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Quinta-feira, 2 de junho de 2016 I Série — Número 74
XIII LEGISLATURA 1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2015-2016)
REUNIÃOPLENÁRIADE1DEJUNHODE 2016
Presidente: Ex.mo Sr. Eduardo Luís Barreto Ferro Rodrigues
Secretários: Ex.mos Srs. Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco Idália Maria Marques Salvador Serrão Diogo Feijóo Leão Campos Rodrigues
S U M Á R I O
O Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 8
minutos. Deu-se conta da entrada na Mesa da proposta de lei n.º
21/XIII (1.ª), dos projetos de lei n.os 244 a 251/XIII (1.ª) e dos projetos de resolução n.os 336 a 351/XIII (1.ª).
Ao abrigo do artigo 73.º do Regimento, procedeu-se a um debate temático, requerido pelo Governo, sobre modernização administrativa, programa Simplex.
Na abertura do debate, interveio a Ministra da Presidência e da Modernização Administrativa (Maria Manuel Leitão Marques), tendo-se seguido no uso da palavra, a diverso título, além daquela oradora e da Secretária de Estado Adjunta e da Modernização Administrativa (Graça Fonseca), os Deputados Jorge Paulo Oliveira (PSD), Filipe Neto Brandão (PS), Paulino Ascenção (BE), Vânia Dias da Silva (CDS-PP), Jorge Machado (PCP), José Luís Ferreira (Os Verdes), Paulo Sá (PCP), Margarida Mano (PSD), João Ramos (PCP), Hortense Martins (PS), Cecília Meireles (CDS-PP), António Leitão Amaro (PSD) e Fernando Anastácio (PS).
No encerramento do debate, proferiram intervenções os Deputados José Luís Ferreira (Os Verdes), Jorge Machado (PCP), Cecília Meireles (CDS-PP), Pedro Filipe Soares (BE), Paulo Trigo Pereira (PS), Maria Luís Albuquerque (PSD) e a Ministra da Presidência e da Modernização Administrativa.
Foram debatidos, na generalidade, a proposta de lei n.º 10/XIII (1.ª) — Restituição de bens culturais que tenham saído ilicitamente do território de um Estado-membro da União
Europeia, que transpõe a Diretiva 2014/60/EU, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de maio de 2014, conjuntamente com o projeto de resolução n.º 335/XIII (1.ª) — Determina a inventariação dos bens culturais da Parvalorem, da Parups e outros ativos incluídos no perímetro da nacionalização do BPN, bem como da Fundação Elipse e outros ativos à guarda do Estado na sequência do processo de resgate do BPP (BE). Intervieram, além do Ministro da Cultura (Castro Mendes), os Deputados Jorge Campos (BE), Teresa Caeiro (CDS-PP), Ana Mesquita (PCP), Pedro do Ó Ramos (PSD) e Maria Augusta Santos (PS).
A Câmara debateu, na generalidade, os projetos de lei n.os 181/XIII (1.ª) — Proíbe a utilização de menores de idade em espetáculos tauromáquicos (PAN), 217/XIII (1.ª) — Impede a participação de menores de 18 anos em atividades tauromáquicas profissionais ou amadoras e elimina a categoria de matadores de toiros (BE) e 251/XIII (1.ª) — Restringe o acesso à prática de atividades tauromáquicas, procedendo à primeira alteração à Lei n.º 31/2015, de 23 de abril, que estabelece o regime de acesso e exercício da atividade de artista tauromáquico e de auxiliar de espetáculo tauromáquico (Os Verdes), tendo intervindo os Deputados André Silva (PAN), Pedro Soares (BE), Heloísa Apolónia (Os Verdes), André Pinotes Batista (PS), Nuno Serra (PSD), Ana Mesquita (PCP) e Telmo Correia (CDS-PP).
O Presidente (José Manuel Pureza) encerrou a sessão eram 18 horas e 20 minutos.
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O Sr. Presidente: — Sr.as e Srs. Deputados, Sr.as e Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Funcionários,
Sr.as e Srs. Jornalistas, está aberta a sessão.
Eram 15 horas e 8 minutos.
Srs. Deputados, há um problema com o sistema de registo eletrónico, que estamos a tentar resolver.
De qualquer forma, peço aos Srs. Agentes da autoridade para abrirem as galerias.
Entretanto, também peço ao Sr. Secretário Duarte Pacheco o favor de dar conta do expediente.
Tem a palavra.
O Sr. Secretário (Duarte Pacheco): — Sr. Presidente, deram entrada na Mesa, e foram admitidos pelo Sr.
Presidente, a proposta de lei n.º 21/XIII (1.ª) — Alteração à Lei n.º 7/2009 de 12 de fevereiro — obrigação de
prestação de serviços de transporte marítimo para as regiões autónomas durante a greve (ALRAM), que baixa
à 10.ª Comissão, e os projetos de lei n.os 244/XIII (1.ª) — Sexta alteração à Lei n.º 108/91, de 17 de agosto, lei
do Conselho Económico e Social, de modo a incluir no plenário dois representantes dos reformados,
aposentados e pensionistas (CDS-PP), 245/XIII (1.ª) — Altera o Código Penal, dispensando de queixa o crime
de violação de obrigação de alimentos e agravando as respetivas penas (CDS-PP), 246/XIII (1.ª) — Altera o
Código Civil, criando a indignidade sucessória dos condenados por crimes de exposição ou abandono ou de
omissão de obrigação de alimentos (CDS-PP), 247/XIII (1.ª) — Primeira alteração à Lei n.º 25/2012, de 16 de
julho, alargando a dimensão do testamento vital ao planeamento da velhice, para além da situação de doença
(CDS-PP), 248/XIII (1.ª) — Procede à décima primeira alteração à Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro, que aprova
o Código do Trabalho, estabelece o direito do trabalhador que estiver a um ano da idade legal de reforma poder
optar por trabalhar a tempo parcial por dois anos (CDS-PP), 249/XIII (1.ª) — Altera o Regime Jurídico do Serviço
Público do Transporte de Passageiros, aprovado pela Lei n.º 52/2015, de 9 de junho (PCP), que baixa à 6.ª
Comissão, 250/XIII (1.ª) — Confirma o passe social intermodal como título em todos os transportes coletivos de
passageiros e atualiza o âmbito geográfico das respetivas coroas na Área Metropolitana de Lisboa (PCP), que
baixa à 6.ª Comissão, e 251/XIII (1.ª) — Restringe o acesso à prática de atividades tauromáquicas, procedendo
à primeira alteração à Lei n.º 31/2015, de 23 de abril, que estabelece o regime de acesso e exercício da atividade
de artista tauromáquico e de auxiliar de espetáculo tauromáquico (Os Verdes).
Deram ainda entrada, e foram admitidos, os projetos de resolução n.os 336/XIII (1.ª) — Recomenda ao
Governo que reveja a legislação de modo a defender os idosos de penalizações e exclusões abusivas de que
são alvo em função da idade (CDS-PP), 337/XIII (1.ª) — Recomenda ao Governo que altere a Portaria n.º
87/2006, de 24 de janeiro, revendo o procedimento do Cartão do Voluntário (CDS-PP), 338/XIII (1.ª) —
Recomenda ao Governo que crie incentivos adicionais de apoio à contratação de desempregados maiores de
55 anos (CDS-PP), 339/XIII (1.ª) — Recomenda ao Governo que crie um plano de gestão da carreira dirigido
aos trabalhadores mais velhos (CDS-PP), 340/XIII (1.ª) — Recomenda ao Governo que elabore e execute uma
estratégia nacional para um envelhecimento ativo e para a longevidade (CDS-PP), 341/XIII (1.ª) — Recomenda
ao Governo que equipare ao sector público o regime do sector privado, em que é permitido, a quem pretender,
continuar a trabalhar depois dos 70 anos (CDS-PP), 342/XIII (1.ª) — Recomenda ao Governo que incentive o
desenvolvimento de iniciativas de voluntariado sénior (CDS-PP), 343/XIII (1.ª) — Recomenda ao Governo que
melhore e qualifique o serviço de apoio domiciliário (CDS-PP), 344/XIII (1.ª) — Recomenda ao Governo que
pondere e estude o alargamento do âmbito e das competências da atual Comissão Nacional de Promoção dos
Direitos e Proteção das Crianças e Jovens (CDS-PP), 345/XIII (1.ª) — Recomenda ao Governo que proceda à
atualização dos preços dos cuidados de saúde e de apoio social nas unidades de internamento e ambulatório
da Rede Nacional de Cuidados Continuados Integrados (RNCCI) (CDS-PP), 346/XIII (1.ª) — Recomenda ao
Governo que reative a linha Saúde 24 Sénior até ao início do outono (CDS-PP), 347/XIII (1.ª) — Recomenda ao
Governo que promova uma campanha informativa de divulgação e incentivo ao registo do testamento vital nos
principais meios de comunicação social e em todos os serviços públicos com locais de atendimento, incluindo
autarquias (CDS-PP), 348/XIII (1.ª) — Recomenda ao Governo o reforço da formação em cuidados paliativos
em Portugal (CDS-PP), 349/XIII (1.ª) — Recomenda ao Governo que reforce a formação dos profissionais de
saúde na área da geriatria, a nível pré e pós graduado, nomeadamente ao nível da especialização médica (CDS-
PP), 350/XIII (1.ª) — Recomendações ao Governo no âmbito das negociações em curso do Acordo de Parceria
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Transatlântica de Comércio e Investimento UE-EUA — TTIP (PS), que baixa à 4.ª Comissão, e 351/XIII (1.ª) —
Pela melhoria dos cuidados de saúde no hospital de Santarém (PS).
É tudo, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, continuamos com problemas a nível do registo eletrónico dos
Deputados. Quando estiverem resolvidos, avisarei, mas isso não nos impede de dar início à nossa ordem do
dia, cujo primeiro ponto é o debate temático, ao abrigo do artigo 73.º do Regimento, sobre modernização
administrativa, programa Simplex.
Peço às Sr.as e aos Srs. Deputados que estão de pé o favor de se sentarem para iniciarmos este debate.
Pausa.
Ainda estão 13 Srs. Deputados de pé, pelo que vamos esperar mais um pouco.
Pausa.
Volto a pedir aos Srs. Deputados para se sentarem, em especial àqueles que estão de costas para a Mesa.
Pausa.
Ainda estão de pé três Deputados, um dos quais de costas para a Mesa, e, portanto, vamos esperar mais
um pouco para que os Srs. Deputados se possam sentar.
Pausa.
Penso que já estamos em condições de continuar, embora do ponto de vista do registo eletrónico ainda não
esteja resolvido o problema, mas em termos de relações humanas e políticas.
Assim, vamos dar início ao debate temático sobre modernização administrativa, programa Simplex.
Para abrir o debate, tem a palavra a Sr.ª Ministra da Presidência e da Modernização Administrativa, Maria
Manuel Leitão Marques.
A Sr.ª Ministra da Presidência e da Modernização Administrativa (Maria Manuel Leitão Marques): — Sr.
Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Não encontrei melhor tema para começar este debate do que ler nesta
Assembleia uma carta que a minha mãe, que tem 94 anos, recebeu em casa.
Reza assim: «Relativamente ao assunto em epígrafe e dando cumprimento à manutenção, suspensão e
perda de qualidade de beneficiário, conforme o disposto na alínea c), ponto 1, do artigo 18.º do Decreto-Lei n.º
118/83, de 25 de fevereiro, e respetiva republicação através do Decreto-Lei n.º 234/2005, de 30 de dezembro,
solicita-se que nos seja enviada a documentação abaixo indicada:
Declaração do Centro Nacional de Pensões ou do Centro Distrital de Segurança Social da área de residência,
com indicação obrigatória do NISS do interessado, comprovativa da situação contributiva perante a segurança
social, explicitando a data do primeiro e último desconto, bem como a situação atual em que se encontra,
nomeadamente se se encontra a auferir alguma prestação social, como, por exemplo, fundo de desemprego.
Caso se encontre na situação de pensionista deverá vir explicado se a pensão é proveniente de regime
contributivo ou de regime não contributivo;
Cópia do Cartão de Cidadão, ou, na sua ausência, do Bilhete de Identidade e do Número de Identificação
Fiscal;
Comprovativo do IRS do ano anterior, com todos os anexos.»
Bem, nem tudo é mau, porque no parágrafo seguinte diz-se: «De futuro, a apresentação da documentação
para reavaliação da manutenção de direitos será dispensada, caso V. Ex.ª autorize a consultar a sua situação
perante a segurança social. Para tal, deverá proceder à devolução deste mesmo ofício devidamente assinado,
em conjunto com a documentação solicitada.
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Mais se informa que os direitos ficarão cancelados à data do términos do cartão que se encontra em seu
poder».
O Simplex serve também para isto, ou seja, para que pessoas de 94 anos não sejam surpreendidas…
Aplausos do PS.
… por cartas que não conseguem sequer descodificar, por pedidos de documentos que não sabem onde
encontrar, por ameaças de perdas dos seus direitos e por cópias de documentos que não deviam ser pedidos
se a lei fosse cumprida. Serve para que esse futuro — que é a única boa notícia desta carta — seja um futuro
mais próximo, seja um futuro que possamos, juntamente com os serviços, ter à nossa disposição, em breve.
Devemos fazê-lo olhando para a lei, verificando se a lei exigiria incomodar estes cidadãos — não terá sido a
única! —, olhando para os procedimentos e verificando se estas cartas (obviamente, invocando as disposições
legislativas, mas talvez mais abaixo) não podem ser escritas de forma mais clara, de tal modo que as pessoas
as entendam e saibam exatamente onde ir buscar toda aquela documentação que lhes é exigida para não
perderem direitos de que auferem há tanto tempo e usando a tecnologia — exatamente o futuro — para que
essa documentação, que está toda na posse da Administração, pois nem um só documento, nem uma só
informação solicitada deixa de estar em poder da Administração, não seja pedida aos cidadãos.
Para que isso aconteça, é preciso que o Simplex, este programa, seja um programa de colaboração entre
todo o Governo, porque nem toda esta informação está junto do serviço que a solicitou, de toda a Administração
Pública, e, naturalmente, se faça em colaboração com as administrações local e regional. Foi este o trabalho
que fizemos para a apresentação deste programa.
E assim chegámos a medidas com impacto em diferentes destinatários, com privilégio, neste programa, para
os cidadãos — 99 medidas destinam-se aos cidadãos —, para as empresas, aliviando-as de custos de contexto
necessário, para ambos, cidadãos e empresas, para a Administração Pública, ela própria, porque isto é trabalho
para a Administração Pública quando formos entregar esta documentação, que há de ser tratada, que há de ser
passada para os sistemas de informação, que há de ser arquivada, para tornar a nossa Administração mais
eficiente, mas também para as associações, fundações, coletividades e cooperativas, como a Cooperativa na
Hora.
O Sr. Presidente: — Sr.ª Ministra, peço-lhe para concluir ou, então, vamos descontar no tempo do Governo.
Pausa.
Faça favor de continuar.
A Sr.ª Ministra da Presidência e da Modernização Administrativa: — Foi para isso que fizemos este
programa que hoje trazemos à Assembleia com sete grandes objetivos: uma Administração Pública mais
eficiente; comunicações mais simples; documentos mais acessíveis; licenciamentos mais ágeis; mais
informações num único local, com pontos únicos de contacto organizados em torno dos nossos eventos de vida;
obrigações mais simples; e até serviços para estrangeiros mais fáceis.
São estes os objetivos que se encontram vertidos no programa.
Muito obrigada pela vossa atenção.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Inscreveram-se nove Srs. Deputados para pedir esclarecimentos, os quais serão feitos
em duas rondas.
A Sr.ª Ministra responde no final dos primeiros cinco pedidos de esclarecimento e, depois, no final dos
restantes quatro pedidos de esclarecimento.
Tem a palavra, em primeiro lugar, o Sr. Deputado Jorge Paulo Oliveira, do Grupo Parlamentar do PSD.
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O Sr. Jorge Paulo Oliveira (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados, Sr.ª
Ministra, tem razão. De facto, a Administração Pública pode ser um verdadeiro calvário para os cidadãos, para
as empresas e para as organizações sociais.
Neste quadro, modernizar e simplificar a Administração Pública já não é uma opção, é um imperativo de
qualquer Governo.
Manda a verdade que se diga que todos os Governos, sobretudo a partir da década de 90, ainda que com
diferentes graus de intensidade, contribuíram, de facto, para esta simplificação da nossa Administração Pública.
Nós próprios, no anterior Governo, pudemos concretizar centenas de medidas exatamente nesse sentido.
Ora, o programa Simplex+2016, que hoje discutimos, também ele se insere nesta linha evolutiva de
simplificação, o que é positivo.
Porém, Sr.ª Ministra, ao contrário do que muitos possam pensar, nem tudo o que consta deste documento é
novidade, nem tudo o que consta deste documento é inovação.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. Jorge Paulo Oliveira (PSD): — Na verdade, Sr.ª Ministra, muitas das medidas já estavam pensadas,
já estavam planeadas, já estavam programadas, já estavam prontas. Muitas delas estavam em execução, ainda
que de forma parcial. Muitas das medidas que aqui constam só são possíveis porque, de facto, o anterior
Governo criou as condições para tanto.
O Sr. Cristóvão Norte (PSD): — Bem lembrado!
O Sr. Jorge Paulo Oliveira (PSD): — Outras medidas são, como a Sr.ª Ministra certamente reconhecerá,
extensões de medidas já implementadas.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. Jorge Paulo Oliveira (PSD): — A saber: IRS Automático, Documentos Sempre à Mão, Escola 360º,
notificações eletrónicas, Receita Sem Papel Plus, Registo Civil On-line+, Livro de reclamações on-line, Balcão
Cidadão Móvel, boletim de saúde eletrónico, Título Único Ambiental. São exemplos de medidas que constam
deste programa, que nasceram com o anterior Governo e a que este Governo dá continuidade.
O Sr. Cristóvão Norte (PSD): — Bem lembrado!
O Sr. Jorge Paulo Oliveira (PSD): — De todas as medidas, permita-me, Sr.ª Ministra, que destaque, talvez
por ser o mais paradigmático, o Licenciamento Único Ambiental, da responsabilidade do ex-Ministro do
Ambiente, Ordenamento do Território e Energia Eng.º Jorge Moreira da Silva. Recordo que, quando este
licenciamento foi discutido nesta Casa, o PS menorizou-o. Dizia, à época, o Deputado Pedro Farmhouse: «Falar
de congregação de vários regimes jurídicos e respetivos procedimentos para obter o licenciamento ambiental e
um título único ambiental é, neste quadro, assaz preocupante».
O Sr. Cristóvão Norte (PSD): — Bem lembrado!
O Sr. Jorge Paulo Oliveira (PSD): — Ainda bem que o PS, agora no Governo, mudou de opinião.
Sem embargo, Sr.ª Ministra, é importante que fique claro que o licenciamento ambiental já existe. Toda a
legislação necessária está publicada, falta apenas cumprir — repito, falta apenas cumprir — a última das fases
de adequação e de ajustamento informático para a plenitude do seu funcionamento.
Por isso, neste contexto, Sr.ª Ministra, não nos preocupa que esta medida, considerada, aliás, precursora e
exemplar quer pela Comissão Europeia, quer pela OCDE conste do programa Simplex+2016.
O que verdadeiramente nos preocupa, Sr.ª Ministra, é que, quando falamos simultaneamente em ambiente,
licenciamento e simplificação administrativa, constatamos que nenhuma outra medida é avançada, nenhuma
outra medida é acrescentada.
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Por isso lhe pergunto se esta referência ao Título Único Ambiental não servirá apenas para o Governo
esconder, escamotear e, de alguma forma, ultrapassar uma gritante incapacidade de ir mais além neste domínio
do que foi o anterior Governo.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: — Antes de continuarmos, faço duas observações.
Primeira, o Sr. Deputado ultrapassou o tempo atribuído ao pedido de esclarecimento. No entanto, esse tempo
que ultrapassou foi descontado no do grupo parlamentar, como aconteceu com a Sr.ª Ministra, pelo que não há
qualquer problema.
Segunda observação, há um barulho de fundo, que não sei se é de fundo, se é mesmo próximo, muito forte.
Por isso, pedia aos Srs. Deputados que estão de pé, de costas ou em manifestações de grande afeto que se
sentassem.
Tem a palavra, para pedir esclarecimentos, o Sr. Deputado Filipe Neto Brandão, do Grupo Parlamentar do
PS.
O Sr. Filipe Neto Brandão (PS): — Sr. Presidente, Srs. Secretários de Estado, Sr.ª Ministra, Almada
Negreiros, esse grande expoente da modernidade, disse: «Quando eu nasci, as frases que hão-de salvar a
humanidade já estavam todas escritas, só faltava uma coisa — salvar a humanidade».
Recordei-me desta citação, na sequência da intervenção do Sr. Deputado do PSD, que acaba de me
anteceder, porquanto Almada Negreiros, com corrosiva acidez, ilustrou bem a diferença entre dizer e fazer.
O Sr. João Paulo Correia (PS): — Muito bem!
O Sr. Filipe Neto Brandão (PS): — Ao assistirmos, nos últimos dias, e hoje mesmo, na pergunta que
antecedeu a minha, a uma tentativa de ocupação do espaço mediático e agora parlamentar, com um ensaio de
desvalorização do Simplex, eu queria dizer, antes de fazer a pergunta, que, por manifesta falta de fundamento,
essa tentativa está destinada a soçobrar, como facilmente se demonstra.
Aliás, quando no início deste ano de 2016, a Sr.ª Ministra disse que o Simplex está de volta, é precisamente
essa imagem que cola à realidade, porquanto, durante quatro anos ou um quadriénio, o processo sistemático
de implementação e modernização administrativa — processo que, recordo, nasceu com esse nome, com o
nome de Simplex, pela sua mão e pela mão do então Ministro responsável, em dezembro de 2005 — esteve
arredado, esteve literalmente a marcar passo, não obstante as centenas de propostas que acabam de ser
alvitradas.
Recordemos: o anterior Governo tomou posse em 2011.
Ora, em 2014, o jornal Sol, insuspeito de esquerdismo, noticiava: O Simplex marca passo.
Também em 2014, em abril, pouco tempo depois, a Assembleia da República aprovava uma resolução que
recomendava ao Governo de então que apresentasse e promovesse a implementação do programa Simplificar,
um programa de modernização e simplificação administrativa.
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, mais uma vez, peço para fazermos uma pausa, porque o ruído na Sala
torna mesmo impossível que os Membros do Governo, conforme o comunicaram, oiçam o que o Sr. Deputado
está a dizer.
Portanto, peço às Sr.as e aos Srs. Deputados que estão de pé e aos Srs. Deputados que estão de costas
para a Mesa o favor de se sentarem.
Faça favor de continuar, Sr. Deputado Filipe Neto Brandão.
O Sr. Filipe Neto Brandão (PS): — Agradeço ao Sr. Presidente e aos Srs. Deputados que me permitem
continuar.
Dizia eu que em 2014, portanto três anos volvidos sobre a tomada de posse do anterior Governo, a
Assembleia da República aprovava uma resolução que recomendava ao Governo que apresentasse e
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promovesse a implementação do programa Simplificar. O que é que aconteceu a esse programa apresentado
em 2014?
Um outro jornal, desta vez on-line, e ainda menos insuspeito de qualquer deriva esquerdista, o Observador,
fazia a seguinte pergunta, em 2015: «O que é feito do guião da reforma do Estado?».
Relativamente à matéria de simplificação administrativa, esse mesmo jornal, sobre o programa Simplificar,
em 2015, não apenas fazia a pergunta como respondia: «Até agora, têm sido ouvidas empresas em várias
setores (…), houve sessões de trabalho (…) a medida ainda está no plano da discussão, mas tinha dois anos
para ser implementada no terreno: 2014 e 2015 (…)». Obviamente, dirão que não foi possível fazer o que se
tinham proposto, não houve tempo.
Sr.ª Ministra, como é óbvio, é a sua capacidade de fazer aquilo que os seus antecessores diziam que não
era possível ou que era demasiado difícil que a carateriza. Também por isso a saudamos e exortamo-la a
continuar e a distinguir-se por essa sua capacidade de realização.
Sr.ª Ministra, queria fazer uma pergunta que se prende com a apresentação que fez do programa, no passado
dia 19 de maio.
Quando o Sr. Primeiro-Ministro referiu, e muito bem, relativamente à modernização do Estado, que é um
desafio onde se cruzam os objetivos de criar condições para sermos mais competitivos e mais eficientes na
gestão da despesa e que o objetivo da modernização não é encerrar serviços, a questão que se colocava, e
pela qual foi elogiado, aliás, pelo Vice-Presidente da Comissão Europeia, era a de que o processo de
modernização administrativa não é um processo acabado; pelo contrário, é um processo contínuo.
Aquilo que lhe pergunto, Sr.ª Ministra, é o seguinte: precisamente não sendo um processo acabado, chegado
a este ponto em que formaliza o programa Simplex 2016, de que modo irá garantir a incorporação de propostas
que garantam a contínua atualização deste programa para que ele possa continuar a ser aquilo que sempre foi,
isto é, um paradigma de modernização da Administração Pública portuguesa?
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para pedir esclarecimentos, o Sr. Deputado Paulino Ascenção, do Grupo
Parlamentar do Bloco de Esquerda.
O Sr. Paulino Ascenção (BE): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr.ª Ministra, venho aqui referir
aquilo que parece ser uma lacuna neste programa Simplex.
Ao pesquisar pelas várias medidas não encontramos nenhuma referência à utilização de software livre ou
aberto e à implementação de normas abertas nos documentos que estão disponibilizados pela Administração.
A utilização do software livre em si mesma não é uma medida de modernização, mas potencia a inovação,
permite grandes poupanças a médio e longo prazo, sobretudo, e assegura maior segurança e independência
face aos fornecedores privados.
A disponibilização dos documentos e formulários, de acordo com normas abertas, isenta os cidadãos e as
empresas da obrigação de adquirirem aplicações que são pagas e, por isso, mais caras do que as soluções de
software aberto, que, por norma, são gratuitas e, portanto, permite grande poupança para toda a economia.
Quanto à questão da segurança, pergunto-lhe como permite o Estado o uso de software fechado em funções
de soberania tão sensíveis como a justiça, a defesa ou a administração fiscal, aplicações fechadas, aplicações
dos sistemas operativos que são autênticas caixas negras, cujo funcionamento interno ninguém pode auditar e,
portanto, ninguém, a não ser o fabricante, pode garantir a segurança, pode garantir que não existem acessos
não autorizados.
As soluções desenvolvidas internamente baseadas em ferramentas proprietárias sofrem destas mesmas
limitações.
Os países mais ricos do norte da Europa estão muito mais avançados neste capítulo no uso de ferramentas
livres.
Em Portugal, vigora o preconceito de que o que é bom tem de ser caro.
Ora, o que é gratuito muitas vezes também é bom e outras vezes até é melhor. Não há, praticamente,
nenhuma área hoje em dia em que as soluções em software de código aberto ou livre não sejam suficientemente
boas. Podem não ser as melhores, mas cumprem perfeitamente os requisitos dos utilizadores médios.
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Não precisamos de Ferrari, nem do último grito da tecnologia, mas, sim, de ferramentas que ofereçam um
custo/benefício que seja aceitável e comportável.
O software livre permite maior inovação, mais colaboração entre diferentes organismos, mais concorrência
entre prestadores de serviços, que a maior parte da inovação da cadeia de valor inerente seja retida no País,
em vez de sair para o exterior, para o detentor das marcas comerciais.
Outra questão concreta diz respeito às aplicações da Administração Tributária para submissão das
obrigações fiscais foram construídas e mantêm-se numa tecnologia que é hoje considerada insegura e que as
mais recentes versões dos navegadores da Internet já não suportam.
Portanto, há aqui uma oportunidade concreta para implementação de soluções abertas para resolver este
problema de segurança, com a integração mais facilitada, com as soluções de gestão das organizações. Há
aqui também uma oportunidade para os centros de competência, nomeadamente na área da informática,
mostrarem a sua potencialidade.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Vânia Dias da Silva, do
Grupo Parlamentar do CDS-PP.
A Sr.ª Vânia Dias da Silva (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.ª e Sr. Secretários de Estado, Sr.as e Srs.
Deputados, Sr.ª Ministra, temos falado muitas vezes, a última das quais ontem mesmo, sobre este assunto que
nos é caro a todos.
Não vou repetir detalhadamente as saudações e os apontamentos críticos que já lhe fiz noutras ocasiões,
que não só ontem, mas não posso deixar de lhe dizer, Sr.ª Ministra, que o CDS foi, é e será sempre um entusiasta
do Simplex, da simplificação e da remoção de obstáculos.
Já agora, fazendo um parêntesis, queria recordar também que a remoção de obstáculos e a simplificação
não se esgotam só no mundo sem papel, no on-line e no digital. É um bocadinho mais — e não gostava de
deixar de lhe dizer isto, de resto sem apropriações, como ontem falávamos, Sr.ª Ministra. Não é disso que se
trata aqui. Não se trata de apropriações ou de outra coisa qualquer, trata-se de uma política que é essencial e
que é, sem sombra de dúvida, de continuidade — com nomes diferentes, sim, senhora, mas, seguramente, de
continuidade. Gostava de deixar isto claro.
Isto dito, e indo à questão mais particular que gostava de lhe deixar dentro desta amálgama da simplificação,
há algo que nos preocupa bastante e que é a remoção de obstáculos à atividade económica, que não parece
tão trabalhada neste Simplex+. Isto tem, obviamente, implicações, que não vou enunciar na totalidade, mas a
maior das quais é, obviamente, a criação líquida de emprego, de que tanto precisamos.
Nesse sentido, Sr.ª Ministra, gostava de lhe fazer uma pergunta acerca dos licenciamentos e de me ater a
esta área.
Em fevereiro, na audição com a Sr.ª Ministra a propósito da discussão do Orçamento do Estado, a respeito
precisamente da política de continuidade e de seguimento que esta maioria vem a dar nesta matéria ao trabalho
do Governo anterior, falei-lhe do LUA (Licenciamento Único Ambiental) e do RJACSR (Regime Jurídico das
Atividades de Comércio, Serviços e Restauração), entre outros licenciamentos, e a Sr.ª Ministra afirmou ter, à
época, uma visão muito crítica dos mesmos.
Vejo que evoluiu, pelo menos quanto ao LUA, mas cito o que disse, nessa altura: «Já mudámos os regimes
todos tantas vezes, mas, na verdade, ainda não fizemos aquilo que algum dia alguém terá de fazer, que é olhar
as regras todas — a do ambiental, a da obra, a do industrial — e ver se aquilo tudo bate certo e se no seu
conjunto o prazo é razoável. Porque só quando tenho essas licenças ou autorizações ou comunicações todas
feitas é que posso começar a laborar, e essa era a grande obra que era preciso continuar a fazer, em vez de se
andar a mexer nas regras.»
Por isso, pergunto-lhe, Sr.ª Ministra, onde está essa «grande obra» neste Simplex+. O que é que neste
Simplex+ foi feito para contrariar essa visão negativa que então demonstrou ter?
Francamente, na parte dedicada aos licenciamentos mais ágeis, vejo matérias relativas à atividade de
segurança privada, à carta do caçador, à mediação imobiliária, ao licenciamento de farmácias e de unidades de
saúde, salvo erro, ou de questões ligadas à saúde, ao licenciamento na área do medicamento, entre
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variadíssimos outros, e só no Balcão do Empreendedor+ vejo uma referência aos licenciamentos ambiental,
urbanístico e industrial, no sentido de se integrarem processos.
A pergunta que tenho para lhe fazer é a seguinte: o que é isto da integração de processos? De que é que
trata esta integração, Sr.ª Ministra? Se é o que se lê textualmente, parece curto, comparativamente, sobretudo,
com aquilo que disse em fevereiro passado, ou seja, que, em relação a estes licenciamentos, era uma «grande
obra» que tinha de se fazer, em vez de se andar a mexer nas regras.
Francamente, se a ideia e o objetivo, e é bom que seja, são os de continuar a remover restrições e
constrangimentos burocráticos e sem sentido à atividade económica não nos parece que este Simplex+ vá ao
encontro dessas preocupações.
Por isso, gostava de a ouvir sobre esta matéria.
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente: — Ainda, para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Machado, do
Grupo Parlamentar do PCP.
O Sr. Jorge Machado (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr.ª Ministra, o PCP está totalmente de
acordo com a necessidade de, efetivamente, modernizar e simplificar a Administração Pública e assim melhorar
a capacidade de resposta aos portugueses em serviços públicos fundamentais como a saúde, a educação ou a
segurança social.
Sr.ª Ministra, não podemos, contudo, deixar de registar um conjunto de preocupações. Questões como a
proteção dos dados, a necessidade de melhorar e de aumentar os serviços de proximidade, a insuficiência das
respostas à distância e a consciência de que este Simplex não resolve todos os problemas que os portugueses
enfrentam vão ser aprofundadas nas diferentes intervenções que o Grupo Parlamentar do PCP fará a seguir.
Neste momento, queria deixar-lhe três questões concretas.
Primeira, como vai este Governo concretizar este gigantesco caderno de encargos de 255 medidas, sabendo
que PSD e CDS-PP deixaram a Administração Pública com gigantescas lacunas, nomeadamente a nível de
recursos humanos?
Uma segunda questão, Sr.ª Ministra, diz respeito à constatação de que muitas das soluções apontadas para
os problemas identificados são de natureza informática e, portanto, são propostas soluções de criação de
aplicações, de software, de bases de dados e de plataformas informáticas. Como é que vai o Estado responder
a esta necessidade? Vamos insistir num percurso de recurso a entidades privadas? Qual vai ser a capacitação
do Estado relativamente a esta matéria? Porque isso é fundamental para assegurar a privacidade, a autonomia
e a independência do Estado, para não ficarmos nas mãos de privados que desenvolvem estas mesmas
respostas informáticas.
Por fim, Sr.ª Ministra, uma pergunta adicional que tem a ver com a constatação de que, muitas vezes, a
simplificação de processos, depois, também traz problemas no mundo real. A criação da solução Empresa na
Hora leva hoje à constatação do facto de que há vários créditos à segurança social, ao fisco que são ocultados,
dissipados, omitidos, da sua cobrança por via da criação de empresas na hora e em que há um fenómeno
particularmente grave dos créditos de trabalhadores que fogem claramente ao cumprimento das suas
obrigações. Portanto, é preciso ter alguma cautela e avaliar as soluções.
Perguntava-lhe, Sr.ª Ministra, qual é a ponderação que o Governo faz sobre esta realidade concreta.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Ministra da Presidência e da Modernização
Administrativa.
A Sr.ª Ministra da Presidência e da Modernização Administrativa: — Sr. Presidente, em primeiro lugar,
queria agradecer às Sr.as e aos Srs. Deputados todas as questões que colocaram e dizer que esperamos que
este não seja o último Simplex mas apenas o primeiro de uma série, de um esforço — aliás, já começámos a
trabalhar para podermos, daqui a um ano, apresentar ao País e perante esta Câmara outro programa.
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Naturalmente, como tenho dito sempre, e por isso a importância da continuidade, a simplificação e a
modernização administrativa não se fazem nem por decreto — infelizmente, porque para mim seria um grande
benefício —, nem por lei, nem apenas por um documento ou por um bom programa por melhor, mais abrangente,
mais aprofundado, mais ousado que ele seja, de uma só vez ou com uma só decisão. É infelizmente, ou
felizmente, um processo contínuo que exige até, muitas vezes, como vimos neste programa, revisitar medidas
que outrora já foram emblemáticas e com grande valor acrescentado na Administração Pública, situações
reconhecidas entre nós pelas empresas e reconhecidas internacionalmente por quem teve de nos avaliar.
É, pois, uma tarefa de continuidade, muitas vezes de rutura, com inovações — e inovação não é invenção,
dispenso-me aqui de fazer a distinção entre os dois conceitos porque as Sr.as e os Srs. Deputados devem saber
—, muitas vezes é feita por inovação incremental, ou seja, acrescentando novas funcionalidades e melhorando
funcionalidades existentes relativamente a plataformas que existiam há muito tempo.
Seria impensável pensar no IRS automático se a entrega das declarações do IRS não se pudesse fazer de
forma eletrónica ou se elas não tivessem, a partir de uma certa fase, que não foi na fase inicial, passado a ser
pré-preenchidas, ligando outras fontes de informação da Administração Pública que detêm a informação que
hoje aparece nas nossas declarações.
Portanto, é normal que estas situações sejam de continuidade nalguns casos e o importante é que as
medidas não sejam abandonadas.
Não queria olhar aqui para o passado, porque gosto de olhar para o futuro. O futuro é suficientemente
desafiante e dá-nos trabalho suficiente para não ocuparmos o nosso tempo a olhar para o passado.
Mas, se olhássemos para o passado, algumas das medidas que os jornais — e presumo que transmitem a
posição de alguns Srs. Deputados — vêm indicando como sendo medidas que eram do Governo anterior até já
eram medidas inscritas em Simplex anteriores, particularmente no último, que não chegou a ser executado.
A Sr.ª Hortense Martins (PS): — Muito bem!
A Sr.ª Ministra da Presidência e da Modernização Administrativa: — E eu podia dar aqui vários exemplos.
Não tem problema nenhum. Até fico contente que tenham tido continuidade.
Aplausos do PS.
Uma até foi o Prémio «Ideia Simplex», que consistia num conjunto de sugestões dadas por funcionários
públicos, as quais premiávamos e assumíamos a obrigação de incluir.
Fala-se no Licenciamento Único Ambiental. Sr. Deputado Jorge Paulo Oliveira, devo dizer que não foi por se
falar nesta medida que eu fui vê-la. Não, eu conhecia a medida e o regime. Até tive oportunidade, embora a
votação seja secreta, de votar sozinha num concurso em que participei há um ano para premiar esta medida,
porque, com a sensibilidade que tenho para as questões do licenciamento, achei que era um passo importante.
Infelizmente, não foi a vencedora, mas até tive oportunidade de a apreciar.
Mas fazer um regime ou, até, começar uma plataforma como aquela que existe, o Simulador, fica longe de
chegar ao fim. Era bom que já tivesse chegado ao fim, porque era um problema, como referiu a Sr.ª Deputada,
que estaria resolvido. Mas não está, Sr. Deputado! O Simulador tem 517 perguntas, repito, 517 perguntas. É
preciso simplificar, é preciso ver se são precisas essas perguntas.
A ligação do Sistema da Indústria Responsável, vulgo SIR, que esta Assembleia aprovou à parte ambiental,
que é um fator fundamental, como a Sr.ª Deputada Vânia Dias da Silva teve oportunidade de referir, só está feita
para os resíduos e para a prevenção de acidentes graves. Nos outros casos, remete para um PDF não editável.
É preciso mandar um e-mail para que se possa editar o PDF. São pequenos detalhes que mostram que estamos
muito longe — mas vamos lá chegar, e foi um bom princípio — de chegar ao fim.
Se não inscrevermos a medida, ela fica menos fiscalizada. O trabalho de cooperação que é preciso fazer
entre a Agência para a Modernização Administrativa e a APA (Associação Portuguesa do Ambiente) para
terminar esse trabalho fica menos fiscalizado. O compromisso público de terminar a medida não existe, como
não existiu em muitos casos do Governo anterior que aqui poderia referir, mas, como disse, gosto mais de olhar
para o futuro do que falar do passado.
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Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Sr.ª Ministra, está inscrito mais um conjunto de quatro Srs. Deputados para lhe pedir
esclarecimentos.
Tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Ferreira, do Grupo Parlamentar de Os Verdes.
O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados,
Sr.ª Ministra, antes de mais, Os Verdes gostariam de registar os esforços do Governo e, em particular, os
esforços do seu Ministério no sentido de tornar este processo o mais participado possível, o que é sempre de
louvar, porque, afinal de contas, ninguém melhor do que os destinatários das medidas saberão da sua
oportunidade e da sua pertinência.
Mas mais: sendo as medidas também resultado de sugestões de pessoas, de autarcas, das associações e
dos próprios trabalhadores e dirigentes da Administração Pública e da administração local, teremos, certamente,
mais garantias de sucesso quanto aos resultados dessas mesmas medidas.
Por outro lado, também sabemos que, quanto mais participado for o processo, mais democrático será e,
portanto, ficamos a ganhar duas vezes, ficamos a ganhar em duas dimensões diferentes.
Sr.ª Ministra, a ideia do Governo neste programa, no programa Simplex, pode ser sintetizado num esforço
para colocar o mais possível o relacionamento entre os cidadãos e o Estado à distância de um clique. Pretende-
se, assim, facilitar o relacionamento dos cidadãos com o Estado e com os serviços públicos que o Estado deve
prestar às pessoas.
Neste contexto, seria muito importante, por exemplo, que as pessoas pudessem tratar num único ponto,
numa única interação, tudo o que tenha a ver com um evento da sua vida, mas seria também imperioso
reorganizar os serviços públicos e dotá-los de meios, sobretudo humanos, para que possam estar dotados e
preparados para dar resposta às necessidades dos portugueses.
Para termos serviços públicos de qualidade importa agilizar, simplificar, desburocratizar.
Importa investir no digital e na capacidade para trabalhar em rede, aumentando o número de serviços on-
line, mas sem nos esquecermos de que há também muitas pessoas que continuam sem acesso aos meios
informáticos e que não podem ser ignorados neste programa.
Importa reduzir custos para quem lida com o Estado e importa melhorar a gestão da despesa pública.
Portanto, vamos esperar que este projeto tenha impactos positivos na vida das pessoas e que, ao mesmo
tempo, possa traduzir uma redução nos custos para a Administração Pública mas também que possa trazer
benefícios do ponto de vista ambiental, assim como do ponto de vista dos recursos naturais.
Nesse sentido, registamos a ambição do Governo de pretender já, para 2017, papel zero na Administração
Pública, o que seria um verdadeiro feito e um excelente contributo para o desenvolvimento sustentável que todos
desejamos, mas, Sr.ª Ministra, o resto do Simplex para a área do ambiente merece-nos algumas reservas e
algumas preocupações que não podemos, naturalmente, deixar de colocar.
Desde logo, porque a simplificação legislativa e administrativa não pode ser sinónimo de desregulamentação,
é preciso simplificar os procedimentos, mas de forma a garantir os objetivos que a lei pretende. A burocracia
deve ser combatida, mas esse combate não pode permitir legalizações automáticas de determinados
investimentos.
Sabemos que o ambiente não ficou a ganhar, por exemplo, com a implementação dos projetos de relevante
interesse nacional, os tais PIN, porque o argumento do crescimento e do turismo ou até dos projetos estratégicos
acabou apenas por ser um pretexto para passar por cima das regras ambientais.
Aliás, a propósito dos projetos PIN, dos projetos de relevante interesse nacional, o que constatamos é que
nos contratos de investimento os próprios promotores dos projetos acabam por impor ao próprio Estado que
ignore as exigências em matéria ambiental, o que não pode ser porque as regras ambientais têm de ser
respeitadas, sendo, aliás, para isso que existem.
Por exemplo, uma das peças mais importantes em toda a política ambiental é, sem dúvida, a avaliação de
impacto ambiental e, por isso mesmo, não pode ser colocada em causa, não pode ser fragilizada e muito menos
pode ser ignorada.
A primeira questão que tenho para lhe colocar, Sr.ª Ministra, tem exatamente a ver com esta matéria.
Queremos saber se a Sr.ª Ministra está em condições de nos garantir que o Simplex para a área do ambiente
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não significará desregulamentação, se não significará abreviar ou passar por cima das exigências ambientais
para os vários empreendimentos — e, quando falo dos empreendimentos, estou a referir-me, sobretudo, dos
empreendimentos turísticos. Acho que era importante que a Sr.ª Ministra nos pudesse dar agora garantias de
que, em matéria de ambiente, nada está em causa em termos de desregulamentação.
Sobre o calendário deste programa, a proposta do Governo é a de que este programa seja monitorizado até
maio de 2017. Gostava que a Sr.ª Ministra nos dissesse como vai ser feito esse trabalho de monitorização do
programa.
Por fim, também gostaria que a Sr.ª Ministra nos dissesse se há, no âmbito deste programa, algumas medidas
específicas previstas para as micro, pequenas e médias empresas.
Aplausos de Os Verdes e do PCP.
O Sr. Presidente: — Também para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Sá, do Grupo
Parlamentar do PCP.
O Sr. Paulo Sá (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr.ª Ministra, no programa Simplex+, o Governo
apresenta um conjunto de medidas para a área fiscal visando simplificar as obrigações declarativas dos
contribuintes.
Entre elas, gostaríamos de destacar a medida IRS automático, que tem como objetivo acabar gradualmente
com a necessidade de entrega da declaração de IRS para os contribuintes que apenas aufiram rendimentos de
trabalho dependente e de pensões.
O objetivo desta medida é, naturalmente, positivo, mas há questões que devem ser acauteladas. Há
informação que não está, à partida, na posse da Administração Tributária e que esta só a poderá obter se for o
contribuinte a fornecê-la. Refiro-me, em particular, a opções do contribuinte expressas na altura da apresentação
da declaração de IRS como, por exemplo, a opção por englobamento de rendimentos prediais e de capital ou a
opção de consignação de parte do imposto pago.
A concretização da medida IRS Automático deve, obviamente, manter a possibilidade de os contribuintes
exercerem estas e outras opções consagradas no Código do IRS.
Há ainda outra informação que a Administração Tributária não dispõe nem pode dispor se não for o
contribuinte a fornecê-la. Refiro-me, por exemplo, a rendimentos de trabalho dependente e de pensões obtidos
no estrangeiro. Tal circunstância obrigará sempre a uma intervenção do contribuinte no processo, não podendo
a Administração Tributária processar a declaração de IRS sem que previamente o contribuinte tenha a
oportunidade de declarar se há ou não rendimentos deste tipo.
Estamos certos de que o Governo não deixará de ter em conta estas questões na concretização da medida
IRS Automático, salvaguardando os diretos dos contribuintes.
Mas, Sr.ª Ministra, o objetivo meritório de simplificação na área fiscal não pode fazer esquecer a questão
política central, que é a necessidade de evoluir no sentido de uma política fiscal mais justa e adequada às
necessidades do País, em particular a necessidade de dar continuidade ao processo de reversão do brutal
aumento de impostos sobre os rendimentos do trabalho, levado a cabo pelo anterior Governo PSD/CDS,
processo iniciado neste ano com a extinção da sobretaxa extraordinária em sede de IRS.
Também não pode fazer esquecer a necessidade de aliviar fiscalmente as pequenas empresas e tributar de
forma adequada os grupos económicos, as grandes empresas e as grandes fortunas.
Sr.ª Ministra, não desvalorizamos as medidas fiscais do programa Simplex, mas muito mais importante é a
construção de uma nova política fiscal que, rompendo com o favorecimento do grande capital, permita aliviar a
carga fiscal que recai sobre os trabalhadores e o povo e que responda de forma mais adequada às necessidades
de desenvolvimento do País.
Aplausos do PCP e de Os Verdes.
O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Margarida Mano, do Grupo
Parlamentar do PSD.
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A Sr.ª Margarida Mano (PSD): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra, Srs. Secretários de Estado, Caros Colegas
Deputados, tivemos já oportunidade de manifestar à Sr.ª Ministra o quanto nos congratulamos com a bondade
dos objetivos e das medidas do Simplex. Tudo o que significar a simplificação de procedimentos da
Administração Pública portuguesa ou a aposta no digital e nas novas tecnologias, contribuindo para uma maior
acessibilidade e transparência dos cidadãos face ao Estado, é bom.
No domínio da modernização administrativa, estamos numa área de convergência política em Portugal, onde
a linha de continuidade é inequívoca, onde não apenas os governos, através dos programas que lançam — o
Simplex, o Aproximar ou o Simplificar —, mas também os organismos com missão específica, como a AMA
(Agência para a Modernização Administrativa) e, muito em particular, os dirigentes da Administração Pública,
das autarquias, dos institutos e dos diferentes serviços, vão construindo boas práticas, vão procurando parceiros
e financiamentos para fazer diferente, para fazer melhor, tornando-se, deste modo, corresponsáveis pelos
sucessos conseguidos no terreno.
Somos o que repetidamente fazemos. Por isso, muitas das medidas que agora se apresentam, como, de
resto, foi dito por todos e também pela Sr.ª Ministra, traduzem bem uma ideia de evolução. É o caso do já citado
IRS Automático, um excelente exemplo na área fiscal, onde muito foi necessário, desde o fazer eletrónico das
declarações de rendimentos, com o Dr. Paulo Macedo à frente da Administração Tributária, até à e-fatura,
acrescentada nos anos mais recentes pelo XIX Governo, sem o que não seria possível a medida agora
anunciada.
Um outro exemplo na área da saúde é o da Receita Sem Papel Plus, onde muito se fez na desmaterialização
da receita de medicamentos, através dos acessos eletrónicos autenticados e onde a Portaria n.º 224/2015, de
27 de julho, regulamenta a implementação de todo o circuito da Receita Sem Papel, prescrição, dispensa e
faturação.
Evoluir sempre é o principal segredo. A modernização administrativa é amplamente consensual; não é,
seguramente, o que nos separa, é, antes, o que nos aproxima.
O documento apresentado é ambicioso, as medidas estão calendarizadas, contudo nada é dito relativamente
aos custos. Será, seguramente, necessário um significativo investimento inicial, mesmo que com participação
nacional de fundos europeus. A questão que coloco é a de saber quanto custa, quanto se poupará relativamente
ao anunciado pelo Governo para este ano, como serão feitas as escolhas para a poupança, quais os orçamentos
que suportarão a despesa. São perguntas que gostaríamos de ver respondidas.
Para concluir, gostaria de reiterar que não pode e não deve, contudo, a modernização administrativa ser
confundida com a reforma do Estado. A modernização é, ou pode ser, um instrumento de reforma do Estado
tanto ou mais importante quanto for alavancada numa cultura de serviço público, vivida pelas pessoas, mas não
é a reforma do Estado.
A reforma do Estado, que beneficia de medidas concretas efetivas que, felizmente, vão acontecendo, quer
ao nível da modernização administrativa, quer a outros níveis, exige a força de um consenso mais ou menos
alargado e o foco numa visão clara do que é ou do que deve ser uma Administração Pública transparente, que
utiliza bem os dinheiros públicos e deles presta contas e que é eficaz na resposta às expectativas de serviço
público a que os cidadãos podem, e devem, em liberdade e democracia, sustentavelmente aspirar.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado João Ramos, do Grupo
Parlamentar do PCP.
O Sr. João Ramos (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Secretários de Estado, Sr.ª Ministra da
Presidência e da Modernização Administrativa, gostava de trazer aqui uma preocupação e um alerta neste
processo.
O programa Simplex propõe simplificar, agilizar as relações com a Administração Pública. Com este
programa, pretende-se e propõe-se também a desmaterialização de processos. Existe um risco, que já ocorreu
noutros programas, em que, ao simplificar, ao desmaterializar os processos, acabam também por se
desmaterializar, anular e encerrar os serviços públicos de proximidade.
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Certamente que estas medidas facilitarão as relações de muitos portugueses com os serviços públicos, mas
há muitos portugueses que continuarão a precisar da existência de serviços públicos de proximidade. Trago o
exemplo, que gostava de referir, do Ministério da Agricultura, onde os serviços de proximidade não servem
apenas de ponto de contacto entre os agricultores e a Administração Pública, mas têm também importantes
funções em matéria de gestão de processos, de processamento de candidaturas e de pagamentos e têm, ou
deveriam ter, funções de apoio técnico.
Anteriores programas de modernização administrativa levaram à perda da capacidade de intervenção destes
serviços públicos de proximidade, que não foram substituídos por qualquer outra estrutura.
Por isso, este problema não é exclusivo destes serviços do Ministério da Agricultura, é um problema
transversal a muitos outros serviços.
Sr.ª Ministra, sendo o objetivo do Simplex 2016 modernizar a forma como são prestados os serviços públicos
e, outro dos objetivos, a poupança em termos financeiros, gostava de saber se estão salvaguardados a
manutenção e o reforço de serviços públicos de proximidade com funções não substituíveis por outros modelos
de modernização e em locais e setores em que os cidadãos precisam de serviços para interagir com a
Administração Pública.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Ministra da Presidência e da Modernização
Administrativa Maria Manuel Leitão Marques.
A Sr.ª Ministra da Presidência e da Modernização Administrativa: — Sr. Presidente, Sr.as e Srs.
Deputados, foram colocadas várias questões, nesta e na anterior série de perguntas, a que não tive oportunidade
de responder.
Sr. Deputado do Bloco de Esquerda, quero dizer-lhe que a essa disposição sobre normas abertas, que foi
uma das últimas pela qual me empenhei no governo anterior de que fiz parte e por isso sei, em detalhe, a
dificuldade que houve para ser aprovada nesta Assembleia da República, darei sempre toda a atenção.
É natural que neste programa não encontre, porque em alguns casos ainda não dispomos dessa informação,
a metodologia, o software, o que será utilizado para desenvolver e executar algumas destas medidas, mas
estamos a trabalhar, conjuntamente, aliás, com todos os meios e organismos informáticos da Administração
Pública, no seguimento do que foi uma iniciativa do governo de que fiz parte, designada por GPTIC (Grupo de
Projeto para as Tecnologias de Informação e Comunicação), que agora alterámos um pouco, mas é apenas
uma alteração normal da evolução do trabalho feito, para partilhar recursos e, naturalmente, economizar meios,
porque os custos são, obviamente, para nós, Sr.ª Deputada, uma preocupação.
Queria também dizer, como ontem tive a oportunidade de dizer na 1.ª Comissão, que, obviamente,
respeitaremos a privacidade e a proteção dos dados, nos termos das leis existentes, mas pensamos que essa
é uma reflexão que todos deveríamos fazer no futuro, sobre se encontramos meios que permitam compatibilizar
melhor a modernização administrativa e a proteção de dados adequados ao que existe e àquilo que são os
dados no século XXI, que não são exatamente o mesmo que eram no século XX, em termos de exposição e de
proteção.
Sr.ª Deputada, há bocado não lhe respondi, mas, obviamente, o Balcão do Empreendedor+ é a nossa
abordagem, como sempre disse e volto a dizer, uma abordagem integrada num só balcão que, depois, liga e
integra diversas plataformas, desde a plataforma daquilo que era o Licenciamento Zero, ao industrial, à parte
ambiental e, obviamente, à mais difícil, que é a ligação à obra, dada a sua descentralização.
Esse caminho faz-se caminhando. É um caminho difícil, mas esperamos ter tempo de lá chegar e de
encontrar aquilo que, como lhe disse, é a minha visão e creio que também é a visão das empresas em matéria
de licenciamentos. A maneira de alterarmos essa perceção e de completarmos um caminho de reforma de
regimes, às vezes, é andando um bocadinho para trás, mas não vou entrar nessa informação, porque não tenho
tempo para responder em detalhe, mas, naturalmente, estou à disposição da Sr.ª Deputada para esse efeito.
Quero dizer também que, quando criamos ou quando dispomos de serviços de forma eletrónica e on-line, às
vezes, isso não é pensado, mas estamos sempre a facilitar o acesso, e até um acesso com maior proximidade,
mesmo que muitas vezes mediado, como acontece nos Espaços do Cidadão, que é uma excelente iniciativa, a
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cidadãos que não podem, não sabem ou não têm acesso a fazer ou a usar meios eletrónicos. Isso deve ser
sempre uma preocupação. Tenho dito, e repito, que ninguém deve ser deixado de fora e que deve haver um
esforço, porque hoje as tecnologias são mais amigáveis, para que todos possam aceder da forma mais cómoda,
que é através do nosso telefone, por assim dizer. Mas, enquanto isso não acontecer, esses cidadãos têm de ter
acesso em condições de igualdade.
Peço ao Sr. Presidente autorização para que a Sr.ª Secretária de Estado Ajunta e da Modernização
Administrativa use da palavra a fim de esclarecer mais algumas das questões que aqui foram colocadas.
O Sr. Presidente: — Com certeza, Sr.ª Ministra.
Sr.ª Secretária de Estado, tem a palavra.
A Sr.ª Secretária de Estado Adjunta e da Modernização Administrativa (Graça Fonseca): — Sr.
Presidente e Sr.as e Srs. Deputados, gostaria de esclarecer algumas das questões aqui colocadas, e vou
começar pelas que foram levantadas pelo PCP e pelo Bloco de Esquerda.
Já no passado aqui foi colocada a questão sobre o software aberto e os dados abertos, e hoje foi novamente
colocada, e eu tenho sempre muito gosto em responder.
Há várias medidas do Simplex que não estão declaradamente assim ditas, mas pressupõem que irão ser
construídas não só com dados abertos como também com software livre. Aliás, o próprio site do Simplex, se o
Sr. Deputado quiser pode consultar, hoje em dia já tem uma área de dados abertos, precisamente para que
possa ser utilizada por todos, e foi construído num software aberto. Portanto, o próprio site do Simplex começou,
se quiser, com essa «cultura», precisamente para promover que outros possam seguir-se-lhe, e vamos fazê-lo
noutras medidas.
Como é que o Simplex vai ser implementado? Ontem também falámos sobre isso em sede de Comissão e,
nessa altura, tive a oportunidade de dizer que é, de facto, um caderno de encargos bastante pesado, pois são
255 medidas e algumas delas bastante complexas. E sabemos bem como é importante, e o Sr. Deputado
também referiu, envolver os dirigentes e os funcionários da Administração Pública. Foi assim que começámos
a construir o Simplex. Recordo, nunca é demais fazê-lo, que 147 das 255 medidas têm origem nos funcionários
e nos dirigentes da Administração Pública, e este é o caminho que temos de seguir.
Há algo que, para nós, é absolutamente evidente: se não começarmos no dia zero a construir um Simplex e
se não houver esta dinâmica com os funcionários, com as pessoas que no dia a dia dão a cara em nome do
Estado nos serviços públicos, se não as envolvemos nas soluções, o Simplex nunca terá qualquer capacidade
para poder ser implementado. Portanto, vamos fazê-lo com todos e temos esperança de que, com esta dinâmica
que criámos desde o início, irá ser possível implementar esse caderno de encargos, e, naturalmente, contamos
também com todos os Srs. Deputados.
Também se colocou a questão das PME (pequenas e médias empresas), a de haver medidas para as PME.
Há várias medidas no Simplex dirigidas especificamente a micro, pequenas e médias empresas. Destaco uma,
que tem sido aqui falada algumas vezes, que é a simplificação de todo o regime de ourivesaria e contrastaria,
que vem do anterior Governo. É uma das áreas que temos vindo a trabalhar com os vários parceiros. Há muitas
micro, pequenas e médias empresas que estão numa situação muito complicada, precisamente por este regime
jurídico, e estamos a trabalhar com os parceiros para simplificar o regime e, assim, podermos aliviar algumas
destas empresas.
Finalmente, quanto à questão do IRS automático, já tive a oportunidade de dizer, várias vezes, e repito, que
o IRS automático será implementado de forma gradual, como aqui foi referido, com a garantia de que todas as
garantias que hoje em dia os contribuintes têm serão mantidas. Costumo dar o exemplo das declarações pré-
preenchidas, que, quando foram iniciadas, também se colocaram muitas questões, designadamente sobre se
seria possível reclamar dos dados e das informações constantes da declaração pré-preenchida, e, hoje em dia,
é uma realidade com a qual todos convivemos de forma relativamente tranquila, porque, sempre que há erros
ou inexatidões, há a possibilidade de se poder reclamar. Portanto, assim será feito também quanto ao IRS
automático.
Aplausos do PS.
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Entretanto, assumiu a presidência o Vice-Presidente José Manuel Pureza.
O Sr. Presidente: — Entramos, agora, na fase do debate e, para uma primeira intervenção, tem a palavra a
Sr.ª Deputada Hortense Martins, do Partido Socialista.
A Sr.ª Hortense Martins (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O programa Simplex foi criado em
2006 e já era, de facto, uma marca interiorizada como algo valioso e que correspondia a desburocratização para
a maioria das empresas e dos portugueses. Uma marca reconhecida pela própria OCDE em 2008 e, como
sabemos, não podemos estar sempre a recomeçar do zero. Este, aliás, é o compromisso deste Governo e que
a Sr.ª Ministra Maria Manuel Leitão Marques aqui já referenciou várias vezes.
Por isso, esta luta sobre a «paternidade» de algumas medidas é, permitam-me dizer-vos, um pouco ridícula,
por aquilo que representa. Seria talvez preferível que a oposição se dedicasse a analisar e a dar sugestões
sobre a forma como melhorar a vida das empresas e dos nossos concidadãos.
Como vimos e bem sabemos, os factos são claros e, se há algumas medidas em que o anterior Governo já
tinha iniciado o processo, como a Escola 360º, muito faltava ainda fazer para que se pudesse dizer que o objetivo
desta medida estivesse de facto a funcionar em pleno. Por outro lado, seria condenável que se deitasse fora
uma ideia, mesmo que apenas existisse enquanto tal, que fosse considerada boa, ou seja, que não fosse
implementada só porque era «cor laranja» e não «cor-de-rosa».
Mas não foi isso, nunca, que este Governo assumiu. Este Governo sempre assumiu a continuidade das boas
medidas, ao contrário do que o anterior Governo fez.
Aplausos do PS.
Esta atitude de desvalorizar o que foi feito no Simplex em 2006 e o que foi feito agora na apresentação do
Simplex+2016 não é um bom caminho. De facto, é uma desvalorização que fica sem razão, porque sabemos
que até internacionalmente, também no passado, esse Simplex já tinha sido valorizado e que o documento de
trabalho da Comissão Europeia Country Report Portugal 2016, publicado em fevereiro, dizia: «Portugal continua
a ter grandes encargos regulatórios em matéria de negócios. O progresso foi lento em 2015 e limitado à
administração central». E ainda: «As fragilidades do ambiente de negócios são o principal obstáculo ao
crescimento económico e a uma mais eficiente alocação dos recursos. As barreiras regulatórias e uma fraca
capacidade institucional dificultam o processo de alocação de recursos visando um aumento da produtividade».
Diz mais, diz que, no que respeita ao registo de um negócio, isso é fácil, mas o licenciamento continua
pesado, e nós sabemos que, em muitas matérias, houve mesmo retrocesso.
A excessiva complexidade e a imprevisibilidade dos procedimentos administrativos são preocupações das
empresas portuguesas.
E, perante estes problemas, o Governo do PS fez muito bem em voltar a dar prioridade ao Simplex, como
está estabelecido no nosso programa. Era urgente fazê-lo e, por isso, o Governo e, nomeadamente a Sr.ª
Ministra e os Srs. Secretários de Estado, fizeram todo este trabalho que configura o Simplex+ baseado num
processo de auscultação que nós também reconhecemos, na proximidade com as pessoas, com as empresas
e com os funcionários públicos, com quem trabalha nos assuntos e sabe o que é necessário e o que deve ser
alterado. E este processo foi também uma metodologia que foi implementada e que foi interrompida.
Queria ainda dizer-vos, Sr.as e Srs. Deputados, que Portugal caiu três posições no ranking mundial da
competitividade, ocupando, neste momento, o 39.º lugar…
O Sr. António Leitão Amaro (PSD): — Caiu este ano!
A Sr.ª Hortense Martins (PS): — … e o índice que mais caiu foi o da eficiência dos organismos públicos, é
este que apresenta a maior queda, passando do 34.º lugar para o 48.º lugar.
Ora temos aqui uma evidência de algo que tem de ser invertido. De facto, a desvalorização e a desmotivação
da Administração Pública é, sem dúvida, algo a que não foi alheio e que tem uma influência e uma correlação
diretas neste índice, e nós também temos de reverter isso, estando o Governo a implementar medidas para,
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ouvindo a Administração Pública, incentivar e motivar os nossos funcionários públicos, de modo a aproveitar os
seus conhecimentos.
O processo de continuidade é essencial. Sr.as e Srs. Deputados, temos consciência de que o nosso tecido
empresarial é, sobretudo, constituído por pequenas e médias empresas. A própria Comissão Europeia há muito
que determinou que deve legislar-se tendo em conta isso mesmo.
Por isso, a simplificação legislativa é essencial, e simplificar não é desregular. Simplificar, tendo em conta os
custos que determinada legislação tem em termos de impacto, é necessário para, com isso, reforçarmos a
competitividade das nossas empresas e ajudarmos à criação de emprego. O acesso dos cidadãos à legislação
tem de ser garantido aos cidadãos e às empresas, através de algo gratuito e oficial, como o acesso ao Portal
do Diário da República, porque é necessário que os cidadãos cumpram a lei, e, para isso, também é necessário
facilitar-lhes o conhecimento da própria lei.
Relevo, ainda, as muitas medidas em termos fiscais e de acesso da população menos informada e menos
dotada de conhecimentos tecnológicos. A Sr.ª Ministra fez muito bem em ter começado a sua intervenção a falar
disso.
Termino, Sr.as e Srs. Deputados, fazendo uma sugestão que acho que também é essencial: a adequada
calendarização das obrigações fiscais para que os profissionais de contabilidade, que há muito o reclamam,
também possam ter facilidade no cumprimento das suas obrigações fiscais.
E, Sr.as e Srs. Deputados, ainda recentemente foi dito que, no futuro, os governos devem ter em conta este
programa, que é exatamente o que os governos precisam. É necessário ter em conta que há muito a ganhar
com o exemplo de Portugal.
Por isso, com trabalho, vontade e competência podemos, sim, ter menos custos de contexto, menos
burocracia e melhor e mais emprego.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Paulino
Ascenção.
O Sr. Paulino Ascenção (BE): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: A
modernização do funcionamento do Estado é algo fundamental para a qualidade dos serviços públicos
oferecidos à população e para a qualidade da nossa democracia.
As medidas do Simplex 2016 merecem-nos, em geral, uma avaliação positiva, tendo em conta o seu
contributo para melhorar a relação quotidiana entre os cidadãos e a Administração, tornando-a mais amigável e
combatendo a realidade de uma Administração pesada, labiríntica, impositiva e mesmo agressiva para com a
generalidade dos cidadãos.
O Provedor de Justiça, em entrevista publicada ontem, queixava-se da frieza excessiva da máquina do
Estado perante os cidadãos, que são pessoas e não números e que, portanto, não podem ser tratados apenas
como números.
O benefício trazido pelas tecnologias da informação e da comunicação deve ser aproveitado ao máximo para
este objetivo estratégico, salvaguardando sempre a fragilidade especial de muitas cidadãs e de muitos cidadãos,
sobretudo de estratos sociais mais pobres e de zonas geográficas mais isoladas, para os quais a proximidade
física — e não apenas a virtual — da Administração constitui uma exigência vital.
O Bloco de Esquerda gostaria de centrar a sua avaliação neste debate num ponto de grande importância. É
muito significativa a grande quantidade de medidas do Simplex com origem em contributos de funcionários
públicos. Como já foi referido pela Sr.ª Secretária de Estado, 147 das 255 medidas tiveram origem em
contributos de funcionários públicos.
Este facto muito relevante vem desmentir a ideia de que os funcionários públicos são um problema para o
País, a imagem de funcionários preguiçosos e improdutivos. Com esta resposta, estes funcionários dizem
«presente» e demonstram que são cidadãos empenhados e que querem participar na construção de um País
melhor.
O problema é a forma como têm sido tratados: com desdém, humilhados, ofendidos na sua dignidade e brio
profissional, em particular sob o anterior Governo PSD/CDS.
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Saudamos o acolhimento de medidas propostas pela nossa bancada, em particular o kit de boas-vindas aos
refugiados.
Conforme informou a Sr.a Secretária de Estado, na Comissão de Orçamento, Finanças e Modernização
Administrativa, houve alguém de entre os funcionários públicos a afirmar ter sido esta a primeira vez, após 30
anos em funções, que foi questionada sobre o funcionamento do seu serviço.
Este caminho, de fomentar a participação dos funcionários na gestão dos serviços, incluindo na avaliação
das chefias, e também a participação dos utentes na avaliaçãodos serviços, é o caminho correto para termos
uma Administração Pública mais eficaz, amigável, participada e transparente, com funcionários motivados e
produtivos.
É necessário fomentar uma cultura participativa, de serviço aos cidadãos, às comunidades, e combater a
cultura autoritária, da prepotência, que é terreno fértil para o compadrio e para a corrupção.
Vemos o PSD preocupado com o custo das medidas propostas no Simplex. Com certeza, essa é uma
avaliação que deve ser feita, aliás, é fundamental avaliar os custos e os benefícios. Mas haja coerência: é
extraordinário que o PSD manifeste essa preocupação de avaliar custos, quando se trata de investir na
modernização do funcionamento do Estado, pois, quando se tratou de destruir serviços públicos para entregá-
los a privados, essa preocupação foi dispensada.
Quando o anterior Governo,por exemplo, celebrou contratos de associação com colégios privados em locais
onde não havia necessidade, por existir oferta suficiente da escola pública, não houve qualquer avaliação
custo/benefício.
Mas, agora, quando se pretende racionalizar a utilização desse instrumento,a direita já vem exigir a
realização desses estudos!
Para esta direita liberal, o Estado é mau. Ponto! Os privados gerem sempre melhor. Ponto! Qualquer
avaliação é desnecessária e inconveniente, porque pode desmentir essa fé absoluta nos mercados.
O que o PSD e CDS querem é desmantelar os serviços públicos e privatizá-los e, portanto, não interessa
que a Administração Pública funcione melhor, seja mais eficaz, tenha mais qualidade. Não interessa, porque
isso prejudica o objetivo da privatização. O PSD e o CDS integram esse estranho movimento intitulado «Em
defesa dos privados. Ponto!».
Por isso, não deram continuidade ao programa Simplex, durante o anterior Governo, e desvalorizam o
anterior programa.
Protestos da Deputada do CDS-PP Cecília Meireles.
Uma palavra para os centros de competências e o papel importante que podem ter para reduzir gastos do
Estado com consultorias, estudos e pareceres externos, que tantas vezes têm a gaveta como destino. Aqui
encontramos muitas «gorduras» na despesa pública, que importa cortar.
Quem conhece melhor o funcionamento da Administração Pública é quem lá trabalha, que deve ser
valorizado, assim como as suas competências. O Estado dispõe de técnicos altamente qualificados que, bem
geridos, podem responder a muitas das necessidades que dão lugar a contratação externa.
Alega-se que a Administração não tem as competências necessárias para determinado estudo ou projeto,
mas, depois, o que encontramos são consultoras privadas que incorporam, nas suas equipas, funcionários do
próprio Estado e, eventualmente, de outros organismos.
É sintomático os privados contratados para suprir as insuficiências do Estado socorrerem-se de funcionários
do Estado para executarem as tarefas para que são chamados. Ora, a Administração Pública tem de ser capaz
de fazer esta intermediação, de levar as competências que estão disponíveis aonde fazem falta.
É necessário criar mecanismos que rompam com a lógica das «capelinhas», que mina o funcionamento da
Administração Pública.
Impõe-se, por isso, fomentar os centros de competências, valorizá-los, torná-los em laboratórios de inovação
de procedimentos, numa cultura institucional de excelência no sector público, juntando o saber dos organismos
e dos seus funcionários com o conhecimento mais inovador da academia e de outros agentes da sociedade.
Aplausos do BE.
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O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Cecília
Meireles.
A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra, Sr.ª e Srs. Secretários de Estado, Sr.as e
Srs. Deputados: Já aqui foi dito, mas será talvez importante neste momento do debate repetir, que o CDS
concorda com a finalidade da simplificação. E eu acho, particularmente, necessário referi-lo neste momento,
porque a verdade é que, de entre as bancadas que apoiam o seu Governo, Sr.ª Ministra, da bancada do PS eu
vi algum entusiasmo, embora, também lhe diga, Sr.ª Ministra, não tanto quanto aquele que é demonstrado no
ataque a estas bancadas. Agora, dali, da parte do PCP, do BE e de Os Verdes, a palavra que mais ouvi foi
«mas», em frases do género: «Nós até achamos que é bom, mas é preciso ter cuidado», «Nós até achamos
que é bom, mas não se pode fazer isto…, mas não se pode fazer aquilo…, mas é preciso ter cautela…». Bom,
é preciso é que tudo, na cabeça de VV. Ex.as, continue exatamente como está. Ora, este programa, suponho
eu, é precisamente para descomplicar, para simplificar. E, nesse sentido, naquilo que o é verdadeiramente, terá,
com certeza, o nosso apoio.
Em segundo lugar, porque simplificar é um objetivo e porque importa perceber se o programa corresponde,
ou não, a esse objetivo, gostava de fazer perguntas sobre dois pontos fundamentais.
Primeiro, sobre a opção pelo on-line, e aqui parece que todos estarão mais ou menos de acordo, eu gostava
de lembrar que on-line não é necessariamente mais simples, não é necessariamente descomplicar, e que a
permanência de uma cultura de «quintas» na Administração Pública traz alguns problemas.
Sr.ª Ministra, sobre as medidas que criam, desenvolvem ou atualizam um portal, temos: Portal do Beneficiário
Militar; Portal Imobiliário Público; Licenciar farmácias+ simples; Ensaios clínicos digitais; Dacultura; Certificados
de autorização do medicamento on-line; Novo Portal de Serviços Camões+ acessível; Porta Única do ICNF;
Portal das Exportações; Portal das Finanças+; Portal das Instituições de Memória da Defesa; Portal do
Cidadão+; Portal do Governo+; Portal do Turismo+.
Ora, pergunto se há alguma estratégia integrada de todas estas criações.
E não nos ficamos por aqui, porque, depois, temos as plataformas. Passo a ler: Plataforma da aquicultura;
Plataforma Renda Apoiada; e-balcão do artista; Cédula Profissional Eletrónica da Saúde; Registo Criminal on-
line; Plataforma do Mar; Catálogo de produtos de apoio para pessoas com deficiência e incapacidade; e-
classificação de filmes; Pedido on-line da apostila; Património cultural do Estado para eventos; Planeamento
Territorial on-line; i-FAMA; Instituto do Cinema e do Audiovisual digital; Janela Única Aduaneira; Livro Amarelo
Eletrónico.
Isto não é uma crítica, Sr.ª Ministra, mas olhando assim, convenhamos que não é mais simples, não parece
um todo construído. E essa é que é a pergunta: não valeria a pena analisar — e já que a Sr.ª Ministra tanto falou
em reforma do Estado e que isto era a verdadeira reforma do Estado, tema que, depois, mais à frente,
poderemos discutir, porque creio que não é — e criar alguma coisa que fosse um todo coerente? Eu acredito
que a Sr.ª Ministra tenha feito esse esforço, mas, com franqueza, quem lê o que aqui está e quem vê todas
estas plataformas e portais — e nem sequer fui às aplicações, que também são 10 —, não achará que há aqui
uma certa confusão, em vez de simplificação?!
O Sr. António Filipe (PCP): — Não é preciso ir a todas! Basta ir aonde se precisa!
A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — É que, mais uma vez, Sr.ª Ministra, on-line não é necessariamente
mais simples.
E sobretudo, de duas, uma: ou nós queremos fazer este esforço do on-line em todo o lado — e há aqui portais
que são transversais, como é o caso do Portal do Cidadão ou do Portal do Governo, e há os que são específicos,
como o das Exportações, o das Finanças ou o do Turismo, e há outros que são muito pequeninos e muito
direcionados —, ou há um estudo para se perceber em que lado se justifica, porque, caso contrário, fica a
sensação de que houve serviços que aderiram com muito entusiasmo àquilo que foi o plano da Sr.ª Ministra e
que houve outros serviços que, enfim, lá partilharão mais das convicções dos vossos colegas de coligação e
estão um pouco mais renitentes, até porque há sempre a questão da perda dos pequenos poderes, que ninguém
quer e muitas vezes esta integração implica isso.
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Portanto, deixava aqui, diria, quase um alerta para o facto de o Simplex poder ser um bocadinho
«complicadex», do ponto de vista on-line.
Depois, quero também perguntar-lhe o seguinte: escolhendo o exemplo de duas medidas — e creio que, na
fase de encerramento, se não lhe restar tempo, como não resta, e se não o obtiver por outra forma, poderá
responder —, a saber, o Livro Amarelo Eletrónico, que é basicamente uma plataforma de submissão e gestão
de elogios, sugestões e reclamações, e outra medida que é o Atendimento público avaliado,…
A Sr.ª Secretária de Estado Adjunta e da Modernização Administrativa: — Elas não são iguais!
A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Eu sei que elas não são iguais, mas acho que são muito conexas.
O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Queira terminar, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Com certeza, Sr. Presidente.
O que pergunto é se não fará mais sentido avaliá-las em conjunto do que adotar este método, em que ficamos
com um catálogo imenso de medidas, e, com franqueza, elas são um bocadinho parecidas umas com as outras.
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António
Leitão Amaro.
O Sr. António Leitão Amaro (PSD): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra, Sr.ª e Srs. Secretários de Estado, Sr.as
e Srs. Deputados: Há 25 anos que vários Governos promovem a modernização administrativa, que tomam
medidas de simplificação. Mas será que estão sempre, na sua atividade política global, a pôr o cidadão no centro
das políticas públicas?
A modernização administrativa, felizmente, tem sido uma área de continuidade — e saúdo a Sr.ª Ministra por
manter esta continuidade.
Este Governo segue muitas medidas do anterior Governo do PSD/CDS, tal como o anterior Governo também
prosseguiu medidas do anterior Governo socialista e este do anterior Governo do PSD. E esta continuidade é
boa porque a modernização administrativa é importante para os cidadãos.
Estamos ou não a favor deste Simplex? Sim, estamos! Como não estaríamos se ele, em grande medida e
em grande parte, é uma continuidade, é continuar a implementação, é continuar a execução de medidas, que
nós próprios, PSD, no último Governo, lançámos, preparámos, fizemos, implementámos?!
Sim, este Simplex é um meritório ato de propaganda do que é essencialmente continuidade e também de
algumas medidas novas e importantes.
Sim, para que não haja ambiguidades, o PSD saúda o Governo e a Sr.ª Ministra por esta iniciativa e por dar
continuidade às políticas de modernização administrativa. É bom que o façam quando querem abrir em Paris
mais um Espaço do Cidadão, produto criado pelo Governo anterior e que já instalou 400 em todo o País, ou
quando prosseguem o Título Único Ambiental, que o anterior Governo lançou, criou e desenvolveu, ou quando
chamam «Escola 360º» ao Portal Escola, que o anterior Governo criou, acrescentando-lhe algumas facilidades
adicionais. Poderia continuar a referir as 16 medidas mais importantes, em que cerca de metade foram criadas
pelo Governo anterior e que estão a ter continuidade, ou poderia referir as outras medidas que apresentam, para
além das do top 16, onde há dezenas de continuidade, mas prefiro elogiar a continuidade e a aposta comum
que nos une na modernização administrativa.
Sim, o Governo anterior fez muito com o Portal do Cidadão — há mais de 400 Espaços do Cidadão que os
portugueses, em todo o País, já podem beneficiar —, com o e-fatura, a digitalização dos serviços de saúde, o
Mapa do Cidadão, a simplificação e a desburocratização enorme nas principais áreas de atividade económica,
industrial, comercial, ambiental e também no turismo. Sim, isto foi feito muito antes e eu desejo que o Governo
continue.
Mas este Simplex é suficiente? Este Simplex é suficiente para podermos dizer que o Governo está a colocar
o cidadão no centro das políticas públicas? Não acredito!
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Na verdade, fico muitas vezes com a sensação de que a Sr.ª Ministra, com a sua capacidade, que eu
reconheço, está sozinha num Governo que tem um objetivo diferente. Perdoe-me a graça, mas parece, muitas
vezes, o Dom Quixote a lutar contra moinhos de vento, sendo esses moinhos de vento o contravento que os
seus colegas do Governo fazem.
A Sr.ª HortenseMartins (PS): — Sabe do que fala!
O Sr. AntónioLeitãoAmaro (PSD): — Por que é que eu digo isto? Porque na modernização administrativa
deve ser o Estado a reorganizar-se a favor do cidadão. Não podem ser os cidadãos, na sua qualidade de utente
e contribuinte, a perderem e a terem de se ajustar ao caminho que, afinal, e vejamos, este Governo está a fazer
a pensar, sim, no Estado, a pensar, sim, no seu alargamento e não no verdadeiro serviço ao cidadão.
Expliquem como é que se coloca o cidadão no centro da política pública quando, ainda hoje, a maioria das
esquerdas, para satisfazer o seu acordo, decidiu que os serviços públicos poderiam fechar mais cedo e os
cidadãos poderiam ter menos tempo de atendimento ao dar a alguns trabalhadores um horário de trabalho
menor do que aquele que a maioria dos trabalhadores portugueses tem de cumprir.
O Sr. JorgePauloOliveira (PSD): — Muito bem!
O Sr. AntónioLeitãoAmaro (PSD): — Como é que estão a colocar os cidadãos no centro das políticas
públicas quando restringem a provisão pública de serviços essenciais como a saúde e a educação — sim! —,
quando obrigam o cidadão utente a passar para um serviço de menor qualidade ou quando obrigam o cidadão
contribuinte a pagar mais? Para quê? Para que o Governo cumpra o seu compromisso das esquerdas do
monopólio público e proteja corporações.
Como é que se está a colocar o cidadão no centro das políticas públicas quando, designadamente, cedem a
interesses corporativos — sim! —, quando, por exemplo, aceitam abrandar a atividade nos portos ou voltar a
trazer para a esfera do bolso dos contribuintes ineficiências na gestão dos sistemas de transportes das áreas
de Lisboa e do Porto?
Modernizar o Estado também é digitalizar e simplificar, mas é cortar burocracias, é rejeitar interesses
corporativos, sejam eles privados ou públicos. O Estado não pode proteger nenhum interesse corporativo.
Olhando para este Governo, e com a exceção da Sr.ª Ministra, o que é que vemos? Eu vejo um Estado
aumentar à custa do cidadão, os cidadãos a perderem qualidade nos serviços. Vejo as empresas a terem mais
custos de contexto e menos condições para investir, e, vejam, a realidade já mostra isso mesmo. Quem paga?
Os cidadãos!
Nós, no PSD, acreditamos no papel do Estado e fizemos muito para que tivéssemos mais serviço público
com menos encargos para os contribuintes, mas esse melhor serviço público deve apostar e deve confiar mais
na iniciativa, na responsabilidade e na cooperação dos cidadãos, dos portugueses.
Isto não é Estado contra portugueses. Os portugueses devem estar no centro e serem a razão da existência
do Estado.
O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Sr. Deputado, queira terminar, por favor.
O Sr. AntónioLeitãoAmaro (PSD): — Vou terminar, Sr. Presidente.
Portugal precisa de um Estado mais moderno. Mas, Sr.ª Ministra, para além deste importante e louvável
Simplex, o seu Governo está a colocar o Estado, e não o cidadão, no centro das políticas públicas.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado
Fernando Anastácio.
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O Sr. FernandoAnastácio (PS): — Sr. Presidente, o Sr. Deputado António Leitão Amaro acabou de fazer
uma intervenção caracterizada por duas questões: uma, talvez por um grande complexo de culpa e, portanto,
uma autocrítica relativamente ao que foi a atividade do PSD e do Governo do PSD no passado;…
A Sr.ª HortenseMartins (PS): — E tem razões para isso!
O Sr. FernandoAnastácio (PS): — … e a outra, e até invocou aqui o Dom Quixote, pelos tais moinhos, que
estão mais desse lado do que propriamente do lado do Simplex que hoje aqui apresentámos. E, para não
corrermos sequer riscos de termos aqui problemas de direitos autorais, queria lembrar o Sr. Deputado de
algumas afirmações que fez a respeito do Simplex, isto sobre aquela grande capacidade do «nós fizemos»,
«nós pensámos», «isto é nosso», aliás, há aqui, quase, uma certa apropriação da atividade governativa. Quem
governa e quem atua no Estado não atua em função de direitos autorais partidários, atua em função e no
interesse dos cidadãos. Portanto, não consigo perceber essa sua conceção de propriedade tão grave e tão…
A Sr.ª HortenseMartins (PS): — Mesquinha!
O Sr. FernandoAnastácio (PS): — … grande sobre a autoria de medidas.
A respeito da declaração das remunerações da segurança social, recordo o que disse o Sr. Deputado, e são
palavras suas: «Já tínhamos em funções um grupo de trabalho».
A respeito, por exemplo, do Espaço do Cidadão no consulado em Paris, o Sr. Deputado disse: «Estava no
programa eleitoral da PàF». Pois, mas os portugueses não quiserem o programa eleitoral da PàF!
A Sr.ª CecíliaMeireles (CDS-PP): — Quiseram, quiseram!
O Sr. FernandoAnastácio (PS): — Sobre o IRS automático, disse: «Pois é, é descendente de outras
medidas».
Sobre a receita sem papel e a marcação de consultas on-line, as suas palavras foram: «Estavam
praticamente prontas».
Mas temos mais! Sobre o boletim de vacinas eletrónico, «Estava em preparação».
Ou seja, tudo isto não passa de coisas pensadas, de coisas que estavam para ser feitas, mas… Lamento,
mas não fizeram.
O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Queira terminar, Sr. Deputado, por favor.
O Sr. FernandoAnastácio (PS): — E o que estamos hoje aqui a fazer é a falar da capacidade de executar,
da capacidade de fazer, e, sobre esta matéria, não tenho dúvidas de que o Simplex, no Governo do Partido
Socialista, não permitirá que daqui a três ou quatro anos se tenha o discurso que hoje podemos ter em relação
ao PSD.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Sr. Deputado Fernando Anastácio, o Sr. Deputado António Leitão
Amaro não tem tempo para responder, pelo que fica feito o pedido de esclarecimento.
Srs. Deputados, passando à fase de encerramento do debate, tem a palavra, para uma intervenção, o Sr.
Deputado José Luís Ferreira.
O Sr. JoséLuísFerreira (Os Verdes): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados:
Nesta fase final do debate importa começar por valorizar o trabalho e as diligências efetuadas pelo Governo no
sentido de construir um projeto participado. Referimo-nos não só aos encontros que o Governo promoveu
previamente com cidadãos, autarcas e associações, com vista a identificar os principais problemas que os
utentes enfrentam na sua relação com a Administração, mas também à possibilidade que é dada aos cidadãos
de participarem na construção deste projeto através de um endereço eletrónico ou de um site e, por essa via,
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dar sugestões para medidas que decorram do próprio contacto que as pessoas estabelecem com a
Administração.
Depois, é necessário garantir que, em matéria ambiental, não haverá mais facilidades no que diz respeito ao
cumprimento das regras ambientais.
Agiliza-se, desburocratiza-se, simplifica-se, mas não se desregulamenta. Este é, para nós, um ponto
fundamental nesta discussão.
Vamos, portanto, esperar que este Programa tenha impactos positivos na vida das pessoas e que, ao mesmo
tempo, possa traduzir uma redução de custos para a Administração e que também possa trazer benefícios dos
pontos de vista ambiental e dos nossos recursos naturais.
Como já referimos, a simplificação legislativa e administrativa não pode ser sinónimo de desregulamentação,
é preciso simplificar os procedimentos mas sem comprometer os objetivos que a lei pretende. Ou seja, a
burocracia deve ser combatida, sim, mas esse combate não pode permitir legalizações automáticas de
determinados investimentos.
A pretensa agilização dos licenciamentos de empreendimentos turísticos não pode ser sinónimo de facilidade
em matéria ambiental.
A eventual criação de um superfundo ambiental que concentre outros fundos já existentes, como seja o
Fundo Português de Carbono, o Fundo de Intervenção Ambiental, o Fundo de Proteção dos Recursos Hídricos
ou o Fundo para a Conservação da Natureza e da Biodiversidade, a ocorrer, não pode dificultar a perceção do
destino das verbas desses mesmos fundos.
Por outro lado, as áreas protegidas e os parques naturais, na sequência do desinvestimento de que têm sido
alvo, têm vindo a perder capacidade de atuação ao longo dos anos. E, sendo assim, é necessário inverter esta
tendência marcada, sobretudo, pelo desinvestimento.
É necessário fixar as populações residentes nestas áreas, estimulando práticas de desenvolvimento
sustentável, e criar mecanismos de compensação para quem vive nas áreas protegidas.
Os Verdes entendem que é possível conciliar mais eficiência na prestação dos serviços públicos, tirando
proveito das novas potencialidades tecnológicas, e, ao mesmo tempo, valorizar a proteção do ambiente e dos
nossos recursos naturais.
Simplificar tem de significar recuperar a confiança das pessoas e as relações de proximidade.
A simplificação tem de ser assumida como uma condição essencial para podermos caminhar no sentido de
se conseguir serviços públicos sustentáveis capazes de dar resposta às expectativas das pessoas quando lidam
e quando procuram o Estado.
É bom saber que o Governo pretende, por exemplo, criar condições para ser possível solicitar o Cartão de
Cidadão e ter médico de família logo no momento do nascimento num só balcão e em todas as unidades
hospitalares.
É bom saber que os trabalhadores dependentes, aposentados ou reformados vão deixar de ser obrigados,
já no próximo ano, a entregar a declaração de IRS.
Isto foi apenas para dar alguns exemplos dos reflexos positivos que este Programa pode ter na vida e no dia
a dia das pessoas.
Mas sublinhamos aquilo que, para nós, é absolutamente fundamental neste debate: a simplificação legislativa
e administrativa não pode ser sinónimo de desregulamentação. É preciso simplificar os procedimentos, mas de
forma a garantir os objetivos que a lei pretende, nomeadamente, mas não só, em matéria ambiental.
É possível agilizar e simplificar a Administração Pública e os serviços públicos prestados aos portugueses e,
ao mesmo tempo, preservar e valorizar o nosso património ambiental e os nossos recursos naturais.
Aplausos de Os Verdes e do PCP.
O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge
Machado.
O Sr. JorgeMachado (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Todas as
medidas que visem facilitar a vida dos portugueses e que visem a modernização e o melhor acesso a serviços
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e funções do Estado merecem, por parte do Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português, o nosso total
apoio.
As 255 medidas aqui apresentadas são transversais a várias áreas e serviços da Administração Pública e
podem ser um passo para uma Administração Pública melhor e mais amiga do cidadão.
Há, no entanto, um conjunto de premissas sem as quais estaremos a falar de destruição do Estado e não de
modernização e melhoria das respostas que o Estado dá aos portugueses.
A primeira premissa é a de que não há modernização do Estado sem a valorização dos trabalhadores da
Administração Pública e o respeito pelos seus direitos.
PSD e CDS, no anterior Governo, atacaram os direitos, roubaram salários e pioraram as condições de
trabalho dos trabalhadores da Administração Pública, não para modernizar ou melhorar os serviços mas, sim,
para desmantelar, fragilizar e destruir serviços públicos.
Assim, importa, neste processo de modernização do Estado, aprofundar e levar mais longe o caminho de
valorização e respeito pelos direitos dos trabalhadores.
Para o PCP é claro: não há modernização do Estado sem trabalhadores com direitos e motivados para o
efeito.
A segunda premissa é a defesa e a segurança dos dados pessoais. A utilização de privados, como os CTT,
para o Espaço Cidadão, empresa privada, ou o recurso sistemático a empresas privadas, para criar e gerir
aplicações informáticas e bases de dados fragilizam o Estado, ameaçam a privacidade dos dados e podem
constituir uma ameaça. O Estado não pode ficar dependente, eu diria que o Estado não pode ficar refém de
privados que visam o lucro e não o serviço público.
A terceira premissa é a assunção, por parte do Estado, de todas as responsabilidades e não transferir para
terceiros responsabilidades que são suas. O exemplo paradigmático do que aconteceu, de atirar
responsabilidades que são do Estado para as autarquias locais, como fizeram o PSD e o CDS-PP, pura e
simplesmente, não pode acontecer.
Quarta e última, e talvez a mais importante, premissa: a modernização da Administração Pública significava,
para o PSD e CDS, encerrar serviços públicos. A ideia de que o on-line ou os call center resolvem os problemas
e assim permitirem encerrar serviços públicos de proximidade é a lógica de quem quer destruir o Estado e não
de quem quer melhorar a capacidade de resposta.
Importa ter em conta que uma grande parte da população portuguesa não tem acesso à Internet, pelo que
temos de manter e alargar serviços públicos de proximidade. Importa, também, referir que os serviços on-line
ou o atendimento telefónico têm de responder às necessidades. Hoje verificamos que muitas das respostas à
distância, promovidas pelo PSD e CDS-PP, significaram a negação do acesso à Administração Pública ou um
acesso a uma Administração Pública insuficiente.
Assim, para este Simplex a modernização do Estado não é, nem pode ser, sinónimo de menos Estado ou
encerramento de serviços. Dito isto, entendemos que, estando cumpridas estas premissas, podemos estar face
a um conjunto de medidas que podem ajudar o dia a dia dos portugueses, podem melhorar a relação que o
cidadão tem com a Administração Pública.
O desafio com que estamos confrontados é claramente um, é concretizar este gigantesco caderno de
encargos respeitando estas premissas. Se assim for, será, efetivamente, dado um passo de gigante para a
resolução de alguns dos problemas que os portugueses enfrentam no dia a dia.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Cecília
Meireles.
A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados:
Aquilo que é a verdadeira simplificação, aproximação, criação e aprofundamento de uma cultura de serviço ao
cidadão dentro do Estado terá, naturalmente, sempre o acordo do CDS. Mas deixamos aqui algumas questões
sobre o funcionamento prático e concreto de várias medidas e sobre se elas, de facto, vão simplificar.
Da mesma forma, também registamos, eu diria, quase a contrição que o Governo demonstrou, passada que
está a primeira fase de publicidade do Simplex, em que se dizia simplesmente: «o Simplex», este Simplex, o
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Simplex+ definiu os problemas e desenhou as soluções». Hoje, percebemos bem que não foi exatamente assim,
que foi um trabalho incontínuo, e ainda bem, pois é assim que deve ser, pena é que se tenha tentado passar
exatamente a ideia contrária.
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Importa, também, dizer que uma verdadeira reforma do Estado é
bastante mais do que um Simplex. Isso não quer dizer que o Simplex não seja bom, quer dizer que a reforma
do Estado é mais do que isto, é reorganizar, pelo menos, o Estado. E não deixa de ser extraordinário que em
todo este programa, em todas estas medidas, e são mais de 250, não haja um departamento do Estado que
mude o seu funcionamento, um órgão que seja reformulado, uma secçãozinha que seja fundida, um serviço que
alargue o seu horário ou que adquira novas funções. Tudo permanece estritamente igual, quiçá porque se
percebe que nas bancadas mais à esquerda aquilo que tem de acontecer é ficar tudo exatamente na mesma, é
nunca se tocar na estrutura do Estado.
É pena porque servir melhor o cidadão era também mexer nessa estrutura e simplificar a vida aos cidadãos
era também terem menos vezes o Estado a interferir, de diversas formas, na sua vida.
Por último, há também uma parte importante e que não pode ser esquecida, e eu diria que ela é dar o
exemplo. Há uma medida, que, aliás, creio, ainda hoje aqui não foi falada, mas noutras ocasiões já falámos, que
é a prevista na página 32 que se chama «Custa quanto?», que é, basicamente, dizer que, cada vez que haja
um ato legislativo, um diploma, se faz uma avaliação do impacto económico desse diploma.
Pois bem, eu acho que seria importante, em relação a este conjunto de medidas, aplicar-lhes a medida
«Custa quanto?», para, afinal, ficarmos a saber quanto vai custar a aplicação destas 255 medidas.
Que fique muito claro, Sr.ª Ministra, do nosso ponto de vista, este é dinheiro bem gasto.
A Sr.ª HortenseMartins (PS): — Ah! Mas parece que está um pouco confusa!
A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Dinheiro gasto na simplificação é dinheiro bem gasto e é dinheiro que
tem retorno, mas isso não significa que, pura e simplesmente, se gaste e não se pergunte quanto, quando o
próprio programa prevê que isso seja feito. Não deixa de ser extraordinariamente irónico que isso esteja previsto
e que, depois, pura e simplesmente, seja esquecido.
Aplausos do CDS-PP.
Aliás, da mesma forma, também não deixa de ser irónico que ainda este programa não estava apresentado
e já o Sr. Ministro das Finanças falava em mais de 253 milhões: 70 milhões com o Programa Aproximar e 183
milhões com a simplificação administrativa. Portanto, eu, se calhar, punha aí uma nova medida, não o «poupa
quanto?», porque isso já sabemos, poupa 253 milhões, mas «poupa onde?», porque eu li as 255 medidas e não
percebi aonde se ia poupar este ano 1 milhão quanto mais 253 milhões.
Poder-me-á dizer: «Mas não é este o objetivo!». E eu até concordo que não seja este o objetivo, agora não
enganem as pessoas, dizendo que vão fazer, que vai acontecer e que vai haver aqui uma grande poupança
este ano e, depois, não há rigorosamente nada.
Por último, termino dizendo, e acho que fica claro, que para simplificar a sério terá sempre o acordo do CDS.
Aquelas medidas que a isso correspondem terão necessariamente o nosso acordo, mas da mesma forma terão
em nós uma oposição exigente que, quer em relação a medidas concretas, quer em relação a promessas no ar,
sempre fará as perguntas certas.
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Filipe
Soares.
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O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: O
debate foi morno, este tema, de facto, não merece divergências de fundo entre as bancadas parlamentares,
mas merece, sim, porque fez saltar essa divergência de fundo, uma visão sobre o Estado, o que é que significa
e como é que olhamos para ele.
O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Claro!
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Creio que a visão de Estado que o PSD ainda há pouco trouxe ao debate
e que será aprofundada, espero, pela Sr.ª Deputada Maria Luís Albuquerque, merecerá de nós um debate, esse
sim, profundo e concreto. Há pouco o PSD dizia que estas medidas de simplificação e de modernização
administrativa são, de facto, uma tentativa de ter mais Estado e que, com isso, eles não concordavam, e nós
compreendemos e percebemos bem porquê. É que, ao longo de quatro anos, PSD e CDS andaram de mãos
dadas a destruir o Estado no nosso País.
Protestos da Deputada do CDS-PP Cecília Meireles.
Veja-se, por exemplo, o que aconteceu com a escola pública, ao longo de quatro anos quiseram mais
privados e menos Estado na escola pública.
Veja-se o que aconteceu no Serviço Nacional de Saúde, em que ao longo de quatro anos quiseram mais
privados e menos serviço público do Serviço Nacional de Saúde. Ao longo de quatro anos sempre atiraram aos
funcionários públicos, querendo menos Estado, apontando-lhes o dedo e dizendo-lhes que os privados é que,
esses sim, podiam ter as mordomias do Estado.
Ora, há, de facto, um debate profundo, um debate que nos separa e no qual nós não estamos de acordo.
PSD e CDS tiveram um legado de quatro anos a destruir o Estado e a prejudicar a vida das pessoas e é com
esse legado que chegam agora, aqui, a este debate.
Mas, mesmo assim, quiseram ter um pequeno pin na lapela, tão saudosos que andam dos pins que usavam
quando eram Governo. E diziam: «Mas há aí medidas que são nossas! Há aí medidas que são nossas e não
pode agora o Governo dizer que tem sobre elas direitos de autor!». Bem, Sr.as e Srs. Deputados, nem este
Governo veio dizer que inventou a roda, nem a História começou quando ele tomou posse, e ainda bem que há
medidas anteriores de outros governos. O que está mal, e esta é que é a acusação de fundo, é que o Governo
anterior nada fez de importante nesta matéria, para simplificar.
A Sr.ª Assunção Cristas (CDS-PP): — Isso não é verdade!
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Por exemplo, tornou mais simples a justiça no nosso País? Não, tornou
pior a justiça no nosso País! Afastou as pessoas da justiça! Encerrou tribunais! É hoje mais caro e mais difícil
ter acesso à justiça, fruto do legado PSD e CDS.
Tornou mais acessíveis os atos administrativos? Reduziu custos? Tornou mais fácil o acesso a esses atos
administrativos? Não! Pelo contrário, aumentou o custo dos atos administrativos,…
Protestos da Deputado do CDS-PP Assunção Cristas.
… reduziu e adiou os tempos de espera. É esta a dificuldade do legado PSD e CDS.
Mas creio que não vamos chegar ao fim deste debate sem que o PSD, novamente, venha a abanar com o
fantasma das 35 horas de trabalho semanal na Administração Pública. Porventura, perguntará a Sr.ª Deputada:
quanto custa? Nós perguntamos ao contrário: quanto custou ao PSD, quanto custou ao CDS, quanto custou ao
País — porque nós sabemos que ao PSD e ao CDS foi de bom grado — ter este conflito permanente com o
trabalho no nosso País? Quanto custou este conflito com os trabalhadores que tinham direito a salários, com os
pensionistas que tinham direito a pensões porque trabalharam, porque tinham feito direito descontos durante
uma vida inteira, e que o PSD e o CDS quiseram sempre, sempre, atacar?
É esta a realidade concreta das escolhas, mas, para saudar a preocupação do CDS, gostaria de dizer que
nós acompanhamos a modernização do Estado, mas não sem cautelas, sem preocupações, porque devemos
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ser humildes quando olhamos para esta matéria. Devemos ter a humildade de saber que, muitas das vezes, um
salto demasiado grande é prejudicial.
A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Mas o Bloco de Esquerda não teve uma ideia, uma proposta, uma
sugestão! Zero!
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Veja-se, por exemplo, o legado do Citius na justiça e como foi prejudicial
para a justiça esse legado.
Por isso, insistimos nas questões que colocamos, tais como a garantia da defesa da confidencialidade dos
dados, a garantia de que as clouds que vão andar a pulular por aí estão debaixo de legislação nacional e, por
isso, os dados que lá se encontram estão salvaguardados pela legislação nacional,…
O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Queira terminar, Sr. Deputado.
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Termino, Sr. Presidente.
Como dizia, insistimos na garantia de sistemas de redundância, porque maior modernização não pode ser a
desumanização administrativa do Estado. Por isso, insistimos nos sistemas de redundância, que devem permitir
a resolução de problemas, que muitas vezes são dos mais difíceis de resolver, porque os sistemas informáticos
são altamente padronizáveis mas pouco permeáveis à exceção, e essas soluções estão, de facto, a par da
modernização administrativa.
Com essas preocupações, cumprimos o pressuposto fundamental nesta matéria: devemos caminhar para a
frente no sentido da modernização e aproveitar as oportunidades da tecnologia, mas garantir que ninguém fica
para trás, como ficou, ao longo de quatro anos, o Governo PSD/CDS.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Em nome do Grupo Parlamentar do Partido Socialista, tem a
palavra o Sr. Deputado Paulo Trigo Pereira.
O Sr. Paulo Trigo Pereira (PS): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados:
Começo esta intervenção final por saudar a Sr.ª Ministra e a sua equipa pela coragem de apresentar este
programa.
Este programa foi elaborado segundo uma metodologia completamente inovadora, ou seja, não foi elaborado
em gabinetes ministeriais, foi elaborado numa volta ao País, auscultando os principais interessados, os
cidadãos, as empresas, os autarcas, as associações empresariais, designando responsáveis em cada
ministério. Ao contrário do que aqui hoje foi referido, este é um programa dirigido por esta equipa ministerial mas
transversal a todos os ministérios, e esta é uma inovação deste programa, aliás, há responsáveis em todos os
ministérios sectoriais pela implementação do programa. Cada medida identifica claramente o problema que quer
resolver e tem um cronograma associado. Ora, isto significa algo a que não estamos habituados na
Administração Pública que é definir objetivos, calendarizá-los e permitir a sua avaliação. Por isso, é preciso
muita coragem para apresentar este programa, que certamente terá sucesso e ficará na memória dos cidadãos
e das empresas.
Falou-se aqui, hoje, se isto seria ou não a reforma do Estado. Depende do que pensamos que é a reforma
do Estado. Se por reforma do Estado entendermos algo que também já hoje foi aqui sugerido, ou seja, a junção
de serviços públicos, fusões, reestruturações, instabilidade, privatização parcial da segurança social,
privatização parcial da educação, não, isto não é, então, a reforma do Estado. Mas se por reforma do Estado
entendermos uma alteração da cultura do exercício das funções públicas, se entendermos servir os cidadãos e
as empresas e não servir o próprio Estado, então, isto faz parte, sem dúvida, dessa tal reforma do Estado.
Alguns Deputados perguntaram nesta Câmara qual seria a estratégia que aqui está subjacente. A estratégia
é muito clara e só não entende quem não olhou para o Simplex com algum detalhe.
Pretende-se que haja uma simplificação legislativa, pretende-se racionalizar os serviços e os recursos
públicos, de que é exemplo a medida de identificação do património cultural do Estado para informação e gestão
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de espaços onde podem ser realizados eventos culturais, enfim, saber o que é o Estado e qual o seu património
para melhorar e racionalizar os recursos públicos, e é pôr o cidadão no centro das políticas públicas, facilitando
a sua vida, pôr a empresa no centro das políticas públicas, facilitando a e reduzindo os seus custos.
A Sr.ª Ministra iniciou a sua intervenção falando numa carta recebida pela sua mãe, que tem 94 anos. Às
vezes, nesta Câmara, esquecemo-nos que o País envelheceu e, de facto, exige-se aos idosos obrigações,
responsabilidades, enviando-se-lhes cartas como se tivessem 60 ou 70 anos. Estamos a falar de uma população
que será crescente no futuro, que terá 80, 90 ou até 100 anos, e que tem de ser ajuda. Nesse sentido, medidas
como a alteração de morada numa só vez ou a simplificação do IRS, por defeito, sem prejuízo de se preservar
o facto de alguns quererem doar a determinadas instituições de utilidade pública, tudo isso deve ser feito e vai
facilitar a vida aos cidadãos.
Finalizaria dizendo o seguinte: o Simplex é, de facto, não tenho dúvidas, algo que vai ficar na memória dos
cidadãos e dos empresários deste País, pelo progresso que vai ser alcançado na vida das empresas e na
facilitação da vida dos cidadãos.
O PS quer um melhor Estado para servir os cidadãos e o Simplex é um instrumento fundamental para esse
desígnio.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Para a intervenção de encerramento em nome do Grupo
Parlamentar do PSD, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria Luís Albuquerque.
A Sr.ª Maria Luís Albuquerque (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Muitas
das medidas incluídas no Simplex são inegavelmente positivas para cidadãos e empresas. Muitas representam
continuidade face às políticas dos anteriores governos, e bem, já que esta é uma área em que Portugal tem
merecido o reconhecimento internacional e em que tem sido possível obter consensos alargados entre partidos
políticos.
Por isso, o PSD saúda o Governo pela continuidade destas medidas. Assim, a democracia só sai reforçada,
e perde quando as palavras de ordem são revogar, reverter ou retroceder, como uma espécie de «cola» para
assegurar a sobrevivência de projetos políticos pessoais.
Vozes do PSD: — Muito bem!
A Sr.ª Maria Luís Albuquerque (PSD): — Mas, tal como foi já dito hoje, aqui, o Simplex não é, de todo, a
reforma do Estado. Nem é sequer uma reforma estrutural de fundo, capaz de resolver problemas que impedem
o nosso crescimento ou a sustentabilidade das nossas finanças públicas. É um instrumento útil, mas apenas
isso.
O que preocupa o PSD, e acredito que preocupa muitos portugueses, é a ausência das reformas estruturais
necessárias ainda por fazer, bem como a reversão de muitas que foram implementadas pelo Governo anterior
e que, até nas palavras do atual Ministro das Finanças, precisariam de tempo para produzir efeitos.
O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Bem lembrado!
A Sr.ª Maria Luís Albuquerque (PSD): — Hoje mesmo, a OCDE atualizou as suas previsões para a
economia portuguesa, juntando-se às cada vez mais numerosas vozes que alertam para o irrealismo do cenário
macroeconómico do Orçamento do Estado para 2016 e para a insustentabilidade do caminho que esta maioria
está a impor a Portugal.
A OCDE realça que o aumento do consumo que decorre da reposição de rendimentos para parte da
população será travado pela incapacidade de criar emprego e destaca com principal preocupação a queda do
investimento que se deve à elevada dívida das empresas, à fragilidade do setor bancário, mas também, notem,
à incerteza política e à falta de vontade de continuar a implementar reformas estruturais. O Simplex não resolve
nada disto.
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O Banco de Portugal tinha-nos trazido uma perspetiva negra quanto ao investimento em 2016, com um
crescimento quase nulo, mas a OCDE, baseando-se em dados mais recentes, prevê já uma queda efetiva do
investimento este ano, criticando abertamente a decisão de interromper a descida programada do IRC.
Mais: a OCDE salienta a ainda forte segmentação do mercado do trabalho e a limitada concorrência nos
setores da energia, portos e serviços como impedimentos ao crescimento da produtividade e salienta que os
riscos que enfrentamos são sobretudo internos. O Simplex não resolve nada disso.
E o que faz esta maioria? Reverte as reformas laborais, fazendo aumentar o desemprego, cede às
corporações mais influentes e/ou mais próximas de alguns dos partidos que a compõem, destrói a confiança e
afasta os investidores,…
Vozes do PSD: — Muito bem!
A Sr.ª Maria Luís Albuquerque (PSD): — … e defende um crescimento assente no consumo que só vai
beneficiar países como a Alemanha.
O Sr. Jorge Paulo Oliveira (PSD): — Exatamente!
A Sr.ª Maria Luís Albuquerque (PSD): — A OCDE não nos diz, infelizmente, nada de novo. Já tivemos em
Portugal estas políticas, estas orientações, e lembramo-nos todos bem demais dos seus resultados.
Protestos do PS.
Esperamos que mais vozes autorizadas a alertar para os riscos possam fazer esta maioria arrepiar caminho
e recolocar Portugal numa trajetória de convergência para a Europa. O Simplex não faz nada disto.
E devo dizer, Srs. Deputados, que, ao mesmo tempo que espero esse recuo, tenho muito pouca esperança.
As reformas de que o nosso País precisa continuam ausentes das propostas da maioria e a nossa abertura
para fazer um debate sério continua a não ter eco.
Para quando uma discussão sobre a urgente reforma da segurança social, uma reforma de fundo que
defenda os pensionistas de hoje e de amanhã? Para quando uma discussão séria sobre educação que defina,
de uma vez por todas, um modelo que assegure um futuro de portugueses qualificados, e não este constante
desfazer do que foi feito? Para quando um acordo sobre política fiscal que dê aos investidores estrangeiros
confiança para trazerem para Portugal o capital de que tanto precisamos para crescer? O Simplex não resolve
nada disso.
O Sr. Jorge Paulo Oliveira (PSD): — Muito bem!
A Sr.ª Maria Luís Albuquerque (PSD): — Olhando para os seis meses de Governo desta maioria, o destaque
é para o que se desfez, reverteu, apagou, com tanta pressa que se percebe o receio de não terem tempo
suficiente para pôr em prática a sua estratégia de não deixar pedra sobre pedra, que possa não haver tempo
para satisfazer todos os interesses particulares, sectários, com que estão comprometidos.
Protestos do Deputado do PS João Galamba.
Percebem-no os portugueses, percebem-no os que nos observam de fora com crescente apreensão. Tantos
sacrifícios que fizemos para agora serem tão levianamente desperdiçados.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Para uma intervenção de encerramento em nome do Governo,
tem a palavra a Sr.ª Ministra da Presidência e da Modernização Administrativa, Maria Manuel Leitão Marques.
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A Sr.ª Ministra da Presidência e da Modernização Administrativa: — Sr. Presidente, Sr.as e Srs.
Deputados: Vale a pena lembrar o objetivo com que se fez o Simplex, porque senão estamos aqui sempre numa
discussão sobre outra coisa ao lado e não sobre os objetivos do programa,…
Aplausos do PS.
… o que, aliás, é uma demonstração de quem não tem nada a dizer sobre o programa.
Aplausos do PS.
O Simplex fez-se com objetivos bem claros: aumentar a qualidade do serviço público, para quem acredita
que é preciso mantê-lo eficiente, moderno, relevante para os cidadãos, em condições de igualdade; reduzir
custos de contexto desnecessários para as diversas atividades económicas; e para o que Estado possa ser mais
eficiente nos seus procedimentos internos e na forma como presta os seus serviços.
O Simplex foi construído ouvindo pessoas, ouvindo cidadãos, empresas, parceiros sociais, autarcas,
associações e ouvindo e trabalhando com funcionários públicos de forma continuada.
A participação não foi, para nós, um processo de mera comunicação «de fachada» ou de oportunismo
circunstancial. A participação é ter coragem, espaço e tempo para ouvir críticas,…
Aplausos do PS.
…sabendo que a nem todas podemos dar respostas imediatas, e também para ouvir oportunidades de
melhoria.
Também por isso uma das medidas deste programa se chama Direito ao Simplex, que se concretizará
através de uma carta contendo os direitos dos cidadãos perante a Administração Pública e os serviços por ela
prestados.
Dizer que o Simplex que não passa de uma mera continuidade de medidas já em curso é desconhecer, no
mínimo, aquilo que efetivamente estava em curso. Não é o nosso caso. Reconhecemos e valorizamos o que
encontrámos,…
A Sr.ª Hortense Martins (PS): — Era muito pouco!
A Sr.ª Ministra da Presidência e da Modernização Administrativa: — … ao contrário do que aconteceu
em 2011.
Fomos até aos serviços ver com atenção o pormenor, para ver o que é que faltava, o que é que se podia
fazer para melhorar. Desejávamos até que fosse mais do que aquilo que efetivamente foi encontrado.
Na verdade, as leis são da República e devem ser cumpridas enquanto estão em vigor, e as marcas e
plataformas são da Administração Pública e não de nenhum governo, estão registadas em nome do Estado e
não de um partido ou de dois. Foram pagas pelos cidadãos. Já viram se as lojas do cidadão fossem propriedade
do Governo PS que as criou?
Quem não percebeu as vantagens de ter um programa feito deste modo, com as prioridades que cada um
queira aí valorizar, integrado, participado, feito com os funcionários e dirigentes da Administração Pública em
grande proximidade, trabalhando com as autarquias e com as administrações regionais, não percebeu como se
pode evoluir mais depressa neste domínio.
Durante quatro anos, não houve Simplex nem nenhum programa equivalente com outro nome.
Aplausos do PS.
Lamento dizê-lo e, como sabem, já aqui o disse, nunca rejeitarei nem abandonarei as boas medidas do
Governo anterior. Aliás, se alguém disser que eu lá fora, em fóruns internacionais onde participei, até tinha
vergonha de dizer que não havia Simplex, diz a verdade.
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O Simplex é, antes de mais, uma mudança de cultura que exige continuidade, não pode ser feito tudo em
seis meses, provavelmente nem num ano, nem em dois, nem sequer em quatro. É uma mudança que procura
orientar os serviços para os cidadãos em muitas medidas, integrando plataformas através da plataforma de
interoperabilidade, que tem essa função, o que não impede, Srs. Deputados, o seu desenvolvimento autónomo,
nalguns casos até exigido devido à separação de dados.
O que importa é que o acesso aos serviços eletrónicos seja potenciado através de um ponto único, e de
preferência através de uma única autenticação, ao que procuramos responder através da medida
Autenticação.gov.
Esta é uma mudança que se faz dando respostas modernas às necessidades de cidadãos e empresas que
se tornaram, e tornam, cada vez mais exigentes face aos resultados que já fomos obtendo no passado ou às
suas experiências em outros serviços públicos e privados.
Esta é uma mudança que deve ser capaz de gerar uma nova confiança no Estado, um Estado presente e
eficiente, que não se deve confundir com um Estado mínimo.
Por estas razões é que o Simplex se constitui como uma parte importante da reforma do Estado — que, aliás,
é uma coisa que podíamos discutir muito, de que falamos muito mas não sabemos bem do que estamos a falar
—,…
Aplausos do PS.
… como um braço ativo que demonstra no terreno, no dia a dia das pessoas, no dia a dia dos funcionários,
a possibilidade e as vantagens de termos serviços públicos de qualidade.
Não se trata de questionar as funções do Estado, trata-se de inovar sistematicamente no modo como essas
funções são cumpridas para que elas se mantenham sustentáveis e relevantes.
Sr.as e Srs. Deputados, estamos aqui há seis meses e não há quatro anos.
Aplausos do PS.
Não estamos a prestar contas do que fizemos nos últimos quatro anos.
A Sr.ª Hortense Martins (PS): — Bem lembrado!
A Sr.ª Ministra da Presidência e da Modernização Administrativa: — Não podemos resolver tudo e
sabemos que não resolvemos tudo, nem sequer todas as sugestões que já nos foram colocadas, mas
pensaremos nelas.
Para compreender o Simplex é, portanto, necessário valorizar o serviço público. Quem ache que o serviço
público pode vir a ser substituído com vantagem pelo privado, com certeza que não precisa de preocupar-se
com programas desta natureza. Serão sempre um custo e não um benefício. Serão sempre um esforço
desnecessário.
O Simplex não é, portanto, ideias vagas, guiões sobre a reforma dos serviços públicos, não é uma lei ou
mesmo um código que decreta a mudança de cima para baixo. O Simplex é um compromisso, um compromisso
claro, detalhado, com metas e objetivos mensuráveis.
Sr.as e Srs. Deputados, este é um programa de risco, técnico e político, como aqui já foi dito, pela ousadia
das medidas que acolhe, pela cultura de cumprimento de prazos que exige, pela transparência e pela prestação
regular de contas que assume.
É um risco assumido pela Administração Pública que nele se envolve.
É também um risco assumido pelo Governo, que entendeu que esse risco de publicidade é indispensável
para melhorar mais e mais depressa a vida dos cidadãos, para reduzir mais e mais depressa os custos de
contexto para as empresas, para tornar Portugal um País mais competitivo, um País onde gostemos de viver,
de trabalhar, de investir ou, mesmo, de envelhecer, não precisando de mais cartas como aquela com que iniciei
a minha intervenção.
Aplausos do PS.
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O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Srs. Deputados, terminado o debate temático sobre
modernização administrativa, programa Simplex, passamos ao segundo ponto da ordem de trabalhos, com a
discussão, na generalidade, da proposta de lei n.º 10/XIII (1.ª) — Restituição de bens culturais que tenham saído
ilicitamente do território de um Estado-membro da União Europeia, que transpõe a Diretiva 2014/60/EU, do
Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de maio de 2014, conjuntamente com o projeto de resolução n.º
335/XIII (1.ª) — Determina a inventariação dos bens culturais da Parvalorem, da Parups e outros ativos incluídos
no perímetro da nacionalização do BPN, bem como da Fundação Elipse e outros ativos à guarda do Estado na
sequência do processo de resgate do BPP (BE).
Para apresentar a proposta de lei em nome do Governo, tem a palavra o Sr. Ministro da Cultura.
O Sr. Ministro da Cultura (Castro Mendes): — Sr. Presidente da Assembleia da República, Srs. Deputados:
A proposta de lei n.º 10/XIII (1.ª), que o Governo vem apresentar a esta Assembleia, é a transposição de uma
diretiva do Parlamento Europeu e do Conselho, que está vertida no texto da proposta de lei.
Trata-se de reforçar os deveres de cooperação entre os diversos Estados-membros, no sentido de impedir o
tráfico ilícito de bens culturais, assegurar a restituição dos bens ilicitamente saídos dos respetivos territórios.
Trata-se de ampliar o objeto do regime de restituição de bens culturais, uma vez que deixa de se exigir que
os bens estejam integrados em categorias específicas pré-definidas e sujeitos a critérios de valor pecuniário e
antiguidade.
Trata-se de clarificar as condições do pagamento pelo Estado-membro de justa indemnização aos
possuidores de boa-fé, em caso de ação judicial de restituição de bens ilicitamente saídos do respetivo território,
sem prejuízo de o Estado poder reclamar o reembolso aos responsáveis pela saída ilícita.
Tal como previsto na anterior diretiva, este regime aplica-se às saídas ilícitas de bens verificadas após 31 de
dezembro de 1992, podendo, no entanto, aplicar-se a saídas anteriores, em caso de reciprocidade.
Estamos, portanto, a transpor para o direito interno uma diretiva da União Europeia cujo prazo tinha, aliás, já
sido ultrapassado, mas que vimos agora pôr à consideração do poder legislativo.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Tem agora a palavra, para apresentar o projeto de resolução, o
Sr. Deputado Jorge Campos.
O Sr. Jorge Campos (BE): — Sr. Presidente, Sr. Ministro da Cultura, Sr.as e Srs. Deputados: Defender e
preservar o património e os bens culturais é, para o Bloco de Esquerda, uma tarefa prioritária.
Sem eles perdem-se as referências, esmorece a memória, dilui-se a identidade. E a identidade de quem
somos na sua diversidade é indissociável de um desígnio comum que só pode ser definido em função da
cidadania. Sem essa consciência, sendo negligentes perante as representações nas quais nos revemos, é fácil
sucumbir ao pântano onde tudo se compra e tudo se vende. Rejeitamos essa visão.
Sr.as e Srs. Deputados, nos últimos anos, Portugal ficou mais pobre de muitas maneiras e também no plano
simbólico.
Vou recordar-vos dois episódios.
Carlo Crivelli, um dos grandes mestres do Renascimento. A sua obra-prima Virgem com o MeninoSanto
Emídio, São Sebastião, São Roque, São Francisco de Assis e o Beato Tiago da Marca, inventariada como bem
de interesse público desde 1970, e na posse de um conhecido empresário, saiu do País em 2013. Como foi isso
possível?
A 19 de junho de 2012, através de uma simples carta, o Secretário de Estado à época autorizou a exportação
da obra sem qualquer documento justificativo da venda. Mais: sem qualquer medida que anulasse a proteção
legal existente. É certo, houve a revogação posterior da decisão, mas o quadro já estava, e está, no estrangeiro.
Segundo episódio: a tentativa de leiloar, em Londres, 85 quadros de Joan Miró, da coleção do BPN. Por
pressão de agentes políticos e culturais, o negócio, felizmente, abortou.
Mas, em qualquer dos casos, Crivelli e Miró, houve, no mínimo, uma ação desastrada dos decisores políticos,
com a inevitável perda de credibilidade institucional que situações deste tipo acarretam.
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Por isso, o Bloco de Esquerda saúda a apresentação da proposta de lei do Governo, que transpõe para a
ordem jurídica interna a Diretiva do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de maio de 2014, relativa à
restituição de bens culturais que tenham saído ilicitamente de um Estado-membro.
Para nós, é evidente a necessidade de reforçar os dispositivos para a recuperação desses bens. Mas também
é evidente a necessidade de precaver a sua saída, e essa prevenção será tanto mais eficaz quanto mais rigorosa
for a inventariação daquilo que temos. Daí o projeto que o Bloco de Esquerda apresenta.
O processo dos quadros de Miró, Sr.as e Srs. Deputados, veio demonstrar a vulnerabilidade dos serviços
públicos face à vontade política do momento.
Por isso, precisamos de saber qual é o verdadeiro espólio detido pelo Estado, através da Parvalorem, da
Parups e de todas as empresas e ativos incluídos no perímetro de nacionalização do BPN.
Em paralelo, precisamos também de informação sobre o que se passa com a extinção da Fundação Elipse
e, tanto quanto se sabe, pelo menos parte desse espólio continua sem acompanhamento técnico.
Assim sendo, a inventariação das obras de arte dos espólios do BPN e do BPP é uma exigência de proteção
do património cultural, mas também do controlo de capitais.
O mercado das obras de arte, particularmente exposto a operações especulativas de branqueamento de
capitais, obedece em toda a Europa a uma apertada legislação sobre inventariação e exportação.
O Sr. Presidente (José Manuel Pureza):— Queira terminar, Sr. Deputado.
O Sr. Jorge Campos (BE): — Vou terminar, Sr. Presidente.
Introduzir essas boas práticas também em Portugal será, certamente, um passo importante na recuperação
da credibilidade e da legitimidade dos serviços públicos de cultura e de a cultura reassumir a centralidade da
cidadania.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Para uma intervenção, tem a palavra em nome do Grupo
parlamentar do CDS-PP, a Sr.ª Deputada Teresa Caeiro.
A Sr.ª Teresa Caeiro (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro da Cultura, Sr. Secretário de Estado dos
Assuntos Parlamentares, Sr.as e Srs. Deputados: Com esta iniciativa, o Governo pretende transpor para a ordem
jurídica interna a Diretiva 2014/60/UE, do Parlamento Europeu e do Conselho, relativa, como já foi dito pelo Sr.
Ministro, à restituição de bens culturais que tenham saído ilicitamente do território de um Estado-membro da
União Europeia.
Ora, convém referir — e penso que aí estaremos todos de acordo — que os bens culturais são um dos
elementos fundamentais da civilização e da cultura dos povos, bem como um eixo de afirmação da sua
identidade intrínseca, sendo que estes só adquirem o seu verdadeiro valor quando se conhece com maior
precisão a sua origem, a sua história e o seu meio tradicional. E é, de facto, um dever do Estado a proteção do
património constituído pelos bens culturais existentes no seu território contra os perigos de roubo e de
exportação, quando esta for ilícita.
Esta proteção deve organizar-se tanto no plano interno como no plano internacional e exige uma estreita
colaboração entre os Estados-membros.
Na União Europeia, com a abertura das fronteiras e a livre circulação de bens no seio da mesma, tornou-se,
de facto, necessária a adoção de regimes que permitissem uma proteção do património cultural móvel dos
Estados-membros contra o tráfico ilícito.
Daí que já tenham sido transportas diretivas do Conselho e que, após várias alterações dos respetivos textos
iniciais, se tenham mostrado insuficientes, sendo que se verificou ser necessário introduzir alterações e corrigir
insuficiências.
No que se refere a esta proposta e à finalidade do reconhecimento mútuo das leis nacionais de proteção dos
bens móveis, nomeadamente na parte que reporta à saída do território, deixa de haver, tanto quanto consta da
proposta de lei, um limite estabelecido pelos critérios da inclusão em categorias pré-definidas do seu valor
pecuniário e da sua antiguidade, bem como — e agora vou citar o texto — «Constitui dever do Estado Português
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(…) diligenciar no sentido do regresso (…) de quaisquer bens culturais provenientes do território de outro Estado-
membro (…)».
Entendemos que esta é uma medida que se torna necessária e cada vez mais premente, pois temos assistido
a vários casos em que isto se verifica. Em todo o caso, consideramos que o texto ainda carece de correções,
de afinamentos e de clarificação para os quais o CDS estará disponível em sede de discussão na Comissão.
Faço uma breve referência ao projeto de lei do Bloco de Esquerda, no qual se determina a inventariação dos
bens culturais da Parvalorem, da Parups e de outros ativos incluídos no perímetro da nacionalização do BPN,
bem como da Fundação Elipse e outros ativos à guarda do Estado.
Todos conhecemos o histórico do que aconteceu com estas instituições e não rejeitamos o princípio de que
há um dever por parte do Estado de proceder a uma inventariação destes bens culturais, quer estejam sob a
tutela do Estado no decurso do processo de nacionalização do BPN, quer no decurso do processo de resgaste
do Banco Privado Português. Temos algumas reservas relativamente a uma classificação, com tudo o que isso
implica,…
O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Sr.ª Deputada, queira terminar.
A Sr.ª Teresa Caeiro (CDS-PP): — Vou terminar, Sr. Presidente.
… mas teremos oportunidade, penso, de, em sede de Comissão, rever todos estes procedimentos e dar a
nossa concordância, de acordo com aquilo que considerarmos mais consentâneo e mais cauteloso.
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Tem a palavra, para uma intervenção em nome do Grupo
Parlamentar do PCP, a Sr.ª Deputada Ana Mesquita.
A Sr.ª Ana Mesquita (PCP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Existe no mundo um museu de
dimensões gigantescas que não pode ser visitado. Do seu vasto acervo, constam Rembrandt e Picasso, joias
da coroa portuguesa, milhares e milhares de peças e artefactos do espólio arqueológico de monumentos e sítios,
abundante arte sacra.
Esta última secção contará com um contributo não despiciendo do nosso património nacional traduzido em
retábulos, altares, cadeirais, azulejos e elementos arquitetónicos de pedra. Encarados, na ótica neoliberal, como
bens escassos, únicos e extremamente valiosos, estes elementos constitutivos da memória, identidade comum
e coletiva transfiguram-se, assim, em objetos comercializáveis altamente apetecíveis e muito rentáveis para os
seus detentores privados.
O tráfico ilícito de património engloba diferentes atividades, como o comércio especializado de bens furtados,
a apropriação e comercialização de obras de arte desconhecidas pelas autoridades, compras e vendas à
margem do controlo fiscal e documental, exportações que originam a retenção ilícita de obras e artefactos, entre
outros exemplos.
A espoliação e o tráfico ilícito causam danos irreparáveis ao património cultural, situação agravada muitas
vezes pela insuficiência de catálogos e inventariação de bens de instituições públicas e privadas.
A inventariação, designadamente, tem vindo a ser sinalizada, enquanto instrumento de defesa do património
cultural de enorme importância, por entidades internacionais como a UNESCO e o ICOM (The International
Council of Museums).
Também as hesitações, quanto à classificação do património móvel e imóvel, vêm contribuir para a maior
fragilização do regime de proteção de muitos destes chamados «bens culturais», que, nomeadamente, nos
casos em que há grande valor artístico ou patrimonial associado, se tornam assim mais vulneráveis.
Na complexa teia do comércio de arte e antiguidades é corrente misturarem-se obras e artefactos de origem
legal e de origem ilegal, espalhando-se a necessidade de controlo e fiscalização pelos canais legítimos e de
conhecimento e acesso, mais ou menos, públicos, bem como por toda a panóplia de circuitos clandestinos.
Acresce ainda toda a extensão do mundo virtual, cujo papel neste fenómeno é incontornável.
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Outro facto que sobressai é que historicamente os países que têm vindo a ser mais espoliados do seu
património cultural são os que têm menor poder económico e os que têm menor capacidade de defesa do saque
a que foram sujeitos ao longo dos anos.
Se olharmos para a União Europeia e fizermos um breve esforço de memória, evocando casos muito
badalados no nosso País ainda há bem pouco tempo, é fácil perceber onde estamos posicionados e a atenção
que esta temática nos deve merecer.
Tendo em conta a nossa apreciável herança cultural e artística, o nosso País foi dando ao longo da história
alguma atenção à proteção do seu património, datando de 1686 o inventário dos bens contidos na Biblioteca
Real, a título de exemplo.
O maior avanço foi dado, sem dúvida, com a nossa Constituição da República Portuguesa que a todos
envolve no dever de preservar, defender e valorizar o património cultural, elemento vivificador da identidade
cultural comum.
Aplausos do BE e de Deputados do PS.
O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro do
Ó Ramos.
O Sr. Pedro do Ó Ramos (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, Srs. Secretários de Estado, Sr.as e Srs.
Deputados: O Governo veio hoje submeter à Assembleia da República a transposição de uma diretiva que
concerne à restituição dos bens culturais que tenham saído ilicitamente do território de um Estado-membro. É,
de facto, uma matéria importante e sabemos as crescentes ameaças que temos tido todos os dias para preservar
o património cultural.
Aliás, desde sempre, a União Europeia dedicou muita atenção a esta problemática, desde logo, no seu
Tratado, quando permite efetivamente que se possa restringir e até mesmo proibir a importação de bens
culturais.
A verdade é que a União Europeia evoluiu no sentido de criar a Diretiva 1993/7/CE que, de alguma maneira,
procurou estabelecer, de facto, mecanismos para ajudar a preservar este património, evitando a saída desses
bens de um Estado-membro para outro Estado-membro de forma ilícita.
No entanto, relativamente à cooperação que foi instituída, e bem, nessa Diretiva entre Estados-membros e a
Interpol, vários relatórios vieram dizer que essa aplicação foi fraca, ou seja, que não teve a aplicação devida e,
como tal, efetivamente, houve agora necessidade de pensar mais. E não teve a aplicação devida porquê? Desde
logo, porque colocou categorias nos bens, os prazos para a propositura de ação eram relativamente curtos e,
também, e importante, os custos dessas mesmas ações eram muito onerosos.
Portanto, a União Europeia, e bem, decidiu avançar com esta Diretiva que hoje visamos transpor.
Então, o que é que se pretende? Pretende-se, de facto, ter mecanismos mais ágeis, ou seja, pretende-se
que a cooperação seja muito mais efetiva no que diz respeito, desde logo, à eliminação das limitações que todos
tínhamos. As limitações pela antiguidade e pela classificação deixam de existir e, portanto, isto vai, de facto,
alargar a possibilidade de combater muito bem a saída ilícita e o furto desses bens de um Estado-membro para
outro Estado-membro. Depois, também se pretende o aumento do prazo para a propositura de ação para três
anos, desde que se tenha conhecimento que determinado bem está num Estado-membro, e também o aumento
do prazo de seis meses para que alguém possa, de facto, sabendo-se que determinado bem, que saiu
ilicitamente de algum Estado-membro, está nesse Estado-membro, reconhecê-lo.
Parece-me bem, parece-me que vamos no bom caminho, que é o de uma preocupação crescente.
Agora, Sr. Presidente, falamos do projeto de resolução do Bloco de Esquerda, que deu entrada na
Assembleia na semana passada e que, por arrasto, vem já hoje à discussão.
Sr. Deputado, não leve a mal, mas tem há aqui um grande equívoco, quando diz que o anterior Governo
negligenciou «(…) obrigações básicas de preservação do património cultural, (…)». Sr. Deputado, tenho de o
lembrar, com todo o respeito, que o anterior Governo, em termos de classificação de património, nomeadamente,
foi a maior classificador de património de sempre.
O Sr. Pedro Pimpão (PSD): — Bem lembrado!
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O Sr. Pedro do Ó Ramos (PSD): — Deixe-me dar-lhe um número: foram 893 as classificações feitas de
2011 a 2015!
O Sr. Pedro Pimpão (PSD): — Bem lembrado!
O Sr. Pedro do Ó Ramos (PSD): — Sabe quantas foram feitas entre 2002 e 2011? Foram 448! Ou seja, o
anterior Governo fez mais do dobro, fez, de facto, um trabalho notável nesta matéria.
Mas, estando aqui o Sr. Ministro, seria muito importante perceber qual é a política de património e de
aquisição de património móvel do Governo, porque percebemos que este Ministério da Cultura tem um
orçamento muito baixo — estamos a falar de 174 milhões, excluindo o orçamento da RTP…
O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Queira terminar, Sr. Deputado.
O Sr. Pedro do Ó Ramos (PSD): — Vou terminar, Sr. Presidente.
É o orçamento mais baixo de sempre e seria muito importante percebermos o que vão fazer com esse
dinheiro e qual é a política de aquisição de bens culturais móveis.
Sr. Ministro, não temos ouvido nada, nem da sua parte, nem do seu assessor.
Aplausos do PSD.
O Sr. Pedro Pimpão (PSD): — Muito bem!
O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria
Augusta Santos.
A Sr.ª Maria Augusta Santos (PS): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados:
Tem-se assistido a uma congregação de esforços e cooperação permanente entre todos os Estados-membros
da União Europeia no sentido de combater a criminalidade associada à saída ilícita de bens culturais do seu
país de origem.
Trata-se, contudo, de matéria de enorme complexidade na medida em que a circulação ilícita de bens
culturais está quase sempre ancorada na perícia de redes internacionais que contrabandeiam bens culturais,
obras de arte, património.
Com o objetivo de proteger o património cultural móvel contra o tráfico ilegal do nosso País, enquanto Estado-
membro da União Europeia, há necessidade de proceder a uma regulamentação e atualização da matéria em
apreço, transpondo para a ordem jurídica interna a Diretiva 2014/60 da União Europeia que se reveste de
particular importância, na medida em que permitirá ultrapassar algumas das limitações e insuficiências do regime
de proteção e defesa do património cultural coletivo, dando também cumprimento ao estabelecido na
Constituição da República Portuguesa.
Quanto ao projeto de resolução do Bloco de Esquerda, este evidencia legítimas preocupações para com
duas importantes coleções dos séculos XX e XXI. Infelizmente, ainda não disponíveis ao público português,
apesar de se encontrarem constituídas em Portugal há vários anos. Mas as situações de ambas são
substancialmente diferentes.
A coleção Miró pertence a uma entidade pública. Este Governo já assegurou que o processo de inventariação
e classificação irá ter lugar. Para esta bancada, não existe qualquer dúvida a este respeito, aguardamos apenas
que esse processo de desenrole o mais rapidamente possível.
Lembro aqui que foi graças a iniciativas da sociedade civil, e deixem-me agora destacar cinco Deputados do
PS que agiram de uma forma efetiva, que esta coleção se conservou em Portugal.
Quanto à coleção Elipse, ela pertence a uma entidade privada, mas todas as obras já estão inventariadas,
como é obrigatório num processo de insolvência, quer as que se encontram em Serralves, quer as que se
encontram no Banco de Portugal. Acresce-se que esta coleção, ao contrário do que afirma o Bloco de Esquerda,
não está sem acompanhamento técnico, muito pelo contrário. A Comissão Liquidatária do BPP tudo tem feito
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para a preservar em adequadas condições, não existindo qualquer degradação relevante das obras, conforme
atestam os relatórios.
Dito isto, pugnamos para que o futuro desta coleção seja usufruído pelos portugueses e enriqueça o
património artístico nacional.
Seria esse o epílogo perfeito para um episódio mais que imperfeito na história financeira recente do nosso
País.
Aplausos do PS.
A Sr.ª Gabriela Canavilhas (PS): — Muito bem!
O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Srs. Deputados, vamos passar ao ponto 3 da nossa ordem de
trabalhos de hoje que consiste na discussão dos projetos de lei n.os181/XIII (1.ª) — Proíbe a utilização de
menores de idade em espetáculos tauromáquicos (PAN), 217/XIII (1.ª) — Impede a participação de menores de
18 anos em atividades tauromáquicas profissionais ou amadoras e elimina a categoria de matadores de toiros
(BE) e 251/XIII (1.ª) — Restringe o acesso à prática de atividades tauromáquicas, procedendo à primeira
alteração à Lei n.º 31/2015, de 23 de abril, que estabelece o regime de acesso e exercício da atividade de artista
tauromáquico e de auxiliar de espetáculo tauromáquico (Os Verdes).
Para apresentar o projeto de lei, tem a palavra o Sr. Deputado André Silva.
O Sr. André Silva (PAN): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Caros Cidadãos e Cidadãs: Debatemos
hoje os direitos das crianças.
Não está aqui em causa a concordância ou não com a indústria tauromáquica mas tão-somente perceber se
o trabalho de menores nesta indústria viola os direitos das crianças e contraria o disposto no Código do Trabalho
que refere que «Os trabalhos que, pela sua natureza ou pelas condições em que são prestados, sejam
prejudiciais ao desenvolvimento físico, psíquico e moral dos menores são proibidos (…)». E, neste caso,
estamos convictos de que sim.
Esta é também a convicção das entidades que tutelam os direitos das crianças e jovens e que, muito
convenientemente ou, melhor, vergonhosamente, foram ignoradas aquando da discussão da atual lei, cuja
alteração hoje se propõe.
Queremos proteger o superior interesse das crianças ou da indústria tauromáquica?
Entre outras, a Comissão de Regulação do Acesso a Profissões defende que, tendo a legislação fixado a
escolaridade obrigatória até aos 18 anos, então, também só deveriam participar neste tipo de atividades
indivíduos cuja escolaridade obrigatória esteja já cumprida, o que aos 16 anos não acontece.
O Comité dos Direitos da Criança da ONU recomendou ao Governo português a proibição de participação
de crianças em touradas, enquanto participantes ou espectadoras.
Espero que cada um dos Deputados que não votar favoravelmente este projeto de lei tenha consciência de
que também é responsável se um menor morrer ou ficar gravemente ferido a exercer uma atividade que é
incontestavelmente perigosa, já que, certamente, não será responsabilidade nem do menor, nem do touro.
Protestos do PSD e do CDS-PP.
As maiores atrocidades da História foram cometidas sob a égide da lei. O facto da indústria tauromáquica
ser legal não quer dizer que sujeitar menores a esta atividade violenta seja adequado, justo ou legítimo. Se
assim fosse não haveria evolução.
A não aprovação do presente projeto de lei revela desconsideração total pelos direitos fundamentais das
crianças a um desenvolvimento sadio, livre de perigo e que lhes permita crescer para serem adultos que
respeitem a dignidade de todos os seres.
O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Queira terminar, Sr. Deputado.
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O Sr. André Silva (PAN): — Esperamos hoje que, no Dia Mundial da Criança, os Srs. Deputados provem
que elas são mais importantes.
Aplausos do BE, do PCP e de Deputados do PS.
O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro
Soares.
O Sr. Pedro Soares (BE): — Sr. Presidente, Sr.as Deputadas, Srs. Deputados: Sugeria alguma serenidade
neste debate, porque acho que é isso que é preciso.
Vozes do PSD: — Ah!…
O Sr. Pedro Soares (BE): — O projeto de lei apresentado pelo Bloco de Esquerda refere-se tão-só à limitação
da participação em touradas de menores de 18 anos.
O Estado tem a obrigação de proteger os menores de atividades que promovem a violência, frequentemente
com aspetos cruéis, sobre animais. E é a violência e a exposição de menores a essa violência que está no
centro das nossas preocupações.
Protestos de Deputados do PSD e do Deputado do CDS-PP Telmo Correia.
Compreendemos que haja um lastro de tradicionalismo à volta das touradas que nós não queremos
questionar para já, mas que deve ser objeto de debate no Parlamento e na opinião pública.
Este é, também, o nosso contributo para esse debate, a que estão sujeitas todas as atividades do nosso País
e ao qual a tourada não se pode eximir.
Saudamos o contributo para este debate, dado por uma petição, que pretende que seja proibido o trabalho
e assistência por menores em espetáculos tauromáquicos, que deu entrada na Assembleia da República em 16
de dezembro de 2015 e que obteve mais de 20 000 subscritores, e só por razões processuais é que não pode
estar hoje em debate, o que lamentamos.
A perceção da nossa sociedade sobre a violência contra animais evoluiu — e hoje temos muito mais a
perceção sobre essa evolução —, despertou para os direitos incontornáveis dos animais a não serem
maltratados e torturados e cada vez mais as pessoas não aceitam que a violência, real e explícita, seja defendida
como um espetáculo para gáudio de apenas alguns.
Aplausos do BE e do PAN.
Hoje ninguém aceitaria que um qualquer outro animal, muito menos um dos nossos animais de estimação,
como alguns se referem aos touros, fosse colocado num espaço para ser sujeito a uma violência que alguns
querem que seja lúdica.
Ninguém aconselharia os seus filhos, por maior que seja a liberdade das famílias na educação das suas
crianças, nenhuma família saudável…
A Sr.ª Patrícia Fonseca (CDS-PP): — Saudável?!
O Sr. Pedro Soares (BE): — … permitiria que os seus filhos participassem num espetáculo em que um
qualquer animal fosse violentamente torturado. Por que é que isto há de ser permitido em relação a um
espetáculo com touros que são violentados com grande crueldade?!
Vozes do BE e do PS: — Muito bem!
Vozes do CDS-PP: — E o boxe?!
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O Sr. Pedro Soares (BE): — Com todo o respeito e elevada consideração pelas profundas raízes culturais
de muitos territórios rurais…
Vozes do CDS-PP: — Não parece!
O Sr. Pedro Soares (BE): — … e mesmo de atividades agrícolas, não podemos deixar de fazer este
debate,…
Protestos do CDS-PP.
… porque, de facto, a nossa sociedade evolui e as suas conceções sobre os direitos dos seres vivos evoluem
também e não podem deixar de ser consideradas na lei. É nossa responsabilidade como Assembleia da
República.
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Muito bem!
O Sr. Pedro Soares (BE): — Até aos 18 anos de idade, no mínimo, o empenho e o esforço da nossa
sociedade deve ser o de garantir condições para a escolaridade obrigatória. O grande desígnio do Estado deve
ser o de proteger as crianças de maus tratos, da pobreza, da falta de uma família que lhe dê afeto e garanta
condições de vida dignas…
O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Queira terminar, Sr. Deputado.
O Sr. Pedro Soares (BE): — … para o seu crescimento físico, psicológico e moral. É esse o grande desígnio
do Estado e é essa a nossa responsabilidade, Sr.as e Srs. Deputados.
À luz destes desígnios e da Convenção sobre os Direitos da Criança, também, consideramos que permitir o
trabalho de menores em espetáculos tauromáquicos é uma contradição perversa que deve ser corrigida na lei.
Aplausos do BE e do PAN.
Protestos do CDS-PP.
O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Para uma intervenção, em nome do Grupo Parlamentar do
Partido Ecologista «Os Verdes», tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Os Verdes apresentam hoje
um projeto de lei à Assembleia da República que visa restringir o acesso à prática de atividades tauromáquicas.
Como é sabido, e acho que é evidente, uma cada vez maior percentagem de portugueses vai tomando
consciência da agressividade genética do espetáculo tauromáquico, em particular direcionada para os animais
não humanos, sujeitos a evidentes e degradantes torturas, mas também, em relação aos participantes, vai
gerando uma cada vez maior intolerância ao espetáculo em causa. Pese embora nós, Os Verdes, tenhamos
consciência de que a intolerância, em relação às touradas, não é unânime no nosso País, a verdade é que,
independentemente da posição que tenhamos sobre esta atividade em concreto, há um facto objetivo que
ninguém nega: as touradas são um espetáculo violento e arriscado.
Ora, Sr.as e Srs. Deputados, é bom lembrar também que a Convenção sobre os Direitos da Criança determina
que os Estados têm a responsabilidade de proteger as crianças em relação a um conjunto de agressões, entre
as quais a sujeição a trabalhos perigosos ou prejudiciais à sua saúde, desenvolvimento físico e mental.
Nessa sequência, esta Convenção determina que os Estados têm a obrigação de criar medidas, incluindo
legislativas, para assegurar aquela proteção às crianças. É isso que Os Verdes hoje se propõem fazer aqui, na
Assembleia da República, com o projeto de lei que apresenta.
Por isso, Sr.as e Srs. Deputados, propomos uma alteração à lei no sentido, vejam bem, de repor o texto da
anterior lei, antes da vigência ou da alteração feita em 2015.
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Concretizando, essa lei previa que os ditos «artistas tauromáquicos» só o poderiam ser se fossem detentores
da habilitação da escolaridade obrigatória. Entretanto, a lei foi alterada em 2015, estabelecendo a idade dos 16
anos de idade.
Vozes do CDS-PP: — Claro!
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Significa, portanto, que, em termos práticos, se desceu a idade,…
A Sr.ª Patrícia Fonseca (CDS-PP): — Não!
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — … porque a escolaridade obrigatória estava no 12.º ano. Por isso,
Sr.as e Srs. Deputados, ao considerar os 16 anos, a idade baixou. Ora, o que Os Verdes propõem é que se
retome o texto da lei anterior, e, nesse caso, subimos para o 12.º ano a escolaridade obrigatória, subimos a
idade para os 18 anos, logo subimos para os maiores de idade e retiramos os menores deste degradante
espetáculo — classifico-o assim na perspetiva de Os Verdes, sabendo que outras Sr.as e Srs. Deputados não o
classificariam dessa forma. De qualquer modo, a unanimidade está na violência e na agressividade deste
espetáculo.
Protestos da Deputada do CDS-PP Cecília Meireles.
Por isso, como referi, o que propomos é que os artistas tauromáquicos e os auxiliares devem estar habilitados
com a escolaridade obrigatória.
Agora, as Sr.as e os Srs. Deputados podem dizer: «Está bem, mas porque não estabelecer, de facto, os 18
anos e manter o texto que estava na lei anteriormente?»
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Era o que fazia sentido!
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — É que, Sr.as e Srs. Deputados, os ecologistas têm uma mania, que
é acreditar muito na educação e nas suas mais diversas perspetivas.
Risos do CDS-PP.
É verdade!
Risos do CDS-PP.
Consideramos que a escola há de ter um papel importante na fixação da mentalidade para a tolerância, para
a não violência e para uma maior interação, com mais respeito por todos os seres que, connosco, habitam neste
planeta.
Protestos da Deputada do CDS-PP Cecília Meireles.
E é verdade, é para isso que nós, Os Verdes, queremos também contribuir, para uma educação mais
interativa e mais respeitadora do meio e, designadamente, da natureza.
Enfim, Sr.as e Srs. Deputados, é este o projeto que trazemos à Assembleia da República e a nossa esperança
é ver a concordância por parte dos restantes grupos parlamentares.
Porém, não quero terminar esta intervenção sem, antes, saudar uma petição — que também teve o apoio da
associação animal, a quem quero reconhecer o trabalho que tem feito nesta matéria — que, de certeza, há de
trazer novamente esta matéria à Assembleia da República e que também ajudará na reflexão da Assembleia da
República sobre o assunto.
Discutir aqui, promover o debate, é sempre importante e trazer respostas é, evidentemente, também crucial.
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Aplausos do BE e do PAN.
O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Para uma intervenção, em nome do Grupo Parlamentar do
Partido Socialista, tem a palavra o Sr. Deputado André Pinotes.
O Sr. André Pinotes Batista (PS): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Permitam-me, antes de mais, que, em
nome da bancada parlamentar do Partido Socialista, saúde todos aqueles que estão aqui, nas galerias,
representantes das atividades tauromáquicas e também dos direitos dos animais, bem como a presença deles
na defesa das convicções das comunidades que representam.
Vozes do PS: — Muito bem!
O Sr. André Pinotes Batista (PS): — O tema de fundo, que ora debatemos, gerou, ao longo dos últimos
anos, apaixonados exercícios dialéticos e salutares disputas democráticas que mais não são do que o confronto
saudável entre interesses louváveis, mas antagónicos, aos quais cumpre a esta Casa estabelecer equilíbrio.
Este é um dos nossos diapasões: equilibrar.
A Sr.ª Hortense Martins (PS): — Muito bem!
O Sr. André Pinotes Batista (PS): — Cabe-nos, por isso, a responsabilidade de agir sob a égide da
tolerância, do bom senso, da capacidade de ponderar de forma integrada os interesses que há pouco referia,
que, sendo legítimos, reforço, são litigantes entre si.
Caros Colegas, cabe, aliás, recordar que no decurso da XII Legislatura a presente Câmara se pronunciou
sobre estas matérias em apreço, revendo o enquadramento legal e permitindo, com a aprovação da Lei n.º
31/2015, a fixação da idade mínima de 16 anos para as atividades tauromáquicas e a remissão do
enquadramento da idade mínima para forcados e outros amadores para o regime do Código do Trabalho e para
a intervenção da Comissão de Proteção de Crianças e Jovens. Este quadro legal permitiu a manutenção de uma
atividade que, em muitas zonas do nosso País, se reveste de um interesse cultural inquestionável e, ao mesmo
tempo, a proteção de um bem jurídico de valor maior, como é o direito à proteção dos animais. Volto a dizer que
o papel desta Casa é o do equilíbrio.
As iniciativas legislativas hoje aqui discutidas pretendem alterar mais este enquadramento e estipular a idade
mínima de acesso a estas atividades para os 18 anos, em paridade com a maioridade. As soluções em debate,
se aprovadas, acarretariam, certamente, implicações no desenvolvimento futuro da atividade tauromáquica,
facto que não pode ser escamoteado.
A este propósito, lembrando as alterações do ano transato, cabe-nos recordar que o valor da estabilidade
legislativa, não constituindo per se uma riqueza, configura um importante compasso na nossa ação legislativa.
Nos últimos anos, o articulado jurídico tem evoluído de forma equilibrada na justa ponderação da defesa dos
direitos dos animais, bem como na dimensão económica, cultural e social das atividades tauromáquicas, e a
nossa opinião é a de que devemos dar continuação a este diapasão.
Srs. Deputados, permitam-me que declare o óbvio até agora não expresso. O assunto em apreço alicia
algumas intervenções mais afoitas e algum sacrifício da razão.
Então, para finalizar, quero transmitir-vos que esta é uma matéria que, no entendimento do PS, carece de
um maior aprofundamento, com o envolvimento das forças que há pouco referi, de auscultar as reais
preocupações que as pessoas têm e os impactos que as alterações legislativas nos trouxeram, mas, ao mesmo
tempo, o Partido Socialista dá liberdade aos seus parlamentares para, como é sua tradição, como é a sua práxis
para a riqueza do debate parlamentar, agirem em conformidade com a sua consciência.
Por fim, quero dizer que os portugueses sabem que o único extremismo que o Grupo Parlamentar do Partido
Socialista está disponível para aceitar é o radicalismo do fomento da tolerância e das opiniões divergentes.
A Sr.ª Hortense Martins (PS): — Muito bem!
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O Sr. André Pinotes Batista (PS): — Este é um traço distintivo da nossa ação e é um compromisso, um
contrato, que há mais de 42 anos cumprimos com os portugueses, e continuaremos a cumprir.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Para uma intervenção, em nome do Grupo Parlamentar do PSD,
tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Serra.
O Sr. Nuno Serra (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Os três documentos que hoje estão em
discussão querem proibir o exercício da atividade de artista e de auxiliar tauromáquico a jovens entre os 16 e
18 anos de idade. Isso mesmo: alterar o regime jurídico do trabalho somente para uma atividade que está inscrita
em lei desde 1991 como património cultural popular.
Depois de 40 anos de uma revolução democrática, onde a livre expressão e a realização pessoal passaram
a ser léxico comum nas nossas conversas, hoje discute-se, no Parlamento, a proibição da prática de uma
atividade consagrada na lei como cultura portuguesa.
O Sr. António Carlos Monteiro (CDS-PP): — Muito bem!
O Sr. Nuno Serra (PSD): — Curioso: nos tempos das liberdades, os três partidos proponentes destes
documentos arrojam-se de ser os paladinos das tolerâncias e das liberdades; hoje, estes documentos
discriminam jovens dependentes das funções e das suas realizações pessoais.
A Sr.ª Maria das Mercês Soares (PSD): — Muito bem!
O Sr. Nuno Serra (PSD): — Aliás, as liberdades de que estes Srs. Deputados são defensores são sempre
as únicas para eles e não aquelas liberdades que os portugueses defendem.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Srs. Deputados, a discriminação faz-se de várias formas, e, para atestar isso, basta ver aquilo que o Bloco
de Esquerda, por exemplo, já tem defendido várias vezes neste Parlamento. Ou seja, o BE defende que os
jovens com 16 anos de idade têm faculdades para votar, que conseguem decidir quem deve ser os nossos
governantes, quem deve estar à frente do nosso País,…
Vozes do PSD: — Exatamente!
O Sr. Nuno Serra (PSD): — … mas hoje diz que esses mesmos jovens não têm capacidade para decidir se
podem ser, ou não, praticantes de tauromaquia.
A Sr.ª Maria das Mercês Soares (PSD): — Muito bem!
O Sr. Nuno Serra (PSD): — O mesmo Bloco de Esquerda já defendeu que os jovens devem ter permissão
para fumar aos 16 anos, para beber aos 16 anos, até para consumir canábis aos 16 anos, mas não podem ser
praticantes tauromáquicos aos 16 anos!
Aplausos do PSD.
O mesmo Bloco de Esquerda, na semana passada, apresentou na Mesa um diploma que considera que a
partir dos 16 anos deve ser reconhecida a qualquer pessoa o direito à autodeterminação do género. Ou seja,
um jovem tem o direito de decidir o seu sexo, o que condiciona a sua vida futura, mas não tem o direito de ser
um praticante tauromáquico.
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Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Srs. Deputados do Partido Ecologista «Os Verdes», é verdade que a escolaridade mínima obrigatória deve
ser um desígnio de todos, mas, Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia, hoje, há deputados, há ministros, há
presidentes de câmara, há presidentes de junta, há pintores, há bailarinos que até para tirarem a carta de
condução não precisam de ter a escolaridade obrigatória.
Por isso, Sr.ª Deputada, como é que se pode exigir a escolaridade obrigatória para se ser artista
tauromáquico?!
Protestos da Deputada de Os Verdes Heloísa Apolónia.
Mais, Sr.ª Deputada: ouvi-a durante anos e anos dizer que existiam muitos jovens que tinham dificuldade no
acesso à educação e que muitos jovens querem ter a escolaridade mínima obrigatória e não conseguem. Como
é que pode discriminar esses jovens que queriam estudar, que queriam ter a escolaridade mínima obrigatória e
hoje não podem realizar-se profissionalmente porque não conseguiram tê-la?
O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Queira terminar, Sr. Deputado.
O Sr. Nuno Serra (PSD): — Não esperava isso da parte de Os Verdes, Sr.ª Deputada. É a isso que chamam
igualdade para todos? É a isso que chamam tolerância? É a isso que chamam liberdade?
O Sr. Jorge Paulo Oliveira (PSD): — Muito bem!
Protestos da Deputada de Os Verdes Heloísa Apolónia.
O Sr. Nuno Serra (PSD): — Srs. Deputados, assumam-se e não usem os jovens, não usem subterfúgios
para assumir a vossa agenda. A vossa agenda é a de colocar em causa a tauromaquia.
O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Queira terminar, Sr. Deputado.
O Sr. Nuno Serra (PSD): — Srs. Deputados, assumam-se rapidamente, senão correm o risco de dar razão
ao socialista Professor Vital Moreira e serem considerados «uma fraude política».
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Para uma intervenção, tem a palavra, em nome do Grupo
Parlamentar do PCP, a Sr.ª Deputada Ana Mesquita.
A Sr.ª Ana Mesquita (PCP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Sendo hoje o Dia Internacional da
Criança, o PCP saúda esta comemoração que se iniciou há várias décadas com o objetivo de chamar a atenção
para os problemas que as crianças enfrentavam.
Aproveitamos para relembrar os graves problemas que milhões de crianças continuam a viver em todo o
mundo, como a pobreza, a fome, a doença, a falta de bens essenciais, a negação dos direitos à saúde, à
educação, à cultura e à proteção social. Estes são problemas centrais que atingem as crianças e dos quais não
podemos desviar a nossa atenção.
Por isso mesmo, o Grupo Parlamentar do PCP entregou hoje um conjunto de projetos com medidas para o
alargamento da rede de creches, para a universalização da educação pré-escolar, para o reforço das comissões
de proteção de crianças e jovens e também para o combate à pobreza infantil, que atinge uma em cada quatro
crianças portuguesas.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Muito bem!
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A Sr.ª Ana Mesquita (PCP): — Quanto às iniciativas aqui trazidas, o tema da idade para a prática
tauromáquica foi objeto de discussão na última Legislatura e nessa altura o PCP questionou o então Secretário
de Estado da Cultura sobre uma alteração inserida que desvinculava o exercício destas atividades da
escolaridade obrigatória e a passava a associar ao mínimo de 16 anos de idade. Os motivos para tal alteração
nunca ficaram cabalmente esclarecidos, tendo o PCP sido o único partido a votar contra a inserção do n.º 4 do
artigo 3.º da Lei n.º 31/2015.
Também hoje várias são as dúvidas que se levantam na abordagem deste assunto, designadamente em
termos da separação das atividades profissionais das atividades amadoras, das condições em que a atividade
é exercida por menores de idade e da aplicação em concreto daquilo que é aprovado em lei.
Continuamos a ter dúvidas sobre a equiparação entre a atividade profissional e a atividade amadora, situação
que as propostas em discussão continuam a não resolver.
O Sr. Jorge Machado (PCP): — Exatamente!
A Sr.ª Ana Mesquita (PCP): — Outro aspeto a ponderar é a necessidade de articulação entre a legislação
sobre a tauromaquia e aquela que já existe, regulamentando não só a prestação de trabalho por menores mas
também a prática de atividades que envolvam perigo para os menores ou os exponham à violência.
Nenhuma das propostas em discussão põe em causa a classificação da tauromaquia como um espetáculo
de natureza artística que, nos termos da lei, tem a sua prática por menores de idade regulamentada no âmbito
da participação em atividade de natureza cultural, artística ou publicitária, estando previstos, inclusivamente, os
moldes em que deve ocorrer nos casos em que exista contacto com animais.
Assim, afigura-se insuficiente o critério estritamente baseado na idade de trabalho e verifica-se ainda a
necessidade de articulação com o quadro legal já existente para as situações de eventual perigosidade ou de
exposição à violência.
O PCP entende que não deve existir uma consideração isolada sobre as designadas «situações de eventual
perigosidade ou violência para os menores de idade», relembrando outros exemplos como os desportos
motorizados ou de combate ou, mesmo, a participação noutros espetáculos culturais e artísticos, como as artes
circenses e a produção cinematográfica e televisiva que possam, em determinadas circunstâncias, envolver a
exposição dos menores ao perigo ou à violência.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Muito bem!
A Sr.ª Ana Mesquita (PCP): — Por fim, coloca-se o problema de saber em que condições a fiscalização
destas propostas seria possível e que consequências concretas resultariam da sua aprovação, considerando
práticas e costumes de muitas comunidades.
Como a experiência passada demonstra, não é solução e não se deve considerar como boa a ideia de que
se deve determinar por decreto ou por lei o destino daquilo que é sentido por algumas comunidades como parte
dos seus costumes e tradições populares.
Aplausos do PCP e da Deputada do PS Isabel Alves Moreira.
O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Para uma intervenção, tem agora a palavra, em nome do Grupo
Parlamentar do CDS-PP, o Sr. Deputado Telmo Correia.
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Em primeiro lugar e serenamente,
em nome do CDS, queria dizer que temos plena consciência de que esta questão não é consensual na
sociedade portuguesa. Talvez por isso não deva ser determinada por nenhuma política do gosto ou por nenhum
tipo de autoritarismo ou de ameaça proibicionista como aquelas que já vimos aqui hoje.
A Sr.ª VâniaDias da Silva (CDS-PP): — Muito bem!
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O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Existem várias sensibilidades. Existe a sensibilidade daqueles que vivem
a tauromaquia, que são aficionados, que vivem no mundo rural, que crescem com a tauromaquia, e isso será
indesmentível. Por outro lado, existe a sensibilidade daqueles para quem, sempre e em qualquer caso, a
tauromaquia será uma forma de violência contra o animal. E existe, eventualmente, não sei se é uma maioria
mas é uma larga parte dos portugueses que podem, ocasionalmente, assistir a um espetáculo tauromáquico,
que podem acompanhar e que, no entanto, não defendem a proibição.
No entanto, o que é que está aqui em causa? A violência em relação aos animais? Bom, a lei que prevê e
que regula a violência contra os animais, a Lei n.º 92/95, exceciona precisamente a tauromaquia dessa violência.
O Sr. Pedro Soares (BE): — Não deixa de ser violenta!
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Exceciona porquê? Exceciona porque, e vou citar, «A corrida à
portuguesa constitui uma manifestação singular da originalidade da cultura lusa». Estas não são palavras
minhas, são palavras de um parecer da ERC, na altura liderada pelo atual Ministro da Defesa. Uma expressão
da cultura portuguesa — é essa expressão da cultura portuguesa que faz a exceção.
Mas podemos pensar, então, que esta razão cultural, que tem proteção constitucional, não é suficiente e que
o que está em causa, de facto, são, como referem os projetos proibicionistas do PAN e do Bloco de Esquerda,
os menores. E eu pergunto: o que está em causa são os menores, mas como? Está em causa o quê? Os
menores participarem numa atividade violenta? Bom, então por que é que os senhores não trazem um projeto
que proíba os menores de participarem no boxe, em qualquer atividade marcial, em qualquer tipo de atividade
que possa ser violenta? Os senhores não o fazem porque não é isso que querem.
A Sr.ª VâniaDias da Silva (CDS-PP): — Muito bem!
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — O que é que está em causa? O risco para os menores? O Sr. Deputado
do PAN foi até longe demais. O risco para os menores? Bom, então por que é que os senhores não trazem um
projeto que proíba os menores de participarem, mesmo com a autorização dos pais, porque é assim que se faz
e quem manda são os pais, não é o Estado,…
A Sr.ª VâniaDias da Silva (CDS-PP): — Muito bem!
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — … em desportos motorizados ou em desportos na natureza — na
montanha, no mar… — em que possa existir qualquer tipo de risco para os menores? Por que é que não o
fazem? Não o fazem porquê? Não o fazem porque não é isso que os senhores querem. Os senhores querem é,
por preconceito cultural, proibir a tauromaquia e não têm a coragem de o assumir aqui.
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
Os senhores querem, por puro preconceito, proibir a tauromaquia e não têm a coragem de o assumir aqui.
Bom, e falo dos projetos que são proibicionistas. É porque os senhores também proíbem os amadores, não
são só os profissionais.
O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Queira terminar, Sr. Deputado.
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Ninguém começa a ser toureiro aos 18 anos de idade. É ridículo, e o Sr.
Deputado sabe isso.
O Sr. André Silva (PAN): — Começam aos 10 anos!
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Só para terminar, Sr. Presidente, em relação ao projeto de Os Verdes,
queria dizer à Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia que a sua iniciativa legislativa parece uma coisa de concorrência
da esquerda, até pela posição manifestada pelo PCP.
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Sr.ª Deputada, dizer que o problema é o de ser preciso ter a escolaridade obrigatória, é ridículo,…
Protestos da Deputada de Os Verdes Heloísa Apolónia.
… repito, é ridículo. É o mesmo que dizer que um campino ou um bandarilheiro, um homem que viveu com
os touros a vida toda e tem 40 anos de idade mas não tem a escolaridade obrigatória não pode ser toureiro.
Risos do CDS-PP.
O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Queira terminar, Sr. Deputado.
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Isto nada tem a ver com menores. Isto é o quê? É conseguir falar com o
touro? É entender o Picasso ou o Goya? É conseguir citar o touro em inglês? Para que é que a senhora quer a
escolaridade obrigatória, Sr.ª Deputada?!
Protestos da Deputada de Os Verdes Heloísa Apolónia.
O que os senhores querem é proibir a tourada, na lógica…
O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Queira terminar, Sr. Deputado.
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — … de alguns antigos estabelecimentos comerciais em Portugal em que
se podia ler o seguinte: «Vendemos fiado? Vendemos, mas tem de ter 90 anos e vir acompanhado pelos pais».
É por aí que os senhores estão a ir.
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Terminámos, assim, o debate, na generalidade, dos projetos de
lei n.os 181, 217 e 251/XIII (1.ª), terceiro e último ponto da nossa ordem de trabalhos de hoje.
O Plenário da Assembleia da República volta a reunir amanhã, às 15 horas, com uma marcação do CDS-
PP, sobre envelhecimento ativo e proteção de idosos.
São os seguintes os diplomas que vão estar amanhã em discussão: na generalidade, os projetos de lei n.os
244/XIII (1.ª) — Sexta alteração à Lei n.º 108/91, de 17 de agosto, lei do Conselho Económico e Social, de modo
a incluir no plenário dois representantes dos reformados, aposentados e pensionistas (CDS-PP), 245/XIII (1.ª)
— Altera o Código Penal, dispensando de queixa o crime de violação de obrigação de alimentos e agravando
as respetivas penas (CDS-PP), 246/XIII (1.ª) — Altera o Código Civil, criando a indignidade sucessória dos
condenados por crimes de exposição ou abandono ou de omissão de obrigação de alimentos (CDS-PP), 247/XIII
(1.ª) — Primeira alteração à Lei n.º 25/2012, de 16 de julho, alargando a dimensão do testamento vital ao
planeamento da velhice, para além da situação de doença (CDS-PP), e 248/XIII (1.ª) — Procede à décima
primeira alteração à Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro, que aprova o Código do Trabalho, estabelece o direito
do trabalhador que estiver a um ano da idade legal de reforma poder optar por trabalhar a tempo parcial por dois
anos (CDS-PP), conjuntamente com os projetos de resolução n.os 336/XIII (1.ª) — Recomenda ao Governo que
reveja a legislação de modo a defender os idosos de penalizações e exclusões abusivas de que são alvo em
função da idade (CDS-PP), 337/XIII (1.ª) — Recomenda ao Governo que altere a Portaria n.º 87/2006, de 24 de
janeiro, revendo o procedimento do Cartão do Voluntário (CDS-PP), 338/XIII (1.ª) — Recomenda ao Governo
que crie incentivos adicionais de apoio à contratação de desempregados maiores de 55 anos (CDS-PP), 339/XIII
(1.ª) — Recomenda ao Governo que crie um plano de gestão da carreira dirigido aos trabalhadores mais velhos
(CDS-PP), 340/XIII (1.ª) — Recomenda ao Governo que elabore e execute uma estratégia nacional para um
envelhecimento ativo e para a longevidade (CDS-PP), 341/XIII (1.ª) — Recomenda ao Governo que equipare
ao sector público o regime do sector privado, em que é permitido, a quem pretender, continuar a trabalhar depois
dos 70 anos (CDS-PP), 342/XIII (1.ª) — Recomenda ao Governo que incentive o desenvolvimento de iniciativas
de voluntariado sénior (CDS-PP), 343/XIII (1.ª) — Recomenda ao Governo que melhore e qualifique o serviço
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de apoio domiciliário (CDS-PP), 344/XIII (1.ª) — Recomenda ao Governo que pondere e estude o alargamento
do âmbito e das competências da atual Comissão Nacional de Promoção dos Direitos e Proteção das Crianças
e Jovens (CDS-PP), 345/XIII (1.ª) — Recomenda ao Governo que proceda à atualização dos preços dos
cuidados de saúde e de apoio social nas unidades de internamento e ambulatório da Rede Nacional de Cuidados
Continuados Integrados (RNCCI) (CDS-PP), 346/XIII (1.ª) — Recomenda ao Governo que reative a linha Saúde
24 Sénior até ao início do outono (CDS-PP), 347/XIII (1.ª) — Recomenda ao Governo que promova uma
campanha informativa de divulgação e incentivo ao registo do testamento vital nos principais meios de
comunicação social e em todos os serviços públicos com locais de atendimento, incluindo autarquias (CDS-PP),
348/XIII (1.ª) — Recomenda ao Governo o reforço da formação em cuidados paliativos em Portugal (CDS-PP)
e 349/XIII (1.ª) — Recomenda ao Governo que reforce a formação dos profissionais de saúde na área da
geriatria, a nível pré e pós graduado, nomeadamente ao nível da especialização médica (CDS-PP).
No final do debate, proceder-se-á às votações regimentais.
Desejo a todos um final de tarde muito harmonioso.
Está encerrada a sessão.
Eram 18 horas e 20 minutos.
Presenças e faltas dos Deputados à reunião plenária.
A DIVISÃO DE REDAÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL.