O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Página 1

Quinta-feira, 3 de dezembro de 2015 I Série — Número 12

XIII LEGISLATURA 1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2015-2016)

REUNIÃOPLENÁRIADE2DEDEZEMBRODE 2015

Presidente: Ex.mo Sr. Eduardo Luís Barreto Ferro Rodrigues

Secretários: Ex.mos

Srs. Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco Idália Maria Marques Salvador Serrão Moisés Salvador Coelho Ferreira

S U M Á R I O

O Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 10

minutos. Deram entrada na Mesa os projetos de resolução n.

os 19

a 28/XIII (1.ª) e projetos de lei n.os

56 a 58/XIII (1.ª). Após saudar o Presidente e os Deputados, o Primeiro-

Ministro (António Costa) apresentou o Programa do XXI Governo Constitucional, tendo, depois, dado resposta a questões colocadas pelos Deputados Luís Montenegro (PSD), Carlos César (PS), Catarina Martins (BE), Nuno Magalhães (CDS-PP), Jerónimo de Sousa (PCP), Heloísa Apolónia (Os Verdes), André Silva (PAN), Hugo Lopes Soares (PSD) — que também usou da palavra sob a forma de interpelação à Mesa —, João Torres (PS), Pedro Soares (BE), Ana Rita Bessa (CDS-PP), António Filipe (PCP), Adão Silva (PSD), Susana Amador (PS), Moisés Ferreira (BE), Patrícia Fonseca (CDS-PP), Paula Santos (PCP), Sara

Madruga da Costa (PSD), Filipe Neto Brandão (PS), Jorge Falcato Simões (BE), Berta Cabral (PSD) e Inês de Medeiros (PS), tendo ainda os Deputados Nuno Magalhães (CDS-PP), Luís Montenegro (PSD) e Carlos César (PS) usado da palavra em interpelação à Mesa.

No debate que se seguiu, intervieram, a diverso título, além do Ministro das Finanças (Mário Centeno), os Deputados Marco António Costa (PSD), Pedro Delgado Alves e Helena Freitas (PS), Mariana Mortágua (BE), António Leitão Amaro (PSD), Cecília Meireles (CDS-PP), Paulo Sá (PCP), Heloísa Apolónia (Os Verdes), Miguel Morgado (PSD), Paulino Ascenção (BE), Filipe Lobo d’Ávila (CDS-PP), Miguel Tiago (PCP), Duarte Pacheco (PSD), Joana Mortágua (BE) e Paulo Trigo Pereira (PS).

O Presidente encerrou a sessão eram 20 horas e 55 minutos.

Página 2

I SÉRIE — NÚMERO 12

2

O Sr. Presidente: — Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Sr.as

e Srs. Deputados, Sr.as

e Srs.

Jornalistas, Sr.as

e Srs. Funcionários, declaro aberta a sessão.

Eram 15 horas e 10 minutos.

Solicito às autoridades que abram as galerias.

Começo por dar a palavra ao Sr. Secretário para a leitura do expediente.

O Sr. Secretário (Duarte Pacheco): — Sr. Presidente e Srs. Deputados, deram entrada na Mesa, e foram

admitidos, as seguintes iniciativas: os projetos de resolução n.os

19/XIII (1.ª) — Construção urgente da escola

secundária na Quinta do Conde, concelho de Sesimbra, distrito de Setúbal (PCP), que baixa à 8.ª Comissão,

20/XIII (1.ª) — Pela reabertura do Pólo de Saúde de Caldelas da Unidade de Cuidados de Saúde

Personalizados Viver Mais (PCP), que baixa à 9.ª Comissão, 21/XIII (1.ª) — Recomenda ao Governo medidas

sobre praxes académicas (BE), que baixa à 8.ª Comissão, 22/XIII (1.ª) — Urgente construção integral do IC35

(PCP), 23/XIII (1.ª) — Recomenda ao Governo a necessidade de construção de um novo hospital para a

Madeira (PSD), que baixa à 9.ª Comissão, 24/XIII (1.ª) — Pela reposição do direito dos ferroviários às

concessões de transportes (PCP), que baixa à 10.ª Comissão, 25/XIII (1.ª) — Eliminação das portagens na

A23 (PCP), que baixa à 6.ª Comissão, 26/XIII (1.ª) — Recomenda o reconhecimento e o reforço das entidades

da economia social (PSD e CDS-PP), 27/XIII (1.ª) — Pela resolução urgente dos problemas do Hospital de S.

João de Deus e em defesa da melhoria dos cuidados de saúde no concelho de Vila Nova de Famalicão (PCP),

que baixa à 9.ª Comissão, e 28/XIII (1.ª) — Pela reposição do direito dos ferroviários e dos seus familiares às

concessões de transportes (BE), que baixa à 10.ª Comissão; e projetos de lei n.os

56/XIII (1.ª) — Alarga o

acesso às pensões de invalidez e velhice dos trabalhadores da Empresa Nacional de Urânio e consagra o

direito a uma indemnização emergente de doença profissional ou por morte (BE), que baixa à 10.ª Comissão,

57/XIII (1.ª) — Altera o Decreto-lei n.º 152/2014, de 15 de outubro, relativo à Casa do Douro (PCP), que baixa

à 7.ª Comissão, e 58/XIII (1.ª) — Promoção do acesso a produtos da agricultura de produção local às cantinas

públicas (BE), que baixa à 5.ª Comissão.

Em termos de expediente, é tudo, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr. Secretário.

Srs. Deputados, como sabem a ordem do dia de hoje consiste na apreciação do Programa do XXI Governo

Constitucional.

Assim, para fazer a sua apresentação, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro (António Costa): — Sr. Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados, Colegas de Governo:

Começo, em nome do XXI Governo Constitucional, por cumprimentar respeitosamente VV. Ex.as

, ciente que é

perante vós que o Governo responde politicamente e que é através de vós que recebemos a legitimidade

democrática para governar.

Este é um momento central do funcionamento do nosso sistema político.

Diz a Constituição: «A Assembleia da República é a assembleia representativa de todos os cidadãos

portugueses.», que detém a competência exclusiva de apreciar o Programa do Governo e de cuja apreciação

depende o futuro do Governo: a sua demissão ou a investidura na plenitude das suas funções.

Este é, assim, um momento de excecional responsabilidade para o Governo. Por isso, fizemos o que nos

cumpria para garantir a viabilização do Programa do Governo e a estabilidade na sua execução ao longo da

Legislatura.

O conjunto das bancadas parlamentares do Partido Socialista, do Bloco de Esquerda, do Partido

Comunista Português e do Partido Ecologista «Os Verdes», que asseguraram um suporte parlamentar

maioritário ao Governo, provaram que em democracia há sempre alternativas e que não estávamos

condenados a ver prosseguir as políticas que não tinham apoio maioritário nesta Assembleia, porque,

maioritariamente, tinham sido rejeitadas pelos cidadãos que as Sr.as

e Srs. Deputados representam.

Aplausos do PS, do BE, do PCP, de Os Verdes e do PAN.

Página 3

3 DE DEZEMBRO DE 2015

3

É, pois, confiante na solidariedade deste apoio maioritário que o XXI Governo se apresenta nesta

Assembleia. Mas é também com o orgulho de a solução política que o viabiliza ter contribuído para enriquecer

a democracia ao valorizar o pluralismo e diversificar as alternativas, garantindo que a maioria eleitoral que

votou pela mudança de políticas não se frustrava na incapacidade de gerar uma mudança da maioria de

governo.

Mas quero deixar claro que ao derrubar este muro, velho de 40 anos, não quisemos abrir uma nova

trincheira de confrontação que exclua do diálogo democrático as restantes bancadas parlamentares, como

bem prova a inclusão no Programa do Governo de contributos do partido Pessoas-Animais-Natureza, com

quem contamos para aprofundar o debate civilizacional sobre o bem-estar animal.

Aplausos do PS, do BE, do PCP, de Os Verdes e do PAN.

É com esta postura de abertura ao diálogo e ao compromisso que o XXI Governo se relacionará com esta

Assembleia. E é com o mesmo esforço persistente de diálogo e concertação social que nos relacionaremos

com os parceiros sociais e com a sociedade.

A concertação social é, para nós, hoje, como no passado, um espaço decisivo para a afirmação de uma

cidadania plena e para a defesa do moderno estado social.

Aplausos do PS.

Seja no plano da concertação estratégica, seja no plano de acordos sectoriais específicos, o Governo

trabalhará em estreita articulação com a Comissão Permanente de Concertação Social, assim como

dinamizará o diálogo social desbloqueando a contratação coletiva.

O Governo não decidirá sem o contributo indispensável da concertação em todos os domínios em que ela é

relevante, mas também quero deixar claro que nunca se escudará na concertação para deixar de decidir ou

protelar as decisões que se imponham para cumprir o nosso Programa.

Aplausos do PS e do BE.

Sr. Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Como tive ocasião de dizer aquando da minha tomada de posse,

devemos confiar à História a discussão sobre o passado e concentrarmo-nos no que nos é exigido hoje para

construir o futuro.

A informação esta semana divulgada pelo Instituto Nacional de Estatística (INE) marca e define o nosso

ponto de partida: um País empobrecido, em que a atividade económica recuou mais de uma década, para

valores de 2004, onde o emprego recuou cerca de duas décadas, para valores de 1995, e onde o investimento

recuou mais de três décadas. É isto que nos confirmam os números anteontem divulgados, ou seja, a

atividade económica em estagnação, o investimento a abrandar, o emprego sem conseguir a anunciada

recuperação.

Estes dados confirmam o pleno sentido do triplo desígnio do tempo novo que queremos iniciar: mais

crescimento, melhor emprego, maior igualdade!

Aplausos do PS e de Deputados do PCP.

O relançamento do crescimento económico exige a melhoria do rendimento disponível das famílias. Já

estão em apreciação parlamentar iniciativas sobre a reposição integral em 2016 dos vencimentos devidos aos

funcionários públicos e a eliminação progressiva da sobretaxa de IRS, de modo a iniciar o alívio da asfixia

fiscal da classe média.

Hoje mesmo, convoquei para a próxima semana uma reunião da Comissão Permanente de Concertação

Social para, entre outras matérias, apreciar a proposta do Governo do aumento do salário mínimo nacional

para 600 euros mensais ao longo da Legislatura.

Página 4

I SÉRIE — NÚMERO 12

4

Aplausos do PS, do BE e de Deputados do PCP.

Mas, a par com a melhoria do rendimento das famílias, é essencial para o relançamento da economia criar

condições de investimento das empresas. As presentes condições financeiras exigem que o investimento

assente, por um lado, na mobilização do investimento privado e, por outro, na aceleração da execução dos

fundos comunitários e na sincronização do ciclo de planeamento de infraestruturas com o ciclo de definição

das perspetivas financeiras da União Europeia.

Neste sentido, recordo, propomo-nos apresentar à Assembleia da República, em 2018, um programa de

investimento em infraestruturas, que aqui possa ser discutido e votado por uma maioria de dois terços, de

modo a assegurar um consenso alargado que transcenda a maioria desta Legislatura e a tempo de enquadrar

as negociações das perspetivas financeiras da União Europeia entre 2020 e 2027.

Aplausos do PS.

Hoje, decorridos cerca de oito meses após o arranque do financiamento de projetos empresariais, o

Portugal 2020, em todos os seus programas operacionais, disponibilizou apoios a 15 empresas ou

associações empresariais. Foi esta a dimensão do contributo do novo ciclo de fundos europeus para o

incentivo ao investimento de que tanto carece a economia portuguesa.

Por isso, propomo-nos alterar substancialmente a situação atual, tomando medidas de imediato, para que,

no final dos primeiros 100 dias deste Governo, sejam ultrapassados os 100 milhões de euros de pagamentos

efetivos às empresas, colocando, assim, em pleno funcionamento os sistemas de incentivos a pleno vapor.

Aplausos do PS.

Para o efeito, tomaremos medidas concretas para eliminar os estrangulamentos já detetados. Por exemplo,

reforçaremos em 35 milhões de euros os fundos de apoio ao Sistema de Garantia Mútua, mitigando deste

modo as dificuldades de obtenção das garantias necessárias ao recebimento dos apoios por parte das

pequenas empresas.

Mas o investimento empresarial depende da resolução de um problema central: o baixo nível de autonomia

financeira da generalidade das empresas, que impede o investimento com capitais próprios e o acesso ao

crédito, sobretudo num contexto crescentemente exigente dos rácios exigidos ao sistema bancário.

A criação de um Fundo de Capitalização, a melhoria do tratamento fiscal do financiamento e capitalização

das empresas pelos sócios, a duplicação do âmbito e do montante do crédito fiscal ao investimento e a criação

de uma linha de adiantamento do crédito fiscal aos investimentos em investigação e desenvolvimento, visam

melhorar as condições de investimento das empresas.

Especial incentivo é o que prevemos com o Programa Semente dirigido ao empreendedorismo e à criação

de start-up, favorecendo um ecossistema dinâmico de iniciativa e inovação que se tem desenvolvido em

contraciclo e que importa acarinhar.

O programa de relançamento da economia que apresentamos acompanha, assim, do lado da oferta a

desejada melhoria do lado da procura interna.

Aplausos do PS.

Mas gostava de ser claro, num ponto: as funções do Estado não se esgotam, para nós, nas essenciais

funções de soberania (a defesa nacional, a diplomacia, a segurança interna, a administração da justiça e a

arrecadação de impostos). Não podemos ignorar, nem desprezar, o papel decisivo que as políticas públicas

podem, e devem, desempenhar na criação de condições para a atração, incentivo e potenciação do

investimento privado.

Por um lado, na internacionalização, apoiada por uma ação externa integrada com a nossa diplomacia, da

promoção da língua à defesa da economia, a partir da posição de Portugal no mundo e do enorme potencial

das comunidades portuguesas, quer na atração do investimento, quer no acesso a mercados onde estão

implantadas.

Página 5

3 DE DEZEMBRO DE 2015

5

Por outro lado, na valorização do nosso território, com o investimento diversificado em sectores como a

agricultura, a floresta ou o turismo; uma abordagem integrada da política do mar, que permita potenciar o

chamado «crescimento azul», da aquacultura à logística portuária, das tecnologias de sistemas offshore à

manutenção e reparação navais, das pescas à defesa da biodiversidade, da náutica de recreio à biotecnologia

marinha, mas, sobretudo, com uma nova visão sobre o nosso território continental e a sua faixa raiana,

passando a olhar o que nos habituámos a abandonar como interior, como a plataforma de excelência para a

afirmação da nossa economia no mercado ibérico.

Aplausos do PS.

Em terceiro lugar, o regresso em força do Simplex, alargando-o a sectores cruciais, como o da justiça, e

uma atitude proactiva de redução da legislação e de melhoria do processo legislativo de modo a melhorar a

previsibilidade e a reduzir os custos de contexto, do investimento e do funcionamento das empresas.

Aplausos do PS.

Por fim, e decisivo, o alinhamento dos incentivos para a prioridade que a inovação tem de ter numa

estratégia apostada na melhoria da produtividade pelo aumento do valor dos produtos e serviços, o que exige,

a par com os incentivos ao investimento empresarial em investigação e desenvolvimento, melhorar os

processos de transferência de conhecimento e tecnologia para a economia e a valorização da inovação

através da procura pública e da capacitação das PME (pequenas e médias empresas), inovadoras no acesso

aos mercados públicos.

Aplausos do PS.

O Estado eficiente é o Estado que confia na descentralização e na governação aos vários níveis, pelo que

contamos com as autarquias locais e as regiões autónomas nesta parceria para o desenvolvimento.

As autonomias regionais são um importante ativo no nosso País e na nossa projeção atlântica. O Governo,

em articulação com os governos regionais dos Açores e da Madeira, procurará exercer as suas competências,

beneficiando açorianos e madeirenses e, desse modo, valorizando todos, ou seja, Portugal.

Esta estratégia implica, definitivamente, romper com a ilusão de um modelo de desenvolvimento assente

no empobrecimento e na precarização do trabalho e apostar, decisivamente, nos fatores cruciais de

desenvolvimento, que são a cultura, a ciência e a educação.

Aplausos do PS.

Ciência, cultura e educação são os pilares da sociedade do conhecimento, condição de cidadania, fator de

segurança da capacidade de adaptação às incertezas do futuro e a base de modernização da economia, por

via de um tecido empresarial inovador, competitivo e internacionalizado. Para isto se concretizar é essencial

dar máxima prioridade ao combate à precariedade. Só assim daremos perspetivas de futuro às novas

gerações, que não nos podemos resignar a ver partir para a emigração; só assim incentivamos o investimento

na formação profissional; e só assim valorizamos a dignidade do trabalho e a melhoria da produtividade das

empresas.

Por isso, melhor emprego é essencial para termos mais crescimento.

Aplausos do PS e do Deputado do BE José Manuel Pureza.

É esta opção estratégica que exige repor no centro das prioridades das nossas políticas públicas a

educação de adultos e a formação ao longo da vida, porque não podemos prescindir da geração da meia-

idade, que não teve oportunidade de adquirir os níveis de qualificação indispensáveis às novas exigências de

empregabilidade para os desempregados de longa duração.

Página 6

I SÉRIE — NÚMERO 12

6

A criação do contrato de geração, permitindo o acesso à reforma a tempo parcial, com contrapartida da

contratação de jovens a tempo inteiro, tem, também, este objetivo: fortalecer a solidariedade entre gerações e

uma harmoniosa conjugação de saberes, formais e informais, indispensáveis às empresas e à transição de

gerações.

As políticas ativas de emprego devem, por isso, ser também mais efetivas e seletivas. Mais efetivas, pondo

termo às políticas de subsidiação à precariedade no preenchimento de postos de trabalho que devem dar

lugar a ocupação efetiva.

Por outro lado, assumindo duas prioridades claras: a integração de jovens qualificados no mercado de

trabalho, condição de modernização acelerada do tecido empresarial e a melhor forma de transferir

conhecimentos, a par com as políticas direcionadas a sectores com forte capacidade de criação de postos de

trabalho, como os serviços de apoio pessoal à infância ou aos idosos, em parceria com o sector social, ou o

relançamento da fileira da construção civil, com um amplo programa de reabilitação urbana, que dê suporte a

uma nova geração de políticas de habitação…

Aplausos do PS.

…ou à restauração, para o que é decisiva a redução da taxa do IVA para 13%.

Aplausos do PS e do BE.

Nos últimos anos, Portugal foi capaz de cumprir uma agenda ambiciosa nas políticas de igualdade, que

favoreceram a integração das comunidades imigrantes, a garantia da liberdade religiosa, o combate às

discriminações em função da orientação sexual ou de género.

Aplausos do PS, do BE e de alguns Deputados do PCP.

Não devemos ignorar que a eliminação das discriminações legais não prescinde da continuidade de um

combate cultural contra o preconceito, nem a subsistência de discriminações de facto, com que não nos

podemos conformar, como as diferenças remuneratórias em função do género.

Aplausos do PS e do BE.

Mas, sobretudo, não podemos adiar mais a prioridade que temos de dar à inclusão de pessoas com

deficiência, que exige uma ação transversal de uma escola inclusiva a um território sem barreiras, ao

aperfeiçoamento de mecanismos de apoio social e a uma estratégia de emprego e de trabalho para todos.

Aplausos do PS.

A inclusão das pessoas com deficiência deve ser, por isso, a nova prioridade central da agenda para a

igualdade.

Os novos desafios à igualdade não substituem a persistência do combate às desigualdades económicas e

sociais, que a crise e a execução do programa de ajustamento agravaram de modo chocante.

Ao longo dos últimos quatro anos a pobreza e as desigualdades acentuaram-se, interrompendo um

caminho de continuada correção, como nos mostra a taxa de risco de pobreza, que atinge, em 2013, os 20%.

Aplausos do PS.

Este agravamento é especialmente intolerável no caso da pobreza infantil, onde a taxa de risco de pobreza

atinge os 26% — uma, em cada cinco crianças portuguesas, está em risco de pobreza — e nada atinge de

forma mais dramática a igualdade e o futuro de um país como a pobreza das suas crianças e jovens.

É, por isso, necessário pôr termo à política fraturante, que rompeu o consenso em torno do modelo social,

que fomos coletivamente criando e desenvolvendo em sucessivos governos, após o 25 de Abril, e que assenta

Página 7

3 DE DEZEMBRO DE 2015

7

em três pilares essenciais: a valorização da escola pública; o desenvolvimento do Serviço Nacional de Saúde

(SNS) e a sustentabilidade de uma segurança social pública e para todos.

Aplausos do PS e do BE.

A reposição de mínimos sociais cortados nos últimos anos, como o Complemento Solidário para Idosos

(CSI) e o Rendimento Social de Inserção (RSI), deve ser acompanhada de duas novas prioridades: a

dignificação do trabalho, com a criação de um crédito fiscal negativo que assegure que todos os que declaram

rendimentos do trabalho possam vencer o limiar da pobreza e uma estratégia integrada de combate à pobreza

infantil e juvenil, centrada no território e articulada em torno da escola, que permita a melhor sinergia na

inclusão do segmento da população mais atingida pelo aumento da pobreza e que mais compromete o nosso

futuro.

Aplausos do PS.

Crescimento, emprego e igualdade são, por isso, três desígnios que se articulam entre si e reforçam

mutuamente, e todos, no seu conjunto, permitem uma consolidação saudável e sustentável das nossas

finanças públicas, com uma consecutiva redução do défice orçamental e da dívida pública, de acordo com a

estratégia orçamental que assumimos no nosso Programa do Governo e que a nossa política económica e

social favorece e potencia.

Aplausos do PS.

Sr. Presidente e Sr.as

e Srs. Deputados, as crises que atingiram a Europa desde 2008 feriram o projeto

europeu e fortaleceram os seus adversários. Precisamos de relançar o projeto europeu em Portugal e de

relançar Portugal no projeto europeu.

Por isso, temos uma prioridade clara, neste ano em que celebramos o 30.º aniversário da adesão de

Portugal à CEE: um novo impulso à convergência com a Europa.

Precisamos de aprofundar a Europa não apenas para defender Portugal mas também para defender o

futuro do próprio projeto europeu, cujos ideais de prosperidade e progresso partilhamos.

Este Governo participará na construção de uma Europa que responda às ambições legítimas dos

portugueses, de uma Europa que crie as condições para que Portugal seja mais próspero e mais igual.

A União Europeia sabe que encontrará, neste Governo, um parceiro responsável, capaz de se bater pela

defesa dos interesses dos seus cidadãos e dos valores e instituições do projeto europeu. Este Governo não

servirá os cidadãos portugueses contra ou apesar da Europa mas com a Europa;…

Aplausos do PS.

… e não servirá a Europa contra os cidadãos portugueses mas, antes, mobilizando-os para participarem

nas mudanças que a Europa, fiel aos seus valores fundadores, necessita de concretizar.

Em suma, com a União Europeia queremos um novo impulso à convergência que garanta os três desígnios

para que nos convocamos neste novo tempo: mais crescimento, melhor emprego e maior igualdade.

Aplausos do PS, de pé, do BE, do PCP e de Os Verdes.

O Sr. Presidente: — Vamos, agora, passar à fase dos pedidos de esclarecimento. A ordem das perguntas,

como sabem, será a seguinte: PSD, PS, BE, CDS-PP, PCP, Os Verdes e o PAN.

Assim, para o efeito, tem a palavra, em primeiro lugar, o Sr. Deputado Luís Montenegro.

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Dr. António Costa, queria

cumprimentá-lo nesta ocasião, em que se senta, pela terceira vez, nessa bancada.

Página 8

I SÉRIE — NÚMERO 12

8

Esteve aí com António Guterres, depois de o Partido Socialista ter vencido as eleições em 1995, e

contribuiu para deixar o País num pântano.

Vozes do PSD e CDS-PP: — Muito bem!

Protestos do PS.

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Esteve aí com José Sócrates, depois de o Partido Socialista ter vencido

as eleições legislativas de 2005, e contribuiu para deixar o País com a troica e num estado de pré-bancarrota.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Está aí hoje, em 2015, depois de o Partido Socialista ter perdido

categoricamente as eleições legislativas de 2015, e logo veremos em que estado é que vai deixar o País.

Dr. António Costa, ao contrário do que aconteceu há 10 e há 20 anos, este Governo socialista e este

Primeiro-Ministro estão diminuídos na sua autoridade política e feridos de morte na sua legitimidade popular. O

povo não escolheu o Dr. António Costa para exercer as funções de Primeiro-Ministro.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O povo não escolheu o programa do Partido Socialista e muito menos o programa do Bloco de Esquerda

ou do PCP para serem a base da ação governativa no próximo quadriénio. O povo escolheu, livre,

democrática e conscientemente, um outro programa, o programa da coligação que juntou o PSD e o CDS-PP.

O Dr. António Costa e o programa do Partido Socialista foram rejeitados pela vontade do povo português e

foram viabilizados pela votação cúmplice, consciente, voluntária dos Deputados eleitos pelos partidos que

perderam as eleições.

O Sr. António Filipe (PCP): — Eleitos! Muito bem!

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Com uma agravante: fizeram tudo isto um pouco às escondidas e não

disseram antes das eleições o que congeminaram entre si, sabe-se lá desde quando.

Vozes do PSD: — Muito bem!

Protestos do PS, do BE e do PCP.

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Rejeitar este programa na Assembleia da República não é, portanto,

mais do que expressar a genuína vontade popular manifestada pelos portugueses nas últimas eleições.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Mas nós sabemos que os senhores estão juntos e votarão unidos contra a moção de rejeição que o PSD e

o CDS-PP irão apresentar.

Vozes do PS, do BE e do PCP: — Oh!…

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Não temos dúvidas algumas sobre isso, aliás, isso até pesou na nossa

decisão.

Risos do PCP.

Página 9

3 DE DEZEMBRO DE 2015

9

Mas, Dr. António Costa, como Primeiro-Ministro, pergunto, em jeito de desafio: por que não apresenta uma

moção de confiança a este Parlamento?

Vozes do PSD: — Exatamente!

Vozes do PS: — Oh!…

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — É que não aprovar uma moção de rejeição, no contexto em que o seu

Governo inicia funções, é diferente de aprovar uma moção de confiança. E, Dr. António Costa, Sr. Primeiro-

Ministro, o meu desafio é construtivo.

Vozes do PS: — Ah!

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — O senhor e o Partido Socialista perderam as eleições legislativas. O

senhor e o Partido Socialista entenderam-se bilateralmente, mano a mano, com o Bloco de Esquerda, com o

PCP e com o Partido Ecologista «Os Verdes». O senhor e o Partido Socialista, instados pelo Sr. Presidente da

República a clarificar alguns eixos estratégicos do vosso Programa e dos respetivos entendimentos,

responderam com secretismo.

Por isso, pergunto: o Sr. Primeiro-Ministro não acha que o País e aqueles que nos seguem do exterior

veriam, nesse voto de confiança, um fator de tranquilidade, um fator de estabilidade?! Foi, aliás, o senhor

quem prometeu ao País uma solução estável, coerente e duradoura.

Se o seu Governo e o seu Programa saíram do voto dos Deputados e do acordo parlamentar

bilateralmente subscrito com os outros partidos, se o seu Governo é minoritário, representa sozinho menos

Deputados do que aqueles que representa a bancada a que pertenço, Sr. Primeiro-Ministro, pergunto-lhe se,

de facto, não é do interesse do País e do seu próprio interesse, como Primeiro-Ministro, ter garantida essa

confiança do Parlamento.

Creio que é justo pedir a todos aqueles que contribuíram para esta solução que não se juntem só para

destruir, que tenham a capacidade, e não tenham vergonha, de construir conjuntamente.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Este é o vosso projeto comum, o vosso projeto conjunto, a democracia

agradece que o assumam sem hesitações e que acabem com esse secretismo!

Sr. Primeiro-Ministro, uma última palavra para deixar claro o seguinte: o senhor inicia funções, mesmo

perdendo as eleições, como Primeiro-Ministro de Portugal, lidera o Governo de um País que deixou para trás a

troica, a recessão económica, o descontrolo financeiro, o aumento do desemprego, as contas externas

deficitárias e juros incomportáveis.

Protestos do PS.

É este o País que nós deixámos para trás. É um País que está a remover a austeridade de forma gradual e

a recuperar rendimentos. É um País que promoveu várias reformas estruturais para garantir a competitividade

da nossa economia, para garantir o aumento das nossas exportações, para garantir a atratividade do

investimento e, em particular, do investimento externo. É um Estado mais fiável, um Estado que, hoje, paga a

tempo e horas, um Estado que salvaguardou os principais sistemas públicos e garantiu, de facto, mais justiça

e mais equidade social.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Não se esqueçam, Sr.as

e Srs. Deputados e também Srs. Membros do

Governo, de que nas políticas fiscais, nas tarifas sociais, até mesmo nos sacrifícios, o caminho que

percorremos protegeu sempre os mais fracos…

Página 10

I SÉRIE — NÚMERO 12

10

O Sr. João Galamba (PS): — Falso!

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — … e pediu sempre um esforço maior aos mais fortes. Isto é indiscutível,

Srs. Deputados!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Protestos do PS, do BE e do PCP.

Para além disso, Portugal é hoje um País credível…

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, informo-o de que já ultrapassou largamente os 5 minutos, mas, como

está a descontar no tempo do seu partido, é um problema de gestão interna.

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Muito bem, Sr. Presidente, vou caminhar para terminar.

Como eu dizia, para além disso, Sr. Presidente, Srs. Deputados e Srs. Membros do Governo, Portugal é

hoje um País credível, um País respeitado e elogiado no exterior, um País que cumpre os seus compromissos.

O Programa que os derrotados, unidos, hoje, aqui nos apresentam põe muitas destas conquistas em

causa.

Protestos do PS.

Traz medidas económicas erradas, traz políticas públicas arriscadas e, sobretudo, não traz, para já, uma

coisa: a fatura.

A Sr.ª Isabel Alves Moreira (PS): — Ah!…

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Mas ela virá! A fatura de uma dívida, que vai crescer; a fatura de um

défice, que não se percebe como é que não vai aumentar; a fatura de afastar investimento, em vez de atrair

investimento que gere emprego; a fatura do vosso acordo cúmplice, consciente e voluntário; a fatura desta

aventura e de um experimentalismo, que é, de facto, perigoso.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, realmente, como consta da nossa agenda, e todos sabem, a primeira

pergunta poderá ter a duração de 5 minutos, mas, como desconta no tempo de que dispõem, o que fiz agora

farei em relação às demais bancadas. Ou seja, o que exceder os 5 minutos será descontado no tempo global

do respetivo grupo parlamentar.

Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Luís Montenegro, começo por saudar, na sua

pessoa, toda a bancada do PPD/PSD e por agradecer-lhe a amabilidade das questões que colocou.

Risos do PS, do BE, do PCP e de Os Verdes.

Primeiro, colocou uma questão verdadeiramente importante: «Por que é que não apresenta uma moção de

confiança?». Dou-lhe uma resposta que creio ser simples e clara: só precisa de pedir confiança quem não tem

confiança.

Aplausos do PS, do BE, do PCP e de Os Verdes.

Página 11

3 DE DEZEMBRO DE 2015

11

E este, Sr. Deputado, lamento desiludi-lo, é um Governo que se apresenta nesta Assembleia da República

confiante, e confiante, desde logo, no suporte parlamentar maioritário que lhe dá legitimidade para estar aqui.

Aplausos do PS e do Deputado do BE José Moura Soeiro.

Isto porque a democracia assenta em regras simples:…

Protestos do PSD e do CDS-PP.

… a igualdade do voto e igual legitimidade de quem representa os cidadãos eleitores. Aquilo que temos

nesta Assembleia da República são 230 Deputados, que não foram nomeados por mim, nem foram escolhidos

por si, foram todos eleitos pelos cidadãos portugueses.

Aplausos do PS, do BE, do PCP e de Os Verdes.

O Sr. Deputado pode achar estranho, mas a razão pela qual as bancadas do PSD e do CDS não são hoje

maioritárias nesta Câmara é porque não são maioritárias no País e porque as outras bancadas tiveram mais

votos, aliás, é por isso que têm mais Deputados.

Aplausos do PS e do BE.

Na noite das eleições, como Secretário-Geral do Partido Socialista, tive oportunidade de dizer aquilo que

era óbvio: tendo a bancada do PSD mais três Deputados do que a bancada do PS, cabia, naturalmente, ao Dr.

Pedro Passos Coelho, ou a quem o PPD/PSD entendesse, o esforço de procurar construir uma solução

governativa estável, coerente e duradoura. Era, aliás, uma exigência que decorria da própria expressão

pública de S. Ex.ª o Sr. Presidente da República. E, naturalmente, respeitámos a indicação que o Sr.

Presidente da República fez, o encargo que deu ao Dr. Pedro Passos Coelho para procurar construir essa

solução. Acontece que o Dr. Pedro Passos Coelho falhou nessa tentativa e não conseguiu construir uma

solução maioritária, estável e duradoura nesta Assembleia da República.

Aplausos do PS.

Por que razão é que existe o XXI Governo Constitucional?

O Sr. Pedro do Ó Ramos (PSD): — Por que será?

O Sr. Miguel Santos (PSD): — Porque o senhor queria ser Primeiro-Ministro!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Porque o XX Governo Constitucional confrontou-se com uma maioria contra,

nesta Assembleia da República, e não foi capaz de encontrar uma solução maioritária. Em alternativa, as

bancadas que rejeitaram o XX Governo não se limitaram, ao contrário do que disse, a votar «contra», a ser

oposição…

Vozes do PS: — Exatamente!

O Sr. Primeiro-Ministro: — … a ser uma maioria negativa. Não! As bancadas que derrubaram o XX

Governo Constitucional encontraram também a solução de viabilizar um governo alternativo, que é este

Governo que está aqui está, o XXI Governo Constitucional.

Aplausos do PS, do BE e do PCP.

Página 12

I SÉRIE — NÚMERO 12

12

E o entendimento é, de facto, uma novidade. É verdade que, entre estas bancadas, há muitos anos que se

tinha estabelecido o tabu de que não era possível haver diálogo, de que não era possível haver entendimento

e de que não era possível viabilizarem uma maioria alternativa. E, porventura, VV. Ex.as

fiaram-se nesse tabu e

confiaram na sorte.

Aplausos do PS, do BE e do PCP.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Saiu-vos a fava!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Mas, Sr. Deputado, aquilo que estas bancadas responsavelmente fizeram foi

dar tradução e responder aos dois desafios que resultaram das eleições: em primeiro lugar, corresponder à

vontade esmagadora do povo português, de pôr termo à austeridade, virar a página e encontrar uma nova

política assente no crescimento, no emprego e na igualdade.

Aplausos do PS, do BE e do PCP.

Em segundo lugar, dotar o País de estabilidade, pôr termo à incerteza e à instabilidade, que,

necessariamente, existiria com um governo que não foi capaz de encontrar uma solução maioritária nesta

Assembleia da República.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Isso dependia de si!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Por isso, Sr.as

e Srs. Deputados, como disse: dependia de mim e dos demais

229 Deputados. Agora, o que os Srs. Deputados do PSD e do CDS, num exercício de humildade, talvez um

dia, possam fazer…

Risos do PSD e do CDS-PP.

Há uma coisa que têm de perceber: na anterior Legislatura, tinham maioria; nesta Legislatura, não têm

maioria.

Protestos do PSD e do CDS-PP.

E não podem entender que o dever dos outros é oferecer-vos a maioria, que os eleitores vos retirou,

porque não queria a prossecução das vossas políticas.

Aplausos do PS, do BE, do PCP e de Os Verdes.

O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos César.

O Sr. Carlos César (PS): — Sr. Presidente, começo por saudar V. Ex.ª, Sr. Primeiro-Ministro, e todos os

Membros do seu Governo, estimando, naturalmente, que tenham os maiores sucessos. O nosso entendimento

é o de que o sucesso do Governo é o sucesso de Portugal.

Aplausos do PS.

Cumprimento-o também, Sr. Primeiro-Ministro, salientando o contributo de V. Ex.ª ao longo destes 40 anos

de democracia.

V. Ex.ª é bem um exemplo daquilo que, ao longo destas quatro décadas, foi, e é, o Partido Socialista,…

Protestos do PSD e do CDS-PP.

Página 13

3 DE DEZEMBRO DE 2015

13

… um partido que nunca se refugiou atrás da porta para espreitar o melhor momento partidário para

governar ou para sair do governo.

Aplausos do PS.

Risos e protestos do PSD e do CDS-PP.

Cumprimento-o também pelo discurso que nos trouxe, nesta apresentação do Programa do Governo.

Não nos trouxe, naquilo que era conhecido, naturalmente, revelações excecionais, mas trouxe-nos,

supletivamente, o que mais nos interessa: entusiasmo, convicção, fundamentação, competência pessoal,

frontalidade, sentido de responsabilidade, sentido das prioridades nacionais e um profundo sentido do

interesse nacional.

Aplausos do PS.

Se tudo isso não for tudo quanto precisamos para inverter a herança de endividamento e de pobreza, que

este XXI Governo recebe, é bem aquilo de que precisamos na liderança do Governo de Portugal.

Aplausos do PS.

Saúdo também os Srs. Deputados, que, entretanto, tomaram posse e assento nesta Assembleia, depois da

mudança de Governo.

Esta é uma Assembleia legitimamente constituída.

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Era o que mais faltava se assim não fosse!

O Sr. Carlos César (PS): — Cumprimento, em especial, os líderes dos partidos minoritários: Dr. Paulo

Portas e Dr. Passos Coelho.

Protestos do PSD e do CDS-PP.

Minoritários, mas barulhentos!

Protestos do PSD e do CDS-PP.

Risos do BE e do PCP

Aplausos do PS.

Na Casa da democracia…

Protestos do PSD e do CDS-PP.

Muito barulhentos!

Como eu dizia, na Casa da democracia, tão legítimas são as maiorias que se formam como as minorias

que, daí, decorrem. Estamos, pois, em presença de dois partidos minoritários no Parlamento, que se opõem

ao Governo, e de uma maioria de partidos e Deputados que o apoiam. Ou seja, é tão legítima esta oposição

como legítima é a maioria e o Governo que, aqui, é apoiado.

Aplausos do PS.

Vozes do PCP: — Muito bem!

Página 14

I SÉRIE — NÚMERO 12

14

O Sr. Carlos César (PS): — Em tempos anteriores, o líder do partido minoritário da coligação minoritária já

tinha dito que um governo com o apoio maioritário tanto pode ser de coligação como ter apenas um acordo

parlamentar. É certo que essa era a sua boa frase.

A pior frase, Sr. Primeiro-Ministro, do líder do partido minoritário da coligação minoritária…

Risos do PS.

… foi quando disse ao futuro Governo de Portugal que não lhe pedissem socorro, porque, não sendo esse

partido componente desse Governo, não daria socorro, em nenhuma circunstância, ao Governo de Portugal.

Aplausos do PS.

Mas, Sr. Primeiro-Ministro, no que toca ao partido maioritário da coligação minoritária, esse só precisará de

recorrer a si próprio para se corrigir a si próprio.

Vozes do PS: — Muito bem!

O Sr. Carlos César: — Bastará, parafraseando o líder parlamentar do PSD, voltar a dizer, tal como disse,

em 2011: «Precisamos de uma oposição responsável!». Ai, sim, precisamos!

Aplausos do PS.

Sr. Primeiro-Ministro, neste novo ciclo político, que tão bem caracterizou e que se expressa num Programa

do Governo exigente na gestão dos recursos e corajoso na sua dimensão humanista, todos sabemos que o

ponto de partida é penalizante para os governantes e, especialmente, penalizante para os governados.

Cessou funções um Governo que não cumpriu as metas com que se comprometeu. Cessou funções um

Governo que não falhou nos sacrifícios impostos, mas falhou nos resultados desses sacrifícios.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Muito bem!

O Sr. Carlos César (PS): — Cessou funções um Governo que vendeu o País ao desbarato, que tornou a

vida das famílias insustentavelmente cara, que endividou Portugal, que destruiu milhares e milhares de

empresas, e que destruiu e que comprometeu economias regionais e locais, por todo o País.

Vozes do PS: — Muito bem!

O Sr. Carlos César (PS): — Só há três países piores que Portugal, no que respeita aos últimos dados

trimestrais de crescimento económico. Por isso, Sr. Primeiro-Ministro, pergunto: não surgindo outros

indicadores nacionais imprevistos e alterações no plano europeu, que possibilidades encontra para

prosseguirmos a política, que é o nosso compromisso, de aumentar o rendimento, em particular das famílias

mais empobrecidas, de alcançarmos outros níveis de crescimento e a de empreendermos, finalmente, uma

linha de convergência com os indicadores europeus, salvaguardando, simultaneamente, os nossos objetivos

de consolidação orçamental?

Sr. Primeiro-Ministro, quero ainda dizer-lhe que V. Ex.ª pode, e deve, contar com o apoio do seu partido,

mas estou convencido de que, no seu esforço por fazer de Portugal um País mais próspero, por ajudar as

famílias portuguesas, dentro de muito pouco tempo pode orgulhar-se de também ter o apoio de Portugal, de

Portugal inteiro,…

Risos do PSD e do CDS-PP.

Página 15

3 DE DEZEMBRO DE 2015

15

… de um Portugal que respeita uma oposição, que falha nos seus compromissos, que falha na sua

dedicação ao seu próprio País…

Protestos do PSD.

… e que coloca, acima dos interesses nacionais, os interesses partidários.

Vozes do PS: — Bem dito!

O Sr. Carlos César (PS): — Força, Sr. Primeiro-Ministro! Viva o Governo de Portugal!

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — A Mesa utilizou a mesma flexibilidade de há pouco, em relação ao pedido de

esclarecimento do Sr. Deputado Carlos César.

Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Carlos César, agradeço as questões e, na sua

pessoa, quero saudar, calorosamente, a bancada do Partido Socialista e agradecer o apoio dessa mesma

bancada na investidura deste Governo.

Quero sublinhar o seguinte: os programas do governo não são um manual de novidades, os programas do

governo devem ser políticas estruturadas, coerentes e, como tal, coerentes.

O Programa do Governo que aqui apresentamos tem uma origem bem conhecida, tem por base o

programa eleitoral que o Partido Socialista apresentou aos eleitores, e agora tem as alterações que resultaram

das negociações com o Bloco de Esquerda, com o Partido Comunista Português, e com o Partido Ecologista

«Os Verdes». As alterações introduzidas em função das negociações foram devidamente publicitadas e o

impacto na estratégia orçamental que tínhamos definido foi também devidamente assinalado. Por isso, este

não é um Programa do Governo que surpreenda, é um Programa do Governo consistente, coerente, que dá

resposta àquilo que é a proposta política do Partido Socialista e é fiel àquilo que o PS negociou com as demais

forças políticas. Este é o Programa do Governo que temos pela frente.

Eu não gostaria de prolongar, nesta Legislatura, um hábito que se tem vindo a acumular em sucessivas

legislaturas anteriores, e não só na última, nem na penúltima, a bem da verdade, que é o de centrar a

discussão do presente sobre as discussões do passado. Acho que temos de nos centrar naquilo que é o ponto

de partida,…

O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — Já vai tarde!

O Sr. Primeiro-Ministro: — … e o ponto de partida é aquele que, aliás, o Instituto Nacional de Estatística

disponibilizou, a informação transparente e esta semana publicitada, relativamente à situação do País no 3.º

trimestre deste ano.

Risos do PS, do BE e do PCP.

Sei que algumas Sr.as

e alguns Srs. Deputados têm dúvidas sobre o que é que significa o terceiro trimestre,

mas para que não haja qualquer dúvida…

Protestos do PSD e do CDS-PP.

… repito, para que não haja qualquer dúvida, o terceiro trimestre decorreu e terminou antes da tomada de

posse deste Governo.

Aplausos do PS.

Página 16

I SÉRIE — NÚMERO 12

16

De facto, o ponto de partida é conhecido: o País recuou 30 anos no nível de investimento.

Protestos de Deputados do CDS-PP.

É, por isso, extraordinário ouvir dizer que o novo Governo assusta os investidores, quando ao fim de quatro

anos de Governo os senhores conseguiram fazer recuar 30 anos o nível de investimento em Portugal.

Aplausos do PS.

O Sr. António Carlos Monteiro (CDS-PP): — Não ia falar do passado e está a falar no passado! Em que é

que ficamos?

O Sr. Primeiro-Ministro: — É extraordinário falarem do emprego quando, em quatro anos de governação,

fizeram recuar 20 anos o emprego em Portugal e quando, ao fim de quatro anos de governação, fizeram

recuar 10 anos a riqueza produzida no País.

Este é, de facto, o ponto de partida e um ponto de partida que tem um preço conhecido: na pobreza, na

emigração, no aumento do endividamento do País, que subiu ao longo dos últimos quatro anos para níveis

recorde em termos históricos.

Protestos de Deputados do CDS-PP.

O ponto de partida é este mas o ponto de chegada há de ser outro, e há de ser outro não por qualquer

efeito mágico mas porque serão outras as políticas.

Aplausos do PS e do Deputado do BE José Manuel Pureza.

Isto porque o resultado que foi alcançado é, também, o resultado das políticas que foram prosseguidas e é

por isso que é necessário inverter a política para podermos ter outros resultados.

Ao contrário do que muitos acreditaram, a austeridade não trouxe crescimento, nem a desvalorização

interna trouxe prosperidade. O empobrecimento e a destruição de direitos laborais não são o caminho para o

desenvolvimento.

Aplausos do PS.

O caminho para o desenvolvimento tem de assentar no conhecimento e tem de assentar na inovação.

Essa inversão implica também uma nova atitude na Europa, não uma atitude de confrontação com a

Europa, não uma atitude da rutura com a Europa, mas uma atitude que contribua para que a Europa mude e,

mudando, nos ajude também a retomar uma trajetória de convergência que está interrompida desde o

princípio do século e que é urgente podermos retomar para, de uma forma saudável e sustentável,

crescermos, gerarmos emprego, diminuirmos as desigualdades e consolidarmos as nossas finanças públicas.

Esse é o nosso caminho, esse é o caminho que queremos percorrer.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para pedir esclarecimentos, a Sr.ª Deputada Catarina Martins.

A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, o Bloco de Esquerda reconhece que

o Programa que aqui traz hoje reflete o acordo que foi feito e as negociações que tivemos para uma solução

de Governo que possa travar o empobrecimento do País.

Aplausos do BE e do PS.

Página 17

3 DE DEZEMBRO DE 2015

17

Debater hoje o Programa do Governo, ainda para mais no contexto de uma moção de rejeição anunciada

pela direita, é também analisar a escolha que foi feita pelas várias forças políticas e a diferença entre o

Programa que rejeitámos e este Programa que hoje estamos a debater.

É bom centrarmo-nos nos pontos que são essenciais: pensões e salários. Onde o Programa da direita

previa cortes nas pensões e manter os cortes inconstitucionais nos salários da função pública durante quatro

anos, o Programa que hoje debatemos prevê descongelamento das pensões, recuperação do complemento

solidário para idosos, reposição dos salários da função pública num ano, combate à precariedade,

desbloquear contratação coletiva, aumento do salário mínimo nacional.

Aplausos do BE.

Em relação ao Estado social, onde a direita queria contratualizar com os privados, em autênticas e

gigantescas PPP, as mais diversas funções do Estado, da escola pública ao Serviço Nacional de Saúde,

criando uma enorme rede clientelar, há agora um compromisso para reforçar os meios, as condições de

trabalho e o acesso das populações ao SNS, à educação pública, à cultura e à ciência.

O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Muito bem!

A Sr.ª Catarina Martins (BE): — No que respeita às privatizações, onde PSD e CDS-PP queriam continuar

a vender o País — CP, EMEF, estradas e linhas férreas —, há o compromisso de parar privatizações, de rever

os processos da TAP e da EGF e de reverter concessões como as do Metro, Carris e STCP.

Aplausos de Deputados do BE.

Vistas as diferenças, é normal que a direita apresente uma moção de rejeição. O Programa é diverso e

ofende-a. Aliás, a direita faz hoje o favor de demonstrar quanto valem os argumentos sobre a ilegitimidade

desta solução de Governo. Apresentem, pois, a moção de rejeição. Nós cá estaremos para a chumbar.

Aplausos do BE e do PS.

O que todos aguardamos hoje da direita, mas não sei se nos dão essa alegria, é que digam alguma coisa

sobre o seu próprio percurso. PSD e CDS-PP não estão a dever alguma explicação ao País sobre a devolução

da sobretaxa que se evaporou logo a seguir às eleições?

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Muito bem!

O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — Vocês é que estão!

A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Sobre a assinatura ilegal do contrato da venda da TAP? Sobre as

nomeações em catadupa?

O Sr. Adão Silva (PSD): — Mas isto é sobre o Programa do Governo ou é o quê?

O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — Equivocou-se!

A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Sobre a estagnação do PIB no terceiro trimestre, depois de todas as

promessas, ou sobre a forma como a meta do défice foi ficando cada vez mais longe?

Ou será que depois de um mandato inteiro a culpar o anterior Governo estão já a preparar-se para dizer

que a culpa é, certamente, do próximo Governo?!

Aplausos do BE e do PS.

Página 18

I SÉRIE — NÚMERO 12

18

Uma coisa é certa, a direita foge do debate sobre a realidade porque teria muitas explicações a dar, mas ao

Bloco de Esquerda interessa hoje falar dos compromissos para a vida concreta das pessoas. Temos a

convicção de que é urgente cortar com o legado da direita e que travar o empobrecimento do País exige

também uma nova forma de credibilidade do compromisso político.

A esperança de um novo ciclo exige palavras claras e exige compromissos, para que seja possível viver

em Portugal com dignidade.

Quero, por isso, questioná-lo, Sr. Primeiro-Ministro, sobre as condições de trabalho e emprego em

Portugal. Nos últimos quatro anos, meio milhão de pessoas em idade ativa saíram do País por não terem

emprego ou por não terem emprego digno. Nos novos contratos, o salário médio desceu 300 € e já quase não

se distingue do salário mínimo.

A precariedade tornou-se regra. Um País em que as poucas alternativas ao desemprego são estágios,

falsos recibos verdes, falso trabalho temporário, sempre com salários muito baixos, é um País em que não há

lugar para a esperança.

Precisamos de garantir que as novas gerações que começam agora a trabalhar encontram condições para

ficar no País, para quererem aqui morar, trabalhar, construir o futuro.

Sr. Primeiro-Ministro, no acordo assinado entre os nossos partidos, estabelecemos as condições para a

efetivação e para o alargamento do âmbito de combate à precariedade, através do reforço dos poderes da

Autoridade para as Condições do Trabalho na regularização de falsos recibos e outros vínculos ilegais, com a

imediata conversão em contrato de trabalho e acesso aos respetivos direitos. É uma medida que pode

responder já aos milhares de trabalhadoras e trabalhadores em situação precária e a falso recibo verde.

Pergunto-lhe o seguinte: em que prazo estará esta medida em vigor? Quando poderão os trabalhadores,

que hoje são vítimas das mais diversas ilegalidades e abusos, contar com a possibilidade de recurso eficaz à

autoridade fiscalizadora, que é a ACT? Estaremos em condições de afirmar que 2016 será o ano do fim dos

falsos recibos verdes e de outras ilegalidades laborais? É agora que os estágios passam a ser formação para

um emprego com contrato em vez do abuso que nega esse mesmo direito?

Sr. Primeiro-Ministro, quem começou a trabalhar na última década em Portugal e ainda não emigrou, só

conhece, em Portugal, a lei da selva no mundo do trabalho. O que pode esperar do seu Governo quem está

agora a terminar os seus estudos e quer começar a trabalhar?

Aplausos do BE.

O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Muito bem!

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro, para responder.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Catarina Martins, agradeço a sua intervenção e

saúdo-a a si e ao Bloco de Esquerda, que contribuíram para construir a solução política para dar ao País uma

solução de Governo com suporte maioritário estável nesta Assembleia da República.

Como disse, os compromissos foram assumidos numa base programática e uma das prioridades que foi

estabelecida foi, efetivamente, aquilo que designei por «melhor emprego». Melhor emprego é uma condição

essencial para defender a dignidade do trabalho, mas é uma condição também essencial para o melhor

crescimento da economia.

Durante os últimos meses tive oportunidade de falar por skype, em duas sessões diferentes, com várias

dezenas de jovens que emigraram nos últimos anos.

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Extraordinário!

O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — Moderno!

O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — E vão voltar?!

Página 19

3 DE DEZEMBRO DE 2015

19

O Sr. Primeiro-Ministro: — E a realidade que todos relataram foi que, mais do que o desemprego, foram

as precárias condições de trabalho, a indignidade das condições de trabalho, a falta de perspetivas de futuro

que lhes eram oferecidas pelas condições de trabalho em Portugal que os levaram a partir para o estrangeiro.

Ora, o maior défice estrutural que o País tem é um défice de qualificações e esse foi, pela primeira vez,

diminuído com esta nova geração, que, com grande esforço da escola pública, com grande esforço das

famílias, o País, pela primeira vez, começou a aproximar-se dos níveis médios de qualificação da União

Europeia.

O drama da emigração não é só um drama individual, não são só as famílias que se dividem e que se

separam, é um drama, também, para o futuro do País, pela perda do potencial relativamente à sua capacidade

de desenvolvimento.

Aplausos do PS.

Combater a precariedade é essencial. 90% dos contratos de trabalho que se celebraram nos últimos anos

foram contratos a prazo e os contratos a prazo deixaram de ser um passo para o contrato definitivo, visto que

só 11% dos contratos a prazo se convertem em contratos definitivos.

Esta é uma situação intolerável para a dignidade do trabalho, mas é uma situação fatal para um modelo de

empresa que queira melhorar a sua produtividade naquilo que é essencial para a melhorar, ou seja, poder

investir na formação dos seus quadros, poder apostar na qualidade dos seus trabalhadores. Isto porque uma

relação que nasce condenada à partida é uma relação em que ninguém investe: nem o trabalhador veste a

camisola da empresa, nem a empresa se empenha relativamente ao trabalhador, isto não é uma empresa

saudável, não é uma empresa do século XXI, é uma empresa de um passado que não nos assegura nenhum

futuro e não é com base nestas empresas que poderemos construir um País desenvolvido e um País que

possa progredir na nossa União Europeia.

Aplausos do PS e de Deputados do BE.

A dignidade do trabalho é uma questão, também, de cidadania. O valor fundamental da dignidade da

pessoa humana diz respeito à dignidade da pessoa humana em todas as dimensões da sua vida, sendo desde

logo mais importante defender aquelas que se encontram numa posição de inferioridade e dependência no

trabalho.

É por isso que temos de inverter esta lógica de que o direito do trabalho e o direito ao trabalho são um

pecado e um fardo para a economia. Não! São uma condição para uma sociedade mais justa, que

corresponda ao modelo social sobre o qual a Europa se reconstruiu no pós-guerra.

Aplausos do PS.

Isso passa pela alteração da legislação, mas passa também, como disse, pela criação de condições de

fiscalização. E uma das prioridades que teremos é, efetivamente, o reforço da Autoridade para as Condições

de Trabalho.

Como sabe, o Programa do Governo acaba com esta ideia de que é necessário continuar a diminuir o

número de funcionários públicos. O Governo assume que o País precisa de uma administração capaz,

qualificada, e não há administração capaz e qualificada sem pessoas capazes e qualificadas.

Temos de repor a contratação e a integração de pessoas nas funções do Estado. Não quer dizer que por

cada pessoa que saia de um serviço entre outra pessoa para esse serviço, mas há serviços onde é necessário

e prioritário restabelecer as condições e a capacidade de funcionamento e um deles, seguramente, é a

Autoridade das Condições de Trabalho, de forma a combater a precariedade e o abuso da lei que

sistematicamente tem vindo a ser cometido. Esse é um compromisso que fizemos, esse é um compromisso

que iremos honrar.

Aplausos do PS.

Página 20

I SÉRIE — NÚMERO 12

20

O Sr. Presidente: — Para colocar questões ao Sr. Primeiro-Ministro, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno

Magalhães, do CDS-PP.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, que não ganhou as eleições,

Sr.as

e Srs. Deputados, discutimos hoje o Programa de um Governo de partidos que perderam as eleições, um

Programa do Governo que se baseia na destruição e não na construção, na rejeição e não na confiança e

neste facto muito simples: os senhores unem-se contra nós e não pelo País, porque nem sequer se

conseguem entender.

Aplausos do CDS-PP e PSD.

Mas é sobretudo um Programa de um partido que perdeu as eleições, que não se conformou com isso e se

lançou numa inédita e desenfreada conquista do poder, perdendo o seu eixo, os seus valores e a sua

moderação. É o Programa de um Governo minoritário, de uma minoria mais pequena, que não resulta de uma

coligação formal, não resulta de um acordo parlamentar, não resulta, sequer, de um texto comum, que nunca

foram capazes de fazer.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. Carlos César (PS): — Ainda a história do texto comum?!

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — É, por isso, um Programa que, conjunturalmente, pode até servir

alguns partidos, mas que, certa e seguramente, não serve Portugal nem os portugueses.

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — E é também por isso, num debate tão inédito como este e não tendo

V. Ex.ª confiança para apresentar uma moção de confiança, que só pode haver uma votação clarificadora

apresentando os partidos da coligação uma moção de rejeição.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Ai estão a pedir desculpa agora, é?!

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Por dois motivos: porque, politicamente, não estamos de acordo com

o que aconteceu e, economicamente, temos receio do que possa acontecer.

Aplausos do CDS-PP.

E, Sr.as

e Srs. Deputados mais à esquerda, que estão muito inquietos, quem se levantar amanhã contra a

rejeição ficará definitivamente comprometido e corresponsável com o que este Governo fizer ou deixar de

fazer. Não fogem à foto de família de que andam a fugir!

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

Protestos do Deputado do PCP João Oliveira.

Sr. Presidente, termino com quatro perguntas.

Primeira, o Ministro das Finanças deste Governo foi ontem a Bruxelas. Portugal tem objetivos orçamentais

para cumprir. O PCP, seu apoiante, diz que o valor do défice é irrelevante — por que é que há de ser três se

pode ser quatro ou cinco ou seis ou sete?

O Sr. João Oliveira (PCP): — Leia melhor!

Página 21

3 DE DEZEMBRO DE 2015

21

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — E a primeira pergunta que lhe gostaria de fazer é se o seu Governo

tenciona começar por cumprir o défice inferior a 3% em 2015, o que está nas suas mãos, permitindo a

Portugal sair do procedimento excessivo, permitindo a Portugal ficar livre de sanções. Sendo ainda mais claro:

pode aqui garantir que o défice de 2015 ficará abaixo dos 3%? É uma pergunta para uma resposta de sim ou

não.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

Protestos do BE e do PCP.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Segunda pergunta: as medidas já anunciadas, pelo acordo que fez

com o PAN, o PEV, o BE e o PCP custam, pelo menos, 2000 milhões de euros — há quem fale em 3000

milhões —, aumenta a despesa e diminui a receita. Onde é que tenciona ir buscar o dinheiro para compensar

tudo isto?

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Tenciona ou não aumentar impostos? E quais?

Terceira pergunta: o seu Programa é eufórico quanto ao consumo, cabisbaixo em relação ao investimento

e omisso nas exportações.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

Protestos do BE e do PCP:

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Exemplo: com as medidas do IRC, que são pura ideologia, como é

que vai convencer as empresas a preferir Portugal para investir, e com isso criar emprego, ou como é que vai

evitar que as empresas portuguesas escolham sistemas ficais mais favoráveis para investir o que poderiam

investir em Portugal?

Aplausos do CDS-PP e de Deputados do PSD.

A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — E até agora, como é que tem sido?!

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Quarta e última pergunta: a CGTP Intersindical já anunciou para este

mês de dezembro, até ao final do ano, uma onda de greves, nomeadamente, e cito, na «CP, CP Carga, Metro

de Lisboa e STCP», que vão desde amanhã até fins de dezembro.

O Sr. João Oliveira (PCP): — O senhor tem de rever a afiliação dos sindicatos porque nem até nisso

acerta!

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Dr. António Costa, em nome de que é que o senhor vai ceder o

controlo do setor dos transportes ao PCP, para mandar as empresas deste setor paralisar a economia e,

sobretudo, tornar num inferno a vida das pessoas numa altura como a do Natal?!

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

Dr. António Costa, é que nós, em quatro anos, tivemos 1073 greves, só no setor dos transportes.

O Sr. João Oliveira (PCP): — E mereciam mais!

Página 22

I SÉRIE — NÚMERO 12

22

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — O senhor ainda agora aqui chegou e já tem estas? Sublinho, uma

onda de greves! Sr. Dr. António Costa, em nome de quê e porquê entregou os transportes ao PCP?!

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

Protestos do PCP.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para responder, o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Nuno Magalhães, em si saúdo toda a bancada do

seu partido, as Sr.as

e os Srs. Deputados do CDS-PP.

Sr. Deputado, não me classifico como vencedor ou perdedor porque, verdadeiramente, já não me lembro

desde quando o CDS não vai a votos.

Risos e aplausos do PS e de Deputados do BE.

Protestos do CDS-PP e do PSD.

Mas permita-me que procure atenuar o seu discurso algo tenso com uma pequena nota de humor: é

verdade que fui eu que negociei com o PCP, mas, pelos vistos, foram os senhores que ficaram com a cassete!

Risos do BE.

Risos e aplausos do PS.

E aquilo que o Sr. Deputado…

Protestos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, deixem o Sr. Primeiro-Ministro responder, se faz favor.

O Sr. Primeiro-Ministro: — E o que o Sr. Deputado Nuno Magalhães qualifica de inédito é simplesmente o

que tem acontecido em todas as eleições para a Assembleia Constituinte e para a Assembleia da República.

Os portugueses votam e esses votos são convertidos em mandatos. Quem tem mais votos, tem mais

mandatos; quem tem menos votos, tem menos mandatos. Por que razão é que o PPD e o CDS, juntos, têm

menos Deputados do que o PS, o BE, o PCP e o PEV?

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — E o PAN?

O Sr. Primeiro-Ministro: — E o PAN. Pela mesma razão que uns e outros sempre tiveram mais mandatos

ou menos mandatos! É porque tiveram mais votos ou menos votos.

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Desculpe, mas não se percebeu!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Na legislatura anterior, o PSD e o CDS bastavam-se para ser maioria.

Acontece que na nova Assembleia da República o PSD e o CDS não se bastam para ser maioria. O que é que

aconteceu? É que os outros partidos, que, em conjunto, formam a maioria, não se limitaram a impedir a

formação de um governo do PSD e do CDS, não se limitaram a ter uma atitude de obstrução,…

Risos de Deputados do PSD.

Página 23

3 DE DEZEMBRO DE 2015

23

… não se limitaram a ter uma atitude de ficar à espera da melhor oportunidade para vos deitar abaixo, mas

encontraram, desde o primeiro minuto, uma alternativa de Governo que tem um suporte maioritário nesta

Assembleia da República. Isto é, simplesmente, a regra da democracia.

Aplausos do PS.

O Sr. Deputado Nuno Magalhães tinha a obrigação de nos conhecer e, portanto, de saber bem…

Protestos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Irrita-se!

O Sr. Primeiro-Ministro: — … de saber bem que não temos a menor das dúvidas de que é do estrito

interesse nacional que nada aconteça nos próximos 29 dias que possa perturbar um objetivo do qual todo o

País comunga, o de que o País possa sair do procedimento por défice excessivo.

Portanto, este Governo, nos próximos 29 dias, tudo fará…

O Sr. António Carlos Monteiro (CDS-PP): — Para não estragar!

O Sr. Primeiro-Ministro: — … para não diminuir a receita nem aumentar a despesa relativamente ao

ponto em que estávamos no dia em que tomámos posse. E aquilo que desejo profundamente, em nome do

interesse nacional e também do interesse deste Governo, é que, a partir do final do próximo ano, Portugal

possa viver sem estar sujeito às regras do procedimento por défice excessivo.

Diz o Sr. Deputado Nuno Magalhães que um dos partidos que apoia este Governo, diria mesmo três dos

partidos que apoiam este Governo…

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Todos menos o PS!

O Sr. Primeiro-Ministro: — … não só não defendem o tratado orçamental como são contra o tratado

orçamental e são mesmo indiferentes ao cumprimento das metas do tratado orçamental. É essa a posição

conhecida do BE, do PCP e do PEV.

Mas também é conhecido o entendimento que tem o Partido Socialista e que está expresso no Programa

do Governo. Nós entendemos que o tratado deve ser mudado, mas, como todos os tratados que vinculam

Portugal e em nome do princípio da continuidade do Estado, o Estado deve respeitar os tratados a que está

vinculado enquanto eles se mantiverem em vigor. Portanto, este Governo nada fará para não cumprir os

tratados a que está obrigado.

Mais: é muito claro que nenhum dos partidos que apoiam este Governo teve de revogar princípios que

consideram irrevogáveis,…

O Sr. João Oliveira (PCP): — Verdadeiramente irrevogáveis!

O Sr. Primeiro-Ministro: — … nem o Partido Socialista teve de abdicar do cumprimento de um objetivo

que constava do seu programa eleitoral e que se mantém neste Programa do Governo. É que o que tem por

base este entendimento, este acordo, esta posição conjunta, como lhe queiram chamar, é um princípio de

enorme transparência. Respeitamos a pluralidade da identidade de cada um e convergimos no que

consideramos prioritário e essencial para dar resposta ao que consideramos urgente para o País: virar a

página da austeridade, permitir mais crescimento, melhor emprego e maior igualdade. Esta é a base do

entendimento e é isso que cimenta este acordo e nada mais.

Aplausos do PS.

Diz o Sr. Deputado, apoquentado, que teme os efeitos na economia.

Página 24

I SÉRIE — NÚMERO 12

24

A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Apoquentado!…

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Deputado, por favor, depois dos resultados já testados, das soluções

mágicas que quiseram aplicar a Portugal, como se fosse um laboratório, para, através da austeridade cega

que praticaram, dessa vontade e da ambição de radicalismo de irem para além da troica, com os resultados

que alcançaram, têm agora medo da mudança de políticas? Sr. Deputado, há uma coisa que lhe posso

garantir: a mudança de políticas mudará os resultados alcançados,…

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Disso é que eu tenho medo!

O Sr. Primeiro-Ministro: — … porque a continuação dessas políticas só pode conduzir ao mesmo

resultado que os senhores alcançaram.

Aplausos do PS.

Última nota: acho absolutamente extraordinário que o Sr. Deputado Nuno Magalhães venha aqui colocar a

questão dos transportes públicos e, em particular, dos transportes públicos urbanos de Lisboa e do Porto nos

termos em que o fez.

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Pois com certeza! É o que as pessoas sentem!

O Sr. Primeiro-Ministro: — É que o que as pessoas têm verificado, ao longo dos últimos anos, é que com

a política prosseguida pelo anterior Governo o País e as cidades tiveram 1073 greves, que aqui enunciou.

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Até março!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Esse é o resultado da forma intransigente, teimosa e de puro preconceito

ideológico que levou o Governo a recusar um entendimento com a Câmara do Porto e com a Área

Metropolitana do Porto, com a Câmara Municipal de Lisboa e com a Área Metropolitana de Lisboa, e essa

teimosia assenta, simplesmente, num preconceito, o de que a gestão privada é melhor do que a gestão

pública,…

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Pelo menos não há greves!

O Sr. Primeiro-Ministro: — … mesmo quando essa gestão privada é assegurada por uma empresa

pública espanhola a quem o Governo entregou parte dos transportes públicos do Porto porque não confia nas

autarquias locais.

Aplausos do PS.

Ora, o senhor presta, certamente, um elogio grande ao PCP,…

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — É quem manda!

O Sr. Primeiro-Ministro: — … confundindo o PCP com o poder local democrático, confundindo o PCP com

os cidadãos e confundindo o PCP com a vontade de termos um serviço público urbano de transporte de

qualidade, que é absolutamente essencial para o desenvolvimento das cidades e para a qualidade do

ambiente urbano. É isso que queremos garantir e é isso que iremos garantir.

Aplausos do PS, do BE e do PCP.

Página 25

3 DE DEZEMBRO DE 2015

25

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — E viva a greve!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Para terminar diria que, felizmente, a cegueira e o radicalismo foi tanto, a

trapalhada foi tanta que o Tribunal de Contas não visou os contratos e hoje é possível desfazer essa negociata

sem que isso custe dinheiro ao Estado nem implique indemnizações que o Estado teria de pagar.

Aplausos do PS, do BE e do PCP.

O Sr. Presidente: — Para pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Jerónimo de Sousa,

do PCP.

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, no processo político decorrente

das eleições legislativas e após a tomada de posse do Governo do PS, estamos hoje numa outra fase, a da

discussão do Programa do Governo.

PSD e CDS sofreram um pesado revés eleitoral, perdendo a maioria e ficando limitados a uma minoria,

incapaz de formar governo e de ver aprovado o seu Programa, no quadro da nova expressão e arrumação de

forças na Assembleia da República, arrumação de forças de onde emanou uma solução política e institucional

alternativa, sustentada por uma maioria de Deputados eleitos pelos portugueses.

Daqui releva um facto: a maioria do povo português expressou a vontade de ver fora das suas vidas o

Governo do PSD e do CDS, vontade alicerçada num anseio profundo de parar com a política de exploração e

empobrecimento, na esperança de ter uma vida melhor.

No seu esforço de guerrilha e de crispação, PSD e CDS recusam-se a aceitar essa expressão da vontade

popular e a analisar as causas que levaram a que cerca de 700 000 portugueses — um CDS inteiro! —

tivessem abandonado a sua coligação…

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Um PCP inteiro!

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — … e quisessem impedir que o Governo do PSD e do CDS levasse por

diante a sua política de destruição económica e social, de afundamento e declínio do País, tratando as

injustiças e o drama de muitas vidas como meros danos colaterais.

O desemprego que aí está, e se mantém, a níveis elevados; a precariedade já não só do trabalho mas da

própria vida de centenas e centenas de milhares de portugueses que se viram despojados de condições

mínimas de vida; todos esses dramas que atingem milhões de portugueses continuam a ser desprezados pelo

PSD e pelo CDS, que preferem alimentar uma estéril guerrilha política.

A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Exatamente!

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — PSD e CDS exercitam as diferenças e as divergências programáticas

entre PS e PCP como se tivessem descoberto a pólvora, como se da nossa parte alguma vez tivesse havido

ocultação ou até abdicação da identidade, do projeto, do programa, como se não existisse o compromisso do

PCP assumido e mantido com os trabalhadores e o povo português.

Compreende-se que PSD e CDS queiram esconder aquilo que em concreto foi possível PS e PCP

identificarem como elementos de convergência na resposta a problemas e anseios dos trabalhadores e do

povo e que estão vertidos no Programa do Governo que hoje discutimos.

Este Programa acolheu um conjunto de propostas que, na sua concretização, podem contribuir para

melhorar, ainda que de forma limitada, a vida de milhões de portugueses, particularmente dos trabalhadores,

dos reformados, dos jovens, das mulheres, dos pequenos e médios empresários. Medidas de reposição de

salários, de descongelamento das pensões, de reposição dos complementos de reforma dos trabalhadores do

setor empresarial do Estado e de outros rendimentos e direitos, incluindo feriados, prestações sociais,

medidas de combate à precariedade, aos falsos recibos verdes, ao recurso abusivo a estágios ou de

conversão de bolsas em contratos de investigação. Medidas de diminuição da carga fiscal, nomeadamente do

IVA da restauração, de introdução da cláusula de salvaguarda do IMI, da dotação dos recursos humanos,

Página 26

I SÉRIE — NÚMERO 12

26

técnicos e financeiros necessários à qualidade dos cuidados de saúde prestados pelo SNS, de eliminação do

obstáculo que as taxas moderadoras constituem no acesso à saúde ou na reposição do transporte de doentes

não urgentes.

Na educação, com um importante conjunto de medidas, designadamente, visando o reforço da ação social

escolar, a progressiva gratuitidade dos manuais escolares no ensino obrigatório ou a redução do número de

alunos por turma, tal como em relação a outros serviços públicos, nomeadamente da segurança social e dos

transportes.

É verdade que este não é um Programa do PCP, este é um Programa do Governo do PS, um Programa

que reconhece que foram erradas as políticas promovidas nos últimos anos. Registamos a vontade de

mudança que expressa e contribuiremos para que a vida a confirme.

Vinte e um dias depois da derrota do Programa do Governo PSD/CDS poderíamos colocar a questão de

saber quanto tempo mais precisamos para descobrir todas as surpresas desagradáveis que o anterior

Governo PSD/CDS deixa ao País.

Nestes vinte e um dias já confirmámos que a devolução da sobretaxa era um embuste, já descobrimos que

a execução orçamental desmente as promessas feitas quanto ao défice e já confirmámos que o BANIF é

mesmo um motivo de preocupação para os portugueses.

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Isso há dois anos que já é!

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — O que haverá mais para descobrir e quanto tempo demorará essa

descoberta será uma boa questão a colocar.

Permitam-me outra questão. O Programa do Governo do PS que hoje discutimos terá de enfrentar a

contradição entre o grau de concretização dos seus objetivos estruturantes — da criação de emprego, do

investimento, do crescimento económico e do desenvolvimento — no quadro dos constrangimentos externos

existentes que nos são impostos e cujos instrumentos de realização têm sido dogmas intocáveis para o PSD e

para o CDS, com as graves consequências que se conhecem e estão plasmadas na grave realidade

económica, social e cultural do País.

É necessário ultrapassar a divergência existente entre uma realidade aprisionada em regras e

constrangimentos draconianos e estéreis e a necessidade de afirmar o nosso desenvolvimento soberano. Esta

é uma pergunta que os portugueses colocam a si próprios e para a qual, estamos certos, gostariam de ter uma

resposta do Primeiro-Ministro, para lhes garantir um outro futuro a que aspiram e merecem.

Valorizamos a resposta a problemas mais urgentes dos portugueses, ao mesmo tempo que colocamos a

necessidade evidente de uma política patriótica e de esquerda.

Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, houve uma derrota que ainda aqui não foi falada, a da ideologia das

inevitabilidades, que tudo justificava e tudo impunha.

Aplausos do PCP, do PS, do BE e de Os Verdes.

Está aberta uma janela de esperança, aquela esperança que não fica à espera. Estará de acordo, Sr.

Primeiro-Ministro, que é necessário concretizá-la.

Aplausos do PCP, do PS, do BE e de Os Verdes.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Jerónimo de Sousa, muito obrigado e, em si,

queria saudar todas e todos os Srs. Deputados do PCP e o contributo que deram para que seja possível ao

País ter esta solução de governo.

O Sr. Deputado começou por colocar a questão no devido ponto. A direita tem dificuldade em compreender

que a esquerda, apesar de ser plural, seja capaz de se entender naquilo que é essencial.

A pluralidade e as nossas diferenças não são um fator de fraqueza; pelo contrário, é a identidade própria

de cada um que dá força a este coletivo e a esta convergência que foi possível realizar.

Página 27

3 DE DEZEMBRO DE 2015

27

Aplausos do PS.

O Sr. Paulo Portas: — Já é um coletivo!

O Sr. Primeiro-Ministro: — E aquilo que é efetivamente de saudar é a capacidade que os diferentes

partidos tiveram de estar à altura das suas responsabilidades e de, perante uma vontade muito clara do povo

português de que houvesse uma mudança de política, termos sido capazes de virar, também nós, uma página

e assumir as responsabilidades que nos competiam, para não frustrar a única oportunidade de que essa

maioria eleitoral que rejeitava as políticas da direita se pudesse converter também numa maioria que fosse

uma solução de governo. Isso é algo que é importante enfatizar e cuja importância política não pode ser

diminuída.

Agora, isso assenta, obviamente, na clareza e na transparência do respeito pelos princípios de uns e de

outros. É sabido que temos uma visão diferente sobre a Europa, mas ambos partilhamos a preocupação da

necessidade que a Europa também crie as condições para que esta moeda única não contribua para acentuar

ainda mais as assimetrias entre as diferentes economias e, pelo contrário, que possamos retomar um

processo de convergência.

Sei bem que o PCP considera que é difícil este esforço de compatibilização. Os compromissos que

assumimos com o PCP são compromissos que avaliámos, que medimos e que nas projeções que fazemos da

nossa trajetória orçamental consideramos absolutamente compatíveis.

Bem sei que o PCP também definiu a regra, como nós definimos a regra. Nós queremos cumprir uma

trajetória e o PCP disse, com toda a clareza, o que é que, para cumprir essa trajetória, não está disponível

para apoiar. Aquilo que o PCP não está disponível para apoiar, também é preciso ser claro, é o que também

nós não estamos disponíveis para propor.

Aplausos do PS.

Portanto, o caminho não será certamente fácil, mas o que é importante é termos decidido iniciar esta

caminhada. E temo-lo feito de uma forma aberta, de boa-fé e com base na confiança mútua.

Quando aqui digo que este é um Governo confiante é porque nós sabemos que podemos confiar naqueles

com quem criámos esta solução de governo e que, designadamente, podemos confiar no PCP para esta

capacidade de governar na perspetiva da Legislatura. É essa a confiança que temos e é essa confiança que

depositamos, também, no diálogo e no trabalho conjunto com o PCP.

É verdade que impressiona olhar agora para aquilo que foram as declarações do então Primeiro-Ministro e

da então Ministra das Finanças sobre as garantias que foram dadas, a poucos dias das eleições, sobre a

devolução da sobretaxa.

É impressionante ver como em julho se perspetivava uma devolução de 19%, como em agosto a devolução

já ia nos 25% e como em setembro, em cima das eleições, já ia quase nos 36%. E de repente, subitamente,

ainda na vigência desse Governo, veio a verificar-se que, afinal, a perspetiva é a de chegar ao final do ano e a

devolução da sobretaxa do IRS ser 0%, não tendo passado de nada mais do que de uma monumental

tentativa de fraude eleitoral com que se quiseram enganar os portugueses e os eleitores.

Aplausos do PS, do BE e do PCP.

Mas há uma coisa que podemos garantir: a partir do próximo ano não haverá «ses». A partir do próximo

ano e de acordo com aquilo que será deliberado por esta Assembleia da República, a sobretaxa começará

mesmo a ser eliminada, porque a questão não é a de devolver nem 9%, nem 15%, nem 36%, é de, pura e

simplesmente, eliminar a sobretaxa. É esse o compromisso que temos e que temos de concretizar.

Aplausos do PS e do PCP.

Página 28

I SÉRIE — NÚMERO 12

28

É verdade que temos constrangimentos externos e que temos posições diferentes sobre os

constrangimentos externos. Agora, a visão que temos é a de que, na Europa, Portugal tem também uma

palavra a dizer. E a Europa em que acreditamos, a Europa por que nos temos de bater é uma Europa onde

todos os Estados são iguais.

É evidente, como tenho dito, que, numa negociação a 28, ninguém pode prometer o resultado. E a

experiência de outros Estados já demonstrou que não é pela via isolada e confrontacional que podemos

encontrar soluções. É criando alianças, é abrindo espaços, é criando diálogo e perspetivas de alternativa que

podemos, também no quadro da Europa, encontrar a margem de manobra de que necessitamos para pôr

termo a esta divergência, que se iniciou no princípio deste século, e retomar a trajetória de convergência que

tivemos nos nossos primeiros 15 anos de participação no quadro da União Europeia.

Esse é um esforço que temos de fazer, que temos de fazer todos, independentemente das diferentes

perspetivas que cada um tem sobre a natureza e o que deve ser o futuro da Europa.

Mas há uma coisa sobre a qual temos de estar todos entendidos: na Europa, o nosso primeiro dever é

defender os interesses de Portugal, os interesses da economia portuguesa e o interesse dos portugueses.

Essa é a nossa postura e será assim que nos bateremos na Europa.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, quero começar por

cumprimentá-lo, em nome do Grupo Parlamentar Partido Ecologista «Os Verdes», assim como todas as Sr.as

e

todos os Srs. Membros do Governo, Sr.as

e Srs. Deputados.

Sr. Primeiro-Ministro, esta questão que quer o PSD quer o CDS hoje trouxeram para encher os seus

discursos aqui, na Assembleia da República, no debate sobre o Programa do Governo — e refiro-me à

questão da legitimidade do Governo —, não se coloca, Sr. Primeiro-Ministro, porque o PSD e o CDS não

considerem que o Governo não seja, de facto, legítimo. Eles sabem que o Governo tem legitimidade política,

como é evidente. Aquilo que eles não querem que se prove é que pode existir, em Portugal, uma política

alternativa, diferente daquilo que eles fizeram. É esse o pavor que eles têm. E é por isso que consideram que

não há legitimidade para praticar uma política diferente, uma política que traga resultados diferentes daqueles

que trouxe, neste caso, a governação do PSD e do CDS.

É evidente que há legitimidade quando estão eleitos 230 Deputados, e quando PSD e CDS, sozinhos, não

conseguem uma maioria na Assembleia da República e não têm, pura e simplesmente, nenhuma outra força

política que lhes dê a mão, porque as outras forças políticas comprometeram-se com uma mudança. Então,

Sr. Primeiro-Ministro, é para essa mudança que nós temos de trabalhar.

E para trabalhar para essa mudança, Sr. Primeiro-Ministro, há uma primeira coisa que temos de fazer: uma

política de verdade. Acabou a política da mentira e da ilusão. Não pode continuar mais, Sr. Primeiro-Ministro!

Risos do Deputado do PSD Hugo Lopes Soares.

Não pode haver, num ano, 100 000, 150 000 pessoas a emigrar e o Governo continuar a dizer que o nível

da emigração não é nada de especial, porque, no passado, sempre foi assim. Não pode haver mais 800 000

pobres e o Governo erradicar do seu discurso o nível de pobreza que existe, em Portugal. Não pode um

Governo dizer que uma sobretaxa vai ser devolvida aos portugueses em 35%, quando, na verdade, sabia já,

na altura, que o resultado seria zero. Sabia já, na altura, Sr. Primeiro-Ministro! Não pode um Governo dizer

que isto, agora, anda tudo a galope no crescimento económico, quando o INE nos vem dizer que a estagnação

do crescimento económico está à vista.

Sr. Primeiro-Ministro, esta é a primeira questão: uma política de verdade.

A segunda questão, Sr. Primeiro-Ministro, é esta: para Os Verdes, há um compromisso fundamental e

prioritário com o País que é o combate às desigualdades — e a dois níveis. Um deles tem obviamente a ver

com a matéria da pobreza.

Página 29

3 DE DEZEMBRO DE 2015

29

O PSD e o CDS procuraram criar um modelo em que era fundamental que uma faixa determinada da

população caísse na pobreza para esse mesmo modelo se sustentar. E não apenas que caísse na pobreza,

mas que se mantivesse na pobreza, que se habituasse a esse nível de pobreza, para que o seu modelo

pudesse funcionar, um modelo de serviço ao grande poder económico e financeiro. E isto não é um modelo

sustentável para o País.

É por isso que lhe peço, Sr. Primeiro-Ministro, que discrimine aqui algumas medidas essenciais para

combatermos a pobreza no curto e no médio prazos.

É evidente que o descongelamento das pensões é uma questão prioritária, é evidente que o aumento do

salário mínimo nacional é fundamental, …

O Sr. João Oliveira (PCP): — É verdade!

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — … é evidente que a reposição dos salários que foram roubados é

fundamental, mas há mais medidas, Sr. Primeiro-Ministro. Como é que vamos inverter este ciclo de

empobrecimento das pessoas, no País?

Há ainda outra matéria fundamental naquilo que se refere ao combate às desigualdades, que tem a ver

com as assimetrias regionais no País.

Pura e simplesmente, PSD e CDS trabalharam para esquecer uma boa parte do nosso território nacional e

as potencialidades que esse território e as pessoas que estão nesse território têm para oferecer ao

crescimento e ao desenvolvimento do País. E é evidente que, se são fundamentais os serviços públicos, o

investimento e o incentivo à instalação de empresas no interior do País, há outra matéria que é fundamental,

que é a matéria da mobilidade, dos transportes. E fundamentalmente agora que ocorre a Cimeira de Paris e

que se discutem os efeitos e as consequências das alterações climáticas e que nós sabemos também que o

setor dos transportes é dos maiores emissores de gases com efeito de estufa, então, Sr. Primeiro-Ministro, o

setor dos transportes tem de ser uma prioridade, em Portugal, quer na lógica urbana, quer na lógica da ligação

do País.

O Sr. Presidente: — Já ultrapassou o seu tempo, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Vou terminar, Sr. Presidente.

Ora, o transporte ferroviário é uma peça-chave nesta mobilidade que se quer mais ecológica, mais amiga

do ambiente e mais amiga das pessoas, porque lhes permite justamente essa mobilidade que lhes é negada.

Gostava também de um comentário do Sr. Primeiro-Ministro sobre aquilo que o Programa do Governo tem

para oferecer nesta matéria.

Aplausos de Os Verdes, do BE e do PCP.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia, quero também saudar, em si,

o Grupo Parlamentar Partido Ecologista «Os Verdes» e o apoio e o contributo que deram para a criação de

uma solução de suporte maioritário a este Governo na Assembleia da República.

A direita começou por confundir aritmética com economia. Por isso, achou que, se cortasse na despesa,

diminuiria seguramente o défice, desconhecendo o efeito que o ter ido além da troica teve em 2012, e achou

que, se aumentasse simplesmente os impostos, aumentaria a receita, desconhecendo o efeito que isso teve

na economia.

A verdade é que o ter ido além da troica e o enorme aumento de impostos em 2012 teve como resultado

um enorme efeito recessivo na economia, que não diminuiu o défice, pelo contrário, agravou o défice e

aumentou o endividamento do País.

A direita acreditou que tinha mudado o paradigma do nosso modelo de desenvolvimento, chegou até a ser

anunciado que hoje crescíamos com base nas exportações e que as importações tinham diminuído,

simplesmente porque tinham cortado os salários e tinham aumentado o empobrecimento do País.

Página 30

I SÉRIE — NÚMERO 12

30

Ora, mudar o paradigma do desenvolvimento não é ficarmos todos tão pobres que não podemos comprar

nada, nem aquilo que é importado nem aquilo que é produzido nacionalmente.

É por isso que aquilo que temos verificado nos últimos anos é que, apesar de ter havido um aumento do

consumo, ele não foi sustentado saudavelmente no aumento do rendimento mas no aumento do

endividamento, e não contribuiu para um aumento da produção nacional mas simplesmente para um aumento

das importações.

O modelo que a direita tinha dito que era um modelo que tinha funcionado não funcionou, não resultou e

nós temos de virar a página a essa política.

É por isso que é necessário afirmar uma alternativa. Perguntam: «Mas como é que se paga?» Paga-se

precisamente porque, se tivermos uma economia a funcionar, temos melhores condições para aumentar a

receita e temos melhores condições para diminuir a despesa.

Não queremos diminuir a despesa com o subsídio de desemprego porque cortamos o acesso ao subsídio

de desemprego a quem está desempregado. Queremos que haja uma diminuição da despesa com o subsídio

de desemprego porque queremos que haja menos desempregados e mais emprego, mais pessoas

empregadas e a trabalhar.

Aplausos do PS.

Não queremos aumentar a receita fiscal por via do aumento da carga fiscal mas por via do aumento do

rendimento, do aumento das pessoas que têm rendimentos, do aumento do número de contribuintes, para,

assim, podermos ter finanças públicas consolidadas de um modo mais saudável.

É essa alternativa que temos de construir e esse virar de página que temos de fazer.

E tem razão, Sr.ª Deputada, eles recusam-se a aceitar essa evidência, a de que havia uma alternativa. Por

isso acreditaram que podiam estar hoje a governar, e podiam estar hoje a governar contra a vontade da

maioria do povo português. Mas a resposta que fomos capazes de dar foi a de termos conseguido transformar

numa maioria de suporte a um governo aquilo que foi a maioria eleitoral expressa pelos portugueses nas

eleições. E é isso que dá a legitimidade e é isso que dá a força política e democrática a esta política.

Aplausos do PS.

O combate à desigualdade, em particular à pobreza, é prioritário. Claro que, antes da pobreza, não

podemos aceitar a continuação do empobrecimento salarial. Assim, o combate à desigualdade passa pelo

salário mínimo, mas passa por outro fator fundamental, que é o de desbloquear a contratação coletiva, porque

a contratação coletiva é essencial para reequilibrar as relações de poder nas empresas e podermos ter, de

uma forma mais saudável e ajustada a cada setor, uma melhor progressão salarial.

Mas temos medidas específicas de combate à pobreza, a saber: o restabelecimento do âmbito de acesso

ao complemento solidário para idosos e ao rendimento social de inserção; uma estratégia nacional de combate

à pobreza infantil e juvenil; e a previsão de uma nova prestação social dirigida especificamente aos

trabalhadores, àqueles que, descontando rendimentos do trabalho, chegam ao final do ano e se encontram

abaixo do limiar de pobreza e que hoje, de uma forma ofensiva para o que é a dignidade do trabalho, já são

10% das pessoas que fazem descontos de rendimentos do trabalho.

Ora, é inaceitável numa sociedade decente que quem trabalhe se encontre, no final do ano, abaixo do

limiar de pobreza. Isso tem de ser compensado e essa nova prestação tem de ser introduzida para combater

os níveis de pobreza, em Portugal.

Finalmente, a aposta na ferrovia é essencial, como a aposta no transporte público em geral é fundamental.

E é hoje uma aposta decisiva também, essencialmente, por questões ambientais.

É por isso que, na nova orgânica do Governo, fizemos uma alteração da maior importância, que foi passar

a tutela dos transportes públicos urbanos do Ministério do Planeamento e das Infraestruturas para o Ministério

do Ambiente. Isto porque queremos que haja um investimento decisivo na melhoria do ambiente urbano e

porque o grande desafio civilizacional das alterações climáticas perde-se ou ganha-se nas cidades — e perde-

se ou ganha-se nas cidades em função da eficiência energética que seja possível adquirir nas cidades. E, aí,

em dois domínios fundamentais: a eficiência energética do edificado, e daí a prioridade à reabilitação, e a

Página 31

3 DE DEZEMBRO DE 2015

31

eficiência energética na mobilidade, e daí a aposta no transporte público e a unificação desta política de

ambiente urbano na tutela do Ministério do Ambiente, para que essa possa ser um motor importante de um

novo paradigma energético em Portugal e de uma nova aposta na qualidade do ambiente e do contributo de

Portugal para a melhoria das condições de combate às alterações climáticas. Essa é também uma prioridade

da ação política deste Governo.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado André Silva.

O Sr. André Silva (PAN): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro e restantes Membros do Governo, Sr.as

e

Srs. Deputados e todos os presentes na Sala, quero começar por expressar os meus votos de sucesso ao

novo Executivo e felicitar a integração, neste Programa de Governo, de algumas medidas no âmbito da

proteção animal, uma aparente nova posição face ao setor da água e o desagravamento das restrições

económicas e sociais desajustadas.

No entanto, a sua análise detalhada revela algumas insuficiências na abordagem de outros temas

estruturantes e suscita várias questões, que passo a colocar.

O Capítulo IV refere a criação de um «Programa Nacional de Educação para a Saúde, Literacia e

Autocuidados». Sabendo que uma elevada percentagem do Orçamento do Estado vai para o tratamento de

doenças crónicas não transmissíveis, muitas delas relacionadas com maus hábitos alimentares, considera o

Sr. Primeiro-Ministro a inclusão de medidas concretas, como, por exemplo, a introdução gradual de alimentos

biológicos em cantinas e refeitórios da Administração Pública?

Segunda questão: no capítulo VI, página 185, que remete para a liderança da transição energética, o

Programa prevê a revisão do Plano Nacional de Barragens. A medida não inclui a expressão «suspensão»,

tão só e apenas a «revisão» do Plano. É assim incontornável pensar-se que a mera referência a uma

«revisão» não exige, da parte do PS, a paragem atempada dos processos de licenciamento e de construção

das barragens que faltam.

Sabemos que os processos de revisão no nosso país são muitas vezes prolongados no tempo. Assim, a

questão que gostaríamos de ver respondida é a seguinte: a revisão do Plano Nacional de Barragens será

acompanhada da imediata e necessária suspensão dos licenciamentos e construções até que exista uma

conclusão da dita revisão?

Terceira questão: este Programa defende a exploração de gás e petróleo na costa marítima do Algarve.

Esta exploração põe em risco a principal atividade económica da região, o turismo, que funciona ainda como

principal alavanca do resto dos setores da vida económica do Algarve. Uma vez que a experiência histórica

mundial dos acidentes em plataformas de exploração de petróleo permite afirmar a probabilidade de que

gravíssimos e devastadores acidentes ambientais possam ocorrer na costa e praias do Algarve, ainda assim,

Sr. Primeiro-Ministro, considera que devemos continuar a subjugar de forma irreversível o nosso bem comum

aos interesses económicos?

O Sr. Presidente: — Já ultrapassou o seu tempo, Sr. Deputado.

O Sr. André Silva (PAN): — A última questão que quero colocar é a seguinte: a Assembleia Municipal de

Lisboa aprovou recentemente, por larga maioria, uma moção dirigida à Assembleia da República para que se

inclua nas competências municipais a proibição de atos de violência contra animais, incluindo touradas. Está o

Governo disponível para acompanhar esta ideia que visa dar liberdade de decisão a cada município?

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr. Deputado, queria saudá-lo pela primeira eleição do PAN

para esta Assembleia da República e pelo diálogo que mantivemos, que permitiu enriquecer o Programa do

Governo com um conjunto de contributos que o PAN apresentou.

Página 32

I SÉRIE — NÚMERO 12

32

Relativamente à questão das touradas, como sabe, o nosso Governo dá uma grande prioridade ao reforço

da descentralização e ao entendimento de que a descentralização deve mesmo ser a pedra angular da

reforma do Estado.

Os municípios com atividade tauromáquica são menos de 50 no conjunto do país. Há municípios onde é

uma tradição muito arreigada e há municípios que, por sua própria decisão, já excluíram essa atividade do seu

território.

Creio que a boa regra é confiar a cada um dos municípios a definição das decisões relativas à realização

desses espetáculos como de outro tipo de espetáculos também envolvendo animais.

Acho que a melhor forma não é estipular uma regra nacional, é fazê-lo em função da realidade específica

de cada um, da valia cultural que os espetáculos têm em cada um deles e das práticas que neles devem ou

não ser prosseguidos, por vontade democrática dos municípios.

Acho que temos boas razões para confiar nos municípios portugueses no sentido de um exercício

responsável dessa competência. Se assim o fizermos acho que respondemos simultaneamente àquilo que

devemos salvaguardar, isto é, por um lado, a preservação e o reforço do bem-estar animal e, por outro lado,

conter e respeitar as tradições nos espaços onde elas têm uma densidade que justifica que,

democraticamente, esses municípios entendam prosseguir essas práticas.

A atribuição dessa competência aos municípios abre, aliás, a porta a que possam ser os próprios cidadãos

desses municípios a, por via de referendo local, pronunciar-se sobre essa matéria e acho que devemos

apostar e confiar na democracia local para poder decidir e gerir essas decisões porque certamente serão

decisões que corresponderão, de uma forma mais genuína, à efetiva vontade popular e à natureza própria de

cada um dos municípios.

Uma segunda questão tem a ver com a promoção da saúde através da alteração dos hábitos alimentares.

Nessa matéria é, aliás, muito importante o trabalho que muitos municípios têm vindo a desenvolver no sentido

de criar programas de educação para a saúde através das ementas das refeições escolares. É importante que

essas práticas se generalizem de forma a podermos melhorar os nossos hábitos alimentares e que isso seja

feito desde a infância, porque condiciona definitivamente a evolução da saúde de cada um e contribui, de uma

forma saudável, para a promoção da saúde e para que a intervenção na saúde não surja exclusivamente na

fase da patologia, mas, pelo contrário, possa existir numa fase preventiva e de promoção e educação para a

saúde.

Relativamente às duas outras questões que colocou, o que consta do Programa do Governo é exatamente

aquilo que nos comprometemos fazer: por um lado, rever no mais curto prazo possível o Plano Nacional de

Barragens, fazendo as avaliações, e, por outro lado, avaliar os potenciais de recursos naturais do País, tendo

em conta a necessidade de compatibilizar com outras atividades económicas e também com um bem maior

que é necessário salvaguardar: a proteção ambiental de zonas sensíveis que importa preservar.

É nesse sentido que o Programa do Governo deve ser lido, deve ser entendido e que esses exercícios

devem ser prosseguidos.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Sr. Primeiro-Ministro, chegámos, assim, ao fim da primeira ronda de questões.

Inscreveram-se ainda mais 15 Sr.as

e Srs. Deputados para pedir esclarecimentos, tendo o Sr. Primeiro-

Ministro informado a Mesa que responderá por grupos de quatro.

Em primeiro lugar, para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Hugo Lopes Soares.

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Sr. Presidente, agradeço-lhe, sobretudo, por ter concedido em

primeiro lugar a palavra a um Deputado da bancada maioritária da Assembleia da República. É só uma

questão de fazer contas, Sr. Deputado Carlos César!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Queria cumprimentar o Sr. Primeiro-Ministro, as Sr.as

e os Srs. Membros do Governo, as Sr.as

e Srs.

Deputados.

Página 33

3 DE DEZEMBRO DE 2015

33

Sr. Primeiro-Ministro, discutimos, hoje, o Programa do Governo que trouxe à Assembleia da República e

que os portugueses nunca sufragaram. Não o sufragaram, porque este não é o programa eleitoral do Partido

Socialista, não é o programa eleitoral do Bloco de Esquerda, tão pouco é o programa eleitoral do Partido

Comunista Português. É uma espécie de rapsódia, Sr. Primeiro-Ministro, um conjunto desafinado de propostas

dos vários partidos sem qualquer coerência e, na verdade, o Sr. Primeiro-Ministro assume a sua paternidade.

O Sr. Primeiro-Ministro! Até porque as Sr.as

e os Srs. Ministros limitaram-se a assinar um contrato de adesão

cujo objetivo é, no fundo, o de ser um contrato de sociedade, mas um contrato de sociedade em que, bem ao

gosto da esquerda portuguesa, a golden share está na posse do Bloco de Esquerda e do Partido Comunista

Português.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Sr. Primeiro-Ministro, não rejeitamos o Programa do Governo apenas por rejeitar. Rejeitamo-lo porque ele

não vai ao encontro dos anseios das portuguesas e dos portugueses.

Queria recordar-lhe o dia 17 de setembro. Já lá vão 76 dias, 1824 horas, mas julgo que o Sr. Primeiro-

Ministro se recordará de certeza de um debate que ficou para a história das rádios portuguesas e que o Sr.

Primeiro-Ministro perdeu copiosamente. Perdeu esse debate, na ocasião, porque não foi capaz de dar uma

resposta para a qual eu pedia hoje a sua atenção. Julgo que é uma resposta que esta bancada, mas também

as bancadas da esquerda, e sobretudo os portugueses, esperam que dê.

No terceiro parágrafo da página 227 do programa eleitoral, o Sr. Primeiro-Ministro reafirma a vontade de

reforçar a aplicação de condições de recurso às prestações sociais não contributivas. De resto, o Sr. Primeiro-

Ministro anunciou em tempos que com isso previa uma poupança de 1000 milhões de euros. Sr. Primeiro-

Ministro, não me levará a mal que me dirija agora ao Bloco de Esquerda e ao Partido Comunista Português

para lhes perguntar se é para caucionar um corte nas prestações sociais não contributivas que o Bloco de

Esquerda e o Partido Comunista Português vão dar uso à tal golden share. É que, durante vários anos,

ouvimos aqui o que a esquerda bradava contra os cortes nas pensões. Hoje caucionarão esse corte nas

prestações não contributivas com a golden share que está na posse da esquerda mais radical das bancadas

do Parlamento!

Sr. Primeiro-Ministro, passo a colocar-lhe uma questão e não vale a pena depois entrarmos num jogo de

pingue-pongue. Não queira sacudir responsabilidades, pois é a si que agora cabe responder pela governação

e pelas propostas que escreve no Programa do Governo.

Sr. Primeiro-Ministro, quais são as prestações não contributivas da segurança social a que vai impor uma

condição de recursos? Tem de me dizer, a mim e aos portugueses, que prestações sociais é que vai cortar. É

o abono de família? São as bolsas de estudo? São os complementos sociais de pensões? É o rendimento

social de inserção?

Sr. Primeiro-Ministro, como lhe disse, passaram 76 dias e o Sr. Primeiro-Ministro não deu essas respostas.

Ora, hoje é o dia de as dar.

Queria lembrar-lhe também que se passaram 56 dias desde o último dia 4 de outubro, que foi o dia em que

o senhor perdeu as eleições legislativas!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado João Torres.

O Sr. João Torres (PS): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Primeiro-Ministro, dirijo-lhe neste momento

uma saudação muito especial pela sua nomeação e faço votos de concretização de um grande mandato e, por

aquilo que ouvi hoje, faço votos para que tenha uma inequívoca condição de paciência nesta Legislatura que

temos pela frente.

Sr. Primeiro-Ministro, ao longo dos últimos anos, foi evidente a degradação das condições de vida das

novas gerações.

A precariedade consolidou-se e a prová-lo está o nível médio salarial dos novos contratos de trabalho com

um salário pouco acima dos 500 €.

Página 34

I SÉRIE — NÚMERO 12

34

O desemprego jovem não deu mostras de um caminho de retrocesso consistente, cifrando-se acima dos

30%, um dos valores mais elevados do espaço europeu.

A emigração constituiu e constitui uma das maiores chagas da nossa sociedade, tendo levado, só em 2013

e 2014, à saída de 2% da nossa população. Portugal é mesmo o País com a mais alta taxa de emigração da

União Europeia.

Mas o que é mais grave, Sr. Presidente, Srs. Deputados e Sr. Primeiro-Ministro, é que todos estes

problemas afetaram o conjunto da nossa população, mas agrediram com especial intensidade as novas

gerações, tendo as suas famílias ficado privadas de um projeto de vida comum.

E mais grave ainda, Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro: não nos enganemos, todo este quadro resulta em

grande medida de uma opção política muito clara por parte da direita conservadora que nos governou ao longo

dos últimos anos.

Quando a geração mais qualificada de sempre mais precisou de um governo que garantisse os seus

direitos, incentivasse as suas capacidades e protegesse o seu futuro menos os portugueses puderam contar

com ele. Mas, Sr. Primeiro-Ministro, não é de estranhar. Afinal de contas o governo cessante acreditava que

era possível o País estar melhor mas os portugueses viverem pior!

Aplausos do PS.

E talvez por isso os portugueses e o Parlamento — sublinho, os portugueses e o Parlamento — tenham

levado a direita para essa zona de conforto que é o lugar da oposição, e, já agora, o lugar de conforto que é o

lugar da oposição da minoria do contra que se está a formar nesta Assembleia da República.

Srs. Deputados do PSD e do CDS, à visão pequenina do nosso País, poucochinho foi o que VV. Ex.as

fizeram com os jovens portugueses!

Aplausos do PS.

À visão pequenina do nosso País, poucochinho foi o que VV. Ex.as

fizeram! À visão pequenina do nosso

País urge contrapor uma nova abordagem, uma nova visão de conjunto para a construção do Portugal futuro!

É indispensável que o novo Governo que o Sr. Primeiro-Ministro lidera governe para todas as gerações ao

invés de instigar conflitos entre as gerações de portugueses.

Por isso, Sr. Primeiro-Ministro, pergunto-lhe o seguinte: que garantias pode dar de que o Governo da

República não continuará a incentivar a emigração forçada da juventude portuguesa? Tem confiança nas

novas gerações deste País? É que está mais do que provado que, nos últimos quatro anos, não houve nem

oportunidades sólidas nem alternativas de futuro para as novas gerações.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Soares, do Bloco de

Esquerda.

O Sr. Pedro Soares (BE): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, em primeiro lugar, felicito-o pelas suas

novas funções e desejo-lhe muitas felicidades.

É nossa convicção que este deverá ser o debate do Programa do Governo dos últimos 40 anos que mais é

acompanhado e que mais expetativas coloca aos portugueses.

A responsabilidade que temos, neste momento, é enorme. Defraudar estas expetativas, defraudar a

expetativa dos portugueses não faz parte do nosso manual de instruções.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Não têm noção nenhuma das coisas!

O Sr. Pedro Soares (BE): — Um dos elementos essenciais que certamente será critério de avaliação deste

Governo é a forma como conseguiremos recuperar o Estado social, que foi sujeito, nos últimos anos, a um

retrocesso conservador que trouxe mais desigualdade, mais pobreza e, consequentemente, menos

Página 35

3 DE DEZEMBRO DE 2015

35

desenvolvimento e menos justiça social. Esvaziar o Estado social de competências e meios foi um desígnio

indisfarçável da anterior maioria.

Um dos ataques mais brutais desencadeado contra a segurança social foi, certamente, o afastamento de

600 trabalhadores das suas funções, num processo conduzido de forma inaceitável em que a dignidade e os

direitos das pessoas foram colocados em causa e sujeitos a uma lei iníqua, a chamada «lei da requalificação».

Em contrapartida do afastamento destas centenas de trabalhadores, o anterior Governo da direita

empenhou-se, nos últimos dias do seu mandato, em fazer proliferar a nomeação de novos assessores, de

novas entidades para o aparelho de Estado.

Vozes do BE: — Muito bem!

O Sr. Pedro Soares (BE): — O afastamento destes trabalhadores não se deveu à extinção dos postos de

trabalho ou ao facto de não serem necessários. Em alguns dos serviços mais afetados, nomeadamente os que

se relacionam com a proteção das crianças em risco, esses técnicos, com o aumento da instabilidade familiar

e da pobreza infantil, são, mais do que nunca, necessários e fundamentais.

Uma lei de requalificação que, em vez de requalificar, corta salários e que, em vez de promover

qualificação, promete despedimentos não é uma lei da requalificação, é uma lei de «encapotamento» dos

despedimentos na função pública.

Vozes do BE: — Muito bem!

O Sr. Pedro Soares (BE): — Este Governo não pode cair na armadilha da direita, deve tomar medidas

urgentes que impeçam o primeiro despedimento, perpetrado pelo anterior Governo, de trabalhadores em

função pública já no final de janeiro.

Sr. Primeiro-Ministro, para quando a revogação da chamada «lei da requalificação»? É fundamental

reintegrar os trabalhadores colocados no falso regime de qualificação, porque requalificar a segurança social é

prestar mais apoio a quem necessita, a quem estamos obrigados, nomeadamente às crianças em risco, e é

prestar um maior apoio aos setores mais fragilizados da nossa sociedade.

É esta a expectativa que todos temos em relação a este Governo.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Rita Bessa.

A Sr.ª Ana Rita Bessa (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, na passada sexta-feira, foram

discutidos, nesta Câmara, dois projetos de lei, apresentados pelo Partido Comunista e pelo Bloco de

Esquerda, propondo a eliminação das provas do 1º ciclo e da prova de avaliação de conhecimentos e

capacidades.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Muito bem!

A Sr.ª Ana Rita Bessa (CDS-PP): — Em ambos os casos, são medidas cuja génese se deve ao Partido

Socialista. Em ambos os casos, na passada sexta-feira, o Partido Socialista esteve ao lado dos partidos de

esquerda, apoiando a sua abolição.

A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Muito bem!

A Sr.ª Ana Rita Bessa (CDS-PP): — Que estes partidos tenham trazido a Plenário estas iniciativas não nos

estranha, bem pelo contrário; elas faziam parte dos seus programas eleitorais. Já a posição do Partido

Socialista causa-nos, no mínimo, perplexidade. Por um lado, nenhuma destas medidas integra os três

documentos designados por «posição conjunta» celebrados entre PS e PCP, PS e BE e PS e Os Verdes e,

portanto, nada obriga o Governo minoritário do PS a esta capitulação.

Página 36

I SÉRIE — NÚMERO 12

36

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Muito bem!

A Sr.ª Ana Rita Bessa (CDS-PP): — Por outro lado, no programa eleitoral do PS e no Programa do

Governo conhecido horas depois naquela mesma sexta-feira, estas medidas são apresentadas com

expressões como «reavaliar», «suspender» e «reponderar», bem diferentes da eliminação sumária verificada.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

A Sr.ª Ana Rita Bessa (CDS-PP): — Portanto, em menos de 24 horas após a tomada de posse deste

Governo, sem que seja ainda conhecida a visão do Sr. Ministro da Educação, que aproveito para

cumprimentar, e mesmo antes do Programa do Governo ser tornado público, este era já «letra morta», sendo

«letra viva», afinal, a constante dos programas dos partidos radicais.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

A Sr.ª Ana Rita Bessa (CDS-PP): — Sr. Primeiro-Ministro, devemos, pois, assumir que em matéria de

Programa do Governo a palavra honrada não é a sua mas, antes, aquela que foi emprestada pelo Bloco e pelo

PCP?

Como pretende garantir a exigência e a transparência na rede pública de educação, tendo eliminado, sem

apelo, no caso dos alunos, as provas que permitiam, com intuito preventivo, a identificação do insucesso e, no

caso dos professores, a prova de admissão ao ingresso na carreira docente?

Será que também o Sr. Primeiro-Ministro se encontra enredado no binómio exigência-felicidade?

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Ana Rita Bessa, começo precisamente por lhe

responder a si, não sem antes a cumprimentar pela sua eleição.

Em primeiro lugar, queria dizer-lhe que a Assembleia da República é um órgão de soberania próprio que

goza de separação de poderes relativamente a um outro órgão de soberania, que é o Governo. A relação,

aqui, é a seguinte: é o Governo que responde perante a Assembleia e não é a Assembleia que responde

perante o Governo. Era o que faltava estar sujeita a visto prévio do Governo a aprovação de medidas

legislativas por parte da Assembleia da República!

Aplausos do PS.

Gostaria de deixar claro que, para nós, não há confusão entre a existência de mecanismos de aferição —

aliás, de acordo com as boas práticas internacionais — que permitam avaliar a qualidade e melhorar o

desempenho do sistema e provas de avaliação que não se destinam a melhorar a qualidade do sistema mas

simplesmente a selecionar os meninos que passam para o nível seguinte.

Aplausos do PS e do BE.

A diferença entre a aferição de um sistema e a avaliação do desempenho de uma criança não é só um jogo

de palavras, é uma visão completamente distinta em relação àquela que é a função da escola.

Aplausos do PS e do BE.

A prova que foi criada pelo anterior Governo obedeceu a uma visão da escola, uma escola orientada para a

seletividade e para a exclusão. A escola que nós queremos é orientada para a inclusão e para a igualdade de

Página 37

3 DE DEZEMBRO DE 2015

37

oportunidades, e é por isso que há toda uma diferença entre nós. E essa prova, felizmente, a Assembleia vai

eliminar.

Aplausos do PS.

Respondo agora ao Sr. Deputado Pedro Soares, a quem saúdo com particular prazer, dizendo-lhe que a

legislação atualmente em vigor autodenominada de requalificação vai ser suspensa, porque não é de

requalificação, é, pura e simplesmente, uma legislação que visa o despedimento e a perda de rendimentos por

parte dos funcionários públicos.

Aplausos do PS.

Posso dizer, sem prejuízo do que depois possa desenvolver o Sr. Ministro do Trabalho, Solidariedade e

Segurança Social quando fizer a sua intervenção neste debate, que relativamente ao que aconteceu no

anterior Ministério da Solidariedade e da Segurança Social, o atual Sr. Ministro está a trabalhar para

rapidamente pôr cobro à situação injusta em que se encontram as centenas de funcionários que foram

afastados e que, aliás, são imprescindíveis para o bom funcionamento de serviços essenciais para a deteção

precoce e para o combate à pobreza infantil, designadamente as comissões de proteção de crianças e jovens,

de onde foram afastadas muitas e muitas educadoras de infância que são absolutamente essenciais ao bom

desempenho e ao bom funcionamento do sistema, e isso será reposto tão breve quanto possível.

Aplausos do PS e do BE.

Relativamente às questões relacionadas com a juventude, queria dizer que foi, efetivamente, um dos

segmentos sociais mais penalizados pela política do anterior Governo — foi-o na educação e foi-o, sobretudo,

nas perspetivas de acesso e de integração no mercado de trabalho.

A sangria de emigração jovem é um dos dramas que o País tem de travar e conseguir inverter, e só há uma

forma de o fazer: devolver aos jovens a confiança no futuro do País. O primeiro sinal de confiança é contrariar

a mensagem do Governo anterior. A mensagem do Governo anterior foi dizer aos jovens «vão-se embora

porque não têm futuro em Portugal» e o que nós queremos dizer aos jovens é «voltem porque sem vocês

Portugal não tem futuro».

Aplausos do PS e do BE.

Para que isso aconteça é necessário combater a precariedade nas relações de trabalho. Para que isso

aconteça, é necessário ter, como aqui disse, políticas ativas de emprego seletivas que se concentrem no que

é essencial: não gastar dinheiro a subsidiar a precariedade mas a concentrar os recursos na criação de postos

de trabalho para jovens e jovens qualificados, pois não só é uma forma de os fixar e beneficiarmos do seu

talento, como também de beneficiarmos do seu impulso e contributo essencial para a modernização do nosso

tecido empresarial e da Administração Pública. É que o programa que temos que contempla a criação de

centros de competência na Administração Pública visa também agir e recrutar, rejuvenescendo os quadros da

administração com um conjunto de jovens qualificados que possam servir, de uma forma transversal, o

conjunto da ação do Estado, qualificando a nossa administração.

Há um setor particularmente importante, e que tem a ver com as universidades e com os centros de

investigação, onde, fruto das restrições à contratação, fruto do envelhecimento dos quadros e fruto da

emigração massiva dos jovens quadros, tem sido criado um gap geracional muito grave para o futuro dessas

instituições e para ser assegurada uma sadia transição de gerações no quadro das instituições. É por isso que

o Programa do Governo prevê um plano específico para a contratação de jovens investigadores de forma a

estabilizar a carreira de investigação e a poder fixar talento indispensável ao futuro do desenvolvimento da

ciência e da economia nacional.

Aplausos do PS.

Página 38

I SÉRIE — NÚMERO 12

38

Por fim, gostaria de recordar que uma das medidas mais importantes do Programa do Governo é o que

designámos de contrato-geração. Ou seja, é a possibilidade de, a partir de certa idade, poder passar-se a uma

reforma não antecipada mas a tempo parcial com a contrapartida da contratação de um jovem a tempo inteiro.

É uma forma de combinar o saber da experiência feito com o saber e o conhecimento adquiridos na formação

no ensino superior. É uma forma de reforçar a solidariedade entre gerações e é uma forma de assegurar,

também ao nível das empresas, uma transição de gerações sem momentos de rutura que, decerto, seriam

extremamente penalizadores. E isto significa que, para este Governo, há uma prioridade fundamental na

recuperação da confiança da juventude portuguesa no futuro do nosso País, sem a qual, o País, dificilmente

poderá ter futuro.

Sr. Deputado Hugo Lopes Soares, os últimos são, naturalmente, os primeiros e, sendo o PPD/PSD a maior

bancada parlamentar, deve ser tratado como tal.

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Os segundos é que são os primeiros!…

O Sr. Primeiro-Ministro: — Gostaria de dizer, tranquilizando o Sr. Deputado, que, amanhã, quando se

votar a moção de rejeição apresentada pelo PPD/PSD e pelo CDS-PP, há duas coisas que ficaremos a saber:

a primeira é que o PPD/PSD e o CDS-PP continuam a estar em minoria nesta Assembleia da República. E

continuam a estar em minoria nesta Assembleia da República por uma única e exclusiva razão: porque tiveram

quase menos 1 milhão de votos do que as restantes bancadas nas eleições do passado dia 4 de outubro.

Aplausos do PS e do BE.

Risos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP):—Já vão 300 mil a mais!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Mas há uma questão que ficamos sem saber e que, devo dizer-lhe, tenho

muita curiosidade em saber, que é a seguinte: vão propor rejeitar este Programa de Governo, vão propor a

demissão deste Governo.

O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — Sempre! Sempre!

O Sr. Primeiro-Ministro: — E pergunto: que alternativa é que apresentam ao País relativamente a este

Governo?!

Aplausos do PS.

Protestos do PSD.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Gostaram tanto do resultado das eleições que querem repetir.

O Sr. Primeiro-Ministro: — É que, Srs. Deputados, essa questão…

Protestos do PSD.

Srs. Deputados, já percebi que gostaram tanto da pergunta que vou repeti-la…

Risos e aplausos do PS.

Amanhã, quando apresentarem a moção de rejeição, há uma pergunta que os portugueses farão e que eu

faço: qual é a alternativa que apresentam ao País?

Página 39

3 DE DEZEMBRO DE 2015

39

Protestos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — É a de os senhores ficarem em gestão!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Gostava de lhe recordar, porque já vi que é bom em datas, que na noite do dia

4 de outubro eu disse, enquanto líder do Partido Socialista, que o PS nunca derrubaria um governo sem ter

uma solução alternativa de governo a proporcionar ao País e que nunca seríamos uma oposição de bota

abaixo e de obstrução pela obstrução! E isso significa que dissemos que não votaríamos qualquer moção de

rejeição sem que, previamente, estivesse garantida uma alternativa de governo.

E isto, como o Sr. Deputado bem disse, foi uma atitude responsável. Ora, devo dizer-lhe que não tomar

esta atitude é uma atitude não responsável. Porque derrubar governos sem ter uma alternativa, isso, sim, é

que é não estar à altura das responsabilidades que temos para com o País.

Aplausos do PS.

Quanto à questão que tanto o angustia, pelos vistos há tantos dias e há tantas horas, assim que for

possível far-lhe-ei chegar a gravação da minha participação, três dias depois, no Fórum da TSF, onde

respondi muito claramente a essa questão.

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Responda agora!

O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — É aqui que tem de responder!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Pode ter, assim, a oportunidade de ver como está bastante atrasado nas

dúvidas que mantém e que há muito tempo estão esclarecidas.

Aplausos do PS.

Protestos do PSD.

Entretanto, assumiu a presidência o Vice-Presidente José Manuel Pureza.

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: — Pede a palavra para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Sr. Presidente, é para fazer uma interpelação à Mesa sobre a

condução dos trabalhos.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Sr. Presidente, o Sr. Primeiro-Ministro, interpelado por esta bancada

e por mim, remeteu a resposta para uma eventual declaração que terá feito num programa de rádio.

Pedia ao Sr. Presidente, porque é a praxe desta Casa, que pedisse ao Sr. Primeiro-Ministro que fizesse

distribuir, ainda durante este debate, uma vez que se furtou a responder às perguntas legítimas que lhe foram

feitas, as tais respostas, para que, de uma vez por todas, os portugueses possam saber que prestações

sociais não contributivas o Sr. Primeiro-Ministro se propõe cortar.

Aplausos do PSD.

Página 40

I SÉRIE — NÚMERO 12

40

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Srs. Deputados, vamos agora entrar na terceira ronda de

pedidos de esclarecimento.

Para o efeito, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe, do PCP.

O Sr. António Filipe (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, o debate do Programa deste Governo

tem um particular significado para a democracia portuguesa e faz recair sobre si uma enorme expectativa e

muita esperança dos portugueses, que não pode ser defraudada.

Esta solução resulta diretamente da vontade popular manifestada nas eleições do passado dia 4 de

outubro, que condenou, inequivocamente, por uma larga maioria, a governação do PSD e do CDS nos últimos

quatro anos e meio.

Essa expressão da vontade popular exigiu não apenas uma mudança de pessoas, mas,

fundamentalmente, uma mudança de políticas, um virar de página nas políticas de empobrecimento, de

desemprego, de precariedade, de aumento da exploração, de emigração forçada, de violação de direitos

fundamentais, de confronto permanente com a Constituição, de privatização selvagem de bens públicos e de

património público.

Portanto, essa vontade manifestada pelo povo português, expressa na diversidade de opções políticas,

mas dando uma expressiva maioria à condenação dessa política, tem tradução na composição desta

Assembleia da República e tem tradução na responsabilidade que assumimos aqui — pela nossa parte,

assumimos — de travar a continuação dessa política.

E foi por isso que, aqui, rejeitámos, com toda a convicção, há umas semanas, essa tentativa falhada de

governo de iniciativa presidencial ao arrepio da opinião dos partidos políticos com representação parlamentar

e dos resultados eleitorais e que fez com que o País tivesse perdido estes dois meses que, seguramente,

muita falta nos farão.

Chegados aqui, Sr. Primeiro-Ministro, há dois factos que importa salientar e que contrariam o discurso que

a direita tem vindo a fazer. Um deles é a realidade da situação económica do País, que está a ser posta em

evidência por dados oficiais.

De facto, aquela cortina de fumo, com que, em período eleitoral, a direita procurou convencer os

portugueses dos grandes sucessos da sua política está a ser desmentida hoje, cabalmente, pela realidade em

que o País se encontra.

Um outro facto tem a ver com o alarmismo que a direita procurou semear. Se nos lembrarmos do que há

umas semanas era dito e escrito, por este País fora, se esta solução governativa, cujos programas estamos

hoje a discutir, se tornasse realidade é que o País hoje estaria num caos absoluto. Estaríamos perante uma

corrida aos bancos, estaríamos perante fugas de capitais, estaríamos perante uma situação como a referida

por uma antiga Deputada do CDS, que escreveu num jornal, num artigo de opinião, que estava a pensar

aconselhar os filhos a emigrar e a fugirem de aqui para fora se esta solução se tornasse realidade.

Portanto, nós verificamos, Sr. Primeiro-Ministro, que o alarmismo da direita é inversamente proporcional ao

otimismo com que os portugueses encaram o futuro próximo, porque, de facto, nada disso está efetivamente a

acontecer.

Sr. Primeiro-Ministro, a questão que gostaríamos de salientar neste momento é que, de facto, há uma

enorme esperança dos portugueses de que haja uma mudança real de política, e para isso é fundamental que

este Governo cumpra os compromissos que assumiu para com os portugueses e que cumpra os

compromissos que todos assumimos ao tornar possível esta solução governativa.

É que, ao contrário da direita, que simulava divergências quando lhe convinha, nós não precisamos de

simular divergências; elas são conhecidas, assumidas e transparentes.

O Sr. Telmo Correia (PSD): — Divergências claras! Isso é muito bom para a governação!

O Sr. António Filipe (PCP): — E aquilo que assumimos são convergências para que o País possa sair

desta situação difícil em que caiu.

Aplausos do PCP.

Página 41

3 DE DEZEMBRO DE 2015

41

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado

Adão Silva, do PSD.

O Sr. Adão Silva (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as

e Srs. Deputados, Sr. Primeiro-

Ministro, começo por ligar a minha pergunta à que não respondeu colocada pelo Sr. Deputado Hugo Lopes

Soares.

V. Ex.ª, neste debate, já foi muito claro nas suas boas intenções: disse que o Governo depende do

Parlamento, que o Governo tudo fará numa relação cordial eficaz e pronta com o Parlamento.

Sr. Primeiro-Ministro, VV. Ex.as

querem cortar nas prestações sociais sujeitas a condição de recursos, que

são as prestações dadas às pessoas mais carenciadas. V. Ex.ª é interpelado sobre quais são essas

prestações sujeitas a condição de recursos que VV. Ex.as

vão cortar e o que é que V. Ex.ª responde ao

Parlamento, ao tal Parlamento que V. Ex.ª passou, aqui, o tempo a elogiar e a dizer ao qual estava submisso?

E o que é que disse? Disse: «oiçam o que eu disse a uma rádio. A uma rádio! Vão ao site da rádio, vão aos

jornais.»

Já percebemos, Dr. António Costa. Boas intenções, com certeza… Na realidade, os Deputados quando

quiserem saber o que pensa ou o que diz o Primeiro-Ministro vão aos jornais, vão às rádios.

Portanto, Sr. Primeiro-Ministro, V. Ex.ª tem de dizer, aqui, onde vai cortar nas prestações dos mais pobres.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Em segundo lugar, V. Ex.ª dizia que este Programa do Governo era coerente. Insistiu até, muitas vezes

dizendo: «É coerente, é coerente.» Eu diria, Sr. Primeiro-Ministro, que tem dias, que tem páginas, porque acho

que é bastante do tipo loja de bric-a-brac, tipo um Programa de paradoxos. Isto é, é aquela coisa que de um

lado se diz de uma maneira e de outro lado se diz de outra. Um elemento verdadeiramente paradoxal, que até

faz lembrar aquela adivinha de quando éramos crianças e que dizia: qual é coisa qual é ela que quanto mais

se tira maior fica?

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Isso é o buraco!

O Sr. Adão Silva (PSD): — Exatamente, Sr. Presidente do Grupo Parlamentar do PSD, é o buraco: quanto

mais se tira, maior fica. Até aqui era o buraco, mas com este Governo é o buraco e é o Fundo de Estabilização

Financeira da Segurança Social.

O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — Ora, lá está!

O Sr. Adão Silva (PSD): — Sr. Primeiro-Ministro, VV. Ex.as

dizem que ao Fundo de Estabilização

Financeira da Segurança Social querem retirar 10% para a construção civil. Mas 10% significa 1,4 milhões de

euros! Isto é, VV. Ex.as

querem retirar 10% de um fundo que tem 14 mil milhões de euros, que tem uma

rentabilidade extraordinária de cerca de 10% ao ano, que é constituído com os descontos dos trabalhadores

portugueses e que serve para aguentar a rutura das pensões em Portugal, e dizem isto na página 137 do

vosso Programa.

O Sr. João Galamba (PS): — Leia lá, porque não é bem isso!

O Sr. Adão Silva (PSD): — Mas, depois, na página 227 do vosso Programa, dizem: «Reforçar o Fundo de

Estabilização Financeira da Segurança Social.» Ora, não percebi como é que dizem, de um lado, corta e, do

outro lado, reforça. Mas percebi, depois. Sabe como? Fui ler o acordo que fizeram com o Partido Ecologista

«Os Verdes» e uma das exigências que Os Verdes fazem é reforçar o Fundo de Estabilização Financeira.

Ora bem, isto não conseguimos entender, Sr. Primeiro-Ministro. Estes 10% do Fundo de Estabilização

Financeira são para aplicar por públicos e por privados, em rentabilidades muito diminutas, como, aliás, diz o

vosso Programa, na página 137.

Página 42

I SÉRIE — NÚMERO 12

42

Pergunto-lhe, então, Sr. Primeiro-Ministro, afinal estes 10%, 1,4 milhões de euros, do fundo de garantia das

pensões em Portugal são para quê? Para dar a privados? Para fazer aplicações de baixa rentabilidade? E até

pergunto ao PCP: os senhores viram isto? E pergunto também a Os Verdes e ao Bloco de Esquerda: os

senhores viram lá isto?

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Para aplicar o dinheiro dos descontos da segurança social dos portugueses nos privados com baixa

rentabilidade?

Sinceramente, conviria passar a ler bem o que diz o Programa do Governo.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada

Susana Amador.

A Sr.ª Susana Amador (PS): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Sr.as

e

Srs. Deputados, os direitos sociais devem ser interpretados à luz dessa referência constitucional unificadora

de todos os direitos fundamentais que é a dignidade humana. Essa visão humanista e de defesa do Estado

social perpassa por todo o Programa do Governo que hoje se discute nesta Câmara.

As pessoas são, de facto, o primeiro e mais revelante ativo do País e devem ser o centro das políticas e da

ação política. Contudo, nos últimos quatro anos e meio, assistimos ao empobrecimento das pessoas, sem

precedentes, e ao aumento das pessoas que vivem em privação material severa, que entendemos ser

intolerável num Estado social, num Estado de bem-estar social, mas que, ao invés, se tornou um Estado mais

distante e mais ausente por pura opção ideológica.

São quase 3 milhões de pessoas que se encontram em risco de pobreza ou de exclusão social, são 850

000 crianças e jovens, que são, aliás, o grupo de maior risco, são 1 850 000 adultos e são 450 000 idosos em

situação de pobreza.

O aumento do desemprego e o recuo do Estado ao nível dos beneficiários do rendimento solidário para

idoso, do complemento solidário, do complemento social de inserção e do abono de família contribuíram para

que o risco de pobreza regressasse aos níveis do início da década de 2000. Portugal andou, efetivamente,

para trás!

Sr. Primeiro-Ministro, tal como decorre do Programa do Governo e foi notório na sua intervenção inicial, a

prioridade, que desde já saudamos, será uma estratégia de combate à pobreza nas crianças e nos jovens. As

políticas sociais são, assim, encaradas como essenciais ao desenvolvimento do País. Não são caridades, não

podem ser; são investimento no futuro,

Gostaríamos de saber como se conjugarão as medidas de combate à pobreza infantil inseridas nessa

estratégia com outros setores, designadamente ao nível da educação ou da saúde. E porque a educação é um

alicerce essencial para o futuro, para a competitividade, para a coesão e para a igualdade, é preocupante, Sr.

Primeiro-Ministro, o aumento das taxas de insucesso escolar nos últimos quatro anos, designadamente no

ensino básico.

Assim, pergunto: quais serão as metas e as medidas para valorizar esse grande desígnio nacional, que

será o combate ao insucesso escolar? Como se fará essa mobilização e qual o papel que a educação pré-

escolar terá neste combate?

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Ainda para pedir esclarecimentos nesta terceira ronda, tem a

palavra o Sr. Deputado Moisés Ferreira.

O Sr. Moisés Ferreira (BE): — Sr. Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados, Sr. Primeiro-Ministro, por diversas

vezes ouvimos a direita — já a ouvimos hoje a dizer o mesmo — falar dos últimos quatro anos, e devemos

Página 43

3 DE DEZEMBRO DE 2015

43

reconhecer, pelo menos, o seu esforço de criatividade, porque às vezes falam de um País imaginário, que não

sabemos qual, às vezes tentam criar uma fotografia e percebermos que é apenas photoshop, às vezes tentam

também dizer que «o Governo anterior protegeu sempre os mais fracos». Quando chegam aqui, percebemos

que estamos já perante um exercício de mera imaginação.

É importante, por isso, falarmos da realidade e do futuro real do País.

Um estudo divulgado na semana passada mostra que, em 2014, em Portugal, 50% das famílias

portuguesas falharam cuidados de saúde considerados essenciais. Porquê? Porque não tinham dinheiro para

os realizar. Foi assim que o PSD e o CDS-PP, nos últimos quatro anos, protegeram os mais fracos? Foi assim,

tornando a saúde mais cara, tornando a saúde mais distante e menos acessível?

Esse estudo dizia que, em Portugal, há pessoas que não foram às urgências ou que faltaram a consultas

programadas porque não podiam pagar.

Esse estudo dizia que, em Portugal, há doentes que abdicaram de tratamento e que racionaram

medicamentos porque não tinham dinheiro.

Esse estudo dizia que, em Portugal, 20% das famílias cortou em bens alimentares ou endividou-se para

poder aceder à saúde.

Esta é que é a realidade que o PSD e o CDS-PP nos deixam. Esta é que é a realidade de quatro anos de

governação de direita.

Há, portanto, uma urgência que vivemos neste País: a primeira, já concretizada, era demitir a continuação

destas políticas. Mas subsistem outras, como as de permitir a devolução de rendimentos e de reforçar e

investir no Estado social.

Por isso, Sr. Primeiro-Ministro, a questão que coloco concretamente sobre o Serviço Nacional de Saúde é a

seguinte: quais são as medidas urgentes para que a saúde seja de acesso universal e se torne mais próxima

das pessoas? Quais são as medidas concretas e imediatas para que a saúde não seja mais um negócio para

privados mas, sim, um serviço para as pessoas?

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, muito obrigado.

Sr. Deputado Moisés Ferreira, relativamente ao Serviço Nacional de Saúde, a prioridade definida será a de,

em primeiro lugar, melhorar as condições de acessibilidade à saúde, repondo, ao longo da Legislatura, as

taxas moderadoras aos níveis que estavam anteriormente, de forma a que voltem a ser taxas moderadoras e

não aquilo que passaram a ser, ou seja verdadeiras taxas que bloqueiam o acesso à saúde por parte de

muitos e muitos cidadãos.

Em segundo lugar, outra prioridade definida tem a ver com os cuidados de saúde primários,

designadamente com a contratação e com o assegurar a todos os portugueses a oportunidade de terem um

médico de família, de forma a assegurar esse serviço a todos os portugueses.

Em terceiro lugar, e como o Sr. Ministro da Saúde já teve oportunidade de responder, relativamente ao

despacho, que já nos surpreendeu após as eleições, de eliminação dos serviços de urgência, ele será

reavaliado de acordo com os padrões técnicos com a garantia do acesso aos cuidados de saúde por parte das

populações.

Relativamente à questão colocada pela Sr.ª Deputada Susana Amador o insucesso escolar é uma das

principais causas assumidas neste Programa do Governo. E o combate ao insucesso escolar visa, por um

lado, cumprir a meta europeia a que estamos obrigados no âmbito do Portugal 2020, mas, sobretudo,

assegurar que o nível de qualificação essencial continue a progredir em Portugal. Este esforço implica uma

intervenção, desde logo, ao nível do pré-escolar e, por isso, temos uma meta ambiciosa de, até ao final da

Legislatura, termos a generalização do ensino pré-escolar a partir dos três anos para todas as crianças.

O reforço da satisfação das necessidades educativas especiais e a melhoria do ensino artístico são

condições importantes à motivação e ao envolvimento das crianças no seu percurso escolar.

Página 44

I SÉRIE — NÚMERO 12

44

Também é importante a valorização do ensino profissionalizante ao nível do secundário, de forma a

diversificar as vias de ensino para conseguirmos cumprir, de modo universal, a escolaridade obrigatória dos 12

anos como objetivo fundamental.

Naturalmente que no programa que definimos como prioritário que, como disse, é centrado no território e

que será desenvolvido em torno da escola, do combate à pobreza infantil e juvenil, um dos objetivos

fundamentais é assegurar que é travado o abandono e o insucesso escolar precoce, de forma a garantir

cursos escolares completos para a nova geração escolar.

O Sr. Deputado António Filipe sinalizou bem o contraste entre a serenidade com que o País, os agentes

económicos, a Europa olham relativamente a Portugal depois do discurso alarmista e, pior, depois do incentivo

ao alarme que foi aqui, no último debate do Programa do anterior Governo, feito pelo próprio Sr. Primeiro-

Ministro e pela então Ministra das Finanças.

Felizmente essa serenidade existe, porque o mundo está habituado ao funcionamento da regra normal da

democracia. E a regra normal da democracia é que os governos sejam gerados e respondam perante os

parlamentos em função das maiorias parlamentares que é possível constituir.

Como o Sr. Deputado bem disse, esta é uma maioria parlamentar assente na diversidade, que não procura

disfarçar as diferenças mas que as assume não só com naturalidade mas como uma riqueza desta mesma

base de apoio parlamentar, o que é assumido com total transparência e tranquilidade, a mesma com que,

estou certo, amanhã a maioria desta Assembleia rejeitará a moção de rejeição apresentada pelo PSD e pelo

CDS, da mesma forma como há 21 dias aprovaram a moção de rejeição apresentada pelo Partido Socialista

nesta Câmara.

Finalmente, Sr. Deputado Adão Silva, verifico que, apesar de terem ouvido o primeiro debate, não ouviram

a resposta. Então, eu repito: em primeiro lugar, os senhores confundem aquele que é um quadro que prevê a

redução da despesa com a existência de cortes nas prestações sociais.

Ora, a redução das despesas das contribuições de natureza não contributiva resultam do facto de, em

função de um conjunto de outras medidas, designadamente a diminuição do desemprego, o complemento

salarial anual, a reposição do complemento solidário para idosos, a reposição do rendimento solidário de

inserção, essas prestações deixarem de ser necessárias, não por serem cortadas, mas porque as pessoas

deixam de estar na condição em que necessitavam de receber essas prestações.

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Não é isso que o Programa do Governo diz!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Foi com base nisto que assentou o debate com o então Primeiro-Ministro.

O que diz o Programa do Governo é uma coisa muito simples e clara: reavaliar e reforçar a coerência do

modelo de aplicação da condição de recursos nas prestações sociais de natureza não contributiva.

O Sr. Adão Silva (PSD): — Onde é que corta? Diga lá!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Como os senhores sabem, as condições de recursos são hoje diversas em

função das diferentes prestações, e o que é necessário assegurar é que haja uma coerência na condição

exigida para receber esta prestação ser ou não distinta da condição exigida para obter outra prestação. A

coerência da prestação não significa a diminuição das prestações sociais.

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Pois não!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Este Governo propõe-se restabelecer tudo aquilo que os senhores cortaram,

nomeadamente no complemento solidário para idosos, no rendimento solidário de inserção, nas pensões, nos

salários, pelo que, com franqueza, Srs. Deputados, é preciso, desculpe, terem muito descaramento para

vierem pôr em causa quem pretende repor prestações sociais.

Aplausos do PS.

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Quais são as prestações que quer repor? Não ande à volta!

Página 45

3 DE DEZEMBRO DE 2015

45

O Sr. Primeiro-Ministro: — Os Srs. Deputados poderão ficar no jogo da dialética;…

Risos do PSD e do CDS-PP.

… nós ficaremos na realização material, em homenagem, aliás, aos nossos parceiros.

Vozes do PSD: — Ora bem!

O Sr. Primeiro-Ministro: — E a realização material é simples: é que nós seremos o Governo que repõe as

prestações sociais e vocês serão sempre o Governo que cortou as prestações sociais.

Aplausos do PS e do BE.

Sobre a segunda questão que colocou, Sr. Deputado, nós entendemos como essencial a diversificação das

fontes de financiamento da segurança social. Hoje em dia, na economia que temos, o futuro da segurança

social não se poderá financiar exclusivamente com base nas contribuições das entidades patronais e com

base nas contribuições dos trabalhadores; há que encontrar novas formas de financiamento da segurança

social.

Nós entendemos que hoje estamos de novo num quadro, como o que vigorou até aos anos 40, em que as

rendas podem ser uma boa fonte de financiamento da segurança social.

Recordar-se-á — eu sei que não é de Lisboa — que grande parte da urbanização do todo o planalto de

Alvalade foi feito com investimento das caixas de previdência, porque era um investimento em criação de

prédios de rendimento que visavam financiar a segurança social.

Porque é que não foi prosseguida essa política? Porque, como sabe, a seguir à guerra, o Dr. Salazar

congelou as rendas em Lisboa e no Porto e a seguir ao 25 de Abril as rendas foram congeladas em todo o

País. Assim, durante muitos anos, verificou-se uma distorção no mercado de arrendamento por via do

congelamento das rendas.

Em segundo lugar, toda a nossa geração acabou por aceder à habitação não por via do arrendamento

mas, sim, por via da compra de casa própria, beneficiando de um longo período onde o crédito foi bastante

acessível e a baixo custo.

Hoje, a realidade é bem diversa e o paradigma do acesso à habitação mudou radicalmente. Hoje, o

mercado de arrendamento, para o bem ou para o mal, está liberalizado e, hoje, o acesso ao crédito à

habitação será cada vez mais difícil pelas restrições de concessão de crédito.

Significa isto que as novas gerações vão confrontar-se… Sr. Deputado Adão Silva, não abane com a

cabeça dizendo que não, porque é essa a realidade.

O Sr. Adão Silva (PSD): — Não, não!

O Sr. Primeiro-Ministro: — As novas gerações vão confrontar-se, como se confrontaram até aos anos 50,

com a dificuldade de a classe média aceder à habitação se não forem criadas condições de habitação a

rendas acessíveis.

É por isso que o Programa do Governo prevê a existência de uma nova geração de políticas de habitação,

porque, a par das políticas de habitação social que os municípios já desenvolvem, a par das políticas de

habitação que proporcionam o acesso à habitação em mercado livre às famílias solventes, a classe média

precisa, como em toda a Europa existe, políticas de habitação que permitam a existência de renda acessível.

Em segundo lugar, precisamos com urgência de programas de reabilitação urbana, programas esses que

têm várias vantagens: melhoram a qualidade da habitação, melhoram a imagem do espaço das cidades e

contribuem para a eficiência energética diminuindo os encargos para o País.

Nós temos, por isso, que mobilizar recursos para poder fazer operações de reabilitação urbana e que criem

condições para colocar no mercado habitações a renda acessível.

Página 46

I SÉRIE — NÚMERO 12

46

Ora, a questão é saber como é que vamos financiar esta operação. Uma das formas importantes e

inteligentes de o fazermos é permitir diversificar as aplicações do Fundo de Estabilização Financeira da

Segurança Social.

Sr. Deputado, não se trata de ir tirar dinheiro ao Fundo.

O Sr. Adão Silva (PSD): — Não?!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Não, não se trata. Trata-se, sim, de assegurar que o Fundo de Estabilização

Financeira não seja totalmente consumido, como hoje está, já em 90%, em compra de dívida pública ou em

aplicações financeiras de solvabilidade duvidosa, mas poder também, na carteira de diversificação, fazer

investimentos que permitam remunerar essas aplicações com base nas rendas, assim proporcionando

reabilitação urbana, que dinamiza a economia, e rendas acessíveis, que servem o acesso à habitação por

parte da classe média.

Mas, Sr. Deputado, sabe qual é a maior novidade que queria dar-lhe? No quadro da lei aprovada no tempo

do Governo do Dr. Durão Barroso e quando era ministro o Dr. Bagão Félix e foi fixada a diversificação e a

tipologia de aplicações das verbas do Fundo de Estabilização Financeira da Segurança Social, sabe o que é

que se previa? Previa-se que uma percentagem pudesse ser aplicada precisamente no mercado de

arrendamento, de forma a diversificar as fontes de financiamento do Fundo de Estabilização Financeira da

Segurança Social.

Portanto, não há contradição nenhuma. O que há é diversificação das aplicações para haver maior

segurança no Fundo a fim de podermos ter uma economia mais dinamizada, um mercado de habitação mais

acessível à classe média e, simultaneamente, reforçar o Fundo através das rendas que venha a obter dos

prédios de rendimento. Desde logo, no investimento no próprio património da segurança social que, como

sabe, são milhares e milhares de metros quadrados em ruína por todo o País e que podem, e devem, ser a

prioridade de investimento do próprio Fundo de Estabilização Financeira da Segurança Social, a recuperação

do seu próprio património.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Srs. Deputados, vamos entrar na última ronda de pedidos de

esclarecimento.

Para esse efeito, tem a palavra a Sr.ª Deputada Patrícia Fonseca.

A Sr.ª Patrícia Fonseca (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, as questões que tenho para

lhe colocar prendem-se com a agricultura e o mundo rural, o que não é de estranhar vindo da bancada do

CDS para quem a agricultura não é uma moda e foi desde sempre considerada um setor relevante para a

economia nacional e, por isso, acarinhado.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

A Sr.ª Patrícia Fonseca (CDS-PP): — Também por motivos pessoais, porque, tal como o Sr. Primeiro-

Ministro se orgulha de ter dedicado toda a sua vida à atividade política, eu orgulho-me de ter dedicado a minha

vida ao trabalho em prol dos agricultores e do mundo rural.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

Assim, Sr. Primeiro-Ministro, coloco-lhe três questões muito simples.

Primeira, as medidas agroambientais desenhadas pelo anterior Governo PSD/CDS foram de tal forma

apelativas que tiveram uma adesão de quase 87 000 agricultores, levando à necessidade de reforço do

Programa de Desenvolvimento Rural em 200 milhões de euros para assegurar as legítimas expectativas dos

agricultores que se candidataram.

Página 47

3 DE DEZEMBRO DE 2015

47

Na campanha eleitoral, o então candidato a Deputado, agora seu Ministro da Agricultura, afirmou que

«pagará com gosto essa fatura».

Dado o passado do Partido Socialista nesta matéria, tenho de lhe perguntar, Sr. Primeiro-Ministro, se

reafirma o compromisso de reforçar o Programa de Desenvolvimento Rural em 200 milhões de euros ou se os

agricultores correm o risco de reviver as más memórias do tempo de um governo do qual o senhor era o

número dois e cujo Ministro da Agricultura de então gorou as expectativas dos agricultores e das suas

organizações, provocando graves prejuízos em todo o mundo rural.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

A Sr.ª Patrícia Fonseca (CDS-PP): — Segunda questão, a alteração à Lei dos Baldios, feita em 2014, veio

trazer equidade no acesso aos baldios pelos compartes e transparência às contas dos baldios, impedindo que

apenas alguns compartes sejam beneficiados, como acontecia em muitos casos.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

A Sr.ª Patrícia Fonseca (CDS-PP): — Esta alteração não coloca em causa os usos e costumes locais na

fruição dos baldios e respeita a Constituição, tal como afirmado no Acórdão do Tribunal Constitucional do

passado mês de novembro.

Pergunto-lhe, portanto, Sr. Primeiro-Ministro, de que lado se quer colocar, se do lado da transparência e da

equidade ou se vai ceder a outros interesses do PCP.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

Por último, Sr. Primeiro-Ministro, o Governo PSD/CDS resolveu, finalmente, a situação da Casa do Douro,

que se arrastava há décadas e que nenhum Governo tinha conseguido solucionar.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

Protestos do PCP.

A Sr.ª Patrícia Fonseca (CDS-PP): — O benefício do vinho do Porto foi em 2015 o mais elevado dos

últimos anos, os viticultores do Douro estão satisfeitos e a administração liquidatária está a iniciar o seu

trabalho para que as dívidas sejam pagas progressivamente.

Protestos do PCP.

O Sr. António Carlos Monteiro (CDS-PP): — Oiçam, oiçam para aprender!

A Sr.ª Patrícia Fonseca (CDS-PP): — Pergunto: Sr. Primeiro-Ministro, pretende o Governo reverter todo

este processo e deitar abaixo uma situação que hoje está pacificada no Douro? Que interesses pretende o

Governo proteger? Os interesses dos viticultores durienses ou os interesses sindicais do PCP?

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada

Paula Santos.

A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, nos últimos quatro anos, PSD e CDS

prosseguiram uma política de desmantelamento das funções sociais do Estado e de destruição de serviços

públicos.

Página 48

I SÉRIE — NÚMERO 12

48

O que caracterizou esta política do PSD e do CDS foi o desinvestimento público: na escola pública, no

Serviço Nacional de Saúde, na proteção social, no serviço público de cultura, no sistema científico e

tecnológico nacional, na prestação de serviços públicos de qualidade, optando, simultaneamente, pela sua

progressiva privatização e mercantilização.

PSD e CDS insistiram na desvalorização profissional e social dos trabalhadores, insistiram na transferência

para as famílias de cada vez mais encargos com a saúde, a educação, a cultura, ou o acesso a serviços

públicos, como são exemplo as águas ou o tratamento de resíduos.

Não nos esquecemos dos utentes que aguardam pelo médico de família, do aumento do número de alunos

por turma, dos estudantes que foram obrigados a abandonar o ensino superior, dos bolseiros de investigação,

que aguardam por um contrato de trabalho, dos professores que foram despedidos ou daqueles que andam há

5, 10, 20 anos a contratos, dos médicos e enfermeiros que abandonaram o Serviço Nacional de Saúde.

Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, o PCP opôs-se veementemente a estas opções políticas,

combatendo-as. Consideramos que é fundamental o escrupuloso cumprimento da nossa Constituição,

garantindo a todos os direitos fundamentais e a prestação de serviços públicos de qualidade.

Defendemos, assim, a escola pública para todos, o reforço do Serviço Nacional de Saúde, uma segurança

social solidária e universal, uma efetiva política de descentralização e de democratização cultural, reforçando o

investimento público progressivamente até alcançar 1% do PIB e, ainda, naturalmente, a valorização dos

próprios trabalhadores.

Sr. Primeiro-Ministro, estas questões que se colocam relativamente às funções sociais do Estado e aos

serviços públicos, quer na perspetiva dos cidadãos que a eles pretendem ter acesso, quer na perspetiva dos

trabalhadores que os asseguram, são matérias essenciais na vida dos portugueses e questões relativamente

às quais estão criadas elevadas expetativas que importa concretizar.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Atenção ao seu tempo, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Vou terminar, Sr. Presidente.

Também por isso é importante que este debate e a sua resposta em concreto contribuam para clarificar as

perspetivas que o Programa do Governo aponta.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada

Sara Madruga da Costa.

A Sr.ª Sara Madruga da Costa (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, no Programa do Governo

ora em discussão refere-se a necessidade de valorizar a autonomia das regiões autónomas.

Após uma leitura mais atenta, apercebemo-nos que essa suposta valorização assenta num conjunto de

conceitos excessivamente vagos, que pretendem significar tudo mas que na realidade parecem não significar

nada.

Este Programa do Governo não assume compromissos específicos para a Região Autónoma da Madeira.

Esperamos, muito sinceramente, que este Governo não faça o mesmo que o anterior governo do PS, que

discriminou a Região Autónoma da Madeira em relação à Região Autónoma dos Açores, atendendo

meramente a aspetos partidários.

Sabendo que há uma questão que une todos os madeirenses, que é a questão da construção de um novo

hospital, gostaríamos de saber se podemos contar com a solidariedade nacional deste novo Governo para

enquadrar, como projeto de interesse comum e nacional, a construção de um novo hospital para a Região

Autónoma da Madeira.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado

Filipe Neto Brandão.

Página 49

3 DE DEZEMBRO DE 2015

49

O Sr. Filipe Neto Brandão (PS): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, o modo como se inicia um texto

assume sempre relevância e significado, e o mesmo sucede com o Programa do Governo.

É assim particularmente significativo que logo o primeiro parágrafo do Programa do XXI Governo expresse

uma proclamação de respeito pelos compromissos europeus e internacionais de Portugal.

Afirma-se, assim, sem quaisquer equívocos, o respeito pelos compromissos europeus e internacionais

numa política reforçada de convergência e coesão.

O Sr. Primeiro-Ministro referiu já que este será um Governo de garantia.

O Sr. Miguel Morgado (PSD): — É?!

O Sr. Filipe Neto Brandão (PS): — É um Governo de garantia, e sê-lo-á, em primeiro lugar, de garantia de

respeito pela Constituição da República Portuguesa, mas também de garantia de continuidade do Estado nos

seus compromissos internacionais e no quadro da União Europeia.

Como o Sr. Primeiro-Ministro bem referiu aquando da sua tomada de posse, este Governo nasceu da

recusa da ideia de que não haveria alternativa à política prosseguida na legislatura que terminou. Há,

obviamente, alternativa e, como este Governo demonstrará, é bem possível fazer diferente.

É verdade — sabemo-lo — que, como membro da União Europeia, Portugal tem várias das suas opções

políticas condicionadas pela União no seu conjunto, mas o que é um constrangimento inerente à participação

de Portugal na União Europeia, à sua participação na União Monetária e Económica e à partilha de uma

moeda comum, sabemo-lo bem, é também uma enorme vantagem. E V. Ex.ª já deu, como poucos, provas

bastantes de saber transformar com sucesso constrangimentos em vantagens.

Ora, Portugal precisa de capitalizar essa vantagem. A voz das autoridades portuguesas tem de ser ativa e

empenhada fazendo-se ouvir em Bruxelas e aí contribuindo também para a mudança a favor da economia e

de mais emprego.

O Programa do XXI Governo defende uma leitura, que, aliás, qualifica de «leitura inteligente da disciplina

orçamental», que passará pela atribuição de prioridade à redução dos desequilíbrios não só económicos mas

também sociais.

Perguntamos, pois, Sr. Primeiro-Ministro, como é que o Governo se propõe cumprir esse objetivo que é,

afinal, o da reconquista da confiança dos cidadãos no modelo social europeu e, do mesmo modo, se teremos,

finalmente — e esperamos que sim! —, deixado para trás o tempo em que as reformas ditas «estruturais» se

traduziam invariavelmente na privatização de setores estratégicos e na redução de direitos laborais e sociais

para, como concluiu há minutos, vivermos um novo impulso à convergência com mais crescimento e maior

igualdade.

Felicidades ao XXI Governo Constitucional!

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado

Jorge Falcato.

O Sr. Jorge Falcato Simões (BE): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as

Deputadas e Srs.

Deputados, antes de perguntar o que quer que seja ao Sr. Primeiro-Ministro, não posso deixar de dizer que me

congratulo com a nomeação da Dr.ª Ana Sofia Antunes para Secretária de Estado da Inclusão das Pessoas

com Deficiência.

Aplausos do BE e do PS.

Congratulo-me, porque já seria bom ter uma pessoa competente no cargo, mas ter uma pessoa

competente e que tem uma deficiência é muito melhor, e melhor ainda quando se trata de uma ativista pelos

direitos das pessoas com deficiência.

Página 50

I SÉRIE — NÚMERO 12

50

Sr. Primeiro-Ministro, como sabe, a população com deficiência é a mais pobre, a que mais sofre com o

desemprego, a que tem menores qualificações escolares. São cidadãos e cidadãs a quem são negados os

mais básicos direitos: à educação, ao trabalho, a uma habitação adequada, à mobilidade, enfim, a uma vida

digna. Direitos que lhes são negados por uma única razão: porque são diferentes, nasceram ou ficaram

diferentes. São pessoas, na sua maioria, eternamente dependentes das suas famílias, porque o Estado

português considera que é possível viver com prestações sociais de 180 € a pouco mais de 200 € mensais.

O Programa do XXI Governo propõe avaliar e reformular as prestações sociais no sentido da

implementação de uma única prestação que inclua uma componente fixa, de acordo com o grau de

incapacidade da pessoas, e uma componente variável, respeitante às despesas com reabilitação.

Dada a complexidade desta proposta, o tempo de estudo necessário para a sua formalização e a sua

implementação na prática, reconhecendo nós, como reconheceu, recentemente, a Sr.ª Secretária de Estado

da Inclusão das Pessoas com Deficiência, que estas prestações sociais são vergonhosamente insuficientes,

está o Governo disponível para promover um aumento substancial destas prestações no imediato, enquanto

outras não forem definidas?

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Atenção ao tempo, Sr. Deputado.

O Sr. Jorge Falcato Simões (BE): — Outra questão, Sr. Primeiro-Ministro, é a implementação de uma

política de vida independente, em oposição à política institucionalizadora seguida pelo anterior Governo. E

vida independente é ser dono da sua vida, é ter meios para escolher e contratar a ajuda necessária para isso,

viver onde e como quiser e não ter como única escolha o internamento num lar, onde nem sequer se tem a

liberdade de optar pelo canal de televisão preferido.

Como sabe, Sr. Primeiro-Ministro, o Estado comparticipa com 970 € os lares residenciais, por cada utente

com deficiência internado, lares que ainda cobram ao utente até 90% dos seus rendimentos.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Sr. Deputado, peço-lhe o favor de terminar.

O Sr. Jorge Falcato Simões (BE): — Podemos contar com o compromisso do Governo para proporcionar

às pessoas com deficiência esta oportunidade de escolha? Poderão estas pessoas contar que, tal como foi

afirmado pela Sr.ª Secretária de Estado da Inclusão das Pessoas com Deficiência, vai ser implementada uma

política neste sentido, que garanta pagamentos diretos e liberdade de escolha de assistente pessoal?

Aplausos do BE e do PS.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Também para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª

Deputada Berta Cabral.

A Sr.ª Berta Cabral (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, li com toda a atenção, como era minha

obrigação, o Programa do Governo e, da análise que fiz, vi, em relação às regiões autónomas e, em concreto,

aos Açores, algumas medidas sobre a economia do mar, mas estranhei, e devo dizê-lo aqui, não encontrar

uma única palavra sobre a agricultura e sobre a produção do leite e toda a fileira associada a este setor.

Não vi, como disse, uma única palavra, porque o Programa do Governo é completamente omisso em

relação ao principal setor económico dos Açores, que é o do leite, o qual atravessa, neste momento, a crise

mais grave dos últimos 40 anos, com o fim das quotas leiteiras, pela mão do Partido Socialista, do Ministro

Jaime Silva.

Protestos da Deputada do PCP Rita Rato.

Queria, por isso, dizer-lhe, Sr. Primeiro-Ministro, que a agricultura nos Açores está presente em todas as

dimensões da atividade económica: cria riqueza, cria emprego direto e indireto, promove o turismo, promove

as exportações, valoriza o território, protege o ambiente, conserva a natureza e preserva a nossa

biodiversidade.

Página 51

3 DE DEZEMBRO DE 2015

51

Protestos da Deputada do PCP Rita Rato.

Por isso mesmo, trata-se de um setor que não poderia estar esquecido, quando se fala em detalhe de

algumas medidas e, em concreto, de outras áreas económicas da Região Autónoma dos Açores.

Se o Programa do Governo fosse vago, no seu conjunto, não estaria a colocar a questão, mas o Programa

é muito específico em determinadas medidas e em determinados setores em concreto.

Por isso mesmo, a questão que aqui lhe deixo é no sentido de saber o que pensam o Sr. Primeiro-Ministro

e o seu Governo fazer para compensar a perda de rendimentos dos agricultores açorianos, que já vai em 30

milhões de euros, nos últimos sete anos.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Está na página 177 do Programa do Governo, Sr.ª Deputada!

A Sr.ª Berta Cabral (PSD): — É uma situação que merece uma atenção especial por parte deste Governo,

em função das promessas eleitorais que fez quando visitou os Açores.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Entretanto, reassumiu a presidência o Presidente, Ferro Rodrigues.

O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Inês de Medeiros.

A Sr.ª Inês de Medeiros (PS): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, é com especial satisfação que

intervenho neste debate do Programa do Governo para falar das áreas da cultura e da comunicação social,

áreas particularmente penalizadas na anterior Legislatura.

O brevíssimo XX Governo Constitucional tentou dar uma aparência de ato de contrição, com o

restabelecimento do Ministério da Cultura. Era, evidentemente, uma aparência, pois, face ao estranho

agrupamento de competências desse Ministério, só muito dificilmente poderíamos entender uma qualquer

lógica ou uma qualquer estratégia que justificasse aquela junção.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Era a lógica da batata!

A Sr.ª Inês de Medeiros (PS): — Em contrapartida, o XXI Governo Constitucional, tal como fora

devidamente anunciado no Programa Eleitoral, apresenta um Ministério da Cultura reforçado nas suas

competências no setor cultural, às quais se acrescentou o da comunicação social, pois ambos são setores

essenciais para a valorização económica da atividade cultural e artística, para a promoção e

internacionalização da nossa língua e cultura e para a coesão nacional e ambos precisam de respostas

conjuntas face aos desafios do digital, e não só.

Sr. Primeiro-Ministro, pela sua ação política passada, sei que não precisa de ser alertado ou mesmo

convencido…

O Sr. Presidente: — Já ultrapassou o tempo de que dispunha, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Inês de Medeiros (PS): — Vou já terminar, Sr. Presidente.

Como estava a dizer, Sr. Primeiro-Ministro, sei que não precisa de ser alertado ou mesmo convencido da

importância destes dois setores, particularmente nos tempos difíceis que ainda temos pela frente.

Gostaria, no entanto, que nos deixasse aqui uma garantia de que este Governo tudo fará para, daqui para

a frente, proteger estes dois setores da permanente incerteza sobre as suas estruturas, sobre a sua orgânica e

sobre o seu financiamento, e das reformas feitas com incompreensível superficialidade e até desleixo do

anterior Governo.

Página 52

I SÉRIE — NÚMERO 12

52

Sr. Primeiro-Ministro, ciência, cultura e educação são, de facto, pilares da cidadania, bem como a

informação e o direito à informação. Aqui estaremos para, em conjunto com o Governo, salvaguardar, melhor

proteger e respeitar estes dois direitos constitucionais.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados, vou procurar responder ao conjunto das

questões de forma tão sintética quanto possível.

Em primeiro lugar, relativamente às questões colocadas pela Sr.ª Deputada Patrícia Fonseca, vejo, com

satisfação, a sua participação ativa nestes debates. Isso talvez ajude aqueles que tanto temem que a

Assembleia da República esvazie a concertação social, pois podem verificar que, também na Assembleia da

República, estão bem representados e os seus direitos serão aqui defendidos.

Aquilo que lhe posso assegurar é que, da nossa parte, trataremos todos os interesses, todos os

agricultores, todas as organizações, todos os setores e todas as regiões por igual, procurando introduzir justiça

naquilo que é essencial à relação do Estado com os agentes económicos, tendo em vista prosseguir um

trabalho que, felizmente, tem vindo a ser desenvolvido ao longo das últimas décadas e que permitiu termos,

hoje, na nossa agricultura e no setor agroalimentar, dos setores económicos mais pujantes e que melhor têm

vindo a contribuir para a internacionalização da economia portuguesa. Essa continuidade certamente existirá.

Relativamente à falta de dotação orçamental em algumas rubricas, naturalmente, estamos a fazer o que

nos compete, que é procurar acudir a uma boa gestão do Orçamento, de forma a cobrir as falhas onde elas

existem, mas sem sacrificar um objetivo que creio ser comum a todos nós e que, ainda há pouco, tanto

apoquentava o líder da sua bancada parlamentar, que é o de assegurar que Portugal, por ação deste

Governo, não deixará de cumprir as metas e sair do procedimento por défice excessivo a partir do final deste

ano.

Quanto à legislação dos baldios, a avaliação que fazemos é distinta da que faz, mas iremos proceder à

revisão, de forma a corrigir injustiças que resultam da aplicação dessa legislação, assim como iremos

acompanhar o processo da Casa do Douro, com a garantia de que não haja distorções na preservação dos

direitos e da igualdade de todos os interessados.

Relativamente ao que foi dito pela Sr.ª Deputada Paula Santos, há um compromisso fundamental neste

Programa do Governo, aliás, reforçado com base nos acordos estabelecidos com o PCP, com o Bloco de

Esquerda e com Os Verdes, tendo em vista a construção da maioria de suporte a este Governo, que é o do

reforço e defesa dos serviços públicos em Portugal. E essa defesa parece-me particularmente importante,

porque é uma marca fundamental do modelo social em que vivemos, é uma questão de igualdade e de

cidadania. E esse é, pois, um esforço que temos de prosseguir.

Não posso garantir-lhe, como não garantimos no acordo que assinámos, que possamos alcançar tão

depressa quanto todos desejaríamos os objetivos nos quais convergimos. Há matérias sobre as quais

conseguimos convergir nos fins, nas condições e nos termos, há outras em que, apesar de convergirmos nos

fins, ainda temos de fazer um esforço para convergir nas condições e nos termos. Mas, como diz o Sr.

Deputado João Oliveira, havemos de lá chegar, com persistência e trabalho.

Sr.ª Deputada Sara Madruga da Costa, tenciono ter tão brevemente quanto possível encontros com os Srs.

Presidentes dos Governos Regionais quer dos Açores, quer da Madeira, tendo em vista procurar articular o

esforço da ação do Governo da República e dos Governos Regionais.

Conheço bem a prioridade que o Governo Regional da Madeira e, não só, também os madeirenses

atribuem à necessidade de um novo hospital, tal como também conheço bem a prioridade que os açorianos

atribuem à necessidade de um novo estabelecimento prisional em Ponta Delgada. Portanto, em diálogo com

ambos os Governos Regionais, teremos, com certeza, condições para alcançar as soluções mais adequadas,

dentro dos limites com que os Governos Regionais se confrontam e com que o Governo da República também

se confronta.

Sr. Deputado Filipe Neto Brandão, gostaria de reafirmar o seguinte: temos, de facto, um compromisso

muito claro relativamente à União Europeia, mas também temos uma leitura realista do que é a União

Página 53

3 DE DEZEMBRO DE 2015

53

Europeia. Este ano, em que fazemos 30 anos da assinatura do Tratado de Adesão, é uma boa altura para

fazermos um balanço e verificarmos o que aconteceu nos primeiros 15 anos e nos 15 anos seguintes. Aquilo

que não podemos deixar de reconhecer é que, desde o início do século, a nossa economia tem tido dificuldade

em adaptar-se ao acréscimo de competitividade que resultou do triplo choque da globalização, do alargamento

a Leste e da criação do euro. E essa dificuldade de adaptação resulta, designadamente, de a União

Económica e Monetária ter sido criada e se ter desenvolvido de um modo incompleto e, ainda hoje, de alguma

forma, aos soluços.

Se recordarmos o que aconteceu em 1992, aquando da criação do mercado interno, verificamos que a

criação do mercado interno foi acompanhada da política de coesão. A introdução do euro não foi

acompanhada do alargamento da política de coesão. Confiou-se, porventura, que a redução da taxa de juro

permitiria financiar, aos Estados e à economia privada, os recursos necessários aos investimentos para

diminuir o gap de competitividade. Isto, de facto, assim foi, mas foi um incentivo errado, como, hoje, todos

sabemos, que conduziu ao endividamento dos Estados, das famílias e das empresas. É, por isso, importante

um novo olhar sobre a União Económica e Monetária.

Vejo com otimismo e esperança alguns sinais. Vejo como bom sinal a nova postura do Banco Central

Europeu, que permitiu libertar-nos de taxas de juro absolutamente insuportáveis, não obstante hoje termos um

produto interno bruto inferior ao que tínhamos em 2011 e um nível de vida superior ao que tínhamos em 2011.

Mas, graças ao Banco Central Europeu, Portugal, felizmente, não está hoje confrontado com as situações

dramáticas que viveu em 2011.

Vejo como positivo que a nova Comissão, rompendo com os dogmas da «Comissão Barroso», atribua

prioridade ao investimento e ao investimento público e que o «Plano Juncker», sendo ainda insuficiente, sendo

ainda inconsequente em muitas dimensões, é, indiscutivelmente, um bom sinal.

Vejo com otimismo a comunicação da Comissão sobre a leitura, inteligente e flexível, do tratado

orçamental.

Mas sinto que é essencial darmos um passo em frente. Por isso, uma das nossas prioridades é aquilo que

designámos «Novo Impulso para a Convergência». E o Novo Impulso para a Convergência significa a

necessidade de propormos à União Europeia que, encerrado este processo de ajustamento, entremos agora

numa fase decisiva e em que seja possível contratualizar…

O Sr. Presidente: — Ultrapassou o seu tempo, Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, vou esforçar-me por terminar, mas não queria deixar sem

resposta os restantes Srs. Deputados.

Mas, dizia eu, esperemos que entremos numa fase em que seja possível contratualizar um programa que

incida sobre os bloqueios estruturais à nossa competitividade, em particular no domínio da educação, da

formação, da modernização do Estado e da Administração Pública, do sistema de justiça, e que permita,

designadamente, a valorização e a modernização da capacidade de inovação e tecnológica do nosso tecido

empresarial. Essa é uma forma de estar na Europa, solidária, mas não passiva, e é isso que é absolutamente

essencial.

Em resposta ao Sr. Deputado Jorge Falcato, que saúdo, que, com gosto, reencontro e que espero ter agora

a possibilidade de voltarmos a trabalhar juntos, queria dizer o seguinte: o Programa do Governo assume como

objetivo poder estudar e avaliar a forma de unificação das diferentes prestações sociais, tendo uma

componente fixa e uma componente variável, de modo a responder de uma forma mais ajustada às

necessidades específicas de cada um dos cidadãos que seja beneficiário e que isso se faça através de um

princípio fundamental de confiança no próprio beneficiário, que não passa, necessariamente, pela sua

institucionalização, porque não há nenhuma razão para encarar a pessoa com deficiência com uma

capacidade diminuída de gerir a sua própria autonomia e de gerir os apoios sociais que recebe do Estado, em

função das necessidades específicas que tem.

Finalmente, respondo à Sr.ª Deputada Berta Cabral dizendo que acompanhamos com muita preocupação o

tema do leite, que resulta não só, nem sobretudo, da há muito prevista eliminação das quotas leiteiras, mas

pelo fortíssimo impacto que tem tido o embargo da União Europeia à Rússia.

Página 54

I SÉRIE — NÚMERO 12

54

Protestos da Deputada do PSD Berta Cabral.

O Sr. Presidente: — Peço-lhe que conclua, Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Vou já terminar, Sr. Presidente.

Ainda recentemente, tive oportunidade de, nos Açores, reunir com o Presidente da Federação Agrícola dos

Açores, Sr. Jorge Rita, que me falou, e eu pude ouvir, das aspirações da lavoura açoriana. Estamos a

trabalhar, e trabalharemos, com o Governo da Região Autónoma dos Açores para responder da melhor forma

à situação específica dos Açores.

À Sr.ª Deputada Inês de Medeiros, louvando-me na nossa amizade, não vou responder para não

desrespeitar ainda mais o Sr. Presidente.

Risos da Deputada do PS Inês de Medeiros.

O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — E concluo, Sr. Presidente, se não se importa, expressando aqui,

antecipadamente, a minha solidariedade aos Srs. Deputados Pedro Passos Coelho e, apesar de ausente,

Paulo Portas, porque, estando agora na circunstância em que eu estava no debate parlamentar sobre o

Programa do anterior Governo,…

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Não, não! Não estamos na mesma situação!

O Sr. Primeiro-Ministro: — … certamente, serão vituperados pelos seus colegas de bancada pelo facto de

não terem usado, hoje, da palavra e terem perdido a oportunidade de me confrontar diretamente.

Aplausos do PS.

Protestos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: — Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Para uma interpelação à Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: — Sobre a condução dos trabalhos, não é?

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Exatamente, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: — Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Sr. Presidente, o Sr. Primeiro-Ministro veio, ele próprio, também

fazer uma interpelação sobre a condução dos trabalhadores e sobre o facto de o Dr. Paulo Portas não ter

intervindo. Vou responder, muito brevemente, ao Sr. Primeiro-Ministro com uma frase que agora, mais do que

nunca, estranhamente, lhe deve ser cara: «Olhe que não, olhe que não!»

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Peço a palavra, Sr. Presidente.

Página 55

3 DE DEZEMBRO DE 2015

55

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado Luís Montenegro, é também para interpelar a Mesa sobre a condução

dos trabalhos, não é verdade?

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Sr. Presidente, nos mesmos termos da interpelação anterior,…

O Sr. Presidente: — Com certeza, Sr. Deputado.

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — … muito rapidamente, também queria dizer ao Sr. Primeiro-Ministro que

a circunstância em que o Dr. Pedro Passos Coelho e o Dr. Paulo Portas se encontram hoje é bem diferente

daquela em que se encontrava o Dr. António Costa há três semanas.

Vozes do PS: — Ah!…

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — É que eles venceram as eleições, não as perderam nem quiseram tomar

o Governo que o povo escolheu que fosse protagonizado por outros. É muito diferente!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Protestos do PS, do BE e do PCP.

O senhor queria deitar o Governo abaixo,…

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, a sua interpelação não tem a ver com a condução dos trabalhos.

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — … tinha oportunidade de dizer ao que vinha e não o quis fazer no

primeiro dia daquele debate. É uma situação completamente diferente.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — A sua interpelação tem pouco a ver com a condução dos trabalhos, Sr. Deputado Luís

Montenegro.

Vou dar, agora, a palavra ao Sr. Deputado Carlos César, que também vai interpelar a Mesa sobre a

condução dos trabalhos.

Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Carlos César (PS): — Sr. Presidente, é apenas para lembrar a V. Ex.ª e, por vosso intermédio, a

todos os Deputados que todos os Deputados, nesta Assembleia, são iguais.

Vozes do PSD: — Ah!…

O Sr. Carlos César (PS): — São iguais quer aqueles que já foram do Governo quer aqueles que para o

Governo passaram. Por isso, é dever de todos nós intervir nos debates e, nessa ocasião, notamos muito a

falta daqueles que criticaram o Sr. Primeiro-Ministro quando, nas mesmas circunstâncias, não usou da

palavra.

Olhe que sim, olhe que sim, Sr. Deputado!

Risos e aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Vamos passar ao debate propriamente dito do Programa do XXI Governo

Constitucional (ponto 2 da ordem de trabalhos).

Estão inscritos vários Srs. Deputados.

Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Marco António Costa, do PSD.

Página 56

I SÉRIE — NÚMERO 12

56

O Sr. Marco António Costa (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Sr.as

Ministras, Srs. Ministros,

Sr.as

Deputadas, Srs. Deputados: A avaliação que hoje aqui fazemos não é apenas do Programa do XXI

Governo Constitucional. É também do processo político que levou à investidura deste Governo. E tal avaliação

só pode levar a uma conclusão: a conclusão de que vivemos um tempo estranho. Um tempo em que a

vontade, a razão e a prática democráticas são subjugadas a experimentalismos partidários. Um tempo em que

alguém quer que o bizarro passe a ser normal e o anómalo passe a ser natural.

Para nós, não faz sentido tal conjugação de ideias e por nós não alinharemos nesses princípios. Porque o

Programa que aqui discutimos é um programa que os cidadãos portugueses não sufragaram, porque é o

Programa de um governo que os portugueses não escolheram e porque a realidade indesmentível é só uma:

no passado dia 4 de outubro os portugueses escolheram, livre e democraticamente, um vencedor e uma

solução governativa clara, que foi derrubada neste Parlamento pela coligação socialista e comunista que

agora suporta este XXI Governo Constitucional.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Marco António Costa (PSD): — Nesse dia 4 de outubro, os portugueses disseram muito claramente

qual era o projeto que desejavam para o País: o projeto governativo que lhes foi proposto pelo PSD e pelo

CDS. E, nessa noite, sufragaram claramente não só uma proposta para o futuro como subscreveram o

caminho que nos trouxe até aqui. Um caminho em cujo percurso muitos quiseram colocar obstáculos, mas

que, por mérito dos portugueses, foi percorrido com sucesso. Um caminho que nos devolveu o prestígio

perdido e o respeito dos nossos parceiros internacionais e europeus. Um caminho que, nessa noite, recebeu a

derradeira avaliação política e aquela que mais importa: a avaliação dos portugueses que votaram para que o

caminho continuasse e que, dessa forma inequívoca, recusaram voltar atrás.

Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Deputados: Nenhum de nós ignora que o caminho seguido foi

difícil. Diria mesmo que foi muito difícil. E ninguém esconde que foram precisos, desde 2011, enormes

sacrifícios para vencer as dificuldades.

Mas também ninguém esquece — e sublinho, ninguém esquece — que o respeito por esse esforço

passado impõe aos governantes especiais responsabilidades no presente e no futuro.

Por isso somos claros, desde logo, numa primeira exigência: a de que não se volte atrás e se respeite o

trabalho e o sentido de entrega que os portugueses colocaram na recuperação de Portugal. Porque, mais do

que tudo, os portugueses não merecem que a recompensa por ultrapassarmos as dificuldades seja o regresso

da instabilidade, da incerteza e do devaneio incalculado.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Pelo contrário, o que os portugueses querem e o que os portugueses merecem é que se dê continuidade

ao trabalho que vinha sendo feito, pois é assim que se garante a manutenção do rumo de crescimento

económico e da recuperação social de Portugal.

Mas hoje, e poucas semanas após as eleições, o cenário é outro. Insisto: é um cenário atípico, anormal e

bizarro. Um cenário que tememos que faça Portugal regressar a 2011, destruindo o esforço de recuperação

que o País já realizou. O País que deixámos em 2015 não é o país que encontrámos em junho de 2011.

Por isso importa registar e recordar, para memória futura, quatro dados importantes. A saber: recebemos o

País com um défice de 11% e entregámos o País com um défice de 3%; recebemos o País em recessão e

entregámos o país com a economia a crescer homologamente há vários trimestres; recebemos um país

incapaz de se financiar, sem acesso a crédito, e entregámos um país com taxas de juro historicamente baixas;

recebemos o País com um desemprego galopante e entregámos o País com o desemprego a diminuir desde

janeiro de 2013.

Por fim, recordamos ainda que recebemos um país com as pensões mínimas sociais e rurais e o salário

mínimo nacional congelados e foi o Governo PSD/CDS que, em sede de concertação social e no âmbito de

um profundo e profícuo diálogo social, promoveu o descongelamento e a atualização desses rendimentos.

Página 57

3 DE DEZEMBRO DE 2015

57

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Deputados: Muitas têm sido as tentativas esforçadas de alguns

dirigentes da frente que apoia este Governo socialista e comunista para torcer a realidade e tentar, como é,

aliás, seu timbre, reescrever a história, pretendendo apagar os factos que acabei de elencar. E ainda tentam

esboçar umas inventonas que possam servir de desculpa aos seus falhanços.

A tais tentativas despudoradas para distorcer a realidade e lançar a confusão na opinião pública,

responderemos com moderação e pedagogia. E a essa atitude pedagógica juntaremos uma postura de

oposição responsável e exigente na vigilância dos caminhos que agora este Governo socialista e comunista

pretende trilhar. Fiéis, como sempre, ao critério que conduz a nossa ação política: a defesa intransigente do

interesse nacional.

É algo que nunca sujeitámos nem sujeitaremos a lógicas partidárias, a movimentações táticas ou a

interesses de circunstância plasmados em posições mais ou menos conjuntas. Porque o nosso compromisso

com Portugal não é o da geometria variável, consoante estamos no poder ou consoante estamos na oposição.

Não pertencemos, definitivamente, ao grupo dos que pensam que só podem ter — ou aparentar ter — uma

postura positiva moderada e dialogante quando estão no poder.

O Sr. Duarte Filipe Marques (PSD): — Muito bem!

O Sr. Marco António Costa (PSD): — Não obstante estarmos em total desacordo com a forma como este

Governo se impôs aos portugueses, o País sabe que o Partido Social Democrata não vira costas às suas

responsabilidades.

Apesar de termos visões políticas e estratégicas em muitos aspetos diametralmente opostas àquelas que

este Governo propõe, o País sabe que nós não baixamos os braços, não desistimos e não desertamos. Mais

claros e diretos não podemos ser.

De outros, o País sabe apenas que, nos últimos quatro anos, não ajudaram nem contribuíram para os

sucessos que Portugal e os portugueses alcançaram. Agora falam de diálogo, quando antes semearam o

sectarismo e o partidarismo mais radical.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Deputados: O Programa do Governo que hoje aqui discutimos

não é, já o disse, um programa escolhido pelos portugueses. Também não é o Programa que o PS apresentou

aos eleitores, nem tampouco a soma de todos os programas dos cinco partidos da esquerda que sustentam

este XXI Governo Constitucional.

O Sr. João Oliveira (PCP): — O PAN já foi apadrinhado!

O Sr. Marco António Costa (PSD): — Na ânsia de tentar conjugar tantas «posições conjuntas», o que

temos aqui, no fim de contas, é um programa desconjuntado e perigoso para o futuro de Portugal.

Não nos iludamos: este é um Programa com perigos reais e evidentes para o País e para os portugueses,

que põe em causa a recuperação económica e social que Portugal empreendeu nos últimos anos. Perigos que

residem nas opções, mas também na pressa vertiginosa com que desejam implementar tais opções. Uma

pressa negociada em nome de uma tomada esdrúxula do poder, mas inevitavelmente geradora de

desequilíbrios que serão fatais para o nosso futuro coletivo.

Não vamos aqui esmiuçar medida a medida deste Programa do Governo.

Concentremo-nos, pois, num dos seus aspetos centrais: aquele que apoia e sustenta o crescimento da

economia portuguesa no incremento artificial da procura e do consumo interno.

Como é possível que, depois de termos passado por tudo o que passámos, possa novamente este

Governo vir insistir numa receita de efeitos fatídicos a médio e longo prazo? Uma receita que faz aumentar as

importações, que desmobiliza do foco exportador a nossa máquina produtiva e afeta irremediavelmente a

competitividade das nossas empresas, gerando, a prazo, mais desemprego.

Página 58

I SÉRIE — NÚMERO 12

58

Por isso, apelamos à responsabilidade deste Governo socialista e comunista para não colocar em risco a

trajetória de crescimento económico que Portugal está a trilhar.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Isto até era divertido se demorasse mais tempo!

O Sr. Marco António Costa (PSD): — Ficámos ainda seriamente preocupados quando ouvimos a porta-

voz de um dos partidos que apoia este Governo classificar as IPSS como sendo — e vou citar — uma «rede

clientelar», a propósito da participação destas instituições na prestação de cuidados de saúde às populações.

É uma afirmação grave e, sobretudo, profundamente ofensiva para com todas as instituições e profissionais

que nelas trabalham e que se assumiram, nas últimas décadas, como parceiros insubstituíveis do Estado

social e como a primeira linha avançada de uma sociedade solidária.

Para nós, é claro que este é um sinal do regresso dos velhos preconceitos ideológicos contra uma

sociedade livre, atuante, inconformada e empreendedora, que faz da solidariedade um dever ético e que

intervém em cooperação com o poder local e central.

E seriamente preocupados ficámos também com a forma como este Governo socialista e comunista se

propõe desvalorizar a concertação social e minar, por essa forma, o diálogo social em Portugal, em nome de

uma radicalização política praticada sob orientação superior de quem, no passado, se autoexcluiu da

concertação e do diálogo social, preferindo a crítica destrutiva e a rua como instrumento de ação, ao trabalho

na concertação social.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Isto até seria divertido se demorasse mais tempo, mas para a semana já se

esqueceram!

O Sr. Marco António Costa (PSD): — Agravando esse receio, ainda hoje ouvimos o Sr. Primeiro-Ministro

afirmar aqui que quer ouvir a concertação social, mas que decidirá independentemente dela.

Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Deputados: Termino afirmando que é para nós claro que este

Governo e este Programa não podem merecer o nosso apoio. Mais: este Programa, socialista e comunista, em

nome de Portugal e dos portugueses, só pode merecer a nossa mais frontal oposição e rejeição.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Inscreveu-se, para pedir esclarecimentos, o Sr. Deputado Pedro Delgado Alves.

Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Pedro Delgado Alves (PS): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Marco António Costa, coloca-nos a

pergunta «em que momento foi o Programa do Governo do XXI Governo Constitucional sufragado tal qual nas

urnas pelos eleitores?»

Devolvo-lhe a pergunta: em que momento é que o Programa com que o PSD e o CDS governaram nos

últimos quatro anos foi, tal qual como foi apresentado aos eleitores, sufragado nas urnas?

Aplausos do PS.

O Programa de Governo é o resultado de um processo parlamentar, democrático, de construção de um

programa político. É o que resulta, depois de umas eleições, da capacidade de os partidos políticos

concertarem soluções que apresentam democraticamente perante um Parlamento.

Fala-nos de experimentalismo. Pergunto-lhe se haveria experimentalismo na altura, em 2011, quando em

debate televisivo o atual líder da oposição e o líder do CDS, confrontados com a possibilidade de acordos

parlamentares, debatiam a possibilidade de até poder ser o CDS a liderar o Governo, desde que a maioria

parlamentar o colocasse perante a Mesa, e a possibilidade até de o CDS, com mais votos do que o PSD,

liderar um governo, ainda que com menos votos do que o PS.

Aplausos do PS.

Página 59

3 DE DEZEMBRO DE 2015

59

A Sr.ª Ana Catarina Mendonça Mendes (PS): — Bem lembrado!

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Se tivessem votos para isso era uma coisa diferente!

O Sr. Pedro Delgado Alves (PS): — Era este experimentalismo ou era outra coisa? Democracia.

Democracia de base e componente parlamentar, democracia a funcionar como funcionou há duas semanas,

como funciona aqui no momento em que, com toda a legitimidade que a nossa Constituição e o nosso

Regimento dão, os senhores apresentam uma proposta de rejeição do Programa de Governo. É legítimo,

como foi legítimo, exatamente, há duas semanas. É a democracia a funcionar.

Mas, já agora, perguntava-lhe também se não entende que radicalização foi precisamente aquilo que levou

os portugueses a rejeitarem maioritariamente o Programa que a coligação apresentou,…

O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — O vosso Programa é que os portugueses rejeitaram!

O Sr. Pedro Delgado Alves (PS): — … porque, precisamente, a maioria dos eleitores que sufragaram os

eleitos que se encontram deste lado, os eleitores que elegeram Deputados que representam os portugueses,

esses, sim, não se reveem na perda de rendimentos, esses, sim, não se reveem na emigração, esses, sim,

não se reveem na precariedade, esses, sim, não se reveem no modelo que durante quatro anos, de facto,

trouxe resultados que agora se pretende ultrapassar e virar a página. Isto também, mais uma vez, é

democracia a funcionar.

Finalmente, uma última observação, uma última pergunta, em relação à concertação social. Não resisto a

voltar a colocá-la, já tem surgido várias vezes, em vários debates, em vários momentos. Aparentemente a

concertação social só se pode ignorar contra os trabalhadores e quando, porventura, os sindicatos levam uma

proposta à concertação social que não é aceite pelos governos, nunca me recordo de nenhuma bancada da

maioria anterior, nunca me recordo de ter havido um ultraje, uma ideia de espanto e de desgraça por,

porventura, uma proposta de um sindicato na concertação social não ser aceite e um governo decidir manter a

sua proposta inicial quando isso prejudica os trabalhadores.

O Sr. JoãoPinho de Almeida (CDS-PP): — Já houve! Está enganado! Tem de perguntar à UGT!

O Sr. Pedro Delgado Alves (PS): — Por que é que no momento em que se discute o salário mínimo e em

que eventualmente temos uma proposta na concertação social favorável aos trabalhadores, de repente, há um

«ai» e um «ui», «cai o Carmo e a Trindade» porque o decisor, democraticamente sufragado, vai manter uma

proposta para melhorar a condição de vida dos trabalhadores e para aumentar o salário mínimo? Por que é

que causa choque nestes momentos e nunca causou em todos os momentos em que a solução era

precisamente a inversa?

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Marco António Costa.

O Sr. Marco António Costa (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Pedro Delgado Alves, agradeço a sua

pergunta. Permita-me que faça aqui algumas precisões muito simples.

Perguntou-me qual era legitimidade para aplicarmos o Programa que aplicámos durante quatro anos de

governação. Foi a legitimidade que decorreu de um resgate que os senhores assinaram e que nós tivemos de

cumprir, sob uma avaliação permanente, aliás, doze avaliações permanentes dos nossos financiadores

externos.

O Sr. Pedro Delgado Alves (PS): — Nunca cumpriram uma meta!

Página 60

I SÉRIE — NÚMERO 12

60

O Sr. Marco António Costa (PSD): — E aquilo que resulta é que, depois de doze avaliações e de termos

cumprido um objetivo que foi o de libertar Portugal da troica, como os senhores tantas vezes referiram em

maio de 2014, ainda conseguimos uma última avaliação positiva, que foi a vitória de 4 de outubro, coisa que

os senhores não conseguiram nem de uma vez, nem da outra.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Mas, Sr. Deputado, de facto, os portugueses escolheram o Programa de Governo e o programa político

que foi apresentado pelo XX Governo Constitucional que os senhores, a maioria socialista e comunista,

chumbaram neste Parlamento.

A Sr.ª Ana Catarina Mendonça Mendes (PS): — E bem!

O Sr. Marco António Costa (PSD): — E essa responsabilidade os senhores terão de a carregar de forma

clara e terão de responder perante os portugueses face à situação em que encontram hoje o País e aquela em

que entregarão o País no futuro.

Descrevi de forma muito objetiva o cenário em que nós encontrámos o País e o cenário em que o

entregámos. As evidências são claras e só isso justifica que os portugueses tivessem tido vontade no dia 4 de

outubro de reconduzir o Dr. Pedro Passos Coelho como Primeiro-Ministro e o Dr. Paulo Portas como Vice-

Primeiro-Ministro. Foi nessa condição e nesse pressuposto que se estabeleceu todo o debate das eleições

legislativas, contrariamente ao que está a acontecer aqui hoje.

O Sr. João Oliveira (PCP): — As eleições eram para a Assembleia da República!

O Sr. Marco António Costa (PSD): — Aquilo que está a acontecer é que nunca antes, no período eleitoral,

foi assumido por essa maioria socialista e comunista que fariam um acordo que levaria ao poder o atual

Governo e o atual Primeiro-Ministro.

Somos institucionalistas, respeitamos institucionalmente todos aqueles que exercem funções, mas não

esquecemos a origem deste Governo e o pecado original que está ligado a este Governo, que é um Governo

com um Programa que não foi o escolhido pelos portugueses.

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Muito bem!

O Sr. João Oliveira (PCP): — Constitucionalistas, mas rancorosos!

O Sr. Marco António Costa (PSD): — É um Governo que também não foi escolhido pelos portugueses,

porque os portugueses não votaram nesta solução governativa.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Helena Freitas, do PS.

A Sr.ª Helena Freitas (PS): — Sr. Presidente da Assembleia da República, Sr. Primeiro-Ministro, é com

muita satisfação e confiança que desejo ao Sr. Primeiro-Ministro as maiores felicidades no exercício do cargo.

Ex.mo

Sr. Presidente da Assembleia da República, Ex.mo

Sr. Primeiro-Ministro, Ex.mas

Srs.as

e Ex.mos

Srs.

Membros do Governo, Sr.as

e Srs. Deputados, Minhas Senhoras e Meus Senhores: Decorre em Paris a 21.ª

Conferência do Clima, com a presença de cerca de 150 Chefes de Estado e de Governo, empenhados em

alcançar um acordo para diminuir a emissão de gases com efeito de estufa e conter o aquecimento global. A

cidade que há duas semanas viveu um dos dias mais violentos e dramáticos da nossa história recente é agora

palco em que a humanidade converge na construção de um projeto comum de paz e de esperança.

A Cimeira de Paris assinala a mudança e um futuro mais auspicioso para o planeta, contribuindo para

eliminar a pobreza e proteger a biodiversidade, os solos, o ar e os oceanos. Como afirmou o Papa Francisco

Página 61

3 DE DEZEMBRO DE 2015

61

«temos a responsabilidade moral de agir em favor dos mais pobres e mais vulneráveis, aqueles que são na

verdade os menos responsáveis pelas alterações do clima e os que mais sofrerão com os seus efeitos».

Nenhum país pode enfrentar sozinho o desafio das alterações do clima, cujos efeitos afetam globalmente a

vida dos povos, a estabilidade económica e a segurança das nações.

Ditaram as circunstâncias que fosse este o tempo de apresentação do Programa do XXI Governo

Constitucional. O tempo de afirmarum caminho alternativo, em que a prosperidade económica se harmoniza

com a ecologia e o desenvolvimento sustentável, pelo primado da pessoa, incorporando o conhecimento e a

inovação no desenho de políticas públicas informadas para o bem-estar e qualidade de vida de todas os

portugueses.

Este é um programa que defende uma outra conceção sobre o papel do Estado, dando prioridade à coesão

social e à promoção do emprego, respeitando a consolidação das contas públicas. Um programa que

prescreve o investimento na economia, travando o empobrecimento e devolvendo o poder de compra aos

cidadãos. Um programa que defende o Estado social e os serviçospúblicos, na segurança social, na

educação e na saúde, para um combate comprometido à pobreza e às desigualdades. Um programa que

defende o investimento na ciência, na inovação, na educação, na formação e na cultura, devolvendo ao País

uma visão de futuro na economia global. Um programa que assume o respeito pelos compromissos europeus

e internacionais, para a defesa dos interesses de Portugal e da economia portuguesa na União Europeia.

Na impossibilidade de me debruçar de forma exaustiva e coerente sobre todas as propostas do Programa

do Governo, destaco alguns dos seus pilares estratégicos.

O financiamento das universidades públicas foi reduzido de forma dramáticapelo anterior Governo,

afetando aestabilidade e a qualidade do ensino superior. Nãoé este o caminho. A diferenciaçãoda Europa e

de Portugal numa economia globalpassará semprepela cultura e pelo conhecimento.

O progresso do País exige competências técnicas e científicas que estão em larga medida nas instituições

de ensino superior e não pode negligenciar o papel da Universidade, enquanto lugar privilegiado de

criatividade e inovação. Desinvestir e abdicar de um ensino superior público de qualidade é condenar o País à

dependência externa e ao retrocesso. O atual Governo propõe um pacto de confiança no ensino superior,

incentivando a cooperação institucional e um quadro de financiamento estável, com definição plurianual.

A reforma do ensino superior público é inadiável, sendo prioritária a racionalização da rede do ensino

superior, ajustando a oferta à procura, sem abdicar da coesão territorial e social. Numa outra lógica e num

outro tempo, todos os governos criaram instituições universitárias, expandindo-se a rede a todo o território.

Esta opção, que hoje nos parece absurda, constituiu, de modo geral, uma mais-valia para os territórios em que

estas escolas se inseriram, pelo que importa agora desenvolver um exercício racional e transparente de

adequação e complementaridade.

É importante manter as instituições cujo papel impulsionador do conhecimento e da cultura se revelar

essencial para a vitalidade dos territórios mais despovoados do País, objetivo que se harmoniza com a

intenção do Governo em promover uma melhor integração entre as instituições de ensino superior e as

políticas de desenvolvimento regional.

Distinguir as prioridades para a renovação do ensino superior não pode deixar de contemplar um modelo

de apoio inequívoco ao mérito e aos estudantes que querem progredir na sua formação académica, mas que

não têm meios, nem pode esquecer a responsabilidade no apoio efetivo ao desenvolvimento económico,

através do conhecimento e da inovação, que são hoje ferramentas essenciais para tornar competitivo o tecido

produtivo nacional.

Nos últimos anos, corremos o risco de desperdiçar um trajeto que, de forma progressiva e consistente,

colocou a ciência portuguesa num patamar competitivo internacional. É preciso retomar o esforço de

crescimento formativo e recuperar o papel da ciência como fonte e expressão da vitalidade criativa do País. Na

educação e na ciência está a força catalisadora desta nova fase empreendedora de Portugal.

O retrocesso do investimento na ciência contribuiu para a emigração de investigadores altamente

qualificados, jovens e seniores. A ambição política tem de apoiar e gerar oportunidades para tantos jovens

investigadores portugueses disponíveis para contribuir e promover o desenvolvimento competitivo de Portugal

num mercado global. Tais oportunidades devem ser acalentadas em ambiente empresarial, mas igualmente

difundidas nas universidades, favorecendo as sinergias que é indispensável fomentar entre os dois mundos.

Página 62

I SÉRIE — NÚMERO 12

62

Importa garantir a estabilidade e o financiamento equilibrado e justo do sistema científico nacional. O

Programa do Governo propõe, entre outros objetivos: recuperar a confiança no sistema de ciência e tecnologia

e assegurar a previsibilidade dos incentivos públicos; restabelecer a transparência e regularidade no

funcionamento dos agentes da política científica; reforçar a administração pública com investigadores

doutorados; reforçar o programa do emprego científico, substituindo progressivamente a atribuição de bolsas

de pós-doutoramento anuais pela criação de um muito maior número de novos contratos de investigador;

reforçar as instituições científicas e garantir um novo programa de avaliação científica das unidades de

investigação e desenvolvimento. Propõe, ainda, o reforço dos programas e instrumentos de promoção da

cultura científica e tecnológica.

Resgata-se, assim, a visão esclarecida e visionária do responsável por uma das políticas públicas mais

consistentes e reformadoras do Portugal moderno. É com emoção e com muito afeto que presto, nesta

Assembleia, a minha homenagem a um dos portugueses mais notáveis que tive o privilégio de conhecer de

perto: José Mariano Gago.

Aplausos do PS.

Portugal tem recursos naturais excecionais, que justificam políticas integradas e uma visão estratégica de

longo prazo. A valorização ecológica do território, das áreas protegidas aos solos e aos rios, é condição de

bem-estar das pessoas e determinante para o crescimento sustentável dos territórios. Exigem-se políticas

ambientais corajosas, medidas de adaptação às alterações climáticas, promoção da eficiência energética e

das energias renováveis e uma aposta inequívoca e definitiva na mobilidade elétrica.

A valorização dos espaços marítimos sob soberania ou jurisdição nacional é estratégica para o

desenvolvimento do País. A extensão da plataforma continental e os recursos biológicos, genéticos, minerais e

energéticos que este espaço contém abrem perspetivas que o País não pode desperdiçar. Este desígnio só é

possível se apoiado no conhecimento científico e desenvolvimento tecnológico, beneficiando da rede de

ciência do País e ainda dando corpo a um tecido empresarial de base tecnológica que tenha como centro da

sua atividade o mar.

Com igual firmeza, o Governo propõe valorizar as atividades marítimas tradicionais e valorizar a posição

estratégica de Portugal no Atlântico, reforçando e modernizando os portos nacionais, ligando-os à rede

transeuropeia de transportes. O Governo proporá um plano de aumento da capacidade das infraestruturas

portuárias, bem como de ligações ferroviárias aos hinterlands europeus, com prioridade para a ligação do

porto de Sines à rede ferroviária.

Assinalo, ainda, a instalação de um centro de observação oceânica nos Açores e a aposta na criação de

um cluster tecnológico e de investigação aplicada nas áreas dos campos petrolíferos e minerais digitais e da

engenharia naval, offshore e submarina.

O empobrecimento biológico da terra e a degradação dos ecossistemas é um processo que compromete os

bens e serviços prestados à Humanidade. A extinção de espécies e a vulnerabilidade de outras, cuja

complexidade é uma dádiva admirável da evolução, confrontam-nos com a nossa própria impotência e com

uma Humanidade indiferente ao seu próprio planeta. As ameaças são profundas e globais, pondo em causa os

ecossistemas que sustentam a vida na Terra. A ameaça das alterações climáticas e do seu impacto sobre o

planeta — 50% da diversidade biológica da Terra desaparecerá ao longo deste século — colocam-nos perante

um desafio ambiental, mas também político, complexo e decisivo para o futuro da Humanidade.

O Programa do Governo propõe a valorização da biodiversidade e dos serviços dos ecossistemas,

encarando-os como ativos estratégicos essenciais para a coesão territorial, social e intergeracional. É neste

contexto de equilíbrio ecológico que se deve entender a sustentabilidade dos recursos hídricos, um recurso

biológico essencial à vida e dela resultante. É por isso, também, um bem coletivo. Toda a vida na Terra,

terrestre e aquática, dos microrganismos aos vertebrados, depende e é composta pela água e pela dinâmica

dos cursos de água. Garantir água e saneamento básico com qualidade e acessível a todos é um objetivo

fundamental que nos deve mobilizar coletivamente.

No sector das águas há decisões e práticas de gestão que o atual Governo irá corrigir, em benefício dos

cidadãos. Destaco a reversão das fusões de empresas de água que tenham sido impostas aos municípios e o

Página 63

3 DE DEZEMBRO DE 2015

63

objetivo de integrar o ciclo urbano da água numa articulação entre o fornecimento de água e as redes de

drenagem.

No domínio específico da política florestal o Governo propõe, entre outros objetivos, a intenção de

promover a progressiva elaboração do cadastro da propriedade rústica, nomeadamente nos territórios sob

gestão das ZIF (zonas de intervenção florestal), o apoio ao movimento associativo florestal e a maior produção

e produtividade das fileiras florestais, através do aumento das áreas de pinheiro bravo e do montado de sobro

e de azinho, travando a expansão da área do eucalipto, designadamente através da revogação da lei que

liberaliza a plantação de eucaliptos. Projeta-se, assim, finalmente, uma floresta que visa repor o equilíbrio

entre a função económica da produtividade silvícola e a conservação de recursos múltiplos que a floresta deve

assegurar.

A política que consistiu em aumentar os impostos e cortar nos salários, nas pensões, nos apoios sociais e

nos serviços públicos, falhou. Os seus efeitos na economia e na sociedade portuguesa foram devastadores e

não contribuíram para a consolidação sustentada das finanças públicas. A economia portuguesa e as finanças

estão frágeis, a fragilidade dos bancos é hoje maior.

O Programa do XXI Governo Constitucional apresenta um caminho alternativo para Portugal, dando

prioridade ao combate ao empobrecimento e ao desemprego, à defesa dos serviços públicos de educação,

saúde e segurança social e apostando na educação e na investigação, a novas políticas económicas e sociais

para tornar o País competitivo, travar o retrocesso social e recuperar o caminho do progresso e da

solidariedade.

Sr. Primeiro-Ministro, este é um tempo de esperança e estou aqui, hoje, para lhe dizer que confio em si e

que acredito em Portugal e nos portugueses.

Aplausos do PS e de Os Verdes.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Ministro das Finanças.

O Sr. Ministro das Finanças (Mário Centeno): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Sr.as

e Srs.

Deputados, Minhas Senhoras e Meus Senhores: Iniciamos, agora, com o Programa do XXI Governo

Constitucional, um tempo novo, um tempo novo na economia e nas finanças de Portugal.

O Programa do Governo parte de uma leitura atenta e detalhada da realidade económica, financeira e

social portuguesa, uma realidade que este Governo conhece bem e que analisou em pormenor.

Reconhecemos os desafios que enfrentamos, não nos escondemos por detrás de desculpas e justificações.

Como este Governo nasce do respeito pelas decisões dos portugueses, não nos apresentamos aqui a dizer

que o País está de tanga, mas sabemos que somos muito menos do que há quatro anos, especialmente os

jovens, que já não temos, nem cuidámos de ter.

Hoje é claro, já todos percebemos, quem é que estava a viver acima das suas possibilidades, acima das

nossas possibilidades, e sabemos que essas possibilidades, hoje, são muito menores para o milhão e meio de

portugueses que ganha menos de 600 € por mês.

Hoje, caídas todas as máscaras e levantados todos os véus, percebemos que a expressão «saída limpa»

foi um resultado pequeno para uma propaganda enorme.

Aplausos do PS.

Mas enfrentamos os desafios com a determinação de quem não está preso a soluções ineficazes e quer

defender o seu País na Europa. O que hoje interessa é o futuro de Portugal. Por isso, a clarificação do cenário

de governabilidade do País recentra a preocupação de todos os agentes políticos, económicos e sociais com

Portugal e com os portugueses.

Hoje sabemos exatamente por que é que as nações falham, e Portugal não tem margem para falhar.

As nações falham quando perdem o respeito pelas instituições, que é uma condição essencial para o

sucesso económico. As nações falham, porque perdem o respeito por si próprias, porque não estabelecem

relações duradouras com as suas próprias regras, porque não se constroem em torno de ideias inclusivas.

Página 64

I SÉRIE — NÚMERO 12

64

Falham, porque deixam de acreditar em si e nos seus, porque se deixam amesquinhar pelos preconceitos e

pelas pressões dos outros.

Sustentamos o nosso Programa do Governo numa visão inclusiva e solidária da economia. Não vendemos

ilusões, nem apresentamos quimeras, porque medimos, económica e financeiramente, todas as propostas que

fazemos.

Aplausos do PS.

Sr. Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: A economia portuguesa apresenta um crescimento anémico, em

que o investimento teima em não aparecer, em que, pelo esforço das empresas e dos trabalhadores, se

conseguiu conter a destruição de emprego, mas esse esforço traduziu-se numa redução inédita dos salários e

também num aumento nunca visto da emigração. É necessário combater os verdadeiros obstáculos à

competitividade das empresas portuguesas.

O resultado das eleições de 4 de outubro demonstrou uma vontade largamente maioritária de alteração das

políticas que nos trouxeram até aqui. Esta mudança deve ser conduzida com total respeito pelas obrigações

do Estado português, desde logo das obrigações que o Estado português tem com os próprios portugueses.

Primeiro que tudo, o Programa do Governo repõe a ordem constitucional.

O Programa do Governo restaura o contrato social, um contrato de confiança, que é o pilar da nossa vida

coletiva. Fá-lo quando respeita e valoriza a escola pública, quando promove a redução das desigualdades

sociais, através de uma política de rendimentos mais justa, quando assegura a proteção do Serviço Nacional

de Saúde, pilar essencial do Estado social português.

Aplausos do PS.

Acabou o tempo dos apelos às revisões constitucionais feitas à medida. Acabou o tempo das violações da

Constituição, não por defeito, mas por feitio.

A reposição dos salários da função pública é acelerada no nosso Programa do Governo, não apenas por

um imperativo constitucional, é, antes, o reconhecimento económico de que o emagrecimento da

Administração Pública trouxe dificuldades ao seu funcionamento e que a desvalorização dos serviços públicos

é, também, um fator de empobrecimento.

A reposição da normalidade constitucional passa, também, pelas pensões. O Estado, expressão

institucional da comunidade nacional, é o garante dos sistemas de segurança social públicos e assim deve

continuar a ser.

A normalidade económica só será conseguida com uma redução efetiva da carga fiscal para as famílias e

para as empresas. É urgente aliviar o espartilho económico, para que as empresas possam investir e criar

emprego e para que as famílias possam desenvolver, com dignidade, as suas aspirações.

Aplausos do PS.

No entanto, sabemos o custo elevado que têm para o investimento das empresas e das famílias as

interrupções abruptas no funcionamento do sistema económico, do seu financiamento e do apoio social.

A mudança que agora propomos é, assim, responsável. O Governo inicia, então, um tempo novo. Um

tempo de mobilizar Portugal e os portugueses para mais crescimento, melhor emprego e maior equidade.

Uma economia só é sustentável se constituir as bases para a ação do Estado, das empresas e das

famílias.

Compreendemos hoje, melhor de que nunca, que há uma linha muito ténue entre as condições económicas

e financeiras de cada um destes agentes. Cada um deles não existe sem os outros. Os investimentos de uns

estão dependentes dos investimentos dos outros. É esta interdependência que torna as políticas públicas tão

relevantes para o crescimento económico e para o emprego.

Sabemos hoje que não recuperamos competitividade por via do empobrecimento, da precarização do

trabalho ou do sacrifício da qualidade e da proximidade dos serviços públicos.

Página 65

3 DE DEZEMBRO DE 2015

65

Esta estratégia debilita a economia e a sociedade, esvaziando-as, através da emigração e do aumento da

componente importada no investimento, no consumo e nas exportações.

Sr. Presidente e Sr.as

e Srs. Deputados, o nosso sucesso económico será função do continuado

investimento no conhecimento e na inovação, na modernização do tecido empresarial e da Administração

Pública.

Pensar Portugal no futuro é pensar na responsabilidade do Estado mas, também, na de cada uma das

nossas empresas, dos nossos trabalhadores e de cada um dos nossos jovens.

A participação na União Europeia requer um conjunto de deveres, que não são mais do que a tradução dos

mecanismos de solidariedade que sempre estiveram presentes na construção europeia.

O Sr. Paulo Portas: — Mas isso o PCP não acha!

O Sr. Ministro das Finanças: — Portugal necessita de iniciar um período de convergência económica e

social com a União Europeia. A política orçamental, a política económica e a regulação devem promover essa

convergência.

Neste sentido, deve ser objetivo essencial de qualquer boa governação assegurar finanças públicas

equilibradas.

Constitui um compromisso deste Governo prosseguir uma trajetória de redução do défice orçamental e da

dívida pública no ciclo desta Legislatura.

O Orçamento do Estado para 2016 vai ser apresentado o mais depressa possível, já o dissemos. O

Governo encurtará o período de que legalmente dispõe para apresentar esse Orçamento. Não é desejável que

o País esteja num prolongado período sem a aprovação de um dos mais relevantes instrumentos de

governação.

Este Orçamento pretende ser o primeiro passo para o País poder atingir os objetivos a que nos propomos:

o aumento e a proteção do rendimento disponível das famílias, o alívio da asfixia fiscal das famílias e das

empresas, melhores condições de investimento para as empresas, o combate à pobreza e a garantia de

serviços e bens públicos essenciais.

É esta equação virtuosa, entre a promoção das condições para o crescimento económico e o rigor nas

contas públicas, que ditará o sucesso da economia portuguesa nos próximos anos e que colocará o País no

caminho da prosperidade e do progresso.

É aos portugueses que este Governo pretende proporcionar a oportunidade de começar a reconstruir

Portugal. É este o tempo novo, o tempo de fazer Portugal.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — O Sr. Ministro das Finanças tem 12 inscrições para pedir esclarecimentos. Como

prefere responder?

O Sr. Ministro das Finanças: — Em três grupos.

O Sr. Presidente: — Prefere responder em três grupos, de quatro pedidos de esclarecimentos cada.

Assim, tem a palavra a Sr.ª Deputada Mariana Mortágua.

A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, começo por cumprimentá-lo e por dizer-lhe

que, como deve ter reparado, está, naquelas bancadas à direita, sentado o ex-Primeiro-Ministro, que prometeu

que nem mais um cêntimo seria gasto a salvar um banco em Portugal.

Esta mesma direita que fez esta promessa, que veio propagandear a consolidação orçamental feita pelo

seu Governo nos últimos quatro anos, foi até hoje incapaz de explicar as pelo menos duas bombas-relógio que

deixou no seu Ministério: o Banif e o Novo Banco.

O Banif apresentou, há dias, ao BCE um plano de reestruturação depois de ter sido intimado a aumentar o

seu capital em 1400 milhões de euros. Uma primeira pergunta, muito clara, Sr. Ministro: sabemos que o

acionista do Novo Banco é o Fundo de Resolução. Portanto, importa-nos saber se este Fundo de Resolução

Página 66

I SÉRIE — NÚMERO 12

66

foi consultado acerca do plano de reestruturação criado pelo Novo Banco. Mais do que isto, importa-nos saber

se o Ministério das Finanças, que faz parte da administração do Fundo de Resolução, deu o seu acordo ao

processo e plano de reestruturação apresentado pelo Novo Banco, ou se, pelo contrário, não teve qualquer

conhecimento do plano que foi apresentado a Bruxelas.

Por outro lado, se o plano de reestruturação do Novo Banco teve o acordo do Ministério das Finanças,

então, gostaríamos que o Sr. Ministro explicasse as consequências desse plano para o Banco, para começar,

e para os trabalhadores, que querem saber se serão, ou não, despedidos, com as ameaças que estão à porta.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Muito bem!

A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Gostaríamos que o Sr. Ministro explicasse as consequências desse

plano para os lesados do BES que, até hoje, não tiveram uma resposta clara das instituições, nomeadamente

do Banco de Portugal. E queremos saber quais são as consequências para as contas públicas, que a direita

tentou esconder até este momento.

Sr. Ministro, parece-nos que a fantasia orçamental já dura há demasiado tempo para que continuemos com

este jogo de máscaras e de sombras, como era prática do Governo do PSD e CDS.

Aplausos do BE e de alguns Deputados do PS.

Por outro lado, S. Ministro, se não houve acordo do Ministério das Finanças, agradecíamos que

esclarecesse o que tenciona dizer ao Banco de Portugal, que tomou conta desta operação para salvar a face

do anterior Governo, que se escudou no Banco de Portugal durante este tempo, que se prepara para nos

apresentar uma conta pela calada.

Portanto, Sr. Ministro, interessa-nos saber qual é a estratégia do seu Governo para o Novo Banco.

Mais uma questão. Gostaríamos de saber o que é que o Sr. Ministro vai dizer ao Banco de Portugal, que

não foi capaz de dar resposta aos lesados, nem de supervisionar convenientemente o BES,…

Protestos do PSD.

… mas foi muito célere a fazer uma contratação milionária do antigo Secretário de Estado Sérgio Monteiro,

para ir vender o Novo Banco, como recompensa das privatizações que fez ao serviço da direita.

Aplausos do BE, do PS e do PCP.

O que é que este Governo vai dizer ao Banco de Portugal acerca dessa contratação milionária?

Aplausos do BE e do PS.

O Sr. Presidente: — O Sr. Ministro informou, entretanto, a Mesa que as respostas serão dadas em quatro

grupos de três, o que torna até o debate mais vivo.

Tem a palavra, para pedir esclarecimentos, o Sr. Deputado António Leitão Amaro.

O Sr. António Leitão Amaro (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, como dizia o seu chefe, comecemos

pelos pontos de partida.

O Sr. Ministro ainda agora, numa intervenção, criticou a saída «limpa» de Portugal. O Sr. Ministro preferiria

estar na posição em que nós estivemos, que chegámos ao Governo com a troica cá dentro? Ou o Sr. Ministro

estará a desdenhar o esforço monumental dos portugueses para tirar de cá a troica, que os senhores

trouxeram?

Vozes do PSD: — Muito bem!

Página 67

3 DE DEZEMBRO DE 2015

67

O Sr. António Leitão Amaro (PSD): — Ou o Sr. Ministro estará a preferir não uma saída «limpa», como a

de Portugal, mas uma presença «suja», como a que teve de ter a Grécia, que, infelizmente, ainda hoje está a

empobrecer?

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Muito bem!

O Sr. António Leitão Amaro (PSD): — Sr. Ministro, o nosso ponto de partida, há quatro anos e meio, foi

um País em recessão, à beira da bancarrota, com um crescimento explosivo do desemprego e da dívida, com

um défice superior a 11% e o investimento em longa contração, quase na bancarrota e sem confiança. E o seu

ponto de partida é bem diferente. É talvez um homem de sorte, sorte que deu muito trabalho a todos, menos a

VV. Ex.as

.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. António Leitão Amaro (PSD): — E esse ponto de partida é feito de uma economia — Sr. Ministro,

soubemos, nas últimas duas semanas, os dados da trajetória e da tendência — que cresce 1,4% face ao

período do ano passado e cujo desemprego desce 1,5% face ao ano passado. No mês de outubro diminuiu o

número de desempregados e no último trimestre o emprego remunerado subiu. Mas também a produção

industrial está a subir 4,2%, o investimento a crescer 1,7%, as exportações 3,9% e um défice que, também

ficámos a saber, por reduzir 1200 milhões de euros face ao ano passado, nos permite almejar a meta de sair

com os 3% e abaixo dos 3%, que é tão importante para o País.

Sr. Ministro, o que quereis vós fazer a este País em recuperação? Uma dupla receita para o desastre ou,

se calhar, um regresso «sujo», que com o vosso modelo económico, Sr. Ministro, ascende num choque ao

consumo, que as negociações à esquerda só agravaram.

Sr. Ministro, isso não funciona e o Sr. Ministro sabe. Sabe que um choque ao consumo é errado, porque

não funciona, sobretudo em economias sobreendividadas. Não funciona, garantidamente, porque, Sr. Ministro,

aumentar o consumo num País que já agora está com uma taxa de aumento do consumo superior à média

dos últimos 20 anos,…

A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — É mentira!

O Sr. António Leitão Amaro (PSD): — … significa não fazer crescer a riqueza e o emprego em Portugal,

mas, sim, fazer crescer a riqueza e o emprego na Alemanha, porque, Sr. Ministro, mais consumo significa

aumentar as importações e em Portugal deixa mais dívida externa e na Alemanha deixa mais emprego e mais

riqueza.

Sr. Ministro, se no seu famoso Excel mágico o senhor se esqueceu, tem boa solução, olhe para o lado.

Tem aí sete colegas que já apostaram nessa receita e que, com essa receita, conduziram o País ao falhanço,

ao fracasso e à bancarrota.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Sr. Ministro, receio mesmo que essa predominância de repetentes governantes socialistas signifique uma

repetição da receita e, por isso, uma repetição do desastre. Mas, Sr. Ministro, há uma outra parte da vossa

receita e da vossa prática que me preocupa ainda mais: quando, mesmo sem ser nas palavras, na prática,

parecem fazer tudo para colocar em causa a confiança, a competitividade da economia portuguesa e, por isso,

o investimento.

Falo, por exemplo, da reversão da reforma do IRC, que estimula e atrai o investimento. Sr. Ministro, não é

apenas o facto de estarem a mudar as regras a meio do jogo, criando um dos piores males do regime tributário

e da fiscalidade, que é a instabilidade. Fazem-no revertendo uma reforma que, reduzindo a tributação,

aumentou a receita.

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — É verdade!

Página 68

I SÉRIE — NÚMERO 12

68

O Sr. António Leitão Amaro (PSD): — E fazem-no, Sr. Ministro, perigando ou colocando completamente

em causa a confiança até nas vossas palavras, rasgando a vossa assinatura.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Sr. Ministro, como é que alguém, um investidor, pode acreditar num partido e num governo cuja assinatura

fiscal não dura nem dois anos? Mas também destroem a confiança dos investidores, Sr. Ministro, com as

vossas pretensões de reverter as reformas estruturais na justiça e na legislação laboral — e sobre as vossas

medidas na legislação laboral, que debate daria consigo!

E, Sr. Ministro, não estão apenas a pôr em causa e a reverter reformas estruturais que já estão a aumentar

a competitividade de Portugal, o que é assinalado por todas as instituições internacionais, como também põem

em causa e rasgam a palavra da concertação social — da UGT, por exemplo.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. António Leitão Amaro (PSD): — Mas também estão a destruir a confiança dos investidores, quando

querem reverter as reprivatizações e as concessões. Primeiro — pasme-se! —, andaram a ameaçar

investidores, quando ainda nem estavam no Governo. Agora, querem rasgar contratos, contratos esses que

existem porque a vossa palavra, a vossa assinatura, a do Partido Socialista, foi colocada, em nome do Estado

português, dizendo que estas privatizações tinham de se fazer.

Sr. Ministro, também por falar em confiança e em palavra que inspira confiança, como é que ficam os

investidores tendo sabido que o Sr. Ministro deixou cair a sua medida, supostamente, para estimular a

tesouraria das empresas com a redução da TSU?

Sr. Ministro, nem sequer essa medida, entre tantas outras, o senhor conseguiu manter? Também para os

investidores, palavra dada, afinal, é palavra rasgada.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, já ultrapassou o dobro do tempo de que dispunha. De qualquer forma,

como está a descontar no tempo da sua bancada, há essa flexibilidade.

Faça favor de continuar.

O Sr. António Leitão Amaro (PSD): — Vou terminar, Sr. Presidente.

Sr. Ministro, o vosso Programa merece rejeição porque tem uma dupla receita para o desastre. E de duas,

uma: ou o Sr. Ministro sabe e esconde, tal como escondeu do Programa do Governo as previsões do PIB e do

emprego, que dele não constam e são essenciais para avaliar o seu Programa do Governo depois das

medidas alteradas pelo acordo das esquerdas,…

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — É verdade!

O Sr. António Leitão Amaro (PSD): — … ou, então, o Sr. Ministro sabe e até queria dizer mas, como em

tantas outras convicções suas, é simplesmente um Ministro derrotado.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — A flexibilidade da Mesa, no que diz respeito a estas intervenções que são

compensadas no tempo dos próprios partidos, é, depois, também compensada por uma grande inflexibilidade

e rigidez quando se passa o tempo dos respetivos partidos, como sabem.

Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Cecília Meireles.

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, gostava de cumprimentá-lo nesta sua

primeira intervenção.

Página 69

3 DE DEZEMBRO DE 2015

69

Começaria por dizer-lhe que há uma frase — e é uma frase sua — que, creio, vai marcar todo o seu

mandato. Disse o Sr. Ministro que a saída limpa de Portugal foi um resultado pequeno. Sr. Ministro, pode

parecer-lhe pequeno, mas olhe que pequeno não pareceu de certeza a muitos milhões de portugueses que

conseguiram, com o seu esforço e com os seus sacrifícios, ao longo destes anos, sair da situação a que

tínhamos chegado.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

E mais lhe direi: pode a dimensão da saída limpa não lhe parecer grande, e nisso reconheço-lhe razão,

porque de certeza é um resultado muito mais pequeno do que a dimensão e a magnitude do resultado da

bancarrota que o Governo de que o senhor é herdeiro deixou a Portugal.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

Essa, de facto, é uma desgraça de um tamanho e de uma dimensão com que, felizmente, nunca ninguém

aqui conseguiu competir. Mas, felizmente para Portugal, não só não competimos como lhe desejo que, no seu

mandato, nunca tenha ocasião de competir e de conseguir um resultado de tão grande dimensão, porque ele

seria uma péssima notícia não apenas para si mas, sobretudo, para todos nós e para o País.

Em segundo lugar, quero colocar-lhe questões muito, muito concretas, sobre um tema — sendo a sua

primeira intervenção nesta Câmara — que sei que lhe é caro, o cenário macroeconómico, que foi uma enorme

bandeira eleitoral do Partido Socialista. Já ouvimos o Sr. Primeiro-Ministro classificar aquelas que são as

opções económicas ou financeiras — umas ou outras, ou ambas — do PSD e do CDS como «magia» e

«coisas de laboratório» e sabemos bem que este vosso cenário macroeconómico não é nada disso, é uma

coisa rigorosa, exigente e altamente científica.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Não parece!

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Portanto, desse ponto de vista, queremos chegar até ao fim e

perceber tudo, tudo, tudo o que ele implica.

Ora, há duas questões que ficaram fora deste Programa do Governo e gostava de saber o que me diz o Sr.

Ministro em relação a isso, porque esse cenário foi sempre bastante pormenorizado e houve até a publicação

de um documento, de um estudo financeiro, aliás, muito útil, e acho que este esforço é para continuar.

Portanto, gostava de lhe fazer duas perguntinhas muito concretas. A primeira é qual é a previsão para o

emprego, para 2016, que está inscrita no cenário do Programa do Governo.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — É que os senhores previam um aumento no emprego de 299 000

postos de trabalho, 207 000 dos quais tinham a ver com as medidas. Aliás, o Sr. Primeiro-Ministro até dizia

«eu não prometo isto, prometo é estas medidas». Mas, agora, veja bem: as medidas mudaram, várias das que

estavam previstas, designadamente a redução da contribuição patronal para a segurança social, a vulgo TSU

do empregador, e o procedimento conciliatório, estavam-no num capítulo intitulado «Promover o emprego,

combater a precariedade», e tinham esse efeito. Portanto, gostava de saber se continua a prever o mesmo

número de aumento de postos de trabalho, se houve uma diminuição ou se houve um aumento. O que é que

aconteceu?

Em segundo lugar, do ponto de vista do PIB e do crescimento do PIB para 2016, aquilo que estava previsto

era também um crescimento de 2,4. Ora, gostaria de saber, com todas estas alterações, porque isso é omisso

no Programa do Governo, se continua a manter-se essa previsão, se ela aumentou ou se ela diminuiu.

É que, repare, o vosso modelo assenta, e muito, no chamado «choque de rendimentos». E há muitas

medidas que estão em curso, designadamente as respeitantes, por exemplo, aos rendimentos dos

funcionários públicos, mas não só, que têm impacto nisso. Ora, gostaria de saber se prevê um aumento do

aumento, ou não.

Página 70

I SÉRIE — NÚMERO 12

70

Por último, porque nesta matéria também há uma leve diferença, quero fazer-lhe uma pergunta. Há várias

revisões do cenário, mas a verdade é que, neste cenário final, aumentam as despesas com pessoal mais ou

menos na mesma medida em que diminuem as despesas do investimento. E sei que há várias revisões: umas

têm a ver com a revisão do cenário inicial e outras têm a ver com as medidas. Mas como, agora, há várias

medidas que têm precisamente a ver com isto, com o aumento das despesas com pessoal, gostava de saber

se elas vão ou não ser compensadas com uma diminuição do investimento correspondente.

Por último, já que necessariamente a sua resposta aqui será finita, porque há medidas que, por assim

dizer, ainda estão em curso, gostaria de saber se é possível dizer-nos a que acordo vão chegar com os vossos

parceiros, o PCP, o BE e Os Verdes, em relação à sobretaxa e às remunerações dos funcionários públicos, e,

já agora, que efeito é que elas irão ter no tal cenário, que é um exercício muitíssimo exigente e rigoroso e que

certamente terá tudo isto amplamente previsto.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente: — Para responder aos três Srs. Deputados que acabaram de pedir esclarecimentos, tem

a palavra o Sr. Ministro das Finanças.

O Sr. Ministro das Finanças: — Sr. Presidente, Srs. Deputados, começo por responder à Sr.ª Deputada

Mariana Mortágua, referindo-me ao sistema financeiro, da seguinte forma: todas as questões que têm a ver

com o sistema financeiro são questões absolutamente centrais para a vida da economia e da sociedade

portuguesa. E, desse ponto de vista, elas devem ser tratadas — e aí estou completamente de acordo com a

Sr.ª Deputada — da forma mais transparente possível.

O processo em curso, quer com o Banif quer com o Novo Banco, está, neste momento, em discussão com

a Comissão Europeia e com o Banco Central Europeu. Existem funções específicas para o Fundo de

Resolução e para o Banco de Portugal, no contexto desses processos, e o Ministério das Finanças participa e

é consultado nestes processos. Mas, na verdade, as responsabilidades que cabem a Portugal para resolver

cada uma destas questões têm a ver e estão nas mãos destas instituições.

Vozes do PSD e do CDS-PP: — Ah!

O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — Que desilusão!…

O Sr. Ministro das Finanças: — O Governo e o Ministério das Finanças cumprirão o seu dever nesta

dimensão, zelando pela estabilidade do sistema financeiro e protegendo os contribuintes portugueses dos

custos associados à resolução destes problemas.

Protestos do PSD e do CDS-PP.

É exatamente porque este é um problema sério que a questão da saída limpa deveria ser tratada com

muito mais cautela pela bancada à minha direita.

Aplausos do PS.

É precisamente porque Portugal enfrenta dificuldades sérias na recuperação económica e na resolução dos

problemas do setor financeiro que eles devem ser tratados com muita seriedade e não com o ruído que acabei

de ouvir.

Aplausos do PS.

Protestos do PSD e do CDS-PP.

Página 71

3 DE DEZEMBRO DE 2015

71

Gostaria de lhe dizer, Sr.ª Deputada, que a posição do Governo em relação a estes assuntos é uma

posição de proteção sem limites daquilo que é o interesse dos contribuintes e do Estado português neste

processo. Incluindo também as estranhas palavras que o Dr. Sérgio Monteiro proferiu recentemente sobre

política geral e venda do Novo Banco, que nos pareceram totalmente despropositadas e, obviamente, não são

do agrado do Governo português.

O Sr. Deputado Leitão Amaro entrou em círculo, porque partiu de um suposto modelo de crescimento pelo

consumo e chegou a 2015 num modelo em que o crescimento da economia portuguesa se faz pelo consumo e

pelo endividamento. É que o problema do endividamento está precisamente em consumirmos sem criarmos

rendimento — e esse é o problema da economia portuguesa, neste momento.

Aplausos do PS.

Sr. Deputado, a população ativa caiu, no terceiro trimestre de 2015, 1%. Saíram da força de trabalho, em

Portugal, mais 50 000 portugueses.

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — E quantos foram para a reforma?!

O Sr. Ministro das Finanças: — Este é um processo que tem de ser parado. É para isso que o Governo

propõe um conjunto bastante alargado de medidas, que, ao contrário do que diz, não são um choque ao

consumo, são um estímulo à criação de riqueza, em Portugal.

Protestos do PSD e do CDS-PP.

Rasgar a assinatura, como refere, do acordo sobre o IRC foi o que os senhores fizeram menos de seis

meses depois, ao não ter cumprido esse acordo nas dimensões do IVA e do IRS.

Aplausos do PS.

O Programa do Governo é um Programa bastante equilibrado, do ponto de vista dos estímulos que dá à

economia, porque é um Programa reformista onde a economia e a sociedade portuguesa necessitam de

reformas, como é o caso da Administração Pública, que foi tão maltratada ao longo destes quatro anos, e

como é o caso das empresas e do financiamento às empresas.

Sr.ª Dr.ª Cecília Meireles…

O Sr. Presidente: — Sr.ª Deputada, Sr. Ministro.

O Sr. Ministro das Finanças: — Peço muita desculpa, Sr.ª Deputada Cecília Meireles.

O Sr. Presidente: — O Sr. Professor está desculpado, Sr. Ministro.

O Sr. Ministro das Finanças: — Muito obrigado, Sr. Presidente.

Sr.ª Deputada Cecília Meireles, o que referi na minha intervenção foi a desproporção entre os sacrifícios e

os resultados. Foram muitos sacrifícios, Sr.ª Deputada, para tão poucos resultados.

Vozes do CDS-PP: — Eh!

O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — Tão poucos?!…

O Sr. Ministro das Finanças: — Sr.ª Deputada, deixe-me dizer-lhe que não estou a apresentar o

Orçamento do Estado. As perguntas que me colocou são perguntas típicas de uma discussão de Orçamento

do Estado e não necessariamente do Programa do Governo, mas vou responder-lhe.

Pensei que as 29 perguntas tinham exaurido a vossa curiosidade pelo exercício que executámos,…

Página 72

I SÉRIE — NÚMERO 12

72

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Não porque ainda não havia o acordo.

O Sr. Ministro das Finanças: — … que apresentámos com muita transparência, que foi, de facto, muito

pouco discutido pelos Srs. Deputados nos últimos meses e em relação ao qual agora ganharam interesse.

Respondo-lhe dizendo que cita o procedimento conciliatório mas ele não estava simulado no nosso

exercício, o seu impacto não estava simulado no nosso exercício.

Protestos do CDS-PP.

Só estou a fazer o enquadramento da questão.

Também não é verdade que haja uma revisão do investimento, como refere, ou das despesas com

pessoal. Não é verdade que na comparação entre os exercícios do impacto do Programa do Governo com o

programa eleitoral do Partido Socialista isso aconteça. Portanto, devemos estar a olhar para documentos

diferentes.

Aquilo que lhe posso garantir nesta fase é que os impactos na atividade económica do conjunto de

medidas que são apresentadas no Programa do Governo são exatamente iguais aos impactos que constavam

do programa eleitoral do Partido Socialista, os quais, serão seguramente debatidos nesta Casa, em sede de

discussão orçamental.

Aplausos do PS.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — O Ministro das Finanças não tem um número?!

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Sai a TSU e o crescimento é o mesmo?!

O Sr. Presidente: — Há mais um grupo de três Srs. Deputados que se inscreveram para pedir

esclarecimentos.

Assim, tem a palavra, em primeiro lugar, o Sr. Deputado Paulo Sá.

O Sr. Paulo Sá (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro das Finanças, o anterior Governo do PSD/CDS impôs

uma política fiscal de escandaloso favorecimento dos grupos económicos e financeiros ao mesmo tempo que

onerava de forma brutal os rendimentos do trabalho.

Para poder reduzir a taxa do IRC durante seis anos consecutivos e aprofundar os múltiplos e generosos

benefícios fiscais ao grande capital, o anterior Governo PSD/CDS não hesitou em esmagar os trabalhadores,

os pensionistas, as famílias, os micro e pequenos empresários, com uma insuportável carga fiscal.

A partir de 2013, o PSD e o CDS impuseram um brutal aumento do IRS, cobrando, em apenas três anos,

11 000 milhões de euros adicionais, e foram os contribuintes com rendimentos mais baixos que sofreram um

maior esbulho.

De acordo com dados publicados há dias pela Autoridade Tributária e Aduaneira, para os contribuintes com

rendimentos mensais até 714 € o IRS liquidado aumentou 209%, em 2013. Noutro extremo do espectro, para

os contribuintes com rendimentos superiores a 250 000 € anuais o IRS liquidado diminuiu 9%. Estes números,

Sr. Ministro das Finanças, falam por si. São bem reveladores da iniquidade da política fiscal do anterior

Governo PSD/CDS, que acentuou a injustiça na distribuição da riqueza nacional.

Mas também as micro e pequenas empresas foram duramente castigadas pela política fiscal do anterior

Governo PSD/CDS, designadamente por via da manutenção do pagamento especial por conta, do atraso na

introdução e insuficiência do regime de IVA de caixa e da insistência em manter o IVA da restauração em

23%.

O PCP defende uma política fiscal mais justa e adequada que, articulada com a dimensão orçamental,

assegure o investimento e sustente o financiamento das funções sociais do Estado. Uma política fiscal que,

rompendo com o favorecimento da banca e dos grupos económicos, desonere os trabalhadores e as famílias,

assim como as micro e pequenas empresas, reduzindo os impostos sobre o trabalho, aumentando os escalões

Página 73

3 DE DEZEMBRO DE 2015

73

do IRS e melhorando a sua progressividade, introduzindo uma cláusula de salvaguarda no IMI ou ainda

reduzindo o IVA da restauração e alargando os estímulos fiscais às pequenas e médias empresas.

Sr. Ministro, estas são dimensões da política fiscal que devem ser consideradas neste debate, pois

respondem às necessidades dos trabalhadores e do povo, assim como às necessidades de desenvolvimento

do País.

Por isso, gostaríamos de colocar a questão de saber como irá o Governo corresponder aos anseios dos

portugueses em matéria de política fiscal.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para pedir esclarecimentos, a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr. Presidente, Sr. Ministro das Finanças, a política de

empobrecimento ou fabrico de empobrecimento que o anterior Governo praticou, assentava sobretudo em dois

pilares, naquilo que toca fundamentalmente à generalidade das pessoas em Portugal: o corte de rendimentos

e aquilo que foi classificado como o enorme aumento de impostos, pela boca do então Sr. Ministro das

Finanças.

Portanto, isto é extraordinariamente significativo: aumento de impostos sobretudo do trabalho e os

impostos indiretos que recaíam sobre o consumo, quantas vezes dificultado às famílias portuguesas.

E, Sr. Ministro das Finanças, é daqui que decorre aquilo que Os Verdes sempre classificaram também

como um erro crasso, acrescendo a esta lógica do aumento de impostos, que foi o aumento do IVA da

restauração para a taxa máxima. E aqui a insensibilidade foi tão grande que o erro foi percecionado mas

nunca corrigido, pois deste aumento do IVA na restauração decorreram inúmeros despedimentos resultantes

de um encerramento bastante alargado de estabelecimentos justamente da área da restauração.

Portanto, corrigir, a curtíssimo prazo, este erro é fundamental. E, de resto, Os Verdes orgulham-se também

de ter acordado, em primeira mão, no âmbito das conversações que fizeram, esta correção no sentido de

reduzirmos o IVA da restauração para os 13%.

Depois havia outra coisa que fazia grande confusão à generalidade dos portugueses, que se prendia com o

facto de, no momento em que o Governo anterior começava a clamar vitória e que uma enormíssima alavanca

de repente se verificava no País a partir de 2013 — e já percebemos agora que resultados é que teve,

estagnação da economia —, estava na altura de começar a fazer algumas devoluções, mas nada para

pessoas e muito para os grandes grupos económicos e financeiros.

Centraram-se na redução do IRC de uma forma progressiva, como agora prometiam para esta Legislatura,

mas de uma maneira absolutamente significativa, e as micro, pequenas e médias empresas nada lucrariam

com isto mas, sim, as grande empresas — esse era o cerne da questão. Contudo, recusavam-se mexer no

IRS, na questão do aumento dos escalões do IRS, que era fundamental para assegurar a progressividade que

retiraram quando diminuíram esses escalões.

Por outro lado, criaram uma fiscalidade ambiental que, como sabemos, pode ser feita fundamentalmente de

duas formas: através do incentivo aos bons comportamentos ambientais ou através de uma penalização.

A fiscalidade ambiental seguida pelo anterior Governo foi praticamente toda centrada na penalização.

Porquê? Porque o Governo queria sacar, através da fiscalidade ambiental, 150 milhões de euros. Mas veja

bem, Sr. Ministro, que esses 150 milhões de euros já não eram necessários quando o Governo anterior

entendia devolver a contribuição do setor energético.

Portanto, eram tudo contradições que tinham como objetivo central esquecer as pessoas — porque essa foi

a política praticada — mas salvaguardar sempre os interesses dos grandes grupos económicos e financeiros.

É por isso, Sr. Ministro, que agora podem e devem ser dados passos significativos no sentido da criação de

uma maior justiça fiscal em Portugal. E o nosso acordo contempla algumas dessas medidas, designadamente

o estímulo fiscal às micro, pequenas e médias empresas e também à sua instalação no interior,

designadamente utilizando estímulos fiscais para o combater às assimetrias regionais, o IVA da restauração,

de que já falei, sendo também fundamental a devolução certa da sobretaxa do IRS e o aumento dos escalões

do IRS, no sentido de garantir uma maior progressividade.

Aplausos do PCP.

Página 74

I SÉRIE — NÚMERO 12

74

O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Morgado.

O Sr. Miguel Morgado (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Ministro, quero transmitir os meus

cumprimentos pela sua estreia no Parlamento, mas, infelizmente, tenho de acrescentar imediatamente que

não vamos começar bem porque o Sr. Ministro não começou nada bem.

A sua estreia no Parlamento vai ficar inevitavelmente marcada por um momento de suprema infelicidade,

pois utilizou as expressões (de que tomei nota) como «caíram as máscaras» e «propaganda», a propósito da

saída limpa do Programa de Assistência. É de assinalar que o disse no meio daquilo que não passou de um

recital de propaganda.

Mas, enfim, passando por cima disso, admito que a partir do conforto de um gabinete do Banco de

Portugal, a saída limpa seja uma coisa de somenos importância, mas para os milhões de portugueses que

foram adversamente afetados pela bancarrota socialista, apostaria muito consigo que fez muita diferença!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Protestos da Deputada do PCP Rita Rato.

Até lhe digo mais: revela uma imensa e inexplicável falta de consideração pelo povo grego,…

Protestos da Deputada do BE Mariana Mortágua.

… que, infelizmente — por razões que até podemos discutir —, não pôde ter como nós e os irlandeses uma

saída limpa e já vai no terceiro resgate. É uma falta de consideração para com os sacrifícios não só dos

portugueses mas do povo grego e devia estar mais sensibilizado para isso, já que agora pertence a um

Governo com tanta simpatia pelo Governo do Syriza.

Protestos do BE.

Deixe-me dizer-lhe ainda o seguinte: disse que «caíram as máscaras». Nem percebi bem a referência à

queda das máscaras, mas foi oportuno para o que lhe queria dizer.

Conto-lhe uma história muito breve, que, tenho a certeza, vai reconhecer, que acho que é importante para

percebermos a natureza do Governo e aquilo que nos espera para a frente.

A história é esta: era uma vez uma liderança política socialista que teve o desejo de iniciar um

experimentalismo radical. Teve o desejo de procurar a companhia dos partidos da via revolucionária e teve

ainda o desejo de ajustar contas com os portugueses e repetir a experiência do seu último Governo socialista

que terminou de maneira trágica, na bancarrota, em 2011.

A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Não está a falar para crianças!

O Sr. Miguel Morgado (PSD): — Só que este projeto político tinha um pequeno problema: a liderança

socialista desta história sabia muito bem, como todos os portugueses sabem, que este projeto é

tremendamente impopular e os portugueses não se reveem nisto.

Então, foi preciso passar para um jogo de aparências, que envolveu muita coisa. Uma delas foi procurar

figuras de cartaz. Foi por isso que o foram buscar a si.

Protestos do PS e do BE.

Foram buscá-lo a si para dar um rosto a este projeto político — repare que isto é um elogio a si! — porque

viram em si, na sua reputação, na sua credibilidade, um homem moderado, um homem que não se revia em

projetos radicais na política e até, quem sabe, estariam dispostos a tolerar o seu liberalismo.

Página 75

3 DE DEZEMBRO DE 2015

75

Protestos do PS e do BE.

Agora, a eficácia deste jogo de aparências tem um pressuposto, um pressuposto muito simples, se não,

não é eficaz: o de que a sua credibilidade se mantenha. Ora, a sua credibilidade só se pode manter dadas

duas condições: uma, a dos contributos que o Dr. Mário Centeno, técnico do Banco de Portugal, Professor na

Universidade de Economia, traga para este projeto político; a segunda é a de que as pessoas possam confiar

em si como Ministro das Finanças.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Isto vai ser assim até ao final da Legislatura?!

O Sr. Miguel Morgado (PSD): — Repare, quanto ao primeiro caso, o que vemos hoje, ao ler o Programa

do Governo, é que não resta nada dos seus contributos próprios.

Lembramos como é que o senhor apareceu, ao lado do atual Primeiro-Ministro, a fazer campanha pelo

País. Ou era o procedimento conciliário ou eram aquelas mexidas na TSU, que às tantas eram nas empresas,

depois eram nos trabalhadores, depois voltava tudo para trás e depois voltava tudo para a frente… Disso não

sobra nada!

Mas, lendo o Programa do Governo, encontramos coisas mais interessantes e para as quais nem sequer

precisamos de esperar uma resposta sua agora, porque, em 2013 — não foi em 2003 nem em 1993, foi há

dois anos —, já se encarregou de nos ter dado as respostas para coisas que encontramos hoje explicitas no

atual Programa do Governo, que são interessantes e que acho que minam radicalmente a sua credibilidade.

O Programa do Governo inclui o quê? Inclui aumentos do salário mínimo. Repare, não me vou pronunciar

sobre a bondade ou a maldade destas medidas,…

Protestos do PCP e do BE.

… porque a coligação PSD/CDS, no anterior Governo, aprovou, em concertação social, um aumento do

salário mínimo que os senhores, socialistas, tinham deixado congelado. Por isso, não recebemos lições de

ninguém para atualizar o salário mínimo.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Portanto, repito, não me vou pronunciar sobre a bondade da medida.

Mas, segundo o Programa do Governo, vai haver um aumento de 20%, um aumento clarissimamente

acima do crescimento da produtividade. O que é que disse o Dr. Mário Centeno, em 2013, sobre os aumentos

do salário mínimo? Disse que o aumento do salário mínimo causa desemprego…

Vozes do PSD e do CDS-PP: — Oh…!

O Sr. Miguel Morgado (PSD): — … se este aumento estiver acima da produtividade do trabalhador.

O que acabei de referir está escrito na página 54 do livrinho que foi publicado pelo Sr. Ministro.

Mas o Sr. Ministro disse mais sobre o aumento do salário mínimo: «Há um efeito negativo dos aumentos do

salário mínimo na variação salarial dos trabalhadores que têm salários imediatamente acima», isto é, os

trabalhadores com os salários mais baixos.

Protestos do PS.

O Sr. Ministro também disse o seguinte: «Depois daqueles que perdem o emprego em consequência do

aumento do salário mínimo…» — portanto, o aumento do salário mínimo causa desemprego, provoca

desemprego — «… os mais prejudicados pelo aumento do salário mínimo são os trabalhadores de baixos

salários», como se pode ler na página 55 do mesmo livro.

Dou apenas mais um exemplo para não ser muito exaustivo nem maçar ninguém. Sei que estou a gastar

muito tempo, por isso dou só mais um exemplo que acho que vale a pena.

Página 76

I SÉRIE — NÚMERO 12

76

No Programa do Governo também encontrámos, de uma maneira enfática, a promoção da negociação

coletiva, o recurso mais intenso às portarias de extensão, no fundo, à centralização do processo de

determinação dos salários. Ora, o que é que propôs o Dr. Mário Centeno antes de ser Ministro das Finanças?

Propôs um sistema de determinação salarial atomizado, ou seja, o contrário da centralização. Diz assim, na

página 97 do seu livro: «Vamos pensar em alterar o quadro em que se estabelecem as relações laborais em

Portugal. Empresários e trabalhadores têm de compreender que o alargamento das possibilidades de

negociação direta é benéfico para ambos. Esta atomização do paradigma negocial tornaria a determinação

salarial um fenómeno essencialmente interno à empresa e, como tal, mais próximo da sua realidade

económica».

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Protestos do BE e do PCP.

O Sr. Ministro das Finanças saberá responder, certamente, a estas contradições, embora eu ache que isto

não vai ajudar à sua credibilidade.

Termino com uma breve nota: recentemente, soubemos que a Sr.ª Deputada Catarina Martins preferia um

cirurgião risonho, que soubesse dar uma gargalhada, a um cirurgião competente.

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — É verdade!

O Sr. Miguel Morgado (PSD): — Agora, ficámos a saber que a Sr.ª Deputada Catarina Martins prefere

também, presumo eu, um Ministro das Finanças marxista na versão Groucho, porque foi Groucho Marx que

disse «estes são os meus princípios, mas, se não gostam, tenho outros».

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Protestos do BE e do PCP.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro das Finanças.

O Sr. Ministro das Finanças: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Paulo Sá, disse, e bem, que há uma enorme

preocupação deste Governo, e que está vertida no Programa do Governo, por uma política fiscal que seja

amiga do rendimento dos portugueses e que seja promotora da recuperação desse mesmo nível de

rendimento — é isso que o Programa do Governo faz quando aborda as questões da sobretaxa, quando

aborda as questões do IVA, quando aborda as questões, por exemplo, do complemento salarial anual.

O complemento salarial anual — e respondo também à Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia — é precisamente

uma das primeiras preocupações do Programa do Governo e constitui, só em si, um alargamento dos escalões

do IRS. Na verdade, o que o complemento salarial anual faz é criar um escalão de IRS no formato de um

imposto negativo, ou seja, de um crédito fiscal, para os trabalhadores com menores rendimentos, que em

Portugal são particularmente sacrificados no mercado de trabalho, porque a esse menor rendimento está

também associada, habitualmente, uma muito maior rotação de emprego e, portanto, períodos de emprego

muito curtos e muitos períodos sem emprego.

Esta medida, que é central no Programa do Governo, será implementada no contexto das restrições

orçamentais assumidas pelo Governo e na interação que elas têm com o próprio crescimento económico.

Portanto, o Governo levará muito sério esta direção na sua política e a política fiscal, em particular das

famílias, será extraordinariamente ativa.

Dirijo-me agora ao Deputado Miguel Morgado, para não entrarmos numa discussão demasiado técnica

sobre economia do trabalho,…

Risos do PSD e do CDS-PP.

Página 77

3 DE DEZEMBRO DE 2015

77

… um tema que terei todo o prazer em discutir consigo, para lhe dizer que eu poderia falar de liberalismo a

alguns dos seus colegas de bancada que tiveram verdadeiras epifanias ao longo dos últimos quatro anos

sobre esse tema.

O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — Mas assumem-nas!

O Sr. Ministro das Finanças: — Poderia falar disso! Poderia também pedir-lhe que lesse as linhas de

antes e depois do que citou.

Vozes do PSD e do CDS-PP: — Ah!…

O Sr. Ministro das Finanças: — Não me vou despir da minha condição de Ministro, mas há uma coisa que

aconselho: não tente, Sr. Deputado Miguel Morgado, transpor conclusões de artigos científicos para a

legislação nacional.

Aplausos do PS.

Se tentar fazer isso — e também não vou abusar da minha condição académica —, garanto-lhe que é um

passo para o desastre.

O Sr. Miguel Morgado (PSD): — Eu também não vou abusar da minha!

O Sr. Ministro das Finanças: — Sr. Deputado, também lhe digo que a minha honestidade e a minha

seriedade, bem como as do Governo, serão julgadas tendo em conta a transparência com que a governação

se executar e a transparência que essa ação tiver nas discussões que aqui fizermos.

Numa outra resposta, já referi que houve uma desproporção entre o esforço pedido aos portugueses e os

resultados obtidos.

O Sr. Miguel Morgado (PSD): — Não foi isso que disse, Sr. Ministro das Finanças!

O Sr. Ministro das Finanças: — Houve uma enorme desproporção entre as consequências que a saída

limpa, a qual, obviamente, todos saudamos, teve para a economia e para a sociedade portuguesa e entre a

propaganda e o que ela efetivamente significou.

Essa desproporção trouxe-nos um crescimento anémico, como eu classifiquei, no terceiro trimestre, em

cadeia. Face ao segundo trimestre, a economia portuguesa cresceu zero e as taxas de emprego e de

desemprego, somadas, caíram. Hoje, há menos portugueses no mercado de trabalho.

É essa a leitura que fazemos, é essa a economia com que temos de nos preocupar e são essas as

medidas que o Governo se propõe aplicar, as quais, estamos convencidos, vão trazer recuperação económica

e de rendimentos sem colocar em causa nenhum dos equilíbrios fundamentais macroeconómicos na economia

portuguesa.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Segue-se mais uma série de três pedidos de esclarecimento ao Sr. Ministro das

Finanças.

Em primeiro lugar, tem a palavra o Sr. Deputado Paulino Ascenção, do Bloco de Esquerda.

O Sr. Paulino Ascenção (BE): — Sr. Presidente, Sr. Ministro das Finanças, felicito o Governo, em primeiro

lugar, pela inclusão, no seu Programa, de medidas em prol de maior justiça e equidade fiscais e do respeito

pelos contribuintes, que tão mal tratados foram pelo anterior Governo, contribuintes em nome individual,

pequenas e médias empresas. A exceção foram mesmo os contribuintes VIP, que tiveram passadeiras

vermelhas.

Página 78

I SÉRIE — NÚMERO 12

78

Essas medidas, em relação às quais quero felicitar-vos, e que resultaram do acordo feito entre o Partido

Socialista e o Bloco de Esquerda, são as seguintes: o aumento da progressividade no IRS; a eliminação do

quociente familiar e a sua substituição por uma dedução fixa, obedecendo ao princípio «um filho de um pobre

vale perante o fisco o mesmo que o filho de um rico»; a salvaguarda da casa de família perante eventuais

penhoras e execuções fiscais; a revisão dos valores absurdos das coimas por incumprimento de obrigações

fiscais, a maior parte delas quando não está em causa a falta de entrega do imposto mas tão-só o atraso no

cumprimento de obrigações declarativas; a redução do IVA na restauração.

Ora, enquanto o anterior Governo avançava com o famoso enorme aumento de impostos para quem

trabalha, concedeu, ao mesmo tempo, uma enorme redução de impostos para as grandes empresas e para o

setor financeiro. Esta foi a maior borla fiscal da democracia que aconteceu ao mesmo tempo em que os

trabalhadores portugueses eram esmifrados nos seus salários e nas pensões.

Vozes do BE: — Muito bem!

O Sr. Paulino Ascenção (BE): — Quero também destacar duas medidas relativas à reforma do IRC: o

alargamento da isenção em sede de IRC — a chamada participation exemption — para participações sociais,

que passou de 5% para 10%, e o alargamento do prazo de reporte de prejuízos fiscais, que passou para 12

anos e que permitiria à banca só pagar impostos a partir do ano de 2020 e que teria até essa data para

amortizar os prejuízos do ano de 2008.

Como o anterior Governo sempre se recusou a quantificar um montante da perda fiscal que estas duas

medidas acarretaram, pergunto ao Sr. Ministro se já tem condições para nos dar essa informação e também

pergunto se realmente encontrou os cofres cheios, conforme garantiu o anterior Governo, ou a chamada

«almofada financeira», nas palavras do Presidente da República, almofada essa que tanto o reconfortava.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Filipe Lobo d'Ávila.

O Sr. Filipe Lobo d'Ávila (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro Mário Centeno, os Deputados não

fazem perguntas por mera curiosidade, fazem perguntas por dever de escrutínio.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. Filipe Lobo d'Ávila (CDS-PP): — Não queria deixar de lhe dar conta disto à primeira oportunidade,

pois mais vale, logo à partida, saber ao que vimos.

Tenho duas perguntas para fazer ao ex-técnico Mário Centeno, que vão direitinhas a uma folha de Excel

feita por si, que são da sua autoria e de mais ninguém. Aliás, é uma folha de Excel em relação à qual julgo que

tem conhecimento.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Parece uma prova de doutoramento!

O Sr. Filipe Lobo d'Ávila (CDS-PP): — O Sr. Ministro disse que vai cortar 1020 milhões de euros em

prestações não contributivas. Tenho a obrigação de lhe perguntar o seguinte: a quem vai cortar e a partir de

que valores?

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

Protestos da Deputada do PCP Rita Rato.

Onde é que vai cortar, Sr. Ministro? É nas pensões mínimas? É no complemento solidário para idosos? É

no abono de família? É onde, Sr. Ministro? Não nos dê respostas redondas. A pergunta está no ar desde que

Página 79

3 DE DEZEMBRO DE 2015

79

a jornalista Graça Franco a fez. Pode dizer que não responde, pode até dizer que não sabe, mas não nos trate

como tolos ou como parvos, dizendo que vai cortar gastando mais.

Aplausos do CDS-PP.

Sr. Ministro, a segunda pergunta que lhe queria colocar também é uma pergunta focada.

Muito recentemente, o Sr. Ministro disse que queria cortar 228 milhões de euros ao ano na ação social, ou

seja, 900 milhões de euros durante a Legislatura. Os números são tão certinhos que só posso dizer que o Sr.

Ministro, de facto, deve saber o que vai fazer.

Estamos a falar de verbas com misericórdias e com instituições de solidariedade, estamos a falar de

creches para os mais novos, estamos a falar de lares para idosos, estamos a falar de estruturas de apoio para

pessoas com deficiência — há meio milhão de portugueses servidos por estas instituições.

Qual é o critério, na sua máquina de calcular, no seu Excel, que lhe permitiu chegar a este número? Onde

é que vai cortar? É que com números certinhos não pode haver uma resposta redonda, Sr. Ministro.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Tiago.

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro das Finanças, nos últimos anos, os trabalhadores

foram sujeitos a sucessivos assaltos aos seus rendimentos, aos seus direitos sociais, culturais e políticos.

Os custos do sistema financeiro em roda livre sobre uma falsa supervisão e regulação caíram sobre as

pessoas. O euro e a União Europeia apenas agravaram o problema.

Os últimos quatro anos de política do Governo PSD/CDS acentuaram esses problemas, acrescentando

crise à vida dos pobres para salvar da crise a vida dos ricos, dos grandes grupos económicos e financeiros e

dos monopólios, que são precisamente a origem dessa crise.

A pretexto da consolidação das contas públicas, os portugueses pagaram, com o seu trabalho e com os

seus direitos, milhares de milhões de euros para a banca privada, em poucos anos 12 000 milhões de euros, e

ainda falta saber como desapareceram os 30 000 milhões de euros de imparidades que a banca privada tinha

registados em 2009, ou melhor, escondidos.

Além das preocupações mais gerais sobre regulação e supervisão, importa, no concreto, compreender que

mecanismos está este Governo disposto a usar para garantir que nenhum trabalhador ou pensionista venha a

ser chamado a pagar prejuízos de aventuras de banqueiros e para que a banca esteja, efetivamente, ao

serviço do povo e não o contrário.

Duas instituições merecem destaque. O Sr. Ministro disse, e estamos de acordo, que a saída limpa foi

forjada. O ministro da propaganda da saída limpa, agora Deputado Paulo Portas, varreu para debaixo do

tapete 6 mil milhões de euros no BES e quanto mais poderá ter varrido para debaixo do tapete para forjar essa

saída limpa, que ainda podem lá estarescondidos e que importa apurar.

Sr. Ministro, mas sobre o BES, atualmente sob controlo público, enquanto um membro do anterior Governo

anda a auferir 30 000 € para concretizar um projeto que é contrário ao interesse nacional, à semelhança do

que se passou com o BPN, importa assegurar que medidas são possíveis tomar para que o Estado não fique

com o prejuízo e, ainda por cima, sem o Banco.

É absolutamente fundamental que o prejuízo — e entenda-se prejuízo no seu sentido mais lato — não

recaia apenas sobre os portugueses, sobre os trabalhadores do Banco, sobre os clientes do Banco e sobre a

estabilidade do sistema financeiro nacional.

Sobre o BANIF, Sr. Ministro, é ainda necessário apurar as dimensões do prejuízo, das eventuais

necessidades de capital do Banco e ainda de que forma será, também, assegurado que nenhum destes custos

vai recair sobre os portugueses. Dos mais de 700 milhões, que retorno se espera e que medidas se podem

esperar para que esses custos não recaiam sobre os portugueses?

Num quadro mais geral ainda, Sr. Ministro, pergunto-lhe que perspetiva tem o Governo quanto às medidas

necessárias para impedir que outros casos de colapso na banca privada surjam no sistema financeiro e para

Página 80

I SÉRIE — NÚMERO 12

80

garantir o papel do Estado, mais importante na gestão do crédito e da moeda, para que não fiquemos limitados

a reagir às aventuras dos banqueiros, mas a agir para que elas não se realizem.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Para responder a estes pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Ministro das

Finanças.

O Sr. Ministro das Finanças: — Sr. Presidente, vou começar por responder ao Sr. Deputado Paulino

Ascenção, referindo-me, precisamente, à última parte da sua pergunta.

Hoje, todos sabemos o que é que são os cofres cheios e o que é que o País pode e deve fazer com esses

cofres cheios. É evidente que estamos a falar de dinheiro que constitui dívida do País e, dessa maneira, os

cofres cheios, na gestão financeira do País, servem para o proteger das suas necessidades de financiamento.

Assim deve ser e assim devem ser usados para judiciosamente fazer essa gestão financeira.

As questões de política fiscal que levantou, com as quais, como sabe, concordamos na generalidade, têm

exatamente essa perspetiva de repor o nível de justiça fiscal, em particular entre rendimentos, ou seja, a

progressividade da fiscalidade em Portugal, na medida do que são as possibilidades orçamentais do País.

Referiu a questão das deduções no IRS em função do número de filhos. E essa é, precisamente, uma

medida com esse teor, em que não aumentando a despesa fiscal com essas deduções, o Governo promoverá

uma melhor justiça e equidade fiscal.

Ao Sr. Deputado Filipe Lobo d’Ávila vou responder, aliás tal como o Sr. Primeiro-Ministro já fez,

longamente, há pouco.

Há uma questão em que vamos ter de nos entender, Sr. Deputado: há uma diferença muito grande entre

despesa agregada e cortes, mas em matéria de cortes não vou conseguir competir convosco, porque de

cortes percebem vocês.

Aplausos e risos do PS e do BE.

Sr. Deputado, honestamente, depois de ouvir a resposta do Sr. Primeiro-Ministro, pensei que já tivesse

compreendido que não é de cortes que se trata, mas, como não percebeu, vou repetir a resposta,

acrescentando algumas notas para poder ter algum valor acrescentado.

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Isso, isso!

O Sr. Ministro das Finanças: — O Programa do Governo contém aumentos, não cortes: aumento no

rendimento social de inserção, no complemento solidário para idosos, no abono de família, nas pensões — o

Programa do Governo inclui um retomar da lei que determina os aumentos das pensões em Portugal — e no

salário mínimo. Estas são as prestações, estas são as componentes do rendimento dos portugueses com

níveis de rendimento mais baixos que vão ser aumentadas. Não é «cortadas», Sr. Deputado.

Aplausos do PS.

É fácil perceber, Sr. Deputado, que, em consequência de todo este esforço e de todo este aumento do

rendimento dos portugueses mais desfavorecidos, quer no mercado de trabalho, quer na área da política

social, há um conjunto de poupanças — não cortes — nas prestações que hoje existem para fazer face àquilo

que é a situação social difícil provocada pelo aumento do desemprego e que o País, hoje em dia, enfrenta.

A melhoria desses indicadores, Sr. Deputado, gera poupanças, não cortes. É essa a noção que está no

Programa do Governo.

Aplausos do PS e do BE.

Página 81

3 DE DEZEMBRO DE 2015

81

Aliás, é um princípio muito simples em economia o de que cada novo empregado paga impostos e tem

contribuições e, em contrapartida, deixa de receber apoios, seja a nível de subsídio de desemprego, seja a

nível deste apoio social.

Quanto às questões colocadas pelo Sr. Deputado Miguel Tiago, vou reiterar aquilo que já disse há pouco

em relação ao sistema financeiro.

O sistema financeiro é, obviamente, uma das áreas mais sensíveis de qualquer economia e aquilo que

temos de fazer, face às dificuldades do sistema financeiro, deve ser feito no escrupuloso respeito pelos

contribuintes, pela sua proteção e, também, tendo em conta os interesses do Estado face ao setor financeiro.

É assim que o Governo vai abordar, em particular, os dois dossiers do BANIF e do Novo Banco.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Se conseguir dar resposta ao BANIF é a primeira em quatro anos!

O Sr. Ministro das Finanças: — Quanto à questão do trabalho que o Sr. Deputado referiu, dos

trabalhadores e dos pensionistas, é uma preocupação, como acabei de mencionar, muito importante para o

Governo. É por isso que, no Programa do Governo, foi incluída uma proposta que vai ser implementada de

acordo com a qual, por exemplo, a atualização das pensões se passará a fazer dentro do respeito pelo quadro

legal nacional e do respeito pelos legítimos interesses e expectativas dos pensionistas portugueses.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Segue-se o último grupo de pedidos de esclarecimento ao Sr. Ministro das Finanças.

Para o efeito, tem a palavra o Sr. Deputado Duarte Pacheco.

O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as

e Srs. Deputados, Sr.

Ministro das Finanças, ao longo desta tarde, ao ouvi-lo nas suas diversas intervenções, estive a pensar qual o

cognome que seria mais apropriado para si depois de tanta intervenção. E só vejo três: Mário Centeno, o

ilusionista; Mário Centeno, o torturador de números; e Mário Centeno, o fazedor de milagres.

Risos do PSD e do CDS-PP.

Não há outra hipótese, Sr. Ministro, e vou tentar explicar porquê. Porque, por um lado, o Sr. Ministro já aqui

nos disse o seguinte: «Com os acordos com a esquerda temos de aumentar a despesa. Até temos, face

àquele que era o cenário do PS, de antecipar determinados rendimentos às pessoas.» — mais despesa!

E disse também: «Face ao acordo com a esquerda, face àquilo que era o cenário com o PS, até temos que

reduzir impostos e receita fiscal.» Mas, pasme-se, isto é neutro, o défice fica igual, a dívida até baixa! Ó, Sr.

Ministro, alguém acredita nisto? O senhor acredita nisto? Não é possível!

Não há alguém que tenha racionalidade de pensamento que possa acreditar nestas suas palavras, Sr.

Ministro, e por isso era útil que nos esclarecesse a todos. Mas compreendo que o Sr. Ministro não está aqui

para esclarecer nada.

Utilizou a palavra «transparência». Ó, Sr. Ministro, a Sr.ª Deputada Cecília Meireles fez-lhe já esta

pergunta: será que torturou os números e por isso não nos apresenta qual é a projeção do PIB para o próximo

ano? É por isso que mantém o défice e reduz a dívida? Qual é? Não respondeu.

O Sr. Deputado Filipe Lobo d’Ávila perguntou-lhe quais são as prestações não contributivas, Sr. Ministro —

não é o subsídio de desemprego —, repito, as prestações não contributivas em que vai fazer a sua poupança.

Não diz. Não responde.

Que não responda a nós, que somos oposição, ainda vá que não vá — pelo menos, tenho a dizer-lhe que

tratou toda a gente por igual —, mas até os partidos que o apoiam o senhor tratou de igual modo, quer a Sr.ª

Deputada Mariana Mortágua, quer o Sr. Deputado Miguel Tiago. E, por solidariedade democrática, peço-lhe

que, pelo menos, a eles responda, que explique o que é que vai fazer em termos de recapitalização da banca.

Ou será que também aqui vai ser derrotado e acabar por nacionalizar a banca em Portugal?

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Página 82

I SÉRIE — NÚMERO 12

82

O Sr. Presidente: — Tem a palavra para um pedido de esclarecimento, a Sr.ª Deputada Joana Mortágua.

A Sr. ª Joana Mortágua (BE): — Sr. Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados, Sr. Ministro, existem cerca de 46

000 desempregados a trabalhar sem salário em organismos públicos no âmbito de contratos emprego-

inserção. A enorme redução de funcionários públicos durante o último Governo não se fez porque estes

funcionários eram excedentários. E a prova disso é que essa enorme redução de funcionários só não levou à

rutura de muitos serviços públicos, de escolas, de bibliotecas, de hospitais e de centros de saúde, porque o

Governo da direita resolveu o problema de uma maneira muito simples: pôs os desempregados a trabalhar à

borla para os serviços públicos ao lado de pessoas que estavam a cumprir as mesmas tarefas, com o mesmo

horário de trabalho e sob as mesmas chefias, mas sem contrato e sem salário. Para estes 46 000

desempregados a trabalhar sem receber salário a saída não foi lá muito limpa!

Esta realidade dos contratos emprego-inserção no Estado representa uma perversidade e uma perversão.

É uma perversidade para aqueles e aquelas a quem prometeram um contrato, a quem prometeram emprego e

a quem prometeram inserção, ou, nas palavras do Sr. ex-Ministro Pedro Mota Soares, a quem prometeram

empregabilidade, justiça social e autoestima, mas que, na verdade, puseram a trabalhar de graça, sob a

ameaça de perderem uma prestação à qual já tinham direito e que receberiam de qualquer forma, a trabalhar

sob chantagem e sob a ameaça de perder a prestação, sabendo que, não importa a dedicação que ponham

naquilo que fazem, não importa o quanto aprendam, no final de um ano estão despedidos e vão continuar no

desemprego porque o Estado não vai empregar ninguém.

E esta realidade é tão mais perversa quanto estas pessoas sabem que aquele lugar que estão a ocupar

enquanto desempregados sem salário podiam estar a ocupar enquanto empregados com contrato de trabalho.

Mas é também uma realidade que representa uma perversão dos princípios da Administração Pública e da

responsabilidade e exemplo que o Estado deve dar enquanto empregador.

A precariedade, o abuso e a exploração laborais tornaram-se a cara mais visível da Administração Pública,

e para isso basta frequentar qualquer balcão de atendimento de qualquer serviço público. E, pior do que isso,

as funções sociais do Estado tornaram-se dependentes do abuso laboral.

Portanto, Sr. Ministro, nós não podemos ter uma Administração Pública que se alimenta do abuso daqueles

que deveria proteger, daqueles cuja missão social da Administração Pública é proteger. O Estado não pode

ser o maior promotor da precariedade e da exploração laboral.

Vozes do BE: — Muito bem!

A Sr.ª Joana Mortágua (BE): — O fim deste abuso é, foi e será uma prioridade para o Bloco de Esquerda.

Por isso, insistimos tanto nesta matéria que aparece no acordo feito entre o Partido Socialista e os partidos à

esquerda.

Finalmente, gostaríamos de saber que medidas é que irá tomar o Governo para acabar com este abuso e

com a precariedade no Estado.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Por último, para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Trigo

Pereira.

O Sr. Paulo Trigo Pereira (PS): — Sr. Presidente, Sr. Ministro das Finanças, penso que a maioria de

direita devia ter um pouco mais de humildade a fazer as perguntas…

Vozes do PSD: — A maioria, a maioria!

O Sr. Paulo Trigo Pereira (PS): — A minoria, ex-maioria, de direita devia ter mais humildade a fazer as

perguntas. Aliás, deveríamos relembrar aqui o ano de 2012, em que o então ministro das Finanças Vítor

Página 83

3 DE DEZEMBRO DE 2015

83

Gaspar, adepto de uma teoria da consolidação orçamental expansionista, cortou dois salários, duas pensões e

levou o País à maior recessão nos últimos quatro anos.

Vozes do PS: — Bem lembrado!

Protestos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Paulo Trigo Pereira (PS): — Mas já se esqueceram. Já se esqueceram dessa experiência e,

portanto, deviam dar, pelo menos, o benefício da dúvida ao Sr. Ministro das Finanças,…

Aplausos do PS.

… porque, de facto, os senhores erraram do ponto de vista económico. Deviam reconhecer esses erros e

ter a humildade de o fazer. Erraram!

Agora, acho que era muito importante que o Sr. Ministro das Finanças esclarecesse o ponto de partida. E o

primeiro mito do ponto de partida é a saída limpa, de que já se falou hoje aqui.

Ora bem, a pergunta que queria fazer-lhe é a seguinte: se não fosse a intervenção do Banco Central

Europeu do quantitative easing, Portugal, com o nível de dívida pública, com o rácio de dívida pública que tem

no PIB, hoje, teria ou não um terceiro resgate?

A pergunta é muito simples: se nós tivéssemos juros da dívida pública ao nível daquela que tínhamos há

três anos… Ou seja, de quem foi o mérito? Eu só quero perceber — e acho que todos os portugueses

merecem perceber — de quem foi o mérito da descida das taxas de juro. Foi do Governo ou foi do Banco

Central Europeu?

Aplausos do PS.

O Sr. António Leitão Amaro (PSD): — Quer falar da Grécia?!

O Sr. Paulo Trigo Pereira (PS): — Falem de Espanha e da Irlanda e a gente entende-se.

A segunda pergunta tem a ver com os «cofres cheios». Há um mito sobre «cofres cheios» e há uma conta

muito simples de fazer, que é esta: a dívida pública, a dívida bruta, menos o montante dos «cofres cheios».

A pergunta, muito direta, que faço é esta: se eu retirar à dívida bruta o montante dos «cofres cheios»,

temos mais ou menos dívida pública, em percentagem, do que tínhamos em 2011?

Aplausos do PS.

Protestos do PSD e do CDS-PP.

É que temos de ficar entendidos sobre o significado de «cofres cheios».

Aplausos do PS.

Protestos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, parece que querem que a reunião dure mais umas horas. Mas não.

Estamos no último pedido de esclarecimento e, já agora, pedia para todos, calmamente, aguardarmos as

respostas do Sr. Ministro.

Faça favor de continuar, Sr. Deputado.

O Sr. Paulo Trigo Pereira (PS): — A terceira pergunta é sobre o ano de 2015.

Sabemos — e penso que os Deputados da direita reconhecem isso — que o indicador para medir a

consolidação orçamental é o saldo estrutural. A minha pergunta é se, em 2015, espera que haja uma melhoria,

Página 84

I SÉRIE — NÚMERO 12

84

uma manutenção ou uma deterioração do saldo estrutural. É porque se houver uma manutenção ou uma

deterioração do saldo estrutural, significa que em 2015 não houve nenhuma consolidação orçamental.

Era só isto que queria perguntar.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para responder a este grupo de três pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr.

Ministro das Finanças.

O Sr. Ministro das Finanças: — Sr. Presidente, o Dr. Duarte Pacheco, aliás, o Sr. Deputado Duarte

Pacheco — peço, mais uma vez, desculpa — elaborou abundantemente, mais uma vez, sobre os exercícios

macroeconómicos que fomos apresentando ao longo dos últimos meses. É verdade que há nesses exercícios

uma característica que vou explicar, e espero que agora seja compreendido como uma verdadeira explicação.

Na transposição do Programa Eleitoral do Partido Socialista para o Programa do Governo, refletindo os

acordos que foram realizados no âmbito do acordo de incidência parlamentar que assinámos, explicámos

detalhadamente em três tabelas todo o impacto das medidas que foram incluídas e que foram retiradas dessas

simulações.

Há, de facto, um conjunto de medidas que foram retiradas dessas simulações, algumas das quais, aliás, os

Srs. Deputados já referiram aqui hoje, que representavam nesse quadro macroeconómico uma redução da

receita e essas medidas já lá não estão, Sr. Deputado. E porque lá não estão não há redução da receita.

Em contrapartida, foram incluídas outras medidas que têm um impacto diferente sobre a receita. A mesma

coisa se passa do lado da despesa.

O conjunto destas medidas, aquelas que retiramos e aquelas que colocamos, têm um impacto que está

explicitado no documento em que o Partido Socialista aprova o Programa do Governo nos seus órgãos

próprios e que gerou uma melhoria do valor do défice em 2016, em 2017 e no resto do horizonte da

Legislatura.

Este é o impacto líquido. Posso indicar-lhe o valor, medida a medida. Posso, por exemplo, dizer-lhe que a

medida da reversão do corte salarial na função pública, quando comparado o exercício do Programa Eleitoral

com o exercício do Programa do Governo, representa um aumento da despesa de, aproximadamente, 50

milhões de euros, em 2016. Acontece que depois, em 2017, o aumento, a variação da receita, é menos 50

milhões de euros, porque eles foram antecipados para 2016.

Em relação à taxa social única e às reduções das taxas contributivas, o efeito líquido destas medidas

nestes dois anos é de, em 2016, aproximadamente, 400 milhões de euros e, em 2017, assume um valor

bastante superior, porque, como se recordará, estas medidas tinham um efeito crescente e progressivo na sua

implementação.

O resultado de todas estas alterações está claramente explicitado, em termos do seu impacto no défice,

nos documentos que acabei de referir.

Sobre a questão das prestações não contributivas, vou apenas referir-lhe que o subsídio social de

desemprego é uma prestação não contributiva, precisamente aquela que afeta os trabalhadores com mais

baixos rendimentos e com níveis de precariedade mais elevados, porque o subsídio social de desemprego é

dirigido a trabalhadores que, pela sua intermitência contributiva, não têm acesso ao subsídio de desemprego.

Não há nenhum corte no subsídio social de desemprego no Programa do Governo. Há um fenómeno que

decorre do mecanismo económico de recuperação económica e de melhoria dos apoios sociais que permite

poupanças. Mas, com isto, eu não estou a dizer que os valores que estão indicados decorrem exclusivamente

do subsídio social de desemprego, estou, sim, a dizer que é uma das formas como isto acontece. Desse ponto

de vista, não é um corte, é uma poupança.

Protestos do PSD.

Em relação à questão que a Sr.ª Deputada Joana Mortágua colocou, permito-me dizer que, sendo essa

uma matéria que afeta também a área da solidariedade e da segurança social, no que tem a ver com a

Administração Pública temos a visão de que os apoios públicos à reinserção e à inserção, particularmente, de

Página 85

3 DE DEZEMBRO DE 2015

85

jovens no mercado de trabalho devem constituir mecanismos de efetiva entrada permanente no mercado de

trabalho.

É para isso que as políticas ativas de emprego devem ser desenhadas e é nesse contexto que a

Administração Pública deve gerir os estágios de que dispõe.

Nós consideramos que a utilização dos estágios para fins meramente estatísticos, como tem sido feito

nestas áreas, gera trajetórias no mercado de trabalho muito instáveis e é por isso que, no âmbito dos acordos

que firmámos, temos a proposta, que vai ser concretizada, da formação de grupos de trabalho para analisar as

questões relacionadas com a precariedade laboral e, seguramente, também com as questões das políticas

ativas de emprego.

Em relação à pergunta que o Sr. Deputado Paulo Trigo me colocou, vou responder-lhe à questão para a

qual tenho, neste momento, uma resposta inequívoca, que é à primeira parte da sua pergunta, dizendo-lhe

que o euro hoje não é o mesmo euro que tínhamos em 2010, não é o mesmo euro que tínhamos em 2011. O

euro é uma instituição económica da maior importância para a construção europeia.

Aplausos do PS.

Risos do PSD e do CDS-PP.

É uma instituição que está em construção de forma bastante acelerada, mas também ainda insuficiente

tendo em conta aquilo que o euro deve promover de apoio às economias europeias.

A verdade é que — e o Sr. Deputado Paulo Trigo explicitou uma das políticas que foram implementadas

recentemente no âmbito do Banco Central Europeu — essa política não era do agrado do anterior Governo. O

anterior Governo, durante muito tempo, recusou a importância dessa política para o sucesso da economia

europeia e, por conseguinte, também da economia portuguesa.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, estamos no final dos nossos trabalhos de hoje.

Penso que hoje trabalhámos bastante bem para amanhã de manhã podermos terminar o período de debate

e deixarmos para a parte da tarde as intervenções finais e a votação da moção de rejeição, que ainda há de

dar entrada na Mesa.

Sr.as

e Srs. Deputados, Sr. Primeiro-Ministro, Sr.as

e Srs. Ministros, Sr.as

e Srs. Funcionários, Sr.as

e Srs.

Jornalistas, muito obrigado a todos.

Está encerrada a sessão.

Eram 20 horas e 55 minutos.

Presenças e faltas dos Deputados à reunião plenária.

A DIVISÃO DE REDAÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL.

Descarregar páginas

Página Inicial Inválida
Página Final Inválida

×