24 DE JANEIRO DE 2019
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proteção da saúde constitui uma responsabilidade do Estado, através do SNS, estabelece que os setores
público, privado e social se articulam de acordo com o princípio da cooperação e condiciona a contratação de
entidades terceiras à avaliação da sua necessidade.
Por último, afirma-se como uma lei de bases que fortalece e moderniza o Serviço Nacional de Saúde. A
proposta manifesta uma preferência pela gestão pública dos estabelecimentos do SNS (Serviço Nacional de
Saúde), assenta em modelos de organização interna que privilegiam a autonomia e a responsabilidade, cujo
investimento se sustenta num plano plurianual e cujos profissionais de saúde constituem uma força de trabalho
estruturada em carreiras, numa evolução progressiva para a criação de mecanismos de dedicação plena ao
exercício de funções públicas.
Sr. Presidente e Srs. Deputados, porventura, houve quem tivesse dúvidas sobre a efetiva necessidade de
uma nova lei de bases e não há ninguém que considere que o novo diploma vai resolver todos os problemas da
saúde em Portugal. Então, porquê uma nova lei de bases? Porque, como escreveu António Arnaut, no livro
Salvar o SNS¸ «a Lei n.º 48/90 visou, essencialmente, a descaracterização constitucional do SNS e reduzi-lo ao
objetivo de um serviço público de índole caritativa para os mais pobres». Ora, no momento em que o SNS está
prestes a completar 40 anos e deu já tantas provas de fazer parte da nossa identidade como país, importa
corrigir aquela descaracterização e aquele reducionismo.
Não tenho dúvidas de que esta Casa conhece bem o texto da Lei de Bases da Saúde atualmente em vigor.
Mas saberão os portugueses, lá em casa, que nela se escreve que é apoiado o desenvolvimento do setor privado
da saúde em concorrência com o setor público?
A Sr.ª Maria Antónia de Almeida Santos (PS): — Exato!
A Sr. Ministra da Saúde: — E que a política de recursos humanos para a saúde visa facilitar a mobilidade
de profissionais entre o setor público e o setor privado?
A Sr.ª Maria Antónia de Almeida Santos (PS): — Já se esqueceram!
A Sr. Ministra da Saúde: — O que se pretende, afinal? Mudar tudo, para que tudo fique como está, como
parecem pretender alguns?
Sr. Presidente e Srs. Deputados, somos claros naquilo que queremos. Queremos aquilo que sempre
afirmámos ao longo da nossa história: um sistema de saúde centrado no SNS, financiado por impostos, com
prestação preferencialmente pública — insisto, preferencialmente pública —, porque reconhecemos a
complexidade e a diversidade do mundo que nos rodeia e os limites do nosso poder transformador da realidade.
O que não nos impede de afirmar qual o caminho que queremos percorrer.
Mas também somos claros naquilo que não queremos: não queremos que a separação das funções de
financiador e prestador seja o alibi para privatizar, não queremos ser sangrados dos profissionais que formamos,
não queremos concessionar pela simples dificuldade em reformar.
A liberdade de iniciativa e a concorrência têm um papel no setor da saúde — conhecemo-lo e respeitamo-lo
—, mas não nos peçam que alinhemos na falácia de que o mercado da saúde é como qualquer outro, que não
tem falhas que importa corrigir, em nome do interesse geral, sendo a Lei de Bases da Saúde um dos mecanismos
para o fazer.
Sr. Presidente e Srs. Deputados, em Portugal percorremos um longo caminho. Cinco anos depois da
Revolução, em setembro de 1979, era criado o Serviço Nacional de Saúde, mas, mesmo antes, o II Governo
Constitucional já deliberara abrir os postos da Previdência e os hospitais a toda a população, um gesto
fundamental no caminho da universalidade da cobertura.
A partir de 1979, o SNS foi-se consolidando e ganhou a simpatia dos portugueses. Os notáveis ganhos em
saúde que se conseguiram nas últimas décadas são bem conhecidos e as suas razões também: a melhoria do
rendimento das pessoas e das suas condições de vida, a democracia, e a existência do SNS. Mas o que é hoje
evidente nem sempre o foi. Importa não esquecer a história. Não para remexer nas feridas ou para colher louros,
mas para evitar erros.