17 DE JUNHO DE 2016
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projeto de uma parceria transatlântica de comércio e investimento é de tal modo importante que justifica
cabalmente o conhecimento e a discussão pública e um intenso escrutínio parlamentar.
Na minha intervenção inicial, explicitarei a posição do Governo, organizando-a em três tópicos: por que
defendemos o empenhamento da União Europeia, e dentro dela de Portugal, na negociação de uma parceria
económica com os Estados Unidos e o Canadá; por que sustentamos que só vale a pena concluir a negociação
com os Estados Unidos até ao fim do corrente ano se dela resultar um acordo robusto; e por que advogamos o
acompanhamento o mais próximo possível da negociação por parte do Parlamento, dos parceiros sociais e da
opinião pública.
A razão primeira da importância crucial do TTIP para os europeus é de natureza geopolítica e geoestratégica.
Um acordo comercial e económico entre a Europa e os Estados Unidos reforça a centralidade do Atlântico,
equilibrando melhor o jogo entre as grandes forças de tração que operam no mundo globalizado. Esta
centralidade não é apenas económica mas, sim, da ligação transatlântica que exprime uma vinculação comum
à ordem política, democrática e cosmopolita. Que ela se faça com protagonismo exigente e crítico da União
Europeia é uma garantia adicional do enquadramento nessa ordem democrática das dinâmicas económicas de
mercado e, portanto, do respeito dessas dinâmicas pelos valores e pelas normas de caráter social e ambiental
que distinguem os europeus.
Não há, aliás, razão alguma para que esta funcionalidade do comércio internacional para a consolidação de
equilíbrios geopolíticos se reduza ao espaço do Atlântico Norte.
Por isso mesmo, Portugal, que esteve entre os mais empenhados no acordo com o Canadá e está
empenhado no que respeita ao TTIP, é também um dos Estados-membros da União Europeia que mais
persistentemente age em favor das negociações com o Mercosul e mais se bate pelo incremento da cooperação
europeia com os espaços e organizações económicas da África ocidental e do sul.
O nosso País tem aqui um interesse estratégico. O que acentua a vinculação atlântica da Europa melhora o
posicionamento de Portugal na Europa; o que favorece o elo norte-atlântico potencia o modo específico como a
geografia e a história nos fazem viver esse elo norte-atlântico; e o que vira a Europa para o Atlântico no seu todo
abre novos caminhos ao papel mediador de Portugal entre o Velho Continente, as Américas e parte substancial
de África.
Estas considerações não pretendem diminuir o valor económico do TTIP. Articulando os dois blocos mais
avançados, este terá um impacto poderoso sobre a dinâmica económica global, criará uma nova janela de
oportunidade para a Europa, em termos de inovação tecnológica e empresarial, salvaguarda do seu modelo de
relações laborais e reinserção positiva na cadeia internacional de valor.
E não é menos importante a natureza do tratado, que incide não somente nas pautas aduaneiras mas
também nas chamadas «barreiras não alfandegárias» e, sobretudo, nos padrões regulamentares que
enquadram o comércio e o investimento.
Portugal tem interesse no TTIP, porque é uma economia aberta que quer ser mais competitiva e basear a
competitividade no conhecimento e na inovação. Acresce que Portugal tem um interesse específico, porque a
importância do mercado norte-americano está a crescer e pode crescer muito mais, porque o desenvolvimento
do comércio atlântico aumentará o valor do nosso sistema de logística e de transportes e porque temos na
negociação em curso mais pontos ofensivos do que defensivos, já que os produtos que mais exportamos para
os Estados Unidos são dos atualmente mais sujeitos a picos pautais.
Isto não significa, bem entendido, que não procuremos acautelar os nossos pontos defensivos e que não
compensemos com medidas de política adequadas os setores que venham a ficar sujeitos a concorrência
reforçada.
Mas por isso, porque nos parece tão importante do ponto de vista da política externa e da política económica
a celebração do TTIP, é que entendemos que ela só vale a pena se der origem a um acordo robusto e produtivo.
Robusto significa com conteúdo — não faria sentido ficarmos agora por uma simples redução de umas tantas
tarifas pautais. Produtivo quer dizer benéfico para a economia orientada para a sustentabilidade e o
desenvolvimento, que nós, europeus, valorizamos.
Os requisitos são claros. O TTIP não pode implicar — repito, não pode implicar — nenhuma redução
substancial dos padrões europeus no que concerne à saúde pública e à segurança alimentar, o modo de relação
salarial e a proteção ambiental.