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Quarta-feira, 19 de junho de 2019 I Série — Número 97

XIII LEGISLATURA 4.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2018-2019)

REUNIÃOPLENÁRIADE18DEJUNHODE 2019

Presidente: Ex.mo Sr. Eduardo Luís Barreto Ferro Rodrigues

Secretários: Ex.mos Srs. Pedro Filipe dos Santos Alves Sandra Maria Pereira Pontedeira Ana Sofia Ferreira Araújo

S U M Á R I O

O Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 6 minutos.

Foi aprovado um parecer da Subcomissão de Ética, da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, relativo à renúncia ao mandato de um Deputado do PS e à respetiva substituição.

Ao abrigo da alínea a) do n.º 2 do artigo 224.º do Regimento, teve lugar o debate quinzenal com o Primeiro-Ministro (António Costa), sobre políticas ambientais e de valorização do território. Após o Primeiro-Ministro ter proferido uma intervenção inicial, respondeu a perguntas colocadas pelos Deputados Fernando Negrão (PSD), Catarina Martins (BE), Assunção Cristas (CDS-PP), Jerónimo de Sousa (PCP), Heloísa Apolónia (Os Verdes), André Silva (PAN) e Renato Sampaio e João Marques (PS).

Deu-se conta da apresentação dos Projetos de Lei n.os 1227, 1231 e 1232/XIII/4.ª e dos Projetos de Resolução n.os 2201 a 2208/XIII/4.ª.

Procedeu-se ao debate preparatório do próximo Conselho Europeu, ao abrigo da alínea a) do n.º 1 do artigo 4.º da Lei n.º 43/2006, de 25 de agosto, com as alteraçõesintroduzidas pela Lei n.º 21/2012, de 17 de maio — Lei deAcompanhamento, Apreciação e Pronúncia pela Assembleiada República no âmbito do Processo de Construção da UniãoEuropeia e, conjuntamente, ao debate sobre os diversosinstrumentos de governação económica da União Europeiaque integram o Semestre Europeu, nos termos do disposto naalínea d) do n.º 1 do artigo 4.º da mesma Lei. Proferiramintervenções, além do Primeiro-Ministro, os DeputadosRubina Berardo (PSD), Vitalino Canas (PS), Isabel Pires (BE),Nuno Magalhães (CDS-PP), Paula Santos (PCP) e José LuísFerreira (Os Verdes).

O Presidente encerrou a sessão eram 17 horas e 55 minutos.

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O Sr. Presidente: — Boa tarde, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Primeiro-Ministro e Srs. Membros do Governo,

Sr.as e Srs. Funcionários, Sr.as e Srs. Jornalistas.

Vamos dar início à nossa sessão.

Eram 15 horas e 6 minutos.

Peço aos Srs. Agentes da autoridade que abram as portas das galerias ao público.

Em primeiro lugar, o Sr. Secretário Pedro Alves vai dar conta de um parecer da Subcomissão de Ética.

Faça favor, Sr. Secretário.

O Sr. Secretário (Pedro Alves): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, o parecer da Subcomissão de

Ética, da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, é relativo à renúncia ao

mandato do Deputado Manuel Caldeira Cabral (PS), círculo eleitoral de Braga, e à respetiva substituição, por

Palmira Maciel Fernandes da Costa, com efeitos a partir de 17 de junho, inclusive, sendo o parecer no sentido

de a renúncia e a substituição em causa serem de admitir, uma vez que se encontram verificados os requisitos

legais.

O Sr. Presidente: — Sr.as e Srs. Deputados, está em apreciação o parecer.

Pausa.

Não havendo pedidos de palavra, vamos votá-lo.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Vamos entrar no primeiro ponto da ordem do dia, que consta do debate quinzenal com o Primeiro-Ministro,

ao abrigo da alínea a) do n.º 2 do artigo 224.º do Regimento da Assembleia da República, sobre políticas

ambientais e de valorização do território.

Para proferir a intervenção inicial, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro, António Costa.

O Sr. Primeiro-Ministro (António Costa): — Sr. Presidente da Assembleia da República, Sr.as e Srs.

Deputados: As alterações climáticas constituem o mais importante desafio político, social e económico do século

XXI. Limitar o aquecimento global a 1,5 °C, em linha com os objetivos do Acordo de Paris, requer uma

transformação sem precedentes das nossas sociedades. Sabemos bem que Portugal é um dos países da União

Europeia que mais serão afetados pelos efeitos das alterações climáticas na erosão costeira, nos riscos de

subida do nível das águas do mar, na desertificação, nos incêndios florestais.

Por isso, quisemos dar o exemplo e fomos o primeiro País do mundo, logo em 2016, a assumir que iríamos

ser neutros em emissões de carbono no ano de 2050 e, no passado dia 6 de junho, num Conselho de Ministros

especialmente dedicado ao ambiente, fomos também o primeiro País a concluir e aprovar o Roteiro para a

Neutralidade Carbónica.

Para atingir a neutralidade em 2050, Portugal terá de reduzir as suas emissões em 85% e fazer subir a sua

capacidade de sumidouro de carbono em 25%. Todos os setores terão de contribuir para este objetivo, na

indústria, na construção, na agricultura, nos transportes e na produção de energia. Alcançar este objetivo com

sucesso será a mais importante missão da nossa e das próximas gerações.

Ouvimos os apelos dos milhares de jovens que se mobilizaram para a greve climática estudantil. Neste trajeto

a 30 anos, temos de fazer da próxima década a mais exigente no combate às alterações climáticas.

Aplausos do PS.

Portugal chegará a 2030 sem centrais a carvão, com metade das emissões em relação a 2005, com 80% da

eletricidade consumida de origem renovável e com um terço da mobilidade de passageiros a eletricidade. Este

é o nosso compromisso com os portugueses, mas é também o compromisso de Portugal com o mundo.

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Para atingir a neutralidade carbónica, é necessário agir em três frentes.

Primeiro, reduzindo as emissões e procurando a independência energética. Portugal importa, hoje, 70

milhões de barris de petróleo por ano. Em 2050, esse número será inferior a 10 milhões, o que representará

uma poupança anual de 1,2 mil milhões de euros nas nossas importações.

Aplausos do PS.

Em segundo lugar, é necessário agir reforçando a nossa capacidade de sumidouro, que, em Portugal, é

essencialmente assegurada pela floresta. Para conseguirmos atingir as nossas metas, a área ardida em fogos

rurais terá de ser reduzida para metade. Esta necessidade reforça o compromisso deste Governo com a

prevenção e o combate e a certeza de que, em 10 anos, teremos de ter uma nova paisagem rural, com mosaicos

adaptados às condições naturais e espécies florestais resistentes ao fogo.

Em terceiro lugar, é necessário investir na investigação e no desenvolvimento, quer com os laboratórios

colaborativos, que contribuem para a valorização dos recursos endógenos do nosso espaço rural, quer com a

criação, nos Açores, de um grande centro de investigação internacional centrado no espaço, no estudo do mar

profundo e nas alterações climáticas, valorizando, assim, o papel dos oceanos como reguladores do clima.

Aplausos do PS.

Atingir a neutralidade carbónica é mesmo um grande projeto para o desenvolvimento de Portugal. Não

estamos a falar de custos, mas de investimento, da criação de novos empregos qualificados, de novos modelos

de negócio, de novos materiais, de novos serviços e de uma economia mais circular.

Falar de neutralidade carbónica, Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, não é, contudo, só falar do futuro, é

também, e desde logo, falar do presente.

Na mobilidade, o plano de redução do tarifário nos transportes públicos gerou um notável crescimento da

procura e, por consequência, uma redução de emissões num setor que, até 2030, terá a obrigação de emitir

menos 40% de gases com efeito de estufa. A redução de preços dos passes sociais é ganha pelas famílias e é

financiada com origem única nas taxas de carbono, que são cobradas a quem mais polui. É este um excelente

exemplo de internalização positiva das externalidades negativas de um modelo de mobilidade que temos de

ultrapassar.

Refiro também a aquisição de mais de 700 autocarros de elevada performance ambiental, dos quais 100 já

se encontram a circular no País, sendo que os demais estarão em circulação até ao final do próximo ano,

acompanhando o investimento na ferrovia, no Sistema de Mobilidade do Mondego e na expansão das redes ou

na aquisição de novas composições para os metros de Lisboa e do Porto.

Na energia, o fim da isenção do ISP (imposto sobre os produtos petrolíferos e energéticos) na produção da

eletricidade a partir do carvão, já em curso desde o ano passado, contribuiu decisivamente para a redução das

emissões logo no seu primeiro ano de vigência.

E, nas renováveis, o reforço da produção de eletricidade a partir da fonte solar, em dois anos, aumentará em

2 GW a capacidade atual, contribuindo para o encerramento das centrais a carvão.

Que não existam dúvidas: a forma mais barata de produzir eletricidade em Portugal é a partir de fontes

renováveis, e na fonte solar esta é uma evidência inequívoca. Por isso, o modelo de leilões em curso, que fixará

tarifas abaixo do preço de mercado, é aquele que melhor defende os consumidores e que beneficiará empresas

e famílias.

Falar de alterações climáticas é mesmo falar do presente. Por isso, o Conselho de Ministros, no mesmo dia

em que aprovou o Roteiro para a Neutralidade Carbónica, aprovou também o Programa de Ação para a

Adaptação às Alterações Climáticas, estando já em curso um investimento superior a 700 milhões de euros na

adaptação do território, na prevenção contra fogos rurais, na rede hidrográfica, na melhoria da fertilidade dos

solos e também nas nossas cidades.

Aplausos do PS.

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A descarbonização tem de jogar a par da valorização do território e da consolidação de um modelo de

economia circular.

Valorizar o território significa gerir as áreas protegidas em conjunto com as autarquias, organizações não

governamentais da área ambiental e instituições de ensino superior, pois as atividades humanas podem também

ser geradoras de biodiversidade. Seremos o primeiro Governo que, em Portugal, irá remunerar os serviços dos

ecossistemas, de maneira a suportar as mudanças necessárias na paisagem.

Valorizar o território significa também cumprir o Programa Nacional da Política de Ordenamento do Território

(PNPOT), recentemente aprovado na Assembleia da República, que considera o capital natural um bem tangível

e um conjunto de recursos que têm de ser colocados ao dispor do bem comum.

Valorizar o território traduz-se numa política concreta para os territórios de baixa densidade.

Para gerar bem-estar, a economia tem de crescer; tem de crescer em Portugal e tem de crescer em todo o

mundo. Mas não pode crescer, nem em Portugal nem no mundo, indo para além dos limites naturais. A nossa

economia tem, por isso, de mudar para encontrar um modelo racional de suficiência.

Portugal já esgotou, nesta data, os seus recursos para o ano de 2019 e países mais desenvolvidos que o

nosso, como a Noruega ou a Suécia, ultrapassaram esses limites anuais ainda mais cedo do que nós. Neste

contexto específico, não somos um País desenvolvido, somos um País em vias de desenvolvimento, pois o que

nos é pedido corresponde a um enorme esforço e a uma não menor ambição.

Portugal tem sido exemplo desta transformação e o setor público tem sido liderante. Há meses que banimos

o uso de plástico descartável no Estado e iremos antecipar em um ano a diretiva que os proíbe para o mercado

em geral. Presentemente, 50% dos carros comprados para o Estado ou para as empresas públicas têm de ser

elétricos.

Estamos a cumprir e distinguimo-nos pelo trabalho feito. Comparativamente a 2005, reduzimos as nossas

emissões em 22% e aumentámos a incorporação de energia renovável em 26%.

O Sr. Presidente: — Sr. Primeiro-Ministro, já ultrapassou o tempo de que dispunha. Peço-lhe que conclua.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Vou já concluir, Sr. Presidente.

Em 2018, reduzimos o triplo das emissões, quando comparados com a média da União Europeia, mas isto

só nos pode impor a responsabilidade e a determinação de irmos ainda mais longe, incorporando a energia

renovável em 32%, em 2020, e em 47%, em 2030.

Para terminar, Sr. Presidente, permita-me que recupere as palavras do Secretário-Geral das Nações Unidas,

António Guterres: no combate às alterações climáticas, não há nada a perder em agir, há tudo a ganhar. É isso

que estamos a fazer, é isso que temos de continuar a fazer, cada vez mais com maior determinação.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Sr.as e Srs. Deputados, vamos passar à fase de perguntas.

Em primeiro lugar, tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Negrão, do Grupo Parlamentar do PSD.

O Sr. Fernando Negrão (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, começo por me referir à tragédia de

Pedrógão Grande, uma vez que ontem foram assinalados dois anos da sua ocorrência. Foi uma tragédia que

roubou as vidas de dezenas de pessoas, hipotecou centenas de famílias e reduziu a pó as aspirações de

milhares de pessoas. O Estado falhou em toda a linha na proteção e no socorro a estas pessoas e continua a

falhar na reconstrução das suas vidas.

Quatro meses depois, a tragédia repetiu-se, as falhas repetiram-se e o número de vítimas cresceu. Num ano,

116 pessoas perderam a vida vítimas de incêndios em Portugal. Em 15 e 16 de outubro, estima-se que,

aproximadamente, 1500 habitações, em 36 concelhos, tenham sofrido danos — 1500 habitações!

O então Ministro Pedro Marques, agora Eurodeputado socialista, presidiu a sucessivas cerimónias de

consignação de reconstrução de casas, anunciando a conclusão da totalidade da reconstrução das casas, no

máximo até ao final de 2018. Mais uma vez, o Governo mentiu aos portugueses!

Ao contrário do que tem sido dito, não são seis ou sete casas que estão por construir. No último balanço que

a CCDR-Centro (Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Centro) fez, em abril de 2019 ainda

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havia uma percentagem de 30% de casas para reconstruir só na Região Centro — 30% de famílias continuam

sem resposta efetiva do Estado.

O pior é que não se conhece o balanço oficial da totalidade das casas ardidas, da totalidade das habitações

que o Estado está a apoiar e das que não serão recuperadas. Não há transparência nos apoios concedidos à

recuperação de casas ardidas entre os incêndios de junho e os de outubro.

Sr. Primeiro-Ministro, passados dois anos, qual é a real situação, qual é o verdadeiro ponto da situação,

acerca da destruição das casas e da sua recuperação?

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Fernando Negrão, ainda ontem foi feito esse ponto

de situação na reunião que tive com os sete presidentes de câmara, tendo sido verificada a situação caso a

caso.

Relativamente ao incêndio de Pedrógão, estão já reconstruídas 90% das casas, havendo 15 casas cujos

pagamentos estão suspensos — apesar de cinco delas estarem já concluídas — devido a um conjunto de

investigações que estão a decorrer no âmbito do Ministério Público ou à suspensão ordenada pelo Conselho de

Gestão do Fundo REVITA.

Por concluir, e em execução, estão, neste momento, 10 casas, tendo-nos assegurado a Sr.ª Presidente da

Câmara Municipal de Castanheira de Pera que, até ao final deste mês, quatro estarão também concluídas, o

que baixará para oito as casas por concluir.

Há uma em relação à qual, apesar de ainda estar sinalizada como não concluída, o Sr. Presidente da Câmara

Municipal de Pampilhosa da Serra nos assegurou que já está concluída. Estamos, portanto, a falar de sete, e

essas sete estão em curso com a perspetiva de conclusão brevemente.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Continua no uso da palavra o Sr. Deputado Fernando Negrão.

O Sr. Fernando Negrão (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, em abril de 2019, a CCDR-Centro

disse que 30% das casas estavam por construir. É este o dado mais fidedigno que nós temos das instituições

que lidam com esta matéria.

E, mais, Sr. Primeiro-Ministro, sabemos, também por declarações públicas de responsáveis da CCDR-

Centro, que mais de 500 pedidos de apoio resultaram em respostas negativas porque — e cito a informação da

CCDR: «As famílias não tinham condições para o programa de apoio e muitos dos ‘não’ tinham a ver com a

propriedade e a legalidade urbanística». Esta é a verdade fria das situações. Mas, Sr. Primeiro-Ministro, estas

pessoas precisam de ser apoiadas. E eu pergunto: o que é que o Estado faz a estas pessoas? Diz «não», vira-

lhes as costas e fecha os olhos?

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr. Deputado, os dados que eu citei também foram os dados de

ontem da CCDR. Os dados mudam todos os dias, porque todos os dias há evoluções.

Aquilo que o Sr. Deputado leu explica tudo: há casos em que, efetivamente, os apoios não podiam ser

concedidos, porque as casas estavam erguidas em locais onde, para a segurança dos próprios ou na

decorrência das normas de ordenamento do território, não podem ser reconstruídas e, portanto, não podem ser

apoiadas.

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É por isso que os mecanismos de apoio preveem a relocalização das pessoas noutras zonas do mesmo

concelho ou fora dele, quando a casa não possa ser construída no mesmo sítio, porque não preenche as normas

legais para o efeito.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Negrão.

O Sr. Fernando Negrão (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, fica, então, claro que estas pessoas

não deixarão de ter apoio do Estado. É que as queixas são muitas, as queixas são inúmeras relativamente à

falta de apoio do Estado nestas situações. Mas o Sr. Primeiro-Ministro acaba de afirmar, claramente, que estas

pessoas vão ter apoio efetivo do Estado. É bom que assim seja e que seja cumprida a sua palavra.

Sr. Primeiro-Ministro, sobre a barragem do Fridão, o senhor afirmou aqui, em debate quinzenal, que o

Governo e a EDP estão de acordo quanto à «desnecessidade da barragem do Fridão» — foi esta a expressão

usada.

Numa audição mais recente, posterior a estas suas declarações, o Presidente da EDP, António Mexia, disse

textualmente o seguinte sobre a construção da barragem do Fridão: «A EDP sempre esteve disponível e nunca

considerou não a construir sem ser ressarcida». A formulação é complexa, mas a ideia é muito simples: ou

constrói ou, não construindo, quer uma indemnização.

O senhor e o seu Ministro do Ambiente foram publicamente desmentidos. Afinal, Sr. Primeiro-Ministro, quem

fala verdade?

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr. Deputado, eu sei que o senhor já explicou, por diversas

vezes, que não confia na minha palavra, pelo que não vale a pena fazer-me mais perguntas, designadamente

sobre a matéria das casas. Como, seguramente, confia na palavra dos presidentes de câmara, em particular

dos do PSD, sugiro-lhe que, relativamente às inúmeras queixas de que fala e que algumas televisões reportam

com regularidade semanal, fale com os presidentes de câmara do PPD/PSD da Região Centro, e eles podem

informá-lo das razões pelas quais houve ou não houve apoio em cada um dos casos concretos. Creio que será

muito útil para a sua cultura geral e assim verificará que eu não minto e que digo a verdade quando falo.

Aplausos do PS.

Quanto à barragem do Fridão, estou quase comovido com a preocupação como exerce a advocacia pro bono

para proteger a EDP. Fico comovido, mas a EDP foi muito clara ao manifestar por escrito que não tinha interesse

em prosseguir com a construção da barragem do Fridão.

Desse ponto de vista, o Estado deve retirar as necessárias consequências e, havendo uma coincidência de

desinteresse nessa barragem, ela não será construída. Se a EDP não está satisfeita, tem os meios legais para

agir relativamente ao Estado.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Tem, de novo, a palavra o Sr. Deputado Fernando Negrão.

O Sr. Fernando Negrão (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, quero deixar duas notas: a primeira

para dizer que V. Ex.ª, Sr. Primeiro-Ministro, não tem rigorosamente nada a ver com quem eu falo. E se eu falo

com presidentes de câmara do PSD, o senhor só fala com presidentes de câmara do PS, e há aqui um problema.

Protestos do PS.

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Quero, ainda, dizer-lhe o seguinte: eu falo com toda a gente, e todas as pessoas que se socorrem do Grupo

Parlamentar do PSD são atendidas, sejam do PS, sejam do PSD ou sejam do PCP. Não nos interessa a filiação

partidária das pessoas, não temos qualquer interesse nisso.

Aplausos do PSD.

Outra coisa, Sr. Primeiro-Ministro: eu sou advogado, mas sou advogado enquanto Deputado do povo.

Risos do Primeiro-Ministro António Costa.

Não se ria. O senhor está a rir-se porque não é Primeiro-Ministro para o povo, porque não compreende a

importância de ser advogado do povo. E ficam-lhe muito mal, mais uma vez, essas insinuações a que o senhor

regressou. É nisso que o senhor é bom, nas insinuações que faz.

Relativamente à barragem do Fridão, estão em causa 218 milhões de euros a pagar pela EDP, como

contrapartida pela exploração por 75 anos, que a «elétrica» considera que lhe devem ser restituídos.

Sr. Primeiro-Ministro, pode garantir que os portugueses não vão ter de pagar estes 218 milhões de euros?

Ou esta será mais uma daquelas heranças irresponsáveis que os governos socialistas estão habituados a

deixar?

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Fernando Negrão, o senhor tem um tal preconceito

na forma como coloca as perguntas que até consegue ouvir aquilo que eu não digo.

Aplausos de Deputados do PS.

Sr. Deputado, eu não lhe disse para falar com os presidentes de câmara do PSD porque eu falo com os do

PS. Eu falo com todos os autarcas. Eu sugeri que falasse com os presidentes de câmara do PPD/PSD porque

presumo que, ao menos, nesses possa confiar.

Ainda ontem, reuni com os sete presidentes de câmara com quem tenho reunido, com frequente regularidade,

desde o dia 18 de junho de 2017. Nesse dia 18 de junho de manhã já estava na Câmara Municipal de Pedrógão

Grande a reunir com todos os presidentes de câmara, e só não estava presente o Presidente da Câmara

Municipal de Castanheira de Pera porque estava ainda a combater as chamas e tinha uma rede telefónica que

não funcionava, não tendo sido possível contactá-lo. Só consegui falar-lhe nessa tarde, porque fui pessoalmente

à procura dele e se ele ficou com meios de contacto foi porque eu lhe emprestei um telemóvel do meu gabinete

para ele poder voltar a contactar com o mundo.

Aplausos do PS.

Portanto, tenho falado com todos, e desde o princípio.

Sr. Deputado, presumo que conheça razoavelmente a geografia eleitoral, pelo que quero dizer-lhe que, na

reunião de ontem dos sete presidentes de câmara, estavam presentes, pelo menos, quatro presidentes de

câmara que não são do PS: o Presidente da Câmara Municipal da Sertã não é do PS, a Presidente da Câmara

Municipal de Castanheira de Pera não é do PS, o Presidente da Câmara Municipal da Pampilhosa da Serra não

é do PS, o Presidente da Câmara Municipal de Penela não é do PS. Ou, pelo menos, não eram até o ouvirem a

si há bocadinho.

Risos e aplausos do PS.

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Sr. Deputado, quanto à EDP, não está em causa o pagamento pela EDP de mais dinheiro ao Estado. O que

a EDP pretende é recuperar do Estado aquilo que pagou, por conta de uma concessão, em que, entretanto,

manifestou ter interesse em não prosseguir. E o que o Estado entende é que, tendo a EDP manifestado o seu

desinteresse em prosseguir, não há razão à devolução do que pagou a título de sinal.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Negrão.

O Sr. Fernando Negrão (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, o senhor acaba de insultar quatro

ilustríssimos presidentes de câmara, dizendo que eles vagueiam de partido em partido, ao sabor daquilo que

vão ouvindo.

Risos e protestos do PS.

Não, Sr. Primeiro-Ministro, nem toda a gente é como V. Ex.ª.

O Sr. Adão Silva (PSD): — Muito bem!

Aplausos do PSD.

O Sr. Fernando Negrão (PSD): — Sr. Primeiro-Ministro, no âmbito do tema que aqui o trouxe, em 2009,

ficou estabelecido que era ilegal remover os filtros de partículas dos automóveis, porque a sua inalação

provocava e piorava as doenças de natureza respiratória ou cardiovasculares. Desde 2017 que há legislação

para estas situações, mas não foi devidamente regulamentada e, não o tendo sido, as inspeções não têm

capacidade para detetar estas situações.

Quando e o que pensa fazer para corrigir isto?

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Fernando Negrão, eu não insultei presidente de

câmara nenhum.

Vozes do PSD: — Insultou, insultou!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Se alguém os desconsiderou foi V. Ex.ª pois, após eu ter referido que tinha

reunido com sete presidentes de câmara dos territórios mais atingidos pelos incêndios de 17 de junho, disse

que eles eram todos do PS. Eu não acho que isso seja um insulto, mas é natural que tendo sido eleitos por outro

partido não gostem da forma como os desconsiderou.

Aplausos do PS.

Sr. Deputado, devo dizer-lhe, ainda, que não julgo ninguém, muito menos V. Ex.ª, pela evolução política que

cada um tem. Os últimos 40 anos da vida política portuguesa foram excessivamente intensos para se poder

exigir coerência a toda a gente ou para que alguém seja privado do direito a mudar as suas opiniões e a sua

visão do mundo.

Nunca censurei ninguém por isso e esteja tranquilo porque não censurarei. Mas, Sr. Deputado, há uma coisa

em que terá dificuldade, que é dizer a quem é militante do mesmo partido desde os 14 anos que tem mudado

ao sabor dos ventos. Nisso, de facto, não tenho mudado, Sr. Deputado.

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Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Tem, ainda, a palavra o Sr. Deputado Fernando Negrão.

O Sr. Fernando Negrão (PSD): — Sr. Presidente, tenho a tentação enorme de fazer um protesto à Mesa,

porque o Sr. Primeiro-Ministro não responde a uma única pergunta. Limita-se a insultar os seus interlocutores,

de quem não gosta.

Protestos do PS.

É isto que faz o Sr. Primeiro-Ministro, não faz mais nada! Não responde a uma única pergunta. É uma falta

de respeito para com o Parlamento!

O Sr. Adão Silva (PSD): — É verdade!

O Sr. Fernando Negrão (PSD): — Quanto aos aumentos da função pública, vou aqui fazer um pequeno

exercício de memória, que julgo será muito útil. Isto porque os senhores têm, por norma, boca de rico e deixam

para o PSD algibeira de pobre, para resolver os problemas.

Em outubro de 2008, em plena antecâmara da bancarrota, o Governo socialista, liderado pelo Eng.º José

Sócrates,…

A Sr.ª Marisabel Moutela (PS): — Já cá faltava!

O Sr. Fernando Negrão (PSD): — … anunciou, para 2009, o maior aumento dos últimos anos para a função

pública, que era de 2,9%.

Nessa altura, o Ministro das Finanças, Teixeira dos Santos, disse que esta proposta de aumento salarial em

ano de eleições se tratava, nas palavras de Teixeira dos Santos, de «uma mera coincidência, que nada tem a

ver com o facto de ser um ano com três atos eleitorais».

Sr. Primeiro-Ministro, veja-se a coincidência: estamos em 2019, o Sr. Primeiro-Ministro anuncia um aumento

significativo de vencimentos para a função pública, fá-lo em ano eleitoral, e em ano eleitoral onde há três atos

eleitorais.

A Sr.ª Elza Pais (PS): — Um já passou!

O Sr. Fernando Negrão (PSD): — Sr. Primeiro-Ministro, isto é uma mera coincidência?

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para responder, o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Fernando Negrão, em primeiro lugar, ao longo

desta Legislatura, cumprimos escrupulosamente, ano após ano, tudo com que nos tínhamos comprometido no

Programa do Governo, relativamente à Administração Pública: repor o vencimento que tinha sido cortado; repor

os subsídios que tinham sido cortados; e repor o horário de trabalho que, unilateralmente, o Estado tinha

alterado. E cumprimos ainda o desejo de, este ano, darmos um sinal de que poderíamos retomar a normalidade

na vida de todos os trabalhadores com uma atualização anual dos seus vencimentos.

Foi por isso que, apesar de termos uma verba muito limitada, de quase 50 milhões de euros, decidimos —

em vez de fazer um aumento igual para todos os funcionários públicos, desde o vencimento mais baixo ao

vencimento do Sr. Presidente da República —, concentrar-nos num aumento que fosse significativo na vida das

pessoas, isto é, concentrámo-nos no universo de rendimentos mais baixos no quadro da Administração Pública.

Assim, garantimos que os rendimentos mais baixos no quadro da Administração Pública, nestes quatro anos,

pudessem ter um aumento de 25,7%. E isto é um sinal muito importante também para o setor privado, para

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estimular e incentivar o setor privado a ter uma política remuneratória mais justa e a poder aumentar o

vencimento.

Isso tem, aliás, tido tradução não só no aumento do salário mínimo nacional, mas na contratação coletiva,

onde muitos contratos têm estado, felizmente, a ser fechados acima dos 600 € do salário mínimo nacional. E

isso é um sinal importante para a sociedade portuguesa, porque a sociedade portuguesa precisa de aumentar,

significativamente, o nível de rendimentos de todos os trabalhadores em Portugal, e também na Administração

Pública.

Em resposta à pergunta de um jornalista…

O Sr. Presidente: — Sr. Primeiro-Ministro, peço-lhe que conclua.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Vou concluir, Sr. Presidente.

Em resposta a um jornalista, tive ocasião de sinalizar que é indispensável que o Estado proceda a um

aumento significativo do quadro remuneratório dos seus técnicos superiores, sob pena de não ter capacidade

de concorrer com o setor privado na contratação dos recursos humanos mais qualificados.

Esse é um problema de Estado que temos de assumir e que tem de ser resolvido. Não, não é agora para as

eleições, mas tem de ser resolvido durante a próxima Legislatura, porque, senão, o Estado vai-se

desqualificando…

Protestos do Deputado do PSD Adão Silva.

… e um Estado desqualificado é um Estado fraco que, depois,…

O Sr. Presidente: — Sr. Primeiro-Ministro, tem de terminar.

O Sr. Primeiro-Ministro: — … não tem capacidade de enfrentar e gerir os poderes fortes com os quais tem

de lidar e que tem de saber regular.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para formular perguntas, a Sr.ª Deputada Catarina Martins.

A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Miguel Duarte foi voluntário de uma

embarcação que salva vidas no Mediterrâneo e a sua ação valeu-lhe um processo do Estado italiano que não

passa de uma farsa política da extrema-direita.

O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Muito bem!

A Sr.ª Catarina Martins (BE): — O Bloco reuniu esta manhã com Miguel Duarte, que nos deu conta de que

as missões civis de salvamento desapareceram por causa desta perseguição e de ameaças de processos e de

prisão aos ativistas.

É bom notar que os civis que, no Mediterrâneo, salvam vidas de forma altruísta o fazem sempre em

articulação com as entidades oficiais, nomeadamente as italianas. De facto, a missão de salvamento cabe aos

Estados, em primeira instância, e os civis só a assumem porque a União Europeia tem falhado.

Sr. Primeiro-Ministro, o Miguel Duarte e os seus companheiros não merecem processos judiciais mas, sim,

o nosso agradecimento, e é importante que o Estado português lhe preste todo o apoio que ele merece.

Julgamos também que este é o momento de remeter ao Estado italiano a expressão formal do nosso repúdio

por esta perseguição a todos quantos põem a humanidade em primeiro lugar.

Aplausos do BE.

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A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Sr. Primeiro-Ministro, escolheu o ambiente como tema deste debate e

saúdo-o por isso.

O Parlamento aprovou, recentemente, uma iniciativa do Bloco, recomendando ao Governo a declaração da

emergência climática. Esta não é uma questão simbólica, porque reconhecer a emergência climática é um

compromisso nacional e internacional, com passos concretos, mais rápidos, para a neutralidade carbónica.

Por isso mesmo, queria perguntar-lhe se o Governo irá cumprir a recomendação da Assembleia e declarar a

emergência climática e se tem coragem de acelerar o processo de encerramento das centrais de carvão.

O nosso País pode, e deve, substituir as centrais a carvão por energia solar e o objetivo deve ser o

encerramento das centrais de Sines e do Pego até 2023, para alcançar o objetivo de neutralidade carbónica até

2030.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para responder, o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Catarina Martins, o Governo nunca foi contactado

por Miguel Duarte. Soubemos do caso pela comunicação social e, naturalmente, asseguraremos todo o apoio,

diplomático e consular, tal como é devido a qualquer cidadão português, em qualquer tipo de circunstância.

Quanto ao mais, desconhecemos o caso, porque nunca nos foi transmitida qualquer informação por parte

desse cidadão.

Risos do Deputado do BE José Manuel Pureza.

Relativamente à questão climática, até agora só dois países fizeram essa declaração, a Irlanda e o Reino

Unido. São dois países que estão numa situação bem diferente da nossa, visto que estão francamente atrasados

relativamente aos níveis e aos compromissos que já atingimos.

Os nossos compromissos, e os resultados que temos alcançado e que estão programados, superam, em

muito, aqueles que resultam da declaração da emergência climática. No nosso caso concreto, não teria uma

consequência real, teria uma consequência puramente retórica. Ora, devemos concentrar-nos naquilo que é real

e prosseguir o que temos vindo a fazer.

Neste momento, já temos uma incorporação de 26% de energias renováveis no que consumimos, temos

uma meta clara para 2020, temos uma meta clara para 2040, somos o primeiro País a assumir a neutralidade

carbónica em 2050, somos o primeiro País a ter um roteiro para a neutralidade carbónica, e isto, sim, é agir com

emergência relativamente à necessidade de enfrentar as alterações climáticas.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Continua no uso da palavra a Sr.ª Deputada Catarina Martins.

A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, os dados científicos dizem-nos que o

processo de caos climático está a acelerar e, por isso, é urgente antecipar as metas.

Com o clima não podemos negociar e, portanto, temos de agir, e já. Por isso mesmo, o Bloco proporá ao

Parlamento que declare, autonomamente, a emergência climática e esperamos que essa declaração seja um

compromisso de ação.

Não basta apelar a comportamentos individuais conscientes, é preciso a coragem da reconversão energética.

Vozes do BE: — Muito bem!

A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Sr. Primeiro-Ministro, o Partido Socialista anunciou a intenção de aumentar

os salários nos quadros superiores da função pública.

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O Bloco de Esquerda compreende a preocupação. Os trabalhadores qualificados e com funções dirigentes

no Estado ganham menos do que no privado e é, de facto, necessário que o Estado consiga manter os seus

profissionais mais qualificados. Mas esse é apenas um dos problemas que temos.

Há, no Estado, muitos trabalhadores qualificados que ganham pouco, tão pouco que a emigração tem sido

o caminho para muitos. Veja-se o que acontece com os enfermeiros, por exemplo. E há muitos trabalhadores

que, não tendo qualificações muito grandes, têm grandes responsabilidades e salários baixos demais. É o caso

das forças de segurança, por exemplo.

O problema salarial não é, pois, só entre os mais qualificados, mas também não é só entre os trabalhadores

do Estado.

No setor privado, em Portugal, a generalidade dos trabalhadores qualificados ganha muito pouco. O aumento

do salário mínimo — que, em boa hora, ficou no acordo que ambos subscrevemos há quatro anos — foi

generalizado, mas não é difícil encontrar engenheiros e arquitetos a ganhar bem abaixo dos 1000 €. Os salários

em Portugal são muito baixos.

O salário médio é cada vez mais próximo do salário mínimo e, por isso, hoje, queria falar-lhe dos

trabalhadores do privado.

Sr. Primeiro-Ministro, os trabalhadores merecem mais salário e mais segurança e só isso pode garantir, em

Portugal, um projeto de futuro, para que a emigração deixe de ser um destino forçado.

O primeiro passo pode ser dado já, sem esperar pelas eleições. Estão em votação, em sede de especialidade,

as alterações ao Código do Trabalho. Para valorizar o trabalho no setor privado é preciso acabar com a

caducidade unilateral dos contratos coletivos e repor o princípio do tratamento mais favorável, é preciso aprovar

as propostas do Bloco para que os trabalhadores do privado tenham o mesmo direito ao subsídio de alimentação

que os do público e acabar com a perversão, introduzida em 2012, de as horas extra serem mais baratas do

que as horas em período normal de trabalho.

Não espere pela próxima Legislatura, faça a lei do trabalho com a esquerda.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para responder, o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada, como disse há pouco, não nos limitámos a aprovar

o roteiro para a neutralidade carbónica, aprovámos também o programa de ação para adaptação às alterações

climáticas, que tem um conjunto de medidas concretas devidamente programadas e com um quadro de

financiamento claro.

É isso que vamos fazer, tal como temos vindo a fazer. Não foi por acaso que, logo no início deste Governo,

atribuímos ao Ministério do Ambiente a competência em matéria de transportes urbanos e não foi por acaso

que, agora, alargámos a competência do Ministério do Ambiente para assumir também, pela primeira vez, a

área da energia. Estas são duas componentes fundamentais para a condução da política ambiental, mobilidade

e energia, e é por isso que estão no Ministério do Ambiente.

É essa trajetória que temos de prosseguir, com firmeza, compreendendo que a medida dos passes é uma

medida socialmente muito importante mas ambientalmente indispensável para termos um novo paradigma de

mobilidade.

Partilho consigo a visão de que os salários são uma questão-chave em Portugal e tenho dito, aliás, repetidas

vezes, que as empresas têm de compreender que, se querem ser competitivas a exportar, têm de começar por

ser competitivas a recrutar.

Não podemos continuar a ter um desnível salarial tão significativo relativamente a outras economias

europeias com quem concorremos, sob pena de, por mais que haja postos de trabalho a serem criados, por

melhores que sejam as condições de vida em Portugal, não deixarmos de sofrer uma sangria dos nossos

quadros.

Ao contrário daqueles que achavam que era uma boa solução para o País que houvesse essa emigração,

entendemos que é uma boa solução para o País atrair investimento e fixar os melhores recursos humanos que

temos para ajudar a desenvolver o País, ajudando mesmo aqueles que partiram e querem voltar a terem

melhores condições para poderem voltar.

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Portanto, não será neste Governo que encontrará, alguma vez, qualquer restrição — pelo contrário! — a que

avancemos numa política salarial de maior ambição. E acho também que talvez seja a altura de, além de

falarmos de salários mínimos, começarmos a falar, em sede de concertação social, de outros níveis de

remuneração, designadamente para os recursos qualificados. Não é possível continuarmos a dar uma

mensagem negativa aos jovens que estão nas nossas universidades relativamente ao seu futuro. Não é

admissível a continuidade da prática dos estágios que é seguida, designadamente, por grandes empresas. Não

são admissíveis os níveis remuneratórios que vêm a ser pagos por essas grandes empresas. Não é admissível

a disparidade salarial gritante que existe em algumas dessas grandes empresas.

O que estou a dizer aqui já o disse, aliás, em público, e já fui muito atacado pela direita e por esse coro de

comentadores profissionais que esgotam e neutralizam o pluralismo da comunicação social em Portugal,

dizendo que era o que faltava ao Governo ter de opinar sobre a questão remuneratória nas empresas privadas.

Mas, sim, temos mesmo de opinar, pela razão essencial que o que se passa nas empresas privadas não é algo

que se passe fora da nossa sociedade e tudo o que diz respeito à sociedade diz respeito ao Governo, diz respeito

à política e temos de ter políticas que deem resposta a esta realidade.

É que o que está em causa não são só essas empresas, não são só essas pessoas, é mesmo o

desenvolvimento do futuro do País e os recursos humanos que o País investiu na sua formação, que não se

pode dar ao luxo de perder porque as empresas não compreendem a essencialidade de preservarem o melhor

capital humano que podem ter ao seu serviço.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Continua no uso da palavra a Sr.ª Deputada Catarina Martins.

Faça favor, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, não basta apelar às empresas, temos

de ter uma legislação laboral que puxe os direitos e os salários para cima.

O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Claro!

A Sr.ª Catarina Martins (BE): — É um erro diminuir direitos com o aumento de contratos laborais de curta

duração e do período experimental, como os patrões querem e como o Governo está a propor no Parlamento.

O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Exatamente!

A Sr.ª Catarina Martins (BE): — É um erro acabar a Legislatura sem tirar a troica da legislação laboral e é

um erro que esta Legislatura acabe com o Governo a aprovar uma lei do trabalho de braço dado com o PSD.

O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Muito bem! Exatamente!

A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Sr. Primeiro-Ministro, daqui a pouco será votada, na especialidade, a Lei

de Bases da Saúde. O PS sabe desde sempre que não terá a ajuda do Bloco de Esquerda para uma lei que

autoriza a lógica da privatização do SNS através da gestão de hospitais públicos por grupos financeiros privados.

O PS já nos disse que se recusa a garantir na nova Lei de Bases a gestão pública dos hospitais públicos,

mas, Sr. Primeiro-Ministro, não pode impor a aceitação das PPP como condição de aprovação da nova lei.

O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Muito bem!

A Sr.ª Catarina Martins (BE): — O Bloco de Esquerda já propôs uma solução para este impasse:

revoguemos a lei atual e deixemos a próxima legislatura decidir se esta porta deve ser deixada aberta aos

privados. Essa é a nossa proposta, daqui a pouco, no grupo de trabalho.

Disse-me aqui, há 15 dias, que o negócio das PPP é coisa pouca. Eu não concordo, mas se pensa assim

não deixe que tão pouca coisa faça cair o trabalho deste ano.

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O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Isso mesmo!

A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Aprovar uma lei de bases que proteja o Serviço Nacional de Saúde e o

acesso aos cuidados de saúde é mais importante do que impor, nesta lei, a vontade do Grupo Mello.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

Faça favor, Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Catarina Martins, se queremos uma nova

legislação do trabalho, então, não hesitem em votar a proposta de lei do Governo, que restringe definitivamente

o acesso à precariedade na relação de trabalho,…

Aplausos do PS.

… que deixa de permitir que ser jovem à procura do primeiro emprego seja fator de contrato a prazo, reduz

o número de renovações, reduz o número de anos em contrato a prazo e pune as empresas que abusam do

contrato a prazo.

De uma vez por todas, Sr.ª Deputada, seja coerente: se quer combater a precariedade aprove a proposta de

lei do Governo.

Aplausos do PS.

Sr.ª Deputada, sobre a Lei de Bases da Saúde, também não vale a pena confundir o essencial com o

acessório.

O Sr. José Manuel Pureza (BE): — É verdade!

O Sr. Primeiro-Ministro: — O essencial é muito simples: revogar a lei de 1990, que atribui ao Estado o dever

de promover o setor privado para ser concorrente do Estado. Se quer acabar com isto aprove hoje uma lei de

bases da saúde!

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Catarina Martins.

A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, se uma empresa pode ter, por um

período experimental cada vez mais longo, um jovem que é despedido no fim, sem indemnização sequer, para

depois pôr outro, há mais precariedade.

Os jovens não são descartáveis e nunca o voto do Bloco de Esquerda está numa lei que terá mais

precariedade.

Aplausos do BE.

Sobre a saúde, deixe-me dizer-lhe uma coisa: o essencial está no legado que nos deixaram António Arnaut

e João Semedo, universalidade. Demos o passo nas taxas moderadoras e no fim da promiscuidade com o setor

privado, e é por isso que é importante a decisão sobre as PPP. Se não estamos de acordo, que fique para a

próxima legislatura, mas agora defendamos uma lei de bases da saúde que dá passos. E nós estaremos cá até

ao último dia para os dar.

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O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Custa-vos! É natural!…

A Sr.ª Catarina Martins (BE): — É o Partido Socialista que, neste momento, tem de fazer escolhas que

definam o futuro que quer. Quer aprovar uma lei do trabalho com a direita e não com a esquerda? Quer deitar

abaixo o trabalho de uma lei de bases para manter a lei de bases da saúde da direita e não termos uma lei de

bases que salve o Serviço Nacional de Saúde?

Essas são as perguntas que se colocam ao Partido Socialista e são essas que vão ser respondidas neste

final de Legislatura.

Do Bloco de Esquerda toda a gente sabe: estamos aqui até ao último dia, até ao último momento, para a

melhor solução possível, para melhorar, no concreto, a vida das pessoas. Nunca faremos o contrário do que

dissemos que faríamos.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

Faça favor, Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Catarina Martins, é muito simples: manterá em

vigor a lei de bases que a direita aprovou em 1990 quem chumbar, em votação final global, a lei de bases que

vai ser votada nesta Assembleia da República.

Aplausos do PS.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Exatamente! Essa é que é essa!

O Sr. José Manuel Pureza (BE): — É exatamente isso!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Há uma coisa de que tenho a certeza: o Governo apresentou uma proposta de

lei de bases que revoga a Lei de Bases de 1990…

O Sr. José Manuel Pureza (BE): — O Bloco de Esquerda também!

O Sr. Primeiro-Ministro: — … e espero que todos os partidos que viabilizaram a atual solução política não

deixem de contribuir para aprovar uma lei de bases da saúde que revoga a de 1990.

Não vale a pena querer esvaziar a proposta com numa única base, não vale a pena fingir que essa lei de

bases diz o que dizia a Lei de Bases de 1990,…

O Sr. José Manuel Pureza (BE): — É o que vocês estão a fazer!

O Sr. Primeiro-Ministro: — … porque a de 1990 nem sequer falava de PPP, que nessa data não tinham

sido, sequer, inventadas.

O que a Sr.ª Deputada não quer votar é uma redação que diz o seguinte:…

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Ora vamos lá ver!…

O Sr. Primeiro-Ministro: — … «A gestão dos estabelecimentos do Serviço Nacional de Saúde é pública,

podendo, a título excecional, supletivo e temporário, ser objeto de contratação de direito público».

É isto que a Sr.ª Deputada não quer votar!

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Peço-lhe para concluir, Sr. Primeiro-Ministro.

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O Sr. Primeiro-Ministro: — E é por não querer votar esta norma, que afirma claramente a natureza pública

da gestão do Serviço Nacional de Saúde, que a Sr.ª Deputada quer pôr em risco o manter em vigor uma lei onde

não só não diz isto como diz o contrário, diz que é função do Estado promover o privado e promover a

concorrência entre o privado e o público.

O Sr. Presidente: — Tem mesmo de concluir, Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — É isso que a Sr.ª Deputada se prepara para fazer e, se a lei de bases chumbar,

a responsabilidade é exclusivamente sua e do seu grupo parlamentar.

Aplausos do PS e do Deputado não inscrito Paulo Trigo Pereira.

O Sr. Presidente: — É a vez do Grupo Parlamentar do CDS-PP.

Tem a palavra a Sr.ª Deputada Assunção Cristas.

A Sr.ª Assunção Cristas (CDS-PP): — Sr. Presidente, o Sr. Primeiro-Ministro trouxe-nos, e ainda bem, o

tema do ambiente e das alterações climáticas e falar de alterações climáticas, em Portugal, significa falar de

forma particularmente exigente no que toca à sua adaptação, porque sabemos que o nosso País é dos mais

expostos, a nível mundial e europeu, naturalmente, às alterações climáticas.

Ontem sinalizou-se o Dia do Combate à Seca e Desertificação e os dois temas estão profundamente ligados.

Onde há seca o território degrada-se e as pessoas saem, procurando outros espaços.

Ora, contrariar a desertificação implica muitas políticas públicas articuladas, evidentemente, e foco

particularmente duas: primeiro, é preciso cuidar do território, encontrar formas de reter e formas de prover água,

para que não seja votado ao abandono, tal como é preciso valorizar as pessoas que ficam nesse território, que

cuidam dele, ou que a ele querem voltar e instalar-se.

No primeiro caso, estamos a falar de apoiar a agricultura, apoiar a floresta, pagar os serviços dos

ecossistemas. Aliás, tomei boa nota do que referiu e, já agora, pergunto-lhe se o Governo está ou não disponível

para que uma parte da taxa de carbono financie a floresta enquanto grande sumidouro de carbono que é.

Implica também apoiar a agricultura e pergunto-lhe se está ou não disponível para aumentar o

cofinanciamento nacional para o máximo permitido pelos regulamentos comunitários no PDR 2020 (Programa

de Desenvolvimento Rural 2014-2020) e nos fundos seguintes, mas implica ainda garantir uma política de

investimentos na água, a qual vai desde charcas a barragens, enfim, uma política pensada para este domínio,

e também ao estudo da dessalinização. O que tem o Governo a dizer sobre isto?

No segundo caso, implica olhar para as pessoas que se fixam e cuidam do território e aquelas que podem ir

para o território. Entendemos que é preciso ser disruptivo em matéria fiscal.

No CDS, defendemos — já o defendemos aqui e continuaremos a defender — que quem habita o interior do

País deve pagar metade da taxa de IRS, deve ter desconto nas portagens e nos outros custos de transporte, tal

como as empresas devem pagar apenas 10% de IRC e ter majorações em todos os apoios ao investimento.

Pergunto-lhe, Sr. Primeiro-Ministro, se está ou não disponível para negociar em Bruxelas a criação de um

verdadeiro estatuto de benefício fiscal para o interior.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Assunção Cristas, até agora, temos adotado um

conjunto de medidas de exceção e atração de investimento para as zonas de baixa densidade, que é, aliás, a

forma essencial de criar emprego e, assim, atrair e fixar população.

Foi assim que, no quadro da reprogramação do Portugal 2020, dos novos 5000 milhões de euros de apoio à

modernização empresarial, 1700 milhões de euros foram reservados para os territórios de baixa densidade. No

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primeiro concurso que foi lançado ao abrigo deste regime, 43% dos apoios ao investimento foram, precisamente,

para os territórios de baixa densidade, o que demonstra bem que é esse o caminho certo por que estamos a ir.

Terá reparado também que nos últimos dois orçamentos do Estado introduzimos um conjunto de medidas

de discriminação positiva em sede de IRC para o reinvestimento, precisamente nas zonas do interior.

Quanto à questão da seca, temos procurado adotar medidas de fundo e, por isso, aprovámos um Programa

Nacional de Regadio, fomos negociar com o Banco Europeu de Investimento a criação de uma linha de

financiamento própria para permitir alargar não só a zona do Alqueva, em mais 50 000 hectares, como também

alargar ao resto do País, com a criação de mais 40 000 hectares de zona de regadio. E preocupámo-nos também

em limitar a zona de expansão do eucalipto, que, como sabe, tem um efeito bastante desertificador e a legislação

que anteriormente liberalizava a sua plantação tinha um efeito particularmente negativo. Felizmente, essa

legislação hoje está revogada, a sua plantação está controlada e o acesso à água e a promoção do regadio está

facilitada.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Assunção Cristas, do Grupo Parlamentar do CDS-PP.

A Sr.ª Assunção Cristas (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, noto que o senhor começou o

seu mandato a falar da expansão do Alqueva em 50 000 hectares, termina a falar da expansão do Alqueva em

50 000 hectares e não fez um único hectare de regadio. É por isso que fico preocupada, porque ouço falar de

planos e projetos mas não vejo nada, efetivamente, concretizado.

Sr. Primeiro-Ministro, o pouco que fez em matéria de regadio estava planeado de trás e continuo a não ver

os planos daqui para a frente!

Mas queria dizer-lhe que não é só a questão do regadio eficiente que nos preocupa, é também, por exemplo,

a questão do abastecimento de água às populações, são os empreendimentos de fins múltiplos.

No ano passado, Sr. Primeiro-Ministro, em Portugal, Viseu ficou sem água e teve de ser abastecida por

camiões-cisterna; ao mesmo tempo, a Cidade do Cabo, na África do Sul, vivia completamente uma situação de

seca. É disto que estou a falar, de um planeamento a sério a pensar nas várias dimensões, assumindo que o

clima mudou e que, por muito que devamos e possamos fazer, já temos essas consequências hoje e, portanto,

temos de nos adaptar a este clima, nomeadamente olhando para temas como barragens, charcas,

empreendimentos de fins múltiplos, irrigação certamente, e também dessalinização. Era sobre isso que gostava

de ver ação, mais ação — e, do lado do CDS, terá certamente esse impulso.

Já agora, em relação às questões fiscais, tomo boa nota de que é a resposta que tem dado sempre nas

discussões dos Orçamentos do Estado, mas que é curta para as necessidades. Por isso, nós, no CDS,

continuaremos a bater-nos por um verdadeiro estatuto de benefício fiscal para o interior, com metade da taxa

do IRS, 10% em IRC, desconto nas portagens e noutros tipos de transporte, majorações para os investimentos,

entre outras coisas, porque achamos que o caminho será certamente por aí.

Mas, Sr. Primeiro-Ministro, passando a um outro tema, porque o tempo vai diminuindo, devo dizer que

assistimos, há bem pouco tempo — aliás, já tive oportunidade de o sinalizar aqui —, a uma clara violação do

princípio constitucional da proporcionalidade na atuação da Autoridade Tributária e Aduaneira (AT). O princípio

da proporcionalidade está previsto na Constituição, está previsto na lei, mas o CDS entende que o mesmo deve

ser densificado na própria lei, para garantir que não voltarão a ocorrer situações como aquelas a que

lamentavelmente tivemos oportunidade de assistir.

Sr. Primeiro-Ministro, temos várias propostas neste domínio. A minha pergunta é no sentido de saber se

concorda com a necessidade de reforçar e de verter em lei as garantias dos contribuintes.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Assunção Cristas, admito que estivesse muita

coisa planeada, mas a verdade é que não havia recursos para fazer o que quer que fosse.

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Vozes do CDS-PP: — Ah!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Foi por isso que tivemos necessidade de estabelecer uma negociação com o

Banco Europeu de Investimento (BEI) e de vencer a resistência do Banco Europeu de Investimento ao

financiamento de mecanismos de regadio, porque havia dúvidas ambientais, muito próprias do norte da Europa,

sobre a importância do regadio. Felizmente, foi possível sensibilizar e convencer o BEI e assinar com o BEI um

contrato que vai permitir financiar 90 000 novos hectares de área de regadio.

Relativamente ao Alqueva, há vários blocos que já estão abertos e em obra, desde que iniciámos as nossas

funções. Mas chamo a sua atenção para que, há 15 dias, em reunião com os presidentes de câmara do distrito

de Portalegre, chegámos a acordo para avançar com um projeto que, há décadas, era discutido — há 63 anos

que era discutido —, para o qual foi, finalmente, encontrado um modelo de sustentabilidade, que foi o de permitir

a construção da barragem do Fridão, de forma a assegurar… Peço desculpa, queria dizer da barragem do Pisão,

mas foi por simpatia com o Sr. Deputado Fernando Negrão que fiz esta confusão.

O Sr. Adão Silva (PSD): — Sim, sim!

O Sr. António Costa Silva (PSD): — Fugiu-lhe a boca para a verdade!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Como dizia, foi possível avançar com a barragem do Pisão, que vai permitir,

relativamente ao norte alentejano, ter um impacto semelhante ao que o Alqueva teve no Baixo Alentejo. E é com

medidas dessas que podemos fazer a transformação.

Quanto a atuações desproporcionadas da Autoridade Tributária e Aduaneira, estamos totalmente de acordo,

quer quanto a atuações casuísticas como esta, que teve a resposta devida, e no próprio dia, por parte do Sr.

Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, quer do ponto de vista legislativo. Foi por isso que uma das nossas

prioridades nesta Legislatura foi acabar com essa medida tão desproporcionada para os contribuintes que era

a penhora da casa de morada de família por dívidas fiscais. Foi pena que a Sr.ª Deputada, enquanto teve o

pelouro da habitação, não tivesse tido o carinho de assegurar que essas famílias também não fossem vítimas

da atuação desproporcionada do fisco, que, para cobrar uma dívida fiscal, lhes retirava a própria casa de morada

de família.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Continua no uso da palavra a Sr.ª Deputada Assunção Cristas.

Faça favor, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Assunção Cristas (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, tomo boa nota de que, pela

quarta vez, anuncia a construção da barragem do Pisão. Cá estaremos para ver se ela vai ser…

O Sr. Primeiro-Ministro: — Não, não!

A Sr.ª Patrícia Fonseca (CDS-PP): — É, é! É a quarta vez!

A Sr.ª Assunção Cristas (CDS-PP): — É, sim, a quarta vez que o Governo anuncia a construção da

barragem do Pisão. E também vem anunciando, desde há quatro anos, sistematicamente, mais 50 000 ha

regados por Alqueva. Olhe, eu, em quatro anos, consegui fazer 70 000 ha em Alqueva — eu não, o Governo de

que fiz parte —, e foi obra feita, não foi obra anunciada!

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. António Costa Silva (PSD): — Este Governo nem uma charca fez!

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A Sr.ª Assunção Cristas (CDS-PP): — Mas, Sr. Primeiro-Ministro, espero que seja igualmente possível

construir a barragem do Alvito, que é outra barragem muitíssimo necessária não só para a agricultura mas

também para fins múltiplos.

Em relação às garantias dos contribuintes, Sr. Primeiro-Ministro, espero que as várias propostas que o CDS

virá apresentar nesta Casa tenham, depois, a genuína e entusiasmada votação favorável e o apoio por parte do

Partido Socialista.

Sr. Primeiro-Ministro, deixe-me terminar com mais uma pergunta sobre algo que nos preocupa e que tem a

ver com os dados sobre a economia portuguesa. Continuamos a olhar para sinalizações que são preocupantes.

Aquilo que é adiantado pelo indicador mais avançado e mais sofisticado da OCDE é que a economia portuguesa

tem um crescimento abaixo do registado na própria União Europeia. Ora, é nosso entendimento que precisamos

urgentemente de baixar impostos.

Sr. Primeiro-Ministro, temos uma carga fiscal máxima, precisamos de baixar impostos sobre as pessoas e

sobre as empresas. Precisamos de estimular o investimento. Já agora, posso até sugerir-lhe áreas específicas

em que isso pode e deve acontecer. Por exemplo, a área do ambiente e a adaptação às alterações climáticas é

uma delas; a área da economia azul é certamente outra; e a área relacionada com a transição digital é ainda

uma outra.

Se queremos reter pessoas, atrair outras e captar investimento, é preciso baixar impostos, Sr. Primeiro-

Ministro!

A minha pergunta é muito simples: vai, ou não, baixar impostos? Compromete-se, ou não, com esse objetivo,

que é essencial, na visão do CDS, para podermos ter uma economia a funcionar?

O Sr. Presidente: — Queira terminar, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Assunção Cristas (CDS-PP): — Já agora, Sr. Primeiro-Ministro, uma vez que gosta de discutir com

o Bloco de Esquerda as questões da Lei de Bases da Saúde, gostaria de lhe perguntar se já pensou melhor na

proposta que o CDS apresentou aqui, no último debate quinzenal,…

O Sr. Presidente: — Tem de terminar, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Assunção Cristas (CDS-PP): — … para resolver o problema concreto das pessoas que estão há

anos à espera da primeira consulta de especialidade e de a poderem fazer em tempo útil, se não no SNS, no

setor privado ou social.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Assunção Cristas, quanto ao regadio, o que

contratámos com o BEI foi um empréstimo de 540 milhões de euros, que felizmente teve uma excelente procura.

Há 200 candidaturas em apreciação e que permitirão realizar mais 90 000 ha de regadio, em Portugal, parte, no

Alqueva, e 40 000 ha, no resto do País.

Protestos da Deputada do CDS-PP Patrícia Fonseca.

E está enganada, Sr.ª Deputada, não anunciámos nada pela quarta vez sobre a barragem do Pisão. É

verdade que, ao longo destas décadas, houve muitos Governos a fazer esse anúncio. Nós só o fizemos quando

tivemos a certeza de que esse investimento era sustentável. E ele é sustentável, precisamente porque aquilo

que conseguimos obter, através da rega, é possível obter, a um preço idêntico àquele que é praticado pela EDIA

(Empresa de Desenvolvimento e Infraestruturas do Alqueva) no Alqueva, através não da produção de energia

por via hidráulica, mas da produção de energia por via solar.

Foi por essa forma que conseguimos encontrar o equilíbrio financeiro que nos permite dizer que este é um

investimento sustentável e que pode dar um contributo muito importante para o Alto Alentejo.

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Relativamente ao futuro da economia portuguesa, creio, com toda a franqueza, que temos boas razões para

estar confiantes na sua trajetória. Não foi só em 2017 e 2018 que voltámos a crescer acima da média europeia,

como já não acontecia desde que aderimos ao euro; em 2019, continuamos a crescer acima da média europeia

e, ainda hoje, vi, com satisfação, que presumo que partilhe também, um estudo de uma consultora internacional,

neste caso, da Ernst & Young, sobre a atratividade internacional dos diferentes países relativamente ao

investimento direto estrangeiro, que sinaliza Portugal como sendo um dos países que, na União Europeia,

continua a ser mais atrativo para o investimento. E o investimento é a chave da modernização da economia, da

criação de emprego e de mais e melhor emprego e do nosso crescimento económico.

É por aí que temos de seguir e é por aí que vamos continuar a seguir.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Cabe, agora, ao Grupo Parlamentar do PCP formular perguntas ao Sr. Primeiro-

Ministro.

Tem a palavra, para o efeito, o Sr. Deputado Jerónimo de Sousa.

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, sendo este o último debate

quinzenal da Legislatura, não desperdiçaremos esta oportunidade para que deste debate possam sair ainda

novas medidas positivas para os trabalhadores e o povo.

Por isso, antes de entrar no tema escolhido para o debate, quero questioná-lo sobre uma matéria que

continua a marcar as preocupações dos portugueses. Refiro-me, no caso concreto, à saúde.

O PCP tem sublinhado que, para lá da discussão da Lei de Bases da Saúde, há um conjunto de medidas de

reforço do Serviço Nacional de Saúde (SNS) que devem ser tomadas e que não estão dependentes daquela

discussão.

Mantemos a opinião de que é indispensável e imperioso mudar a Lei de Bases da Saúde e clarificar, sem

ambiguidades, a separação entre o setor público e o setor privado.

É necessário inscrever na Lei de Bases da Saúde o princípio da gestão pública do SNS, para não enfraquecer

a resposta pública, para defender os utentes, a boa utilização dos dinheiros públicos e o próprio SNS, em vez

de favorecer os grandes grupos monopolistas que operam no setor da saúde.

Mas, enquanto essa discussão continua a ser feita, é preciso tomar medidas urgentes para responder aos

problemas que se acumulam.

Recentemente, voltámos a ter notícias de maternidades encerradas por falta de médicos, designadamente

em Beja e no Algarve. O problema não é novo e o Orçamento do Estado prevê até uma resposta por via do

reforço do número de vagas para fixação de médicos em zonas carenciadas.

O que é que falta para o Governo resolver este problema, concretizando o que está previsto no Orçamento

do Estado?

O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — E perguntamos o mesmo em relação à garantia de médico de família a

todos os utentes, ao plano de investimento nos hospitais, ao alargamento do Programa Nacional de Vacinação,

ao reforço de profissionais do INEM, à criação das Equipas de Saúde Mental Comunitária (ESMC) ou à

contratação de profissionais de saúde para pôr fim à subcontratação de empresas.

Todas essas medidas estão previstas no Orçamento do Estado aqui aprovado. Perguntamos, Sr. Primeiro-

Ministro: quando é que o Governo as vai concretizar?

Vozes do PCP: — Muito bem!

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Nós costumamos usar a seguinte expressão: «Avançar é preciso! Andar

para trás não». Não venha com qualquer argumento que o contrarie, pois andar para trás, outra vez, não, não

estamos de acordo. Penso que é possível avançar nesta matéria, tendo em conta a própria Lei do Orçamento

do Estado que está em vigor.

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Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Jerónimo de Sousa, concordo em 100% consigo.

Primeiro, quanto à Lei de Bases da Saúde, fundamental é alterá-la e afirmar claramente a separação entre

o setor público e o setor privado. E isso é feito revogando a lei que diz que é função do Estado promover o setor

privado como concorrencial do público. É assim que avançamos também, melhorando a acessibilidade e

restringindo a cobrança das taxas moderadoras. É assim que fazemos também, criando melhores condições

para a exclusividade no Serviço Nacional de Saúde. E é assim que avançamos também, afirmando claramente

o princípio da gestão pública em todos os estabelecimentos do Serviço Nacional de Saúde. Estamos de acordo

quanto a isso.

Mas também estamos de acordo quanto a outra coisa. Mais do que alterar a Lei de Bases, é preciso mudar

a base da vida do dia a dia das pessoas e do funcionamento do Serviço Nacional de Saúde. É por isso que,

desde o primeiro dia da Legislatura, temos vindo a trabalhar para recuperar os 1300 milhões de euros que tinham

sido cortados na Legislatura anterior e que conseguimos recuperar. Isto, para termos, hoje, mais 11 000

profissionais no Serviço Nacional de Saúde do que tínhamos no início desta Legislatura. Para dar execução ao

artigo 45.º da Lei do Orçamento do Estado e ao decreto-lei de execução orçamental, um despacho recentemente

publicado vai permitir reforçar o número de médicos especialistas, o número de enfermeiros, o número de

técnicos superiores de diagnóstico e terapêutica, de forma a diminuir a contratação externa.

Posso também dizer-lhe que, com a conclusão do concurso para as 400 vagas para médicos de medicina

geral e familiar, se todos os candidatos aceitarem as posições em que ficam, conseguiremos atingir não 100%

mas um número de 98% de portugueses com médico de família.

Aplausos do PS.

Isto significa a maior redução de sempre de portugueses sem médico de família.

É nesse sentido que temos de continuar a trabalhar, porque também temos consciência de que não basta

abrir vagas, é necessário que as vagas sejam suficientemente atrativas para que haja um número de candidatos

suficiente e elas possam ser totalmente preenchidas.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Continua no uso da palavra o Sr. Deputado Jerónimo de Sousa, do Grupo Parlamentar

do PCP.

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, entenda isto como sendo, de facto,

uma preocupação de fundo: há verbas inscritas no Orçamento para responder a problemas que aqui referi e a

dificuldade está na sua efetivação.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!

O Sr. Adão Silva (PSD): — É, é! O Orçamento é bom, o Governo é que é mau!…

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Há verbas para resolver os problemas dos utentes, das pessoas que

estão, neste momento, a sofrer com as dificuldades do Serviço Nacional de Saúde.

Tome isto como um sentimento profundo de quem conhece a realidade, porque, naturalmente, o Serviço

Nacional de Saúde defende-se, em primeiro lugar, dando resposta aos portugueses, às pessoas, aos doentes.

Aplausos do PCP.

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Sr. Primeiro-Ministro, o tema do ambiente e do ordenamento do território é oportuno. No plano das

preocupações ambientais, insistimos nas medidas para concretizar e alargar a redução dos custos dos passes

dos transportes. Esta é, de facto, a medida de maior impacte ambiental tomada nas últimas décadas e deve ir o

mais longe possível na sua concretização e alargamento.

É preciso que esta medida seja uma realidade em todo o território nacional e que as várias soluções para a

redução do preço e alargamento da oferta se concretizem. É preciso investimento no material circulante, na

infraestrutura ferroviária, nos barcos e também na contratação dos trabalhadores em falta nas empresas

públicas de transportes.

Perguntamos-lhe: qual é o ponto da situação nesta matéria?

Também em relação ao ordenamento do território, queremos deixar aqui a nossa preocupação quanto a um

problema central, o das pessoas que fazem falta para ocupar e ordenar o território.

Agora que passam dois anos dos incêndios de Pedrógão, é decisivo que se questione o que mudou neste

mundo rural, que ardeu, sobretudo, por estar abandonado e despovoado. Que medidas foram tomadas, que

investimento foi feito pelo Governo para que as vilas e aldeias do nosso mundo rural não continuem desabitadas,

para que os territórios não continuem ao abandono? Sem pessoas, sem atividade económica, sem investimento

e sem serviços públicos não há mundo rural que resista nem há ordenamento do território digno desse nome.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Muito bem!

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Para terminar, Sr. Primeiro-Ministro, queremos ainda questioná-lo sobre

a decisão do Governo de comprar a rede SIRESP (Sistema Integrado de Redes de Emergência e Segurança de

Portugal) por 7 milhões de euros.

O PCP defende o controlo público do SIRESP e o fim da parceria público-privada (PPP), mas temos muitas

dúvidas de que este negócio que o Governo encontrou defenda o interesse público.

O PCP sempre defendeu que a rede de comunicações de emergência nunca deveria ser submetida à lógica

do lucro e entregue a grupos económicos. A segurança dos portugueses não pode ser um negócio, tem de ser

uma responsabilidade assumida pelo Estado e pela qual o Estado responda.

O preço que o País pagou por essa PPP está à vista nas consequências dramáticas das falhas do SIRESP

nos incêndios de 2017, mas está também à vista nos 487 milhões de euros pagos pelo Estado por uma rede

que custa 85 milhões a montar.

Como é que o Governo justifica ir agora comprar a parte dos grupos económicos nesta PPP, entregando-

lhes mais 7 milhões de euros, depois de tudo o que já ganharam com uma rede que deixaram obsoleta?!

Que responsabilidades pelas falhas do SIRESP no incêndio de 2017 pediu o Governo aos grupos

económicos que beneficiaram do chorudo negócio que foi esta PPP?!

Quem vai assumir o investimento que é preciso fazer para que a rede de comunicações de emergência

funcione em condições?

Eram estas as questões e preocupações que lhe queríamos deixar.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro António Costa, para responder.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Jerónimo de Sousa, partilhamos exatamente das

mesmas preocupações no âmbito da saúde, não só quanto ao reforço dos recursos mas também quanto aos

resultados alcançados. É por isso que vemos com satisfação que, hoje, temos mais 190 000 consultas nos

cuidados primários, mais 140 000 consultas nas unidades hospitalares e mais cirurgias do que tínhamos

anteriormente, ou seja, estamos a conseguir recuperar o tempo perdido.

Tínhamos, no início deste ano, cerca de 100 000 consultas em atraso. Até agora já foi recuperada uma parte

significativa e o objetivo que temos é o de uma recuperação total até ao final do ano.

Mas, como o Sr. Deputado sabe, e no setor dos transportes isso é particularmente evidente, a recuperação

do grau de destruição sofrido em muitos destes sistemas é um processo lento. Durante pelo menos dois anos,

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o Sr. Deputado questionou-me regularmente sobre a contratação de novos navios para a Transtejo e Soflusa e,

um dia, pude finalmente dizer-lhe «está aberto o concurso».

Protestos do Deputado do PCP Bruno Dias.

Participámos todos no lançamento do concurso, mas este tem o seu tempo, tem a sua tramitação e não

vamos ter os navios antes do prazo contratualmente previsto para os podermos ter.

Protestos do Deputado do PCP Bruno Dias.

Da mesma forma, estamos a adquirir mais autocarros, mais composições para os metros, mais composições

para a CP. Se tudo isto tivesse sido feito antes, claro que hoje já estaríamos noutra situação. Mas, como diz, e

bem, o caminho não é andar para trás, o caminho é andar para a frente.

Em matéria de recursos humanos, nos quatro anos anteriores a esta Legislatura, só no setor dos transportes,

perderam-se 19% desses recursos. Já recuperámos 4% dos recursos humanos e há uma série de concursos

em aberto, mas, infelizmente, até estarem concluídos, não vamos poder contar com esses recursos humanos.

Portanto, é verdade se diz que estamos a correr atrás do prejuízo. Sim, estamos a correr atrás do prejuízo, mas

temos de ter consciência de que não podemos voltar a correr o risco de ter novamente prejuízo, porque, então,

aí não estaremos só a correr atrás do prejuízo mas, antes, a cavar ainda mais o prejuízo. É isso que não

podemos fazer.

Relativamente ao SIRESP, aquilo que o Estado fez foi adquirir os cerca de 70%, ou 67%, que lhe faltavam

da empresa pelo valor do património líquido em 31 de dezembro do ano passado. Esse valor já incorpora todo

o investimento feito pelo SIRESP desde 2017, designadamente todo o investimento que foi necessário fazer

para assegurar os níveis de redundância quer da energia elétrica, quer dos sistemas de comunicação que os

incêndios de 2017 tinham tornado patente ser absolutamente essencial. É que uma rede de comunicações

assente exclusivamente em elementos físicos está, como é óbvio, sujeita a que esses mesmos elementos sejam

destruídos por força do fogo. Aquilo que aconteceu nesses incêndios foi que os cabos, que, aliás, eram

suspensos, foram consumidos pelo fogo e o sistema de comunicações deixou de funcionar.

As próprias antenas não estão, obviamente, isentas de serem destruídas — nada está! —, mas um

mecanismo assente num conjunto de antenas satélite aumenta, obviamente, o grau de redundância e de

fiabilidade da rede. Esse investimento foi feito e é isso que justifica, aliás, o valor da empresa.

O Sr. Presidente: — Tem de terminar, Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, vou já terminar.

Creio que, assim, concluímos um processo, responsabilizando o Estado, inteira e exclusivamente, pela

gestão desta rede de emergência. Uma rede que não está obsoleta, mas, sim, funcional, que está, neste

momento, reforçada nas suas capacidades de redundância e, por isso, tal como aconteceu em 2018 — ano em

que funcionou sem qualquer tipo de incidente —, estamos em condições de assegurar que poderá funcionar

sem qualquer tipo de incidentes.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Tem agora a palavra, para fazer perguntas, a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia, de Os

Verdes.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, para levarmos a sério a

questão da mitigação das alterações climáticas e da adaptação às alterações climáticas há alguns vícios e erros

no País dos quais temos de nos livrar definitivamente. Um deles é o de agir com uma visão de mero curto prazo,

o outro é o de deixar de agir com uma visão economicista das coisas.

Sr. Primeiro-Ministro, vou dar-lhe um exemplo que vai compreender muito bem e que tem a ver com a nossa

floresta, que é fundamental para a adaptação do território. O que acontece é que se foi «eucaliptizando» o País.

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E com que argumento? Com o argumento de que gerava muito emprego, de que criava uma enorme dinâmica

económica na floresta, o que era muito bom. Portanto, eram só vantagens e expandiram-se monoculturas e

monoculturas de eucalipto.

O que se verificou, Sr. Primeiro-Ministro, foi aquilo que hoje todos sabemos: criou-se um rastilho por este

País, relativamente aos fogos florestais, pondo justamente em causa a segurança das populações e do território.

Conhecemos o brutal erro do Governo PSD/CDS, quando aprovou a lei da liberalização do eucalipto,

fomentando mais eucalipto no nosso território.

O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — É verdade.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Ora, nesta Legislatura, o que é que tivemos de fazer? Não foi

preciso esperar pela infeliz tragédia de 2017! Logo no início da Legislatura, Os Verdes criaram uma condição

para assinar a posição conjunta com o PS, que foi, justamente, a de estancar, diminuir, a área das monoculturas

do eucalipto em Portugal e apostar nas espécies autóctones para gerar maior resistência na nossa floresta.

Mas eu dei-lhe este exemplo porquê, Sr. Primeiro-Ministro? Porque, agora, talvez vá compreender também

aquilo para que Os Verdes têm alertado. Diversos estudos já apontam para a desertificação dos solos do nosso

território, decorrente do fenómeno das alterações climáticas, e o que se está a fazer, neste momento, correndo

esse risco grande, é a expandir monoculturas e monoculturas, intensivas e superintensivas, designadamente de

olival.

Este Governo tem uma grande responsabilidade nesta matéria, mas qual é o seu grande argumento? É o de

que cria muito emprego e uma dinamização económica muito grande no interior. Cuidado, Sr. Primeiro-Ministro!

Temos de ver se, daqui a uns anos, não andamos todos de mãos na cabeça a dizer que temos os solos

saturados, que gastámos água demais e que, devido ao uso intensivo dos pesticidas, temos solos e águas

contaminados. O alerta está a ser feito atempadamente, mas o Governo não está a ligar a este alerta.

Por outro lado, Sr. Primeiro-Ministro, há uma questão que gostaria de lhe colocar. Enquanto nós andamos a

trabalhar para estancar as monoculturas de eucalipto, para que não se faça essa opção em termos produtivos,

mas se aposte, antes, na floresta e nas espécies autóctones, a verdade é que andam a despontar, natural e

intensivamente, eucaliptos pelas áreas ardidas afora, em redor das aldeias que já sofreram o flagelo dos fogos

florestais. A questão é a seguinte: se o Governo está a observar esta realidade das zonas florestais

abandonadas, o que é que está a fazer? Cuidado com a visão de curto prazo, porque estamos a criar um novo

rastilho e novas condições para que, daqui a uns anos, voltem os fogos, com grande intensidade e nas mesmas

zonas.

O Sr. Presidente: — Peço-lhe para concluir, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Termino, Sr. Presidente.

Sr. Primeiro-Ministro, quero rematar com uma última questão que tem a ver com a exploração de lítio. O

Governo afirmou que não haveria exploração de lítio em áreas classificadas, mas ocorre que, em Montalegre,

classificado pela UNESCO (Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura) como

património agrícola da humanidade,…

O Sr. Presidente: — Sr.ª Deputada, peço-lhe para sintetizar.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — … há um contrato assinado para prospeção e exploração, sem

sequer haver avaliação de impacte ambiental.

Protestos do Deputado do PS Ascenso Simões.

São estas contradições, Sr. Primeiro-Ministro, que não se conseguem perceber.

Aplausos de Os Verdes e de Deputados do PCP.

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O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro, para responder.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia, em primeiro lugar, não só ficou

nas posições conjuntas que assinámos a revogação da liberalização da «lei Cristas» em matéria de

«eucaliptização» do País, como ficou também acordado que iríamos fixar um quadro máximo que impedisse o

alargamento das áreas de eucalipto. Essa alteração entrou em vigor e travou o crescimento do eucalipto.

Vozes do PS: — Muito bem!

O Sr. Primeiro-Ministro: — É muito importante que assim seja, porque, se é verdade que tem uma relevância

económica importante, designadamente para os proprietários, muitos deles pequenos e médios proprietários,

sendo um rendimento importante para a economia local, também é verdade que têm de ter o devido

enquadramento e a devida disciplina.

O mesmo se diga relativamente ao olival. Primeiro, é preciso ter em conta que, dos 3 milhões de hectares

que constituem a região do Alentejo, o olival só ocupa 170 000 ha…

Protestos da Deputada de Os Verdes Heloísa Apolónia.

… e, destes, só 50 000 ha, ou seja, 1,5% da área total, estão a ser objeto de plantação intensiva ou em sebe.

De qualquer modo, apesar de os estudos do Ministério da Agricultura terem concluído que a cultura intensiva

do olival não promove mais pressões ambientais do que outras culturas regadas com expressão determinante

no Alentejo, o Sr. Ministro da Agricultura ordenou ao Instituto Nacional de Investigação Agrária e Veterinária a

realização de um estudo mais aprofundado que permita a avaliação comparativa dos diversos tipos de

exploração do olival. Esse estudo está encomendado. Vamos ver qual é o seu resultado.

Sr.ª Deputada, tem muita razão no que diz respeito às zonas abandonadas. Apesar de o Governo ter já

aprovado todos os planos regionais de ordenamento florestal e apesar de, neste momento, os municípios

estarem a trabalhar na sua transposição para os respetivos planos diretores municipais, a verdade é que a

natureza não acompanha o ritmo institucional e, portanto, cresce por si própria. Ainda ontem, pude ver, com os

meus próprios olhos, como na área ardida o eucalipto renasce espontaneamente, recriando a mesma situação

vivida anteriormente.

Mas, para isso, Sr.ª Deputada, de uma vez por todas, temos de, nesta Assembleia da República, entender-

nos sobre esta matéria. É que ou queremos intervir ou queremos fingir que intervimos, porque 90% da floresta

em Portugal é privada. É uma exceção relativamente a toda a Europa, mas 90% é privada e temos de ter normas.

Em primeiro lugar…

O Sr. Presidente: — Peço-lhe que conclua, Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Vou concluir, Sr. Presidente.

De uma vez por todas, temos de ter normas para conhecer a propriedade…

Protestos da Deputada de Os Verdes Heloísa Apolónia.

… e, Sr.ª Deputada, para que não demore muito tempo é essencial que a Assembleia da República aprove

a extensão a todo o território nacional da experiência do cadastro simplificado, que já foi testado em sete

concelhos, com grande sucesso,…

Aplausos do PS.

Protestos do Deputado do PCP João Dias.

… e que permitirá em quatro anos fazer o que o País espera que se faça desde a Maria da Fonte.

O País não pode continuar parado,…

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O Sr. Presidente: — Sr. Primeiro-Ministro, peço-lhe, mais uma vez, que conclua.

O Sr. Primeiro-Ministro: — … tem de, de uma vez por todas, fazer o cadastro para termos a identificação

dos proprietários, para os obrigarmos a fazer o que têm a fazer ou para, quando estes não tiverem condições,

o Estado poder fazê-lo em sua substituição.

Sr.ª Deputada, enquanto não tivermos a lei do cadastro, não é possível avançar mais do que já avançámos.

Por isso, Sr.ª Deputada, peço-lhe um favor:…

O Sr. Presidente: — Sr. Primeiro-Ministro, tem mesmo de concluir.

O Sr. Primeiro-Ministro: — … vote a lei do cadastro para podermos conhecer quem é proprietário e

podermos avançar.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — É a vez do Sr. Deputado André Silva, do PAN.

Tem a palavra.

O Sr. André Silva (PAN): — Boa tarde, Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro.

O PAN congratula o Governo pela dignificação das políticas ambientais ao trazê-las para o debate quinzenal.

Preocupa-nos, no entanto, a insistente bipolaridade com que o Governo procura compatibilizar o compromisso

de descarbonizar a economia com práticas lesivas para o ambiente.

Vejamos: são linhas de ação do P-3AC — o Programa Nacional de Ação para a Adaptação às Alterações

Climáticas — a implementação de boas práticas de gestão de água na agricultura, a implementação de técnicas

de conservação e de melhoria da fertilidade do solo e o aumento da resiliência dos ecossistemas, das espécies

e dos habitats aos efeitos das alterações climáticas.

Porém, proliferam práticas de produção superintensiva a nível da agricultura e da pecuária, práticas essas

que, segundo os cientistas, num cenário de aumento de temperaturas, de eventos climáticos extremos e de

escassez de água — como, aliás, aqueles que têm vindo a assolar Portugal com mais frequência —, aceleram

a degradação e, até, a desertificação dos solos e põem em causa a resiliência dos ecossistemas.

O que lhe pergunto, Sr. Primeiro-Ministro, é se as medidas adotadas pelo Governo em matéria de adaptação

às alterações climáticas visam, efetivamente, tornar o território mais resiliente ou se, pelo contrário, se limitam

a fazer equilibrar os pratos da balança, ou seja, a poluir um pouco menos nuns setores para se continuar a poluir

noutros.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr. Deputado André Silva, quer no roteiro para a

descarbonização, quer no plano nacional de adaptação às alterações climáticas, o que o Governo procura — e

procurei traduzi-lo também no meu discurso — é que haja um esforço transversal do conjunto da sociedade: das

famílias, de cada um de nós individualmente e da economia. Digo «da economia» em todos os seus setores:

nos serviços, na indústria, na construção, na agricultura, na produção de energia, no uso da energia, no uso da

água… Em todos os setores, temos de, de uma forma integrada, poder concorrer para obter este resultado. É

um resultado de uma enorme ambição e que requer mesmo o empenho de todos. Não basta descarbonizar aqui

para carbonizar ali.

Portanto, respondendo claramente à sua pergunta, direi que não, não procuramos limpar a carbonização do

litoral para transferi-la para o interior. Procuramos que o País seja globalmente descarbonizado.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado André Silva, tem a palavra.

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O Sr. André Silva (PAN): — Sr. Primeiro-Ministro, a prevenção dos incêndios rurais é a primeira linha de

ação identificada no P-3AC. Contudo, os eucaliptos e as acácias continuam a nascer descontroladamente nas

áreas ardidas.

Perguntamos-lhe por que razão é que, após terem sido aprovadas várias resoluções no Parlamento no

sentido de combater a regeneração natural dos eucaliptos e espécies invasoras, continua a não se ver qualquer

ação no terreno, verificando-se cerca de 1 milhão de novos eucaliptos por hectare, sendo que o território está

pior do que estava há dois anos.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro, para responder.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr. Deputado, eu não quero ser indelicado, mas aprovar uma

resolução é fácil. No entanto, como é que a vamos concretizar? Como é que notificamos um proprietário, que

não sabemos quem é, de que não pode ali deixar plantar um novo eucalipto ou deixar crescer uma nova acácia?

Há muito tempo que, relativamente ao solo urbano, está claramente feita a separação entre o direito de

propriedade e o direito a construir naquela propriedade. Eu posso ter um terreno, mas o plano diretor municipal

só me pode permitir construir uma vivenda, ou um prédio de 12 andares, ou pode simplesmente dizer que é uma

área de cedência para um espaço verde.

Isto é o mesmo que tem de acontecer relativamente ao solo rural. É por isso que os planos regionais de

ordenamento florestal fixam quais são as regras do uso do solo e que têm de ter transpostos para o plano diretor

municipal. Mas isto só será eficaz quando finalmente conhecermos quem são os proprietários.

Sr. Deputado, por isso é que lançámos um projeto-piloto, aprovado por esta Assembleia da República, em

12 concelhos, em todo o País, entre os quais os sete concelhos mais atingidos pelos incêndios de há dois anos.

O projeto-piloto foi desenvolvido e todos os presidentes de câmara aplaudem esse projeto-piloto.

O Sr. Presidente: — Peço-lhe que termine, Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Os resultados estão à vista e demonstram que, ao contrário do que muitas

pessoas acreditam, não é necessária uma eternidade para fazer o cadastro, não é necessário uma fortuna para

fazer o cadastro…

O Sr. André Silva (PAN): — Então!?

O Sr. Primeiro-Ministro: — … e que o cadastro é possível.

O Sr. Presidente: — Sr. Primeiro-Ministro, tem de concluir.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Está, na Assembleia da República, uma proposta…

O Sr. André Silva (PAN): — Não é o PAN que a vai rejeitar!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Eu não estou a dizer que o Sr. Deputado é o culpado, mas, infelizmente, o Sr.

Deputado não é maioria absoluta desta Assembleia da República!

O Sr. Presidente: — Sr. Primeiro-Ministro, tem mesmo de concluir.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Infelizmente, há vários outros Deputados que contribuem para a existência de

uma maioria ou de uma minoria.

Aquilo que é absolutamente essencial é que o Sr. Deputado, como a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia, os Srs.

Deputados do Partido Socialista, todos os Srs. Deputados que já estão convencidos da bondade desta medida

e, também, os Srs. Deputados do Bloco de Esquerda, que estão igualmente convencidos da bondade desta

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medida, se esforcem para que haja uma maioria nesta Assembleia que permita, efetivamente, fazer a lei que é

necessário para concretizar a reforma da floresta.

Ainda bem que temos o seu apoio, Sr. Deputado!

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, pelo Grupo Parlamentar do PS, o Sr. Deputado Renato Sampaio.

O Sr. Renato Sampaio (PS): — Sr. Presidente, queria cumprimentar o Sr. Primeiro-Ministro e todos os

ministros e felicitar o Sr. Primeiro-Ministro por trazer a debate as políticas ambientais, tão importantes para o

nosso País.

Hoje, vivemos uma crise ambiental grave com as alterações climáticas, que são uma realidade no presente

com consequências devastadoras no futuro. Por isso, não restam muitas mais oportunidades para invertermos

esta situação.

As suas consequências estão hoje bem identificadas. Os ciclos de seca, as ondas de calor e de frio, as

inundações e tempestades são cada vez mais curtos e severos. A água, que é um recurso natural essencial, é

cada vez mais escassa. A quantidade de água reposta é inferior à utilizada, os cursos de água estão a secar e

o abastecimento de água para consumo humano está a ficar comprometido. É, pois, necessário tomar medidas

para a reutilização, algo que o Governo já está a fazer, e bem, com o aproveitamento da água das ETAR (estação

de tratamento de águas residuais), e, sobretudo, encontrar mecanismos de uso eficiente da água e garantir

reservas estratégicas de água para o nosso País.

A desertificação e a erosão dos territórios é galopante, provocando o empobrecimento das suas

comunidades, e desencadearão, estamos certos, a próxima vaga global de migrações, criando mais

desigualdades na sociedade e, sobretudo, mais desigualdades entre países. Não basta realizar conferências

mundiais, aprovar documentos ou subscrever resoluções. É preciso mais, é preciso mais ambição para mobilizar

todos os decisores políticos e os cidadãos para esta realidade.

Do ponto de vista climático, as temperaturas não deverão e não poderão aumentar mais os termómetros e

não poderão subir mais de 1,5º, conforme o Acordo de Paris, mas os ponteiros do relógio não poderão avançar

mais com os decisores políticos inativos.

Ao contrário dos problemas ambientais de 1.ª geração, que mostram resultados imediatos no combate às

alterações climáticas, os efeitos positivos só se sentirão a longo prazo, por isso é urgente atuar.

Sabemos que nenhum país isoladamente pode resolver por si só o fenómeno das alterações climáticas. Este

tem de ser um combate persistente e continuado de todos, globalmente, e de cada um de nós, individualmente.

Portugal e o Governo têm estado na vanguarda no combate às alterações climáticas. Fixou, com grande

ambição, as metas a atingir em Portugal, implementou e está a implementar as medidas para as concretizar e

tem colocado sempre, na agenda política europeia, as alterações climáticas como um tema central. Aliás,

Portugal reduziu as emissões em 9%, quando a média europeia só reduziu em 3%, ao mesmo tempo que

crescíamos acima da média europeia, o que comprova que a redução de emissões não é incompatível com o

crescimento económico.

É preciso continuar e acelerar este caminho? É! E é isso que o Governo está a fazer: a construir uma

estratégia que nos conduza à neutralidade carbónica em 2050, com a descarbonização da economia; a planear

o fim da eletricidade a partir de combustíveis fósseis, apostando na produção de energia de fontes renováveis;

apoiar a mobilidade elétrica; a implementar maior eficiência energética; a concretizar a economia circular; a

empreender a reorganização da floresta e o ordenamento do território; a valorizar o interior e os seus recursos;

a apostar na utilização do transporte público, tomando medidas como o novo tarifário com os passes mais

baratos, uma medida de grande alcance social, mas também um contributo decisivo para o combate às

alterações climáticas.

Este é o caminho do futuro, o caminho que queremos continuar a percorrer, para assim garantir a

sustentabilidade do planeta e aumentar a qualidade de vida dos portugueses.

Sr. Primeiro-Ministro, pergunto-lhe como perspetiva para Portugal, para a Europa e até para o mundo o

aprofundamento do combate às alterações climáticas, em particular a exigência que vamos ter na próxima

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década neste combate. Qual é a importância da neutralidade carbónica e qual é o trabalho que o Governo está

a realizar nesta matéria?

Gostava também de ouvir o Sr. Primeiro-Ministro sobre o tema do leilão das fotovoltaicas, com incidência no

combate às alterações climáticas.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Renato Sampaio, Portugal já esteve na vanguarda

da transformação do paradigma energético: esteve na vanguarda das energias renováveis, esteve na vanguarda

da mobilidade elétrica. Infelizmente, a diabolização política conduziu a que, com a mudança de Governo, se

interrompesse uma trajetória que teria permitido a Portugal estar hoje mais à frente. Mas, felizmente, temos

vindo a recuperar, temos de recuperar o tempo perdido e a evolução tecnológica ajuda-nos a que assim seja.

Hoje, felizmente, já é possível recorrer ao uso intensivo da energia solar sem subsidiação e temos conseguido

licenciar novos projetos de energia solar sem haver qualquer tipo de subsidiação.

Porém, temos de agir de forma integrada e foi com essa consciência que desenhámos um ministério do

ambiente, desde o início do Governo, com uma competência alargada para poder intervir nos domínios que são

fundamentais para assegurar a descarbonização do País.

Começámos pelos transportes, alargámos agora à energia e cremos que, nesta dimensão, o Ministério do

Ambiente e da Transição Energética dá a adequada coerência institucional à ambição de um País, que foi o

primeiro a assumir logo, em Marraquexe, o objetivo de atingirmos a neutralidade carbónica em 2050 e que tem

trabalhado, consequentemente, para isso ao ser, também, o primeiro País a aprovar um roteiro para a

descarbonização em 2050.

Temos de ser os primeiros e temos de andar depressa, porque, infelizmente, hoje, sabemos que as metas

fixadas no Acordo de Paris estão mais difíceis de alcançar porque alguns dos parceiros fundamentais, como os

Estados Unidos, se quiseram retirar dele mas também sabemos, ao mesmo tempo, que essas metas já são

insuficientes para podermos alcançar o objetivo que aí estava previsto.

É por isso que, quando o objetivo do Acordo de Paris era controlar entre 1,5ºC e 2ºC o aumento de

temperatura, nós sabemos que, hoje, já não há alternativa entre 1,5ºC e 2ºC; a única solução é mesmo fixarmos

uma meta de 1,5ºC, sob pena de ser absolutamente irreversível a trajetória a nível mundial. E sabemos isto com

base na evidência científica, porque o Painel Intergovernamental para as Alterações Climáticas nos disse,

entretanto, que a evolução que o mundo teve exige uma maior ambição na concretização desse resultado.

É por isso que, neste Roteiro para a Neutralidade Carbónica a 30 anos, assumimos a opção de sermos mais

ambiciosos logo na primeira década. Porquê? Porque quanto mais depressa avançarmos, menos efeitos

cumulativos negativos iremos ter.

Por isso, neste Roteiro, temos a meta de, nesta primeira década, reduzirmos em 40% as emissões na área

dos transportes, é por isso que, nesta primeira década, nos propomos duplicar a produção de eletricidade a

partir de energias renováveis.

É este esforço, que temos de fazer à cabeça, que nos permitirá ter uma maior confiança de que o resultado

final será alcançado. Para isso temos de trabalhar, desde já, seguindo este Roteiro, que aprovámos, fomos os

primeiros a aprovar, e espero que sejamos também os primeiros a conseguir cumprir.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Ainda pelo Grupo Parlamentar do PS, tem a palavra o Sr. Deputado João Marques.

O Sr. João Marques (PS): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Primeiro-

Ministro, a valorização do território é um dos pilares fundamentais para o desenvolvimento do País. O equilíbrio

entre o litoral e o interior é urgente. O território precisa de um modelo de desenvolvimento que responda aos

problemas estruturais, que valorize o capital natural e que promova a coesão territorial.

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É fundamental, neste processo de valorização do território, a implementação de uma agenda que combata a

desertificação das regiões do interior do País, que promova o emprego e o acesso a serviços públicos, como a

educação e a saúde, que crie incentivos para a fixação de jovens e de famílias nestas regiões.

Só teremos um território mais coeso económica e socialmente, mais competitivo externamente, mais

resiliente às alterações climáticas, quando tivermos um território mais equilibrado, um território mais valorizado.

Sr.as e Srs. Deputados, muito já foi feito por este Governo, quer na definição, quer na implementação de

medidas concretas de combate às assimetrias entre o litoral e o interior, mas muito ainda há a fazer.

A aprovação, na semana passada, do Plano Nacional da Política de Ordenamento do Território, PNPOT,

constituiu mais um passo fundamental neste caminho de valorização do território e de valorização do interior.

O PNPOT é um importante instrumento estratégico de gestão territorial que define as opções de

desenvolvimento e estabelece o modelo de organização nacional, que rompe com a atual lógica de litoral/interior,

que assume a diversidade territorial como um ativo fundamental.

No seu programa de ação, o PNPOT estabelece 10 compromissos que traduzem a aposta política para a

valorização do território e para o reforço das abordagens integradas de base territorial.

Com a aprovação do PNPOT, Portugal passou a dispor de um referencial estratégico para o desenvolvimento

territorial, para a programação de fundos comunitários e para definição dos grandes investimentos públicos.

O PNOT compromete-se com um País mais valorizado ambientalmente, que respeita o Acordo de Paris e

que assume a meta da neutralidade carbónica.

Quando falamos em ambiente e quando falamos em alterações climáticas, falamos em gestão territorial, pelo

que lhe queria perguntar, Sr. Primeiro-Ministro, o seguinte: de que forma o PNPOT é uma ferramenta importante

para a valorização do território, capaz de permitir ao País alcançar maior coesão territorial, ou seja, combater as

assimetrias entre o litoral e o interior? De que forma este PNPOT reflete a problemática das alterações climáticas

e as necessárias adaptações do território?

Gostaria, ainda, de deixar uma nota sobre a Lei de Bases da Saúde.

Sr. Primeiro-Ministro, o PS tem defendido que incumbe ao Estado a responsabilidade de prestar cuidados de

saúde em cooperação com o setor privado e com o setor social e não em concorrência, como a atual lei prevê.

A mesma orientação é a que defendemos no que toca à gestão das unidades de saúde. Esta é uma

responsabilidade do Estado que a deve exercer diretamente, mas, a título excecional, pode fazê-lo por contrato

com entidades privadas ou com o setor social.

A questão não é a de saber se o próximo Governo fará ou não mais PPP (parceria público-privada), mas a

de saber se uma lei de bases pode ou não proibir que se façam. Nós entendemos que não!

Sr. Primeiro-Ministro, está ou não de acordo em que essa deve ser uma solução para uma lei de bases

durável? Está ou não de acordo que, no futuro, seja qual for a proibição que a lei de bases contenha, uma

maioria parlamentar poderá, com a maior facilidade, alterar a lei de bases e celebrar novos contratos PPP?

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr. Deputado, uma boa política nacional de ordenamento do

território é a chave para uma boa gestão do nosso território, para a valorização dos seus recursos e também

para uma boa gestão da capacidade que temos para assegurar a neutralidade carbónica.

Nós só teremos uma economia circular se tivermos uma economia que seja capaz de gerar rendimento no

local onde os recursos existem e na aposta da sua valorização.

É por isso muito importante que este PNPOT tenha sido aprovado nesta Assembleia da República, que possa

enformar o programa nacional de infraestruturas, que deve ser uma ferramenta de execução do Programa

Nacional de Ordenamento do Território, e que possa enformar também um conjunto de outras políticas públicas,

desde logo em matéria de serviços públicos e de investimento na Investigação & Desenvolvimento.

Um dos passos mais importantes que foram dados nesta Legislatura e, porventura, menos conhecido, foi o

de, na estratégia de criação dos laboratórios colaborativos, ter havido uma aposta muito clara, por parte do Sr.

Ministro da Ciência, em dar prioridade à localização daqueles que trabalham na valorização dos recursos

endógenos nos territórios de baixa densidade. Foi assim com o de cultura de montanha, sediado em Bragança,

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é assim com o de cultura de precisão, sediado no Minho, é assim com o da floresta. Isto é importante para

valorizar os recursos endógenos dessas regiões.

Só fazendo assim é que conseguimos compatibilizar, de forma positiva, a ambição, que temos de ter, de

desenvolver o País, de promover maior rendimento para as populações, e, simultaneamente, o dever, que temos

de ter, de preservar os recursos para as gerações futuras.

Este é o trabalho que temos de fazer, de uma forma integrada, na gestão do território.

Sr. Deputado, não quero deixar de comentar o que disse sobre a Lei de Bases da Saúde.

O País tem vivido, desde 1990, com uma Lei de Bases da Saúde que foi criada para provocar uma entorse

no Serviço Nacional de Saúde, que foi criada depois de o Tribunal Constitucional ter declarado inconstitucional

a tentativa de revogação do Serviço Nacional de Saúde.

Nessa altura, o PSD e o CDS, confrontados com a impossibilidade constitucional de revogarem a lei do

Serviço Nacional de Saúde, criaram uma lei de bases para procurar esvaziar, contrariando o texto constitucional.

A Constituição da República Portuguesa é muito clara: o Estado tem a responsabilidade de assegurar a

saúde aos portugueses através da criação de um serviço nacional de saúde. Aquilo que a lei de bases veio dizer

é que incumbia ao Estado também promover um setor privado que funcionasse em concorrência com o Serviço

Nacional de Saúde.

Ora, a questão essencial que está em discussão nesta lei de bases, que a Assembleia da República pode

ou não aprovar, é saber se mantemos este equívoco que vem desde 1990 ou se afirmamos, claramente, que a

responsabilidade do Estado é promover e defender um serviço nacional de saúde público, universal e

tendencialmente gratuito. Isto não significa acabar com a medicina privada ou com a função do setor social, que

devem ter uma natureza complementar, ou até supletiva. Aliás, há uma norma, já votada, creio que proposta

pelo PCP, que é a base quinta,…

O Sr. João Oliveira (PCP): — Base cinco!

O Sr. Primeiro-Ministro: — ou base cinco, onde se deixa, aliás, muito claro, qual é a responsabilidade

pública e qual é o papel do setor social e do setor privado.

Em meu entender, nós não podemos deixar perder esta oportunidade de termos um consenso político tão

alargado quanto possível, para repor a Lei de Bases da Saúde em consonância com a Constituição da República

Portuguesa e com o Serviço Nacional de Saúde público, universal e tendencialmente gratuito.

Devemos fazê-lo com a consciência do seguinte: uma lei de bases só tem valor reforçado se tiver uma base

política reforçada, porque senão uma lei de bases é uma lei igual às outras leis e qualquer nova maioria revogará

aquilo que aprovarmos nesta maioria.

Ora, nós não queremos uma lei de bases para fazer campanha eleitoral, nem queremos uma lei de bases

para lavar a nossa consciência de hoje.

Aplausos do PS.

Queremos uma lei de bases que seja durável nos seus princípios!

Portanto, quanto àquela que é a opção política deste Governo, não precisamos de lei de bases para não

fazer nenhuma nova PPP, porque consta do Programa do Governo, deste Governo, que não haverá nenhuma

nova PPP; não precisamos de nenhuma nova lei de bases para não renovar nenhuma PPP, quando a avaliação

é negativa; não precisamos de nenhuma nova lei de bases para não renovar uma PPP, mesmo quando a

avaliação é positiva mas o concessionário pretende alterar o contrato. Já o fizemos e já demos provas disso.

Aquela que é uma mais-valia desta lei de bases não é para este Governo, é para qualquer outro Governo

que venha a seguir. Para que isso aconteça, é necessário que essa lei de bases não só tenha um consenso

político suficientemente alargado para perdurar com esta maioria e para além desta maioria, mas também dê

sustentabilidade definitiva ao nosso Serviço Nacional de Saúde.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Sr. Primeiro-Ministro, queira terminar.

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O Sr. Primeiro-Ministro: — Só uma última frase, Sr. Presidente.

Começar por fazer dessa lei de bases um instrumento de combate institucional com o Presidente da

República ou de criação de divisões artificiais na Assembleia da República é, pura e simplesmente, fazer bonito

hoje, condenando a lei de bases à sua morte certa no primeiro dia em que a maioria parlamentar seja diferente

daquela que é hoje.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, chegámos, assim, ao fim no primeiro ponto da ordem do dia.

Antes de passarmos ao segundo ponto, a Sr.ª Secretária Emília Santos irá dar conta de iniciativas legislativas

que deram entrada na Mesa.

Tem a palavra, Sr.ª Secretária.

A Sr.ª Secretária (Emília Santos): — Sr. Presidente e Srs. Deputados, deram entrada, e foram admitidos, os

Projetos de Lei n.os 1231/XIII/4.ª — Procede à 11.ª alteração ao Decreto-Lei n.º 113/2011, de 29 de novembro,

que isenta do pagamento de taxas moderadoras os doentes crónicos nos cuidados de saúde primários e na

referenciação a partir destes cuidados (PCP), 1227/XIII/4.ª — Reversão da privatização dos CTT (PCP) e

1232/XIII/4.ª — Determina a alteração do Regime Jurídico das Custas Judiciais de forma a garantir um acesso

mais alargado aos tribunais pelos trabalhadores, pelos trabalhadores precários e pela generalidade dos

cidadãos (14.ª alteração ao Regulamento das Custas Processuais) (BE).

Deram também entrada, e foram admitidos, os Projetos de Resolução n.os 2201/XIII/4.ª — Pela criação de

um Plano Nacional de Forragens (PCP), 2202/XIII/4.ª — Recomenda ao Governo o desenvolvimento de um

regime de ordenamento e gestão das áreas de produção agrícola em regime intensivo e superintensivo (PCP),

2203/XIII/4.ª — Recomenda ao Governo a requalificação da EN105 no interior da cidade de Alfena (BE),

2204/XIII/4.ª — Recomenda ao Governo que inicie obras de requalificação e construa um pavilhão desportivo

na Escola Básica e Secundária Francisco Simões (BE), 2205/XIII/4.ª — Recomenda ao Governo a

sustentabilidade do projeto «Orquestra Geração» (BE), 2206/XIII/4.ª — Recomenda ao Governo a valorização

da experiência adquirida e da avaliação dos estagiários PEPAC e PEPAL no âmbito de procedimentos

concursais abertos na administração pública e na administração local (BE), 2207/XIII/4.ª — Campanha de

informação sobre as qualidades do leite e dos seus benefícios para a saúde (PS) e 2208/XIII/4.ª —

Desenvolvimento de um sistema de recolha de dados relativos aos preços e ao mercado da cadeia de

abastecimento alimentar (PS).

É tudo, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, vamos passar ao segundo ponto da nossa ordem do dia, que consiste

no debate preparatório do próximo Conselho Europeu, ao abrigo da alínea a) do n.º 1 do artigo 4.º da Lei n.º

43/2006, de 25 de agosto, com as alterações introduzidas pela Lei n.º 21/2012, de 17 de maio — Lei de

Acompanhamento, Apreciação e Pronúncia pela Assembleia da República no âmbito do Processo de

Construção da União Europeia e, conjuntamente, ao debate sobre os diversos instrumentos de governação

económica da União Europeia que integram o Semestre Europeu, nos termos do disposto na alínea d) do n.º 1

do artigo 4.º da mesma Lei.

Tem a palavra, em primeiro lugar, o Sr. Primeiro-Ministro, António Costa.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, este Conselho Europeu terá três

dimensões fundamentais: uma, sobre a designação, pela parte do Conselho, dos candidatos a presidentes da

Comissão, do Conselho Europeu e de altos representantes da União Europeia para as relações externas e

segurança; e dois pontos da maior importância, que são a aprovação da Agenda Estratégica da União Europeia

2019-2024 e a criação do mecanismo orçamental para a convergência e para a competitividade.

Resumidamente, quanto à Agenda Estratégica, que é conhecida por parte dos Srs. Deputados, as posições

de Portugal foram no sentido de reforçar a ideia de que é necessário intensificar a proteção dos direitos

humanos, em particular em sede de migração, criando canais de migração legal e tendo uma visão holística

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sobre a política migratória, no quadro das nossas relações com as regiões vizinhas, e, por outro lado, da

necessidade de enfatizar a prioridade da execução do pilar europeu dos direitos sociais e também de recusar

uma visão de competitividade assente na ideia da criação de grandes campeões europeus, mas pelo contrário

no estímulo ao empreendedorismo e do apoio às pequenas e médias empresas.

No que diz respeito ao objetivo das alterações climáticas, Portugal, juntamente com outros 11 Estados-

membros, defende que a União Europeia deve assumir um objetivo mais ambicioso, de forma a alcançar a

neutralidade carbónica em 2050, de forma a contribuir para que o clima não tenha um aumento da temperatura

superior a 1,5º.

Finalmente, no que diz respeito à política externa, defendemos a prioridade absoluta de uma parceria

estratégica com África para o século XXI, o aprofundamento das relações com as Nações Unidas e, também, a

criação de uma rede de acordos de comércio livre no quadro da Organização Mundial do Comércio que ajude a

globalizar os valores da União Europeia e a não proceder à sua fragilização.

Um momento particularmente importante deste Conselho é o de, finalmente, podermos receber a proposta

do Eurogrupo relativa à criação da capacidade orçamental da zona euro. Foi algo que definimos, desde o

princípio desta Legislatura como uma prioridade e, em dezembro do ano passado, finalmente, por unanimidade,

o Conselho atribuiu um mandato ao Europgrupo para desenvolver, tendo, na última reunião do Eurogrupo, sido

foi possível avançar com uma proposta de base, ainda incompleta, para ser discutida neste Conselho Europeu.

Com base nesta proposta, é criado um mecanismo para apoiar a realização de reformas e investimentos que

aumentem o potencial produtivo de cada país, em consonância com o semestre europeu e de acordo, aliás, com

aquilo que Portugal tem vindo a defender ao longo dos anos, de, numa base contratualizada, permitir financiar

os países para quem a divergência, em termos de PIB per capita, é ainda acentuado e que tem de, acordo com

as recomendações específicas de cada país, realizar um conjunto de investimentos que possam aumentar o

seu potencial de crescimento.

Temos bem consciência de que este mecanismo, tal como proposto, não é seguramente aquele que todos

desejamos, mas é uma excelente base de trabalho, partindo, desde logo, de uma dotação orçamental prevista

pela Comissão de 17 mil milhões de euros previstos no antigo mecanismo de apoio às reformas e que pode vir

a ser aumentado com dotações de cada Estado, de forma a poder ganhar uma nova dimensão.

A nossa convicção é a de que não podemos deixar esta oportunidade de avançar já com aquilo em que há

consenso, sem prejuízo de continuarmos a trabalhar para que possamos fazer o que falta fazer: por um lado,

aumentar a dotação deste instrumento e, por outro lado, diversificar as suas funções.

Este orçamento responde a algo que sempre definimos como prioritário: financiar a convergência, visto que

a convergência é o grande mecanismo de estabilização, mas não ignoramos, nem podemos esquecer, que, tal

como se verificou em 2008 e em 2011, a falta de um mecanismo de estabilização em situação e crise é algo que

fragiliza o conjunto da zona euro e que cria desequilíbrios assimétricos nos diferentes países.

Por isso, é necessário continuar a trabalhar para que, para além deste instrumento orçamental para a

competitividade e para a convergência, se criem, também, mecanismos de estabilização em situação de crise

de que o mais consensual parece ser a criação de um mecanismo europeu de seguro de desemprego.

Finalmente, é necessário avançar e concluir a última fase da união bancária, criando definitivamente um

mecanismo europeu de garantia de depósitos, o backstop para o financiamento dos fundos de resolução e,

também, o novo passo em matéria de criação de um mecanismo de financiamento de emergência.

Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, em resumo, são estas as posições que Portugal irá defender no

Conselho Europeu.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, vamos passar à fase de debate.

Em primeiro lugar, tem a palavra a Sr.ª Deputada Rubina Berardo, do Grupo Parlamentar do PSD.

A Sr.ª Rubina Berardo (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, começo por cumprimentar os Srs.

Membros do Governo presentes neste debate

O Sr. Primeiro-Ministro traz aqui a debate a questão da Agenda Estratégica para o próximo ciclo institucional

e o quão importante é para Portugal estar na linha da frente na resposta a esses desafios, mas o sucesso dessa

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Agenda depende bastante dos próprios protagonistas e do equilíbrio ao qual se chega na distribuição desses

protagonistas nos cargos de topo. Por isso, o primeiro ponto da ordem do dia deste próximo Conselho Europeu

é, precisamente, o das nomeações para o próximo ciclo institucional.

O PSD já teve oportunidade de dizer aqui, no Plenário, que tal não pode ser só mais uma guerra de cadeiras

entre as famílias partidárias, é preciso sair das trincheiras, porque o que está em causa é, efetivamente, a

estabilidade e a visão para o futuro da União Europeia, e isso deveria imperar também nas negociações.

Gostaria, pois, de sublinhar a palavra «institucional» deste ponto da ordem do dia. Isto, porque ainda ontem

o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros afirmou «nós somos todos institucionais». Contudo, pergunto: onde

está esse suposto institucionalismo do vosso Governo quando, segundos antes, o Sr. Ministro dizia que o seu

maior desejo era — e cito — «uma mudança na paisagem político-institucional da União Europeia», aludindo a

um suposto monocromatismo do PPE (Partido Popular Europeu)?

Aliás, também o Sr. Primeiro-Ministro, logo depois das eleições europeias, já tinha ensaiado esse grande

desejo primordial de que o que mais interessa aqui é retirar o PPE de certos cargos.

Sr. Primeiro-Ministro, é importante recordar alguns factos: no anterior exercício de distribuição dos altos

cargos, em 2014, não houve nenhum monopólio do PPE: Presidente da Comissão e Presidente do Conselho

Europeu, sim eram do PPE, mas, na altura, o Presidente do Parlamento Europeu, a Alta Representante para a

Política Externa e o Presidente do Eurogrupo foram todos socialistas europeus.

Portanto, houve diversidade com o processo de escolha do Spitzenkandidat e, nesta altura, com um

Parlamento Europeu ainda mais fragmentado, mais profunda deverá ser essa diversidade.

Hoje não é tempo para obsessões partidárias; é tempo de diálogo entre todas as forças políticas europeias.

Logo depois do tiro de partida destas negociações, a 28 de maio, o PSD teve oportunidade de elencar aqui,

neste Hemiciclo, qual é o caderno de encargos para estas nomeações na perspetiva do interesse nacional,

relembrando que o chefe do Governo português representa, precisamente, esses interesses, apesar de o PS,

frequentemente, só relevar a função do Sr. Primeiro-Ministro como negociador em nome da família socialista.

É por isso que relembramos que queremos líderes de topo que sejam campeões da política de coesão, que

lutem contra as assimetrias regionais na Europa, que não aceitem o corte de 7% para um País como Portugal,

enquanto a Espanha ganharia 5%, a Itália 6% e a Finlândia 5%. Que negociação de fundos é esta em que a

política de coesão beneficia países mais ricos e desenvolvidos e penaliza Portugal?

Nós queremos líderes de topo que percebam a natureza da aplicação dos fundos da política agrícola comum

em Portugal e, no âmbito da política externa da União Europeia, queremos uma União que não vacile na defesa

da democracia a nível internacional e que não hesite no cinzentismo.

Sr. Primeiro-Ministro, nós queremos, também, líderes de topo que contribuam proactivamente para a

resposta europeia às alterações climáticas que assolam o nosso planeta e — não esquecer também — que

saibam defender os interesses dos cidadãos na conclusão do processo do Brexit. Tempus fugit, Sr. Primeiro-

Ministro.

A propósito do Brexit, Sr. Primeiro-Ministro, lançamos hoje, aqui, um apelo urgentíssimo para que Portugal

contribua proactivamente para a resolução positiva e célere das negociações neste Conselho Europeu, pois

qualquer impasse negocial para além de julho, no campo da União, pode ser extremamente prejudicial para o

posicionamento do bloco a 27 no contexto da iminente mudança de Primeiro-Ministro no Reino Unido.

Ficar nas trincheiras partidárias, em vez de colaborar para uma solução boa e rápida, seria desastroso

também para os 400 000 portugueses que residem no Reino Unido. Isto sim, Sr. Primeiro-Ministro, é ser

institucionalista, e esse deveria ser o interesse primordial do Governo português.

Sr. Primeiro-Ministro, outro assunto que nos traz hoje a este debate é, precisamente, o das recomendações

da Comissão para Portugal. Em fevereiro, a Comissão concluiu que 13 Estados-Membros, incluindo Portugal,

apresentavam desequilíbrios económicos. Na verdade, os portugueses revêm-se, também, nessas

recomendações, quando experienciam, em primeira mão, o caos nos transportes públicos, quando vivem

diretamente as consequências da degradação do SNS (Serviço Nacional de Saúde), quando parcelas do

território são esquecidas pelo Estado central. Parece que só o Governo não reconhece estas recomendações.

E gostaria de relembrar a presença do Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros na última audição regimental,

quando classificou estas recomendações como — e cito — «uma autêntica ladainha», porque depois, todos os

anos, seria a mesma coisa, acrescentado que o próprio Comissário já tinha dito para — e cito novamente —

«desvalorizar as próprias recomendações».

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Disse que é preciso olhar para os programas nacionais de reforma e traduzi-los nos instrumentos financeiros

comunitários. Nisso concordamos, mas nunca se pode excluir a própria responsabilidade da governação

nacional para a constatação dessas recomendações. Por isso, o Sr. Primeiro-Ministro tem aqui uma

oportunidade para responder, claramente, sobre as próprias recomendações. Isso, sim, é também ser

institucionalista.

Termino, fazendo uma pergunta sobre a questão do instrumento orçamental para a convergência e

competitividade da zona euro,…

O Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros (Augusto Santos Silva): — Ah! Finalmente!

A Sr.ª Rubina Berardo (PSD): — … que é, realmente, um aspeto muito longe do orçamento para a zona

euro, que acaba por ser, na verdade, um apêndice do próximo quadro financeiro plurianual, e falta o essencial

Sr. Primeiro-Ministro,…

O Sr. Presidente: — Sr.ª Deputada, peço-lhe para concluir.

A Sr.ª Rubina Berardo (PSD): — Sr. Primeiro-Ministro, falta o essencial, que é um plano de estabilização

macroeconómica.

Risos do Primeiro-Ministro.

Por isso pergunto-lhe, Sr. Primeiro-Ministro: quando podemos esperar um desbloqueio de certos travões, de

outros governos de várias cores partidárias para criar um verdadeiro orçamento para a zona euro?

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Vitalino Canas.

O Sr. Vitalino Canas (PS): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Ministros, Sr. Secretário de Estado,

Sr.as e Srs. Deputados: Deixo uma primeira nota sobre o projeto de recomendações para Portugal preparado

pela Comissão, no quadro do Semestre Europeu, para observar, simplesmente, que ele nenhuma surpresa

encerra.

Como tem sido habitual, as previsões da Comissão são mais pessimistas do que as do Governo e, como

também é habitual, é provável que não se materializem.

Também sem surpresa são as ênfases sobre políticas públicas, desde a prossecução do esforço de

consolidação orçamental favorável ao crescimento, até ao combate à corrupção, passando pela redução das

desigualdades e da pobreza e pelo investimento na educação e na formação.

Essas e outras políticas e objetivos têm sido prosseguidos pelo Governo, em muitos casos revertendo

políticas anteriores ou retirando-as do modo de paralisia em que se encontravam com o Governo anterior. Os

comentários sobre elas só podem ser entendidos, portanto, como um encorajamento para que o Governo

continue no caminho que já prossegue.

Deixo uma segunda nota para assinalar um passo positivo, sobre o qual o Sr. Primeiro-Ministro versou, dado

na última reunião dos ministros das finanças do Eurogrupo: a criação do instrumento orçamental para a

convergência e a competitividade, em execução do mandato da cimeira do euro, em dezembro.

Decerto, como também referiu, relevantes aspetos permanecem em aberto e ficaram distantes daquilo que

o Governo português defende. São aspetos que têm que ver com a dimensão, com as fontes de financiamento

e até com as funções a desempenhar por este mecanismo. Mas é positivo que tenham sido ultrapassadas as

resistências dos Estados-Membros que se opunham a um mecanismo desta natureza, e queríamos realçar aqui

isso.

Esperemos que o mesmo venha a ocorrer quanto a pilares que faltam, por exemplo da união bancária,

designadamente o mecanismo de garantia de depósitos.

Sr. Primeiro-Ministro, debruço-me agora sobre o novo ciclo institucional, que está pressionado pela

circunstância de, já no início do próximo mês de julho, haver a necessidade de eleger o novo Presidente do

Parlamento Europeu, quando este começar a funcionar.

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A recomposição do quadro de governação das instituições nunca foi tão complexa quanto hoje, depois das

eleições para o Parlamento Europeu e tendo em conta a composição do Conselho Europeu.

As eleições mostraram a acentuação de tendências de há uma ou duas décadas: a Europa diversifica-se

politicamente, multiplicando-se as agendas com expectativas razoáveis de realização.

A tensão tradicional entre uma Europa mais permeável à estrita lógica dos mercados, mais focada no

mercado único e na melhoria da competitividade, mais aberta ao fenómeno da globalização, e uma Europa mais

social, mais preocupada com a coesão e com a solidariedade internas — tensão, até aqui, protagonizada pelos

dois grupos políticos que dominaram o Conselho Europeu e o Parlamento Europeu desde a sua existência, com

maior ou menor intervenção do ALDE (Alliance of Liberals and Democrats for Europe), agora Renew Europe —

, foi desafiada pelo resultado das eleições.

É inevitável que aquelas duas agendas clássicas tenham de ser complementadas, articuladas ou, até mesmo,

subalternizadas por outras agendas, por vezes contraditórias, com poder para se impor: críticas da globalização,

ambientalistas, avessas aos acordos de comércio, revisionistas das políticas de migração.

Por outro lado, as eleições mostraram também a capacidade de um setor populista, eurocético, nacionalista,

a raiar o extremismo de direita, ganhar posições, embora de forma muito menos pujante do que anunciavam e

ambicionavam.

Ainda está para se ver se aqueles que advogam uma prática e um discurso nacionalista e isolacionista,

acautelando interesses próprios e desprezando os dos outros, são, efetivamente, capazes de se unir com

coerência e coesão.

Mas, se essa união de ações for conseguida por eles, ela não é necessariamente negativa. Antes cria um

polo contra o qual as forças políticas europeístas — sejam socialistas, conservadores, liberais ou verdes —

serão convocadas a unir forças nos momentos e nos temas decisivos.

Considerando este panorama, recomposição institucional com sucesso será aquela que consiga garantir pelo

menos dois objetivos: primeiro, o equilíbrio entre os vários órgãos — Presidente do Parlamento, Presidente da

Comissão, Presidente do Conselho, Alto Representante para a PESC (política externa e de segurança comum)

e, noutro patamar, Presidente do Banco Central Europeu —, que permita a harmonização virtuosa das várias

agendas em termos que sejam benéficos para o aprofundamento e a consolidação do projeto europeu; segundo,

a capacidade de conjugar esforços para derrotar aqueles que querem destruir o projeto europeu e para reganhar

para esse projeto o eleitorado que neles votou.

Muitos de nós apoiam a consolidação do modelo dos Spitzenkandidaten. Não é o único modelo concebível

em contexto de democracia representativa, mas a sua aplicação contribui para a consolidação das instituições

democrático-representativas da União Europeia.

Não obstante, tem de se admitir que, numa situação polarizada, fracionada e desafiadora, como é a presente,

esse modelo pode mostrar-se inexequível.

Muitos dos dados que são hoje determinantes não eram conhecidos aquando da escolha dos

Spitzenkandidaten dos vários grupos políticos, podendo o respetivo perfil não se coadunar com as exigências

atuais.

Por isso, é possível que as escolhas tenham de conseguir equilíbrios que não passem necessariamente

pelas personalidades antes apresentadas, nem pela entrega de presidências e lugares de liderança a quem tem

mais eleitos, embora não os suficientes para garantir uma maioria.

O Sr. Presidente: — Peço-lhe que conclua, Sr. Deputado.

O Sr. Vitalino Canas (PS): — Termino, Sr. Presidente.

Em 2015, Portugal mostrou capacidade para construir, internamente, um modelo de governação inovador,

imaginativo e de sucesso, que soube enfrentar os condicionamentos que, então, se colocavam. Pode constituir,

portanto, um exemplo relevante para a Europa.

Registe-se e aplauda-se, Sr. Primeiro-Ministro, a atuação proeminente que lhe foi entregue, no sentido de

desempenhar, neste processo de recomposição institucional, um papel positivo e um papel que permita uma

solução correta e adequada.

Aplausos do PS.

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O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para uma intervenção, a Sr.ª Deputada Isabel Pires.

A Sr.ª Isabel Pires (BE): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: No primeiro Conselho Europeu após as

eleições europeias um dos principais temas que está na agenda prende-se com as alterações climáticas.

Claramente, é o tema mais emergente da nossa sociedade atualmente e, tal como tivemos oportunidade de

dizer no último debate, em março — antes do anterior Conselho Europeu —, é preciso mesmo que se tomem

medidas efetivas para combater o problema.

Ora, a agenda do próximo Conselho indica que voltarão a esse debate, novamente, ainda sem nada de

concreto. Disse, aqui, que o que está em cima da mesa é mais ambição, ir mais longe na questão da neutralidade

carbónica para 2050.

A verdade é que, ao longo do tempo, continuamos a ouvir muitas declarações de intenções, muitas medidas

paliativas, mas poucos passos verdadeiramente corajosos e que façam frente aos interesses por trás de grandes

poluidores.

Mas, mais do que isso, achamos que é preciso entrar neste debate de uma forma mais séria. E, para isso,

há que partir de um princípio básico: que sem mudanças de fundo no atual modelo de produção não

conseguiremos fazer frente às alterações climáticas e ao aquecimento global com os resultados trágicos que

hoje já vamos começando a sentir. A verdade é que falamos de impactos e de consequências que já hoje são

irreversíveis se não houver a coragem e a vontade de passar das palavras aos atos.

Sabemos que, na prática, o que se tem vindo a fazer não está muito longe de manter tudo na mesma. Já do

anterior Conselho Europeu saíram pouco mais do que declarações de intenções.

A urgência do tema não se coaduna com mais declarações de intenções. A urgência das gerações mais

novas, que continuam a sair à rua, não é compaginável com esta demora em agir para uma verdadeira mudança.

Imagino que o Sr. Primeiro-Ministro tenha ficado orgulhoso de ter um português na capa da revista Time

nesta semana. Mas, se não ficar apenas pela admiração perante a fotografia de António Guterres, perceberá,

facilmente, que a mensagem é de uma enorme preocupação e de um apelo lancinante à ação.

O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Muito bem.

A Sr.ª Isabel Pires (BE): — É que estamos, de facto, perante uma urgência.

A pergunta que colocámos antes do anterior Conselho Europeu mantém-se: afinal, que medidas concretas,

que de facto alterem o paradigma atual, estão pensadas para debate no Conselho Europeu? O que será, afinal,

diferente, nesta matéria, neste Conselho Europeu, em relação aos anteriores?

Este debate do Conselho Europeu tem de ir a um outro assunto, que é, verdadeiramente, aquele que tem

aquecido corações e paixões nos gabinetes de Bruxelas, nos últimos tempos.

Sabemos que estamos em processo de distribuição dos lugares nas instituições europeias, fruto da nova

arrumação de forças resultante das últimas eleições europeias. E é público que o Sr. Primeiro-Ministro tem sido

um dos interlocutores de alto nível, particularmente com os novos liberais europeus. Até ainda em períodos

eleitorais, o Sr. Primeiro-Ministro cultivou essas aproximações, nomeadamente com Emmanuel Macron, facto

político que, do nosso ponto de vista, tem de merecer uma clarificação.

Assim, há três perguntas que gostaríamos de deixar.

A primeira é no sentido de saber se este novo alinhamento nos jogos de poder europeus significa a aceitação

do tratado orçamental e das suas regras. É que sabemos que Macron, porque governa contra o Estado social e

contra os direitos do trabalho, quer uma Europa que tenha exatamente a mesma política e, por isso, quer dar

mais força ao tratado orçamental, pelo que estar com Macron é alinhar nesta estratégia.

A segunda pergunta que fazemos é se não considera, Sr. Primeiro-Ministro, que este caminho é o contrário

do que seguimos em Portugal. É que vários Eurodeputados do Partido Socialista votaram contra a inscrição do

tratado orçamental no ordenamento jurídico europeu,…

O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Exatamente!

A Sr.ª Isabel Pires (BE): — … porque o consideravam errado e, já o dissemos, fizeram muito bem.

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O seu Governo e a solução política que iniciámos em 2015 fizeram várias escolhas contra estas regras e,

por isso mesmo, na altura, até fomos ameaçados pela Comissão Europeia com sanções.

O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Bem lembrado!

A Sr.ª Isabel Pires (BE): — A conclusão que o Governo tira é que estava errado quando tomou todas estas

decisões, considerando a proximidade que tem, ultimamente, com Emmanuel Macron?

A terceira pergunta é sobre o próximo quadro financeiro plurianual, no sentido de saber se o Sr. Primeiro-

Ministro, agora um dos nomes fortes nos corredores de Bruxelas, vai procurar, efetivamente, uma solução que

reverta a perda de fundos que estava prevista.

Já tivemos várias oportunidades de falar sobre a alteração das prioridades que estão no quadro financeiro

plurianual e, portanto, a pergunta que fica é se, em nome da guerra dos tronos de Bruxelas e dos arranjos entre

famílias políticas, o Sr. Primeiro-Ministro vai aceitar desviar o dinheiro da solidariedade e da coesão para

políticas militaristas e aceitar um acordo mau para Portugal.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Tem, agora, a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Nuno Magalhães.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, Srs. Secretários de Estado, Sr.as e Srs.

Deputados, Sr. Primeiro-Ministro: Ouvi-o com atenção e, embora balizando nas chamadas três dimensões que

considerou que iria ser o Conselho Europeu, procurou e fez um esforço — realço — de percorrer alguns temas

que considero importantes, não só do ponto de vista nacional, mas também do ponto de vista da União Europeia:

a questão das alterações climáticas e a forma de lhes dar uma resposta global, que também e, sobretudo, a

União Europeia pode dar; a questão das migrações, que, diria, é um dos maiores símbolos do que tem sido o

falhanço da União Europeia enquanto tal, nomeadamente, do ponto de vista daquilo que é um princípio

estruturante da União Europeia, o princípio da solidariedade.

Já agora, e num aparte, é preciso distinguir — e sei que o Sr. Primeiro-Ministro sabe isso, não é, obviamente,

um recado para o Sr. Primeiro-Ministro — refugiados em situação de imigração ilegal, o apoio aos refugiados e

o que é, ou não, apoio à imigração ilegal, e, nesse sentido, faz bem o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros

em apoiar, em qualquer circunstância, qualquer cidadão português que se encontre acusado pela justiça.

Tenhamos a noção que estamos no âmbito da União Europeia e que isso tem direitos mas também tem

deveres e Itália é, desde logo, um Estado de direito democrático, uma democracia, por isso mesmo um país

amigo de Portugal, e seguramente que respeitamos o seu princípio judicial. Isto é um aparte para lhe dizer, Sr.

Primeiro-Ministro, que a sua resposta de há pouco foi para nós convincente e parece-nos, aliás, do mais

elementar bom-senso.

O Sr. Primeiro-Ministro também falou de outras questões que eu gostaria mesmo que fossem matéria e objeto

deste Conselho Europeu, mas permita-me que lhe diga que temo que nada disto vá ser realmente discutido.

Permita-me, talvez, algum pessimismo excessivo, algum pessimismo irritante, mas creio bem que a primeira,

segunda e terceira dimensões serão as questões institucionais, para não dizer que não é mais do que um

eufemismo para a questão das cadeiras.

Sr. Primeiro-Ministro, estou a dizer isto com alguma leveza, mas, naturalmente, com preocupação, porquanto

é precisamente isto que faz com que os cidadãos europeus se afastem da Europa, é precisamente isto que faz

com que, em muitas circunstâncias, estejamos todos a lamentarmo-nos do alto grau de abstenção.

A minha questão em relação a isto é simples. Independentemente da maior ou menor simpatia que possamos

ter em relação ao candidato, do maior ou menor reconhecimento e até das maiores ou menores razões de queixa

que possamos ter do que foi o seu passado na defesa de alguns interesses coincidentes ou não com os nossos

interesses, a verdade é que há tratados, normas — não lhes chamaria tradições, porque são recentes —, mas

estamos balizados numa lógica tendo em conta os resultados eleitorais.

É verdade que tal não é vinculativo, é indicativo, mas não é menos verdade que essa foi uma disposição que

foi alterada no sentido de aproximar os cidadãos da União Europeia, fazendo com que quando fossem votar

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para o Parlamento Europeu sentissem que, de alguma forma, também estão a votar para uma instituição

europeia, neste caso para a Comissão Europeia e para o Presidente da Comissão.

Não quero cair nesse erro da guerra de nomes, mas queria apenas fazer-lhe uma pergunta muito concreta:

admite ou não um candidato fora das listas, portanto, um terceiro candidato, e será essa a posição do Governo

português, ou rejeita liminarmente esta visão de que, ainda que sem maioria, o candidato da família política mais

votada é o que deve ser indicado para esse mesmo lugar?

Para terminar, Sr. Primeiro-Ministro, em relação ao Quadro Financeiro Plurianual, sabemos que pode haver

um novo calendário. Se sim, qual será?

Sabemos também que o Sr. Primeiro-Ministro, um pouco depois de alguma pressão, nomeadamente por

parte do CDS, veio dizer que aquela primeira proposta em relação a esse Quadro Financeiro Plurianual poderia

ser alterada. Enfim, não vamos agora entrar na guerra dos números — de eventuais cortes de 7% na coesão,

dos eventuais cortes de 15% no segundo pilar, fundamental para matérias como a agricultura —, mas pergunto-

lhe se mantém a esperança de alteração dessa primeira proposta de verbas e, em caso afirmativo, o que é que

irá fazer.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Paula Santos, do PCP.

A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Primeiro-Ministro: Passadas as

eleições para o Parlamento Europeu, o discurso social e de combate à extrema-direita esbateu-se. À mesa da

negociação sobre os próximos cargos na nomenclatura da eurocracia senta-se a extrema-direita.

A hipocrisia é a marca de uma União Europeia que, acenando com o novo ciclo, nada de novo tem a oferecer

aos povos da Europa. Aliás, as soluções que se conhecem para os cargos da União Europeia dizem-nos mesmo

isso. O velho e putrefacto consenso entre direita e social-democracia aí está a fazer caminho, abraçando e

chamando para dentro de casa alguns dos que se dizia combater, nomeadamente os liberais.

A agenda estratégica 2019-2024 que estará em discussão no Conselho Europeu acaba por ser a melhor

prova de que a União Europeia não tem resposta aos problemas com que os povos estão confrontados, pelo

contrário. É com profunda preocupação que olhamos para objetivos como o do aprofundamento da União

Europeia e a peregrina ideia do orçamento para a zona euro, de que o Ministro Mário Centeno tanto se orgulha,

a deriva militarista e securitária, o aprofundamento da criminosa política dita migratória, o aprofundamento do

mercado único, visando mais privatizações e concentração de capital, ou a configuração do investimento,

direcionando-o para as multinacionais.

Recordamos os discursos eloquentes do Sr. Primeiro-Ministro na campanha eleitoral sobre o pacto social.

Pois bem, sabe quantas vezes a palavra «social» surge na agenda estratégica que está em discussão? Duas!

E emprego? Nenhuma! E direitos laborais? Zero! E combate à precariedade? Zero! E poderíamos continuar por

aí fora. Passadas as eleições, fica tudo na mesma.

Insistir neste caminho tem custos muito elevados na política de empobrecimento, de ataque a direitos, de

criação de injustiças e desigualdades na Europa-fortaleza. E são os senhores os responsáveis pelas suas

consequências.

Sobre o Quadro Financeiro Plurianual há uma pergunta que se impõe: vai ou não o Governo usar o seu

direito de veto para impedir um novo corte, o terceiro, no orçamento da União Europeia para Portugal? Vai ou

não impedir os cortes na coesão e na política agrícola comum? Ou vai, pelo contrário, calar-se e assinar por

baixo um orçamento que corta nas políticas sociais mas aumenta mais de 1000% nas despesas militares?

Perante o cenário negro que se perspetiva neste designado novo ciclo, a União Europeia procura agora pintá-

lo de verde, para aparentar preocupações ambientais.

Do que se conhece da política ambiental da União Europeia não há qualquer intenção de intervir sobre as

causas estruturais da degradação do meio ambiente, em particular aquelas que residem no âmago do

funcionamento da economia capitalista.

Se se pretende discutir de forma séria a proteção ambiental, comecemos por discutir a inversão da política

de mercantilização das emissões e concentrar atenções nas grandes corporações internacionais, incluindo o

setor industrial militar altamente poluente; o financiamento de medidas como o alargamento do passe social

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intermodal e a promoção do transporte público; o controlo público de empresas do setor energético; o incentivo

à investigação para o desenvolvimento de novas tecnologias menos poluentes ou o apoio a políticas de apoio à

produção e consumo locais, combatendo a produção intensiva e superintensiva, responsáveis por maiores

emissões e pela utilização acrescida de agroquímicos.

Por que não são incluídos na diretiva relativa às emissões industriais os poluentes que estão no mercado do

carbono e que são excluídos do âmbito desta diretiva? Ou por que não há reforço dos programas destinados à

conservação da natureza, a par da criação de um instrumento financeiro específico destinado a apoiar a gestão

das áreas integrantes da Rede Natura 2000?

Discuta-se, no concreto, a adoção de uma abordagem normativa à problemática das alterações climáticas,

em detrimento da atual abordagem mercantilista. Discuta-se a responsabilização dos grandes produtores e não

dos consumidores, tendo em linha de conta as melhores tecnologias disponíveis e o apoio à criação de

condições para a sua implementação e generalização, tendo em vista a redução de gases com efeito de estufa.

Isso, sim, poderia abrir caminho a uma abordagem séria aos problemas ambientais e climáticos, não aquilo que

é proposto para este Conselho Europeu.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Ferreira, de Os Verdes.

Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Primeiro-Ministro: Este

debate serve, sobretudo, para que a Assembleia da República possa pronunciar-se sobre a construção europeia

e Os Verdes consideram que falar do processo de construção europeia deveria implicar que o próprio Conselho

Europeu, regularmente, procedesse a uma análise dos caminhos das políticas da União Europeia e, sobretudo,

dos seus resultados, porque o que vemos é que a União Europeia continua a fazer um grande esforço para

alimentar os mercados e engordar os setor financeiro, ignorando completamente os cidadãos europeus e os

povos da Europa.

Portanto, na perspetiva de Os Verdes, a União Europeia tem de começar a olhar mais para as pessoas, para

os europeus, e menos para a banca.

Mas, Sr. Primeiro-Ministro, na agenda deste Conselho a questão das alterações climáticas volta a estar em

discussão, desta vez na perspetiva da cimeira climática organizada pelas Nações Unidas.

Como sabemos, a União Europeia pretende atingir a neutralidade carbónica em 2050, mas sucede que para

muitos investigadores esse objetivo ficará seriamente comprometido se a União Europeia mantiver a meta da

redução de carbono até 2030 nos 30%. Para alguns investigadores, aliás, a União Europeia só conseguirá o

objetivo da neutralidade carbónica em 2050 se houver uma redução de carbono até 2030 que se situe na ordem

dos 65%.

Mas, Sr. Primeiro-Ministro, uma vez que neste Conselho certamente estará em debate o apelo do Secretário-

Geral das Nações Unidas para que a União Europeia seja mais ambiciosa relativamente às metas da redução

de carbono até 2030, o que pergunto é que posição vai assumir o Governo português neste desafio feito pelo

Secretário-Geral das Nações Unidas, que considera, aliás, que o objetivo da neutralidade carbónica só será

possível em 2050 se a União Europeia alterar as suas metas de redução de carbono até 2030. Ou seja, as

Nações Unidas consideram que a neutralidade carbónica só é possível em 2050 se a União Europeia alterar a

sua meta de redução de carbono até 2030, abandonando a meta atual dos 30% e estabelecendo uma meta de

55% no que diz respeito à redução de carbono até 2030.

Portanto, basicamente, queríamos saber que posição vai assumir o Governo português nesta matéria, face

ao desafio lançado pelo Secretário-Geral das Nações Unidas para que a União Europeia até 2030 reduza o

carbono em 55% e não em 30%, como está atualmente previsto.

O Sr. Presidente: — Para encerrar o debate, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro António Costa.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Começando pela primeira questão, que

foi colocada pela Sr.ª Deputada Rubina Berardo, quero dizer que é evidente que, com os novos resultados do

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Parlamento Europeu, hoje temos um Parlamento bastante mais fragmentado, o que exige uma negociação

alargada a diferentes famílias políticas. Onde antes era suficiente duas famílias para que houvesse maioria,

agora são necessárias pelo menos três ou quatro famílias para que haja uma maioria política.

Em segundo lugar, essa maioria tem de ter também uma coincidência no Conselho. Por exemplo, só para a

eleição do Presidente da Comissão é necessário que haja uma maioria no Conselho, que propõe, que

corresponda a uma maioria no Parlamento, que aprova.

É por isso que essa maioria tem de ser desenhada tendo em conta qual é a realidade matemática: a

reprodução da maioria parlamentar na Assembleia da República no Parlamento Europeu, pura e simplesmente,

não é possível, porque a aritmética não soma. É que somando o grupo do GUE (Grupo Confederal da Esquerda

Unitária Europeia) com o grupo socialista, social-democrata e trabalhista, não temos maioria, temos mesmo uma

minoria.

Ao nível do Conselho essa reprodução já existe, visto que desde pelo menos há três anos e meio, e sou

testemunha, o Primeiro-Ministro Aléxis Tsípras participa na preparação dos conselhos europeus com os

primeiros-ministros socialistas e sociais-democratas e participa connosco na estratégia da construção de uma

maioria progressista que, necessariamente, tem de ter como primeiro objetivo impedir que se forme uma maioria

no Parlamento Europeu sem que a esquerda faça parte dessa maioria.

Temos de escolher alguém para Presidente da Comissão que procure corresponder ao que é a vontade do

Parlamento Europeu, ou seja, alguém que seja escolhido entre quem foi candidato a Presidente da Comissão

Europeia. Não é uma norma, não está nos tratados, mas é um bom princípio e acho que o Conselho deve

esgotar todas as possibilidades de ter um candidato ou candidata a Presidente da Comissão de entre aqueles

que foram chamados spitzenkandidaten.

Com toda a franqueza, não acho que isso seja impossível, há um e uma que preenchem todas as condições

para serem excelentes Presidentes da Comissão, e há um que, infelizmente, não creio que tenha a experiência

política, quer a nível nacional, quer europeu, para poder desempenhar o cargo, independentemente de — e

creio que seguramente — não poder merecer o apoio de um país que ele procurou sancionar, contra tudo e

contra todos.

Sei que a Sr.ª Deputada Rubina Berardo apoia o candidato que quis castigar Portugal por não ter ido ainda

mais longe no cumprimento da política de austeridade e quis punir Portugal pela mudança política que foi feita

em 2015. Respeito, é coerente com o que o PSD sempre quis, castigar Portugal e os portugueses, mas connosco

não contarão para apoiar alguém que quer castigar Portugal e os portugueses.

Aplausos do PS.

Mas o que é fundamental é que, além dos lugares, discutamos uma agenda e um programa, que tem de ter,

efetivamente, como prioridade a execução do pilar social — como consta, aliás, da proposta de estratégia na

sua nova redação —, que tenha em conta uma política económica que seja simultaneamente verde, inclusiva,

aposte no crescimento, na convergência, no reforço da coesão, na redução das desigualdades e na criação de

mais e melhor emprego, que dê prioridade muito clara à conclusão da União Económica e Monetária, que dê

prioridade ao programa de combate às alterações climáticas e assegure um quadro financeiro plurianual onde

nem o segundo pilar da política agrícola comum, o que está afeto ao desenvolvimento rural, sofra uma redução

nem que países como Portugal tenham uma redução nas verbas de recebem da política de coesão.

Há uma outra dimensão absolutamente estratégica e fundamental que tem a ver com a criação da capacidade

orçamental da zona euro. Essa é uma matéria decisiva.

A nossa experiência é, aliás, ilustrativa: Portugal convergiu fortemente com a União Europeu até a adesão

ao euro e desde a adesão ao euro deixámos de convergir. Haverá faltas nossas, seguramente, mas há uma

razão sistémica que tem a ver com a dificuldade que tivemos de adaptação a um quadro competitivo mais

exigente, que é a participação na área do euro.

Só em 2017, 2018 e, agora, em 2019 estamos a inverter essa tendência, mas sabemos que, para a inverter,

precisamos de poder fazer mais e as recomendações da Comissão Europeia dizem-no, claramente: temos de

investir mais em qualificações, temos de investir mais em infraestruturas da ferrovia e do setor portuário e temos

de investir mais naquilo que aumenta o nosso potencial de crescimento.

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Ora, para que isto aconteça, não basta o instrumento da coesão nem basta retirar à coesão as verbas para

podermos fazê-lo; deve haver uma verba e um programa destinados, exclusivamente, aos países da zona euro

e aos países que, dentro da zona euro, têm de fazer um esforço de convergência, que devem estar devidamente

articulados com as recomendações do Semestre Europeu.

Por isso, a existência destes 17 000 milhões de euros que possam ser reservados aos 19 países da zona

euro, e, de entre estes, àqueles que têm de fazer um esforço de convergência e que possam ter programas

específicos — por exemplo, no caso das nossas recomendações é investir em qualificações, investir na ferrovia

e na capacidade portuária e investir na descarbonização da economia —, é um complemento orçamental da

maior importância para podermos acelerar o processo de convergência com a União Europeia.

Por isso, não se trata de algo menor, pelo contrário, é algo absolutamente estratégico e essencial. Se, em

vez de 17 000 milhões, desejávamos que tivesse o dobro? Com certeza! O triplo? Ainda melhor! Mas há uma

coisa que é certa: há três anos e meio, quando começámos a colocar como prioritária a existência desta

capacidade orçamental para a convergência, era tabu para mais de metade dos membros do Conselho; hoje, já

é algo unânime entre os membros do Conselho.

O que está, neste momento, em aberto para discutir neste Conselho, depois do Eurogrupo, é a chave de

repartição entre os diferentes Estados. Aí creio que Portugal tem tudo a ganhar em aproveitar esta oportunidade

para criar um embrião que tenha uma capacidade, ainda que limitada, mas que tenha todo o potencial para se

desenvolver, crescer e atingir uma maturidade no futuro.

A nossa experiência é muito clara: não nos basta ter as verbas da coesão, temos de ter também as verbas

que aumentem a nossa competitividade, que aumentem o nosso potencial produtivo, porque só assim

poderemos, simultaneamente, ser mais coesos internamente mas também mais competitivos externamente.

Ora, é absolutamente essencial conseguir alcançar isto e é nesse quadro que iremos negociar e iremos

trabalhar.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, chegámos assim ao fim da nossa ordem do dia. Agradeço ao Sr.

Primeiro-Ministro, aos membros do Governo presentes e a todas as Sr.as e Srs. Deputados.

Lembro que a reunião plenária de amanhã, com início às 15 horas, terá como único ponto um debate, ao

abrigo da alínea b) do n.º 3 do artigo 64.º do Regimento, requerido pelo CDS-PP, sobre o tema «em defesa dos

contribuintes, contra os abusos da Autoridade Tributária».

Srs. Deputados, nada mais havendo para tratar, dou por encerrada a sessão.

Eram 17 horas e 55 minutos.

Presenças e faltas dos Deputados à reunião plenária.

A DIVISÃO DE REDAÇÃO.

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