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Quarta-feira, 11 de dezembro de 2019 I Série — Número 15

XIV LEGISLATURA 1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2019-2020)

REUNIÃOPLENÁRIADE10DEDEZEMBRODE 2019

Presidente: Ex.mo Sr. Eduardo Luís Barreto Ferro Rodrigues

Secretários: Ex.mos Srs. Maria da Luz Gameiro Beja Ferreira Rosinha Helga Alexandra Freire Correia Ana Cristina Cardoso Dias Mesquita

S U M Á R I O

O Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 2 minutos.

Deu-se conta da entrada na Mesa da Proposta de Lei n.º 2/XIV/1.ª, dos Projetos de Lei n.os 134 a 143/XIV/1.ª, do Projeto de Regimento n.º 5/XIV/1.ª e dos Projetos de Resolução n.os 139 a 148/XIV/1.ª.

Ao abrigo da alínea a) do n.º 2 do artigo 224.º do Regimento, teve lugar o debate quinzenal com o Primeiro-Ministro (António Costa), sobre o Quadro Financeiro Plurianual da União Europeia 2021-2022. Após ter proferido uma intervenção inicial, o Primeiro-Ministro respondeu a perguntas que lhe foram colocadas pelos Deputados José Luís Carneiro (PS), Rui Rio (PSD), Catarina Martins (BE), Jerónimo de Sousa (PCP), Cecília Meireles (CDS-PP), Inês

de Sousa Real (PAN), José Luís Ferreira (PEV), André Ventura (CH) e João Cotrim de Figueiredo (IL).

Seguiu-se o debate preparatório do próximo Conselho Europeu, ao abrigo da alínea a) do n.º 1 do artigo 4.º da Lei de Acompanhamento, Apreciação e Pronúncia pela Assembleia da República no âmbito do Processo de Construção da União Europeia. Proferiram intervenções, além do Primeiro-Ministro, que abriu e encerrou o debate, os Deputados Luís Capoulas Santos (PS), Carlos Brás (PS), Isabel Meireles (PSD), Fabíola Cardoso (BE), Bruno Dias (PCP), João Pinho de Almeida (CDS-PP), Inês de Sousa Real (PAN) e José Luís Ferreira (PEV).

O Presidente encerrou a sessão eram 17 horas e 44 minutos.

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O Sr. Presidente: — Sr.as e Srs. Deputados, Sr.as e Srs. Funcionários, Sr.as e Srs. Jornalistas, está aberta a

sessão.

Eram 15 horas e 2 minutos.

Peço aos Srs. Agentes da autoridade para abrirem as portas das galerias ao público.

Srs. Deputados, o primeiro ponto da ordem do dia de hoje consiste no debate quinzenal com o Sr. Primeiro-

Ministro, ao abrigo da alínea a) do n.º 2 do artigo 224.º do Regimento, sobre o Quadro Financeiro Plurianual da

União Europeia 2021-2027. Do segundo ponto consta o debate preparatório do próximo Conselho Europeu, ao

abrigo da alínea a) do n.º 1 do artigo 4.º da Lei de Acompanhamento, Apreciação e Pronúncia pela Assembleia

da República no âmbito do Processo de Construção da União Europeia.

Entretanto, a Sr.ª Secretária Maria da Luz Rosinha fará o favor de nos dar conta de algumas informações.

A Sr.ª Secretária (Maria da Luz Rosinha): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, deram entrada na Mesa

diversos diplomas.

Em primeiro lugar, informo da entrada na Mesa da Proposta de Lei n.º 2/XIV/1.ª (GOV) — Procede à

transposição da Diretiva Delegada (UE) 2019/369 da Comissão, de 13 de dezembro de 2018, a fim de incluir

novas substâncias psicoativas na definição de droga, introduzindo a vigésima quarta alteração ao Decreto-Lei

n.º 15/93, de 22 de janeiro, que aprova o regime jurídico aplicável ao tráfico e consumo de estupefacientes e

substâncias psicotrópicas, que baixa à 1.ª Comissão.

Deram também entrada na mesa os seguintes projetos de lei: n.º 134/XIV/1.ª (PAN) — Visa a interdição do

fabrico, posse, utilização e venda de artefactos que sirvam unicamente para a captura de aves silvestres não

sujeitas a exploração cinegética, que baixa à 7.ª Comissão; n.º 135/XIV/1.ª (PCP) — Aprova o Estatuto da Rádio

e Televisão de Portugal (terceira alteração à Lei n.º 8/2007, de 14 de fevereiro, que procede à reestruturação da

concessionária do serviço público de rádio e televisão, bem como os novos estatutos da Rádio e Televisão de

Portugal), que baixa à 12.ª Comissão; n.º 136/XIV/1.ª (BE) — Elimina o fator de sustentabilidade das pensões,

repõe a idade legal de reforma nos 65 anos e consagra a redução personalizada da idade da reforma para

trabalhadores com 40 ou mais anos de descontos (décima alteração ao Decreto-Lei n.º 187/2007, de 10 de

maio), que baixa à 10.ª Comissão; n.º 137/XIV/1.ª (BE) — Institui a obrigatoriedade e gratuitidade de emissão

do distrate e de declaração de liquidação do empréstimo, elimina comissões cobradas pelo processamento de

prestações de crédito, proibindo ainda as instituições de crédito de alterar unilateralmente as condições

contratuais dos créditos concedidos ao consumo (quarta alteração ao Decreto-Lei n.º 133/2009, de 2 de junho),

que baixa à 5.ª Comissão; n.º 138/XIV/1.ª (BE) — Institui a obrigatoriedade e gratuitidade de emissão do distrate

e de declaração de liquidação do empréstimo, elimina comissões cobradas pelo processamento de prestações

de crédito, proibindo ainda as instituições de crédito de alterar unilateralmente as condições contratuais dos

créditos concedidos à habitação (terceira alteração ao Decreto-Lei n.º 74-A/2017, de 23 de junho), que baixa à

5.ª Comissão; n.º 139/XIV/1.ª (BE) — Consagra a proibição de cobrança de encargos pelas instituições de

crédito nas operações realizadas em plataformas eletrónicas operadas por terceiros (primeira alteração ao

Decreto-Lei n.º 3/2010, de 5 de janeiro), que baixa à 5.ª Comissão; n.º 140/XIV/1.ª (BE) — Cria o sistema de

acesso à conta básica universal, que baixa à 5.ª Comissão; n.º 141/XIV/1.ª (PEV) — Relações de trabalho dentro

da Infraestruturas de Portugal, SA (alteração ao Decreto-Lei n.º 91/2015, de 29 de maio), que baixa à 13.ª

Comissão; n.º 142/XIV/1.ª (PEV) — Limita o período de fidelização nos contratos de prestação de serviços de

comunicações eletrónicas, que baixa à 6.ª Comissão; e n.º 143/XIV/1.ª (CDS-PP) — Assegura formação

obrigatória aos magistrados em matéria de Convenção dos Direitos da Criança (quarta alteração à Lei n.º 2/2008,

de 14 de janeiro), que baixa à 1.ª Comissão.

Deu, igualmente, entrada na Mesa o Projeto de Regimento n.º 5/XIV/1.ª (CDS-PP) — Quarta alteração ao

Regimento da Assembleia da República, que baixa à 1.ª Comissão.

Deram, ainda, entrada na Mesa os seguintes projetos de resolução: n.º 139/XIV/1.ª (PAN) — Recomenda ao

Governo que cesse o incumprimento da Diretiva Habitats e que proceda à designação das Zonas Especiais de

Conservação, que baixa à 11.ª Comissão; n.º 140/XIV/1.ª (PAN) — Recomenda ao Governo que institua um

regime de moratória temporário para a caça da rola-comum, que baixa à 7.ª Comissão; n.º 141/XIV/1.ª (PAN) —

Recomenda ao Governo que integre nos planos globais de gestão do lobo-ibérico a obrigatoriedade de zonas

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de refúgio de presas silvestres em cada núcleo populacional, que baixa à 11.ª Comissão; n.º 142/XIV/1.ª (BE)

— Pela requalificação de toda a linha do Alentejo, a eletrificação do troço ferroviário Casa Branca-Beja-Funcheira

e a reativação do ramal ferroviário de Aljustrel, que baixa à 6.ª Comissão; n.º 143/XIV/1.ª (BE) — Recomenda a

elaboração de orientações para a política de comissões bancárias da Caixa Geral de Depósitos, que baixa à 6.ª

Comissão; n.º 144/XIV/1.ª (PSD) — Criação do estatuto estudante-voluntário, que baixa à 8.ª Comissão; n.º

145/XIV/1.ª (CDS-PP) — Recomenda ao Governo a criação de um regime de incentivos para lusodescendentes

e portugueses emigrados que pretendam frequentar instituições de ensino superior públicas em Portugal, que

baixa à 8.ª Comissão; n.º 146/XIV/1.ª (IL) — Recomenda ao Governo a reintrodução da obrigatoriedade de

análise custo/benefício para concessão de parcerias público-privadas, que baixa à 5.ª Comissão, em conexão

com a 6.ª Comissão; n.º 147/XIV/1.ª (CDS-PP) — Recomenda ao Governo que tome medidas para o

desenvolvimento da geriatria, que baixa à 9.ª Comissão; e n.º 148/XIV/1.ª (PCP) — Estabelece o calendário

para a instituição em concreto das regiões administrativas durante o ano de 2021, que baixa à 13.ª Comissão

em conexão com a 1.ª Comissão.

Em termos de expediente é tudo, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: — Muito obrigada, Sr.ª Secretária, pelo seu esforço em condições difíceis, porque há muito

barulho na Sala. Espero que na próxima vez em que seja anunciado o expediente, haja um pouco mais de

respeito por quem está a exercer a função de Secretária da Mesa.

Srs. Deputados, vamos, agora entrar no primeiro ponto da ordem do dia, que, como já indiquei, consiste no

debate quinzenal com o Sr. Primeiro-Ministro, ao abrigo da alínea a) do n.º 2 do artigo 224.º do Regimento,

sobre o Quadro Financeiro Plurianual da União Europeia 2021-2027.

Para introduzir o debate, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro (António Costa): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Estamos a entrar numa

fase crítica e decisiva das negociações relativas aos fundos comunitários pós-2020. Este é um tema fulcral para

todo o País e que condiciona o nosso modelo de crescimento económico, de coesão social e de desenvolvimento

territorial.

O próximo Quadro Financeiro extravasa a presente Legislatura e por isso procurámos, nesta matéria,

alcançar um amplo consenso interno, seja sobre a visão estratégica do Portugal 2030 seja sobre o que deva ser

o Programa Nacional de Investimentos para a próxima década. Também por isso, face à essencialidade do que

está em jogo, é vital que o Governo se apresente, em todas as instâncias europeias de negociação, apoiado

não só num debate parlamentar franco e clarificador, mas, desejavelmente, numa frente comum que congregue

todos os partidos representados nesta Assembleia da República em nome do interesse nacional.

Por razões conhecidas, este novo Quadro Financeiro Plurianual insere-se num contexto de exigência

acrescida, necessitando, simultaneamente, de acomodar o impacto do Brexit, de corresponder às prioridades

na área da defesa, da segurança e das migrações e de investir na transição para uma economia mais sustentável

nos planos ambiental, social e tecnológico.

Ora, não podemos exigir mais da Europa dando menos à Europa. Não podemos ir atribuindo mais tarefas à

União Europeia sem aumentar as nossas contribuições e os seus recursos próprios. Caso contrário, a União

Europeia continuará a prometer de mais e a realizar de menos, e isso afetará, de forma muito perigosa, a

confiança dos cidadãos nas instituições nacionais e europeias, o que só contribui para alimentar o populismo.

Portugal está nestas negociações com uma postura construtiva e empenhado em encontrar soluções.

Insistimos sempre na necessidade de se alcançar um acordo atempado, essencial para permitir uma boa

transição entre quadros comunitários, que não comprometa o crescimento económico da Europa. Uma

aprovação atempada do novo quadro é, pois, a nossa primeira prioridade.

Aplausos do PS.

Como sabemos, a primeira proposta apresentada pela Comissão era insuficiente. Contudo, a recente

proposta da presidência finlandesa, que estará em debate no próximo Conselho Europeu, fica ainda mais aquém

da dimensão necessária para que o próximo Quadro Financeiro Plurianual possa cumprir os compromissos que

a União Europeia assumiu com os cidadãos, não tem em consideração as propostas quer da Comissão quer do

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Parlamento Europeu, nem a posição da maioria dos Estados-Membros, conduzindo, inevitavelmente, a um

confronto entre a maioria no Conselho e a um conflito institucional com o Parlamento Europeu e com a própria

Comissão Europeia.

Concretamente, e no que diz respeito a Portugal, a proposta da presidência finlandesa implicaria um corte

de 10% nos fundos da coesão destinados ao nosso País, menos três pontos percentuais do que a proposta

inicial da Comissão Europeia.

Outro aspeto especialmente gravoso consiste na alteração das taxas de cofinanciamento, aumentando a

pressão sobre os encargos do Orçamento do Estado.

Por todas estas razões, esta proposta merece a nossa clara rejeição e, estou certo, a firme rejeição de toda

esta Câmara.

Aplausos do PS.

Convém recordar o que está em causa quando falamos em Fundo de Coesão: falamos de 14 000 empresas

que estão a ser apoiadas na sua modernização no quadro do Portugal 2020, dos milhares de trabalhadores que

estão em ações de formação nas empresas, de mais 400 equipamentos de apoio à infância, de 118 000

estudantes bolseiros no ensino superior, do aumento de milhares de toneladas por ano na reciclagem de

resíduos ou no tratamento de águas residuais.

Como proposta de compromisso, defendemos que o próximo quadro plurianual deverá, no mínimo, manter a

proporção do esforço que cada Estado-membro já aceitou fazer há sete anos, sem contar com o Reino Unido,

ou seja, uma contribuição de 1,16% do rendimento nacional bruto da União Europeia a 27.

Aplausos do PS.

Defendemos, também, que as novas políticas e iniciativas europeias requerem meios adicionais e, por isso,

apoiamos a criação de novos recursos próprios da União. Precisamos de um orçamento que corresponda às

ambições europeias e à necessidade de investir mais em investigação e desenvolvimento, no combate às

alterações climáticas, na transição digital, na cooperação com outros continentes, em particular com o continente

africano, e na segurança.

Mas, em qualquer caso, a política de coesão e a política agrícola comum não podem ser as variáveis de

ajustamento, pois são as políticas que mais contribuem para aproximar a Europa do dia a dia dos seus cidadãos,

pelo que, se é certo que precisamos de responder a novos desafios, convém não sacrificar aquilo que já

provámos fazer bem. Além do mais, porque estas políticas também contribuem para enfrentar os desafios do

futuro, devemos, por isso, rejeitar o confronto simplista e redutor entre novas e velhas políticas. Não! Quer a

política de coesão, quer a política agrícola são fundamentais para enfrentarmos os desafios do futuro.

Aplausos do PS.

A política agrícola e, em particular, o seu segundo pilar, relativo ao desenvolvimento rural, tem um papel

fundamental na luta contra as alterações climáticas e na garantia da biodiversidade. A coesão, por sua vez, é

essencial na abordagem à transição digital, através do investimento nas qualificações e na modernização das

empresas. O caminho correto consiste, por isso, em intensificar estas tendências.

Assim, tal como a política agrícola comum tem evoluído no sentido de uma maior preocupação

agroambiental, também a política de coesão deve evoluir para a valorização dos seus principais destinatários:

as pessoas.

Aplausos do PS.

Para tal, é essencial associar a política de coesão ao pilar social, tornando-a num instrumento central da

resposta aos desafios demográficos, laborais e de inclusão com que as sociedades europeias se confrontam.

Deste modo, há que casar o objetivo de maior competitividade económica com o imperativo de maior coesão

social, a fim de promover uma convergência real com a União Europeia. É esta política dos três cc —

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competitividade, coesão e convergência — que deve nortear a ação das instituições europeias e para a qual

importa assegurar os necessários meios financeiros.

Eis um desafio essencial que temos pela frente e já! Para esta difícil negociação, é essencial podermos

contar com todos, em nome do interesse de Portugal e dos portugueses.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Vamos entrar na fase de debate.

O primeiro grupo parlamentar a intervir é o do PS.

Tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Carneiro.

O Sr. José Luís Carneiro (PS): — Sr. Presidente da Assembleia da República, Sr.as e Srs. Deputados, Sr.

Primeiro-Ministro, permita-me que o felicite pelo modo inteligente e consistente como tem defendido a política

de convergência e de coesão junto das instâncias da União Europeia. Fazê-lo é, antes do mais, defender o

projeto europeu e nele, também, o interesse de Portugal e dos países da convergência.

Aliás, a voz de Portugal, por intermédio do Sr. Primeiro-Ministro, é hoje a voz de muitos desses países, de

países que, como Portugal, aderiram ao projeto da União Europeia, porque foram capazes de aí encontrar um

ideal de democracia, de paz, de liberdade, de prosperidade e de justiça. Esse é um ideal muito antigo, vindo de

homens como Victor Hugo, Coudenhove, Jean Monnet, Adenauer, Alcide De Gasperi, Robert Schuman e,

depois, nos anos 80, daquele que é para nós uma referência, Jacques Delors, que foram os continuadores desse

projeto de desenvolvimento, em harmonia económica e social.

Sr. Primeiro-Ministro, foi e é esse ideal que manteve e que mantém vivo o projeto europeu. Temos, pois, o

dever de lutar por ele. Ao defendermos uma política de coesão sólida e robusta, estamos a defender esse ideal

e o projeto dos pais fundadores.

Aplausos do PS.

É isso que, pela mão do PS e de V. Ex.ª, tem acontecido no nosso País e que queremos que volte a suceder

no próximo ciclo de fundos europeus.

Sr. Primeiro-Ministro, permita-me, pois, que lhe transmita o incondicional apoio desta bancada parlamentar

às suas posições junto da União Europeia. Fazemo-lo não por razões de egoísmo nacional, mas por sabermos

que, desde a sua origem, o desenvolvimento equilibrado e harmonioso, numa primeira fase, e o desenvolvimento

regional e a coesão, a partir das décadas de 70 e de 80, têm sido a outra face do mercado comum europeu.

Como tem afirmado V. Ex.ª, o crescimento económico é virtuoso quando acompanhado do bem-estar social,

quando há equilíbrio entre a riqueza criada e a justa repartição da mesma. É isso que honra a história da política

de coesão e que favorece um futuro digno da política regional. Sabemos bem que, hoje, V. Ex.ª Sr. Primeiro-

Ministro, é um dos que representam esse espírito fundador europeu.

Sr. Primeiro-Ministro, propor e defender, em Bruxelas, que a dimensão do Quadro Financeiro Plurianual para

2021-2027 não pode ser inferior ao valor do atual quadro comunitário em execução é uma atitude que honra a

história da política regional e da política de coesão europeias. Assumir esta posição significa honrar toda a

história do projeto europeu.

Aplausos do PS.

Sr. Primeiro-Ministro, defendemos a sua posição porque se integra num importante princípio fundador do

projeto europeu, o da equidade e o da justiça social, ideias fundamentais de que o PS sempre foi um paladino.

Mas fazemo-lo, também, por sabermos que há muitas vantagens para a União Europeia na política de coesão

e de desenvolvimento regional. São muitos os argumentos económicos, hoje já demonstrados cientificamente:

promove o aumento do rendimento e da produção; conduz à redução da inflação e estimula um crescimento

mais rápido; permite fazer face aos problemas sociais que se vivem nas grandes cidades; contribui para

aprofundar a integração comercial e económica; contribui para a expansão dos mercados; promove os efeitos

de dispersão; ajuda a resolver algumas das questões relacionadas com as finanças públicas, que aconselham

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a não concentrar os recursos apenas nos países com regiões deprimidas; apresenta vantagens de coordenação,

o que promove uma maior eficácia na afetação dos recursos; e é o melhor modo para atenuar os desequilíbrios

que resultam da integração e dos alargamentos.

Sr. Primeiro-Ministro, desde a Comunidade Económica do Carvão e do Aço, passando pelo Tratado de Roma,

até à criação do Fundo Europeu do Desenvolvimento Regional (FEDER), a coesão tem sido uma constante no

projeto europeu. Com a adesão de Portugal, da Grécia e da Espanha, foi alargado o âmbito do FEDER a todas

as regiões com atrasos no desenvolvimento. E com o Ato Único Europeu e com o pacote Delors mais do que

duplicaram os apoios destinados à coesão, o que permitiu, em 1992, com o Tratado da União Europeia, dar

prioridade a esta política, sendo assumida como a outra face para o cumprimento dos critérios de convergência

para a moeda única.

Posteriormente, quer nos conselhos europeus de Edimburgo, quer no Tratado de Amesterdão, a política de

coesão ganhará uma grande centralidade. Temos orgulho na Cimeira de Lisboa, que adotou uma nova visão

estratégica para a competitividade e para a coesão e esta, para além da dimensão económica e social, passou

também a ter um olhar para os territórios. A estratégia 2014/2020 que temos em execução não apenas manteve

esta visão, como associou o crescimento económico à inclusão, à justiça social e à sustentabilidade ambiental.

Sr. Primeiro Ministro, já era incompreensível a proposta da Comissão que reduzia os apoios a Portugal. Ora,

a proposta finlandesa é ainda mais drástica e propõe uma redução de 10% nesses apoios.

O Sr. Primeiro-Ministro é um europeísta convicto; somos, em Portugal, europeístas convictos. Participámos

em vários dos momentos cruciais da história do projeto europeu e temos vindo a conquistar prestígio e influência

nas suas mais importantes instâncias. O financiamento europeu é hoje vital, como aliás afirmou, é uma das

variáveis estruturais nas condições de desenvolvimento do País e no relançamento do investimento público para

a próxima década e para cumprirmos os desafios da Legislatura.

Sr. Primeiro-Ministro, em função da proposta da presidência Finlandesa, que objetivos visa alcançar o

Governo, com que aliados podemos contar e que resultados esperamos para Portugal?

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro, António Costa.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr. Deputado José Luís Carneiro, a política de coesão, hoje, faz

parte da identidade da própria União Europeia, não só dos valores de solidariedade que lhe estão na génese,

mas também como um elemento central da visão com que Jacques Delors encarou a construção do mercado

único. O mercado único, aumentando muito a competitividade entre economias com um nível de

desenvolvimento muito diverso, exigia uma contrapartida muito forte, através de uma sólida política de coesão

ancorada na dimensão regional da Europa.

Sr. Deputado, tivemos o privilégio de ser colegas, durante muitos anos, no Comité das Regiões e de poder

testemunhar como, do norte da Finlândia ao sul da Grécia, a política de coesão tem desempenhado um papel

essencial não só no reforço da coesão económico-social, não só no esbatimento das assimetrias regionais, mas

também no fortalecimento do espírito europeu. Não se trata só de dinheiro, trata-se de algo que tem que ver

com o nosso compromisso com a União Europeia. Não há política nenhuma, na União Europeia, que chegue

mais próximo de cada cidadão. Não há uma cidade, uma aldeia, uma vila da Europa onde a União Europeia não

tenha chegado através da política de coesão.

Aplausos do PS.

Por isso, a política de coesão é um cimento fundamental na construção do futuro do projeto europeu.

Sabemos bem que tudo exige ir acompanhando o evoluir dos tempos. E a política de coesão, naturalmente,

deve ir, também, acompanhando os tempos.

Hoje, não podemos olhar só para a sua dimensão territorial, temos de olhar cada vez mais para a sua

dimensão em relação às pessoas. A sua prioridade tem de ser também o combate à pobreza,

independentemente de onde estejam as maiores concentrações de pobreza. Hoje, tem de se investir cada vez

mais na qualificação dos recursos humanos e na modernização do tecido empresarial, porque só melhorando a

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competitividade das empresas reforçaremos a nossa coesão interna. É por isso que tem sido tão importante no

esforço de modernização, por exemplo, do nosso País. Grande parte do sucesso económico que temos tido

deve-se ao facto de o investimento privado se ter solidamente suportado nos fundos do Portugal 2020. Ora, esta

é uma trajetória que não podemos interromper — nem nós, nem o conjunto da Europa —, é uma trajetória que

tem de ter continuidade e, por isso, temos de nos bater por este princípio, e temos de o fazer em nome de

Portugal, mas também em nome do conjunto do projeto europeu.

Por isso, relativamente à proposta da presidência finlandesa, só há uma resposta a dar: rejeitar a proposta

da presidência finlandesa.

Aplausos do PS.

É verdade que é uma proposta que procura um maior equilíbrio entre a política de coesão, a política agrícola

e as novas políticas. É verdade que, no caso concreto de Portugal, no que diz respeito à política agrícola, tem

até uma ligeira melhoria, contudo, essa melhoria não existe no Fundo das Pescas, essa melhoria não existe

relativamente ao POSEI, o programa de opções específicas para fazer face ao afastamento e à insularidade, e

ao financiamento dos programas para as nossas duas regiões ultraperiféricas dos Açores e da Madeira e agrava

a nossa situação no âmbito do Fundo de Coesão.

Sendo justos, não é uma decisão da Presidência, é fruto de uma decisão aparentemente técnica, mas

altamente penalizadora de Portugal, que tem a ver com o facto de se ter atualizado a referência estatística,

deixando de se utilizar os dados de 2015 para se passar a utilizar os dados de 2017, o que nos penaliza agora

em cerca de 800 milhões de euros, fruto do progresso económico e, em particular, da redução do desemprego

que se conseguiu entre 2015 e 2017.

Ora, se há algo que não é aceitável para um país que sofreu, como Portugal sofreu, o ajustamento económico

de resposta à crise das dívidas soberanas, que sofreu o que sofreu com a crise económica internacional de

2008, é sermos agora penalizados pelo sucesso da nossa política económica, do nosso crescimento e da

redução do desemprego.

Aplausos do PS.

Temos, por isso, de manter uma posição firme e construtiva: firme, rejeitando tudo o que contrarie o interesse

nacional; construtiva, de forma a procurar aproximar parceiros e também instituições. E a posição que

assumimos deve ser a que procura aproximar a proposta inicial da Comissão da proposta do Parlamento

Europeu, com vista a um justo equilíbrio no Conselho Europeu, que garanta algo que é essencial: que nenhum

Estado-Membro terá de fazer proporcionalmente um esforço superior ao que aceitou fazer há sete anos,

descontando a presença do Reino Unido, e permitindo, simultaneamente, graças ao crescimento que existiu do

rendimento nacional bruto, cobrir as novas prioridades políticas, mas não afetar a política de coesão nem a

política agrícola comum, muito em especial o segundo pilar da política agrícola comum.

É muito importante que, tal como está a acontecer no Parlamento Europeu, seja possível construir uma

grande frente nacional nesta matéria. Eu próprio, há duas semanas, tive oportunidade de reunir, no Parlamento

Europeu, não só com o Presidente e com as lideranças dos principais grupos parlamentares mas também com

os dois Eurodeputados portugueses, José Manuel Fernandes e Margarida Marques, que no PPE e no grupo

socialista têm responsabilidades na elaboração do próximo quadro, e fiquei muito ciente da convergência de

pontos de vista entre todos e da posição clara do Parlamento Europeu de não aceitar a proposta finlandesa.

É também muito importante que quando nos reunirmos no Conselho na próxima quinta-feira ninguém tenha

dúvidas de qual é a posição do Parlamento português e de que o Governo português, quando diz «não» a esta

proposta, está a dizer «não» com o apoio claro e inequívoco da maioria desta Assembleia.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Tem, agora, a palavra, para formular as suas perguntas, em nome do Grupo

Parlamentar do PSD, o Sr. Deputado Rui Rio.

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O Sr. Rui Rio (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, no debate que se vai seguir iremos abordar

com mais pormenor a questão do Quadro Financeiro Plurianual, que é efetivamente relevante, como disse, para

a competitividade e a convergência das economias europeias. Mas queria fazer-lhe agora uma pergunta muito

específica sobre a competitividade e a convergência, a qual tem a ver com a proposta que o Eurogrupo fez sobre

o denominado «BICC» (Budgetary Instrument for Convergence and Competitiveness), que é o instrumento

orçamental justamente para a competitividade e a convergência da zona euro.

Essa proposta, se vier a ser aplicada, contraria aquilo que é a sua própria lógica. E porquê? Porque um país

como, por exemplo, a Alemanha acaba a receber mais do que um país como Portugal.

Portanto, o PSD não pode, naturalmente, estar de acordo com a proposta do Eurogrupo.

Dá-se, no entanto, a feliz ou infeliz coincidência de o Eurogrupo ser presidido pelo Ministro das Finanças de

Portugal, ou seja, pelo seu Ministro das Finanças, Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Adão Silva (PSD): — Ora aí está!

O Sr. Rui Rio (PSD): — A pergunta concreta que lhe faço é no sentido de saber se o Sr. Primeiro-Ministro

está de acordo com a proposta do Eurogrupo para o denominado BICC.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro, António Costa.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Rui Rio, agradeço a sua pergunta.

Portugal não está de acordo com a proposta do Eurogrupo sobre o BICC. O BICC é um instrumento essencial

para, no quadro da moeda única, fazer aquilo que a política de coesão fez no quadro do mercado único e, por

isso, tem de ser um instrumento para a convergência. Tenho, aliás, vários textos escritos, de sucessivos

discursos que fiz nos últimos anos, defendendo a criação deste instrumento financeiro, numa lógica de financiar

os países da zona euro que precisam de convergir e de nos permitir responder às recomendações anuais do

Semestre Europeu.

O que resulta da proposta do Eurogrupo é algo completamente diferente. Como se confundiu entre o

instrumento proposto inicialmente pela Comissão, no interior do quadro financeiro plurianual, e uma proposta

francesa de acordo intergovernamental, criando um princípio de justo retorno ou rebate de cada verba, isso

conduziu ao resultado absurdo de o primeiro país beneficiário do BICC ser precisamente a economia mais

desenvolvida da União Europeia, que é a Alemanha. A seguir vem a França, depois a Itália, depois a Espanha,

depois a Holanda e, depois, lá conseguimos vir nós, graças ao mecanismo corretor que, apesar de tudo, existe,

que é o do PIB per capita invertido.

É um instrumento que não cumpre a sua função e, se reparar nas conclusões do Conselho sobre esse ponto,

que aceitamos, verá que recebemos a proposta do Eurogrupo e a partir de agora será trabalhada no âmbito do

debate no Conselho sobre o Quadro Financeiro Plurianual, e tem de levar, obviamente, uma volta muito grande

para poder ser útil. Se não for útil, mais vale que não exista.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Continua no uso da palavra, para formular as suas perguntas, o Sr. Deputado Rui Rio.

Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Rui Rio (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, estamos, então, de acordo, assim como

também estamos de acordo, como é evidente, na rejeição da proposta finlandesa.

Não sei é se estaremos de acordo em relação àquilo com que o vou confrontar agora, mais importante ainda

para a convergência e para a competitividade do que o quadro financeiro plurianual da União Europeia, que é a

educação.

O sistema educativo é aquilo que de mais importante um país tem, e, neste caso, que Portugal tem, para a

sua competitividade futura.

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Como sabe, desde o ano de 2000, a OCDE, através do PISA (Programme for International Student

Assessment), vai medindo, de três em três anos, a literacia dos jovens que saem do ensino básico em leitura,

em ciências e em matemática. De 2000 a 2015, Portugal melhorou sempre nos três indicadores. No entanto, na

semana passada, ou há uma semana e meia, saíram os dados de 2018 e, comparados com os de 2015,

justamente o ano em que o PS começou a governar, pela primeira vez degradaram-se, ou seja, o melhor que

conseguimos foi estagnar na matemática, mas piorámos nas ciências e na leitura. Os números que tenho

indicam que na matemática nos mantivemos nos 492, isto é, deixámos de melhorar, mas, depois, na leitura,

baixámos de 498 para 492 e, nas ciências, ainda foi pior, porque baixámos de 501 para 492.

O Sr. Ministro da Educação, questionado sobre isso — aliás, penso que deu mesmo uma conferência de

imprensa sobre a matéria —, desvalorizou a degradação, considerou-a relativa e, ainda assim, disse que a

responsabilidade pela degradação não era dele, era do Ministro Nuno Crato e da crise económica que Portugal

atravessou aquando da troica, ou seja, o Sr. Ministro da Educação considera que o seu trabalho não foi relevante

para esta degradação. Ora, como nada melhorou, se calhar, atrevo-me a dizer que ele considera que o seu

trabalho é, pura e simplesmente, irrelevante, mas eu não o considero irrelevante, considero que é relevante, e

é relevante, justamente, na degradação.

Aplausos do PSD.

A minha pergunta concreta é esta: o Sr. Primeiro-Ministro está de acordo com o Ministro da Educação e,

portanto, subscreve que nada é preciso alterar, porque tudo o que está mal vem de trás e o que vem de trás já

passou?

Protestos do Deputado do PS Porfírio Silva.

Ou está efetivamente preocupado com o facto de Portugal ter visto degradados os seus indicadores, pela

primeira vez, nestes últimos três anos, propondo-se, efetivamente, fazer alterações — o quê, pergunto eu —

para que, daqui por três anos, Portugal volte a melhorar e não fique, como em 2018, com o que perdeu

relativamente a 2015?

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Rui Rio, felizmente, estamos de acordo no ponto

de partida: a educação é mesmo a chave para o nosso desenvolvimento.

Em segundo lugar, não vou entrar no debate,…

Vozes do PSD: — Ah!

O Sr. Primeiro-Ministro: — … se me permite, mesquinho…

Protestos de Deputados do PSD.

… sobre o contributo de cada Governo,…

O Sr. Adão Silva (PSD): — Não lhe dá jeito!

O Sr. Primeiro-Ministro: — … além do mais, porque, como todos os cientistas da área da educação e todos

os especialistas da área estatística já explicaram, o coorte etário que foi objeto de avaliação foi claramente

influenciado, na sua formação, pelas políticas do Governo que antecedeu o Governo que antecedeu o atual.

Aplausos do PS.

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Risos do PSD.

Mas não é isso que é relevante. O que é relevante são dois outros dados. O que é relevante é, em primeiro

lugar, Portugal ser o único país, no seio da OCDE que, continuamente, desde o início do século, tem tido uma

evolução sistematicamente positiva dos indicadores no âmbito do PISA. Esse é o dado absolutamente relevante.

Aplausos do PS.

O segundo dado relevante é o de que é fundamental continuarmos a fazer ainda mais e melhor. Portanto,

indo à sua pergunta, no sentido de saber se estamos satisfeitos ou se temos de fazer mais, a minha resposta é

muito clara: temos de fazer mais. É por isso que temos de continuar a reduzir o número de alunos por turma, é

por isso que temos de continuar a universalizar o pré-escolar, é por isso que temos de continuar a eliminar as

barreiras económicas relativas ao sucesso educativo, é por isso que temos de continuar a reforçar a autonomia

das escolas, a melhorar a flexibilidade curricular e a melhorar novas práticas pedagógicas que favoreçam o

sucesso educativo e não simplesmente a seletividade por via da eliminação. Sim, temos de continuar a fazer

mais, temos de continuar a fazer melhor! É para isso que aqui estamos. É para fazer mais e melhor!

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Continua no uso da palavra o Sr. Deputado Rui Rio.

O Sr. Rui Rio (PSD): — Sr. Primeiro-Ministro, deixe-me referir que, na minha avaliação, debate mesquinho

é aquele que o Ministro da Educação faz quando sacode toda a responsabilidade de si próprio e atira tudo lá

para trás.

Aplausos do PSD.

Isso, para mim, é absolutamente claro.

Mas deixe-me colocar-lhe outra questão, também no âmbito da educação e dos resultados do PISA

(Programa Internacional de Avaliação de Alunos) 2018, que tem a ver com o facto de se terem agravado as

desigualdades sociais. E o que é que isto quer dizer? Todos nós sabemos que os alunos com menos capacidade

financeira, cujas famílias são mais desfavorecidas, têm, naturalmente, mais dificuldade em aprender do que

aqueles cujas famílias são, financeira e socialmente, mais favorecidas.

O que não é aceitável é que também nesse patamar os dados se degradem, porque ao degradarem-se os

dados nesse patamar quer dizer que a escola pública não está a cumprir a sua função, não está a reduzir essa

assimetria, mas está, neste caso concreto e nos últimos tempos, de certa forma, até, a agravar a assimetria.

Ora, se isso é grave para qualquer partido e para qualquer cidadão, mais grave deveria ser para um Governo

que se diz de esquerda e que enche a boca a dizer que combate as desigualdades sociais. Os resultados vêm

exatamente no sentido contrário.

O Sr. Adão Silva (PSD): — Exatamente!

O Sr. Rui Rio (PSD): — Hoje em dia, só não põe o filho no ensino privado quem, manifestamente, não tem

dinheiro. Poucos são aqueles que, tendo dinheiro, optam pelo público relativamente ao privado.

Protestos do PS, do BE e do PCP.

Negar a realidade não é, de certeza, dar um passo no sentido de resolver o problema.

O Sr. Adão Silva (PSD): — Exatamente!

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Aplausos do PSD.

O Sr. Rui Rio (PSD): — Portanto, volto a dizer, como há uns dias disse aqui em relação a outra matéria, que

isto não é publicitação de dados, é assim!

Protestos da Deputada do BE Catarina Martins.

As pessoas fogem do público quando têm dinheiro e quando não têm não o podem fazer.

O Sr. Jorge Costa (BE): — Não meça o País pela sua bitola!

O Sr. João Oliveira (PCP): — É o espaço publicitário das camisolas amarelas!

O Sr. Rui Rio (PSD): — E qual tem sido a resposta do Governo nesta matéria? Tal como o Sr. Primeiro-

Ministro acabou de dizer, de certa forma, tem sido a baixa do nível de exigência, com o fim dos exames, o

previsível fim das reprovações.

Devo dizer que, com a baixa do nível de exigência, prejudicamos, acima de tudo, aqueles que não têm meios

para contrabalançar a insuficiência da escola pública.

O Sr. Adão Silva (PSD): — Exatamente!

O Sr. Rui Rio (PSD): — É que quem tem dinheiro pode ter explicações, pode ter uma série de ajudas, e

quem não tem dinheiro, naturalmente, não consegue ter.

Aplausos do PSD.

Portanto, baixar o nível de exigência é, acima de tudo, prejudicar aqueles que são mais pobres.

Sr. Primeiro-Ministro, já lhe disse aqui um dia, e hoje repito, com toda a convicção: se reprovar é mau, passar

sem saber é muito pior, em termos do futuro dos jovens portugueses.

Aplausos do PSD.

Por isso, Sr. Primeiro-Ministro, a pergunta concreta que lhe faço é a seguinte: em face destes resultados

objetivos, ou seja, em face dos números para que este estudo internacional aponta, qual é a política que V. Ex.ª

tem para valorizar a escola pública? E espero que não me venha responder outra vez que é com mais incentivo

ao desleixo e menos rigor no ensino público em Portugal.

Protestos de Deputados do PS.

É que, tal como referi há pouco — e concordou comigo —, a educação é absolutamente vital para o futuro

de Portugal. E, se baixarmos os níveis de exigência, vamos comparar-nos aos países do terceiro mundo, não

nos vamos comparar aos países do primeiro mundo, onde, efetivamente, a exigência passa um patamar muito

acima daquele que o Governo tem implementado em Portugal desde que tomou posse, em 2015.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para responder, o Sr. Primeiro-Ministro, António Costa.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Rui Rio, desculpe a comparação, mas julguei que

entre o debate que tivemos há 15 dias e o debate de hoje tivesse tido oportunidade, nesta segunda época de

exames, de constatar, ao contrário daquilo em que insistia, que ninguém propôs o fim da avaliação, o fim de

exames nem essa retórica do desleixo que aqui tem sustentado.

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Aplausos do PS.

Protestos do PSD.

Sobre o que foi efetivamente avaliado neste inquérito, recomendo-lhe vivamente que leia um artigo da Dr.ª

Isabel Flores, publicado no Público do passado dia 2 de dezembro, antes de o resultado ser conhecido, onde

ela explica muito bem quem esteve em avaliação nestes resultados do PISA.

O Sr. José Magalhães (PS): — Muito bem!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Finalmente, e para concluir, percebo que esse slogan de a escola privada ser

melhor do que a escola pública seja um discurso muito tentador…

O Sr. Luís Moreira Testa (PS): — É, é!

O Sr. João Oliveira (PCP): — É para as camisolas amarelas!

O Sr. Primeiro-Ministro: — … para a disputa que tem de fazer agora, com as novas alternativas liberais,

pela liderança da direita em Portugal.

Protestos do PSD.

Mas se há nestes resultados algo muito claro é o facto de não haver distinção relevante entre a escola pública

e a escola privada: uma tem 492 pontos, outra tem 491 pontos. É absolutamente irrelevante a diferença.

Aplausos do PS.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Em termos de estratos sociais são completamente diferentes!

O Sr. Presidente: — Continua no uso da palavra o Sr. Deputado Rui Rio.

O Sr. Rui Rio (PSD): — Sr. Presidente, já só disponho de pouco mais de 30 segundos, portanto vou

aproveitá-los apenas para relembrar o Sr. Primeiro-Ministro de que, quando tomou posse, havia exames no 4.º

ano, no 6.º ano e no 9.º ano. Os senhores acabaram com eles…

A Sr.ª Paula Santos (PCP): — E ainda bem!

O Sr. Rui Rio (PSD): — … e hoje só há exames no 9.º ano.

Portanto, a política do Governo é, pois, tendencialmente, a de acabar com os exames no ensino básico.

Aplausos do PSD.

Protestos da Deputada do BE Mariana Mortágua.

O Sr. Adão Silva (PSD): — É verdade! É o facilitismo!

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Tem saudades dos exames da 4.ª classe, não é?!

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para responder, o Sr. Primeiro-Ministro.

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O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Rui Rio, o Sr. Deputado tem a profunda convicção

de que a função do sistema educativo é a de chumbar quem não sabe.

Vozes do PSD: — Não é nada!

O Sr. Primeiro-Ministro: — A minha profunda convicção é a de que a função do sistema educativo consiste

em ensinar quem não sabe para que possa ter sucesso educativo.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado Rui Rio, ainda tem tempo disponível. Não vai utilizá-lo?

O Sr. Rui Rio (PSD): — Não, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: — Segue-se no uso da palavra, para formular perguntas, pelo Grupo Parlamentar do Bloco

de Esquerda, a Sr.ª Deputada Catarina Martins.

A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, o País está a acompanhar com

expectativa a preparação do Orçamento do Estado para 2020.

Do que se sabe até agora, na proposta do Governo os objetivos mínimos de valorização dos rendimentos e

de garantia de direitos continuam reféns do excedente orçamental já em 2020.

Não venho convidá-lo para uma negociação orçamental em sede de debate quinzenal, não teria sentido.

Faremos a negociação orçamental no sítio próprio. Mas não deixo de regressar aqui aos pontos principais que

mobilizam o Bloco de Esquerda de modo a assegurar um Orçamento com medidas elementares para responder

às urgências do País e também às debilidades estruturais da nossa economia.

Sublinho as principais propostas do Bloco, que mantemos sobre a mesa e que ainda não têm uma resposta

satisfatória do Governo: responder à emergência na saúde; baixar o IVA (imposto de valor acrescentado) da

energia, que é um bem essencial; continuar a recuperar as pensões, combater a pobreza e responder aos mais

vulneráveis; investir nos serviços públicos e respeitar os seus trabalhadores, que têm os salários congelados há

mais de uma década; responder também aos trabalhadores do setor privado, nomeadamente no trabalho por

turnos, no acesso à reforma e no gozo de férias.

As dificuldades deste processo orçamental — sabemo-lo — são diferentes daquelas que conhecemos nos

últimos quatro anos. Desta vez não temos um compromisso com um horizonte de quatro anos, porque foi essa

a opção exclusiva do Partido Socialista.

A expectativa de quem nos ouve hoje é grande. É uma expectativa sobre as medidas do Orçamento do

Estado, sobre a capacidade do Governo para os entendimentos que prometeu e sobre as responsabilidades e

prioridades de cada partido.

O Bloco de Esquerda é absolutamente claro sobre as suas prioridades e sobre o seu mandato.

Sr. Primeiro-Ministro, ontem, o Governo anunciou a criação de um grupo de trabalho para definir uma

estratégia de combate à corrupção. Para o Bloco, o combate à corrupção é — sempre foi — uma prioridade. Por

isso, denunciámos sempre a porta giratória entre cargos públicos e interesses privados — nas privatizações,

PPP (parcerias público-privadas) e outros grandes negócios rentistas; lutámos pelo fim do sigilo bancário e pela

criminalização do enriquecimento injustificado; defendemos a exclusividade dos Deputados e períodos

alargados de nojo para ex-governantes.

Estaremos sempre do lado do combate à corrupção e disponíveis para melhorar a legislação, mas, sejamos

claros, para além de anúncios, o combate à corrupção precisa de meios. Lançar a proposta da delação premiada

— pouco aconselhável pela experiência internacional — e propor mais um grupo de trabalho, sem garantias de

efetivação dos avanços legislativos anteriores, pode bem mais criar ruído do que permitir ter resultados.

Para o Bloco de Esquerda, há duas prioridades no combate à corrupção: dar meios à Polícia Judiciária e ao

Ministério Público, garantindo o orçamento necessário aos meios humanos e técnicos para combater um crime

que é cada vez mais sofisticado, e garantir os meios para que a Entidade da Transparência, criada na anterior

Legislatura por proposta do Bloco de Esquerda, saia do papel e tenha condições para atuar.

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Gostaria de saber se nos acompanha nestas prioridades já no próximo Orçamento do Estado.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para responder, o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Catarina Martins, a expectativa sobre o Orçamento

do Estado é, obviamente, legítima.

Estamos todos a trabalhar para termos um bom Orçamento do Estado para 2020, que dê continuidade às

políticas que iniciámos com o Orçamento do Estado de 2016, a que demos sequência em 2017, 2018, 2019 e a

que daremos, com certeza, continuidade em 2020.

Relativamente à sua específica ansiedade — que, enfim, é menor do que a do cidadão comum, porque tem

mais informação —, diria que, quando na segunda-feira da próxima semana for apresentado o Orçamento do

Estado, verificará que muito daquilo de que temos falado, e que têm sido as preocupações do Bloco, está, em

grande medida, espelhado no Orçamento do Estado.

Perguntar-me-á se o estão integralmente, mas não lho posso dizer, porque sei que a ambição do Bloco é

sempre muito exigente e nem sempre nós somos capazes de ser tão exigentes na satisfação dessa ambição.

Mas acho que, seguramente, temos muito boas condições para fazermos um bom Orçamento para 2020.

Quanto à corrupção, esta é, objetivamente, uma prioridade. Aquilo que foi ontem apresentado foi um

enunciado de um conjunto de medidas para se construir uma estratégia nacional, que enfoca também a

dimensão dos meios, dando continuidade ao facto de termos, aliás, uma nova Lei Orgânica da Polícia Judiciária

e um novo estatuto dos funcionários da Polícia Judiciária.

Preveem-se, designadamente, medidas muito importantes, como por exemplo o acompanhamento do

julgamento por parte dos próprios magistrados que fizeram a investigação — que é da maior importância, não

só para a gestão de meios como para a qualidade da intervenção do Ministério Público na fase de julgamento

—, e um conjunto de outras medidas, que estão previstas nessa estratégia nacional e que terão, de alguma

forma, tradução no Orçamento do Estado para o próximo ano.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Continua no uso da palavra a Sr.ª Deputada Catarina Martins.

A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Sr. Primeiro-Ministro, nesta manhã começaram as manobras para

dragagens no Porto de Setúbal.

Iniciar estas manobras a poucos dias do debate no Parlamento da petição contra as dragagens é uma

manobra política de facto consumado que o Bloco de Esquerda não aceita.

As dragagens têm vindo a ser contestadas pela população e pelos movimentos ambientalistas por boas

razões: não só destroem a biodiversidade do estuário do Sado — que é uma área de reserva natural —, como

são feitas para aumentar a capacidade do Porto de Setúbal, contrariando todos os objetivos de diminuição das

emissões poluentes.

Ontem mesmo, foi divulgado um estudo sobre as emissões do transporte marítimo em Portugal que afirma

que o peso das emissões provenientes dos navios que param nos portos portugueses é já maior do que o

provocado pelos automóveis nas oito maiores cidades do País.

O Sr. Primeiro-Ministro afirmou em Madrid, na Cimeira do Clima, que não dá para fazer de avestruz e enfiar

a cabeça na areia, porque as evidências científicas estão aí e a realidade também. Ora, quando vemos a política

de transportes do Governo e a aposta nos transportes mais poluidores, marítimo e aéreo, enquanto a ferrovia

— o transporte sem emissões e que transporta menos de 5% dos passageiros e das mercadorias no País —

não tem qualquer projeto de expansão, a pergunta que temos de fazer é se, quando chega aos transportes, o

Governo já recusa as evidências científicas e já coloca a cabeça na areia.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

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O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Catarina Martins, em primeiro lugar, quanto às

dragagens, elas foram objeto de estudo de impacte ambiental e de declaração de impacte ambiental por parte

da Agência Portuguesa do Ambiente. Portanto, esse estudo de impacte foi feito.

Em segundo lugar, no que diz respeito às emissões do transporte marítimo, não só os portos nacionais têm

vindo a ser equipados de forma a poderem servir navios com combustível, designadamente, hidrogénio de

menor impacto, como Portugal tem defendido sempre que essas emissões devem entrar no mercado das

emissões de carbono, como, aliás, recentemente, a nova Presidente da Comissão Europeia defendeu, de modo

a criar um incentivo positivo para que haja uma regeneração da fonte de combustível do transporte marítimo.

No entanto, um país como Portugal, que tem como um dos seus maiores ativos estratégicos a fachada

atlântica, a última coisa que pode fazer é desperdiçar o seu enorme potencial de ser uma grande plataforma

giratória no conjunto das rotas que vêm do Cabo, do Canal do Panamá ou do Mediterrâneo.

Temos, de facto, uma localização privilegiada e isso significa milhares de postos de trabalho que podemos

gerar no nosso País.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Continua no uso da palavra a Sr.ª Deputada Catarina Martins, do Grupo Parlamentar

do Bloco de Esquerda.

Faça favor, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, sabe, o País também não pode

desperdiçar o seu território, não pode desperdiçar nem desconhecer as suas responsabilidades na redução das

emissões de carbono. Por isso é preciso apostar na ferrovia, sim, por isso é que não se podem negar as

evidências científicas sobre o que o transporte marítimo está a provocar.

E digo-lhe mais, Sr. Primeiro-Ministro: em relação às propostas da Comissão Europeia, o Governo contará

com o apoio do Bloco de Esquerda contra a proposta de Orçamento feita pela presidência da Finlândia — aliás,

já defendemos que o Governo português deve vetá-la, se ela não for alterada —, mas não contará com o nosso

apoio para a ideia do mercado de carbono. A questão não é se quem polui pode pagar para continuar a poluir;

a questão é que temos mesmo de reduzir as emissões.

Aplausos do BE.

Sr. Primeiro-Ministro, hoje, há manifestações do setor cultural que contestam a decisão de financiamento a

estruturas artísticas, o que põe em causa o acesso à cultura no País.

A Ministra da Cultura esteve no Parlamento a dizer que está tudo bem, mas sabe que não é assim e o

Governo sabe que não é assim.

A ata, com a decisão do júri, que incluía o aviso de que o financiamento era claramente insuficiente, é de 27

de agosto. O Governo esperou 45 dias e só a 11 de outubro é que publicou os resultados.

A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Bem lembrado!

A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Se a demora tivesse sido para corrigir o erro, perceber-se-ia. Mas não foi.

Foi apenas para esconder o erro durante o período eleitoral.

Este, Sr. Primeiro-Ministro, é o momento de começar a corrigir os erros. O Governo deve financiar todas as

estruturas que os júris consideraram elegíveis e deve separar, claramente, os apoios à programação dos apoios

à criação, ativando o programa para a rede de cineteatros, que foi criado na Legislatura passada por proposta

do Bloco de Esquerda.

O Sr. Presidente: — Sr.ª Deputada, já ultrapassou o tempo de que dispunha.

A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Estou mesmo a terminar, Sr. Presidente.

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Colocar nas mãos dos programadores o financiamento às artes precariza os trabalhadores e ataca a

liberdade e a diversidade da criação artística.

Vozes do BE: — Muito bem!

O Sr. Presidente: — Tem mesmo de concluir, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Uma última nota, em 5 segundos, Sr. Presidente: porque hoje é Dia

Internacional dos Direitos Humanos, queria dizer que, para o Bloco de Esquerda, é uma vergonha que Portugal

tenha sido anfitrião do Primeiro-Ministro israelita, Netanyahu, um criminoso de guerra…

O Sr. Presidente: — Sr.ª Deputada, tem mesmo de terminar. Já ultrapassou largamente o tempo de que

dispunha e está a entrar noutra matéria.

A Sr.ª Catarina Martins (BE): — … que veio a Portugal procurar apoios para as suas políticas de agressão

no Médio Oriente.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para responder, o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Catarina Martins, vou responder-lhe começando

pela última questão.

Primeiro, na última Legislatura, conseguimos, em conjunto, aumentar em 38% o orçamento para a cultura.

Especificamente, no que diz respeito ao apoio às artes, houve um aumento de 83% entre 2015 e 2019.

Aplausos do PS.

Do concurso que agora foram conhecidos os resultados, comparando com o concurso de há dois anos, houve

um aumento da verba de 18,7 milhões de euros — 18,7 milhões de euros! Este é o reforço que temos vindo a

fazer e que iremos continuar a fazer, aliás, de acordo com a meta que fixámos de que o orçamento global para

a cultura corresponda a 2% das receitas gerais do Estado ao longo desta Legislatura.

Aplausos do PS.

Mas o que não temos é a visão, que, creio, ninguém pode ter, de que um concurso significa que,

independentemente das verbas que são alocadas, nós financiemos todos os candidatos, independentemente

da sua avaliação. Isso não é um concurso, é uma abertura da lista de pedidos e toda a gente é aprovada!

Aplausos do PS.

O que aconteceu foi um reforço muito claro de 18,7 milhões de euros das verbas a financiar. Foi constituído

um júri, foram apresentadas candidaturas, o júri hierarquizou as candidaturas e, obviamente, segundo as regras

do concurso, como o financiamento é em função do montante proposto por cada um dos projetos, houve um

limite, que foi, precisamente, a totalidade das verbas propostas a concurso.

Aplausos do PS.

Por isso, até ao montante dessas verbas todos foram contemplados; para além dessas verbas, não houve,

obviamente, contemplados. Mas essas são as regras de qualquer concurso.

Se entenderem que devemos prescindir do concurso e que o apoio passe a ser simplesmente atribuído por

vontade discricionária de um membro do Governo, eu serei totalmente contra, porque acho que os apoios têm

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de ser regulados, transparentes, públicos e que permitam, efetivamente, com total independência relativamente

à vontade do Governo, atribuir os financiamentos.

Aplausos do PS.

Quanto à ferrovia, não há a menor dúvida de que foi este Governo que aprovou o Programa Ferrovia 2020,

que lançou, e está em curso, o maior investimento de há décadas na ferrovia — mais de 2000 milhões de euros

—, que está a recuperar a EMEF (Empresa de Manutenção de Equipamento Ferroviário), que está a adquirir

novas composições para a CP (Comboios de Portugal), que está a recuperar muitas composições que estavam

paralisadas e que agora estão a funcionar.

Mas, Sr.ª Deputada, se me permite, relativamente à questão do Orçamento, temos de ser coerentes quando

discutimos todas estas matérias. Não tenho dúvida nenhuma de que temos de baixar o custo da energia e, por

isso, adotámos medidas tão importantes como a da tarifa social, que permitiu aumentar de 70 000 para 800 000

as famílias que estão hoje abrangidas por esta medida.

Aplausos do PS.

Mais: temos de continuar a reduzir o défice tarifário, de forma a diminuir sustentadamente a tarifa da energia,

mas, antes de propormos benefícios fiscais para a redução da energia, convém lembrarmo-nos que estamos

mesmo em emergência climática.

O Sr. Presidente: — Já ultrapassou o tempo de que dispunha, Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Vou terminar, Sr. Presidente.

É por isso que, hoje mesmo, dirigi uma carta à Sr.ª Presidente da Comissão Europeia para, em apoio à carta

que foi dirigida pelo Ministro das Finanças ao Comité do IVA, solicitar que sejam alterados os critérios sobre o

princípio da estabilidade do IVA, de forma a que seja possível variar a taxa do IVA em função dos diferentes

escalões do consumo,…

O Sr. Presidente: — Peço-lhe que conclua, Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — … para que o IVA seja também um bom instrumento fiscal de incentivo a um

uso mais eficiente da energia. Assim, sim, casamos uma boa política fiscal com um objetivo estratégico que tem

de estar presente em todas as medidas políticas, que é o combate às alterações climáticas.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Pelo Grupo Parlamentar do PCP, para formular perguntas, tem a palavra o Sr. Deputado

Jerónimo de Sousa.

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, as estruturas de criação artística

estão hoje em luta, a exigir do Governo o direito de garantir aos cidadãos o acesso à cultura.

Verificamos que, apesar de esse concurso ter dado um passo adiante, é incompreensível que candidaturas

elegíveis, sujeitas a concurso, tivessem preenchido os requisitos para receber o respetivo subsídio e o Governo

tenha ido até ao limite, deixando de fora essas que eram, de facto, elegíveis. Portanto, há aqui uma situação

clara de injustiça e essa é a razão por que nos solidarizamos com a luta dos homens e mulheres da cultura.

Aplausos do PCP.

Sr. Primeiro-Ministro, temos trazido a debate, por várias vezes, o problema do atraso na atribuição das

pensões e subsídios da segurança social. O problema não é novo e o Governo já fez várias promessas dizendo

que seria resolvido, mas a verdade é que a demora na atribuição das pensões se mantém como um problema

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grave para muitos milhares de trabalhadores, que ficam tempo a mais à espera de saber como podem reformar-

se e qual o valor da sua pensão, e para os desempregados, que ficam sem subsídio enquanto esperam pela

reforma.

Ainda não acabou o ano de 2019 e a Provedoria de Justiça já recebeu mais de 1500 queixas por causa deste

problema, além das 923 queixas que recebeu em 2018. Este problema alarga e agrava a regularização

atempada das prestações sociais, nomeadamente a prestação por morte. Este não é um drama pouco pequeno,

Sr. Primeiro-Ministro, para quem tem de pagar na hora e depois passa meses e até anos sem receber.

É preciso, de uma vez por todas, que o Governo tome medidas de reforço de pessoal do Centro Nacional de

Pensões para que o problema seja ultrapassado.

Deixo-lhe uma pergunta que já coloquei três vezes, por isso pode ser que à terceira seja de vez: quando é

que o Governo vai tomar medidas com caráter de urgência para resolver o problema dos atrasos na atribuição

das pensões pela segurança social?

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro, António Costa.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Jerónimo de Sousa, se me permite, a pergunta não

deve ser «quando é que o Governo vai tomar medidas?», mas, sim, «quando é que as medidas tomadas pelo

Governo produzem todos os resultados que têm de produzir?».

O Sr. João Oliveira (PCP): — Essa resposta não foi grande espingarda!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Essa é a pergunta que o Sr. Deputado tem de me fazer, e digo-lhe porquê.

Como sabe, houve medidas que já foram tomadas. Foram tomadas medidas na desconcentração do

tratamento; foi lançado um concurso, há ano e meio, para a contratação de 200 técnicos, que ainda está em

curso; foi introduzida uma alteração à lei para atribuição de pensões provisórias, que já permitiu atribuir cerca

de 20 000 novas pensões a título provisório.

A verdade é que, se compararmos com 2018, verificamos que já se reduziu o tempo de deferimento, quer

das pensões de invalidez, quer das pensões de sobrevivência, quer das pensões de velhice. Temos, ainda, 33

000 pedidos pendentes há mais de 90 dias, mas num contexto em que só até outubro já tinham sido deferidas

147 000 novas pensões.

Portanto, pela primeira vez, graças ao conjunto de medidas adotado, já estamos a conseguir despachar mais

pedidos do que os que entram e estamos a fazer o esforço de recuperação do muito acumulado que tínhamos

e que, felizmente, temos vindo a reduzir.

Por isso, a pergunta certa não é «quando é que adotam medidas?» mas «quando é que as medidas que

adotaram produzem totalmente os seus resultados?». É esta a questão a que importa responder.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Continua no uso da palavra o Sr. Deputado Jerónimo de Sousa.

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, isto significa que possivelmente

vou ter de fazer a pergunta mais à frente.

Mas não se esqueça, Sr. Primeiro-Ministro, dos dramas pessoais e familiares que estes atrasos provocam,

particularmente em relação à atribuição das pensões, das reformas e dos subsídios. Ou o Sr. Primeiro-Ministro

pensa que qualquer cidadão português tem 2000 € para pagar um funeral?! Não tem, Sr. Primeiro-Ministro!

Este problema tem de ser colocado e despachado com celeridade, como esperamos que aconteça.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Muito bem!

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O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Sr. Primeiro-Ministro, está a terminar o prazo de concessão do serviço

público postal. Os CTT foram vendidos pelo Governo PSD/CDS e, de então para cá, assistimos ao encerramento

de estações um pouco por todo o País, à venda do património e à degradação vertiginosa do serviço postal, que

chega cada vez mais tarde. Atualmente, para os seus acionistas, mais do que o serviço postal, o que conta é o

Banco CTT, esse sim, galinha dos ovos de ouro nesta enorme negociata. Se trazemos novamente este tema à

Assembleia da República é porque a situação se agravou.

Os CTT nunca deveriam ter saído da esfera pública e já há muito que se impunha ser revertida a privatização.

Com o terminar do prazo da concessão, urge dar uma resposta ao problema que está criado. Não basta o Estado

português resgatar ou pôr fim à concessão, porque isso seria ficar com a obrigação do serviço, sem o

instrumento para o concretizar.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — O caminho terá de passar pela recuperação do controlo público dos

CTT, colocando-o ao serviço do povo e do País.

No próximo ano, os CTT continuarão nas mãos dos grupos económicos privados, dos especuladores e

outros, ou passarão para as mãos do povo português? O que nos diz sobre este importante e premente

problema?

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para responder, o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Jerónimo de Sousa, não ignoro os dramas que

existem com os atrasos na segurança social. Por isso, alterámos a legislação para permitir a atribuição de

pensões a título provisório, porque grande parte destes 33 000 casos que estão pendentes há mais de 90 dias

são casos que, em regra, têm várias complexidades. A maioria deles são de pessoas cuja formação de pensão

combinou períodos no território nacional e períodos no estrangeiro.

Há um caso, aliás, muito mediatizado na televisão, de uma senhora que, numa ação de campanha minha,

em Moscavide, mostrou um recibo que revelava que estava há dois anos à espera de resposta. Eu disse-lhe

que ia ver o caso e fui. Em concreto, o problema dessa senhora é que acumulava vários regimes: o de

profissional liberal, o de profissional por conta de outrem e o de vários anos de descontos num país estrangeiro.

O problema de intercomunicação de dados e de informações entre os diferentes países é gravíssimo, o que,

muitas vezes, condiciona a resolução dessas situações. Essa é uma das razões pelas quais a atribuição de

pensões provisórias é da maior importância para lhes podermos responder.

Eu não ignoro o problema. Efetivamente, ele existe e receio que o Sr. Deputado ainda tenha de voltar ao

tema, aqui, na Assembleia da República. Sei que não se esquecerá e há uma coisa que também posso garantir-

lhe: é que eu também não me esquecerei desse problema e não desistirei enquanto ele não estiver resolvido.

Quanto à questão dos CTT, não quero repetir uma cassete que tenho utilizado nas várias vezes que tem

colocado a questão, mas, no momento próprio em que o Estado tiver de tomar decisões sobre a concessão do

serviço público, anunciaremos a nossa posição sobre essa matéria. Até lá, estamos totalmente disponíveis para

ouvir sugestões, para as ponderar e para as discutir. Quanto a falar, fá-lo-emos publicamente quando for o

momento próprio, e esse será o momento da avaliação da concessão ou não concessão.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Continua no uso da palavra o Sr. Deputado Jerónimo de Sousa.

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, depois de aprovada a nova Lei de

Bases da Saúde, coloca-se agora a necessidade de regulamentar a lei.

Entre outros aspetos a exigirem regulamentação, está a questão das taxas moderadoras, algo a que sempre

nos opusemos por considerarmos que a introdução das taxas moderadoras constitui um verdadeiro obstáculo

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que põe em casa o direito à saúde — obstáculo que se mantém, como é confirmado por vários estudos que

afirmam que, só em 2017, não se realizaram 2 milhões de consultas nos centros de saúde e nos hospitais e

mais de 500 000 exames de diagnóstico por causa dos custos das taxas.

Apesar dos avanços verificados nos últimos anos, o PCP defende que devem ser removidos todos os

obstáculos que limitam o direito à saúde, incluindo as taxas moderadoras.

A pergunta que lhe faço é a seguinte, Sr. Primeiro-Ministro: para quando é que o Governo pretende

regulamentar o n.º 2 da Base 24 da nova Lei de Bases da Saúde, onde se lê, «Com o objetivo de promover a

correta orientação dos utentes, deve ser dispensada a cobrança de taxas moderadoras nos cuidados de saúde

primários e, se a origem da referenciação for o SNS, nas demais prestações de saúde, nos termos a definir por

lei»?

Fica colocada a questão, que aguarda, com certeza, uma resposta do Sr. Primeiro-Ministro.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Jerónimo de Sousa, amanhã mesmo, o Conselho

de Ministros irá aprovar uma resolução enquadradora da estratégia plurianual para toda a Legislatura na área

da saúde, para responder a uma necessidade clara, que existe, de ir reduzindo a suborçamentação e o nível de

endividamento no Serviço Nacional de Saúde, mas também para investir em equipamentos, em instalações e

em recursos humanos.

Como sabe, no Programa do Governo assumimos o compromisso de regulamentar a Lei de Bases da Saúde,

tendo em vista a eliminação progressiva das taxas moderadoras para os serviços prestados no âmbito dos

cuidados de saúde primários ou para todos os tratamentos ou consultas que sejam prescritas a partir dos

cuidados de saúde primários, a partir da Linha Saúde 24 ou na sequência do encaminhamento dos cuidados de

saúde primários para outros cuidados diferenciados.

É esse o compromisso que temos e que iremos começar a cumprir, seguramente, já no Orçamento do Estado

para 2020 e que terá ainda tradução no decreto-lei de execução orçamental.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — É a vez do Grupo Parlamentar do CDS-PP.

Tem a palavra a Sr.ª Deputada Cecília Meireles.

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Primeiro-Ministro, queria

começar por cumprimentá-lo e, sem prejuízo de, depois, nos debruçarmos sobre o Orçamento do Estado e os

fundos estruturais, queria fazer uma primeira pergunta sobre a eleição indireta das CCDR (Comissões de

Coordenação e Desenvolvimento Regional) por um vasto colégio eleitoral. Aliás, já tínhamos tido esta conversa

aqui, aquando da discussão do Programa do Governo.

O Sr. Primeiro-Ministro, exprimindo-se de uma maneira que me pareceu bastante curiosa, disse, no

Congresso da Associação Nacional de Municípios Portugueses, o seguinte: «este passo…», a tal eleição indireta

pelos autarcas das CCDR, «… não é o passo por que todos anseiam, mas é o passo que, desde já, deve ser

dado para criar no País a confiança para os passos seguintes», entre outras coisas do mesmo género.

Gostava de lhe dizer, Sr. Primeiro-Ministro, que, de facto, este não é o passo por que todos anseiam. O passo

por que todos anseiam é o da descentralização, que, infelizmente, ainda não está feita.

Nesta matéria, não vou fazer a maldade de lhe perguntar, mais uma vez, pelo Infarmed (Autoridade Nacional

do Medicamento e Produtos de Saúde), mas gostava de saber se consegue dizer-me exatamente quantos

municípios já aceitaram todas as competências e qual é o ponto de situação sobre essa descentralização, que

é o único mas o único passo por que todos anseiam.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Muito bem!

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A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Também gostava de lhe perguntar se esta eleição indireta não é, na

realidade, uma regionalização, porque o Sr. Primeiro-Ministro é bem explícito quando diz que é o passo que tem

de ser dado para, depois, darmos os passos seguintes.

Ora, quais são esses passos seguintes? Os passos seguintes são a criação de assembleias ou de

parlamentos regionais para fiscalizar essas CCDR e, depois da eleição indireta das CCDR, a eleição direta das

regiões. Aliás, o Sr. Primeiro-Ministro não o esconde particularmente, porque, ao mesmo tempo que diz que não

quer antecipar a decisão sobre a regionalização, também diz que não quer fazer nada que a possa comprometer,

quando — não é «se» — for essa a decisão soberana do voto.

Por isso, Sr. Primeiro-Ministro, de duas uma: ou, hipótese A, estamos aqui a discutir, de facto, a

descentralização e, então, vamos concentrar-nos no processo de descentralização e deixar para depois a

questão das CCDR e as suas eleições diretas ou indiretas, ou, hipótese B, o que está em causa é um processo

de regionalização, e esta eleição é o primeiro passo. Nesse caso, Sr. Primeiro-Ministro, o que lhe digo é que se

é isso que quer fazer, então, tem de apresentar um referendo, porque regionalização só com referendo!

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Cecília Meireles, neste debate, convém ser

rigoroso nos conceitos e não confundir deslocalização de serviços com desconcentração, dentro da

administração central, e descentralização.

O Sr. Luís Moreira Testa (PS): — Muito bem!

O Sr. Primeiro-Ministro: — A descentralização pode existir para várias escalas: há a descentralização para

freguesia, há a descentralização para o município e há a descentralização para a região. A regionalização não

é senão uma forma de descentralização para um escalão regional.

Sei que nem toda a comunicação social sabe disso e que, por isso, apresenta títulos como «CDS exige

referendo», mas o que é muito claro, hoje, na Constituição, é que o CDS não precisa de exigir nada.

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Está na Constituição!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Está na Constituição, aliás, que só pode haver regionalização com duplo

referendo. Portanto, não há nada para exigir. Quando se quiser fazer a regionalização, tem de se fazer um duplo

referendo!

Aplausos do PS.

O que estamos aqui a tratar é de alterar o processo de designação dos presidentes de um órgão da

administração desconcentrada do Estado, que são as comissões de coordenação e desenvolvimento regional.

Aliás, neste momento — não sei se sabem, mas julgo que foi introduzido por um Governo em que o CDS

participou —, um dos vice-presidentes já é designado, bem sei que por via da Associação Nacional de Municípios

Portugueses, pelos Srs. Presidentes de Câmara.

O que agora propomos é algo que consta do nosso Programa do Governo, e, portanto, não tem segredo

nenhum, que constava do nosso Programa Eleitoral, que constava já do Programa do meu anterior Governo e

que foi adiado em virtude da criação, pela Assembleia da República, da Comissão Independente para a

Descentralização, presidida pelo Eng.º João Cravinho. Isto é, o que propomos é que os presidentes das

comissões deixem de ser designados pelo Conselho de Ministros e passem a ser eleitos por um colégio que

compreenda os membros das câmaras, os membros das assembleias municipais, incluindo os presidentes de

juntas de freguesia. É esta a proposta que fazemos.

Quando, e se, o País desejar avançar para uma verdadeira e própria regionalização, então, sim, terá de fazer

aquilo que aqui não está a ser proposto: em primeiro lugar, as CCDR têm de deixar de ser serviço da

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administração desconcentrada do Estado e ganhar personalidade jurídica própria, para serem «autarquias» de

âmbito regional; em segundo lugar, temos de discutir qual é a sua forma de eleição e, para esse processo, sim,

é necessário que haja o duplo referendo que está previsto na Constituição.

Como toda a gente sabe, há muitos anos que sou defensor da regionalização — já o era há 20 anos. Ao

longo destes 20 anos, houve pessoas que continuaram a ser defensoras da regionalização, houve pessoas que

eram e que deixaram de sê-lo e houve pessoas que, na altura, eram contra e que passaram a ser a favor, como,

por exemplo, o Dr. Rui Rio, que já o disse publicamente.

O que eu digo é que, quando quisermos avançar, devemos fazê-lo num quadro político que seja sólido, que

não seja um fator de divisão mas de unidade nacional, em que vários dos fantasmas que costumam poluir este

debate, como a criação de assembleias e o aumento da despesa, estejam devidamente esclarecidos e

pacificados. Portanto, não está na minha agenda.

Se ler o Programa do Governo, constatará que nada se propõe em matéria de regionalização. O que se

propõe é a democratização da designação das CCDR e é com isso que avançaremos no próximo semestre.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Continua no uso da palavra a Sr.ª Deputada Cecília Meireles.

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, é bom que se tenha rigor nos

conceitos e devo dizer que tem razão: desconcentração não é a mesma coisa que descentralização.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — É deslocalização!

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Não sei se esta questão do Infarmed será uma boa matéria para termos

uma discussão sobre rigor nos conceitos, Sr. Primeiro-Ministro; em todo o caso, seria uma desconcentração e

uma deslocalização, não seria uma descentralização!

Sr. Primeiro-Ministro, a questão aqui é muito simples. De duas uma: ou o Sr. Primeiro-Ministro acha que a

regionalização é um processo à parte, mas, então, não percebo por que razão surge esta questão da eleição

indireta das CCDR e por que razão não se concentra na descentralização, que bem precisa e que não está bem

feita — para não dizer mesmo que está a correr muito mal; ou aquilo que o Sr. Primeiro-Ministro disse perante

a Associação Nacional de Municípios Portugueses é verdade e isto é um processo, um processo que tem como

fim a regionalização e como primeiro passo esta eleição indireta.

O que lhe pergunto, Sr. Primeiro-Ministro, é o seguinte: se esta eleição indireta não é um primeiro passo e

se os passos seguintes não são aqueles que conduzem à regionalização, então, por que é que foi dizer isso à

Associação Nacional de Municípios Portugueses?

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Cecília Meireles, felizmente, o que eu disse consta

de um discurso escrito, onde digo precisamente que é um passo, que não compromete nenhum passo

subsequente nem o antecipa. Por isso, é o passo que entendo que deve ser dado nesta Legislatura.

Mas também lhe confesso, não vale a pena esconder, que tenho muita esperança de estar cá na próxima

Legislatura para dar os passos seguintes.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Continua no uso da palavra a Sr.ª Deputada Cecília Meireles.

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, neste ponto, a minha visão é

muito simples: se este é o primeiro passo de um processo e se o processo só acontece se os portugueses

disserem «sim» — e até é um processo ao qual, em referendo, os portugueses já disseram «não» —, então, se

quer dar o primeiro passo, antes de o dar, pergunte aos portugueses se querem dá-lo, ou não.

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O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Muito bem!

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Isso é o que nos parece sensato e é por aí que o Governo deveria

começar. O primeiro passo nesta matéria é um referendo.

Sr. Primeiro-Ministro, porque já disponho de pouco tempo, gostava de deixar-lhe aqui uma pergunta sobre o

Orçamento do Estado, designadamente sobre uma matéria que é muito importante. Trata-se de uma pergunta

não sobre o englobamento, porque, tanto quanto percebi, felizmente, o Governo já não quer caminhar no sentido

do englobamento — e ainda bem que arrepiou caminho, espero que agora o PS não volte a desviar-se nesse

sentido —, mas, sim, de uma pergunta sobre a saúde e o que está previsto no Orçamento do Estado para a

saúde.

É que ouço muitos partidos, o seu e outros, falarem da falta de dinheiro — e, de facto, há falta de dinheiro.

Mas o que a UTAO (Unidade Técnica de Apoio Orçamental) e os especialistas nos vêm dizer é que, na saúde,

há um problema de falta de saúde e há, sobretudo, um problema de má gestão e de gestão ineficiente.

O Sr. Presidente: — Já ultrapassou o seu tempo, Sr.ª Deputada. Tem de terminar.

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Terminarei, Sr. Presidente.

O que lhe pergunto, Sr. Primeiro-Ministro, é se o seu Orçamento tem finalmente, ao fim de quatro, cinco

anos, medidas para corrigir isso e se é desta vez que o Governo vai reconhecer a todos os portugueses o direito

que só alguns portugueses têm, que é o direito de, pagando um contributo para um sistema chamado «ADSE»,

terem acesso às consultas que eles próprios livremente escolhem.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Cecília Meireles, em primeiro lugar, a lei da

descentralização para os municípios e freguesias, áreas metropolitanas e comunidades intermunicipais prevê

um processo de transição até 2021, que está a correr. No dia 1 de janeiro de 2021, todos os municípios

assumirão aquelas competências.

Neste momento, 89% dos municípios já assumiram parte das competências previstas e o processo há de

correr com total tranquilidade, como, aliás, consta das conclusões do Congresso da Associação Nacional de

Municípios Portugueses.

Quanto à regionalização, não a propusemos, nem a proporemos, nesta Legislatura. O que propomos para

esta Legislatura é a democratização da eleição das CCDR. Este é um passo que, como referi no Congresso,

não compromete no futuro a regionalização, nem antecipa neste momento a regionalização. Cada coisa a seu

tempo.

Finalmente, quanto à saúde, tal como há 15 dias pude dizer à Sr.ª Deputada Catarina Martins que teria

brevemente uma boa notícia sobre suborçamentação, também hoje posso dizer à Sr.ª Deputada que amanhã,

na resolução do Conselho de Ministros, vai ter uma boa notícia sobre a gestão.

O Sr. Presidente: — Queira terminar, Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Diria mesmo que vai ser um momento muito feliz, pois ambas vão ter boas

notícias.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Acho difícil agradar a ambas!

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O Sr. Presidente: — Tem, agora, a palavra, em nome do Grupo Parlamentar do PAN, a Sr.ª Deputada Inês

de Sousa Real.

A Sr.ª Inês de Sousa Real (PAN): — Sr. Presidente, começo por cumprimentar o Sr. Primeiro-Ministro, os

Srs. Membros do Governo, as Sr.as Deputadas e os Srs. Deputados.

Sr. Primeiro-Ministro, de entre as várias críticas que nos é possível fazer à proposta da Presidência

Finlandesa do Conselho para o próximo Quadro Financeiro Plurianual, a falta de ambição e de compromisso no

combate às alterações climáticas é, sem sombra de dúvida, uma delas. Folgamos, assim, em ver o Sr. Primeiro-

Ministro reconhecer a necessidade de responder com assertividade à iminente crise climática em que vivemos,

pelo que ficamos mais perplexos com algumas opções ambientalmente incomportáveis que têm sido tomadas,

como seja a construção do novo aeroporto no Montijo, a viabilização de dragagens no estuário do Sado, a

ineficácia das políticas de gestão de resíduos ou o fomento do transporte de animais vivos.

Assim, Sr. Primeiro-Ministro, neste momento tão importante para o País — em que vamos discutir o

Orçamento do Estado, mas não o querendo afastar para este debate —, e face aos desafios climáticos que

enfrentamos e também ao compromisso que deveríamos ter com o bem-estar animal, não podemos deixar de

lhe perguntar se está ou não disponível para revisitar estas opções políticas e, no caso em particular das

dragagens no estuário do Sado, para determinar a suspensão das mesmas.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Inês de Sousa Real, como sabe, em 2016,

Portugal foi o primeiro País do mundo a assumir o compromisso com a neutralidade carbónica em 2050.

Aplausos do PS.

Este ano, fomos o primeiro País do mundo a aprovar um roteiro das medidas concretas para atingir essa

meta, fixando, aliás, o maior esforço e a maior ambição nesta primeira década essencial até 2030.

E assumimos esse compromisso sabendo também que era simultaneamente necessário satisfazer um

conjunto de outras necessidades. O País precisa de um novo aeroporto, o País precisa de valorizar a sua

fachada atlântica e a sua capacidade portuária, pelo que não devemos renunciar a essas oportunidades.

Temos é de saber concretizá-las no quadro daquilo que são os nossos compromissos em matéria de ação

climática e, designadamente, em matéria de proteção do ambiente.

É por isso que as dragagens no estuário do Sado só foram feitas após um estudo de impacte ambiental e

após a emissão da declaração de impacte ambiental.

Não temos qualquer razão para suspender uma obra que a Agência Portuguesa do Ambiente autorizou que

fosse realizada.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Continua no uso da palavra a Sr.ª Deputada Inês de Sousa Real.

A Sr.ª Inês de Sousa Real (PAN): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, não basta dizer que se está

comprometido a combater as alterações climáticas ou na rota da descarbonização, quando diariamente se

conhecem exemplos que apontam noutro sentido.

Vejamos o seguinte exemplo: foi recentemente divulgado um estudo da Federação Europeia para os

Transportes e Ambiente que dá nota que os navios que param nos portos da União Europeia emitiram, em 2018,

mais de 139 milhões de toneladas de CO2. Só para se ter uma ideia, os navios que operam nos portos europeus

poluem mais do que todos os veículos de passageiros da Europa.

O PAN tem exigido ao Governo que diligencie no sentido de apurar a capacidade de carga turística das

cidades portuguesas, nomeadamente em Lisboa e no Porto, mas o Governo até agora parece estar mais

preocupado em continuar a aumentar indefinidamente o número de turistas que visitam o nosso País, sem

conhecer os reais impactos, não apenas no ambiente mas nas próprias cidades.

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Sr. Primeiro-Ministro, está ou não disponível o Governo para garantir um turismo responsável e, em caso

afirmativo, vai ou não concretizar os estudos de capacidade de carga turística que o PAN reclama e limitar o

acesso desregrado às cidades?

Aplausos do PAN.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Inês de Sousa Real, esta é uma matéria em

relação à qual penso que o princípio da descentralização deve mesmo valer. O mais importante é que as cidades

saibam gerir os seus recursos e as suas capacidades, assim como o equilíbrio que devem manter entre a oferta

turística que devem gerar e a oferta turística que devem limitar.

A lei, hoje, já lhes permite fazê-lo e, aliás, têm vindo a adotar medidas nesse sentido. Por exemplo, aqui, na

capital, li que a Câmara Municipal aprovou áreas de contenção para a expansão do alojamento local.

E é positivo que sejam os municípios a fazê-lo porque ninguém está em melhores condições do que os

municípios para fazer a gestão mais adequada do seu território. São eles, aliás, que têm a competência para

definir onde é edificável e onde não é edificável, o que se pode ou não edificar, quais são as condições de

edificabilidade, quais são os usos. Enfim, ninguém melhor do que os municípios pode gerir o seu território.

Portanto, esta é mesmo uma matéria onde confio que os municípios saibam gerir bem a sua capacidade.

Quando pensamos sobre este assunto, convém colocá-lo em perspetiva. É que, hoje, porventura, queixamo-

nos de que, em algumas zonas, há excesso de turistas. Mas convém não esquecer que, ainda nem há 10 anos,

do que as pessoas se queixavam era do abandono, do vazio que existia nesses espaços. Convém meditar nisso.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Continua no uso da palavra a Sr.ª Deputada Inês de Sousa Real.

A Sr.ª Inês de Sousa Real (PAN): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, parece-nos que o Governo tem

de decidir de que lado quer estar: se do lado dos que, como o PAN, querem um planeta sadio, ou se do lado

daqueles que apenas têm pretendido saqueá-lo, comprometendo até a sua própria existência e aquilo que são

os interesses das gerações atuais e futuras. Dos dois lados, em simultâneo, é que não pode estar seguramente!

Para terminar, Sr. Primeiro-Ministro, gostaríamos de falar do Programa de Arrendamento Acessível (PAA).

Desde que entrou em vigor, no passado dia 1 de julho, este Programa ainda só resultou na celebração de 78

contratos assinados. Conhecemos a leitura que o Governo faz desta realidade, nomeadamente quando nos diz

que os resultados só se verão de forma mais evidente dentro de dois anos ou que o ritmo de adesão ao Programa

está a aumentar.

Mas, Sr. Primeiro-Ministro, a urgência associada às matérias de habitação não permite que nos

tranquilizemos com tais respostas. Numa altura em que cada vez mais pessoas se mostram incapazes de

suportar as rendas praticadas, em especial nos grandes centros urbanos, e, em consequência disso, se veem

ora despejadas das suas casas e até empurradas para situações de sem-abrigo, ora forçadas a procurar zonas

periféricas, com todos os efeitos sociais, laborais e ambientais nefastos daí decorrentes, o que lhe queremos

perguntar — hoje que se celebra precisamente o Dia Internacional dos Direitos Humanos e sendo o direito à

habitação um direito universalmente consagrado e fundamental — é se o Governo está disponível, às portas da

discussão do Orçamento do Estado, para ampliar o Programa de Arrendamento Acessível e rever os seus

critérios e com ele o número de fogos disponíveis para 28 000 agregados e, em caso afirmativo, como tenciona

quebrar o ciclo de perda para a especulação imobiliária e garantir que mais proprietários estejam disponíveis

para arrendar os seus imóveis.

Por fim, sendo o direito à habitação um direito fundamental para a reintegração de pessoas em situação de

extrema vulnerabilidade social, como são as pessoas em situação de sem-abrigo, está ou não o Governo

disponível para assumir o compromisso de efetivar este direito, já no Orçamento do Estado para o próximo ano?

Aplausos do PAN.

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O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Inês de Sousa Real, o País esteve décadas sem

ter política de habitação. Teve uma política de concessão de crédito à construção e teve uma política de

liberalização das rendas. Ora, a conjugação destas duas políticas foi fatal. E vivemos hoje um contexto global,

onde, fruto da queda global do valor das taxas de juro, o imobiliário se transformou no investimento de refúgio.

A crise habitacional que vivemos não é, feliz ou infelizmente, um exclusivo nacional, mas é hoje uma realidade

em todo o mundo mais desenvolvido. E isso exige, de facto, uma nova geração de políticas de habitação, que

este Governo teve a coragem de lançar, depois de décadas sem ter havido qualquer nova iniciativa em matéria

de política de habitação.

É cedo para avaliar o sucesso da generalidade dos programas, designadamente o do Programa de

Arrendamento Acessível, que só foi regulamentado há cerca de três meses.

Mas há algo sobre o qual não tenho dúvidas: é que temos de continuar a desenvolver políticas, porque não

há nesta matéria — como não há em regra — nenhuma «bala de prata» que resolva todos os problemas. E a

questão da habitação acessível é central à vitalidade das cidades, à coesão social, ao direito à emancipação

das jovens gerações e ao direito à tranquilidade das gerações mais velhas.

O Sr. Presidente: — Peço-lhe para concluir, Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Vou já concluir, Sr. Presidente.

Temos, por isso, de ter sucesso. E o próximo Orçamento do Estado conterá seguramente um conjunto de

medidas que reforcem os incentivos ao arrendamento acessível e — cruzando, aliás, este tema com a sua

pergunta anterior — que favoreçam, designadamente, a transferência de fogos que estão hoje afetos ao

alojamento local para o alojamento habitacional, sem a penalização fiscal que hoje existe sobre essa matéria.

Creio que o próximo Orçamento do Estado poderá dar mais um passo no sentido de termos uma nova

geração de políticas que favoreça o arrendamento acessível nas nossas cidades.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para formular perguntas, tem a palavra, em nome do Grupo Parlamentar do Partido

Ecologista «Os Verdes», o Sr. Deputado José Luís Ferreira.

O Sr. José Luís Ferreira (PEV): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, permita-me, antes de mais, e em

nome de Os Verdes, que saúde todos os homens e mulheres que hoje lutam para que haja arte e cultura no

nosso País.

Aplausos do Deputado do PCP Bruno Dias.

O Sr. Primeiro-Ministro referiu-se ao segundo pilar da PAC (política agrícola comum) e até lembrou bem que

esse pilar pretende promover o desenvolvimento rural. De facto, tanto o segundo como o primeiro pilar da PAC

preveem apoios para práticas agrícolas sustentáveis, com benefícios ambientais, com respeito pela proteção do

ambiente, da paisagem rural, dos recursos naturais e dos solos.

Sucede que as culturas superintensivas, como seja a do olival ou a do amendoal, têm vindo a beneficiar

desses apoios quando nada têm a ver com práticas agrícolas sustentáveis — bem pelo contrário! — e

contrariam, aliás, todos os pressupostos que presidem à atribuição desses apoios.

O que eu queria saber, Sr. Primeiro-Ministro, era se o Governo vai tomar alguma medida no sentido de propor

o fim desses apoios, do primeiro e do segundo pilar da PAC, às culturas superintensivas.

Sr. Primeiro-Ministro, o Parlamento Europeu aprovou recentemente uma resolução que alerta para o facto

de o setor dos transportes ter aumentado substancialmente as emissões de gases com efeito de estufa e,

segundo as previsões, vão continuar a aumentar, até 2050, para valores absolutamente assustadores. Na

aviação, esse aumento pode chegar aos 700% e, na navegação, estamos a falar de um aumento que pode

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oscilar entre os 50% e os 250%. Aliás, segundo alguns estudos, a poluição atmosférica dos navios que operam

nos portos europeus pode ser superior à poluição provocada por todos os veículos de passageiros da Europa.

Sr. Primeiro-Ministro, queria saber qual é a sensibilidade do Governo para esta questão e se pretende incluí-

la na discussão do quadro financeiro da União Europeia, nomeadamente quanto à necessidade de se colocar

um fim à subsidiação do transporte marítimo ou, pelo menos, limitá-la aos casos em que haja um esforço para

reduzir as emissões de gases com efeito de estufa. Também queria saber qual é a sensibilidade do Governo

para a necessidade de estabelecer limites de emissão de CO2 para os navios que fazem escala nos portos

europeus.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr. Deputado José Luís Ferreira, primeiro, temos de decidir, em

sede de ordenamento, que culturas devem existir em cada parcela do território. Foi o que fizemos, por exemplo,

nos planos regionais de ordenamento da floresta e quando restringimos o olival intensivo no perímetro do

Alqueva, por já haver excesso de presença desta cultura. Não creio que transferir esse debate para as condições

de financiamento da PAC seja o caminho adequado.

No que diz respeito às reduções das emissões, temos um roteiro que já foi aprovado e que tem medidas

concretas, tanto assim que estão a ser adotadas. Ao decidirmos encerrar, já em 2021, a central do Pego ou, em

2023, a central de Sines, estamos a contribuir para eliminar dois dos principais focos de emissão de CO2, pois

15% das nossas emissões estão nessas duas centrais. Ao apostarmos, sustentadamente, quer na requalificação

dos veículos, que na redução do preço, quer no alargamento das redes de transporte público, estamos a dar um

grande contributo para haver uma alteração do modo e do paradigma da mobilidade, em particular nas áreas

metropolitanas. Ao darmos prioridade ao investimento na reabilitação, estamos a contribuir para melhorar a

eficiência energética e para fomentar a economia circular no domínio da construção.

Este é o roteiro concreto que estamos a traçar, mas não vamos deixar de plantar, de comer ou de circular. O

que temos é de plantar, comer e circular de um modo sustentável para o ambiente. Quando digo «circular», é

por via terrestre, aérea ou marítima. A sustentabilidade é a resposta e não a ausência da mobilidade.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Continua no uso da palavra o Sr. Deputado José Luís Ferreira.

O Sr. José Luís Ferreira (PEV): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, não podemos concluir que as

culturas superintensivas são práticas agrícolas sustentáveis, amigas do ambiente e fazem bem aos solos.

Sabemos bem que não.

O Sr. Primeiro-Ministro referiu-se às centrais a carvão que vão encerrar — a de Sines e a do Pego —, e, já

o dissemos aqui, consideramos que essa medida é muito boa do ponto de vista da redução da emissão de gases

com efeito de estufa e do combate às alterações climáticas.

Mas somos ecologistas e isso não basta. Por isso, aproveito para lhe perguntar, Sr. Primeiro-Ministro, se,

entretanto, o Governo já reuniu com as organizações representativas dos trabalhadores das centrais de Sines

e do Pego no sentido de garantir os direitos dos cerca de 600 trabalhadores com vínculo efetivo e, sobretudo,

dos trabalhadores com vínculo precário que trabalham para a EDP, uns, e para a Pegop, outros.

Por fim, Sr. Primeiro-Ministro, acho que é importante termos uma garantia da sua parte. Consideramos que

não há lugar a qualquer tipo de compensação aos operadores das centrais pelo seu encerramento. Do ponto de

vista contratual, não há nada que obrigue o Estado a compensar a EDP e a Pegop. O contrato de aquisição de

energia e os CMEC (custos de manutenção de equilíbrio contratual) relativos a Sines terminaram em 2017 e os

relativos ao Pego vão acabar em 2021, que é exatamente o ano em que o Governo prevê encerrar essa central.

Portanto, gostaríamos de ter a garantia do Governo de que não vai haver compensação às operadoras pelo

encerramento das centrais a carvão.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro para responder.

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O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr. Deputado José Luís Ferreira, respondo telegraficamente.

Creio, aliás, que já tinha respondido, mas mais vale repetir. Não haverá qualquer compensação, seja pelo

encerramento da central do Pego, seja pelo encerramento da central de Sines. Não haverá qualquer

compensação.

Em segundo lugar, está a ser desenvolvido pelo Instituto de Emprego e Formação Profissional (IEFP) um

projeto financiado pelo fundo ambiental para estudar as necessidades de requalificação dos trabalhadores que

dela precisem, visto que uma das hipóteses relativamente à central do Pego, pelo menos, é a de poder ter uma

reutilização com outro tipo de combustível.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Tem agora a palavra o Sr. Deputado André Ventura para formular perguntas.

O Sr. André Ventura (CH): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, já lhe colocámos esta questão em sede

própria — aliás, também a colocámos na 1.ª Comissão —, mas não obtivemos resposta. No entanto, volto a

colocá-la aqui diretamente.

Num momento em que não conseguimos pagar às nossas Forças Armadas aquilo que efetivamente

deveríamos pagar, pergunto-lhe olhos nos olhos: temos, ou não, um plano para ir buscar os familiares dos

combatentes jihadistas à Síria? Pergunto-lhe com toda a abertura e frontalidade: temos, ou não, um plano para

gastar dinheiro de Portugal em pessoas que, segundo disseram, continuam a querer matar-nos a todos? É isto

que lhe pergunto diretamente.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr. Deputado André Ventura, não, não temos qualquer plano

para ir buscar as famílias de antigos jihadistas à Síria.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Continua no uso da palavra o Sr. Deputado André Ventura.

O Sr. André Ventura (CH): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, agradeço o seu esclarecimento.

Há três questões que gostávamos de lhe colocar, sendo a primeira relativa à área da saúde.

O Sr. Deputado Sérgio Sousa Pinto disse que era anedótico achar que a saúde não está a cair aos bocados

e o seu líder parlamentar disse que todos os dias recebe queixas acerca do Sistema Nacional de Saúde.

Pergunto-lhe se a estimativa orçamental é a de voltarmos a ter um défice que seria de 90 milhões e acabou em

550 milhões de euros.

Pergunto-lhe também o que dizer do despacho do Secretário de Estado que proibiu mais contratações no

Serviço Nacional de Saúde. Na verdade, se queremos melhorar o Serviço Nacional de Saúde, não podemos

dizer que não se podem contratar mais pessoas.

Protestos da Deputada do PS Maria Antónia de Almeida Santos.

Por fim, pergunto-lhe, Sr. Primeiro-Ministro, já que o seu Ministro do Ambiente aplaudiu a chegada da jovem

Greta a Portugal e já que gosta tanto de piscar o olho ao PAN, ao PEV e ao PCP, como é possível que ninguém

nesta Casa o tenha questionado sobre o facto de Portugal ter caído oito posições — oito! — no tal famoso

ranking do ambiente e das alterações climáticas. Não era suposto ser o Chega a fazer aqui este papel, mas

somos obrigados a fazê-lo, porque, aparentemente, mais ninguém o quer fazer.

Protestos de Deputados do PS.

Obrigado! Eu oiço bem!

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O Sr. Presidente: — Peço-lhe para concluir, Sr. Deputado.

O Sr. André Ventura (CH): — Vou já concluir, Sr. Presidente. Estou a ser interrompido, mas vou já concluir.

O Sr. Primeiro-Ministro desafiou-me, no início desta Legislatura, a apoiar as medidas do programa do Partido

Socialista em relação à corrupção. Até agora, ainda não vimos nada!

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, tem mesmo de concluir.

O Sr. André Ventura (CH): — Vou terminar, Sr. Presidente.

Pergunto-lhe onde é que está a proposta do PS em matéria de enriquecimento ilícito. Estamos todos à

espera!

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro para responder.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr. Deputado André Ventura, convém que deste Governo só

espere o que está no Programa do Governo. E o nosso Programa do Governo não muda semana sim semana

não, conforme as críticas que recebe.

Aplausos do PS.

O Sr. João Oliveira (PCP): — É um barrete que enfia até aos pés!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Mas vejo que já está adaptado ao seu novo programa e que o Serviço Nacional

de Saúde também passou a estar no seu coração.

Aplausos do PS.

O Sr. André Ventura (CH): — Sempre esteve no meu coração!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Ainda bem! Devolve-nos a todos nós esperança sobre o futuro da humanidade,

porque julgávamos que desde a apresentação da sua tese de doutoramento até aos dias de hoje tinha havido

um processo de regressão lamentável,…

O Sr. André Ventura (CH): — Está enganado!

O Sr. Primeiro-Ministro: — … mas, pelos vistos, há áreas onde poderá haver um progresso assinalável.

Bem-vindo à defesa do Serviço Nacional de Saúde.

O Sr. André Ventura (CH): — Vai responder ou não?!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Será mais um a ter, amanhã, uma agradável surpresa com a aprovação de uma

resolução do Conselho de Ministros.

Aplausos do PS.

O Sr. André Ventura (CH): — Ah! É amanhã!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Fiquei também a perceber que, apesar de tudo, a questão ambiental só lhe

interessa para a dialética política, mas que era pressuposto não interessar ao Chega. Ficámos a saber!

Quero dizer-lhe que os dados que saíram, de uma organização não-governamental, referem-se ao ano de

2017…

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O Sr. André Ventura (CH): — Ao de 2018!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Não, ao de 2017. Repito, referem-se a 2017, um ano que foi assinalado com

dois factos de que terá dado conta.

O Sr. André Ventura (CH): — A vinda do Papa?!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Não. Foi um ano trágico em incêndios florestais, o que aumentou

exponencialmente as nossas emissões de CO2.

O Sr. Presidente: — Peço-lhe para concluir, Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, concluo já.

E foi um ano de seca severíssima, o que contribuiu para que a produção de energia hidráulica tivesse uma

quebra muito significativa.

Aplausos do PS.

O Sr. André Ventura (CH): — Caímos oito posições!

O Sr. Presidente: — Para formular perguntas, tem a palavra o Sr. Deputado João Cotrim de Figueiredo.

O Sr. João Cotrim de Figueiredo (IL): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, 33 anos depois da adesão

de Portugal à União Europeia, continua-se a ir a Bruxelas todos os anos lutar por mais umas esmolas dos países

ricos europeus. Em vez de ambicionarmos deixar de precisar do Fundo de Coesão e de outros fundos,

mendigam-se migalhas de fundos destinados a objetivos definidos em Bruxelas.

Em 2004, a União Europeia tinha 15 membros, sendo que, desses, só dois continuam pobres ao ponto de

ainda precisarem dos apoios dos Fundos de Coesão — Portugal e Grécia, exatamente os países menos liberais

e mais estatistas.

A verdadeira coesão que os liberais querem é a de deixar de precisar dos apoios dos Fundos de Coesão…

O Sr. João Oliveira (PCP): — Viva o Chile!

O Sr. João Cotrim de Figueiredo (IL): — … e crescer mais do que os países da nossa dimensão e que

connosco concorrem.

Já sei que o Sr. Primeiro-Ministro vai dizer que crescemos acima da média da União Europeia,…

O Sr. Primeiro-Ministro: — Ainda bem!

O Sr. João Cotrim de Figueiredo (IL): — … mas essa é uma média do poucochinho. É que esquece-se de

dizer que só quatro países cresceram menos do que Portugal no último trimestre.

A reação do Governo às propostas, da presidência finlandesa ou outras, que pretendem reduzir os fundos

estruturais é sintomática.

O Sr. João Oliveira (PCP): — E como estará o paraíso liberal do Chile?

O Sr. João Cotrim de Figueiredo (IL): — Não sabe viver sem o dinheiro dos outros europeus e todos

conhecemos a famosa frase: «O socialismo dura até acabar o dinheiro dos outros.»

Protestos do Deputado do PCP João Oliveira.

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Aliás, isso nota-se nos insistentes apelos que o Sr. Primeiro-Ministro faz para o reforço das contribuições de

cada país e para o aumento das receitas próprias da União Europeia. Isto é, em bom português: mais impostos.

Tudo isto existe e tudo isto é triste. É triste que Portugal seja, diz a OCDE (Organização para a Cooperação

e Desenvolvimento Económico), o único País do grupo de coesão que não irá crescer mais de 2% em 2020 e

em 2021. É triste que, nos últimos anos, Portugal tenha sido ultrapassado por vários países de Leste e que seja

hoje mais pobre do que a Eslovénia.

O Sr. Presidente: — Peço-lhe para concluir, Sr. Deputado.

O Sr. João Cotrim de Figueiredo (IL): — Vou terminar, Sr. Presidente.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Vai terminar a chorar!

O Sr. João Cotrim de Figueiredo (IL): — É triste perceber que, daqui a 10 ou 15 anos, sem as necessárias

reformas liberais, podemos ser o País mais pobre da Europa.

Sr. Primeiro-Ministro, não acha triste esta realidade e esta falta de ambição?

O Sr. João Oliveira (PCP): — É uma anedota!

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Cotrim de Figueiredo, primeiro, é alegre verificar

que, ao menos, mantém-se coerente e não teve ainda necessidade de mudar o programa do seu partido.

Risos do PS.

Assim é que é um verdadeiro liberal: contra qualquer apoio, mesmo ao seu País. Assim é que é mesmo!

Aplausos do PS.

O que é triste é o Sr. Deputado entender que os fundos europeus são uma esmola e não um dever de

solidariedade, um valor fundamental em que assenta o projeto europeu. É na paz e na solidariedade que assenta

o projeto europeu.

Aplausos do PS.

Ainda mais triste é verificar que o Sr. Deputado não deu conta de que não há um único país da União Europeia

— um único, repito — que não receba apoios dos Fundos de Coesão. Todos os países da União Europeia

recebem apoios dos Fundos de Coesão. Muitos recebem-nos diretamente, como é o caso da Alemanha, onde

grande parte dos Länder recebe apoios dos Fundos de Coesão. Recebe a Dinamarca, recebe a Finlândia,

recebe a Holanda.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Claro! E ainda vão receber mais!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Não há nenhum país da União Europeia que não receba apoios dos Fundos de

Coesão.

Aplausos do PS.

E sabe porquê, Sr. Deputado? Por mais desenvolvido que um país seja, nem todas as regiões são igualmente

desenvolvidas.

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Porventura, na sua geografia de Portugal, poderá prescindir dos Fundos de Coesão, mas, no País real que

Portugal é, não podemos prescindir desses fundos e vamos bater-nos por eles.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Chegámos ao final do primeiro ponto da nossa ordem do dia.

Vamos, imediatamente, iniciar o segundo ponto, que se trata do debate preparatório do Conselho Europeu,

ao abrigo da alínea a) do n.º 1 do artigo 4.º da Lei de Acompanhamento, Apreciação e Pronúncia pela

Assembleia da República no Âmbito do Processo de Construção da União Europeia.

Para intervir, em nome do Governo, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Srs. Deputados, a minha intervenção será muito curta, tendo em

conta que o principal ponto do Conselho Europeu é, precisamente, o debate sobre o quadro financeiro plurianual,

relativamente ao qual tive a oportunidade de me expressar durante 12 minutos.

Agora, gostaria de ouvir, depois de um penoso silêncio das diferentes bancadas, ou melhor, de quase todas

as bancadas, sobre estas matérias, o que é que a Assembleia…

Protestos do PSD.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Eu disse «quase todas»!

O Sr. Adão Silva (PSD): — Corrigiu!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Eu disse «quase todas as bancadas».

Como estava a dizer, gostaria de ouvir o que é que a Assembleia tem a dizer sobre esta matéria, visto

sabermos que o PSD está de acordo em que é necessário rejeitar a proposta finlandesa, sabemos que o

Iniciativa Liberal apoia a proposta finlandesa e sabemos que o PS também apoia a posição do Governo, pelo

que, aliás, o Governo agradece profundamente à bancada do Partido Socialista.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — E o Bloco também!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Não tenho mais nada a acrescentar àquilo que já tive oportunidade de dizer.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — E o Bloco também!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Ah! E o Bloco também! O Bloco disse, efetivamente, que também recusava a

proposta finlandesa.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — E os outros vai ouvir agora!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Por isso, vou ouvir agora e guardarei o tempo para poder responder

devidamente.

Muito obrigado, Sr. Deputado Bruno Dias, e aproveito para cumprimentá-lo porque ainda não o tinha visto

nesta Legislatura.

Aplausos do PS.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — É um prazer! Mas olhe que eu tenho estado cá! Não ando a faltar!

O Sr. Presidente: — Vamos, então, iniciar a fase de debate.

Tem a palavra, pelo Grupo Parlamentar do PS, o Sr. Deputado Capoulas Santos.

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O Sr. Luís Capoulas Santos (PS): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro e Srs. Membros do Governo, Sr.as

e Srs. Deputados: Gostaria, em primeiro lugar, enquanto Presidente da Comissão Parlamentar de Assuntos

Europeus, de saudá-lo, e ao Governo, e de manifestar a disponibilidade do Parlamento, neste caso através da

Comissão de Assuntos Europeus, para uma cooperação estreita e leal, ao longo deste mandato, na defesa dos

valores europeus e dos interesses nacionais no contexto da União Europeia. Exerceremos, com empenho e

determinação, os poderes que o Tratado de Lisboa e a legislação nacional nos conferem, no que respeita ao

acompanhamento, apreciação e pronúncia sobre a participação de Portugal no processo de construção

europeia.

Há uma semana, tive a honra de presidir à delegação da Assembleia da República que participou na LXII

COSAC (Conference of Parliamentary Committees for Union Affairs of Parliaments of the European Union), que

teve lugar em Helsínquia, composta pelos Deputados Isabel Rodrigues e Pedro Cegonho, do PS, Isabel Meireles

e Paulo Moniz, do PSD, e pela Deputada Beatriz Dias, do Bloco de Esquerda.

Aí, todos tivemos oportunidade de intervir e de influenciar positivamente, propondo ou apoiando a inscrição

nos documentos finais de um conjunto de recomendações que estão em linha com as posições nacionais que

têm vindo a ser defendidas pelo Governo, especialmente no que diz respeito às alterações climáticas e ao

quadro financeiro plurianual, neste caso, através de uma vigorosa rejeição da proposta finlandesa, que estará

em discussão no Conselho Europeu desta semana.

Afirmámos, também, a necessidade de a União Europeia dispor, no próximo período de programação, de um

orçamento compatível com as suas elevadas ambições, incluindo a ponderação e decisões ousadas sobre os

novos recursos próprios.

Em segundo lugar — e permita-me que fale agora na qualidade de Deputado do Grupo Parlamentar do

Partido Socialista —, estando essencialmente em causa no próximo Conselho Europeu as alterações climáticas

e o MFF (Multiannual Financial Framework), quero felicitá-lo, e ao Governo, pela postura liderante e construtiva

que, em nome de Portugal, tem assumido nestas matérias.

Quanto às alterações climáticas, felicito-o pela antecipação já assumida e traduzida na Resolução do

Conselho de Ministros de 1 de julho, que aprovou o roteiro para a neutralidade carbónica, e nas metas fixadas

para 2030, no âmbito do Plano Nacional Energia e Clima.

Quanto ao quadro financeiro plurianual, felicito-o pelo inconformismo e pela recusa das propostas do

Conselho, incluindo a última, da Presidência Finlandesa, e pela insistência na necessidade de serem

repensados e reforçados os recursos próprios da União, como condição fundamental para contornar a penosa

e cíclica discussão em torno das percentagens do RNB (rendimento nacional bruto) e para assegurar os meios

necessários para dar expressão concreta às novas e às velhas políticas europeias, da ciência ao digital e à

inovação, das migrações à segurança, sem esquecer a pertinência da coesão, da agricultura, do

desenvolvimento rural e do mar, incluindo ainda, no caso português, a necessidade de garantir a continuidade,

em termos adequados, dos apoios às regiões ultraperiféricas.

Gostaria, assim, de perguntar-lhe, Sr. Primeiro-Ministro, qual a sua expectativa quanto à possibilidade de se

lograr um compromisso aceitável, já neste Conselho, sobre os objetivos climáticos. Dada a necessidade da

rápida aprovação do novo quadro financeiro plurianual e conhecida a posição recuada dos chamados

«contribuintes líquidos», considera possível algum avanço positivo neste Conselho Europeu?

Finalmente, gostava de saber a sua opinião sobre a possibilidade, ou não, de se conseguir algum progresso

quanto a novos recursos próprios.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Ainda no tempo do Grupo Parlamentar do PS, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos

Brás.

O Sr. Carlos Brás (PS): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs.

Deputados: Sr. Primeiro-Ministro, o Governo que V. Ex.ª lidera definiu a neutralidade carbónica como um desafio

estruturante para este mandato e, em linha com o programa eleitoral apresentado aos portugueses, definiu

também medidas que podem reduzir a pegada carbónica e tem vindo a criar um conjunto de instrumentos nesse

sentido, para que, de facto, possamos atingir esse desígnio até 2050.

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Considerando que Portugal, à semelhança de outros países do sul da Europa e da bacia do mediterrâneo,

tem especiais vulnerabilidades aos efeitos das alterações climáticas, queria deixar-lhe a seguinte pergunta: em

que medida poderemos, no próximo quadro plurianual da União Europeia, encontrar alguma resposta específica

para esta especial vulnerabilidade de Portugal às alterações climáticas?

Queria também deixar-lhe uma questão que é, para nós, igualmente pertinente e que tem a ver com a

conferência sobre o futuro da Europa, que acontecerá durante o mandato de Portugal na União Europeia.

Gostávamos de saber quais as principais linhas de orientação que o Governo tem nesta matéria.

Para concluir, deixava-lhe uma outra questão que, para nós, é também importante, tendo Portugal, nessa

área, um especial ativo e um património riquíssimo, relativamente ao relacionamento da União Europeia com o

continente africano e à cimeira União Europeia/África. Que linhas de orientação estratégica o Governo tem

planeadas para essa cimeira, tendo em conta que ainda não conhecemos em detalhe nem o modelo, nem o

formato dessa cimeira?

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, agora, a Sr.ª Deputada Isabel Meireles, do Grupo Parlamentar do PSD.

A Sr.ª Isabel Meireles (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Sr.as e Srs. Membros do Governo,

Sr.as e Srs. Deputados: Em vésperas de realização do próximo Conselho Europeu, o PSD deseja, antes de mais,

os maiores sucessos a todos os novos responsáveis pelas instituições europeias que acabam de iniciar os seus

mandatos. Obviamente, o PSD estende esse cumprimento à Comissária Europeia Dr.ª Elisa Ferreira, a quem

formulamos, também, votos de bom trabalho à frente da política de coesão e reformas. Ela é, aliás, a primeira

mulher portuguesa a integrar a Comissão Europeia, juntamente com a Presidente da Comissão, Ursula von der

Leyen, e, ainda, à frente do BCE (Banco Central Europeu), com Christine Lagarde. Ou seja, podemos dizer que

este é um momento muito feliz para as mulheres, que saberão, estou certa, fazer a diferença.

Sr. Primeiro-Ministro, o próximo Conselho Europeu estará centrado em temas decisivos para a Europa nos

próximos anos, ou, diria mesmo, décadas. A luta contra as alterações climáticas é um dos tópicos considerados

prioritários pela nova Presidente da Comissão Europeia e, aliás, há dias, o Parlamento Europeu declarou a

situação de emergência climática.

Pergunto de que forma o Governo português pretende travar a batalha da defesa desta causa, quando os

sinais internos são absolutamente contraditórios.

O Sr. Adão Silva (PSD): — É verdade!

A Sr.ª Isabel Meireles (PSD): — É que foi conhecido esta manhã o Índice de Desempenho das Alterações

Climáticas, durante a cimeira sobre o clima em Madrid, que ainda decorre, e Portugal obtém a pior posição de

sempre, com o desempenho do País a descer em quase todas as categorias.

O Sr. Adão Silva (PSD): — Bem lembrado!

A Sr.ª Isabel Meireles (PSD): — O nosso País desceu oito lugares, ocupando agora a 25.ª posição entre 57

países. Que medidas tem tomado o Governo, pergunto, para mitigar o impacto da seca e dos incêndios florestais,

áreas onde o anterior Governo socialista deixou um rasto de má memória e uma crise de autoridade interna sem

precedentes?

Esta é uma contradição clamorosa. Este é um péssimo sinal que o Governo português dá. O planeta, digo

eu, dispensa socialismos mascarados ou de verde ou de «super-homem ecológico» que vem salvar a

humanidade, porque, na prática, faz o oposto. O que vemos são opções e políticas que destroem ainda mais o

equilíbrio dos ecossistemas e deixam danos irreversíveis para as próximas gerações.

O Governo português, pergunto, tem em vista algum Green Deal para o combate às alterações climáticas,

ou continuaremos a ter anúncios, promessas e intenções?

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Sr. Primeiro-Ministro, o quadro financeiro plurianual será outro tema igualmente a ser discutido no Conselho

Europeu. A proposta da Presidência Finlandesa, estamos de acordo, ninguém a apoia. A contribuição de 1,7%

do rendimento nacional bruto…

O Sr. Primeiro-Ministro: — É 0,7%!

A Sr.ª Isabel Meireles (PSD): — A contribuição de 0,7% dos 27 Estados-Membros está abaixo do 1,16%

que V. Ex.ª, Sr. Primeiro-Ministro, defende.

Pergunto que argumentos fará o Governo de Lisboa valer para que se encontre uma solução mais vantajosa

para Portugal, uma posição mais próxima das instituições europeias, do Parlamento ou da Comissão Europeia.

Sr. Primeiro-Ministro, quanto aos Fundos de Coesão, desde o início deste ano que o PSD, na Assembleia da

República, lhe dirigiu esta pergunta simples: que negociação de fundos é esta quando, ao que tudo indica, a

política de coesão irá beneficiar os países mais ricos e penalizar Portugal? De que forma o Governo português

pretende defender a posição nacional junto de Bruxelas quando países como a Espanha, Itália e até a Finlândia

saem a ganhar? Onde está a força da razão dos amigos da coesão?

Também o PSD defende que não haja cortes na PAC (política agrícola comum), sendo que o segundo pilar

do desenvolvimento rural tem uma proposta de corte de mais de 25%, o que é absolutamente inaceitável. Pode

dizer-nos como pretende impedir este corte? Ou será que o poder de negociação do Sr. Primeiro-Ministro está

à altura da taxa de execução dos fundos europeus? A taxa de execução destes fundos situa-se, atualmente, na

ordem dos 40%, ou seja, 60% dos 25,9 mil milhões de euros de fundos europeus do Portugal 2020 estão por

usar. Como podemos pretender obter mais fundos se não conseguimos gastar aqueles que temos? Portugal só

executou 10,5 mil milhões de euros de fundos, repito, 40%. São valores muito baixos, ou, na linguagem que o

Sr. Primeiro-Ministro tanto aprecia, muito «poucochinho».

Finalmente, faço-lhe uma última pergunta: estão o Governo e o Sr. Primeiro-Ministro em condições de

assegurar perante esta Câmara que Portugal não sofrerá um corte nos Fundos de Coesão da ordem dos 7%?

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — É a vez do Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda, por intermédio da Sr.ª Deputada

Fabíola Cardoso.

Tem a palavra.

A Sr.ª Fabíola Cardoso (BE): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro: Alguns de nós chegaram aqui há

pouco tempo. Não me refiro a esta Assembleia, ao Governo, nem mesmo à Comissão Europeia. Refiro-me aos

seres humanos, nesta pequena rocha hidratada, rodeada de gases, a que chamamos Terra.

Quando chegámos, já o planeta tinha ultrapassado várias crises globais, de consequências catastróficas para

os seus habitantes — que o digam os dinossauros! Mas, agora, pela primeira vez, somos nós os principais

responsáveis pela calamidade que coloca em causa não a continuação da vida na Terra mas o nosso futuro

enquanto espécie.

Não somos o pináculo da criação. Somos parte de uma intrincada e delicada rede de ciclos biogeoquímicos

e dependemos completamente das condições muito especiais e também muito frágeis que existem neste

bocadinho do Universo.

Se, durante muitos anos, as teorias negacionistas das alterações climáticas conseguiram impor-se, hoje, a

emergência climática é reconhecida não só por este Parlamento mas também pelo Parlamento Europeu; tanto

assim é que o combate às alterações climáticas será o primeiro ponto da ordem de trabalhos do Conselho

Europeu que este debate prepara. A Comissão presidida por Ursula von der Leyen defende como prioritário um

pacto ecológico europeu, o Green Deal, que tem o objetivo de reduzir em 55% as emissões de gases com efeito

de estufa até 2030 e atingir a neutralidade carbónica na União Europeia em 2050.

Mobilizar conhecimento científico não basta. Um comprimido pode fazer baixar a febre, mas não curará a

doença. O consenso científico aponta atualmente o caminho. A causa da emergência climática está no sistema

de extração, produção e consumo vigente, uma produção viciada em combustíveis fósseis, agressivamente

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extrativista, que enterra toneladas de recursos naturais ao mesmo tempo que destrói rios, florestas, povos

originários e culturas para os obter. A lógica de consumo infinito é insustentável num planeta finito.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Muito bem!

A Sr.ª Fabíola Cardoso (BE): — No dia em que é anunciado que Portugal cai para a posição mais baixa de

sempre no Índice de Desempenho das Alterações Climáticas, no mês em que a Agência Europeia do Ambiente

anuncia que não cumpriremos as metas para 2020, nem mercados vendilhões de dióxido de carbono nem o

anunciado trilião de euros vão à raiz do problema. Se o «deal» continuar como de costume, podemos chamar-

lhe «verde» 10 vezes por página mas isso não resolve o problema.

A recente manifestação em Madrid é um grito global dos jovens, perante a exiguidade da ação política e a

falta de ambição operacional dos Governos, que não podemos ignorar. Sabemos que, no dizer do Sr. Primeiro-

Ministro, «temos dois deveres: ouvir os cientistas e agir». Podemos, assim, concluir, Sr. Primeiro-Ministro, que

neste Conselho Europeu defenderá metas vinculativas e políticas concretas para travar o contínuo aumento de

emissões e garantir a neutralidade carbónica?

Podemos fazê-lo, por exemplo, como defende o Bloco de Esquerda, cancelando os benefícios fiscais sobre

o carvão e outros combustíveis fósseis, tanto ao nível da produção de energia como na aviação, garantindo a

colocação de painéis solares em edifícios públicos e habitações, numa lógica de produção descentralizada e

partilhada de energia solar, e proporcionando transportes públicos eficazes e acessíveis, com a expansão do

metro e o aumento da oferta de autocarros, ambos ligados à ferrovia.

São necessárias corajosas e profundas alterações na política europeia, que incluam, em todas as suas

vertentes, a adaptação às alterações climáticas na agricultura, nas florestas, no mar, na saúde, no trabalho e,

sem dúvida, também na educação e na ciência. Trata-se de substituir uma lógica de lucro pela lógica da

sustentabilidade. Podemos fazê-lo, por exemplo, abolindo o uso de plásticos únicos e de duplas embalagens,

terminando com o apoio às explorações agropecuárias intensivas e superintensivas e protegendo os

trabalhadores diretamente afetados por esta transição.

O Sr. Presidente: — Peço-lhe que conclua, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Fabíola Cardoso (BE): — Concluo, sim, Sr. Presidente.

Só mediante mecanismos efetivos de ação, acompanhados de processos de monitorização e avaliação

abertos à participação da cidadania global, poderemos manter as condições ambientais que nos permitem

chamar «casa» a este pequeno planeta.

O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Fabíola Cardoso (BE): — As minhas questões são simples. Sr. Primeiro-Ministro, concorda com as

medidas apresentadas? E, à luz do debate feito anteriormente, como vão elas ser implementadas?

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, em nome do Grupo Parlamentar do PCP, tem a palavra o Sr.

Deputado Bruno Dias.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo, Sr. Primeiro-

Ministro, antes de mais, permita-me que esclareça o seguinte: o Sr. Primeiro-Ministro reparou hoje, mas já há

algumas semanas que andamos por cá — aliás, diria mais «há uns anos»!…

Risos do Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares, Duarte Cordeiro.

O Sr. Primeiro-Ministro já deixou bem claro que a prioridade fundamental para o Governo, nesta reunião do

Conselho Europeu, é o debate de fundo sobre o próximo quadro financeiro plurianual. Não é nada que

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surpreenda, naturalmente, quando se tem em conta a gravidade e o caráter inaceitável da proposta da

Presidência finlandesa.

Mas, se não esperávamos que alguém, nesta Assembleia, rejeitasse a rejeição que o Governo afirmou e

defendeu, também não podemos deixar de sublinhar as reservas e os alertas que o PCP sistematicamente veio

fazendo em relação aos problemas deste quadro financeiro, que teve um péssimo ponto de partida e vai ficando

cada vez pior.

A verdade é que este quadro financeiro vai mais longe do que os anteriores no acentuar das assimetrias

entre regiões e países e no abandonar de uma política de coesão e convergência que, na verdade, nunca foi

digna desse nome e nunca teve meios para tal.

Quando o Sr. Primeiro-Ministro refere, como referia há pouco, essa necessidade de equilíbrio entre a coesão,

a PAC e as novas políticas, o problema é que essas novas políticas são políticas muito velhas, como o

militarismo e a indústria da guerra, o securitarismo, áreas que têm recebido financiamentos sem paralelo nos

quadros até hoje. É por isso que, depois, se vai dizer que não há dinheiro para a coesão — tudo isto é inaceitável!

— e é também devido à gestão centralizada dos fundos e ao privilégio dado, também por essa via, nas vantagens

e nos benefícios às grandes potências europeias, com a Alemanha à cabeça.

Fala-se na saída do Reino Unido da União Europeia, mas, durante o quadro que agora termina, no Horizonte

2020, que era um programa de gestão centralizada, o principal país beneficiário, em termos contabilísticos —

não é em termos reais, é em termos nominais —, era o Reino Unido. Por outro lado, agora, precisamente em

áreas como a coesão, não apenas se coloca o corte orçamental como ainda são criados «alçapões», diria eu,

como é o caso do Fundo para uma Transição Justa, que vem beneficiar países como a Alemanha, embora não

se fale tanto disso.

Sr. Primeiro-Ministro, a questão que se coloca é a de fazer esse debate de fundo, que se proclama na agenda

da reunião mas que não se pode limitar à discussão de uma pseudo-opção entre o que é mau e o que é péssimo.

Não podemos apenas ficar entre esta proposta da Presidência finlandesa e qualquer coisa um bocadinho menos

mau que isso.

Temos de rejeitar as supostas inevitabilidades em relação às contribuições baseadas no rendimento nacional

bruto. Há que reforçar, e não diminuir, o caráter redistributivo do orçamento e o princípio da solidariedade

contributiva, porque isso está no papel mas não está na prática da União Europeia — muito pelo contrário!

Aliás, foi a própria Comissão Europeia que, na sua comunicação de fevereiro do ano passado, contrapôs à

leitura contabilística dos fundos comunitários a análise dos benefícios da integração no mercado único. Isto está

na página 6 e começa com a Alemanha, a França, o Reino Unido, os Países Baixos, que são os principais

beneficiários deste mercado e desta integração. Portugal está em 19.º lugar! Não se fale em beneficiários e em

contribuintes líquidos. Estamos a falar, efetivamente, nos países mais poderosos, que são os maiores

beneficiários desta União Europeia.

Como temos vindo a dizer, no fundo, isto a que estamos a assistir é a União Europeia a ser a União Europeia

e há muito tempo que o PCP tem vindo a sublinhar a necessidade imperiosa de rejeitarmos este caminho.

Aplausos do PCP e do PEV.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Almeida, do Grupo

Parlamentar do CDS-PP.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Srs. Membros do

Governo, Sr. Primeiro-Ministro: Em relação à agenda deste Conselho Europeu, já foi aqui referida a matéria

mais importante, que é o quadro financeiro plurianual, e, obviamente, não deixaremos de falar sobre ela.

Em primeiro lugar, registamos um consenso: também rejeitamos a proposta finlandesa e, naturalmente,

estamos solidários com a defesa do interesse de Portugal. Mas temos de dizer duas outras coisas.

O facto de estarmos solidários e de rejeitarmos a proposta finlandesa é a consequência daquele que foi o

discurso do CDS ao longo de todo este tempo e que o Governo foi negando. Nós avisámos e dissemos várias

vezes, quer em debates aqui quer em debates com o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros e a Sr.ª Secretária

de Estado na Comissão, que a estratégia de Portugal poderia pôr em causa o sucesso da posição que o Sr.

Primeiro-Ministro dizia defender.

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A primeira questão que colocamos é relativa àquilo que o Sr. Primeiro-Ministro dizia querer defender, que

era a construção de pontes entre diferentes tipos de países, afirmando que nos devíamos sentar com a

Alemanha e a França e também com a Grécia e que não nos devíamos limitar às reuniões do grupo da coesão

ou a alinhar com os países de Visegrado. Portanto, não tendo corrido bem a estratégia do Sr. Primeiro-Ministro,

perguntamos: o que é que correu mal e por que é que Portugal está, agora, exatamente na posição em que

dissemos que poderia vir a ficar, se seguisse este caminho?

Depois, é importante os portugueses saberem o que está em causa, porque «quadro financeiro plurianual»

pode dizer pouco às pessoas. Estão em causa os fundos de coesão e os fundos da PAC para os próximos anos

e, portanto, também está em causa o resultado de um Governo que se afirmou sempre como o Governo que

mais conseguiria influenciar as políticas europeias a favor de Portugal e do Primeiro-Ministro que tem fama,

nacional e internacional, de conseguir fazer ouvir a sua voz junto da Europa. Ora, numa matéria tão importante

para os portugueses como os fundos de coesão e a PAC, afinal, poderemos ficar pior do que estávamos, antes

deste Governo e deste Primeiro-Ministro.

Por isso, Sr. Primeiro-Ministro, é importante que nos esclareça sobre esta matéria e sobre o objetivo de

Portugal, neste momento. Sabemos qual foi a proposta inicial da Comissão e sabemos qual foi a proposta do

Parlamento Europeu. Esperava-se que a proposta da Presidência finlandesa pudesse ficar entre ambas, mas

ficou pior do que a da Comissão. O que é que o Governo português, que terá o apoio do CDS para lutar pela

defesa dos interesses de Portugal, fará para que a nossa posição não seja aquela que é neste momento?

Depois, coloca-se a questão das alterações climáticas e do Fundo para uma Transição Justa e, também aqui,

a relevância é dupla. Por um lado, queremos saber como é que este Fundo vai ser constituído e como é que o

dinheiro do Fundo vai ser aplicado, porque é importante sabê-lo. Sabemos, por exemplo, que a Polónia vai ser

um dos principais beneficiados com este Fundo, devido à desativação das minas de carvão no seu território, e

que a Alemanha, pela utilização intensiva de carvão, vai também beneficiar com este Fundo.

O que queremos saber, atendendo, ainda por cima, às exigências que o Green Deal trará à economia

nacional, é como é que Portugal será apoiado…

O Sr. Presidente: — Peço-lhe que conclua, Sr. Deputado.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Vou terminar, Sr. Presidente.

Como dizia, o que queremos saber é como é que Portugal será apoiado para que o Fundo para uma

Transição Justa não seja mais um obstáculo aos apoios a Portugal.

Por fim, Sr. Primeiro-Ministro, pergunto: a cimeira entre a Europa e a África vai ou não ser na Presidência

portuguesa?

O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr. Deputado.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — E, se deixar de ser na Presidência portuguesa, como, aliás,

tinha sido anunciado pelo Sr. Presidente da República, pergunto: porquê?

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Inês de Sousa Real, do PAN, para uma intervenção.

A Sr.ª Inês de Sousa Real (PAN): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro: Sabemos que, nesta semana, em

Bruxelas, o Conselho Europeu fará uma declaração forte para garantir a neutralidade climática na União

Europeia até 2050.

Porém, e como já demos nota anteriormente, a proposta colocada em cima da mesa pela Presidência

finlandesa para o próximo quadro financeiro plurianual é pouco ambiciosa e até contraditória com os princípios

que emanarão deste Conselho Europeu. No contexto atual, e com a confirmação do Brexit, 1,07% do rendimento

nacional bruto é irrealista, se quisermos ser determinados na transição económica, justa e social europeia, tal

como no combate estrutural à crise climática.

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O que lhe perguntamos, Sr. Primeiro-Ministro, sabendo que, a 28 de setembro de 2018, aquando da visita

do Presidente do Parlamento Europeu a Lisboa, defendeu um valor global para o quadro plurianual de 1,3%,

posição, de resto, igual à do Parlamento Europeu, é se manterá essa posição junto dos outros Estados-

Membros.

Mais, Sr. Primeiro-Ministro: a declaração de neutralidade climática que terá sido feita no Conselho é um

marco histórico que só peca por tardio. Há décadas que Os Verdes europeus alertam para a necessidade de

alteração radical de políticas públicas, bem como do modo de produção de bens e serviços, e para o erro que

tem sido financiar uma economia baseada em combustíveis fósseis e no superprodutivismo.

Sabemos que um dos pontos das conclusões deste Conselho será que todas as políticas europeias devem

cumprir e contribuir para esta neutralidade climática. E é aqui que reside a «prova dos nove» desta declaração,

pois, por exemplo, a atual política agrícola comum é totalmente contrária a este princípio.

Assim, Sr. Primeiro-Ministro, questionamo-lo no sentido de saber se está preparado para defender uma

mudança estrutural da PAC. Isto porque a proposta em cima da mesa não é mais do que a velha PAC, a PAC

dos grandes produtores pecuários, a PAC que continuará a contribuir para a pegada carbónica, a PAC que

continuará a explorar desmesuradamente os recursos naturais e também os animais, a PAC que continuará

também a pôr em causa a sustentabilidade dos ecossistemas e a preservação da biodiversidade.

Pondera ou não, Sr. Primeiro-Ministro, defender uma revisão da atual política agrícola comum, para que

passe a ser uma PAC que aposte mais na agricultura biológica e na reconversão para o uso adequado dos solos

e dos recursos naturais existentes? E que prioridade será dada, Sr. Primeiro-Ministro, em matéria de coesão

territorial, nomeadamente para o desenvolvimento do interior do País, contribuindo também para a diminuição

das assimetrias regionais, a par das questões que já aqui foram colocadas em matéria da defesa das alterações

climáticas, acima de tudo também relacionadas com a posição atual de Portugal no ranking, que, embora tenha

sido de uma maior eficácia ao nível das políticas de alteração climática, caiu naquilo que foi o seu desempenho?

Aplausos do PAN.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Ferreira, de Os Verdes, para uma intervenção.

O Sr. José Luís Ferreira (PEV): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro: Os Verdes também rejeitam a

proposta finlandesa para o quadro financeiro plurianual, mas o Conselho também se vai debruçar sobre as

alterações climáticas e é este o assunto que trago à discussão.

O relatório sobre o estado do ambiente na União Europeia, produzido pela Agência Europeia do Ambiente,

não é nada animador. Segundo esse relatório, a União Europeia não está a fazer o suficiente relativamente à

redução da emissão de gases com efeito de estufa e não vai cumprir as metas de sustentabilidade que fixou. O

que diz o relatório é que só dois dos três objetivos definidos para a proteção da natureza e conservação da

biodiversidade deverão ser atingidos.

Ora, isto tem, naturalmente, explicação. Aquilo que nos parece é que a União Europeia fala muito de

alterações climáticas mas, depois, avança na desregulação do comércio internacional, potenciando a produção

intensiva, e impõe políticas agrícolas que favorecem o grande agronegócio, esmagando a pequena produção,

arrasando a agricultura familiar e empurrando as pessoas para fora dos campos agrícolas, potenciando,

naturalmente, o abandono do mundo rural e a desertificação.

Mas a União Europeia acabou também por embarcar na conversa de reduzir o combate às alterações

climáticas a um mero negócio, com o mercado do carbono, onde os países ricos podem poluir desde que

paguem. E como se este mecanismo, que eu diria sinistro, fosse pouco, agora ainda vêm países como o Brasil

defender a dupla contagem. Isto é, tanto o comprador como o vendedor poderão descontar o valor do negócio

no total das emissões que produzem. Portanto, era importante perceber qual a posição do Governo nesta dupla

contagem, a que eu chamaria golpada, no que diz respeito ao mercado do carbono.

Para terminar, Sr. Primeiro-Ministro, o Parlamento Europeu aprovou uma resolução sobre a COP25, a

Conferência das Partes da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre as Alterações Climáticas, defendendo

que a União Europeia deveria reduzir as suas emissões de gases com efeito de estufa para 50% até 2030, em

vez do que está previsto atualmente, que são 40% até 2030. Queria saber, Sr. Primeiro-Ministro, qual a posição

do Governo português sobre esta proposta do Parlamento Europeu para afixar as metas em 50% em vez dos

40%.

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O Sr. Presidente: — Para encerrar este debate preparatório do Conselho Europeu, tem a palavra o Sr.

Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Em primeiro lugar, gostaria de saudar o

Sr. Deputado Capoulas Santos na sua qualidade de Presidente da Comissão Parlamentar de Assuntos

Europeus, que, no papel dos parlamentos nacionais, é fundamental para o acompanhamento das temáticas

europeias e como um verdadeiro segundo pilar da democracia europeia no seio da União, e desejar-lhe as

maiores felicidades neste novo mandato.

Aplausos do PS.

Primeiro, e relativamente à questão do próximo quadro financeiro plurianual, verifico com satisfação que,

com a exceção do Sr. Deputado do Iniciativa Liberal, todos rejeitam a proposta finlandesa, o que dá muito

conforto ao Governo para a posição que iremos assumir no próximo…

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — O Chega não se pronunciou!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Ah! O Chega não se pronunciou e o Deputado já não se encontra presente, mas

deve estar de acordo. Nisso deve estar de acordo.

Mas, como estava a dizer, isso dá um grande conforto ao Governo quanto à posição de rejeição dessa

posição que iremos assumir no Conselho.

É preciso ter em conta que não podemos cair na armadilha de nos entretermos a discutir sobre as diferentes

aplicações dos recursos, porque a questão é mesmo de montante.

Podemos discutir se a defesa é melhor ou pior, mas, por exemplo, a proposta finlandesa até reduz em 39%,

quase 10 mil milhões de euros, os fundos alocados à defesa, comparativamente à proposta da Comissão, e não

é isso que faz da proposta finlandesa uma proposta melhor.

Neste momento, o nosso problema — e esse é o centro da batalha que temos travado — tem a ver com o

montante global do orçamento, que exige mais transferências e mais recursos próprios por parte dos diferentes

Estados.

Pergunta o CDS-PP qual é a posição do Governo português. Sobre a posição do Governo português já tive

oportunidade de dizer que temos de procurar um consenso institucional entre a proposta inicial da Comissão e

a proposta inicial do Parlamento Europeu.

A nossa base de partida, numa lógica de compromisso negocial, como já tive a oportunidade de dizer várias

vezes, deve ser, pelo menos, de 1,16%, valor que corresponde a manter o mesmo esforço percentual do

conjunto dos Estados relativamente àquilo que aceitaram há sete anos, descontando o Reino Unido.

Se quiser, isto é o que permitirá à Primeira-Ministra da Finlândia dizer, no Parlamento finlandês, que não

aumenta o seu esforço e que permitirá à União Europeia beneficiar do aumento dos recursos necessários para

satisfazer quer os novos objetivos da agenda estratégica, quer evitar qualquer tipo de corte na política de coesão

ou na política agrícola comum.

Sr.ª Deputada Isabel Meireles, gostaria, em primeiro lugar, que não fragilizássemos a posição negocial do

País com discussões sobre o nível de execução, sobretudo com acusações que são injustas. Entre os países

que mais beneficiam, Portugal é o primeiro na sua taxa de execução. Neste momento, tem uma taxa de

execução de 38,3%, o que compara com 30,2% da média europeia. Nós não estamos mal na execução, estamos

bem, e não devemos fragilizar a nossa posição negocial com essa questão.

O mesmo se diga relativamente à questão colocada pelo PAN sobre a discussão da política agrícola comum.

Tenho dito aos meus colegas que há um momento para discutir as políticas, mas esse momento não é quando

se discute o orçamento, que é o instrumento de aplicação das políticas. Portanto, podemos discutir — como o

meu colega búlgaro quer fazer — se deve existir ou não uma agência de fronteiras como a Frontex (Agência

Europeia da Guarda de Fronteiras e Costeira), tal como podemos discutir o que deve ser a política agrícola, mas

não é no momento em que se chega ao orçamento — e a única coisa que aí temos de discutir é quanto

colocamos para a execução de cada uma das políticas — que vamos rediscutir o fundo das políticas.

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O orçamento não é o momento para discutir o fundo das políticas, é o momento para financiar a discussão

que atempadamente foi feita, sob pena de sacrificarmos e não alcançarmos o objetivo fundamental.

No que diz respeito à alteração climática, neste debate Portugal está muito confortável, visto que fomos o

primeiro país do mundo a assumir o objetivo que agora a Comissão Europeia propõe e que espero que o

Conselho venha a adotar, pois na semana passada, em Madrid, ainda havia dois Estados-membros da União

Europeia que não aceitavam assumir o compromisso da neutralidade carbónica em 2050.

Quanto à questão das metas para 2030, Sr. Deputado José Luís Ferreira, o que temos no nosso roteiro para

a neutralidade carbónica são reduções entre 45 e 55 até 2030, metas essas que também devem ser assumidas

pelo conjunto da União Europeia.

Sobre o relatório que aqui foi muito citado, creio que as Sr.as e os Srs. Deputados leram muitas notícias mas

nenhum leu o relatório propriamente dito. Primeiro, o relatório refere-se aos dados de 2017 e ele próprio explica

as razões pelas quais Portugal obteve aqueles dados, que resultam de 2017 ter sido o ano trágico de incêndios,

na sequência de sucessivos anos de seca severa. Portanto, causas naturais não têm a ver com política.

Quanto ao que tem a ver com política, sugiro que leiam as páginas 16 e 17 do relatório, onde Portugal é

colocado no top 3 dos países com melhor política climática, um dos critérios analisados mais importantes.

Aplausos do PS.

Portanto, no que diz respeito à política, nas páginas 16 e 17 do relatório, Portugal é mesmo colocado no top

3 dos países que têm melhores políticas climáticas. Quanto aos resultados, como o relatório explica, fruto dos

incêndios de 2017 e fruto de vários anos de seca severa, efetivamente, os resultados foram mais negativos do

que nos anos anteriores.

Portanto, no que diz respeito à natureza, a notícia foi má; no que diz respeito às políticas seguidas por este

Governo, a notícia é boa. Diria mesmo mais, para ser correto e justo: não são só as políticas deste Governo,

são as políticas que o País prossegue há mais de uma década, com um pequeno intervalo, em que as renováveis

foram diabolizadas, a mobilidade elétrica foi abandonada e as preocupações com as alterações climáticas se

traduzirão na liberalização do eucalipto e noutras pérolas que a direita nos reservou.

Aplausos do PS.

Era o tempo em que se julgava que, proibindo o uso da gravata no verão, se combatiam as alterações

climáticas.

Risos do PS e do Deputado do PEV José Luís Ferreira.

Felizmente, não foi esta a regra no País e, por isso, Portugal deverá ter orgulho em que a sua capital seja a

primeira cidade do sul da Europa a ser Capital Verde a partir do dia 1 de janeiro do próximo ano,…

O Sr. Presidente: — Faça favor de terminar, Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Termino já, Sr. Presidente.

… fruto de 10 anos de políticas prosseguidas na cidade de Lisboa em prol do ambiente e de combate às

alterações climáticas.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Chegamos, assim, ao final deste segundo ponto e, com ele, da nossa agenda de hoje.

Amanhã teremos reunião plenária, com início às 15 horas, cuja ordem de trabalhos é composta por muitos

pontos.

O primeiro ponto consiste na apreciação, na generalidade, dos Projetos de Lei n.os 88/XIV/1.ª (PS) — Reforça

a proteção de advogados em matéria de parentalidade ou doença grave, alterando o Código do Processo Civil

e o Código do Processo Penal, 109/XIV/1.ª (BE) — Regula as relações laborais na advocacia e 113/XIV/1.ª

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(PAN) — Confere aos advogados a prerrogativa de suspensão de processos judiciais nos quais sejam

mandatários ou defensores oficiosos em caso de doença grave ou exercício de direitos de parentalidade.

Do segundo ponto consta a discussão dos Projetos de Resolução n.os 83/XIV/1.ª (PSD) — Recomenda ao

governo que adote um programa de apoio à mobilidade de âmbito verdadeiramente nacional e territorialmente

justo, 102/XIV/1.ª (BE) — Recomenda ao Governo a efetiva aplicação do Programa de Apoio à Redução Tarifária

(PART) em todo o território nacional, 104/XIV/1.ª (PEV) — Promoção efetiva dos transportes coletivos em todo

o território nacional e 107/XIV/1.ª (CDS-PP) — Recomenda ao Governo que estude e desenvolva condições

para o aumento das deduções dos encargos com os transportes para os contribuintes residentes em territórios

do interior.

O terceiro ponto refere-se à apreciação, na generalidade, dos Projetos de Lei n.os 3/XIV/1.ª (BE) — Altera a

Lei da Nacionalidade e o Regulamento Emolumentar dos Registos e Notariado (Nona alteração à Lei n.º 37/81,

de 3 de outubro e trigésima quarta alteração ao Decreto-Lei n.º 322-a/2001, de 14 de dezembro), 117/XIV/1.ª

(PAN) — Alarga o acesso à naturalização às pessoas nascidas em território português após o dia 25 de Abril de

1974 e antes da entrada em vigor da Lei da Nacionalidade (Procede à nona alteração à Lei n.º 37/81, de 3 de

Outubro), 118/XIV/1.ª (PCP) — Alarga a aplicação do princípio do jus soli na Lei da Nacionalidade Portuguesa

(Nona alteração à Lei n.º 37/81, de 3 de outubro, que aprova a Lei da Nacionalidade) e 126/XIV/1.ª (IL) — Nona

alteração à Lei n.º 37/81, de 3 de outubro (Lei da Nacionalidade).

Do quarto ponto consta o debate, na generalidade, dos Projetos de Lei n.os 37/XIV/1.ª (PCP) — Estabelece

medidas de promoção da durabilidade e garantia dos equipamentos para o combate à obsolescência

programada, 116/XIV/1.ª (PAN) — Estabelece medidas de promoção do desenho ecológico e do aumento do

ciclo de vida dos equipamentos elétricos e eletrónicos, 119/XIV/1.ª (BE) — Alarga o prazo de garantia na venda

de bens móveis de consumo (Segunda alteração ao Decreto-Lei n.º 67/2003, de 8 de abril) e 120/XIV/1.ª (PEV)

— Aumento da durabilidade e expansão da garantia para os bens móveis e imóveis (Alteração ao Decreto-Lei

n.º 67/2003, de 08 de abril).

O quinto ponto consiste na discussão dos Projetos de Resolução n.os 15/XIV/1.ª (CDS-PP) — Recomenda

ao Governo que tome as medidas necessárias ao alargamento da ADSE a todos os portugueses,

independentemente de terem ou não um vínculo laboral ao Estado e 92/XIV/1.ª (PSD) — Recomenda ao

Governo a adoção de medidas que garantam a sustentabilidade da ADSE.

No sexto e último ponto teremos o debate, na generalidade, dos Projetos de Lei n.os 52/XIV/1.ª (PAN) —

Privilegia o modelo de residência alternada sempre que tal corresponda ao superior interesse da criança,

excecionando-se o decretamento deste regime aos casos de abuso infantil, negligência e violência doméstica,

87/XIV/1.ª (PS) — Altera o Código Civil, estabelecendo o princípio da residência alternada do filho em caso de

divórcio, separação judicial de pessoas e bens, declaração de nulidade ou anulação do casamento dos

progenitores, 107/XIV/1.ª (PSD) — Septuagésima sexta alteração ao Código Civil, aprovado pelo Decreto-Lei

n.º 47 344, de 25 de novembro de 1966, alterando o regime do exercício das responsabilidades parentais em

caso de divórcio, separação judicial de pessoas e bens, declaração de nulidade ou anulação do casamento, de

forma a clarificar que o tribunal pode determinar a residência alternada do filho com cada um dos progenitores

sempre que tal corresponda ao superior interesse do menor, 110/XIV/1.ª (CDS-PP) — Sobre o estabelecimento

da residência alternada dos menores, em caso de divórcio separação judicial de pessoas e bens, declaração de

nulidade ou anulação do casamento e 114/XIV/1.ª (BE) — Altera o Código Civil, prevendo o regime de residência

alternada da criança na regulação do exercício das responsabilidades parentais em caso de divórcio, separação

judicial de pessoas e bens, declaração de nulidade ou anulação do casamento.

É um vasto programa de trabalho que teremos amanhã à tarde.

Desejo a todos uma boa noite. Está encerrada a sessão.

Eram 17 horas e 44 minutos.

Presenças e faltas dos Deputados à reunião plenária.

A DIVISÃO DE REDAÇÃO.

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