidário para
governar ou para sair do governo.
Aplausos do PS.
Risos e protestos do PSD e do CDS-PP.
Cumprimento-o também pelo discurso que nos trouxe, nesta apresentação do Programa do Governo.
Não nos trouxe, naquilo que era conhecido, naturalmente, revelações excecionais, mas trouxe-nos,
supletivamente, o que mais nos interessa: entusiasmo, convicção, fundamentação, competência pessoal,
frontalidade, sentido de responsabilidade, sentido das prioridades nacionais e um profundo sentido do
interesse nacional.
Aplausos do PS.
Se tudo isso não for tudo quanto precisamos para inverter a herança de endividamento e de pobreza, que
este XXI Governo recebe, é bem aquilo de que precisamos na liderança do Governo de Portugal.
Aplausos do PS.
Saúdo também os Srs. Deputados, que, entretanto, tomaram posse e assento nesta Assembleia, depois da
mudança de Governo.
Esta é uma Assembleia legitimamente constituída.
O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Era o que mais faltava se assim não fosse!
O Sr. Carlos César (PS): — Cumprimento, em especial, os líderes dos partidos minoritários: Dr. Paulo
Portas e Dr. Passos Coelho.
Protestos do PSD e do CDS-PP.
Minoritários, mas barulhentos!
Protestos do PSD e do CDS-PP.
Risos do BE e do PCP
Aplausos do PS.
Na Casa da democracia…
Protestos do PSD e do CDS-PP.
Muito barulhentos!
Como eu dizia, na Casa da democracia, tão legítimas são as maiorias que se formam como as minorias
que, daí, decorrem. Estamos, pois, em presença de dois partidos minoritários no Parlamento, que se opõem
ao Governo, e de uma maioria de partidos e Deputados que o apoiam. Ou seja, é tão legítima esta oposição
como legítima é a maioria e o Governo que, aqui, é apoiado.
Aplausos do PS.
Vozes do PCP: — Muito bem!
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O Sr. Carlos César (PS): — Em tempos anteriores, o líder do partido minoritário da coligação minoritária já
tinha dito que um governo com o apoio maioritário tanto pode ser de coligação como ter apenas um acordo
parlamentar. É certo que essa era a sua boa frase.
A pior frase, Sr. Primeiro-Ministro, do líder do partido minoritário da coligação minoritária…
Risos do PS.
… foi quando disse ao futuro Governo de Portugal que não lhe pedissem socorro, porque, não sendo esse
partido componente desse Governo, não daria socorro, em nenhuma circunstância, ao Governo de Portugal.
Aplausos do PS.
Mas, Sr. Primeiro-Ministro, no que toca ao partido maioritário da coligação minoritária, esse só precisará de
recorrer a si próprio para se corrigir a si próprio.
Vozes do PS: — Muito bem!
O Sr. Carlos César: — Bastará, parafraseando o líder parlamentar do PSD, voltar a dizer, tal como disse,
em 2011: «Precisamos de uma oposição responsável!». Ai, sim, precisamos!
Aplausos do PS.
Sr. Primeiro-Ministro, neste novo ciclo político, que tão bem caracterizou e que se expressa num Programa
do Governo exigente na gestão dos recursos e corajoso na sua dimensão humanista, todos sabemos que o
ponto de partida é penalizante para os governantes e, especialmente, penalizante para os governados.
Cessou funções um Governo que não cumpriu as metas com que se comprometeu. Cessou funções um
Governo que não falhou nos sacrifícios impostos, mas falhou nos resultados desses sacrifícios.
O Sr. Primeiro-Ministro: — Muito bem!
O Sr. Carlos César (PS): — Cessou funções um Governo que vendeu o País ao desbarato, que tornou a
vida das famílias insustentavelmente cara, que endividou Portugal, que destruiu milhares e milhares de
empresas, e que destruiu e que comprometeu economias regionais e locais, por todo o País.
Vozes do PS: — Muito bem!
O Sr. Carlos César (PS): — Só há três países piores que Portugal, no que respeita aos últimos dados
trimestrais de crescimento económico. Por isso, Sr. Primeiro-Ministro, pergunto: não surgindo outros
indicadores nacionais imprevistos e alterações no plano europeu, que possibilidades encontra para
prosseguirmos a política, que é o nosso compromisso, de aumentar o rendimento, em particular das famílias
mais empobrecidas, de alcançarmos outros níveis de crescimento e a de empreendermos, finalmente, uma
linha de convergência com os indicadores europeus, salvaguardando, simultaneamente, os nossos objetivos
de consolidação orçamental?
Sr. Primeiro-Ministro, quero ainda dizer-lhe que V. Ex.ª pode, e deve, contar com o apoio do seu partido,
mas estou convencido de que, no seu esforço por fazer de Portugal um País mais próspero, por ajudar as
famílias portuguesas, dentro de muito pouco tempo pode orgulhar-se de também ter o apoio de Portugal, de
Portugal inteiro,…
Risos do PSD e do CDS-PP.
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… de um Portugal que respeita uma oposição, que falha nos seus compromissos, que falha na sua
dedicação ao seu próprio País…
Protestos do PSD.
… e que coloca, acima dos interesses nacionais, os interesses partidários.
Vozes do PS: — Bem dito!
O Sr. Carlos César (PS): — Força, Sr. Primeiro-Ministro! Viva o Governo de Portugal!
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — A Mesa utilizou a mesma flexibilidade de há pouco, em relação ao pedido de
esclarecimento do Sr. Deputado Carlos César.
Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.
O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Carlos César, agradeço as questões e, na sua
pessoa, quero saudar, calorosamente, a bancada do Partido Socialista e agradecer o apoio dessa mesma
bancada na investidura deste Governo.
Quero sublinhar o seguinte: os programas do governo não são um manual de novidades, os programas do
governo devem ser políticas estruturadas, coerentes e, como tal, coerentes.
O Programa do Governo que aqui apresentamos tem uma origem bem conhecida, tem por base o
programa eleitoral que o Partido Socialista apresentou aos eleitores, e agora tem as alterações que resultaram
das negociações com o Bloco de Esquerda, com o Partido Comunista Português, e com o Partido Ecologista
«Os Verdes». As alterações introduzidas em função das negociações foram devidamente publicitadas e o
impacto na estratégia orçamental que tínhamos definido foi também devidamente assinalado. Por isso, este
não é um Programa do Governo que surpreenda, é um Programa do Governo consistente, coerente, que dá
resposta àquilo que é a proposta política do Partido Socialista e é fiel àquilo que o PS negociou com as demais
forças políticas. Este é o Programa do Governo que temos pela frente.
Eu não gostaria de prolongar, nesta Legislatura, um hábito que se tem vindo a acumular em sucessivas
legislaturas anteriores, e não só na última, nem na penúltima, a bem da verdade, que é o de centrar a
discussão do presente sobre as discussões do passado. Acho que temos de nos centrar naquilo que é o ponto
de partida,…
O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — Já vai tarde!
O Sr. Primeiro-Ministro: — … e o ponto de partida é aquele que, aliás, o Instituto Nacional de Estatística
disponibilizou, a informação transparente e esta semana publicitada, relativamente à situação do País no 3.º
trimestre deste ano.
Risos do PS, do BE e do PCP.
Sei que algumas Sr.as
e alguns Srs. Deputados têm dúvidas sobre o que é que significa o terceiro trimestre,
mas para que não haja qualquer dúvida…
Protestos do PSD e do CDS-PP.
… repito, para que não haja qualquer dúvida, o terceiro trimestre decorreu e terminou antes da tomada de
posse deste Governo.
Aplausos do PS.
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De facto, o ponto de partida é conhecido: o País recuou 30 anos no nível de investimento.
Protestos de Deputados do CDS-PP.
É, por isso, extraordinário ouvir dizer que o novo Governo assusta os investidores, quando ao fim de quatro
anos de Governo os senhores conseguiram fazer recuar 30 anos o nível de investimento em Portugal.
Aplausos do PS.
O Sr. António Carlos Monteiro (CDS-PP): — Não ia falar do passado e está a falar no passado! Em que é
que ficamos?
O Sr. Primeiro-Ministro: — É extraordinário falarem do emprego quando, em quatro anos de governação,
fizeram recuar 20 anos o emprego em Portugal e quando, ao fim de quatro anos de governação, fizeram
recuar 10 anos a riqueza produzida no País.
Este é, de facto, o ponto de partida e um ponto de partida que tem um preço conhecido: na pobreza, na
emigração, no aumento do endividamento do País, que subiu ao longo dos últimos quatro anos para níveis
recorde em termos históricos.
Protestos de Deputados do CDS-PP.
O ponto de partida é este mas o ponto de chegada há de ser outro, e há de ser outro não por qualquer
efeito mágico mas porque serão outras as políticas.
Aplausos do PS e do Deputado do BE José Manuel Pureza.
Isto porque o resultado que foi alcançado é, também, o resultado das políticas que foram prosseguidas e é
por isso que é necessário inverter a política para podermos ter outros resultados.
Ao contrário do que muitos acreditaram, a austeridade não trouxe crescimento, nem a desvalorização
interna trouxe prosperidade. O empobrecimento e a destruição de direitos laborais não são o caminho para o
desenvolvimento.
Aplausos do PS.
O caminho para o desenvolvimento tem de assentar no conhecimento e tem de assentar na inovação.
Essa inversão implica também uma nova atitude na Europa, não uma atitude de confrontação com a
Europa, não uma atitude da rutura com a Europa, mas uma atitude que contribua para que a Europa mude e,
mudando, nos ajude também a retomar uma trajetória de convergência que está interrompida desde o
princípio do século e que é urgente podermos retomar para, de uma forma saudável e sustentável,
crescermos, gerarmos emprego, diminuirmos as desigualdades e consolidarmos as nossas finanças públicas.
Esse é o nosso caminho, esse é o caminho que queremos percorrer.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para pedir esclarecimentos, a Sr.ª Deputada Catarina Martins.
A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, o Bloco de Esquerda reconhece que
o Programa que aqui traz hoje reflete o acordo que foi feito e as negociações que tivemos para uma solução
de Governo que possa travar o empobrecimento do País.
Aplausos do BE e do PS.
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Debater hoje o Programa do Governo, ainda para mais no contexto de uma moção de rejeição anunciada
pela direita, é também analisar a escolha que foi feita pelas várias forças políticas e a diferença entre o
Programa que rejeitámos e este Programa que hoje estamos a debater.
É bom centrarmo-nos nos pontos que são essenciais: pensões e salários. Onde o Programa da direita
previa cortes nas pensões e manter os cortes inconstitucionais nos salários da função pública durante quatro
anos, o Programa que hoje debatemos prevê descongelamento das pensões, recuperação do complemento
solidário para idosos, reposição dos salários da função pública num ano, combate à precariedade,
desbloquear contratação coletiva, aumento do salário mínimo nacional.
Aplausos do BE.
Em relação ao Estado social, onde a direita queria contratualizar com os privados, em autênticas e
gigantescas PPP, as mais diversas funções do Estado, da escola pública ao Serviço Nacional de Saúde,
criando uma enorme rede clientelar, há agora um compromisso para reforçar os meios, as condições de
trabalho e o acesso das populações ao SNS, à educação pública, à cultura e à ciência.
O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Muito bem!
A Sr.ª Catarina Martins (BE): — No que respeita às privatizações, onde PSD e CDS-PP queriam continuar
a vender o País — CP, EMEF, estradas e linhas férreas —, há o compromisso de parar privatizações, de rever
os processos da TAP e da EGF e de reverter concessões como as do Metro, Carris e STCP.
Aplausos de Deputados do BE.
Vistas as diferenças, é normal que a direita apresente uma moção de rejeição. O Programa é diverso e
ofende-a. Aliás, a direita faz hoje o favor de demonstrar quanto valem os argumentos sobre a ilegitimidade
desta solução de Governo. Apresentem, pois, a moção de rejeição. Nós cá estaremos para a chumbar.
Aplausos do BE e do PS.
O que todos aguardamos hoje da direita, mas não sei se nos dão essa alegria, é que digam alguma coisa
sobre o seu próprio percurso. PSD e CDS-PP não estão a dever alguma explicação ao País sobre a devolução
da sobretaxa que se evaporou logo a seguir às eleições?
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Muito bem!
O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — Vocês é que estão!
A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Sobre a assinatura ilegal do contrato da venda da TAP? Sobre as
nomeações em catadupa?
O Sr. Adão Silva (PSD): — Mas isto é sobre o Programa do Governo ou é o quê?
O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — Equivocou-se!
A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Sobre a estagnação do PIB no terceiro trimestre, depois de todas as
promessas, ou sobre a forma como a meta do défice foi ficando cada vez mais longe?
Ou será que depois de um mandato inteiro a culpar o anterior Governo estão já a preparar-se para dizer
que a culpa é, certamente, do próximo Governo?!
Aplausos do BE e do PS.
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Uma coisa é certa, a direita foge do debate sobre a realidade porque teria muitas explicações a dar, mas ao
Bloco de Esquerda interessa hoje falar dos compromissos para a vida concreta das pessoas. Temos a
convicção de que é urgente cortar com o legado da direita e que travar o empobrecimento do País exige
também uma nova forma de credibilidade do compromisso político.
A esperança de um novo ciclo exige palavras claras e exige compromissos, para que seja possível viver
em Portugal com dignidade.
Quero, por isso, questioná-lo, Sr. Primeiro-Ministro, sobre as condições de trabalho e emprego em
Portugal. Nos últimos quatro anos, meio milhão de pessoas em idade ativa saíram do País por não terem
emprego ou por não terem emprego digno. Nos novos contratos, o salário médio desceu 300 € e já quase não
se distingue do salário mínimo.
A precariedade tornou-se regra. Um País em que as poucas alternativas ao desemprego são estágios,
falsos recibos verdes, falso trabalho temporário, sempre com salários muito baixos, é um País em que não há
lugar para a esperança.
Precisamos de garantir que as novas gerações que começam agora a trabalhar encontram condições para
ficar no País, para quererem aqui morar, trabalhar, construir o futuro.
Sr. Primeiro-Ministro, no acordo assinado entre os nossos partidos, estabelecemos as condições para a
efetivação e para o alargamento do âmbito de combate à precariedade, através do reforço dos poderes da
Autoridade para as Condições do Trabalho na regularização de falsos recibos e outros vínculos ilegais, com a
imediata conversão em contrato de trabalho e acesso aos respetivos direitos. É uma medida que pode
responder já aos milhares de trabalhadoras e trabalhadores em situação precária e a falso recibo verde.
Pergunto-lhe o seguinte: em que prazo estará esta medida em vigor? Quando poderão os trabalhadores,
que hoje são vítimas das mais diversas ilegalidades e abusos, contar com a possibilidade de recurso eficaz à
autoridade fiscalizadora, que é a ACT? Estaremos em condições de afirmar que 2016 será o ano do fim dos
falsos recibos verdes e de outras ilegalidades laborais? É agora que os estágios passam a ser formação para
um emprego com contrato em vez do abuso que nega esse mesmo direito?
Sr. Primeiro-Ministro, quem começou a trabalhar na última década em Portugal e ainda não emigrou, só
conhece, em Portugal, a lei da selva no mundo do trabalho. O que pode esperar do seu Governo quem está
agora a terminar os seus estudos e quer começar a trabalhar?
Aplausos do BE.
O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Muito bem!
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro, para responder.
O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Catarina Martins, agradeço a sua intervenção e
saúdo-a a si e ao Bloco de Esquerda, que contribuíram para construir a solução política para dar ao País uma
solução de Governo com suporte maioritário estável nesta Assembleia da República.
Como disse, os compromissos foram assumidos numa base programática e uma das prioridades que foi
estabelecida foi, efetivamente, aquilo que designei por «melhor emprego». Melhor emprego é uma condição
essencial para defender a dignidade do trabalho, mas é uma condição também essencial para o melhor
crescimento da economia.
Durante os últimos meses tive oportunidade de falar por skype, em duas sessões diferentes, com várias
dezenas de jovens que emigraram nos últimos anos.
O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Extraordinário!
O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — Moderno!
O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — E vão voltar?!
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O Sr. Primeiro-Ministro: — E a realidade que todos relataram foi que, mais do que o desemprego, foram
as precárias condições de trabalho, a indignidade das condições de trabalho, a falta de perspetivas de futuro
que lhes eram oferecidas pelas condições de trabalho em Portugal que os levaram a partir para o estrangeiro.
Ora, o maior défice estrutural que o País tem é um défice de qualificações e esse foi, pela primeira vez,
diminuído com esta nova geração, que, com grande esforço da escola pública, com grande esforço das
famílias, o País, pela primeira vez, começou a aproximar-se dos níveis médios de qualificação da União
Europeia.
O drama da emigração não é só um drama individual, não são só as famílias que se dividem e que se
separam, é um drama, também, para o futuro do País, pela perda do potencial relativamente à sua capacidade
de desenvolvimento.
Aplausos do PS.
Combater a precariedade é essencial. 90% dos contratos de trabalho que se celebraram nos últimos anos
foram contratos a prazo e os contratos a prazo deixaram de ser um passo para o contrato definitivo, visto que
só 11% dos contratos a prazo se convertem em contratos definitivos.
Esta é uma situação intolerável para a dignidade do trabalho, mas é uma situação fatal para um modelo de
empresa que queira melhorar a sua produtividade naquilo que é essencial para a melhorar, ou seja, poder
investir na formação dos seus quadros, poder apostar na qualidade dos seus trabalhadores. Isto porque uma
relação que nasce condenada à partida é uma relação em que ninguém investe: nem o trabalhador veste a
camisola da empresa, nem a empresa se empenha relativamente ao trabalhador, isto não é uma empresa
saudável, não é uma empresa do século XXI, é uma empresa de um passado que não nos assegura nenhum
futuro e não é com base nestas empresas que poderemos construir um País desenvolvido e um País que
possa progredir na nossa União Europeia.
Aplausos do PS e de Deputados do BE.
A dignidade do trabalho é uma questão, também, de cidadania. O valor fundamental da dignidade da
pessoa humana diz respeito à dignidade da pessoa humana em todas as dimensões da sua vida, sendo desde
logo mais importante defender aquelas que se encontram numa posição de inferioridade e dependência no
trabalho.
É por isso que temos de inverter esta lógica de que o direito do trabalho e o direito ao trabalho são um
pecado e um fardo para a economia. Não! São uma condição para uma sociedade mais justa, que
corresponda ao modelo social sobre o qual a Europa se reconstruiu no pós-guerra.
Aplausos do PS.
Isso passa pela alteração da legislação, mas passa também, como disse, pela criação de condições de
fiscalização. E uma das prioridades que teremos é, efetivamente, o reforço da Autoridade para as Condições
de Trabalho.
Como sabe, o Programa do Governo acaba com esta ideia de que é necessário continuar a diminuir o
número de funcionários públicos. O Governo assume que o País precisa de uma administração capaz,
qualificada, e não há administração capaz e qualificada sem pessoas capazes e qualificadas.
Temos de repor a contratação e a integração de pessoas nas funções do Estado. Não quer dizer que por
cada pessoa que saia de um serviço entre outra pessoa para esse serviço, mas há serviços onde é necessário
e prioritário restabelecer as condições e a capacidade de funcionamento e um deles, seguramente, é a
Autoridade das Condições de Trabalho, de forma a combater a precariedade e o abuso da lei que
sistematicamente tem vindo a ser cometido. Esse é um compromisso que fizemos, esse é um compromisso
que iremos honrar.
Aplausos do PS.
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O Sr. Presidente: — Para colocar questões ao Sr. Primeiro-Ministro, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno
Magalhães, do CDS-PP.
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, que não ganhou as eleições,
Sr.as
e Srs. Deputados, discutimos hoje o Programa de um Governo de partidos que perderam as eleições, um
Programa do Governo que se baseia na destruição e não na construção, na rejeição e não na confiança e
neste facto muito simples: os senhores unem-se contra nós e não pelo País, porque nem sequer se
conseguem entender.
Aplausos do CDS-PP e PSD.
Mas é sobretudo um Programa de um partido que perdeu as eleições, que não se conformou com isso e se
lançou numa inédita e desenfreada conquista do poder, perdendo o seu eixo, os seus valores e a sua
moderação. É o Programa de um Governo minoritário, de uma minoria mais pequena, que não resulta de uma
coligação formal, não resulta de um acordo parlamentar, não resulta, sequer, de um texto comum, que nunca
foram capazes de fazer.
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Sr. Carlos César (PS): — Ainda a história do texto comum?!
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — É, por isso, um Programa que, conjunturalmente, pode até servir
alguns partidos, mas que, certa e seguramente, não serve Portugal nem os portugueses.
O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Muito bem!
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — E é também por isso, num debate tão inédito como este e não tendo
V. Ex.ª confiança para apresentar uma moção de confiança, que só pode haver uma votação clarificadora
apresentando os partidos da coligação uma moção de rejeição.
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Ai estão a pedir desculpa agora, é?!
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Por dois motivos: porque, politicamente, não estamos de acordo com
o que aconteceu e, economicamente, temos receio do que possa acontecer.
Aplausos do CDS-PP.
E, Sr.as
e Srs. Deputados mais à esquerda, que estão muito inquietos, quem se levantar amanhã contra a
rejeição ficará definitivamente comprometido e corresponsável com o que este Governo fizer ou deixar de
fazer. Não fogem à foto de família de que andam a fugir!
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
Protestos do Deputado do PCP João Oliveira.
Sr. Presidente, termino com quatro perguntas.
Primeira, o Ministro das Finanças deste Governo foi ontem a Bruxelas. Portugal tem objetivos orçamentais
para cumprir. O PCP, seu apoiante, diz que o valor do défice é irrelevante — por que é que há de ser três se
pode ser quatro ou cinco ou seis ou sete?
O Sr. João Oliveira (PCP): — Leia melhor!
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O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — E a primeira pergunta que lhe gostaria de fazer é se o seu Governo
tenciona começar por cumprir o défice inferior a 3% em 2015, o que está nas suas mãos, permitindo a
Portugal sair do procedimento excessivo, permitindo a Portugal ficar livre de sanções. Sendo ainda mais claro:
pode aqui garantir que o défice de 2015 ficará abaixo dos 3%? É uma pergunta para uma resposta de sim ou
não.
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
Protestos do BE e do PCP.
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Segunda pergunta: as medidas já anunciadas, pelo acordo que fez
com o PAN, o PEV, o BE e o PCP custam, pelo menos, 2000 milhões de euros — há quem fale em 3000
milhões —, aumenta a despesa e diminui a receita. Onde é que tenciona ir buscar o dinheiro para compensar
tudo isto?
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Tenciona ou não aumentar impostos? E quais?
Terceira pergunta: o seu Programa é eufórico quanto ao consumo, cabisbaixo em relação ao investimento
e omisso nas exportações.
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
Protestos do BE e do PCP:
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Exemplo: com as medidas do IRC, que são pura ideologia, como é
que vai convencer as empresas a preferir Portugal para investir, e com isso criar emprego, ou como é que vai
evitar que as empresas portuguesas escolham sistemas ficais mais favoráveis para investir o que poderiam
investir em Portugal?
Aplausos do CDS-PP e de Deputados do PSD.
A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — E até agora, como é que tem sido?!
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Quarta e última pergunta: a CGTP Intersindical já anunciou para este
mês de dezembro, até ao final do ano, uma onda de greves, nomeadamente, e cito, na «CP, CP Carga, Metro
de Lisboa e STCP», que vão desde amanhã até fins de dezembro.
O Sr. João Oliveira (PCP): — O senhor tem de rever a afiliação dos sindicatos porque nem até nisso
acerta!
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Dr. António Costa, em nome de que é que o senhor vai ceder o
controlo do setor dos transportes ao PCP, para mandar as empresas deste setor paralisar a economia e,
sobretudo, tornar num inferno a vida das pessoas numa altura como a do Natal?!
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
Dr. António Costa, é que nós, em quatro anos, tivemos 1073 greves, só no setor dos transportes.
O Sr. João Oliveira (PCP): — E mereciam mais!
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O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — O senhor ainda agora aqui chegou e já tem estas? Sublinho, uma
onda de greves! Sr. Dr. António Costa, em nome de quê e porquê entregou os transportes ao PCP?!
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
Protestos do PCP.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para responder, o Sr. Primeiro-Ministro.
O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Nuno Magalhães, em si saúdo toda a bancada do
seu partido, as Sr.as
e os Srs. Deputados do CDS-PP.
Sr. Deputado, não me classifico como vencedor ou perdedor porque, verdadeiramente, já não me lembro
desde quando o CDS não vai a votos.
Risos e aplausos do PS e de Deputados do BE.
Protestos do CDS-PP e do PSD.
Mas permita-me que procure atenuar o seu discurso algo tenso com uma pequena nota de humor: é
verdade que fui eu que negociei com o PCP, mas, pelos vistos, foram os senhores que ficaram com a cassete!
Risos do BE.
Risos e aplausos do PS.
E aquilo que o Sr. Deputado…
Protestos do CDS-PP e do PSD.
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, deixem o Sr. Primeiro-Ministro responder, se faz favor.
O Sr. Primeiro-Ministro: — E o que o Sr. Deputado Nuno Magalhães qualifica de inédito é simplesmente o
que tem acontecido em todas as eleições para a Assembleia Constituinte e para a Assembleia da República.
Os portugueses votam e esses votos são convertidos em mandatos. Quem tem mais votos, tem mais
mandatos; quem tem menos votos, tem menos mandatos. Por que razão é que o PPD e o CDS, juntos, têm
menos Deputados do que o PS, o BE, o PCP e o PEV?
A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — E o PAN?
O Sr. Primeiro-Ministro: — E o PAN. Pela mesma razão que uns e outros sempre tiveram mais mandatos
ou menos mandatos! É porque tiveram mais votos ou menos votos.
O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Desculpe, mas não se percebeu!
O Sr. Primeiro-Ministro: — Na legislatura anterior, o PSD e o CDS bastavam-se para ser maioria.
Acontece que na nova Assembleia da República o PSD e o CDS não se bastam para ser maioria. O que é que
aconteceu? É que os outros partidos, que, em conjunto, formam a maioria, não se limitaram a impedir a
formação de um governo do PSD e do CDS, não se limitaram a ter uma atitude de obstrução,…
Risos de Deputados do PSD.
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… não se limitaram a ter uma atitude de ficar à espera da melhor oportunidade para vos deitar abaixo, mas
encontraram, desde o primeiro minuto, uma alternativa de Governo que tem um suporte maioritário nesta
Assembleia da República. Isto é, simplesmente, a regra da democracia.
Aplausos do PS.
O Sr. Deputado Nuno Magalhães tinha a obrigação de nos conhecer e, portanto, de saber bem…
Protestos do CDS-PP e do PSD.
O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Irrita-se!
O Sr. Primeiro-Ministro: — … de saber bem que não temos a menor das dúvidas de que é do estrito
interesse nacional que nada aconteça nos próximos 29 dias que possa perturbar um objetivo do qual todo o
País comunga, o de que o País possa sair do procedimento por défice excessivo.
Portanto, este Governo, nos próximos 29 dias, tudo fará…
O Sr. António Carlos Monteiro (CDS-PP): — Para não estragar!
O Sr. Primeiro-Ministro: — … para não diminuir a receita nem aumentar a despesa relativamente ao
ponto em que estávamos no dia em que tomámos posse. E aquilo que desejo profundamente, em nome do
interesse nacional e também do interesse deste Governo, é que, a partir do final do próximo ano, Portugal
possa viver sem estar sujeito às regras do procedimento por défice excessivo.
Diz o Sr. Deputado Nuno Magalhães que um dos partidos que apoia este Governo, diria mesmo três dos
partidos que apoiam este Governo…
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Todos menos o PS!
O Sr. Primeiro-Ministro: — … não só não defendem o tratado orçamental como são contra o tratado
orçamental e são mesmo indiferentes ao cumprimento das metas do tratado orçamental. É essa a posição
conhecida do BE, do PCP e do PEV.
Mas também é conhecido o entendimento que tem o Partido Socialista e que está expresso no Programa
do Governo. Nós entendemos que o tratado deve ser mudado, mas, como todos os tratados que vinculam
Portugal e em nome do princípio da continuidade do Estado, o Estado deve respeitar os tratados a que está
vinculado enquanto eles se mantiverem em vigor. Portanto, este Governo nada fará para não cumprir os
tratados a que está obrigado.
Mais: é muito claro que nenhum dos partidos que apoiam este Governo teve de revogar princípios que
consideram irrevogáveis,…
O Sr. João Oliveira (PCP): — Verdadeiramente irrevogáveis!
O Sr. Primeiro-Ministro: — … nem o Partido Socialista teve de abdicar do cumprimento de um objetivo
que constava do seu programa eleitoral e que se mantém neste Programa do Governo. É que o que tem por
base este entendimento, este acordo, esta posição conjunta, como lhe queiram chamar, é um princípio de
enorme transparência. Respeitamos a pluralidade da identidade de cada um e convergimos no que
consideramos prioritário e essencial para dar resposta ao que consideramos urgente para o País: virar a
página da austeridade, permitir mais crescimento, melhor emprego e maior igualdade. Esta é a base do
entendimento e é isso que cimenta este acordo e nada mais.
Aplausos do PS.
Diz o Sr. Deputado, apoquentado, que teme os efeitos na economia.
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A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Apoquentado!…
O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Deputado, por favor, depois dos resultados já testados, das soluções
mágicas que quiseram aplicar a Portugal, como se fosse um laboratório, para, através da austeridade cega
que praticaram, dessa vontade e da ambição de radicalismo de irem para além da troica, com os resultados
que alcançaram, têm agora medo da mudança de políticas? Sr. Deputado, há uma coisa que lhe posso
garantir: a mudança de políticas mudará os resultados alcançados,…
O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Disso é que eu tenho medo!
O Sr. Primeiro-Ministro: — … porque a continuação dessas políticas só pode conduzir ao mesmo
resultado que os senhores alcançaram.
Aplausos do PS.
Última nota: acho absolutamente extraordinário que o Sr. Deputado Nuno Magalhães venha aqui colocar a
questão dos transportes públicos e, em particular, dos transportes públicos urbanos de Lisboa e do Porto nos
termos em que o fez.
O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Pois com certeza! É o que as pessoas sentem!
O Sr. Primeiro-Ministro: — É que o que as pessoas têm verificado, ao longo dos últimos anos, é que com
a política prosseguida pelo anterior Governo o País e as cidades tiveram 1073 greves, que aqui enunciou.
O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Até março!
O Sr. Primeiro-Ministro: — Esse é o resultado da forma intransigente, teimosa e de puro preconceito
ideológico que levou o Governo a recusar um entendimento com a Câmara do Porto e com a Área
Metropolitana do Porto, com a Câmara Municipal de Lisboa e com a Área Metropolitana de Lisboa, e essa
teimosia assenta, simplesmente, num preconceito, o de que a gestão privada é melhor do que a gestão
pública,…
O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Pelo menos não há greves!
O Sr. Primeiro-Ministro: — … mesmo quando essa gestão privada é assegurada por uma empresa
pública espanhola a quem o Governo entregou parte dos transportes públicos do Porto porque não confia nas
autarquias locais.
Aplausos do PS.
Ora, o senhor presta, certamente, um elogio grande ao PCP,…
O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — É quem manda!
O Sr. Primeiro-Ministro: — … confundindo o PCP com o poder local democrático, confundindo o PCP com
os cidadãos e confundindo o PCP com a vontade de termos um serviço público urbano de transporte de
qualidade, que é absolutamente essencial para o desenvolvimento das cidades e para a qualidade do
ambiente urbano. É isso que queremos garantir e é isso que iremos garantir.
Aplausos do PS, do BE e do PCP.
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O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — E viva a greve!
O Sr. Primeiro-Ministro: — Para terminar diria que, felizmente, a cegueira e o radicalismo foi tanto, a
trapalhada foi tanta que o Tribunal de Contas não visou os contratos e hoje é possível desfazer essa negociata
sem que isso custe dinheiro ao Estado nem implique indemnizações que o Estado teria de pagar.
Aplausos do PS, do BE e do PCP.
O Sr. Presidente: — Para pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Jerónimo de Sousa,
do PCP.
O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, no processo político decorrente
das eleições legislativas e após a tomada de posse do Governo do PS, estamos hoje numa outra fase, a da
discussão do Programa do Governo.
PSD e CDS sofreram um pesado revés eleitoral, perdendo a maioria e ficando limitados a uma minoria,
incapaz de formar governo e de ver aprovado o seu Programa, no quadro da nova expressão e arrumação de
forças na Assembleia da República, arrumação de forças de onde emanou uma solução política e institucional
alternativa, sustentada por uma maioria de Deputados eleitos pelos portugueses.
Daqui releva um facto: a maioria do povo português expressou a vontade de ver fora das suas vidas o
Governo do PSD e do CDS, vontade alicerçada num anseio profundo de parar com a política de exploração e
empobrecimento, na esperança de ter uma vida melhor.
No seu esforço de guerrilha e de crispação, PSD e CDS recusam-se a aceitar essa expressão da vontade
popular e a analisar as causas que levaram a que cerca de 700 000 portugueses — um CDS inteiro! —
tivessem abandonado a sua coligação…
O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Um PCP inteiro!
O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — … e quisessem impedir que o Governo do PSD e do CDS levasse por
diante a sua política de destruição económica e social, de afundamento e declínio do País, tratando as
injustiças e o drama de muitas vidas como meros danos colaterais.
O desemprego que aí está, e se mantém, a níveis elevados; a precariedade já não só do trabalho mas da
própria vida de centenas e centenas de milhares de portugueses que se viram despojados de condições
mínimas de vida; todos esses dramas que atingem milhões de portugueses continuam a ser desprezados pelo
PSD e pelo CDS, que preferem alimentar uma estéril guerrilha política.
A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Exatamente!
O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — PSD e CDS exercitam as diferenças e as divergências programáticas
entre PS e PCP como se tivessem descoberto a pólvora, como se da nossa parte alguma vez tivesse havido
ocultação ou até abdicação da identidade, do projeto, do programa, como se não existisse o compromisso do
PCP assumido e mantido com os trabalhadores e o povo português.
Compreende-se que PSD e CDS queiram esconder aquilo que em concreto foi possível PS e PCP
identificarem como elementos de convergência na resposta a problemas e anseios dos trabalhadores e do
povo e que estão vertidos no Programa do Governo que hoje discutimos.
Este Programa acolheu um conjunto de propostas que, na sua concretização, podem contribuir para
melhorar, ainda que de forma limitada, a vida de milhões de portugueses, particularmente dos trabalhadores,
dos reformados, dos jovens, das mulheres, dos pequenos e médios empresários. Medidas de reposição de
salários, de descongelamento das pensões, de reposição dos complementos de reforma dos trabalhadores do
setor empresarial do Estado e de outros rendimentos e direitos, incluindo feriados, prestações sociais,
medidas de combate à precariedade, aos falsos recibos verdes, ao recurso abusivo a estágios ou de
conversão de bolsas em contratos de investigação. Medidas de diminuição da carga fiscal, nomeadamente do
IVA da restauração, de introdução da cláusula de salvaguarda do IMI, da dotação dos recursos humanos,
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técnicos e financeiros necessários à qualidade dos cuidados de saúde prestados pelo SNS, de eliminação do
obstáculo que as taxas moderadoras constituem no acesso à saúde ou na reposição do transporte de doentes
não urgentes.
Na educação, com um importante conjunto de medidas, designadamente, visando o reforço da ação social
escolar, a progressiva gratuitidade dos manuais escolares no ensino obrigatório ou a redução do número de
alunos por turma, tal como em relação a outros serviços públicos, nomeadamente da segurança social e dos
transportes.
É verdade que este não é um Programa do PCP, este é um Programa do Governo do PS, um Programa
que reconhece que foram erradas as políticas promovidas nos últimos anos. Registamos a vontade de
mudança que expressa e contribuiremos para que a vida a confirme.
Vinte e um dias depois da derrota do Programa do Governo PSD/CDS poderíamos colocar a questão de
saber quanto tempo mais precisamos para descobrir todas as surpresas desagradáveis que o anterior
Governo PSD/CDS deixa ao País.
Nestes vinte e um dias já confirmámos que a devolução da sobretaxa era um embuste, já descobrimos que
a execução orçamental desmente as promessas feitas quanto ao défice e já confirmámos que o BANIF é
mesmo um motivo de preocupação para os portugueses.
O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Isso há dois anos que já é!
O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — O que haverá mais para descobrir e quanto tempo demorará essa
descoberta será uma boa questão a colocar.
Permitam-me outra questão. O Programa do Governo do PS que hoje discutimos terá de enfrentar a
contradição entre o grau de concretização dos seus objetivos estruturantes — da criação de emprego, do
investimento, do crescimento económico e do desenvolvimento — no quadro dos constrangimentos externos
existentes que nos são impostos e cujos instrumentos de realização têm sido dogmas intocáveis para o PSD e
para o CDS, com as graves consequências que se conhecem e estão plasmadas na grave realidade
económica, social e cultural do País.
É necessário ultrapassar a divergência existente entre uma realidade aprisionada em regras e
constrangimentos draconianos e estéreis e a necessidade de afirmar o nosso desenvolvimento soberano. Esta
é uma pergunta que os portugueses colocam a si próprios e para a qual, estamos certos, gostariam de ter uma
resposta do Primeiro-Ministro, para lhes garantir um outro futuro a que aspiram e merecem.
Valorizamos a resposta a problemas mais urgentes dos portugueses, ao mesmo tempo que colocamos a
necessidade evidente de uma política patriótica e de esquerda.
Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, houve uma derrota que ainda aqui não foi falada, a da ideologia das
inevitabilidades, que tudo justificava e tudo impunha.
Aplausos do PCP, do PS, do BE e de Os Verdes.
Está aberta uma janela de esperança, aquela esperança que não fica à espera. Estará de acordo, Sr.
Primeiro-Ministro, que é necessário concretizá-la.
Aplausos do PCP, do PS, do BE e de Os Verdes.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.
O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Jerónimo de Sousa, muito obrigado e, em si,
queria saudar todas e todos os Srs. Deputados do PCP e o contributo que deram para que seja possível ao
País ter esta solução de governo.
O Sr. Deputado começou por colocar a questão no devido ponto. A direita tem dificuldade em compreender
que a esquerda, apesar de ser plural, seja capaz de se entender naquilo que é essencial.
A pluralidade e as nossas diferenças não são um fator de fraqueza; pelo contrário, é a identidade própria
de cada um que dá força a este coletivo e a esta convergência que foi possível realizar.
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Aplausos do PS.
O Sr. Paulo Portas: — Já é um coletivo!
O Sr. Primeiro-Ministro: — E aquilo que é efetivamente de saudar é a capacidade que os diferentes
partidos tiveram de estar à altura das suas responsabilidades e de, perante uma vontade muito clara do povo
português de que houvesse uma mudança de política, termos sido capazes de virar, também nós, uma página
e assumir as responsabilidades que nos competiam, para não frustrar a única oportunidade de que essa
maioria eleitoral que rejeitava as políticas da direita se pudesse converter também numa maioria que fosse
uma solução de governo. Isso é algo que é importante enfatizar e cuja importância política não pode ser
diminuída.
Agora, isso assenta, obviamente, na clareza e na transparência do respeito pelos princípios de uns e de
outros. É sabido que temos uma visão diferente sobre a Europa, mas ambos partilhamos a preocupação da
necessidade que a Europa também crie as condições para que esta moeda única não contribua para acentuar
ainda mais as assimetrias entre as diferentes economias e, pelo contrário, que possamos retomar um
processo de convergência.
Sei bem que o PCP considera que é difícil este esforço de compatibilização. Os compromissos que
assumimos com o PCP são compromissos que avaliámos, que medimos e que nas projeções que fazemos da
nossa trajetória orçamental consideramos absolutamente compatíveis.
Bem sei que o PCP também definiu a regra, como nós definimos a regra. Nós queremos cumprir uma
trajetória e o PCP disse, com toda a clareza, o que é que, para cumprir essa trajetória, não está disponível
para apoiar. Aquilo que o PCP não está disponível para apoiar, também é preciso ser claro, é o que também
nós não estamos disponíveis para propor.
Aplausos do PS.
Portanto, o caminho não será certamente fácil, mas o que é importante é termos decidido iniciar esta
caminhada. E temo-lo feito de uma forma aberta, de boa-fé e com base na confiança mútua.
Quando aqui digo que este é um Governo confiante é porque nós sabemos que podemos confiar naqueles
com quem criámos esta solução de governo e que, designadamente, podemos confiar no PCP para esta
capacidade de governar na perspetiva da Legislatura. É essa a confiança que temos e é essa confiança que
depositamos, também, no diálogo e no trabalho conjunto com o PCP.
É verdade que impressiona olhar agora para aquilo que foram as declarações do então Primeiro-Ministro e
da então Ministra das Finanças sobre as garantias que foram dadas, a poucos dias das eleições, sobre a
devolução da sobretaxa.
É impressionante ver como em julho se perspetivava uma devolução de 19%, como em agosto a devolução
já ia nos 25% e como em setembro, em cima das eleições, já ia quase nos 36%. E de repente, subitamente,
ainda na vigência desse Governo, veio a verificar-se que, afinal, a perspetiva é a de chegar ao final do ano e a
devolução da sobretaxa do IRS ser 0%, não tendo passado de nada mais do que de uma monumental
tentativa de fraude eleitoral com que se quiseram enganar os portugueses e os eleitores.
Aplausos do PS, do BE e do PCP.
Mas há uma coisa que podemos garantir: a partir do próximo ano não haverá «ses». A partir do próximo
ano e de acordo com aquilo que será deliberado por esta Assembleia da República, a sobretaxa começará
mesmo a ser eliminada, porque a questão não é a de devolver nem 9%, nem 15%, nem 36%, é de, pura e
simplesmente, eliminar a sobretaxa. É esse o compromisso que temos e que temos de concretizar.
Aplausos do PS e do PCP.
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É verdade que temos constrangimentos externos e que temos posições diferentes sobre os
constrangimentos externos. Agora, a visão que temos é a de que, na Europa, Portugal tem também uma
palavra a dizer. E a Europa em que acreditamos, a Europa por que nos temos de bater é uma Europa onde
todos os Estados são iguais.
É evidente, como tenho dito, que, numa negociação a 28, ninguém pode prometer o resultado. E a
experiência de outros Estados já demonstrou que não é pela via isolada e confrontacional que podemos
encontrar soluções. É criando alianças, é abrindo espaços, é criando diálogo e perspetivas de alternativa que
podemos, também no quadro da Europa, encontrar a margem de manobra de que necessitamos para pôr
termo a esta divergência, que se iniciou no princípio deste século, e retomar a trajetória de convergência que
tivemos nos nossos primeiros 15 anos de participação no quadro da União Europeia.
Esse é um esforço que temos de fazer, que temos de fazer todos, independentemente das diferentes
perspetivas que cada um tem sobre a natureza e o que deve ser o futuro da Europa.
Mas há uma coisa sobre a qual temos de estar todos entendidos: na Europa, o nosso primeiro dever é
defender os interesses de Portugal, os interesses da economia portuguesa e o interesse dos portugueses.
Essa é a nossa postura e será assim que nos bateremos na Europa.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, quero começar por
cumprimentá-lo, em nome do Grupo Parlamentar Partido Ecologista «Os Verdes», assim como todas as Sr.as
e
todos os Srs. Membros do Governo, Sr.as
e Srs. Deputados.
Sr. Primeiro-Ministro, esta questão que quer o PSD quer o CDS hoje trouxeram para encher os seus
discursos aqui, na Assembleia da República, no debate sobre o Programa do Governo — e refiro-me à
questão da legitimidade do Governo —, não se coloca, Sr. Primeiro-Ministro, porque o PSD e o CDS não
considerem que o Governo não seja, de facto, legítimo. Eles sabem que o Governo tem legitimidade política,
como é evidente. Aquilo que eles não querem que se prove é que pode existir, em Portugal, uma política
alternativa, diferente daquilo que eles fizeram. É esse o pavor que eles têm. E é por isso que consideram que
não há legitimidade para praticar uma política diferente, uma política que traga resultados diferentes daqueles
que trouxe, neste caso, a governação do PSD e do CDS.
É evidente que há legitimidade quando estão eleitos 230 Deputados, e quando PSD e CDS, sozinhos, não
conseguem uma maioria na Assembleia da República e não têm, pura e simplesmente, nenhuma outra força
política que lhes dê a mão, porque as outras forças políticas comprometeram-se com uma mudança. Então,
Sr. Primeiro-Ministro, é para essa mudança que nós temos de trabalhar.
E para trabalhar para essa mudança, Sr. Primeiro-Ministro, há uma primeira coisa que temos de fazer: uma
política de verdade. Acabou a política da mentira e da ilusão. Não pode continuar mais, Sr. Primeiro-Ministro!
Risos do Deputado do PSD Hugo Lopes Soares.
Não pode haver, num ano, 100 000, 150 000 pessoas a emigrar e o Governo continuar a dizer que o nível
da emigração não é nada de especial, porque, no passado, sempre foi assim. Não pode haver mais 800 000
pobres e o Governo erradicar do seu discurso o nível de pobreza que existe, em Portugal. Não pode um
Governo dizer que uma sobretaxa vai ser devolvida aos portugueses em 35%, quando, na verdade, sabia já,
na altura, que o resultado seria zero. Sabia já, na altura, Sr. Primeiro-Ministro! Não pode um Governo dizer
que isto, agora, anda tudo a galope no crescimento económico, quando o INE nos vem dizer que a estagnação
do crescimento económico está à vista.
Sr. Primeiro-Ministro, esta é a primeira questão: uma política de verdade.
A segunda questão, Sr. Primeiro-Ministro, é esta: para Os Verdes, há um compromisso fundamental e
prioritário com o País que é o combate às desigualdades — e a dois níveis. Um deles tem obviamente a ver
com a matéria da pobreza.
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O PSD e o CDS procuraram criar um modelo em que era fundamental que uma faixa determinada da
população caísse na pobreza para esse mesmo modelo se sustentar. E não apenas que caísse na pobreza,
mas que se mantivesse na pobreza, que se habituasse a esse nível de pobreza, para que o seu modelo
pudesse funcionar, um modelo de serviço ao grande poder económico e financeiro. E isto não é um modelo
sustentável para o País.
É por isso que lhe peço, Sr. Primeiro-Ministro, que discrimine aqui algumas medidas essenciais para
combatermos a pobreza no curto e no médio prazos.
É evidente que o descongelamento das pensões é uma questão prioritária, é evidente que o aumento do
salário mínimo nacional é fundamental, …
O Sr. João Oliveira (PCP): — É verdade!
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — … é evidente que a reposição dos salários que foram roubados é
fundamental, mas há mais medidas, Sr. Primeiro-Ministro. Como é que vamos inverter este ciclo de
empobrecimento das pessoas, no País?
Há ainda outra matéria fundamental naquilo que se refere ao combate às desigualdades, que tem a ver
com as assimetrias regionais no País.
Pura e simplesmente, PSD e CDS trabalharam para esquecer uma boa parte do nosso território nacional e
as potencialidades que esse território e as pessoas que estão nesse território têm para oferecer ao
crescimento e ao desenvolvimento do País. E é evidente que, se são fundamentais os serviços públicos, o
investimento e o incentivo à instalação de empresas no interior do País, há outra matéria que é fundamental,
que é a matéria da mobilidade, dos transportes. E fundamentalmente agora que ocorre a Cimeira de Paris e
que se discutem os efeitos e as consequências das alterações climáticas e que nós sabemos também que o
setor dos transportes é dos maiores emissores de gases com efeito de estufa, então, Sr. Primeiro-Ministro, o
setor dos transportes tem de ser uma prioridade, em Portugal, quer na lógica urbana, quer na lógica da ligação
do País.
O Sr. Presidente: — Já ultrapassou o seu tempo, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Vou terminar, Sr. Presidente.
Ora, o transporte ferroviário é uma peça-chave nesta mobilidade que se quer mais ecológica, mais amiga
do ambiente e mais amiga das pessoas, porque lhes permite justamente essa mobilidade que lhes é negada.
Gostava também de um comentário do Sr. Primeiro-Ministro sobre aquilo que o Programa do Governo tem
para oferecer nesta matéria.
Aplausos de Os Verdes, do BE e do PCP.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.
O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia, quero também saudar, em si,
o Grupo Parlamentar Partido Ecologista «Os Verdes» e o apoio e o contributo que deram para a criação de
uma solução de suporte maioritário a este Governo na Assembleia da República.
A direita começou por confundir aritmética com economia. Por isso, achou que, se cortasse na despesa,
diminuiria seguramente o défice, desconhecendo o efeito que o ter ido além da troica teve em 2012, e achou
que, se aumentasse simplesmente os impostos, aumentaria a receita, desconhecendo o efeito que isso teve
na economia.
A verdade é que o ter ido além da troica e o enorme aumento de impostos em 2012 teve como resultado
um enorme efeito recessivo na economia, que não diminuiu o défice, pelo contrário, agravou o défice e
aumentou o endividamento do País.
A direita acreditou que tinha mudado o paradigma do nosso modelo de desenvolvimento, chegou até a ser
anunciado que hoje crescíamos com base nas exportações e que as importações tinham diminuído,
simplesmente porque tinham cortado os salários e tinham aumentado o empobrecimento do País.
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Ora, mudar o paradigma do desenvolvimento não é ficarmos todos tão pobres que não podemos comprar
nada, nem aquilo que é importado nem aquilo que é produzido nacionalmente.
É por isso que aquilo que temos verificado nos últimos anos é que, apesar de ter havido um aumento do
consumo, ele não foi sustentado saudavelmente no aumento do rendimento mas no aumento do
endividamento, e não contribuiu para um aumento da produção nacional mas simplesmente para um aumento
das importações.
O modelo que a direita tinha dito que era um modelo que tinha funcionado não funcionou, não resultou e
nós temos de virar a página a essa política.
É por isso que é necessário afirmar uma alternativa. Perguntam: «Mas como é que se paga?» Paga-se
precisamente porque, se tivermos uma economia a funcionar, temos melhores condições para aumentar a
receita e temos melhores condições para diminuir a despesa.
Não queremos diminuir a despesa com o subsídio de desemprego porque cortamos o acesso ao subsídio
de desemprego a quem está desempregado. Queremos que haja uma diminuição da despesa com o subsídio
de desemprego porque queremos que haja menos desempregados e mais emprego, mais pessoas
empregadas e a trabalhar.
Aplausos do PS.
Não queremos aumentar a receita fiscal por via do aumento da carga fiscal mas por via do aumento do
rendimento, do aumento das pessoas que têm rendimentos, do aumento do número de contribuintes, para,
assim, podermos ter finanças públicas consolidadas de um modo mais saudável.
É essa alternativa que temos de construir e esse virar de página que temos de fazer.
E tem razão, Sr.ª Deputada, eles recusam-se a aceitar essa evidência, a de que havia uma alternativa. Por
isso acreditaram que podiam estar hoje a governar, e podiam estar hoje a governar contra a vontade da
maioria do povo português. Mas a resposta que fomos capazes de dar foi a de termos conseguido transformar
numa maioria de suporte a um governo aquilo que foi a maioria eleitoral expressa pelos portugueses nas
eleições. E é isso que dá a legitimidade e é isso que dá a força política e democrática a esta política.
Aplausos do PS.
O combate à desigualdade, em particular à pobreza, é prioritário. Claro que, antes da pobreza, não
podemos aceitar a continuação do empobrecimento salarial. Assim, o combate à desigualdade passa pelo
salário mínimo, mas passa por outro fator fundamental, que é o de desbloquear a contratação coletiva, porque
a contratação coletiva é essencial para reequilibrar as relações de poder nas empresas e podermos ter, de
uma forma mais saudável e ajustada a cada setor, uma melhor progressão salarial.
Mas temos medidas específicas de combate à pobreza, a saber: o restabelecimento do âmbito de acesso
ao complemento solidário para idosos e ao rendimento social de inserção; uma estratégia nacional de combate
à pobreza infantil e juvenil; e a previsão de uma nova prestação social dirigida especificamente aos
trabalhadores, àqueles que, descontando rendimentos do trabalho, chegam ao final do ano e se encontram
abaixo do limiar de pobreza e que hoje, de uma forma ofensiva para o que é a dignidade do trabalho, já são
10% das pessoas que fazem descontos de rendimentos do trabalho.
Ora, é inaceitável numa sociedade decente que quem trabalhe se encontre, no final do ano, abaixo do
limiar de pobreza. Isso tem de ser compensado e essa nova prestação tem de ser introduzida para combater
os níveis de pobreza, em Portugal.
Finalmente, a aposta na ferrovia é essencial, como a aposta no transporte público em geral é fundamental.
E é hoje uma aposta decisiva também, essencialmente, por questões ambientais.
É por isso que, na nova orgânica do Governo, fizemos uma alteração da maior importância, que foi passar
a tutela dos transportes públicos urbanos do Ministério do Planeamento e das Infraestruturas para o Ministério
do Ambiente. Isto porque queremos que haja um investimento decisivo na melhoria do ambiente urbano e
porque o grande desafio civilizacional das alterações climáticas perde-se ou ganha-se nas cidades — e perde-
se ou ganha-se nas cidades em função da eficiência energética que seja possível adquirir nas cidades. E, aí,
em dois domínios fundamentais: a eficiência energética do edificado, e daí a prioridade à reabilitação, e a
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eficiência energética na mobilidade, e daí a aposta no transporte público e a unificação desta política de
ambiente urbano na tutela do Ministério do Ambiente, para que essa possa ser um motor importante de um
novo paradigma energético em Portugal e de uma nova aposta na qualidade do ambiente e do contributo de
Portugal para a melhoria das condições de combate às alterações climáticas. Essa é também uma prioridade
da ação política deste Governo.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado André Silva.
O Sr. André Silva (PAN): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro e restantes Membros do Governo, Sr.as
e
Srs. Deputados e todos os presentes na Sala, quero começar por expressar os meus votos de sucesso ao
novo Executivo e felicitar a integração, neste Programa de Governo, de algumas medidas no âmbito da
proteção animal, uma aparente nova posição face ao setor da água e o desagravamento das restrições
económicas e sociais desajustadas.
No entanto, a sua análise detalhada revela algumas insuficiências na abordagem de outros temas
estruturantes e suscita várias questões, que passo a colocar.
O Capítulo IV refere a criação de um «Programa Nacional de Educação para a Saúde, Literacia e
Autocuidados». Sabendo que uma elevada percentagem do Orçamento do Estado vai para o tratamento de
doenças crónicas não transmissíveis, muitas delas relacionadas com maus hábitos alimentares, considera o
Sr. Primeiro-Ministro a inclusão de medidas concretas, como, por exemplo, a introdução gradual de alimentos
biológicos em cantinas e refeitórios da Administração Pública?
Segunda questão: no capítulo VI, página 185, que remete para a liderança da transição energética, o
Programa prevê a revisão do Plano Nacional de Barragens. A medida não inclui a expressão «suspensão»,
tão só e apenas a «revisão» do Plano. É assim incontornável pensar-se que a mera referência a uma
«revisão» não exige, da parte do PS, a paragem atempada dos processos de licenciamento e de construção
das barragens que faltam.
Sabemos que os processos de revisão no nosso país são muitas vezes prolongados no tempo. Assim, a
questão que gostaríamos de ver respondida é a seguinte: a revisão do Plano Nacional de Barragens será
acompanhada da imediata e necessária suspensão dos licenciamentos e construções até que exista uma
conclusão da dita revisão?
Terceira questão: este Programa defende a exploração de gás e petróleo na costa marítima do Algarve.
Esta exploração põe em risco a principal atividade económica da região, o turismo, que funciona ainda como
principal alavanca do resto dos setores da vida económica do Algarve. Uma vez que a experiência histórica
mundial dos acidentes em plataformas de exploração de petróleo permite afirmar a probabilidade de que
gravíssimos e devastadores acidentes ambientais possam ocorrer na costa e praias do Algarve, ainda assim,
Sr. Primeiro-Ministro, considera que devemos continuar a subjugar de forma irreversível o nosso bem comum
aos interesses económicos?
O Sr. Presidente: — Já ultrapassou o seu tempo, Sr. Deputado.
O Sr. André Silva (PAN): — A última questão que quero colocar é a seguinte: a Assembleia Municipal de
Lisboa aprovou recentemente, por larga maioria, uma moção dirigida à Assembleia da República para que se
inclua nas competências municipais a proibição de atos de violência contra animais, incluindo touradas. Está o
Governo disponível para acompanhar esta ideia que visa dar liberdade de decisão a cada município?
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.
O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr. Deputado, queria saudá-lo pela primeira eleição do PAN
para esta Assembleia da República e pelo diálogo que mantivemos, que permitiu enriquecer o Programa do
Governo com um conjunto de contributos que o PAN apresentou.
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Relativamente à questão das touradas, como sabe, o nosso Governo dá uma grande prioridade ao reforço
da descentralização e ao entendimento de que a descentralização deve mesmo ser a pedra angular da
reforma do Estado.
Os municípios com atividade tauromáquica são menos de 50 no conjunto do país. Há municípios onde é
uma tradição muito arreigada e há municípios que, por sua própria decisão, já excluíram essa atividade do seu
território.
Creio que a boa regra é confiar a cada um dos municípios a definição das decisões relativas à realização
desses espetáculos como de outro tipo de espetáculos também envolvendo animais.
Acho que a melhor forma não é estipular uma regra nacional, é fazê-lo em função da realidade específica
de cada um, da valia cultural que os espetáculos têm em cada um deles e das práticas que neles devem ou
não ser prosseguidos, por vontade democrática dos municípios.
Acho que temos boas razões para confiar nos municípios portugueses no sentido de um exercício
responsável dessa competência. Se assim o fizermos acho que respondemos simultaneamente àquilo que
devemos salvaguardar, isto é, por um lado, a preservação e o reforço do bem-estar animal e, por outro lado,
conter e respeitar as tradições nos espaços onde elas têm uma densidade que justifica que,
democraticamente, esses municípios entendam prosseguir essas práticas.
A atribuição dessa competência aos municípios abre, aliás, a porta a que possam ser os próprios cidadãos
desses municípios a, por via de referendo local, pronunciar-se sobre essa matéria e acho que devemos
apostar e confiar na democracia local para poder decidir e gerir essas decisões porque certamente serão
decisões que corresponderão, de uma forma mais genuína, à efetiva vontade popular e à natureza própria de
cada um dos municípios.
Uma segunda questão tem a ver com a promoção da saúde através da alteração dos hábitos alimentares.
Nessa matéria é, aliás, muito importante o trabalho que muitos municípios têm vindo a desenvolver no sentido
de criar programas de educação para a saúde através das ementas das refeições escolares. É importante que
essas práticas se generalizem de forma a podermos melhorar os nossos hábitos alimentares e que isso seja
feito desde a infância, porque condiciona definitivamente a evolução da saúde de cada um e contribui, de uma
forma saudável, para a promoção da saúde e para que a intervenção na saúde não surja exclusivamente na
fase da patologia, mas, pelo contrário, possa existir numa fase preventiva e de promoção e educação para a
saúde.
Relativamente às duas outras questões que colocou, o que consta do Programa do Governo é exatamente
aquilo que nos comprometemos fazer: por um lado, rever no mais curto prazo possível o Plano Nacional de
Barragens, fazendo as avaliações, e, por outro lado, avaliar os potenciais de recursos naturais do País, tendo
em conta a necessidade de compatibilizar com outras atividades económicas e também com um bem maior
que é necessário salvaguardar: a proteção ambiental de zonas sensíveis que importa preservar.
É nesse sentido que o Programa do Governo deve ser lido, deve ser entendido e que esses exercícios
devem ser prosseguidos.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Sr. Primeiro-Ministro, chegámos, assim, ao fim da primeira ronda de questões.
Inscreveram-se ainda mais 15 Sr.as
e Srs. Deputados para pedir esclarecimentos, tendo o Sr. Primeiro-
Ministro informado a Mesa que responderá por grupos de quatro.
Em primeiro lugar, para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Hugo Lopes Soares.
O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Sr. Presidente, agradeço-lhe, sobretudo, por ter concedido em
primeiro lugar a palavra a um Deputado da bancada maioritária da Assembleia da República. É só uma
questão de fazer contas, Sr. Deputado Carlos César!
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Queria cumprimentar o Sr. Primeiro-Ministro, as Sr.as
e os Srs. Membros do Governo, as Sr.as
e Srs.
Deputados.
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Sr. Primeiro-Ministro, discutimos, hoje, o Programa do Governo que trouxe à Assembleia da República e
que os portugueses nunca sufragaram. Não o sufragaram, porque este não é o programa eleitoral do Partido
Socialista, não é o programa eleitoral do Bloco de Esquerda, tão pouco é o programa eleitoral do Partido
Comunista Português. É uma espécie de rapsódia, Sr. Primeiro-Ministro, um conjunto desafinado de propostas
dos vários partidos sem qualquer coerência e, na verdade, o Sr. Primeiro-Ministro assume a sua paternidade.
O Sr. Primeiro-Ministro! Até porque as Sr.as
e os Srs. Ministros limitaram-se a assinar um contrato de adesão
cujo objetivo é, no fundo, o de ser um contrato de sociedade, mas um contrato de sociedade em que, bem ao
gosto da esquerda portuguesa, a golden share está na posse do Bloco de Esquerda e do Partido Comunista
Português.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Sr. Primeiro-Ministro, não rejeitamos o Programa do Governo apenas por rejeitar. Rejeitamo-lo porque ele
não vai ao encontro dos anseios das portuguesas e dos portugueses.
Queria recordar-lhe o dia 17 de setembro. Já lá vão 76 dias, 1824 horas, mas julgo que o Sr. Primeiro-
Ministro se recordará de certeza de um debate que ficou para a história das rádios portuguesas e que o Sr.
Primeiro-Ministro perdeu copiosamente. Perdeu esse debate, na ocasião, porque não foi capaz de dar uma
resposta para a qual eu pedia hoje a sua atenção. Julgo que é uma resposta que esta bancada, mas também
as bancadas da esquerda, e sobretudo os portugueses, esperam que dê.
No terceiro parágrafo da página 227 do programa eleitoral, o Sr. Primeiro-Ministro reafirma a vontade de
reforçar a aplicação de condições de recurso às prestações sociais não contributivas. De resto, o Sr. Primeiro-
Ministro anunciou em tempos que com isso previa uma poupança de 1000 milhões de euros. Sr. Primeiro-
Ministro, não me levará a mal que me dirija agora ao Bloco de Esquerda e ao Partido Comunista Português
para lhes perguntar se é para caucionar um corte nas prestações sociais não contributivas que o Bloco de
Esquerda e o Partido Comunista Português vão dar uso à tal golden share. É que, durante vários anos,
ouvimos aqui o que a esquerda bradava contra os cortes nas pensões. Hoje caucionarão esse corte nas
prestações não contributivas com a golden share que está na posse da esquerda mais radical das bancadas
do Parlamento!
Sr. Primeiro-Ministro, passo a colocar-lhe uma questão e não vale a pena depois entrarmos num jogo de
pingue-pongue. Não queira sacudir responsabilidades, pois é a si que agora cabe responder pela governação
e pelas propostas que escreve no Programa do Governo.
Sr. Primeiro-Ministro, quais são as prestações não contributivas da segurança social a que vai impor uma
condição de recursos? Tem de me dizer, a mim e aos portugueses, que prestações sociais é que vai cortar. É
o abono de família? São as bolsas de estudo? São os complementos sociais de pensões? É o rendimento
social de inserção?
Sr. Primeiro-Ministro, como lhe disse, passaram 76 dias e o Sr. Primeiro-Ministro não deu essas respostas.
Ora, hoje é o dia de as dar.
Queria lembrar-lhe também que se passaram 56 dias desde o último dia 4 de outubro, que foi o dia em que
o senhor perdeu as eleições legislativas!
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado João Torres.
O Sr. João Torres (PS): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Primeiro-Ministro, dirijo-lhe neste momento
uma saudação muito especial pela sua nomeação e faço votos de concretização de um grande mandato e, por
aquilo que ouvi hoje, faço votos para que tenha uma inequívoca condição de paciência nesta Legislatura que
temos pela frente.
Sr. Primeiro-Ministro, ao longo dos últimos anos, foi evidente a degradação das condições de vida das
novas gerações.
A precariedade consolidou-se e a prová-lo está o nível médio salarial dos novos contratos de trabalho com
um salário pouco acima dos 500 €.
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O desemprego jovem não deu mostras de um caminho de retrocesso consistente, cifrando-se acima dos
30%, um dos valores mais elevados do espaço europeu.
A emigração constituiu e constitui uma das maiores chagas da nossa sociedade, tendo levado, só em 2013
e 2014, à saída de 2% da nossa população. Portugal é mesmo o País com a mais alta taxa de emigração da
União Europeia.
Mas o que é mais grave, Sr. Presidente, Srs. Deputados e Sr. Primeiro-Ministro, é que todos estes
problemas afetaram o conjunto da nossa população, mas agrediram com especial intensidade as novas
gerações, tendo as suas famílias ficado privadas de um projeto de vida comum.
E mais grave ainda, Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro: não nos enganemos, todo este quadro resulta em
grande medida de uma opção política muito clara por parte da direita conservadora que nos governou ao longo
dos últimos anos.
Quando a geração mais qualificada de sempre mais precisou de um governo que garantisse os seus
direitos, incentivasse as suas capacidades e protegesse o seu futuro menos os portugueses puderam contar
com ele. Mas, Sr. Primeiro-Ministro, não é de estranhar. Afinal de contas o governo cessante acreditava que
era possível o País estar melhor mas os portugueses viverem pior!
Aplausos do PS.
E talvez por isso os portugueses e o Parlamento — sublinho, os portugueses e o Parlamento — tenham
levado a direita para essa zona de conforto que é o lugar da oposição, e, já agora, o lugar de conforto que é o
lugar da oposição da minoria do contra que se está a formar nesta Assembleia da República.
Srs. Deputados do PSD e do CDS, à visão pequenina do nosso País, poucochinho foi o que VV. Ex.as
fizeram com os jovens portugueses!
Aplausos do PS.
À visão pequenina do nosso País, poucochinho foi o que VV. Ex.as
fizeram! À visão pequenina do nosso
País urge contrapor uma nova abordagem, uma nova visão de conjunto para a construção do Portugal futuro!
É indispensável que o novo Governo que o Sr. Primeiro-Ministro lidera governe para todas as gerações ao
invés de instigar conflitos entre as gerações de portugueses.
Por isso, Sr. Primeiro-Ministro, pergunto-lhe o seguinte: que garantias pode dar de que o Governo da
República não continuará a incentivar a emigração forçada da juventude portuguesa? Tem confiança nas
novas gerações deste País? É que está mais do que provado que, nos últimos quatro anos, não houve nem
oportunidades sólidas nem alternativas de futuro para as novas gerações.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Soares, do Bloco de
Esquerda.
O Sr. Pedro Soares (BE): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, em primeiro lugar, felicito-o pelas suas
novas funções e desejo-lhe muitas felicidades.
É nossa convicção que este deverá ser o debate do Programa do Governo dos últimos 40 anos que mais é
acompanhado e que mais expetativas coloca aos portugueses.
A responsabilidade que temos, neste momento, é enorme. Defraudar estas expetativas, defraudar a
expetativa dos portugueses não faz parte do nosso manual de instruções.
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Não têm noção nenhuma das coisas!
O Sr. Pedro Soares (BE): — Um dos elementos essenciais que certamente será critério de avaliação deste
Governo é a forma como conseguiremos recuperar o Estado social, que foi sujeito, nos últimos anos, a um
retrocesso conservador que trouxe mais desigualdade, mais pobreza e, consequentemente, menos
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desenvolvimento e menos justiça social. Esvaziar o Estado social de competências e meios foi um desígnio
indisfarçável da anterior maioria.
Um dos ataques mais brutais desencadeado contra a segurança social foi, certamente, o afastamento de
600 trabalhadores das suas funções, num processo conduzido de forma inaceitável em que a dignidade e os
direitos das pessoas foram colocados em causa e sujeitos a uma lei iníqua, a chamada «lei da requalificação».
Em contrapartida do afastamento destas centenas de trabalhadores, o anterior Governo da direita
empenhou-se, nos últimos dias do seu mandato, em fazer proliferar a nomeação de novos assessores, de
novas entidades para o aparelho de Estado.
Vozes do BE: — Muito bem!
O Sr. Pedro Soares (BE): — O afastamento destes trabalhadores não se deveu à extinção dos postos de
trabalho ou ao facto de não serem necessários. Em alguns dos serviços mais afetados, nomeadamente os que
se relacionam com a proteção das crianças em risco, esses técnicos, com o aumento da instabilidade familiar
e da pobreza infantil, são, mais do que nunca, necessários e fundamentais.
Uma lei de requalificação que, em vez de requalificar, corta salários e que, em vez de promover
qualificação, promete despedimentos não é uma lei da requalificação, é uma lei de «encapotamento» dos
despedimentos na função pública.
Vozes do BE: — Muito bem!
O Sr. Pedro Soares (BE): — Este Governo não pode cair na armadilha da direita, deve tomar medidas
urgentes que impeçam o primeiro despedimento, perpetrado pelo anterior Governo, de trabalhadores em
função pública já no final de janeiro.
Sr. Primeiro-Ministro, para quando a revogação da chamada «lei da requalificação»? É fundamental
reintegrar os trabalhadores colocados no falso regime de qualificação, porque requalificar a segurança social é
prestar mais apoio a quem necessita, a quem estamos obrigados, nomeadamente às crianças em risco, e é
prestar um maior apoio aos setores mais fragilizados da nossa sociedade.
É esta a expectativa que todos temos em relação a este Governo.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Rita Bessa.
A Sr.ª Ana Rita Bessa (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, na passada sexta-feira, foram
discutidos, nesta Câmara, dois projetos de lei, apresentados pelo Partido Comunista e pelo Bloco de
Esquerda, propondo a eliminação das provas do 1º ciclo e da prova de avaliação de conhecimentos e
capacidades.
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Muito bem!
A Sr.ª Ana Rita Bessa (CDS-PP): — Em ambos os casos, são medidas cuja génese se deve ao Partido
Socialista. Em ambos os casos, na passada sexta-feira, o Partido Socialista esteve ao lado dos partidos de
esquerda, apoiando a sua abolição.
A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Muito bem!
A Sr.ª Ana Rita Bessa (CDS-PP): — Que estes partidos tenham trazido a Plenário estas iniciativas não nos
estranha, bem pelo contrário; elas faziam parte dos seus programas eleitorais. Já a posição do Partido
Socialista causa-nos, no mínimo, perplexidade. Por um lado, nenhuma destas medidas integra os três
documentos designados por «posição conjunta» celebrados entre PS e PCP, PS e BE e PS e Os Verdes e,
portanto, nada obriga o Governo minoritário do PS a esta capitulação.
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O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Muito bem!
A Sr.ª Ana Rita Bessa (CDS-PP): — Por outro lado, no programa eleitoral do PS e no Programa do
Governo conhecido horas depois naquela mesma sexta-feira, estas medidas são apresentadas com
expressões como «reavaliar», «suspender» e «reponderar», bem diferentes da eliminação sumária verificada.
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
A Sr.ª Ana Rita Bessa (CDS-PP): — Portanto, em menos de 24 horas após a tomada de posse deste
Governo, sem que seja ainda conhecida a visão do Sr. Ministro da Educação, que aproveito para
cumprimentar, e mesmo antes do Programa do Governo ser tornado público, este era já «letra morta», sendo
«letra viva», afinal, a constante dos programas dos partidos radicais.
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
A Sr.ª Ana Rita Bessa (CDS-PP): — Sr. Primeiro-Ministro, devemos, pois, assumir que em matéria de
Programa do Governo a palavra honrada não é a sua mas, antes, aquela que foi emprestada pelo Bloco e pelo
PCP?
Como pretende garantir a exigência e a transparência na rede pública de educação, tendo eliminado, sem
apelo, no caso dos alunos, as provas que permitiam, com intuito preventivo, a identificação do insucesso e, no
caso dos professores, a prova de admissão ao ingresso na carreira docente?
Será que também o Sr. Primeiro-Ministro se encontra enredado no binómio exigência-felicidade?
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.
O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Ana Rita Bessa, começo precisamente por lhe
responder a si, não sem antes a cumprimentar pela sua eleição.
Em primeiro lugar, queria dizer-lhe que a Assembleia da República é um órgão de soberania próprio que
goza de separação de poderes relativamente a um outro órgão de soberania, que é o Governo. A relação,
aqui, é a seguinte: é o Governo que responde perante a Assembleia e não é a Assembleia que responde
perante o Governo. Era o que faltava estar sujeita a visto prévio do Governo a aprovação de medidas
legislativas por parte da Assembleia da República!
Aplausos do PS.
Gostaria de deixar claro que, para nós, não há confusão entre a existência de mecanismos de aferição —
aliás, de acordo com as boas práticas internacionais — que permitam avaliar a qualidade e melhorar o
desempenho do sistema e provas de avaliação que não se destinam a melhorar a qualidade do sistema mas
simplesmente a selecionar os meninos que passam para o nível seguinte.
Aplausos do PS e do BE.
A diferença entre a aferição de um sistema e a avaliação do desempenho de uma criança não é só um jogo
de palavras, é uma visão completamente distinta em relação àquela que é a função da escola.
Aplausos do PS e do BE.
A prova que foi criada pelo anterior Governo obedeceu a uma visão da escola, uma escola orientada para a
seletividade e para a exclusão. A escola que nós queremos é orientada para a inclusão e para a igualdade de
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oportunidades, e é por isso que há toda uma diferença entre nós. E essa prova, felizmente, a Assembleia vai
eliminar.
Aplausos do PS.
Respondo agora ao Sr. Deputado Pedro Soares, a quem saúdo com particular prazer, dizendo-lhe que a
legislação atualmente em vigor autodenominada de requalificação vai ser suspensa, porque não é de
requalificação, é, pura e simplesmente, uma legislação que visa o despedimento e a perda de rendimentos por
parte dos funcionários públicos.
Aplausos do PS.
Posso dizer, sem prejuízo do que depois possa desenvolver o Sr. Ministro do Trabalho, Solidariedade e
Segurança Social quando fizer a sua intervenção neste debate, que relativamente ao que aconteceu no
anterior Ministério da Solidariedade e da Segurança Social, o atual Sr. Ministro está a trabalhar para
rapidamente pôr cobro à situação injusta em que se encontram as centenas de funcionários que foram
afastados e que, aliás, são imprescindíveis para o bom funcionamento de serviços essenciais para a deteção
precoce e para o combate à pobreza infantil, designadamente as comissões de proteção de crianças e jovens,
de onde foram afastadas muitas e muitas educadoras de infância que são absolutamente essenciais ao bom
desempenho e ao bom funcionamento do sistema, e isso será reposto tão breve quanto possível.
Aplausos do PS e do BE.
Relativamente às questões relacionadas com a juventude, queria dizer que foi, efetivamente, um dos
segmentos sociais mais penalizados pela política do anterior Governo — foi-o na educação e foi-o, sobretudo,
nas perspetivas de acesso e de integração no mercado de trabalho.
A sangria de emigração jovem é um dos dramas que o País tem de travar e conseguir inverter, e só há uma
forma de o fazer: devolver aos jovens a confiança no futuro do País. O primeiro sinal de confiança é contrariar
a mensagem do Governo anterior. A mensagem do Governo anterior foi dizer aos jovens «vão-se embora
porque não têm futuro em Portugal» e o que nós queremos dizer aos jovens é «voltem porque sem vocês
Portugal não tem futuro».
Aplausos do PS e do BE.
Para que isso aconteça é necessário combater a precariedade nas relações de trabalho. Para que isso
aconteça, é necessário ter, como aqui disse, políticas ativas de emprego seletivas que se concentrem no que
é essencial: não gastar dinheiro a subsidiar a precariedade mas a concentrar os recursos na criação de postos
de trabalho para jovens e jovens qualificados, pois não só é uma forma de os fixar e beneficiarmos do seu
talento, como também de beneficiarmos do seu impulso e contributo essencial para a modernização do nosso
tecido empresarial e da Administração Pública. É que o programa que temos que contempla a criação de
centros de competência na Administração Pública visa também agir e recrutar, rejuvenescendo os quadros da
administração com um conjunto de jovens qualificados que possam servir, de uma forma transversal, o
conjunto da ação do Estado, qualificando a nossa administração.
Há um setor particularmente importante, e que tem a ver com as universidades e com os centros de
investigação, onde, fruto das restrições à contratação, fruto do envelhecimento dos quadros e fruto da
emigração massiva dos jovens quadros, tem sido criado um gap geracional muito grave para o futuro dessas
instituições e para ser assegurada uma sadia transição de gerações no quadro das instituições. É por isso que
o Programa do Governo prevê um plano específico para a contratação de jovens investigadores de forma a
estabilizar a carreira de investigação e a poder fixar talento indispensável ao futuro do desenvolvimento da
ciência e da economia nacional.
Aplausos do PS.
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Por fim, gostaria de recordar que uma das medidas mais importantes do Programa do Governo é o que
designámos de contrato-geração. Ou seja, é a possibilidade de, a partir de certa idade, poder passar-se a uma
reforma não antecipada mas a tempo parcial com a contrapartida da contratação de um jovem a tempo inteiro.
É uma forma de combinar o saber da experiência feito com o saber e o conhecimento adquiridos na formação
no ensino superior. É uma forma de reforçar a solidariedade entre gerações e é uma forma de assegurar,
também ao nível das empresas, uma transição de gerações sem momentos de rutura que, decerto, seriam
extremamente penalizadores. E isto significa que, para este Governo, há uma prioridade fundamental na
recuperação da confiança da juventude portuguesa no futuro do nosso País, sem a qual, o País, dificilmente
poderá ter futuro.
Sr. Deputado Hugo Lopes Soares, os últimos são, naturalmente, os primeiros e, sendo o PPD/PSD a maior
bancada parlamentar, deve ser tratado como tal.
O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Os segundos é que são os primeiros!…
O Sr. Primeiro-Ministro: — Gostaria de dizer, tranquilizando o Sr. Deputado, que, amanhã, quando se
votar a moção de rejeição apresentada pelo PPD/PSD e pelo CDS-PP, há duas coisas que ficaremos a saber:
a primeira é que o PPD/PSD e o CDS-PP continuam a estar em minoria nesta Assembleia da República. E
continuam a estar em minoria nesta Assembleia da República por uma única e exclusiva razão: porque tiveram
quase menos 1 milhão de votos do que as restantes bancadas nas eleições do passado dia 4 de outubro.
Aplausos do PS e do BE.
Risos do PSD e do CDS-PP.
O Sr. Paulo Portas (CDS-PP):—Já vão 300 mil a mais!
O Sr. Primeiro-Ministro: — Mas há uma questão que ficamos sem saber e que, devo dizer-lhe, tenho
muita curiosidade em saber, que é a seguinte: vão propor rejeitar este Programa de Governo, vão propor a
demissão deste Governo.
O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — Sempre! Sempre!
O Sr. Primeiro-Ministro: — E pergunto: que alternativa é que apresentam ao País relativamente a este
Governo?!
Aplausos do PS.
Protestos do PSD.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Gostaram tanto do resultado das eleições que querem repetir.
O Sr. Primeiro-Ministro: — É que, Srs. Deputados, essa questão…
Protestos do PSD.
Srs. Deputados, já percebi que gostaram tanto da pergunta que vou repeti-la…
Risos e aplausos do PS.
Amanhã, quando apresentarem a moção de rejeição, há uma pergunta que os portugueses farão e que eu
faço: qual é a alternativa que apresentam ao País?
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Protestos do PSD e do CDS-PP.
O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — É a de os senhores ficarem em gestão!
O Sr. Primeiro-Ministro: — Gostava de lhe recordar, porque já vi que é bom em datas, que na noite do dia
4 de outubro eu disse, enquanto líder do Partido Socialista, que o PS nunca derrubaria um governo sem ter
uma solução alternativa de governo a proporcionar ao País e que nunca seríamos uma oposição de bota
abaixo e de obstrução pela obstrução! E isso significa que dissemos que não votaríamos qualquer moção de
rejeição sem que, previamente, estivesse garantida uma alternativa de governo.
E isto, como o Sr. Deputado bem disse, foi uma atitude responsável. Ora, devo dizer-lhe que não tomar
esta atitude é uma atitude não responsável. Porque derrubar governos sem ter uma alternativa, isso, sim, é
que é não estar à altura das responsabilidades que temos para com o País.
Aplausos do PS.
Quanto à questão que tanto o angustia, pelos vistos há tantos dias e há tantas horas, assim que for
possível far-lhe-ei chegar a gravação da minha participação, três dias depois, no Fórum da TSF, onde
respondi muito claramente a essa questão.
O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Responda agora!
O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — É aqui que tem de responder!
O Sr. Primeiro-Ministro: — Pode ter, assim, a oportunidade de ver como está bastante atrasado nas
dúvidas que mantém e que há muito tempo estão esclarecidas.
Aplausos do PS.
Protestos do PSD.
Entretanto, assumiu a presidência o Vice-Presidente José Manuel Pureza.
O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Sr. Presidente, peço a palavra.
O Sr. Presidente: — Pede a palavra para que efeito, Sr. Deputado?
O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Sr. Presidente, é para fazer uma interpelação à Mesa sobre a
condução dos trabalhos.
O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Sr. Presidente, o Sr. Primeiro-Ministro, interpelado por esta bancada
e por mim, remeteu a resposta para uma eventual declaração que terá feito num programa de rádio.
Pedia ao Sr. Presidente, porque é a praxe desta Casa, que pedisse ao Sr. Primeiro-Ministro que fizesse
distribuir, ainda durante este debate, uma vez que se furtou a responder às perguntas legítimas que lhe foram
feitas, as tais respostas, para que, de uma vez por todas, os portugueses possam saber que prestações
sociais não contributivas o Sr. Primeiro-Ministro se propõe cortar.
Aplausos do PSD.
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O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Srs. Deputados, vamos agora entrar na terceira ronda de
pedidos de esclarecimento.
Para o efeito, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe, do PCP.
O Sr. António Filipe (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, o debate do Programa deste Governo
tem um particular significado para a democracia portuguesa e faz recair sobre si uma enorme expectativa e
muita esperança dos portugueses, que não pode ser defraudada.
Esta solução resulta diretamente da vontade popular manifestada nas eleições do passado dia 4 de
outubro, que condenou, inequivocamente, por uma larga maioria, a governação do PSD e do CDS nos últimos
quatro anos e meio.
Essa expressão da vontade popular exigiu não apenas uma mudança de pessoas, mas,
fundamentalmente, uma mudança de políticas, um virar de página nas políticas de empobrecimento, de
desemprego, de precariedade, de aumento da exploração, de emigração forçada, de violação de direitos
fundamentais, de confronto permanente com a Constituição, de privatização selvagem de bens públicos e de
património público.
Portanto, essa vontade manifestada pelo povo português, expressa na diversidade de opções políticas,
mas dando uma expressiva maioria à condenação dessa política, tem tradução na composição desta
Assembleia da República e tem tradução na responsabilidade que assumimos aqui — pela nossa parte,
assumimos — de travar a continuação dessa política.
E foi por isso que, aqui, rejeitámos, com toda a convicção, há umas semanas, essa tentativa falhada de
governo de iniciativa presidencial ao arrepio da opinião dos partidos políticos com representação parlamentar
e dos resultados eleitorais e que fez com que o País tivesse perdido estes dois meses que, seguramente,
muita falta nos farão.
Chegados aqui, Sr. Primeiro-Ministro, há dois factos que importa salientar e que contrariam o discurso que
a direita tem vindo a fazer. Um deles é a realidade da situação económica do País, que está a ser posta em
evidência por dados oficiais.
De facto, aquela cortina de fumo, com que, em período eleitoral, a direita procurou convencer os
portugueses dos grandes sucessos da sua política está a ser desmentida hoje, cabalmente, pela realidade em
que o País se encontra.
Um outro facto tem a ver com o alarmismo que a direita procurou semear. Se nos lembrarmos do que há
umas semanas era dito e escrito, por este País fora, se esta solução governativa, cujos programas estamos
hoje a discutir, se tornasse realidade é que o País hoje estaria num caos absoluto. Estaríamos perante uma
corrida aos bancos, estaríamos perante fugas de capitais, estaríamos perante uma situação como a referida
por uma antiga Deputada do CDS, que escreveu num jornal, num artigo de opinião, que estava a pensar
aconselhar os filhos a emigrar e a fugirem de aqui para fora se esta solução se tornasse realidade.
Portanto, nós verificamos, Sr. Primeiro-Ministro, que o alarmismo da direita é inversamente proporcional ao
otimismo com que os portugueses encaram o futuro próximo, porque, de facto, nada disso está efetivamente a
acontecer.
Sr. Primeiro-Ministro, a questão que gostaríamos de salientar neste momento é que, de facto, há uma
enorme esperança dos portugueses de que haja uma mudança real de política, e para isso é fundamental que
este Governo cumpra os compromissos que assumiu para com os portugueses e que cumpra os
compromissos que todos assumimos ao tornar possível esta solução governativa.
É que, ao contrário da direita, que simulava divergências quando lhe convinha, nós não precisamos de
simular divergências; elas são conhecidas, assumidas e transparentes.
O Sr. Telmo Correia (PSD): — Divergências claras! Isso é muito bom para a governação!
O Sr. António Filipe (PCP): — E aquilo que assumimos são convergências para que o País possa sair
desta situação difícil em que caiu.
Aplausos do PCP.
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O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado
Adão Silva, do PSD.
O Sr. Adão Silva (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as
e Srs. Deputados, Sr. Primeiro-
Ministro, começo por ligar a minha pergunta à que não respondeu colocada pelo Sr. Deputado Hugo Lopes
Soares.
V. Ex.ª, neste debate, já foi muito claro nas suas boas intenções: disse que o Governo depende do
Parlamento, que o Governo tudo fará numa relação cordial eficaz e pronta com o Parlamento.
Sr. Primeiro-Ministro, VV. Ex.as
querem cortar nas prestações sociais sujeitas a condição de recursos, que
são as prestações dadas às pessoas mais carenciadas. V. Ex.ª é interpelado sobre quais são essas
prestações sujeitas a condição de recursos que VV. Ex.as
vão cortar e o que é que V. Ex.ª responde ao
Parlamento, ao tal Parlamento que V. Ex.ª passou, aqui, o tempo a elogiar e a dizer ao qual estava submisso?
E o que é que disse? Disse: «oiçam o que eu disse a uma rádio. A uma rádio! Vão ao site da rádio, vão aos
jornais.»
Já percebemos, Dr. António Costa. Boas intenções, com certeza… Na realidade, os Deputados quando
quiserem saber o que pensa ou o que diz o Primeiro-Ministro vão aos jornais, vão às rádios.
Portanto, Sr. Primeiro-Ministro, V. Ex.ª tem de dizer, aqui, onde vai cortar nas prestações dos mais pobres.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Em segundo lugar, V. Ex.ª dizia que este Programa do Governo era coerente. Insistiu até, muitas vezes
dizendo: «É coerente, é coerente.» Eu diria, Sr. Primeiro-Ministro, que tem dias, que tem páginas, porque acho
que é bastante do tipo loja de bric-a-brac, tipo um Programa de paradoxos. Isto é, é aquela coisa que de um
lado se diz de uma maneira e de outro lado se diz de outra. Um elemento verdadeiramente paradoxal, que até
faz lembrar aquela adivinha de quando éramos crianças e que dizia: qual é coisa qual é ela que quanto mais
se tira maior fica?
O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Isso é o buraco!
O Sr. Adão Silva (PSD): — Exatamente, Sr. Presidente do Grupo Parlamentar do PSD, é o buraco: quanto
mais se tira, maior fica. Até aqui era o buraco, mas com este Governo é o buraco e é o Fundo de Estabilização
Financeira da Segurança Social.
O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — Ora, lá está!
O Sr. Adão Silva (PSD): — Sr. Primeiro-Ministro, VV. Ex.as
dizem que ao Fundo de Estabilização
Financeira da Segurança Social querem retirar 10% para a construção civil. Mas 10% significa 1,4 milhões de
euros! Isto é, VV. Ex.as
querem retirar 10% de um fundo que tem 14 mil milhões de euros, que tem uma
rentabilidade extraordinária de cerca de 10% ao ano, que é constituído com os descontos dos trabalhadores
portugueses e que serve para aguentar a rutura das pensões em Portugal, e dizem isto na página 137 do
vosso Programa.
O Sr. João Galamba (PS): — Leia lá, porque não é bem isso!
O Sr. Adão Silva (PSD): — Mas, depois, na página 227 do vosso Programa, dizem: «Reforçar o Fundo de
Estabilização Financeira da Segurança Social.» Ora, não percebi como é que dizem, de um lado, corta e, do
outro lado, reforça. Mas percebi, depois. Sabe como? Fui ler o acordo que fizeram com o Partido Ecologista
«Os Verdes» e uma das exigências que Os Verdes fazem é reforçar o Fundo de Estabilização Financeira.
Ora bem, isto não conseguimos entender, Sr. Primeiro-Ministro. Estes 10% do Fundo de Estabilização
Financeira são para aplicar por públicos e por privados, em rentabilidades muito diminutas, como, aliás, diz o
vosso Programa, na página 137.
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Pergunto-lhe, então, Sr. Primeiro-Ministro, afinal estes 10%, 1,4 milhões de euros, do fundo de garantia das
pensões em Portugal são para quê? Para dar a privados? Para fazer aplicações de baixa rentabilidade? E até
pergunto ao PCP: os senhores viram isto? E pergunto também a Os Verdes e ao Bloco de Esquerda: os
senhores viram lá isto?
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Para aplicar o dinheiro dos descontos da segurança social dos portugueses nos privados com baixa
rentabilidade?
Sinceramente, conviria passar a ler bem o que diz o Programa do Governo.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada
Susana Amador.
A Sr.ª Susana Amador (PS): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Sr.as
e
Srs. Deputados, os direitos sociais devem ser interpretados à luz dessa referência constitucional unificadora
de todos os direitos fundamentais que é a dignidade humana. Essa visão humanista e de defesa do Estado
social perpassa por todo o Programa do Governo que hoje se discute nesta Câmara.
As pessoas são, de facto, o primeiro e mais revelante ativo do País e devem ser o centro das políticas e da
ação política. Contudo, nos últimos quatro anos e meio, assistimos ao empobrecimento das pessoas, sem
precedentes, e ao aumento das pessoas que vivem em privação material severa, que entendemos ser
intolerável num Estado social, num Estado de bem-estar social, mas que, ao invés, se tornou um Estado mais
distante e mais ausente por pura opção ideológica.
São quase 3 milhões de pessoas que se encontram em risco de pobreza ou de exclusão social, são 850
000 crianças e jovens, que são, aliás, o grupo de maior risco, são 1 850 000 adultos e são 450 000 idosos em
situação de pobreza.
O aumento do desemprego e o recuo do Estado ao nível dos beneficiários do rendimento solidário para
idoso, do complemento solidário, do complemento social de inserção e do abono de família contribuíram para
que o risco de pobreza regressasse aos níveis do início da década de 2000. Portugal andou, efetivamente,
para trás!
Sr. Primeiro-Ministro, tal como decorre do Programa do Governo e foi notório na sua intervenção inicial, a
prioridade, que desde já saudamos, será uma estratégia de combate à pobreza nas crianças e nos jovens. As
políticas sociais são, assim, encaradas como essenciais ao desenvolvimento do País. Não são caridades, não
podem ser; são investimento no futuro,
Gostaríamos de saber como se conjugarão as medidas de combate à pobreza infantil inseridas nessa
estratégia com outros setores, designadamente ao nível da educação ou da saúde. E porque a educação é um
alicerce essencial para o futuro, para a competitividade, para a coesão e para a igualdade, é preocupante, Sr.
Primeiro-Ministro, o aumento das taxas de insucesso escolar nos últimos quatro anos, designadamente no
ensino básico.
Assim, pergunto: quais serão as metas e as medidas para valorizar esse grande desígnio nacional, que
será o combate ao insucesso escolar? Como se fará essa mobilização e qual o papel que a educação pré-
escolar terá neste combate?
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Ainda para pedir esclarecimentos nesta terceira ronda, tem a
palavra o Sr. Deputado Moisés Ferreira.
O Sr. Moisés Ferreira (BE): — Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados, Sr. Primeiro-Ministro, por diversas
vezes ouvimos a direita — já a ouvimos hoje a dizer o mesmo — falar dos últimos quatro anos, e devemos
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reconhecer, pelo menos, o seu esforço de criatividade, porque às vezes falam de um País imaginário, que não
sabemos qual, às vezes tentam criar uma fotografia e percebermos que é apenas photoshop, às vezes tentam
também dizer que «o Governo anterior protegeu sempre os mais fracos». Quando chegam aqui, percebemos
que estamos já perante um exercício de mera imaginação.
É importante, por isso, falarmos da realidade e do futuro real do País.
Um estudo divulgado na semana passada mostra que, em 2014, em Portugal, 50% das famílias
portuguesas falharam cuidados de saúde considerados essenciais. Porquê? Porque não tinham dinheiro para
os realizar. Foi assim que o PSD e o CDS-PP, nos últimos quatro anos, protegeram os mais fracos? Foi assim,
tornando a saúde mais cara, tornando a saúde mais distante e menos acessível?
Esse estudo dizia que, em Portugal, há pessoas que não foram às urgências ou que faltaram a consultas
programadas porque não podiam pagar.
Esse estudo dizia que, em Portugal, há doentes que abdicaram de tratamento e que racionaram
medicamentos porque não tinham dinheiro.
Esse estudo dizia que, em Portugal, 20% das famílias cortou em bens alimentares ou endividou-se para
poder aceder à saúde.
Esta é que é a realidade que o PSD e o CDS-PP nos deixam. Esta é que é a realidade de quatro anos de
governação de direita.
Há, portanto, uma urgência que vivemos neste País: a primeira, já concretizada, era demitir a continuação
destas políticas. Mas subsistem outras, como as de permitir a devolução de rendimentos e de reforçar e
investir no Estado social.
Por isso, Sr. Primeiro-Ministro, a questão que coloco concretamente sobre o Serviço Nacional de Saúde é a
seguinte: quais são as medidas urgentes para que a saúde seja de acesso universal e se torne mais próxima
das pessoas? Quais são as medidas concretas e imediatas para que a saúde não seja mais um negócio para
privados mas, sim, um serviço para as pessoas?
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.
O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, muito obrigado.
Sr. Deputado Moisés Ferreira, relativamente ao Serviço Nacional de Saúde, a prioridade definida será a de,
em primeiro lugar, melhorar as condições de acessibilidade à saúde, repondo, ao longo da Legislatura, as
taxas moderadoras aos níveis que estavam anteriormente, de forma a que voltem a ser taxas moderadoras e
não aquilo que passaram a ser, ou seja verdadeiras taxas que bloqueiam o acesso à saúde por parte de
muitos e muitos cidadãos.
Em segundo lugar, outra prioridade definida tem a ver com os cuidados de saúde primários,
designadamente com a contratação e com o assegurar a todos os portugueses a oportunidade de terem um
médico de família, de forma a assegurar esse serviço a todos os portugueses.
Em terceiro lugar, e como o Sr. Ministro da Saúde já teve oportunidade de responder, relativamente ao
despacho, que já nos surpreendeu após as eleições, de eliminação dos serviços de urgência, ele será
reavaliado de acordo com os padrões técnicos com a garantia do acesso aos cuidados de saúde por parte das
populações.
Relativamente à questão colocada pela Sr.ª Deputada Susana Amador o insucesso escolar é uma das
principais causas assumidas neste Programa do Governo. E o combate ao insucesso escolar visa, por um
lado, cumprir a meta europeia a que estamos obrigados no âmbito do Portugal 2020, mas, sobretudo,
assegurar que o nível de qualificação essencial continue a progredir em Portugal. Este esforço implica uma
intervenção, desde logo, ao nível do pré-escolar e, por isso, temos uma meta ambiciosa de, até ao final da
Legislatura, termos a generalização do ensino pré-escolar a partir dos três anos para todas as crianças.
O reforço da satisfação das necessidades educativas especiais e a melhoria do ensino artístico são
condições importantes à motivação e ao envolvimento das crianças no seu percurso escolar.
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Também é importante a valorização do ensino profissionalizante ao nível do secundário, de forma a
diversificar as vias de ensino para conseguirmos cumprir, de modo universal, a escolaridade obrigatória dos 12
anos como objetivo fundamental.
Naturalmente que no programa que definimos como prioritário que, como disse, é centrado no território e
que será desenvolvido em torno da escola, do combate à pobreza infantil e juvenil, um dos objetivos
fundamentais é assegurar que é travado o abandono e o insucesso escolar precoce, de forma a garantir
cursos escolares completos para a nova geração escolar.
O Sr. Deputado António Filipe sinalizou bem o contraste entre a serenidade com que o País, os agentes
económicos, a Europa olham relativamente a Portugal depois do discurso alarmista e, pior, depois do incentivo
ao alarme que foi aqui, no último debate do Programa do anterior Governo, feito pelo próprio Sr. Primeiro-
Ministro e pela então Ministra das Finanças.
Felizmente essa serenidade existe, porque o mundo está habituado ao funcionamento da regra normal da
democracia. E a regra normal da democracia é que os governos sejam gerados e respondam perante os
parlamentos em função das maiorias parlamentares que é possível constituir.
Como o Sr. Deputado bem disse, esta é uma maioria parlamentar assente na diversidade, que não procura
disfarçar as diferenças mas que as assume não só com naturalidade mas como uma riqueza desta mesma
base de apoio parlamentar, o que é assumido com total transparência e tranquilidade, a mesma com que,
estou certo, amanhã a maioria desta Assembleia rejeitará a moção de rejeição apresentada pelo PSD e pelo
CDS, da mesma forma como há 21 dias aprovaram a moção de rejeição apresentada pelo Partido Socialista
nesta Câmara.
Finalmente, Sr. Deputado Adão Silva, verifico que, apesar de terem ouvido o primeiro debate, não ouviram
a resposta. Então, eu repito: em primeiro lugar, os senhores confundem aquele que é um quadro que prevê a
redução da despesa com a existência de cortes nas prestações sociais.
Ora, a redução das despesas das contribuições de natureza não contributiva resultam do facto de, em
função de um conjunto de outras medidas, designadamente a diminuição do desemprego, o complemento
salarial anual, a reposição do complemento solidário para idosos, a reposição do rendimento solidário de
inserção, essas prestações deixarem de ser necessárias, não por serem cortadas, mas porque as pessoas
deixam de estar na condição em que necessitavam de receber essas prestações.
O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Não é isso que o Programa do Governo diz!
O Sr. Primeiro-Ministro: — Foi com base nisto que assentou o debate com o então Primeiro-Ministro.
O que diz o Programa do Governo é uma coisa muito simples e clara: reavaliar e reforçar a coerência do
modelo de aplicação da condição de recursos nas prestações sociais de natureza não contributiva.
O Sr. Adão Silva (PSD): — Onde é que corta? Diga lá!
O Sr. Primeiro-Ministro: — Como os senhores sabem, as condições de recursos são hoje diversas em
função das diferentes prestações, e o que é necessário assegurar é que haja uma coerência na condição
exigida para receber esta prestação ser ou não distinta da condição exigida para obter outra prestação. A
coerência da prestação não significa a diminuição das prestações sociais.
O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Pois não!
O Sr. Primeiro-Ministro: — Este Governo propõe-se restabelecer tudo aquilo que os senhores cortaram,
nomeadamente no complemento solidário para idosos, no rendimento solidário de inserção, nas pensões, nos
salários, pelo que, com franqueza, Srs. Deputados, é preciso, desculpe, terem muito descaramento para
vierem pôr em causa quem pretende repor prestações sociais.
Aplausos do PS.
O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Quais são as prestações que quer repor? Não ande à volta!
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O Sr. Primeiro-Ministro: — Os Srs. Deputados poderão ficar no jogo da dialética;…
Risos do PSD e do CDS-PP.
… nós ficaremos na realização material, em homenagem, aliás, aos nossos parceiros.
Vozes do PSD: — Ora bem!
O Sr. Primeiro-Ministro: — E a realização material é simples: é que nós seremos o Governo que repõe as
prestações sociais e vocês serão sempre o Governo que cortou as prestações sociais.
Aplausos do PS e do BE.
Sobre a segunda questão que colocou, Sr. Deputado, nós entendemos como essencial a diversificação das
fontes de financiamento da segurança social. Hoje em dia, na economia que temos, o futuro da segurança
social não se poderá financiar exclusivamente com base nas contribuições das entidades patronais e com
base nas contribuições dos trabalhadores; há que encontrar novas formas de financiamento da segurança
social.
Nós entendemos que hoje estamos de novo num quadro, como o que vigorou até aos anos 40, em que as
rendas podem ser uma boa fonte de financiamento da segurança social.
Recordar-se-á — eu sei que não é de Lisboa — que grande parte da urbanização do todo o planalto de
Alvalade foi feito com investimento das caixas de previdência, porque era um investimento em criação de
prédios de rendimento que visavam financiar a segurança social.
Porque é que não foi prosseguida essa política? Porque, como sabe, a seguir à guerra, o Dr. Salazar
congelou as rendas em Lisboa e no Porto e a seguir ao 25 de Abril as rendas foram congeladas em todo o
País. Assim, durante muitos anos, verificou-se uma distorção no mercado de arrendamento por via do
congelamento das rendas.
Em segundo lugar, toda a nossa geração acabou por aceder à habitação não por via do arrendamento
mas, sim, por via da compra de casa própria, beneficiando de um longo período onde o crédito foi bastante
acessível e a baixo custo.
Hoje, a realidade é bem diversa e o paradigma do acesso à habitação mudou radicalmente. Hoje, o
mercado de arrendamento, para o bem ou para o mal, está liberalizado e, hoje, o acesso ao crédito à
habitação será cada vez mais difícil pelas restrições de concessão de crédito.
Significa isto que as novas gerações vão confrontar-se… Sr. Deputado Adão Silva, não abane com a
cabeça dizendo que não, porque é essa a realidade.
O Sr. Adão Silva (PSD): — Não, não!
O Sr. Primeiro-Ministro: — As novas gerações vão confrontar-se, como se confrontaram até aos anos 50,
com a dificuldade de a classe média aceder à habitação se não forem criadas condições de habitação a
rendas acessíveis.
É por isso que o Programa do Governo prevê a existência de uma nova geração de políticas de habitação,
porque, a par das políticas de habitação social que os municípios já desenvolvem, a par das políticas de
habitação que proporcionam o acesso à habitação em mercado livre às famílias solventes, a classe média
precisa, como em toda a Europa existe, políticas de habitação que permitam a existência de renda acessível.
Em segundo lugar, precisamos com urgência de programas de reabilitação urbana, programas esses que
têm várias vantagens: melhoram a qualidade da habitação, melhoram a imagem do espaço das cidades e
contribuem para a eficiência energética diminuindo os encargos para o País.
Nós temos, por isso, que mobilizar recursos para poder fazer operações de reabilitação urbana e que criem
condições para colocar no mercado habitações a renda acessível.
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Ora, a questão é saber como é que vamos financiar esta operação. Uma das formas importantes e
inteligentes de o fazermos é permitir diversificar as aplicações do Fundo de Estabilização Financeira da
Segurança Social.
Sr. Deputado, não se trata de ir tirar dinheiro ao Fundo.
O Sr. Adão Silva (PSD): — Não?!
O Sr. Primeiro-Ministro: — Não, não se trata. Trata-se, sim, de assegurar que o Fundo de Estabilização
Financeira não seja totalmente consumido, como hoje está, já em 90%, em compra de dívida pública ou em
aplicações financeiras de solvabilidade duvidosa, mas poder também, na carteira de diversificação, fazer
investimentos que permitam remunerar essas aplicações com base nas rendas, assim proporcionando
reabilitação urbana, que dinamiza a economia, e rendas acessíveis, que servem o acesso à habitação por
parte da classe média.
Mas, Sr. Deputado, sabe qual é a maior novidade que queria dar-lhe? No quadro da lei aprovada no tempo
do Governo do Dr. Durão Barroso e quando era ministro o Dr. Bagão Félix e foi fixada a diversificação e a
tipologia de aplicações das verbas do Fundo de Estabilização Financeira da Segurança Social, sabe o que é
que se previa? Previa-se que uma percentagem pudesse ser aplicada precisamente no mercado de
arrendamento, de forma a diversificar as fontes de financiamento do Fundo de Estabilização Financeira da
Segurança Social.
Portanto, não há contradição nenhuma. O que há é diversificação das aplicações para haver maior
segurança no Fundo a fim de podermos ter uma economia mais dinamizada, um mercado de habitação mais
acessível à classe média e, simultaneamente, reforçar o Fundo através das rendas que venha a obter dos
prédios de rendimento. Desde logo, no investimento no próprio património da segurança social que, como
sabe, são milhares e milhares de metros quadrados em ruína por todo o País e que podem, e devem, ser a
prioridade de investimento do próprio Fundo de Estabilização Financeira da Segurança Social, a recuperação
do seu próprio património.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Srs. Deputados, vamos entrar na última ronda de pedidos de
esclarecimento.
Para esse efeito, tem a palavra a Sr.ª Deputada Patrícia Fonseca.
A Sr.ª Patrícia Fonseca (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, as questões que tenho para
lhe colocar prendem-se com a agricultura e o mundo rural, o que não é de estranhar vindo da bancada do
CDS para quem a agricultura não é uma moda e foi desde sempre considerada um setor relevante para a
economia nacional e, por isso, acarinhado.
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
A Sr.ª Patrícia Fonseca (CDS-PP): — Também por motivos pessoais, porque, tal como o Sr. Primeiro-
Ministro se orgulha de ter dedicado toda a sua vida à atividade política, eu orgulho-me de ter dedicado a minha
vida ao trabalho em prol dos agricultores e do mundo rural.
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
Assim, Sr. Primeiro-Ministro, coloco-lhe três questões muito simples.
Primeira, as medidas agroambientais desenhadas pelo anterior Governo PSD/CDS foram de tal forma
apelativas que tiveram uma adesão de quase 87 000 agricultores, levando à necessidade de reforço do
Programa de Desenvolvimento Rural em 200 milhões de euros para assegurar as legítimas expectativas dos
agricultores que se candidataram.
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Na campanha eleitoral, o então candidato a Deputado, agora seu Ministro da Agricultura, afirmou que
«pagará com gosto essa fatura».
Dado o passado do Partido Socialista nesta matéria, tenho de lhe perguntar, Sr. Primeiro-Ministro, se
reafirma o compromisso de reforçar o Programa de Desenvolvimento Rural em 200 milhões de euros ou se os
agricultores correm o risco de reviver as más memórias do tempo de um governo do qual o senhor era o
número dois e cujo Ministro da Agricultura de então gorou as expectativas dos agricultores e das suas
organizações, provocando graves prejuízos em todo o mundo rural.
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
A Sr.ª Patrícia Fonseca (CDS-PP): — Segunda questão, a alteração à Lei dos Baldios, feita em 2014, veio
trazer equidade no acesso aos baldios pelos compartes e transparência às contas dos baldios, impedindo que
apenas alguns compartes sejam beneficiados, como acontecia em muitos casos.
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
A Sr.ª Patrícia Fonseca (CDS-PP): — Esta alteração não coloca em causa os usos e costumes locais na
fruição dos baldios e respeita a Constituição, tal como afirmado no Acórdão do Tribunal Constitucional do
passado mês de novembro.
Pergunto-lhe, portanto, Sr. Primeiro-Ministro, de que lado se quer colocar, se do lado da transparência e da
equidade ou se vai ceder a outros interesses do PCP.
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
Por último, Sr. Primeiro-Ministro, o Governo PSD/CDS resolveu, finalmente, a situação da Casa do Douro,
que se arrastava há décadas e que nenhum Governo tinha conseguido solucionar.
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
Protestos do PCP.
A Sr.ª Patrícia Fonseca (CDS-PP): — O benefício do vinho do Porto foi em 2015 o mais elevado dos
últimos anos, os viticultores do Douro estão satisfeitos e a administração liquidatária está a iniciar o seu
trabalho para que as dívidas sejam pagas progressivamente.
Protestos do PCP.
O Sr. António Carlos Monteiro (CDS-PP): — Oiçam, oiçam para aprender!
A Sr.ª Patrícia Fonseca (CDS-PP): — Pergunto: Sr. Primeiro-Ministro, pretende o Governo reverter todo
este processo e deitar abaixo uma situação que hoje está pacificada no Douro? Que interesses pretende o
Governo proteger? Os interesses dos viticultores durienses ou os interesses sindicais do PCP?
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada
Paula Santos.
A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, nos últimos quatro anos, PSD e CDS
prosseguiram uma política de desmantelamento das funções sociais do Estado e de destruição de serviços
públicos.
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O que caracterizou esta política do PSD e do CDS foi o desinvestimento público: na escola pública, no
Serviço Nacional de Saúde, na proteção social, no serviço público de cultura, no sistema científico e
tecnológico nacional, na prestação de serviços públicos de qualidade, optando, simultaneamente, pela sua
progressiva privatização e mercantilização.
PSD e CDS insistiram na desvalorização profissional e social dos trabalhadores, insistiram na transferência
para as famílias de cada vez mais encargos com a saúde, a educação, a cultura, ou o acesso a serviços
públicos, como são exemplo as águas ou o tratamento de resíduos.
Não nos esquecemos dos utentes que aguardam pelo médico de família, do aumento do número de alunos
por turma, dos estudantes que foram obrigados a abandonar o ensino superior, dos bolseiros de investigação,
que aguardam por um contrato de trabalho, dos professores que foram despedidos ou daqueles que andam há
5, 10, 20 anos a contratos, dos médicos e enfermeiros que abandonaram o Serviço Nacional de Saúde.
Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, o PCP opôs-se veementemente a estas opções políticas,
combatendo-as. Consideramos que é fundamental o escrupuloso cumprimento da nossa Constituição,
garantindo a todos os direitos fundamentais e a prestação de serviços públicos de qualidade.
Defendemos, assim, a escola pública para todos, o reforço do Serviço Nacional de Saúde, uma segurança
social solidária e universal, uma efetiva política de descentralização e de democratização cultural, reforçando o
investimento público progressivamente até alcançar 1% do PIB e, ainda, naturalmente, a valorização dos
próprios trabalhadores.
Sr. Primeiro-Ministro, estas questões que se colocam relativamente às funções sociais do Estado e aos
serviços públicos, quer na perspetiva dos cidadãos que a eles pretendem ter acesso, quer na perspetiva dos
trabalhadores que os asseguram, são matérias essenciais na vida dos portugueses e questões relativamente
às quais estão criadas elevadas expetativas que importa concretizar.
O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Atenção ao seu tempo, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Vou terminar, Sr. Presidente.
Também por isso é importante que este debate e a sua resposta em concreto contribuam para clarificar as
perspetivas que o Programa do Governo aponta.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada
Sara Madruga da Costa.
A Sr.ª Sara Madruga da Costa (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, no Programa do Governo
ora em discussão refere-se a necessidade de valorizar a autonomia das regiões autónomas.
Após uma leitura mais atenta, apercebemo-nos que essa suposta valorização assenta num conjunto de
conceitos excessivamente vagos, que pretendem significar tudo mas que na realidade parecem não significar
nada.
Este Programa do Governo não assume compromissos específicos para a Região Autónoma da Madeira.
Esperamos, muito sinceramente, que este Governo não faça o mesmo que o anterior governo do PS, que
discriminou a Região Autónoma da Madeira em relação à Região Autónoma dos Açores, atendendo
meramente a aspetos partidários.
Sabendo que há uma questão que une todos os madeirenses, que é a questão da construção de um novo
hospital, gostaríamos de saber se podemos contar com a solidariedade nacional deste novo Governo para
enquadrar, como projeto de interesse comum e nacional, a construção de um novo hospital para a Região
Autónoma da Madeira.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado
Filipe Neto Brandão.
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O Sr. Filipe Neto Brandão (PS): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, o modo como se inicia um texto
assume sempre relevância e significado, e o mesmo sucede com o Programa do Governo.
É assim particularmente significativo que logo o primeiro parágrafo do Programa do XXI Governo expresse
uma proclamação de respeito pelos compromissos europeus e internacionais de Portugal.
Afirma-se, assim, sem quaisquer equívocos, o respeito pelos compromissos europeus e internacionais
numa política reforçada de convergência e coesão.
O Sr. Primeiro-Ministro referiu já que este será um Governo de garantia.
O Sr. Miguel Morgado (PSD): — É?!
O Sr. Filipe Neto Brandão (PS): — É um Governo de garantia, e sê-lo-á, em primeiro lugar, de garantia de
respeito pela Constituição da República Portuguesa, mas também de garantia de continuidade do Estado nos
seus compromissos internacionais e no quadro da União Europeia.
Como o Sr. Primeiro-Ministro bem referiu aquando da sua tomada de posse, este Governo nasceu da
recusa da ideia de que não haveria alternativa à política prosseguida na legislatura que terminou. Há,
obviamente, alternativa e, como este Governo demonstrará, é bem possível fazer diferente.
É verdade — sabemo-lo — que, como membro da União Europeia, Portugal tem várias das suas opções
políticas condicionadas pela União no seu conjunto, mas o que é um constrangimento inerente à participação
de Portugal na União Europeia, à sua participação na União Monetária e Económica e à partilha de uma
moeda comum, sabemo-lo bem, é também uma enorme vantagem. E V. Ex.ª já deu, como poucos, provas
bastantes de saber transformar com sucesso constrangimentos em vantagens.
Ora, Portugal precisa de capitalizar essa vantagem. A voz das autoridades portuguesas tem de ser ativa e
empenhada fazendo-se ouvir em Bruxelas e aí contribuindo também para a mudança a favor da economia e
de mais emprego.
O Programa do XXI Governo defende uma leitura, que, aliás, qualifica de «leitura inteligente da disciplina
orçamental», que passará pela atribuição de prioridade à redução dos desequilíbrios não só económicos mas
também sociais.
Perguntamos, pois, Sr. Primeiro-Ministro, como é que o Governo se propõe cumprir esse objetivo que é,
afinal, o da reconquista da confiança dos cidadãos no modelo social europeu e, do mesmo modo, se teremos,
finalmente — e esperamos que sim! —, deixado para trás o tempo em que as reformas ditas «estruturais» se
traduziam invariavelmente na privatização de setores estratégicos e na redução de direitos laborais e sociais
para, como concluiu há minutos, vivermos um novo impulso à convergência com mais crescimento e maior
igualdade.
Felicidades ao XXI Governo Constitucional!
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado
Jorge Falcato.
O Sr. Jorge Falcato Simões (BE): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as
Deputadas e Srs.
Deputados, antes de perguntar o que quer que seja ao Sr. Primeiro-Ministro, não posso deixar de dizer que me
congratulo com a nomeação da Dr.ª Ana Sofia Antunes para Secretária de Estado da Inclusão das Pessoas
com Deficiência.
Aplausos do BE e do PS.
Congratulo-me, porque já seria bom ter uma pessoa competente no cargo, mas ter uma pessoa
competente e que tem uma deficiência é muito melhor, e melhor ainda quando se trata de uma ativista pelos
direitos das pessoas com deficiência.
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Sr. Primeiro-Ministro, como sabe, a população com deficiência é a mais pobre, a que mais sofre com o
desemprego, a que tem menores qualificações escolares. São cidadãos e cidadãs a quem são negados os
mais básicos direitos: à educação, ao trabalho, a uma habitação adequada, à mobilidade, enfim, a uma vida
digna. Direitos que lhes são negados por uma única razão: porque são diferentes, nasceram ou ficaram
diferentes. São pessoas, na sua maioria, eternamente dependentes das suas famílias, porque o Estado
português considera que é possível viver com prestações sociais de 180 € a pouco mais de 200 € mensais.
O Programa do XXI Governo propõe avaliar e reformular as prestações sociais no sentido da
implementação de uma única prestação que inclua uma componente fixa, de acordo com o grau de
incapacidade da pessoas, e uma componente variável, respeitante às despesas com reabilitação.
Dada a complexidade desta proposta, o tempo de estudo necessário para a sua formalização e a sua
implementação na prática, reconhecendo nós, como reconheceu, recentemente, a Sr.ª Secretária de Estado
da Inclusão das Pessoas com Deficiência, que estas prestações sociais são vergonhosamente insuficientes,
está o Governo disponível para promover um aumento substancial destas prestações no imediato, enquanto
outras não forem definidas?
O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Atenção ao tempo, Sr. Deputado.
O Sr. Jorge Falcato Simões (BE): — Outra questão, Sr. Primeiro-Ministro, é a implementação de uma
política de vida independente, em oposição à política institucionalizadora seguida pelo anterior Governo. E
vida independente é ser dono da sua vida, é ter meios para escolher e contratar a ajuda necessária para isso,
viver onde e como quiser e não ter como única escolha o internamento num lar, onde nem sequer se tem a
liberdade de optar pelo canal de televisão preferido.
Como sabe, Sr. Primeiro-Ministro, o Estado comparticipa com 970 € os lares residenciais, por cada utente
com deficiência internado, lares que ainda cobram ao utente até 90% dos seus rendimentos.
O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Sr. Deputado, peço-lhe o favor de terminar.
O Sr. Jorge Falcato Simões (BE): — Podemos contar com o compromisso do Governo para proporcionar
às pessoas com deficiência esta oportunidade de escolha? Poderão estas pessoas contar que, tal como foi
afirmado pela Sr.ª Secretária de Estado da Inclusão das Pessoas com Deficiência, vai ser implementada uma
política neste sentido, que garanta pagamentos diretos e liberdade de escolha de assistente pessoal?
Aplausos do BE e do PS.
O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Também para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª
Deputada Berta Cabral.
A Sr.ª Berta Cabral (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, li com toda a atenção, como era minha
obrigação, o Programa do Governo e, da análise que fiz, vi, em relação às regiões autónomas e, em concreto,
aos Açores, algumas medidas sobre a economia do mar, mas estranhei, e devo dizê-lo aqui, não encontrar
uma única palavra sobre a agricultura e sobre a produção do leite e toda a fileira associada a este setor.
Não vi, como disse, uma única palavra, porque o Programa do Governo é completamente omisso em
relação ao principal setor económico dos Açores, que é o do leite, o qual atravessa, neste momento, a crise
mais grave dos últimos 40 anos, com o fim das quotas leiteiras, pela mão do Partido Socialista, do Ministro
Jaime Silva.
Protestos da Deputada do PCP Rita Rato.
Queria, por isso, dizer-lhe, Sr. Primeiro-Ministro, que a agricultura nos Açores está presente em todas as
dimensões da atividade económica: cria riqueza, cria emprego direto e indireto, promove o turismo, promove
as exportações, valoriza o território, protege o ambiente, conserva a natureza e preserva a nossa
biodiversidade.
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Protestos da Deputada do PCP Rita Rato.
Por isso mesmo, trata-se de um setor que não poderia estar esquecido, quando se fala em detalhe de
algumas medidas e, em concreto, de outras áreas económicas da Região Autónoma dos Açores.
Se o Programa do Governo fosse vago, no seu conjunto, não estaria a colocar a questão, mas o Programa
é muito específico em determinadas medidas e em determinados setores em concreto.
Por isso mesmo, a questão que aqui lhe deixo é no sentido de saber o que pensam o Sr. Primeiro-Ministro
e o seu Governo fazer para compensar a perda de rendimentos dos agricultores açorianos, que já vai em 30
milhões de euros, nos últimos sete anos.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Está na página 177 do Programa do Governo, Sr.ª Deputada!
A Sr.ª Berta Cabral (PSD): — É uma situação que merece uma atenção especial por parte deste Governo,
em função das promessas eleitorais que fez quando visitou os Açores.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Entretanto, reassumiu a presidência o Presidente, Ferro Rodrigues.
O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Inês de Medeiros.
A Sr.ª Inês de Medeiros (PS): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, é com especial satisfação que
intervenho neste debate do Programa do Governo para falar das áreas da cultura e da comunicação social,
áreas particularmente penalizadas na anterior Legislatura.
O brevíssimo XX Governo Constitucional tentou dar uma aparência de ato de contrição, com o
restabelecimento do Ministério da Cultura. Era, evidentemente, uma aparência, pois, face ao estranho
agrupamento de competências desse Ministério, só muito dificilmente poderíamos entender uma qualquer
lógica ou uma qualquer estratégia que justificasse aquela junção.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Era a lógica da batata!
A Sr.ª Inês de Medeiros (PS): — Em contrapartida, o XXI Governo Constitucional, tal como fora
devidamente anunciado no Programa Eleitoral, apresenta um Ministério da Cultura reforçado nas suas
competências no setor cultural, às quais se acrescentou o da comunicação social, pois ambos são setores
essenciais para a valorização económica da atividade cultural e artística, para a promoção e
internacionalização da nossa língua e cultura e para a coesão nacional e ambos precisam de respostas
conjuntas face aos desafios do digital, e não só.
Sr. Primeiro-Ministro, pela sua ação política passada, sei que não precisa de ser alertado ou mesmo
convencido…
O Sr. Presidente: — Já ultrapassou o tempo de que dispunha, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Inês de Medeiros (PS): — Vou já terminar, Sr. Presidente.
Como estava a dizer, Sr. Primeiro-Ministro, sei que não precisa de ser alertado ou mesmo convencido da
importância destes dois setores, particularmente nos tempos difíceis que ainda temos pela frente.
Gostaria, no entanto, que nos deixasse aqui uma garantia de que este Governo tudo fará para, daqui para
a frente, proteger estes dois setores da permanente incerteza sobre as suas estruturas, sobre a sua orgânica e
sobre o seu financiamento, e das reformas feitas com incompreensível superficialidade e até desleixo do
anterior Governo.
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Sr. Primeiro-Ministro, ciência, cultura e educação são, de facto, pilares da cidadania, bem como a
informação e o direito à informação. Aqui estaremos para, em conjunto com o Governo, salvaguardar, melhor
proteger e respeitar estes dois direitos constitucionais.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.
O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados, vou procurar responder ao conjunto das
questões de forma tão sintética quanto possível.
Em primeiro lugar, relativamente às questões colocadas pela Sr.ª Deputada Patrícia Fonseca, vejo, com
satisfação, a sua participação ativa nestes debates. Isso talvez ajude aqueles que tanto temem que a
Assembleia da República esvazie a concertação social, pois podem verificar que, também na Assembleia da
República, estão bem representados e os seus direitos serão aqui defendidos.
Aquilo que lhe posso assegurar é que, da nossa parte, trataremos todos os interesses, todos os
agricultores, todas as organizações, todos os setores e todas as regiões por igual, procurando introduzir justiça
naquilo que é essencial à relação do Estado com os agentes económicos, tendo em vista prosseguir um
trabalho que, felizmente, tem vindo a ser desenvolvido ao longo das últimas décadas e que permitiu termos,
hoje, na nossa agricultura e no setor agroalimentar, dos setores económicos mais pujantes e que melhor têm
vindo a contribuir para a internacionalização da economia portuguesa. Essa continuidade certamente existirá.
Relativamente à falta de dotação orçamental em algumas rubricas, naturalmente, estamos a fazer o que
nos compete, que é procurar acudir a uma boa gestão do Orçamento, de forma a cobrir as falhas onde elas
existem, mas sem sacrificar um objetivo que creio ser comum a todos nós e que, ainda há pouco, tanto
apoquentava o líder da sua bancada parlamentar, que é o de assegurar que Portugal, por ação deste
Governo, não deixará de cumprir as metas e sair do procedimento por défice excessivo a partir do final deste
ano.
Quanto à legislação dos baldios, a avaliação que fazemos é distinta da que faz, mas iremos proceder à
revisão, de forma a corrigir injustiças que resultam da aplicação dessa legislação, assim como iremos
acompanhar o processo da Casa do Douro, com a garantia de que não haja distorções na preservação dos
direitos e da igualdade de todos os interessados.
Relativamente ao que foi dito pela Sr.ª Deputada Paula Santos, há um compromisso fundamental neste
Programa do Governo, aliás, reforçado com base nos acordos estabelecidos com o PCP, com o Bloco de
Esquerda e com Os Verdes, tendo em vista a construção da maioria de suporte a este Governo, que é o do
reforço e defesa dos serviços públicos em Portugal. E essa defesa parece-me particularmente importante,
porque é uma marca fundamental do modelo social em que vivemos, é uma questão de igualdade e de
cidadania. E esse é, pois, um esforço que temos de prosseguir.
Não posso garantir-lhe, como não garantimos no acordo que assinámos, que possamos alcançar tão
depressa quanto todos desejaríamos os objetivos nos quais convergimos. Há matérias sobre as quais
conseguimos convergir nos fins, nas condições e nos termos, há outras em que, apesar de convergirmos nos
fins, ainda temos de fazer um esforço para convergir nas condições e nos termos. Mas, como diz o Sr.
Deputado João Oliveira, havemos de lá chegar, com persistência e trabalho.
Sr.ª Deputada Sara Madruga da Costa, tenciono ter tão brevemente quanto possível encontros com os Srs.
Presidentes dos Governos Regionais quer dos Açores, quer da Madeira, tendo em vista procurar articular o
esforço da ação do Governo da República e dos Governos Regionais.
Conheço bem a prioridade que o Governo Regional da Madeira e, não só, também os madeirenses
atribuem à necessidade de um novo hospital, tal como também conheço bem a prioridade que os açorianos
atribuem à necessidade de um novo estabelecimento prisional em Ponta Delgada. Portanto, em diálogo com
ambos os Governos Regionais, teremos, com certeza, condições para alcançar as soluções mais adequadas,
dentro dos limites com que os Governos Regionais se confrontam e com que o Governo da República também
se confronta.
Sr. Deputado Filipe Neto Brandão, gostaria de reafirmar o seguinte: temos, de facto, um compromisso
muito claro relativamente à União Europeia, mas também temos uma leitura realista do que é a União
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Europeia. Este ano, em que fazemos 30 anos da assinatura do Tratado de Adesão, é uma boa altura para
fazermos um balanço e verificarmos o que aconteceu nos primeiros 15 anos e nos 15 anos seguintes. Aquilo
que não podemos deixar de reconhecer é que, desde o início do século, a nossa economia tem tido dificuldade
em adaptar-se ao acréscimo de competitividade que resultou do triplo choque da globalização, do alargamento
a Leste e da criação do euro. E essa dificuldade de adaptação resulta, designadamente, de a União
Económica e Monetária ter sido criada e se ter desenvolvido de um modo incompleto e, ainda hoje, de alguma
forma, aos soluços.
Se recordarmos o que aconteceu em 1992, aquando da criação do mercado interno, verificamos que a
criação do mercado interno foi acompanhada da política de coesão. A introdução do euro não foi
acompanhada do alargamento da política de coesão. Confiou-se, porventura, que a redução da taxa de juro
permitiria financiar, aos Estados e à economia privada, os recursos necessários aos investimentos para
diminuir o gap de competitividade. Isto, de facto, assim foi, mas foi um incentivo errado, como, hoje, todos
sabemos, que conduziu ao endividamento dos Estados, das famílias e das empresas. É, por isso, importante
um novo olhar sobre a União Económica e Monetária.
Vejo com otimismo e esperança alguns sinais. Vejo como bom sinal a nova postura do Banco Central
Europeu, que permitiu libertar-nos de taxas de juro absolutamente insuportáveis, não obstante hoje termos um
produto interno bruto inferior ao que tínhamos em 2011 e um nível de vida superior ao que tínhamos em 2011.
Mas, graças ao Banco Central Europeu, Portugal, felizmente, não está hoje confrontado com as situações
dramáticas que viveu em 2011.
Vejo como positivo que a nova Comissão, rompendo com os dogmas da «Comissão Barroso», atribua
prioridade ao investimento e ao investimento público e que o «Plano Juncker», sendo ainda insuficiente, sendo
ainda inconsequente em muitas dimensões, é, indiscutivelmente, um bom sinal.
Vejo com otimismo a comunicação da Comissão sobre a leitura, inteligente e flexível, do tratado
orçamental.
Mas sinto que é essencial darmos um passo em frente. Por isso, uma das nossas prioridades é aquilo que
designámos «Novo Impulso para a Convergência». E o Novo Impulso para a Convergência significa a
necessidade de propormos à União Europeia que, encerrado este processo de ajustamento, entremos agora
numa fase decisiva e em que seja possível contratualizar…
O Sr. Presidente: — Ultrapassou o seu tempo, Sr. Primeiro-Ministro.
O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, vou esforçar-me por terminar, mas não queria deixar sem
resposta os restantes Srs. Deputados.
Mas, dizia eu, esperemos que entremos numa fase em que seja possível contratualizar um programa que
incida sobre os bloqueios estruturais à nossa competitividade, em particular no domínio da educação, da
formação, da modernização do Estado e da Administração Pública, do sistema de justiça, e que permita,
designadamente, a valorização e a modernização da capacidade de inovação e tecnológica do nosso tecido
empresarial. Essa é uma forma de estar na Europa, solidária, mas não passiva, e é isso que é absolutamente
essencial.
Em resposta ao Sr. Deputado Jorge Falcato, que saúdo, que, com gosto, reencontro e que espero ter agora
a possibilidade de voltarmos a trabalhar juntos, queria dizer o seguinte: o Programa do Governo assume como
objetivo poder estudar e avaliar a forma de unificação das diferentes prestações sociais, tendo uma
componente fixa e uma componente variável, de modo a responder de uma forma mais ajustada às
necessidades específicas de cada um dos cidadãos que seja beneficiário e que isso se faça através de um
princípio fundamental de confiança no próprio beneficiário, que não passa, necessariamente, pela sua
institucionalização, porque não há nenhuma razão para encarar a pessoa com deficiência com uma
capacidade diminuída de gerir a sua própria autonomia e de gerir os apoios sociais que recebe do Estado, em
função das necessidades específicas que tem.
Finalmente, respondo à Sr.ª Deputada Berta Cabral dizendo que acompanhamos com muita preocupação o
tema do leite, que resulta não só, nem sobretudo, da há muito prevista eliminação das quotas leiteiras, mas
pelo fortíssimo impacto que tem tido o embargo da União Europeia à Rússia.
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Protestos da Deputada do PSD Berta Cabral.
O Sr. Presidente: — Peço-lhe que conclua, Sr. Primeiro-Ministro.
O Sr. Primeiro-Ministro: — Vou já terminar, Sr. Presidente.
Ainda recentemente, tive oportunidade de, nos Açores, reunir com o Presidente da Federação Agrícola dos
Açores, Sr. Jorge Rita, que me falou, e eu pude ouvir, das aspirações da lavoura açoriana. Estamos a
trabalhar, e trabalharemos, com o Governo da Região Autónoma dos Açores para responder da melhor forma
à situação específica dos Açores.
À Sr.ª Deputada Inês de Medeiros, louvando-me na nossa amizade, não vou responder para não
desrespeitar ainda mais o Sr. Presidente.
Risos da Deputada do PS Inês de Medeiros.
O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr. Primeiro-Ministro.
O Sr. Primeiro-Ministro: — E concluo, Sr. Presidente, se não se importa, expressando aqui,
antecipadamente, a minha solidariedade aos Srs. Deputados Pedro Passos Coelho e, apesar de ausente,
Paulo Portas, porque, estando agora na circunstância em que eu estava no debate parlamentar sobre o
Programa do anterior Governo,…
O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Não, não! Não estamos na mesma situação!
O Sr. Primeiro-Ministro: — … certamente, serão vituperados pelos seus colegas de bancada pelo facto de
não terem usado, hoje, da palavra e terem perdido a oportunidade de me confrontar diretamente.
Aplausos do PS.
Protestos do PSD e do CDS-PP.
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: — Para que efeito, Sr. Deputado?
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Para uma interpelação à Mesa, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: — Sobre a condução dos trabalhos, não é?
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Exatamente, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: — Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Sr. Presidente, o Sr. Primeiro-Ministro veio, ele próprio, também
fazer uma interpelação sobre a condução dos trabalhadores e sobre o facto de o Dr. Paulo Portas não ter
intervindo. Vou responder, muito brevemente, ao Sr. Primeiro-Ministro com uma frase que agora, mais do que
nunca, estranhamente, lhe deve ser cara: «Olhe que não, olhe que não!»
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Peço a palavra, Sr. Presidente.
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O Sr. Presidente: — Sr. Deputado Luís Montenegro, é também para interpelar a Mesa sobre a condução
dos trabalhos, não é verdade?
O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Sr. Presidente, nos mesmos termos da interpelação anterior,…
O Sr. Presidente: — Com certeza, Sr. Deputado.
O Sr. Luís Montenegro (PSD): — … muito rapidamente, também queria dizer ao Sr. Primeiro-Ministro que
a circunstância em que o Dr. Pedro Passos Coelho e o Dr. Paulo Portas se encontram hoje é bem diferente
daquela em que se encontrava o Dr. António Costa há três semanas.
Vozes do PS: — Ah!…
O Sr. Luís Montenegro (PSD): — É que eles venceram as eleições, não as perderam nem quiseram tomar
o Governo que o povo escolheu que fosse protagonizado por outros. É muito diferente!
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Protestos do PS, do BE e do PCP.
O senhor queria deitar o Governo abaixo,…
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, a sua interpelação não tem a ver com a condução dos trabalhos.
O Sr. Luís Montenegro (PSD): — … tinha oportunidade de dizer ao que vinha e não o quis fazer no
primeiro dia daquele debate. É uma situação completamente diferente.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
O Sr. Presidente: — A sua interpelação tem pouco a ver com a condução dos trabalhos, Sr. Deputado Luís
Montenegro.
Vou dar, agora, a palavra ao Sr. Deputado Carlos César, que também vai interpelar a Mesa sobre a
condução dos trabalhos.
Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Carlos César (PS): — Sr. Presidente, é apenas para lembrar a V. Ex.ª e, por vosso intermédio, a
todos os Deputados que todos os Deputados, nesta Assembleia, são iguais.
Vozes do PSD: — Ah!…
O Sr. Carlos César (PS): — São iguais quer aqueles que já foram do Governo quer aqueles que para o
Governo passaram. Por isso, é dever de todos nós intervir nos debates e, nessa ocasião, notamos muito a
falta daqueles que criticaram o Sr. Primeiro-Ministro quando, nas mesmas circunstâncias, não usou da
palavra.
Olhe que sim, olhe que sim, Sr. Deputado!
Risos e aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Vamos passar ao debate propriamente dito do Programa do XXI Governo
Constitucional (ponto 2 da ordem de trabalhos).
Estão inscritos vários Srs. Deputados.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Marco António Costa, do PSD.
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O Sr. Marco António Costa (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Sr.as
Ministras, Srs. Ministros,
Sr.as
Deputadas, Srs. Deputados: A avaliação que hoje aqui fazemos não é apenas do Programa do XXI
Governo Constitucional. É também do processo político que levou à investidura deste Governo. E tal avaliação
só pode levar a uma conclusão: a conclusão de que vivemos um tempo estranho. Um tempo em que a
vontade, a razão e a prática democráticas são subjugadas a experimentalismos partidários. Um tempo em que
alguém quer que o bizarro passe a ser normal e o anómalo passe a ser natural.
Para nós, não faz sentido tal conjugação de ideias e por nós não alinharemos nesses princípios. Porque o
Programa que aqui discutimos é um programa que os cidadãos portugueses não sufragaram, porque é o
Programa de um governo que os portugueses não escolheram e porque a realidade indesmentível é só uma:
no passado dia 4 de outubro os portugueses escolheram, livre e democraticamente, um vencedor e uma
solução governativa clara, que foi derrubada neste Parlamento pela coligação socialista e comunista que
agora suporta este XXI Governo Constitucional.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. Marco António Costa (PSD): — Nesse dia 4 de outubro, os portugueses disseram muito claramente
qual era o projeto que desejavam para o País: o projeto governativo que lhes foi proposto pelo PSD e pelo
CDS. E, nessa noite, sufragaram claramente não só uma proposta para o futuro como subscreveram o
caminho que nos trouxe até aqui. Um caminho em cujo percurso muitos quiseram colocar obstáculos, mas
que, por mérito dos portugueses, foi percorrido com sucesso. Um caminho que nos devolveu o prestígio
perdido e o respeito dos nossos parceiros internacionais e europeus. Um caminho que, nessa noite, recebeu a
derradeira avaliação política e aquela que mais importa: a avaliação dos portugueses que votaram para que o
caminho continuasse e que, dessa forma inequívoca, recusaram voltar atrás.
Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Deputados: Nenhum de nós ignora que o caminho seguido foi
difícil. Diria mesmo que foi muito difícil. E ninguém esconde que foram precisos, desde 2011, enormes
sacrifícios para vencer as dificuldades.
Mas também ninguém esquece — e sublinho, ninguém esquece — que o respeito por esse esforço
passado impõe aos governantes especiais responsabilidades no presente e no futuro.
Por isso somos claros, desde logo, numa primeira exigência: a de que não se volte atrás e se respeite o
trabalho e o sentido de entrega que os portugueses colocaram na recuperação de Portugal. Porque, mais do
que tudo, os portugueses não merecem que a recompensa por ultrapassarmos as dificuldades seja o regresso
da instabilidade, da incerteza e do devaneio incalculado.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Pelo contrário, o que os portugueses querem e o que os portugueses merecem é que se dê continuidade
ao trabalho que vinha sendo feito, pois é assim que se garante a manutenção do rumo de crescimento
económico e da recuperação social de Portugal.
Mas hoje, e poucas semanas após as eleições, o cenário é outro. Insisto: é um cenário atípico, anormal e
bizarro. Um cenário que tememos que faça Portugal regressar a 2011, destruindo o esforço de recuperação
que o País já realizou. O País que deixámos em 2015 não é o país que encontrámos em junho de 2011.
Por isso importa registar e recordar, para memória futura, quatro dados importantes. A saber: recebemos o
País com um défice de 11% e entregámos o País com um défice de 3%; recebemos o País em recessão e
entregámos o país com a economia a crescer homologamente há vários trimestres; recebemos um país
incapaz de se financiar, sem acesso a crédito, e entregámos um país com taxas de juro historicamente baixas;
recebemos o País com um desemprego galopante e entregámos o País com o desemprego a diminuir desde
janeiro de 2013.
Por fim, recordamos ainda que recebemos um país com as pensões mínimas sociais e rurais e o salário
mínimo nacional congelados e foi o Governo PSD/CDS que, em sede de concertação social e no âmbito de
um profundo e profícuo diálogo social, promoveu o descongelamento e a atualização desses rendimentos.
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Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Deputados: Muitas têm sido as tentativas esforçadas de alguns
dirigentes da frente que apoia este Governo socialista e comunista para torcer a realidade e tentar, como é,
aliás, seu timbre, reescrever a história, pretendendo apagar os factos que acabei de elencar. E ainda tentam
esboçar umas inventonas que possam servir de desculpa aos seus falhanços.
A tais tentativas despudoradas para distorcer a realidade e lançar a confusão na opinião pública,
responderemos com moderação e pedagogia. E a essa atitude pedagógica juntaremos uma postura de
oposição responsável e exigente na vigilância dos caminhos que agora este Governo socialista e comunista
pretende trilhar. Fiéis, como sempre, ao critério que conduz a nossa ação política: a defesa intransigente do
interesse nacional.
É algo que nunca sujeitámos nem sujeitaremos a lógicas partidárias, a movimentações táticas ou a
interesses de circunstância plasmados em posições mais ou menos conjuntas. Porque o nosso compromisso
com Portugal não é o da geometria variável, consoante estamos no poder ou consoante estamos na oposição.
Não pertencemos, definitivamente, ao grupo dos que pensam que só podem ter — ou aparentar ter — uma
postura positiva moderada e dialogante quando estão no poder.
O Sr. Duarte Filipe Marques (PSD): — Muito bem!
O Sr. Marco António Costa (PSD): — Não obstante estarmos em total desacordo com a forma como este
Governo se impôs aos portugueses, o País sabe que o Partido Social Democrata não vira costas às suas
responsabilidades.
Apesar de termos visões políticas e estratégicas em muitos aspetos diametralmente opostas àquelas que
este Governo propõe, o País sabe que nós não baixamos os braços, não desistimos e não desertamos. Mais
claros e diretos não podemos ser.
De outros, o País sabe apenas que, nos últimos quatro anos, não ajudaram nem contribuíram para os
sucessos que Portugal e os portugueses alcançaram. Agora falam de diálogo, quando antes semearam o
sectarismo e o partidarismo mais radical.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Deputados: O Programa do Governo que hoje aqui discutimos
não é, já o disse, um programa escolhido pelos portugueses. Também não é o Programa que o PS apresentou
aos eleitores, nem tampouco a soma de todos os programas dos cinco partidos da esquerda que sustentam
este XXI Governo Constitucional.
O Sr. João Oliveira (PCP): — O PAN já foi apadrinhado!
O Sr. Marco António Costa (PSD): — Na ânsia de tentar conjugar tantas «posições conjuntas», o que
temos aqui, no fim de contas, é um programa desconjuntado e perigoso para o futuro de Portugal.
Não nos iludamos: este é um Programa com perigos reais e evidentes para o País e para os portugueses,
que põe em causa a recuperação económica e social que Portugal empreendeu nos últimos anos. Perigos que
residem nas opções, mas também na pressa vertiginosa com que desejam implementar tais opções. Uma
pressa negociada em nome de uma tomada esdrúxula do poder, mas inevitavelmente geradora de
desequilíbrios que serão fatais para o nosso futuro coletivo.
Não vamos aqui esmiuçar medida a medida deste Programa do Governo.
Concentremo-nos, pois, num dos seus aspetos centrais: aquele que apoia e sustenta o crescimento da
economia portuguesa no incremento artificial da procura e do consumo interno.
Como é possível que, depois de termos passado por tudo o que passámos, possa novamente este
Governo vir insistir numa receita de efeitos fatídicos a médio e longo prazo? Uma receita que faz aumentar as
importações, que desmobiliza do foco exportador a nossa máquina produtiva e afeta irremediavelmente a
competitividade das nossas empresas, gerando, a prazo, mais desemprego.
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Por isso, apelamos à responsabilidade deste Governo socialista e comunista para não colocar em risco a
trajetória de crescimento económico que Portugal está a trilhar.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Isto até era divertido se demorasse mais tempo!
O Sr. Marco António Costa (PSD): — Ficámos ainda seriamente preocupados quando ouvimos a porta-
voz de um dos partidos que apoia este Governo classificar as IPSS como sendo — e vou citar — uma «rede
clientelar», a propósito da participação destas instituições na prestação de cuidados de saúde às populações.
É uma afirmação grave e, sobretudo, profundamente ofensiva para com todas as instituições e profissionais
que nelas trabalham e que se assumiram, nas últimas décadas, como parceiros insubstituíveis do Estado
social e como a primeira linha avançada de uma sociedade solidária.
Para nós, é claro que este é um sinal do regresso dos velhos preconceitos ideológicos contra uma
sociedade livre, atuante, inconformada e empreendedora, que faz da solidariedade um dever ético e que
intervém em cooperação com o poder local e central.
E seriamente preocupados ficámos também com a forma como este Governo socialista e comunista se
propõe desvalorizar a concertação social e minar, por essa forma, o diálogo social em Portugal, em nome de
uma radicalização política praticada sob orientação superior de quem, no passado, se autoexcluiu da
concertação e do diálogo social, preferindo a crítica destrutiva e a rua como instrumento de ação, ao trabalho
na concertação social.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Isto até seria divertido se demorasse mais tempo, mas para a semana já se
esqueceram!
O Sr. Marco António Costa (PSD): — Agravando esse receio, ainda hoje ouvimos o Sr. Primeiro-Ministro
afirmar aqui que quer ouvir a concertação social, mas que decidirá independentemente dela.
Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Deputados: Termino afirmando que é para nós claro que este
Governo e este Programa não podem merecer o nosso apoio. Mais: este Programa, socialista e comunista, em
nome de Portugal e dos portugueses, só pode merecer a nossa mais frontal oposição e rejeição.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
O Sr. Presidente: — Inscreveu-se, para pedir esclarecimentos, o Sr. Deputado Pedro Delgado Alves.
Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Pedro Delgado Alves (PS): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Marco António Costa, coloca-nos a
pergunta «em que momento foi o Programa do Governo do XXI Governo Constitucional sufragado tal qual nas
urnas pelos eleitores?»
Devolvo-lhe a pergunta: em que momento é que o Programa com que o PSD e o CDS governaram nos
últimos quatro anos foi, tal qual como foi apresentado aos eleitores, sufragado nas urnas?
Aplausos do PS.
O Programa de Governo é o resultado de um processo parlamentar, democrático, de construção de um
programa político. É o que resulta, depois de umas eleições, da capacidade de os partidos políticos
concertarem soluções que apresentam democraticamente perante um Parlamento.
Fala-nos de experimentalismo. Pergunto-lhe se haveria experimentalismo na altura, em 2011, quando em
debate televisivo o atual líder da oposição e o líder do CDS, confrontados com a possibilidade de acordos
parlamentares, debatiam a possibilidade de até poder ser o CDS a liderar o Governo, desde que a maioria
parlamentar o colocasse perante a Mesa, e a possibilidade até de o CDS, com mais votos do que o PSD,
liderar um governo, ainda que com menos votos do que o PS.
Aplausos do PS.
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A Sr.ª Ana Catarina Mendonça Mendes (PS): — Bem lembrado!
O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Se tivessem votos para isso era uma coisa diferente!
O Sr. Pedro Delgado Alves (PS): — Era este experimentalismo ou era outra coisa? Democracia.
Democracia de base e componente parlamentar, democracia a funcionar como funcionou há duas semanas,
como funciona aqui no momento em que, com toda a legitimidade que a nossa Constituição e o nosso
Regimento dão, os senhores apresentam uma proposta de rejeição do Programa de Governo. É legítimo,
como foi legítimo, exatamente, há duas semanas. É a democracia a funcionar.
Mas, já agora, perguntava-lhe também se não entende que radicalização foi precisamente aquilo que levou
os portugueses a rejeitarem maioritariamente o Programa que a coligação apresentou,…
O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — O vosso Programa é que os portugueses rejeitaram!
O Sr. Pedro Delgado Alves (PS): — … porque, precisamente, a maioria dos eleitores que sufragaram os
eleitos que se encontram deste lado, os eleitores que elegeram Deputados que representam os portugueses,
esses, sim, não se reveem na perda de rendimentos, esses, sim, não se reveem na emigração, esses, sim,
não se reveem na precariedade, esses, sim, não se reveem no modelo que durante quatro anos, de facto,
trouxe resultados que agora se pretende ultrapassar e virar a página. Isto também, mais uma vez, é
democracia a funcionar.
Finalmente, uma última observação, uma última pergunta, em relação à concertação social. Não resisto a
voltar a colocá-la, já tem surgido várias vezes, em vários debates, em vários momentos. Aparentemente a
concertação social só se pode ignorar contra os trabalhadores e quando, porventura, os sindicatos levam uma
proposta à concertação social que não é aceite pelos governos, nunca me recordo de nenhuma bancada da
maioria anterior, nunca me recordo de ter havido um ultraje, uma ideia de espanto e de desgraça por,
porventura, uma proposta de um sindicato na concertação social não ser aceite e um governo decidir manter a
sua proposta inicial quando isso prejudica os trabalhadores.
O Sr. JoãoPinho de Almeida (CDS-PP): — Já houve! Está enganado! Tem de perguntar à UGT!
O Sr. Pedro Delgado Alves (PS): — Por que é que no momento em que se discute o salário mínimo e em
que eventualmente temos uma proposta na concertação social favorável aos trabalhadores, de repente, há um
«ai» e um «ui», «cai o Carmo e a Trindade» porque o decisor, democraticamente sufragado, vai manter uma
proposta para melhorar a condição de vida dos trabalhadores e para aumentar o salário mínimo? Por que é
que causa choque nestes momentos e nunca causou em todos os momentos em que a solução era
precisamente a inversa?
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Marco António Costa.
O Sr. Marco António Costa (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Pedro Delgado Alves, agradeço a sua
pergunta. Permita-me que faça aqui algumas precisões muito simples.
Perguntou-me qual era legitimidade para aplicarmos o Programa que aplicámos durante quatro anos de
governação. Foi a legitimidade que decorreu de um resgate que os senhores assinaram e que nós tivemos de
cumprir, sob uma avaliação permanente, aliás, doze avaliações permanentes dos nossos financiadores
externos.
O Sr. Pedro Delgado Alves (PS): — Nunca cumpriram uma meta!
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O Sr. Marco António Costa (PSD): — E aquilo que resulta é que, depois de doze avaliações e de termos
cumprido um objetivo que foi o de libertar Portugal da troica, como os senhores tantas vezes referiram em
maio de 2014, ainda conseguimos uma última avaliação positiva, que foi a vitória de 4 de outubro, coisa que
os senhores não conseguiram nem de uma vez, nem da outra.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Mas, Sr. Deputado, de facto, os portugueses escolheram o Programa de Governo e o programa político
que foi apresentado pelo XX Governo Constitucional que os senhores, a maioria socialista e comunista,
chumbaram neste Parlamento.
A Sr.ª Ana Catarina Mendonça Mendes (PS): — E bem!
O Sr. Marco António Costa (PSD): — E essa responsabilidade os senhores terão de a carregar de forma
clara e terão de responder perante os portugueses face à situação em que encontram hoje o País e aquela em
que entregarão o País no futuro.
Descrevi de forma muito objetiva o cenário em que nós encontrámos o País e o cenário em que o
entregámos. As evidências são claras e só isso justifica que os portugueses tivessem tido vontade no dia 4 de
outubro de reconduzir o Dr. Pedro Passos Coelho como Primeiro-Ministro e o Dr. Paulo Portas como Vice-
Primeiro-Ministro. Foi nessa condição e nesse pressuposto que se estabeleceu todo o debate das eleições
legislativas, contrariamente ao que está a acontecer aqui hoje.
O Sr. João Oliveira (PCP): — As eleições eram para a Assembleia da República!
O Sr. Marco António Costa (PSD): — Aquilo que está a acontecer é que nunca antes, no período eleitoral,
foi assumido por essa maioria socialista e comunista que fariam um acordo que levaria ao poder o atual
Governo e o atual Primeiro-Ministro.
Somos institucionalistas, respeitamos institucionalmente todos aqueles que exercem funções, mas não
esquecemos a origem deste Governo e o pecado original que está ligado a este Governo, que é um Governo
com um Programa que não foi o escolhido pelos portugueses.
O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Muito bem!
O Sr. João Oliveira (PCP): — Constitucionalistas, mas rancorosos!
O Sr. Marco António Costa (PSD): — É um Governo que também não foi escolhido pelos portugueses,
porque os portugueses não votaram nesta solução governativa.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Helena Freitas, do PS.
A Sr.ª Helena Freitas (PS): — Sr. Presidente da Assembleia da República, Sr. Primeiro-Ministro, é com
muita satisfação e confiança que desejo ao Sr. Primeiro-Ministro as maiores felicidades no exercício do cargo.
Ex.mo
Sr. Presidente da Assembleia da República, Ex.mo
Sr. Primeiro-Ministro, Ex.mas
Srs.as
e Ex.mos
Srs.
Membros do Governo, Sr.as
e Srs. Deputados, Minhas Senhoras e Meus Senhores: Decorre em Paris a 21.ª
Conferência do Clima, com a presença de cerca de 150 Chefes de Estado e de Governo, empenhados em
alcançar um acordo para diminuir a emissão de gases com efeito de estufa e conter o aquecimento global. A
cidade que há duas semanas viveu um dos dias mais violentos e dramáticos da nossa história recente é agora
palco em que a humanidade converge na construção de um projeto comum de paz e de esperança.
A Cimeira de Paris assinala a mudança e um futuro mais auspicioso para o planeta, contribuindo para
eliminar a pobreza e proteger a biodiversidade, os solos, o ar e os oceanos. Como afirmou o Papa Francisco
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«temos a responsabilidade moral de agir em favor dos mais pobres e mais vulneráveis, aqueles que são na
verdade os menos responsáveis pelas alterações do clima e os que mais sofrerão com os seus efeitos».
Nenhum país pode enfrentar sozinho o desafio das alterações do clima, cujos efeitos afetam globalmente a
vida dos povos, a estabilidade económica e a segurança das nações.
Ditaram as circunstâncias que fosse este o tempo de apresentação do Programa do XXI Governo
Constitucional. O tempo de afirmarum caminho alternativo, em que a prosperidade económica se harmoniza
com a ecologia e o desenvolvimento sustentável, pelo primado da pessoa, incorporando o conhecimento e a
inovação no desenho de políticas públicas informadas para o bem-estar e qualidade de vida de todas os
portugueses.
Este é um programa que defende uma outra conceção sobre o papel do Estado, dando prioridade à coesão
social e à promoção do emprego, respeitando a consolidação das contas públicas. Um programa que
prescreve o investimento na economia, travando o empobrecimento e devolvendo o poder de compra aos
cidadãos. Um programa que defende o Estado social e os serviçospúblicos, na segurança social, na
educação e na saúde, para um combate comprometido à pobreza e às desigualdades. Um programa que
defende o investimento na ciência, na inovação, na educação, na formação e na cultura, devolvendo ao País
uma visão de futuro na economia global. Um programa que assume o respeito pelos compromissos europeus
e internacionais, para a defesa dos interesses de Portugal e da economia portuguesa na União Europeia.
Na impossibilidade de me debruçar de forma exaustiva e coerente sobre todas as propostas do Programa
do Governo, destaco alguns dos seus pilares estratégicos.
O financiamento das universidades públicas foi reduzido de forma dramáticapelo anterior Governo,
afetando aestabilidade e a qualidade do ensino superior. Nãoé este o caminho. A diferenciaçãoda Europa e
de Portugal numa economia globalpassará semprepela cultura e pelo conhecimento.
O progresso do País exige competências técnicas e científicas que estão em larga medida nas instituições
de ensino superior e não pode negligenciar o papel da Universidade, enquanto lugar privilegiado de
criatividade e inovação. Desinvestir e abdicar de um ensino superior público de qualidade é condenar o País à
dependência externa e ao retrocesso. O atual Governo propõe um pacto de confiança no ensino superior,
incentivando a cooperação institucional e um quadro de financiamento estável, com definição plurianual.
A reforma do ensino superior público é inadiável, sendo prioritária a racionalização da rede do ensino
superior, ajustando a oferta à procura, sem abdicar da coesão territorial e social. Numa outra lógica e num
outro tempo, todos os governos criaram instituições universitárias, expandindo-se a rede a todo o território.
Esta opção, que hoje nos parece absurda, constituiu, de modo geral, uma mais-valia para os territórios em que
estas escolas se inseriram, pelo que importa agora desenvolver um exercício racional e transparente de
adequação e complementaridade.
É importante manter as instituições cujo papel impulsionador do conhecimento e da cultura se revelar
essencial para a vitalidade dos territórios mais despovoados do País, objetivo que se harmoniza com a
intenção do Governo em promover uma melhor integração entre as instituições de ensino superior e as
políticas de desenvolvimento regional.
Distinguir as prioridades para a renovação do ensino superior não pode deixar de contemplar um modelo
de apoio inequívoco ao mérito e aos estudantes que querem progredir na sua formação académica, mas que
não têm meios, nem pode esquecer a responsabilidade no apoio efetivo ao desenvolvimento económico,
através do conhecimento e da inovação, que são hoje ferramentas essenciais para tornar competitivo o tecido
produtivo nacional.
Nos últimos anos, corremos o risco de desperdiçar um trajeto que, de forma progressiva e consistente,
colocou a ciência portuguesa num patamar competitivo internacional. É preciso retomar o esforço de
crescimento formativo e recuperar o papel da ciência como fonte e expressão da vitalidade criativa do País. Na
educação e na ciência está a força catalisadora desta nova fase empreendedora de Portugal.
O retrocesso do investimento na ciência contribuiu para a emigração de investigadores altamente
qualificados, jovens e seniores. A ambição política tem de apoiar e gerar oportunidades para tantos jovens
investigadores portugueses disponíveis para contribuir e promover o desenvolvimento competitivo de Portugal
num mercado global. Tais oportunidades devem ser acalentadas em ambiente empresarial, mas igualmente
difundidas nas universidades, favorecendo as sinergias que é indispensável fomentar entre os dois mundos.
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Importa garantir a estabilidade e o financiamento equilibrado e justo do sistema científico nacional. O
Programa do Governo propõe, entre outros objetivos: recuperar a confiança no sistema de ciência e tecnologia
e assegurar a previsibilidade dos incentivos públicos; restabelecer a transparência e regularidade no
funcionamento dos agentes da política científica; reforçar a administração pública com investigadores
doutorados; reforçar o programa do emprego científico, substituindo progressivamente a atribuição de bolsas
de pós-doutoramento anuais pela criação de um muito maior número de novos contratos de investigador;
reforçar as instituições científicas e garantir um novo programa de avaliação científica das unidades de
investigação e desenvolvimento. Propõe, ainda, o reforço dos programas e instrumentos de promoção da
cultura científica e tecnológica.
Resgata-se, assim, a visão esclarecida e visionária do responsável por uma das políticas públicas mais
consistentes e reformadoras do Portugal moderno. É com emoção e com muito afeto que presto, nesta
Assembleia, a minha homenagem a um dos portugueses mais notáveis que tive o privilégio de conhecer de
perto: José Mariano Gago.
Aplausos do PS.
Portugal tem recursos naturais excecionais, que justificam políticas integradas e uma visão estratégica de
longo prazo. A valorização ecológica do território, das áreas protegidas aos solos e aos rios, é condição de
bem-estar das pessoas e determinante para o crescimento sustentável dos territórios. Exigem-se políticas
ambientais corajosas, medidas de adaptação às alterações climáticas, promoção da eficiência energética e
das energias renováveis e uma aposta inequívoca e definitiva na mobilidade elétrica.
A valorização dos espaços marítimos sob soberania ou jurisdição nacional é estratégica para o
desenvolvimento do País. A extensão da plataforma continental e os recursos biológicos, genéticos, minerais e
energéticos que este espaço contém abrem perspetivas que o País não pode desperdiçar. Este desígnio só é
possível se apoiado no conhecimento científico e desenvolvimento tecnológico, beneficiando da rede de
ciência do País e ainda dando corpo a um tecido empresarial de base tecnológica que tenha como centro da
sua atividade o mar.
Com igual firmeza, o Governo propõe valorizar as atividades marítimas tradicionais e valorizar a posição
estratégica de Portugal no Atlântico, reforçando e modernizando os portos nacionais, ligando-os à rede
transeuropeia de transportes. O Governo proporá um plano de aumento da capacidade das infraestruturas
portuárias, bem como de ligações ferroviárias aos hinterlands europeus, com prioridade para a ligação do
porto de Sines à rede ferroviária.
Assinalo, ainda, a instalação de um centro de observação oceânica nos Açores e a aposta na criação de
um cluster tecnológico e de investigação aplicada nas áreas dos campos petrolíferos e minerais digitais e da
engenharia naval, offshore e submarina.
O empobrecimento biológico da terra e a degradação dos ecossistemas é um processo que compromete os
bens e serviços prestados à Humanidade. A extinção de espécies e a vulnerabilidade de outras, cuja
complexidade é uma dádiva admirável da evolução, confrontam-nos com a nossa própria impotência e com
uma Humanidade indiferente ao seu próprio planeta. As ameaças são profundas e globais, pondo em causa os
ecossistemas que sustentam a vida na Terra. A ameaça das alterações climáticas e do seu impacto sobre o
planeta — 50% da diversidade biológica da Terra desaparecerá ao longo deste século — colocam-nos perante
um desafio ambiental, mas também político, complexo e decisivo para o futuro da Humanidade.
O Programa do Governo propõe a valorização da biodiversidade e dos serviços dos ecossistemas,
encarando-os como ativos estratégicos essenciais para a coesão territorial, social e intergeracional. É neste
contexto de equilíbrio ecológico que se deve entender a sustentabilidade dos recursos hídricos, um recurso
biológico essencial à vida e dela resultante. É por isso, também, um bem coletivo. Toda a vida na Terra,
terrestre e aquática, dos microrganismos aos vertebrados, depende e é composta pela água e pela dinâmica
dos cursos de água. Garantir água e saneamento básico com qualidade e acessível a todos é um objetivo
fundamental que nos deve mobilizar coletivamente.
No sector das águas há decisões e práticas de gestão que o atual Governo irá corrigir, em benefício dos
cidadãos. Destaco a reversão das fusões de empresas de água que tenham sido impostas aos municípios e o
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objetivo de integrar o ciclo urbano da água numa articulação entre o fornecimento de água e as redes de
drenagem.
No domínio específico da política florestal o Governo propõe, entre outros objetivos, a intenção de
promover a progressiva elaboração do cadastro da propriedade rústica, nomeadamente nos territórios sob
gestão das ZIF (zonas de intervenção florestal), o apoio ao movimento associativo florestal e a maior produção
e produtividade das fileiras florestais, através do aumento das áreas de pinheiro bravo e do montado de sobro
e de azinho, travando a expansão da área do eucalipto, designadamente através da revogação da lei que
liberaliza a plantação de eucaliptos. Projeta-se, assim, finalmente, uma floresta que visa repor o equilíbrio
entre a função económica da produtividade silvícola e a conservação de recursos múltiplos que a floresta deve
assegurar.
A política que consistiu em aumentar os impostos e cortar nos salários, nas pensões, nos apoios sociais e
nos serviços públicos, falhou. Os seus efeitos na economia e na sociedade portuguesa foram devastadores e
não contribuíram para a consolidação sustentada das finanças públicas. A economia portuguesa e as finanças
estão frágeis, a fragilidade dos bancos é hoje maior.
O Programa do XXI Governo Constitucional apresenta um caminho alternativo para Portugal, dando
prioridade ao combate ao empobrecimento e ao desemprego, à defesa dos serviços públicos de educação,
saúde e segurança social e apostando na educação e na investigação, a novas políticas económicas e sociais
para tornar o País competitivo, travar o retrocesso social e recuperar o caminho do progresso e da
solidariedade.
Sr. Primeiro-Ministro, este é um tempo de esperança e estou aqui, hoje, para lhe dizer que confio em si e
que acredito em Portugal e nos portugueses.
Aplausos do PS e de Os Verdes.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Ministro das Finanças.
O Sr. Ministro das Finanças (Mário Centeno): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Sr.as
e Srs.
Deputados, Minhas Senhoras e Meus Senhores: Iniciamos, agora, com o Programa do XXI Governo
Constitucional, um tempo novo, um tempo novo na economia e nas finanças de Portugal.
O Programa do Governo parte de uma leitura atenta e detalhada da realidade económica, financeira e
social portuguesa, uma realidade que este Governo conhece bem e que analisou em pormenor.
Reconhecemos os desafios que enfrentamos, não nos escondemos por detrás de desculpas e justificações.
Como este Governo nasce do respeito pelas decisões dos portugueses, não nos apresentamos aqui a dizer
que o País está de tanga, mas sabemos que somos muito menos do que há quatro anos, especialmente os
jovens, que já não temos, nem cuidámos de ter.
Hoje é claro, já todos percebemos, quem é que estava a viver acima das suas possibilidades, acima das
nossas possibilidades, e sabemos que essas possibilidades, hoje, são muito menores para o milhão e meio de
portugueses que ganha menos de 600 € por mês.
Hoje, caídas todas as máscaras e levantados todos os véus, percebemos que a expressão «saída limpa»
foi um resultado pequeno para uma propaganda enorme.
Aplausos do PS.
Mas enfrentamos os desafios com a determinação de quem não está preso a soluções ineficazes e quer
defender o seu País na Europa. O que hoje interessa é o futuro de Portugal. Por isso, a clarificação do cenário
de governabilidade do País recentra a preocupação de todos os agentes políticos, económicos e sociais com
Portugal e com os portugueses.
Hoje sabemos exatamente por que é que as nações falham, e Portugal não tem margem para falhar.
As nações falham quando perdem o respeito pelas instituições, que é uma condição essencial para o
sucesso económico. As nações falham, porque perdem o respeito por si próprias, porque não estabelecem
relações duradouras com as suas próprias regras, porque não se constroem em torno de ideias inclusivas.
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Falham, porque deixam de acreditar em si e nos seus, porque se deixam amesquinhar pelos preconceitos e
pelas pressões dos outros.
Sustentamos o nosso Programa do Governo numa visão inclusiva e solidária da economia. Não vendemos
ilusões, nem apresentamos quimeras, porque medimos, económica e financeiramente, todas as propostas que
fazemos.
Aplausos do PS.
Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: A economia portuguesa apresenta um crescimento anémico, em
que o investimento teima em não aparecer, em que, pelo esforço das empresas e dos trabalhadores, se
conseguiu conter a destruição de emprego, mas esse esforço traduziu-se numa redução inédita dos salários e
também num aumento nunca visto da emigração. É necessário combater os verdadeiros obstáculos à
competitividade das empresas portuguesas.
O resultado das eleições de 4 de outubro demonstrou uma vontade largamente maioritária de alteração das
políticas que nos trouxeram até aqui. Esta mudança deve ser conduzida com total respeito pelas obrigações
do Estado português, desde logo das obrigações que o Estado português tem com os próprios portugueses.
Primeiro que tudo, o Programa do Governo repõe a ordem constitucional.
O Programa do Governo restaura o contrato social, um contrato de confiança, que é o pilar da nossa vida
coletiva. Fá-lo quando respeita e valoriza a escola pública, quando promove a redução das desigualdades
sociais, através de uma política de rendimentos mais justa, quando assegura a proteção do Serviço Nacional
de Saúde, pilar essencial do Estado social português.
Aplausos do PS.
Acabou o tempo dos apelos às revisões constitucionais feitas à medida. Acabou o tempo das violações da
Constituição, não por defeito, mas por feitio.
A reposição dos salários da função pública é acelerada no nosso Programa do Governo, não apenas por
um imperativo constitucional, é, antes, o reconhecimento económico de que o emagrecimento da
Administração Pública trouxe dificuldades ao seu funcionamento e que a desvalorização dos serviços públicos
é, também, um fator de empobrecimento.
A reposição da normalidade constitucional passa, também, pelas pensões. O Estado, expressão
institucional da comunidade nacional, é o garante dos sistemas de segurança social públicos e assim deve
continuar a ser.
A normalidade económica só será conseguida com uma redução efetiva da carga fiscal para as famílias e
para as empresas. É urgente aliviar o espartilho económico, para que as empresas possam investir e criar
emprego e para que as famílias possam desenvolver, com dignidade, as suas aspirações.
Aplausos do PS.
No entanto, sabemos o custo elevado que têm para o investimento das empresas e das famílias as
interrupções abruptas no funcionamento do sistema económico, do seu financiamento e do apoio social.
A mudança que agora propomos é, assim, responsável. O Governo inicia, então, um tempo novo. Um
tempo de mobilizar Portugal e os portugueses para mais crescimento, melhor emprego e maior equidade.
Uma economia só é sustentável se constituir as bases para a ação do Estado, das empresas e das
famílias.
Compreendemos hoje, melhor de que nunca, que há uma linha muito ténue entre as condições económicas
e financeiras de cada um destes agentes. Cada um deles não existe sem os outros. Os investimentos de uns
estão dependentes dos investimentos dos outros. É esta interdependência que torna as políticas públicas tão
relevantes para o crescimento económico e para o emprego.
Sabemos hoje que não recuperamos competitividade por via do empobrecimento, da precarização do
trabalho ou do sacrifício da qualidade e da proximidade dos serviços públicos.
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Esta estratégia debilita a economia e a sociedade, esvaziando-as, através da emigração e do aumento da
componente importada no investimento, no consumo e nas exportações.
Sr. Presidente e Sr.as
e Srs. Deputados, o nosso sucesso económico será função do continuado
investimento no conhecimento e na inovação, na modernização do tecido empresarial e da Administração
Pública.
Pensar Portugal no futuro é pensar na responsabilidade do Estado mas, também, na de cada uma das
nossas empresas, dos nossos trabalhadores e de cada um dos nossos jovens.
A participação na União Europeia requer um conjunto de deveres, que não são mais do que a tradução dos
mecanismos de solidariedade que sempre estiveram presentes na construção europeia.
O Sr. Paulo Portas: — Mas isso o PCP não acha!
O Sr. Ministro das Finanças: — Portugal necessita de iniciar um período de convergência económica e
social com a União Europeia. A política orçamental, a política económica e a regulação devem promover essa
convergência.
Neste sentido, deve ser objetivo essencial de qualquer boa governação assegurar finanças públicas
equilibradas.
Constitui um compromisso deste Governo prosseguir uma trajetória de redução do défice orçamental e da
dívida pública no ciclo desta Legislatura.
O Orçamento do Estado para 2016 vai ser apresentado o mais depressa possível, já o dissemos. O
Governo encurtará o período de que legalmente dispõe para apresentar esse Orçamento. Não é desejável que
o País esteja num prolongado período sem a aprovação de um dos mais relevantes instrumentos de
governação.
Este Orçamento pretende ser o primeiro passo para o País poder atingir os objetivos a que nos propomos:
o aumento e a proteção do rendimento disponível das famílias, o alívio da asfixia fiscal das famílias e das
empresas, melhores condições de investimento para as empresas, o combate à pobreza e a garantia de
serviços e bens públicos essenciais.
É esta equação virtuosa, entre a promoção das condições para o crescimento económico e o rigor nas
contas públicas, que ditará o sucesso da economia portuguesa nos próximos anos e que colocará o País no
caminho da prosperidade e do progresso.
É aos portugueses que este Governo pretende proporcionar a oportunidade de começar a reconstruir
Portugal. É este o tempo novo, o tempo de fazer Portugal.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — O Sr. Ministro das Finanças tem 12 inscrições para pedir esclarecimentos. Como
prefere responder?
O Sr. Ministro das Finanças: — Em três grupos.
O Sr. Presidente: — Prefere responder em três grupos, de quatro pedidos de esclarecimentos cada.
Assim, tem a palavra a Sr.ª Deputada Mariana Mortágua.
A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, começo por cumprimentá-lo e por dizer-lhe
que, como deve ter reparado, está, naquelas bancadas à direita, sentado o ex-Primeiro-Ministro, que prometeu
que nem mais um cêntimo seria gasto a salvar um banco em Portugal.
Esta mesma direita que fez esta promessa, que veio propagandear a consolidação orçamental feita pelo
seu Governo nos últimos quatro anos, foi até hoje incapaz de explicar as pelo menos duas bombas-relógio que
deixou no seu Ministério: o Banif e o Novo Banco.
O Banif apresentou, há dias, ao BCE um plano de reestruturação depois de ter sido intimado a aumentar o
seu capital em 1400 milhões de euros. Uma primeira pergunta, muito clara, Sr. Ministro: sabemos que o
acionista do Novo Banco é o Fundo de Resolução. Portanto, importa-nos saber se este Fundo de Resolução
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foi consultado acerca do plano de reestruturação criado pelo Novo Banco. Mais do que isto, importa-nos saber
se o Ministério das Finanças, que faz parte da administração do Fundo de Resolução, deu o seu acordo ao
processo e plano de reestruturação apresentado pelo Novo Banco, ou se, pelo contrário, não teve qualquer
conhecimento do plano que foi apresentado a Bruxelas.
Por outro lado, se o plano de reestruturação do Novo Banco teve o acordo do Ministério das Finanças,
então, gostaríamos que o Sr. Ministro explicasse as consequências desse plano para o Banco, para começar,
e para os trabalhadores, que querem saber se serão, ou não, despedidos, com as ameaças que estão à porta.
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Muito bem!
A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Gostaríamos que o Sr. Ministro explicasse as consequências desse
plano para os lesados do BES que, até hoje, não tiveram uma resposta clara das instituições, nomeadamente
do Banco de Portugal. E queremos saber quais são as consequências para as contas públicas, que a direita
tentou esconder até este momento.
Sr. Ministro, parece-nos que a fantasia orçamental já dura há demasiado tempo para que continuemos com
este jogo de máscaras e de sombras, como era prática do Governo do PSD e CDS.
Aplausos do BE e de alguns Deputados do PS.
Por outro lado, S. Ministro, se não houve acordo do Ministério das Finanças, agradecíamos que
esclarecesse o que tenciona dizer ao Banco de Portugal, que tomou conta desta operação para salvar a face
do anterior Governo, que se escudou no Banco de Portugal durante este tempo, que se prepara para nos
apresentar uma conta pela calada.
Portanto, Sr. Ministro, interessa-nos saber qual é a estratégia do seu Governo para o Novo Banco.
Mais uma questão. Gostaríamos de saber o que é que o Sr. Ministro vai dizer ao Banco de Portugal, que
não foi capaz de dar resposta aos lesados, nem de supervisionar convenientemente o BES,…
Protestos do PSD.
… mas foi muito célere a fazer uma contratação milionária do antigo Secretário de Estado Sérgio Monteiro,
para ir vender o Novo Banco, como recompensa das privatizações que fez ao serviço da direita.
Aplausos do BE, do PS e do PCP.
O que é que este Governo vai dizer ao Banco de Portugal acerca dessa contratação milionária?
Aplausos do BE e do PS.
O Sr. Presidente: — O Sr. Ministro informou, entretanto, a Mesa que as respostas serão dadas em quatro
grupos de três, o que torna até o debate mais vivo.
Tem a palavra, para pedir esclarecimentos, o Sr. Deputado António Leitão Amaro.
O Sr. António Leitão Amaro (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, como dizia o seu chefe, comecemos
pelos pontos de partida.
O Sr. Ministro ainda agora, numa intervenção, criticou a saída «limpa» de Portugal. O Sr. Ministro preferiria
estar na posição em que nós estivemos, que chegámos ao Governo com a troica cá dentro? Ou o Sr. Ministro
estará a desdenhar o esforço monumental dos portugueses para tirar de cá a troica, que os senhores
trouxeram?
Vozes do PSD: — Muito bem!
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O Sr. António Leitão Amaro (PSD): — Ou o Sr. Ministro estará a preferir não uma saída «limpa», como a
de Portugal, mas uma presença «suja», como a que teve de ter a Grécia, que, infelizmente, ainda hoje está a
empobrecer?
O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Muito bem!
O Sr. António Leitão Amaro (PSD): — Sr. Ministro, o nosso ponto de partida, há quatro anos e meio, foi
um País em recessão, à beira da bancarrota, com um crescimento explosivo do desemprego e da dívida, com
um défice superior a 11% e o investimento em longa contração, quase na bancarrota e sem confiança. E o seu
ponto de partida é bem diferente. É talvez um homem de sorte, sorte que deu muito trabalho a todos, menos a
VV. Ex.as
.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. António Leitão Amaro (PSD): — E esse ponto de partida é feito de uma economia — Sr. Ministro,
soubemos, nas últimas duas semanas, os dados da trajetória e da tendência — que cresce 1,4% face ao
período do ano passado e cujo desemprego desce 1,5% face ao ano passado. No mês de outubro diminuiu o
número de desempregados e no último trimestre o emprego remunerado subiu. Mas também a produção
industrial está a subir 4,2%, o investimento a crescer 1,7%, as exportações 3,9% e um défice que, também
ficámos a saber, por reduzir 1200 milhões de euros face ao ano passado, nos permite almejar a meta de sair
com os 3% e abaixo dos 3%, que é tão importante para o País.
Sr. Ministro, o que quereis vós fazer a este País em recuperação? Uma dupla receita para o desastre ou,
se calhar, um regresso «sujo», que com o vosso modelo económico, Sr. Ministro, ascende num choque ao
consumo, que as negociações à esquerda só agravaram.
Sr. Ministro, isso não funciona e o Sr. Ministro sabe. Sabe que um choque ao consumo é errado, porque
não funciona, sobretudo em economias sobreendividadas. Não funciona, garantidamente, porque, Sr. Ministro,
aumentar o consumo num País que já agora está com uma taxa de aumento do consumo superior à média
dos últimos 20 anos,…
A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — É mentira!
O Sr. António Leitão Amaro (PSD): — … significa não fazer crescer a riqueza e o emprego em Portugal,
mas, sim, fazer crescer a riqueza e o emprego na Alemanha, porque, Sr. Ministro, mais consumo significa
aumentar as importações e em Portugal deixa mais dívida externa e na Alemanha deixa mais emprego e mais
riqueza.
Sr. Ministro, se no seu famoso Excel mágico o senhor se esqueceu, tem boa solução, olhe para o lado.
Tem aí sete colegas que já apostaram nessa receita e que, com essa receita, conduziram o País ao falhanço,
ao fracasso e à bancarrota.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Sr. Ministro, receio mesmo que essa predominância de repetentes governantes socialistas signifique uma
repetição da receita e, por isso, uma repetição do desastre. Mas, Sr. Ministro, há uma outra parte da vossa
receita e da vossa prática que me preocupa ainda mais: quando, mesmo sem ser nas palavras, na prática,
parecem fazer tudo para colocar em causa a confiança, a competitividade da economia portuguesa e, por isso,
o investimento.
Falo, por exemplo, da reversão da reforma do IRC, que estimula e atrai o investimento. Sr. Ministro, não é
apenas o facto de estarem a mudar as regras a meio do jogo, criando um dos piores males do regime tributário
e da fiscalidade, que é a instabilidade. Fazem-no revertendo uma reforma que, reduzindo a tributação,
aumentou a receita.
O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — É verdade!
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O Sr. António Leitão Amaro (PSD): — E fazem-no, Sr. Ministro, perigando ou colocando completamente
em causa a confiança até nas vossas palavras, rasgando a vossa assinatura.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Sr. Ministro, como é que alguém, um investidor, pode acreditar num partido e num governo cuja assinatura
fiscal não dura nem dois anos? Mas também destroem a confiança dos investidores, Sr. Ministro, com as
vossas pretensões de reverter as reformas estruturais na justiça e na legislação laboral — e sobre as vossas
medidas na legislação laboral, que debate daria consigo!
E, Sr. Ministro, não estão apenas a pôr em causa e a reverter reformas estruturais que já estão a aumentar
a competitividade de Portugal, o que é assinalado por todas as instituições internacionais, como também põem
em causa e rasgam a palavra da concertação social — da UGT, por exemplo.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. António Leitão Amaro (PSD): — Mas também estão a destruir a confiança dos investidores, quando
querem reverter as reprivatizações e as concessões. Primeiro — pasme-se! —, andaram a ameaçar
investidores, quando ainda nem estavam no Governo. Agora, querem rasgar contratos, contratos esses que
existem porque a vossa palavra, a vossa assinatura, a do Partido Socialista, foi colocada, em nome do Estado
português, dizendo que estas privatizações tinham de se fazer.
Sr. Ministro, também por falar em confiança e em palavra que inspira confiança, como é que ficam os
investidores tendo sabido que o Sr. Ministro deixou cair a sua medida, supostamente, para estimular a
tesouraria das empresas com a redução da TSU?
Sr. Ministro, nem sequer essa medida, entre tantas outras, o senhor conseguiu manter? Também para os
investidores, palavra dada, afinal, é palavra rasgada.
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, já ultrapassou o dobro do tempo de que dispunha. De qualquer forma,
como está a descontar no tempo da sua bancada, há essa flexibilidade.
Faça favor de continuar.
O Sr. António Leitão Amaro (PSD): — Vou terminar, Sr. Presidente.
Sr. Ministro, o vosso Programa merece rejeição porque tem uma dupla receita para o desastre. E de duas,
uma: ou o Sr. Ministro sabe e esconde, tal como escondeu do Programa do Governo as previsões do PIB e do
emprego, que dele não constam e são essenciais para avaliar o seu Programa do Governo depois das
medidas alteradas pelo acordo das esquerdas,…
O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — É verdade!
O Sr. António Leitão Amaro (PSD): — … ou, então, o Sr. Ministro sabe e até queria dizer mas, como em
tantas outras convicções suas, é simplesmente um Ministro derrotado.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
O Sr. Presidente: — A flexibilidade da Mesa, no que diz respeito a estas intervenções que são
compensadas no tempo dos próprios partidos, é, depois, também compensada por uma grande inflexibilidade
e rigidez quando se passa o tempo dos respetivos partidos, como sabem.
Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Cecília Meireles.
A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, gostava de cumprimentá-lo nesta sua
primeira intervenção.
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Começaria por dizer-lhe que há uma frase — e é uma frase sua — que, creio, vai marcar todo o seu
mandato. Disse o Sr. Ministro que a saída limpa de Portugal foi um resultado pequeno. Sr. Ministro, pode
parecer-lhe pequeno, mas olhe que pequeno não pareceu de certeza a muitos milhões de portugueses que
conseguiram, com o seu esforço e com os seus sacrifícios, ao longo destes anos, sair da situação a que
tínhamos chegado.
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
E mais lhe direi: pode a dimensão da saída limpa não lhe parecer grande, e nisso reconheço-lhe razão,
porque de certeza é um resultado muito mais pequeno do que a dimensão e a magnitude do resultado da
bancarrota que o Governo de que o senhor é herdeiro deixou a Portugal.
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
Essa, de facto, é uma desgraça de um tamanho e de uma dimensão com que, felizmente, nunca ninguém
aqui conseguiu competir. Mas, felizmente para Portugal, não só não competimos como lhe desejo que, no seu
mandato, nunca tenha ocasião de competir e de conseguir um resultado de tão grande dimensão, porque ele
seria uma péssima notícia não apenas para si mas, sobretudo, para todos nós e para o País.
Em segundo lugar, quero colocar-lhe questões muito, muito concretas, sobre um tema — sendo a sua
primeira intervenção nesta Câmara — que sei que lhe é caro, o cenário macroeconómico, que foi uma enorme
bandeira eleitoral do Partido Socialista. Já ouvimos o Sr. Primeiro-Ministro classificar aquelas que são as
opções económicas ou financeiras — umas ou outras, ou ambas — do PSD e do CDS como «magia» e
«coisas de laboratório» e sabemos bem que este vosso cenário macroeconómico não é nada disso, é uma
coisa rigorosa, exigente e altamente científica.
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Não parece!
A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Portanto, desse ponto de vista, queremos chegar até ao fim e
perceber tudo, tudo, tudo o que ele implica.
Ora, há duas questões que ficaram fora deste Programa do Governo e gostava de saber o que me diz o Sr.
Ministro em relação a isso, porque esse cenário foi sempre bastante pormenorizado e houve até a publicação
de um documento, de um estudo financeiro, aliás, muito útil, e acho que este esforço é para continuar.
Portanto, gostava de lhe fazer duas perguntinhas muito concretas. A primeira é qual é a previsão para o
emprego, para 2016, que está inscrita no cenário do Programa do Governo.
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — É que os senhores previam um aumento no emprego de 299 000
postos de trabalho, 207 000 dos quais tinham a ver com as medidas. Aliás, o Sr. Primeiro-Ministro até dizia
«eu não prometo isto, prometo é estas medidas». Mas, agora, veja bem: as medidas mudaram, várias das que
estavam previstas, designadamente a redução da contribuição patronal para a segurança social, a vulgo TSU
do empregador, e o procedimento conciliatório, estavam-no num capítulo intitulado «Promover o emprego,
combater a precariedade», e tinham esse efeito. Portanto, gostava de saber se continua a prever o mesmo
número de aumento de postos de trabalho, se houve uma diminuição ou se houve um aumento. O que é que
aconteceu?
Em segundo lugar, do ponto de vista do PIB e do crescimento do PIB para 2016, aquilo que estava previsto
era também um crescimento de 2,4. Ora, gostaria de saber, com todas estas alterações, porque isso é omisso
no Programa do Governo, se continua a manter-se essa previsão, se ela aumentou ou se ela diminuiu.
É que, repare, o vosso modelo assenta, e muito, no chamado «choque de rendimentos». E há muitas
medidas que estão em curso, designadamente as respeitantes, por exemplo, aos rendimentos dos
funcionários públicos, mas não só, que têm impacto nisso. Ora, gostaria de saber se prevê um aumento do
aumento, ou não.
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Por último, porque nesta matéria também há uma leve diferença, quero fazer-lhe uma pergunta. Há várias
revisões do cenário, mas a verdade é que, neste cenário final, aumentam as despesas com pessoal mais ou
menos na mesma medida em que diminuem as despesas do investimento. E sei que há várias revisões: umas
têm a ver com a revisão do cenário inicial e outras têm a ver com as medidas. Mas como, agora, há várias
medidas que têm precisamente a ver com isto, com o aumento das despesas com pessoal, gostava de saber
se elas vão ou não ser compensadas com uma diminuição do investimento correspondente.
Por último, já que necessariamente a sua resposta aqui será finita, porque há medidas que, por assim
dizer, ainda estão em curso, gostaria de saber se é possível dizer-nos a que acordo vão chegar com os vossos
parceiros, o PCP, o BE e Os Verdes, em relação à sobretaxa e às remunerações dos funcionários públicos, e,
já agora, que efeito é que elas irão ter no tal cenário, que é um exercício muitíssimo exigente e rigoroso e que
certamente terá tudo isto amplamente previsto.
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
O Sr. Presidente: — Para responder aos três Srs. Deputados que acabaram de pedir esclarecimentos, tem
a palavra o Sr. Ministro das Finanças.
O Sr. Ministro das Finanças: — Sr. Presidente, Srs. Deputados, começo por responder à Sr.ª Deputada
Mariana Mortágua, referindo-me ao sistema financeiro, da seguinte forma: todas as questões que têm a ver
com o sistema financeiro são questões absolutamente centrais para a vida da economia e da sociedade
portuguesa. E, desse ponto de vista, elas devem ser tratadas — e aí estou completamente de acordo com a
Sr.ª Deputada — da forma mais transparente possível.
O processo em curso, quer com o Banif quer com o Novo Banco, está, neste momento, em discussão com
a Comissão Europeia e com o Banco Central Europeu. Existem funções específicas para o Fundo de
Resolução e para o Banco de Portugal, no contexto desses processos, e o Ministério das Finanças participa e
é consultado nestes processos. Mas, na verdade, as responsabilidades que cabem a Portugal para resolver
cada uma destas questões têm a ver e estão nas mãos destas instituições.
Vozes do PSD e do CDS-PP: — Ah!
O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — Que desilusão!…
O Sr. Ministro das Finanças: — O Governo e o Ministério das Finanças cumprirão o seu dever nesta
dimensão, zelando pela estabilidade do sistema financeiro e protegendo os contribuintes portugueses dos
custos associados à resolução destes problemas.
Protestos do PSD e do CDS-PP.
É exatamente porque este é um problema sério que a questão da saída limpa deveria ser tratada com
muito mais cautela pela bancada à minha direita.
Aplausos do PS.
É precisamente porque Portugal enfrenta dificuldades sérias na recuperação económica e na resolução dos
problemas do setor financeiro que eles devem ser tratados com muita seriedade e não com o ruído que acabei
de ouvir.
Aplausos do PS.
Protestos do PSD e do CDS-PP.
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Gostaria de lhe dizer, Sr.ª Deputada, que a posição do Governo em relação a estes assuntos é uma
posição de proteção sem limites daquilo que é o interesse dos contribuintes e do Estado português neste
processo. Incluindo também as estranhas palavras que o Dr. Sérgio Monteiro proferiu recentemente sobre
política geral e venda do Novo Banco, que nos pareceram totalmente despropositadas e, obviamente, não são
do agrado do Governo português.
O Sr. Deputado Leitão Amaro entrou em círculo, porque partiu de um suposto modelo de crescimento pelo
consumo e chegou a 2015 num modelo em que o crescimento da economia portuguesa se faz pelo consumo e
pelo endividamento. É que o problema do endividamento está precisamente em consumirmos sem criarmos
rendimento — e esse é o problema da economia portuguesa, neste momento.
Aplausos do PS.
Sr. Deputado, a população ativa caiu, no terceiro trimestre de 2015, 1%. Saíram da força de trabalho, em
Portugal, mais 50 000 portugueses.
O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — E quantos foram para a reforma?!
O Sr. Ministro das Finanças: — Este é um processo que tem de ser parado. É para isso que o Governo
propõe um conjunto bastante alargado de medidas, que, ao contrário do que diz, não são um choque ao
consumo, são um estímulo à criação de riqueza, em Portugal.
Protestos do PSD e do CDS-PP.
Rasgar a assinatura, como refere, do acordo sobre o IRC foi o que os senhores fizeram menos de seis
meses depois, ao não ter cumprido esse acordo nas dimensões do IVA e do IRS.
Aplausos do PS.
O Programa do Governo é um Programa bastante equilibrado, do ponto de vista dos estímulos que dá à
economia, porque é um Programa reformista onde a economia e a sociedade portuguesa necessitam de
reformas, como é o caso da Administração Pública, que foi tão maltratada ao longo destes quatro anos, e
como é o caso das empresas e do financiamento às empresas.
Sr.ª Dr.ª Cecília Meireles…
O Sr. Presidente: — Sr.ª Deputada, Sr. Ministro.
O Sr. Ministro das Finanças: — Peço muita desculpa, Sr.ª Deputada Cecília Meireles.
O Sr. Presidente: — O Sr. Professor está desculpado, Sr. Ministro.
O Sr. Ministro das Finanças: — Muito obrigado, Sr. Presidente.
Sr.ª Deputada Cecília Meireles, o que referi na minha intervenção foi a desproporção entre os sacrifícios e
os resultados. Foram muitos sacrifícios, Sr.ª Deputada, para tão poucos resultados.
Vozes do CDS-PP: — Eh!
O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — Tão poucos?!…
O Sr. Ministro das Finanças: — Sr.ª Deputada, deixe-me dizer-lhe que não estou a apresentar o
Orçamento do Estado. As perguntas que me colocou são perguntas típicas de uma discussão de Orçamento
do Estado e não necessariamente do Programa do Governo, mas vou responder-lhe.
Pensei que as 29 perguntas tinham exaurido a vossa curiosidade pelo exercício que executámos,…
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A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Não porque ainda não havia o acordo.
O Sr. Ministro das Finanças: — … que apresentámos com muita transparência, que foi, de facto, muito
pouco discutido pelos Srs. Deputados nos últimos meses e em relação ao qual agora ganharam interesse.
Respondo-lhe dizendo que cita o procedimento conciliatório mas ele não estava simulado no nosso
exercício, o seu impacto não estava simulado no nosso exercício.
Protestos do CDS-PP.
Só estou a fazer o enquadramento da questão.
Também não é verdade que haja uma revisão do investimento, como refere, ou das despesas com
pessoal. Não é verdade que na comparação entre os exercícios do impacto do Programa do Governo com o
programa eleitoral do Partido Socialista isso aconteça. Portanto, devemos estar a olhar para documentos
diferentes.
Aquilo que lhe posso garantir nesta fase é que os impactos na atividade económica do conjunto de
medidas que são apresentadas no Programa do Governo são exatamente iguais aos impactos que constavam
do programa eleitoral do Partido Socialista, os quais, serão seguramente debatidos nesta Casa, em sede de
discussão orçamental.
Aplausos do PS.
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — O Ministro das Finanças não tem um número?!
O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Sai a TSU e o crescimento é o mesmo?!
O Sr. Presidente: — Há mais um grupo de três Srs. Deputados que se inscreveram para pedir
esclarecimentos.
Assim, tem a palavra, em primeiro lugar, o Sr. Deputado Paulo Sá.
O Sr. Paulo Sá (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro das Finanças, o anterior Governo do PSD/CDS impôs
uma política fiscal de escandaloso favorecimento dos grupos económicos e financeiros ao mesmo tempo que
onerava de forma brutal os rendimentos do trabalho.
Para poder reduzir a taxa do IRC durante seis anos consecutivos e aprofundar os múltiplos e generosos
benefícios fiscais ao grande capital, o anterior Governo PSD/CDS não hesitou em esmagar os trabalhadores,
os pensionistas, as famílias, os micro e pequenos empresários, com uma insuportável carga fiscal.
A partir de 2013, o PSD e o CDS impuseram um brutal aumento do IRS, cobrando, em apenas três anos,
11 000 milhões de euros adicionais, e foram os contribuintes com rendimentos mais baixos que sofreram um
maior esbulho.
De acordo com dados publicados há dias pela Autoridade Tributária e Aduaneira, para os contribuintes com
rendimentos mensais até 714 € o IRS liquidado aumentou 209%, em 2013. Noutro extremo do espectro, para
os contribuintes com rendimentos superiores a 250 000 € anuais o IRS liquidado diminuiu 9%. Estes números,
Sr. Ministro das Finanças, falam por si. São bem reveladores da iniquidade da política fiscal do anterior
Governo PSD/CDS, que acentuou a injustiça na distribuição da riqueza nacional.
Mas também as micro e pequenas empresas foram duramente castigadas pela política fiscal do anterior
Governo PSD/CDS, designadamente por via da manutenção do pagamento especial por conta, do atraso na
introdução e insuficiência do regime de IVA de caixa e da insistência em manter o IVA da restauração em
23%.
O PCP defende uma política fiscal mais justa e adequada que, articulada com a dimensão orçamental,
assegure o investimento e sustente o financiamento das funções sociais do Estado. Uma política fiscal que,
rompendo com o favorecimento da banca e dos grupos económicos, desonere os trabalhadores e as famílias,
assim como as micro e pequenas empresas, reduzindo os impostos sobre o trabalho, aumentando os escalões
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do IRS e melhorando a sua progressividade, introduzindo uma cláusula de salvaguarda no IMI ou ainda
reduzindo o IVA da restauração e alargando os estímulos fiscais às pequenas e médias empresas.
Sr. Ministro, estas são dimensões da política fiscal que devem ser consideradas neste debate, pois
respondem às necessidades dos trabalhadores e do povo, assim como às necessidades de desenvolvimento
do País.
Por isso, gostaríamos de colocar a questão de saber como irá o Governo corresponder aos anseios dos
portugueses em matéria de política fiscal.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para pedir esclarecimentos, a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr. Presidente, Sr. Ministro das Finanças, a política de
empobrecimento ou fabrico de empobrecimento que o anterior Governo praticou, assentava sobretudo em dois
pilares, naquilo que toca fundamentalmente à generalidade das pessoas em Portugal: o corte de rendimentos
e aquilo que foi classificado como o enorme aumento de impostos, pela boca do então Sr. Ministro das
Finanças.
Portanto, isto é extraordinariamente significativo: aumento de impostos sobretudo do trabalho e os
impostos indiretos que recaíam sobre o consumo, quantas vezes dificultado às famílias portuguesas.
E, Sr. Ministro das Finanças, é daqui que decorre aquilo que Os Verdes sempre classificaram também
como um erro crasso, acrescendo a esta lógica do aumento de impostos, que foi o aumento do IVA da
restauração para a taxa máxima. E aqui a insensibilidade foi tão grande que o erro foi percecionado mas
nunca corrigido, pois deste aumento do IVA na restauração decorreram inúmeros despedimentos resultantes
de um encerramento bastante alargado de estabelecimentos justamente da área da restauração.
Portanto, corrigir, a curtíssimo prazo, este erro é fundamental. E, de resto, Os Verdes orgulham-se também
de ter acordado, em primeira mão, no âmbito das conversações que fizeram, esta correção no sentido de
reduzirmos o IVA da restauração para os 13%.
Depois havia outra coisa que fazia grande confusão à generalidade dos portugueses, que se prendia com o
facto de, no momento em que o Governo anterior começava a clamar vitória e que uma enormíssima alavanca
de repente se verificava no País a partir de 2013 — e já percebemos agora que resultados é que teve,
estagnação da economia —, estava na altura de começar a fazer algumas devoluções, mas nada para
pessoas e muito para os grandes grupos económicos e financeiros.
Centraram-se na redução do IRC de uma forma progressiva, como agora prometiam para esta Legislatura,
mas de uma maneira absolutamente significativa, e as micro, pequenas e médias empresas nada lucrariam
com isto mas, sim, as grande empresas — esse era o cerne da questão. Contudo, recusavam-se mexer no
IRS, na questão do aumento dos escalões do IRS, que era fundamental para assegurar a progressividade que
retiraram quando diminuíram esses escalões.
Por outro lado, criaram uma fiscalidade ambiental que, como sabemos, pode ser feita fundamentalmente de
duas formas: através do incentivo aos bons comportamentos ambientais ou através de uma penalização.
A fiscalidade ambiental seguida pelo anterior Governo foi praticamente toda centrada na penalização.
Porquê? Porque o Governo queria sacar, através da fiscalidade ambiental, 150 milhões de euros. Mas veja
bem, Sr. Ministro, que esses 150 milhões de euros já não eram necessários quando o Governo anterior
entendia devolver a contribuição do setor energético.
Portanto, eram tudo contradições que tinham como objetivo central esquecer as pessoas — porque essa foi
a política praticada — mas salvaguardar sempre os interesses dos grandes grupos económicos e financeiros.
É por isso, Sr. Ministro, que agora podem e devem ser dados passos significativos no sentido da criação de
uma maior justiça fiscal em Portugal. E o nosso acordo contempla algumas dessas medidas, designadamente
o estímulo fiscal às micro, pequenas e médias empresas e também à sua instalação no interior,
designadamente utilizando estímulos fiscais para o combater às assimetrias regionais, o IVA da restauração,
de que já falei, sendo também fundamental a devolução certa da sobretaxa do IRS e o aumento dos escalões
do IRS, no sentido de garantir uma maior progressividade.
Aplausos do PCP.
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O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Morgado.
O Sr. Miguel Morgado (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Ministro, quero transmitir os meus
cumprimentos pela sua estreia no Parlamento, mas, infelizmente, tenho de acrescentar imediatamente que
não vamos começar bem porque o Sr. Ministro não começou nada bem.
A sua estreia no Parlamento vai ficar inevitavelmente marcada por um momento de suprema infelicidade,
pois utilizou as expressões (de que tomei nota) como «caíram as máscaras» e «propaganda», a propósito da
saída limpa do Programa de Assistência. É de assinalar que o disse no meio daquilo que não passou de um
recital de propaganda.
Mas, enfim, passando por cima disso, admito que a partir do conforto de um gabinete do Banco de
Portugal, a saída limpa seja uma coisa de somenos importância, mas para os milhões de portugueses que
foram adversamente afetados pela bancarrota socialista, apostaria muito consigo que fez muita diferença!
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Protestos da Deputada do PCP Rita Rato.
Até lhe digo mais: revela uma imensa e inexplicável falta de consideração pelo povo grego,…
Protestos da Deputada do BE Mariana Mortágua.
… que, infelizmente — por razões que até podemos discutir —, não pôde ter como nós e os irlandeses uma
saída limpa e já vai no terceiro resgate. É uma falta de consideração para com os sacrifícios não só dos
portugueses mas do povo grego e devia estar mais sensibilizado para isso, já que agora pertence a um
Governo com tanta simpatia pelo Governo do Syriza.
Protestos do BE.
Deixe-me dizer-lhe ainda o seguinte: disse que «caíram as máscaras». Nem percebi bem a referência à
queda das máscaras, mas foi oportuno para o que lhe queria dizer.
Conto-lhe uma história muito breve, que, tenho a certeza, vai reconhecer, que acho que é importante para
percebermos a natureza do Governo e aquilo que nos espera para a frente.
A história é esta: era uma vez uma liderança política socialista que teve o desejo de iniciar um
experimentalismo radical. Teve o desejo de procurar a companhia dos partidos da via revolucionária e teve
ainda o desejo de ajustar contas com os portugueses e repetir a experiência do seu último Governo socialista
que terminou de maneira trágica, na bancarrota, em 2011.
A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Não está a falar para crianças!
O Sr. Miguel Morgado (PSD): — Só que este projeto político tinha um pequeno problema: a liderança
socialista desta história sabia muito bem, como todos os portugueses sabem, que este projeto é
tremendamente impopular e os portugueses não se reveem nisto.
Então, foi preciso passar para um jogo de aparências, que envolveu muita coisa. Uma delas foi procurar
figuras de cartaz. Foi por isso que o foram buscar a si.
Protestos do PS e do BE.
Foram buscá-lo a si para dar um rosto a este projeto político — repare que isto é um elogio a si! — porque
viram em si, na sua reputação, na sua credibilidade, um homem moderado, um homem que não se revia em
projetos radicais na política e até, quem sabe, estariam dispostos a tolerar o seu liberalismo.
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Protestos do PS e do BE.
Agora, a eficácia deste jogo de aparências tem um pressuposto, um pressuposto muito simples, se não,
não é eficaz: o de que a sua credibilidade se mantenha. Ora, a sua credibilidade só se pode manter dadas
duas condições: uma, a dos contributos que o Dr. Mário Centeno, técnico do Banco de Portugal, Professor na
Universidade de Economia, traga para este projeto político; a segunda é a de que as pessoas possam confiar
em si como Ministro das Finanças.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Isto vai ser assim até ao final da Legislatura?!
O Sr. Miguel Morgado (PSD): — Repare, quanto ao primeiro caso, o que vemos hoje, ao ler o Programa
do Governo, é que não resta nada dos seus contributos próprios.
Lembramos como é que o senhor apareceu, ao lado do atual Primeiro-Ministro, a fazer campanha pelo
País. Ou era o procedimento conciliário ou eram aquelas mexidas na TSU, que às tantas eram nas empresas,
depois eram nos trabalhadores, depois voltava tudo para trás e depois voltava tudo para a frente… Disso não
sobra nada!
Mas, lendo o Programa do Governo, encontramos coisas mais interessantes e para as quais nem sequer
precisamos de esperar uma resposta sua agora, porque, em 2013 — não foi em 2003 nem em 1993, foi há
dois anos —, já se encarregou de nos ter dado as respostas para coisas que encontramos hoje explicitas no
atual Programa do Governo, que são interessantes e que acho que minam radicalmente a sua credibilidade.
O Programa do Governo inclui o quê? Inclui aumentos do salário mínimo. Repare, não me vou pronunciar
sobre a bondade ou a maldade destas medidas,…
Protestos do PCP e do BE.
… porque a coligação PSD/CDS, no anterior Governo, aprovou, em concertação social, um aumento do
salário mínimo que os senhores, socialistas, tinham deixado congelado. Por isso, não recebemos lições de
ninguém para atualizar o salário mínimo.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Portanto, repito, não me vou pronunciar sobre a bondade da medida.
Mas, segundo o Programa do Governo, vai haver um aumento de 20%, um aumento clarissimamente
acima do crescimento da produtividade. O que é que disse o Dr. Mário Centeno, em 2013, sobre os aumentos
do salário mínimo? Disse que o aumento do salário mínimo causa desemprego…
Vozes do PSD e do CDS-PP: — Oh…!
O Sr. Miguel Morgado (PSD): — … se este aumento estiver acima da produtividade do trabalhador.
O que acabei de referir está escrito na página 54 do livrinho que foi publicado pelo Sr. Ministro.
Mas o Sr. Ministro disse mais sobre o aumento do salário mínimo: «Há um efeito negativo dos aumentos do
salário mínimo na variação salarial dos trabalhadores que têm salários imediatamente acima», isto é, os
trabalhadores com os salários mais baixos.
Protestos do PS.
O Sr. Ministro também disse o seguinte: «Depois daqueles que perdem o emprego em consequência do
aumento do salário mínimo…» — portanto, o aumento do salário mínimo causa desemprego, provoca
desemprego — «… os mais prejudicados pelo aumento do salário mínimo são os trabalhadores de baixos
salários», como se pode ler na página 55 do mesmo livro.
Dou apenas mais um exemplo para não ser muito exaustivo nem maçar ninguém. Sei que estou a gastar
muito tempo, por isso dou só mais um exemplo que acho que vale a pena.
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No Programa do Governo também encontrámos, de uma maneira enfática, a promoção da negociação
coletiva, o recurso mais intenso às portarias de extensão, no fundo, à centralização do processo de
determinação dos salários. Ora, o que é que propôs o Dr. Mário Centeno antes de ser Ministro das Finanças?
Propôs um sistema de determinação salarial atomizado, ou seja, o contrário da centralização. Diz assim, na
página 97 do seu livro: «Vamos pensar em alterar o quadro em que se estabelecem as relações laborais em
Portugal. Empresários e trabalhadores têm de compreender que o alargamento das possibilidades de
negociação direta é benéfico para ambos. Esta atomização do paradigma negocial tornaria a determinação
salarial um fenómeno essencialmente interno à empresa e, como tal, mais próximo da sua realidade
económica».
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Protestos do BE e do PCP.
O Sr. Ministro das Finanças saberá responder, certamente, a estas contradições, embora eu ache que isto
não vai ajudar à sua credibilidade.
Termino com uma breve nota: recentemente, soubemos que a Sr.ª Deputada Catarina Martins preferia um
cirurgião risonho, que soubesse dar uma gargalhada, a um cirurgião competente.
O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — É verdade!
O Sr. Miguel Morgado (PSD): — Agora, ficámos a saber que a Sr.ª Deputada Catarina Martins prefere
também, presumo eu, um Ministro das Finanças marxista na versão Groucho, porque foi Groucho Marx que
disse «estes são os meus princípios, mas, se não gostam, tenho outros».
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Protestos do BE e do PCP.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro das Finanças.
O Sr. Ministro das Finanças: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Paulo Sá, disse, e bem, que há uma enorme
preocupação deste Governo, e que está vertida no Programa do Governo, por uma política fiscal que seja
amiga do rendimento dos portugueses e que seja promotora da recuperação desse mesmo nível de
rendimento — é isso que o Programa do Governo faz quando aborda as questões da sobretaxa, quando
aborda as questões do IVA, quando aborda as questões, por exemplo, do complemento salarial anual.
O complemento salarial anual — e respondo também à Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia — é precisamente
uma das primeiras preocupações do Programa do Governo e constitui, só em si, um alargamento dos escalões
do IRS. Na verdade, o que o complemento salarial anual faz é criar um escalão de IRS no formato de um
imposto negativo, ou seja, de um crédito fiscal, para os trabalhadores com menores rendimentos, que em
Portugal são particularmente sacrificados no mercado de trabalho, porque a esse menor rendimento está
também associada, habitualmente, uma muito maior rotação de emprego e, portanto, períodos de emprego
muito curtos e muitos períodos sem emprego.
Esta medida, que é central no Programa do Governo, será implementada no contexto das restrições
orçamentais assumidas pelo Governo e na interação que elas têm com o próprio crescimento económico.
Portanto, o Governo levará muito sério esta direção na sua política e a política fiscal, em particular das
famílias, será extraordinariamente ativa.
Dirijo-me agora ao Deputado Miguel Morgado, para não entrarmos numa discussão demasiado técnica
sobre economia do trabalho,…
Risos do PSD e do CDS-PP.
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… um tema que terei todo o prazer em discutir consigo, para lhe dizer que eu poderia falar de liberalismo a
alguns dos seus colegas de bancada que tiveram verdadeiras epifanias ao longo dos últimos quatro anos
sobre esse tema.
O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — Mas assumem-nas!
O Sr. Ministro das Finanças: — Poderia falar disso! Poderia também pedir-lhe que lesse as linhas de
antes e depois do que citou.
Vozes do PSD e do CDS-PP: — Ah!…
O Sr. Ministro das Finanças: — Não me vou despir da minha condição de Ministro, mas há uma coisa que
aconselho: não tente, Sr. Deputado Miguel Morgado, transpor conclusões de artigos científicos para a
legislação nacional.
Aplausos do PS.
Se tentar fazer isso — e também não vou abusar da minha condição académica —, garanto-lhe que é um
passo para o desastre.
O Sr. Miguel Morgado (PSD): — Eu também não vou abusar da minha!
O Sr. Ministro das Finanças: — Sr. Deputado, também lhe digo que a minha honestidade e a minha
seriedade, bem como as do Governo, serão julgadas tendo em conta a transparência com que a governação
se executar e a transparência que essa ação tiver nas discussões que aqui fizermos.
Numa outra resposta, já referi que houve uma desproporção entre o esforço pedido aos portugueses e os
resultados obtidos.
O Sr. Miguel Morgado (PSD): — Não foi isso que disse, Sr. Ministro das Finanças!
O Sr. Ministro das Finanças: — Houve uma enorme desproporção entre as consequências que a saída
limpa, a qual, obviamente, todos saudamos, teve para a economia e para a sociedade portuguesa e entre a
propaganda e o que ela efetivamente significou.
Essa desproporção trouxe-nos um crescimento anémico, como eu classifiquei, no terceiro trimestre, em
cadeia. Face ao segundo trimestre, a economia portuguesa cresceu zero e as taxas de emprego e de
desemprego, somadas, caíram. Hoje, há menos portugueses no mercado de trabalho.
É essa a leitura que fazemos, é essa a economia com que temos de nos preocupar e são essas as
medidas que o Governo se propõe aplicar, as quais, estamos convencidos, vão trazer recuperação económica
e de rendimentos sem colocar em causa nenhum dos equilíbrios fundamentais macroeconómicos na economia
portuguesa.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Segue-se mais uma série de três pedidos de esclarecimento ao Sr. Ministro das
Finanças.
Em primeiro lugar, tem a palavra o Sr. Deputado Paulino Ascenção, do Bloco de Esquerda.
O Sr. Paulino Ascenção (BE): — Sr. Presidente, Sr. Ministro das Finanças, felicito o Governo, em primeiro
lugar, pela inclusão, no seu Programa, de medidas em prol de maior justiça e equidade fiscais e do respeito
pelos contribuintes, que tão mal tratados foram pelo anterior Governo, contribuintes em nome individual,
pequenas e médias empresas. A exceção foram mesmo os contribuintes VIP, que tiveram passadeiras
vermelhas.
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Essas medidas, em relação às quais quero felicitar-vos, e que resultaram do acordo feito entre o Partido
Socialista e o Bloco de Esquerda, são as seguintes: o aumento da progressividade no IRS; a eliminação do
quociente familiar e a sua substituição por uma dedução fixa, obedecendo ao princípio «um filho de um pobre
vale perante o fisco o mesmo que o filho de um rico»; a salvaguarda da casa de família perante eventuais
penhoras e execuções fiscais; a revisão dos valores absurdos das coimas por incumprimento de obrigações
fiscais, a maior parte delas quando não está em causa a falta de entrega do imposto mas tão-só o atraso no
cumprimento de obrigações declarativas; a redução do IVA na restauração.
Ora, enquanto o anterior Governo avançava com o famoso enorme aumento de impostos para quem
trabalha, concedeu, ao mesmo tempo, uma enorme redução de impostos para as grandes empresas e para o
setor financeiro. Esta foi a maior borla fiscal da democracia que aconteceu ao mesmo tempo em que os
trabalhadores portugueses eram esmifrados nos seus salários e nas pensões.
Vozes do BE: — Muito bem!
O Sr. Paulino Ascenção (BE): — Quero também destacar duas medidas relativas à reforma do IRC: o
alargamento da isenção em sede de IRC — a chamada participation exemption — para participações sociais,
que passou de 5% para 10%, e o alargamento do prazo de reporte de prejuízos fiscais, que passou para 12
anos e que permitiria à banca só pagar impostos a partir do ano de 2020 e que teria até essa data para
amortizar os prejuízos do ano de 2008.
Como o anterior Governo sempre se recusou a quantificar um montante da perda fiscal que estas duas
medidas acarretaram, pergunto ao Sr. Ministro se já tem condições para nos dar essa informação e também
pergunto se realmente encontrou os cofres cheios, conforme garantiu o anterior Governo, ou a chamada
«almofada financeira», nas palavras do Presidente da República, almofada essa que tanto o reconfortava.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Filipe Lobo d'Ávila.
O Sr. Filipe Lobo d'Ávila (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro Mário Centeno, os Deputados não
fazem perguntas por mera curiosidade, fazem perguntas por dever de escrutínio.
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Sr. Filipe Lobo d'Ávila (CDS-PP): — Não queria deixar de lhe dar conta disto à primeira oportunidade,
pois mais vale, logo à partida, saber ao que vimos.
Tenho duas perguntas para fazer ao ex-técnico Mário Centeno, que vão direitinhas a uma folha de Excel
feita por si, que são da sua autoria e de mais ninguém. Aliás, é uma folha de Excel em relação à qual julgo que
tem conhecimento.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Parece uma prova de doutoramento!
O Sr. Filipe Lobo d'Ávila (CDS-PP): — O Sr. Ministro disse que vai cortar 1020 milhões de euros em
prestações não contributivas. Tenho a obrigação de lhe perguntar o seguinte: a quem vai cortar e a partir de
que valores?
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
Protestos da Deputada do PCP Rita Rato.
Onde é que vai cortar, Sr. Ministro? É nas pensões mínimas? É no complemento solidário para idosos? É
no abono de família? É onde, Sr. Ministro? Não nos dê respostas redondas. A pergunta está no ar desde que
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a jornalista Graça Franco a fez. Pode dizer que não responde, pode até dizer que não sabe, mas não nos trate
como tolos ou como parvos, dizendo que vai cortar gastando mais.
Aplausos do CDS-PP.
Sr. Ministro, a segunda pergunta que lhe queria colocar também é uma pergunta focada.
Muito recentemente, o Sr. Ministro disse que queria cortar 228 milhões de euros ao ano na ação social, ou
seja, 900 milhões de euros durante a Legislatura. Os números são tão certinhos que só posso dizer que o Sr.
Ministro, de facto, deve saber o que vai fazer.
Estamos a falar de verbas com misericórdias e com instituições de solidariedade, estamos a falar de
creches para os mais novos, estamos a falar de lares para idosos, estamos a falar de estruturas de apoio para
pessoas com deficiência — há meio milhão de portugueses servidos por estas instituições.
Qual é o critério, na sua máquina de calcular, no seu Excel, que lhe permitiu chegar a este número? Onde
é que vai cortar? É que com números certinhos não pode haver uma resposta redonda, Sr. Ministro.
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Tiago.
O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro das Finanças, nos últimos anos, os trabalhadores
foram sujeitos a sucessivos assaltos aos seus rendimentos, aos seus direitos sociais, culturais e políticos.
Os custos do sistema financeiro em roda livre sobre uma falsa supervisão e regulação caíram sobre as
pessoas. O euro e a União Europeia apenas agravaram o problema.
Os últimos quatro anos de política do Governo PSD/CDS acentuaram esses problemas, acrescentando
crise à vida dos pobres para salvar da crise a vida dos ricos, dos grandes grupos económicos e financeiros e
dos monopólios, que são precisamente a origem dessa crise.
A pretexto da consolidação das contas públicas, os portugueses pagaram, com o seu trabalho e com os
seus direitos, milhares de milhões de euros para a banca privada, em poucos anos 12 000 milhões de euros, e
ainda falta saber como desapareceram os 30 000 milhões de euros de imparidades que a banca privada tinha
registados em 2009, ou melhor, escondidos.
Além das preocupações mais gerais sobre regulação e supervisão, importa, no concreto, compreender que
mecanismos está este Governo disposto a usar para garantir que nenhum trabalhador ou pensionista venha a
ser chamado a pagar prejuízos de aventuras de banqueiros e para que a banca esteja, efetivamente, ao
serviço do povo e não o contrário.
Duas instituições merecem destaque. O Sr. Ministro disse, e estamos de acordo, que a saída limpa foi
forjada. O ministro da propaganda da saída limpa, agora Deputado Paulo Portas, varreu para debaixo do
tapete 6 mil milhões de euros no BES e quanto mais poderá ter varrido para debaixo do tapete para forjar essa
saída limpa, que ainda podem lá estarescondidos e que importa apurar.
Sr. Ministro, mas sobre o BES, atualmente sob controlo público, enquanto um membro do anterior Governo
anda a auferir 30 000 € para concretizar um projeto que é contrário ao interesse nacional, à semelhança do
que se passou com o BPN, importa assegurar que medidas são possíveis tomar para que o Estado não fique
com o prejuízo e, ainda por cima, sem o Banco.
É absolutamente fundamental que o prejuízo — e entenda-se prejuízo no seu sentido mais lato — não
recaia apenas sobre os portugueses, sobre os trabalhadores do Banco, sobre os clientes do Banco e sobre a
estabilidade do sistema financeiro nacional.
Sobre o BANIF, Sr. Ministro, é ainda necessário apurar as dimensões do prejuízo, das eventuais
necessidades de capital do Banco e ainda de que forma será, também, assegurado que nenhum destes custos
vai recair sobre os portugueses. Dos mais de 700 milhões, que retorno se espera e que medidas se podem
esperar para que esses custos não recaiam sobre os portugueses?
Num quadro mais geral ainda, Sr. Ministro, pergunto-lhe que perspetiva tem o Governo quanto às medidas
necessárias para impedir que outros casos de colapso na banca privada surjam no sistema financeiro e para
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garantir o papel do Estado, mais importante na gestão do crédito e da moeda, para que não fiquemos limitados
a reagir às aventuras dos banqueiros, mas a agir para que elas não se realizem.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: — Para responder a estes pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Ministro das
Finanças.
O Sr. Ministro das Finanças: — Sr. Presidente, vou começar por responder ao Sr. Deputado Paulino
Ascenção, referindo-me, precisamente, à última parte da sua pergunta.
Hoje, todos sabemos o que é que são os cofres cheios e o que é que o País pode e deve fazer com esses
cofres cheios. É evidente que estamos a falar de dinheiro que constitui dívida do País e, dessa maneira, os
cofres cheios, na gestão financeira do País, servem para o proteger das suas necessidades de financiamento.
Assim deve ser e assim devem ser usados para judiciosamente fazer essa gestão financeira.
As questões de política fiscal que levantou, com as quais, como sabe, concordamos na generalidade, têm
exatamente essa perspetiva de repor o nível de justiça fiscal, em particular entre rendimentos, ou seja, a
progressividade da fiscalidade em Portugal, na medida do que são as possibilidades orçamentais do País.
Referiu a questão das deduções no IRS em função do número de filhos. E essa é, precisamente, uma
medida com esse teor, em que não aumentando a despesa fiscal com essas deduções, o Governo promoverá
uma melhor justiça e equidade fiscal.
Ao Sr. Deputado Filipe Lobo d’Ávila vou responder, aliás tal como o Sr. Primeiro-Ministro já fez,
longamente, há pouco.
Há uma questão em que vamos ter de nos entender, Sr. Deputado: há uma diferença muito grande entre
despesa agregada e cortes, mas em matéria de cortes não vou conseguir competir convosco, porque de
cortes percebem vocês.
Aplausos e risos do PS e do BE.
Sr. Deputado, honestamente, depois de ouvir a resposta do Sr. Primeiro-Ministro, pensei que já tivesse
compreendido que não é de cortes que se trata, mas, como não percebeu, vou repetir a resposta,
acrescentando algumas notas para poder ter algum valor acrescentado.
O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Isso, isso!
O Sr. Ministro das Finanças: — O Programa do Governo contém aumentos, não cortes: aumento no
rendimento social de inserção, no complemento solidário para idosos, no abono de família, nas pensões — o
Programa do Governo inclui um retomar da lei que determina os aumentos das pensões em Portugal — e no
salário mínimo. Estas são as prestações, estas são as componentes do rendimento dos portugueses com
níveis de rendimento mais baixos que vão ser aumentadas. Não é «cortadas», Sr. Deputado.
Aplausos do PS.
É fácil perceber, Sr. Deputado, que, em consequência de todo este esforço e de todo este aumento do
rendimento dos portugueses mais desfavorecidos, quer no mercado de trabalho, quer na área da política
social, há um conjunto de poupanças — não cortes — nas prestações que hoje existem para fazer face àquilo
que é a situação social difícil provocada pelo aumento do desemprego e que o País, hoje em dia, enfrenta.
A melhoria desses indicadores, Sr. Deputado, gera poupanças, não cortes. É essa a noção que está no
Programa do Governo.
Aplausos do PS e do BE.
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Aliás, é um princípio muito simples em economia o de que cada novo empregado paga impostos e tem
contribuições e, em contrapartida, deixa de receber apoios, seja a nível de subsídio de desemprego, seja a
nível deste apoio social.
Quanto às questões colocadas pelo Sr. Deputado Miguel Tiago, vou reiterar aquilo que já disse há pouco
em relação ao sistema financeiro.
O sistema financeiro é, obviamente, uma das áreas mais sensíveis de qualquer economia e aquilo que
temos de fazer, face às dificuldades do sistema financeiro, deve ser feito no escrupuloso respeito pelos
contribuintes, pela sua proteção e, também, tendo em conta os interesses do Estado face ao setor financeiro.
É assim que o Governo vai abordar, em particular, os dois dossiers do BANIF e do Novo Banco.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Se conseguir dar resposta ao BANIF é a primeira em quatro anos!
O Sr. Ministro das Finanças: — Quanto à questão do trabalho que o Sr. Deputado referiu, dos
trabalhadores e dos pensionistas, é uma preocupação, como acabei de mencionar, muito importante para o
Governo. É por isso que, no Programa do Governo, foi incluída uma proposta que vai ser implementada de
acordo com a qual, por exemplo, a atualização das pensões se passará a fazer dentro do respeito pelo quadro
legal nacional e do respeito pelos legítimos interesses e expectativas dos pensionistas portugueses.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Segue-se o último grupo de pedidos de esclarecimento ao Sr. Ministro das Finanças.
Para o efeito, tem a palavra o Sr. Deputado Duarte Pacheco.
O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as
e Srs. Deputados, Sr.
Ministro das Finanças, ao longo desta tarde, ao ouvi-lo nas suas diversas intervenções, estive a pensar qual o
cognome que seria mais apropriado para si depois de tanta intervenção. E só vejo três: Mário Centeno, o
ilusionista; Mário Centeno, o torturador de números; e Mário Centeno, o fazedor de milagres.
Risos do PSD e do CDS-PP.
Não há outra hipótese, Sr. Ministro, e vou tentar explicar porquê. Porque, por um lado, o Sr. Ministro já aqui
nos disse o seguinte: «Com os acordos com a esquerda temos de aumentar a despesa. Até temos, face
àquele que era o cenário do PS, de antecipar determinados rendimentos às pessoas.» — mais despesa!
E disse também: «Face ao acordo com a esquerda, face àquilo que era o cenário com o PS, até temos que
reduzir impostos e receita fiscal.» Mas, pasme-se, isto é neutro, o défice fica igual, a dívida até baixa! Ó, Sr.
Ministro, alguém acredita nisto? O senhor acredita nisto? Não é possível!
Não há alguém que tenha racionalidade de pensamento que possa acreditar nestas suas palavras, Sr.
Ministro, e por isso era útil que nos esclarecesse a todos. Mas compreendo que o Sr. Ministro não está aqui
para esclarecer nada.
Utilizou a palavra «transparência». Ó, Sr. Ministro, a Sr.ª Deputada Cecília Meireles fez-lhe já esta
pergunta: será que torturou os números e por isso não nos apresenta qual é a projeção do PIB para o próximo
ano? É por isso que mantém o défice e reduz a dívida? Qual é? Não respondeu.
O Sr. Deputado Filipe Lobo d’Ávila perguntou-lhe quais são as prestações não contributivas, Sr. Ministro —
não é o subsídio de desemprego —, repito, as prestações não contributivas em que vai fazer a sua poupança.
Não diz. Não responde.
Que não responda a nós, que somos oposição, ainda vá que não vá — pelo menos, tenho a dizer-lhe que
tratou toda a gente por igual —, mas até os partidos que o apoiam o senhor tratou de igual modo, quer a Sr.ª
Deputada Mariana Mortágua, quer o Sr. Deputado Miguel Tiago. E, por solidariedade democrática, peço-lhe
que, pelo menos, a eles responda, que explique o que é que vai fazer em termos de recapitalização da banca.
Ou será que também aqui vai ser derrotado e acabar por nacionalizar a banca em Portugal?
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
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O Sr. Presidente: — Tem a palavra para um pedido de esclarecimento, a Sr.ª Deputada Joana Mortágua.
A Sr. ª Joana Mortágua (BE): — Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados, Sr. Ministro, existem cerca de 46
000 desempregados a trabalhar sem salário em organismos públicos no âmbito de contratos emprego-
inserção. A enorme redução de funcionários públicos durante o último Governo não se fez porque estes
funcionários eram excedentários. E a prova disso é que essa enorme redução de funcionários só não levou à
rutura de muitos serviços públicos, de escolas, de bibliotecas, de hospitais e de centros de saúde, porque o
Governo da direita resolveu o problema de uma maneira muito simples: pôs os desempregados a trabalhar à
borla para os serviços públicos ao lado de pessoas que estavam a cumprir as mesmas tarefas, com o mesmo
horário de trabalho e sob as mesmas chefias, mas sem contrato e sem salário. Para estes 46 000
desempregados a trabalhar sem receber salário a saída não foi lá muito limpa!
Esta realidade dos contratos emprego-inserção no Estado representa uma perversidade e uma perversão.
É uma perversidade para aqueles e aquelas a quem prometeram um contrato, a quem prometeram emprego e
a quem prometeram inserção, ou, nas palavras do Sr. ex-Ministro Pedro Mota Soares, a quem prometeram
empregabilidade, justiça social e autoestima, mas que, na verdade, puseram a trabalhar de graça, sob a
ameaça de perderem uma prestação à qual já tinham direito e que receberiam de qualquer forma, a trabalhar
sob chantagem e sob a ameaça de perder a prestação, sabendo que, não importa a dedicação que ponham
naquilo que fazem, não importa o quanto aprendam, no final de um ano estão despedidos e vão continuar no
desemprego porque o Estado não vai empregar ninguém.
E esta realidade é tão mais perversa quanto estas pessoas sabem que aquele lugar que estão a ocupar
enquanto desempregados sem salário podiam estar a ocupar enquanto empregados com contrato de trabalho.
Mas é também uma realidade que representa uma perversão dos princípios da Administração Pública e da
responsabilidade e exemplo que o Estado deve dar enquanto empregador.
A precariedade, o abuso e a exploração laborais tornaram-se a cara mais visível da Administração Pública,
e para isso basta frequentar qualquer balcão de atendimento de qualquer serviço público. E, pior do que isso,
as funções sociais do Estado tornaram-se dependentes do abuso laboral.
Portanto, Sr. Ministro, nós não podemos ter uma Administração Pública que se alimenta do abuso daqueles
que deveria proteger, daqueles cuja missão social da Administração Pública é proteger. O Estado não pode
ser o maior promotor da precariedade e da exploração laboral.
Vozes do BE: — Muito bem!
A Sr.ª Joana Mortágua (BE): — O fim deste abuso é, foi e será uma prioridade para o Bloco de Esquerda.
Por isso, insistimos tanto nesta matéria que aparece no acordo feito entre o Partido Socialista e os partidos à
esquerda.
Finalmente, gostaríamos de saber que medidas é que irá tomar o Governo para acabar com este abuso e
com a precariedade no Estado.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente: — Por último, para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Trigo
Pereira.
O Sr. Paulo Trigo Pereira (PS): — Sr. Presidente, Sr. Ministro das Finanças, penso que a maioria de
direita devia ter um pouco mais de humildade a fazer as perguntas…
Vozes do PSD: — A maioria, a maioria!
O Sr. Paulo Trigo Pereira (PS): — A minoria, ex-maioria, de direita devia ter mais humildade a fazer as
perguntas. Aliás, deveríamos relembrar aqui o ano de 2012, em que o então ministro das Finanças Vítor
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Gaspar, adepto de uma teoria da consolidação orçamental expansionista, cortou dois salários, duas pensões e
levou o País à maior recessão nos últimos quatro anos.
Vozes do PS: — Bem lembrado!
Protestos do PSD e do CDS-PP.
O Sr. Paulo Trigo Pereira (PS): — Mas já se esqueceram. Já se esqueceram dessa experiência e,
portanto, deviam dar, pelo menos, o benefício da dúvida ao Sr. Ministro das Finanças,…
Aplausos do PS.
… porque, de facto, os senhores erraram do ponto de vista económico. Deviam reconhecer esses erros e
ter a humildade de o fazer. Erraram!
Agora, acho que era muito importante que o Sr. Ministro das Finanças esclarecesse o ponto de partida. E o
primeiro mito do ponto de partida é a saída limpa, de que já se falou hoje aqui.
Ora bem, a pergunta que queria fazer-lhe é a seguinte: se não fosse a intervenção do Banco Central
Europeu do quantitative easing, Portugal, com o nível de dívida pública, com o rácio de dívida pública que tem
no PIB, hoje, teria ou não um terceiro resgate?
A pergunta é muito simples: se nós tivéssemos juros da dívida pública ao nível daquela que tínhamos há
três anos… Ou seja, de quem foi o mérito? Eu só quero perceber — e acho que todos os portugueses
merecem perceber — de quem foi o mérito da descida das taxas de juro. Foi do Governo ou foi do Banco
Central Europeu?
Aplausos do PS.
O Sr. António Leitão Amaro (PSD): — Quer falar da Grécia?!
O Sr. Paulo Trigo Pereira (PS): — Falem de Espanha e da Irlanda e a gente entende-se.
A segunda pergunta tem a ver com os «cofres cheios». Há um mito sobre «cofres cheios» e há uma conta
muito simples de fazer, que é esta: a dívida pública, a dívida bruta, menos o montante dos «cofres cheios».
A pergunta, muito direta, que faço é esta: se eu retirar à dívida bruta o montante dos «cofres cheios»,
temos mais ou menos dívida pública, em percentagem, do que tínhamos em 2011?
Aplausos do PS.
Protestos do PSD e do CDS-PP.
É que temos de ficar entendidos sobre o significado de «cofres cheios».
Aplausos do PS.
Protestos do PSD e do CDS-PP.
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, parece que querem que a reunião dure mais umas horas. Mas não.
Estamos no último pedido de esclarecimento e, já agora, pedia para todos, calmamente, aguardarmos as
respostas do Sr. Ministro.
Faça favor de continuar, Sr. Deputado.
O Sr. Paulo Trigo Pereira (PS): — A terceira pergunta é sobre o ano de 2015.
Sabemos — e penso que os Deputados da direita reconhecem isso — que o indicador para medir a
consolidação orçamental é o saldo estrutural. A minha pergunta é se, em 2015, espera que haja uma melhoria,
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uma manutenção ou uma deterioração do saldo estrutural. É porque se houver uma manutenção ou uma
deterioração do saldo estrutural, significa que em 2015 não houve nenhuma consolidação orçamental.
Era só isto que queria perguntar.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Para responder a este grupo de três pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr.
Ministro das Finanças.
O Sr. Ministro das Finanças: — Sr. Presidente, o Dr. Duarte Pacheco, aliás, o Sr. Deputado Duarte
Pacheco — peço, mais uma vez, desculpa — elaborou abundantemente, mais uma vez, sobre os exercícios
macroeconómicos que fomos apresentando ao longo dos últimos meses. É verdade que há nesses exercícios
uma característica que vou explicar, e espero que agora seja compreendido como uma verdadeira explicação.
Na transposição do Programa Eleitoral do Partido Socialista para o Programa do Governo, refletindo os
acordos que foram realizados no âmbito do acordo de incidência parlamentar que assinámos, explicámos
detalhadamente em três tabelas todo o impacto das medidas que foram incluídas e que foram retiradas dessas
simulações.
Há, de facto, um conjunto de medidas que foram retiradas dessas simulações, algumas das quais, aliás, os
Srs. Deputados já referiram aqui hoje, que representavam nesse quadro macroeconómico uma redução da
receita e essas medidas já lá não estão, Sr. Deputado. E porque lá não estão não há redução da receita.
Em contrapartida, foram incluídas outras medidas que têm um impacto diferente sobre a receita. A mesma
coisa se passa do lado da despesa.
O conjunto destas medidas, aquelas que retiramos e aquelas que colocamos, têm um impacto que está
explicitado no documento em que o Partido Socialista aprova o Programa do Governo nos seus órgãos
próprios e que gerou uma melhoria do valor do défice em 2016, em 2017 e no resto do horizonte da
Legislatura.
Este é o impacto líquido. Posso indicar-lhe o valor, medida a medida. Posso, por exemplo, dizer-lhe que a
medida da reversão do corte salarial na função pública, quando comparado o exercício do Programa Eleitoral
com o exercício do Programa do Governo, representa um aumento da despesa de, aproximadamente, 50
milhões de euros, em 2016. Acontece que depois, em 2017, o aumento, a variação da receita, é menos 50
milhões de euros, porque eles foram antecipados para 2016.
Em relação à taxa social única e às reduções das taxas contributivas, o efeito líquido destas medidas
nestes dois anos é de, em 2016, aproximadamente, 400 milhões de euros e, em 2017, assume um valor
bastante superior, porque, como se recordará, estas medidas tinham um efeito crescente e progressivo na sua
implementação.
O resultado de todas estas alterações está claramente explicitado, em termos do seu impacto no défice,
nos documentos que acabei de referir.
Sobre a questão das prestações não contributivas, vou apenas referir-lhe que o subsídio social de
desemprego é uma prestação não contributiva, precisamente aquela que afeta os trabalhadores com mais
baixos rendimentos e com níveis de precariedade mais elevados, porque o subsídio social de desemprego é
dirigido a trabalhadores que, pela sua intermitência contributiva, não têm acesso ao subsídio de desemprego.
Não há nenhum corte no subsídio social de desemprego no Programa do Governo. Há um fenómeno que
decorre do mecanismo económico de recuperação económica e de melhoria dos apoios sociais que permite
poupanças. Mas, com isto, eu não estou a dizer que os valores que estão indicados decorrem exclusivamente
do subsídio social de desemprego, estou, sim, a dizer que é uma das formas como isto acontece. Desse ponto
de vista, não é um corte, é uma poupança.
Protestos do PSD.
Em relação à questão que a Sr.ª Deputada Joana Mortágua colocou, permito-me dizer que, sendo essa
uma matéria que afeta também a área da solidariedade e da segurança social, no que tem a ver com a
Administração Pública temos a visão de que os apoios públicos à reinserção e à inserção, particularmente, de
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jovens no mercado de trabalho devem constituir mecanismos de efetiva entrada permanente no mercado de
trabalho.
É para isso que as políticas ativas de emprego devem ser desenhadas e é nesse contexto que a
Administração Pública deve gerir os estágios de que dispõe.
Nós consideramos que a utilização dos estágios para fins meramente estatísticos, como tem sido feito
nestas áreas, gera trajetórias no mercado de trabalho muito instáveis e é por isso que, no âmbito dos acordos
que firmámos, temos a proposta, que vai ser concretizada, da formação de grupos de trabalho para analisar as
questões relacionadas com a precariedade laboral e, seguramente, também com as questões das políticas
ativas de emprego.
Em relação à pergunta que o Sr. Deputado Paulo Trigo me colocou, vou responder-lhe à questão para a
qual tenho, neste momento, uma resposta inequívoca, que é à primeira parte da sua pergunta, dizendo-lhe
que o euro hoje não é o mesmo euro que tínhamos em 2010, não é o mesmo euro que tínhamos em 2011. O
euro é uma instituição económica da maior importância para a construção europeia.
Aplausos do PS.
Risos do PSD e do CDS-PP.
É uma instituição que está em construção de forma bastante acelerada, mas também ainda insuficiente
tendo em conta aquilo que o euro deve promover de apoio às economias europeias.
A verdade é que — e o Sr. Deputado Paulo Trigo explicitou uma das políticas que foram implementadas
recentemente no âmbito do Banco Central Europeu — essa política não era do agrado do anterior Governo. O
anterior Governo, durante muito tempo, recusou a importância dessa política para o sucesso da economia
europeia e, por conseguinte, também da economia portuguesa.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, estamos no final dos nossos trabalhos de hoje.
Penso que hoje trabalhámos bastante bem para amanhã de manhã podermos terminar o período de debate
e deixarmos para a parte da tarde as intervenções finais e a votação da moção de rejeição, que ainda há de
dar entrada na Mesa.
Sr.as
e Srs. Deputados, Sr. Primeiro-Ministro, Sr.as
e Srs. Ministros, Sr.as
e Srs. Funcionários, Sr.as
e Srs.
Jornalistas, muito obrigado a todos.
Está encerrada a sessão.
Eram 20 horas e 55 minutos.
Presenças e faltas dos Deputados à reunião plenária.
A DIVISÃO DE REDAÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL.