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Sexta-feira, 15 de junho de 2018 I Série — Número 94
XIII LEGISLATURA 3.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2017-2018)
REUNIÃOPLENÁRIADE14DEJUNHODE 2018
Presidente: Ex.mo Sr. Jorge Lacão Costa
Secretários: Ex.mos Srs. Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco Idália Maria Marques Salvador Serrão António Carlos Bivar Branco de Penha Monteiro Sandra Maria Pereira Pontedeira
S U M Á R I O
O Presidente (Jorge Lacão) declarou aberta a sessão às
15 horas e 5 minutos. Deu-se conta da entrada na Mesa da proposta de lei n.º
137/XIII (3.ª), dos projetos de lei n.os 913 a 919/XIII (3.ª), dos projetos de resolução n.os 1686 a 1704/XIII (3.ª) e da retirada, pelo PCP, do seu projeto de resolução n.º 411/XIII (1.ª).
A abrir o debate da interpelação ao Governo n.º 20/XIII (3.ª) — Sobre justiça (PSD), usaram da palavra o Deputado José Silvano (PSD) e a Ministra da Justiça (Francisca Van Dunem).
Durante o debate, intervieram, a diverso título, além
daqueles oradores, os Deputados Filipe Neto Brandão (PS), José Manuel Pureza (BE), Sara Madruga da Costa (PSD), Susana Amador (PS), Telmo Correia (CDS-PP), António Filipe (PCP), José Luís Ferreira (Os Verdes), Rui Cruz (PSD), Paulo Sá (PCP), Emília Cerqueira e Sandra Pereira (PSD), Vânia Dias da Silva (CDS-PP) e Fernando Anastácio (PS).
A encerrar o debate, proferiram intervenções o Deputado Carlos Peixoto (PSD) e a Ministra da Justiça.
O Presidente (Jorge Lacão) encerrou a sessão eram 17 horas e 32 minutos.
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O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Sr.as e Srs. Deputados, vamos dar início aos nossos trabalhos.
Eram 15 horas e 5 minutos.
Como sabem, a nossa ordem do dia de hoje compõe-se de um único ponto, a interpelação ao Governo n.º
20/XIII (3.ª) — Sobre justiça, da iniciativa do PSD.
Entretanto, peço aos Srs. Agentes da autoridade o favor de determinarem a abertura das galerias e ao Sr.
Secretário Deputado Duarte Pacheco o favor dar conta à Câmara das iniciativas legislativas que deram entrada
na Mesa.
Tem a palavra.
O Sr. Secretário (Duarte Pacheco): — Sr. Presidente e Sr. as e Srs. Deputados, deram entrada na Mesa, e
foram admitidas, as seguintes iniciativas legislativas: proposta de lei n.º 137/XIII (3.ª) — Regula a transferência,
pelas transportadoras aéreas, dos dados dos registos de identificação dos passageiros, bem como o tratamento
desses dados, transpondo a Diretiva (UE) 2016/681, que baixa à 1.ª Comissão, e projetos de lei n.os 913/XIII
(3.ª) — Altera o Decreto-Lei n.º 11/2008, de 17 de janeiro, que aprova o Regime de Execução do Acolhimento
Familiar (PSD), que baixa à 10.ª Comissão, 914/XIII (3.ª) — Nova lei de bases da saúde (BE), que baixa à 9.ª
Comissão, 915/XIII (3.ª) — Impede o financiamento público aos espetáculos tauromáquicos (Os Verdes), que
baixa à 12.ª Comissão, 916/XIII (3.ª) — Remove as penalizações aplicadas a trabalhadores que já tenham
acedido à pensão antecipada (Os Verdes), que baixa à 10.ª Comissão, 917/XIII (3.ª) — Procede à reposição do
regime de férias na função pública, consagrando o direito a 25 dias úteis de férias e a majorações em função da
idade (Os Verdes), que baixa à 10.ª Comissão, 918/XIII (3.ª) — Determina a admissibilidade de alimentação de
animais errantes (PAN), que baixa à 7.ª Comissão, em conexão com a 11.ª Comissão, e 919/XIII (3.ª) — Altera
o Código do IVA, com o intuito de isentar deste imposto os serviços de explicações e apoio escolar prestados
pelos centros de estudo (CDS-PP), que baixa à 6.ª Comissão.
Deram ainda entrada na Mesa os projetos de resolução n.os 1686/XIII (3.ª) — Recomenda ao Governo um
conjunto de medidas de apoio extraordinário em resultado da forte intempérie ocorrida na freguesia do Pinhão,
na União de Freguesias de Casal de Loivos, Vale de Mendiz e Vilarinho de Cotas, na freguesia de Sanfins do
Douro e na freguesia de Vilar de Maçada, no concelho de Alijó (PSD), que baixa à 7.ª Comissão, 1687/XIII (3.ª)
— Recomenda ao Governo que realize, com urgência, obras de requalificação na Escola Secundária do Lumiar,
em Lisboa (CDS-PP), que baixa à 8.ª Comissão, 1688/XIII (3.ª) — Recomenda ao Governo que programe obras
de requalificação da Escola Básica 2, 3 Professor Delfim Santos, em Lisboa (CDS-PP), que baixa à 8.ª
Comissão, 1689/XIII (3.ª) — Recomenda ao Governo que proceda com urgência às obras necessárias à
requalificação do Posto Territorial de Oliveira do Bairro da GNR (CDS-PP), que baixa à 1.ª Comissão, 1690/XIII
(3.ª) — Recomenda ao Governo que inclua a Escola Secundária de Esmoriz na lista nacional de escolas a
requalificar com fundos do Portugal 2020 (CDS-PP), que baixa à 8.ª Comissão, 1691/XIII (3.ª) — Recomenda
ao Governo a implementação de medidas que melhorem a qualidade de vida da população de Fortes, no
concelho de Ferreira do Alentejo, eliminando a poluição causada pela empresa de extração de bagaço de
azeitona (PCP), que baixa à 11.ª Comissão, 1692/XIII (3.ª) — Linha de financiamento para instituições de ensino
superior trabalharem em cooperação com o sistema de promoção e proteção de crianças e jovens em risco
(PSD), que baixa à 8.ª Comissão, em conexão com a 1.ª Comissão, 1693/XIII (3.ª) — Consagra o dia 20 de
novembro como Dia Nacional das Famílias de Acolhimento (PSD), que baixa à 10.ª Comissão, 1694/XIII (3.ª) —
Recomenda ao Governo que proceda à regularização das situações decorrentes do processo de descolonização
(CDS-PP), que baixa à 5.ª Comissão, em conexão com a 2.ª Comissão, 1695/XIII (3.ª) — Recomenda ao
Governo que avalie a possibilidade de criação de mecanismos de incentivo à implementação de projetos de
astroturismo nas regiões do interior de Portugal (CDS-PP), que baixa à 6.ª Comissão, em conexão com a 11.ª
Comissão, 1696/XIII (3.ª) — Alteração da data da deslocação do Presidente da República a Moscovo, Federação
Russa (Presidente da AR), 1697/XIII (3.ª) — Requalificação urgente da Escola Secundária do Lumiar, no
concelho de Lisboa (Os Verdes), que baixa à 8.ª Comissão, 1698/XIII (3.ª) — Recomenda ao Governo que
desencadeie as ações necessárias para a construção do hospital central do Algarve (BE), que baixa à 9.ª
Comissão, 1699/XIII (3.ª) — Recomenda ao Governo que promova uma efetiva redução, reciclagem e
reutilização de resíduos de embalagens (CDS-PP), que baixa à 11.ª Comissão, 1700/XIII (3.ª) — Recomenda
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ao Governo que assegure a gestão dos equipamentos sociais da União das Freguesias de Cedofeita, Santo
Ildefonso, Sé, Miragaia, São Nicolau e Vitória e garanta o vínculo público dos respetivos trabalhadores (PCP),
que baixa à 10.ª Comissão, 1701/XIII (3.ª) — Recomenda o reforço do investimento no Hospital São João (Porto)
(PCP), que baixa à 9.ª Comissão, 1702/XIII (3.ª) — Recomenda ao Governo que desbloqueie a construção da
nova ala pediátrica do Hospital São João (Porto) (PCP), que baixa à 9.ª Comissão, 1703/XIII (3.ª) — Propõe a
redução imediata do ISP e a sua adequação face ao aumento do preço do petróleo (PCP), 1704/XIII (3.ª) —
Recomenda ao Governo que publique um relatório anual sobre a situação das refeições escolares nas escolas
públicas (CDS-PP).
Informo, ainda, que o Grupo Parlamentar do PCP pediu a retirada do projeto de resolução n.º 411/XIII (3.ª)
— Recomenda a contratação de vigilantes da natureza e a valorização da carreira, cessando a indefinição
existente quanto ao seu futuro.
Em termos de expediente é tudo, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Srs. Deputados, apelo a que façamos melhores condições no Hemiciclo
para podermos ouvir os oradores.
Pausa.
Vamos dar início à ordem do dia, com a interpelação ao Governo n.º 20/XIII (3.ª) — Sobre justiça, da iniciativa
do PSD.
Na fase de abertura da interpelação, tem a palavra o Sr. Deputado José Silvano.
O Sr. José Silvano (PSD): — Sr. Presidente da Assembleia da República, Sr.ª Ministra da Justiça, Sr.as e
Srs. Deputados: O PSD agendou esta interpelação ao Governo por assumir a reforma da justiça como uma
efetiva prioridade para o País. Nós queremos e o País precisa de uma verdadeira reforma da justiça,
assegurando sempre a sua independência e autonomia como garantes dos direitos, liberdades e garantias de
todos e de cada cidadão.
A justiça é um pilar essencial da nossa democracia e uma alavanca fundamental para a nossa economia.
Portugal precisa de uma justiça célere e eficiente que esteja ao serviço dos cidadãos e das empresas.
Infelizmente, a situação atual que se vive nesta área de soberania está longe de satisfazer o desejável,
assistindo-se a um descontentamento por parte da generalidade das profissões judiciárias e dos portugueses
em geral. A justiça é uma área em que Portugal tem vindo a acumular deficiências por força de um Estado que
não tem estado à altura das necessidades do País.
A justiça tem muitas entropias: são os magistrados — judiciais e do Ministério Público —, os advogados, os
investigadores criminais, os guardas prisionais, os oficiais de justiça, os oficiais dos registos e notariado, todos
contestam nuns casos a ação, noutros a omissão da Sr.ª Ministra da Justiça.
Assiste-se a um desapontamento generalizado com um clima de crispação como há muito não se via. Todos
os dias se anunciam contestações, muitas delas com marcação de greves e outras formas de luta de todos
conhecidas.
Qual tem sido a resposta da Sr.ª Ministra? Muitos anúncios e medidas em matérias mais fáceis,
particularmente no domínio do plano da Justiça mais Próxima e do Simplex na área da justiça, como Nascer
Cidadão, Registo Criminal Online, certidão online permanente para empresas e pessoas coletivas, Certidão
Judicial Eletrónica, envelopagem automática em vários tribunais, novo portal da Justiça, criação de grupos de
trabalho para estudar os problemas. Cada problema justifica um grupo de trabalho.
Com efeito, a Sr.ª Ministra é perita na criação de grupos de trabalho, já que os criou para tudo, desde o
Estatuto dos Magistrados e do Estatuto do Maior Acompanhado à avaliação do Regulamento da CPAS (Caixa
de Previdência dos Advogados e Solicitadores), passando pelo apoio judiciário, pelas custas processuais até à
reforma administrativa e fiscal e aos inventários.
Ainda esta semana, na segunda-feira, foi publicada em Diário da República a constituição de mais um grupo
de trabalho, desta feita para proceder ao levantamento e caracterização das situações dos internados na Clínica
de Psiquiatria e de Saúde Mental de Santa Cruz do Bispo com vista a uma possível revisão da situação de
internado e a sua colocação em liberdade.
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Desde que tomou posse, a Sr.ª Ministra já constituiu mais de uma dezena de grupos de trabalho para analisar
as mais diversas matérias. A verdade, porém, é que o resultado destes grupos de trabalho tardam em aparecer,
arrastando-se os assuntos sem que se saiba quando e como serão resolvidos.
A Sr.ª Ministra da Justiça andou e prometeu aos magistrados judiciais do Ministério Público, bem como aos
funcionários judiciais, que teriam o seu estatuto em vigor em janeiro deste ano e a verdade é que já estamos
em meados do ano e até ao momento a única proposta que existe nesta Assembleia da República para
discussão, e que só foi apresentada em abril passado, é a do Estatuto dos Magistrados Judiciais.
A Sr.ª Ministra estava obrigada a cumprir as normas do Orçamento para este ano, que impunham a
publicação em Diário da República da revisão da lei orgânica e do estatuto da carreira dos conservadores,
notários e oficiais dos registos e do notariado até ao final do mês de janeiro e a verdade é que esse objetivo
está longe de ser cumprido.
A avaliação do Regulamento da CPAS foi anunciada pela Sr.ª Ministra em fevereiro de 2016 e mais de dois
anos depois continuamos praticamente na mesma, já que o Governo ainda não aprovou nenhuma alteração a
este regulamento.
Também há mais de dois anos que a Sr.ª Ministra prometeu rever o Código de Processo do Trabalho,
adaptando-o ao novo Código de Processo Civil e até ao momento nada foi feito nesta matéria.
A revisão do Estatuto do Pessoal da Polícia Judiciária tem vindo a arrastar-se há tempo demais. A prometida
plataforma de entendimento sobre a questão do horário de trabalho do corpo da Guarda Prisional está longe de
ser alcançada, o que cria constrangimentos ao normal funcionamento dos estabelecimentos prisionais.
O sistema prisional continua com graves problemas, sobretudo ao nível do estado das infraestruturas com
áreas muito degradadas e falta de condições condignas para os reclusos, sendo dramática a situação que se
vive em alguns estabelecimentos prisionais, como sejam os casos de Lisboa, de Leiria e de Setúbal.
A sobrelotação continua a ser uma realidade na maioria dos estabelecimentos prisionais. No caso do sistema
prisional, é notório a completa ausência de programação e, em grande medida, de investimento. A única forma
de resolver os problemas neste setor será programar no tempo devido, executar no tempo devido, na medida
das disponibilidades orçamentais do País, e não adiar o investimento durante três anos para o executar à pressa
no último ano.
Sr.ª Ministra, denunciamos os problemas, mas também nos congratulamos com os resultados obtidos em
matéria de pendências e de simplificação processual com a redução do número de processos pendentes, com
reflexos positivos no funcionamento dos tribunais cível, criminal, laboral, administrativo e fiscal, bem como na
ação executiva.
Estes resultados são mérito da Sr.ª Ministra, mas também do trabalho empenhado e abnegado dos agentes
da justiça e, no essencial, também são resultado da reforma do Código de Processo Civil e da reorganização
judiciária, medidas do anterior Governo que introduziram medidas de simplificação que também contribuíram
para este resultado.
Importa também referir as reformas levadas a cabo pelo anterior Governo, nomeadamente na ação executiva,
a aprovação do novo Regime Geral do Processo Tutelar Cível ou a reforma do Código da Insolvência e
Recuperação de Empresas.
Queremos que este bom desempenho nas estatísticas do judiciário continue a afirmar-se e que seja replicado
em todas as áreas do sistema da justiça para o que é essencial a concretização de uma verdadeira reforma da
justiça.
Um primeiro contributo para se caminhar nesse sentido já foi dado com o consenso alcançado — e com o
alto patrocínio do Presidente da República que, na abertura do ano judicial de 2016, lançou um apelo nesse
sentido — entre a Associação Sindical dos Juízes Portugueses, a Ordem dos Advogados, a Ordem dos
Solicitadores e dos Agentes de Execução, o Sindicato dos Funcionários Judiciais e o Sindicato dos Magistrados
do Ministério Público, que apresentaram, em janeiro passado, os acordos para o sistema da justiça.
Estes acordos, fruto do trabalho de quase um ano e meio, incidem sobre quatro áreas fundamentais — a
organização judiciária, a justiça económica, o acesso ao direito e a criminalidade económica — e propõem um
conjunto de 89 medidas concretas.
O PSD valoriza muito estes acordos, mas, infelizmente, eles não são suficientes para a concretização da tão
desejada, quanto necessária, reforma da justiça.
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Na verdade, nem os principais partidos políticos nem o Governo deram sequência a estes acordos, o que só
demonstra que não pode haver reforma na justiça sem a colaboração de todos. Como tem sido reiteradamente
sublinhado pelo Presidente do PSD, a reforma da justiça, e passo a citar, «deve ser feita pelos partidos e agentes
da justiça como um todo. Nenhum Governo sozinho, nenhum partido sozinho, consegue uma reforma da justiça
a sério. Temos todos de unir vontades e, com sentido patriótico, fazer um esforço que contribua para essa
reforma».
A aposta do PSD é numa reforma transversal da justiça que procure dar resposta às matérias que mais
preocupam os portugueses e que envolva não só os operadores judiciários, mas também, e sobretudo, os
partidos políticos.
Há que dotar a justiça do muito que ela carece: maior celeridade, mais meios, melhor gestão, maior
programação dos investimentos, melhor qualidade legislativa, maior especialização, melhores conhecimentos
técnicos, mais recato no seu funcionamento, melhor cumprimento do segredo de justiça e maior eficácia no
combate à corrupção.
Termino com as palavras e com o trabalho que o Presidente do PSD anda a fazer todos os dias no terreno,
em reuniões com todos os operadores judiciários: «Estamos a efetuar um diagnóstico aprofundado que visa
contribuir para o desenvolvimento de caminhos seguros para uma reforma global da justiça, a qual deve ser feita
pelos partidos e agentes da justiça como um todo. Assim, o objetivo é equacionar as questões desde o mais
ínfimo pormenor até à revisão constitucional. Ninguém está aqui contra ninguém. Estamos é contra um sistema,
que não funciona, e a favor dos cidadãos. Vamos apresentar um documento, com propostas concretas, ainda
nesta Sessão Legislativa para ser debatido e até alterado por todos os que queiram fazer e que queiram aderir
a isto: partidos, cidadãos e agentes judiciários.».
Temos, por isso, de unir vontades e, com sentido de Estado e sentido patriótico, fazer um esforço que
contribua para essa reforma.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Ainda na fase de abertura da interpelação, tem a palavra a Sr.ª Ministra
da Justiça.
A Sr.ª Ministra da Justiça (Francisca Van Dunem): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Iniciou-se hoje
o VIII Congresso dos Advogados Portugueses em cuja abertura, no final da manhã, eu deveria ter participado,
mas o agendamento desta interpelação, na semana passada, inviabilizou a minha presença.
Por essa razão, peço que relevem aqui o facto de me dirigir a esse conclave de advogados e desejar os
melhores êxitos para o Congresso.
Aplausos do PS.
Uma publicação recente sobre políticas de justiça nos 43 anos de democracia portuguesa identifica quatro
fases distintas, sendo a última, com início em 2003, a de procura de resolução para o problema da morosidade,
das pendências e das dificuldades de gestão e liderança dos tribunais.
Este diagnóstico reuniu um consenso alargado, tanto mais que algumas das suas premissas serviram de
base aos acordos político-parlamentares para a reforma da justiça firmados em 2006 entre o Partido Socialista
e o Partido Social Democrata. Foram acordos com base nos quais se decidiu e se iniciou em 2008, em regime
experimental, a reorganização do território judiciário, a instituição de órgãos de gestão nas comarcas e bem
assim as alterações no processo executivo.
Dez anos se passaram, entretanto…
Sr. Presidente, vou pedir desculpa, mas há um ruído de fundo na Sala que está a perturbar-me.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Tem toda a razão, Sr.ª Ministra.
Srs. Deputados, como acabámos de constatar, é preciso que sejam criadas condições no Hemiciclo para que
a Sr.ª Ministra se faça ouvir.
Peço, portanto, a todos os Srs. Deputados o favor de cooperarem nesse objetivo.
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Pausa.
Faça favor de continuar, Sr.ª Ministra.
A Sr.ª Ministra da Justiça: — Muito obrigada, Sr. Presidente.
Dez anos se passaram, entretanto, e, todavia, encontramo-nos hoje e aqui a discutir os mesmos temas de
fundo, ainda que com diferenças na forma de abordagem. Podemos querer dizer que nada mudou, mas mudou,
sim, Sr.as e Srs. Deputados!
O criticismo em relação ao sistema judiciário centra-se em duas dimensões essenciais: a tempestividade e a
aparência de desigualdade. Mas, se sairmos do domínio das perceções e nos reconduzirmos aos factos, temos
de assumir, sem preconceitos, que a realidade efetivamente está a mudar.
No passado mês de maio, foram publicadas as estatísticas da justiça relativas ao quarto, e último, trimestre
de 2017 e elas confirmam uma trajetória consistentemente descendente das pendências processuais, que
passaram de 1 milhão e 300 mil, no quarto trimestre de 2015, para 983 000, no quarto trimestre de 2017, o que
traduz uma redução global de mais de 300 000 processos e uma descida acumulada de 25 pontos percentuais.
Aplausos do PS.
Esse sentido descendente observa-se na generalidade da jurisdição cível, na área criminal, na área laboral,
na jurisdição tutelar e, ainda que em grau menos acentuado, também na área administrativa e tributária.
Nesta última área, a redução de pendências registada e as taxas de resolução processual, que são positivas,
constituindo, embora, resultados que, pensamos, 0são de aplaudir, justificam o sentido e a persistência da nossa
intervenção, que não se traduz em pequenas medidas mas no aumento de efetivos superior a 50%, em múltiplas
ações de melhoria de organização e tecnológica e também num pacote de medidas legislativas em que trabalhou
um grupo de trabalho, sim, porque trabalhamos com base no consenso e chamando a nós os agentes do setor.
É essa a nossa forma de trabalhar.
Na jurisdição comum, registámos, no final de 2017, a menor pendência dos últimos 10 anos, situando-nos,
pela primeira vez, abaixo de 1 milhão.
As taxas de resolução processual, que medem a capacidade do sistema para enfrentar a procura, mantêm-
se acima dos 120% e em algumas jurisdições são superiores a 170%.
Na área da justiça económica, em que se integram os segmentos executivo, insolvências e recuperação de
empresas e trabalho, a conjugação de medidas de natureza legislativa, tecnológica e organizativa, associadas
a um acompanhamento de grande proximidade, tem-nos permitido agir sobre os focos de congestionamento.
No segmento da ação executiva, o número de ações pendentes em 2017 baixou 12,5%, por comparação
com 2016. As insolvências, no mesmo período, conheceram uma redução de 11,6%.
Em matéria de justiça criminal, o declínio das pendências acompanha sensivelmente a redução das entradas
de inquéritos.
Na justiça laboral, em que a resposta média já era aceitável, as alterações que estamos a introduzir no Código
de Processo do Trabalho — que está pronto, Sr. Deputado! —, eliminando as disrupções que persistem,
assegurará tempos ainda mais curtos.
Ainda em matéria criminal, na fase de julgamento, as pendências processuais passaram de 61 000, em 2015,
para 46 000, no quarto trimestre de 2017, o que representa uma redução na ordem dos 23%. Esta pendência é
também a mais baixa dos últimos 10 anos.
Aplausos do PS.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Estes são os dados do País em que vivemos. São as estatísticas
oficiais da República Portuguesa, não são perceções!
A área criminal é, paradoxalmente, aquela em que resultados mais tempestivos se alcançam nos dois
segmentos mais numerosos, sobretudo ao nível da pequena e média criminalidade, mas é também aquela em
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que se perceciona o maior espaço de deceção cidadã relativamente à capacidade do Estado para reprimir de
forma igual os fenómenos de crime grave, em particular a denominada «criminalidade económico-financeira».
É aqui que se centra a aparência de um aparelho de justiça desigual. De uma justiça que não terá capacidade
para responder, eficaz e tempestivamente, aos fenómenos corruptivos.
Temos assistido a inúmeros pronunciamentos sobre o que fazer. Um debate sério em torno destas matérias
pressupõe análises fundadas em dados objetivos e um ambiente de serenidade, isento de pré-compreensões,
de receios e apartado de paixões.
O País merece-o.
A luta contra a corrupção não pode convocar apenas o sistema judiciário, ainda que este seja essencial tanto
no plano preventivo como no repressivo.
Um olhar sobre os Estados em que se verificam menores índices de corrupção revela-nos que o antídoto
contra a contaminação por fenómenos corruptivos resulta da combinação de três componentes: transparência,
responsabilização, confiança.
O sistema judiciário cumpre, em primeira linha, a função de responsabilização que induz confiança.
O Sr. Diretor do DCIAP (Departamento Central de Investigação e Ação Penal) afirmou recentemente que não
seria necessária mais legislação. Eu tenderia a concordar que uma leitura atenta dos instrumentos legislativos
disponíveis dispensaria grandes alterações, ainda que possa comportar aperfeiçoamentos.
A intervenção de profissionais, com conhecimento especializado em toda a cadeia do processo, do inquérito
ao julgamento, numa abordagem sistémica e a institucionalização da análise retrospetiva de casos como meio
de apuramento da validade dos métodos podem facilitar a responsabilização dos agentes em tempo útil,
concretizando, assim, a terceira componente do antídoto: a confiança.
O Governo tem-se empenhado ativamente no combate à corrupção em todas as suas dimensões. E fê-lo
reorganizando serviços para melhorar a qualidade, disponibilizando mais e melhor informação aos cidadãos,
determinando a atualização de planos de prevenção de riscos de corrupção, assegurando que a Inspeção-Geral
dos Serviços de Justiça inclui, nos seus planos anuais, ações direcionadas para segmentos de atividade mais
suscetíveis de permeabilidade a fenómenos corruptivos.
Deixo uma última nota sobre o sistema prisional e de reinserção. Apesar de todas as dificuldades, é inegável
o enorme esforço que tem sido feito na definição de uma estratégia de futuro e na melhoria das condições de
vida no interior do sistema.
Sr.as e Srs. Deputados, vou terminar, citando Max Webber: «A política consiste num esforço tenaz e
persistente de furar tábuas duras com paixão e sentido de proporção, ao mesmo tempo».
Estejamos todos à altura de tão nobre tarefa!
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Vamos passar à fase de debate propriamente dito.
Em primeiro lugar, estão inscritos dois Srs. Deputados para pedir esclarecimentos ao Sr. Deputado José
Silvano.
Como deseja responder, Sr. Deputado?
O Sr. José Silvano (PSD): — Responderei globalmente, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Sendo assim, tem a palavra, para pedir esclarecimentos, o Sr. Deputado
Filipe Neto Brandão, do PS.
O Sr. Filipe Neto Brandão (PS): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra, Sr.as e Sr. Secretários de Estado, Sr.
Deputado José Silvano, devo confessar, Sr. Deputado José Silvano, que tinha alguma expectativa relativamente
a este agendamento, a esta interpelação ao Governo, expectativa essa que, penso, terá sido completamente
gorada, na medida em que, tendo o PSD e o seu líder pré-anunciado um conjunto de medidas que iriam
apresentar, a sua intervenção, permita-me a franqueza, não passou de um conjunto de lugares-comuns e, nessa
medida, francamente dececionante.
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Mas também, devo dizer, a sua apreciação sobre o desempenho do sistema é, também ele próprio, falacioso,
porquanto, como aliás a Sr.ª Ministra referiu, nenhuma interpelação sobre a política de justiça poderia passar ao
lado do reconhecimento de que todos os indicadores de desempenho do sistema comparam bem com quaisquer
indicadores homólogos pretéritos.
A Sr.ª Ministra referiu, aliás — e tinha-o feito já há menos de uma semana —, que, por exemplo, às mais de
1 milhão de pendências herdadas no final do ano de 2015 se contrapõe, hoje, uma diminuição acumulada de
25%. E, Sr. Deputado, se não acredita em mim, se não acredita na Sr.ª Ministra — fica-lhe mal, mas admito! —
, terá, seguramente, de acreditar nas palavras do Sr. Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, quando, na
intervenção da Sessão Solene de Abertura do Ano Judicial, referiu, e cito, «Os Relatórios semestrais de todas
as comarcas que o Conselho Superior da Magistratura avaliou revelam, de modo estruturado e consistente,
bons, mesmo muito bons, resultados em todos os indicadores de desempenho: na taxa de resolução, na taxa
de recuperação, nos índices de descongestionamento e no tempo médio de agendamento e decisão.».
O Sr. Carlos César (PS): — Muito bem!
O Sr. Filipe Neto Brandão (PS): — Portanto, Sr. Deputado, constatando que são números francamente
positivos, queria saber se reconhece essa evolução positiva ou se milita entre aqueles que não compreenderão
nunca — e volto a citar o Sr. Presidente do Supremo Tribunal de Justiça — «a realidade contra o domínio das
perceções, que não mudam nunca, mesmo quando confrontadas com a evidência.».
Mas sintomática também — e registo que nada tenha referido sobre isso —, da natureza errática do
posicionamento do PSD nesta matéria, é a circunstância iniludível de que o desempenho positivo do sistema foi
acompanhado da reabertura dos tribunais judiciais que o PSD havia encerrado.
Refira-se, Sr. Deputado, que essa reabertura de tribunais não apenas deu corpo ao princípio da coesão e
solidariedade territoriais — não são meras palavras vãs, pois não apenas reforçou os juízos de proximidade e o
princípio da proximidade com a realização de julgamentos criminais, a que se juntará, brevemente, a realização
de ações cíveis de valor até 50 000 € —, como também não comprometeu o desempenho do sistema.
Mas há uma questão a que o PSD não pode fugir, pelo que o interpelo diretamente, Sr. Deputado: o PSD
votou contra a Lei n.º 52/2008 — aliás, o Sr. Deputado omitiu a sua referência, hoje —, com o argumento
extraordinário de que esta Lei não continha, no texto legal, uma norma que proibisse o encerramento de tribunais
— repito, o PSD votou contra, porque a Lei não proibia que se encerrassem tribunais — e disse que não se
bastava com a mera promessa do então Ministro Alberto Costa de não encerrar tribunais.
O Sr. João Oliveira (PCP): — O argumento não era mau. A prática é que o foi!
O Sr. Filipe Neto Brandão (PS): — Ora, a primeira coisa que o PSD fez quando se apanhou a governar foi
encerrar os tribunais que havia prometido nunca encerrar!
Aplausos do PS.
Pergunto-lhe, Sr. Deputado, se o PSD está arrependido e se garante que essa sua política estava errada.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Atenção ao tempo, Sr. Deputado.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Faça já um ato de contrição!
O Sr. Filipe Neto Brandão (PS): — E, já que falo de arrependimento, o Sr. Deputado não ignora que aquela
que é hoje uma das vice-presidentes do PSD — e presumo que o PSD não tenha como vice-presidentes pessoas
irresponsáveis! — referiu, pronunciando-se, exatamente, sobre a política de justiça do Governo do PSD, no final
de 2015, que estava arrependida de votar no PSD por causa das políticas de justiça.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Desarrependeu-se!
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O Sr. Filipe Neto Brandão (PS): — Ora, ao PSD, que veio aqui interpelar o Governo, a última pergunta que
lhe deixo é esta: também podemos contar com o arrependimento do PSD relativamente às suas políticas de
justiça ou o PSD acha que o que fez durante quatro anos deve continuar a ser feito?
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Também para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado José
Manuel Pureza, do Bloco de Esquerda.
O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Deputado José Silvano, na
verdade, o Grupo Parlamentar do PSD é, seguramente, o menos credível dos grupos parlamentares para vir
falar sobre justiça.
Lembro que o Governo do PSD colocou verdadeiramente a justiça em estado de Citius, Sr. Deputado.
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Muito bem!
O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Na verdade, ao pôr a justiça em «estado de Citius», o Governo do PSD
criou condições para agora não poder, com autoridade, vir falar-nos sobre propostas para a justiça, que, aliás,
não apresentou. Mas já lá vamos.
Diz o Sr. Deputado José Silvano: «Bom, agora todos contestam. Está uma onda de crispação como nunca
se viu!». Sr. Deputado, talvez o senhor não se lembre, mas queria recordar-lhe que foi precisamente durante
um governo em que o PSD foi responsável pela pasta da justiça que se criou o maior clima de rutura alguma
vez visto, com todos os atores relevantes, com todas as instituições do sistema judicial.
O Sr. Carlos Peixoto (PSD): — Deixe lá o passado!
O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Mas, enfim, já lá vai, dirá o Sr. Deputado. Esqueçamos isso!
Muito bem, mas lembro-lhe também que foi durante um governo em que o PSD teve a pasta da justiça que
se fizeram reformas que criaram o caos na justiça. Não volto a falar do «estado de Citius», mas volto a falar, por
exemplo, de reformas como a extraordinária reforma em matéria de inventários. Ó Sr. Deputado, vir falar desta
matéria é realmente extraordinário!
Dirá o Sr. Deputado José Silvano: «É o passado e nós temos de nos concentrar no presente». Duas notas a
esse respeito: primeiro, é um passado que conta, Sr. Deputado, porque é um passado que diz tudo sobre a
credibilidade do PSD para nos falar, a partir de agora, sobre justiça. Mas é mais: é um presente vazio, totalmente
vazio!
Devo dizer que ouvi com toda a atenção a intervenção do Sr. Deputado e estava à espera de uma proposta,
uma proposta que fosse! Uma! E o que é que o Sr. Deputado nos disse? Que o PSD pretende uma reforma
global da justiça!
Ó Sr. Deputado, eu gostava de perceber os contornos… Já nem falo numa reforma global, mas uma
reformazinha! Mas nada, rigorosamente nada!
E depois vem dizer-nos que vão apresentar, até ao fim da Sessão Legislativa, um documento com propostas
concretas. Ou seja, fazem uma interpelação ao Governo para dizer que qualquer dia são capazes de apresentar
propostas. E queixa-se o Sr. Deputado que o Governo tem muitos grupos de trabalho! Ó Sr. Deputado,
realmente, veio fazer-nos uma intervenção de puro entretenimento, sem qualquer proposta concreta. Creio que
não deixa de ser muito importante de referir isso.
Quais são, então, as propostas do PSD? Que propostas tem o PSD para o acesso à justiça? Isso é que
precisamos de saber. Que proposta tem para as custas judiciais? Que proposta tem para o acesso ao direito?
Que proposta tem para o apoio judiciário? Não sabemos e tememos o pior! Que proposta tem o PSD para
contrapor ao relatório que o Governo apresentou em matéria de programação sobre alterações no sistema
prisional? Ou em matéria do edificado? Ou de contratações? O PSD tem alguma coisa a dizer sobre isso?
Ficamos na expectativa.
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O PSD tem alguma proposta sobre funcionários, sobre a dotação do sistema judicial de funcionários com
capacidade para dar resposta? Não sabemos!
Tem alguma proposta para contrapor à situação da precarização do exercício da advocacia, quando tantos
advogados estão hoje numa situação de angústia extraordinária? Hoje, que se inicia o Congresso dos
Advogados, tem o PSD alguma coisa a dizer aos advogados quanto ao combate à precariedade no exercício da
advocacia? Não sabemos e a intervenção do Sr. Deputado nada nos disse! Gostaria que até ao fim deste debate
houvesse qualquer referência a isso.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Atenção ao tempo, Sr. Deputado.
O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Termino, Sr. Presidente, com a pergunta que queria fazer ao Sr.
Deputado José Silvano: para além do anúncio de propostas, que propostas concretas tem o PSD para
apresentar?
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado José Silvano.
O Sr. José Silvano (PSD): — Sr. Presidente, agradeço as perguntas levantadas pelos Srs. Deputados, mas
queria dizer-lhes que não sabia que ficavam tão incomodados por ouvirem palavras como «vontade»,
«resolução» e «acordos». Não sabia que ficavam tão incomodados com estas palavras iniciais.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. José Silvano (PSD): — Mas também não sabia que ficavam tão incomodados a ponto de irem buscar
declarações que uma vice-presidente do PSD fez há dois anos e perguntarem-me se eu tinha vergonha disso.
Não, não tenho, Sr. Deputado, porque isso não é comparável com os comportamentos de um ex-Primeiro-
Ministro vosso, do Ministro Manuel Pinho vosso e do atual Ministro Siza Vieira vosso. Não é comparável!
Garanto-lhes que não é comparável!
Aplausos do PSD.
Protestos do PS.
Quem levantou a questão foi o Sr. Deputado Filipe Neto Brandão.
Continuação de protestos do PS e contraprotestos do PSD.
Sr. Presidente, há algum desconto na contagem do tempo?
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Sr. Deputado, eu só não pedi para se fazer silêncio porque, neste caso,
as dificuldades vinham do meu lado direito do Hemiciclo.
Protestos do PSD.
Srs. Deputados, querem colaborar com o vosso colega Deputado para que ele possa continuar?
Pausa.
Queira continuar, Sr. Deputado.
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O Sr. José Silvano (PSD): — Respondendo às questões do Deputado Filipe Neto Brandão, ao contrário do
que disse, eu também reconheci o que o Governo fez bem feito, nomeadamente nas estatísticas que acabou de
enumerar. O que acrescentei foi outra coisa: esse resultado é da Sr. Ministra, mas não é só, é também do
trabalho dos agentes judiciários que estão no terreno e das medidas adotadas pelo anterior Governo, que fez
uma reforma da justiça nesta matéria. Foi esse conjunto que levou a estes resultados.
Em segundo lugar, faço-lhe esta pergunta direta: a reorganização judiciária previa ou não que, depois de um
determinado tempo, pudesse ser alterada? Quem é que diz ao Sr. Deputado que o PSD, decorrido o devido
tempo, não faria essas alterações? Quem?
Protestos do PS.
A reorganização judiciária previa ou não essas alterações? Por isso, nada garante que não pudéssemos
fazer essas alterações.
Por último, e ainda sobre esta matéria, quero dizer ao Deputado José Manuel Pureza que é evidente que
não trazemos hoje medidas concretas.
O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Isso é verdade!
O Sr. José Silvano (PSD): — Nós trazemos é vontade de fazer medidas concretas para a justiça que tenham
a aceitação de todos.
Pergunto-lhe: com as vossas intervenções, acham que os portugueses estão satisfeitos com o atual sistema
de justiça? Respondam a isto! Acham que os portugueses estão satisfeitos com o atual sistema de justiça? O
sistema de justiça precisa ou não de uma reforma? É ou não preciso o acordo de todos para que o sistema de
justiça fique implantado e se torne eficaz? Acho que sobre isto ninguém tem dúvidas. Basta a disponibilidade
deste princípio para todos, em conjunto, termos aceitado muito bem esta…
O Sr. João Oliveira (PCP): — Quem fez o debate em 2005 foram os senhores! Só têm de se queixar do
vosso acordo!
O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Qual é o conteúdo concreto?!
O Sr. José Silvano (PSD): — Nós queremos é que a justiça resolva os problemas dos portugueses, que
tenha confiança nos seus agentes e que os não divida.
Quanto à contestação, quero dizer-vos o seguinte: diziam que, numa época de crise, a contestação foi
fortíssima. É verdade! Mas pergunto: se numa época de crise ela foi tão expressiva, como é que numa altura
em que, pelos vistos, não há crise essa contestação continua na rua, com greves e com lutas? Como é que isso
é possível?!
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Srs. Deputados, passamos aos pedidos de esclarecimento dirigidos à
Sr.ª Ministra da Justiça.
A indicação que a Mesa tem é a de que, havendo 10 Srs. Deputados que se inscreveram para pedir
esclarecimentos, a Sr.ª Ministra responderá por grupos: primeiro, a três Srs. Deputados, depois também a três
Srs. Deputados e, por último, a quatro Srs. Deputados.
Com esta estrutura, começarei por dar a palavra, para pedir esclarecimentos, à Sr.ª Deputada Sara Madruga
da Costa, do PSD.
A Sr.ª Sara Madruga da Costa (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Sr. Secretários de Estado, Sr.as e Srs.
Deputados, Sr.ª Ministra, o acesso ao direito e à justiça tem um papel central nas democracias contemporâneas.
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Não pode haver democracia sem o respeito pela garantia dos direitos dos cidadãos e os cidadãos não
subsistem se o sistema jurídico e judicial não for de livre acesso e independente de classe social, sexo, raça,
etnia e religião de cada um.
Sr.ª Ministra, apesar de a nossa Constituição consagrar o direito de todos os cidadãos acederem à justiça,
há entropias no sistema que impedem um acesso universal à justiça e aos tribunais em Portugal. Falamos, por
um lado, do elevado preço das custas processuais e, por outro, das dificuldades de abrangência do apoio
judiciário aos cidadãos com carências económicas. Estes são dois dos entraves conhecidos e aceites por todos
há muito tempo que afastam a justiça da maioria das pessoas e a garantem apenas aos muito ricos e aos
indigentes.
Sr.ª Ministra, o acesso ao direito e à justiça constituem a pedra basilar do nosso edifício da justiça e, por isso,
tem de ser encarado como um todo. E é como um todo que o PSD está disponível, como aqui já foi dito, para
fazer a reforma da justiça, com o apoio de todos os partidos, do Governo e dos agentes da justiça. Mas, Sr.as e
Srs. Deputados, neste momento, quem tem de governar, quem tem de apresentar as suas propostas, de
apresentar as suas soluções e de explicar o que está a fazer é o Governo, não é o PSD.
Há muito tempo que estão reunidas as condições para uma avaliação séria, rigorosa e transparente, quer do
Regulamento das Custas Processuais, quer do acesso ao direito e dos honorários dos advogados oficiosos. Há
mais de um ano, Sr.ª Ministra, que aguardamos que o atual Governo proceda à reforma do sistema do acesso
ao direito e aos tribunais.
O PSD já apresentou uma iniciativa e está à espera que ela seja discutida, porque está pendente a
apresentação, pelo Governo, de uma proposta legislativa.
Sr.ª Ministra, as perguntas concretas que lhe queremos colocar são as seguintes: quando é que o atual
Governo apresentará a tão anunciada reforma do sistema de acesso ao direito? Quando é que o Governo
apresentará medidas concretas na área das custas processuais? Por que motivo a Sr.ª Ministra não conseguiu
cumprir com a sua palavra e incluir no Orçamento do Estado de 2018 as verbas necessárias para a revisão do
acesso ao direito e das custas processuais? Por que motivo, Sr.ª Ministra, o Governo não apresentou —
conforme foi anunciado por si em novembro de 2017 — uma proposta legislativa sobre esta matéria, a qual,
segundo as suas palavras, estaria em vigor no primeiro trimestre de 2018?
Estas são algumas das perguntas que se impõem e que se podem resumir, dado o consenso de todos os
partidos e operadores judiciários, a um «para quando, Sr.ª Ministra?».
Por fim, refiro algumas notas em relação à situação da Caixa de Previdência dos Advogados e Solicitadores
(CPAS). É de todos conhecida esta situação, muitos dos 35 000 advogados e solicitadores estão preocupados
com a sustentabilidade da Caixa de Previdência dos Advogados, estão contra os aumentos das contribuições
mensais ocorridos no início deste ano e contestam a inexistência de contrapartidas e de assistência em caso de
doença e de parentalidade.
Algumas notícias dão conta de um acordo entre o Ministério da Justiça e as respetivas ordens, pelo que, Sr.ª
Ministra, gostaríamos de lhe perguntar qual é o ponto de situação, neste momento, sobre esse eventual acordo
e quando tenciona o Governo concretizar as medidas acordadas.
Sr.ª Ministra, é altura de remover os obstáculos ao acesso ao direito e à justiça e de acabar com o «tudo ou
nada» que permite todo o acesso a alguns e torna a justiça inacessível a outros. É hora de reduzir as custas
processuais e de permitir o acesso a todos os beneficiários carenciados.
Sr.ª Ministra, em nome da democracia, é imperativo garantir a universalidade do acesso à justiça e aos
tribunais em Portugal, por uma justiça mais justa, mais célere e mais próxima dos cidadãos.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Para formular pedidos de esclarecimento, tem agora a palavra o Sr.
Deputado José Manuel Pureza.
O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra da Justiça, na sua intervenção afirmou-nos
que, em matéria de política de justiça, o tempo está a mudar e, para isso, apresentou um conjunto de indicadores
estatísticos que revelam uma determinada fotografia do universo da justiça.
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Sr.ª Ministra, queria mostrar-lhe uma outra fotografia, a qual se junta, provavelmente, àquela que aqui nos
trouxe.
Diz a Sr.ª Ministra: «O tempo está a mudar para melhor». Sr.ª Ministra, os funcionários judiciais não dizem
isso! As promoções na carreira continuam blindadas e a inserção justa — e quem diz a palavra «justa» é o
próprio Ministério da Justiça — do suplemento de 10% no salário continua por fazer. Não obstante toda a vontade
manifestada pelo Ministério da Justiça, esta matéria continua por mudar. O tempo, para os funcionários judiciais,
não está a mudar.
Diz a Sr.ª Ministra da Justiça: «O tempo está a mudar». Mas os requerentes de apoio judiciário não dizem
isso! Os requerentes de apoio judiciário dizem-nos que estão confrontados com demoras na resposta a
requerimentos de apoio judiciário que vão para lá dos oito meses. Sr.ª Ministra, esta situação mostra como, em
matéria de apoio judiciário, o tempo não está a mudar.
Diz a Sr.ª Ministra: «O tempo está a mudar». Mas os conservadores e os trabalhadores dos Registos e
Notariado não dizem isso! Justamente porque a norma orçamental que impõe o terminar do processo de revisão
do estatuto profissional e do respetivo estatuto remuneratório continua por cumprir, não obstante as sucessivas
afirmações — que só posso crer serem sinceras! — de vontade por parte do Ministério da Justiça. Não obstante
tudo isso, a verdade é que a situação permanece blindada e, portanto, para os conservadores e demais
trabalhadores dos Registos e Notariado, a verdade é que o tempo não está a mudar.
Diz a Sr.ª Ministra: «O tempo está a mudar». Mas os profissionais das carreiras de técnicos superiores de
reinserção social e de técnicos superiores de educação não dizem isso, porque o estímulo à sua motivação no
exercício de uma tão difícil dedicação profissional continua profundamente degradado. Portanto, para estes
profissionais o tempo não está a mudar!
Finalmente — e poderíamos continuar com muitos mais exemplos—, os advogados, sobretudo aqueles que
exercem em nome individual ou os mais jovens, não se reconhecem nessa afirmação de que o tempo está a
mudar. Ou melhor, se está a mudar é para pior, na exata medida em que há cada vez mais advogados e
advogadas confrontados com uma situação de angústia, tanto pelo exercício precário da sua profissão como
pela perspetiva de, eventualmente, não terem reforma ou de terem uma reforma muito abaixo daquilo que foram
os seus descontos para a Caixa de Previdência dos Advogados e Solicitadores.
Portanto, Sr.ª Ministra, a minha pergunta é esta: que garantias nos pode trazer de que estes cinco domínios
que referi vão ser objeto da sua atenção privilegiada e com que calendário poderemos contar para conseguirmos
acompanhar esse esforço, que é o esforço que realmente vale a pena para que, efetivamente, o tempo mude
para todo o sistema judicial?
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Também para pedidos de esclarecimento, tem a palavra a Sr.ª Deputada
Susana Amador.
A Sr.ª Susana Amador (PS): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra da Justiça, decorridos dois anos e meio de
governação do Partido Socialista, podemos dizer que Portugal está melhor porque o sistema de justiça está
melhor e com um desempenho positivo evidente, como foi aqui destacado no discurso da Sr.ª Ministra.
Portugal está melhor porque serve melhor os cidadãos, e é também para isso que a justiça serve. Isto, caros
Deputados e Deputadas, não é uma perceção, é antes uma convicção sustentada em dados, em estatísticas e
até em avaliações de instâncias exteriores, como o Painel de Avaliação da Justiça na União Europeia de 2018,
da Comissão Europeia.
Temos, assim, que saudar a Sr.ª Ministra pelo trabalho realizado no quadro do Programa do Governo, pelas
áreas críticas que identificou ao nível penal e pelas prioridades que estabeleceu para o sistema judiciário,
focando-as na aproximação das populações aos tribunais — reabrindo 20 tribunais — e, ao mesmo tempo,
devolvendo às populações, a mais de 882 000 pessoas, a presença do Estado no território e a função soberana
da justiça. E também se focou, e bem, na redução das pendências processuais, em toda a linha, em todas as
jurisdições, com menos 327 969 processos, uma redução acumulada de 25 pontos percentuais.
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Portanto, se isto não é mais justiça, melhor justiça e servir melhor os portugueses não sabemos o que o será!
O que sabemos é que esta é uma linha de continuidade, reconhecida pelos agentes do setor e por instâncias
nacionais e instâncias europeias.
Temos hoje, Sr.ª Ministra, uma justiça melhor porque houve mais investimento ao longo dos orçamentos do
Estado com este Governo, um orçamento do Ministério da Justiça que foi reforçado anualmente numa
percentagem média de 4%. Há uma justiça melhor porque também é mais simplificada, mais próxima e mais
eficiente. Desenvolvemos, neste período de dois anos e meio, uma agenda que visou a aproximação da justiça
aos cidadãos, reestabelecendo os sentimentos de confiança através da melhoria de gestão do sistema judicial,
da promoção do descongestionamento dos tribunais e através do plano de justiça mais próxima.
Sr.ª Ministra, neste plano de justiça mais próxima, em que houve quatro pilares e 120 medidas — a verdade
é que 66 já estão concluídas — pergunto-lhe: da estratégia definida no início da Legislatura, que pilares
estratégicos foram efetivamente valorizados e quais os resultados e impactos que podemos hoje evidenciar?
Quanto à preocupação das nossas autoridades em relação à diminuição da população prisional, lembro
aquilo que foi feito numa dupla dimensão: a dimensão legislativa, através da excelente reforma das penas curtas
— que, ao mesmo tempo que diminuiu a lotação prisional, apostou também, e bem, na ressocialização dos
nossos reclusos, ou seja, houve uma diminuição de reclusos, mas também uma preocupação com a reinserção
—, e a dimensão de natureza operativa, uma vez que o sistema conseguiu, por via de pequenas obras e de
beneficiações, libertar mais 465 lugares.
Por isso, temos hoje um serviço prisional melhor porque está menos sobrelotado. Houve um reforço de 10%
do efetivo prisional, com 400 novos guardas prisionais, temos 90% de reclusos em plano individual de adaptação
e 77% da população reclusa está ocupada, em formação ou a trabalhar.
Sr.ª Ministra, uma vez que este caminho de concretização estratégica tem de percorrer o setor através da
modernização do edificado prisional, no horizonte de uma década, e temos ainda de estancar e de reverter a
depauperização que sofremos, entre 2011 e 2015, nos recursos humanos que trabalhavam na reinserção social,
pergunto: como e quando pretende o Governo levar a efeito todo o conjunto de propostas contidas no documento
Olhar o Futuro para Guiar a Ação Presente?
Gostaria ainda de aproveitar, Sr.ª Ministra, para obter uma resposta clara sobre o processo relativo às
beneficiações e à construção do novo estabelecimento prisional de Ponta Delgada, pois é muito importante a
clarificação de todo este processo.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Atenção ao tempo, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Susana Amador (PS): — Termino já, Sr. Presidente, dizendo que a confiança no sistema judicial
assenta em dois vetores fundamentais: a qualidade e a eficiência do seu desempenho e a sua reputação social.
Nestes últimos anos de governação do Partido Socialista, temos desenvolvido — e bem! — estes dois vetores,
porque acreditamos que a confiança é um capital inalienável e diferenciador da justiça.
Srs. Deputados, a confiança na justiça não se faz com uma semana dedicada à justiça, com algumas reuniões
e declarações erráticas pelo meio, como fez o PSD. A confiança na justiça e nos seus agentes não pode ser
intermitente, tem de fazer-se de forma continuada, estruturada, em perspetiva, sem roturas nem sobressaltos,
como estamos a fazer.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Atenção ao tempo, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Susana Amador (PS): — Sr. Presidente, termino de seguida.
A luta pelo direito, de que falou Von Ihering, é a luta pelo acesso ao direito, é a luta pela dignidade da pessoa
humana e, Sr.ª Ministra, sabemos que esta é também a sua luta, a luta de todo o Governo e a luta deste Grupo
Parlamentar.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Para responder, num prazo regimental de até 6 minutos, tem a palavra
a Sr.ª Ministra da Justiça.
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A Sr.ª Ministra da Justiça: — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Não gosto muito de falar sobre o
passado. Acho que, de facto, nos devemos concentrar no presente e procurar construir o futuro.
Aplausos de Deputados do PS.
Mas, se tivermos de partilhar os êxitos atuais, talvez devamos também partilhar os «inêxitos». Ou seja, não
se pode querer dividir apenas aquilo que funciona bem e atribuir aos outros aquilo que funciona mal. Vamos
partilhar tudo, Srs. Deputados!
Foram colocadas questões que são, efetivamente, estruturantes no que diz respeito ao sistema de justiça e
à organização do sistema. Sobre a primeira questão, do acesso ao direito, identificada desde logo como uma
questão fundamental, queria dizer que Portugal não tem taxas de litigância inferiores às dos seus congéneres,
o que significa que, do ponto de vista da dificuldade de acesso, não estaremos numa situação muito
perturbadora. Mas o Governo tem noção de que, relativamente a isso, há duas questões que devem ser
trabalhadas. Uma delas é o gradualismo relativamente aos custos da justiça, pois não pode ser o «tudo ou
nada», é preciso encontrar um modelo gradual; a outra é a necessidade de se encontrar um conceito de apoio
social transversal às várias áreas de governação. É nisso que estamos a trabalhar neste momento, para além
de estarmos também a trabalhar na mecânica relacionada com os aspetos técnicos da atribuição do apoio
judiciário, que, como sabem, está sediada no Ministério do Trabalho e da Segurança Social. O Ministério tem
estado a trabalhar connosco nessa área e pensamos que, rapidamente, encontraremos uma resposta para isso.
Outra questão que me foi colocada tem a ver com os Srs. Advogados e com a CPAS. O que posso dizer
sobre a CPAS — e vou tentar fazê-lo muito telegraficamente — é que houve um conjunto de reuniões envolvendo
o Sr. Bastonário da Ordem dos Advogados e o Sr. Presidente da CPAS. As propostas apresentadas foram
discutidas do ponto de vista técnico pelas duas equipas e houve um primeiro grupo de propostas que foi aceite.
Há um segundo grupo de propostas, que é mais residual e que tem mais a ver com questões de segurança
social, que a CPAS levou para reapreciar e reapresentar e ainda neste mês teremos uma reunião onde essas
questões ficarão fechadas.
Apresentei aqui uma face da justiça, mas posso, Sr. Deputado José Manuel Pureza, apresentar a outra. A
fotografia dessa outra face é, de facto, preocupante, mas seria mais preocupante se eu não pudesse dizer que
introduzimos no sistema 370 magistrados, 400 guardas prisionais, 400 oficiais de justiça.
O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Era mais preocupante, sim!
A Sr.ª Ministra da Justiça: — E, já que falamos em oficiais de justiça, devo dizer que promovemos 699,
temos um procedimento para a promoção de mais 200 nas Finanças e vão ser promovidos neste movimento
mais 123.
Aplausos do PS.
Portanto, essa parte do desbloqueamento está a ser feita e estamos a trabalhar articuladamente nas várias
áreas.
Quanto à questão dos conservadores, tem toda a razão no que diz respeito ao timing, mas o timing que o
Parlamento fixou era manifestamente irrealizável. Portanto, tal como eu já disse na 1.ª Comissão…
O Sr. José Manuel Pureza (BE): — São dois anos!
A Sr.ª Ministra da Justiça: — Não, não são dois anos! Estamos aqui com um problema que tem 39 anos,
não são dois anos. Tem 39 anos, Sr. Deputado! Estamos a resolver agora um problema que tem 39 anos, e
resolvê-lo-emos. Temos estado a trabalhar com os sindicatos — seguramente terão indicação sobre isso — na
perspetiva de termos tudo resolvido durante este ano, quer as carreiras quer a organização, e também uma
outra dimensão relevante, que é a das condições de exercício no interior das próprias conservatórias.
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Relativamente à questão da justiça mais próxima e da eficiência, efetivamente estamos a trabalhar numa
justiça mais próxima, fundamentalmente no pilar da eficiência. Os resultados que temos não caem do céu, têm
a ver com a reorganização do trabalho das secretarias, têm a ver com a reestruturação que tem sido feita nos
tribunais, têm a ver com a introdução de automatismos, têm a ver com a criação de equipas específicas que
trabalham nas execuções e que fazem a limpeza — se assim se pode dizer — de processos executivos nos
vários sítios. É óbvio que há todo um passado, mas há também um presente, e um presente ativo de trabalho
empenhado.
Relativamente à questão dos planos estratégicos que apresentámos, estamos a preparar o futuro:
apresentámos um plano para os prisionais, apresentámos um plano para os tribunais e temos um plano para a
área registral. Como é que pensamos concretizar estes planos? Vou apresentar ao Parlamento uma lei de
programação das infraestruturas da justiça e, no quadro dessa lei, estão identificados os timings e os meios com
que iremos concretizar os planos que temos nessas três dimensões.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Srs. Deputados, vamos passar à segunda ronda de perguntas.
Para o efeito, tem a palavra o Sr. Deputado Telmo Correia, do CDS-PP.
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra da Justiça, Sr.as e Sr. Secretários de Estado,
Sr.as e Srs. Deputados, em primeiro lugar, em nome do CDS, cumprimento e saúdo o Grupo Parlamentar do
Partido Social Democrata por esta iniciativa e pelo tema que trouxe aqui hoje.
Este é um tema que consideramos da maior importância e no qual, de resto, nós, no CDS, estamos
particularmente à vontade. Podemos lembrar que há mais de três meses apresentámos um conjunto vasto de
propostas — concretamente, seis projetos de lei e seis projetos de resolução — para procurarmos melhorar e
resolver várias questões da justiça, as quais aguardam ainda iniciativas quer do Governo quer dos outros grupos
parlamentares.
A Sr.ª Vânia Dias da Silva (CDS-PP): — Muito bem!
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Portanto, esta é uma matéria na qual estamos particularmente à vontade
e temos procurado estar — e temos estado, de facto — à frente, por assim dizer.
Por outro lado, começámos por propor aquelas matérias que nos pareciam mais concretas e mais práticas.
Ou seja, não fomos às grandes questões — como, por exemplo, questões que envolvam revisão constitucional
ou outras —, fomos àquelas que poderiam resolver o que sabemos serem as questões fundamentais da justiça
e que toda a gente discute como tal, designadamente a questão da celeridade. Esta é uma questão de sempre,
uma velha questão, não só para quem ela ficou parada há quatro anos, como parecia, há pouco, na primeira
intervenção do Sr. Deputado José Manuel Pureza, mas também para quem a discute já há três anos — que não
sei se serão longos, mas a Sr.ª Ministra o dirá —, quase uma Legislatura completa de mandato.
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — A questão da celeridade mantém-se: continuamos a ter abaixo de 1
milhão, acima de 1 milhão, mas, Sr.ª Ministra, um número de referência de 1 milhão é sempre preocupante,
como é evidente.
A Sr.ª Vânia Dias da Silva (CDS-PP): — Ora bem!
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Uma duração média de três anos em termos de justiça cível e mais do
que isso em termos de justiça penal não é, do nosso ponto de vista, aceitável.
Além da questão da celeridade, temos ainda a questão da confiabilidade do escrutínio da justiça e até da sua
eficácia. Como disse, nós, no CDS, respondemos a um apelo que nos pareceu da maior importância e que veio,
designadamente, do mais alto magistrado da Nação, S. Ex.ª o Sr. Presidente da República.
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O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Muito bem!
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Respondemos àquilo que foi o trabalho dos operadores judiciais em
matéria de Pacto da Justiça e não vimos até agora que essas nossas iniciativas fossem acompanhadas.
A Sr.ª Vânia Dias da Silva (CDS-PP): — Ora, ora!
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Lembro aqui várias dessas iniciativas, Sr.ª Ministra, pedindo-lhe a sua
opinião, se quiser beneficiar-nos com essa possibilidade: assessores judiciais, para ajudar a uma maior eficácia
da parte dos juízes; bolsa de juízes, para, reconhecendo que nas pendências alguma coisa melhorou, atacar
mais a fundo e mais a sério ainda essa questão; gabinete de intervenção rápida para esse efeito; melhor e mais
arbitragem, ou seja, introdução da arbitragem administrativa e melhoria, reforço e existência também de mais
arbitragem nos tribunais fiscais. Concorda ou não? Quando poderemos prosseguir esse caminho?
Também apresentámos um projeto, não há três meses mas há um ano, em relação ao acesso à justiça e à
matéria das custas. Propusemos essa matéria há um ano e está ainda por responder.
Numa outra matéria de que a Sr.ª Ministra falou, a questão da justiça penal, sublinho que o combate à
corrupção e à criminalidade económica tem de ser encarado de forma muito séria, pelo que lhe pergunto se está
disponível para promover verdadeiras alterações nesta matéria.
A Sr.ª Ministra deu a entender que não é preciso mexer muito, mas existem alterações que têm de ser feitas.
À partida, sem revisão constitucional, não iremos à questão do enriquecimento ilícito, por exemplo. Houve duas
tentativas nesse sentido, nós participámos nesse esforço, mas o Tribunal Constitucional não o permitiu. No
entanto, há que saber se vamos ou não mexer em outras matérias, até em termos constitucionais, se for
necessário, para resolver algumas questões.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Atenção ao tempo, Sr. Deputado.
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Termino, Sr. Presidente.
Ninguém pode ignorar, por exemplo, a questão do segredo de justiça, Sr.ª Ministra. O segredo de justiça,
com esta justiça mediática, é ofendido diariamente, pelo que tem de haver uma resposta.
A Sr.ª Assunção Cristas (CDS-PP): — Muito bem!
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Se a resposta não for a nível constitucional ou de alteração do próprio
Código Penal, como defendemos, Sr.ª Ministra, peço, pelo menos, mais meios. A questão dos meios é
fundamental, pois temos o quadro da PJ (Polícia Judiciária) sensivelmente a metade ou a menos de metade do
que devia ser a sua ocupação e a própria investigação fala sistematicamente de falta de meios. Portanto, vamos
ou não mexer aí, Sr.ª Ministra? Vamos ou não ter a capacidade de fazer grandes mudanças?
A Sr.ª Ministra citou Max Weber — e bem, como jurista que é — e eu talvez me atrevesse a citar Malraux:
«Há algo maior que o poder que se chama justiça». E isso talvez seja a medida da nossa prioridade.
Em termos de citações, Sr.ª Ministra, queria dizer ainda…
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Sr. Deputado, tem mesmo de concluir.
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Estou mesmo a terminar, Sr. Presidente.
Queria dizer ainda o seguinte: «O desejo…» — e a Sr.ª Ministra expressou esse desejo — «… mede os
obstáculos, mas é a vontade que os vence». Com isto já não estou a citar Malraux nem Max Weber, mas
Alexandre Herculano.
A Sr.ª Ministra é uma conhecedora do sistema e, até por isso, será uma gestora do sistema, mas o desafio
que lhe deixo é o de que, mais que uma gestora do sistema, seja alguém que tenha a coragem de mudar esse
sistema e de o reformar, porque é isso que se exige em matéria de justiça.
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Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe, do PCP, também para pedir
esclarecimentos.
O Sr. António Filipe (PCP): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra da Justiça, Sr.as Secretárias de Estado, Sr.
Secretário de Estado, o mote para esta interpelação, da parte do partido interpelante, poderia ser qualquer coisa
como isto: «Dos gravíssimos problemas que deixámos no sistema de justiça quando saímos do Governo, o que
é que os senhores já resolveram?» Poderia ser este o mote.
O balanço que fazemos é que o sistema de justiça hoje não está pior do que estava há dois anos e meio —
efetivamente, não está. O Governo PSD/CDS, com as medidas que tomou em matéria de justiça e com algumas
vicissitudes — designadamente o colapso do Citius que se verificou a determinada altura —, deixou, de facto, o
sistema de justiça numa situação calamitosa, que teve como «joia da coroa», no pior sentido, o encerramento
de tribunais que marcou a Legislatura passada.
Podemos dizer que nessa matéria houve mudanças que se verificaram, designadamente no início da
Legislatura, com a reabertura de tribunais. A Sr.ª Ministra fez muito bem em anunciar hoje, aqui, como fez há
poucos dias na Comissão, uma melhor utilização dos atuais juízos de proximidade para acabar com alguma
sensação que existe no País de que os tribunais reabriram, mas pouco — enfim, que reabrem de vez em quando.
Portanto, é bom acabar com isso e que haja, de facto, uma maior utilização dos juízos de proximidade, alargando
as suas competências judiciais.
Mas, Sr.ª Ministra, é forçoso reconhecer que há questões de fundo que, efetivamente, não tiveram ainda
perspetivas de resolução, e isso não pode ser esquecido. Já passaram mais de dois anos e meio sobre o início
da Legislatura e há matérias que continuam a ser discutidas e a ser objeto de grupos de trabalho, mas que,
efetivamente, não conheceram ainda perspetivas de resolução.
Uma dessas matérias é o problema do acesso ao direito. O que se passou com o acesso ao direito,
designadamente em matéria de custas judiciais, foi que o atual Bastonário da Ordem dos Advogados, na tomada
de posse, colocou essa questão de uma forma muito enfática, o que levou, até, a que houvesse iniciativas de
praticamente todos os grupos parlamentares nesta Assembleia relacionadas com essa matéria.
Ora, aquilo que se avançou foi apenas aquilo que se aprovou no Orçamento do Estado, por proposta do
PCP, no sentido de desindexar as custas judiciais do IAS (indexante dos apoios sociais) para que o seu aumento
não implicasse o aumento das custas judiciais. Houve um congelamento do valor das custas judiciais, que foi o
que propusemos, e, obviamente, saudamos esse avanço. Mas há que reconhecer que, em matéria de custas
judiciais, há muito mais a fazer, porque este é um grave estrangulamento do acesso de largas camadas
populacionais ao direito e aos tribunais.
Existe um grupo de trabalho para tratar esta matéria, que carece de uma intervenção de fundo, cujas
conclusões ainda não foram tornadas públicas. Há pessoas que não têm possibilidades económicas para aceder
aos tribunais, pelo que não podem beneficiar de assistência judiciária, e também não têm meios financeiros para
custear uma lide judicial, o que deixa muitas pessoas de fora do acesso a uma tutela jurisdicional efetiva.
Sr.ª Ministra, há problemas gravíssimos de pessoal que estão por resolver. Houve, de facto, alguns
acréscimos de admissões em matéria de funcionários judiciais e de guardas prisionais, mas há que assegurar
uma entrada regular de profissionais no sistema que vá colmatando as naturais saídas profissionais por razões
de idade.
Na Polícia Judiciária, não só menos de metade dos quadros estão preenchidos como os efetivos têm uma
média de idades de 48 anos, o que significa que ou há entradas regulares nestas instituições ou, então, a
situação não deixará de se agravar. A Polícia Judiciária tem qualquer coisa como 1150 efetivos para um quadro
que devia ser de 2500 e acontece o mesmo nos tribunais, no sistema prisional, nos Registos e Notariado…
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Atenção ao tempo, Sr. Deputado.
O Sr. António Filipe (PCP): — Vou terminar, Sr. Presidente.
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Como dizia, nessas instituições há défices enormes que têm de ser resolvidos e que, efetivamente, ainda
não o foram. Claro que há também as questões estatutárias, as quais esperamos que tenham desenvolvimentos
a breve prazo.
A última coisa que diria, Sr.ª Ministra, é que efetivamente não basta ter relatórios e programas, porque
também nos lembramos que há uns anos a Ministra Celeste Cardona encomendou a uma comissão coordenada
pelo Prof. Freitas do Amaral um belíssimo relatório sobre o sistema prisional e o que aconteceu foi que, quando
esse Governo cessou funções, o relatório foi para o arquivo. Portanto, importa que esses relatórios tenham
efetivamente concretização prática, sob pena de daqui a 10 anos ainda estarmos a discutir novos relatórios
sobre relatórios que foram abandonados.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Ainda para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado José
Luís Ferreira, de Os Verdes.
O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados,
começo por saudar o PSD pelo tema da sua interpelação, porque nunca é demais falar de justiça. Sendo a
justiça um pilar absolutamente central da nossa democracia e um elemento fundamental do nosso Estado de
direito democrático, falar de justiça será sempre oportuno.
Neste quadro, face à situação da justiça em Portugal, que continua, aliás, a ser sobretudo marcada pela sua
morosidade, onde inundam as pendências processuais, exige-se, naturalmente, que os governos assumam
como responsabilidade trabalhar no sentido de construir um sistema de justiça mais célere, mais eficiente, e,
sobretudo, mais acessível aos cidadãos.
Falamos, portanto, de uma responsabilidade que deveria ser encarada a todo o tempo e por todos os
governos. E digo «deveria» porque, na verdade, não tem sido assim e não foi assim desde logo quando falámos
do Governo anterior, porque, de facto, como todos sabemos, o Governo PSD/CDS tornou a justiça mais cara,
dificultou o acesso dos portugueses à justiça e afastou ainda mais os cidadãos da justiça.
Convém, a este propósito, recordar que o Governo PSD/CDS começou por aumentar as custas judiciais para
que os cidadãos não recorressem aos tribunais, negando-lhes, dessa forma, o direito do acesso à justiça, que,
aliás, é uma obrigação do Estado garantir, e depois encerrou dezenas de tribunais, afastando ainda mais a
justiça dos cidadãos. Por isso, hoje, no mínimo, teremos de estranhar o PSD vir falar de justiça mais próxima
quando fez o que fez nesta matéria. Mas também se calhar por causa disso, os portugueses colocaram o PSD
e o CDS longe do Governo porque, provavelmente, também perceberam que o PSD só se preocupa com as
pessoas quando está longe do Governo, e o CDS também.
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Nós não!
O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — O CDS também foi contra o encerramento dos tribunais? É isso
que o Sr. Deputado quer dizer-me?! Não, foram o PSD e o CDS. Já agora, clarifiquemos: quem encerrou os
tribunais foi o PSD e foi o CDS!
Sr.ª Ministra, com esta nova solução governativa, os portugueses viram renascer a esperança também ao
nível da justiça, mas as respostas começam a demorar, até porque, Sr.ª Ministra, não se consegue administrar
a justiça sem funcionários judiciais, pois são precisos trabalhadores e trabalhadores com direitos.
Nesta matéria, no que diz respeito aos funcionários judiciais, falamos sobretudo da necessidade de proceder
à dignificação do respetivo estatuto socioprofissional. Estes trabalhadores fizeram chegar ao conhecimento de
Os Verdes informações segundo as quais o Governo não está a cumprir compromissos importantes para com
estes profissionais, nomeadamente no que diz respeito à regularização do suplemento de recuperação
processual.
O Sr. Carlos Peixoto (PSD): — Não está?!
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O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — Neste sentido, Sr.ª Ministra, seria importante que nos pudesse
explicar ou que fizesse o ponto da situação sobre a regularização do suplemento de recuperação processual
dos funcionários judiciais.
Segundo o Sindicato dos Funcionários Judiciais, os representantes dos trabalhadores não estão a ser
ouvidos nos processos de reorganização dos mapas de pessoal e de funcionamento das secretarias dos
tribunais, o que certamente colocará em causa o que há para acordar ao nível da negociação do Estatuto dos
Oficiais de Justiça.
Sr.ª Ministra, confirma que os representantes dos trabalhadores não estão a ser ouvidos nos processos de
reorganização dos mapas de pessoal e de funcionamento das secretarias dos tribunais? Se assim é, que
fundamentos a Sr.ª Ministra considera como razoáveis para justificar esta atitude do Governo?
Por fim, Sr.ª Ministra, ainda segundo o Sindicato dos Funcionários Judiciais, as negociações entre o Governo
e o Sindicato estão suspensas aparentemente porque o Ministério da Justiça terá de articular com o Ministério
das Finanças os fundos para a tabela remuneratória, as aposentações e o regime de avença. São matérias
sobre as quais parece já terá até havido um compromisso por parte do Ministério da Justiça.
Portanto, Sr.ª Ministra, seria oportuno que hoje nos esclarecesse sobre as razões reais que levam o Governo
a manter a suspensão das negociações com as associações representativas dos trabalhadores, porque, como
já referi, a administração da justiça não é possível sem pessoas e sem trabalhadores com direitos, isto sem
prejuízo da importância das medidas que este Governo já tomou nesta matéria, nomeadamente as que a Sr.ª
Ministra há pouco referiu, particularmente no que tem a ver com as novas admissões para funcionários judiciais
e também com as progressões.
No entanto, apesar da importância com que essas medidas se revestem, consideramos que seria importante
que a Sr.ª Ministra se pronunciasse sobre as matérias que Os Verdes hoje trouxeram para discussão.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Atenção ao tempo, Sr. Deputado.
O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — Vou terminar, Sr. Presidente, solicitando à Sr.ª Ministra que nos
diga alguma coisa sobre estas questões que foram levantadas por Os Verdes neste debate e que não
mereceram qualquer palavra da sua parte.
Aplausos de Os Verdes e do PCP.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Ministra da Justiça.
A Sr.ª Ministra da Justiça: — Sr. Presidente, Srs. Deputados, se me permitem, vou responder a uma questão
que me foi colocada antes e à qual não respondi, que tem a ver com o Estabelecimento Prisional de Ponta
Delgada.
Sr.ª Deputada Susana Amador, neste momento, o novo Estabelecimento Prisional de Ponta Delgada
encontra-se na seguinte situação: está pronto o caderno de encargos, o que nos vai permitir dar início à primeira
fase da obra e aquilo que apenas está em causa é um conjunto de autorizações do Ministério das Finanças que
serão para as fases subsequentes, mas diria que está tudo encaminhado — o terreno, que foi cedido pelo
Governo Regional, está identificado. Obviamente, a obra é feita por fases, mas os trabalhos irão ser iniciados o
mais brevemente possível, uma vez que existe já um caderno de encargos que nos permite fazer a contratação
para a primeira fase.
Relativamente às outras questões que me foram colocadas, nomeadamente pelo Sr. Deputado Telmo
Correia, gostava de lhe dizer que precisamos de ter um bocadinho mais de confiança nas nossas instituições.
Não se trata de eu vir aqui fazer propaganda daquilo que está feito, pois, como disse, não quero discutir louros,
mas se o Sr. Deputado ler o European Justice Scoreboard 2018 perceberá que, no que diz respeito aos tempos
médios de vida dos processos, Portugal encontra-se em muito boa posição em muitas áreas, portanto nós
ganhamos bastantes pontos nessa matéria. Não significa que estejamos onde queremos, mas que avançamos
muito, e os dados internacionais que existem confirmam aquilo que a nossa estatística interna nos diz.
Aplausos do PS.
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Quanto ao Pacto da Justiça, seguimos com atenção os trabalhos do Pacto e temos também o máximo
respeito pelos resultados desse trabalho, assim como fomos seguindo as propostas que foram feitas pelos
partidos em matéria de justiça, como é óbvio.
Relativamente ao Pacto, abstendo-nos das medidas que implicam revisão constitucional e das que já estão
consignadas na lei, como por exemplo a da possibilidade de especialização nos tribunais superiores, ou de
outras medidas que, eventualmente, do nosso ponto de vista, não façam sentido, estamos a fazer o seguinte
percurso: aquilo que foi acordado do ponto de vista institucional — e penso que foi com esta Casa — foi que o
Parlamento ouviria primeiro os intervenientes no Pacto e que, numa segunda fase, ouviria os intervenientes
institucionais. Eu aguardo que o Parlamento me chame para me ouvir sobre isso.
Em qualquer caso, quero dizer que há um conjunto de medidas que, por coincidirem com coisas que
estávamos já a fazer ou por coincidirem com as ideias que nós tínhamos para a justiça, foram incorporadas
naquilo que é o nosso pipeline em termos de trabalhos que estão em curso.
Relativamente à questão das assessorias, estamos completamente de acordo e relativamente à bolsa de
juízes também. Como sabe, já existem bolsas de majoração comum. Neste momento, através de uma portaria,
criámos uma bolsa para os administrativos, que era a área em que não existia. Através do número de pessoas
que conseguimos aumentar no sistema, pensamos que vai ser possível prover essa bolsa de efetivos.
Quanto às demais matérias, como a questão do combate à corrupção, dos meios de investigação, do segredo
de justiça, queria dizer ao Sr. Deputado que a questão do segredo de justiça é uma questão crítica — estou de
acordo — e crucial em termos do sistema por aquilo que traz de descrédito ou de descredibilidade do sistema
de justiça. Eu venho do sistema e tenho essa sensação muito funda.
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Pois claro!
A Sr.ª Ministra da Justiça: — Temos várias hipóteses, mas o único sistema que conheço é o contempt of
court, é o sistema de desrespeito pelo tribunal, que no nosso sistema constituiria uma forma de
responsabilização objetiva, sobre cuja adequação aos princípios gerais do Direito Penal eu tenho algumas
dúvidas. Portanto, acho que precisamos de continuar a falar sobre isso. O único sistema eficaz que conheço é
esse. O sistema alemão, por exemplo, não é assim, baseia-se fundamentalmente num grande respeito
relativamente às instituições de justiça, que a imprensa tem, portanto não precisa desse tipo de intervenções.
Mas, no limite, a única coisa que funciona é efetivamente o contempt of court, que considero uma hipótese
que pode ser estudada, embora tenha dúvidas sobre se ela se compagina ou não com o nosso Direito interno.
Relativamente aos meios de investigação, quando falei da minha intervenção sobre a corrupção, disse que
pensava — e penso — que não era necessária muito mais legislação. Porquê? Porque é uma área em que
transpusemos tudo o que era legislação internacional, em que temos um conjunto de diplomas internos e que,
do meu ponto de vista, precisam de ser adequadamente explorados.
Para sabermos o que falha precisamos de fazer análise de casos, análise retrospetiva, e é óbvio que é
preciso ter meios. A questão que se coloca é: quais são os meios necessários? Eu diria, na avaliação que faço,
que há um meio indispensável, que é um trabalho sistémico em torno do processo. Neste momento, temos
várias fases processuais que são repartidas entre si.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Atenção ao tempo, Sr.ª Ministra.
A Sr.ª Ministra da Justiça: — Nessas fases, também intervêm agentes que podem não ter o mesmo grau
de especialização. Essa é, do meu ponto de vista, uma área sobre a qual é preciso agir.
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Foi a isso que me referi!
A Sr.ª Ministra da Justiça: — Sr. Deputado José Luís Ferreira, quanto à questão da morosidade, penso que,
de alguma maneira, aquilo que eu disse esclareceu as questões em termos de morosidade, mas relativamente
aos funcionários judiciais, de facto o suplemento de recuperação processual está a ser discutido connosco e
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com o Ministério das Finanças. Basicamente, aquilo que está em causa quando me dizem que, em termos de
reorganização dos mapas de pessoal…
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Atenção ao tempo, Sr.ª Ministra.
A Sr.ª Ministra da Justiça: — Só mais 1 minuto, Sr. Presidente.
Temos discutido com as organizações sindicais representativas dos oficiais de justiça todas as matérias que
relevam da sua área, nas quais se incluem, obviamente, as reestruturações internas que fazemos.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Srs. Deputados, passamos à última ronda de perguntas, para a qual
estão inscritos quatro Srs. Deputados, sendo o primeiro o Sr. Deputado Rui Cruz, do PSD, a quem dou a palavra.
Faz favor, Sr. Deputado.
O Sr. Rui Cruz (PSD): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra, Sr.as e Srs. Deputados, não subsistem dúvidas sobre
a importância e o papel dos psicólogos na reinserção social de reclusos. Assim, tem interesse avaliar a existência
destes profissionais no quadro da Direção-Geral de Reinserção e Serviços Prisionais.
O Ministério da Justiça tem optado por uma política de contratação destes profissionais em regime de
prestação de serviços. Dizem-nos que o mais adequado à ressocialização seria que, entre técnico e recluso,
fosse estabelecida uma relação de confiança, suficientemente longa e estável, que assegurasse uma atuação
eficaz.
Por outro lado, não andam a fazer a vontade ao Sr. Primeiro-Ministro, que, em prejuízo da valorização das
remunerações dos funcionários atuais, parece preferir usar folgas orçamentais para contratar novos funcionários
públicos. Por isso, pergunta-se: quando pondera autorizar a contratação daqueles profissionais, técnicos
superiores, psicólogos, em número adequado à população prisional e ao número de processos de reinserção?
Em matéria de tramitação eletrónica, a legislação estabelece que os atos processuais dos magistrados
judiciais e dos magistrados do Ministério Público sejam sempre praticados em suporte informático, através do
sistema informático de suporte à atividade dos tribunais, sendo garantida a disponibilização automática e a
consulta no endereço do Citius.
Sabemos que nem sempre é assegurada a disponibilização automática e que esta tecnologia tem falhas,
continua a falhar, mas continuamos a confundir depósito com disponibilização, dando como efetuadas
notificações que não ocorrem.
De igual modo, sabemos que o Sistema de Informação dos Tribunais Administrativos e Fiscais (SITAF) é
quase inexpressivo em matéria de tramitação eletrónica se comparado com o Citius, obrigando ao envio por
correio, em formato de papel, de inúmeros documentos e peças processuais.
Sr.ª Ministra, quando irá o SITAF adquirir características e funcionalidades idênticas às do Citius? Quando
teremos uma melhoria efetiva dos sistemas informáticos de suporte à atividade dos tribunais?
A reforma do mapa judiciário, aquela que anarquizou verdadeiramente o sistema de justiça, foi levada a cabo
pelo anterior Governo socialista, que conseguiu sobrelotar tribunais de competências e processos, atafulhando
arquivos e corredores; conseguiu deixar ao abandono bons equipamentos e tornar outros completamente
ingovernáveis; conseguiu manter tribunais em edifícios indignos, só não conseguiu encerrar.
A reforma foi cega e o Governo foi surdo, antecipou irresponsavelmente a sua implementação numa estrutura
que não estava preparada para a receber e promoveu um desequilíbrio chocante na rede de equipamentos da
justiça.
Mas agora, Sr.ª Ministra, em brilhante milagre económico e depois de quase três anos — 32 meses — a
estudar e a trabalhar num conjunto complexivo de medidas, ainda sem resultados significativos, como não nos
satisfaz apenas a reabertura de secretarias, onde outrora existiram tribunais, perguntamos: o plano de
investimentos anunciado por este Governo socialista resolverá todos os problemas que o anterior Governo
socialista provocou ou ainda não? E, V. Ex.ª, já obteve autorização do Sr. Ministro das Finanças ou teremos de
esperar por 2020?
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Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Sá, do
PCP.
O Sr. Paulo Sá (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr.ª Ministra da Justiça, em meados de maio, a
Assembleia da República aprovou um projeto de resolução do PCP que recomenda ao Governo que acelere o
processo de construção do novo estabelecimento prisional do Algarve e que o localize na freguesia de São
Bartolomeu de Messines.
O Relatório sobre o Sistema Prisional e Tutelar, apresentado pelo Governo em setembro de 2017, concluiu
pela necessidade de construir um novo estabelecimento prisional no Algarve, com lotação de 600 lugares, mas
não estabelece uma data para o início e conclusão do processo de construção nem se debruça sobre a
localização do novo estabelecimento prisional. Entende o PCP que o processo de construção deste novo
estabelecimento prisional deve ser acelerado, dotando a região algarvia de uma infraestrutura prometida há
mais de três décadas, mas sempre adiada por sucessivos governos.
Entende ainda o PCP que o novo estabelecimento prisional do Algarve deve ser construído na freguesia de
São Bartolomeu de Messines, no terreno adquirido pelo Estado para esse efeito, nos finais dos anos 80 do
século passado.
Este terreno, ainda na posse do Estado, e de acordo com informações recolhidas pelo PCP, dispõe de uma
área mais do que suficiente para a construção de um estabelecimento prisional com a lotação de 600 reclusos,
como previsto no Relatório sobre o Sistema Prisional e Tutelar.
Foram estas propostas do PCP que, tendo sido aprovadas, se transformaram numa resolução da Assembleia
da República, a cujo cumprimento o Governo se encontra politicamente vinculado.
Assim sendo, Sr.ª Ministra da Justiça, pergunto-lhe quando se iniciará a construção do estabelecimento
prisional do Algarve na freguesia de São Bartolomeu de Messines. Pela nossa parte, consideramos que há
condições para que esta construção se inicie em breve, com os trabalhos preparatórios a ocorrerem ainda em
2018.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Emília
Cerqueira, do PSD.
A Sr.ª Emília Cerqueira (PSD): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra da Justiça, primeiro, quero deixar aqui um
profundo lamento: estamos a discutir um dos principais pilares de um Estado de direito — a justiça —, em dia
de Congresso dos Advogados, aliás, faço, desde já, uma declaração de interesse, porque sou advogada e acho
o Congresso muito importante, e compreendo mal que um ministro inicie o seu debate queixando-se por não
poder estar presente no Congresso, no período da manhã, para poder estar aqui à tarde, como se prestar
esclarecimentos ao Parlamento sobre o exercício do seu mandato fosse uma coisa menor.
Sr.ª Ministra, não podia deixar de fazer aqui este lamento.
Além disso, Sr.ª Ministra, os esclarecimentos que nos trouxe, infelizmente, foram muito parcos. De facto,
referiu-se à diminuição de pendências, e é verdade que houve uma diminuição de pendências, mas a Sr.ª
Ministra esqueceu-se de dizer que essa diminuição de pendências não é, propriamente, fruto do trabalho de V.
Ex.ª à frente do Ministério mas, sim, a colheita de frutos de um trabalho que já estava feito. Ficava-lhe bem
admitir que esse trabalho já tinha sido feito e que agora se estão a colher os frutos.
Como dissemos na intervenção inicial, habituou-nos a grupos de trabalho: grupos de trabalho para isto,
grupos de trabalho para aquilo e resultados não se veem.
Por falar em grupos de trabalho, Sr.ª Ministra, o último grande plano que nos apresenta é o plano estratégico
plurianual para os edifícios da justiça.
A Sr.ª Ministra fala da proximidade que se pretende com os cidadãos, e ainda hoje aqui a referiu, tal como o
PS nas suas intervenções, com a abertura das novas secções de proximidade. Claro que estas secções não
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passam de uma secretaria onde não está ninguém, para além de um funcionário que basicamente não faz nada
— e quem anda pelos tribunais sabe que é assim —, mas a verdade é que existe esse anúncio.
Porém, Sr.ª Ministra — espanto dos espantos! —, quando olhamos para este plano, vemos que ele assenta
numa outra estratégia completamente diferente, que é a da centralização. Vemos o plano e ele diz-nos que é
preciso centralizar, e começa logo pelo Porto, por Lisboa e Coimbra. Aliás, relativamente a Coimbra, Sr.ª
Ministra, deixe-me fazer um aparte, porque o plano me levou para o passado, para tempos de trabalho em
Coimbra, e refere até um terreno ao lado do Palácio da Justiça como adequado para a construção. Presumo
que seja o terreno de que já se falava há cerca de 20 anos,…
O Sr. António Filipe (PCP): — Deve estar no mesmo sítio!
A Sr.ª Emília Cerqueira (PSD): — … e que não seja qualquer novidade, mas se nunca foi usado por algum
motivo terá sido.
Porém, repito, do que se fala é da concentração de edifícios: concentração nas comarcas, concentração na
sede das comarcas. Quando lemos o plano, ele não nos congrega para a descentralização, congrega-nos
exatamente para o contrário, mas este contrário, Sr.ª Ministra, faz-me lembrar a famosa reforma do tempo de
José Sócrates, de transformar o mapa judiciário em sete grandes comarcas. Sim, porque a retirada de
competências aos tribunais começou com o plano do ex-Primeiro-Ministro José Sócrates, não começou a
posteriori.
Sr.ª Ministra, atendendo à realidade do que anuncia e a este grande plano, a minha pergunta é muito simples:
primeiro, porquê vir anunciar, em 2018, um plano estratégico de 274 milhões de euros para o período de 2018-
2028?
O Sr. Carlos Peixoto (PSD): — É para os outros pagarem!
A Sr.ª Emília Cerqueira (PSD): — Acabou de dizer tudo, Sr. Deputado!
É para os outros pagarem, Sr.ª Ministra?! É que nós estamos em pleno fim de mandato e faz agora um
anúncio para que os outros assumam responsabilidades. Aliás, foi algo a que nos habituaram, a este «empurra
para a frente», «os outros que façam, porque nós só dizemos que fazemos».
A Sr.ª Sandra Pereira (PSD): — É o que o Partido Socialista sabe fazer melhor!
A Sr.ª Emília Cerqueira (PSD): — Sr.ª Ministra, finalmente, uma última pergunta. Tudo isto é muito
anunciado, mas a Sr.ª Ministra tem autorização do Sr. Ministro Mário Centeno para fazer o que quer que seja?
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Sandra
Pereira.
A Sr.ª Sandra Pereira (PSD): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra da Justiça, gostaria só de lhe dizer que os
advogados são, naturalmente, importantes agentes da justiça e, como disse a minha colega, fica-lhe bem
lamentar a sua ausência no Congresso dos Advogados, ainda mais escudando-se com a vinda aqui, ao
Parlamento, mas a sessão inaugural foi às 11 horas e, havendo vontade política, talvez a Sr.ª Ministra
conseguisse honrar os dois compromissos, ou seja, estar às 11 horas em Viseu e estar aqui, no Parlamento, às
15 horas.
O Sr. António Filipe (PCP): — Só se fosse o Prof. Marcelo!
Risos do PCP e do PS.
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A Sr.ª Sandra Pereira (PSD): — Sr.ª Ministra, no último Relatório Anual de Segurança Interna (RASI), na
categoria dos crimes contra a autodeterminação sexual, o crime de violação teve um aumento expressivo, de
mais de 21%, em 2017, atingindo o valor mais alto dos últimos 10 anos.
Tendo em conta que se encontra prevista neste mesmo documento, nas orientações estratégicas para o ano
de 2018, e passo a citar, a «Concretização do aprofundamento do quadro legal da criminalização da violência
de género e doméstica e da criminalidade sexual, em linha com os Convénios Internacionais a que Portugal se
encontra vinculado», gostaríamos de saber, Sr.ª Ministra, se, neste quadro, e face ao aumento dos crimes de
violação ocorridos no ano anterior, se encontra previsto algum programa específico de prevenção e combate a
este tipo de crime.
Por outro lado, Sr.ª Ministra, gostaria que concretizasse qual o alcance destas palavras bonitas —
«aprofundamento do quadro legal da criminalização da violência de género e doméstica e da criminalidade
sexual» — que estão inscritas no RASI como orientações do Governo. O que é que se quer dizer, em concreto,
com isto.
Sr.ª Ministra, rapidamente, porque já não tenho muito tempo, gostaria de lhe dizer que todos reconhecemos
que há uma desvalorização judicial dos crimes de violência doméstica e isso mesmo foi apontado num estudo
que analisou várias decisões judiciais. Há, inclusivamente, juízes que dizem que nunca julgaram crimes de
violência doméstica, que foram só uns murros e uns pontapés.
Ora, esta tolerância judicial, Sr.ª Ministra, mais não é do que uma tolerância social que existe com a violência
doméstica e que naturalmente nos convoca a todos — ao Governo, ao Parlamento — e que todos devemos
combater.
O próprio Ministério Público, Sr.ª Ministra, assume que não está preparado para lidar com a violência
doméstica. Os funcionários do Ministério Público, e o sindicato disse isto recentemente, não têm formação nessa
matéria, porque não lhes é dada, por parte do Ministério da Justiça, e não existem funcionários suficientes que
permitam um atendimento personalizado, quer por esses mesmos funcionários, quer pelos próprios magistrados.
Sr.ª Ministra, a minha pergunta, em concreto, é a seguinte: o anterior Governo tinha um plano robusto de
formação nessa área que nós reconhecemos que foi «desintensificado», pelo que lhe pergunto que medidas
concretas é que a Sr.ª Ministra pretende implementar no sistema judicial para erradicar e prevenir o crime de
violência doméstica e, sobretudo, combater este preconceito, que é um preconceito social e que também tem
reflexos na magistratura e nas decisões judiciais.
Aplausos do PSD.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Como é que têm coragem de «desintensificar» um plano?!
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Para responder, tem, novamente, a palavra a Sr.ª Ministra da Justiça.
A Sr.ª Ministra da Justiça: — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, relativamente ao sistema prisional e
aos meios humanos, o Governo tem trabalhado no sentido de internalizar, ou seja, fazer um movimento ao
contrário daquele que existia antes, que era o movimento de externalização.
É por isso que temos estado a contratar médicos e enfermeiros para termos o pessoal mínimo no interior dos
estabelecimentos, que permita assegurar essa ligação efetiva entre os reclusos e o pessoal de saúde.
Quanto às questões do Citius, gostava de dizer que, provavelmente, o Citius nunca esteve tão bem como
está hoje.
Quanto ao SITAF (Sistema de Informação dos Tribunais Administrativos e Fiscais), fizemos 50 intervenções
no SITAF, Sr. Deputado. E mais: estamos a estender o SITAF aos tribunais superiores na área administrativa e
tributária.
Quanto à questão que colocou, das comunicações, de atos através de carta, dir-lhe-ia que introduzimos o
sistema de printing and finishing nos tribunais administrativos e, portanto, se eventualmente em algum momento
isso aconteceu, deixará necessariamente de acontecer.
A alteração da organização judiciária ocorreu inicialmente, em fase experimental, em apenas três comarcas,
mas, quanto à reabertura, quero dizer-vos que, no período de um ano, se realizaram 1000 julgamentos e, nos
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últimos quatro meses de 2018, já se realizaram 400 julgamentos. Portanto, dizer que são meras antenas de
receção de processos ou é desconhecimento ou é qualquer outra coisa que não consigo identificar.
Quanto às autorizações do Ministério das Finanças, já me foi perguntado várias vezes, mas gostava de vos
dizer que este Governo funciona articuladamente e, por isso, quando os meus colegas trabalham em áreas da
justiça, obviamente, falam comigo e articulamo-nos. Portanto, o Ministro da Justiça, quando lida com matérias
financeiras, obviamente, articula-se com o Ministro das Finanças, tal como acontece, presumo eu, em qualquer
Governo.
Aplausos do PS.
Acerca da resolução relativa à construção do novo estabelecimento prisional no Algarve, o Ministério da
Justiça, o Governo, respeitará as deliberações da Assembleia da República. A única coisa que lhe posso dizer,
Sr. Deputado, é que, da análise que fizemos, há seis distritos do País que concentram 70% do crime e foi um
pouco em função disso que definimos as prioridades, em função disso e em função do estado de degradação e
da capacidade dos estabelecimentos prisionais das áreas onde se verificam maiores índices de criminalidade.
Por isso, as nossas prioridades eram outras, mas, tendo havido esta decisão, obviamente, acatá-la-emos.
Quanto às questões do plano estratégico plurianual da justiça, penso que já tive oportunidade de dizer à Sr.ª
Deputada, que me colocou a mesma pergunta na 1.ª Comissão, que não se trata aqui de centralizar.
Provavelmente, exprimimo-nos mal no nosso documento — é a única coisa que posso dizer para ser elegante
—, mas, repito, nós não estamos a centralizar tribunais, aquilo que considerámos foi que os sítios onde havia
problemas mais graves era justamente nas grandes áreas metropolitanas, em Lisboa, no Porto e em Coimbra.
É natural! E é natural porquê, Sr.ª Deputada? Porque é aí que se concentra o essencial da massa processual e,
portanto, é nessas áreas que apresentamos projetos que realmente implicam a concentração em espaços de
edificado, à semelhança do que hoje acontece em Lisboa, por exemplo, com o Campus de Justiça. Não há mais
nada para além disso, e creio ter-lhe explicado isso.
Quanto à questão de saber se estamos a fazer para outros pagarem, diria que não, ou seja, tudo aquilo que
fazemos é para todos pagarmos em qualquer momento.
O que os senhores fizeram foi para nós pagarmos, o que este Governo faz será para este Governo e para
os outros pagarem. Mas nenhum Governo é obrigado a assumir os compromissos do anterior. Se o Governo
que vier a seguir entender que estes projetos não são bons, que não os faça, o que não pode é deixar de haver
instrumentos de planificação, como não havia até agora na área da justiça, e em matérias tão estruturantes
quanto o edificado e os recursos humanos.
Quanto ao Relatório de Segurança e à questão da violência doméstica, quero apenas lembrar que foi este
Governo que pôs a funcionar a Equipa de Análise Retrospetiva de Homicídio em Violência Doméstica.
A Sr.ª SandraPereira (PSD): — Não é verdade!
A Sr.ª Teresa Morais (PSD): — Já estava criada!
A Sr.ª MinistradaJustiça: — Estava criada, mas não estava instalada. Criar no papel é fácil, instalar é outra
coisa. Fomos nós que a instalámos!
Aplausos do PS.
Protestos da Deputada do PSD Teresa Morais.
Além disso, criámos um Centro de Crise para questões de violência sexual que está a funcionar bem.
Aplausos do PS.
Sr.ª Deputada Sandra Pereira, quanto àquela questão enigmática que me colocou sobre o aperfeiçoamento…
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Protestos da Deputada do PSD Teresa Morais.
Sr.ª Deputada, desculpe lá, deixe-me falar.
A Sr.ª TeresaMorais (PSD): — Fale à vontade!
A Sr.ª MinistradaJustiça: — Como estava a dizer, quanto àquela questão enigmática que me colocou sobre
o aperfeiçoamento, a única coisa que lhe posso dizer é que, como a Sr.ª Deputada sabe, a Convenção de
Istambul foi transcrita mas não o foi integralmente e há domínios dessa Convenção que precisam de transcrição.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Peço-lhe o favor de concluir, Sr.ª Ministra.
A Sr.ª MinistradaJustiça: — Quando dizemos que há ainda uma intervenção a fazer, é especificamente na
área da agressão sexual, no quadro das exigências da Convenção de Istambul, que a Sr.ª Deputada,
seguramente, conhece tão bem como eu.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Passamos agora à fase de intervenções.
Tem a palavra, para esse efeito, a Sr.ª Deputada Vânia Dias da Silva.
A Sr.ª VâniaDiasdaSilva (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra da Justiça, Srs. Membros do Governo,
Sr.as e Srs. Deputados: Há uma semana, e hoje mesmo, nesta tribuna onde me encontro, a Sr.ª Ministra fez o
balanço dos quase três anos de mandato que já leva à frente da pasta da Justiça e mostrou-se razoavelmente
satisfeita. Razoavelmente satisfeita com as estatísticas, razoavelmente satisfeita com o trabalho desenvolvido
e razoavelmente satisfeita com os planos para o futuro. No entanto, para além de algumas promessas, nem uma
palavra de fundo lhe ouvimos quanto ao pacto da justiça e à resposta do Governo ao apelo que o Sr. Presidente
da República nos fez, a que, até agora, e para o que importa, apenas os operadores judiciários e o CDS
responderam.
Ao contrário da Sr.ª Ministra, o CDS sente-se razoavelmente insatisfeito com as estatísticas, bastante
insatisfeito com o trabalho desenvolvido pelo Ministério da Justiça e particularmente preocupado com os planos
para o futuro.
Quanto à estatística, registamos e enaltecemos a ligeira melhoria no número das pendências, mas
sublinhamos, Sr.ª Ministra, que permanecemos perigosamente perto de 1 milhão de pendências nos tribunais
cíveis, já não em ritmo tão acelerado como nos três anos precedentes. E isto agrava-se quando olhamos para
os tribunais administrativos e fiscais, onde a dramática acumulação de processos subsiste e persiste,
permanecendo em cerca de 1000 os dias que um ano precisaria de ter para se resolverem todos os processos
administrativos e fiscais.
O Sr. TelmoCorreia (CDS-PP): — Muito bem!
A Sr.ª VâniaDiasdaSilva (CDS-PP): — De resto, essa é a razão por que olhamos com especial inquietação
para o trabalho desenvolvido pelo Governo na área da justiça e por que, por isso mesmo, apresentámos, há já
três meses, um conjunto de propostas que visam não só melhorar a estatística mas, sobretudo, trazer confiança,
celeridade e eficácia ao sistema de justiça, bem como conferir garantias e o efetivo direito de acesso aos
cidadãos. Um trabalho que o Governo prometeu e alardeou, mas que — não surpreendentemente — não fez.
Para além de uns retoques ao mapa judiciário e de umas normas tecnológicas e de simplificação, pouco mais
resta a este Governo para mostrar.
A praticamente um ano do fim do mandato útil, é tempo de perguntar o seguinte, Sr.ª Ministra: para quando
a implementação de assessorias e de gabinetes de intervenção rápida, tal qual o CDS propôs e o Governo
prometeu?!
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Poderá o CDS contar com a companhia do Governo para as propostas de arbitragem, que aguardam
sozinhas na 1.ª Comissão e que também fazem parte de um rol de promessas que permanecem esquecidas?!
Para quando, e cito o Programa do Governo, «(…) a inovação radical da cultura processual civil (…) que
permita a gestão dinâmica do processo pelo juiz»? Estas propostas também foram apresentadas pelo CDS e
pendem, igualmente, na solidão da 1ª Comissão.
E para quando, Sr.ª Ministra, a conclusão dos trabalhos do grupo de trabalho de acesso ao direito ou a
promessa de revisão das custas judiciais, para o cumprimento de um verdadeiro direito de acesso à justiça,
propostas que o CDS também já apresentou há mais de um ano?!
Sr.ª Ministra, quando poderemos esperar por uma verdadeira intervenção do Governo na justiça, pela qual
os agentes judiciários esperam, os portugueses anseiam e o Sr. Presidente da República clama?!
Vamos chegar ao fim do debate e levar, como é costume, muito pouco, Sr.ª Ministra.
Com que prazos e iniciativas concretas pode o Governo comprometer-se hoje, aqui e agora, para darmos
início à discussão da reforma do sistema de justiça?
O Sr. TelmoCorreia (CDS-PP): — Muito bem!
A Sr.ª VâniaDiasdaSilva (CDS-PP): — A avaliar pelo que adiantou já a Sr.ª Ministra — e daqui sigo para
a preocupação do CDS quanto aos planos do Governo para o futuro —, nenhuma destas matérias será tratada
a breve trecho e as propostas do CDS permanecerão reféns da inação da maioria, não porque não sejam boas,
não porque não sejam úteis, mas, antes, porque o Governo e a maioria se recusam, pura e simplesmente, a agir
e, pior, a cumprir muito daquilo que prometeram.
Sr.ª Ministra, a avaliar pelo que nos adiantou já, o futuro próximo passará, basicamente, por uma estranha
lei de programação das infraestruturas da justiça, aparentemente desenhada com um plano a 10 anos mas com
um orçamento previsto para apenas 5 anos.
Além de muito curto e sem grande impacto nas preocupações dos portugueses em matéria de justiça, é, no
mínimo, difícil de compreender como se faz um plano a 10 anos com um orçamento para 5 anos.
Sr. Presidente, Sr.ª Ministra, Sr.as e Srs. Deputados: Sabemos das dificuldades, conhecemos os limites, não
ignoramos a escassez de recursos, mas governar é bem mais do que prometer e anunciar. Governar é fazer
escolhas e governar bem significa fazer as melhores escolhas.
O Sr. TelmoCorreia (CDS-PP): — Muito bem!
A Sr.ª VâniaDiasdaSilva (CDS-PP): — Em março deste ano, nesta mesma tribuna, o CDS deixou bem
claro que pretendia deixar o seu contributo para melhorar a qualidade da justiça portuguesa e juntar, além das
suas propostas, uma pergunta àquela que fez o Sr. Presidente da República: que resposta têm para dar à justiça
as Sr.as e os Srs. Deputados que compõem a maioria? Aparentemente, nenhuma.
Por isso, Sr.ª Ministra, Sr.as e Srs. Deputados, repetimos a pergunta: para quando um sinal que seja?
Uma profunda reforma da justiça está, para já, adiada, porque o PS recusou a revisão constitucional que o
CDS propôs e que se impõe. Porém, o CDS irá prosseguir os trabalhos no fórum para a reforma da justiça,
liderado pelo Sr. Professor Rui Medeiros.
O Sr. TelmoCorreia (CDS-PP): — Muito bem!
A Sr.ª VâniaDiasdaSilva (CDS-PP): — No entanto, há toda uma série de pequenas mas significativas
medidas — e não são uns ajustes no mapa judiciário ou um plano enviesado relativo a infraestruturas — que
podem ajudar a fazer a diferença já. O CDS foi o único que já contribuiu. Por que espera, Sr.ª Ministra? Por que
esperam, Sr.as e Srs. Deputados?
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Também para uma intervenção, tem, agora, a palavra o Sr. Deputado
Fernando Anastácio, do PS.
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O Sr. FernandoAnastácio (PS): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra da Justiça, Sr.as e Srs. Secretários de
Estado, Sr.as e Srs. Deputados: A respeito de justiça, sinto-me tentado a iniciar esta minha intervenção com uma
citação, precisamente de Martin Luther King: «Eu não sou quem eu gostaria de ser; / eu não sou quem eu
poderia ser, ainda, / eu não sou quem eu deveria ser. Mas (…) eu não sou mais quem eu era». De alguma
maneira, esta frase sintetiza a evolução da justiça de um passado recente ao nosso presente.
Sr.as e Srs. Deputados: A melhoria no acesso à justiça é determinante. Importa, assim, de uma forma clara e
objetiva, percebermos o caminho que fizemos nestes dois anos e meio.
Com este objetivo, procedeu-se ao reajustamento do mapa judiciário, disponibilizando-se, em áreas
territoriais marcadas pela interioridade, 47 juízes de proximidade, 20 dos quais por reativação de tribunais
encerrados pelo anterior Governo, em 2014, e 23 por conversão de secções de proximidade, onde se passaram
a realizar audiências de julgamento e, nalguns deles, passou a haver competência para jurisdição de menores.
Criaram-se desdobramentos de juízos de família e menores em sete novos juízos.
Aproximou-se a justiça de 700 000 pessoas na área da justiça criminal e de 300 000 na área da justiça de
família e menores.
Mais recentemente, foi anunciado que nestes tribunais serão resolvidos litígios em matéria cível até ao valor
de 50 000 €.
Mas é importante que todos nos recordemos do muito que se disse e escreveu sobre esta iniciativa, do ruído
que então foi criado, de quanto se desvalorizou esta medida.
Estou certo de que o Dr. Rui Rio, no seu anunciado diagnóstico sobre a justiça, não deixará de reconhecer
o progresso verificado em matéria de proximidade.
Sr.as e Srs. Deputados: O reforço dos meios humanos é também um dos eixos principais da ação política e
governativa.
A título de exemplo, nestes últimos três anos, entraram 380 novos magistrados, que comparam com os 160
que entraram durante a vigência do Governo anterior, entre 2011 e 2015.
Em 2016 e 2017, desbloqueou-se o acesso à promoção de 600 oficiais de justiça e promoveu-se o ingresso
de 400 novos funcionários.
O combate à morosidade da justiça, com a diminuição do número de pendências e a redução do tempo de
duração, é um aspeto essencial.
No passado mês de maio, foram publicados os resultados respeitantes ao quarto trimestre de 2017.
Como já hoje aqui se disse, as pendências reduziram-se em cerca de 300 000 processos e, além disso,
houve uma redução de 25 000 pontos percentuais em quase todas as jurisdições, inclusive, também, na
jurisdição administrativa e tributária, sem prejuízo de, neste caso, os resultados não serem tão significativos,
embora já tenha sido preparado um conjunto de medidas que foram anunciadas recentemente pela Sr.ª Ministra
da Justiça.
Sr.as e Srs. Deputados: Permitam-me ainda um destaque muito especial: esta diminuição, esta, que é a menor
pendência dos últimos 10 anos, foi conseguida, essencialmente, à custa de taxas de resolução processual que
se mantêm hoje acima dos 120%.
Como já hoje aqui foi citado, mas não posso deixar de referir, se alguma dúvida houvesse, bastaria ouvir o
que disse, em janeiro deste ano, o Sr. Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, que confirmou todos os
indicadores e referiu precisamente que, de todos os aspetos relacionados com a pendência, tramitação e
resposta, os resultados são extremamente positivos.
Mas também no sistema prisional tem havido uma intervenção muito significativa deste Governo. Em
contraponto com 2015, a população prisional reduziu em 10%, ou seja, são cerca de 1000 presos a menos. Dos
113% de ocupação, passou-se para os 103%. Estes são números, estes são factos!
Reduzimos a população prisional, aumentámos o efetivo de guardas prisionais, com cerca de 400 novos
guardas prisionais, relativamente a 2015, estamos a melhorar as condições de vivência no interior dos
estabelecimentos prisionais e, pela primeira vez, temos uma estratégia plurianual de requalificação e
modernização do sistema prisional e tutelar para os próximos 10 anos, tanto a nível de equipamentos quanto de
meios humanos.
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Também não queria deixar de referir, como último aspeto e não menos importante, o combate à criminalidade
económica e financeira, tendo presentes os desafios que aí se nos colocam, tanto no quadro interno quanto no
quadro internacional.
Destaco só algumas medidas e, entre muitas delas, refiro, a título de exemplo, a criação da Unidade Nacional
de Combate ao Cibercrime e à Criminalidade Tecnológica e a instalação do Ponto Único de Contacto para a
Cooperação Policial Internacional.
Mas também quero destacar o efetivo reforço do investimento. O Orçamento do Estado, para a área do
Ministério da Justiça, nos últimos três anos, aumentou a despesa em investigação criminal, de 223 milhões de
euros para 261 milhões de euros em 2018.
Sr.as e Srs. Deputados: Termino com a profunda convicção de que, após este debate, o PSD e a sua liderança
terão mais facilitado o seu trabalho de preparação do diagnóstico anunciado, pois só alguma dificuldade em
identificar a realidade permite compreender que se agende uma interpelação ao Governo sobre justiça sem nada
de concreto para propor.
Como já foi hoje aqui dito, se o caminho em que se reveem é o de aproximar, melhorar a gestão, reduzir as
dependências processuais, humanizar e preparar o futuro, sejam bem-vindos. É que, se assim for, não teremos,
como no passado, governantes perdidos, dirigentes partidários arrependidos por terem votado nos seus
companheiros de partido ou governantes em rutura com a estrutura de justiça. Teremos, com certeza, uma
justiça sempre, sempre, melhor.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Para uma intervenção, em nome do Bloco de Esquerda, tem a palavra o
Sr. Deputado José Manuel Pureza.
O Sr. JoséManuelPureza (BE): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Num artigo de opinião hoje
publicado, o Sr. Bastonário da Ordem dos Advogados, o Dr. Guilherme Figueiredo, refere que deveríamos poder
falar de um serviço nacional de justiça, à semelhança de podermos falar de um Serviço Nacional de Saúde ou
de um serviço nacional de educação.
Creio que essa afirmação merece toda a nossa reflexão quando debatemos a justiça em Portugal. Para
alguns, poderá ser uma utopia, mas quando foi criado o Serviço Nacional de Saúde, por António Arnaut, também
era dito que isso era uma utopia. Precisamos de confrontos fortes, de propostas fortes para avançarmos no
sentido da qualificação do serviço público e da democracia.
Pensemos, portanto, num serviço nacional de justiça, que, creio, tem três aspetos essenciais. Em primeiro
lugar, um serviço nacional de justiça arranca, necessariamente, de uma identificação rigorosa de quem são as
nossas concidadãs e os nossos concidadãos que estão arredados, por razões económicas, sociais e culturais,
do acesso ao bem público «justiça». Essa identificação permitir-nos-á estabelecer uma estratégia que assente,
tal como no Serviço Nacional de Saúde, num princípio de gratuitidade no acesso à justiça, numa rede de
proximidade de resposta do serviço de justiça aos cidadãos e às cidadãs portuguesas e numa discriminação
positiva dos mais pobres. Assim tem de funcionar um serviço nacional de justiça à altura da nossa democracia.
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Muito bem!
O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Em segundo lugar, é bem sabido que a ousadia de querer um serviço
nacional de justiça terá sempre a oposição, terá sempre a animosidade dos inimigos do serviço público, que,
aliás, se comportam assim para com o Serviço Nacional de Saúde e, por maioria de razão, comportar-se-iam,
ou hão de comportar-se assim de cada vez que se der um passo no sentido da criação de um verdadeiro serviço
nacional de justiça. Apresentar-nos-ão estratégias sedutoras, estratégias de privatização, como a da arbitragem,
estratégias de desjudicialização. Será sempre assim…
Protestos do PSD e do CDS-PP.
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Será sempre assim, e já estamos a ouvir as vozes daqueles que reagem, naturalmente, incomodados com
esta proposta. É natural que assim seja!
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Incomodados é com a ignorância!
O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Mas, para aqueles que defendem o primado do serviço público, há uma
resposta e essa resposta…
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — É a cativação!
O Sr. José Manuel Pureza (BE): — … é a dotação do serviço nacional de justiça com meios humanos
qualificados, numa cultura de serviço público. É isso, também, que está a faltar.
Finalmente, um serviço nacional de justiça há de ser sempre um serviço baseado num investimento a sério,
estratégico, na reinserção social, no apoio judiciário e no apetrechamento de meios humanos e de meios
técnicos.
Sr.ª Ministra, Sr.as e Srs. Deputados: Para o Bloco de Esquerda, tem de ser este o horizonte que nos tem de
guiar numa discussão sobre a justiça no campo da democracia portuguesa. É isto uma utopia? Não! É apenas
o produto da nossa determinação e da nossa vontade política.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.
O Sr. António Filipe (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Quase no final
desta interpelação ao Governo importa dizer que ela correspondeu, essencialmente, às nossas expectativas. E
que expectativas eram essas? Em boa verdade, nenhumas! Sabemos o que foi a ação do PSD no Governo em
matéria de justiça e sabemos também a vacuidade do que têm sido as ideias do PSD, nesta matéria, com a sua
nova liderança, em que o novo líder do PSD, à saída de algumas reuniões com agentes do sistema de justiça,
vem fazendo umas afirmações avulsas que o PSD ainda não conseguiu traduzir em rigorosamente nada de
concreto.
Daí que o PSD saia desta interpelação como entrou, ou seja, de mãos a abanar em matéria de propostas
relativas ao sistema de justiça, sem grande coragem para defender aquela que foi a política do seu Governo
nesta matéria, mas também sem se demarcar dessa ação política que desenvolveu.
Portanto, aquilo que o PSD aqui vem dizer é que defende uma reforma da justiça, seja lá isso o que for, acha
que essa reforma da justiça tem de ter o acordo do PSD e acha que essa reforma da justiça deve ser amplamente
debatida, mas, relativamente ao que pensa do que deve ser essa reforma da justiça, aí, não nos dá contribuição
nenhuma.
Assim, aquilo que aqui foi dito foi que o PSD, neste momento, ainda não tem propostas, critica o Governo,
porque o Governo tem mais grupos de trabalho do que trabalho desenvolvido, o que, digamos, na minha
intervenção, também tive oportunidade de dizer, ou seja, que, de facto, há mais grupos de trabalho do que, até
agora, trabalho, mas acontece que o PSD não tem uma coisa nem outra, isto é, nem tem grupos de trabalho
nem tem trabalho desenvolvido…
O Sr. Carlos Peixoto (PSD): — Ora essa!
O Sr. António Filipe (PCP): — … e o que vem aqui dizer é que não tem propostas mas tem vontade. Não
tem propostas mas gostava de ter…
Risos do Deputado do PS Filipe Neto Brandão.
Portanto, tem vontade, mas… Mas o PSD tranquilizou-nos: esperem, porque o PSD, até ao final da sessão
legislativa, há de apresentar propostas.
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No que nos diz respeito, Sr. Presidente, como o nosso tempo já terminou, nós esperamos, mas vamos
esperar sentados.
Aplausos do PCP e do Deputado do BE José Manuel Pureza.
Risos do Deputado do PS Filipe Neto Brandão.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Passamos, agora, à fase de encerramento do debate e, para esse efeito,
tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Peixoto, do PSD.
O Sr. Carlos Peixoto (PSD): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra da Justiça, Srs. Secretários de Estado, Sr.as e
Srs. Deputados: O PSD chega ao fim deste debate com três certezas, a primeira das quais é a de que o Partido
Socialista, o Bloco de Esquerda e o Partido Comunista encararam este debate de forma azeda, amarga,
agastada,…
Risos do BE e do PCP.
… não manifestando intenção nenhuma de convergir.
O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Convergir com quê?
O Sr. Carlos Peixoto (PSD): — Querem continuar a divergir, agarrados a um passado, porque os senhores
cristalizaram lá atrás. Vêm com uns clichés, com umas bandeiras, mas já lá vamos. Esta é a primeira conclusão!
A segunda conclusão é a de que o Governo traz para este debate a tal bandeira da redução do número de
pendências. Podia ser pior, é verdade, mas, Sr.ª Ministra, com a humildade e a seriedade que lhe é reconhecida,
a Sr.ª Ministra devia olhar para o seu lado direito e cumprimentar, saudar e reconhecer que aquilo que é hoje a
redução do número de pendências se deve muito à Sr.ª Ministra do Governo anterior, a Dr.ª Paula Teixeira da
Cruz, que está sentada na bancada do PSD. Era a ela que também devia agradecer o facto de termos hoje as
pendências que temos.
Aplausos do PSD.
Mas o Partido Socialista e o Governo — mais o Partido Socialista — vêm também para aqui com o cliché do
encerramento dos tribunais.
Srs. Deputados, nós não queremos falar do passado,…
O Sr. José Manuel Pureza (BE): — É melhor, é melhor!
O Sr. Carlos Peixoto (PSD): — … mas contra factos não há argumentos.
Se é verdade que o PSD encerrou 20 tribunais — e não podemos esconder a verdade —, também é verdade
que um Sr. Secretário de Estado que os senhores conhecem — lembram-se do Dr. João Correia?! — vos
apresentou um documento para encerrar 52 tribunais,…
O Sr. Filipe Neto Brandão (PS): — Há quantos anos foi isso?
O Sr. Carlos Peixoto (PSD): — … e os senhores só não os encerraram, porque o Governo mudou e os
senhores já não foram capazes de os encerrar.
O Sr. Filipe Neto Brandão (PS): — Que disparate!
O Sr. Carlos Peixoto (PSD): — Mas, em matéria de encerramentos, os senhores são os campeões.
Lembrem-se do que aconteceu entre 2008 e 2011: os senhores encerraram postos dos CTT; encerraram postos
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da GNR; encerraram escolas básicas; encerraram serviços da segurança social; encerraram agências da Caixa
Geral de Depósitos. E tinham esse desejo encapotado de encerrar tribunais que acabaram por consumar já
nesta Legislatura sem disso se aperceberem ou sem dizerem cá fora que o fizeram.
Sabem qual foi o truque? O truque foi que fizeram uma agregação de juízes. Em quatro distritos deste País,
agregaram, juntaram tribunais, pondo um juiz a servir dois tribunais. Isto é um encerramento encapotado e é
isto que deve ser denunciado!
Aplausos do PSD.
A terceira conclusão, Srs. Deputados, é a de que toda a gente percebe — e nós também o sentimos — que
o sistema de justiça não funciona de forma eficiente e que a sua imagem pública está desgastada. São os
advogados que desconfiam do seu sistema previdencial; são os advogados que pedem melhores condições e
reclamam melhores compensações; são os magistrados que não têm resposta para as suas progressões na
carreira.
Naquilo que é fácil, Sr.ª Ministra, a senhora resolve! Naquilo que é difícil, empurra com a barriga! É assim no
caso do estatuto remuneratório dos magistrados, é assim no caso dos guardas prisionais, é assim no caso dos
oficiais de justiça, dos funcionários do registo e do notariado. Até é assim no caso da Polícia Judiciária!
Não leve a mal que lhe diga, com grande franqueza, que não há, praticamente, ninguém satisfeito, confiante
e mobilizado com o trabalho deste Governo.
As expectativas que foram criadas com o artificial discurso de que já virámos a página da austeridade estão
a ser defraudadas de dia para dia. Como sabe, quem semeia ventos de facilidade acaba por colher tempestades
de dificuldades, e a Sr.ª Ministra ainda vai sentir isso.
Foi também por isso que o Sr. Presidente da República pediu a todos os agentes da justiça para se unirem.
Foi por isso que o PSD organizou, nas últimas semanas, encontros com vários agentes judiciários. E, feita
esta ronda, há lá crítica mais injusta do que aquela que os senhores vêm aqui fazer?! Então, não era razoável
que o PSD ouvisse o Governo sobre o que tem a dizer quanto à justiça?! Não era razoável que o PSD ouvisse
os outros partidos relativamente àquilo que têm a dizer sobre a justiça?! Isto, para que, amanhã,…
O Sr. António Filipe (PCP): — Ah! É amanhã…
O Sr. Carlos Peixoto (PSD): — … com o documento que vamos propor — e não é um documento com uma
mão cheia de nada, é um documento com muitas propostas —, seja possível saber se os senhores estão ou
não dispostos a introduzir as vossas sugestões, a dar as vossas ideias e a dar os vossos contributos.
Nós não queremos marcar a agenda, não queremos a manchete do dia seguinte, não temos nenhum objetivo
particular senão, apenas, o de prosseguirmos um desígnio nacional com espírito patriótico e com sentido de
Estado.
Não entraremos em querelas partidárias, não mandaremos slogans para o ar, não apontaremos o dedo a
ninguém, nomeadamente ao Partido Socialista,…
O Sr. Filipe Neto Brandão (PS): — Já apontaram!
O Sr. Carlos Peixoto (PSD): — … queremos, apenas, ajudar o País, convocando a ajuda de todos.
Queremos dizer-vos que as nossas propostas jamais estarão fechadas…
O Sr. António Filipe (PCP): — Propostas… Vou esperar sentado!
O Sr. Carlos Peixoto (PSD): — Sr. Deputado António Filipe, era melhor esperar de pé e começar a correr
atrás dessas propostas, porque nós também temos muitas ideias, e muito boas.
Já agora, na área cível, concorda ou não que é preciso haver afinações em matéria de execuções, dos
trabalhos do agente de execução, das notificações às partes,…
A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Ah! Agora é que apresenta as propostas?!
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O Sr. Carlos Peixoto (PSD): — … talvez um dos segmentos que mais atrasa os processos?!
Na área administrativa e fiscal, são ou não precisos mais recursos e mais meios?
Na área penal, há muito a fazer no que respeita ao segredo de justiça e há muito a fazer no que respeita ao
combate à corrupção. E, neste domínio, o exemplo devia vir de cima! Nesta matéria, o PSD está perfeitamente
à-vontade, tanto que já recusou o apoio de candidatos a cargos, de pessoas indiciadas por crimes deste género,
e está na primeira linha do estreitamento do regime das incompatibilidades dos cargos políticos. Mas todos
assim pudessem falar!… O que se passa com o Ministro Adjunto deste Governo não é enquadrável — é certo!
— nesta questão, nesta lógica, mas tipifica aquilo que de pior se pode transmitir aos cidadãos: a violação de
regras éticas e de conduta e a impunidade com que ela é tratada.
Quem não cumpre regras legais sobre as incompatibilidades, quem não cumpre a lei, não pode ser ministro!
É a própria lei que comina essa violação com a demissão e, se não fosse a lei, devia ser, pelo menos, a
consciência do Sr. Ministro Adjunto, do Sr. Ministro Siza Vieira, ou a consciência do Primeiro-Ministro a dizer-
lhe que ele devia imediatamente cessar funções.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Peço-lhe para concluir, Sr. Deputado.
O Sr. Carlos Peixoto (PSD): — Sr. Presidente, termino dizendo que o PSD sabe muito bem aquilo que quer,
mas sabe também que não é autossuficiente. Nenhuma reforma da justiça…
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Tem mesmo de concluir, Sr. Deputado.
O Sr. Carlos Peixoto (PSD): — … se faz apenas pela sua mão, com a sua iniciativa e somente com os seus
contributos.
O PSD aqui lança, pois, o desafio do esforço comum, alargado, com o envolvimento de todos apenas e tão-
só a pensar em Portugal.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Para encerrar o debate, tem a palavra a Sr.ª Ministra da Justiça.
A Sr.ª Ministra da Justiça: — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Começaria por dizer que estou disposta
a agradecer todos os contributos positivos do passado, e digo-o genuinamente.
Gostava apenas de saber a quem agradecer aquilo que, vindo do passado, não corre bem.
Aplausos do PS.
Este debate demonstrou que temos todos uma enorme vontade e, seguramente, a mais reta das intenções
de ajudar a conceber e executar políticas mais eficazes na área da justiça.
O debate foi, de facto, muito interessante e os contributos são todos bem-vindos se concretizados e quando
enquadrados nesse grande desígnio nacional. Mas precisamos de ter um léxicofundado em instrumentos de
análise validados e credíveis, uma espécie de gramática comum, que nos oriente na definição dos passos
imediatos com vista aos resultados que pretendemos: uma justiça igual, realizada em tempo razoável.
Se nos guiarmos mais por indicadores do que por perceções, corrigiremos os erros e alteraremos as
perceções. Diria que, num debate destes, realismo e justiça são exigíveis. O realismo exige-se relativamente ao
que está a acontecer e justiça exige-se na avaliação da ação e dos resultados do Governo. De contrário,
prosseguiremos sempre um afã reformista, persistente e incansável, mas estéril e, no final, frustrante.
A ação política do Governo centrou-se em três eixos fundamentais: primeiro, a melhoria do acesso à justiça
nas suas várias dimensões; segundo, o reforço dos meios humanos, a melhoria da gestão, a modernização e a
humanização das respetivas organizações; terceiro, o combate à morosidade com redução das pendências e
melhoria na duração dos processos.
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Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: As políticas são validadas em função dos resultados. Já lhes falei hoje
dos resultados que obtivemos numa destas dimensões, que é relevantíssima, mas, para além disso, com o
objetivo de melhorar o acesso à justiça, como os senhores sabem, reabrimos os tribunais encerrados em 2014;
garantimos a audição por videoconferência no interior das comarcas e também a partir dos estabelecimentos
prisionais; com o movimento que fizemos, aproximámos 700 000 pessoas da justiça criminal e 300 000 da justiça
de família e menores; no espaço de um ano, os juízos de proximidade realizaram 1176 julgamentos, com a
intervenção de 7432 cidadãos, e, como disse, nos últimos quatro meses de 2018, foram feitos 463 julgamentos.
Aplausos do PS.
Esse ensaio mostrou-nos que é possível melhorar e é possível fazê-lo sem ruturas. É por isso que estamos
agora a preparar a alteração da lei no sentido de admitir os julgamentos cíveis até aos 50 000 €.
Também introduzimos no sistema mais de 1000 efetivos. Em nenhuma das classes profissionais da área da
justiça há hoje menos efetivos do que havia em 2015, mesmo considerando as saídas que, entretanto,
ocorreram.
Mais: fizemos formação aplicada; renovámos e qualificámos a formação para os órgãos de gestão da
comarca; produzimos e disponibilizámos ao Conselho Superior e aos órgãos de gestão os indicadores de gestão
que consentem hoje a monitorização da atividade dos tribunais por áreas; melhorámos os sistemas de
tramitação processual que foram aqui referidos. Quer a segurança do Citius, quer o SITAF, quer o conjunto de
ações que foram desenvolvidas junto do SITAF foram claramente intervenções que melhoraram a relação da
justiça com os cidadãos. De facto, só o desconhecimento é que pode levar a que se venha falar destas matérias.
Como disse, também temos em curso um amplo processo de reorganização e de modernização das
secretarias judiciais e esse processo, que está em curso e muito avançado em muitos tribunais, é efetivamente
uma das causas, um dos motores dos resultados que temos estado a apresentar.
Em dois anos, como já foi aqui dito, na jurisdição comum, obtivemos uma redução acumulada de 25 pontos
percentuais. A redução das pendências, Srs. Deputados, é essencial na capacitação por uma maior celeridade,
já que com as pendências que tínhamos não o iríamos conseguir a não ser com um aumento, impossível, de
efetivos no sistema.
Por outro lado, reduzimos a população prisional e estamos a melhorar as condições de vivência no interior
dos estabelecimentos prisionais. Se abstrairmos das prisões por dias livres ainda em execução, o sistema
prisional no seu conjunto deixou já de ter sobrelotação.
Sabem também, porque já foi aqui dito, que fizemos análises exaustivas de todos os setores, com
radiografias e relatórios, que nos permitirão, a nós, trabalhar e a quem vier, no futuro, utilizar essa
documentação, se o entender, para prosseguir na atividade.
Mais. dispomos, hoje, de instrumentos de programação que faltavam na justiça em matérias tão estruturantes
como infraestruturas físicas ou recursos humanos.
Em suma, aproximamos, melhoramos a gestão, reduzimos pendências, humanizamos, preparamos o futuro.
Permitam-me, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que termine recordando Lewis Carroll, em Alice no País das
Maravilhas, quando Alice, perdida, sem saber em que direção caminhar, pede ajuda a um gato que, ao saber
que Alice não sabe que destino quer alcançar, lhe responde: «Para quem não sabe para onde vai qualquer
caminho serve».
Nós sabemos para onde vamos, conhecemos o caminho, fizemos o que está certo, não temos razão para
não prosseguir e aprofundar a nossa linha de ação, mas todos os contributos serão bem-vindos.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Srs. Deputados, estão, assim, concluídos os trabalhos relativos à
interpelação ao Governo n.º 20/XIII (3.ª), sobre justiça, da iniciativa do PSD, restando-me anunciar a ordem do
dia para a sessão de amanhã.
Peço a vossa especial atenção para o facto de a sessão começar às 9 horas e 30 minutos.
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O primeiro ponto consiste num debate de atualidade, marcação do PCP, ao abrigo do artigo 72.º do
Regimento da Assembleia da República, sobre o tema «Organização do próximo ano letivo, carreira e concursos
dos docentes».
No ponto dois, discutir-se-ão, conjuntamente, na generalidade, a proposta de lei n.º 131/XIII (3.ª) — Altera a
Lei das Finanças Locais, e os projetos de lei n.os 551/XIII (2.ª) — Lei das Finanças Locais (PCP) e 883/XIII (3.ª)
— Reforça a autonomia financeira dos municípios e introduz medidas de justiça nos impostos municipais (BE).
No ponto três, far-se-á a discussão da proposta de lei n.º 134/XIII (3.ª) — Procede à primeira alteração à Lei
n.º 151/2015, de 11 de setembro, recalendarizando a produção integral de efeitos da Lei de Enquadramento
Orçamental.
Segue-se, no ponto quatro, a discussão da Conta Geral do Estado de 2016.
No ponto cinco, será discutida, na generalidade, a proposta de lei n.º 119/XIII (3.ª) — Estabelece o regime
jurídico da segurança do Ciberespaço, transpondo a Diretiva (UE) 2016/1148.
No ponto seis, serão discutidos, na generalidade, os projetos de lei n.os 869/XIII (3.) — Visa a implementação
de um sistema de incentivo e depósito de embalagens de bebidas de plástico, vidro e alumínio (PAN) e 882/XIII
(3.ª) — Implementa um sistema de depósito, devolução e retorno de embalagens de bebida (tara recuperável)
e cria o respetivo sistema de recolha de recolha mediante incentivo (Primeira alteração ao regime unificado dos
fluxos específicos de resíduos) (BE) juntamente com o projeto de resolução n.º 1016/XIII (2.ª) — Campanhas
de sensibilização para redução de resíduos e para deposição seletiva adequada à reciclagem (Os Verdes).
Por fim, no ponto sete, haverá votações regimentais.
Face ao anúncio que referi, a agenda distribuída, em relação ao ponto dois, tem suprimido o projeto de lei
n.º 890/XIII (3.ª).
Sr.as e Srs. Deputados, nada mais havendo a tratar por hoje, declaro encerrada a sessão, desejando a todos
uma boa tarde.
Eram 17 horas e 32 minutos.
Presenças e faltas dos Deputados à reunião plenária.
A DIVISÃO DE REDAÇÃO.