28 DE FEVEREIRO DE 2020
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O facto é que os bancos continuam a usar e abusar da sua posição dominante, inclusive para alterar
unilateralmente as condições dos contratos de crédito. A concorrência, que sempre foi apontada como uma
solução para todos os males que advêm da privatização de serviços públicos em setores altamente
concentrados, teve na banca o mesmo resultado que verificámos nas telecomunicações ou nos combustíveis,
que foi a cartelização dos preços em prejuízo dos consumidores.
Não é demais recordar, a este propósito, que, em 2019, a Autoridade da Concorrência condenou 14 bancos
por prática concertada de troca de informação sensível durante um período de mais de 10 anos, entre 2012 e
2013. Escreve a acusação da Autoridade da Concorrência: «Cada banco sabia, com particular detalhe, rigor e
atualidade, as características da oferta dos outros bancos, o que desencorajou os bancos visados de oferecerem
melhores condições aos clientes, eliminando a pressão concorrencial, benéfica para os consumidores». Sobre
esta matéria, do Banco de Portugal, ao longo de mais de dez anos, nem uma palavra!
O Sr. Jorge Costa (BE): — Bem lembrado!
A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Sabemos que existem, neste momento, no mercado alguns casos, aqui e
ali, de instituições que cobram comissões inferiores, mas também começa agora a ficar claro que esses
preçários promocionais escondem outros custos que muitas vezes só começam a ser cobrados mais tarde.
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Muito bem!
A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Sr.as e Srs. Deputados, esta não é a primeira vez que o Parlamento é
chamado a decidir sobre a limitação de comissões bancárias. Isso já aconteceu no passado e nem sempre com
resultados produtivos. Alguns dos projetos que o Bloco de Esquerda traz hoje a debate e votação,
nomeadamente aqueles que pretendem eliminar a cobrança de comissões absurdas, foram rejeitados no
passado, com os votos contra do Partido Socialista e abstenções do PSD e do CDS.
Registaram-se, no entanto, ao longo dos últimos anos, alguns avanços com o objetivo de limitar a cobrança
abusiva de comissões bancárias e promover a inclusão financeira. A mais importante é o regime de serviços
mínimos bancários, que deveria oferecer, em teoria, uma alternativa viável para o acesso a serviços bancários
a custos controlados. Infelizmente, a aplicação prática deste regime fica muito aquém dos objetivos, aplicando-
se a menos de 80 000 contas bancárias no primeiro semestre de 2019 e, por isso, importa agora perceber que
mecanismos devem ser instituídos para garantir o acesso dos cidadãos a serviços básicos.
Sr.as e Srs. Deputados, o acesso a serviços bancários é hoje uma necessidade inultrapassável para qualquer
cidadão, e é dever das políticas públicas assegurar que este acesso seja feito em condições de justiça e
proporcionalidade. Nesse sentido, o Bloco de Esquerda apresentou cinco projetos que hoje coloca a debate e
que incidem sobre quatro pontos essenciais: o acesso a serviços bancários, a eliminação de cobranças
absurdas, a limitação do poder do banco nas renegociações contratuais e o papel do banco público, que é a
Caixa Geral de Depósitos.
A primeira proposta visa instituir a conta básica universal, que se propõe que substitua o regime de serviços
mínimos bancários, corrigindo falhas que foram identificadas. Assim, a conta básica universal irá disponibilizar
a todos os clientes bancários um conjunto alargado de serviços — uma conta à ordem, um cartão bancário, o
acesso ao homebanking, transferências — a um preço limitado e tabelado. Esta conta passa a estar disponível
a qualquer cliente bancário individual; qualquer cidadão passa a ter acesso a esta conta, independentemente
de ter outras contas bancárias ou ter contas bancárias associadas a créditos à habitação que já possam ser
existentes sem que haja lugar a uma perda de spread.
O segundo grupo de propostas pretende eliminar comissões absurdas, ou seja, que não têm nenhum serviço
associado. Propõe-se, assim, a gratuitidade da emissão de declaração de não dívida, da emissão do distrate e
a proibição de cobrança de comissões pelo processamento de prestação de crédito.
Adicionalmente, propõe-se que os bancos não possam cobrar taxas pelas transferências efetuadas através
de plataformas de intermediação, como o MB Way, porque também neste caso os bancos estão a cobrar uma
comissão por um serviço que não prestam, uma vez que a transferência é efetuada pelo próprio cliente através
de uma plataforma eletrónica operada por uma entidade terceira, neste caso a SIBS.