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Quinta-feira, 19 de janeiro de 2017 I Série — Número 40
XIII LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2016-2017)
REUNIÃOPLENÁRIADE18DEJANEIRODE 2017
Presidente: Ex.mo Sr. Eduardo Luís Barreto Ferro Rodrigues
Secretários: Ex.mos Srs. Emília de Fátima Moreira Santos Idália Maria Marques Salvador Serrão Sandra Maria Pereira Pontedeira
S U M Á R I O
O Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 5
minutos. Ao abrigo do artigo 74.º do Regimento, procedeu-se a um
debate de urgência, requerido pelo Grupo Parlamentar do BE, sobre transportes públicos. Proferiram intervenções, na fase de abertura, o Deputado Heitor Sousa (BE) e o Ministro do Ambiente (João Pedro Matos Fernandes), tendo-se seguido no uso da palavra, além daqueles oradores e do Secretário de Estado Adjunto e do Ambiente (José Mendes), os Deputados Carlos Santos Silva (PSD), João Paulo Correia (PS), Hélder Amaral (CDS-PP), Bruno Dias (PCP), José Luís Ferreira (Os Verdes), Luís Leite Ramos (PSD), Carlos Pereira (PS), José Moura Soeiro (BE) e Pedro Mota Soares (CDS-PP). No encerramento do debate, proferiram intervenções o Ministro do Ambiente e o Deputado Pedro Filipe Soares (BE).
Foi debatido, na generalidade, o projeto de lei n.º 322/XIII (2.ª) — Cria a conta de gestão florestal(CDS-PP) juntamente com o projeto de resolução n.º 609/XIII (2.ª) —Recomenda ao Governo a atribuição de apoios financeiros aos produtores
florestais (BE), tendo proferido intervenções os Deputados Patrícia Fonseca (CDS-PP), Carlos Matias (BE), Maurício Marques (PSD), João Ramos (PCP) e Francisco Rocha (PS).
Procedeu-se à apreciação do Decreto-Lei n.º 57/2016, de 29 de agosto, que aprova um regime de contratação de doutorados destinado a estimular o emprego científico e tecnológico em todas as áreas do conhecimento [apreciações parlamentares n.os 25/XIII (2.ª) (PCP) e 23/XIII (2.ª) (BE)], juntamente, na generalidade, com o projeto de lei n.º 368/XIII (2.ª) — Procede à primeira alteração do Decreto-Lei n.º 57/2016, de 29 de agosto, conferindo maior justiça e corrigindo incentivos aos agentes abrangidos pelas disposições do artigo 23.º (Norma Transitória) (CDS-PP). Proferiram intervenções, além do Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior (Manuel Heitor), os Deputados Ana Mesquita (PCP), Luís Monteiro (BE), Ana Rita Bessa (CDS-PP), Porfírio Silva (PS) e Nilza de Sena (PSD). Usaram ainda da palavra, sob a forma de interpelação à Mesa, a propósito da ordem das intervenções no debate, os
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Deputados Pedro Filipe Soares (BE), João Oliveira (PCP), Nuno Magalhães (CDS-PP) e Hugo Lopes Soares (PSD). No fim, deram entrada na Mesa propostas de alteração ao Decreto-Lei apresentadas pelo BE, pelo PCP, pelo PS e pelo CDS-PP.
Foram discutidos, em conjunto, na generalidade, os projetos de lei n.os 21/XIII (1.ª) — Consagra a Terça-Feira de Carnaval como feriado nacional obrigatório (Alteração ao Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro, alterado pelas Leis n.os 105/2009, de 14 de setembro, 53/2011, de 14 de outubro, 23/2012, de 25 de junho, 47/2012, de 29 de agosto, 69/2013, de 30 de agosto, 27/2014, de 8 de maio, e 55/2014, de 25 de agosto) (Os Verdes) e 369/XIII (2.ª) — Altera o Código do Trabalho, consagrando a Terça-Feira de Carnaval como feriado
nacional obrigatório (PAN) juntamente com o projeto de resolução n.º 604/XIII (2.ª) — Negociação em sede de concertação social de princípios orientadores para uma legislação específica, por forma a definir quais os feriados obrigatórios a serem observados na segunda-feira da semana subsequente (PSD). Pronunciaram-se os Deputados José Luís Ferreira (Os Verdes), André Silva (PAN), Pedro Roque (PSD), José Moura Soeiro (BE), António Carlos Monteiro (CDS-PP), Rita Rato (PCP) e Luís Soares (PS).
Deu-se conta da apresentação do projeto de resolução n.º 618/XIII (2.ª), das apreciações parlamentares n.os 29 e 30/XIII (2.ª), da proposta de lei n.º 51/XIII (2.ª) e do projeto de deliberação n.º 13/XIII (2.ª).
O Presidente (Jorge Lacão) encerrou a sessão eram 18 horas e 6 minutos.
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O Sr. Presidente: — Sr.as e Srs. Deputados, Sr.as e Srs. Jornalistas, Sr.as e Srs. Funcionários, está aberta a
sessão.
Eram 15 horas e 5 minutos.
Peço aos Srs. Agentes da autoridade para abrirem as galerias.
Vamos dar início à nossa ordem de trabalhos de hoje, da qual consta, em primeiro lugar, um debate de
urgência, requerido pelo Bloco de Esquerda, sobre transportes públicos.
Para abrir o debate, tem a palavra o Sr. Deputado Heitor Sousa.
O Sr. Heitor Sousa (BE): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Ministro do Ambiente e restantes Srs.
Membros do Governo: O debate de urgência que o Bloco de Esquerda traz hoje ao Parlamento é sobre os
transportes públicos, mas a urgência real é das populações, que se deparam com o péssimo nível de serviço
que é prestado.
De facto, o País todo é como se fosse uma grande casa em que todos protestam e todos têm razão. Em
Lisboa, no Porto, em Aveiro, em Coimbra, em Cascais, em Almada, em Setúbal, em Faro, em Leiria, na Covilhã,
em Mirandela, milhares de pessoas reclamam a justo título. Reclamam porque ficam penduradas à espera do
autocarro que não chega ou pela carreira reestruturada sem aviso. Reclamam porque o comboio foi suprimido.
Reclamam porque o metro está com dificuldades técnicas, porque está atrasado ou porque as escadas rolantes
estão paradas em manutenção. Reclamam porque o barco sofreu um corte nos horários, não por falta de
marinheiros para os conduzir, mas porque, ele mesmo, foi parar ao cemitério como reserva de peças na
reparação de um outro também avariado.
O efeito de todas estas falhas é conhecido: as frequências baixam, os veículos andam sobrelotados,
sobretudo às horas de ponta da manhã e da tarde, que é quando as pessoas precisam deles. E como uma
desgraça nunca vem só, o Governo toma a inoportuna decisão de um aumento de 1,5% nos preços,
precisamente numa altura em que o problema maior até nem será o referido aumento, mas sim a própria falta
de transportes.
Por isso, a primeira questão que se pode colocar é muito simples: há alguma justiça numa decisão que fecha
os olhos à montanha de queixas justas, indignadas, recorrentes e repetidas das pessoas, fazendo de conta que
não se passa nada na prestação deste serviço público essencial?
Considerando a realidade que existe à nossa volta, Sr. Ministro e restantes membros do Governo, não faria
sentido, pelo contrário, reduzir os preços nos transportes, enquanto, pelo menos, o patamar da oferta e os
descontos que respeitam a existência de verdadeiros preços sociais sejam repostos nos níveis que existiam há
quatro anos?
Bem sabemos que, em grande medida, as falhas, as faltas, os cortes, as avarias, a carência de veículos, de
motoristas e de maquinistas têm origem numa política sistemática de destruição da operação destas empresas
públicas que o Governo PSD/CDS levou a cabo durante quatro anos e meio para justificar a inevitabilidade da
sua entrega a privados.
Mesmo assim, o exemplo da MoveAveiro, concessionada a privados no dia 1 deste mês pela coligação
autárquica PSD/CDS, mostra que a direita nada aprendeu com o passado e o resultado é o caos nos transportes
em Aveiro, com a enorme redução de carreiras, autocarros sobrelotados e um enorme aumento de preços.
O Sr. Jorge Duarte Costa (BE): — Muito bem!
O Sr. Heitor Sousa (BE): — Foi por isso que todas as empresas que integravam o caderno de encargos de
privatizações de Sérgio Monteiro e Pires de Lima seguiram um caminho de degradação sistemática e de
austeridade extrema, expresso no desfalque das tesourarias e do seu subfinanciamento, o que foi
substancialmente agravado pelo enorme buraco criado por operações financeiras especulativas, como os
swaps, cujo apuramento de responsabilidade só deu no sacrifício singular de um «coelho» — passe a expressão
—, mas de onde resultou que alguns desses responsáveis tenham, ainda assim, sido premiados com convites
para fazerem parte da governação da direita.
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Mergulhadas no meio de uma austeridade miserável, as empresas foram obrigadas a servir pior, mais caro
e com muito menos meios. São exemplos desta política de delapidação sistemática e de contração forçada de
recursos materiais e humanos, a venda ao desbarato de 150 autocarros na Carris e a redução de mais de 200
motoristas, bem como a atual imobilização de 23 carruagens no metropolitano de Lisboa por falta de peças,
entre as quais está a falta de rodas para os bogies das carruagens. Diga-se, a propósito, que, mesmo que essas
carruagens estivessem em condições de poder andar, não haveria quem as pusesse em funcionamento pois
faltam 50 maquinistas e mais de 100 trabalhadores para repor o trabalho necessário nas estações e na
manutenção.
Na Carris, a degradação dos esquemas de manutenção mede-se pela duplicação dos veículos imobilizados
por avarias, entre os quais se contam diversos veículos equipados com rampas de acesso para pessoas com
deficiência. Situações destas são intoleráveis, porque é um direito constitucional, o direito ao transporte, que
está em causa.
Urge corrigir a falta de veículos e de trabalhadores na Carris, na Metropolitano de Lisboa, na STCP
(Sociedade de Transportes Coletivos do Porto), na CP e na Metro do Porto. No imediato, nas quatro primeiras
empresas, contabilizamos 490 trabalhadores em falta.
A não contratação de trabalhadores tem um efeito dramático nas empresas: há quem faça dois turnos de
operação na Metro do Porto ou de Lisboa ou quem esteja ao volante de um autocarro 10 a 12 horas seguidas.
O aumento de baixas por doenças profissionais agrava a falta de recursos humanos. Na Carris, só nos primeiros
seis meses de 2016, houve 55 motoristas que entraram de baixa médica.
O anterior Governo também deixou como herança a precariedade no trabalho. É outra das falhas a que urge
dar resposta, pondo fim à subcontratação de motoristas, como acontece com a CarrisTur, que contrata
motoristas e depois os «vende» à Carris.
Só há uma solução: acabar com este negócio espúrio, pondo fim a todas as formas de precariedade laboral
no setor público empresarial e, portanto, no Estado. Esperemos que o Governo honre os compromissos que
assinou e que recentemente reafirmou publicamente.
O mesmo se aplica à contratação coletiva.
Por fim, sabemos que tudo isto depende da libertação de investimento, que está bloqueado há mais de 10
anos. O investimento que faz falta é de duas naturezas: o investimento de urgência com efeitos no mais curto
prazo possível e o investimento de raiz, estrutural, que deve cumprir o objetivo de requalificação, modernização
e sustentabilidade da oferta a longo prazo, como condição para a melhoria da qualidade de vida das cidades e
o respeito do direito à mobilidade para todos e todas.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, ainda na fase de abertura, tem a palavra o Sr. Ministro do
Ambiente.
O Sr. Ministro do Ambiente (João Pedro Matos Fernandes): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: É
difícil aceitar o grau de fragilidade, direi mesmo de pré-rutura, em que encontrámos as seis empresas de
transporte coletivo diretamente exploradas pelo Estado no início de 2016.
A probabilidade de chumbo dos contratos de subconcessão por parte do Tribunal de Contas era elevadíssima
e a inexistência de uma alternativa por parte do anterior Governo revelou uma arrogância política difícil de
compreender, mais ainda quando as empresas tinham perdido 1000 trabalhadores e, no seu conjunto, cerca de
25% dos passageiros nos quatro anos antecedentes.
Partimos, assim, de uma base muito fraca, e só o empenho de gestores e de trabalhadores permitiu chegar
ao final do ano de 2016 com muitos sobressaltos, é verdade, mas sem ruturas na oferta e até com um
crescimento na procura de 1,7%, o que corresponde a mais ou menos 7,2 milhões de euros a mais
transportados.
Separemos o Porto de Lisboa. Na Metro do Porto, a operação decorre sem problemas, foi decidido apenas
desistir do procedimento de subconcessão que estava em curso por o mesmo se revelar eivado de ilegalidades
que podiam comprometer a defesa do interesse público. Já no próximo mês de abril, cumprindo com escrúpulo
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os prazos legais, será lançado para um período de sete anos o concurso para a operação. Foi hoje mesmo
adjudicada a construção de uma nova estação em Modivas.
Na STCP (Sociedade de Transportes Coletivos do Porto) conseguimos mesmo aumentar a oferta, tendo
ainda problemas, reconhecemo-lo, aos fins de semana. O número de passageiros aumentou já em 2016,
estancando a erosão dos anos anteriores, e fomos mesmo muito consequentes com o aumento da oferta, na
medida em que subiu em 5,5% ao longo desse ano. Esta é, aliás, a razão para que se verifique a melhoria da
mobilidade dos indicadores financeiros em todas as empresas, com exceção, exatamente, na STCP.
Números globais: o EBITDA (earnings before interest, taxes, depreciation and amortization) é positivo em
cinco destas seis empresas e as receitas, durante 2016, cresceram 3,3%.
A título de curiosidade, refira-se que das 150 000 pessoas que acorreram à avenida dos Aliados na passagem
de ano mais de 120 000 foram transportadas em transporte coletivo, o que prova a capacidade já hoje instalada
na Área Metropolitana do Porto.
Penso não fazer sentido repetir a explicação dos modelos de municipalização das empresas STCP e Carris.
Já são conhecidos por todos nas suas semelhanças, nas suas diferenças, mas radicam, claramente, num tronco
comum. Em primeiro lugar, não é o Governo que gere a via pública e o território e, como tal, são as autarquias
que melhor poderão potenciar e ajustar a oferta de transportes.
Em segundo lugar, são as autarquias, onde a Carris e a STCP prestam serviços, tal como em todo o País,
que deverão financiar as obrigações de serviço público — e, já agora, todas estas autarquias, sem exceção, o
assumiram.
Em terceiro lugar, mantém o Governo o empenho na renovação das frotas, sobretudo de autocarros, agora
a gás ou elétricas, disponibilizando fundos comunitários para o efeito. São mais ou menos 400 autocarros para
estas duas empresas e, no caso da STCP, pagando mesmo a totalidade dos novos autocarros, uma vez que o
Estado se mantém como dono da empresa.
Sr.as e Srs. Deputados, foi na Metro de Lisboa que encontrámos a situação mais complexa: os bilhetes
dependentes de um único fornecedor, a manutenção das composições sem peças, as estações ao abandono e
sem projetos.
A situação dos bilhetes está resolvida, e foi resolvida em prazo. Na manutenção, das 23 composições
paradas, duas entraram ontem em funcionamento e mais duas entrarão ainda este mês. Até ao final de abril,
deixaremos de ter em definitivo problemas deste foro. Também no dia 3 de fevereiro será publicado o aviso para
o concurso da obra na estação de Arroios, resolvendo-se com ela o maior estrangulamento na rede. Também
no próximo dia 10 de fevereiro iniciar-se-á a formação de 30 novos funcionários dos mais de 1000 que
concorreram para a Metro de Lisboa.
Começam já a sentir-se as melhorias na operação que, ao chegar ao verão, serão mesmo sentidas por todos.
Um apontamento relevante é o facto de o metro ter funcionado na passagem de ano, o que nunca tinha
acontecido, com grande empenho por parte dos trabalhadores da empresa.
Também o orçamento da Metro para 2017 nos dá garantias de ser este o ano de viragem
Por fim, em relação à Transtejo e à Soflusa, agora com uma administração que lhes é complemente dedicada,
aliás, em consequência de uma lei aprovada nesta Assembleia da República, até ao final de fevereiro, como foi
garantido, teremos um plano completo para a manutenção e operação, mas, reconhecemos que aqui, ao
contrário da Metro, o orçamento é mais apertado.
No entanto, em 2016, foram efetuadas 10 docagens de navios, quando, por exemplo, em 2015, só tinham
sido efetuadas três — 15 é o número ideal. Se na última quinzena do ano anterior foram suprimidas 32 ligações,
ou seja, mais ou menos duas por dia, na primeira quinzena deste ano ocorreram apenas 9 supressões, ou seja,
cerca de uma em cada dois dias. Esta melhoria, como poderão continuar a acompanhar, não é conjuntural.
Em síntese, reconhecemos as nossas limitações, e muitas delas são difíceis de ultrapassar no contexto atual
do País. No caso do Porto, a principal limitação é a idade da frota de autocarros, a qual se irá resolver com a
renovação da frota. Talvez não saibam, mas entre 2011 e 2015 não foi comprado um único autocarro.
Em Lisboa, e para o metro, os planos são claros, têm orçamento e calendário, mas, para além da obra de
Arroios, o nosso foco principal é o da recuperação de serviço. Só a partir do meio deste ano podemos pensar
em voltar a aumentar a oferta para chegarmos aos níveis pré-2011.
Como final, gostaria de dizer que a fundamental diferença em relação ao passado que nos antecedeu é a de
que gostamos das nossas empresas, não olhamos para elas como um fardo que agrava o défice e que, com o
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apoio dos trabalhadores, faremos mesmo de 2017 um ano de viragem no sucesso das empresas de transporte,
mantendo inalienado o seu caráter público.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Dando início à primeira ronda de intervenções, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos
Santos Silva.
O Sr. Carlos Santos Silva (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, Srs. Secretários de Estado, Sr.as e Srs.
Deputados: O caos instalou-se nos transportes públicos, os níveis de serviço nas empresas públicas de
transportes de Lisboa degradam-se de dia para dia. Mas, mais importante do que esta acusação ser efetuada
por este Grupo Parlamentar, é que ela é reiteradamente efetuada no dia a dia pelas comissões de utentes. Aliás,
esta é a grande diferença dos protestos do passado: no passado, eram os sindicatos e as comissões de
trabalhadores que exigiam melhor qualidade dos serviços prestados e, para isso, faziam greves quase todos os
dias no setor dos transportes; hoje, esses mesmos sindicatos estão calados e silenciados, os alertas vêm das
comissões de utentes e esta diferença é bem significativa e importa realçar.
São os utentes que reclamam na praça pública — ainda hoje os ouvi na comunicação social; a falta de
maquinistas e de material circulante leva à supressão diária de carreiras; a falta de motoristas na Carris leva a
centenas de serviços por realizar; a falta de tripulações impõe cortes de carreiras fluviais na Transtejo e na
Soflusa, inclusive em horas de ponta; a falta de investimento na bilhética leva à ausência de bilhetes nas
máquinas automáticas; estações e interfaces ao abandono, por falta de trabalhadores, geram insegurança e
degradação dos espaços; dezoito comboios do metro e vários navios da Transtejo, parados, fornecem peças
aos restantes, que circulam; no metro, o número de carruagens por composição diminuiu; o espaçamento entre
cada composição é maior e tornou-se corrente os avisos de que o tempo de espera pode ser superior ao normal;
os utentes são obrigados a esperar mais tempo em plataformas apinhadas e depois a viajarem de forma
enlatada; o adiamento da resolução de problemas de material e equipamento no metro e a falta de pessoal na
manutenção da via está a levar à degradação da infraestrutura, com impacto no material circulante, na qualidade
do serviço, bem como na acessibilidade às estações — elevadores, escadas e tapetes rolantes.
Com este cenário preocupante de alerta, o que temos? Sindicatos silenciados e sossegados. É espantoso,
Sr.as e Srs. Deputados! Sendo assim, estão satisfeitos e a atingir os seus objetivos, e estes, em empresas
públicas dependentes do Orçamento do Estado, são, sem sombra de dúvida, contraditórios com o interesse
público dos utentes e de todos os contribuintes.
Sr. Ministro, não há lugar para grandes dúvidas: o serviço tem vindo a deteriorar-se e isso acentuou-se nos
meses mais recentes. Espantosamente, os maiores problemas têm surgido nos últimos meses, em que não
ocorreu qualquer redução do número de funcionários, que eu saiba, e em que o financiamento até aumentou.
Que eu saiba, é público que os custos operacionais nos transportes públicos aumentaram 200 milhões de euros
nos primeiros seis meses do ano passado e no metro chegaram a aumentar 92%.
Sr. Ministro, o que se passa sobre esta matéria?
O Parlamento exige respostas, os utentes exigem respostas. Não basta o Sr. Ministro dizer que foi azar, não
basta o Bloco de Esquerda marcar debates de urgência para fingir que não tem nada a ver com isto.
Os senhores estão a tentar enganar os portugueses! Não fujam com o rabo à seringa!
Não basta que a Deputada Catarina Martins ande de metro com a comissão de trabalhadores. Sr.ª Deputada,
deixo-lhe, até, uma sugestão: faça-o com as comissões de utentes, que elas dão-lhe mais informação. Mas vá
também revisitar o acordo que assinou com o Partido Socialista, que encontrará lá várias respostas.
Sr.as e Srs. Deputados, não será necessária uma investigação aprofundada às contas das empresas públicas
de transportes para percebermos a origem do problema, bastará revisitarmos o acordo da geringonça, que
implicou uma devolução mais rápida dos cortes salariais, para, de forma natural, percebermos a origem de todos
os problemas. O dinheiro que deveria estar a ser utilizado em manutenção e na excelência da qualidade de
serviço está a ser gasto no pagamento que mantém os sindicatos calados e as empresas sem greves.
Aplausos do PSD.
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Os Srs. Deputados irão afirmar que a raiz do problema esteve no anterior Governo, mas aí eu deixo-vos
informação precisa: o saldo operacional destas empresas, em 2010, era de 65 milhões de euros negativos; em
2013, era de 22 milhões de euros positivos; em 2015, estas empresas aumentaram em 2% o número de
passageiros transportados e reduziram em 7% os custos operacionais.
O Sr. Heitor Sousa (BE): — As carruagens pararam!
O Sr. Carlos Santos Silva (PSD): — Estranhamente, nesses anos, a CGTP sempre lutou contra todas as
medidas que foram permitindo aliviar a fatura que os contribuintes tinham de pagar e invocaram
permanentemente o interesse dos utentes e o serviço público prestado pela companhia.
Deixo-vos uma reflexão, Srs. Deputados: o que teria sido realizado por estas empresas se tivesse ocorrido
alguma contenção no movimento sindical?
Sr.as e Srs. Deputados, convosco no Governo as coisas mudaram, naturalmente, mas não foi a favor dos
utentes, apesar das greves terem deixado de fazer parte do seu dia a dia. Aos utentes dos transportes públicos
é hoje oferecido um serviço deficiente e medíocre e não só nos dias de greve, é todos os dias.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Paulo Correia, do Grupo
Parlamentar do PS.
O Sr. João Paulo Correia (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: se hoje estamos a debater
transportes públicos e não transportes privados é porque o Governo do PS, com o apoio desta maioria
parlamentar de esquerda, impediu o desmantelamento do serviço público de transportes.
Aplausos do PS.
O PSD e o CDS, no anterior Governo, lançaram o maior ataque ao serviço público de transportes em Portugal.
A dois meses das eleições legislativas, lançaram sete processos de privatização: tentaram privatizar a TAP,
privatizaram a CP Carga, tentaram privatizar a EMEF, tentaram privatizar a Carris, tentaram privatizar a
Metropolitano de Lisboa, tentaram privatizar a STCP e tentaram lançar novamente a privatização da Metro do
Porto.
No caso dos transportes urbanos do Porto — metro do Porto e STCP — lançaram um ajuste direto — repito,
não foi um concurso, foi um ajuste direto — de 820 milhões de euros, um processo com total falta de
transparência, contra a vontade dos autarcas de todos os partidos, incluindo os partidos e os autarcas de direita
da Área Metropolitana do Porto.
Aplausos do PS.
A estratégia da direita durante quatro anos, de 2011 a 2015, era só uma: degradar o serviço público de
transporte de passageiros — reduzir pessoal, reduzir a frota, reduzir a oferta, reduzir a segurança e aumentar
os tarifários.
O preço dos títulos intermodais nos primeiros 18 meses de mandato do anterior Governo do PSD e do CDS
subiu 20%. Hoje protestam por causa de um aumento de 1,5%, mas nos primeiros 18 meses de mandato do
anterior Governo, aumentaram o preço dos títulos intermodais em 20%!
A estratégia era simples: era deixar as empresas públicas à mão de qualquer privado que quisesse pegar
nelas e fazer lucro.
Vamos a números: a redução da oferta na STCP e na Metro do Porto, entre 2010 e 2015, foi de 24%. Já na
Carris e na Metropolitano de Lisboa a redução da oferta, entre 2010 e 2014, foi de 22%. Entre 2011 e 2015,
Carris, Metropolitano de Lisboa, Transtejo e Soflusa perderam 1000 trabalhadores. Como é possível ter um
serviço de qualidade quando deixam estas empresas, que prestam um serviço público de transporte, perder
1000 trabalhadores?!
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Felizmente para os utentes dos transportes públicos foi possível colocar um ponto final nas privatizações dos
transportes urbanos de Lisboa e do Porto. O Governo levou avante o seu compromisso, o compromisso que
tinha assumido com os portugueses: descentralizar a operação da Carris, e fê-lo com a Câmara Municipal de
Lisboa; descentralizar a STCP para seis municípios da Área Metropolitana do Porto, o que está a ser praticado.
É esta a vontade dos utentes, é esta a vontade dos autarcas.
Mas não compreendemos bem esta incoerência da direita e do PSD. Às segundas-feiras, terças-feiras,
quintas-feiras e sextas-feiras defendem a descentralização na saúde, na ação social e noutros setores, mas à
quarta-feira estão contra a descentralização para as câmaras municipais, na área dos transportes.
Aplausos do PS.
Em novembro de 2015, quando começou o mandato deste Governo, a empresa STCP tinha 844 motoristas;
em dezembro de 2016, há um mês, tinha 921 motoristas, registando um aumento de 77 motoristas no primeiro
ano deste Governo.
Em 2012, a STCP tinha 93 milhões de passageiros. Quando o PSD e o CDS saíram do Governo este número
desceu para 69 milhões. Em quatro anos a empresa perdeu 24 milhões de passageiros, uma quebra de 26%.
Nos primeiros dez meses de 2016, face ao período homólogo de 2015, o serviço da empresa registou um
acréscimo de 100 000 passageiros e os resultados operacionais da empresa melhoraram, porque em 2012 eles
eram negativos em 10 milhões de euros e quando os senhores saíram do Governo os resultados operacionais
da STCP agravaram-se para 21 milhões de euros negativos.
Quanto à intermodalidade, o passe Andante, em setembro de 2016, integrou 36 novas linhas e três novos
operadores. Está confirmada a extensão da rede da CP Urbanos do Porto no Andante, levando o Andante à
Trofa e garantindo mais 1 milhão e 200 000 passageiros.
A Metropolitano de Lisboa, nos primeiros dez m, a Metro do Porto aumentou 100 000, a Transtejo e a Soflusa
aumentaram 400 000.
Quanto às receitas, a Metropolitano de Lisboa teve um acréscimo de 11 milhões de euros nos primeiros dez
meses de 2016 face a 2015, a Carris de 2 milhões e 700 mil euros, a Metro do Porto de 2 milhões de euros e a
Transtejo e a Soflusa de 600 mil euros.
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, peço-lhe que conclua, caso contrário descontará depois no tempo da
intervenção seguinte.
O Sr. João Paulo Correia (PS): — Termino, Sr. Presidente, dizendo o seguinte: afinal, também neste setor
e nesta área havia uma política alternativa às privatizações. Está provado que gerir estas empresas na mão do
Estado é melhor para os utentes — melhor serviço, melhores ofertas e mais qualidade.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Pelo Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda, tem a palavra o Sr. Deputado Heitor
Sousa.
O Sr. Heitor Sousa (BE): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Queria dizer que as lágrimas de crocodilo
que o PSD trouxe ao debate são de um filme que provavelmente só existirá na bancada do PSD, talvez do
mesmo realizador que esperava que o Diabo aparecesse até ao final do ano passado. Esse filme existe com
base em efabulações e alguém que perceba e conheça a realidade do sistema de transportes do País não pode,
evidentemente, aceitar.
O Sr. Jorge Costa (BE): — Muito bem!
O Sr. Heitor Sousa (BE): — Srs. Deputados do PSD, o problema foi a delapidação patrimonial e de meios
que o Governo anterior sistematicamente prosseguiu para preparar as empresas para a sua privatização, para
justificar a entrega das empresas públicas a entidades privadas, que, a partir de um grau zero de serviço público,
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poderiam brilhar num deserto de medidas e, sobretudo, num deserto de direitos, que, quer os utentes, quer os
trabalhadores dessas empresas estavam obrigados a suportar.
Veja-se, por exemplo, o caso da MoveAveiro, que foi privatizada no dia 1 deste mês. O resultado concreto
dessa concessão a privados redundou num caos completo em termos de serviço público de transportes em
autocarros e de transporte fluvial que existe na cidade de Aveiro. Esse é o resultado da política que os senhores
defenderam durante quatro anos e meio, a de entregar a privados o que não pode ser entregue a privados.
Protestos do PSD.
Estamos a falar de um serviço público de transportes que só o Estado, porque está obrigado a defender o
interesse público, pode verdadeiramente respeitar.
Aplausos do BE.
Todas as empresas privadas que, em nome do Estado, prestam um alegado serviço público de transportes
querem simplesmente defender o seu interesse, porque é com base no pagamento de rendas milionárias do
Estado a essas empresas que o serviço de transportes é assegurado.
Portanto, Srs. Deputados do PSD e do CDS, o caminho da concessão de transportes públicos a privados
não é seguramente o futuro da defesa dos transportes públicos. O futuro da defesa dos transportes públicos
está na manutenção do caráter público dessas empresas, na aproximação da gestão dessas empresas aos
poderes autárquicos, ao poder local, para que, do ponto de vista do desenvolvimento das necessidades das
populações, os transportes possam, mais rapidamente, e com maior proximidade, satisfazer essas carências.
Por fim, Srs. Deputados, um aspeto que não tive oportunidade de referir há pouco tem a ver com o
investimento público no setor dos transportes.
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, faça favor de concluir.
O Sr. Heitor Sousa (BE): — O Sr. Ministro falou aqui em algum investimento que se desenvolveu no caso
da Metro do Porto, mas, Sr. Ministro, infelizmente, em todas as outras empresas de transportes públicos falta
investimento público imediato que reponha os níveis de oferta que existiam em 2010 e que prepare o futuro do
sistema de transportes em termos de qualidade de vida das populações e dos territórios em que o serviço público
de transportes se insere.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra, em nome do Grupo Parlamentar do CDS-PP, o Sr. Deputado Hélder
Amaral.
O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, Srs. Secretários de Estado, Sr.as e Srs.
Deputados: Estamos a fazer um debate que gostaria de apelidar de «simulacro», para não apelidar mesmo de
«embuste».
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Exatamente!
O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Os partidos que apoiam o Governo e o próprio Governo estão a fazer um
simulacro de defesa do serviço público de transportes. E vamos ver se não é mesmo assim. É que, em 2011, o
Deputado João Paulo Correia — e aqui começa já a incoerência do Partido Socialista —, sobre o tema, dizia:
«O Partido Ecologista ‘Os Verdes’, o Bloco de Esquerda e o PCP seguem uma linha de demagogia própria de
quem prefere colocar-se do lado do problema e nunca do lado da solução. Tudo o que lhes possa render votos
conta com o aproveitamento político e o populismo da extrema-esquerda».
Vozes do CDS-PP: — Bem lembrado!
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O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — E dizia também: «O melhor contributo a dar ao serviço público de
transportes passa por criar condições de sustentabilidade económico-financeira aos operadores do serviço.
Hoje, essas condições de sustentabilidade não são as mesmas de 2007, 2008 e 2009». Talvez seja por isso
que os senhores inscreveram no Memorando a privatização da CP, a privatização da TAP e, obviamente, um
conjunto de subconcessões. Talvez seja por isso que o Partido Socialista tenha sido o pai do modelo de gestão
privada da Metro do Porto — e, que eu saiba, o modelo da gestão privada mantém-se na Metro do Porto, a não
ser que o Sr. Ministro me desminta e diga que vai mudar. Mas não mudou! Ou seja, há dois pesos e duas
medidas. E isto para não dizer mesmo aos Srs. Deputados que aqui não é possível haver «feira de gado». Sabe
porquê, Sr. Deputado? É que, na feira de gado, «palavra dada é palavra honrada», e aqui não é o caso.
Aplausos do CDS-PP.
Passo agora a referir-me à situação atual dos transportes. Estou à espera que o Bloco de Esquerda, numa
prática que já é comum, possa permitir que se faça uma petição, subscrita pelo Deputado Heitor Sousa e pelos
demais Deputados do BE, que recomende ao Governo o voto contra o Orçamento ou a demissão do Ministro ou
que apresente uma moção de censura ao Governo caso a situação dos transportes públicos não melhore. Isso
é que seria coerente. Siga o exemplo do Deputado do Algarve que já fez essa recomendação numa petição,
recomendando mesmo a si próprio votar contra o Orçamento do Estado, caso o Partido Socialista não cumpra
as promessas que fez.
Mas, indo mais longe, Sr. Ministro, vamos fazer uma avaliação da atual situação dos transportes públicos.
Os senhores têm um modelo diferente de gestão dos transportes públicos, que é legítimo e perfeitamente
aceitável. A pergunta que faço é esta: o serviço público está melhor do que estava no passado? Não está! Ele
está mais barato do que estava no passado, ou seja, custa menos dinheiro aos contribuintes e aos utentes? Não
custa! O Sr. Ministro reconheceu um conjunto de investimentos, um conjunto de verbas a transferir em
indemnizações compensatórias que, no nosso modelo, desapareceriam, e um conjunto, quer ao nível autárquico
quer ao nível do Orçamento do Estado, de transferências para as várias empresas. Desde logo, 300 milhões de
euros para a CP mais 5 milhões de euros para a Metro e para a Carris.
Mas por que é que digo que o serviço está pior? Não vou socorrer-me da minha opinião, nem tão-pouco de
notícias dos jornais. Vou socorrer-me daquilo que é aferível, ou seja, da opinião dos utentes, que o CDS respeita.
O CDS respeita muito os utentes do serviço público, respeita os contribuintes portugueses e respeita muito o
serviço público de transportes e mobilidade nas áreas urbanas.
O Sr. Presidente: — Peço que conclua, Sr. Deputado.
O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Vou terminar, Sr. Presidente.
Sr. Deputado, com o vosso Governo, o preço dos bilhetes aumentou, está mais caro. Porém, o senhor diz
«mas criámos uma dedução no IRS por esse mesmo serviço»…
O Sr. Presidente: — Se não concluir, Sr. Deputado, teremos de descontar no tempo do CDS da segunda
ronda.
O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Acontece, Sr. Ministro, que é praticamente impossível efetivar essa
dedução, tal a burocracia que o senhor criou para se poder exercer esse direito. Ainda por cima, o Sr. Ministro
tem de explicar que 45% da população não paga IRS, pelo que não tem acesso a essa dedução. Ou seja, o Sr.
Ministro tirou com as duas mãos e nem com uma mão consegue dar. Precisava que me explicasse isso.
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Bruno Dias.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Em outubro
passado, quando o PCP trouxe a debate nesta Assembleia a situação grave dos transportes públicos, o PSD
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demonstrou que tinha acabado de descobrir toda essa nova realidade, que era a das empresas do setor. Como
dissemos na altura, começaram a andar de metro quando saíram do Governo.
Agora fizeram uma nova descoberta, que os deixou deslumbrados e que já aqui hoje realçaram, que são as
comissões de utentes e a sua luta em defesa dos transportes públicos. O PSD e o CDS descobriram as
comissões de utentes e agora respeitam-nas muito. E trazem aqui as suas reclamações e as suas
reivindicações.
Srs. Deputados, não queiram que eu vos lembre das coisas que os senhores diziam das comissões de
utentes! Entre 2011 e 2015, quando estavam no Governo e queriam encerrar linhas de transportes públicos, foi
graças à luta dos utentes e dos trabalhadores dos transportes que não levaram adiante as vossas intenções.
Aplausos do PCP.
Não queira o Sr. Deputado saber o que era dito nessa altura pelo PSD e pelo CDS das comissões de utentes
e da luta que travavam contra a vossa ação de destruição do transporte público: quando os senhores queriam
eixar a Transtejo sem barcos para a Trafaria, para o Seixal e para o Montijo, aos sábados, domingos e feriados
e quando os senhores queriam que o metropolitano de Lisboa encerrasse às 23 horas e às 21 horas fora do
centro urbano! Nessa altura, os utentes e os trabalhadores lutaram acerrimamente em defesa dos transportes.
E agora é que os senhores dizem que os respeitam?! Obrigadinho, Srs. Deputados! Obrigadinho!…
Aquilo que hoje, como nessa altura, é preciso é ouvir os trabalhadores e os utentes dos transportes
relativamente às situações concretas que estão hoje colocadas e às medidas, que, de resto, já tinham sido
colocadas e anunciadas pelo Governo em debates anteriores trazidos ao longo do tempo pelo PCP a esta
Assembleia, e, neste momento, fazer esse ponto de situação.
Ora, esse ponto de situação exige, de facto, que haja soluções e medidas concretas avançadas, como já
avançámos em relação à bilhética, fruto da denúncia dos trabalhadores, tendo-se conseguido avançar para
medidas que resolveram o problema gravíssimo que vinha de trás.
Mas, neste momento, em relação à Transtejo, à Soflusa e em relação a várias empresas e serviços de
transportes de todo o País, para além daquilo que está a ser aqui colocado sobre a Metropolitano de Lisboa,
para o que o PCP tem vindo a chamar a atenção ao longo do tempo, é, de facto, necessário responder às
questões sentidas no dia a dia na vida das pessoas.
A proposta do PCP, Sr. Presidente e Srs. Deputados, é muito concreta: é que a Assembleia desenvolva e
aprofunde este trabalho. Nesse sentido, apresentamos neste momento a proposta de constituição de um grupo
de trabalho, em sede de comissão parlamentar, para que vamos ao terreno, vamos ao ramal da Lousã ouvir as
populações, vamos falar com os trabalhadores da Metropolitano e da Transtejo, para acompanhar, no concreto,
as medidas que têm de ser tomadas e as soluções concretas que têm de ser levadas a cabo para resolver estes
diagnósticos que agora todos veem, mas que, na altura, ninguém via, quando o PCP aqui trazia a denúncia
concreta e os problemas das empresas, dos trabalhadores e dos utentes.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Ferreira.
O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados:
Sr. Ministro, nós sabemos — certamente o Sr. Ministro também o reconhecerá — que uma rede de transportes
públicos eficiente e de qualidade tem muita importância, não só como forma de garantir o direito à mobilidade
das pessoas mas também porque representa benefícios ambientais, económicos e sociais que são indiscutíveis.
Os transportes coletivos são, incontestavelmente, uma opção mais amiga do ambiente ao reduzirem a
circulação automóvel e, consequentemente, a emissão de gases com efeito de estufa. O que significa que
estamos a falar de um elemento absolutamente decisivo quando falamos do combate às alterações climáticas
e da necessidade de dar resposta aos compromissos assumidos nesta matéria no plano internacional.
Exatamente por isso, o investimento nos transportes públicos deve ser uma prioridade absoluta. Sabemos
que os problemas são muitos e que também não são de agora. Aliás, basta ver que, desde a primeira vez que
se assinalou o «dia sem carros», que visava exatamente sensibilizar as pessoas para a utilização do transporte
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público em detrimento da utilização da viatura particular, os transportes púbicos da Grande Lisboa, nesse
período, perderam 10% dos passageiros. Ou seja, em 16 anos, os transportes púbicos perderam 10% dos
passageiros.
A principal razão para estes números preocupantes, demos as voltas que dermos, reside na falta de
investimento que se verificou ao longo dos anos, com particular incidência nos anos de governação do PSD e
do CDS, que deixaram os transportes púbicos numa absoluta desgraça e num verdadeiro caos, como, aliás, já
hoje foi aqui reconhecido pelo próprio PSD: falta de pessoal, material circulante obsoleto, máquinas e
locomotivas paradas por falta de peças, supressão de carreiras, e por aí fora.
Sabemos que não é fácil, Sr. Ministro, e que as coisas não se resolvem de um dia para o outro, sobretudo
depois do quadro que nos foi deixado pelo Governo anterior, do PSD e do CDS — aliás, um quadro muito bem
retratado hoje, pelo Sr. Deputado Carlos Silva, na sua intervenção.
Mas, Sr. Ministro, uma vez que o Governo atual assumiu o compromisso de proceder a um forte investimento
nos transportes púbicos, Os Verdes consideram que hoje seria uma boa altura para que o Sr. Ministro pudesse
fazer aqui um diagnóstico sobre esse compromisso e também sobre o grau de concretização ao nível do
investimento.
É que a situação é dramática e atinge todos os operadores de transportes públicos e todos os pontos do
País: são os comboios suburbanos, sobretudo os da linha de Cascais, mas não só, é a Carris, é a Metropolitano
de Lisboa, são as ligações fluviais entre as margens do Tejo, e por aí fora.
E sobre as ligações fluviais entre as margens do Tejo, Sr. Ministro, queria deixar-lhe já uma questão. Ainda
recentemente, a comissão de utentes do cais do Seixalinho veio denunciar a falta de barcos em condições de
navegabilidade, seja por razões de avaria, seja por ausência de certificado exigido, seja por falta de pessoal
operacional, desorçamentação da empresa, constantes atrasos ou mesmo supressão de carreiras. Os utentes
recordam, aliás, os dias negros vividos numa quinzena do mês passado, altura em que a ligação ao Montijo foi
particularmente afetada por inúmeras carreiras terem sido suprimidas.
Sr. Ministro, é necessário garantir que estas situações não se voltem a repetir.
O Sr. Presidente: — Peço-lhe que conclua, Sr. Deputado.
O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — Vou concluir, Sr. Presidente.
Hoje, as ligações de Lisboa ao Montijo e ao Seixal estão a ser feitas apenas por seis barcos, porque 20 deles
estão encostados. Portanto, seria conveniente que nos dissesse alguma coisa sobre essas ligações fluviais no
Tejo, em particular as do Montijo, porque, de facto, o Governo anterior, do PSD e do CDS, deixaram os
transportes públicos num verdadeiro caos.
Aplausos de Os Verdes e do PCP.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Ministro do Ambiente.
O Sr. Ministro do Ambiente: — Sr. Presidente, se não visse inconveniente, gostaria de partilhar uma parte
da resposta com o Sr. Secretário de Estado Adjunto e do Ambiente.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, começo por dizer que não há volta a dar, os números, tal como o
algodão, não enganam: a regularidade da oferta aumentou mesmo em todas as empresas, em 2016. Não quero
com isso esconder os muitos sobressaltos que tivemos, mas a regularidade aumentou mesmo. E é um facto que
a confiança dos utilizadores regressou. Mais 7,2 milhões de passageiros são a prova de que a confiança dos
utilizadores regressou, sendo que, naturalmente, com esse regresso, regressou também a sua exigência.
Parece-me evidente que o que aconteceu nos últimos anos, com uma perda de 25% da procura, é que foram
muitos os que, pura e simplesmente, deixaram de acreditar nos transportes coletivos e, por isso mesmo, também
deixaram de se queixar quando os transportes coletivos funcionavam pior.
E porque conseguimos, exatamente como já referi, na STCP, apesar do aumento da procura — e foi o
aumento até mais ténue em todas as empresas —, aumentar em 5,5% a oferta, o número de queixas reduziu-
se, durante o ano de 2016, em 70%.
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Esses também são números que fazem parte do nosso dia a dia, reconhecendo e insistindo que não fugimos
a responsabilidades nenhumas e que sabemos que temos muito trabalho pela frente.
Sr. Deputado Hélder Amaral, relativamente à questão dos números e das contas, é muito evidente a melhoria
de 2015 para 2016. Os números que tenho não são do final do ano, são do final de novembro, mas cinco das
seis empresas tiveram um EBITDA positivo — como já referi, a única que o não teve foi a STCP — e o volume
de receitas aumentou em 4,7% sem ter existido nenhum aumento no tarifário ao longo desse ano.
Não temos dúvidas nenhumas sobre o que teria acontecido caso as subconcessões avançassem. O valor
que iria ser pago — chamam-lhe investimento, mas é exatamente o inverso, naturalmente é o pagamento de
uma prestação de serviços — no caso da Metropolitano de Lisboa não cobria sequer o valor dos salários e o
valor da energia. Portanto, era impensável que, há cerca de um ano, não tivesse acontecido um despedimento
coletivo e não tivesse acontecido uma grande degradação do funcionamento destas empresas.
Sr. Deputado Heitor Sousa, ainda que, no que diz respeito ao investimento na Transtejo e na Soflusa —
gostaria de o referir, porque não o escondemos —, precisemos de chegar ao final de fevereiro com o plano que
está a ser elaborado para podermos saber com mais detalhe o que nos é exigido ao longo deste ano, o
investimento na Metropolitano de Lisboa, por exemplo, está à vista de todos, não tenham a mais pequena dúvida.
Estamos a falar de 30 milhões de euros para investimento que estão neste Orçamento, dos quais a fatia mais
expressiva, com cerca de 4 milhões já gastos no próximo ano, tem a ver com a estação de Arroios. O mesmo é
verdade para a estação do Areeiro, o mesmo é verdade para o Colégio Militar, o mesmo é verdade para um
conjunto de outras estações que não vou enumerar aqui.
Depois de um programa, o PO SEUR (Programa Operacional Sustentabilidade e Eficiência no Uso de
Recursos), que foi desenhado com a garantia de que, se ficasse como estava, nunca haveria um tostão de
fundos comunitários nem para material circulante nem para novas obras nas expansões da rede do metro de
Lisboa, as obras estão anunciadas, os projetos estão a iniciar-se e sentimos que são da maior relevância.
O mesmo é válido relativamente aos autocarros. Não quero atribuir culpas a ninguém, mas é um facto que
desde 2011 não se comprou um único autocarro para a STCP.
O Sr. Jorge Duarte Costa (BE): — Para a Carris também não!
O Sr. Ministro do Ambiente: — Esta interrupção de quatro anos não se retoma ao fim de quatro dias, é
impossível que assim seja. Não estou a chamar culpado a ninguém, mas durante quatro anos não se comprou
nenhum autocarro. Estamos agora a concluir os avisos, que fecham no final do mês de fevereiro, para podermos
investir na compra de 600 autocarros para o País todo, não só para a STCP e a Carris, dos quais 200 serão
para a STCP e outros 200 para a Carris — mas depende também, naturalmente, do mérito das candidaturas
que forem apresentadas pelas empresas. Não foi mesmo possível fazer esta recuperação de forma mais rápida.
No que diz respeito aos bogies, a questão já foi resolvida. Já temos, neste momento, todas as peças de que
necessitamos, a manutenção está em curso e, tal como disse no discurso inicial, duas das composições do
metro de Lisboa, que eram 23, entraram em funcionamento ontem mesmo.
Por isso, acreditamos firmemente que 2017 é o ano em que saberemos dar resposta a esta nova confiança.
Apesar dos muitos sobressaltos que tivemos ao longo ano, os portugueses voltaram a sentir uma oferta de
transporte público, que continuará a ser público enquanto estivermos no Governo.
Sr. Presidente, se não se opuser, passo agora a palavra ao Sr. Secretário de Estado Adjunto e do Ambiente
para dar continuidade à resposta.
O Sr. Presidente: — Tem, então, a palavra o Sr. Secretário de Estado Adjunto e do Ambiente.
O Sr. Secretário de Estado Adjunto e do Ambiente (José Mendes): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs.
Deputados: Foram feitas referências por parte da bancada do CDS aos aumentos dos preços dos transportes
neste ano de 2017. Sobre essa matéria, vale a pena recordar, Sr. Deputado Hélder Amaral, que, quando se faz
um aumento no tarifário dos transportes, tem de se equilibrar duas situações: em primeiro lugar, a preocupação
em manter o transporte acessível às famílias e, em segundo lugar, a preocupação com a sustentabilidade das
empresas de transporte,…
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O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Ah…!
O Sr. Secretário de Estado Adjunto e do Ambiente: — … que, naturalmente, têm de ter margem para
reinvestir no sistema. Foi tendo em conta o equilíbrio dessas duas situações que tomámos a decisão de
aumentar os preços dos transportes em 1,5% neste ano.
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Tem de explicar isso às bancadas da esquerda!
O Sr. Secretário de Estado Adjunto e do Ambiente: — Gostaria de dizer também que, paralelamente a
este aumento dos preços dos transportes, existe a possibilidade de as famílias deduzirem até 100% do IVA
(imposto sobre o valor acrescentado) pago nos passes em sede de IRS (imposto sobre o rendimento das
pessoas singulares).
Protestos dos Deputados do CDS-PP Cecília Meireles e Hélder Amaral.
O Sr. Deputado Hélder Amaral diz que apenas parte das famílias paga IRS, mas vale sempre a pena ajudar
essas famílias que pagam IRS do que não ajudar quaisquer famílias, que era o que VV. Ex.as faziam.
Queria ainda dizer que aquilo que é um simulacro e um embuste, para usar as palavras do Sr. Deputado
Hélder Amaral, é a pseudodefesa do sistema de transportes por parte da direita, do CDS e do PSD. Senão,
vejamos: assim que chegaram ao Governo, em 2011, implementaram de imediato um aumento dos preços dos
transportes na área metropolitana de Lisboa de 15% — 15%, Sr. Deputado, para que não se esqueça!
Aplausos do PS.
Apenas seis meses depois, sobre os mesmos passes aplicou um segundo aumento de 5%!
Protestos de Deputados do CDS-PP.
No ano seguinte voltou a aumentar, e só não aumentou o preço dos transportes no ano de 2015, quiçá,
porque vinham aí eleições.
O Sr. Carlos Silva (PSD): — Agora já os baixaram ou não?
O Sr. Secretário de Estado Adjunto e do Ambiente: — Portanto, parece-me que quem não defende os
utentes são, seguramente, os partidos da direita, porque estamos a falar de aumentos extraordinários no período
em que se procedeu ao mais importante corte de rendimentos das famílias portuguesas.
Protestos de Deputados do PSD.
Isso, Sr. Deputado Hélder Amaral, não é, com certeza, defender o sistema de transportes.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, passamos à segunda ronda.
Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Leite Ramos, do Grupo Parlamentar do PSD.
O Sr. Luís Leite Ramos (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Ministro do Ambiente, Srs. Secretários de Estado, Sr.as
e Srs. Deputados: O Bloco de Esquerda trouxe hoje a debate, neste Plenário, um tema muito importante, o dos
transportes públicos. Pensávamos que o debate visava denunciar a falta de investimento público e a degradação
dos serviços de transporte. Estávamos à espera de um debate sério, que teria de começar com um ato de
contrição solene do Bloco de Esquerda e do Partido Comunista sobre a responsabilidade que os respetivos
Grupos Parlamentares e partidos têm nesta matéria.
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Infelizmente, assistimos a uma rábula revisteira — não tem outro termo — da série «não tenho nada a ver
com isto». VV. Ex.as não têm nada a ver com o que aconteceu nos transportes — é isso que estão a dizer ao
Parlamento e ao País!
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. Luís Leite Ramos (PSD): — Trata-se de uma total falta de vergonha e de pudor, Sr. Deputado Heitor
Sousa. Senão, vejamos: então o Bloco de Esquerda e o Partido Comunista Português primeiro negoceiam e
aprovam Orçamentos, depois deixam o Governo adotar o seu plano b com um corte brutal da despesa pública
e agora queixam-se da falta de investimento, da falta de recursos materiais, da falta de pessoal, da degradação
de serviços?! Se não fosse dramático, Sr. Deputado, era, seguramente, hilariante.
Os senhores bem podem continuar a fazer declarações inflamadas, organizar manifestações e protestos com
os vossos sindicatos e comissões de utentes.
O Sr. Jorge Duarte Costa (BE): — Mas há manifestações ou não há manifestações? Já estamos a ficar
baralhados.
O Sr. Luís Leite Ramos (PSD): — Nada disto elimina a vossa responsabilidade, a vossa velada cumplicidade
e corresponsabilidade pelas aprovações das políticas deste Governo e suas consequências.
Os senhores são cúmplices e corresponsáveis pela política de reversões e pelo puro revanchismo que tem
sido adotado por este Governo, nomeadamente em matéria de transportes. Os senhores são cúmplices e
corresponsáveis pelo desinvestimento no setor, com cativações e cortes cegos na manutenção, no
funcionamento, na qualidade do serviço público! Os senhores são cúmplices e corresponsáveis pelo tratamento
de favor dado à Câmara de Lisboa e pela injustiça cometida contra o resto do País, que vai continuar a pagar
os desmandos e as dívidas dos transportes nas áreas metropolitanas do Porto e de Lisboa!
Aplausos do PSD.
Protestos do Deputado do BE Heitor Sousa.
Os senhores são cúmplices e corresponsáveis por esta política de transportes, que não visa mais do que
garantir o apoio do PCP e comprar o silêncio da CGTP (Confederação Geral dos Trabalhadores Portugueses).
Foi esse o principal pilar desta política de transportes, que continua a alimentar uma agenda eleitoralista que
sacrifica o interesse público e algumas corporações de interesses particulares.
Aplausos do PSD.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — O Sr. Deputado devia ter vergonha na cara por estar a fazer essa figura!
O Sr. Luís Leite Ramos (PSD): — Sr.as e Srs. Deputados: As queixas do Bloco de Esquerda, e por maioria
de razão do PCP, são patéticas e cínicas.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Olha quem fala!
O Sr. Luís Leite Ramos (PSD): — Então, a Deputada Catarina Martins e o Deputado Jerónimo de Sousa,
quando participam nas reuniões da troica parlamentar, não pedem mais investimento, mais recursos, mais
trabalhadores?!
Quando o Governo promete, anuncia, jura e depois não faz, o Bloco de Esquerda e o PCP não pedem
responsabilidades?! Não exigem demissões?! Ficam contentes com o que viram no vosso roadshow mediático
no metro e na Carris?! Foi para isso que apoiaram este Governo e aprovaram os Orçamentos?! Estão a dizer
ao País e aos portugueses que assinam de cruz os vossos acordos com o PS?! Estão a dizer ao País que
deixam que o Governo que apoiam e suportam transforme cativações em cortes cegos?!
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O Sr. Presidente: — Já ultrapassou o seu tempo, Sr. Deputado.
O Sr. Luís Leite Ramos (PSD): — Vou terminar, Sr. Presidente.
Os senhores são tão responsáveis quanto o Governo, o vosso Governo, pela falta de investimento público e
pela degradação dos serviços públicos. VV. Ex.as são cúmplices deste Governo. Não brinquem com os
portugueses nem com o País; ambos merecem ser levados a sério.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Pereira, do Grupo Parlamentar do PS, para uma
intervenção.
O Sr. Carlos Pereira (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Gostaria de começar esta intervenção
deixando duas notas prévias. A primeira é para dizer que ouvi com atenção a intervenção do Sr. Deputado
Carlos Silva, do PSD. Devo dizer que até apreciei a energia e o entusiasmo com que falou no suposto
desmantelamento e no desmantelamento efetivo do sistema de transportes públicos em Portugal, apenas acho
que o Sr. Deputado se enganou no destinatário, porque os destinatários da sua intervenção são, de facto, a sua
bancada, a bancada do PSD e a do CDS, porque foram os senhores que desmantelaram deliberadamente o
sistema de transportes públicos em Portugal.
Aplausos do PS.
Protestos do Deputado do PSD Carlos Santos Silva.
A segunda nota é dirigida ao Sr. Deputado Hélder Amaral. Sr. Deputado, este debate sobre transportes
públicos não é um simulacro, como o senhor lhe chamou. Um simulacro é, efetivamente, a posição do CDS
sobre transportes públicos, porque às segundas, quartas e sextas tem uma posição e às terças, quintas e
sábados tem outra. Isso é mais do que claro e já ficou mais do que claro neste mesmo debate.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Felizmente para o País, para as cidades, para os trabalhadores e
para a mobilidade dos portugueses, o PS chegou a tempo de impedir o caminho de privatização que a direita
estava a fazer em Portugal. Na verdade, estava tudo a ficar de pantanas, os senhores estavam a estragar tudo,
estavam a arruinar o sistema de transportes públicos. É por isso que, nesta altura, em que se debate o sistema
de transportes públicos, vale a pena lembrar que a direita fez tudo para afundar este sistema, de modo a ganhar
fôlego — era isso que os senhores queriam — para a privatização que tanto desejavam.
Os dados são, aliás, esmagadores e revelam um Governo em completa contramão com os princípios básicos
da boa mobilidade urbana. Com o PSD e o CDS, verificou-se um deliberado desinvestimento nos transportes
públicos, conforme já se disse aqui, e uma clara desqualificação da importância decisiva de um eficiente sistema
de transportes públicos ao serviço do cidadão para a sustentabilidade do País.
Foi por isso que a direita deixou uma marca nesta área dos transportes públicos, uma herança do tempo em
que governaram Portugal. Com eles, os transportes públicos transportaram cada vez menos passageiros,
ofereceram cada vez menos serviços e cobraram cada vez mais aos utilizadores. Na verdade, a queda na
procura dos transportes públicos foi brutal em todos os sistemas. Só na Carris — é bom que se diga isto —, a
procura caiu 34% entre 2011 e 2012 e, nos quatro anos do Governo PSD/CDS, a Metropolitano e a Carris
perderam 25% dos passageiros. O aumento médio dos preços foi evidente, conforme já se disse aqui, e foi
relevante. Os senhores fizeram dois aumentos de preços em 2011, de 15% e de 5%, e é absolutamente
inacreditável que hoje se mostrem indignados com o aumento de 1,5%, o mesmo valor que se espera para a
inflação. A redução dos serviços ocorreu de forma absolutamente deliberada por parte da direita portuguesa.
Além disso, na altura em que estiveram no Governo, o Metro e a Carris perderam mais de 1000 trabalhadores,
uma situação verdadeiramente assustadora que já foi aqui referida.
Por isso, Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, o que o País não deve perdoar é esta ideia grosseira do
PSD e do CDS de que podemos passar bem sem os benefícios do transporte público e de que vale tudo para
pressionar a sua privatização. Foi por isso que demos um passo em frente, que o Governo deu um passo em
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frente, que impedimos a privatização do sistema de transportes públicos, que asseguramos o caráter público
dos transportes e que promovemos a sua descentralização, chamando para a gestão os municípios.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado José Soeiro, do Grupo Parlamentar do Bloco de
Esquerda.
O Sr. José Moura Soeiro (BE): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Ministro do Ambiente: Sr. Deputado
Luís Leite Ramos, do PSD, a sério que veio falar da preocupação com os transportes públicos por parte do PSD,
que degradou os transportes públicos até ao limite nos anos em que foi Governo?!
A sério que teve coragem de vir dizer que o Bloco de Esquerda e o PCP são os responsáveis pelo
desinvestimento nos transportes públicos?!
Sr. Deputado, em 2011, houve indemnizações compensatórias de 19 milhões do Estado para a STCP e, em
2015, 4 milhões — a isto se chama desinvestimento feito pelo PSD e pelo CDS.
O Sr. Deputado veio aqui sugerir que este debate fosse transformado num ato de contrição. Muito bem, Sr.
Deputado. Avance na contrição pelos quatro anos em que a direita destruiu e quis privatizar os transportes
públicos, em que os degradou até ao limite, em que envelheceu a frota não adquirindo nenhum autocarro para
a SCTP, em que permitiu que a SCTP deixasse de fazer 150 000 viagens por ano pondo os utentes à espera
nas paragens, porque os autocarros não chegavam, porque não havia motoristas para fazer as carreiras, porque
não havia condições, porque os senhores estavam interessados em degradar o serviço público para poderem
privatizá-lo.
Protestos do PSD.
Nos anos do vosso Governo, só no Porto houve 10 km de faixa bus que foram eliminados, houve milhares
de passageiros que foram perdidos pela STCP, além do corte que fizeram nos passes para os idosos e para os
estudantes.
Portanto, a luta contra a privatização e a degradação que o Governo do PSD e do CDS procuraram fazer, e
fizeram, foi importante e começou a ser vencida no momento em que garantimos a propriedade pública das
empresas.
Mas agora há muitos desafios, pelo gostava de me dirigir ao Sr. Ministro a propósito desses desafios.
Primeiro desafio: recuperar passageiros.
A notícia positiva foi a da contratação de 160 motoristas para a STCP e a aquisição de novos autocarros.
Mas pergunto: quando serão adquiridos estes 200 novos autocarros?
Mas, Sr. Ministro, não se recuperam passageiros sem baixar o preço dos passes, sem garantir que as redes
e as carreiras chegam a todo o território, sem que haja transportes com horários alargados, nomeadamente à
noite.
Segundo desafio e preocupação: atualmente, os mais de 30 operadores privados que operam na Área
Metropolitana do Porto estão a tentar abocanhar carreiras, zonas de operação, áreas geográficas e percursos
que são da STCP. Tal tem acontecido porque não tem havido a fiscalização necessária e suficiente sobre estas
práticas abusivas e ilegais dos operadores privados. Aliás, alguns autarcas fizeram declarações preocupantes
dizendo que entendem que a STCP deve ser encolhida, pequenina e reduzida ao centro histórico.
Ora, nós precisamos, por um lado, de garantir que os privados não abocanhem zonas, carreiras e percursos
da STCP e, por outro lado, de garantir a expansão da STCP, porque ela presta um serviço de muito melhor
qualidade, de maior segurança e com mais critérios ambientais que os operadores privados.
O Sr. Presidente: — Tem de concluir, Sr. Deputado.
O Sr. JoséMouraSoeiro (BE): — Vou terminar, Sr. Presidente, perguntando ao Sr. Ministro o seguinte: para
quando o alargamento do metro do Porto a Vila d'Este, Trofa e Gondomar? Para quando a valorização dos
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trabalhadores dos transportes em termos da renovação das carreiras e do reconhecimento do trabalho por
turnos?
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente: — O Grupo Parlamentar do CDS-PP fará uma intervenção a duas vozes.
Sendo assim, tem a palavra, em primeiro lugar, o Sr. Deputado Hélder Amaral.
O Sr. HélderAmaral (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, Srs. Secretários de Estado, Srs. Deputados:
Pretendo esclarecer duas coisas.
Primeira coisa que convém esclarecer: sobre a STCP, Sr. Deputado José Moura Soeiro, o nosso modelo
previa a renovação da frota da STCP paga pelos privados e por uma empresa com know-how na matéria. Sabe
qual é a solução de VV. Ex.as? É a renovação da frota ser feita com o dinheiro dos contribuintes via orçamento
do Estado. É toda uma diferença, Sr. Deputado!
O Sr. PedroFilipeSoares (BE): — Isso não é verdade!
O Sr. HélderAmaral (CDS-PP): — Segunda coisa que convém esclarecer: as opções são legítimas e
concordo com os objetivos que o Sr. Secretário de Estado enunciou, mas temos de fazer o ponto da situação.
A pergunta que se deve colocar é a seguinte: o serviço de transportes públicos está hoje melhor ou pior do que
estava no passado? A resposta é: está pior!
O Sr. JoãoPauloCorreia (PS): — Está bem melhor!
O Sr. HélderAmaral (CDS-PP): — Por exemplo, o Presidente de Câmara da CDU Joaquim Seixas…
O Sr. BrunoDias (PCP): — Não é Seixas, é do Seixal!
O Sr. HélderAmaral (CDS-PP): — … disse, a 4 de dezembro, que tinha menos 73% da frota e um défice
enorme de barcos da Transtejo.
Sr. Secretário de Estado, o que é que diziam os utentes? Queixavam-se, de facto, do preço dos bilhetes,
queixavam-se da falta de transportes alternativos nos dias de greve e queixavam-se do preço dos passes. É
evidente que agora não há greves, porque, entre os utentes e os sindicatos, optaram pelos sindicatos. Por isso,
não há greves, mas continuam os problemas, e até aumentaram.
Fiz uma pergunta clara e os senhores até a sensibilidade social deitaram para o lixo. Então, é possível que
os senhores aumentem os preços dos transportes e digam que vão criar 100% de desconto em sede de IRS?!
Os mais necessitados, a população mais pobre não paga IRS e é aquela que precisa de transportes públicos!
Os senhores estão a fazer um embuste!
Sr. Secretário de Estado, tem de explicar melhor esta medida.
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente: — Tem agora a palavra, ainda em nome do CDS-PP, o Sr. Deputado Pedro Mota Soares.
O Sr. PedroMotaSoares (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, Sr.as e Srs. Secretários de Estado, Sr.as
e Srs. Deputados: O Sr. Ministro falou muito sobre o facto de o transporte público ser uma alternativa ao
transporte privado, pelo que queria falar-lhe de um caso muito concreto em que isso não está a acontecer, que
é o caso da linha de Cascais.
Neste momento, circulam mais pessoas na A5 entre Cascais e Lisboa do que no comboio da linha de Cascais.
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
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O Sr. PedroMotaSoares (CDS-PP): — Esta linha perdeu, nos últimos 20 anos, cerca de 20 milhões de
passageiros.
O Sr. BrunoDias (PCP): — Há três anos, não! Vinham de skate!
O Sr. PedroMotaSoares (CDS-PP): — Neste momento, a linha está obsoleta, tem uma oferta insuficiente
de comboios, há atrasos sistemáticos — é, aliás, a linha que teve mais atrasos no ano passado — e a verdade,
Sr. Ministro, é que estava prevista uma solução para esta linha, como um investimento público com fundos
comunitários de 176 milhões de euros e, ao mesmo tempo, um investimento privado no material circulante, nas
carruagens, feito através de uma concessão.
Com a mudança de Governo, o que é que aconteceu? Não houve investimento — foi realocado para outro
lado — e o Governo não encontrou, até agora, uma alternativa de investimento público. E as concessões? As
concessões nem pensar! Basta falar em concessões e as bancadas mais à esquerda começam logo numa
gritaria.
Sr. Ministro, pergunto-lhe, muito concretamente, o seguinte: qual é a alternativa que o Governo vai
apresentar?
Como temos falado muito sobre o poder autárquico, também lhe pergunto quando é que o Governo se vai
dignar a receber a Câmara Municipal de Cascais, a Câmara Municipal de Oeiras e a Câmara Municipal de
Lisboa, que já disseram que podem ter uma solução, que querem encontrar uma solução, mas que não
conseguem dialogar com o Governo.
O Sr. BrunoDias (PCP): — O Sr. Deputado nem sabe onde é que se apanha o comboio!
O Sr. PedroMotaSoares (CDS-PP): — Qual é a solução e quando é que os senhores se vão dignar a
receber as câmaras municipais?
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Bruno Dias.
O Sr. BrunoDias (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Tínhamos algumas
dúvidas que o CDS soubesse exatamente onde é que se apanha o comboio da linha de Cascais e ficámos agora
a saber que não sabem quem é o ministro que tutela o setor ferroviário.
Risos do PS.
Haveremos de continuar esta discussão, mas ficará para outro dia, certamente.
Da nossa parte, queremos chamar a atenção para um aspeto central nesta discussão e que tem a ver com
o que foi feito pelo Governo do PSD e do CDS e o modo a que chegou o transporte público. Esta situação exige
que aquilo que hoje é decidido tenha em conta o impacto das políticas que foram levadas a cabo, não só na
área operacional, mas também no aumento de preços, que, em média, foi agora de 1,5%, seguiu-se aos
aumentos brutais durante anos, o que, aliás, o Sr. Secretário de Estado já referiu.
O resultado foi o seguinte: desde 2011, o passe L123 aumentou 25% em termos acumulados; no caso do
passe para a terceira idade, o aumento foi de 102%; no caso do bilhete da CP para quatro zonas, o aumento
foi, salvo erro, de 19%.
A receita tarifária não é, em lado nenhum da Europa, o fator fundamental do financiamento das empresas de
transporte público — não é! —, mas é um fator fundamental para atrair ou para afastar a utilização do transporte
público. E é neste contexto concreto que as decisões são tomadas.
Aliás, nas empresas privadas de transporte, no nosso País, os bilhetes ficaram mais caros e não foi 1,5%,
foi mais. Ficaram bastante acima de 1,5% — as questões das médias têm sempre este problema.
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Por outro lado, temos de chamar a atenção para a necessidade de reforçar a oferta, a regularidade da oferta
e o número de circulações e carreiras que estão ao dispor das populações, porque o que aconteceu ao longo
destes quatro anos foi uma diminuição muito grande da oferta do transporte público.
Portanto, não é com essa base ou com esse ponto de partida que temos de olhar para as medidas a tomar
pelas empresas e pela oferta operacional. Temos de repor a capacidade de resposta que foi retirada pelo
Governo anterior e estas é que são as medidas que se colocam em cima da mesa do ponto de vista operacional
e do investimento.
É urgente começar a obra na estação de Arroios, na linha verde, mas, até esse dia, é necessário pôr o
metropolitano a circular com quatro carruagens. Quando começar a obra, a situação será diferente,
Quanto ao que se está a passar na Transtejo, é necessário tomar medidas urgentes e imediatas em relação
à capacidade operacional da oferta da linha fluvial aos passageiros.
Em relação aos Transportes Sul do Tejo (TST), colocamos aqui uma questão muito concreta.
Há uns meses, a Assembleia da República aprovou, por proposta do PCP, uma resolução que alertava o
Estado central e as autoridades para o incumprimento da empresa TST que se estava a fazer sentir na oferta,
prejudicando as populações e os utentes.
A questão que se coloca é a seguinte: neste momento, por parte das autoridades, que resposta é que existe?
É que no terreno não se faz sentir alteração nenhuma. Não há soluções e não há respostas para os problemas
que as populações estão a sentir.
Sr. Ministro, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados, reforço a nossa oposição, que, aliás, é conhecida,
relativamente às opções políticas de entrega aos municípios da STCP e da Carris.
O Sr. Presidente: — Tem de terminar, Sr. Deputado.
O Sr. BrunoDias (PCP): — Termino já, Sr. Presidente.
Já foi entregue, nesta Assembleia, uma apreciação parlamentar em relação à STCP e queremos anunciar
que também entregaremos uma apreciação parlamentar relativa ao decreto-lei sobre a municipalização da
Carris.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: — Ainda nesta segunda ronda, tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado José
Luís Ferreira.
O Sr. JoséLuísFerreira (Os Verdes) — Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Sr. Deputado Hélder Amaral
referiu-se à renovação da frota da SCTP, mas isso não aconteceu. Não houve renovação da frota!
O Sr. HélderAmaral (CDS-PP): — Estava prevista. Os senhores é que não a quiseram!
O Sr. JoséLuísFerreira (Os Verdes) — Falou de uma coisa que não aconteceu!
Já o Sr. Deputado Pedro Mota Soares acerta no nome da linha de comboio mas não acerta no nome do
ministro. Com o tempo, é capaz de lá ir!
Protestos do CDS-PP.
Sr. Ministro, continuamos à espera que nos diga alguma coisa sobre as ligações fluviais do Tejo, sobretudo
as do Montijo.
O metropolitano de Lisboa presta um serviço que está muito longe de responder às necessidades dos
utentes: há falta de pessoal, há atrasos, há comboios imobilizados, há estações degradadas e até há meios
mecânicos que estão constantemente avariados.
Para além de todos estes problemas, em 2012, com o Governo PSD/CDS, para variar, o metropolitano de
Lisboa diminuiu de quatro para três o número de carruagens que circulavam na linha verde. Como sabemos,
esta é uma das linhas com mais utilizadores, porque tem ligações fluviais e aos comboios da CP.
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Portanto, Sr. Ministro, gostaria que nos dissesse que planos tem para o metropolitano de Lisboa e, em
particular, para a reposição das quatro carruagens da linha verde, até que seja possível a circulação de comboios
com seis carruagens após a conclusão das obras da estação de Arroios.
Sr. Ministro, na segunda-feira passada, estivemos reunidos com os trabalhadores da Carris Bus. Estes
trabalhadores, que, aliás, deviam pertencer à Carris, desde logo porque a Carris não pode operar sem reparação
e sem manutenção, trabalham em piores condições e com salários mais baixos do que os trabalhadores da
Carris. Segundo o que pudemos apurar, o conselho de administração desta empresa recusa-se a assinar
qualquer documento que vise a contratação coletiva, perpetuando, assim, a precariedade e os salários baixos.
Recordo, a este propósito, que o Orçamento do Estado para este ano estabelece o primado da contratação
coletiva para as empresas do setor empresarial do Estado. Portanto, é necessário acautelar este princípio
mesmo antes de a Carris passar para a autarquia, como é pretensão do Governo.
Sr. Ministro, pergunto-lhe se o Governo está a ponderar dar orientações para que os trabalhadores da Carris
Bus possam, pelo menos, beneficiar do acordo de empresa que hoje é da Carris.
Aplausos de Deputados do PCP.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Ministro do Ambiente, que junta o tempo que tem atribuído para
esta ronda ao tempo que tem disponível para fazer a intervenção de encerramento. Espero, pois, que não utilize
todo o tempo que tem disponível.
Tem, então, a palavra o Sr. Ministro do Ambiente.
O Sr. MinistrodoAmbiente: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Luís Leite Ramos, acho que há um mínimo de
complexo judaico-cristão que perpassa pelo comum dos portugueses, mas, de facto, esse complexo não o afeta
minimamente, porque V. Ex.ª repudia por completo qualquer responsabilidade do seu partido e do anterior
Governo quanto à situação dos transportes coletivos, o que não me parece, do ponto de vista intelectual, um
exercício de seriedade.
O PSD nada investiu, o PSD gerou um modelo que prejudicava o serviço público, mesmo do ponto de vista
financeiro, que já comentarei.
O exemplo que o Sr. Deputado deu sobre a Carris é uma afronta intelectual. Sr. Deputado, em que modelo
é que a dívida histórica ficava por conta de quem viesse a explorar? De que forma, sem degradar, a níveis
miseráveis, o serviço, é que é possível pagar com a operação essa mesma dívida histórica, dívida essa que
resulta exclusivamente da acumulação — e mentiria se dissesse que era só do Governo anterior — de um
passivo em que ninguém pagou as obrigações de serviço público.
De facto, é mesmo uma afronta intelectual quando V. Ex.ª diz que o modelo, que foi aprovado, publicado e
já promulgado pelo Sr. Presidente da República em decreto-lei, é um modelo em que os contribuintes são
obrigados a pagar.
Ó Sr. Deputado, é tão assim que é exatamente o contrário…! É que é mesmo exatamente o contrário, e não
há volta a dar! É evidente que a dívida do passado, como, aliás, nas subconcessões que os senhores tentaram
fazer — e não haveria outra maneira — seria paga pelos contribuintes. Ora, a única forma de não prejudicar
ainda mais os contribuintes é garantir que não é com a operação do futuro que essa dívida será paga, porque,
de outra forma, o que seria mau tornar-se-ia ainda pior, e, como é normal, como em todas as outras autarquias
deste País, a autarquia de Lisboa e as seis autarquias onde a STCP presta serviço público passarão a pagar as
obrigações de serviço público.
Sr. Deputado Hélder Amaral, não vou usar adjetivos, mas é um facto que, sim, seria a nova empresa
concessionária a comprar autocarros. E os autocarros velhos, autocarros que podiam ser a diesel, que seriam
obrigatoriamente a diesel, evidentemente, Sr. Deputado, teriam de ser pagos, na parte que não estava
amortizada, no final da concessão e de uma maneira que só prejudicava os contribuintes, por uma razão muito
simples: é que o modelo de amortização dos autocarros que VV. Ex.as desenharam é um modelo linear, ou seja,
quando eles viessem a ser pagos o valor contabilístico que tinha de ser pago era muito maior do que o valor real
dos autocarros.
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Portanto, o modelo que os senhores desenharam — não há volta a dar — é um modelo que, se quiser, facilita
a tesouraria no primeiro dia, mas, mesmo do ponto de vista económico-financeiro, é um modelo desastroso,
porque os autocarros teriam mesmo de ser pagos daquela forma. É um modelo absolutamente desastroso!
O Sr. Deputado José Soeiro perguntou quando é que os autocarros começam a chegar à empresa.
Como eu disse, o aviso está aberto — não é uma ficção –, são 60 milhões de euros para, ao contrário do
que o anterior Governo previa (que obrigava que os autocarros fossem a diesel e permitia que fossem em
segunda mão), comprar autocarros novos, todos eles a gás ou elétricos.
Como sabe, há um procedimento de contratação pública e de fabricação dos próprios autocarros, que
também não acontece num estalar de dedos, as empresas estão já a preparar esses concursos e quero acreditar
firmemente, desejarei que assim seja, porque não há nenhum problema de falta de capacidade financeira para
que isso aconteça, que, ao longo do ano de 2017, alguns desses autocarros cheguem à empresa.
Qual é o período de tempo? São três anos, de 2017 a 2019, mas, certamente, ainda durante o ano de 2017
alguns autocarros começarão a chegar às empresas.
Sr. Deputado, com todo o respeito, o modelo da STCP que desenhámos é o modelo que mais defende a
estabilidade da empresa e a própria dimensão da rede, porque a partir do momento em que a STCP passa a
ser operador interno da Área Metropolitana do Porto não tem limitações para que essa mesma rede seja
estendida — aliás, as antenas, como assim se chamam as linhas fora da própria cidade do Porto, estavam a ser
contestadíssimas na forma como foram atribuídas à STCP pela ANTROP (Associação Nacional de
Transportadores Rodoviários de Pesados de Passageiros), com um despacho do anterior Secretário de Estado
Sérgio Monteiro, e, com este modelo, fica completamente sanada essa questão, porque passa a ser evidente
que fazem parte da rede STCP.
Por isso, repito, com muita convicção, que o modelo por nós desenhado é um modelo em que se garante a
estabilidade dos postos de trabalho e da própria empresa enquanto operador interno da Área Metropolitana do
Porto.
Quanto à passagem das três para as quatro carruagens, como toda a franqueza, são três, seis, nove e os
múltiplos são múltiplos de três. Ter quatro carruagens, que cabem fisicamente na estação de Arroios, obriga a
que, para quatro carruagens, tenha de haver duas unidades motoras e não faz sentido que isso aconteça. Alias,
o serviço poderia ser, marginalmente, melhorado na linha verde, mas, de facto, perdia-se muita capacidade de
tração na própria rede completa de metro. Por isso, não o faremos, não por qualquer embirração, mas porque
não temos a mais pequena dúvida de que se o fizéssemos não iriamos ter qualquer melhoria, muito pelo
contrário iriamos ter uma pioria.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Mas pode haver seis e não pode haver quatro?!
O Sr. Ministro do Ambiente: — Por isso, reafirmo o nosso compromisso, o compromisso de uma estrada,
que, certamente, não é feita só com rosas, mas onde o ano 2017 vai ser mesmo o ano de viragem.
Relativamente à Transtejo e à Soflusa, já o reconheci, em todas as empresas que tutelámos aquelas que
têm um orçamento mais esmagado, onde muito tem de ser feito no domínio da manutenção… Repito: em 2015
foram feitas 3 docagens e em 2016 foram feitas 10 docagens, mas o número ideal são 15 docagens, porque se
temos, mais ou menos, 30 navios e o certificado de navegação vale por dois anos a conta é muito fácil de fazer.
Fizemos, de facto, uma aproximação muito grande às nossas obrigações e continuaremos a fazer, mormente,
agora que temos uma administração completamente focada na gestão destas duas empresas e com ganhos
que, repito, apesar de serem de muito recente data, são importantes. É que passar de 32 supressões na última
quinzena do ano passado para 9 na primeira quinzena deste ano é, sem dúvida, um salto qualitativo expressivo
que, garanto, não é conjuntural, embora, evidentemente, o horário em que essas 9 supressões aconteceram,
se calhar, não foi numa hora morta, às quatro da tarde, foi, sim, numa hora de ponta e isso afetou um número
significativo de pessoas.
Iniciando, agora, a fase do encerramento de debate, gostaria de dizer que, se parece evidente a importância
de discutir as seis empresas de que falámos, era extremamente redutor centrar essa discussão apenas nessas
mesmas empresas que, em conjunto, não representam mais do que um terço de todo o setor.
O transporte é responsável em Portugal por 25% das emissões de CO2, valor que, aliás, é muito comparável
ao de outros países da União Europeia.
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No desafio global de combate às alterações climáticas, no qual Portugal, indesmentivelmente, está na
liderança mundial — uns quiseram ir além da troica, o nosso objetivo é estar na linha da frente do cumprimento
do Acordo de Paris —, reduzir emissões significa, sem dúvida, melhorar a eficiência do transporte e promover
junto das populações soluções de uma muito maior sustentabilidade.
Temos bem presente que os transportes representam 15% do custo do orçamento das famílias e que é a
maior despesa logo a seguir à habitação. É por via do sistema de transportes que a maior parte de nos acede
ao emprego, à educação, aos serviços públicos.
Garantir a acessibilidade em todo o território deve ser, por isso, um fator de particular atenção para todos
nós, privilegiando o transporte público e criando alternativas reais à utilização de veículo próprio baseado em
modos coletivos e partilhados é uma das formas mais rápidas de reduzir os custos dos transportes e, com isso,
aumentar o rendimento das famílias.
Sr.as e Srs. Deputados: Não desvalorizamos nenhum dos problemas com as carruagens avariadas no
metropolitano de Lisboa. Com certeza é um facto importante, que temos de discutir, mas discutir a empresa é,
de facto, fazer mais do que isso e, assim, convido-vos a refletirem com o Governo sobre o quadro geral, o quadro
que interessa aos lisboetas, mas também aos portuenses e a todos os outros habitantes metropolitanos e no
resto do País.
A política do Governo é, inequivocamente, dar prioridade às pessoas e isso significa que queremos que todos
tenham acesso ao transporte público e que estamos empenhados em apoiar essa decisão, a começar por quem
mais precisa.
Por essa razão, alargámos o Passe Social + a todo o País e vamos recuperar o Sub23, por sugestão gerada
neste mesmo Parlamento, sem condição de recursos, a nível nacional, permitindo aos jovens um acesso ao
transporte público em condições mais competitivas.
Mas também pensamos nas famílias e com o Orçamento do Estado para 2017 as famílias passam a poder
deduzir 100% do valor do IVA dos passes, ou seja, 6% desse valor dos passes, ficando, assim, o transporte
público mais barato e mais acessível para todos.
Com estas decisões aumentamos, de forma significativa, o apoio do Estado ao setor e, ao contrário do
passado, a todo o País.
Também sabemos que temos de fazer diferente e para fazer diferente teremos de criar soluções
diferenciadas e atores diferenciados. É por isso que a nossa política se foca em dar prioridade à inovação.
A pensar na descarbonização retomamos o caminho da mobilidade elétrica, potenciando não só a aposta de
Portugal nas renováveis e, portanto, em soluções de transporte de reais emissões zero, mas também
potenciando aquela que é, inequivocamente, a mobilidade do futuro com custos operacionais cada vez mais
competitivos.
Ainda no domínio da descarbonização promoveremos um dos maiores apoios públicos às frotas de transporte
rodoviário alguma vez lançado em Portugal e do qual já fui falando ao longo das minhas intervenções. Serão 60
milhões de euros que servirão para colocar em todo o País mais de 500 autocarros novos e todos eles com alta
performance ambiental.
A pensar nas zonas de baixa densidade criámos a regulamentação de transporte flexível e com esta
regulamentação é possível com custo muito baixo, como já o fazem hoje concelhos como Mação, Sardoal,
Abrantes, levar o transporte público à população que vive em zonas isoladas, criando acessibilidade e
promovendo a inclusão.
A pensar nos centros urbanos abrimos portas à inovação. Enviámos para esta Casa aquilo que consideramos
ser uma regulamentação moderna, que protege os consumidores, que protege os trabalhadores e que impõe
obrigações sem privilegiar classes.
É uma forma de oferecer novos produtos que as pessoas, inequivocamente, procuram.
Mas, Sr.as e Srs. Deputados, precisamos de atores diferentes, precisamos das cidades, dos municípios, dos
autarcas. A política deste Governo é aqui também, inequívoca, e descentralizar é uma palavra da maior
relevância. Por isso, incorporámos no Orçamento do Estado para 2017 a dotação necessária para o Fundo para
o Serviço Público de Transportes e temos o IMT (Instituto da Mobilidade e dos Transportes) a trabalhar de forma
ativa na capacitação destes atores municipais e supramunicipais.
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Não vos escondo que esta é uma das nossas reformas mais ambiciosas e sentimos que, apesar de exemplos
como os que nos chegam da Área Metropolitana do Porto, este é um tema que ainda não mobiliza a generalidade
dos autarcas do País.
Não acreditamos que o Governo ou o IMT a partir de Lisboa saibam qual é a carreira que falta na Ericeira,
em Bragança, ou em Lagos. São os autarcas e as comunidades intermunicipais que o saberão, são eles que
conseguem, com os poucos recursos que todos temos, fazer melhor. Convido-vos a todos, acreditando neste
processo de descentralização, a trabalhar com o Governo para concretizar esta reforma.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr. Ministro João Pedro Matos Fernandes.
Para a última intervenção neste debate, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Filipe Soares.
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, Srs. Secretários de Estado, Sr.as e Srs.
Deputados: Se este debate tinha como objetivo provar o descaramento do PSD ou do CDS, não tinha, mas que
ele ficou claro e inequívoco, isso ficou! Se este debate tinha como objetivo provar a falta de pudor do PSD e do
CDS, não tinha, mas que ficou claro isso é inequívoco!
Protestos do PSD.
Srs. Deputados do PSD e do CDS, lembram-se do que dizia o Sr. Secretário de Estado Sérgio Monteiro
quando ouvia as populações a pugnarem por melhores serviços públicos, por acabar com os cortes nos
transportes públicos? Lembram-se do que ele disse aqui neste Parlamento? Disse: «não os oiço!» E nós
percebemos o que é que ele quis dizer; disse que não os queria ouvir!
O Sr. Heitor Sousa (BE): — Exatamente!
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Não queria ouvir as pessoas, as suas críticas e as suas justas
reivindicações!
E o que é que disseram os Deputados e as Deputadas do PSD e do CDS na altura? Calaram!
O Sr. Heitor Sousa (BE): — Bem lembrado!
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Fizeram de conta que concordavam com Sérgio Monteiro, porque
concordavam mesmo com o Sérgio Monteiro e não quiseram ouvir as populações.
Protestos do PSD e do CDS-PP.
Por isso, só mesmo o descaramento do PSD e do CDS se demonstra neste debate, quando vêm aqui dizer
que estão preocupados com as preocupações das populações. Descaramento! Falta de pudor!
Protestos do PSD e do CDS-PP.
O ato de contrição do PSD e do CDS fica à vista quando estão contra o aumento dos transportes — e
poderiam até estar, porque seria justa essa nova posição –, mas quando aumentaram 20% os transportes, só
num ano. Então, percebe-se: provavelmente estão contra, porque acham que o aumento é muito curto e queriam
muito mais! 20% de aumento nos transportes: é esse o legado do PSD e do CDS! 20% de aumento no custo
dos transportes!
Falavam do investimento nas empresas de transportes públicos, quando foi o PSD e o CDS que cortaram o
investimento nas empresas de transportes públicos. O que é que queriam fazer? Privatizar, concessionar,
pedindo aos privados dinheiro que não chegava, sequer, para pagar os salários quanto mais para haver
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investimento! E, agora, vêm dizer que estão preocupados…!? Que descaramento! Que falta de pudor! É este o
legado do PSD e do CDS!
Mas, já agora, poderíamos admitir que houve aqui uma alteração de circunstâncias e que de repente «viram
a luz», viram que de facto estavam errados. Mas perguntemos, então: o que é que neste momento PSD e CDS
fariam se estivessem no Governo? Ou o que é que fazem, por exemplo, no governo das autarquias? A Dr.ª
Assunção Cristas, ainda há algumas semanas, foi visitar o Presidente da Câmara Municipal de Aveiro, Dr. Ribau
Esteves, e não disse nada sobre a privatização da MoveAveiro mas lá as populações estão em luta porque
sabem o que é que significa uma concessão, cortar nos transportes, aumento brutal do preço dos transportes,
ficarem à espera na paragem dos autocarros porque não conseguem entrar, porque eles estão sobrelotados.
Houve alguma palavra do CDS sobre a matéria? Nada!
Sr.as e Srs. Deputados, digo-vos que só me faz lembrar aquela canção de Sérgio Godinho que dizia que havia
alguém que andava desencontrado. PSD e CDS estão com certeza à espera do comboio na paragem do
autocarro — é a única conclusão que poderemos retirar sobre esta matéria.
Aplausos do BE.
Sr. Ministro, deixe-me dizer que este debate não foi agendado para podermos zurzir no PSD e CDS, por
muita razão que tenhamos sobre esta matéria. Há problemas reais e inequívocos nos transportes públicos e é
sobre soluções que queremos fazer este debate.
O Bloco de Esquerda identificou aqui os problemas e apresentamos soluções concretas. Não estamos de
acordo com o aumento dos transportes, mesmo que seja 1,5%. Sabemos que não são os 20% que PSD e CDS
aumentaram, mas é incompreensível, a quem não consegue entrar no metro porque está sobrelotado, a quem
ainda não foram repostas as carreiras que tinha à porta, a quem continua a não ver as alterações dos horários,
mantendo os cortes que PSD e CDS tinham, e exigir que se pague mais transportes. Isso para nós não é
compreensível.
Sabemos que há uma intenção do Governo em investir, mas o problema é que esse investimento tarda.
Tarda o investimento nos novos autocarros, tarda o investimento na atualização de material circulante das linhas
de comboio, tarda o investimento que dê capacidade para que os transportes públicos sejam verdadeiramente
um serviço às populações.
Começámos bem esta Legislatura, no que toca aos transportes públicos, no que era urgente fazer, parámos
com as privatizações que eram as concessões destruidoras do PSD e CDS. Mas a sensação que agora
começamos a ter é a de que essa agenda de construção de um futuro que acabe com o legado da troica começa
a «patinar» e este debate de urgência tem esse nome exatamente porque é esse o nosso sentimento, a urgência
de responder pelos serviços públicos ao serviço das populações que deixem para trás o legado da troica e que
garantam que estamos cá para servir as populações no bom sentido.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, chegamos, assim, ao fim do primeiro ponto da nossa agenda, o debate
de urgência, requerido pelo Bloco de Esquerda, sobre transportes públicos.
Passamos ao segundo ponto, que consiste na discussão, na generalidade, do projeto de lei n.º 322/XIII (2.ª)
— Cria a conta de gestão florestal(CDS-PP),juntamente com o projeto de resolução n.º 609/XIII (2.ª) —
Recomenda ao Governo a atribuição de apoios financeiros aos produtores florestais (BE).
Para apresentar o projeto de lei, tem a palavra a Sr.ª Deputada Patrícia Fonseca, do Grupo Parlamentar do
CDS-PP.
A Sr.ª Patrícia Fonseca (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Quando falamos de floresta,
há um conjunto de matérias em que há consenso generalizado. É reconhecido por todos o papel estratégico do
setor florestal para o desenvolvimento do País, quer como exportador quer seja como gerador de emprego.
É também consensual que a realidade da estrutura da propriedade constitui uma limitação em termos de
rentabilidade e de competitividade, 97% da área florestal é privada e 87% dessa área é de muito pequena
dimensão, não tem mais do que três hectares.
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É ainda consensual que a floresta presta, indiscutivelmente, um conjunto de benefícios de carácter social
que não são mensuráveis mas que têm imprescindível utilidade. Por tudo isto, é também aceite por todos que
se justifica em toda a floresta uma especial intervenção do Estado.
Quando falamos de floresta temos de distinguir dois tipos: a floresta de produção e a floresta de conservação.
Se na floresta de conservação também é relativamente consensual que o papel do Estado deverá ser o de
garantir que os vários usos não anulam essa função de conservação, já na floresta de produção, a que contribui
para a criação de riqueza, as opiniões são mais diversas.
O CDS é claro nesta matéria: a intervenção do Estado deverá passar por políticas de incentivo ao
investimento e à boa gestão florestal que constituam um estímulo aos proprietários que, de outra forma, não se
sentem impelidos a fazê-lo muitas vezes por não terem capacidade financeira para tal. Foi por isso que, quando
fomos Governo, introduzimos um conjunto de normas de cariz fiscal, no âmbito da reforma da fiscalidade verde
e da reforma do IRS e do IRC, mas acreditamos que o enquadramento fiscal vigente pode, e deve, ser
melhorado.
Por isso, apresentamos este projeto de lei, que propõe a criação de uma conta de gestão florestal que não é
mais do que uma provisão financeira para o investimento na floresta. Isto porquê? Como as receitas e os custos
ocorrem geralmente desfasados no tempo, o que propomos é que os produtores possam, de certa forma, cativar
30% das receitas da floresta no ano em que elas ocorrem e que, por isso, será considerado como custo fiscal e
que, quando for utilizado posteriormente, para investimento na floresta, seja novamente considerado como custo
do ano, gerando assim um benefício fiscal.
Sabemos, Srs. Deputados, que esta não será a solução única. Sabemos que melhorar a rentabilidade da
nossa floresta não se esgota nesta proposta, mas sabemos também que não se esgota na constituição das
sociedades de gestão florestal tal como propostas pelo Governo.
Acreditamos que esta medida, a par das que já existem, das que estão previstas e de outras que possam vir
a ser criadas, será mais um importante contributo para incentivar o investimento na floresta num universo de
milhares de proprietários que não têm capacidade financeira para o fazerem sem este estímulo.
Esta mesma proposta foi apresentada para o Orçamento do Estado para 2017 e foi reprovada pelos partidos
que suportam o Governo. Talvez não a tenham compreendido bem e estamos, por isso, dispostos a trabalhá-la
melhor na especialidade, mas um voto contra será certamente incompreendido por todos quanto ouvem o
Governo, todos os dias, a falar em reforma da floresta e na necessidade de melhorar a competitividade da nossa
floresta.
Aplausos do CDS-PP.
Entretanto, assumiu a presidência o Vice-Presidente Jorge Lacão.
O Sr. Presidente: — Peço aos Srs. Deputados dos outros grupos parlamentares que queiram participar neste
debate o favor de se inscreverem.
Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Carlos Matias, do Bloco de Esquerda.
O Sr. Carlos Matias (BE): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Em 2013, era de 35% a superfície
continental do País coberta por arvoredo florestal. A área a mato, e que pode, na sua maior parte, ser cultivada
com floresta, tem uma área semelhante. Ora, enquanto a primeira, a de floresta, tem vindo a reduzir-se, a
segunda tem vindo a aumentar.
A maior parte do arvoredo florestal do País situa-se nas áreas de pequena e média propriedade, onde a
agricultura foi, em tempos, de subsistência e de muito pequenas unidades familiares.
A floresta e os terrenos a mato mantinham-se então suficientemente limpos, dificultando a eclosão de fogos.
Se eclodissem eram facilmente combatidos sem a ajuda de meios humanos exteriores às aldeias.
No entanto, ao longo das últimas décadas, por razões diversas, a pequena agricultura familiar de subsistência
entrou em declínio, com os terrenos de lavoura a serem progressivamente abandonados. Em consequência
desta desertificação, a vegetação arbustiva e herbácea cresceu e, como não é cortada, inevitavelmente o fogo
queima-a no verão e, com ela, arde a floresta.
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Como resultado destas enormes mudanças sociais e económicas, o arvoredo, em grande parte espontâneo,
ou seja, não cultivado, que está a ser destruído pelos fogos florestais nas regiões de pequena e média
propriedade, cobre cerca de 3 milhões de hectares.
Tudo somado, pode estimar-se em cerca de 5 milhões de hectares a área que poderia ser cultivada com
floresta em Portugal continental se fossem tomadas as medidas adequadas.
Nesse sentido, para além das necessárias medidas de incentivo à florestação sustentável e à organização
dos produtores, é preciso que os donos desses terrenos — milhares de pequenos proprietários, muito pequenos
proprietários — beneficiem do apoio ao rendimento da política agrícola comum para compensar as despesas
com o corte de mato.
Não nos parece que a atribuição de benefícios fiscais resolva o problema da falta de rendimento desses
muito pequenos proprietários. A grande maioria desses proprietários florestais, pela sua pequeníssima
dimensão, não chega sequer a ter contabilidade organizada, motivo pelo qual ficarão de fora desses benefícios.
Qualquer medida que vise benefícios fiscais para o setor irá beneficiar apenas os maiores proprietários, os que
têm vindo a concentrar apoios e subsídios.
Em vez disso, ajudas ao rendimento que sejam significativamente maiores onde a propriedade é de pequena
e média dimensão poderão contribuir para resolver problemas de gestão de material combustível em quase todo
o território, a norte do rio Tejo e na serra algarvia, onde os fogos são problema. Porque aí é muito maior a
despesa com o corte do mato e a eliminação dos ramos do arvoredo e porque é necessário criar um incentivo
significativo para que os proprietários das pequenas e médias propriedades plantem arvoredo e cuidem dele.
Estes pequenos, pequeníssimos, proprietários também têm de ganhar ao cuidar das suas pequenas
parcelas, porque estão a prestar um serviço que é do interesse de toda a sociedade, um serviço que trará efeitos
muito positivos na economia, no ambiente e no ordenamento do território. É precisamente este o sentido do
projeto de resolução que apresentamos.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Maurício Marques,
do PSD.
O Sr. Maurício Marques (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Falar de floresta é falar de
emprego, é falar de exportações, é falar de valor acrescentado, é falar de contribuição muito positiva para a
nossa balança de transações correntes. Por isso, saúdo o CDS por ter trazido a Plenário este tema.
Mas falar de floresta é falar também de rentabilidade. Enquanto não tivermos uma atividade florestal que seja
rentável vamos continuar a assistir ao aumento das terras abandonadas. Solos abandonados, para além de não
terem uma contribuição social, trazem também enormes prejuízos económicos e ambientais, pois contribuem
para o aumento de áreas ardidas, tal como os terrenos que não são bem cultivados.
É por isso muito importante que se rentabilize esta atividade, não apenas com a criação da conta de gestão
florestal, mas esta pode ser, também, do ponto de vista financeiro, muito importante.
O retorno do investimento é muito longo na maioria das espécies, para melhorar a diversidade florestal, que
todos defendemos, muito importante por questões ambientais e não só implica um investimento permanente na
floresta como implica uma gestão cuidada. Importa, por isso, criar mecanismos e incentivos fiscais que
estimulem o investimento permanente na nossa floresta.
Importa também melhorar a produtividade das nossas espécies, nomeadamente aquelas que já hoje são das
mais rentáveis.
Registamos com agrado que o atual Governo, contrariamente à maioria que o apoia, reconhece agora esta
sua valorização. Registamos que o projeto de resolução, apresentado pelo Bloco de Esquerda, não reconhece
a importância do eucalipto. Vem agora o Governo reconhecer esta importância com a alocação de 18 milhões
de euros de fundos comunitários para melhorar a produtividade do eucalipto.
Comparar o eucalipto a uma espécie invasora não é conhecer a floresta, nem é a realidade nacional. O
projeto de resolução do Bloco de Esquerda não é só um atentado à floresta, é também um verdadeiro ataque
aos milhares e milhares de pequenos proprietários que têm nas pequenas parcelas de eucalipto o seu único
rendimento, rendimento esse que os mantem num território mais desfavorecido.
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Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado João Ramos.
O Sr. João Ramos (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Todos concordarão que a florestal é o principal
elemento de defesa dos ecossistemas na preservação dos aquíferos, no combate à desertificação dos solos e,
por estes motivos, elemento importante na preservação do mundo rural. A concordância com estas verdades
tem levado à constituição de unanimidades em torno de legislação florestal que começou a ser quebrada pelo
anterior Governo PSD/CDS, quando decidiu corresponder às exigências de grandes interesses do setor,
nomeadamente os da indústria da pasta de papel.
A correspondência aos interesses instalados, sem promover mudanças no sentido correto, é o que o CDS
continua a fazer com o projeto hoje discutido, projeto este que já foi escrutinado pela Assembleia da República
e rejeitado na discussão do Orçamento do Estado para 2017, onde o CDS apresentou exatamente a mesma
proposta que já tinha entregue sob a forma do presente projeto de lei.
No seu projeto, o CDS aponta como importante constrangimento da floresta a baixa rentabilidade das
explorações florestais. Contudo, aponta como razões para esse problema quer a dimensão da propriedade, quer
a falta de «orientação empresarial» dos proprietários. Estas razões são manobras de diversão para a falta de
respostas aos problemas, que seguem a linha da sobrevalorização do contributo das áreas abandonadas ou
sem dono conhecido para os incêndios florestais.
Se a proposta do CDS fosse aprovada, e como o próprio reconhece que a larga maioria dos proprietários
não tem «orientação empresarial», colocaria as grandes propriedades e investimentos florestais a acederem a
benefícios fiscais de investimentos que podem ainda amortizar, comprometendo receitas do Estado.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!
O Sr. João Ramos (PCP): — Não deixa de ser curioso e demagógico que o mesmo partido que, mal assumiu
a pasta, retirou 150 milhões de euros ao PRODER florestal esteja agora tão preocupado com o investimento na
floresta.
O projeto do BE, que propõe apoios à floresta de espécies exóticas, com algumas exceções, coloca como
necessidade a existência de um apoio mínimo, mas nada refere sobre limites máximos desses apoios. No
essencial, também nada refere sobre o principal problema que compromete a rentabilidade da atividade florestal.
Ainda que algumas medidas isoladas possam ser positivas, o que não nos parece ser o caso das propostas
do CDS, o que é preciso é fazer o essencial.
A valorização da floresta tem de passar pela diversificação florestal, pela valorização de espécies que podem
alimentar outras indústrias para além da pasta de papel, como o pinho ou o sobro, ou pelo ataque aos graves
problemas fitossanitários que subsistem. Para tal, são necessários mais investimentos públicos numa área onde
o retorno financeiro é a 10, 30 ou 40 anos, consoante se trate de eucalipto, pinheiro ou montado.
Também é essencial enfrentar os interesses instalados no setor e aumentar os preços muito degradados da
madeira, numa fileira onde o negócio é marcado pela atuação de empresas com características monopolistas.
As celuloses pagam o eucalipto em Portugal a metade do preço que é pago em Espanha e as outras madeiras
estão também bastante desvalorizadas.
É o preço a que a madeira é paga ao produtor que, verdadeiramente, ataca a rentabilidade das explorações.
Foram estes os problemas que o PSD e o CDS, no Governo, não quiseram enfrentar. São estes os problemas
que o Governo do PS não se pode escusar a enfrentar se verdadeiramente quer mais e melhor floresta em
Portugal.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Rocha.
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O Sr. Francisco Rocha (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Desde o passado mês de outubro
que temos tido oportunidade de, quase diariamente, falar, ouvir falar, ler opiniões, emitir opiniões e discutir o
cenário florestal português e o seu futuro.
Por isso, as iniciativas que hoje debatemos nesta Câmara não podem ser desligadas da reforma do setor
florestal que este Governo tomou como tarefa prioritária, estando prestes a culminar a fase de discussão pública.
O conjunto vasto de medidas incluídas nessa reforma não será a panaceia para todos os males, mas quer
ser parte das respostas aos problemas oportunamente identificados aquando da elaboração do Programa do
Governo, e quer, muito justamente, atuar no que já tarda fazer, iniciando um novo ciclo que promova
vincadamente a extensão florestal e a gestão ativa e inicie um processo para a identificação simplificada da
propriedade, aumentando simultaneamente a oferta de terra a quem pretenda investir no setor agroflorestal.
Ou seja, essa reforma, que apoiamos claramente, assume, sem tibiezas, uma visão holística e uma
perspetiva integrada de tudo aquilo que pode concorrer para o sucesso ou para o insucesso da floresta
portuguesa. Não trata isoladamente a questão dos apoios financeiros ou dos benefícios fiscais para os
produtores florestais.
Deste modo, e levando em linha de conta o conteúdo dos diplomas que hoje debatemos, somos obrigados
a perguntar qual é a mais-valia, qual é o ganho estrutural em tratar, isoladamente, mais apoios financeiros e
benefícios fiscais para este setor, quando continuamos a não saber quem é quem numa mancha florestal que é
detida, em mais de 90%, por privados e comunidades rurais.
E, já agora, o que podem acrescentar estas iniciativas, ao tratar, isoladamente, esta questão dos apoios
financeiros e benefícios fiscais, quando temos um longo caminho a percorrer no que toca à criação e ao fomento
das sociedades de gestão florestal, por forma a reforçar o aumento da produtividade e rentabilidade dos ativos
florestais e melhorar o ordenamento do território, acolhendo a evolução organizativa das zonas de intervenção
florestal?!
Por último, não podemos deixar de perguntar se não deram conta de que o pacote legislativo da reforma das
florestas já contempla e propõe um novo e amplo quadro de incentivos e isenções fiscais para o setor florestal,
no âmbito das boas práticas silvícolas e da defesa da floresta contra incêndios, promovendo a rendibilidade dos
ativos e tornando mais atrativa a silvicultura.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Não podemos nem devemos ignorar a realidade. Fazer de conta que
não existe uma reforma florestal em curso não é, certamente, justo, quando sabemos que a dita reforma
pretende ser participada, abrangente e equilibrada e que, cumulativamente, promove a coesão, o
desenvolvimento rural, o crescimento económico e a sustentabilidade ambiental do nosso País, querendo
contribuir para que a nossa floresta se torne diversa e duradoura.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Ainda para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Matias.
O Sr. Carlos Matias (BE): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Sem dúvida que o tema da floresta é complexo
e exige uma abordagem variada e alargada.
Mas, para o PSD, o problema da floresta resume-se a uma palavra que tem um valor quase cabalístico:
eucalipto, eucalipto! Todo o milagre vem do eucalipto!… «O eucalipto dá riqueza! O euca lipto promove o
ordenamento! O eucalipto é o futuro! O eucalipto traz-nos o paraíso!» — para o PSD, o eucalipto é tudo, o
eucalipto é a floresta!
Para nós, não é assim! O eucalipto é, de facto, um problema! O cultivo extensivo e a monocultura do eucalipto
são um problema que tem de ser resolvido. Por isso, nós privilegiamos a floresta autóctone, porque já há
eucaliptos que cheguem! Por isso, nós privilegiamos o apoio aos pequenos proprietários, porque os outros já
receberam muitos subsídios e muitos apoios! É este o sentido do nosso projeto de resolução e é este o sentido
que, pelos vistos, infelizmente, o PSD nunca vai conseguir perceber.
Aplausos do BE.
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O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Também para uma segunda intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada
Patrícia Fonseca.
A Sr.ª Patrícia Fonseca (CDS-PP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Queria apenas dizer, relativamente
aos fundos que supostamente foram retirados às florestas no PRODER, que tal sucedeu apenas porque o
PRODER estava mal desenhado, as florestas não aproveitavam e, se não fossem desviados para outro tipo de
apoios no setor, os fundos seriam devolvidos a Bruxelas.
Queria também dizer que, quando falamos da falta de orientação empresarial dos produtores florestais,
queremos apenas referir que as suas decisões não são tomadas com base no lucro. A floresta, Srs. Deputados,
como todos muito sabem, no âmbito da pequena propriedade, sempre foi considerada como o «mealheiro» da
família. Está lá para, se for preciso, um dia, cortar para casar um filho ou construir uma casa. Por isso mesmo,
estas pessoas precisam de ser ajudadas.
Ao contrário do PCP e do Bloco de Esquerda, que têm preconceito com os grandes proprietários, o CDS não
tem preconceito com os pequenos, pelo que o nosso projeto de lei inclui uma possibilidade de dedução à coleta
para os pequenos produtores que não têm contabilidade organizada, para que estes, que são a grande maioria
dos proprietários florestais, possam também usufruir deste benefício.
O Sr. Deputado Francisco Rocha pergunta-nos qual será o benefício de tratar isoladamente esta questão
dos apoios financeiros e benefícios fiscais, mas eu disse-lhe, Sr. Deputado, que este era apenas mais um
contributo, e também não se esgota no pacote da reforma da floresta que o Governo apresentou.
Aliás, Sr. Deputado, aquilo que acabou por dizer aqui é claro, no que diz respeito ao que se vai concretizar,
que são estudos, estudos e mais estudos, sem nunca se chegar a vias de facto, aos apoios aos produtores
florestais, porque até que a constituição das sociedades de gestão florestal esteja concluída e que os benefícios
revertam, concretamente, para os produtores florestais há de passar muito tempo, quando esta medida já
poderia ter dado proveito a muitos produtores florestais.
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Srs. Deputados, chegámos ao fim da apreciação, na generalidade, do
projeto de lei n.º 322/XIII (2.ª) juntamente com o projeto de resolução n.º 609/XIII (2.ª).
Passamos ao ponto seguinte da nossa ordem de trabalhos, que consta da apreciação do Decreto-Lei n.º
57/2016, de 29 de agosto, que aprova um regime de contratação de doutorados destinado a estimular o emprego
científico e tecnológico em todas as áreas do conhecimento [apreciações parlamentares n.os 25/XIII (2.ª) (PCP)
e 23/XIII (2.ª) (BE)], juntamente, na generalidade, com o projeto de lei n.º 368/XIII (2.ª) — Procede à primeira
alteração do Decreto-Lei n.º 57/2016, de 29 de agosto, conferindo maior justiça e corrigindo incentivos aos
agentes abrangidos pelas disposições do artigo 23.º (Norma Transitória) (CDS-PP).
Tem a palavra, em primeiro lugar, a Sr.ª Deputada Ana Mesquita.
A Sr.ª Ana Mesquita (PCP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O PCP saúda os bolseiros de
investigação científica, designadamente os doutorados e os seus representantes, aqui presentes nas galerias
da Assembleia da República. Saudamos a vossa persistência, toda a luta que têm desenvolvido em defesa dos
vossos direitos, pelo fim da precariedade, pela valorização do trabalho científico.
Sucessivos governos trataram os bolseiros de investigação científica como mão de obra barata e precária,
altamente qualificada, roubando-lhes direitos fundamentais no trabalho e na vida, mantendo fechadas as portas
de acesso à carreira de investigação científica e aproveitando para suprir necessidades permanentes.
É de exploração que falamos, Sr.as e Srs. Deputados. E, no caso dos bolseiros doutorados, de uma
exploração requintada de pessoas que dedicam anos, décadas da sua vida para obter um grau de doutoramento,
que seguem para pós-doutoramento, que o alcançam e ainda ficam sujeitas a dar o seu contributo ao Sistema
Científico e Tecnológico Nacional (SCTN) através de uma bolsa.
Isto não pode ser assim! Se era urgente dar passos para acabar com esta situação errada e injusta, não
podemos aceitar que o caminho a seguir passe pela alteração de um regime altamente precário de bolsas para
uma sucessão de contratos precários, sem um claro fim à vista.
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Por isso, apresentamos como proposta de alteração a integração dos doutorados na carreira de investigação
científica, na respetiva categoria, nos termos do Estatuto da Carreira, no final dos prazos contratuais previstos
como limite máximo.
Outra questão que temos de assinalar é que não faz sentido proceder à construção de uma espécie de
regime ou carreira paralela, nomeadamente quando muitos dos aspetos abrangidos por este Decreto-Lei já
encontram resposta ou referência no Estatuto da Carreira de Investigação Científica. Precisamente por isso,
consideramos que, em termos de níveis remuneratórios, se deve fazer a remissão para o Estatuto da Carreira,
garantindo que não há qualquer perda de rendimento líquido mensal.
E que ninguém alegue que, com este Decreto-Lei, tal como está, no final de contas, os doutorados até vão
receber mais uns pozinhos, 14 meses de salário, e que agora até vão poder aceder automaticamente a
descontos e prestações sociais. Sr.as e Srs. Deputados, isto são direitos! São direitos que há muito deviam ter
sido reconhecidos e colocados em prática. Não são uma benesse!
O Sr. João Oliveira (PCP): — Muito bem!
A Sr.ª Ana Mesquita (PCP): — Aos que apontem o aumento de encargos para limitar ou travar o recurso a
contratos, conforme algumas instituições têm referido, devido ao seu crónico subfinanciamento — e isto também
é bem lembrado —, contrapomos a proposta do PCP, que estabelece que os encargos resultantes da
contratação são suportados, até ao fim da vigência do contrato, incluindo as renovações, pela Fundação para a
Ciência e a Tecnologia (FCT).
A situação de precariedade no trabalho científico é penalizadora e gera instabilidade para todos: para os
investigadores, para as instituições, para o desenvolvimento científico, para o nosso País. Há soluções para
estes trabalhadores, Sr. Ministro, mas o atual Decreto-Lei não responde na dimensão do que é justo, digno e
necessário. É preciso ir mais longe!
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Para uma intervenção, tem agora a palavra o Sr. Deputado Luís Monteiro.
O Sr. Luís Monteiro (BE): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Quero, antes de mais, aproveitar o
momento para saudar a vinda a este Plenário de dezenas de bolseiros, de organizações sindicais e de
associações várias, organizações essas que nunca desistiram de lutar em nome da dignidade da ciência, dos
investigadores e do direito ao conhecimento.
Sr.as e Srs. Deputados, o diploma publicado não cumpre os objetivos que enuncia. Na verdade, o que o
diploma estipula é a troca da precariedade das bolsas por mais precariedade, não criando nenhum horizonte de
estabilidade aos investigadores, podendo até constituir uma porta aberta para mais fáceis despedimentos. A
contratação a termo resolutivo, para organismos da Administração Pública, ou a termo incerto, para organismos
abrangidos pelo direito privado, pelo prazo de três anos, renováveis até um máximo de seis, não promove a
necessária estabilidade e dignidade dos investigadores.
Deixa de fora do regime de emprego científico todos aqueles e todas aquelas sem o grau de doutor, como,
por exemplo, muitos dos bolseiros de gestão de ciência e tecnologia. A instabilidade das tabelas da FCT, que
enunciam os abrangidos por este diploma, é a prova de que são necessárias alterações ao mesmo. Desde
dezembro, as tabelas foram alteradas quatro vezes. Sr.as e Srs. Deputados, desde dezembro que foram
alteradas quatro vezes as grelhas da FCT!
É certo que, com contratos de trabalho, os investigadores ficam com alguns dos direitos laborais e sociais
que hoje lhes são negados, mas tal não pode ser conseguido nem com um quadro de tão grande precariedade
nem com contratos a prazo.
O acordo que foi encontrado entre o Bloco de Esquerda e o Governo no que toca ao combate à precariedade
é um passo importante. Passo importante esse que, ao que parece, o Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino
Superior não quis dar. Mas ainda vai a tempo, porque o Bloco de Esquerda cria essa possibilidade com esta
apreciação parlamentar.
É, por isso, importante desmistificar alguns dos argumentos que têm sido utilizados em defesa da medida.
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Em primeiro lugar, o argumento de que este diploma é um nível intermédio na passagem para a carreira de
investigação científica é falso, Sr.as e Srs. Deputados. O que o diploma garante, única e simplesmente, é um
contrato a prazo, sem qualquer garantia de estabilidade no horizonte. Aos bolseiros, é-lhes negada uma
perspetiva de futuro, porque não garante a possibilidade de ingressar na carreira de investigação científica.
Em segundo lugar, o argumento de que os bolseiros ficarão a ganhar mais também é falso, Sr.as e Srs.
Deputados. Refere o Decreto-Lei que a remuneração a atribuir no âmbito das contratações é correspondente ao
nível 28 da TRU (Tabela Remuneratória Única). Isto pode mesmo significar uma diminuição muito expressiva
dos rendimentos dos atuais bolseiros, o que é de todo inaceitável. Constitui um retrocesso relativo ao estipulado
no programa Investigador FCT, que também tinha os seus problemas, mas que, na verdade, garantia um grau
de rendimento igual àquele que está na carreira de investigação científica.
Não estamos, por isso, perante uma lógica de reposição de rendimentos nem tampouco de aumentos
salariais, estamos, sim, a discutir quanto é que, em nome de um contrato precário, cada um destes bolseiros
perde ao fim do mês.
Se queremos, realmente, resolver o problema da precariedade e alterar o paradigma da investigação em
Portugal, temos de ter a coragem para alterar aquilo que cria ainda mais entropias ao sistema.
Garantir que ninguém fica de fora do combate à precariedade é o objetivo do Bloco de Esquerda.
A Assembleia da República tem, hoje, a responsabilidade de corrigir os erros que o Ministério criou.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Peço aos Srs. Deputados que têm intenção de intervir neste debate mas
que ainda não se inscreveram o favor de o fazerem.
Tem agora a palavra a Sr.ª Deputada Ana Rita Bessa, do Grupo Parlamentar do CDS-PP, para apresentar o
projeto de lei n.º 368/XIII (2ª).
A Sr.ª Ana Rita Bessa (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O Governo apresentou o
Decreto-Lei n.º 57/2016 como uma solução para a precariedade reconhecidamente existente no Sistema
Científico e Tecnológico Nacional. É este Decreto-Lei — a sua intencionalidade, aplicabilidade e efeito — que
está, hoje, em apreciação parlamentar.
O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior tem afirmado relativamente a este regime que:
primeiro, resultou de um processo de ampla discussão pública e institucional; segundo, assume a figura do
contrato como o vínculo normal para o trabalho científico pós-doutoral; e terceiro, contribuirá para a renovação
contínua da comunidade científica.
Em primeiro lugar, a discussão recente no meio académico e científico que converge, hoje, quatro meses
decorridos da publicação do Decreto-Lei, nesta apreciação parlamentar, tem demonstrado que, embora possa
ter havido uma ampla discussão pública e institucional, esta não resultou num desejável consenso sobre a
matéria. Bem pelo contrário, as universidades, os bolseiros e os sindicatos — que daqui saúdo — têm,
insistentemente, apresentado sérias críticas, como, de resto, nos foi dado ouvir nos últimos dois dias, na
Comissão de Educação e Ciência. E, se há consenso, ele está quase todo fora da letra do Decreto-Lei.
De resto, o Decreto-Lei contém uma série de contradições. Por exemplo, a disposição quanto aos níveis
remuneratórios estabelece que uma experiência de três anos corresponde ao escalão 54 de vencimento, mas a
norma transitória faz equivaler o escalão 28 aos mesmos três anos, o que tem impacto significativo nas
remunerações dos candidatos.
Em segundo lugar, se a intenção é a de que os contratos de trabalho passem a ser o modo de vinculação
normal para os doutorados, então as disposições do Decreto-Lei ficam aquém desse desígnio e a delineação
contratual de seis anos exemplifica bem esta limitação.
É verdade que se estabelece a possibilidade de se poderem abrir concursos para esse efeito, mas isso, por
si só, não tem novidade. A maior relevância está na norma transitória que, ao vigorar por um ano, acaba por não
conferir igual oportunidade a todos os bolseiros que estão hoje no sistema. Resulta que o efeito pretendido, de
fazer prevalecer o contrato sobre a bolsa — que, em si mesmo, é positivo —, tem uma abrangência menor do
que a devida. Importa, por isso, alargar o período transitório para três anos, garantida a correta interpretação
dos requisitos por parte da FCT, o que nos dizem não estar a ser o caso.
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Finalmente, e em terceiro lugar, o Decreto-Lei estabelece a obrigatoriedade de abertura de concursos para
a contratação de doutorados para o desempenho de funções realizadas por bolseiros. Note-se que não se
formula como objetivo a vinculação garantida dos bolseiros ao sistema. Portanto, ao abrir o procedimento
concursal, o objetivo da instituição será o de contratar o elemento mais qualificado para realizar a função, seja
ele o bolseiro que já está na instituição, seja outro candidato. Mas, na norma transitória, é definido o incentivo
financeiro à contratação do bolseiro, porque a FCT paga o seu custo, o que pode condicionar o resultado final
do concurso e, assim, perverter o objetivo definido no Decreto-Lei, bem como limitar a dita renovação contínua
da comunidade científica. Parece-nos necessário corrigir esta situação, criando um incentivo neutralizador,
desde que acautelado o impacto orçamental na FCT.
Em conclusão, este Decreto-Lei tem a virtude de converter algumas bolsas em contratos, mas tem várias
inconsistências e limitações que, no nosso entendimento, podem ser melhoradas em sede de comissão, para
que os efeitos sejam, efetivamente, benéficos para o sistema como um todo.
Por esta razão, o CDS-PP apresentou propostas, comprometendo-se com a procura de soluções. Mas
fazemo-lo numa atitude de responsabilidade, o que implica não ignorar as restrições orçamentais das
instituições, para que não se criem falsas expectativas numa questão que tem enormes implicações na vida das
pessoas mais qualificadas.
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Não há mais inscrições por parte dos Srs. Deputados.
Como a Mesa regista a inscrição, para uma intervenção, do Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino
Superior, Manuel Heitor, faça favor de usar da palavra.
O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior (Manuel Heitor): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs.
Deputados: Discutir, nesta Câmara, as questões do emprego científico é, certamente, uma grande oportunidade.
Este é, de facto, um dos combates centrais da política do Governo e, em particular, da ação governativa da
ciência e do ensino superior. O desígnio que demos ao conhecimento e ao desenvolvimento científico passa,
certamente, por valorizar o conhecimento científico — e, com ele, o emprego científico — e por corrigir erros do
passado.
Percebemos uma sociedade com mais conhecimento, onde o emprego científico seja, de facto, uma forma
de aproximarmos melhor a atividade científica à vida dos portugueses e à atividade das nossas empresas e das
nossas instituições sociais, da saúde e de qualquer área do conhecimento. A ciência, hoje, está em todas as
atividades. E é isso que se pretende do emprego científico: o emprego de doutorados com atividade científica
de uma forma que dignifique as condições de trabalho.
O Decreto-Lei que está hoje, nesta Câmara, em apreciação — e agradeço, mais uma vez, o facto de me
terem dado a oportunidade de aqui vir —, foi resultado de um debate público e é resultado, sobretudo, de um
esforço de comparação internacional, vindo, de facto, dar a Portugal um quadro renovado de emprego no
contexto europeu. Basta comparar as situações tornadas, entretanto, públicas pela organização Science Europe
para a Europa.
Em todo o caso, se há dúvidas, devem ser clarificadas. No sentido de responsabilidade de tornar a ciência
consensual na sociedade portuguesa, evidentemente que aceitamos clarificar alguns aspetos no âmbito do
emprego.
Face às várias propostas apresentadas, parece-me que é particularmente importante identificar e clarificar
três aspetos: primeiro, o acesso às carreiras — esse é o objetivo deste Decreto-Lei. O recrutamento inicial de
jovens investigadores com doutoramento deve dar acesso às carreiras. Se há dúvida perante essa intenção,
deve ficar perfeitamente claro que, ao fim dos seis anos de contrato, deve ser aberto o concurso. Claro que a
atividade científica tem de ser regida por critérios de exigência e de avaliação científica, não podendo ser os
contratos impostos, mas naturalmente que esse aspeto deve ser clarificado.
Segundo, o regime transitório. Se há dúvidas face ao período de interrupção ou não dos três anos de bolsas,
tal deve ser nitidamente clarificado no âmbito do Decreto-Lei, para não haver qualquer tipo de dúvidas.
Terceiro, há necessidade de desacoplar, claramente, as condições de emprego científico da precariedade
nas organizações da administração central.
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Por isso, claro que estamos abertos à clarificação do documento.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Tem agora a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Porfírio
Silva, do Grupo Parlamentar do PS.
O Sr. Porfírio Silva (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: A apreciação
parlamentar do Decreto-Lei n.º 57/2016 é oportunidade para afirmarmos e reforçarmos a estratégia de combate
à precariedade do emprego científico. Este diploma serve uma mudança de paradigma: combater o abuso da
figura do bolseiro e celebrar contratos com os trabalhadores científicos. Deixamos de ter doutorados como falsos
bolseiros e passamos a ter contratos, com os direitos sociais e laborais inerentes, sem qualquer perda de
rendimento líquido anual, mesmo para os que comecem no índice remuneratório mais baixo — e nem todos
começam no mínimo e todos podem progredir.
Importa sublinhar que este diploma é, também, uma ferramenta contra a eternização de situações de
contratação a prazo. Se algum investigador esteve seis anos com um dos contratos previstos neste diploma,
essa relação de trabalho só pode prosseguir pela via de um concurso de acesso à carreira com perspetivas de
progressão.
Mesmo a norma transitória é um elemento importante de correção de injustiças acumuladas, porque obriga
à abertura de concursos para contratos que cubram as funções desempenhadas por bolseiros há mais de três
anos, seguidos ou interpolados.
Situação específica é a dos bolseiros de gestão de ciência e tecnologia em serviço, nomeadamente, na FCT.
Sejamos claros: esta é uma situação inaceitável, de pura precariedade na Administração Pública, que terá de
ser corrigida para além deste diploma.
O Grupo Parlamentar do Partido Socialista introduziu propostas de alteração sobre estas e outras questões.
Trabalharemos, contando também com as propostas de outros partidos, para clarificar a intenção do legislador
e melhorar o que, já de si, é um diploma tão importante.
Ninguém, nenhum sindicato, nenhuma associação, nenhum grupo de bolseiros propôs a cessação de
vigência do Decreto-Lei. Isso sublinha um ponto essencial: o diploma é um passo importante na direção certa,
nenhum investigador ficaria melhor sem este diploma.
Evidentemente, este não é o caminho dos que defendem o regresso ao modelo elitista do Investigador FCT…
O Sr. Duarte Filipe Marques (PSD): — Elitista?! Modelo elitista?!
O Sr. Porfírio Silva (PS): — … que remunera melhor os que vencem a maratona com obstáculos, mas é
apenas para uns poucos. Não aceitamos uma pequena ilha de suposta excelência, cercada de precariedade por
todos os lados. Não vamos por aí e não irá por aí quem queira combater a precariedade e dignificar o emprego
científico, como quer o Governo e como quer o PS.
Por isso, apoiamos a estratégia em curso, muito mais vasta do que este diploma, e que passa,
nomeadamente, por novas regras dos concursos para projetos de investigação e novas regras para a avaliação
das unidades de I&D (inovação e desenvolvimento).
Tal como passa pelos contratos de legislatura, celebrados pelo Governo e pelas universidades e politécnicos,
que criaram um horizonte de estabilidade que permitiu às instituições comprometerem-se a contratar mais 3000
docentes e investigadores até 2019, sempre premiando as estratégias institucionais que assentam na
dignificação do emprego científico e na sua sustentabilidade.
Isto não será para fazer tudo num ano. Isto não será fazer milagres. Mas isto é virar a página da razia
institucional com que o anterior Governo ameaçou o futuro da ciência em Portugal. Isto é combater a
precariedade, porque a precariedade é má para as pessoas e é má para as instituições. Isto é honrar os nossos
comprimidos…
Risos do Deputado do PSD Duarte Filipe Marques.
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… digo, compromissos e fazer o que deve ser feito.
Não confunda, Sr. Deputado, porque nós queremos honrar os nossos compromissos e não nos desviamos
disso, mesmo que alguns Deputados brinquem com uma matéria tão séria.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Tem a palavra, para uma intervenção, a Sr.ª Deputada Nilza de Sena,
do Grupo Parlamentar do PSD.
A Sr.ª Nilza de Sena (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Ministro: Começo por cumprimentar
os Srs. Investigadores presentes nas galerias e dizer que o debate de hoje ilustra bem o que temos vindo a
denunciar nas mais diversas ocasiões. Este Governo, esta maioria, promete o que não pode cumprir, anuncia o
que não pode dar e o que se vê aqui é que vendeu gato por lebre!
A Sr.ª Maria Germana Rocha (PSD): — Exatamente!
A Sr.ª Nilza de Sena (PSD): — É uma maioria que ilude, cria expectativas, enche discursos com intenções
simpáticas, mas, depois, ficam admirados com as suas próprias ações.
Não vale a pena o Bloco de Esquerda e o PCP fingirem que são oposição e ora estarem dentro, ora estarem
fora da coligação. Estão todos na fotografia, Srs. Deputados.
Protestos da Deputada do BE Mariana Mortágua.
Afinal, a decisão da tutela sobre o novo regime de contratação de doutorados para estimular o emprego
científico, não cumpre com os objetivos que enuncia, porque troca precariedade por mais precariedade, diz o
Bloco de Esquerda.
O Sr. Duarte Filipe Marques (PSD): — Muito bem! Essa é a verdade!
A Sr.ª Nilza de Sena (PSD): — Pasme-se que até verificam que há um retrocesso face ao estipulado no
programa Investigador FCT, do anterior Governo.
Francamente, não percebemos o espanto do Bloco de Esquerda e do PCP. O Ministro Manuel Heitor tem
sido muito claro ao longo deste tempo: quer uma política de baixos salários para os investigadores.
A Sr.ª Rita Rato (PCP): — E o PSD fez o quê?!
A Sr.ª Nilza de Sena (PSD): — É uma política de precariedade que retira condições, inclusivamente
remuneratórias, que o anterior Governo tinha dado. Houve quase 40% de perda de rendimento! É a política
miserabilista de toda a esquerda!
O PSD não se revê neste diploma, pois defende que devemos caminhar para a garantia de mais direitos
sociais para os investigadores…
A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Tem graça!
A Sr.ª Nilza de Sena (PSD): — … seguindo uma linha evolutiva, como a que tínhamos, em que o programa
Investigador FCT já melhorava o Programa Ciência 2008, que agora poderia ser revisitado de forma
«incrementalista» e não com perda de talentos, com endogamia, com discriminação entre investigadores
doutorados no estrangeiro e doutorados no País, com descontinuidade na carreira e fragilizando menos as
instituições de ensino superior.
Relembro que — não sei se os senhores ficam confortáveis —, em 2016, abriram zero bolsas! Vou repetir:
em 2016, abriram zero bolsas! Aprovaram zero bolsas!
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O Sr. Duarte Filipe Marques (PSD): — É mentira?!
A Sr.ª Nilza de Sena (PSD): — Mas os senhores acham isto aceitável!
Sr.as e Srs. Deputados, este é um mau diploma! Não acrescenta, subtrai… Há atrasos e mais atrasos que
são escandalosos.
Não foi o PSD que anunciou o fim da precariedade, foram os senhores que o anunciaram, foi o Governo.
Portanto, o PSD, nesta matéria, depois de uma maratona de audições, anuncia que vai apresentar uma
iniciativa legislativa própria que vá ao encontro das expectativas dos investigadores e das instituições.
Aplausos do PSD.
Protestos do BE.
O Sr. Duarte Filipe Marques (PSD): — Zero bolsas!
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Ainda no tempo disponível, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Monteiro,
do Bloco de Esquerda…
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Sr. Presidente, se me permite, é prática instituída que os partidos que
agendam iniciativas encerram o debate.
Se mais nenhuma bancada nem o Governo quiserem intervir…
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — É o caso, Sr. Deputado.
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Então, assim será.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Só está previsto que o Governo faça a sua intervenção final no
encerramento, uma vez que é um decreto-lei que está a ser apreciado.
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Sr. Presidente, se me permite, não é essa a prática instituída. Este é um
debate agendado por partidos políticos, com iniciativas e propostas de alteração.
O Governo intervém quando quiser, mas o encerramento não é uma prerrogativa do Governo.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Não vamos estabelecer uma querela à volta disto, Sr. Deputado.
Tem a palavra o Sr. Deputado João Oliveira.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr. Presidente, parece-me que, nisto, o PCP tem voto de qualidade porque foi
quem fez o agendamento.
Da nossa parte, temos o direito de encerrar o debate, porque fomos o partido que agendou a iniciativa. Vemos
vantagem em que o Sr. Ministro possa ainda responder, no fim, a algumas perguntas.
Portanto, se o Governo não quiser encerrar o debate, terá de ser o PCP a fazê-lo. De resto, as outras
bancadas que ainda têm tempo disponível, nomeadamente o Bloco de Esquerda, o CDS e o PSD, é bom que
se inscrevam antes do PCP e do Governo.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Sr. Deputado João Oliveira, relativamente à precedência das vossas
intervenções, não há dúvida. A Mesa não regista mais nenhum pedido de inscrição, a não ser da parte dos
Grupos Parlamentares do Bloco de Esquerda e do PCP, e a disponibilidade do Sr. Deputado para que o Governo
encerre o debate.
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Sr. Deputado Pedro Filipe Soares, mantém a sua posição?
Pausa.
Nesse caso, peço ao Governo que use da palavra e depois clarificaremos esta questão em sede própria.
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Sr. Presidente, se me permite, o meu aceno de cabeça era para
responder afirmativamente à sua pergunta no sentido de saber se aceitamos a alteração.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Muito obrigado pelo espírito de colaboração, Sr. Deputado Pedro Filipe
Soares.
Tem, então, a palavra o Sr. Deputado do Bloco de Esquerda Luís Monteiro.
O Sr. Luís Monteiro (BE): — Sr. Presidente, queria responder a algumas questões que foram levantadas.
Sr. Deputado Porfírio Silva, do PS, uma mudança de paradigma era combater a lógica de fazer proliferar
carreiras paralelas à carreira de investigação científica. O diploma só faz isso se realmente for aprovada a
proposta de alteração do Bloco de Esquerda que garante que, ao fim dos seis anos, há uma entrada efetiva na
carreira. Não fazendo isso, estamos a legitimar uma carreira paralela à da investigação científica.
Em relação ao PSD, parece que acordou agora para este problema, mas ainda bem!
O Sr. Duarte Filipe Marques (PSD): — Vocês é que acordaram agora! Mas vieram a tempo!
O Sr. Luís Monteiro (BE): — É bom que tenha iniciativas, mas pode fazê-lo já! Baixa à comissão, como é
regimental, e aí poderemos discutir as propostas de alteração para resolver este problema.
Portanto, estaremos disponíveis para fazer esse debate.
Aplausos do BE.
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Para que efeito, Sr. Deputado?
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Sr. Presidente, é para uma interpelação à Mesa sobre a condução dos
trabalhos.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Sr. Presidente, para não tomar muito tempo, nem tão-pouco para fazer
destes últimos minutos qualquer tipo de incidente, gostaria de clarificar, de uma vez por todas, esta questão.
O Sr. Deputado Pedro Filipe Soares, do Bloco de Esquerda, estava, e bem, a cumprir com o acordo feito em
Conferência de Líderes, mas, de forma gentil, por cortesia, aceitou falar antes do Governo, quando seria, de
facto, o Bloco de Esquerda e a seguir o PCP a encerrar o debate.
Portanto, está no seu direito, não temos nada a opor — era o que mais faltava! —, mas que isto não fique
como precedente que possa ser invocado no futuro.
A regra é a de que o partido que agenda um debate é quem o encerra.
O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Claro!
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Gostaria que isto ficasse claro.
Não há nenhum problema da nossa parte quanto a isso, porque se trata de uma disponibilidade do Bloco de
Esquerda que entendeu assim fazer, mas que não sirva para futuro.
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O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Muito bem, Sr. Deputado.
O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Calculo que também seja para uma interpelação à Mesa.
O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Sim, Sr. Presidente. É para o mesmo efeito.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Sr. Presidente, queria apenas sublinhar aquilo que o Sr. Deputado
Nuno Magalhães acabou de dizer.
É consensual, na Conferência de Líderes, que quem agenda os debates tem direito de os encerrar, ainda
que o Governo possa estar presente.
Se os proponentes assim o permitem, creio que não há discussão à volta desta matéria, mas é evidente que
isto não cria precedente e que o consenso da Conferência de Líderes vale para futuro e para todos os debates.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Isso já estava claro na intervenção que fizemos há pouco.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Srs. Deputados, haverá um momento para exprimirem as vossas
posições novamente em sede de Conferência de Líderes, mas a questão, por agora, está resolvida.
Tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Mesquita, do PCP, para uma intervenção.
A Sr.ª Ana Mesquita (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: No fim
deste debate agendado por iniciativa do PCP, mais do que clarificar a aplicação do texto atual era mesmo preciso
pôr na lei, claro como água, o que lá não está. Este é o desafio que deixamos.
Por exemplo, se o acesso à carreira é um objetivo claro deste diploma, então coloque-se isso de forma
explícita na lei. É o que temos para dizer.
Sr. Ministro, uma questão que também foi alegada é a de que este diploma tem em conta o quadro
internacional. Pois no quadro internacional também existem, Sr. Ministro, vários casos em que há estabilidade
na contratação de doutorados. Portanto, temos de olhar para isso.
Relativamente ao súbito interesse do PSD e do CDS também nesta matéria, não podemos passar em claro
o que foram os anos de ataque da política de direita à ciência e ao ensino superior.
O Sr. Duarte Filipe Marques (PSD): — Zero bolsas em 2016!
A Sr.ª Ana Mesquita (PCP): — Portanto, não podemos deixar de lembrar esse ataque e também não
podemos deixar de pedir para, então, virem, agora votar de acordo com a melhoria das condições de vida, de
trabalho e de rendimentos destes doutorados.
Protestos do Deputado do PSD Duarte Filipe Marques.
Venham para o lado de cá! Nós nunca saímos daqui, contrariamente a outros partidos.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Tem, então, agora a palavra, para uma intervenção, o Sr. Ministro da
Ciência, Tecnologia e Ensino Superior.
O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados:
Estamos a tratar de um assunto muito concreto e grave, porque afeta pessoas e famílias.
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Por isso, mais do que fazer um debate sobre estratégias, temos de nos lembrar que, entre 2012 e 2015,
reduziu em 40% o número de contratos ativos em Portugal. Eram cerca de 1084, em 2012, e quando tomámos
posse eram cerca de 660.
É essa a questão que estamos a tratar, estamos a tentar dignificar o emprego científico em Portugal. Não
estamos a criar carreiras paralelas — o diploma não as cria —, pelo contrário, estamos a dar acesso às carreiras
criando, em Portugal, um quadro digno no contexto europeu.
É isso que este diploma faz e é isso que estamos dispostos, naturalmente, a clarificar, numa versão revista
do diploma. Se há dúvidas, clarifiquem-se. Clarifique-se o acesso à carreira, o regime transitório, a necessidade
de desacoplar da solução de precariedade as organizações da administração central.
Este diploma é, sobretudo, a favor do emprego científico, de Portugal e dos portugueses com mais ciência.
Aplausos do PS.
O Sr. Duarte Filipe Marques (PSD): — Não respondeu!
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Srs. Deputados, está encerrada a apreciação conjunta do Decreto-Lei
n.º 57/2016, de 29 de agosto [apreciações parlamentares n.os 25/XIII (2.ª) (PCP) e 23/XIII (2.ª) (BE)], e do projeto
de lei n.º 368/XIII (2.ª).
No âmbito regimental da apreciação parlamentar de decretos-leis, deram entrada na Mesa, para discussão
na especialidade, propostas de alteração ao Decreto-Lei n.º 57/2016, apresentadas pelo BE, pelo PCP, pelo PS
e pelo CDS-PP, as quais baixam à 8.ª Comissão.
Passamos, de seguida, ao ponto quatro da nossa ordem do dia, que consiste na discussão, na generalidade,
dos projetos de lei n.os 21/XIII (1.ª) — Consagra a Terça-Feira de Carnaval como feriado nacional obrigatório
(Alteração ao Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro, alterado pelas Leis n.os
105/2009, de 14 de setembro, 53/2011, de 14 de outubro, 23/2012, de 25 de junho, 47/2012, de 29 de agosto,
69/2013, de 30 de agosto, 27/2014, de 8 de maio, e 55/2014, de 25 de agosto) (Os Verdes) e 369/XIII (2.ª) —
Altera o Código do Trabalho, consagrando a Terça-Feira de Carnaval como feriado nacional obrigatório (PAN),
juntamente com o projeto de resolução n.º 604/XIII (2.ª) — Negociação em sede de concertação social de
princípios orientadores para uma legislação específica, por forma a definir quais os feriados obrigatórios a serem
observados na segunda-feira da semana subsequente (PSD).
Para apresentar o projeto de lei de Os Verdes, tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Ferreira.
O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Os Verdes apresentam, hoje, uma
iniciativa legislativa com vista a consagrar a Terça-Feira de Carnaval como feriado obrigatório.
A primeira nota que Os Verdes consideram importante para esta discussão é dizer que não propomos um
novo feriado. Não é nada disso que se pretende.
A Terça-feira de Carnaval já é um feriado — certamente, os Srs. Deputados têm conhecimento disso. É
facultativo, mas é um feriado.
Risos de Deputados do PSD e do CDS-PP.
Sr. Presidente, se calhar, era melhor distribuir um Código do Trabalho aos Srs. Deputados do PSD e do CDS
que, pelos vistos, não têm conhecimento. Convinha que lessem os projetos!
Como é facultativo, fica nas mãos do Governo decidir se considera ou não a Terça-Feira de Carnaval como
feriado, o que, muitas vezes, até é feito com poucos dias de antecedência.
Portanto, o que se pretende não é inventar um feriado, mas, sim, apenas, alterar a natureza jurídica do feriado
de Carnaval.
Protestos de Deputados do PSD.
Não sei se os Srs. Deputados sabem do que estamos a falar quando falamos da natureza jurídica. Se calhar,
não sabem! É pena! Mas o Carnaval ainda está longe!
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Risos de Deputados do CDS-PP.
Achamos que, de facto, chega de brincar ao Carnaval, que deve ser entendido como uma coisa séria.
Todos sabemos que o Carnaval é interiorizado pelos portugueses como um feriado, o que tem levado as
pessoas — se calhar, até muitos dos Srs. Deputados — a planear com algum tempo uma saída com a família
nesse dia, tantas vezes até com reservas de estadas antecipadas que é preciso acautelar.
O calendário escolar está organizado no pressuposto do feriado de Carnaval. A GNR até prepara com
antecedência a Operação Carnaval. Municípios como Torres Vedras, Loulé, Sesimbra, Ovar, Canas de
Senhorim, Alcobaça ou Mealhada investem verbas assinaláveis para dinamizar as festividades do Carnaval. O
que nos parece é que não faz sentido que essas autarquias invistam tanto no Carnaval e fiquem de pés atados
e de coração nas mãos até às vésperas do Carnaval, à espera que o Governo se decida se é ou não feriado.
Isto é, as autarquias ficam à espera que o Governo dê o ámen a uma festa que até é pagã!
Portanto, o que se pretende é atribuir certeza e segurança às autarquias locais, mas também aos operadores
turísticos, que apostam no Carnaval como forma de dinamizar as economias locais.
O que Os Verdes pretendem é não perturbar as dinâmicas económicas e sociais que são criadas nessas
festividades ao nível local, mas também evitar situações caricatas e singulares, essas, sim, um verdadeiro
Carnaval, como as que assistimos com o Governo do PSD e do CDS, em que uma parte do País estava a
trabalhar e a outra parte estava parada. E a parte que trabalhou fê-lo a meio gás.
A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Bem lembrado!
O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — E fê-lo a meio gás porquê? Porque os CTT estavam fechados, os
bancos não chegaram a abrir, os transportes públicos tinham uma oferta equivalente a um feriado e grande parte
dos municípios, inclusivamente os do PSD e do CDS, deram tolerância de ponto nesse dia.
Portanto, achamos que é tempo de acabar com esta brincadeira e considerar a Terça-Feira de Carnaval
como um feriado obrigatório.
Para ficarmos com uma ideia da importância do Carnaval para as economias locais, deixo apenas um dado:
só o Carnaval de Torres Vedras gera um retorno de cerca de 10 milhões de euros nestas festividades. Estes
números não podem ser minimizados, sobretudo numa altura em que se impõe dinamizar a nossa economia.
Portanto, em vez das gargalhadas e dos sorrisos, seria bom que isto fosse encarado com bom senso.
Aplausos de Os Verdes, do BE e do PCP.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Para apresentar o projeto de lei do PAN, tem a palavra o Sr. Deputado
André Silva.
O Sr. André Silva (PAN): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O PAN propõe a consagração da Terça-
Feira de Carnaval como feriado obrigatório.
Previsto atualmente na legislação laboral como feriado facultativo, a realidade demonstra que este dia é
muitas vezes encarado como se de um feriado obrigatório se tratasse, motivo pelo qual uma parte bastante
significativa das empresas do setor privado adiciona este dia à lista de feriados obrigatórios e o Governo tem
concedido, salvo raras exceções, tolerância de ponto, pelo que entendemos que a presente medida visa
institucionalizar aquilo que na prática já se verifica.
Mais: o calendário escolar encontra-se também organizado no pressuposto de que a Terça-Feira de Carnaval
é considerada feriado, o que leva muitas famílias a aproveitarem esta data para agendar férias.
Numa altura em que os pais se veem submetidos a um ritmo alucinante, trabalhando todo o dia, com
exigências profissionais cada vez maiores, deixando pouco tempo e disponibilidade para estarem com os filhos,
consideramos de elevada importância incentivar e criar condições efetivas que permitam o aumento do número
de períodos de lazer em família, o que esta medida também possibilitará.
Além disso, a perceção dominante de que elevados níveis de produtividade apenas se conseguem com
elevadas cargas horárias tem sido cientificamente rejeitada. É uma prioridade, aceite por todos, de que
precisamos de mais tempo para a família e para viver, não meramente sobreviver, mas esta é uma visão que
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ainda não encontrou uma forma de se harmonizar com um modelo de sociedade sequestrado pelos mercados,
pela visão economicista do trabalho e pela mercantilização do tempo.
Acresce a todos os factos apresentados o de ser uma época festiva de grande importância no País, e são
festejos e manifestações culturais saudáveis, não violentas e comunitárias, como o Carnaval, que se devem
elevar, ao contrário de outras tradições anacrónicas, doentias e violentas que nada têm de positivo, como é o
caso das touradas.
Neste sentido e por razões várias, nomeadamente pelo reforço do tempo passado em família e pelos
impactos positivos para as economias locais, propomos que a Terça-Feira de Carnaval passe a constar da lista
de feriados obrigatórios.
Em suma, nesta sociedade cada vez mais abundante em bens e serviços, o que mais escasseia é o que
mais precisamos: de tempo para viver.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Para apresentar o projeto de resolução do PSD, tem a palavra o Sr.
Deputado Pedro Roque.
O Sr. Pedro Roque (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Com esta iniciativa, vem o PSD propor
à Assembleia da República que recomende ao Governo para, em sede da Comissão Permanente de
Concertação Social, promover uma efetiva negociação por forma a chegar a um acordo que estabeleça os
princípios orientadores para se definir em legislação específica quais os feriados obrigatórios a serem
observados na segunda-feira da semana subsequente, conforme estabelecido no n.º 3 do artigo 234.º do Código
do Trabalho.
Um feriado é um dia do ano especial em que, por lei, as atividades laborais normais são suspensas para
lembrar um evento ou uma tradição de relevância histórica, cultural ou religiosa.
Porém, se esta é a intenção tradicional dos feriados, nas sociedades ocidentais modernas eles servem
predominantemente uma importante função recreativa e de lazer. Podemos afirmar sem receio de erro que para
as pessoas, na prática, a maioria dos feriados não se destrinça de um qualquer fim de semana normal, no
sentido de conferir mais uma pausa laboral aproveitada salutarmente para o convívio familiar, a cultura, o
desporto, o turismo ou o lazer em geral.
Não se trata de pôr em causa a estabilidade do número de feriados obrigatórios em Portugal. Todavia, a
questão do impacto das pausas laborais na competitividade económica deve merecer-nos uma atenção
detalhada.
Foi, aliás, essa a intenção do legislador quando, em 2009, definiu claramente, no artigo 234.º, n.º 3 do Código
do Trabalho, que «mediante legislação específica, determinados feriados obrigatórios podem ser observados na
segunda-feira da semana subsequente».
A Sr.ª Maria das Mercês Soares (PSD): — Bem lembrado!
O Sr. Pedro Roque (PSD): — Importa que os intervenientes políticos, económicos e sociais tomem em linha
de conta os efeitos na competitividade das empresas no que diz respeito às quebras de produtividade que
ocorrem quando as datas dos feriados coincidem com os dias de terça, quarta ou quinta-feiras.
Existem exemplos internacionais onde a introdução de uma medida deste tipo permite ganhos para as
empresas e para os trabalhadores e respetivas famílias. Considera-se que a implementação desta prática
proporcionará um justo equilíbrio e um resultado virtuoso no que diz respeito ao correto planeamento anual da
agenda de atividades e pausas nas empresas, bem como promover e garantir os interesses das partes através
de ganhos de produtividade, por um lado, e da agregação dos dias de lazer, por outro. Evitar-se-ão, assim,
interrupções de produção e de atividade económica e existirão ganhos de eficiência das empresas, permitindo
igualmente, do lado do trabalhador, mais tempo livre contínuo com ganhos nas suas atividades de lazer.
Em nome da promoção do diálogo social, dever-se-á remeter esta questão à Comissão Permanente de
Concertação Social para que, no âmbito da negociação de um acordo, se possa definir com exatidão e acuidade
sobre esta matéria, tendo em conta os interesses das partes, por um lado, e do crescimento económico, por
outro.
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Sabemos já, todavia, que o PS anuncia que irá votar contra esta iniciativa. É uma prerrogativa sua,
naturalmente. Todavia, convirá recordar o seguinte ao PS: esta iniciativa resulta do disposto numa lei que data
de 2009, em que o Governo era socialista. Em maio de 2016, foi o Governo que levou a questão à concertação
social, mas deixou-a esquecida no fundo de uma gaveta.
Pede-se, pois, nesta matéria, coerência ao Partido Socialista.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Moura Soeiro,
do Bloco de Esquerda.
O Sr. José Moura Soeiro (BE): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em nome do Bloco de Esquerda, queria
dizer que o Carnaval é, obviamente, uma tradição — aliás, de liberdade e de sátira — que existe também em
Portugal, muito presente em alguns municípios e que se configura no facto de, por exemplo, estar inscrito no
calendário escolar, de os transportes nesse dia, regra geral, não funcionarem. Portanto, existe essa tradição,
como era tradição também, até 2012, o Governo, por despacho, reconhecer a sua existência.
Por isso, acompanhamos as iniciativas do PAN e de Os Verdes para que se consagre no Código do Trabalho
o feriado do Carnaval, para que as pessoas não tenham de ficar à espera até à última hora para saber se o
Governo vai ou não reconhecer esse dia por despacho e para não termos a situação caricata, como já aqui foi
dito, de meio País estar a trabalhar e outro meio a gozar um feriado, ainda por cima colocando dificuldades
concretas àqueles que trabalham em termos dos transportes, por exemplo.
Por isso, entendemos que reconhecer este feriado é um respeito pela tradição do Carnaval e é permitir que
os trabalhadores tenham também mais tempo para viver, num país em que se trabalha horas demais.
Sobre o projeto do PSD, quero fazer três comentários, que são, na verdade, também, três perguntas.
A primeira é esta: qual é a embirração obsessiva do PSD com as pontes? Qual é?! As pontes são boas. As
pontes não são uma oferta nem do Estado, nem das entidades empregadoras. Um trabalhador que faz ponte
goza um dia de férias seu para gozar aquela ponte. Aliás, férias que são um direito seu e um direito irrenunciável.
Portanto, não se percebe qual é o problema do PSD com as pontes.
Em segundo lugar, o PSD propõe mudar os feriados para a segunda-feira. Porquê? Quais? Neste ano, 2017,
o 25 de Abril calha numa terça-feira. Certamente não estarão a sugerir que se goze o 25 de Abril no dia 24 de
abril, por ser uma segunda-feira. Imagino que também não vão propor que a Sexta-Feira Santa passe a ser
gozada à segunda-feira santa, ou que o Domingo de Páscoa passe a ser a segunda-feira de Páscoa! Nada disto
faz sentido e não se percebe quais são os feriados que querem alterar.
Em terceiro lugar, a parte anedótica do projeto do PSD que é discutido hoje: o PSD diz, no seu projeto, que
quer que o assunto seja debatido na concertação social porque a valoriza muito. Valoriza muito a concertação
social? Srs. Deputados, sem comentários.
Aplausos do BE.
Protestos do PSD.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Para uma intervenção, tem a palavra, por parte do CDS-PP, o Sr.
Deputado António Carlos Monteiro.
O Sr. António Carlos Monteiro (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Discutimos hoje dois
projetos de lei, um de Os Verdes e o outro do PAN, para alterar o Código do Trabalho consagrando o Carnaval
como feriado nacional obrigatório.
O Carnaval é uma tradição importante em vários concelhos do País e uma realidade social, cultural e
económica com a sua relevância. É assim em concelhos como a Mealhada, Estarreja, Ovar, Torres Vedras,
também na Madeira, por exemplo — em vários pontos do País.
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A verdade também é que o Carnaval sempre se festejou dentro do atual quadro legal, que é suficiente. Umas
vezes festejou-se mais, outras menos. É verdade que em tempos excecionais, excecional e temporariamente
foi suspenso, bem como alguns feriados.
Protestos da Deputada do PCP Rita Rato e do Deputado de Os Verdes José Luís Ferreira.
Já não é assim e sabemos que este é um tempo em que talvez seja bom que tenhamos um pouco de
estabilidade e de previsibilidade para as famílias e para as empresas. Aliás, quando falamos em estabilidade, é
até um pouco irónico olhar para o projeto de Os Verdes porque não sei o que aconteceu, mas há três feriados
que desaparecem: o 5 de Outubro, o 1 de Novembro e o 1 de Dezembro.
O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — É verdade!
O Sr. António Carlos Monteiro (CDS-PP): — Enganaram-se? Esqueceram-se desses feriados? Para
consagrar o Carnaval eliminam três feriados?! Que grande trapalhada!
Protestos doDeputado de Os Verdes José Luís Ferreira.
Enfim, se calhar, os Srs. Deputados acham que isto é «Carnaval, ninguém leva a mal»! É uma trapalhada!
O Sr. João Oliveira (PCP): — Isto é uma anedota do CDS!
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Vocês tiram três feriados e a anedota é nossa?!
O Sr. António Carlos Monteiro (CDS-PP): — Para o CDS esta é uma matéria que não necessita neste
momento de alteração. Tivemos a reposição dos feriados que tinham sido suspensos e estamos, por isso, na
altura de ter alguma estabilidade nesta matéria. Qualquer alteração em relação aos feriados deve ser objeto de
concertação social, de conversa com os parceiros sociais, com a Igreja — até porque quando falamos em
feriados religiosos ela deve ser tida também em atenção.
Olhando para a proposta do PSD, que, conforme disse, tem em atenção a concertação social, embora haja
toda a vantagem em estudar outras soluções relativamente aos feriados, neste momento — e é um juízo de
oportunidade —, para o CDS, o fundamental é que empresas, trabalhadores e famílias tenham estabilidade e
previsibilidade.
É isso que é preciso neste momento em relação aos feriados.
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Rita Rato, do PCP.
A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Queria, em nome do PCP, saudar Os Verdes
pelo agendamento deste debate.
Não é a primeira vez que fazemos um debate na Assembleia da República sobre a importância do
reconhecimento como feriado obrigatório da Terça-Feira de Carnaval. Recordo-me bem da discussão que
fizemos aquando das alterações ao Código do Trabalho, promovidas pelo PSD e pelo CDS, que retiraram quatro
feriados e três dias de férias e que significaram uma semana de trabalho à borla para os patrões por parte dos
trabalhadores.
Portanto, ouvir agora o CDS falar de previsibilidade parece-nos normal. É até previsível que os partidos que
cortaram e roubaram feriados e tempos de lazer,…
O Sr. António Carlos Monteiro (CDS-PP): — Roubaram o quê?!
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Três feriados é que foram roubados por Os Verdes!
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A Sr.ª Rita Rato (PCP): — … venham agora dizer que são contra o reconhecimento de feriados. Isso também
nos parece muito previsível da parte do PSD e do CDS. E até digo mais, Srs. Deputados: como por estes tempos
o que vai faltando ao PSD é coerência, ainda bem que apresentaram essa proposta, porque, pelo menos, vamos
sabendo aquilo com que vamos contando.
Sr. Presidente e Srs. Deputados, o reconhecimento da Terça-Feira de Carnaval como feriado obrigatório é
de elementar justiça e de importância muito significativa para as comunidades em que esta celebração tem
raízes populares e históricas muito importantes, mas também para outras, onde importa garantir um quadro de
universalidade no reconhecimento deste direito.
Da parte do PCP, naturalmente que acompanhamos este objetivo, pelo que votaremos favoravelmente este
projeto de lei, do reconhecimento da Terça-Feira de Carnaval como um dia de feriado obrigatório.
Ainda mais, porque não deixa de ser curioso que a proposta do PSD venha propor uma recomendação,
quando podia apresentar esta matéria através de um projeto de lei, mas isso cabe ao PSD decidir. É que é
interessante perceber como é que o PSD dedica toda a criatividade que tem para impedir tempo de lazer aos
trabalhadores — é impressionante! Como é que garantir tempo de lazer e tempo de descanso, no século XXI,
continua a ser entendido pelo PSD e pelo CDS — e espero que não pelo PS, porque caso contrário não o
acompanharei — como um problema?!
Srs. Deputados, passados mais de 130 anos do primeiro 1.º de Maio, continua de uma grande atualidade a
luta pelo horário de trabalho e pelos tempos de lazer e de descanso. E o que não deixa de ser impressionante
é que, passados 130 anos, esta ainda seja uma das matérias fundamentais na ordem do dia.
Da parte do PCP, continuaremos a lutar por isso: por tempos de lazer e tempo de trabalho com direitos.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Soares, do
PS.
O Sr. Luís Soares (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Queria, em nome do Grupo Parlamentar
do Partido Socialista, referir que as propostas que aqui nos trazem o PAN e Os Verdes não são propostas novas,
como também não é nova a posição do Partido Socialista sobre esta matéria. Não é nova e, hoje, ao contrário
do que acontece com outros partidos, naturalmente que a manteremos.
Consideramos que esta é uma festividade importante, havendo concelhos no nosso País que lhe dão uma
relevância diferente de outros, e consideramos também que a confirmação da tolerância de ponto, como medida
que o Governo pode determinar, que a Administração Pública ao nível local pode determinar e que as próprias
empresas podem determinar, é também uma medida suficiente para valorizar esta festividade.
Esta proposta, este compromisso não era um compromisso do Partido Socialista. Aliás, em matéria de
feriados, o Partido Socialista já fez o que lhe competia, já pôs em prática aquilo que era o seu compromisso,
recuperando quatro feriados que o PSD tinha retirado aos portugueses.
Relativamente à proposta do PSD, queria dizer que saudamos os considerandos iniciais de quem aqui
recupera a evocação filosófica dos feriados como momentos para comemorar datas históricas. É que não foi
assim com o 5 de Outubro, não foi assim com o 1.º de Dezembro e não foi assim com os feriados religiosos.
Esta evocação filosófica dos feriados deve merecer a nossa saudação.
Mas quero dizer que, para além destes considerandos, há na mesma o preconceito ideológico. Aquilo que o
Sr. Deputado Pedro Roque aqui nos trouxe é a proposta que visa eliminar as pontes. E isso tem um preconceito
ideológico porque os senhores entendem que os feriados e as pontes quebram a produtividade. Dizem que
eliminar pode trazer um impacto positivo na economia. Dizem que os feriados são um custo. Quero ver se ainda
teremos aqui o PSD a defender o fim dos fins de semana, a defender o fim das férias, ou a defender o fim dos
direitos básicos dos trabalhadores!
Aplausos do PS e do BE.
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É que essa ideia peregrina de que trabalhar mais tempo corresponde a produzir mais é uma ideia perigosa
e errada.
Por isso, temos muita estranheza, Sr. Deputado, relativamente à proposta que aqui nos trazem. Estranheza,
em primeiro lugar, pela forma, porque o Sr. Deputado podia ter escolhido outra forma que não a de um projeto
de resolução. Como é que os Srs. Deputados querem que esta Câmara aprove uma recomendação ao Governo,
quando o senhor aqui referiu, e muito bem, que foi o Governo, através do Ministro do Trabalho, que deu o
pontapé de saída na discussão desta matéria?! Como é que os senhores querem que se recomende ao Governo,
se é o Governo que está na liderança da discussão deste tema?!
Mas estranheza também pela questão substantiva, Sr. Deputado. É que não sei qual foi a diferença
substancial na orgânica do PSD entre 2012 e 2016 que permitiu também provocar uma mudança substancial no
seu pensamento político. É que, em 2012, o PSD não só não defendia a eliminação das pontes como, no acordo
de concertação social que promoveu e assinou, dizia e favorecia precisamente a existência dessas pontes,
concedendo aos empregadores a possibilidade de encerrar a empresa e tendo, nesse caso, os trabalhadores a
obrigação de gozar um dia de férias.
Portanto, Sr. Deputado, é preciso perceber o que é que mudou entre 2012 e 2016,…
A Sr.ª Maria das Mercês Soares (PSD): — Mudou mesmo muito!
O Sr. Luís Soares (PS): — … ou perceber se é só o Sr. Deputado que defende a eliminação das pontes.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Peço-lhe que conclua, Sr. Deputado.
O Sr. Luís Soares (PS): — Vou concluir, Sr. Presidente.
Nós percebemos muito bem a estratégia do PSD. A estratégia do PSD é a estratégia de alguém que
abandonou a sua identidade, abandonou os interesses dos eleitores e apenas quer causar conflitualidade na
concertação social.
Mas quero dizer-lhe, Sr. Deputado, que, com isso, o Partido Socialista pode bem.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — No tempo de que ainda dispõe, tem a palavra a Sr.ª Deputada Rita Rato,
do PCP.
A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Depois de ouvir esta intervenção do PS, fica claro
que o PS não vai acompanhar a iniciativa de Os Verdes. E o que temos a dizer é que lamentamos que se
desperdice uma oportunidade para reconquistar um feriado obrigatório nacional, porque entendemos que seria
importante reconhecer como feriado obrigatório, que não o é ainda, a Terça-Feira de Carnaval.
Portanto, da parte do PCP, continuaremos a lutar por isso, porque entendemos que os tempos de lazer são
um direito fundamental dos trabalhadores. E era importante que, se, de facto, o PSD e o CDS estão tão
incomodados com esta intervenção do PS, pudessem dar um sinal reconhecendo a importância de consagrar a
Terça-Feira de Carnaval como feriado obrigatório. Mas isso não farão, e nós sabemos porquê. Porque não estão
do lado dos trabalhadores, nem dos direitos ao lazer e ao descanso.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Roque, do
PSD.
O Sr. Pedro Roque (PSD): — Sr. Presidente, parece que nem o Bloco de Esquerda nem o PCP leram o
nosso projeto de resolução. É que aqui não se trata das pontes mas, sim, de os feriados calharem no meio da
semana. E já que falamos em trabalhadores, em nome do interesse dos trabalhadores, há todo o interesse em
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que eles sejam colados e que haja três dias de pausa no fim de semana. Isso é que é defender o interesse dos
trabalhadores.
O Sr. José Moura Soeiro (BE): — É impedi-los de fazer pontes!
O Sr. Pedro Roque (PSD): — Quais os feriados? Nós aqui não os definimos. Quem tem os interesses
económicos e sociais que os defina à mesa da concertação. Portanto, estranho muito que não tenham entendido.
Quanto ao Partido Socialista, disse bem, Sr. Deputado, este tema já foi suscitado. Agora, onde é que está o
debate? O Sr. Ministro Vieira da Silva levantou a questão, mas não lhe deu sequência.
Gostava de recordar o que refere o jornal Público sobre uma entrevista dada pelo Ministro à TSF,
precisamente no dia 25 de maio de 2016: «O tutelar da pasta (…) sublinha que esta é uma discussão que deve
ser feita com base num debate em sede de concertação social. ‘Esse aspeto tem de ser discutido, obviamente,
com os parceiros sociais e, a poder avançar-se nesse caminho, a decisão de o fazer ou não deve ser muito
deixada à negociação coletiva, porque essa solução pode ser muito interessante para alguns sectores e menos
interessante para outros’ (…).
Além disso, o Ministro alerta que nem todos os feriados são suscetíveis a essa mudança. ‘Há alguns que,
pela sua natureza, como os religiosos, ou até alguns civis — como o 1.º de Maio, Dia do Trabalhador —,
dificilmente seriam considerados noutras datas’, exemplifica.»
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Peço-lhe que conclua, Sr. Deputado.
O Sr. Pedro Roque (PSD): — Portanto, os senhores foram os pioneiros, mas não deram sequência a esta
matéria.
Assim sendo, apelo a que sejam consequentes e que votem favoravelmente o nosso projeto de resolução.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Para concluir este debate, tem a palavra o Sr. Deputado José Luís
Ferreira, de Os Verdes.
O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não foram Os Verdes, Sr.
Deputado António Carlos Monteiro, que retiraram os feriados aos portugueses;…
O Sr. António Carlos Monteiro (CDS-PP): — Foi a sua proposta!
O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — … foi o Governo que o Sr. Deputado apoiou, o Governo do PSD e
do CDS. Se o Sr. Deputado leu mal,…
O Sr. António Carlos Monteiro (CDS-PP): — Não li mal, não!
O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — … ou não leu a data da entrada do diploma, que é 15 de novembro
de 2015, não queira com isso atribuir culpas a Os Verdes. Portanto, leia melhor o projeto e veja qual é a data
de entrada.
Queria ainda dizer o seguinte: a preocupação de Os Verdes foi com o lazer das pessoas, com as economias
locais e com a economia. Outros não, acharam até graça.
Depois, pelos vistos, o que vai acontecer é que os serviços públicos, nomeadamente os centros de saúde,
os hospitais ou os tribunais, vão ter de ficar à espera até às vésperas do Carnaval para marcar diligências para
esse dia porque não sabem se é feriado ou não.
E, já agora, faria o desafio ao PS, ao PSD e ao CDS de explicarem aos Presidentes de Câmara de Torres
Vedras, de Loulé, de Sesimbra, de Ovar, de Canas de Senhorim, de Alcobaça ou da Mealhada porque é que
vão ter de ficar «com o coração nas mãos» até às vésperas do Carnaval à espera que o Governo decida ou não
atribuir o feriado nesse dia.
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Uma última nota sobre o projeto de lei do PSD. Srs. Deputados do PSD, não estranhem que, durante a
campanha eleitoral, os eleitores lhes perguntem se são candidatos à Assembleia da República ou se são
candidatos a membros da concertação social.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Srs. Deputados, está concluída a discussão, na generalidade, dos
projetos de lei n.os 21/XIII (1.ª) e 369/XIII (2.ª) e do projeto de resolução n.º 604/XIII (2.ª) e, com isto, a ordem do
dia de hoje.
Tem a palavra a Sr.ª Secretária Emília Santos para dar conta de diplomas que, entretanto, deram entrada na
Mesa.
A Sr.ª Secretária (Emília Santos): — Sr. Presidente e Srs. Deputados, deram entrada na Mesa, e foram
admitidas, as seguintes iniciativas legislativas: projeto de resolução n.º 618/XIII (2.ª) — Recomenda ao Governo
a criação de mecanismos que permitam a simplificação do procedimento de reembolso do subsídio social de
mobilidade (PS), que baixa à 6.ª Comissão; apreciações parlamentares n.os 29/XIII (2.ª) (BE) e 30/XIII (2.ª) (PCP)
— Decreto-Lei n.º 11-A/2017, de 17 de janeiro, que cria uma medida excecional de apoio ao emprego através
da redução da taxa contributiva a cargo da entidade empregadora.
Deram ainda entrada na Mesa, e foram admitidos, a proposta de lei n.º 51/XIII (2.ª) — Altera o regime de
congelamento e de perda dos instrumentos e produtos do crime na União Europeia, transpondo a Diretiva n.º
2014/42/EU, e o projeto de deliberação n.º 13/XIII (2.ª) — Terceira alteração à Deliberação n.º 1-PL/2016, de 19
de janeiro, alterada pela Deliberação n.º 3-PL/2016, de 22 de março, e pela Deliberação n.º 5-PL/2016, de 10
de maio (Composição das delegações às organizações parlamentares internacionais) (Presidente da AR).
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Srs. Deputados, cumpre-me ainda anunciar a ordem do dia para a sessão
plenária de amanhã, quinta-feira, que terá lugar às 15 horas: do primeiro ponto consta o debate com o Ministro
da Saúde, ao abrigo do artigo 225.º do Regimento. Chamo a atenção para a especificidade da regulação dos
tempos previstos no Regimento para este tipo específico de debate.
Segue-se, no segundo ponto, a apreciação da petição n.º 141/XIII (1.ª) — Solicitam mais rigor, transparência
e objetividade na ciência que recorre ao uso de modelos animais na investigação, maximizando o bem-estar
animal e o retorno do investimento público (Gonçalo Faria da Silva e outros), juntamente, na generalidade, com
o projeto de lei n.º 372/XIII (2.ª) — Introduz normas mais rigorosas no que diz respeito à utilização de animais
para fins de investigação científica (PAN) e com os projetos de resolução n.os 612/XIII (2.ª) — Pela progressiva
redução e eliminação do uso de animais para fins científicos (Os Verdes), 614/XIII (2.ª) — Recomenda ao
Governo a implementação de medidas no âmbito da utilização de animais em investigação científica (PCP),
615/XIII (2.ª) — Medidas para a proteção de animais para fins experimentais e outros fins científicos (BE) e
616/XIII (2.ª) — Recomenda ao Governo a alocação de uma percentagem dos fundos de inovação e
desenvolvimento (I&D) da despesa pública distribuídos pela Fundação para a Ciência e Tecnologia (FCT) em
métodos não animais (PAN).
Por fim, haverá votações regimentais.
Está encerrada a sessão.
Eram 18 horas e 6 minutos.
Presenças e faltas dos Deputados à reunião plenária.
A DIVISÃO DE REDAÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL.