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Quarta-feira, 23 de março de 2016 I Série — Número 46

XIII LEGISLATURA 1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2015-2016)

REUNIÃOPLENÁRIADE22DEMARÇODE 2016

Presidente: Ex.mo Sr. Eduardo Luís Barreto Ferro Rodrigues

Secretários: Ex.mos Srs. Pedro Filipe dos Santos Alves Idália Maria Marques Salvador Serrão

S U M Á R I O

O Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 4

minutos. De seguida, a propósito dos atentados terroristas

ocorridos em Bruxelas de manhã, o Presidente leu à Câmara a mensagem que enviou ao Embaixador do Reino da Bélgica em Portugal — que se encontrava a assistir à reunião plenária — e aos Presidentes do Senado e da Câmara dos Representantes do Parlamento daquele país, tendo-se pronunciado os Deputados Luís Marques Guedes (PSD), Pedro Delgado Alves (PS), Pedro Filipe Soares (BE), Telmo Correia (CDS-PP), Carla Cruz (PCP), José Luís Ferreira (Os Verdes) e André Silva (PAN) e ainda o Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares (Pedro Nuno Santos).

Foi, depois, lido e aprovado o voto n.º 49/XIII (1.ª) — De condenação e pesar pelos atentados terroristas de Bruxelas (Presidente da AR, PSD, PS, BE, CDS-PP, PCP, Os Verdes e PAN), tendo a Câmara guardado 1 minuto de silêncio.

O Presidente, em seu nome e em nome da Mesa, manifestou solidariedade ao Embaixador do Reino da Bélgica e informou que a bandeira nacional estava a meia haste na Assembleia da República.

Em declaração política, o Deputado Carlos Costa Neves (PSD), além de se ter associado, de forma pessoal, ao voto

de pesar aprovado, defendeu o princípio democrático da separação de poderes, tendo colocado ao Primeiro-Ministro questões sobre a eventual intenção do Governo de interferir em soluções relativas à estrutura acionista da banca nacional e sobre a ratificação da decisão de prorrogar a exploração da Metro do Porto, por ajuste direto, ao grupo Barraqueiro. No final, respondeu a questões colocadas pelos Deputados João Galamba (PS), João Pinho de Almeida (CDS-PP), Mariana Mortágua (BE) e Paulo Sá (PCP).

Deu-se conta da entrada na Mesa dos projetos de resolução n.os 182 a 187/XIII (1.ª).

Em declaração política, o Deputado Porfírio Silva (PS) regozijou-se pela aprovação, no Conselho de Ministros realizado na passada semana, do modelo integrado de avaliação externa das aprendizagens no ensino básico, modelo esse que, para além dos exames do 9.º ano, da abolição dos exames dos 4.º e 6.º anos, da introdução das provas de aferição a meio de cada ciclo de estudos, define as datas concretas de realização das provas e prevê a possibilidade de um regime transitório para as provas de aferição. Respondeu, depois, a pedidos de esclarecimento dos Deputados Emília Santos (PSD), Ana Rita Bessa (CDS-PP), Joana Mortágua (BE) e Paula Santos (PCP).

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Em declaração política, o Deputado Carlos Matias (BE) pediu o envolvimento do poder local, a começar nas regiões mais próximas da Extremadura espanhola e nos municípios banhados pelo rio Tejo, bem como do Governo português, a fim de pressionarem o Governo espanhol no sentido do encerramento da central nuclear de Almaraz, na província de Cáceres, devido aos riscos de acidente por falta de segurança. Deu, depois, resposta a pedidos de esclarecimento dos Deputados Bruno Coimbra (PSD), Heloísa Apolónia (Os Verdes), Bruno Dias (PCP) e Maria da Luz Rosinha (PS).

Em declaração política, a Deputada Ana Rita Bessa (CDS-PP) criticou a política de educação seguida pelo Governo, centrando-se na abolição dos exames dos 4.º e 6.º anos e na introdução das provas de aferição a meio de cada ciclo de estudos, e respondeu a pedidos de esclarecimento dos Deputados Odete João (PS), Joana Mortágua (BE), Diana Ferreira (PCP) e Maria Germana Rocha (PSD).

Em declaração política, o Deputado João Ramos (PCP) alertou para os problemas que os sectores da produção leiteira e da suinicultura estão a viver e advertiu o Governo para a necessidade de intervir, após o que respondeu a pedidos de esclarecimento dos Deputados Abel Baptista (CDS-PP), Pedro Soares (BE), José Luís Ferreira (Os Verdes), Nuno Serra (PSD) e António Borges (PS).

Em declaração política, a Deputada Heloísa Apolónia (Os Verdes), a propósito do Dia Mundial da Água, chamou a atenção para a poluição hídrica, nomeadamente no rio Tejo, assinalada pelo seu partido com uma marcha no rio Alviela contra a poluição dos cursos de água. No fim, respondeu a

pedidos de esclarecimento dos Deputados Maria da Luz Rosinha (PS), Patrícia Fonseca (CDS-PP), Jorge Paulo Oliveira (PSD), Carlos Matias (BE) e Ana Mesquita (PCP).

Procedeu-se à apreciação conjunta da petição n.º 308/XII (3.ª) — Apresentada pela CGTP-IN — Confederação Geral dos Trabalhadores Portugueses — Intersindical Nacional, manifestando-se contra o roubo nas pensões e o aumento da idade da reforma e do projeto de lei n.º 140/XIII (1.ª) — Valoriza as longas carreiras contributivas, garantindo a antecipação da pensão, sem penalizações, aos beneficiários que completem 40 anos de descontos (PCP), tendo-se pronunciado os Deputados Rita Rato (PCP), José Moura Soeiro (BE), Susana Lamas (PSD), Rui Riso (PS) e António Carlos Monteiro (CDS-PP).

Foram também apreciados, conjuntamente, a petição n.º 549/XII (4.ª) — Apresentada por António José Ladeira Soares Neto e outros, solicitando à Assembleia da República a suspensão da aplicação do novo regulamento da Caixa de Previdência dos Advogados e Solicitadores (CPAS) e o projeto de resolução n.º 135/XIII (1.ª) — Recomenda ao Governo a suspensão do novo regulamento da Caixa de Previdência dos Advogados e Solicitadores e sua posterior revogação, repristinando-se o regime anterior (BE). Proferiram intervenções os Deputados José Manuel Pureza (BE), Vânia Dias da Silva (CDS-PP), Isabel Alves Moreira (PS), Carlos Abreu Amorim (PSD) e António Filipe (PCP).

O Presidente encerrou a sessão eram 18 horas e 49 minutos.

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O Sr. Presidente: — Sr.as e Srs. Deputados, Sr.as e Srs. Funcionários, Sr.as e Srs. Jornalistas, está aberta a

sessão.

Eram 15 horas e 4 minutos.

Os Srs. Agentes da autoridade podem abrir as galerias, por favor.

Vamos iniciar os trabalhos desta reunião plenária, de terça-feira, dia 22 de março de 2016.

Infelizmente, introduzimos um primeiro ponto na ordem de trabalhos hoje de manhã. Trata-se da

apreciação do voto n.º 49/XIII (1.ª) — De condenação e pesar pelos atentados terroristas de Bruxelas,

relativamente ao qual cada grupo parlamentar, e também o PAN, disporá de 2 minutos para intervir.

Antes, porém, informo que, logo de manhã, tomei a iniciativa de enviar ao Sr. Embaixador do Reino da

Bélgica, que se encontra presente a assistir à sessão, e aos Presidentes do Senado e da Câmara dos

Representantes do Parlamento do Reino da Bélgica a seguinte mensagem: «Foi com enorme consternação

que tomei conhecimento dos trágicos atentados desta manhã na cidade de Bruxelas. Num dia que julgaram

ser igual a tantos outros, perderam a vida dezenas de cidadãos.

Os atentados desta manhã desafiam os nossos valores e o nosso modelo de sociedade assentes no

respeito pela liberdade, pela democracia e pelos direitos fundamentais. Ataques bárbaros que merecem a

nossa condenação absoluta.

Os nossos pensamentos estão com as famílias das vítimas, a quem endereçamos a manifestação do

nosso sentido pesar.

Em meu nome, e em nome da Assembleia da República, apresento ao Estado e ao povo belga, através de

V. Ex.ª, sentidas condolências».

Esta foi a mensagem que enviei logo de manhã. De qualquer forma, foi acordado entre os grupos

parlamentares que iriamos proceder à apreciação e votação do referido voto.

Tem a palavra, em primeiro lugar, o Sr. Deputado Luís Marques Guedes.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O nosso sentimento e a

nossa solidariedade estão hoje com a população de Bruxelas e, em particular, com a família das vítimas.

Os atentados terroristas são atos bárbaros de uma selvajaria desumana. Seguramente que o são, e por

isso merecem o nosso incondicional repúdio.

Mas são mais do que isso. A arma do terror tem sempre alvos diretos que, através da infeção do medo,

visa alcançar. Esses alvos somos nós, a nossa liberdade, a nossa tolerância, o nosso respeito pelo outro e

pela diferença, o nosso modelo democrático de sociedade.

É, por isso, essencial que hoje saibamos todos defender com firmeza os valores que nos querem tirar,

afirmando convictamente que, sim, somos homens e mulheres livres e queremos continuar livres. Sim,

acreditamos na igualdade na diferença, que só as sociedades democráticas sabem promover e preservar.

Sim, acreditamos e cultivamos a igualdade de género, condição sine qua non para o verdadeiro respeito pelos

direitos humanos. Sim, defendemos as liberdades de expressão e de circulação e o direito de todos a

escolherem o seu projeto de vida, de acordo com as suas ambições. Sim, somos pelo respeito intransigente

das liberdades religiosa, de crenças e de ideologias. E, sim, opomo-nos a todo o tipo de fundamentalismos e

totalitarismo e à cultura do pensamento único.

Seremos determinados a combater e punir severamente os responsáveis por estes ataques desumanos,

mas não cederemos ao propósito de deixar encolher estes valores. A nossa civilização passou por muito e

sofreu muito para os construir. Temos o dever de os saber defender e de passar essa mensagem a quem os

procura destruir.

Aplausos do PSD, do PS, do BE e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Delgado Alves.

O Sr. Pedro Delgado Alves (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: As minhas primeiras palavras

são de condolências endereçadas às famílias das vítimas, ao povo belga, aos cidadãos de Bruxelas, onde

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hoje, no coração da Europa, mais uma vez, na sede do que se quer um projeto de paz, de prosperidade e de

democracia, voltamos a enfrentar o terrorismo.

Infelizmente, torna-se frequente demais. Torna-se de tal forma frequente que uma rede social como o

Facebook já tem hoje um botão que permite às pessoas declarar que estão seguras, um botão que permite às

pessoas que estão numa rede social, num contexto normal, de descontração, registar e dizer aos seus amigos

que estão vivas, de tal forma a barbárie nos bate à porta e bate à porta dos nossos computadores.

Infelizmente, acrescentamos hoje Bruxelas a Paris, a Madrid, a Londres, a Nova Iorque, a Beirute, a

Bagdade, a Telavive, a Istambul, a Damasco, a Moscovo e a tantas e tantas cidades do planeta que lidam com

o terrorismo e que vezes demais são recordadas, que são frágeis. Com os seus cidadãos partilhamos os

mesmos dramas, os mesmos valores. Morremos da mesma maneira indistintamente de sermos belgas ou

portugueses, flamengos ou valões, europeus ou não europeus, imigrados ou naturais, cristãos ou ateus,

judeus ou muçulmanos, pobres ou ricos.

Hoje, no aeroporto e no metro em Bruxelas, os inocentes não escolheram a barbárie a que foram sujeitos.

Mas também os terroristas não escolhem as suas vítimas, precisamente porque lhes é indiferente, porque o

que pretendem é intimidar, aterrorizar, tentar quebrar a paz e o convívio saudável entre seres humanos, que é

o que todos somos. É o que todos somos quando vivemos, é o que todos somos quando morremos e é o que

não podemos, em circunstância alguma, deixar de ser sempre que confrontados com o desafio que os

fundamentalistas nos propõem colocar em cima da mesa. Somos todos alvos. Todos os que não cedemos à

intolerância, todos os que rejeitamos os fundamentalismos somos todos alvos da mesma barbárie.

Neste momento em que a Europa enfrenta tantos desafios, neste momento em que a Europa se confronta

tantas vezes com aqueles que, nas nossas costas, nos nossos portos, nas nossas cidades, vêm procurar

conforto de conflitos tão violentos quanto estes que hoje sofreram, temos de recordar e não perder o sentido

de humanidade, porque aquelas pessoas, se calhar, partilham e sofrem há mais tempo do que nós

precisamente o mesmo. Se calhar, nós, europeus, belgas, portugueses, temos hoje mais em comum com

aqueles que tiveram de fugir de Damasco, de Alepo, e que sofrem quotidianamente da mesma maneira. Hoje,

recordamo-nos um pouco mais porque é que somos seres humanos e aqueles que procuram abrigo connosco,

junto de nós, nas nossas cidades, esses também choram hoje connosco quando nós devíamos mais vezes

chorar com eles quando o mesmo lhes sucede.

Hoje, fundamentalmente, penso que a mensagem que todos passamos é a mesma: temos de combater o

terrorismo com os meios do Estado de direito, com os meios que permitem reforçar a cooperação policial, a

cooperação entre os Estados, que combate a exclusão social que alimenta os fundamentalismos, que combate

os fundamentalismos que depois alimentam os extremismos e destrói, também, o tecido das nossas

sociedades. Fieis aos nossos valores, unidos na diversidade, que é a máxima da União Europeias, mas hoje,

também, infelizmente, unidos na dor que também une todos os povos da Europa e do mundo, sejamos

capazes de nos mantermos fieis aos nossos valores e sermos capazes, também, de não abdicarmos um

milímetro, como o Sr. Deputado Luís Marques Guedes há pouco dizia.

Não vamos desfazer o que construímos, porque não podemos ceder àqueles que pretendem destruir aquilo

que não é tanto o nosso meio de vida ou a nossa civilização, mas aquilo que nos identifica enquanto seres

humanos.

Aplausos do PS, do PSD, do BE e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Em nome do Bloco de Esquerda, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Filipe Soares.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares,

Sr.as e Srs. Deputados: São momentos como este que nos convocam para aquilo que é uma demonstração do

terror. E, perante o terror, perante o ódio, perante o desprezo pela vida que demonstrou quem colocou hoje as

bombas que deflagraram em Bruxelas, muitas vezes a nossa sociedade tem sido confrontada e tem sido

instada a reagir, e tem-no feito bem, pela positiva, mostrando que nós não nos deixamos vencer nem pelo

ódio, nem pelo medo e que não aceitamos ser instrumentalizados naquilo que aqueles que colocaram as

bombas querem, isto é, que haja um choque de civilizações, que haja um choque de religiões. Não! Há

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desprezo pela vida por parte daqueles que quiseram matar indiscriminadamente, há o ódio que os levou a

fazer este ataque.

É por isso que, confrontados com este terror, a nossa primeira resposta deve ser da mais humilde

humanidade, porque é aí que radicam os valores que devemos defender nestes momentos difíceis. Os nossos

mortos, aqueles que em Bruxelas, Paris ou Madrid pereceram perante o terror, exigem de nós que não nos

deixemos vergar perante o ódio e que não deixemos cair aquilo que nós construímos: a liberdade, a defesa do

Estado de direito e a garantia que é pela positiva que os direitos se exercem e não pela negativa.

É com isso que nós hoje somos confrontados e é essa a resposta que devemos dar. Insisto: os nossos

mortos merecem mais do que o nosso ódio e o ódio seria a vitória daqueles que colocaram e mataram com

essas bombas.

Por isso, em nome do Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda, vou terminar, porventura, como deveria

ter começado, apresentando uma palavra de solidariedade para com o povo belga, para com os povos

europeus que foram vítimas do terrorismo e para com as famílias e os amigos daqueles que pereceram e,

claro, endereçando um voto àqueles que ainda estão a lutar pela vida neste momento.

É aqui que somos confrontados com a nossa humanidade e é, portanto, nesta resposta singela que nós

damos também resposta à humanidade do momento, pela positiva, pela afirmação de que não há medo que

possa destruir aquilo que nos custou tanto a construir: a liberdade, os Estados de direito.

A nossa solidariedade para com o povo belga.

Aplausos do BE, do PSD, do PS, do CDS-PP e do PAN.

O Sr. Presidente: — Pelo CDS-PP, tem a palavra o Sr. Deputado Telmo Correia.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Em primeiro lugar, quero

sublinhar que discutimos e votamos, hoje, mais um voto de pesar. Cada um destes votos de pesar que

aprovamos é um voto de pesar a mais. Nós continuamos a aprovar votos de pesar, porque, mais uma vez, o

terrorismo atacou, e atacou desta vez, literalmente, no coração da Europa e naquela que é, também, a capital

política da União Europeia.

Como aqui foi dito, e bem, este terrorismo que atacou hoje em Bruxelas é o mesmo que, só para citar os

exemplos mais recentes, atacou na Tunísia, atacou em Paris ou atacou em Istambul.

Obviamente que a nossa primeira palavra, Sr. Presidente, é uma palavra de consternação, é uma palavra

de pesar, é uma palavra de tristeza e é, também, uma palavra de solidariedade para com o Reino da Bélgica,

para com as suas autoridades, aqui representadas, e também para com todos aqueles que, desde a primeira

hora, estiveram no auxílio às vítimas e a tentar minorar o sofrimento de todos os que foram atingidos por esta

tragédia.

É evidente que o que este terrorismo pretende é criar o pânico, gerar o medo nas sociedades europeias,

mas é verdade também — e nós estamos de acordo — que, perante isso, nós não poderemos nunca pôr em

causa os nossos valores, a nossa forma de vida, a liberdade e o humanismo, que são os nosso valores

fundamentais e dos quias não prescindimos em nenhuma circunstância.

Não recuaremos um milímetro que seja na defesa do humanismo, da humanidade em ajudar quem precisa.

E tantos se dirigem agora à Europa a precisar de ajuda, refugiados de situações de guerra, de guerra que está

na Síria, mas de guerra que está também no coração da Europa, como vimos esta manhã.

Continuaremos sempre a defender a paz; continuaremos sempre a usar daquilo a que chamamos a

superioridade moral das democracias, ou seja, nós não cedemos perante o terror, mas nós não usaremos

nunca métodos que sejam considerados abusivos ou métodos que sejam comparáveis a qualquer tipo de

terror para combater esse mesmo terrorismo.

Seremos firmes também e não cederemos a populismos ou radicalismos, que encontram nestas ameaças

um terreno fértil para o seu crescimento, mas não desistiremos nunca do objetivo de garantir a segurança dos

nossos concidadãos. E não aceitamos, Sr.as e Srs. Deputados, em nenhuma circunstância, algum tipo de

desculpabilização, seja sociológica ou outra, deste tipo de assassinos sanguinários que hoje mataram

cobardemente e inopinadamente no coração da Europa.

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Continuaremos a combater o terrorismo, a sermos firmes e a melhorar, também aqui, em Portugal, os

mecanismos de combate ao terrorismo, a exigir uma Europa unida no combate ao terrorismo, a partilhar

informação, a cooperar na área europeia para que seja garantido aos nossos concidadãos e aos nossos filhos

segurança e liberdade e para que estes assassinos saibam que, no fim, não triunfarão.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente: — Em nome do PCP, tem a palavra a Sr.ª Deputada Carla Cruz.

A Sr.ª Carla Cruz (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: O PCP condena firmemente os atentados

perpetrados em Bruxelas, manifesta às vítimas e aos seus familiares, na pessoa do Sr. Embaixador, aqui

presente, a sua consternação e sentimento de pesar e expressa ao povo belga a sua solidariedade.

O terrorismo, quaisquer que sejam as suas causas, formas e objetivos proclamados, serve sempre os

interesses mais reacionários, mesmo que se apresentem de forma mais obscura.

Crimes desta natureza não podem ser desligados de uma situação internacional que continua marcada por

ingerências e agressões contra Estados soberanos, muitas vezes através da instigação de conflitos religiosos

e étnicos e da promoção e instrumentalização de forças de cariz xenófobo, racista e fascista. Uma situação

onde se verifica a implementação de políticas que aumentam a exploração e a exclusão social, que

negligenciam direitos e valores fundamentais, nomeadamente com o aprofundamento do conceito de «Europa

fortaleza», como acontece na União Europeia.

O PCP chama a atenção para os perigos da instrumentalização de genuínos sentimentos de indignação

para impor medidas de cariz securitário ainda mais atentatórias de direitos, liberdades e garantias dos

cidadãos e para promover sentimentos racistas e xenófobos que têm alimentado o crescimento de forças de

extrema-direita e de cariz fascista na Europa.

Como tem salientado, o PCP considera que a resposta ao terrorismo passa necessariamente pelo combate

às suas mais profundas causas — políticas, económicas e sociais — e pela defesa e afirmação dos valores da

liberdade, da democracia, da soberania e independência dos Estados.

Isto é, o combate a tais crimes exige uma inversão de políticas, quer de âmbito económico e social, quer de

relacionamento internacional entre Estados.

Por isso, sublinhamos, uma vez mais, e com maior premência, a necessidade do fim do apoio político,

financeiro e militar dado a grupos que espalham o terror e a destruição, nomeadamente no Médio Oriente,

bem como o fim das ingerências e agressões contra Estados soberanos, o desenvolvimento de políticas de

paz e cooperação, movidas por valores de solidariedade e de defesa dos direitos humanos, respeitadoras do

direito internacional.

Aplausos do PCP, do BE e de Os Verdes.

O Sr. Presidente: — Em nome de Os Verdes, tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Ferreira.

O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado dos Assuntos

Parlamentares, Sr.as e Srs. Deputados: O Grupo Parlamentar do Partido Ecologista «Os Verdes» associa-se e,

naturalmente, subscreve este voto de condenação e pesar pelos atentados terroristas de Bruxelas que esta

manhã, dramaticamente, acordaram a Europa e o mundo.

Os Verdes aproveitam para manifestar a sua solidariedade ao povo belga e, em especial, às famílias das

vítimas, desejando rápidas melhoras às centenas de pessoas que ficaram feridas nestes atentados,

particularmente à cidadã portuguesa que também foi atingida.

Estes atentados terroristas, que causaram, pelo menos, 34 mortos e mais de 200 feridos, merecem a mais

viva condenação por parte do Partido Ecologista «Os Verdes» e devem merecer a mais firme condenação de

todos aqueles que acreditam que a democracia, a paz e a solidariedade entre os povos devem ser os pilares

fundamentais da construção do nosso futuro coletivo.

Face a estes atentados terroristas, vamos esperar não só que as sociedades que têm por base os valores

do Estado de direito democrático não esmoreçam na afirmação desses valores, mas também que estes

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atentados nos levem a refletir sobre as causas do terrorismo e sobre a facilidade com que as armas circulam

dentro do nosso planeta.

Os Verdes condenam, assim, de forma determinada, os atentados terroristas hoje ocorridos em Bruxelas e

expressam o seu mais profundo pesar pelas vítimas.

Aplausos de Os Verdes, do PS, do BE, do PCP e do PAN.

O Sr. Presidente: — Tem ainda a palavra, pelo PAN, o Sr. Deputado André Silva.

O Sr. André Silva (PAN): — Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares, Sr.as e

Srs. Deputados: Em nome do PAN e dos valores que defendemos, baseados na não violência, é com profundo

pesar que apresentamos as nossas condolências às famílias de todos os cidadãos e cidadãs envolvidos,

direta ou indiretamente, neste ato irracional de terrorismo, tal como a nossa solidariedade ao povo belga.

Recordando os atentados de Paris em novembro de 2015, reforçamos que o caminho democrático para a

resolução destes casos deverá sempre ser feito através de uma investigação criminal justa e transparente

pelas instituições competentes e democráticas. Não nos deixemos levar pelos apelos cegos de uma guerra

invisível e intemporal ao terrorismo.

Reforçamos que a Europa não está em guerra, pois não se constrói a paz com militarismo ou com a

supressão de liberdades cívicas.

A irracionalidade ideológica que divide corações e mentes em muitas regiões do mundo deve ser

contraposta, em superior medida, por uma empatia e racionalidade global que compreende que todas as

nossas ações têm repercussões.

Assim sendo, somos mais uma vez chamados a repensar a nossa gestão social e o impacto real das

nossas geopolíticas noutros países e noutras culturas.

Neste momento de profunda comoção, apelamos à união de todos os cidadãos europeus e mundiais na

defesa dos valores democráticos da liberdade de expressão e religiosa e na não violência, para reforçarmos a

nossa determinação em construir uma sociedade realmente equitativa e pacífica em todas as suas

expressões.

Como frisou Mahatma Gandhi, «sejamos a mudança que desejamos ver no Mundo».

Aplausos do PS, do BE, do PCP e de Os Verdes.

O Sr. Presidente: — O Governo associa-se a este voto de condenação e pesar, pelo que tem a palavra,

também por 2 minutos, o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares (Pedro Nuno Santos): — Sr. Presidente, Sr.as e

Srs. Deputados: Permitam-me que comece por endereçar um cumprimento especial ao Sr. Embaixador do

Reino da Bélgica em Portugal e que transmita, através dele, a solidariedade de todo o povo português e do

Governo português a todo o povo belga.

A Europa acordou hoje em profundo choque com as notícias de um bárbaro atentado na capital da Bélgica.

Em nome do Governo da República Portuguesa, gostaria de endossar as mais profundas condolências às

famílias das vítimas dos atentados e também de expressar solidariedade para com a população.

Os cidadãos belgas vivem hoje um dia de dor e luto que ficará por muito tempo gravado nas suas

memórias como o dia em que o terrorismo tentou destruir a tranquilidade democrática e substituí-la pela

violência e pelo medo.

Mas o dia 22 de março de 2016 não ficará apenas na memória do povo belga, ficará na memória de todos

os povos europeus. Quando Bruxelas é atacada não é apenas o coração de um país amigo que é atingido,

são os valores civilizacionais que a Europa herda do passado, os mesmos valores que representa no presente

e os valores que deve continuar a defender no futuro. São os valores que permitem que mais de 500 milhões

de habitantes possam, em paz, partilhar uma mesma comunidade política, com direitos e deveres iguais, e que

vão permitir aos europeus, no futuro, vencer a batalha contra o terrorismo.

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Hoje, o dia em que os valores civilizacionais em que se funda a União Europeia foram tão brutalmente

atacados é o momento para reafirmarmos esses mesmos valores que defendemos e que devemos continuar a

defender.

Perante o risco da espiral do extremismo que paira hoje sobre a população belga e todos os concidadãos

europeus, devemos responder com o melhor da herança europeia: os valores da democracia, da liberdade, da

solidariedade, da segurança e da justiça.

Aplausos do PS, do BE, de Os Verdes e do PAN.

O Sr. Presidente: — O Sr. Secretário da Mesa, Deputado Pedro Alves, vai ler o voto n.º 49/XIII (1.ª) — De

condenação e pesar pelos atentados terroristas de Bruxelas (Presidente da AR, PSD, PS, BE, CDS-PP, PCP,

Os Verdes e PAN), após o que o mesmo será votado.

O Sr. Secretário (Pedro Alves): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, o voto é do seguinte teor:

«Hoje fomos acordados por um verdadeiro cenário de horror.

Perante os ataques terroristas num aeroporto e numa estação de metro em Bruxelas, as nossas primeiras

palavras de solidariedade são dirigidas às famílias das vítimas, bem como ao povo belga e ao Reino da

Bélgica.

Em segundo lugar, uma palavra de conforto neste momento difícil para todos os cidadãos belgas,

portugueses e de outras nacionalidades, que residem em Bruxelas.

Bruxelas é sede das instituições europeias e ponto de encontro de tantos povos e de tantas ideias e

projetos que para ali convergem.

Esta terrível notícia, que nos abalou profundamente, surge na sequência da captura de um dos

responsáveis pelos atentados de Paris.

Estes ataques não farão imperar o medo ou o preconceito, nem esmorecer a coragem no combate ao

terrorismo e às suas causas, um esforço persistente que envolve múltiplas dimensões.

Dure o que durar esse combate, o que importa é que as sociedades abertas nunca se deixem fechar e se

mantenham sempre fiéis aos valores do Estado de direito democrático.

A Assembleia da República, reunida em sessão plenária, expressa, assim, a sua mais veemente

condenação dos atentados terroristas de Bruxelas e o seu mais profundo pesar pelas vítimas».

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, vamos votar este voto.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Peço a todos que façamos 1 minuto de silêncio.

A Câmara guardou, de pé, 1 minuto de silêncio.

Sr.as e Srs. Deputados, queria manifestar também a minha solidariedade e a de toda a Mesa para com o Sr.

Embaixador da Bélgica, aqui presente, e dizer-lhe que a nossa bandeira, na Assembleia da República, estará

a meia haste a partir deste momento.

Vamos entrar no segundo ponto da nossa ordem de trabalhos, que consta de declarações políticas.

Para uma declaração política, tem a palavra, em primeiro lugar, o Sr. Deputado Carlos Costa Neves.

O Sr. Carlos Costa Neves (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Permitam-me que, de uma

forma mais pessoal, me associe expressamente ao voto de pesar que acaba de ser aprovado por

unanimidade. Afinal, vivi, ou tive casa, em Bruxelas durante oito anos e a estação de Maelbeek era a que

usava habitualmente, por isso vivo este momento com especial intensidade.

Gostaria também de afirmar que só há uma forma de fazer face ao terrorismo: agarrando-nos com força

aos nossos valores, aos nossos princípios, às regras que partilhamos na União Europeia.

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Passando, agora, à minha declaração política, Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, a Lei Fundamental

que nos rege celebra, por estes dias, 40 anos! Há 40 anos que a Constituição da República pauta os nossos

valores, os nossos princípios e as regras do Estado de direito democrático que somos e que, desde então,

cada um de nós se comprometeu a preservar, cultivar e defender.

Defendemos o Estado de direito democrático, na medida em que cumprimos, nomeadamente, a regra

essencial da separação de poderes, assumindo, plena e responsavelmente, os que nos estão expressamente

atribuídos: o poder legislativo e o poder de fiscalizar o Governo.

Neste contexto, temos o direito e o dever de acompanhar, escrutinar e inquirir o Governo, que, por seu

lado, tem a obrigação de disponibilizar a informação necessária ao pleno exercício da nossa função.

Estaremos, assim, a velar pela transparência da governação e a promover a credibilidade das instituições

da democracia, bem como a segurança e a confiança dos nossos concidadãos. Segurança e confiança que

são, afinal, os mais poderosos antídotos de populismos e populistas que, no mundo de hoje, estão entre as

principais ameaças ao Estado de direito democrático, mesmo na União Europeia de que somos parte.

Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Se reafirmar o compromisso com os valores, princípios e regras que

aqui nos juntam é sempre oportuno, o início de uma Legislatura é um momento especialmente adequado para

exercitar tal compromisso. Daí que, de forma frontal, transparente e construtiva, repita, aqui e agora, as

perguntas que há já 72 horas fazemos ao Sr. Primeiro-Ministro.

Que fundamento tem o que, há três dias, chegou ao espaço público, em relação à eventual intenção do

Governo de desenhar, redesenhar ou, de qualquer outra forma, influenciar ou condicionar soluções quanto à

estrutura acionista da banca nacional?

Será que o Sr. Primeiro-Ministro tomou a iniciativa de se encontrar com a Sr.ª Eng.ª Isabel dos Santos e fê-

lo à margem da administração das instituições financeiras presumivelmente envolvidas, bem como do Sr.

Ministro das Finanças e, sobretudo, à margem das competentes entidades reguladoras de supervisão,

nacionais e europeias, do sistema financeiro e do mercado de capitais, independentes por definição?

A confirmar-se tal encontro, foi nele abordado ou acertado qualquer tipo de arranjo quanto à composição do

capital social de instituições financeiras?

Mais: na ocasião foram discutidas ou acordadas contrapartidas do Governo e/ou de potenciais acionistas

ou, ainda, feita alusão a possíveis alterações de legislação que pudessem facilitar eventuais soluções?

Em algum momento se admitiu que um eventual compromisso pudesse envolver o dispêndio de capitais

públicos, decorrente, nomeadamente, da nacionalização de instituições financeiras nacionais, tal como resulta

do entendimento tantas vezes repetido pelo Bloco de Esquerda e pelo Partido Comunista Português?

Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Noutro contexto, mas sempre no plano dos valores, princípios e

regras do Estado de direito democrático, e continuando a ser muito direto, pergunto: confirma o Sr. Primeiro-

Ministro que o Governo já assegurou a ratificação da decisão, ontem divulgada, de prorrogar a exploração da

Metro do Porto, por ajuste direto, ao Grupo Barraqueiro?

Se tal decisão está tomada, tem relação, direta ou indireta, com a regressão das condições de privatização

da TAP?

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Muito bem!

O Sr. Carlos Costa Neves (PSD): — A conjugação de tempo e de protagonistas dos processos de

regressão da privatização da TAP e do prolongamento da concessão da Metro do Porto é inoportuna

coincidência ou decorre de prévia concertação?

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Muito bem!

O Sr. Carlos Costa Neves (PSD): — Se ocorreu prévia concertação, quais os contornos exatos do

compromisso entre o Governo e o Grupo Barraqueiro e como, quando e por quem foi assumido tal

compromisso?

Sr. Presidente e Srs. Deputados, mais do que desejável, é forçoso que, todos, tudo façamos para clarificar

as duas situações referidas e, assim, anular qualquer dúvida que possa ensombrar a transparência da relação,

forçosa em democracia, entre a esfera privada dos negócios e a esfera pública da governação.

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Risos do PS.

É tempo, é mais do que tempo, de o Governo esclarecer, sem ambiguidade, logo sem margem para

dúvidas, o que se passou, como se passou, com quem se passou ou, na eventualidade de nada se ter

passado, de o proclamar com igual clareza.

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Muito bem!

O Sr. Carlos Costa Neves (PSD): — Assim se respeitarão os valores, os princípios e as regras do Estado

de direito democrático, por que optámos há 40 anos.

Ganham as instituições, ganha o País, ganham os portugueses.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — A Mesa regista quatro pedidos de esclarecimento.

O Sr. Deputado Carlos Costa Neves informou que responderá dois a dois.

Em primeiro lugar, para um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado João Galamba.

O Sr. João Galamba (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, o Sr. Deputado Carlos Costa Neves

vem aqui abonar-se da Constituição, texto que o PSD e o CDS violaram, flagrantemente e com entusiasmo,

durante quatro anos. Portanto, é sempre bom ver o PSD regressar, ainda que timidamente, ao arco

constitucional. Cá estaremos para vos receber de bom grado!

Sr. Deputado Carlos Costa Neves, não sei se sabe, mas no Regime Geral das Instituições de Crédito e

Sociedades Financeiras, bem como nos demais textos legislativos sobre esta matéria, incumbe ao Ministério

das Finanças e ao Governo de Portugal, em articulação com o Banco de Portugal, a responsabilidade máxima

pela estabilidade financeira em Portugal.

O atual Governo não vai demitir-se, irresponsavelmente, de tudo aquilo que é sua incumbência, deixando

ao Governo que se lhe siga a responsabilidade de tentar resolver os problemas que não resolveu.

Protestos do PSD.

Foi por o seu Governo, ou o Governo que o Sr. Deputado apoiou, não ter resolvido, não se ter metido, não

ter falado e não ter cumprido com as suas obrigações que temos os problemas que temos.

O Sr. Deputado não pode ser alheio ao facto de o segundo pilar do Programa de Ajustamento da troica ser

a estabilidade do setor financeiro e também não pode ser alheio ao facto de a estabilidade do setor financeiro

ser coisa que hoje não temos, e por responsabilidade do seu Governo.

Vozes do PS: — Muito bem!

Protestos do PSD.

O Sr. João Galamba (PS): — O Sr. Deputado deve estar lembrado de viagens do senhor que está ao seu

lado, o Dr. Pedro Passos Coelho, que ri, com aquele sorriso que todos, infelizmente, lhe conhecemos — e que

bom sorriso tem o Dr. Passos Coelho, que está a rir-se à gargalhada…

Protestos do PSD.

Mas os portugueses não se riem à gargalhada de o Governo anterior não ter cumprido as suas funções!

Protestos do PSD.

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Portanto, Sr. Deputado, a questão é esta: Portugal, neste momento, tem um problema grave no setor

financeiro que o Governo anterior devia ter resolvido, que disse que tinha resolvido e que não resolveu.

O Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras determina que o Ministério das

Finanças, juntamente com o Banco de Portugal, têm responsabilidades no acompanhamento do setor

financeiro.

Pausa.

Sr. Deputado Carlos Costa Neves, tire as notas que o Sr. Deputado, ou Primeiro-Ministro no exílio, Passos

Coelho, lhe está a dar. Vou dar-lhe tempo para as tirar.

Protestos do PSD.

O Sr. Presidente: — Peço-lhe que conclua, Sr. Deputado.

O Sr. João Galamba (PS): — Já tirou as notas? Posso continuar?

Protestos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Faça favor de concluir, Sr. Deputado.

O Sr. João Galamba (PS): — A pergunta que eu gostava de lhe fazer, Sr. Deputado, é a seguinte: tendo

em conta o enquadramento regulatório que existe, neste momento, na União Europeia, em que, se os Estados

não acautelarem os problemas no setor financeiro, são os Estados, nomeadamente o Governo e o Primeiro-

Ministro, como responsável máximo por esse Governo, que têm de pagar a fatura, tendo o País pago a fatura

por um Governo que, por razões eleitorais, decidiu não se envolver…

O Sr. Presidente: — Tem de concluir, Sr. Deputado João Galamba.

O Sr. João Galamba (PS): — … numa matéria que era da sua exclusiva responsabilidade, uma vez que

envolveu dinheiro dos contribuintes portugueses em vários bancos portugueses, não estando os problemas

desses bancos resolvidos e sendo responsabilidade do Ministério das Finanças e do Governo de Portugal…

Protestos do PSD e do CDS-PP.

… acautelar que não haja problemas graves no sistema financeiro, considera o Sr. Deputado que o melhor

que um Governo tem a fazer é não se meter, não fazer, não se envolver, não decidir e, no final, quando tudo

corre mal, ser esse mesmo Governo e os contribuintes portugueses a pagarem a fatura?

Vozes do PS: — Muito bem!

Protestos do PSD.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, já ultrapassou em muito o seu tempo.

O Sr. João Galamba (PS): — Foi isso que aconteceu no passado. Todos pagámos pela inação do

Governo.

Gostava de perguntar ao Sr. Deputado se é isso que defende agora.

Aplausos do PS.

Protestos do PSD.

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O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado João Pinho de Almeida.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — O Sr. Deputado Carlos Costa Neves trouxe aqui uma matéria

relevantíssima, que é a do princípio da separação de poderes e da forma como este Parlamento deve

fiscalizar a ação do Governo.

Reformulou perguntas que o Partido Social Democrata fez e a que, naturalmente, só o Partido Socialista ou

o Governo podem responder, o que pelos vistos, optam por não fazer. Fê-las num quadro que é essencial em

qualquer momento, e também neste, em concreto, que é o quadro da estabilidade do setor financeiro.

É verdade que é o Ministério das Finanças o máximo responsável pela estabilidade do setor financeiro em

Portugal. Por isso, pergunto ao Sr. Deputado Carlos Costa Neves se não considera que, nesse contexto, é

fundamental que o Ministério das Finanças tenha opinião sobre matérias relevantíssimas no âmbito da

estabilidade do setor financeiro, como, por exemplo, a localização dos centros de decisão da concessão de

crédito das instituições bancárias autorizadas a exercer atividade em Portugal.

É ou não importante discutir se o crédito que é concedido às pequenas e médias empresas portuguesas é

decidido em Lisboa, no Porto, se é decidido em Portugal ou se é decidido em qualquer outro país? Isso, sim, é

uma questão para colocar ao poder executivo, que tem de ter opinião e de responder sobre essa matéria.

É ou não tempo de pararmos de saltar de caso em caso e de os contribuintes portugueses saberem, em

cada um dos casos, afinal de contas, o que é que o Governo faz e quanto custa o que faz?

É ou não o momento de sabermos, de uma vez por todas, que o Governo só pode intervir de acordo com

os poderes que tem e que, portanto, não pode intervir de forma direta nem indireta na estrutura acionista de

bancos, quando isso diz respeito apenas a negócios entre privados? Os negócios entre privados não estão no

âmbito da estabilidade do sector financeiro que é conferida ao Ministério das Finanças. Isso é outra coisa! Isso

é mercado e interferir é perverter as regras de mercado de forma ilegítima.

São todos estes esclarecimentos que têm de ser dados — estamos de acordo.

Pergunto, pois, ao Sr. Deputado Carlos Costa Neves se o problema que temos é ou não um problema de

transparência. Não discutimos a separação de poderes, porque essa é absoluta, não discutimos a

competência que o Ministério das Finanças tem como máximo responsável pela estabilidade do setor

financeiro, porque essa decorre da lei. Não é esse o problema! O que está em causa é os contribuintes

saberem, de uma vez por todas, como é comprometido o seu dinheiro, com que objetivos, em nome de que

interesses e com que proveito para os contribuintes. É isto que tem, ou não, de ser esclarecido? Está em

causa, ou não, um problema de transparência, pela qual este Governo ainda não fez nada?

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Costa Neves.

O Sr. Carlos Costa Neves (PSD) — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Deputado João Galamba,

realmente, ao fim de algum tempo, vamo-nos conhecendo bem uns aos outros, portanto não estranho que o

Sr. Deputado comece a sua intervenção por dizer «não sei se sabe».

O Sr. Deputado sabe tudo, os outros não sabem nada, e, portanto, esse começo não é nada de

inesperado.

Aplausos do PSD.

Protestos do Deputado do PS João Galamba.

E escusa de ser insolente, porque também não me comove.

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Ora!

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O Sr. Carlos Costa Neves (PSD) — À pergunta do «não sei se sabe», sempre lhe digo que sei agora e já

sabia em 2011.

Em 2011, já sabia qual era a diferença entre a estabilidade financeira e a responsabilidade do Governo e a

estrutura acionista, como bem referia o Sr. Deputado João Almeida. E também sei que, em 2011, porque já

era Deputado nesta Assembleia, o Governo de então teve de andar a capitalizar vários bancos e que ainda

hoje pagamos muitas das opções e das interferências do Governo anterior a 2011 em negócios privados, que

seriam exclusivamente da esfera privada.

Aplausos do PSD.

Sei tudo isso, Sr. Deputado. Acompanhei tudo isso, Sr. Deputado. Tal como conheço a Constituição da

República. Sei o que é o Estado de direito, sei o que é a transparência, sei o que é respeito pela Constituição.

Sr. Deputado, escusa de disparar em todos os sentidos. Assuma, pura e simplesmente, que não quer

responder. A única coisa que pedi na intervenção que fiz da tribuna foi que o Sr. Primeiro-Ministro dissesse o

que foi tratado no encontro. O que a revista Sábado diz é ou não verdade? Tratou-se da estabilidade

financeira ou tratou-se do quadro de acionistas da banca? É só o que pergunto! É só o que quero saber!

Entretanto, assumiu a presidência o Vice-Presidente José Manuel Pureza.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, queira terminar.

O Sr. Carlos Costa Neves (PSD) — Em relação às questões do Sr. Deputado João Almeida, é óbvio que

há uma distinção profunda entre a discussão sobre estrutura acionista e responsabilidade do Governo em

matéria de estabilidade financeira.

Portanto, fica claro que, apesar de 6 minutos de tentativas, de, pelo menos, 20 perguntas entrecruzadas e

de referências à questão da TAP e ao Grupo Barraqueiro, o Grupo Parlamentar do Partido Socialista não quer

responder. Aguardemos que o Sr. Primeiro-Ministro responda.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada

Mariana Mortágua, do Bloco de Esquerda.

A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, é sabido que a banca portuguesa é das

menos capitalizadas da Europa e que está sentada em cima de biliões de ativos altamente desvalorizados. E,

mais, toda a gente sabe que é apenas uma questão de tempo, até que o problema que o PSD e o CDS não

quiseram ver, nem resolver, nos rebente nas mãos. Vai rebentando ao retardador e vai sendo pago ao

retardador.

Também é verdade que a direita não tem uma solução para o sistema bancário que não seja mais do

mesmo. E o mesmo é deixar os negócios privados funcionar e entregar o nosso sistema financeiro ao capital

estrangeiro, seja esse capital espanhol ou angolano.

Mas também é preciso dizer que não é só a direita. Temos visto, vezes demais, gente do bloco central

sentada nas administrações de bancos portugueses e angolanos, gente do PSD e do PS sentada nos

conselhos de administração de bancos portugueses e angolanos.

Por isso, não se pense que o problema da «espanholização» da banca se resolve não fazendo nada e

deixando o mercado funcionar ou entregando a banca portuguesa à família do poder angolano.

O Sr. Jorge Duarte Costa (BE): — Muito bem!

A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — As notícias que saíram nos últimos dias são preocupantes. É preciso

dizer que, em vez de procurar um equilíbrio entre o capital angolano e o capital espanhol, o Governo de

Portugal tem de encontrar um equilíbrio e uma resposta para a estabilidade do sistema financeiro português e

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para garantir que temos o controlo estratégico do sistema financeiro. É tempo de compreendermos que o

sistema financeiro é um bem público.

Aplausos do BE.

O sistema financeiro é um instrumento de política económica, de desenvolvimento e de crescimento

económico. O sistema financeiro é um instrumento de soberania que não pode ser alienado nem a capital

angolano, nem a capital espanhol.

Sr. Deputado Carlos Costa Neves, tenho muita dificuldade em imaginar uma pergunta para lhe fazer,

porque o PSD não tem resposta para este problema. Não tem resposta! Já se rendeu à ideia de Portugal ser

uma colónia financeira completamente dependente seja dos interesses de Espanha seja dos interesses da

família de José Eduardo dos Santos, tanto faz!

Uma coisa lhe garanto: com este modelo, sem controlo público da banca…

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Sr.ª Deputada, queira terminar.

A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Termino, Sr. Presidente.

Como eu estava a dizer, com este modelo, sem o controlo público da banca que os contribuintes

portugueses já pagaram muito cara, nunca seremos capazes de recuperar da crise e de ter uma política

económica e de desenvolvimento que se veja.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado

Paulo Sá, do PCP.

O Sr. Paulo Sá (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Deputado Carlos Costa Neves, o controlo

cada vez maior da banca nacional pelo capital estrangeiro é um problema. É um problema porque significa o

controlo dos centros de decisão nacionais pelo estrangeiro e é ainda mais grave quando se trata de um setor

estratégico como a banca.

Sr. Deputado, o problema é a banca nacional estar entregue a grupos económicos e financeiros que a

gerem não em benefício de Portugal e dos portugueses, mas, sim, na ótica da maximização dos lucros. Esse

problema, Sr. Deputado, apenas se resolve com o controlo público da banca.

O setor bancário privado não serviu, nem serve, os trabalhadores, as populações, as empresas, os

produtores, a economia nacional, nem serviu, nem serve, o País. Pelo contrário, prejudicou-os.

Por isso, Sr. Deputado, o que é preciso é que o Estado assuma o controlo da banca. É aqui que reside a

resposta ao problema! É preciso dar esse passo e garantir que a banca portuguesa, controlada pelo Estado,

passe a estar ao serviço dos interesses nacionais.

O Sr. Deputado Carlos Costa Neves veio aqui hoje lamentar o crescente controlo da banca nacional por

capital estrangeiro. Este lamento, Sr. Deputado, cheira a hipocrisia, a profunda hipocrisia política!

A Sr.ª Carla Cruz (PCP): — Exatamente!

O Sr. Paulo Sá (PCP): — Então, o PSD não se assumiu sempre como o defensor do controlo do setor

bancário pelo capital privado?

Então, não foi o PSD que, no anterior Governo, juntamente com o CDS, obrigou a Caixa Geral de

Depósitos a vender parte dos seus ativos, nomeadamente no setor segurador, enfraquecendo o único banco

público português?

A Sr.ª Carla Cruz (PCP): — Ora aí está!

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O Sr. Paulo Sá (PCP): — Então, não foi o Governo do PSD que vendeu ao desbarato o BPN e tentou

entregar de bandeja o Novo Banco a capitais privados?

Por acaso, não é o PSD um acérrimo defensor da união bancária, um processo que tem como objetivo

central a concentração da atividade bancária em meia dúzia de megabancos das principais potências

capitalistas da União Europeia?

Por acaso, não defende o PSD a livre circulação de capital, em particular do capital financeiro?

Por acaso, Sr. Deputado, não tem o PSD aplicado uma política de favorecimento dos grandes interesses

privados, nomeadamente no setor bancário?

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Atenção ao tempo, Sr. Deputado.

O Sr. Paulo Sá (PCP): — Vou terminar, Sr. Presidente.

O anterior Primeiro-Ministro Pedro Passos Coelho nem sequer se preocupou em esconder o seu contacto

com José Maria Ricciardi, mantendo-o à frente do BES Investimento, já depois do escândalo BES/GES,…

A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Bem lembrado!

O Sr. Paulo Sá (PCP): — … assumindo essa ligação de promiscuidade entre o poder político e o poder

económico.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Bem lembrado!

O Sr. Paulo Sá (PCP): — Sr. Deputado Carlos Costa Neves, a sua declaração política é um hino à

hipocrisia. Não venha agora «chorar lágrimas de crocodilo», quando o PSD teve sempre um papel

determinante nas opções que levaram a banca nacional à situação em que se encontra.

Aplausos do PCP, do BE e de Os Verdes.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Costa

Neves.

O Sr. Carlos Costa Neves (PSD) — Sr. Presidente, a intervenção da Sr.ª Deputada Mariana Mortágua,

que, afinal, não fez pergunta nenhuma, merece, certamente, um comentário por duas razões.

Primeira, o que está em causa é o momento atual. A minha intervenção não tem nada a ver com o passado

de quatro anos de Governo, de que, aliás, me orgulho; não foi sobre isso que falei. Os senhores é que estão

confrontados com o momento atual e eu estou a falar do momento atual.

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Muito bem!

O Sr. Carlos Costa Neves (PSD) — Não ponha o discurso no passado, porque o discurso está no

presente.

A Sr.ª Deputada diz que a direita não tem soluções. Bom, mas as soluções apresentadas pelas esquerdas

eu não as percebo, porque há, pelo menos, quatro soluções diferentes.

A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Pelo menos, há soluções!

O Sr. Carlos Costa Neves (PSD) — Por isso é que não entendo o oportunismo do apoio que vão dando

uns aos outros, porque as soluções que vão sendo apontadas aqui dia a dia divergem entre si profundamente.

Vou repetir as duas principais questões que coloquei e a que os senhores não quiseram responder.

Primeira: que fundamento tem o que há três dias chegou ao espaço público em relação à eventual intenção

do Governo de desenhar, redesenhar ou, de qualquer outra forma, influenciar ou condicionar soluções quanto

à estrutura acionista da banca nacional?

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Ao Sr. Deputado Paulo Sá, sempre digo que, sobre esta questão, a vossa posição relativamente à banca é

muito clara, ou seja, querem Portugal fora do euro, querem renegociar a dívida, ou seja, não a pagar, e

querem nacionalizar a banca. Entendam-se com os vossos parceiros do lado esquerdo! É muito clara a vossa

posição!

Mas também gostava de perceber por que é que não reagem à segunda parte da minha intervenção.

O Sr. Paulo Sá (PCP): — Mas quem faz as perguntas somos nós!

O Sr. Carlos Costa Neves (PSD) — Aliás, nenhuma das intervenções dos partidos à minha direita fizeram

qualquer referência a essa segunda parte, ou seja, à seguinte pergunta: a conjugação de tempo e

protagonistas, dos processos de regressão da privatização da TAP e do prolongamento da concessão da

Metro do Porto, é inoportuna coincidência ou decorre de prévia concertação? Não vale a pena baralhar as

coisas, respondam à questão! Houve coincidência ou houve propósito?

O Sr. Paulo Sá (PCP): — Mas quem faz as perguntas somos nós! E nós fizemos seis perguntas!

O Sr. Carlos Costa Neves (PSD) — Srs. Deputados do Grupo Parlamentar do Partido Comunista, estão

muito incomodados com a TAP, não querem falar sobre o assunto, mas as perguntas que fiz tinham a ver com

TAP, com Barraqueiro e com o encontro do Sr. Primeiro-Ministro com a Sr.ª Eng.ª Isabel dos Santos.

Aplausos do PSD.

A Sr.ª Carla Cruz (PCP): — Falou, falou, mas não disse nada!

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Antes da próxima declaração política, peço à Sr.ª Secretária o

favor de ler o expediente que, entretanto, chegou à Mesa.

A Sr.ª Secretária (Idália Salvador Serrão): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, deram entrada na Mesa os

projetos de resolução n.os 182/XIII (1.ª) — Assegura a atribuição do subsídio de educação especial e garante

os apoios clínicos a todas as crianças e jovens com deficiência (PCP), que baixa à 10.ª Comissão, 183/XIII

(1.ª) — Recomenda ao Governo a resolução dos problemas e constrangimentos existentes e que promova a

defesa e valorização da comunidade piscatória de Apúlia (PCP), que baixa à 7.ª Comissão, 184/XIII (1.ª) —

Recomenda ao Governo a ratificação do protocolo sobre trabalho forçado da OIT (PS), que baixa à 10.ª

Comissão, 185/XIII (1.ª) — Deslocação do Presidente da República a Estrasburgo (Presidente da AR), 186/XIII

(1.ª) — Recomenda a definição de um conjunto de medidas tendentes a realizar obras de requalificação nos

bairros sociais de Guimarães e Barcelos (PCP), que baixa à 11.ª Comissão, e 187/XIII (1.ª) — Pela

intervenção urgente na recuperação da Estrada Nacional n.º 4 (PCP), que baixa à 6.ª Comissão.

É tudo, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Vamos, então, prosseguir com as declarações políticas.

Tem a palavra o Sr. Deputado Porfírio Silva, do PS.

O Sr. Porfírio Silva (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Uma das orientações fundamentais do

Programa do XXI Governo constitucional resume-se na expressão «prioridade às pessoas».

Duas frases do Programa do Governo dizem o essencial: «A dignidade das pessoas tem que ser o valor

central de uma sociedade decente. As pessoas são o primeiro e o mais importante ativo do País.»

As políticas públicas de educação são uma das vias de concretização desta orientação fundamental. A

qualificação dos portugueses, se, indubitavelmente, importa ao desenvolvimento sustentável do País, importa

também, e isto não é menos crucial, à plena realização de cada pessoa e ao aprofundamento da cidadania

democrática.

É neste quadro que se compreende que o Ministério da Educação tenha colocado como primeira prioridade

de atuação a promoção do sucesso escolar. Um aspeto decisivo da promoção de aprendizagens de sucesso é

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a avaliação. Por isso, o Partido Socialista saúda a aprovação pelo Conselho de Ministros, na semana passada,

do modelo integrado de avaliação externa das aprendizagens no ensino básico.

O essencial era já conhecido desde janeiro: continuam os exames do 9.º ano; são abolidos os exames de

4.º e 6.º anos; introduzem-se provas de aferição a meio de cada ciclo de estudos, para que essas provas

deem um contributo atempado à melhoria das aprendizagens, permitindo detetar, a tempo, o que está bem e

deve prosseguir, mas igualmente o que seja preciso corrigir, melhorar.

Tudo isto era conhecido desde janeiro. O que é novo e que foi comunicado às escolas na semana passada

foram as datas concretas de realização das provas, que caem na semana anteriormente sinalizada, bem como

o regime transitório das provas de aferição.

Já que a oposição de direita escolheu como motivo de ruído precisamente o regime transitório, como se ele

fosse inédito ou extraordinário numa mudança destas, esclareça-se em que consiste tal regime transitório.

Pois, simplesmente, na possibilidade de as escolas decidirem não realizar este ano provas de aferição, se,

para isso, encontrarem fundamento na sua situação específica, nomeadamente em dificuldades logísticas,

bem como na possibilidade de as escolas ainda realizarem este ano provas nos 4.º e 6.º anos com caráter de

diagnóstico, usando uma matriz nacional.

Cabe lembrar aos mais esquecidos que já na comunicação enviada às escolas no princípio de janeiro havia

elementos que caracterizavam o corrente ano letivo como um ano de transição, ao deixar para 2016/2017 a

entrada em vigor de alguns aspetos importantes do modelo, designadamente no tocante ao alargamento das

áreas curriculares abrangidas pelo processo de aferição.

Nada mais normal do que prover uma mudança deste alcance pedagógico com um período de transição,

ainda mais quando este resultou de uma intensa auscultação das escolas, que passou por reuniões da equipa

governativa com as centenas de diretores de agrupamentos e de escolas não agrupadas por todo o País, de

forma descentralizada.

Claro que não podem gostar disto os partidários do método Crato, o ministro do Governo PSD/CDS, que

tudo mudou (avaliação, currículo, horários), sem nunca ouvir ninguém, sem ouvir os diretores, sem ouvir as

escolas.

Tudo está preparado. Todas as escolas podem avançar para as provas de aferição porque da parte do

Ministério da Educação terão todos os instrumentos para a sua concretização.

As provas de aferição constituem um novo direito dos alunos: o direito de cada aluno a receber uma

informação individual sobre o seu desempenho por cada domínio ou tema; o direito de cada aluno a ter, com

base nessa ficha individual, indicações atempadas e o apoio diferenciado que o ajudem a reforçar os seus

pontos fortes e a corrigir os seus pontos fracos; o direito de cada aluno a saber a tempo e horas o que fazer

para aprender mais e aprender melhor, porque precisamente para isso deve servir sempre a avaliação.

Sr.as e Srs. Deputados, quando este Parlamento aprovou, na generalidade, o fim dos exames do 4.º ano,

uma reportagem registou a seguinte reação de alunos do 1.º ciclo: «Andámos três anos a treinar para nada».

Percebemos, assim, a profundidade dos danos causados à educação pela governação ideológica de Nuno

Crato. Quem ensinou às crianças que três anos a aprender não servem para nada, se depois não houver um

exame precoce? Sim, o exame do 4.º ano era um exame precoce, que não existe em praticamente nenhum

país civilizado. Sim, o foco excessivo nos exames foi uma fixação ideológica que ignorou o conhecimento

disponível sobre estas questões. O novo modelo, este sim, alinha o sistema português pelas melhores práticas

internacionais, acabando com a anormalidade de sermos uma raridade na OCDE.

O Partido Socialista não tem nenhuma posição radical sobre os exames em geral, como demonstra o facto

de o novo modelo manter os exames do 9.º ano. Mas convém lembrar: estamos a falar do ensino básico e o

mais importante é a avaliação contínua, essa avaliação centrada no trabalho concreto da sala de aula — que

já era, e vai continuar a ser, o elemento decisivo, tanto para a aprendizagem como para a formação da nota. É

claro que aqueles que só pensam em multiplicar exames e em rankings e que, por causa dessa fixação,

esquecem o essencial, esses estão nervosos.

Mas não deveriam, porque o novo modelo integrado de avaliação externa coloca o foco no que importa,

nas condições concretas de funcionamento das escolas. Por exemplo, enquanto o calendário anterior

interrompia as aulas a meio do 3.º período para as provas, no novo calendário as provas realizam-se na última

semana de aulas, minimizando o seu impacto nas outras disciplinas. É disso que os saudosos de Crato se

esquecem: da vida concreta das escolas.

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Cabe-nos, em vez disso, assumir as nossas responsabilidades e dar a mensagem correta aos alunos, aos

pais, aos profissionais: continuem a estudar, continuem a ensinar, a seu tempo virão as provas de aferição

para ajudar a melhorar esse trabalho. E nunca, nunca mais, a avaliação como castigo.

Aplausos do PS, do BE e do PCP.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos, quatro Srs.

Deputados.

O Sr. Deputado Porfírio Silva informou a Mesa que pretende responder dois a dois.

Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Emília Santos, do PSD.

A Sr.ª Emília Santos (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Deputado Porfírio Silva,

compreendemos a necessidade de o Grupo Parlamentar do Partido Socialista vir a debate defender as

políticas educativas deste Governo, até para quem a sua responsabilidade termina onde as dificuldades

começam, mas também compreendemos a sua dificuldade em defender tanta inconsistência e tanta

incompetência em tão pouco tempo.

Vozes do PSD: — Muito bem!

A Sr.ª Emília Santos (PSD): — À instabilidade introduzida com as mudanças ao sistema de avaliação

anunciadas a meio do ano letivo, o Governo acrescenta, agora, mais instabilidade ao remeter para as escolas

a responsabilidade e o ónus de este ano letivo poderem fazer, ou não fazer, as provas de aferição e as provas

de avaliação final.

Como pode o Sr. Deputado concordar com este alijamento de responsabilidade? Conhece, porventura, os

critérios para que uma escola decida fazer exames e outra não? Não vai chamar a esta incompetência

autonomia das escolas, pois não, Sr. Deputado?

O Sr. Amadeu Soares Albergaria (PSD): — Vai, vai!

A Sr.ª Emília Santos (PSD): — Estou certa de que não.

Mas deixo-lhe uma outra questão que a todos deve preocupar: como podem os alunos, os pais e até os

profissionais que aqui já hoje referiu levar a sério uma política de educação que a dois meses do final do ano

letivo não deixa claro se vai ou não vai haver provas de avaliação?

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Não pode!

A Sr.ª Emília Santos (PSD): — Sr. Deputado, lembre-se que uma escola fácil não prepara para a vida

difícil. Esta é uma verdade inquestionável que não devemos esquecer jamais.

Deixo, ainda, uma palavra sobre o concurso de professores que o Sr. Deputado quis aqui ignorar.

O Ministério veio a esta Casa prometer que irá lutar contra a precariedade e disse que era necessário dar

estabilidade ao corpo docente nas escolas. É bom lembrar que os partidos que agora apoiam o Governo

criticaram o anterior, que vinculou aos quadros mais de 4000 professores.

No ano passado, quando o anterior Ministério abriu as quase 1500 vagas no concurso, acharam pouco,

disseram que era insuficiente e que se traduzia em mais um passo na destruição da escola pública. Neste ano,

o que dizem? O que dizem perante a abertura de um concurso de docentes com apenas 100 novas vagas de

quadro?

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Cem?!

A Sr.ª Emília Santos (PSD): — Qual é a vossa justificação com a média dos últimos quatro anos, que foi

de 1000 vagas?

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O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Tem de terminar, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Emília Santos (PSD): — Nenhuma, estou certa. A não ser a de quererem aumentar o número de

professores contratados no início do ano letivo.

O Sr. Amadeu Soares Albergaria (PSD): — É o costume!

A Sr.ª Emília Santos (PSD): — Dito isto, perguntamos, Sr. Deputado — e termino, Sr. Presidente: por

acaso, as escolas têm subitamente os seus quadros docentes completos? Não têm agora docentes a mais?

Não houve aposentações? É isto que importa ser esclarecido hoje e agora pelo Partido Socialista, que suporta

o Governo.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana

Rita Bessa, do CDS-PP.

A Sr.ª Ana Rita Bessa (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as Deputadas, Srs. Deputados, Sr. Deputado

Porfírio Silva, também para o CDS este é um tema fundamental, razão pela qual daqui a pouco faremos uma

declaração política exatamente sobre o mesmo assunto.

Por isso, reservando a nossa visão sobre o tema para daqui a pouco, tenho apenas duas questões muito

práticas, que gostaria de lhe colocar, decorrentes da sua intervenção.

A primeira é a seguinte: com estas provas facultativas, como acabaram por ser neste ano letivo, como é

que o Ministério da Educação vai conseguir garantir que todos os alunos do sistema público-privado

beneficiam deste novo direito de que o Sr. Deputado aqui falou, o direito de fazer provas de aferição e de

receber uma ficha de avaliação individual, se as provas são deixadas ao critério de cada escola e, portanto,

teremos escolas que cumprem e escolas que não cumprem esta realização de provas?

A segunda pergunta tem a ver com consequências. No caso em que, dependendo das escolas, temos ou

não realização de provas e no caso em que estas provas não têm qualquer impacto sobre o resultado dos

alunos, o que é que acontece aos alunos que decidam, com toda a liberdade, não ir a estas provas no final do

ano letivo, já depois de o ano ter terminado?

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Muito bem!

A Sr.ª Ana Rita Bessa (CDS-PP): — Diz o Sr. Deputado que está tudo em marcha, que está tudo no

terreno, que todos os instrumentos estão criados. Depois de terem sido consultados todos os diretores e tendo

o Sr. Ministro assegurado que estava tudo em paz, que toda a gente estava de acordo e que já não havia

qualquer esclarecimento adicional, continuo sem compreender por que é que as provas não são aplicadas

com a segurança que o Sr. Ministro anunciou em 8 de janeiro.

Aplausos do CDS-PP e do Deputado do PSD Amadeu Soares Albergaria.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Porfírio Silva.

O Sr. Porfírio Silva (PS): — Sr. Presidente, Sr.as Deputadas Emília Santos e Ana Rita Bessa, obrigado

pelas questões que me colocaram.

Queria dizer, com toda a clareza, que não sinto a necessidade de defender a política de educação deste

Governo. Tenho o gosto e a honra de defender a política de educação deste Governo.

Aplausos do PS.

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Também é verdade, Sr.ª Deputada, que eu não lhe posso dizer, porque estaria a mentir, que é possível

reverter em apenas um ano e alguns meses o que os senhores fizeram durante quatro anos e meio na

educação. Mas, tenham calma, a Legislatura está apenas a começar, e lá iremos.

O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Isso é que é assustador!

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Se estivesse a acabar, não era tão assustador!

O Sr. Porfírio Silva (PS): — Mas a ideia é a de que eu não possa responder aos pedidos de

esclarecimento ou gostariam de ouvir a resposta?!

Sr.ª Deputada Ana Rita Bessa, há uma coisa que realmente vos falta compreender…

Protestos do CDS-PP.

Estamos a ver o exemplo que os Srs. Deputados dão aos alunos!…

Sr.ª Deputada Ana Rita Bessa, penso que deveria ter cumprido, pelo menos, este ponto essencial: todos os

alunos vão ter avaliação a 100%, resultante da avaliação interna e da avaliação contínua.

Portanto, Sr.ª Deputada, se já compreendeu os traços básicos deste sistema, sabe que nenhum aluno vai

ser prejudicado na sua avaliação por causa da implementação deste modelo.

A Sr.ª Ana Rita Bessa (CDS-PP): — Não foi isso que eu disse!

O Sr. Porfírio Silva (PS): — Sr.ª Deputada, como eu disse da tribuna, consideramos que é um novo direito

dos alunos as provas de aferição darem indicações atempadas para que os alunos possam, com os seus

professores e com as suas famílias, corrigir o seu processo. É um direito que, eventualmente, só ao longo do

tempo poderemos ver completamente realizado.

Porém, Sr.ª Deputada, é melhor começar a aplicar um direito, começar a desenvolver um direito, do que,

como os senhores fizeram, substituir educação, substituir aprendizagem, substituir ensino por exames,

exames e mais exames em anos que mais nenhum país civilizado tem. Precisamos de ir a uma parte da

Bélgica e a uma parte dos Estados Unidos para termos o exemplo que tínhamos aqui com os exames do 4.º

ano. Isso, certamente, vai terminar.

A responsabilidade das escolas, Sr.ª Deputada Emília Santos, não é um ónus. As escolas sabem, sempre

souberam, assumir as suas responsabilidades.

Portanto, esteja descansada, Sr.ª Deputada,…

A Sr.ª Emília Santos (PSD): — Não estou, não!

O Sr. Porfírio Silva (PS): — … porque as escolas sabem muito bem aquilo que fazem, as escolas sabem

muito bem organizar-se, os profissionais que lá estão sabem muito bem como devem fazer as coisas. Não se

preocupe que não é um ónus das escolas, é uma responsabilidade que os profissionais de educação, as

famílias, os pais, os alunos, assumem com toda a vontade e com toda a responsabilidade, a mesma

responsabilidade que os senhores não souberam ter durante a última Legislatura.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Para uma segunda ronda de pedidos de esclarecimento, tem,

em primeiro lugar, a palavra, em nome do Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda, a Sr.ª Deputada Joana

Mortágua.

A Sr.ª Joana Mortágua (BE): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Porfírio Silva, o PSD e o CDS ainda não

estão conformados com o fim dos exames. Andam com argumento para a frente, argumento para trás, sem

decidir, de facto, qual é o argumento que querem utilizar.

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Primeiro, diziam: «Que surpresa o fim dos exames. Ninguém estava à espera disto». Na verdade, toda a

gente sabia.

O Sr. Amadeu Soares Albergaria (PSD): — Não é verdade!

A Sr.ª Joana Mortágua (BE): — Estava nos programas, foi aprovado no Parlamento, o Ministro anunciou…

Toda a gente sabia que os exames iam acabar, menos os Deputados do PSD e do CDS.

O Sr. Amadeu Soares Albergaria (PSD): — Não é verdade!

A Sr.ª Joana Mortágua (BE): — Portanto, a surpresa não é argumento.

A seguir, o argumento era a arrogância. Diziam: «O Sr. Ministro não ouviu ninguém, o Governo não ouviu

ninguém.» Muito engraçado vir dos Deputados que suportaram o Ministro que menos ouviu e que menos quis

ver durante todo o tempo de ministérios da educação!

Quando o Governo e o Ministro foram ouvir todos os diretores de todos os agrupamentos e escolas não

agrupadas para saberem o que achavam, afinal o argumento da arrogância já não servia e vieram com outro

argumento: o Ministro ouviu, mas não escutou, não respeitou a autonomia, não respeitou o que os diretores

tinham para dizer, não respeitou as escolas. O Ministro é um radical, o Ministro quer fazer tudo à pressa.

Quando o Governo vem com uma medida transitória para respeitar a autonomia, afinal a moderação já não

serve, afinal a ponderação já não é desejada, afinal querem é o radicalismo, porque o radicalismo é que é

prova de confiança, o radicalismo é que é prova de que se sabe o que se está a fazer.

Vozes do BE: — Muito bem!

A Sr.ª Joana Mortágua (BE): — A seguir, vieram com outro argumento: acabou a avaliação! Não podia

haver maior mentira. Antes de 2011, não havia avaliação? Só os exames é que permitem avaliar os alunos?

Não, senhor! Os alunos vão continuar a ter avaliação e nenhum aluno ou aluna deste País vai ter exame a

contar para a nota. Vai haver igualdade para todos.

Portanto, o argumento do fim da avaliação não serve, o argumento da desigualdade não serve. Ficamos

isolados na Europa? Não! Pelo contrário, acompanhamos o caminho europeu. Portanto, o argumento do

isolamento também não serve.

Sr. Deputado, afinal, qual é o único argumento que a direita tem para defender os exames? Será que,

chegados ao final das contas, o único argumento que a direita tem para defender os exames, a única pena

que a direita tem, é que tenham desaparecido os rankings?

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada

Paula Santos.

A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Deputado Porfírio Silva, cumprimento-o

também pela sua intervenção e pelo tema que trouxe a este debate, não só pela sua atualidade, mas também

pela sua importância.

Digo pela sua importância porque, de facto, estamos perante, nomeadamente no que diz respeito ao fim

dos exames nos 4.º e 6.º anos, uma decisão que não só vai ao encontro e que reflete as propostas pelas quais

o PCP se tem vindo a bater há muitos anos, mas porque constitui, de facto, um avanço. Um avanço na

educação, um avanço nas escolas, um avanço para os estudantes, um avanço que põe fim à injustiça dos

exames nacionais, os quais penalizavam os estudantes, limitavam o seu percurso escolar, e que vai no

sentido de uma aposta na avaliação contínua, na valorização das aprendizagens ao longo do ano e não num

momento concreto, como é a avaliação sumativa.

Compreendemos muito bem o desconforto e a discordância a que temos vindo a assistir por parte do PSD

e do CDS. De facto, a visão de escola do PSD e do CDS é uma visão elitista, uma visão em que só alguns

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podem atingir os mais elevados níveis de ensino. O objetivo do PSD e do CDS em relação aos exames

nacionais era o de iniciar uma seleção social e económica dos estudantes logo no início do seu percurso. Uma

seriação que o PSD e o CDS queriam impor cada vez mais precocemente, em vez de investirem no acesso

dos estudantes a um processo educativo orientado para a formação da cultura integral do indivíduo.

De facto, temos visões bastante diferenciadas do que é a escola, daquilo que deve ser a escola pública e

do que devem ser os percursos escolares por parte dos estudantes.

Sr. Deputado, a instabilidade que o PSD invocou aqui neste debate, na nossa perspetiva, mais não passa

do que dar espaço às escolas para que, ainda neste ano letivo, possam ajustar o processo de avaliação àquilo

que consideram ser mais adequado, mas permite também, na nossa ótica, ao Governo preparar-se para a

implementação de um modelo que consideramos que vai ao encontro daquelas que são as reivindicações da

comunidade escolar e da comunidade educativa.

O fim dos exames não é uma exigência de hoje. Durante os últimos quatro anos em que o PSD e o CDS

estiveram no Governo, esta foi uma medida amplamente contestada pela comunidade escolar e pela

comunidade educativa,…

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Já ultrapassou o seu tempo, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Paula Santos (PCP): — … e isso os senhores continuam a não aceitar.

As vossas políticas educativas foram amplamente contestadas e agora estamos a ir ao encontro das

reivindicações da comunidade escolar.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Para responder aos dois pedidos de esclarecimento, tem a

palavra o Sr. Deputado Porfírio Silva.

O Sr. Porfírio Silva (PS): — Sr. Presidente, Sr.as Deputadas Joana Mortágua e Paula Santos, obrigado

pelas questões colocadas.

Respondendo às vossas interrogações, gostaria de dizer o seguinte: penso que, apesar de tudo, alguma

coisa deve estar a mexer na direita.

Há um Sr. Deputado que sempre que se fala de educação faz um ataque aos sindicatos e fala na extrema-

esquerda. Hoje, já nem atacaram os sindicatos e já nem falaram na extrema-esquerda.

Há outros Deputados da direita que sempre que se fala nisto dizem que o Conselho Nacional de Educação

estaria contra. Hoje, já não vieram dizer isso, talvez por terem consciência de que houve alguém que tentou

que o Conselho Nacional de Educação se pronunciasse contra este modelo integrado de avaliação e o

Conselho não seguiu essa iniciativa e mandou meter esse parecer negativo na gaveta. Talvez por isso,

abandonaram o argumento da extrema-esquerda, abandonaram o argumento do Conselho Nacional de

Educação!

Às vezes, também dizem: «Ah, os relatórios internacionais…», aquela de lerem a capa e depois não lerem

o que lá está dentro! Hoje, também voltaram a não falar dos relatórios internacionais. Talvez porque, olhando

bem para os relatórios internacionais, percebam que agora é que Portugal vai estar alinhado com a

comunidade internacional civilizada e deixa de estar alinhado com um Estado americano e com uma região

belga! Talvez seja por isso!

Mas talvez haja outra explicação. Esta história da pressa… Mas, afinal, há pressa?

Ó Srs. Deputados, o Governo de Pedro Passos Coelho e de Paulo Portas tomou posse em junho de 2011

— em junho — e no dia 3 de agosto desse mesmo ano publicou logo o Decreto-Lei n.º 94/2011, em que se

mexia radicalmente no ensino básico, na organização curricular, na avaliação das aprendizagens e introduzia

provas, isto passadas umas semanas de estarem em funções. Talvez por isso, agora, também estejam a

começar a deixar de falar da pressa.

Sim, porque a nossa pressa é a de corrigir, é a de melhorar, é a de melhorar as avaliações para melhorar

as aprendizagens, é para que os alunos tenham todos melhor e mais aprendizagem e não para que só alguns

usufruam de algumas possibilidades.

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Sim, porque o anterior Governo extinguiu as disciplinas mais viradas para a cidadania; mudou programas,

mesmo aqueles que tinham entrado em vigor escassos anos antes; estabeleceu novas metas curriculares;

introduziu exames nos 4.º e 6.º anos, à pressa, sem ouvir ninguém, orientado por uma mera pulsão ideológica.

Mas nós aqui não estamos orientados por nenhuma pulsão ideológica. Estamos, sim, orientados pela

necessidade de que todos os alunos possam aprender mais e melhor, porque isso é importante para eles,

para o País e para todos nós.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Para uma declaração política, tem a palavra, em nome do

Bloco de Esquerda, o Sr. Deputado Carlos Matias.

O Sr. Carlos Matias (BE): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Antes de cada desgraça evitável, a

negligência critica sempre o alarmismo. Quem não quer mexer no que está, quem não quer desinstalar

nenhum interesse, vira-se sempre contra quem faz a prevenção.

Pela parte do Bloco de Esquerda não são essas acusações que nos inibem de fazer soar o alarme.

Dizemos com todas as letras e com toda a responsabilidade: junto à fronteira portuguesa, sobre o Tejo, cresce

o risco de catástrofe na central nuclear de Almaraz.

Assinala-se, hoje, o Dia Mundial da Água e também hoje, neste Parlamento, foram recebidas pela

Comissão Parlamentar de Ambiente várias organizações ambientalistas para uma audição acerca do Tejo e da

sua proteção. Nessa audição, ficou registada uma alteração substancial na posição do PSD que não posso

deixar de assinalar como positiva. Pela voz do Sr. Deputado Manuel Frexes foi dada a conhecer a exigência,

pelo PSD, do encerramento da central nuclear de Almaraz.

Como bem assinalou na reunião desta manhã a Deputada Helena Roseta, com memória direta sobre o

tema, desde a abertura da central, nos anos 70 — que o PSD de então contestou —, a direita conformou-se

com a contínua presença desta ameaça junto à nossa fronteira. Nos últimos quatro anos, foi o silêncio total. O

Governo de Passos Coelho poderia ter dito uma palavra, ter feito um mínimo gesto que fosse junto do

Governo do Estado espanhol, dirigido, como se sabe, por aliados próximos e destacados membros da família

política do PSD. Preferiu esperar pelo regresso à oposição. Mais vale tarde, porque temos pressa, temos

muita pressa.

Há apenas dois meses, cinco inspetores do Conselho de Segurança Nuclear do Estado espanhol vieram a

público quebrar o silêncio sobre Almaraz. Depois da última vistoria à central nuclear, motivada por repetidas

avarias nos motores das bombas de água, ficou claro que o sistema de refrigeração não dá garantias

suficientes e que, dizem os técnicos, coloca sério risco de segurança.

Almaraz tem os reatores nucleares mais envelhecidos do Estado espanhol. E cada má notícia antecede

outra como um mau presságio. Em maio de 2015, há cerca de um ano, era noticiado o desleixo na vigilância

contra incêndios na central; aliás, foi noticiada a falsificação das folhas de registo das rondas contra incêndios

na central. Pouco depois, no verão, a Greenpeace divulgava um estudo europeu sobre a aplicação dos

mínimos de segurança estabelecidos depois do acidente de Fukushima.

Almaraz é apresentada pela Greenpeace como um caso extremo. A central não cumpre pontos essenciais:

não tem válvulas de segurança e sistemas de ventilação filtrada para prevenir uma explosão de hidrogénio

como a que aconteceu em Fukushima; não tem dispositivo eficaz para a contenção da radioatividade em caso

de acidente grave; não tem avaliação de riscos naturais; não está sequer prevista a implantação de um escape

alternativo para calor.

Já antes do jornal El País divulgar o relatório dos cinco inspetores do Conselho de Segurança Nuclear, a

Greenpeace era taxativa: «Almaraz não é segura e não se deveria permitir a manutenção da sua atividade».

Depois do relato dos inspetores, já se registou, em fevereiro, nova avaria e um incêndio.

Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, diante dos riscos, assumir o alarme sobre Almaraz é uma obrigação.

Há anos que os governos de Madrid respondem com «garantias de segurança» às autoridades regionais

da Extremadura e ao Governo de Portugal. E assim foi de novo agora, como admitiu António Costa,

interpelado pelo Bloco de Esquerda aqui, no Parlamento. Mas a cada ano, a cada incidente, essas garantias

valem menos.

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Todos sabem que um acidente grave teria gravíssimas implicações na vida e na saúde de gerações, com

contaminação em larga escala pelo ar e pelo Tejo, podendo levar a um êxodo de populações. Uma catástrofe

que, não sendo inédita, deveria suscitar outra atenção pública, a começar pela atenção de quem defende o

recurso à energia nuclear sob a alegação da sua vantagem em termos de custos. Portugal não pode limitar-se

a esperar por melhores «garantias», dadas, talvez, de novo, por um Governo do PS espanhol.

Pelo contrário. Depois dos pedidos de esclarecimento realizados pelo Ministro do Ambiente, importa olhar

para as notícias dos últimos dias. Um conjunto de municípios alemães, luxemburgueses e holandeses — as

autarquias de Dusseldorf, Colónia, Maastricht e Cidade do Luxemburgo, entre outras — acabam de abrir um

processo no Tribunal Europeu de Justiça pelo encerramento de dois reatores nucleares com 40 anos, situados

precisamente na Bélgica.

Também por cá importa um novo esforço de pressão sobre as autoridades espanholas. Não só um

pronunciamento de todos os responsáveis políticos à altura dos seus cargos perante um risco como o que vem

de Almaraz, mas um envolvimento do poder local, a começar nas regiões mais próximas da Extremadura

espanhola e nos municípios banhados pelo Tejo.

A segurança das populações, fronteiriças e não só, vale mais do que os lucros da Endesa, da Iberdrola e

da União Fenosa, os acionistas de Almaraz.

Aplausos do BE.

Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Presidente, o encerramento de Almaraz não é só uma exigência das populações

ameaçadas. O encerramento da central nuclear de Almaraz é o único objetivo responsável para um governo

português.

Aplausos do BE e do PAN.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos ao Sr. Deputado

Carlos Matias, quatro Srs. Deputados.

Pergunto ao Sr. Deputado Carlos Matias como pretende responder.

O Sr. Carlos Matias (BE): — Sr. Presidente, responderei em conjunto.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Tem, então, a palavra, para pedir esclarecimentos, o Sr.

Deputado Bruno Coimbra.

O Sr. Bruno Coimbra (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, a central de Almaraz e as

temáticas relativas às problemáticas do rio Tejo têm sido alvo de toda a atenção por parte do PSD.

Relembro que no passado recente, na anterior Legislatura, foi precisamente o Grupo Parlamentar do PSD

que aprovou um projeto de resolução que colocou na agenda a questão dos caudais ecológicos, da

navegabilidade e da poluição no rio Tejo.

No Governo da anterior Legislatura, reforçámos não só a cooperação com Espanha como a Convenção de

Albufeira, em especial para os períodos de seca.

Srs. Deputados, este é, de facto, um tema importante, uma temática séria demais para que seja usada

como arma de arremesso político. Exige-se um debate sereno e sério e o PSD está à vontade porque, já no

final da década de 70, votou contra a construção…

Exige-se um debate sereno e um debate sério. E o PSD está à vontade nessa matéria, porque, já no final

da década de 70, votou contra a construção da central nuclear de Almaraz e contra a construção de outras

centrais nucleares, desta feita no nosso território.

Já nesta Legislatura — e já que estamos a fazer aqui uma retrospetiva —, quando vieram a público as

notícias mencionadas pelo Sr. Deputado sobre falhas em Almaraz, foi o PSD que questionou o Governo

português e que suscitou as questões que o Governo português depois colocou ao Governo espanhol.

Foi o PSD que propôs, e aprovou, a criação de uma comissão interparlamentar luso-espanhola que aborda

todas estas temáticas.

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O PSD é claro no que defende. Defende que esta matéria deve ser resolvida no quadro das relações

bilaterais Portugal/Espanha; defende que deve ser reforçada a política de acesso à informação, como, aliás,

tem vindo a ser reforçada nos últimos anos; e defende que Bruxelas deve também reforçar a fiscalização das

centrais nucleares europeias, cujo período de vida útil expirou e onde se inclui a central nuclear de Almaraz.

Defendemos que se cumpram rigorosamente os requisitos de segurança, porque, nestes casos, o que

deveria acontecer, como no caso de Almaraz, seria, idealmente, o encerramento ou a reconversão destas

centrais.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada

Heloísa Apolónia.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Carlos Matias, quero saudá-lo pelo

tema da declaração política que aqui nos trouxe e lembrar-lhe, Sr. Deputado, que, quando se deu o acidente

em Fukushima, ouvimos uma série de vozes de responsáveis políticos nesta Europa — na Alemanha, em

França, em Espanha e por aí fora — dizer que era tempo de terminar com a energia nuclear, de encontrar

outras alternativas e de criar planos que progressivamente fossem terminando com a opção do nuclear.

O certo é, Sr. Deputado, que o tempo apaga para muitas pessoas muitas responsabilidades e hoje já não

se ouve falar, como se ouviu na altura de Fukushima, da necessidade do encerramento célere de muitas

centrais nucleares nesta Europa.

E Almaraz, Sr. Deputado, diz-nos profundamente respeito. Se a questão do nuclear nos diz naturalmente

respeito, Almaraz ainda nos diz mais pela proximidade que tem relativamente à fronteira portuguesa e pelo

impacto que qualquer incidente ou acidente pode ter no rio Tejo, criando uma calamidade que chega

facilmente a Portugal.

Portanto, nós devemos ter uma palavra a dizer sobre isso, não há qualquer dúvida. E o certo é que

estamos a falar de uma central nuclear que ultrapassou, expirou, há muito, o seu tempo útil de vida.

Portanto, estamos a falar de uma bomba que pode explodir a qualquer momento. E é isso mesmo que nos

diz o Conselho de Segurança Nuclear quando nos garante que não estão reunidas as condições de segurança

no funcionamento desta central nuclear.

Agora, ir dizendo «Ah, mas parece que está tudo bem! Parece que as bombas do sistema de refrigeração,

afinal, não estão tão mal!», isto não pode gerar segurança, Sr. Deputado. Portanto, nós temos de criar alarme

relativamente a esta matéria.

O Sr. Jorge Duarte Costa (BE): — Exatamente!

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Agora, o Sr. Deputado falou dos esclarecimentos pedidos pelo Sr.

Ministro do Ambiente, seguramente bem pedidos, mas descansarmos relativamente à resposta que nos veio

do Governo de Espanha não sei se será a melhor metodologia.

Agora, Sr. Deputado, o que é que eu acho? Acho que é preciso despertar a população. E se a população

portuguesa teve, em tempos, força bastante para travar Ferrel, estou em crer que a população terá força e

empenho bastantes para travar a continuação da laboração daquela central nuclear em Almaraz.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Peço-lhe que conclua, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Vou concluir, Sr. Presidente.

Portanto, despertar, juntar, abanar, fazer intervir e participar a população portuguesa, juntamente com a

população espanhola, é fundamental para pressionar os governos a ter responsabilidade na segurança de

todos nós.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado

Bruno Dias.

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O Sr. Bruno Dias (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Carlos Matias, da parte do Grupo Parlamentar do

PCP, gostaria de saudar e de valorizar a iniciativa de colocar na agenda do debate o problema central que

colocou na sua intervenção e, de uma forma abrangente, a defesa da água, a defesa da nossa rede

hidrográfica, a defesa da segurança e do ambiente. E quando falamos de matérias com a sensibilidade e o

grau de risco que esta situação concreta que mencionou vem suscitar, importa ter presente uma questão de

carácter crítico, verdadeiramente incontornável e que gostaríamos de trazer a esta discussão, que é a questão

da capacidade de resposta das entidades e das estruturas ao nível do Estado português, com a missão, a

incumbência do acompanhamento, do estudo, da investigação, da intervenção, e no terreno também,

relativamente ao evoluir destas situações e aos indicadores que podem transmitir ou não preocupações como

aquelas que referiu.

Isto é, até que ponto pode o nosso País dar-se ao luxo de, relativamente a matérias com esta sensibilidade

e este grau de risco, depender da capacidade técnica e científica de outros países? Isto, quando verificamos

que, ao longo dos anos, assistimos a uma degradação contínua dos Laboratórios do Estado, das estruturas de

investigação e análise científica e tecnológica, degradação esta que tem vindo a afetar, de forma acentuada, a

capacidade de resposta no exercício e cumprimento das suas missões, entre as quais está, designadamente,

esta questão da segurança e da verificação dos parâmetros de segurança em matéria ambiental e,

designadamente, na questão do nuclear. Quando se verifica uma enorme carência de quadros, em particular

no plano dos técnicos destas instituições. Quando se verifica uma gravíssima falta de financiamento. Quando

continuamos a ter — e a ter cada vez mais — técnicos substituídos por bolseiros para missões e desempenho

de trabalho e intervenção regular e constante, que deveriam ser cometidos a essas instituições. Quando se

verifica que no próprio Instituto Tecnológico e Nuclear (ITN), que já não existe como tal, pois foi integrado no

Instituto Superior Técnico nas capacidades práticas, o problema continua a fazer-se sentir, com a agravante

da centralização e da burocratização maior do que era antes no seu funcionamento…

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Queira terminar, Sr. Deputado.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Termino já, Sr. Presidente.

Aliás, importa ter em conta, desde logo, os alertas que hoje conhecemos na Comissão de Ambiente, em

relação às condições de intervenção, de trabalho que os técnicos do ITN têm no terreno para responder à sua

missão, com todas as dificuldades que são conhecidas. Tem de haver uma definição clara das missões a

atribuir aos Laboratórios do Estado e, depois, tem de haver meios para o efetivo desempenho dessas missões.

Aplausos do PCP, do BE e de Os Verdes.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada

Maria da Luz Rosinha.

A Sr.ª Maria da Luz Rosinha (PS): — Sr. Presidente, comemora-se hoje o Dia Mundial da Água. E as

questões da poluição do rio Tejo que, desde logo, marcam a agenda não só dos municípios mas também da

Comissão do Ambiente, e que devem marcar a agenda deste Governo, estiveram também em discussão na

audição promovida pela 11.ª Comissão.

O Governo do Partido Socialista já deu, aliás, sinais claros da sua abertura e da sua preocupação em

relação a esta matéria ao criar uma comissão de acompanhamento sobre a poluição no rio Tejo, cuja proposta

de trabalho em breve será conhecida, e que tem como objetivo principal avaliar e diagnosticar as situações

que concorrem para a diminuição da qualidade da água do rio.

Entre as diversas origens do problema da poluição do rio Tejo tem sido apontada a Central Nuclear de

Almaraz, que, segundo notícias vindas recentemente a público e acabadas ainda agora de referir, não reúne

as condições para continuar a funcionar, desde logo, por se verificarem frequentes falhas no sistema de

refrigeração.

A Central Nuclear de Almaraz deveria ter sido encerrada em 2010, mas acontece que, mais de 25 anos

depois do seu início, continua ainda a laborar com problemas sucessivos.

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Os perigos daí provenientes estão nas preocupações do Governo do Partido Socialista, como, aliás, foi

esclarecido aquando da vinda do Sr. Primeiro-Ministro e da resposta dada à questão colocada pelo Sr.

Deputado do Bloco de Esquerda. Aliás, é uma questão que está a ser tratada entre os dois governos.

Quero ainda dar conta de que as preocupações relacionadas com o rio Tejo, com os problemas graves que

se sentem no rio Tejo, mobilizam os municípios, as comunidades intermunicipais, as associações

ambientalistas, o Parlamento e também o Governo e todas as populações ribeirinhas.

Por isso, é necessário avançar com algumas medidas, o que merece um acordo geral. Desde logo, a

revisão da Convenção de Albufeira, Convenção essa que, assinada em 1998, contém um conjunto de

compromissos que devem ser revistos, com vista a encontrarmos uma solução para os problemas do rio Tejo

e acessórios.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Matias.

O Sr. Carlos Matias (BE): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, agradeço as perguntas que me foram

dirigidas.

Queria reafirmar, com a máxima serenidade, ao Sr. Deputado do PSD que o único objetivo responsável

para o Governo português é apelar ao encerramento de Almaraz. É que nós, Sr. Deputado, não confundimos

serenidade com alheamento irresponsável,…

Vozes do PSD: — O PSD não se alheou em nada!

O Sr. Carlos Matias (BE): — … nem confundimos serenidade com silêncio e posições dúbias.

Vozes do BE: — Muito bem!

O Sr. Carlos Matias (BE): — Por isso, saudamos a posição do PSD, que, a partir de hoje, afirmou,

claramente e sem qualquer dúvida, que defende o encerramento da Central Nuclear de Almaraz. Aliás, deixe-

me dizer que apreciaria e ouviria com muito agrado uma posição idêntica se ela porventura viesse da bancada

do seu anterior parceiro de coligação, o CDS, que, nesta matéria, se remete a um silêncio que nos deixa a

maior preocupação. Já agora, convidamos o CDS-PP a juntar-se ao consenso alargadíssimo que existe nesta

Assembleia entre as bancadas da esquerda e, agora, também a do PSD, assim como o Governo, na defesa

do encerramento da Central Nuclear de Almaraz. Serão muito bem-vindos e o vosso silêncio é que está a

mais.

Aplausos do BE e de Deputados do PS.

Sr.as e Srs. Deputados, permitam-me uma citação muito breve. Diz um antigo responsável: «Agora penso

que todas as centrais nucleares deveriam fechar e farei tudo o que for preciso para que isso aconteça». Quem

disse isto não foi nenhum radical de esquerda, nem foi a extrema-esquerda, quem disse isto foi um antigo

Primeiro-Ministro japonês, Naoto Kan, que era Primeiro-Ministro do Japão, aquando do desastre de

Fukushima. O antigo Primeiro-Ministro do Japão aprendeu muito sobre o desastre que o seu país viveu. Era

bom que nós também tirássemos lições e não criássemos condições para que se repetisse um acidente desta

dimensão e com esta gravidade.

De facto, a luta pelo encerramento da Central Nuclear de Almaraz deve ser o mais alargada possível e

envolver o máximo de instâncias, a saber, os partidos, o Governo, as autarquias locais e as populações, que

têm um papel absolutamente decisivo nesta luta, nesta batalha que, com certeza, vai ser difícil porque vai

enfrentar interesses muito poderosos que estão a defender a prorrogação sucessiva do funcionamento de uma

central que, há muito, não reúne as condições mínimas de segurança, como, aliás, os técnicos do Conselho

de Segurança Nuclear de Espanha têm repetidamente afirmado.

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Finalmente, tem razão o Sr. Deputado do PCP, quando refere a falta de meios. Efetivamente, é preciso

duas coisas: em primeiro lugar, meios para executar a fiscalização dos casos de poluição, de radioatividade,

meios que permitam detetar e identificar situações de potencial gravidade para o nosso País; e, em segundo

lugar, vontade política, algo que é essencial. De facto, é preciso haver vontade política para resolver os

problemas. E o anterior Governo não teve vontade política para resolver os problemas da poluição do rio

Tejo,…

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Este agora vai ter!

O Sr. Carlos Matias (BE): — … porque houve inspeções que foram feitas e houve processos que foram

levantados, mas que acabaram mortos em cima da secretária do Ministro.

Protestos do PSD.

Vozes do PSD: — É falso!

O Sr. Carlos Matias (BE): — É verdade!

Portanto, haja meios e haja responsabilidade política.

Aplausos do BE.

Protestos do PSD.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Para uma declaração política, tem a palavra a Sr.ª Deputada

Ana Rita Bessa.

A Sr.ª Ana Rita Bessa (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O tema que me traz aqui hoje

é, como já sabem, o tema da avaliação.

Em 2006, a Ministra da Educação, Maria de Lurdes Rodrigues, anunciava a introdução de provas

nacionais. Dizia Maria de Lurdes Rodrigues que «(…) para prevenir o insucesso escolar no fim do básico, é

preciso haver instrumentos de aferição e controlo da qualidade das aprendizagens no final dos 1.º, 2.º e 3.º

ciclos. (…) Teremos provas nacionais de aferição universalizadas nos 1.º e 2.º ciclos, a Português e a

Matemática, já no próximo ano letivo».

Desde então, fez-se um caminho, longo, gradual e consistente, no sentido de um sistema — complementar

à sempre preponderante avaliação contínua, que nunca esteve em discussão — de avaliação externa, mais

exigente e com maior credibilidade, dentro e fora do País.

Em novembro de 2015, já perto do fim do 1.º período de aulas, foram abolidas, por via parlamentar, as

provas finais do 4.º ano e, em virtude do vazio assim criado, a nova equipa ministerial teve oportunidade de

fazer uma escolha sobre a atuação a seguir: pelo gradualismo ou pelo experimentalismo?

Nos primeiros dias de 2016, no início do 2.º período, o recém-chegado Ministro da Educação fez saber da

sua escolha: anunciou, para implementação imediata e na altura em produção legislativa, o ambicioso modelo

integrado de avaliação das aprendizagens no ensino básico, que acabava também com as provas finais do 6.º

ano, introduzia um sistema de provas de aferição em anos intermédios e mantinha apenas os exames de 9.º

ano.

Sem consultar ninguém sobre este modelo concreto — nem Conselho Nacional de Educação, nem

Conselho das Escolas, nem CONFAP (Confederação Nacional das Associações de Pais), nem os próprios

ministros do PS que o antecederam —, o Sr. Ministro da Educação implodiu o sistema de avaliação e decidiu

experimentar.

No CDS temos pena de termos tido razão. Relembro parte do que dissemos na altura, dando voz a muitos

pais e escolas: «Temos a convicção de que o Governo agiu mal no tempo, na solução e na explicação. No

tempo porque não se mudam provas nacionais a meio de um ano escolar — não é de esquerda, nem de

direita. É de bom senso e respeito pelas famílias».

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Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Ministro tranquilizou-nos, então, com um périplo nacional pelas escolas e disse-nos que tudo corria

bem. Disse que falou com 800 diretores — coisa hercúlea, se pensarmos que chegou à fala com quase todos

e cada um dos diretores deste País…! — e concluiu que a recetividade era total e era o CDS o profeta da

desgraça.

No CDS temos pena de ter tido razão. Porque chegamos ao final do segundo período, às portas do terceiro

e último do ano, e o que ficamos a saber? Que as provas no final deste ano letivo, de aplicação obrigatória e

universal, serão afinal facultativas e casuísticas, que o processo de aferição estabelecido para o meio do ciclo

a fim de garantir uma ação atempada poderá, afinal e sem problema, ser feito no final dos ciclos, no 4.º e 6.º

anos, como até aqui, que este ano cada escola fará o que puder, não haverá provas nacionais, não haverá

provas obrigatórias, não haverá dados, informação sistémica sobre a qual atuar e que, por isso, até o Sr.

Primeiro-Ministro ficou ultrapassado quando disse, por exemplo, que «(…) uma prova de aferição no segundo

ano é essencial para conhecer o trabalho que é necessário fazer com aquela criança para, eventualmente, a

poder recuperar nos terceiro e quarto anos (…). Não queremos deixar ninguém para trás».

É o Ministério da Educação que deixa as escolas para trás quando se demite da sua responsabilidade de

estabelecer um sistema de aferição nacional.

Então, sob uma pretensa capa de autonomia, passa às escolas o ónus e pede-lhes que façam aquilo que o

Sr. Ministro não conseguiu fazer, como se lhes dissesse: «Façam provas nos anos que entenderem, mas, se

não fizerem, é bom que se justifiquem, porque as provas são muito importantes», ainda que o Ministério não

as tenha conseguido pôr em prática.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Ministro da Educação poderia ter escolhido o gradualismo, que comporta a virtude de quem,

prudentemente, promove de forma sustentada a mudança em que acredita, mas preferiu o experimentalismo,

resultante de um certo voluntarismo impreparado, sem ouvir até quem seu amigo procurou ser. Com isso,

produziu um resultado nocivo, rompendo vários anos de avaliação externa sistémica, de resto consolidados

por um governo PS.

Este ano não haverá exames nacionais de 4.º ano, e isso é devido à iniciativa das esquerdas, mas também

não haverá provas de aferição nacionais, universais e obrigatórias, nem no 2.º, nem no 4.º, nem no 5.º, nem

no 6.º, nem no 8.º ano. E isto é falta de capacidade deste Governo.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

A Sr.ª Ana Rita Bessa (CDS-PP): — Este Ministro da Educação foi incoerente com o passado do Partido

Socialista: ignorou os educadores, que fingiu ouvir e com quem depois se desculpou; abandonou os alunos e

as famílias, a quem prometeu não deixar para trás; esqueceu a luta contra o insucesso escolar, que tinha na

aferição um instrumento, e até ultrapassou o Primeiro-Ministro, que tinha afirmado outro caminho. E tudo isto

não foi para chegar a lado algum, foi, simplesmente, porque não conseguiu fazer aquilo que em 8 de janeiro, já

a meio do ano letivo, se propôs.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada

Odete João.

A Sr.ª Odete João (PS): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Ana Rita Bessa, pelo que disse, parece que o

PSD e o CDS não estiveram no governo nos últimos quatro anos e que as opções políticas que tomaram

aprofundaram clivagens sociais no acesso à educação e à formação.

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Sr.ª Deputada, gostaria de não ter razão quando o Governo PSD/CDS deixou que 150 000 alunos

reprovassem todos os anos, quando duplicou o número de reprovações dos alunos no 2.º ciclo do ensino

secundário. Gostava de não ter razão, Sr.ª Deputada, quando o Governo PSD/CDS agravou a taxa de risco de

pobreza e exclusão social, quando atingiu mais de 30% das crianças em risco de pobreza e quando, num só

ano, 42% dos jovens deixaram de receber o rendimento social de inserção.

Este ciclo de empobrecimento teve consequências desastrosas para as famílias e foi socialmente injusto,

perpetuando ciclos de pobreza que não desejamos.

Sr.as e Srs. Deputados, a revisão da estrutura curricular implementada pelo vosso Governo PSD/CDS foi

objeto de críticas generalizadas: tornou incoerente a arquitetura do currículo, privilegiou disciplinas essenciais

como o Português e a Matemática, destruiu o programa de Matemática A, do secundário, menorizou outras

disciplinas, como as artes, as expressões e a educação para a cidadania, e com igual propósito transformou o

sistema educativo num mero exame nacional.

Educar, Sr.ª Deputada, é muito mais do que preparar alunos para exames. O Governo do PS, ao acabar

com o anterior modelo de avaliação, voltou a alinhar o sistema educativo com as melhores práticas

internacionais. O serem agora as escolas a tomarem a decisão de iniciar já este ano um novo modelo de

avaliação é uma prova de que o Governo ouve os diretores das escolas, partilha as decisões com aqueles que

estão mais próximos e que estão no terreno e quer todos assumam as suas responsabilidades no respeito

pela autonomia das escolas.

O CDS estranha esta partilha, pois convive mal com esta tomada de decisões.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada

Joana Mortágua.

A Sr.ª Joana Mortágua (BE): — Sr. Presidente Sr.ª Deputada Ana Rita Bessa, é legítimo defender exames,

o que é desonesto é dizer que a escola não pode ser exigente sem eles. É legítimo defender exames, o que é

totalizante é dizer que não há outra forma de avaliação para uma escola exigente.

É legítimo defender exames, só que é simplesmente errado. É errado defender exames!

Risos do Deputado do PSD Hugo Lopes Soares.

É errado defender exames de todos os pontos de vista.

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Claro! Se a Sr.ª Deputada o diz!

A Sr.ª Joana Mortágua (BE): — É errado porque seca o sistema e, em vez de pôr a avaliação a funcionar

para o sistema, põe o sistema a funcionar para a avaliação — é a velha história de, em vez de termos exames

para escolas, temos escolas para exames.

É errado porque ele cria o chamado «afunilamento curricular». Só as disciplinas que têm exames é que são

levadas a sério, as outras são relegadas para um estatuto secundário ou para o final dos exames das

disciplinas que são mais importantes.

É errado porque ele não melhorou o sucesso escolar e, prova disso, são os níveis de retenção que

subiram, desde a introdução dos exames, em todos os níveis de escolaridade, com exceção do 4.º ano, mas

com a pequena nuance de que aumentou a retenção no 3.º ano, o que veio confirmar a ideia de que os

meninos são retidos no 3.º ano para não chegarem ao exame do 4.º ano.

E é errado também porque se trata de forma de forma igual, da pior maneira, o que é diferente. E vamos à

velha história: se julgamos um peixe pela sua capacidade de subir a uma árvore,…

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Um peixe a subir uma árvore?!

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A Sr.ª Joana Mortágua (BE): — … ele vai sempre achar que é estúpido. É a velha história de não permitir

diferenciação pedagógica perante alunos que são diferentes.

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Peixe?!

A Sr.ª Joana Mortágua (BE): — Mas os exames são também errados por outra razão: porque eles são

perfeitamente inúteis numa escola do século XX, em que os alunos não percebem por que é que têm de

decorar informação que está na ponta dos dedos ou no ecrã de um telemóvel. Não é isso que temos de

ensinar aos nossos alunos. Estamos a usar um sistema de avaliação do século XIX e do princípio do século

XX para uma escola que se quer do século XXI, para alunos do século XXI.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Sr.ª Deputada, peço-lhe que tenha atenção ao tempo.

A Sr.ª Joana Mortágua (BE): — Num caminho isolado na Europa, só percebo esta insistência nos exames

como um exercício de conservadorismo, que não resistirá ao exercício do tempo, da realidade e do progresso.

Se o CDS — e o problema é este — se quer indignar com alguma coisa para marcar o seu estatuto de

oposição, então, vou dar-lhe algumas sugestões: indigne-se com as turmas sobrelotadas!

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Sr.ª Deputada, tem de terminar.

A Sr.ª Joana Mortágua (BE): — Indigne-se com o fim do subsídio da educação especial para tantas

famílias! Indigne-se com os alunos com necessidades educativas especiais que não têm apoio! Indigne-se

com a falta de professores! Indigne-se com a precariedade dos professores! Indigne-se com os alunos que

têm aulas em contentores ou em refeitórios!

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Sr.ª Deputada, tem mesmo de terminar.

A Sr.ª Joana Mortágua (BE): — Indigne-se com a violência no namoro e os níveis da violência no namoro

nas nossas escolas! Indigne-se com o abandono escolar! E se não se quer indignar com nada disto, então,

tenha alguma humildade e deixe trabalhar aqui quem se indigna com isso!

Aplausos do BE.

Protestos de Deputados do PSD.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Rita

Bessa.

A Sr.ª Ana Rita Bessa (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as Deputadas, a declaração política que fiz hoje foi

sobre uma medida tomada por este Governo, sobre um novo modelo integrado de avaliação. Não foi por

escolha minha que a primeira decisão política deste Governo e deste Ministro da Educação tivesse sido sobre

avaliação. Isso indica que, para este Governo, esta medida é muito importante e claramente define o que é ou

não um bom sistema de ensino. Se fosse outra, teriam começado por outro tipo de decisão.

Portanto, repito, não foi escolha minha.

Sobre isso, gostava também esclarecer que PSD e CDS não têm o poder de causar reprovação. No

exercício da autonomia das escolas, são elas que têm de fazer a avaliação dos alunos.

Relembro-lhe também que, no relatório do CNE (Conselho Nacional de Educação), que, seguramente, a

Sr.ª Deputada Odete João não terá tido ocasião de ler mas terá tido ocasião de ver a capa, diz-se que a

aplicação de uma ponderação de 30% às classificações nas provas de Português e de Matemática tem um

efeito residual na classificação dos alunos e que o contributo dos exames e provas finais do ensino básico

para a retenção escolar não é relevante. Isto não sou eu que o digo, é o CNE.

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Quanto a indignação, Sr.ª Deputada Joana Mortágua, eu também gostaria que a Sr.ª Deputada se

indignasse — mas este ano vão vai ser possível, porque não vai haver provas nacionais para «desocultar»

dados — comigo e com os restantes partidos desta Câmara por haver escolas em que, no 1.º Ciclo, ao fim de

quatro anos a aprender Português e Matemática, a média dos resultados, até aqui em exames, estava abaixo

de dois.

A Sr.ª Joana Mortágua (BE): — Mas o exame resolve isso?!

A Sr.ª Ana Rita Bessa (CDS-PP): — Parece-me que isto é caso de indignação, que é caso de escândalo e

de necessidade de atuação.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

A Sr.ª Ana Rita Bessa (CDS-PP): — Só que este ano, graças a este Governo, apoiado pelos senhores, e a

este Ministro de Educação, não vamos saber. Não vamos saber o que é que aconteceu em cada escola, e não

venha falar em avaliação contínua, porque essa existiu antes e continuará a existir,…

Vozes do CDS-PP: — Claro!

A Sr.ª Ana Rita Bessa (CDS-PP): — … mas, como sabe, depende de escola para escola, e o único

instrumento que nossa permitira comparar escolas e aferir como é que o sistema se comporta foi destruído por

este Governo.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada

Diana Ferreira.

A Sr.ª Diana Ferreira (PCP): — Sr. Presidente Sr.ª Deputada Ana Rita Bessa, primeiro, gostaria de registar

que a intervenção que fez refere-se a uma norma transitória e que vigora exclusivamente este ano.

Gostaria ainda de dizer que, ao contrário do que pretendem fazer crer com a vossa intervenção, o que criou

instabilidade não foi o fim dos exames nacionais do 4.º ano, o que criou instabilidade foi, sim, a criação dos

exames nacionais do 4.º ano, que trouxe consigo uma pressão inaceitável sobre as crianças e um ambiente de

descontentamento entre as famílias e os professores, que viram os seus filhos transformados em autênticos

«cavalos de corridas» e que viram as salas de aula transformadas em salas de treino, com o objetivo único de

preparação para o exame.

Nós sabemos, Srs. Deputados, que a avaliação contínua exige mais meios humanos, que se faça um

acompanhamento de proximidade ao aluno e que essa não é a vontade do CDS, que não foi a vontade do

Governo PSD/CDS, que quiserem, sim, destruir a escola pública, sendo que os exames nacionais do 4.º e do

6.º anos foram instrumentos utilizados para isso. São elementos de seletividade no nosso sistema educativo,

com a triagem social a ser feita logo no início, no 1.º ciclo do ensino básico. E, para o CDS, fica claro que os

exames nacionais são, sim, o alfa e o ómega da educação, numa obsessão e numa «examinite» aguda, que

está longe de resolver ou de contribuir para qualquer melhoria na escola pública, sendo, sim, um fator de

agravamento das desigualdades.

Já agora, Sr.ª Deputada, onde é que estava o CDS tão preocupado com a educação e com o ensino

quando o Governo que integrava despediu 25 000 professores contratados? Onde estava essa preocupação

quando o Governo que integrava deixou de pagar as visitas de estudo aos alunos do escalão A e do escalão

B? Onde é que estava essa preocupação com a qualidade de ensino quando o vosso Governo aumentou o

número de alunos por turma, encerou escolas, perpetuou a escassez de meios humanos, com a profunda falta

de funcionários e de psicólogos nas escolas públicas? Onde é que estava essa preocupação, Sr.ª Deputada?

Nós sabemos que o que o CDS queria era uma escola pública a duas velocidades, uma para aqueles que a

pudessem pagar e, uma outra, fragilizada, para as restantes crianças e jovens.

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Srs. Deputados, o fim dos exames nacionais do 4.º e do 6.º anos é algo que o PCP vem defendendo e as

medidas do Governo PS, nesta matéria, são medidas que acompanhamos e que, não indo tão longe como

defendemos, abrem perspetivas para uma evolução positiva.

O modelo de avaliação assente em provas finais é contrário…

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Tem de terminar, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Diana Ferreira (PCP): — Termino já, Sr. Presidente.

Como eu dizia, o modelo de avaliação assente em provas finais é contrário à lógica da escola pública

inclusiva, pois ignora as condições económicas, sociais e culturais dos estudantes e das suas famílias e não

assegura as condições pedagógicas correspondentes às exigências que coloca.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada

Germana Rocha.

A Sr.ª Maria Germana Rocha (PSD): — Sr. Presidente e Sr.as e Srs. Deputados, quero, em primeiro lugar,

saudar o CDS, na pessoa da Sr.ª Deputada Ana Rita Bessa, pela pertinência do tema que aqui trouxe,

pertinência essa que decorre do pântano em que se encontra atualmente o nosso sistema educativo.

Vozes do PSD: — Muito bem!

A Sr.ª Maria Germana Rocha (PSD): — De facto, o atual Ministro da Educação é o verdadeiro Ministro dos

ziguezagues, pois ora avança, ora recua, próprios de quem está completamente perdido e que vai ajustando a

sua agenda conforme se vai apercebendo da impossibilidade de execução do seu Programa.

Quando o Partido Socialista tem, de facto, necessidade de se socorrer da à pobreza infantil para justificar,

aqui, o modelo de avaliação está a assumir, desde logo, a fraqueza do modelo proposto.

Vozes do PSD: — Muito bem!

A Sr.ª Maria Germana Rocha (PSD): — Na semana passada, a meio do ano letivo, assistimos,

estupefactos ao anúncio, por parte do Sr. Ministro da Educação, da atribuição de carácter facultativo à

realização das provas de aferição, o que gera, mais uma vez, no seio da comunidade educativa uma enorme

incerteza e uma enorme instabilidade.

Pergunto: não será este modelo facultativo violador do princípio da equidade no que diz respeito à

avaliação dos alunos?

Por diversas vezes, o Sr. Ministro deu garantias a este Parlamento de que tudo estava preparado para

aplicação do novo modelo de avaliação, mas, afinal, verifica-se que este Ministro é muito rápido a anunciar e

incapaz a concretizar.

Vozes do PSD: — Muito bem!

Protestos de Deputados do PS.

A Sr.ª Maria Germana Rocha (PSD): — É muito rápido a desfazer, mas incompetente a construir, e isto,

sim, é um ataque feroz à escola pública: primeiro, destrói-se e, depois, logo se vê o que acontece.

Protestos do PCP.

É de referir, ainda, uma outra perplexidade, que se prende, como já foi aqui referido, com a abertura de um

concurso de docentes para o ano letivo 2016/2017 para apenas 100 novos lugares do quadro, número que é

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manifestamente inferior às 1000 vagas postas a concurso anualmente pelo anterior Governo, para vincular

docentes com contratos sucessivos ao longo dos anos. É assim que se combate a precariedade laboral?

Afinal, estamos perante mais um retrocesso por parte deste Governo, no que diz respeito à vinculação dos

professores, uma vez que o anterior Governo vinculou mais de 4000.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Tem de terminar, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Maria Germana Rocha (PSD): — Termino já, Sr. Presidente.

Este Ministro começou mal e vai de mal a pior com a execução de um programa que está ferido de morte à

nascença.

Como diz o povo, «O que nasce torto, tarde ou nunca se endireita!».

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Rita

Bessa.

A Sr.ª Ana Rita Bessa (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Diana Ferreira, hoje estamos, de facto,

a discutir uma norma transitória e isso, sim, é o problema, porque chegámos a esta situação pela incapacidade

de o Sr. Ministro levar a cabo aquilo que, em 8 de janeiro, prometeu às escolas como um dado adquirido.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

A Sr.ª Ana Rita Bessa (CDS-PP): — Seguramente não acompanho a sua analogia, de transformar os

alunos em cavalos de corrida, mas, infelizmente, vejo os alunos a serem transformados em cobaias do

experimentalismo…

O Sr. António Carlos Monteiro (CDS-PP): — Muito bem!

A Sr.ª Ana Rita Bessa (CDS-PP): — … de um Ministro impreparado e arrogante, cuja primeira medida no

início do ano civil foi transformar uma avaliação que existia de forma estável no sistema numa trapalhada, que

hoje em dia não é nada.

Fiz aqui, hoje, não necessariamente a defesa dos exames, embora saiba e conheça a posição do CDS

sobre isso, mas, sim, a defesa da estabilidade da escola pública, que me parece merecida, e continuo, como

disse ao Sr. Deputado Porfírio Silva, sem compreender por que é que, se todos os instrumentos existem e

podem ser postos no terreno, essa estabilidade não foi levada a cabo, subscreva eu ou não o modelo que foi

determinado por este Governo com o apoio dos partidos de esquerda.

Sr.ª Deputada, pergunto se, nesse espírito de discriminação que parece ou parecia existir na escola pública

com o sistema de exames, não a incomoda que, com este modelo transitório, haja alunos que beneficiarão de

uma ficha individual que lhes vai permitir uma recuperação escolar nos anos subsequentes e outros que, de

forma discriminatória, não terão acesso a essa ficha, porque cada escola poderá livremente escolher se quer

ou não realizar as provas.

Protestos da Deputada do PCP Rita Rato.

E daqui a muito pouco tempo estaremos a fazer as contas para saber quantas destas escolas vão cumprir

esta orientação ou quantas vão deixar os seus alunos sem provas este ano.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado

João Ramos.

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O Sr. João Ramos (PCP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Importantes sectores produtivos

nacionais correm hoje sério risco de desaparecer. Cada exploração que encerra é um contributo mais, para o

aumento do desemprego, para o aumento das importações e para redução da soberania nacional.

Dois importantes sectores com capacidade de abastecimento do País vivem dias de aflição e o seu

desaparecimento será uma perda irreparável. Falamos da produção leiteira, que, paralelamente, também

produz carne, e da suinicultura, mas a situação pode estender-se a outros sectores pecuários.

O processo de integração na União Europeia e a política agrícola comum fizeram encerrar mais de 60 000

explorações leiteiras, que não chegarão hoje às 6000, e fizeram reduzir o efetivo suíno em 25% nos últimos 25

anos, fazendo passar os níveis de autoabastecimento de carne suína de 90% para 60%.

Os produtores de leite gastam 35 cêntimos para produzir um quilo de leite, mas só recebem 22 cêntimos

quando o vendem.

Os produtores de carne suína gastam 1,5 € em média para produzir um quilograma de carne, que, depois,

é vendida a 1,10 € no máximo. E isto acontece porque entra em Portugal carne vinda de outros países e as

cadeias de grande distribuição multiplicam as promoções, utilizando a carne de porco para atrair clientes para

outros produtos.

É importante referir que isto acontece em dois dos sectores mais modernos e organizados da Europa,

sectores bastante competitivos, na linguagem neoliberal. Esta modernização e esta organização

corresponderam a um apelo dos responsáveis governativos, dando garantias de sucesso se tal acontecesse.

Acreditando nesse discurso, muitos produtores endividaram-se para modernizar as explorações e dar resposta

a exigências crescentes em matéria de bem-estar animal e de qualidade alimentar.

No caso do leite muitos produtores endividaram-se para, inclusivamente, comprar quotas que, agora, de

nada valem.

A União Europeia, que, através dos seus mecanismos de integração, criou o problema, remete agora a

solução, ou pelo menos a panaceia, para a responsabilidade dos Estados-membros, os quais não contam com

mais nada.

É confrangedor que o Conselho de Ministros da Agricultura não tome decisões, que tenha usado o dinheiro

destinado a intervir em situações de emergência para pagar as implicações das decisões políticas no embargo

à Rússia e que, agora, perante a verdadeira emergência, diga que não há dinheiro disponível.

Como terá futuro uma Europa que arranja milhões quando os especuladores estão aflitos e não consegue

arranjar tostões se essa aflição estiver do lado dos produtores?

Importa lembrar que o fim do regime de quotas foi sendo decidido, e confirmado, desde 1999 e em

consulado de diferentes governos e de diferentes geometrias partidárias, sem que nunca a defesa do direito a

produzir tenha sido suficientemente importante para levar um ministro a opor-se na votação dos instrumentos

que eliminavam as quotas leiteiras.

O PCP entregará esta semana um projeto de resolução que vai ao encontro das preocupações dos

suinicultores. Também realizou ontem uma audição pública sobre o sector do leite com o objetivo de auscultar

sobre as medidas que será necessário tomar, medidas essas que são de diversa ordem.

É fundamental, no plano imediato, exigir a Bruxelas apoios para que a produção nacional de leite e carne

suína não desapareçam. O País tem direito a produzir, é inaceitável que seja sequer admitida como solução a

redução voluntária da capacidade produtiva. Esse é o tipo de proposta que interessa aos países, grandes

produtores, do centro e norte da Europa. Cada litro de leite que Portugal não produzir será produzido na

Irlanda ou na Holanda.

É necessário a reposição de um sistema de regulação da produção, chame-se quotas ou qualquer outra

coisa. Não é admissível que se diga que as regras europeias e o mercado único não nos permitem atuar,

quando, depois, vemos que Espanha toma um conjunto de medidas que impede a entrada, por exemplo, na

Galiza, do leite português.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Bem lembrado!

O Sr. João Ramos (PCP): — Em 2015, segundo o sector, deixaram de entrar em Espanha 100 milhões de

quilos de leite nacional por interferência dos governos de Espanha e da Galiza. Como afirmou um dirigente da

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CNA, na manifestação da semana passada, enquanto as autoridades espanholas fiscalizavam os autotanques

com leite português, as autoridades portugueses fiscalizavam os tratores que se manifestavam em defesa da

produção nacional.

Tem de haver coragem para enfrentar a grande distribuição, que continua a acumular lucros, mesmo

quando aqueles que produzem para ela só acumulem prejuízos. Tem de haver exigência na rotulagem da

produção nacional e a grande distribuição tem resistido. Tem de se verificar se não há dumping na importação

de carne e leite que fazem baixar os preços pagos em Portugal. Exige-se também por parte da ASAE uma

maior atenção através de uma ação forte, visível e dissuasora.

É também necessário intervir nos prazos de pagamento. Os produtores, para além de receberem pouco,

ainda recebem, muitas vezes, tarde.

É necessário que se revejam e refaçam os estudos sobre a distribuição de valor ao longo da cadeia do

agroalimentar, para, em seguida, intervir politicamente para que essa distribuição seja justa.

Estes problemas não são, infelizmente, de agora, nem na suinicultura, nem no leite, que há seis anos é

pago abaixo da média europeia, embora alguns, como os partidos que apoiavam o anterior Governo, queiram

fazer crer que o problema só começou agora. Veja-se, por exemplo, no caso da suinicultura, em que PSD e

CDS se desdobram, agora, em recomendações ao Governo, mas no Conselho de Ministros da Agricultura de

setembro, em que a Ministra Assunção Cristas participou, não houve uma palavra para colocar os problemas

dos suinicultores.

A intervenção institucional do PCP em defesa da produção nacional vem de longe. Hoje, mais do que

nunca, é preciso salvaguardar os sectores produtivos. Daqui saudamos os que lutam em defesa das suas

explorações e do direito a produzir. Daqui exortamos o Governo a que não poupe nos esforços para defender

a produção nacional e a soberania alimentar do País.

Para isso não faltará o contributo do PCP.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Sr. Deputado, informo-o de que se inscreveram cinco Srs.

Deputados para pedir esclarecimentos.

Como é que pretende responder?

O Sr. João Ramos (PCP): — Um a um, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Muito bem.

Tem a palavra o Sr. Deputado Abel Baptista.

O Sr. Abel Baptista (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Deputado João Ramos, agradeço-lhe que tenha

trazido novamente a questão da agricultura e, mais em particular, a da produção leiteira em Portugal.

Sr. Deputado, o PCP ainda não percebeu que, neste momento, apoia um governo do Partido Socialista,

porque vem aqui fazer um conjunto de críticas à situação em particular dos produtores de leite, relativamente à

qual o Partido Socialista não está a fazer rigorosamente nada, o Governo e o Ministro do Partido Socialista

nada têm feito para resolver esta matéria.

Portugal, ao longo dos anos, fosse com governos do Partido Socialista ou com governos do PSD e do

CDS, em todas as circunstâncias, esteve sempre contra a alteração das quotas leiteiras, apesar de, no

momento em que o Partido Socialista esteve no Governo, ter acabado por assinar a extinção das quotas, em

2014.

Portanto, há aqui matéria sobre a qual o Partido Socialista tem de responder, e, por isso, a sua intervenção,

Sr. Deputado, é muito dirigida à bancada do Partido Socialista e ao Governo que o senhor está a apoiar.

Por exemplo, no âmbito do leite, no ano passado, através do Governo PSD/CDS, com a Ministra Assunção

Cristas, que o senhor teve oportunidade de citar ou de referir, deu um apoio de aproximadamente 4,5 milhões

de euros aos agricultores, com verbas nacionais e comunitárias, porque o sector estava em crise.

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A PARCA (Plataforma de Acompanhamento das Relações na Cadeia Agroalimentar) reuniu para conseguir

alterar a distribuição de valor no setor, entre a produção, a transformação e a comercialização. Isto foi feito e

foi estabelecido um entendimento nesta matéria.

Ora, rigorosamente nada foi feito nos últimos quatro meses em que o Partido Socialista é responsável pela

governação. O Ministro da Agricultura, sobre esta matéria, ainda não fez rigorosamente nada!

Portanto, a única coisa que o Sr. Deputado João Ramos se esqueceu de dizer foi que este Partido

Socialista e este Ministro da Agricultura conseguiram fazer uma coisa que, nos últimos quatro anos, nunca

tinha acontecido: pôr o setor leiteiro contra a atuação do Governo e contra o próprio Ministro da Agricultura,

por nada terem feito em relação a esta matéria.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Tem, agora, a palavra, para um segundo pedido de

esclarecimentos, o Sr. Deputado Pedro Soares.

O Sr. Pedro Soares (BE): — Sr. Presidente, Sr. Deputado João Ramos, queria saudá-lo por ter trazido

este debate à Assembleia da República. A situação que se vive tanto no setor do leite quanto da produção de

carne suína é dramática. Estamos perante um grave desequilíbrio no mercado do leite e da carne suína na

União Europeia e Portugal está a pagar esse desequilíbrio de forma absolutamente dramática, com graves

prejuízos para os produtores.

É preciso dizer que, na raiz desta questão, está, de facto, a desregulação do mercado. E está a

desregulação do mercado, desde logo, quando, em 31 de março do ano passado, a União Europeia decidiu

acabar com as quotas leiteiras. Foi precisamente a partir desse momento que a situação se agravou e que os

preços à produção baixaram. Em contrapartida, a produção de leite na Europa, e também em Portugal, como é

óbvio, cresceu. Portanto, este desequilíbrio precisa de ser enfrentado com medidas concretas a nível europeu.

Utilizar-se o argumento de que este é um problema relacionado com o embargo da Rússia ou com a

diminuição do consumo de leite na China, ou outra coisa qualquer do género, tem sempre um bocadinho de

verdade, mas procura ocultar o problema real, fundamental, que é a desregulação do mercado e o fim das

quotas leiteiras. E esta questão prende-se também com a situação que se vive ao nível da carne suína.

O que acontece é que há países como Portugal que não produzem mais do que 55% das suas

necessidades e há outros que ultrapassam os 160%. E o que é facto é que a grande distribuição aproveita

estes desequilíbrios para fazer dumping e para importar carne e leite, de modo a diminuir o preço à produção e

a esmagar os nossos produtores.

É preciso que se intervenha nesta matéria e é preciso defender, na União Europeia, a reposição das quotas

do leite. E era esta a questão que gostava de colocar ao Sr. Deputado João Ramos: o que considera

fundamental, no sentido de enfrentar este problema que vivemos? É continuar a querer regressar a uma

espécie de velha PAC (política agrícola comum), antes dos anos 80, quando o erário público pagava o

armazenamento de toneladas de produtos lácteos na Europa, ou resolver o problema do excesso de produção

e do desequilíbrio do mercado?

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Tem de terminar, Sr. Deputado.

O Sr. Pedro Soares (BE): — Onde é que está o verdadeiro âmago do problema? Não considera essencial

que, no nosso País, o nosso Governo tome medidas no sentido de que a volatilidade dos preços não seja

sempre suportada pela produção, como tem sido, mas, antes, distribuída pela produção, pela indústria e pela

grande distribuição, que é, precisamente, quem tem ganho com esta especulação?

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Para responder a estes dois pedidos de esclarecimento, tem a

palavra o Sr. Deputado João Ramos.

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O Sr. João Ramos (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados Abel Baptista e Pedro Soares, agradeço as

questões que colocaram e começo por responder às mais simples.

Relativamente ao que foi dito pelo Sr. Deputado Pedro Soares, as regras da PAC nunca foram a solução,

aliás, nestes dois problemas em concreto, foram as regras da PAC que nos encaminharam para esta situação.

Por isso, o PCP não tem dúvida de que é fundamental, para já, imediatamente, salvaguardar estes setores,

não permitir que desapareçam e, por outro lado, repor regimes de regularização quer da produção, quer do

comércio e intervir junto da grande distribuição, que tem uma importância fundamental.

Sr. Deputado Abel Baptista, o PCP sempre defendeu a produção nacional e continuará a defender a

produção nacional. E ouviu muito bem aquilo que eu disse, na tribuna, exigindo um conjunto de matérias e

alertando e exortando o Governo para essa intervenção. A isto chama-se coerência!

Sei que, se calhar, do lado do CDS, que ainda agora saiu do Governo e apresenta projetos de resolução «a

metro» para resolver os problemas da suinicultura, podem não perceber isso, mas o que é certo, disse-o na

tribuna e o Sr. Deputado não o contestou, é que, no Conselho de Ministros da Agricultura de setembro, que foi

aquele em que se decidiram os apoios para estes setores, onde a Sr.ª Ministra Assunção Cristas esteve

presente, não houve qualquer palavra para o setor da suinicultura, enquanto que os outros países colocaram

os seus problemas.

Quanto à questão do fim das quotas e sobre quem tem a responsabilidade, Sr. Deputado, a bem da

verdade, o processo começou em 1999, houve vários Ministros de vários Governos e nenhum Ministro

português votou contra estes instrumentos na União Europeia.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Foram quatro Governos!

O Sr. João Ramos (PCP): — A verdade é que, em 2008, quando estas matérias foram retomadas, países

como, por exemplo, a Alemanha e a Áustria votaram contra.

Vozes do CDS-PP: — Isso é com o PS!

O Sr. João Ramos (PCP): — Eu sei, mas, no Governo do PSD/CDS, com o Ministro Sevinate Pinto,

aconteceu a mesma coisa, só que, em vez de terminarem com as quotas em 2008, decidiram acabar com elas

em 2015, mas decidiram acabar com elas na mesma!

Houve países que, neste processo, votaram contra. A Alemanha e a Áustria votaram contra, a França, em

2008, absteve-se, mas Portugal votou sempre a favor destas matérias.

Por último, o Sr. Deputado Abel Baptista falou nas ajudas que foram definidas pelo anterior Governo,

falando até num número gordo, que enche os olhos, que foi o de 4,5 milhões de euros — e acho que até pode

ser um pouco acima, podem ser 4,8 milhões —, mas vamos ver os números ao contrário, porque, se virmos

isto por litro de leite, representa um quarto de cêntimo de apoio por litro de leite.

O Sr. Abel Baptista (CDS-PP): — Mas este ano é zero!

O Sr. João Ramos (PCP): — Ora, um produtor para receber 1 € tem de produzir 400 litros de leite. E mais:

na altura em que isto foi decidido, os preços pagos à produção reduziram 40 vezes mais do que aquele que foi

o apoio determinado. Mais ainda: não lhe aplicaram a modulação e, por isso, os grandes produtores

receberam muito e os pequenos produtores receberam muito pouco.

Aplausos do PCP, do BE e de Os Verdes.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado José

Luís Ferreira.

O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — Sr. Presidente, Sr. Deputado João Ramos, antes de mais, queria

saudá-lo pela oportunidade da matéria que trouxe para discussão, até porque coincide com os protestos dos

agricultores portugueses, que se têm vindo a manifestar contra a crise no setor leiteiro e no setor da carne de

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porco. Esta não é uma crise de hoje, não é uma crise nova, mas, hoje, de facto, atingiu todos os limites, e o

que é curioso é que a Comissão Europeia, em relação à crise do setor leiteiro, limita-se à redução temporária

da produção, através de acordos voluntários, ou seja, através de medidas nacionais.

Portanto, o que a Comissão Europeia faz é remeter para os Estados-membros a resolução de um problema

que a União Europeia criou e que a sua PAC, e quem a defendeu, ajudou a fomentar.

Houve consenso quanto ao pacote adicional para apoiar os agricultores, dentro das regras da PAC, mas a

decisão sobre a fonte de financiamento das ajudas ficou adiada, o que é absolutamente incompreensível e, a

todos os títulos, lamentável.

Sr. Deputado João Ramos, aquilo que nos parece é que os agricultores portugueses precisam, de facto, de

uma solução duradoura que responda, sobretudo, à questão dos preços do leite, porque, com o aumento da

oferta no mercado europeu, o setor assistiu a uma brutal descida dos preços à produção, numa altura em que

os agricultores estão a ser literalmente esmagados com o fim das quotas da União Europeia, onde, aliás, o

Governo anterior, como se sabe, tem muitas responsabilidades.

Mas o que se está a passar com os agricultores portugueses acaba por ser também o resultado das

orientações da política agrícola comum, que destruíram todos os instrumentos públicos de regulação e

acabaram por impor uma reforma liberal onde os agricultores não são vistos nem achados porque o que

interessa é o mercado. Aquilo que consideramos fundamental é criar mecanismos que garantam o direito a

que cada país possa produzir, porque é preciso também garantir a nossa soberania alimentar.

Mas há outro elemento que importa trazer para a discussão. É que aquilo que se está a passar mostra-nos

que, de facto, a falência da própria PAC nunca foi tão visível como o é hoje. Sr. Deputado João Ramos, não

lhe parece que se impõe, de facto, uma viragem nas políticas da PAC que coloque os produtores e a

soberania alimentar de cada povo no centro das preocupações europeias, em vez de a Europa continuar a

estar exclusivamente preocupada com os mercados?! Parece-me que isso é que é fundamental.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Muito bem!

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Tem, agora, a palavra, também para pedir esclarecimentos, o

Sr. Deputado Nuno Serra.

O Sr. Nuno Serra (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Deputado João Ramos, quero começar por lhe agradecer o

tema que aqui trouxe hoje. Sabemos bem a importância destes dois setores no complexo agroalimentar

português e a crise pela qual estão a passar, e isto é da maior relevância nos dias de hoje.

Mas, Sr. Deputado João Ramos, também nunca o Partido Comunista Português esteve em tão boa posição

para tomar medidas concretas, para agir, em vez de protestar.

Vozes do PSD e do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. Nuno Serra (PSD): — Os senhores fazem parte integrante deste Governo,…

O Sr. António Carlos Monteiro (CDS-PP): — Exatamente!

O Sr. Nuno Serra (PSD): — … escolheram o Ministro da Agricultura atual, votaram favoravelmente e

aplaudiram de pé o Orçamento do Estado, aplaudiram e votaram favoravelmente o Programa do Governo e,

portanto, chegou a hora de assumirem essa responsabilidade.

Aplausos do PSD.

Chega de dizer mal do passado, os senhores têm de agir, tomar medidas e fazer com que elas aconteçam.

Percebo o vosso dilema, Sr. Deputado, e percebo também que os portugueses, hoje, estejam um bocado

baralhados relativamente àquilo que o PCP pensa,…

O Sr. Jorge Duarte Costa (BE): — Só o PSD é que está baralhado!

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O Sr. Nuno Serra (PSD): — … porque o PCP não pode vir apresentar no seu programa eleitoral medidas

que pretendem estabelecer um regime de preços máximos nos combustíveis e um reforço dos regimes de

energia bonificada para o setor agrícola, de modo a baixar os custos de contexto,…

O Sr. João Oliveira (PCP): — E batemo-nos por isso!

O Sr. Nuno Serra (PSD): — … e, depois, pela primeira vez, em 40 anos de história, aplaudir, de pé, um

Orçamento que aumenta brutalmente os custos de contexto e os custos de produção para os agricultores.

Aplausos do PSD.

Srs. Deputados do PCP, onde é que os senhores estão?! Querem estar do lado da produção, diminuindo

os custos de contexto, ou querem ser subservientes a um Governo que tudo tem feito para aumentar os custos

da agricultura?!

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Nuno Serra (PSD): — Srs. Deputados do PCP, durante anos e anos, ouvimos a vossa defesa

relativamente aos produtos nacionais, contra a importação de produtos concorrentes com os produtos

nacionais e, agora, os senhores aplaudem de pé um Orçamento que baixa o IVA nas bebidas de cereais, de

amêndoa e caju, praticamente todas importadas e que são concorrentes do leite?! Afinal, Srs. Deputados,

onde é que os senhores estão, qual é a vossa posição?!

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Sr. Deputado, tem de terminar.

O Sr. Nuno Serra (PSD): — Vou já terminar, Sr. Presidente.

Srs. Deputados, percebo a vossa aversão à PAC, mas percebo também o vosso pedido de quotas na PAC.

Os Srs. Deputados falam das vezes que os anteriores Ministros foram ao Conselho Europeu, mas o vosso

Ministro já foi três vezes a Bruxelas, nunca falou das quotas e não vos ouvi nenhuma reivindicação. De duas,

uma: ou o Ministro tem ouvidos moucos para os senhores ou são os senhores que não reivindicam deste

Governo aquilo que reivindicaram no passado.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado João Ramos.

O Sr. João Ramos (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados José Luís Ferreira e Nuno Serra, agradeço as

questões que colocaram e começo por responder ao Sr. Deputado Nuno Serra.

Sr. Deputado Nuno Serra, pode ficar descansado que aquilo que o PCP apresentou no seu programa

eleitoral já foi sendo, e será, apresentado em muitas propostas que temos trazido aqui, à Assembleia da

República.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — E o senhor vai debatê-las!

O Sr. João Ramos (PCP): — Não temos, obviamente, a garantia de que elas sejam aprovadas, mas o Sr.

Deputado e o seu grupo parlamentar podem dar um contributo importante para aprovar um conjunto de

propostas que o PCP possa aqui trazer.

Vozes do PCP: — Vai dar uma ajuda! Muito bem!

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O Sr. João Ramos (PCP): — Sr. Deputado, terei todo o prazer em enviar-lhe por mail a intervenção que foi

feita onde, claramente, colocámos aquelas que são as reivindicações do PCP para estes setores.

Percebi que o Sr. Deputado tem andado um bocadinho distraído, nomeadamente na discussão do

Orçamento do Estado, e não percebeu que o PCP não votou favoravelmente a questão que referiu quanto ao

IVA nas bebidas de cereais, tal como também não percebeu que os combustíveis não aumentaram com o

Orçamento do Estado mas com uma portaria anterior ao Orçamento do Estado,…

Protestos do PSD e do CDS-PP.

… matéria com a qual o PCP não concorda.

O Sr. Deputado não percebeu,…

O Sr. João Oliveira (PCP): — Não quer perceber!

O Sr. João Ramos (PCP): — … anda distraído, mas tenho todo o gosto em enviar-lhe um documento onde

consta, claramente, aquilo que o PCP defende.

Sr. Deputado José Luís Ferreira, o PCP avalia e entende que a União Europeia tem um conjunto de

mecanismos que limitam o desenvolvimento do nosso País. E também aqui, na área da agricultura e da

produção, estes mecanismos existem. Por isso, entendemos que não é aceitável, e nunca aceitaremos, por

exemplo, uma redução voluntária da produção, porque o espaço que Portugal não ocupar há de ser ocupado

por outros e isso não é admissível.

Mas sem dúvida que é necessário trabalharmos para que haja um aumento dos rendimentos da produção.

Por exemplo, no setor leiteiro os produtores estão a perder entre 5 a 10 cêntimos por cada quilo de leite. Ora,

como uma vaca produz 10 t/ano, isto pode significar uma perda das explorações de 500 a 1000 euros/ano.

Assim, é fundamental fazer alguma coisa sobre esta matéria. Ainda para mais porque o País importa cerca

de 100 milhões de litros de leite e 48 000 t de queijo, quando metade deste podia ser produzido em Portugal.

Para terminar, quanto à garantia de preços à produção, diria que é fundamental intervir na área da grande

distribuição. O anterior Governo do PSD e do CDS-PP criou uma coisa que é a PARCA (Plataforma de

Acompanhamento das Relações na Cadeia Agroalimentar) mas esta não conseguiu, ou não quis, mexer

nestas matérias e a distribuição continua a arrecadar uma parte importante daquele que é o esforço e o

trabalho da produção, o que não é admissível.

O País tem direito a produzir. Em vez de importarmos um conjunto de matérias, temos condições para as

produzir e é fundamental que isso se faça. Portanto, é preciso condicionar e pressionar a grande distribuição.

O anterior Governo não o fez e esperamos que o atual Governo o faça.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Para um pedido de esclarecimento, tem ainda a palavra o Sr.

Deputado António Borges, do PS.

O Sr. António Borges (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O Governo e todos nós

consideramos estes setores como prioritários e determinantes para o desenvolvimento económico e social do

País, bem como para a promoção da coesão social e territorial.

Como se sabe e aqui já foi dito, o embargo da venda de produtos à Rússia e a retração do consumo e das

importações pela China acarretam fortes impactos no setor da suinicultura e ao fim das quotas leiteiras

representa também fortes impactos no setor leiteiro de Portugal. Revela-se por isso determinante a

concentração de esforços no alívio da tesouraria das empresas e na salvaguarda do rendimento da

suinicultura e da produção de leite. É nisso que o Governo e o Ministério da Agricultura estão a trabalhar.

O Ministro da Agricultura já reuniu por diversas vezes com os setores desde que tomou posse,

provavelmente mais vezes nestes meses do que nos últimos anos, como comprova o recentemente criado

gabinete de crise, com resultados evidentes em novas encomendas à produção. Conseguiu igualmente junto

dos seus parceiros europeus que o problema e a crise dos setores da suinicultura e leiteiro fossem agendados

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para discussão na reunião do Conselho de Ministros da Agricultura, contra a vontade de alguns Ministros da

Agricultura europeus. Também se sabe que para a preparação deste Conselho de Ministros reuniu com os

dois setores e pediu contributos para a resolução desta grave crise.

O Ministro levou a Bruxelas, ao contrário do que qui já foi dito, o estabelecimento de um regime de quotas

de produção, que, no caso do setor leiteiro, permitiu, na últimas décadas, manter os preços equilibrados, e vai

continuar a defender apoios acrescidos à armazenagem, limiares de preços para produtos como o leite em pó

e amanteiga e outras medidas temporariamente limitadoras da produção, como a redução do número de

fêmeas reprodutoras no setor da carne de porco e apoios à produção por cabeça de gado.

Refiro ainda, para os mais distraídos, aspetos concretos de políticas para estes setores, como a medida

excecional da isenção parcial de contribuições para a segurança social, que merece a nossa concordância,

bem como uma proposta recente do Ministro para a criação de um programa subtemático para o leite, já

anunciado.

Queria deixar uma nota final ao Sr. Deputado João Ramos. Todos percebemos que as respostas a estes

problemas não são só de caráter nacional e necessitam de respostas conjuntas no espaço europeu. Pergunto:

deixou ou não o anterior Governo agravar e arrastar até ao limite, ou mesmo para além do limite, os

problemas? Sr. Deputado João Ramos, o Governo anterior fez tudo o que tinha de fazer ou não fez nada?

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Sr. Deputado António Borges, queira concluir.

O Sr. António Borges (PS): — Finalmente, pergunto se toda esta problemática necessita ou não de uma

resposta conjunta no espaço europeu.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado João Ramos.

O Sr. João Ramos (PCP): — Sr. Presidente, agradeço ao Sr. Deputado António Borges a questão que

colocou, mas acho que é do conhecimento de todos que os problemas não surgiram agora, de repente, e,

portanto, a sua pergunta sobre se o Governo anterior fez o que tinha de fazer é retórica.

Por exemplo, referi ali, na Tribuna, que há seis anos que o leite é pago abaixo da média europeia, portanto,

os problemas não surgiram agora, e o anterior Governo não fez o que podia ter feito para salvaguardar este

setor.

Sr. Deputado, conhecemos o posicionamento do Ministro da Agricultura, que parece que até já referiu a

posição de que será favorável à reposição do regime de quotas no caso do setor leiteiro, mas entendemos que

é preciso mais, é preciso que se tome um conjunto de decisões em Portugal. Por exemplo, em relação aos

apoios que existem, pode haver limitação do acesso dos produtores aos apoios que foram definidos, ou seja,

em relação à redução da TSU, pode haver alguns produtores que já tenham dívidas à segurança social ou ao

fisco e já estejam limitados nesses apoios, sendo por isso necessário tomar medidas para garantir estas

matérias.

Portanto, é preciso tomar decisões em Portugal mas também é preciso «bater o pé» em Bruxelas,

nomeadamente tendo iniciativas junto de governos de outros países que atravessem os mesmos problemas

que Portugal, para tentar ter uma ação conjunta com esses países no sentido de salvaguardar interesses

comuns.

Depois, é também preciso colocar limitações à atividade e à atuação da grande distribuição, e pensamos

que está ao alcance do Governo tomar opções desta natureza.

Inicialmente, referi que é preciso um conjunto de ajudas financiadas por Bruxelas e não suportadas pelo

Orçamento português para garantir que os setores não desaparecem, é preciso a reintrodução de um sistema

de regulação da produção e da comercialização…

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Tem de terminar, Sr. Deputado.

O Sr. João Ramos (PCP): — Termino, Sr. Presidente, dizendo que os Deputados do PCP estão

disponíveis para suscitar estas matérias no Parlamento Europeu, conforme já têm suscitado, e vamos lá a ver

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a preocupação dos Deputados do PSD e do CDS-PP no Parlamento Europeu e aquilo que estão disponíveis

para fazer, que iniciativas estão disponíveis para tomar relativamente a estas matérias.

Por último, é preciso mexer na cadeia de distribuição de valor e essa também é uma matéria em que o

Governo poderá fazer algo, está ao seu alcance. Tendo em conta que temos aqui dois setores em que o País

tem capacidade de produzir aquilo que são as suas necessidades, não podemos ficar totalmente dependentes,

por uma questão de soberania alimentar e de soberania nacional.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Para a última declaração política, tem a palavra a Sr.ª

Deputada Heloísa Apolónia, de Os Verdes.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Assinala-se hoje o Dia

Mundial da Água e Os Verdes gostariam de trazer à discussão neste Plenário a matéria da poluição dos

recursos hídricos.

Talvez fosse importante relembrar às Sr.as e Srs. Deputados que, na posição conjunta que Os Verdes

assinaram com o PS, esta questão da poluição dos recursos hídricos foi matéria de destaque nos nossos

acordos e das nossas negociações. Melhorar os nossos recursos hídricos foi uma matéria que Os Verdes

fizeram questão de salientar nessa posição conjunta.

Os Verdes assinalaram este Dia Mundial da Água com uma marcha pelo Alviela. Porquê? Porque o Alviela

é um símbolo de uma longa luta contra a poluição dos recursos hídricos, com muitas e muitas promessas,

muitas das quais não cumpridas e, portanto, com muitos problemas ainda não resolvidos definitivamente.

Mas, Sr.as e Srs. Deputados, nesta declaração política, Os Verdes gostariam de fazer uma abordagem

sobre o rio Tejo, em particular. Não sei se as Sr.as e Srs. Deputados sabem mas a primeira petição ambiental

que deu entrada na Assembleia da República, há mais de 30 anos, foi justamente sobre a poluição do Tejo.

Ora, passadas estas décadas — já se pode dizer assim —, o Tejo continua a ser uma prioridade ambiental no

País pelos inúmeros problemas que ainda enfrenta.

Os problemas estão identificados. Desde logo, trata-se de um rio internacional que transporta poluição de

Espanha e com escassez de caudal, e sabemos que a Convenção de Albufeira não está a garantir os caudais

ecológicos. Portanto, o reforço da relação com Espanha na preservação do Tejo é um imperativo e impõe-se,

como tantas vezes Os Verdes têm dito, mesmo já no decurso desta legislatura, que a revisão da Convenção

de Albufeira seja também ela um imperativo, garantindo métricas de caudais médios em períodos mais curtos

para aproximar as médias aos caudais efetivamente existentes no Tejo e para garantir caudais mínimos que

sejam adequados à preservação dos ecossistemas.

Em território nacional, os focos de poluição e de descargas, portanto, de problemas, também são sérios e

estão identificados, nomeadamente em empresas como a Centroliva, a Celtejo, em Vila Velha de Ródão, ou

em ETAR (Estação de Tratamento de Águas Residuais) como a de Mação e Abrantes.

A questão é: por que razão continuam as fontes poluidoras identificadas a contribuir para a degradação do

rio Tejo? É que, na verdade, existem debilidades propícias à continuação destes crimes ambientais sobre o rio

Tejo. E as debilidades também estão encontradas.

Só para dar alguns exemplos, falemos de duas responsabilidades que se prendem com as empresas. O

autocontrolo das empresas é muito espaçado e deve ser mais regular. O controlo mensal não chega, havendo

alturas em que o controlo diário deve ser exigido. Por outro lado, os investimentos para garantia de melhores

padrões ambientais são claramente secundarizados pelas empresas e devem ser exigidos sob pena de, se

essas indústrias degradarem o património natural da forma como o fazem, não terem condições para

funcionar.

Só a título de exemplo, a Celtejo tem um plano de investimentos de ordem ambiental previsto para 2020. É

tarde! É tarde e deve ser antecipado.

Mas também há claramente responsabilidades por parte do Estado. A escassez de recursos humanos em

estruturas públicas como a Agência Portuguesa do Ambiente (APA) é uma evidência e as necessidades de

contratação são reconhecidas pela própria APA para melhorar a ação no tereno e poder desempenhar funções

de fiscalização com eficácia.

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Diz a APA que, no mínimo, seriam necessários mais 10 funcionários para agir no terreno; o Governo

comprometeu-se com a contratação de mais cinco funcionários em 2016, o que não é suficiente, mesmo com

a articulação entre a IGAMAOT (Inspeção-Geral da Agricultura, do Mar, do Ambiente e do Ordenamento do

Território), a CCDR (Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional) e o SEPNA (Serviço de

Proteção da Natureza e do Ambiente, da Guarda Nacional Republicana).

Outra responsabilidade do Estado é a impunidade dos poluidores. Durante um longo período de tempo, não

eram homologados relatórios de inspeção que permitissem a punição dos infratores. Portanto, a celeridade de

processos com princípio, meio e fim é determinante para conter a ação dos poluidores.

Resumindo, Sr.as e Srs. Deputados, são necessárias medidas em que nos devemos empenhar para salvar

o Tejo, de que são exemplo o controlo mais regular, a exigência de investimentos ambientais, mais recursos

humanos para fiscalização e não facilitar a impunidade dos poluidores.

Face às denúncias feitas por cidadãos e movimentos associativos, e também por nós, Partido Ecologista

«Os Verdes», face às evidências de agravamento da poluição no rio Tejo, designadamente desde o terceiro

trimestre de 2015, o Governo criou a comissão de acompanhamento sobre a poluição do rio Tejo em janeiro

de 2016, que produzirá conclusões até ao final de junho de 2016.

Vamos aguardar essas conclusões com séria responsabilidade e, para terminar, gostava de salientar uma

questão: a luta das populações é fundamental, com a sua denúncia, protesto e exigência para salvar o Tejo.

Todos pelo Tejo deve ser uma máxima que todos devemos adotar na presente Legislatura, para que daqui a

30 anos não andemos a falar do mesmo.

Aplausos do BE e do PCP.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Sr.ª Deputada, a Mesa regista cinco inscrições para pedidos de

esclarecimentos. Como pretende responder?

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Reponderei a todos no final, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada

Maria da Luz Rosinha.

A Sr.ª Maria da Luz Rosinha (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, começo por saudar, desde

logo, a intervenção da Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia e por lhe dizer que o Partido Socialista subscreve as

preocupações que aqui foram expressas.

Nesse sentido, com base na prática que temos tido quer no acompanhamento da discussão ao nível da

Comissão de Ambiente e deste Plenário, quer também por parte do Governo relativamente às medidas já

tomadas, entendemos que devemos, isso sim, tomar decisões que se tornem efetivas para resolver os

problemas existentes há muito mas que não tiveram nenhuma abordagem que conduzisse a soluções.

Houve abordagens meramente retóricas, principalmente quando os problemas se tornavam mais visíveis, e

todos os que acompanham a vida do rio desde Vila Velha de Ródão até Lisboa sabem bem o que é a poluição,

com os inerentes prejuízos, inclusivamente a matança de espécies.

A Sr.ª Deputada referiu a Convenção de Albufeira, também já referida em momento anterior. Na realidade,

essa Convenção, que teve o seu momento, precisa urgentemente de ser revista no que diz respeito à

qualidade e à quantidade dos caudais do rio, uma vez que já não é só um problema de quantidade do caudal

que vem de Espanha mas também da sua qualidade.

A Sr.ª Deputada referiu que muita massa de água é de má qualidade e isso é um problema sério para o

território português, inclusivamente para a capacidade de se tratarem os problemas do rio ao longo do troço

que corre em Portugal.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Queira terminar, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Maria da Luz Rosinha (PS): — Depois, no que diz respeito às fontes poluidoras, há muito mais

fontes poluidoras do que as que foram apontadas.

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As questões da agricultura e da suinicultura exigem um envolvimento e um compromisso que tem de

implicar muitas entidades, a começar nas autarquias locais, a quem devem ser dados mais poderes, e depois

na administração central que, efetivamente, deve ser dotada dos meios necessários para o efeito.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada

Patrícia Fonseca.

A Sr.ª Patrícia Fonseca (CDS-PP): — Sr. Presidente, o CDS-PP acompanha as preocupações sobre a

sustentabilidade do rio Tejo tanto no Plenário como na 11.ª Comissão.

Com efeito, os problemas de poluição no Tejo são uma constante de há muitos anos, mas têm tido um

agravamento substancial no último ano. Acreditamos que é possível conciliar as atividades económicas com a

sustentabilidade do Tejo. Tem sido muito apontada a poluição provocada pela agricultura e pela agroindústria,

mas não podemos esquecer que estas são atividades económicas fundamentais. Não podemos dizer que são

atividades que não queremos que existam, o que é preciso é internalizar os custos da poluição e as empresas

que são prevaricadoras não serem tomadas como a generalidade das empresas.

Nesse sentido, o CDS-PP apresentou um projeto de resolução, que já está agendado para Plenário, que

prevê uma articulação entre a APA e a GNR, ou seja, os elementos do SEPNA, com uma maior e melhor

fiscalização, porque acreditamos, de acordo com o que nos foi sendo transmitido ao longo do processo de

discussão desta matéria, que é uma das falhas apontadas ao sistema, porque, no fundo, a GNR não consegue

aplicar as coimas porque não tem meios para isso.

No que respeita à inspeção, pelas palavras do Sr. Ministro do Ambiente, já foram contratados 16 novos

inspetores e, portanto, acreditamos que essa situação possa estar ultrapassada, com a articulação que, em

sede de discussão do Orçamento do Estado, a Sr.ª Ministra da Administração Interna nos transmitiu, referindo

o bom acolhimento desta nossa medida que apresentámos no projeto de resolução.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Tem a palavra, para pedir esclarecimentos, o Sr. Deputado

Jorge Paulo Oliveira.

O Sr. Jorge Paulo Oliveira (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, a posição do Grupo

Parlamentar do PSD sobre a poluição do rio Tejo que ocorre em território nacional, mas também, como todos

sabemos, ocorre em território espanhol, demanda, do nosso ponto de vista, três coisas muito simples.

Por um lado, exige uma intensificação da fiscalização por parte das entidades portuguesas, no que diz

respeito ao território nacional. Demanda também um reforço da coordenação transfronteiriça e, por último,

uma sensibilização do país vizinho para a necessidade de um combate mais eficaz à poluição no rio Tejo no

lado espanhol.

Portanto, Sr.ª Deputada, a nossa posição sobre esta matéria é muito clara, e sempre fomos consentâneos

com esta posição, quer enquanto Deputados na Assembleia da República, quer no Governo.

Recordo a Câmara que o PSD, juntamente com o CDS-PP, apresentou o projeto de resolução n.º 1537/XII,

aprovado na anterior Legislatura, no qual, entre as muitas recomendações que formulava, pedia uma

investigação urgente às condições em que as empresas e outras entidades fazem descargas ou poluem o rio.

Recordo também, como já foi referido pelo meu colega Deputado Bruno Coimbra, que foi o anterior

Governo que, depois de várias reuniões com os responsáveis espanhóis, reforçou as regras da Convenção de

Albufeira no sentido de melhorar a coordenação e a monitorização dos rios em período de seca.

Finalmente, aproveito também para responder, com a autorização da Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia, ao

Sr. Deputado Carlos Matias: não foi o anterior Governo que deixou pendentes para homologação 120

processos de inspeção. Foi exatamente o contrário! Recordo que foi por força de uma megaoperação

desencadeada no mês de agosto do ano passado, por iniciativa do anterior Governo, que foram instaurados

120 processos de inspeção.

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O Sr. Carlos Matias (BE) — Os esclarecimentos vieram tarde!

O Sr. Jorge Paulo Oliveira (PSD): — Por isso, Sr. Presidente, Srs. Deputados, as perguntas que aqui

ficam são: ao fim de cinco meses, o Governo que o Partido Ecologista «Os Verdes» integra ou apoia, quantos

processos de inspeção levantou? Que diligências é que o Governo que o Partido Ecologista «Os Verdes»

apoia fez relativamente a esta matéria, ou seja, àqueles processos de inspeção que desencadeámos?

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Para um novo pedido de esclarecimentos, tem a palavra o Sr.

Deputado Carlos Matias.

O Sr. Carlos Matias (BE) — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, agradeço o esclarecimento que me foi

dado agora, mas, pelos vistos, veio tarde. Foi precisamente em fase de campanha pré-eleitoral que o PSD fez

um ajuntamento de Deputados do PSD e do CDS-PP dos distritos de Portalegre, Castelo-Branco e Santarém

para, nessa altura, virem dizer que estavam muito preocupados com o Tejo.

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Vamos ver o que é o seu Governo vai fazer!

O Sr. Carlos Matias (BE) — Chegaram tarde demais!

Cumprimento a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia por ter trazido aqui, mais uma vez, os problemas do Tejo

que estão identificados: o problema das águas vindas de Espanha, ou seja, o controlo das águas e da

radioatividade que, eventualmente, possam trazer; os problemas dos focos de poluição gravíssimos e os

obstáculos à migração das espécies piscícolas e à navegação de pequenas embarcações, fruto e resultado de

obstáculos artificiais colocados no Tejo, e, segundo se sabe, alguns até de modo irregular, como é o caso do

travessão da central do Pego, e a irregularidade dos caudais dependente de uma renegociação da Convenção

de Albufeira.

A minha pergunta prende-se diretamente com outro aspeto. Segundo a Diretiva-Quadro da Água, em

dezembro de 2015, todas as massas de água superficiais em Portugal deveriam ser consideradas boas, e esta

avaliação não é uma avaliação subjetiva, decorre e resulta de critérios técnicos precisos. Ora bem, a massa de

água da ribeira do Açafal é considerada medíocre e medíocre, enfim, a olho nu. Para alguém que tem senso

comum, aquilo é, de facto, muito mau, para não dizer péssimo, mas, enfim, admitamos que os critérios

técnicos a classificam como medíocre.

Pergunto, Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia, se é admissível prorrogar o prazo para o tratamento da ribeira

do Açafal até 2027. É admissível que aquela situação degradante se prolongue por mais 11 anos, continuando

a poluir o ambiente? Isto é admissível?

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Tem de terminar, Sr. Deputado.

O Sr. Carlos Matias (BE) — Vou terminar colocando uma segunda pergunta: é admissível que a situação

grave da albufeira do Fratel, cuja água é considerada meramente razoável — e esta é uma classificação

benevolente —, continue por mais cinco anos, consoante os planos que estão a ser elaborados, no estado em

que está neste momento?

Em síntese, é admissível tanta permissividade com quem polui?

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Para um último pedido de esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª

Deputada Ana Mesquita.

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A Sr.ª Ana Mesquita (PCP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, começo por saudar o Partido

Ecologista «Os Verdes» por ter trazido o tema da água, em particular, do rio Tejo, ao Plenário da Assembleia

da República.

Saúdo também os muitos ativistas e o movimento associativo ambiental neste que é o Dia Mundial da

Água.

A comemoração desta efeméride em 2016 tem um aspeto particular, que ressaltamos, que é focar-se nas

ligações entre a água e o trabalho. Na verdade, esta questão não é de somenos importância considerando o

papel que os trabalhadores, e, designadamente, os serviços públicos, têm para a proteção desse direito

humano fundamental para a vida no nosso planeta.

Durante o Governo PSD/CDS-PP ficou muito claro o ataque aos serviços públicos e aos seus

trabalhadores a pretexto de pretensas de reduções de gorduras do Estado e de outros argumentos que

geraram consequências nefastas que não podem ser agora escamoteadas.

Por isso, não podemos desligar a situação que temos tido a oportunidade de testemunhar, nomeadamente

no rio Tejo, dessa opção política.

Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia, a pergunta que lhe faço é: como pode ser feito um verdadeiro combate a

este flagelo ambiental sem a existência do correspondente reforço de meios materiais e humanos no sentido

de se reforçar a presença no terreno, a ação inspetiva, a ação fiscalizadora das entidades que intervêm nesta

área? Não será absolutamente necessário reverter o esvaziamento dos serviços e das estruturas públicas que

tutelam e têm responsabilidades na área do ambiente, esvaziamento esse que, incontornavelmente,

determinou o aumento das dificuldades de intervenção nesta área?

Pergunto também se considera suficiente a mera melhoria de articulação entre os serviços que existem

nesta área para dar resposta aos desafios que temos pela frente.

Já agora, deixo uma pequena observação, a talhe de foice. O Sr. Deputado Jorge Paulo Oliveira estava a

falar da abertura dos tais 120 processos, mas, na verdade, quais foram as consequências práticas desses

processos? Como é que eles se desenrolaram? Qual foi a sua conclusão?

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — O Governo é vosso, governem!

O Sr. João Oliveira (PCP): — Isso é resposta de preguiçoso!

A Sr.ª Ana Mesquita (PCP): — Aqui é que está o problema!

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa

Apolónia.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Queria agradecer a todos

os grupos parlamentares o facto de se terem pronunciado sobre esta questão, o que demonstra bem a

preocupação de todos relativamente à poluição do rio Tejo. Este já é um ponto de partida positivo para

podermos produzir trabalho em conjunto nesta Legislatura.

Se me permitem, vou começar por responder à questão colocada pela Sr.ª Deputada Ana Mesquita,

articulando-a com a da Sr.ª Deputada Patrícia Fonseca, que diz respeito aos recursos humanos, porque me

parece ser uma questão da maior importância.

Na passada Legislatura, dissemos tantas vezes que, quando estamos a despedir funcionários públicos ou a

congelar a sua admissão, é a degradação dos serviços públicos que estamos a promover, assim como a

incapacidade de o Estado dar resposta àquilo que é fundamental para os cidadãos e para a preservação do

nosso património, designadamente o património natural. Depois, dá nisto: não há recursos humanos para

fiscalizar e para dar a resposta necessária ao que é fundamental!

Portanto, esta é uma questão fulcral. Se queremos falar de fiscalização — e para falarmos do combate a

poluição do Tejo temos, necessariamente, de falar em fiscalização —, temos de colocar a necessidade de

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mais recursos humanos em cima da mesa e temos de assumir que essa é uma realidade que tem de ser

concretizada.

Os Verdes vão bater-se por isso. Já antes se bateram por isso, na posição conjunta que assinaram com o

Partido Socialista, e gostávamos de ver todos os grupos parlamentares empenhados nesta matéria porque ela

é fundamental.

A Sr.ª Deputada Patrícia Fonseca, do CDS, falou justamente da articulação da APA (Agência Portuguesa

do Ambiente) com a SEPNA (Serviço de Proteção da Natureza e do Ambiente), mas não sei que resultados

pode dar a articulação de entidades que já têm suficiência de recursos.

A articulação é uma questão fundamental, atenção, mas temos de olhar para a realidade tal como ela é.

Podemos articular tudo, mas com escassez de funcionários não vamos lá. Esta é uma questão que

gostávamos de sublinhar.

Sr.ª Deputada Maria da Luz Rosinha, do Partido Socialista, eu também gostava de referir que a revisão da

Convenção de Albufeira é uma prioridade. Caudais insuficientes com poluição regular resultam numa grande

calamidade a que o Rio Tejo tem assistido com profunda regularidade também. Relativamente às fontes

poluidoras, dei apenas alguns exemplos, mas evidentemente que muitas outras há a acrescentar.

Sr. Deputado Carlos Matias, do BE, estou inteiramente de acordo consigo quando refere que existem

muitas massas de água sem qualidade em Portugal, problema a que devemos estar atentos e não enfiar a

cabeça na areia.

Ao que o Sr. Deputado disse só gostava de acrescentar o seguinte: quando adiamos investimentos

tornamos as situações mais difíceis de serem resolvidas e, porventura, até mais caras. Portanto, quando

estamos a adiar investimentos que são um imperativo, estamos a prestar um mau serviço ao objetivo que

queremos prosseguir, neste caso o trabalho de despoluição de um rio que é fundamental em tantos setores e

em tantas regiões do nosso País.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Sr.ª Deputada, tem de terminar.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Termino já, Sr. Presidente, respondendo ao Sr. Deputado João

Paulo Oliveira aquilo que outros Deputados não resistiram a ter de lhe responder, mesmo na pergunta que me

estavam a fazer a mim.

É que, de facto, os senhores arrancaram em pré-campanha com muitos processos, mas não os acabaram,

e muitos foram enfiados na gaveta e não chegaram a ver a luz ao fundo do túnel. Portanto, a impunidade foi

uma das consequências que resultou dos processos que os senhores levantaram.

Para responder diretamente à pergunta que o Sr. Deputado levantou, faça o favor de ler a pergunta n.º

240/XIII (1.ª), que Os Verdes dirigiram ao Governo, e veja a resposta do Governo. Tem lá todas as respostas à

curiosidade que tem.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Srs. Deputados, terminadas as declarações políticas, vamos

iniciar o terceiro ponto da nossa ordem de trabalhos de hoje, que consiste na apreciação conjunta da petição

n.º 308/XII (3.ª) — Apresentada pela CGTP-IN — Confederação Geral dos Trabalhadores Portugueses —

Intersindical Nacional, manifestando-se contra o roubo nas pensões e o aumento da idade da reforma e do

projeto de lei n.º 140/XIII (1.ª) — Valoriza as longas carreiras contributivas, garantindo a antecipação da

pensão, sem penalizações, aos beneficiários que completem 40 anos de descontos (PCP).

Em primeiro lugar, para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Rita Rato, do PCP.

A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Saudamos, em primeiro lugar, a CGTP-IN/Inter-

reformados e os mais de 60 000 cidadãos que subscreveram e dinamizaram esta petição contra o roubo nas

pensões e o aumento da idade da reforma, pela valorização das longas carreiras contributivas e que

acompanham, aqui, nas galerias, esta discussão.

Aplausos do PCP e do BE.

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Sr. Presidente, Srs. Deputados: Esta petição que hoje discutimos data de 2013, momento em que o

anterior Governo PSD/CDS desencadeava um profundo ataque aos direitos e à dignidade de milhares de

reformados e pensionistas, propondo cortes definitivos nas pensões.

Sr. Presidente, Srs. Deputados: Uma das mais importantes conquistas da Revolução de Abril é,

seguramente, o direito à proteção social. No nosso País existem milhares de trabalhadores com longas

carreiras contributivas, iniciadas aos 14, 15 e 16 anos de idade, muitos em setores especialmente

desgastantes.

Se, hoje, estes trabalhadores com 40 anos de descontos decidirem reformar-se antes dos 65 anos de

idade, sofrem brutais reduções no valor das suas pensões. Tomemos como exemplo uma trabalhadora têxtil

que tenha começado a trabalhar e a contribuir para a segurança social aos 16 anos. Com 40 anos de

contribuições teria 56 anos de idade. Poderia aceder ao regime de flexibilização pois tem mais de 55 anos de

idade e 30 de contribuições. Contudo, a aplicação do fator de redução significaria um corte de 36% no valor da

sua pensão, construída já com base em descontos sobre um salário mínimo nacional muito baixo.

Por isso mesmo, Sr. Presidente e Srs. Deputados, o PCP traz hoje à discussão um projeto de lei que visa o

acesso à reforma sem penalizações ou reduções, independentemente da idade, aos trabalhadores que

tenham no mínimo 40 anos de carreira contributiva. É inaceitável a imposição do tempo em que as pessoas

eram obrigadas a trabalhar até ao limite das suas vidas e das suas forças.

É no respeito pelo contributo que milhares de trabalhadores já deram ao País, à produção de riqueza e ao

sistema público de segurança social que apresentamos esta proposta. Este projeto de lei é um contributo

fundamental para a valorização do trabalho e dos trabalhadores, na defesa da dignidade de todos aqueles que

têm uma vida inteira de trabalho e é uma medida de progresso e de justiça social.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Para uma intervenção, em nome do Grupo Parlamentar do

Bloco de Esquerda, tem, agora, a palavra o Sr. Deputado José Moura Soeiro.

O Sr. José Moura Soeiro (BE): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Queria saudar a CGTP-IN/Inter-

reformados e os representantes dos peticionários aqui presentes e, por via deles, queria saudar também as

mais de 60 000 pessoas que trouxeram a este Parlamento, já no final de 2013, a sua indignação contra o

roubo nas pensões e contra o aumento da idade de reforma que foram levados a cabo, nesse mesmo ano,

pelo Governo do PSD e do CDS.

É preciso lembrar que, com o anterior Governo, não foi só a idade da reforma que aumentou, foi o fator de

sustentabilidade que foi agravado,…

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Olhe que não!

O Sr. José Moura Soeiro (BE): — … impondo um corte nas pensões de mais de 13%; foi a esmagadora

maioria das pensões que foi congelada; foi a diminuição do seu valor real face ao aumento da inflação; foram

as políticas sociais, com os cortes na saúde, nos transportes de doentes, no complemento solidário para

idosos que significaram sempre o maior empobrecimento e a penalização dos pensionistas.

Ao contrário do que a direita gosta de insinuar, as ameaças à sustentabilidade da segurança social não

resultam do prolongamento da esperança média de vida nem resultam de nenhuma fatalidade demográfica. O

que ameaça a segurança social pública são, justamente, as tentativas de perverter a lógica de solidariedade

entre gerações que a sustenta, são os apetites de privatização de uma parte da segurança social para a

descapitalizar em benefício do negócio privado e são as políticas que promovem o desemprego, a

precariedade, a informalização do trabalho, os convites à emigração. Essas medidas e essas políticas, sim,

descapitalizam a segurança social e são ameaças.

Com o Orçamento que aprovámos na semana passada, o que começámos a fazer foi a reversão de

algumas destas medidas que penalizavam os pensionistas. Foi a anulação de algumas das maldades que

foram feitas aos pensionistas pelo PSD e pelo CDS…

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O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Que descaramento!

O Sr. José Moura Soeiro (BE): — … e foi a interrupção do ciclo de empobrecimento, que era a política do

anterior Governo para os pensionistas.

Começámos a fazer esse caminho com o descongelamento de pensões, com o reforço do CSI

(complemento solidário para idosos) e com as isenções das taxas moderadoras. Mas há ainda muitas outras

injustiças que precisam de ser corrigidas e o grupo de trabalho que agora iniciará funções, no qual o Bloco de

Esquerda participará também, com membros do Governo e do Partido Socialista, tem de ser uma ocasião para

se fazer esse debate.

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Ah, é?

O Sr. José Moura Soeiro (BE): — Uma das mais gritantes injustiças que é preciso corrigir é a que diz

respeito a quem trabalhou uma vida inteira e que, ao fim de 40 anos de descontos e de contribuições, se

quiser reformar-se, sofre uma penalização que pode ser superior a 1/3 da sua reforma.

Estamos a falar, Sr.as e Srs. Deputados, de pessoas que, em muitos casos, começaram a trabalhar antes

dos 16 anos, numa altura em que a idade mínima para trabalhar não estava regulada ou não era respeitada.

Estamos a falar de pessoas que, na maior parte dos casos, tinham salários muito baixos e, por isso, têm

pensões mais baixas e que passam a ter pensões totalmente miseráveis com a aplicação do corte resultante

do fator de redução.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Tem de terminar, Sr. Deputado.

O Sr. José Moura Soeiro (BE): — Termino, Sr. Presidente.

Estamos a falar de pessoas a quem se diz, na prática, que, ao fim de 40 anos de descontos, têm de

trabalhar até ao limite das suas vidas.

Sr.as e Srs. Deputados, o direito à reforma por inteiro e sem penalizações, ao fim de 40 anos sem

descontos, é uma medida justa que o Bloco de Esquerda defende agora e no futuro. Por isso, acompanhamos

a petição da CGTP e as iniciativas para concretizar esta medida. E se nos dizem que não é possível

concretizá-la agora, então, Sr.as e Srs. Deputados, nós temos a obrigação de tornar possível o que é

necessário e o que é justo, que é a reforma ao fim de 40 anos de descontos.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Para intervir em nome do PSD, tem a palavra a Sr.ª Deputada

Susana Lamas.

A Sr.ª Susana Lamas (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Permitam-me que centralize esta

minha intervenção no que julgamos ser o tema essencial dos dois documentos que aqui hoje são

apresentados, seja a petição subscrita pela CGTP, seja o projeto de lei n.º 140/XIII (1.ª), do Grupo Parlamentar

do PCP, ou seja, as pensões.

De facto, o sistema de pensões é um tema que preocupa não só a geração dos atuais pensionistas, como

a geração dos atuais trabalhadores e futuros pensionistas. É uma matéria de enorme importância, que traz

associado o problema da sustentabilidade dos sistemas públicos de pensões.

E, Sr.as e Srs. Deputados, temos dois caminhos: ou centramos, uma vez mais, o nosso debate no passado

e então vamos lembrar novamente a austeridade que, em 2010 e em 2011, o Governo socialista trouxe com

os cortes de salários da função pública, o congelamento das pensões, e por aí fora, ou então centramos o

nosso debate no presente e no futuro. Nós preferimos este segundo caminho.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Pois claro!

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A Sr.ª Susana Lamas (PSD): — De facto, importa olhar em frente e procurar soluções para a vida de

milhões de portugueses.

Sr.as e Srs. Deputados, não podemos mais ignorar que o nosso País tem um problema real de

financiamento dos sistemas públicos de pensões, e este problema de financiamento exige um estudo sério,

um esforço de todos, para se encontrarem soluções.

O PSD está hoje, como sempre esteve, preocupado com os pensionistas, tanto os atuais como os futuros.

Vozes do PSD: — Muito bem!

Protestos do PCP e do BE.

A Sr.ª Susana Lamas (PSD): — E, contrariamente ao que tem sido por diversas vezes erradamente

afirmado, o PSD está disponível para discutir, para debater de forma séria, os problemas que afetam os

portugueses.

Será que o atual Governo está com a mesma vontade? Ou vai adiar novamente a solução deste problema?

De facto, parece que o Partido Socialista continua de orelhas moucas à proposta de reforma do sistema de

segurança social que o presidente do PSD tem apresentado.

O Sr. João Galamba (PS): — Qual é?

A Sr.ª Susana Lamas (PSD): — A não ser que o atual PS se sinta seduzido pelas propostas do seu

parceiro comunista, propostas do tipo daquelas que aqui nos traz hoje o PCP.

Sr.as e Srs. Deputados, é imperioso pensar a sustentabilidade do sistema público de pensões. É necessária

uma reforma da segurança social que traga sustentabilidade às pensões e que reduza o défice no sistema

previdencial.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Justiça para quem trabalha, zero!

A Sr.ª Susana Lamas (PSD): — Mas não nos podemos limitar às questões das receitas e das despesas.

Temos de ir mais além e procurar criar critérios justos de atribuição das pensões.

Queremos e devemos combater as injustiças e as iniquidades sociais que, às vezes, os sistemas de

pensões também geram.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Para uma intervenção, em nome do Grupo Parlamentar do

Partido Socialista, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Riso.

O Sr. Rui Riso (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Acho que devo dar as boas-vindas ao PSD

ao clube dos preocupados com este sistema de pensões.

O sistema português de pensões foi construído de uma forma que hoje se revela insuficiente para cumprir

tudo aquilo que prometeu aos pensionistas. Este tema nunca deveria sair da discussão, de uma forma

transparente, de uma forma clara. É um tema do passado, é um tema do presente e é um tema do futuro. Tem

de ser sempre tido em conta todo o passado que nos fez chegar até aqui, o conjunto de compromissos que

existem para com uma geração numa sociedade em envelhecimento muito rápido por desaparecimento da

geração de base, tem também de ser visto tendo em conta a diminuição do rendimento das pessoas que

trabalham e que, consequentemente, fornecerão menos recursos à segurança social para que cumpra os seus

desígnios.

Este tema tem de ser sempre partilhado por toda esta Câmara, independentemente de quem estiver no

Governo e na oposição.

O Sr. António Carlos Monteiro (CDS-PP): — Tem de falar para a esquerda!

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O Sr. Rui Riso (PS): — Falo para todos, porque todos têm sempre pedras para atirar a este tema, fugindo

às responsabilidades e muitas vezes aproveitando o sistema de pensões para, por vezes em manobras de

recurso, suportarem o Orçamento ou défices orçamentais, mexendo em coisas em que não se deve mexer.

E uma das coisas em que não se deve mexer é naquilo que não é nosso, é no dinheiro que é dos

pensionistas e que devia ter constituído reserva.

Aplausos do PS.

Obviamente que agora se vai fazer um concurso para ver quem mexeu primeiro no «meu queijo», mas vai-

se chegar à conclusão…

Protestos do PSD.

Não se enervem, não se enervem! Provavelmente, mexeram todos, ao longo de muitos anos, porque o

sistema não tem reservas. A verdade é que este sistema foi construído sem reservas, e o facto de as não ter

faz com que, de vez em quando, tenhamos estes amargos de boca.

O Sr. António Carlos Monteiro (CDS-PP): — Tem de falar para aquele lado da Sala!

O Sr. Rui Riso (PS): — Sr. Deputado, é para todos!

Tem a ver com a forma como o modelo foi construído, muito antes, sequer, de haver crises económicas

com esta profundidade, muito antes de haver um efeito demográfico super negativo relativamente ao futuro do

sistema de pensões, porque isso também conta.

E ainda mais: os sistemas sociais são construídos de uma forma ascendente e quando existem disrupções

como aquela que existiu e quando há retrocessos, nomeadamente nos vencimentos médios e nos descontos

para a segurança social, estes problemas serão sempre agravados e aquilo que verificámos nos últimos anos

foi uma diminuição do rendimento dos portugueses e uma consequente diminuição das receitas para a

segurança social, com efeitos a prazo que serão muito mais devastadores do que aqueles que hoje podemos

encarar.

As variáveis previsíveis e as variáveis imprevisíveis que impendem sobre a segurança social devem manter

esta preocupação sempre em cima da mesa e nunca virar as costas ao problema, encarando-o e procurando

soluções duradouras e sobretudo transparentes, porque é isso que deve fazer-se.

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Como é que vão votar a proposta do PCP?

O Sr. Rui Riso (PS): — Sr. Presidente, termino, dizendo que existe um Orçamento do Estado aprovado

mas, sobretudo, existem as Grandes Opções do Plano aprovadas. E nas Grandes Opções do Plano está,

visivelmente, no que respeita à segurança social, aquilo que o Governo preconiza para tornar o sistema mais

justo, mais transparente e mais eficaz. Agradecia que todos o vissem, porque as Grandes Opções do Plano

foram aqui aprovadas.

Aplausos do PS.

Entretanto, reassumiu a presidência o Presidente Ferro Rodrigues.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Carlos Monteiro, do

CDS-PP.

O Sr. António Carlos Monteiro (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Quero começar por

saudar os peticionários, neste caso a CGTP.

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Em relação a esta matéria, é muito claro o desafio que aqui temos. Como conciliar o aumento da

esperança média de vida, que é motivo de satisfação para todos nós, e a quebra demográfica? Isto é, como

pagar mais pensões durante mais tempo com menos ativos? Negar a necessidade de reformas no sistema de

segurança social é condenar esse mesmo sistema.

Os peticionários falam em roubo de pensões. Não reformar a segurança social é roubar o futuro a todos

nós.

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. António Carlos Monteiro (CDS-PP): — Por isso, faz sentido ligar a esperança média de vida à idade

de reforma, em especial quando se fala em reformas antecipadas. Dizer o contrário é demagógico e ignorar

que há um problema.

A verdade é que foi possível, a partir do início de 2015, que aos 60 anos de idade, e com 40 anos de

descontos, fosse possível requerer a reforma antecipada. E o que fez o Governo do Partido Socialista? No

início deste ano, este sistema terminaria e o Governo do Partido Socialista entendeu manter exatamente este

mesmo sistema, ou seja, 60 anos de idade com 40 anos de descontos, o que torna em regra aquilo que tinha

sido excecionalmente fixado pelo anterior Governo. Então, aquilo que criticavam antes agora já é bom?

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Exatamente!

O Sr. António Carlos Monteiro (CDS-PP): — E não deixa também de ser significativo que os

peticionários, juntamente com o PCP, demonstravam uma grande esperança em que este Governo trouxesse

a resolução para este problema. Disseram, até, que tinham disponibilidade para dialogar. Ora, o que

constatamos é que o PCP, à boleia desta petição, agendou a apreciação de um projeto de lei em que o que

pretende é que aos 40 anos com descontos, sem qualquer limitação, se passe a receber a reforma por inteiro.

A minha pergunta é esta: o PCP esqueceu-se que apoia este Governo? E qual é a posição do PS sobre

esta proposta? É que ouvimos o Sr. Deputado do Partido Socialista falar e foi incapaz de nos dizer como é que

vai votar este projeto de lei do PCP.

Coloca-se também aquela questão fulcral, que é ouvir o PCP e o Bloco de Esquerda dizerem o que é que

vão fazer se o PS chumbar a proposta. Vão fazer o mesmo que fizeram em relação à atualização das

pensões, ou seja, vão «enfiar a viola no saco» e contentarem-se com um aumento de 0,4%? É isso?

Protestos do Deputado do PCP Bruno Dias.

Aquilo que dantes diziam ser um roubo agora já não é?

Para nós, as coisas são muito claras: o que está em causa é o futuro de todos nós e, por isso mesmo,

nesta questão, a preocupação do CDS foi sempre a de garantir o futuro da segurança social.

Aplausos do CDS-PP:

O Sr. Presidente: — Para uma segunda intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Rita Rato, do PCP.

A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Após terem sido aqui proferidas várias

intervenções, é de facto visível que o principal problema da segurança social não é demográfico, é económico.

A principal ameaça à segurança social é o desemprego, é a precariedade, é a emigração, é a ausência de

períodos contributivos e de ciclos contributivos.

É óbvio que os senhores do PSD e do CDS, que ao longo dos últimos quatro anos, além de terem roubado

pensões, fomentaram o desemprego, a precariedade e a emigração, não querem falar disso, mas a verdade é

esta, Srs. Deputados.

Protestos do PSD e do CDS-PP.

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Hoje trazemos aqui uma proposta que pretende que aqueles que têm 40 anos de descontos, que têm uma

vida inteira de trabalho às costas, possam reformar-se sem penalizações.

Os senhores acham que isso é incorreto, mas nós achamos que é de elementar justiça. Qual é a razão

para quem iniciou uma carreira contributiva aos 14, 15 ou 16 anos não ter direito a uma reforma sem

penalizações, depois de 40 anos de descontos?

Da nossa parte, esse é um compromisso que temos, é uma defesa que fazemos. Fizemo-lo no passado,

fazemo-lo no presente e fá-lo-emos sempre, porque é de elementar justiça, pela dignidade da vida de milhares

de pessoas no nosso País que começaram a trabalhar muito cedo, que tiveram uma vida inteira de trabalho

em setores muito desgastantes e que os senhores humilharam e atingiram na sua dignidade.

Por isso, Sr. Presidente, Srs. Deputados, termino, dizendo que o compromisso do PCP, a cara do PCP, a

palavra do PCP é uma: no passado como no presente, defendemos a valorização das longas carreiras

contributivas, defendemos o direito a uma reforma com 40 anos de descontos, independentemente da idade. É

pelo direito das pessoas e pelo desenvolvimento do País.

Aplausos do PCP e do BE.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, terminado este debate, passamos ao ponto seguinte da nossa

agenda de hoje, que consta da apreciação conjunta da petição n.º 549/XII (4.ª) — Apresentada por António

José Ladeira Soares Neto e outros, solicitando à Assembleia da República a suspensão da aplicação do novo

regulamento da Caixa de Previdência dos Advogados e Solicitadores (CPAS) e do projeto de resolução n.º

135/XIII (1.ª) — Recomenda ao Governo a suspensão do novo regulamento da Caixa de Previdência dos

Advogados e Solicitadores e sua posterior revogação, repristinando-se o regime anterior (BE).

Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Manuel Pureza, do Bloco de Esquerda.

O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Em primeiro lugar, queria, em

nome do Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda, cumprimentar os representantes dos 4383 peticionantes e

dizer-lhes que convergimos numa preocupação essencial que nos é trazida por esta petição. Passo a citar: «A

advocacia e a solicitadoria, em particular aquela que é exercida em prática individual e em pequenas

sociedades e se dedica ao patrocínio dos estratos sociais economicamente mais vulneráveis, atravessa

momentos de graves dificuldades e tal situação decorre das draconianas medidas de austeridade que foram

aplicadas pelas instâncias políticas e que conduziram à destruição de grande parte do aparelho produtivo

nacional, empurrando para a insolvência famílias e empresas e aumentando os casos de pobreza e de

exclusão social. Ora, não podem os profissionais forenses que patrocinam estes setores sociais mais atingidos

pela crise financeira deixar de, eles próprios, serem reflexamente afetados pela situação adversa dos seus

patrocinados e, em consequência, lutar com graves dificuldades de sobrevivência».

Acabei de citar a petição que nos é apresentada.

Esta petição toca um problema da maior importância para quem exerce a advocacia e a solicitadoria. É

que, na verdade, o regime da Caixa de Previdência dos Advogados e Solicitadores tem como problemas

complicadíssimos neste momento o facto de a ratio entre contribuintes e pensionistas ter decrescido na casa

dos 30% ou acima dos 30% nos últimos anos, registando-se um envelhecimento acentuado do universo de

beneficiários, calculando-se que por volta de 2060 mais de metade dos contribuintes para esta Caixa de

Previdência venham a ter mais de 60 anos de idade.

Acresce ainda que o valor das contribuições anuais atuais cobrirá uma parcela muito reduzida das pensões

a pagar em 2040.

Por isto mesmo, é evidente que a solvabilidade e a sustentabilidade financeira da Caixa de Previdência dos

Advogados e Solicitadores, que cobre, nesta altura, qualquer coisa como 47 500 advogados e 5100

solicitadores, constitui um objetivo ao qual o Bloco de Esquerda se associa plenamente. Mas nesta Caixa de

Previdência, como no País, é necessário que a garantia futura das pensões não seja obtida através de uma

penalização desproporcional dos advogados e dos solicitadores economicamente mais frágeis, sobretudo dos

mais jovens, mas sim, e sobretudo, através do cumprimento efetivo das obrigações contributivas dos

advogados e dos solicitadores de maior poder económico.

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Naturalmente que, por isto mesmo, para o Bloco de Esquerda, o foco deve ser posto no impacto sobre os

advogados mais frágeis e não na aplicação em abstrato das regras do regulamento, como se todos os

advogados ou solicitadores fossem iguais nos seus rendimentos e nas suas obrigações contributivas. Não são.

Para o Bloco de Esquerda, há, basicamente, dois problemas que neste novo regulamento nos colocam

reservas relativamente à questão que acabámos de enunciar. Em primeiro lugar, o alargamento do número de

escalões, de 10 para 18, é acompanhado de uma previsão de subida da taxa contributiva dos 17% para os

24% até 2020, o que vai gerar um impacto muito gravoso sobre jovens advogados e advogados e solicitadores

em nome individual. Em segundo lugar, o pagamento obrigatório a partir da segunda fase do estágio coloca

problemas novos, na exata medida em que o início de atividade anterior a este regime beneficiava, durante um

ano, quase automaticamente, de isenção de contribuição para segurança social. É realmente um acréscimo

que se pode dizer pequeno, mas que para advogados em início de carreira é um acréscimo particularmente

gravoso.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, tem de concluir.

O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Termino, Sr. Presidente, dando conta de que, por isso mesmo,

advogamos e recomendamos ao Governo uma avaliação muito rigorosa do impacto da aplicação deste

regulamento e, por isso mesmo, apresentamos, nesse sentido, um projeto de resolução que recomenda ao

Governo que, ouvindo as entidades representativas dos profissionais sobre os quais o regulamento incide,

proceda a uma avaliação rigorosa do impacto da sua aplicação, tendo particularmente em consideração aquilo

que se verificará sobre advogados e solicitadores cuja prática é exercida em nome individual ou em pequenas

sociedades e cujo rendimento se revele mais afetado pelas obrigações contributivas decorrentes do novo

regulamento.

Aplausos do BE e do Deputado do PS João Galamba.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Vânia Dias da Silva, do CDS-

PP.

A Sr.ª Vânia Dias da Silva (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A minha primeira palavra

vai, obviamente, para saudar os Srs. Peticionários, a quem, de resto, já falei sobre esta matéria e deixei clara

a posição do CDS.

Como então referi, e repito, percebemos os anseios e aflições de que nos dão nota com esta petição, mas

não acolhemos, de todo, a ideia de repristinar o anterior regulamento e muito menos de serem travadas as

cobranças coercivas em curso.

A razão é simples e é meridianamente evidente. Do que aqui se trata e o que está em causa, muito mais do

que as questões práticas que nos põem, é, obviamente, a solvabilidade e a perpetuação desse sistema

previdencial de advogados e solicitadores e, sobretudo, a sustentabilidade do sistema. Friso que o que está

aqui em causa é, basicamente, a sustentabilidade do sistema e voltar ao passado significa tão-somente isto:

falir o sistema. E a falência do sistema não tem apenas consequências para estes profissionais — e, ainda que

assim fosse, obviamente não seria despiciendo —, mas tem consequências para todos os portugueses e, com

isso, obviamente, o CDS não compactua.

O CDS não compactua com a rutura de um sistema cujos principais e diretamente atingidos são

precisamente aqueles que contestam este regulamento.

Sabemos bem — e sei que nesta Câmara ninguém ignora — que as dificuldades que a segurança social

vem enfrentando são as mesmas que enfrenta este sistema previdencial e, por isso mesmo, seria urgente

combatê-las. Foi exatamente, e só isso, que norteou as alterações que fizemos, sendo certo que, além do

mais, as contribuições mais altas a pagar serão, ainda assim, mais baixas do que as dos demais trabalhadores

independentes para as mesmas eventualidades. Portanto, também não colhe o argumento de que este

sistema não é preferível ao outro para estes trabalhadores. Acresce ainda um pormenor, mas que é da maior

importância: o CDS recusa-se a ver engrossar as fileiras daqueles que pouco ou nada descontaram para um

sistema de segurança social, não apenas porque isto, obviamente, distorce o sistema mas, sobretudo, porque

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o CDS defende uma existência condigna, que muitas vezes estas pensões dificilmente alcançam e

asseguram.

Mas, mais do que isso, não é justo, nem é ético, que uns contribuam, com maior ou menor esforço, para

um sistema que lhes vai assegurar uma reforma, para que outros, porque têm dificuldades, não o façam.

Muitos dos que contribuem terão tantas ou mais dificuldades e não deixam de o fazer e não querem sair do

sistema.

É tudo isto que aqui está em causa. E tanto assim é que as esquerdas, que tanto falaram sobre isto

anteriormente, evoluíram muito nesta matéria — e ainda bem —, de uma ideia radical de suspender as

cobranças e de ressuscitar o anterior regulamento para, agora, tenuemente sugerirem que seja avaliado o

regime em vigor. E fizeram-no porque perceberam — o que, aliás, já foi aqui dito — que o que estava aqui em

causa era tão-somente a sustentabilidade do sistema, deste e, no limite, até de outros onde tivessem de ser

integrados por força da rutura daquele.

É óbvio que esta questão não tem só a ver com questões da crise económica, como disseram algumas

vezes, tem razões muitíssimo mais profundas do que isso, mas esse não é debate para fazermos agora.

Para concluir, Sr. Presidente, muito rapidamente, queria deixar aqui só três ideias. Em primeiro lugar, a

cobrança coerciva não é feita pela máquina fiscal, como invocam os peticionários; é feita nos termos gerais do

Código de Procedimento e de Processo Tributário.

Para além disso, a CPAS tem vindo agora a celebrar acordos de pagamento em prestações, evitando, e

bem, a via judicial, o que recomendamos e deve continuar.

Caberá, agora, à atual maioria verificar se faz sentido tomar mais medidas como aquelas que o anterior

Governo tomou. Em 2012, percebemos que havia um problema de regularização de dívidas e conseguiu-se

fazer um processo excecional de pagamento de contribuições.

Agora, caberá a este Governo ver se, sim ou não, faz sentido que se faça o mesmo para se assegurar a

sustentabilidade do sistema.

Aplausos do CDS-PP e do Deputado do PSD Carlos Abreu Amorim.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Moreira.

A Sr.ª Isabel Alves Moreira (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Peticionantes, Sr.as e Srs. Deputados: Sr.ª

Deputada do CDS,…

A Sr.ª Vânia Dias da Silva (CDS-PP): — O meu nome é Vânia Dias da Silva!

A Sr.ª Isabel Alves Moreira (PS): — … aqui não se tratou de mudar de ideia e de não querermos uma

rutura. Não, a Sr.ª Deputada, como eu, que fui a relatora desta petição, é membro da 1.ª Comissão, pelo que

sabe perfeitamente o que o PS sempre defendeu. Agora, certamente não vamos dizer que é preciso estudar o

problema para não acontecer nada e acabarmos por defender que as coisas fiquem como estão, como a

senhora acabou de fazer.

Os peticionantes dirigiram-se à Assembleia da República, e não só. Fizeram-no porque têm sentido muitas

dificuldades desde que, no final da última Legislatura, o Governo PSD/CDS aprovou o novo Regulamento da

Caixa de Previdência dos Advogados e Solicitadores, já aqui citado.

Não restam dúvidas, quer da leitura do novo Regulamento, quer de toda a documentação recolhida

aquando da audição dos peticionantes, de que estamos perante alterações profundas, num sistema

contributivo, as quais tiveram lugar em clima não ameno.

Não restam dúvidas também de que um diploma que teve por objetivo garantir a sustentabilidade deste

sistema, criou dificuldades, sobretudo aos advogados e solicitadores que exercem a sua atividade em nome

individual, aos jovens estagiários, a quem exerce a sua profissão em pequenas sociedades e a quem estava

não já com um direito consolidado à sua contribuição (portanto, não há aqui um problema de retroatividade),

mas a escassos anos da mesma.

Para mais, o diploma que permitia o pagamento faseado à CPAS foi revogado. É bom não confiarmos em

meras práticas, é necessário que haja segurança jurídica.

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O impacto do novo Regulamento foi efetivamente, aqui e ali, desigual, em alguns casos desproporcionado

e afetou expetativas — e tudo isto tem de merecer a nossa atenção.

É certo que os peticionantes requerem a suspensão do atual Regulamento. Acontece que tal meio jurídico,

em nosso entender, não atenderia as preocupações da petição. A suspensão do Regulamento não implicaria o

renascimento, que é como quem diz a repristinação de um outro qualquer regime jurídico anterior.

A complexidade da questão, não se podendo silenciar que grande parte dessa complexidade advém das

medidas de austeridade aplicadas e da crise financeira que, reflexamente, afetaram os profissionais forenses,

exige uma análise integrada e dialogante — a qual, com esta Ministra da Justiça, já é finalmente possível —,

de resto, já em curso, de forma a encontrar-se, numa visão holística, uma solução justa e equitativa.

Acompanhamos, para além do que já foi dito, as preocupações destacadas no projeto de resolução do

Bloco de Esquerda, ou seja, o aumento acentuado do esforço contributivo dos advogados, o regime mais

gravoso para os jovens e para os que exercem a sua profissão em pequenas sociedades.

Finalmente, não pode deixar de ser referido que o novo Regulamento constitui para um alto número de

jovens estagiários destas profissões o pagamento de uma contribuição efetiva, que não existia antes deste

diploma. Este facto é particularmente pesado, se me permitem a expressão, tendo em conta os salários —

quando os há —, de todas e de todos conhecidos, destes jovens profissionais.

Pela complexidade do tema, pela necessidade de se assegurar a sustentabilidade de todos os sistemas

contributivos de acordo com os princípios decorrentes do Estado de direito, o PS entende que o Governo

deverá avaliar com rigor o que aqui foi destacado, em concertação com todas as entidades envolvidas, por

forma a que se possa juntar justiça e sustentabilidade — justiça também!

Aplausos do PS e do BE.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Abreu Amorim.

O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — Sr. Presidente, queria, em primeiro lugar, saudar os peticionários.

Em relação à discussão que estamos a ter no Parlamento quer sobre a petição quer sobre o projeto de

resolução apresentado pelo Bloco de Esquerda, lembrei-me daquele que é o conceito formal de milenarismo.

É uma atitude filosófica, com tonalidades míticas, que parte do pressuposto de que existiu uma época anterior

de grande felicidade, que, depois, foi estorvada ou até pereceu devido a um conjunto de situações

calamitosas, mas que com certeza se vai novamente impor e repor, e a felicidade voltará novamente.

Não há dúvida alguma de que as intervenções não apenas sobre esta matéria mas sobre quase todas as

outras que temos ouvido nos últimos meses por parte do Partido Socialista e da extrema-esquerda assumem

intencionalmente, penso, esta atitude milenarista.

Então, sobre esta matéria da Caixa de Previdência dos Advogados e Solicitadores, vêm contar esta fábula,

e nem sequer lhe chamo mito, dizendo que estava tudo bem antes do surgimento da crise — crise, aliás,

provocada diretamente pela ação governativa do seu parceiro material de coligação — e que, depois, quando

a crise sobreveio, tudo ficou mal e, nomeadamente, aquilo que foram os remédios do anterior Governo para

solucionar os problemas financeiros e económicos da crise é que trouxeram a calamidade à Caixa de

Previdência dos Advogados e Solicitadores.

É falso! Como todas as fábulas, esta também é falsa. A situação financeira da Caixa de Previdência dos

Advogados e Solicitadores tem problemas, e tem-nos há muito.

O Grupo Parlamentar do PSD não pactuará com nenhuma intenção que, de alguma forma, direta ou

indireta, possa afetar a sustentabilidade da Caixa de Previdência dos Advogados e Solicitadores, porque esse

é o meio mais direto e doloso de afetar as situações dos advogados e solicitadores que, de alguma maneira,

os peticionários e também, julgo, o Bloco de Esquerda querem proteger em primeira mão, digamos assim.

Por isso, nós acolhemos a viragem ou, melhor, a reflexão que o Bloco de Esquerda fez, porque o Bloco de

Esquerda, em bom rigor, apresentou dois projetos de resolução. Um deles ia no mesmo sentido da petição —

queria suspender, revogar a legislação em vigor e repristinar a anterior. Mas o Bloco de Esquerda recuou, e

fez bem. Saúdo o Bloco de Esquerda por recuar — e não apenas nesta matéria, porque parece que está a

recuar em muitas, está a recuar em muitos dos princípios que andou a apregoar quando ainda estava na

oposição. Há pouco assistimos, em matéria de segurança social e do pagamento de pensões, a um

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movimento mais ou menos similar por parte do Partido Comunista Português. O Bloco de Esquerda fez este

flic-flac — e não será o último, com certeza — e apresentou agora um projeto de resolução muito mais

moderado, aparentemente mais sério, mas que contradiz aquilo que está na petição — como, aliás, foi dito

aqui pela Sr.ª Deputada Isabel Moreira —, que não tinha viabilidade jurídica.

O Grupo Parlamentar do PSD aceitará qualquer análise e qualquer reflexão que vá no sentido de transmitir

sustentabilidade à Caixa de Previdência dos Advogados e Solicitadores. Fazer demagogia e retirar os poucos

fundamentos de sustentabilidade que esta instituição tem, com isso não estaremos de acordo, não contem

connosco para isso.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Queria também saudar os peticionários

aqui presentes e dizer que acompanhamos aquilo que é proposto em concreto nesta Assembleia, que é que

se recomende uma reflexão sobre a sustentabilidade e a justeza da regulamentação aprovada para a Caixa de

Previdência dos Advogados e Solicitadores. Isto não significa uma adesão àquilo que inicialmente vem

proposto pelos peticionários, porque também nos parece que a solução adequada para este problema não é

apontar para a suspensão do regime vigente, até porque isso não implicaria necessariamente a repristinação

do regime anterior, e nem nos parece que fosse solução a repristinação do regime anterior. É que a reflexão

que é necessário fazer não é apenas sobre este regime que está agora em vigor, mas também sobre se era

viável e sustentável o regime anteriormente vigente.

A Caixa de Previdência dos Advogados e Solicitadores tem uma configuração que se aproxima dos fundos

de pensões. Podemos dizer que, verdadeiramente, se trata praticamente de um fundo de pensões, na medida

em que era possível aos seus subscritores gerir as suas carreiras contributivas. Designadamente, um

advogado com mais anos de profissão e maior nível de rendimentos poderia gerir as suas contribuições, fazer

contribuições mais elevadas, o que lhe garantiria, quando se reformasse, quando cessasse a sua atividade ou

mesmo que não cessasse completamente a sua atividade mas pudesse reformar-se, auferir uma pensão

relativamente elevada.

Ora, esta situação, com a diferente configuração etária que tem hoje a classe dos advogados e com um

maior número de advogados mais jovens e com menores rendimentos, é suscetível, de facto, de gerar

desequilíbrios e de poder pôr em causa, na prática, a prazo, a sustentabilidade da Caixa de Previdência dos

Advogados e Solicitadores.

Esta reflexão não pode, obviamente, deixar de ser feita. Hoje em dia, a Caixa de Previdência dos

Advogados e Solicitadores tem um nível de contribuições que quase se equipara ao nível de despesas. Isto,

obviamente, não põe em causa a sua sustentabilidade, mas deve motivar uma reflexão.

Portanto, devemos ter em conta a situação particularmente dos contribuintes mais jovens, que tenderão a

ser a maioria, como todos sabemos, mas também não devemos perder a noção de uma justiça relativa quanto

aos outros trabalhadores independentes, aos outros trabalhadores que estão a recibo verde. Aquilo que consta

deste Decreto-Lei é que o esforço contributivo aumente, gradualmente, nos próximos quatro anos, até chegar

a um nível de contribuições de 24%. Ora, 24% é o que já paga hoje qualquer jovem que esteja a recibo verde.

Há, pois, que ter isso em consideração.

Tem de haver uma solução adequada, refletida, participada, mas que seja uma solução justa, que tenha

em conta o nível de rendimentos efetivos das pessoas e que não crie uma situação de desigualdade entre

estes jovens advogados, os advogados e pessoas que estão noutras profissões, jovens ou menos jovens, mas

que tenham também uma profissão liberal, que estejam a recibos verdes, sejam verdadeiros ou falsos, mas

que também têm de fazer os seus descontos e que os fazem a um nível de contribuição que é elevada.

O Sr. Presidente: — Peço-lhe que conclua, Sr. Deputado.

O Sr. António Filipe (PCP): — Concluo de imediato, Sr. Presidente.

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É essa a reflexão que temos de fazer. Não podemos isolar o nível de contribuições exigido aos advogados

do nível de contribuições que é exigido a todas as outras classes profissionais. Aquilo que subscrevemos é

que esta reflexão se faça e que o Governo possa dinamizar uma reflexão que conduza a uma solução justa.

Aplausos do PCP e do BE.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, com esta intervenção, chegámos ao fim do último ponto da ordem do

dia, a discussão conjunta da petição n.º 549/XII (4.ª) e do projeto de resolução n.º 135/XIII (1.ª) (BE).

A próxima reunião plenária realiza-se amanhã, às 10 horas, tendo como ordem do dia um debate temático,

requerido pelo PCP, sobre precariedade laboral.

Haverá ainda, no final do debate, votações regimentais.

Está encerrada a sessão.

Eram 18 horas e 49 minutos.

Presenças e faltas dos Deputados à reunião plenária.

A DIVISÃO DE REDAÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL.

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