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Quinta-feira, 7 de maio de 2020 I Série — Número 50

XIV LEGISLATURA 1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2019-2020)

REUNIÃOPLENÁRIADE6DEMAIODE 2020

Presidente: Ex.mo Sr. Eduardo Luís Barreto Ferro Rodrigues

Secretários: Ex.mos Srs. Maria da Luz Gameiro Beja Ferreira Rosinha Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco

S U M Á R I O

O Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 2

minutos. Deu-se conta da apresentação da Proposta de Lei n.º

30/XIV/1.ª, dos Projetos de Lei n.os 343, 344 e 352 a 364/XIV/1.ª e dos Projetos de Resolução n.os 405 e 415 a 425/XIV/1.ª.

Procedeu-se à discussão conjunta, na generalidade, da Proposta de Lei n.º 28/XIV/1.ª (GOV) — Altera o regime jurídico aplicável à prevenção da violência doméstica e à proteção e à assistência das suas vítimas e dos Projetos de Lei n.os 352/XIV/1.ª (PCP) — Reforça as medidas de proteção

das vítimas de violência doméstica (sexta alteração à Lei n.º 112/2009, de 16 de setembro), 358/XIV/1.ª (PEV) — Apoio às vítimas de violência em época de pandemia, 361/XIV/1.ª (BE) — Proteção da criança ou jovem no seu bem-estar e desenvolvimento saudável (trigésima sexta alteração ao Código de Processo Penal, sexta alteração ao regime jurídico aplicável à prevenção da violência doméstica, à proteção e à assistência das suas vítimas e quinquagésima alteração ao Código Penal) e 364/XIV/1.ª (IL) — Autonomização expressa do crime de exposição de menor a violência doméstica (quinquagésima alteração ao Código Penal). Intervieram, a

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diverso título, além da Ministra de Estado e da Presidência (Mariana Vieira da Silva), os Deputados André Ventura (CH), Alma Rivera (PCP), Mariana Silva (PEV), Sandra Cunha (BE), João Cotrim de Figueiredo (IL), Inês de Sousa Real (PAN), Constança Urbano de Sousa (PS), Joacine Katar Moreira (N insc.), Mónica Quintela (PSD) e Telmo Correia (CDS-PP).

Foi discutido, na generalidade, o Projeto de Lei n.º 194/XIV/1.ª (PS) — Altera o Estatuto da Ordem dos Advogados, revendo o estatuto remuneratório do revisor oficial de contas que integra o respetivo Conselho Fiscal. Intervieram os Deputados Pedro Delgado Alves (PS), José Manuel Pureza (BE), Artur Soveral Andrade (PSD), António Filipe (PCP), Telmo Correia (CDS-PP), Inês de Sousa Real (PAN) e André Ventura (CH).

Foram debatidos em conjunto, na generalidade, os Projetos de Lei n.os 336/XIV/1.ª (PSD) — Garante apoio social extraordinário aos gerentes das empresas, 339/XIV/1.ª (CDS-PP) — Reforça a proteção social aos gerentes das empresas comerciais, 346/XIV/1.ª (IL) — Reforça o apoio social dos gerentes das empresas, 354/XIV/1.ª (PEV) — Garante o apoio extraordinário ao rendimento dos micro empresários e trabalhadores em nome individual devido à redução da atividade económica pela epidemia de COVID-19, 357/XIV/1.ª (BE) — Medidas de emergência para as micro e pequenas empresas e 363/XIV/1.ª (PAN) — Reforça a proteção dos sócios-gerentes das micro, pequenas e médias empresas (procede à oitava alteração ao Decreto-Lei n.º 10-A/2020, de 13 de março, e à segunda alteração do Decreto-Lei n.º 10-G/2020, de 26 de março). Usaram da palavra os Deputados Cristóvão Norte (PSD), Telmo Correia (CDS-PP), João Cotrim de Figueiredo (IL), José Luís Ferreira (PEV), Isabel Pires (BE), Inês de Sousa Real (PAN), Hugo Costa (PS), Bruno Dias (PCP), João Gonçalves Pereira (CDS-PP) e André Ventura (CH).

Foi discutido o Projeto de Resolução n.º 409/XIV/1.ª (BE) — Garante que as crianças cujos pais perderam rendimentos não são excluídas das creches, protegendo as famílias afetadas e os profissionais, juntamente com, na generalidade, o Projeto de Lei n.º 355/XIV/1.ª (PCP) — Cria um regime de apoio às famílias na frequência de equipamentos de apoio à infância e com os Projetos de Resolução n.os 396/XIV/1.ª (CH) — Pela criação e implementação imediata do Plano Nacional de Solidariedade e Literacia Digital, 421/XIV/1.ª (PEV) — Define medidas excecionais relativas ao pagamento de creches no período de influência da COVID-19 e 423/XIV/1.ª (PAN) — Reforça a proteção das famílias com dependentes matriculados em creches e jardins de infância e garante a sustentabilidade destes equipamentos educativos. Intervieram os Deputados Joana Mortágua (BE), Diana Ferreira (PCP), André Ventura (CH), Mariana Silva (PEV), Bebiana Cunha (PAN), Joacine Katar Moreira (N insc.), Marina Gonçalves (PS), Carla Madureira (PSD) e João Pinho de Almeida (CDS-PP).

Foram discutidos, em conjunto, na generalidade, os Projetos de Lei n.os 341/XIV/1.ª (PCP) — Proíbe a distribuição de dividendos na banca, nas grandes empresas e grupos económicos, 356/XIV/1.ª (PEV) — Regime excecional e temporário de proibição de distribuição de dividendos para a banca, o setor financeiro, as grandes empresas e os grupos económicos e 362/XIV/1.ª (PAN) — Impede o pagamento de remunerações acionistas e de bónus por instituições de crédito e por empresas que tenham recebido apoios públicos

em virtude da situação epidemiológica provocada pela doença COVID-19 (segunda alteração do Decreto-Lei n.º 10-G/2020, de 26 de março). Proferiram intervenções os Deputados Duarte Alves (PCP), José Luís Ferreira (PEV), André Silva (PAN), João Cotrim de Figueiredo (IL), Carlos Silva (PSD), Moisés Ferreira (BE), Cecília Meireles (CDS-PP), Joacine Katar Moreira (N insc.), André Ventura (CH) e João Paulo Correia (PS).

Foi discutido o Projeto de Resolução n.º 397/XIV/1.ª (CDS-PP) — Criação do «cheque emergência» para as micro e pequenas empresas cuja atividade se suspendeu, tendo feito intervenções os Deputados João Gonçalves Pereira (CDS-PP), João Cotrim de Figueiredo (IL), Hugo Martins de Carvalho (PSD), Isabel Pires (BE), Bruno Dias (PCP), Ricardo Leão (PS), Cristina Rodrigues (PAN) e André Ventura (CH).

Foram discutidos, em conjunto, na generalidade, os Projetos de Lei n.os 338/XIV/1.ª (PAN) — Altera o Decreto-Lei n.º 14-G/2020, de 13 de abril, possibilitando a realização de exame de melhoria de nota interna no ensino secundário e 360/XIV/1.ª (PCP) — Procede à primeira alteração ao Decreto-Lei n.º 14-G/2020, de 13 de abril, que estabelece as medidas excecionais e temporárias na área da educação, no âmbito da pandemia da doença COVID-19, juntamente com os Projetos de Resolução n.os 381/XIV/1.ª (CH) — Pela garantia de acesso de todos os docentes do País a meios informáticos que lhes permitam lecionar à distância, 404/XIV/1.ª (CDS-PP) — Recomenda ao Governo que permita a realização de exames nacionais para efeito de melhoria da classificação final e 406/XIV/1.ª (IL) — Pela reposição do normal funcionamento dos exames finais nacionais. Intervieram os Deputados Ana Mesquita (PCP), Bebiana Cunha (PAN), André Ventura (CH), Ana Rita Bessa (CDS-PP), João Cotrim de Figueiredo (IL), António Cunha (PSD), Joana Mortágua (BE), Joacine Katar Moreira (N insc.) e Porfírio Silva (PS).

Foi discutido o Projeto de Resolução n.º 405/XIV/1.ª (PEV) — Informação aos cidadãos sobre as melhores práticas de deposição de resíduos, como máscaras e luvas protetoras, juntamente com, na generalidade, o Projeto de Lei n.º 353/XIV/1.ª (PCP) — Definição de normas e regulamentos para operações de gestão de resíduos e com os Projetos de Resolução n.os 417/XIV/1.ª (PSD) — Recomenda ao Governo a criação e ampla divulgação de uma campanha de comunicação destinada à sensibilização das populações para o correto acondicionamento e depósito dos resíduos domésticos, 418/XIV/1.ª (BE) — Campanha nacional de sensibilização sobre a correta deposição de resíduos de materiais de proteção individual contra a pandemia de COVID-19 e, quando possível, o recurso a materiais reutilizáveis, 424/XIV/1.ª (PAN) — Pela realização de uma campanha de informação nacional sobre a deposição de resíduos utilizados na prevenção da atual crise sanitária e 425/XIV/1.ª (PS) — Recomenda ao Governo que promova boas práticas relativamente aos equipamentos de proteção individual para efeitos de prevenção do contágio do novo coronavírus (SARS-CoV-2). Usaram da palavra os Deputados Mariana Silva (PEV), Alma Rivera (PCP), Bruno Coimbra (PSD), Nelson Peralta (BE), André Silva (PAN), Hugo Pires (PS), João Gonçalves Pereira (CDS-PP) e Joacine Katar Moreira (N insc.).

A Presidente (Edite Estrela) encerrou a sessão eram 19 horas e 25 minutos.

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O Sr. Presidente: — Sr.as Deputadas e Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Funcionários,

Srs. Jornalistas, está aberta a sessão.

Eram 15 horas e 2 minutos.

Srs. Deputados, em primeiro lugar, a Sr.ª Secretária Maria da Luz Rosinha vai dar conta do longo expediente

que deu entrada na Mesa.

A Sr.ª Secretária (Maria da Luz Rosinha): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, deram entrada na Mesa,

e foram admitidas, várias iniciativas legislativas.

Refiro, em primeiro lugar, a Proposta de Lei n.º 30/XIV/1.ª (GOV) — Altera as medidas excecionais e

temporárias de resposta à pandemia da doença COVID-19.

Deram também entrada na Mesa os seguintes projetos de lei: n.º 343/XIV/1.ª (PCP) — Estabelece restrições

à publicidade nos jogos e apostas (décima quinta alteração ao Código da Publicidade, aprovado pelo Decreto-

Lei nº 330/90, de 23 de outubro); n.º 344/XIV/1.ª (PCP) — Medidas integradas para responder aos efeitos do

surto COVID-19 sobre o setor do vinho; n.º 352/XIV/1.ª (PCP) — Reforça as medidas de proteção das vítimas

de violência doméstica (sexta alteração à Lei n.º 112/2009, de 16 de setembro); n.º 353/XIV/1.ª (PCP) —

Definição de normas e regulamentos para operações de gestão de resíduos, que baixa à 11.ª Comissão; n.º

354/XIV/1.ª (PEV) — Garante o apoio extraordinário ao rendimento dos microempresários e trabalhadores em

nome individual devido à redução da atividade económica pela epidemia de COVID-19; n.º 355/XIV/1.ª (PCP)

— Cria um regime de apoio às famílias na frequência de equipamentos de apoio à infância; n.º 356/XIV/1.ª (PEV)

— Regime excecional e temporário de proibição de distribuição de dividendos para a banca, o setor financeiro,

as grandes empresas e os grupos económicos; n.º 357/XIV/1.ª (BE) — Medidas de emergência para as micro e

pequenas empresas; n.º 358/XIV/1.ª (PEV) — Apoio às vítimas de violência em época de pandemia; n.º

359/XIV/1.ª (CH) — Pela introdução de medidas que permitam a reabertura do setor das empresas itinerantes

de diversão, cumprindo os pressupostos de segurança sanitária e pela introdução de medidas económicas

transitórias que visem minorar os danos e prejuízos causados pela pandemia da doença COVID-19, que baixa

à 6.ª Comissão; n.º 360/XIV/1.ª (PCP) — Procede à primeira alteração ao Decreto-Lei n.º 14-G/2020, de 13 de

abril, que estabelece as medidas excecionais e temporárias na área da educação, no âmbito da pandemia da

doença COVID-19; n.º 361/XIV/1.ª (BE) — Proteção da criança ou jovem no seu bem-estar e desenvolvimento

saudável (trigésima sexta alteração ao Código de Processo Penal, sexta alteração ao regime jurídico aplicável

à prevenção da violência doméstica, à proteção e à assistência das suas vítimas e quinquagésima alteração ao

Código Penal); n.º 362/XIV/1.ª (PAN) — Impede o pagamento de remunerações acionistas e de bónus por

instituições de crédito e por empresas que tenham recebido apoios públicos em virtude da situação

epidemiológica provocada pela doença COVID-19 (segunda alteração do Decreto-Lei n.º 10-G/2020, de 26 de

março); n.º 363/XIV/1.ª (PAN) — Reforça a proteção dos sócios-gerentes das micro, pequenas e médias

empresas (procede à oitava alteração ao Decreto-Lei n.º 10-A/2020, de 13 de março, e à segunda alteração do

Decreto-Lei n.º 10-G/2020, de 26 de março); n.º 364/XIV/1.ª (IL) — Consagração expressa do crime de

exposição de menor a violência doméstica (quinquagésima alteração ao Código Penal).

Deram ainda entrada na Mesa os seguintes projetos de resolução: n.º 405/XIV/1.ª (PEV) — Informação aos

cidadãos sobre as melhores práticas de deposição de resíduos, como máscaras e luvas protetoras, que baixa à

11.ª Comissão; n.º 415/XIV/1.ª (CDS-PP) — Recomenda ao Governo a concretização das medidas de melhoria

e de aumento de resiliência da rede SIRESP propostas pela ANACOM e pelo Ministério da Administração Interna

na sequência dos incêndios de 2017, que baixa à 1.ª Comissão; n.º 416/XIV/1.ª (IL) — Pela igualdade parental

no apoio excecional à família, que baixa à 10.ª Comissão; n.º 417/XIV/1.ª (PSD) — Recomenda ao Governo a

criação e ampla divulgação de uma campanha de comunicação destinada à sensibilização das populações para

o correto acondicionamento e depósito dos resíduos domésticos; n.º 418/XIV/1.ª (BE) — Campanha nacional de

sensibilização sobre a correta deposição de resíduos de matérias de proteção individual contra a pandemia de

COVID-19 e, quando possível, o recurso a materiais reutilizáveis; n.º 419/XIV/1.ª (BE) — Plano para a

recuperação da atividade programada no Serviço Nacional de Saúde, que baixa à 9.ª Comissão; n.º 420/XIV/1.ª

(CH) — Recomenda ao Governo que mantenha a realização dos exames finais nacionais para efeitos de

aprovação de disciplinas e conclusão do ensino secundário e que recorra à utilização de espaços sob a alçada

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das autarquias para realização das provas de ensino em causa, que baixa à 8.ª Comissão; n.º 421/XIV/1.ª (PEV)

— Define medidas excecionais relativas ao pagamento de creches no período de influência da COVID-19; n.º

422/XIV/1.ª (PEV) — Adoção de medidas com vista à concretização dos direitos das pessoas surdas e

valorização da profissão de intérprete de língua gestual portuguesa, que baixa à 10.ª Comissão em conexão

com a 13.ª Comissão; n.º 423/XIV/1.ª (PAN) — Reforça a proteção das famílias com dependentes matriculados

em creches e jardins de infância e garante a sustentabilidade destes equipamentos educativos; n.º 424/XIV/1.ª

(PAN) — Pela realização de uma campanha de informação nacional sobre a deposição de resíduos utilizados

na prevenção da atual crise sanitária; n.º 425/XIV/1.ª (PS) — Recomenda ao Governo que promova boas

práticas relativamente aos equipamentos de proteção individual para efeitos de prevenção do contágio do novo

coronavírus (SARS-CoV-2).

Em termos de expediente, é tudo, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: — Obrigada, Sr.ª Secretária.

Antes de entrarmos na ordem do dia, queria pedir aos serviços para resolverem rapidamente o problema

informático que tem a ver com o facto de aparecer a indicação de «presença por registar». É que os Srs.

Deputados têm de se manter na Sala enquanto isso acontecer.

Não se percebe porque é que estas coisas continuam a acontecer ao fim de tantos dias, mas espero que

esta situação se resolva rapidamente.

Do primeiro ponto da nossa ordem de trabalhos consta a discussão conjunta, na generalidade, da Proposta

de Lei n.º 28/XIV/1.ª (GOV) — Altera o regime jurídico aplicável à prevenção da violência doméstica e à proteção

e à assistência das suas vítimas e dos Projetos de Lei n.os 352/XIV/1.ª (PCP) — Reforça as medidas de proteção

das vítimas de violência doméstica (sexta alteração à Lei n.º 112/2009, de 16 de setembro), 358/XIV/1.ª (PEV)

— Apoio às vítimas de violência em época de pandemia, 361/XIV/1.ª (BE) — Proteção da criança ou jovem no

seu bem-estar e desenvolvimento saudável (trigésima sexta alteração ao Código de Processo Penal, sexta

alteração ao regime jurídico aplicável à prevenção da violência doméstica, à proteção e à assistência das suas

vítimas e quinquagésima alteração ao Código Penal) e 364/XIV/1.ª (IL) — Autonomização expressa do crime de

exposição de menor a violência doméstica (quinquagésima alteração ao Código Penal).

Em nome do Governo, tem a palavra a Sr.ª Ministra de Estado e da Presidência, Mariana Vieira da Silva, a

quem aproveito para cumprimentar.

A Sr.ª Ministra de Estado e da Presidência (Mariana Vieira da Silva): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs.

Deputados: No início de 2019, fomos confrontados com uma dimensão particularmente trágica dos casos de

violência doméstica. Os episódios sucessivos registados no início do ano passado, bem como o trabalho da

equipa de análise retrospetiva, tornaram visíveis algumas fragilidades do sistema de proteção às vítimas de

violência doméstica.

O Governo não legislou de forma apressada, mas atuou de forma decidida para poder dar as respostas

necessárias. Nomeou uma comissão multidisciplinar com um mandato claro para identificar as fragilidades na

proteção às vítimas de violência doméstica e apontar soluções, em particular nas 72 horas imediatamente após

a denúncia.

O Governo tem sido consequente e tem implementado, de forma sistemática, as recomendações da

Comissão Técnica Multidisciplinar para a Melhoria da Prevenção e Combate à Violência Doméstica.

A proposta de lei que aqui discutimos materializa precisamente algumas dessas recomendações, que irão

conferir mais proteção às vítimas de violência doméstica e de violência de género. Mais proteção, porque reforça

a proteção das vítimas, através de uma melhoria da avaliação do risco nas primeiras 72 horas, com a obrigação

de as autoridades realizarem, naquele prazo, diligências probatórias de avaliação do enquadramento familiar da

vítima.

Reforça a proteção das vítimas, permitindo que o juiz de instrução criminal possa decidir, a título provisório,

por exemplo, várias questões relacionadas com menores, concretizando, assim, uma abordagem judiciária

integrada, correspondendo às recomendações da referida equipa multidisciplinar mas também às

recomendações internacionais, como as do GREVIO (Grupo de Peritos para o Combate à Violência contra as

Mulheres e a Violência Doméstica).

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Reforça a proteção das vítimas, permitindo que o mesmo juiz possa decretar medidas provisórias de proteção

de natureza cível.

E, finalmente, reforça a proteção das vítimas alargando e harmonizando a recolha de dados, tendo em vista

a sistematização da produção de informação que permita estudar, compreender e atuar melhor sobre todo o

ciclo da violência doméstica.

Sr.as e Srs. Deputados, em muitas matérias, mas muito em particular na matéria da violência doméstica e da

violência de género, sempre contámos com esta Assembleia para um diálogo franco em torno das melhores

soluções para proteger as vítimas, discordando poucas vezes e concordando na maioria das soluções.

Hoje, como em muitas outras ocasiões, contamos com o contributo do Parlamento para aprofundar a

discussão na especialidade de forma a encontrar as melhores respostas para as vítimas e para que saia desta

Câmara uma solução o mais consensualizada possível, porque assim será o mais forte possível, para uma

resposta eficaz do nosso sistema de prevenção e combate à violência doméstica.

Vivemos um tempo de emergência sanitária, mas sabemos que temos outras urgências a que temos de

responder: é o caso da urgência que temos em responder melhor às vítimas de violência doméstica e é isso que

está em causa com a discussão, hoje, desta proposta de lei.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, inscreveu-se o Sr. Deputado André Ventura, do Chega, a

quem dou a palavra.

O Sr. André Ventura (CH): — Sr. Presidente, muito obrigado.

Sr.ª Ministra, a proposta de lei que aqui nos traz hoje trata um tema fundamental, o de um crime que aumentou

— era previsível que aumentasse — no específico tempo de confinamento que tivemos.

Todavia, é importante perceber porque é que as associações e os magistrados estiveram, fundamentalmente,

contra esta proposta e é também importante que, hoje, sejam dados os esclarecimentos que têm de ser dados.

Vai haver uma decisão provisória por parte de um juiz criminal. O que é que acontece se já estiver a decorrer

um processo num tribunal de família? O que é que acontece se tiver sido tomada uma decisão anterior por um

juiz de família? Ou o que acontece se, mais à frente, vier a ser tomada uma decisão diferente pelo juiz

competente, que é o juiz de família e menores?

Para além das dúvidas de constitucionalidade, que são levantadas com as trocas e com a confusão da

especialização que aqui é feita, o Governo traz uma outra proposta: 72 horas para uma prova de risco pericial.

Todos — Ministério Público, polícias e tribunais — dizem que não são as horas que estão em causa, é a falta

de meios.

E não vale a pena dizer-nos, Sr.ª Ministra, que são 72 horas, ou uma hora, ou até, podíamos dizer, meia

hora, porque se não houver meios para que as autoridades possam levar a cabo esta prova pericial nada

conseguirá ser feito nesta matéria.

Portanto, são duas as questões muito específicas que, não só o Parlamento, mas, acima de tudo, as

associações de magistrados, têm colocado e que é muito importante que o Governo resolva numa matéria tão

crucial como esta.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para responder, a Sr.ª Ministra de Estado e da Presidência.

A Sr.ª Ministra de Estado e da Presidência: — Sr. Presidente, Sr. Deputado André Ventura, antes de mais,

queria referir que este processo dura já há alguns meses. Entre fevereiro e março, a nossa proposta esteve

disponível para discussão pública, depois fizemos as consultas obrigatórias e decorre um prazo, ainda mais

alargado, se tivermos em conta o relatório da Comissão Técnica de Acompanhamento, que é conhecido há

muito tempo.

A importância, para o nosso sistema, da especialização dos tribunais não nos deve impedir de identificar,

quando existam, momentos em que isso produziu uma segmentação no tratamento de determinados assuntos.

Procurámos encontrar um equilíbrio — que sabemos que é difícil e que muitas vezes discutimos nesta sede —,

uma resposta integrada no quadro que a nossa Constituição permite. O que permitimos é que haja uma medida

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provisória, porque a decisão definitiva é sempre do tribunal especializado e isso não fica posto em causa, mas

não podemos fechar os olhos à análise retrospetiva da equipa e do GREVIO, quando nos dizem que havia um

problema de decisões contrárias e uma necessidade de convergência.

Quanto à questão das 72 horas, não somos nós que o definimos, é a lei, e o que procuramos é uma solução

para responder à lei.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, pelo Grupo Parlamentar do PCP, tem a palavra a Sr.ª Deputada

Alma Rivera.

Faça favor, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Alma Rivera (PCP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A violência doméstica é uma violação

dos direitos humanos, um crime abominável que representa, infelizmente, um flagelo social de grandes

proporções.

Falamos de mulheres, crianças e homens que vivem, por vezes anos, ou mesmo a vida inteira, a sofrer de

violência física, psicológica e sexual no contexto de relações familiares ou de intimidade.

Hoje, debruçamo-nos, uma vez mais, sobre este problema, na tentativa de encontrar as melhores soluções.

Cumpre não esquecer que, mais do que alterar a legislação, é fundamental reforçar as condições para a sua

efetividade, e isto tem sido reclamado tanto pelas organizações da sociedade civil como pelo próprio mundo do

direito.

O combate à violência doméstica passa pela alteração da realidade económica, social e cultural que lhe

subjaz, como passa também pela capacitação dos diversos serviços e recursos públicos que vão ser chamados

a intervir e responder a estas situações, desde as forças de segurança ao Serviço Nacional de Saúde (SNS), à

educação, à segurança social, aos órgãos de investigação criminal e ao aparelho judicial.

Posto isto, hoje, a Assembleia da República é chamada a discutir a proposta do Governo, que visa,

essencialmente, intervir sobre o problema de articulação entre os tribunais de família e menores e os tribunais

criminais, procurando-se uma abordagem coordenada que atribua prioridade à proteção e segurança das vítimas

de violência doméstica através de uma partilha de tarefas que almeja garantir decisões em tempo útil adequadas

aos fins.

Basta dizer que, quando falamos de casos de violência doméstica, na maioria das vezes estão envolvidos

menores e outros dependentes ou, simplesmente, que qualquer situação que, de facto, consubstancie violência

doméstica constitui violação do dever de respeito, sendo, por isso, causa objetiva de divórcio.

Ou seja, o caráter plurifacetado deste fenómeno e das suas implicações promove, normalmente,

procedimentos judiciais em vários tribunais em paralelo, e é daqui que pode resultar um risco de desarmonia ou

mesmo de colisão das decisões, tal como a incapacidade de essas decisões protegerem os bens jurídicos em

causa.

A Lei n.º 112/2019, em vigor, que estabelece o regime aplicável à prevenção da violência doméstica e à

proteção e assistência disponibilizada às suas vítimas, é unanimemente reconhecida como um excelente

instrumento de grande abrangência e profundidade. Não obstante, a realidade tem demonstrado limitações do

sistema em termos de eficácia, rapidez e coerência das decisões judiciais. Por isso, e apesar de o problema

fundamental não se encontrar na esfera normativa, reconhecemos ser preciso corrigir essas dificuldades para

que, de facto, se consiga corresponder às necessidades das vítimas.

É do entendimento do PCP que esta proposta vai no sentido de agilizar e assegurar maior utilidade e eficácia

às decisões. No entanto, atendendo às diversas opiniões suscitadas durante a sua discussão pública,

consideramos essencial uma discussão mais aprofundada da proposta, para evitar que se obtenha o efeito

contrário do que se pretende.

Tal como é apontado pelo Conselho Superior da Magistratura e pelo Conselho Superior do Ministério Público,

tal como o PCP tem vindo a sublinhar, tudo isto exige reforço de meios, designadamente conferindo recursos

para as equipas multidisciplinares de apoio à decisão do juiz.

A proposta incide ainda sobre a melhoria da Base de Dados da Violência contra as Mulheres e Violência

Doméstica e adita à composição da Equipa de Análise Retrospetiva de Homicídio em Violência Doméstica um

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representante da Comissão Nacional de Promoção dos Direitos e Proteção das Crianças e Jovens. Nenhuma

destas ideias merece a nossa oposição.

Manifestamos, por isso, a nossa disponibilidade para contribuir, na especialidade, para a melhoria da

proposta de lei que o Governo nos traz, procurando resolver alguns dos problemas que a esta proposta foram

apontados e que merecem maior atenção.

O PCP não quis desperdiçar esta oportunidade para solucionar uma questão aparentemente de pormenor,

mas que é uma dificuldade objetiva para as vítimas do crime de violência doméstica. A proteção das vítimas

passa por, no mais curto prazo possível, promover a separação física do agressor, fazendo cessar as agressões,

mas também por repelir, durante e após o processo, retaliações e novas agressões. Procuram-se soluções de

abrigo para as vítimas, que impeçam o contacto com o agressor; no entanto, no âmbito do processo, tanto

criminal como civil, não está prevista a possibilidade de a vítima omitir a sua morada nas notificações feitas ao

agressor, o que pode frustrar a proteção da vítima.

Por isso, apresentamos também um projeto de lei que visa um aditamento pontual à Lei n.º 112/2019, no

sentido de que as vítimas possam requerer que a respetiva morada seja ocultada ao agressor nas notificações

judiciais que o tenham por destinatário.

Sr.as e Srs. Deputados, através desta pequena alteração dão-se passos, de facto, na proteção das vítimas

deste crime hediondo.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Tem agora a palavra, para uma intervenção, pelo Grupo Parlamentar de Os Verdes, a

Sr.ª Deputada Mariana Silva.

A Sr.ª Mariana Silva (PEV): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: A violência

doméstica é matéria que continua na agenda política e que, apesar das medidas tomadas, continua a vitimar

muitas mulheres.

Grave violação de direitos humanos e grave problema de saúde pública, a violência doméstica é uma

barbaridade que a sociedade tem de atacar de forma firme e determinada, rejeitando a velha ideia de que «entre

marido e mulher não se mete a colher».

Impõe-se, pois, que a designada «territorialização» da resposta seja efetiva e cada vez mais forte, de modo

a abranger todo o território nacional e a corresponder a objetivos de prevenção deste crime e dos dramas que

dele decorrem.

Não temos dúvidas de que o trabalho em rede entre entidades com responsabilidade na proteção social,

agentes de segurança, autoridades judiciais e organizações não governamentais, com linhas telefónicas de

apoio e redes de casas-abrigo para as vítimas, é fundamental para dar respostas mais eficazes.

Outro aspeto que Os Verdes consideram que deve ser concretizado é a criação de condições para que a

vítima de violência doméstica, que tem de sair da sua casa, possa ter um apoio público de modo a garantir a

sua inclusão e, sobretudo, a sua autonomia.

Nem todas as mulheres vivem este drama de igual forma, e muitas mulheres, particularmente as de mais

baixos recursos, acabam por se sujeitar de uma forma mais prolongada a situações de violência, por estarem

economicamente dependentes do agressor, por não terem como pagar uma casa, por não verem forma de se

sustentarem sozinhas. A fragilização emocional é muito significativa nestes casos e a determinação para tomar

uma decisão de pedido de proteção e de procura de ajuda não ocorre de forma célere.

A questão da violência doméstica tornou-se um fator de preocupação acrescida também em tempo de

pandemia da COVID-19. Com efeito, a solicitação e recomendação, depois transformada em determinação, para

que as pessoas ficassem confinadas em casa de modo a garantir um distanciamento social que fosse mais

eficaz na prevenção e contenção da propagação do vírus levou a que muitas vítimas de violência doméstica

tivessem de ficar todo o dia, e todos os dias, com aqueles que são os seus agressores.

As medidas encontradas para solucionar um problema não podem agravar outros problemas e, como

sabemos, a epidemia pode prolongar-se, com eventuais novos surtos, continuando a ser necessário medidas

restritivas de deslocação de pessoas.

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Os Verdes já apresentaram um projeto de lei neste Plenário que determinava a atribuição de um subsídio

temporário de apoio a vítimas de violência que fossem obrigadas a abandonar as suas casas justamente por

motivo dessa violência, mas, infelizmente, foi rejeitado.

Porém, consideramos que, em tempo de pandemia, quando as dificuldades económicas de muitas famílias

se fazem sentir de uma forma ainda mais intensa, decorrente da crise económica que se está a abrir, estão

criadas ainda mais condições para situações de violência, e faz todo o sentido que exista um apoio financeiro a

estas vítimas que tenham mesmo de abandonar os seus lares. Assim sendo, a proposta que apresentamos hoje

defende que este apoio financeiro seja prestado, a título excecional e temporário, enquanto durar esta situação

de pandemia.

O Sr. Presidente: — Sr.as e Srs. Deputados, quero dizer-vos que, entretanto, foi resolvido o problema

informático a que há pouco fiz referência, pelo que o registo das presenças já é possível, com as consequências

que daí derivam.

Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Sandra Cunha, do Bloco de Esquerda.

A Sr.ª Sandra Cunha (BE): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A proposta de lei hoje apresentada

mostra-nos que o Governo reconhece o problema da articulação entre tribunais criminais e tribunais cíveis,

nomeadamente os tribunais de família e menores, problema esse que conduz tantas vezes a decisões

contraditórias e que leva a que sejam entregues crianças à tutela do agressor ou que sejam estabelecidos

regimes de visitas colocando em perigo as crianças e a vítima adulta. Esses processos partilham entre si um

pormenor-chave: a origem na violência doméstica.

O Bloco de Esquerda apresentou, na Legislatura passada, uma iniciativa que procurava resolver este

problema, inspirada no modelo espanhol. Essa iniciativa foi rejeitada, apenas com o argumento de que feria a

Constituição, mas esse teste de constitucionalidade não foi sequer feito. Preferiu-se uma competência mista

alojada no Penal.

Consideramos que a solução dos tribunais de competência mista resolveria muitos dos problemas

assinalados nos pareceres relativos à proposta de lei do Governo, nomeadamente aqueles que se referem ao

estabelecimento de uma hierarquia entre tribunais e que dá a um tribunal de família e menores o poder de validar

as decisões do tribunal criminal.

Continuamos a afirmar que os problemas de articulação entre processo criminal e processo cível constituem

fator de desproteção às vítimas de violência doméstica e estamos, por isso, abertos para trabalhar em soluções

que o permitam resolver.

Registamos, igualmente, o reconhecimento do Governo, expresso na exposição de motivos da proposta de

lei, de que as crianças são as «vítimas esquecidas» da violência doméstica. Ora, se são as vítimas esquecidas,

o Governo reconhece, afinal, que as disposições legais atuais permitem esse esquecimento.

O Conselho Superior do Ministério Público consagra quase metade das mais de quarenta páginas do seu

parecer à proposta de lei, com um apelo ao reconhecimento expresso das crianças enquanto vítimas do crime

de violência doméstica.

Lembramos, igualmente, o apelo das organizações da sociedade civil que trabalham no terreno com estas

matérias, do Instituto de Apoio à Criança, do UNICEF (Fundo das Nações Unidas para a Infância) ou as

recomendações do relatório do GREVIO a este respeito.

Insistimos: quantos processos de violência doméstica que envolvam crianças conhecem em que lhes tenha

sido atribuído o estatuto de vítima?

A doutrina maioritariamente seguida pela jurisprudência dos tribunais portugueses é, efetivamente, a de se

esquecer das crianças enquanto vítimas, coisa que, aliás, se depreende do Código Penal, que considera como

agravante do crime de violência doméstica o facto de este ser praticado na presença de menor. Isto conflitua

claramente com o entendimento da criança enquanto vítima autónoma, diferenciada, titular de direitos pessoais

próprios e merecedores de idêntica proteção.

Por acreditarmos que existe consenso na sociedade, e até neste Parlamento, sobre as consequências

devastadoras que a violência tem no bem-estar e desenvolvimento das crianças, trazemos novamente a esta

Casa uma iniciativa que propõe a criação de um novo tipo legal de crime: a exposição do menor à violência

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doméstica. E fazemo-lo com humildade e com toda a abertura a novas ideias e propostas para que não mais

haja «vítimas esquecidas» da violência doméstica.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado João Cotrim de Figueiredo, da

Iniciativa Liberal.

O Sr. João Cotrim de Figueiredo (IL): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra, Srs. Secretários de Estado, Sr.as e

Srs. Deputados: A violência doméstica é, de facto, um crime que deixa marcas, umas visíveis, outras invisíveis.

São marcas com que as vítimas, as diretas e as indiretas também, terão de lidar por toda a vida, e são um drama

particularmente grave quando essas vítimas são crianças.

A proposta que o Governo aqui hoje traz tem alguns problemas que cremos serem sanáveis em sede de

especialidade. Um exemplo de algo de que discordamos é a possibilidade de o tribunal poder desencadear, no

processo penal, a proteção de tutela de responsabilidade sem que seja dada legitimidade à própria vítima para

o fazer. Mas, no global, esta proposta de lei tem o mérito de reconhecer as crianças como as vítimas esquecidas

da violência doméstica, quer quando são vítimas diretas, quer quando são expostas à violência contra terceiros.

É exatamente por isso que trazemos hoje uma proposta que, verdadeiramente, reconhece essas vítimas

esquecidas, autonomizando-as enquanto vítimas deste crime.

Ao consagrar expressamente o crime de exposição de menor a violência doméstica, reconhecemos que a

sua saúde, o seu bem-estar e o seu desenvolvimento são bens jurídicos merecedores de tutela penal.

Devemos reconhecer que os danos para a saúde mental das crianças que são expostas a violência

doméstica são equiparáveis aos danos decorrentes da prática dos atos de violência direta sobre elas.

Devemos reconhecer que as crianças têm direito a crescer sentindo-se seguras, especialmente em sua

própria casa.

Devemos reconhecer que um pai ou uma mãe que agride o parceiro não é um bom pai ou uma boa mãe para

os seus filhos. Devemos reconhecer que é nosso dever, enquanto comunidade, proteger estas crianças e

salvaguardar o seu crescimento harmonioso e saudável. Devemos reconhecer isto tudo, passando a reconhecer

as crianças como vítimas autónomas do crime que é a exposição de menor à violência doméstica e, por isso,

instamos esta Câmara a votar favoravelmente a nossa proposta de lei.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para uma intervenção, pelo Grupo Parlamentar do PAN, a Sr.ª Deputada

Inês de Sousa Real.

A Sr.ª Inês de Sousa Real (PAN): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: A

violência doméstica constitui uma das formas mais gravosas de discriminação e de violência, em particular

contra as mulheres, continuando os números a demonstrar a necessidade de implementação de políticas

públicas transversais que ponham fim a este flagelo. De acordo com dados recentes da APAV (Associação

Portuguesa de Apoio à Vítima), em 2019, houve 65 casos de violência doméstica por dia, número bastante

superior ao registado no ano anterior.

Assim, saudamos o Governo por, finalmente, acolher estas preocupações, que há muito têm vindo a ser

apontadas pela sociedade civil, pelas organizações não-governamentais e também pelas forças políticas, onde

se inclui o PAN.

As primeiras 72 horas após a denúncia são, de facto, fundamentais, pois correspondem a um período

especialmente crítico dado que esta pode potenciar situações de violência, pelo que apoiamos o reforço das

providências que devem ser aplicadas aos agressores para proteção da vítima em situação de perigo, incluindo

crianças e jovens. Para além disso, valorizamos o reforço do sistema de avaliação de risco da vítima, uma vez

que neste tipo de processos a recolha e produção de prova apresentam dificuldades acrescidas, precisamente

porque, por norma, o crime é cometido dentro de casas onde não há testemunhas.

A necessidade de articulação entre os tribunais é também de saudar, assim como destacamos a importância

do reforço das medidas de proteção destinadas às crianças e jovens vítimas de violência doméstica, com a

atribuição do estatuto de vítima às crianças e a garantia de comunicação entre o tribunal de família e menores

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onde corre o processo-crime e o tribunal onde corre o processo cível, neste caso, indo ao encontro das

recomendações do Grupo de Peritos para o Combate à Violência contra as Mulheres e a Violência Doméstica,

do Conselho da Europa, tendo o PAN, inclusive, já apresentado iniciativas com este objetivo nesta Assembleia.

Contudo, consideramos que o Governo deveria ter ido mais longe na proteção das vítimas de violência

doméstica, em particular das crianças, pelo que apresentámos já uma proposta de alteração a esta proposta de

lei, para contribuir para a sua melhoria na fase de discussão em especialidade, que passa pela obrigatoriedade

da tomada de declarações para memória futura, que atualmente é facultativa, desde logo quando esta seja

requerida pela vítima. Recordamos que é essencial que o fim do depoimento possa ser, desde logo, tomado em

conta no julgamento, salvaguardando que não há uma revitimização. Para o PAN, o instituto da tomada de

declarações para memória futura é um mecanismo essencial para evitar a repetição da audição da vítima e para

protegê-la do perigo da revitimização, pelo que, sendo a seu pedido, nada vemos que possa obstar à sua

inquirição nem que esta não possa ser obrigatória, até porque, por vezes, como bem sabemos, estes processos

são de investigação demorada e o seu testemunho é essencial para a prova dos factos.

As crianças também enfrentam muitos obstáculos no sistema judiciário, sendo por vezes sujeitas a

interrogatórios repetitivos, processos morosos e a um ambiente muito intimidatório, pelo que o passo que tem

de ser dado e que defendemos é o de garantir que a audição das crianças vítimas de violência doméstica ou de

qualquer outro tipo de abuso seja feita com recurso ao apoio de equipas técnicas especializadas, incluindo

psicólogos, com conhecimentos nas matérias de desenvolvimento infantil, saúde mental, técnicas facilitadoras

da audição e estratégias empáticas e de gestão do stress, devendo estas audições ocorrer em espaços

adaptados, criando um ambiente securizante para a criança e ainda, sempre que se encontrem reunidas as

condições para o efeito, devendo ser privilegiada a tomada de declarações do menor para memória futura.

O Sr. Presidente: — Peço-lhe para concluir, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Inês de Sousa Real (PAN): — Concluo já, Sr. Presidente.

Estamos hoje a dar um passo para proteger as vítimas, e acreditamos que, em sede de especialidade, em

conjunto, vamos poder melhorar esta proposta para conseguirmos dar resposta a algo fundamental na nossa

democracia — salvaguardar as vítimas e não deixar ninguém para trás.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para uma intervenção, pelo Grupo Parlamentar do PS, a Sr.ª Deputada

Constança Urbano de Sousa.

A Sr.ª Constança Urbano de Sousa (PS): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.ª Ministra, Sr.as

e Srs. Deputados: Todos, nesta Casa, dizemos que a violência doméstica é um flagelo social, e é, de facto, um

flagelo social e também um crime grave de violação de direitos fundamentais, no limite é uma violação do direito

à vida. Também é um facto que atinge as mulheres de forma muito desproporcional, constituindo assim uma

forma absolutamente inaceitável de discriminação de género.

A luta contra a violência doméstica é um desígnio que deve ser de todos, de toda a sociedade, de toda uma

sociedade que se queira decente. Mas cumpre ao Estado um especial dever de proteger as vítimas deste crime,

dando-lhes uma resposta célere, e é precisamente esse o objetivo essencial desta proposta de lei.

Todos reconhecemos que, muitas vezes, a segmentação de competências por diferentes tribunais prejudica

a tomada de medidas urgentes que são essenciais para dar às vítimas, nomeadamente às mulheres e às

crianças, uma proteção rápida e efetiva e evitar a sua dupla vitimização. Também todos reconhecemos que, na

intervenção em situação de violência doméstica, o fator tempo é absolutamente decisivo, e muitas vezes esta

proteção não se compadece com o tempo que é requerido a um tribunal de família e menores — que não é o

primeiro a contactar com a situação — e que, muitas vezes, leva a tomar medidas absolutamente vitais para

proteger as vítimas. É precisamente esta a abordagem que esta proposta de lei permite, dando ao juiz criminal

— que é, repito, o primeiro a tomar contacto com uma situação de violência doméstica e que também já está na

posse de todos os elementos que lhe permitem decidir medidas estritamente criminais — a possibilidade de

tomar, imediatamente, medidas cautelares de proteção das vítimas, como as que são relacionadas com o

contacto que o agressor pode, ou não, ter com a vítima, ou mesmo o destino da casa de morada de família.

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Estas medidas continuam e vão continuar a ser da competência dos tribunais de família e menores, que, nos

termos da lei das medidas cautelares, já podem decidir sem audição da outra parte. Portanto, isto não é

nenhuma novidade desta proposta de lei.

No fundo, esta proposta visa concretizar uma preocupação de todos com a proteção das vítimas de violência

doméstica. Mais: a questão da falta de especialização do juiz criminal para decidir este tipo de medidas de

proteção da vítima não tem, em minha opinião, qualquer tipo de fundamento porque se trata, pura e

simplesmente, de tomar medidas que são imediatas, meramente temporárias, que podem e devem ser revistas

pelo tribunal competente, que é o tribunal de família e menores.

O Sr. Presidente: — Peço-lhe para concluir, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Constança Urbano de Sousa (PS): — Concluo já, Sr. Presidente.

Penso que esta é uma medida absolutamente essencial para lutarmos de forma muito eficaz contra a

violência doméstica e, sobretudo, para passarmos aos atos de proteção efetiva das vítimas de violência

doméstica.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada não inscrita Joacine Katar Moreira.

A Sr.ª Joacine Katar Moreira (N insc.): — Sr. Presidente, necessitamos de uma visão feminista na luta

contra a violência doméstica, uma visão que tenha hipótese de desautorizar os ideais de masculinidade e de

feminilidade que, reiteradamente, subalternizam as mulheres, os direitos das mulheres e os direitos das

crianças, enquanto simultaneamente vão alimentando as masculinidades hegemónicas e as ideias das

masculinidades violentas. Este é o nosso objetivo número um. Isto é fundamental para qualquer medida

legislativa que tenha a intenção de combater a violência doméstica, mas é igualmente necessário reforçar que

é também preciso haver uma ótica feminista interseccional que não se esqueça da violência doméstica invisível

no seio das comunidades minoritárias, no seio dos imigrantes, e é necessário que usemos o nível altíssimo de

violência doméstica e de feminicídio para avaliarmos se somos ou não somos uma sociedade desenvolvida.

O Sr. Presidente: — Tem agora a palavra, para uma intervenção, pelo Grupo Parlamentar do PSD, a Sr.ª

Deputada Mónica Quintela.

A Sr.ª Mónica Quintela (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.ª Ministra, Sr.as e Srs.

Deputados: O Governo pretende alterar a Lei n.º 112/2009, que é um diploma fundamental e estrutural no

combate à violência doméstica. A violência doméstica é um crime hediondo, que merece o mais vivo repúdio,

mas os fins, Srs. Deputados, não podem justificar os meios.

A proposta é bem-intencionada, reconhecemos isso, mas não podemos concordar com ela porque desvirtua

completamente o sistema jurídico, com grave prejuízo para as vítimas. Se é evidente que o combate à violência

doméstica não pode esmorecer, também é evidente que tem de ser eficaz e certeiro, tudo o que esta proposta

não permite.

A proposta foi buscar inspiração ao sistema espanhol e confundiu os conceitos e as ideias todas. Esquece-

se da organização dos tribunais e dos regimes processuais das diferentes jurisdições e, sobretudo, faz tábua

rasa dos princípios que fundamentam essas diferenças. A proposta põe o juiz de instrução criminal a decidir

sobre a atribuição da casa de morada de família, sobre a regulação das responsabilidades parentais, sobre a

guarda dos animais, a fazer intervir o fundo de garantia de alimentos a menores como se fosse um larguíssimo

antibiótico de largo espectro da violência doméstica, qual amoxicilina, que não pode resolver tudo. Fala em

repartição de tarefas entre os tribunais, esquecendo-se da especialização de cada um deles e da hierarquia

para se indicarem as decisões proferidas, tudo numa mais do que duvidosa constitucionalidade e com o risco

de decisões contraditórias e mal fundamentadas, o que não se pode tolerar, por mais provisórias que as decisões

sejam. Recordo aqui que, na justiça, o provisório eterniza-se.

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A proposta arrasa com o princípio do contraditório, o que é inaceitável num Estado de direito democrático.

Não tem em conta o regime de recursos nem os pressupostos da intervenção do fundo de garantia de alimentos

a menores. Nada! Faz tábua rasa. Passa uma esponja em tudo e aterra com estrondo no nosso ordenamento

jurídico. As alterações propostas vão ter um forte impacto na atividade diária dos tribunais, multiplicando-se

diligências e decisões desencontradas, com grave prejuízo para as vítimas.

Sr.as e Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Para combater a violência doméstica, o que é preciso é

proteger as vítimas, o que é preciso é dotar os tribunais de recursos humanos, materiais e técnicos necessários,

que tanta falta fazem e que o Governo tem esquecido. É preciso tornar a Lei n.º 112/2009 operacional,

explorando as suas virtualidades e pondo-a plenamente em vigor, conjugando-a com o regime geral do Código

de Processo Penal. Recordo aqui que as recomendações do GREVIO dizem que «mais do que alterar a

legislação, é fundamental reforçar as condições para a sua efetividade», pois a multiplicidade de legislação só

gera confusão no ordenamento jurídico. No entanto, o GREVIO reconhece que a Lei n.º 112/2009 é um

instrumento eficaz no combate à violência doméstica, sem prejuízo de pequenos afinamentos de pormenor de

que pode precisar. Melhorar podemos sempre.

O Sr. Presidente: — Peço-lhe para concluir, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Mónica Quintela (PSD): — Concluo já. Sr. Presidente.

Pugnaremos sempre por um combate sem tréguas à violência doméstica, mas não poderemos aprovar uma

lei que é um atropelo aos direitos, às garantias e à segurança de todos os intervenientes.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para uma intervenção, pelo Grupo Parlamentar do CDS-PP, o Sr.

Deputado Telmo Correia.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra, Srs. Secretários de Estado, Sr.as e Srs.

Deputados: É evidente que nesta Câmara há um consenso, que penso ser unânime, em relação ao problema

da violência doméstica, em relação à necessidade de o combater e em relação à necessidade de atuarmos de

uma forma firme e decidida para combatermos um flagelo global, que é um flagelo muito sério no nosso País.

Isso é evidente e não está em causa.

A primeira coisa que reconheceria é que esta proposta que aqui discutimos hoje tem, em nossa opinião, uma

reta intenção. Não é isso que está em causa. A proposta procura responder, essencialmente, a uma questão de

urgência, de atuação urgente em relação a um problema que carece, de facto, muitas vezes, desta urgência,

como carece de outras coisas. Enfim, tendo acompanhado um pouco este problema no terreno, no meu distrito,

recordo-me até de constatar que, muitas vezes, é preciso que alguém chegue perto das vítimas e lhes dê um

amparo suficiente numa primeira fase, ou também pode ser necessário que, por exemplo, quando ouvidas em

sede da Polícia Judiciária, tenham aí a privacidade suficiente para poderem expor as suas queixas, colocar o

seu problema e, por fim, é preciso que essa articulação entre as entidades de investigação e, depois, o próprio

tribunal seja feita com meios e de uma forma eficaz.

No entanto, esta proposta suscita certas preocupações, algumas das quais já foram aqui referidas. Uma

delas é esta: a pretexto dessa urgência, estabelece-se uma série de competências, em matéria daquilo que

normalmente seria decidido por um tribunal de família, para os tribunais criminais. E aí a dúvida que colocamos

é se não estaremos, de alguma forma, a desperdiçar a própria experiência e a própria consistência que os

tribunais de família têm nesta mesma matéria e se não poderemos até, em alguns casos, estar a sobrepor

competências, podendo levar inclusive a decisões eventualmente contraditórias. Ou seja, tem de estar garantido

que aquilo que é provisório seja efetivamente provisório e que a decisão definitiva compita aos tribunais de

família.

Por outro lado, e compreendendo eu que, nestes casos, não faça nenhum sentido qualquer tipo de audiência

conciliatória — estamos, normalmente, perante um caso de ameaça e um caso de violência —, ainda assim,

não podemos, em nossa opinião, prescindir completamente da ideia do contraditório, até porque tem de haver

alguma sustentação naquilo que estamos a observar. Ou seja, fazer conciliação não faz sentido, mas é preciso

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garantir que o contraditório, peça basilar de todo o nosso ordenamento jurídico, esteja, de alguma forma,

assegurado.

Era basicamente isto que queríamos dizer.

O Sr. Ministro da Administração Interna dizia-nos ontem, aqui, na Assembleia, em sede de comissão, que

tem havido menos queixas de violência doméstica. A dúvida que todos teremos é se tem havido, efetivamente,

menos queixas ou se há menos possibilidade de haver queixas até em função do confinamento. Eventualmente,

à medida que formos «destapando esta panela», poderão aparecer muitos mais casos e situações muito mais

graves.

Nós não confrontamos diretamente esta proposta, mas pensamos que é preciso ponderar, em sede de

especialidade, alguns dos aspetos que aqui suscitámos.

O Sr. Presidente: — Queira terminar, Sr. Deputado.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Termino já, Sr. Presidente.

Não estamos fechados a propostas. Por exemplo, a proposta do PCP, de garantir o anonimato em qualquer

circunstância, é uma boa proposta. E as outras propostas que autonomizam a questão das crianças podem e

devem também, em nossa opinião, ser ponderadas em sede de especialidade.

O Sr. Presidente: — Para concluir este debate, tem a palavra, em nome do Governo, a Sr.ª Ministra de

Estado e da Presidência.

A Sr.ª Ministra de Estado e da Presidência: — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Vou procurar

responder às diferentes questões com rapidez, em particular destacando a importância de que o trabalho

parlamentar permita melhorar esta proposta e assumindo a disponibilidade do Governo para também participar

nesse trabalho nos termos aqui referidos, da garantia do anonimato, do especial reconhecimento do tema das

crianças.

Em segundo lugar, quero dizer que as questões do apoio social, já aqui referidas, foram também tratadas em

sede de Orçamento do Estado, garantindo que o apoio judiciário passa a presumir, quando à vítima lhe é

atribuído o estatuto de vítima, que a insuficiência económica está assumida — para ser mais rápido — e

prevendo também uma medida de apoio à reestruturação familiar que deve ser desenvolvida.

Em terceiro lugar, a questão que mais nos preocupa aqui é proteger as vítimas. Quanto às decisões, elas

são provisórias e não são eternizáveis, porque caducam ao fim dos três meses, a não ser que sejam

reconfirmadas ou tratadas pelo tribunal de família.

Temos de reconhecer que nos foram apontadas falhas nesta comunicação e que devemos ter uma forma de

lhes responder com a urgência devida. Os juízes, ao longo da sua vida, participam em diferentes especialidades

e não me parece que, para tomarem a decisão aqui em causa, careçam de qualquer capacidade ou

competência. De qualquer maneira, a resposta que aqui desenhámos para a violência doméstica, como referi

no início, cobre não apenas a dimensão social e, por exemplo, a dos guias de resposta das polícias, mas também

um pacote alargado de formação a todos os intervenientes porque esta articulação é fundamental, e temos de

trabalhar essa formação com todos os agentes, incluindo com o CEJ (Centro de Estudos Judiciários).

Tem, de facto, havido um registo menor de queixas nas últimas semanas, mas sabemos que nos outros

países não tem sido assim. E sabemos, por experiência própria, que, muitas vezes, é no fim do confinamento

que aquilo que aconteceu durante o confinamento vem ao de cima.

Portanto, acho que há urgência em tomar uma decisão sobre esta matéria. Agora é o tempo de o Parlamento

poder melhorar a proposta que o Governo aqui apresenta, com a consciência de que precisamos mesmo de

tomar as medidas que já há mais de um ano estamos a trabalhar e a discutir de forma alargada com a sociedade

portuguesa.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Concluída a discussão conjunta, na generalidade, da Proposta de Lei n.º 28/XIV/1.ª

(GOV) e dos Projetos de Lei n.os 352/XIV/1.ª (PCP), 358/XIV/1.ª (PEV), 361/XIV/1.ª (BE) e 364/XIV/1.ª (IL),

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passamos à apreciação, na generalidade, do Projeto de Lei n.º 194/XIV/1.ª (PS) — Altera o Estatuto da Ordem

dos Advogados, revendo o estatuto remuneratório do revisor oficial de contas que integra o respetivo Conselho

Fiscal.

Para abrir o debate e apresentar o projeto de lei, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Delgado Alves, do

Partido Socialista.

O Sr. Pedro Delgado Alves (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A matéria que nos convoca para

este debate, não sendo uma matéria estruturante do funcionamento do Estado de direito democrático — e

dizemo-lo com todo o respeito pela mesma —, é, de facto, muito relevante para a Ordem dos Advogados e

fundamental para que a mesma possa concluir processos fulcrais para a certificação da sua atividade e para o

cumprimento das obrigações legais a que está adstrita em matéria de contabilidade.

Efetivamente, determina a lei que o Conselho Fiscal da Ordem dos Advogados integre obrigatoriamente um

revisor oficial de contas (ROC) na qualidade de um dos seus vogais, mas o mesmo Estatuto também determina

a obrigatoriedade do exercício de funções, de forma gratuita, por parte dos membros da Ordem dos Advogados,

apenas com duas exceções: o cargo de Bastonário, quando exerça as funções em dedicação exclusiva, e o

cargo de Provedor dos Clientes.

Consequentemente, a Ordem tem-se visto confrontada com a dificuldade de carecer da certificação legal das

suas contas, mas não poder ter o seu revisor oficial de contas a prestar, de forma remunerada, como é

obrigatório nos termos do seu próprio estatuto e qualidade enquanto revisor oficial de contas, as funções nesses

termos, algo que, aliás, já foi objeto de uma chamada de atenção por parte do Tribunal de Contas com a sugestão

à Ordem que promovesse a alteração do seu Estatuto.

Sendo o Estatuto da Ordem dos Advogados aprovado em ato legislativo da competência do Parlamento, é

obviamente indispensável uma proposta de lei ou um projeto de lei, como este o é, para proceder à alteração,

razão que, neste contexto de relativa urgência que a Ordem tem nesta matéria, determinou o seu agendamento.

Ouvidas as duas ordens, a Ordem dos Advogados deu já nota de que acompanha as sugestões formuladas,

recordando mesmo a sugestão que recebeu por parte do Tribunal de Contas, e do lado dos revisores oficiais de

contas também nos chegaram contributos que estão fundados na natureza da função e na clarificação

necessária da forma como a prestação de contas deve ter lugar, sublinhando a necessidade de introduzir

algumas alterações para as quais obviamente temos toda a disponibilidade, nomeadamente a de que a

certificação não é feita pelo Conselho Fiscal mas pelo próprio revisor oficial de contas, por um lado, e, por outro,

alguma precisão terminológica quanto ao que está em causa no ato a praticar nesse contexto.

Assim sendo, perante algo que é de alguma simplicidade e que não mobiliza muito tempo parlamentar,

devemos, no entanto, mobilizar-nos o tempo suficiente para superar um problema e permitir à Ordem resolver a

pendência que tem na certificação das suas contas e poder encarar a atividade normal do seu funcionamento

com base nestes critérios e nesta lei revista nestes termos.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, pelo Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda, o Sr. Deputado José

Manuel Pureza.

O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Este projeto de lei cumpre, no

essencial, uma exigência do Tribunal de Contas, que é justamente a de permitir a certificação legal das contas

da Ordem dos Advogados, para o que introduz uma nova exceção à regra da não remuneração do exercício de

funções nos órgãos da Ordem. Nada a opor deste ponto de vista.

Quero, no entanto, aproveitar esta intervenção para sublinhar a estranheza, nossa e de tanta gente, pela

dessintonia entre o que a Assembleia da República hoje discute aqui sobre advogados e aquilo que a grande

maioria dos advogados estão a experimentar, dia após dia, como urgências absolutas para as suas vidas.

As contas dessa grande maioria de advogados estão «a zeros», ou estão mesmo «em negativos», porque

se mantém a obrigação de descontarem mais de 250 € mensais para a Caixa de Previdência dos Advogados e

dos Solicitadores, ao mesmo tempo, que, por força do encerramento na prática da maioria dos tribunais, não

têm trabalho, não têm rendimento. E também não beneficiam de quaisquer medidas de apoio excecionais,

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idênticas àquelas que foram previstas para os demais trabalhadores independentes. É claro que é muito

importante permitir que as contas da Ordem dos Advogados sejam certificadas. Mas mais importante — muito

mais importante! — é permitir que a grande maioria dos advogados tenha contas para poderem ser certificadas.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Tem, agora, a palavra, para uma intervenção, pelo Grupo Parlamentar do PSD, o Sr.

Deputado Artur Soveral Andrade.

O Sr. Artur Soveral Andrade (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O Estatuto da Ordem dos

Advogados consagra como regra a gratuitidade do exercício das funções por parte dos seus órgãos próprios. E

aqui cria um problema relativamente ao Conselho Fiscal, conforme já referido, uma vez que dele faz parte o

revisor oficial de contas, a quem compete certificar as contas da Ordem, mas que, nos termos da legislação que

lhe é aplicável, tem necessariamente de ser remunerado.

Ora, esta regra da gratuitidade do exercício das funções consagrada no Estatuto da Ordem dos Advogados,

apenas com exceções para o Bastonário, em determinadas circunstâncias, e para o Provedor dos Clientes, torna

impeditiva, obstaculiza, impossibilita a certificação das contas da Ordem dos Advogados.

Nesse sentido, o que aqui é proposto vem resolver este problema, ao aditar ao artigo 15.º do Estatuto da

Ordem dos Advogados um número que prevê a remuneração da certificação de contas da Ordem, sanando, por

essa via, todas estas impossibilidades. Assim, o revisor oficial de contas passará a poder ser remunerado e

passarão a poder ser certificadas as contas da Ordem.

Do mesmo passo, resolve-se, como também já foi aqui referido, o problema dos reparos por parte do Tribunal

de Contas, o que também não é despiciendo.

Conforme também já foi referido, e realço, foram ouvidas e pronunciaram-se as duas Ordens em causa — a

Ordem dos Advogados e a Ordem dos Revisores Oficiais de Contas. A Ordem dos Advogados não propôs

qualquer alteração, tendo-se limitado a aderir em toda a linha ao proposto. Já a Ordem dos Revisores Oficiais

de Contas propôs algumas sugestões. No entanto, ambas se congratularam com este projeto de lei.

Assim sendo, para o PSD, esta proposta é inteiramente justificada, não havendo argumentos que militem

contra a sua aprovação. É isto, em síntese, que o PSD tem a dizer sobre o assunto.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe, do Grupo

Parlamentar do PCP.

O Sr. António Filipe (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Este projeto de lei é de tal modo pacífico que

poderemos dizer que não só podemos fazer nossas as palavras dos oradores antecedentes como poderíamos

fazer nossas, certamente, as palavras dos oradores seguintes.

De facto, há uma anomalia legal, que é conhecida e que é esta: a Ordem dos Advogados tem de ter um

revisor oficial de contas, mas depois não pode remunerá-lo, porque os órgãos estatutários da Ordem não são

remunerados. Simplesmente, um revisor oficial de contas não é um advogado, é um outro profissional.

Portanto, há uma anomalia que importa retificar, é esse o objetivo desta iniciativa legislativa e, pela nossa

parte, nada temos a acrescentar àquilo que é proposto, a não ser que votaremos favoravelmente este projeto

de lei.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Pelo Grupo Parlamentar do CDS-PP, tem a palavra, para uma intervenção, o Sr.

Deputado Telmo Correia.

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O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Tem razão, Sr. Deputado António Filipe,

penso que também não desacompanharia o orador subsequente, que, neste caso, sou eu, porque, de facto, a

proposta não tem muito que se lhe diga, o que não lhe tira mérito e pode até ser uma virtude.

De facto, diria que, como aqui foi explicado, a tradição na Ordem dos Advogados é a de que a maior parte

dos cargos não sejam remunerados. Penso que durante muitos anos foi assim, até para todos os cargos, e que

só a partir de certa altura, com um determinado bastonário em concreto, é que os cargos de bastonário e de

provedor do cliente passaram a ser remunerados, porque até aí nem o de bastonário era remunerado. Mas,

efetivamente, o revisor oficial de contas não é um advogado e, portanto, quem trabalha tem direito a salário. Isto

resolve o problema da Ordem e resolve, também, o problema do Tribunal de Contas, no que se refere à

verificação, pelo que nada temos a dizer senão que concordamos.

A outra hipótese era falarmos sobre outras coisas — o Sr. Deputado José Manuel Pureza já o fez —, mas

vou resistir a fazê-lo e, por isso, não vou lembrar aqui que o CDS já fez uma proposta sobre essa matéria que

foi chumbada. Podia lembrá-lo, mas não o vou fazer e, portanto, não querendo falar de outras coisas, ficaria só

pela proposta que está em discussão, dando, obviamente, a nossa concordância à sua aprovação.

Risos do Deputado do BE José Manuel Pureza.

O Sr. Presidente: — É a vez do PAN, pelo que tem a palavra, para uma intervenção, a Sr.ª Deputada Inês

de Sousa Real.

A Sr.ª Inês de Sousa Real (PAN): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Contrariamente ao Sr. Deputado Telmo

Correia, não vou resistir a fazê-lo, porque, de facto, não obstante o consenso que existe em torno da matéria

que estamos a debater, uma vez que há uma incoerência, do ponto de vista legislativo e do Estatuto da Ordem

dos Advogados, relativamente à remuneração do ROC que tem de ser colmatada, indo até ao encontro do

relatório emanado pelo Tribunal de Contas, que também veio recomendar nesse sentido, não nos podemos

esquecer que há um debate a que não podemos furtar-nos, que tem a ver com o que foi referido pelo Sr.

Deputado José Manuel Pureza, que é o da lacuna em relação aos advogados, sobre a qual, enquanto

Assembleia da República, temos de refletir.

Não faz sentido que se tenha procurado dar respostas sociais a vários setores da nossa sociedade e não se

deem também aos advogados e solicitadores, que têm uma caixa de previdência própria. No caso dos

solicitadores, essa situação foi ultrapassada; no caso dos advogados, a Caixa de Previdência insiste em não a

resolver e também em não negociar com o Governo, pelo que nos parece fundamental que esta Assembleia

não se furte a este debate.

É que se, por um lado, é consensual a questão do ROC, por outro, ter contas para pagar e ter contas para,

de alguma forma, serem organizadas e avaliadas pela própria Ordem dos Advogados parece-nos, sobremaneira,

relevante e não podemos fechar os olhos a esta questão.

A alternativa é não estudar e não revisitar esta matéria, e lamentamos que as propostas que foram

apresentadas tenham sido, todas elas, rejeitadas e não tenha havido, sequer, um debate na especialidade sobre

este assunto, mas não nos podemos esquecer de que o contexto em que a Caixa de Previdência foi criada é

muito diferente daquele que hoje temos.

A Caixa de Previdência é regulada também pela tutela, pelo ministério respetivo, e não nos faz sentido que

se deixe uma classe, toda ela, desprovida de rendimentos, neste momento, quando os prazos e processos

judiciais estão suspensos e, a seguir ao levantamento da suspensão e das medidas de contenção, vamos ter

férias judiciais. Trata-se de uma situação que se vai prolongar no tempo e, por isso, não podemos fechar os

olhos a esta realidade.

É da mais elementar justiça que se faça esse debate na Assembleia da República, mas não é isso que nos

traz aqui hoje, o que nos traz aqui hoje é uma situação bastante pacífica, do ponto de vista organizacional da

Ordem e da validação das suas contas, mas ignorar tudo o resto é, de facto, ignorarmos aquele que é, hoje, um

problema social da classe. Portanto, não faz sentido não deixar aqui uma palavra de preocupação e de reflexão,

esperando que esta Casa, em breve, esteja disponível para discutir e ouvir a classe. É fundamental percebermos

o que querem fazer, nomeadamente à Caixa de Previdência, mas é um debate ao qual não nos vamos poder

furtar.

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O Sr. Presidente: — Tem, agora, a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado André Ventura, do Chega.

O Sr. André Ventura (CH): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Estamos a tratar de um assunto que é, de

facto, consensual — as contas têm de estar certificadas e a tarefa tem de ser remunerada —, mas não deixa de

ser curioso, no entanto, que o Partido Socialista invoque o Tribunal de Contas como seu motivo de inspiração e

tratamento desta norma quando ainda há uns meses tinha aqui Deputados que diziam que os juízes eram

mentecaptos, os mesmos do Tribunal de Contas,…

O Sr. João Paulo Correia (PS): — Quem é que disse isso?!

O Sr. André Ventura (CH): — … ou, ainda, tentava tirar competências ao Tribunal de Contas. Foi o que

aconteceu durante o último mês. Dizer agora que é o Tribunal de Contas que obriga a isto é, pelo menos, alguma

ironia.

Mas, já que falamos disto, podia o Governo aproveitar para explicar como é que vai resolver a questão dos

apoios aos advogados, conforme disse o Sr. Deputado José Manuel Pureza. É que, de facto, o que temos hoje

são apoios reservados a quem contribui para a segurança social e todos sabemos que os advogados não

contribuem para a segurança social mas para a Caixa de Previdência, que, como também todos sabemos, não

tem, nem de perto nem de longe, apoios suficientes para centenas de milhares de pessoas que precisam do

apoio do Estado. Também digo que, se for para lhes dar o mesmo que deram aos sócios-gerentes das pequenas

sociedades, não vale a pena. Mas é uma situação que merece ser apreciada, porque são centenas de milhares

de pessoas que pagam os seus impostos todos os meses, a quem o Governo virou as costas, e que olham para

esta Casa com o sentido de que agora também merecem ter apoio. Portanto, se vamos certificar contas, mais

valia certificarmos também as suas contas.

O Sr. Presidente: — Peço-lhe o favor de concluir, Sr. Deputado.

O Sr. André Ventura (CH): — Vou concluir, Sr. Presidente.

Não deixa de ser curioso que todos os dias falemos da justiça, da imparcialidade e da necessidade de ter

uma justiça forte e, quando chega a altura, esqueçamos aqueles que mais contribuem para uma justiça forte,

que são também os advogados.

O Sr. Presidente: — Para concluir o debate, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Delgado Alves.

O Sr. Pedro Delgado Alves (PS): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não querendo falar de outros assuntos,

uma vez que o tema que está a ser discutido é outro, não deixo também de dar alguma nota, uma vez que houve

algumas intervenções que o fizeram. De facto, a falar de outros assuntos, o Sr. Deputado André Ventura

conseguiu ir muito longe, às declarações sobre o Tribunal de Contas feitas por um Sr. Deputado que não vincula

o Partido Socialista — devo dizer que é, de facto, lamentável que se chame mentecapto ao Tribunal de Contas,

isto é inequívoco, seja de um Deputado desta bancada ou de outra, e só temos a lamentar que assim seja —,

mas, efetivamente, o tema não é esse. O tema é outro, o tema é muito claro, é uma incongruência na lei, e uma

incongruência na lei que se corrige.

Questão diferente e importante, que não é o debate de hoje, que ocorre porque estava agendado e é urgente

pois a Ordem precisa de certificar as contas, é o outro debate, que é efetivamente relevante. E esse outro

debate, aliás, teremos oportunidade de o retomar amanhã, dando, por exemplo, no fundo, uma credencial legal

para que as ordens, todas elas, mas em particular a Ordem dos Advogados e a Ordem dos Solicitadores, possam

determinar a suspensão do pagamento de algumas contribuições, validando algo que, no fundo, muitas delas já

fizeram.

E, Sr.ª Deputada Inês Real, ambas as Ordens fizeram o mesmo e a Caixa de Previdência é a mesma para

as duas, pelo que o problema existe em ambos os casos, e é um problema que é anterior. Ou seja, temos de

reconhecer que a crise exacerba um problema sobre a desatualização de um modelo de proteção social em que

nem a forma de contribuir, que não tem em conta a capacidade contributiva, nem os benefícios que estão

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associados a essas contribuições são os mesmos do regime geral da segurança social, e temos de fazer essa

reflexão. Mas, no momento vigente, efetivamente, há autonomia na gestão da Caixa, as medidas que foram

sendo adotadas tiveram isso em conta, a Caixa de Previdência, nalguns casos, adotou-as de forma suficiente,

noutros, infelizmente, não pôde acautelar todas as circunstâncias, pelo que mantemos essa preocupação.

Mas, de facto, esse não é o debate de hoje. Não deixam de ser relevantes as questões que foram frisadas,

mas a situação que analisamos hoje é relativamente simples e urgente e, também por isso, gerou o consenso

que pudemos observar.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, chegámos, assim, ao final do debate do Projeto de Lei n.º 194/XIV/1.ª

(PS).

Passamos à discussão conjunta, na generalidade, dos Projetos de Lei n.os 336/XIV/1.ª (PSD) — Garante

apoio social extraordinário aos gerentes das empresas, 339/XIV/1.ª (CDS-PP) — Reforça a proteção social aos

gerentes das empresas comerciais, 346/XIV/1.ª (IL) — Reforça o apoio social dos gerentes das empresas,

354/XIV/1.ª (PEV) — Garante o apoio extraordinário ao rendimento dos micro empresários e trabalhadores em

nome individual devido à redução da atividade económica pela epidemia de COVID-19, 357/XIV/1.ª (BE) —

Medidas de emergência para as micro e pequenas empresas, e 363/XIV/1.ª (PAN) — Reforça a proteção dos

sócios-gerentes das micro, pequenas e médias empresas (procede à oitava alteração ao Decreto-Lei n.º 10-

A/2020, de 13 de março, e à segunda alteração ao Decreto-Lei n.º 10-G/2020, de 26 de março).

Tem a palavra, para abrir o debate, o Sr. Deputado Cristóvão Norte, do Grupo Parlamentar do PSD.

O Sr. Cristóvão Norte (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, a razão de ser do projeto que

apresentamos é simples: o Governo teve mais do que uma ocasião para resolver a questão dos sócios-gerentes

mas optou por não o fazer. Optou por deixar essas pessoas sem proteção, optou por não salvaguardar os seus

rendimentos e foi por isso que o PSD, após insistentemente ter solicitado ao Governo que o fizesse, decidiu

apresentar este este projeto de lei, no dia 14 de abril, para reparar essa flagrante injustiça.

É de uma flagrante injustiça que se trata porque os sócios-gerentes descontam como os demais

trabalhadores para a segurança social e é também uma injustiça porque os sócios-gerentes, a maioria das

vezes, trabalham, no dia a dia, lado a lado com os seus funcionários, muitas vezes sem distinção.

Mas temos de saber daquilo de que estamos a falar e a realidade é que este é um universo de micro e

pequenas empresas, de restaurantes, de comércio local, de empresas de informática, de empresas de bairro

que servem as pessoas nas suas comunidades. Mais de 90% das empresas do País são micro e pequenas

empresas que, por decisão do Governo, tendo um, dois ou três trabalhadores a seu cargo, tiveram de encerrar,

em nome da saúde pública, e as suas vendas tiveram rombos que colocam em causa a sua subsistência e a

preservação dos postos de trabalho.

São estas pessoas, Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, que queremos que acreditem, que persistam, que

preservem o emprego, que não desistam, que continuem a pagar salários, que cumpram, em suma, as suas

obrigações. Não pode, por isso, ser a estas pessoas que negamos um direito que é delas, que foi pago por elas,

exatamente quando elas mais precisam.

Mas, infelizmente, é isso que o Governo está a fazer: deixou, numa primeira instância, todos os sócios-

gerentes de fora, entre as sucessivas revisões de medidas que foi fazendo; depois de o PSD e de outros partidos

terem dito que isso estava errado, decidiu rever a decisão mas só integrou nos apoios os sócios-gerentes sem

trabalhadores a seu cargo; hoje, tão convenientemente, perante a iminência da decisão desta Assembleia, já

veio dizer que se vai antecipar e que vai fazer o que não fez, e nem era sua intenção fazer, o que, do meu ponto

de vista, repito, do meu ponto de vista, pelo momento em que foi publicamente assumido, roça alguma

desconsideração institucional pelo Parlamento.

Aplausos do PSD.

Esta crise vai ser muito difícil para todos, não temos qualquer ilusão a esse respeito, mas há uma coisa que

tem de ser feita e que não pode falhar: o Estado não pode ser injusto nem frustrar as legítimas expectativas das

pessoas. E estes sócios-gerentes, estes para quem hoje falamos e para quem hoje decidimos, têm crédito. Têm

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crédito porque estão desesperados a pagar os layoff em que o Estado se atrasa com a sua parte e porque o

dinheiro das linhas de financiamento não lhes chega.

Portanto, aquilo que temos de dizer é que o mínimo que nos cumpre é fazermos a nossa parte. Façamos

todos a nossa parte, solucionando esta situação, porque ela é uma injustiça que deve e tem de ser reparada e

o Governo já demorou demasiado tempo a fazê-lo.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Tem, agora, a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Telmo Correia.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Queria dizer, em nome do CDS,

que esta é uma questão relativamente à qual, realmente, não se percebe por que razão não foi atendida nem

resolvida pelo Governo desde o início, desde que este problema se colocou. É que era muito evidente que,

quando se determinou a possibilidade de layoff para os trabalhadores das empresas, deveria ter sido atendida,

imediatamente, a possibilidade de os gerentes, sobretudo das micro e das pequenas empresas, poderem

também recorrer a um mecanismo desse tipo. E é muito fácil exemplificar.

Vamos pensar, por exemplo, no gerente de um pequeno restaurante, que tem dois ou três trabalhadores a

seu cargo; os trabalhadores são colocados em layoff e, no restaurante, além desses dois ou três trabalhadores,

trabalham o gerente e a sua própria mulher; o gerente, pelo seu estatuto de sócio-gerente, não foi abrangido e

pergunta o que vai fazer ao seu restaurante. Ainda recentemente, em Braga, por exemplo, ouvimos os donos

dos restaurantes dizerem: «Se calhar, temos de entregar as chaves; não temos condições de abrir porque não

recebemos, sequer, nenhum tipo de apoio.» Isto era evidente desde o início!

O CDS, e não foi o único, o PAN, de resto, também fez o mesmo, no âmbito e no quadro do layoff, apresentou

uma proposta para resolver este problema, a qual, na altura, foi chumbada, designadamente com os votos do

Partido Socialista e do Partido Social Democrata, que, depois, retomou esta mesma proposta, e agora, fora do

quadro do layoff, apresentamo-la especificamente para os sócios-gerentes. Mas estamos a falar de um mês e

muito depois e, como aqui foi dito pelo Sr. Deputado Cristóvão Norte, o Governo, ao fazer o anúncio que fez

hoje, no dia em que o Parlamento discute propostas de vários partidos, deu um sinal de um tipo de habilidade

política e de desconsideração pelo Parlamento absolutamente inqualificável, quando o Governo teve muito mais

de um mês para ter resolvido este problema. Não se percebe sequer porque é que, até aqui, não quis resolver

o problema dos sócios-gerentes das pequenas e microempresas.

O Sr. Presidente: — Agora, sim, é a vez do Sr. Deputado João Cotrim de Figueiredo, do Iniciativa Liberal.

O Sr. João Cotrim de Figueiredo (IL): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Costumavam frequentar

restaurantes só com um trabalhador? E oficinas? Costumavam ir a oficinas onde só trabalha uma pessoa? E

lojas, gabinetes de arquitetura, serviços de manutenção, onde só trabalha uma pessoa? E, no consultório do

vosso médico dentista, também só trabalha uma pessoa? Esta última pergunta é retórica, porque a própria lei

exige que um médico dentista não possa exercer sem um assistente.

Mas se respondeu que sim a qualquer uma das outras perguntas, então parabéns, porque não é fácil

encontrar uma pessoa nessas condições, porque conhece uma das poucas pessoas que podia estar abrangida

pelo regime — que hoje, à última hora, o Governo vem tentar corrigir, com o tal malabarismo — de apoio aos

sócios-gerentes previsto. Isto, claro, se essa pessoa não só não tiver trabalhadores, como também não faturar

mais de 60 000 € por ano.

Ao deixar de fora grande parte do tecido empresarial, o Governo e o PS mostravam, no modelo original do

decreto, uma vez mais, um chocante desconhecimento do funcionamento da economia e das empresas. É, aliás,

tão chocante que até o PSD, que há cerca de um mês rejeitou projetos de lei relativos ao apoio aos sócios-

gerentes, oriundos de praticamente todas as bancadas, vem agora propor praticamente o apoio que, há um

mês, rejeitava. Saudamos, obviamente, que se tenham juntado a nós na defesa dos gerentes do País, embora

tarde.

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Mas a proposta do PSD, e as de outros, só se aplica aos sócios-gerentes de micro e pequenas empresas.

Porquê? A família de alguém com este cargo, numa empresa média ou grande, vai ter menos fome ou passar

menos dificuldades se o sócio ou a sócia-gerente ficarem sem rendimento?

Nós não padecemos destes complexos e consideramos que o apoio aos sócios-gerentes deverá ser

concedido, com os limites previstos na lei, obviamente, independentemente do tamanho da empresa, desde que

esteja nas circunstâncias definidas como situação de crise empresarial e em regime semelhante ao dos

trabalhadores por conta de outrem, em igual situação.

As pessoas têm os mesmos direitos aos apoios, independentemente da designação do cargo que ocupam

ou do tamanho da empresa em que trabalham. Nós, no Iniciativa Liberal, poremos sempre as pessoas à frente

dos preconceitos.

O Sr. Presidente: — É a vez de Os Verdes. Tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Ferreira.

O Sr. José Luís Ferreira (PEV): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Como já percebemos, o layoff

simplificado veio canalizar para os trabalhadores as dificuldades do momento, reduzindo-lhes os salários e

passando para a segurança social a parte significativa dos encargos enquanto perdurar esta situação.

Mas, para além disso, esta medida não diferencia o tipo de empresas, a dimensão, o volume de negócios,

os lucros obtidos ou até mesmo a forma como se respeitam os direitos de quem trabalha. Com efeito, algumas

das empresas que aderiram ao layoff, sobretudo as grandes empresas, apressaram-se a tomar medidas para,

das mais diversas formas, fazerem tábua rasa dos direitos dos trabalhadores: pressionaram os trabalhadores

para gozarem férias durante este período, denunciaram contratos de trabalho durante o período experimental,

cessaram contratos a termo antes do prazo previsto e por aí fora. Falamos de empresas que, durante anos,

acumularam lucros e mais lucros, algumas delas até integradas em multinacionais e que transferem para o

estrangeiro a riqueza criada em Portugal, mas que, neste contexto, alegam enormes dificuldades e prejuízos.

Do outro lado, porém, estão as micro e pequenas empresas cujos apoios concedidos têm um alcance muito

limitado face às necessidades da maioria dessas empresas. Recorde-se que milhares de pequenas empresas

foram obrigadas a suspender a sua atividade por imposição de medidas sanitárias ou pela redução drástica das

encomendas e consequente queda ou mesmo ausência de receitas, enquanto se mantiveram as obrigações

fiscais e os encargos fixos com as instalações, os seguros, a energia, as telecomunicações, a água, entre outros.

Como sabemos, as micro, pequenas e médias empresas representam a generalidade do tecido empresarial

do nosso País, muitas das quais no setor terciário, que foi, aliás, dos mais afetados, desde logo o pequeno

comércio, o setor do táxi e de outros transportes, os setores das artes e espetáculos, da restauração, do turismo,

dos pequenos serviços como cabeleireiros, entre tantas outras que ficaram, de um dia para o outro, numa

situação extremamente difícil.

Como na altura Os Verdes denunciaram, as medidas estabelecidas deixaram de fora milhares de

trabalhadores pelo seu estatuto empresarial, pois são simultaneamente sócios-gerentes, ficando por isso sem

qualquer salário ou rendimento. Posteriormente, o Governo veio alargar o apoio extraordinário à redução da

atividade económica de trabalhador independente aos sócios-gerentes.

Contudo, esse apoio continua ainda a padecer de duas fragilidades ou de duas injustiças que importar

reparar. Por um lado, porque exclui os gerentes/trabalhadores de pequenas empresas que tenham

trabalhadores por sua conta e, por outro, porque apenas contempla as pequenas empresas que tenham tido

uma faturação inferior a 60 000 € no ano anterior, o que reduz drasticamente o universo das pequenas empresas

abrangidas. Ou seja, as pequenas empresas com um ou dois trabalhadores podem recorrer ao apoio temporário;

contudo, o gerente, que é simultaneamente trabalhador e que nessa qualidade pagou os seus impostos e as

suas contribuições, não tem acesso à medida, ficando sem qualquer rendimento. Isto leva, em muitos casos, ao

encerramento da empresa.

Neste contexto, para além da injustiça que esta situação potencia, representa ainda uma penalização para

quem cria postos de trabalho. Ora, a reparação desta injustiça é um dos objetivos da proposta que Os Verdes

aqui apresentam e que pretende alargar os apoios, em caso de layoff, aos trabalhadores que, simultaneamente,

sejam gerentes e tenham trabalhadores a seu cargo.

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Por outro lado, o teto atualmente estabelecido de 60 000 € de faturação por ano deixa de fora, como disse

há pouco, muitas pequenas empresas que não terão outra saída que não seja o encerramento. Por isso,

propomos que o limite de faturação para acesso ao apoio se situe nos 250 000 € por ano.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Muito bem!

O Sr. José Luís Ferreira (PEV): — São contributos para procurar garantir a sobrevivência de milhares e

milhares de pequenas e médias empresas e é nessa perspetiva que esta proposta deve ser entendida.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Pires, do Grupo Parlamentar do Bloco de

Esquerda.

A Sr.ª Isabel Pires (BE): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A pandemia provocada pela doença

COVID-19 afetou em grande medida a saúde pública, numa crise sanitária de dimensões não antes vistas no

nosso tempo de vida, mas também afetou a vida social e económica um pouco por todo o mundo.

Portugal não é exceção e as previsões apontam para uma queda abrupta e severa da atividade económica,

com um impacto transversal a todos os setores de atividade. E, apesar disso, sabemos já que vai afetar

sobremaneira os mais desprotegidos, seja os mais precários, mas também as micro e pequenas empresas, que

têm uma menor capacidade de resposta e que também têm tido um menor acesso às ajudas que foram criadas.

Aliás, estes micro e pequenos empresários já estão a ser os mais afetados e ainda agora iniciámos a fase de

desconfinamento. No entanto, até agora, o plano de resposta à crise económica apresentado pelo Governo é

tímido, quer em instrumentos, quer em dimensão, quer no seu alcance.

Ao longo das últimas semanas, houve vários debates parlamentares sobre como responder a esta crise e,

apesar de avanços relevantes, o Governo optou por não acolher propostas de alteração que poderiam ter

ajudado, desde mais cedo, as micro e pequenas empresas no impacto que o encerramento de praticamente

toda a atividade económica provoca.

Sobre o timing, diga-se que não deixa de ser profundamente hipócrita que este debate tenha sido marcado

pelo mesmo PSD que votou contra — repito, votou contra — propostas exatamente iguais no que toca ao

alargamento das medidas de proteção aos sócios-gerentes das micro e pequenas empresas.

Isto significa, Srs. Deputados, que para estes milhares de pessoas a solução já poderia ter sido aprovada há

mais de três semanas, mas o PSD e toda a direita não quiseram dar essa resposta. Quem perdeu, Srs.

Deputados, foram milhares de pessoas que, por responsabilidade vossa, continuam a não estar abrangidas por

medidas de proteção.

Mas é porque, desde o início, estivemos com estas pessoas e porque, desde a primeira hora, apresentámos

propostas que voltámos aqui hoje, porque não podemos, não pode o Parlamento, falhar a estas situações.

Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Não desistimos de dar uma resposta a todos e a todas, sem deixar

ninguém para trás. Por isso, apresentámos um conjunto de medidas urgentes dedicadas às micro e pequenas

empresas, que julgamos serem essenciais tomar neste momento extraordinário. Em primeiro lugar, defender o

emprego, garantindo o pagamento de salários; em segundo lugar, alargar o acesso às linhas de crédito e às

moratórias bancárias, diminuindo as restrições impostas pela banca; em terceiro lugar, reforçar o regime de

apoio aos custos fixos, apoiando a baixa do preço da energia elétrica e alargando, também, as moratórias a

seguros automóveis, por exemplo; e, por fim, estender o acesso de micro empresas ao apoio extraordinário aos

membros de órgãos estatutários, aos sócios-gerentes, ao abrigo do layoff, que tenham carreiras contributivas e,

portanto, sejam trabalhadores.

Sr.as Deputadas e Srs. Deputados, são medidas justas e urgentes que já poderiam ter sido aprovadas neste

Parlamento, volto a repeti-lo. Já percebemos que a dimensão da crise será maior ou menor consoante a resposta

inicial que consigamos dar. E, neste caso, falamos de muitos micro e pequenos negócios que poderão não se

aguentar no período de maior carência, porque a retoma gradual não permite fazer face a custos imediatos nem,

depois, à dívida que vão acumulando durante este período. Isto abrange vários setores, desde a restauração,

às feiras e mercados, ao táxi e vários outros setores.

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Por isso, consideramos que é essencial que estas medidas sejam hoje aprovadas. Esperemos que hoje, ao

contrário de outros momentos, impere a justiça e a resposta solidária à crise, em vez de jogos que deixam os

mesmos de sempre para trás.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — É agora a vez do Grupo Parlamentar do PAN. Sr.ª Deputada Inês de Sousa Real, tem

a palavra.

A Sr.ª Inês de Sousa Real (PAN): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Quando estamos precisamente

à beira de perfazer três meses de uma crise de saúde pública com efeitos sociais e económicos tremendos para

Portugal, verificamos, com algum espanto, que o PSD decidiu finalmente apresentar, pela primeira vez, em

tempo de COVID-19, uma iniciativa legislativa que procura — vejam bem! — propor soluções para dar resposta

à crise que vivemos.

O Sr. Afonso Oliveira (PSD): — Outra vez?!

A Sr.ª Inês de Sousa Real (PAN): — O PAN não pode deixar de saudar esta mudança de postura do PSD

e o facto de terem percebido que os compromissos com os eleitores se cumprem e respeitam aqui, no

Parlamento, e não com recadinhos para o Governo.

O Sr. Cristóvão Norte (PSD): — É sempre a mesma coisa!

A Sr.ª Inês de Sousa Real (PAN): — Tal postura até pode ser muito patriótica e merecer elogios do Podemos

de Espanha, mas traz um desprezo pelo Parlamento enquanto órgão de soberania, o que é, de facto,

inadmissível para um partido que diz querer ser alternativa ao Governo. Assim como também não podemos

deixar de dar nota, em relação ao Governo, do facto de ter a sua agenda legislativa curiosamente alinhada com

o Parlamento, quando trazemos estas matérias, o que nos traz algum espanto.

Os problemas dos sócios-gerentes, que debatemos hoje, poderiam, de facto, estar resolvidos desde o dia 8

de abril se a proposta do PAN, a par de propostas de outras forças políticas que traziam esta solução, não

tivesse sido chumbada — pasme-se! — com os votos contra do PS e do PSD.

Mas indo ao tema que aqui nos traz, não podemos deixar de referir que, a par dos demais trabalhadores,

neste momento os sócios-gerentes de micro, pequenas e médias empresas estão numa situação marcada por

grandes dificuldades, com quebras avultadas do volume de negócios, sendo que muitos não estão a conseguir

fazer face às obrigações fiscais ou ao pagamento de salários no mês de abril e outros já assumem como certo

que não vão conseguir manter o negócio para lá do mês de maio.

Estamos perante problemas que exigem responsabilidade, ação rápida, eficaz e robusta, porque é a vida das

pessoas e a sustentabilidade do nosso tecido empresarial que está aqui em causa. A solução do Governo ficou

aquém do que a situação exige. Desde logo, o apoio extraordinário previsto tem em conta apenas um valor

absolutamente risível, não acautela um apoio equilibrado com o peso das contribuições realizadas e, ao ter por

referência a faturação, está a ignorar que um sócio-gerente pode ter comunicado faturação positiva e não ter

tido lucro, deixando assim de fora milhares de sócios-gerentes que, neste momento, carecem de apoios e estão

a ter prejuízos brutais.

Por outro lado, as linhas de apoio à economia garantidas pelo Estado, e, em alguns casos, financiadas com

juros negativos pelo BCE (Banco Central Europeu), não só têm tardado a chegar às empresas como comportam

custos significativos devido à cobrança de juros e comissões, que mais não vão do que contribuir para que a

banca tenha lucro à custa da COVID-19, e que se traduzem, de facto, num obstáculo para as micro, pequenas

e médias empresas.

Para o PAN, a solução é clara e já o dissemos há mais de um mês: os sócios-gerentes têm de ter um

mecanismo de apoio dual que lhes garanta a possibilidade de escolha entre um apoio extraordinário reconhecido

aos trabalhadores independentes ou o acesso ao regime do layoff simplificado. Claro está que também será

necessário deixar de ter por referência o volume de faturação ou o número de pessoas afetas à empresa para

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que se possa simplificar o apoio e assegurar que chega a todos aqueles que estão a ter quebras do volume de

negócios e prejuízos.

A proposta que trazemos hoje a debate procurar dar esse contributo para a solução do problema, estando

nós disponíveis para que este compromisso e para que a construção de pontes seja feita, também, em sede de

discussão na especialidade. Neste momento, não é relevante saber a cor do partido que propõe as soluções, é,

sim, necessário aprovar essas mesmas soluções. Resta saber se as demais forças políticas, em particular, o

PSD, também estão empenhadas nesse objetivo ou se todo este debate não passa, como já vos ouvimos dizer,

de mero «folclore parlamentar».

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Hugo Costa, do Grupo Parlamentar do PS.

O Sr. Hugo Costa (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Todos compreendemos que a crise

económica decorrente da crise sanitária terá fortes consequências no emprego e no produto a curto prazo. Para

conseguirmos responder a esta crise é necessário, do ponto de vista económico, garantir a manutenção dos

postos de trabalho e a liquidez das empresas.

Ao nível da liquidez, gostaria de sublinhar a autorização da Comissão Europeia para empréstimos no valor

de 13 mil milhões euros, além de, por exemplo, incentivos às microempresas a fundo perdido e das medidas de

moratória nos empréstimos e no arrendamento.

A nível da manutenção do emprego e das respostas sociais, tempos excecionais obrigam a medidas

excecionais. Obviamente que, perante uma tempestade, não existe forma de impedir as suas fortes

consequências.

Contudo, gostava de sublinhar as medidas de apoio, nomeadamente ao layoff. As respostas do Governo, ao

nível das empresas e da manutenção do emprego, apresentam um conjunto de medidas significativas com vista

a salvar a economia.

O layoff permite o apoio financeiro extraordinário para o pagamento de remunerações, isenção de pagamento

de contribuições e, algo que é pouco referido, 635 € por cada posto de trabalho — por exemplo, para uma

empresa com 50 trabalhadores, estamos a falar de mais de 16 000 €. Estão igualmente garantidos apoios à

formação. Além dessas medidas, existem medidas de apoio aos trabalhadores a recibos verdes e a sócios-

gerentes sem trabalhadores.

Essas medidas estão, naturalmente, sempre em constante análise, nomeadamente para garantir que

ninguém fique de fora injustamente, assim como para gerir os naturais recursos escassos.

Este é o nosso princípio: procuramos responder e evitar a destruição do emprego e o aumento galopante do

desemprego, visão muito diferente da de alguns que agora estão muito preocupados com esta situação mas

que, em 2012 e 2013, tiveram políticas ativas de destruição do emprego.

Dessa forma, sublinhamos, porque tem sido dito que o Governo vem apenas agora apresentar esta medida,

que, no último debate quinzenal, o Sr. Primeiro-Ministro assumiu que existia a necessidade de alargar de apoios.

O Sr. CristóvãoNorte (PSD): — Umas horas antes do debate no Parlamento?

O Sr. HugoCosta (PS): — Segundo o que é hoje público, esses apoios vão ser alargados aos sócios-

gerentes, previsivelmente, de empresas até 10 trabalhadores, ou seja, de microempresas — uma mexida justa.

Defendemos que as medidas devem ser, em primeiro lugar, para quem mais precisa, com equidade e com

justiça. Todos conhecemos sócios-gerentes de pequenas indústrias, do comércio ou de setores comerciais como

a restauração ou as pequenas oficinas com menos de 10 trabalhadores, e esses precisam de urgente apoio.

E duas visões aparecem nesses apoios: os que acreditam tratar de forma igual o que é igual e de forma

diferente o que é diferente. Trata-se de uma questão de justiça. Mas existem duas matérias e duas visões

diferentes aqui: por um lado, os que tratam este problema dos sócios-gerentes como um problema similar ao

layoff e, por outro, os que o tratam como um problema similar ao dos trabalhadores independentes.

Para o Grupo Parlamentar do Partido Socialista, trata-se de uma questão de justiça a legislação tratá-los

como são tratados os trabalhadores independentes. É que quem define o salário do sócio-gerente é o próprio e

não outro, logo os trabalhadores independentes têm um regime muito mais fácil e muito mais lógico para este

tipo de trabalhadores.

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Contudo, nas medidas aqui debatidas, estamos sempre disponíveis para trabalhar em conjunto para resolver

estes problemas dos sócios-gerentes.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Bruno Dias, do Grupo

Parlamentar do PCP.

O Sr. BrunoDias (PCP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A situação que o País enfrenta na

sequência do surto epidémico da doença COVID-19 originou uma inesperada e muito significativa desaceleração

da economia, com reflexos negativos imediatos e de grande impacto em quase todos os setores da atividade

económica.

Há camadas e setores da população particularmente atingidos pelas consequências da situação que se vive,

de que se destacam os trabalhadores, mas também milhares de micro e pequenas empresas que vivem

situações de crise empresarial. As medidas criadas pelo Governo de apoio social nestas situações têm vindo,

em muitas situações, a revelar-se insuficientes nos apoios concedidos e limitadas na sua abrangência. Neste

debate, o caso concreto dessas limitações é a situação dos sócios-gerentes de micro e pequenas empresas

que, como foi oportunamente denunciado pela Confederação Portuguesa das Micro, Pequenas e Médias

Empresas, não se encontram abrangidos por qualquer das medidas de apoio social criadas, apesar de, na sua

maioria, viverem do salário que auferem pela atividade que desenvolvem na respetiva empresa.

Situação muito próxima dessa é a que vivem milhares de trabalhadores independentes que se confrontam

com a insuficiência dos apoios que lhe são atribuídos e a dificuldade em lhes aceder.

Perante estas difíceis situações, o PCP propôs a aplicação aos sócios-gerentes das micro e pequenas

empresas o regime dos trabalhadores independentes, pela similitude das circunstâncias em que desenvolvem

a sua atividade, propondo simultaneamente o reforço da proteção social concedida nessas situações e

facilitando as condições de acesso.

Ao ouvir a intervenção do PS, como acabámos de ouvir, torna-se ainda mais incompreensível como é que o

PS e o PSD votaram contra esta mesma proposta.

VozesdoPCP: — Exatamente!

O Sr. BrunoDias (PCP): — Desde logo, afastávamos essa restrição absurda a sócios-gerentes de empresas

sem qualquer trabalhador para além do próprio, ou ainda a questão da faturação, tendo em conta, por exemplo,

a situação de milhares de tabacarias e os montantes que movimentam, nada disso tendo a ver com lucros.

Essa proposta do PCP foi rejeitada faz esta semana um mês, no dia 8 de abril, com o voto contra, repito, do

PS e do PSD e a abstenção do CDS.

Esse apoio já poderia estar em vigor e os sócios-gerentes já poderiam estar a recebê-lo, Srs. Deputados,

não fosse o voto contra e a inviabilização que dele fizeram relativamente à proposta do PCP.

O PSD descobriu o problema e apresentou uma proposta uma semana depois de chumbar as propostas do

PCP que permitiam enfrentar e responder a este problema.

O Sr. CristóvãoNorte (PSD): — Já tínhamos falado nisso!

O Sr. AfonsoOliveira (PSD): — Seriedade, Sr. Deputado, seriedade!

O Sr. BrunoDias (PCP): — É lamentável que hoje, nesta fase, estas pessoas continuem confrontadas com

este problema. Não vamos fazer à proposta do PSD aquilo que o PSD fez à proposta do PCP. Nós queremos

ser, e continuaremos a ser, parte da solução e não parte do problema.

Aplausos do PCP.

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O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado João Gonçalves Pereira, do

Grupo Parlamentar do CDS-PP.

O Sr. JoãoGonçalvesPereira (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Neste mesmo debate,

já foi aqui dito que o CDS foi o primeiro partido a alertar para a desproteção dos sócios-gerentes de micro e

pequenas empresas e também, ainda há duas semanas, confrontou o Ministro da Economia no sentido de saber

que resposta é que o Governo tem para os sócios-gerentes destas micro e pequenas empresas.

Só para termos uma noção da dimensão deste universo, quando falamos de sócios-gerentes de

microempresas estamos a falar de qualquer coisa como 190 000 empresários e o CDS está preocupado com

aquele pequeno comerciante, o dono daquela pequena loja que está completamente desprotegido.

O Governo, numa manobra de habilidade, sabendo que estavam agendadas estas mesmas iniciativas,

apresenta, hoje, uma solução — uma solução que já devia ter chegado antes. Temos aqui uma espécie de

política a conta-gotas e o CDS crítica essa política errática do próprio Governo.

O que esperamos é que este processo de adesão para o pedido de apoio seja um processo simples, seja

um processo pouco burocrático, até porque tem existido burocracia a mais e apoio efetivo a menos. Portanto,

esperamos que esse processo decorra bem, ao contrário daquilo que tem acontecido, por exemplo, em matéria

de layoff ou em matéria de acesso ao crédito nas linhas COVID-19. A burocracia é mais do que muita, a papelada

é mais do que muita e o excesso de papelada significa tempo perdido, tempo perdido para salvar empresas e

tempo perdido para salvar a nossa economia. Como já disse num debate anterior, não se conseguem salvar

empregos se não salvarmos as empresas.

A título de exemplo e para terminar,…

O Sr. Presidente: — Tem de concluir, Sr. Deputado.

O Sr. JoãoGonçalvesPereira (CDS-PP): — … para vermos como os atrasos prejudicam as nossas

empresas, veja-se o caso do layoff: o Governo falhou o primeiro prazo e soubemos agora que falhou o segundo.

Quantos prazos vai ser necessário falhar para que haja responsáveis políticos, para que haja a assunção de

responsabilidades?

Agradeço a sua tolerância, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado André Ventura, do Chega.

O Sr. AndréVentura (CH): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Sr. Deputado Hugo Costa, depois de o ouvir

fiquei com uma certeza: O senhor tem um amplo caminho pela frente e vai ser, certamente, um dos próximos

ministros da administração interna ou da justiça. É que conseguir estar 3 minutos — 3 minutos! — a dizer que

estamos todos a avançar, todos de acordo, que tudo vai ser feito, que nada ainda foi feito, que o melhor ainda

está para vir, é digno de Eduardo Cabrita, que hoje não está aqui conosco, e, portanto, não nos vamos alongar

sobre isso.

A verdade é que estamos perante um enorme desrespeito a este Parlamento: no dia em que o Parlamento

discute e em o que o Governo sabe que uma maioria negativa o obrigará a apoiar os sócios-gerentes, o Governo

diz que, amanhã, em Conselho de Ministros, vai apoiar com novas medidas empresas até 10 trabalhadores,

sem o limite de faturação previsto, e até trabalhadores que não tenham descontado no primeiro ano.

Chama-se a isto desrespeito pelo Parlamento porque, sabendo que já nada pode fazer, quer agora vir dizer

foi por sua iniciativa que se geraram estes apoios. Nada mais errado!

A verdade é que o Governo quis ganhar tempo e enquanto esteve a apoiar uns esqueceu outros, nos apoios

que, agora, não lhes vai dar. Aliás, basta ver qual vai ser o prazo de retroatividade destes apoios para

percebermos que não é verdade, que o Governo não quis gastar dinheiro com estas pessoas ao longo dos

últimos meses.

O Sr. Presidente: — Peço-lhe para concluir, Sr. Deputado.

O Sr. AndréVentura (CH): — Vou concluir, Sr. Presidente.

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Mais: diz o Governo que vai também alargar estes apoios a quem não descontou. Nada a apontar, mas não

se esqueçam daqueles que andaram a pagar impostos ao longo dos últimos anos, porque esses têm de ser os

primeiros a quem nós temos, agora, de dar a mão. O contrário é mais uma vergonha nesta Câmara.

O Sr. Presidente: — Tem agora a palavra, para encerrar o debate deste ponto da nossa ordem de trabalhos,

o Sr. Deputado Cristóvão Norte, do PSD.

O Sr. CristóvãoNorte (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Creio que os Srs. Deputados já tenham

tido tempo para perceber qual é a orientação da conduta do PSD.

O PSD entende que a primazia da ação legislativa num tempo tão difícil como este, em que é necessário

mobilizar tantas medidas, compete, em primeira linha, ao Governo. Respeitamos isso e insistimos junto do

Governo, por canais oficiais, públicos, e outros de natureza informal, para que o Governo se apressasse a

legislar para pôr cobro a esta injustiça flagrante que se verifica.

Não tendo o Governo assumido essa obrigação, o PSD decidiu apresentar um projeto. Fê-lo no dia 14 de

abril, transcorreram três semanas desde esse o dia e ainda estamos na mesma situação. Até hoje, o Governo

optou, deliberadamente, por não legislar. Aquilo que viemos fazer foi substituirmo-nos ao Governo, Governo

este que tinha a obrigação de legislar e que não o fez.

Portanto, aquilo que esperamos é que os Srs. Deputados acompanhem a posição do PSD, já que tiveram

aqui ocasião de a saudar.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Chegámos assim ao fim do terceiro ponto da nossa ordem de trabalhos.

Vamos passar ao quarto ponto da nossa ordem de trabalhos, que consiste na discussão do Projeto de

Resolução n.º 409/XIV/1.ª (BE) — Garante que as crianças cujos pais perderam rendimentos não são excluídas

das creches, protegendo as famílias afetadas e os profissionais, do Projeto de Lei n.º 355/XIV/1.ª (PCP) — Cria

um regime de apoio às famílias na frequência de equipamentos de apoio à infância (na generalidade) e dos

Projetos de Resolução n.os 396/XIV/1.ª (CH) — Pela criação e implementação imediata do Plano Nacional de

Solidariedade e Literacia Digital, 421/XIV/1.ª (PEV) — Define medidas excecionais relativas ao pagamento de

creches no período de influência da COVID-19 e 423/XIV/1.ª (PAN) — Reforça a proteção das famílias com

dependentes matriculados em creches e jardins de infância e garante a sustentabilidade destes equipamentos

educativos.

Tem a palavra, para iniciar este debate, a Sr.ª Deputada Joana Mortágua, do Grupo Parlamentar do Bloco

de Esquerda.

A Sr.ª JoanaMortágua (BE): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O encerramento das creches foi uma

medida importante para promover o isolamento social e conter o contágio do vírus.

A reabertura está agora a começar a ser programada e julgamos que ela deve ser feita de forma gradual e

com critérios sanitários rigorosos. Mas é importante que essa reabertura das creches não nos faça esquecer os

problemas de acesso às creches que foram criados, aprofundados e/ou desmascarados por esta pandemia.

Desde logo, o facto de não haver uma rede universal e pública de creches integrada no sistema educativo

faz com que existam poucas vagas, muito menos do que aquelas que seriam necessárias, e que as

mensalidades sejam tão caras, tantas vezes mais do que a mensalidade ou a propina de uma universidade,

tantas vezes metade de um salário médio em Portugal.

Portanto, as famílias estão reféns desta falta de vagas nas creches e quando se depararam com uma quebra

de rendimentos como aquela que existe durante a crise que estamos a atravessar ficam «entre a espada e a

parede». Não têm como pagar a mensalidade porque perderam rendimentos por causa da crise da COVID-19,

mas não podem dar-se ao luxo de perder aquela vaga, naquela creche, porque precisam de deixar lá as suas

crianças quando a economia retomar. Portanto, quando a escolha passa a ser entre pagar a creche e pôr comida

na mesa, houve muitas famílias que não tiveram como pagar a creche e houve muitas creches que ameaçaram

excluir as crianças de quem não pagou.

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Estes problemas estruturais resultam do facto de sempre se ter considerado o acesso das crianças às

creches como uma matéria de mercado e o mercado abandona quem está mais vulnerável, ou seja, as crianças

das famílias que perderam rendimentos.

São essas as crianças que pretendemos proteger com este projeto, garantindo três coisas: que as famílias

afetadas pela crise tenham uma redução da mensalidade proporcional à redução do seu rendimento, que as

creches sejam apoiadas pela segurança social para compensar esta perda de mensalidade, para que não

tenham de despedir nenhum trabalhador nem de reduzir salários, e para garantir que quem deixou de pagar a

mensalidade porque teve o seu rendimento cortado não perde a vaga na creche.

Este projeto não ignora algumas garantias que já foram dadas pela associação que representa as creches e

não ignora que há famílias que chegaram a acordo individualmente com a creche ou as instituições onde têm

as suas crianças. Mas aquilo que propomos é uma rede de segurança, para garantir que nenhuma criança fica

para trás. E isso é competência e responsabilidade nossa, da Assembleia da República e do Governo, não pode

ser deixado à boa vontade dos privados.

Aplausos do BE.

Entretanto, assumiu a presidência a Vice-Presidente Edite Estrela.

A Sr.ª Presidente: — Tem a palavra, para uma intervenção e para apresentar o seu projeto, por parte do

Grupo Parlamentar do PCP, a Sr.ª Deputada Diana Ferreira.

A Sr.ª Diana Ferreira (PCP): — Sr.ª Presidente e Srs. Deputados: Nas últimas semanas têm sido muitos os

problemas e as adversidades sentidos pelos pais e pelas mães trabalhadoras.

Falamos de despedimentos que atingem milhares de trabalhadores, muitos sem a possibilidade de qualquer

proteção social; falamos da significativa quebra dos rendimentos familiares, nomeadamente dos salários, pelas

mais variadas situações, entre as quais o layoff, que atinge mais de um milhão de trabalhadores no nosso País;

e falamos de brutais atropelos aos direitos laborais, a pretexto da crise sanitária.

A esta situação acresce a realidade das famílias que, tendo filhos inscritos em equipamentos sociais de apoio

à infância e cujas atividades estão suspensas, se veem confrontadas com o pagamento de mensalidades no

momento em que aumentam as despesas familiares e se reduzem os rendimentos que entram em casa.

É para garantir respostas imediatas às famílias face a esta situação que o PCP apresenta este projeto de lei,

lembrando que há muitas famílias que não têm condições para pagar as mensalidades das instituições que os

seus filhos frequentam e lembrando também que há, naturalmente, a vontade por parte das famílias de que as

suas crianças voltem a frequentar as respetivas valências no futuro. E é preciso criar condições para tal.

Perante as muitas dificuldades sentidas pelas famílias, acentuadas e agravadas no contexto atual, importa

garantir que as crianças podem voltar a frequentar as instituições e que as famílias não são penalizadas por não

terem condições para pagar as mensalidades das mesmas.

Por isso, propomos a revisão das mensalidades de forma a refletir a alteração dos rendimentos do agregado

familiar, devendo este instrumento continuar em vigor após a abertura das várias valências para atender também

a nova situação de quebra de salários e de rendimentos das famílias no futuro; a alteração do período que serve

de cálculo a essa mesma revisão, passando a ser efetuada em função dos rendimentos dos últimos dois meses;

a redução das mensalidades em pelo menos 20% do valor no contexto de suspensão de atividades letivas e

não-letivas, bem como a proibição de anulação de matrícula e de cobrança de taxas ou multas por

incumprimento do pagamento das mensalidades no período do encerramento das valências.

Propomos também o alargamento das vagas abrangidas pelos acordos de cooperação, nomeadamente no

âmbito das creches, criando-se critérios de igualdade no cálculo das mensalidades entre as crianças que

frequentam as valências de apoio à infância e garantindo a todas a possibilidade de redução das mensalidades.

Mas há outra resposta que também importa assegurar e pela qual o PCP se tem batido: a gratuitidade das

creches para todas as crianças até aos 3 anos ou até à entrada no pré-escolar.

Importa cumprir o que foi aprovado em Orçamento do Estado, por proposta do PCP. Aliás, se esta medida

tivesse já tido concretização muitas das situações com as quais as famílias se deparam neste momento não

teriam, sequer, lugar.

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A rápida concretização da gratuitidade de acesso às creches representaria — e representa — uma redução

de despesas do agregado familiar num momento tão difícil para muitas famílias, confrontadas com

despedimentos, com situações de desemprego, com perdas de salários e de outros rendimentos. Esta é,

naturalmente, uma matéria na qual insistiremos.

Defendemos uma rede pública de creches gratuita para todas as crianças, mas também respostas públicas

no que concerne a outras dimensões da rede de serviços e equipamentos, sem prejuízo do papel complementar

das IPSS (instituições particulares de solidariedade social) nas diferentes valências. E a realidade que hoje

vivemos demonstra a importância dessa rede pública e a necessidade de se darem passos decisivos neste

sentido.

Mas importa também, no imediato, responder a problemas sentidos por estas famílias. São exatamente essas

respostas aos problemas sentidos pelas famílias, pelos pais e pelas mães trabalhadoras, que este projeto de lei

do PCP garante.

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado André Ventura,

do Chega.

O Sr. André Ventura (CH): — Sr.ª Presidente e Srs. Deputados: O Sr. Primeiro-Ministro tinha dito que cada

casa teria um computador; o Sr. Ministro da Educação tinha dito que neste trabalho ninguém ficaria para trás. A

verdade é que já estamos no segundo mês de pandemia — a caminhar para o terceiro — e continuam muitas

famílias a ir às autarquias e às empresas pedir meios para conseguirem, pelo menos, ter acesso aos

equipamentos fundamentais, como o ensino à distância e outros.

Sim, as autarquias e as empresas é que estão, neste momento, a substituir o Estado nestas matérias. E se,

de facto, o Chega se junta às propostas aqui apresentadas, por ser inadmissível que uma creche que não esteve

em funcionamento venha agora cobrar a mesma mensalidade como se tivesse estado em funcionamento,

retirando até vagas a quem já lá estava, não deixa de ser igualmente fundamental que as crianças tenham

acesso a todos os meios informáticos que lhes permitam aceder a estes bens que agora não podem ser obtidos

presencialmente e têm de ser obtidos à distância.

Por isso, e porque não sabemos — e até o próprio Primeiro-Ministro o admite — se podemos ter um segundo

surto daqui a alguns meses, é fundamental garantir que todos os meios estão à disposição de cada família.

Assim, apresentamos hoje, aqui, um plano nacional de solidariedade e de literacia digital para que, de facto,

não falte um computador em nenhuma casa e que, envolvidos todos — autarquias, empresas e o Governo —,

possamos levar este esforço de solidariedade a uma resposta conjunta para que as nossas crianças não fiquem

para trás num esforço de educação que é de todos.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Tem a palavra, para uma intervenção, a Sr.ª Deputada Mariana Silva.

A Sr.ª Mariana Silva (PEV): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A frequência de creche é das

primeiras experiências da criança num sistema organizado e exterior ao seu círculo familiar. A sua integração é

importante para desenvolver competências e capacidades e é reconhecido que estas experiências podem ter

um verdadeiro impacto no seu desenvolvimento no futuro. Os cuidados adequados durante a primeira infância

trazem benefícios para a toda a vida.

Nos nossos dias, as famílias contam cada vez menos com o apoio direto dos familiares mais velhos, exigindo-

se que a sociedade dê resposta a esta questão, sendo da responsabilidade do Estado proporcionar apoio e

suporte às famílias, designadamente com uma rede de equipamentos de apoio à infância e com a regulação de

horários de trabalho que permitam gerir saudavelmente cada situação.

Uma das primeiras medidas a ser decretada para conter a propagação da COVID-19 foi o encerramento das

creches, causando inúmeros transtornos às famílias.

Lamentavelmente, os problemas de saúde pública serão acompanhados de uma crise económica que trouxe

para inúmeras famílias uma quebra considerável de rendimentos, provocada por situações de layoff, e muitas

outras viram os seus rendimentos desaparecer, tendo muitas caído na dramática situação de desemprego.

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No entanto, as famílias estão a ser obrigadas a pagar as mensalidades de creches mesmo não tendo

usufruído dos seus serviços. Como sabemos, a inexistência de uma rede pública de creches — neste momento

cobre apenas 30% das necessidades — faz com que as respostas existentes sejam, sobretudo, da

responsabilidade dos privados e das instituições de solidariedade social.

Chegaram aos Verdes diversas denúncias e pedidos de ajuda de famílias que têm medo de perder os lugares

dos seus filhos nestes espaços, por falta de pagamento das mensalidades no período de confinamento e de

encerramento de creches e das escolas.

Visto que o Estado não tem uma rede de apoio desenvolvida para chegar ao maior número de crianças, é

necessário que se encontrem soluções para que os pais possam retomar as suas rotinas sem que os seus filhos

sejam excluídos das creches porque se viram impedidos de pagar as mensalidades.

Existe um risco efetivo, se estas condições se mantiverem, de aumentar o fosso da desigualdade social. Os

custos das famílias com as creches são muitas vezes comparáveis a metade do salário médio e é urgente que

se travem as desigualdades que a situação que se tem vivido com a pandemia veio alargar. As famílias com

rendimentos mais baixos e com um nível de precariedade superior são as mais afetadas pelas medidas de

restrição.

Nesse sentido, é urgente assegurar que nenhuma criança perde lugar na creche que frequenta por razões

relacionadas com o não pagamento da respetiva mensalidade devida no período de confinamento recomendado

ou obrigatório, em particular nos casos de comprovada perda ou quebra de rendimento do agregado familiar.

É urgente também mobilizar as instituições que gerem creches no sentido de promoverem acordos

excecionais com as famílias, de reajustamento do valor das mensalidades, tendo em conta a sua situação

concreta, no sentido de que estas não sejam ainda mais prejudicadas pelo facto de terem perdido rendimentos

ou o seu emprego, e, para o futuro, é necessário elaborar um plano de criação de uma rede pública de creches

que cubra todo o País, com vista a garantir creche gratuita a todas as crianças até aos 3 anos.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Muito bem!

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Tem a palavra, para uma intervenção, a Sr.ª Deputada Bebiana Cunha,

do PAN.

A Sr.ª Bebiana Cunha (PAN): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: No que toca a creches e jardins de

infância, os apoios às famílias e às instituições continuam a ser insuficientes, pois não refletem os impactos que

a COVID-19 teve nos rendimentos dos agregados familiares e das instituições.

Na urgência de fazer face a esta bola de neve das despesas correntes, é com desespero que milhares de

famílias constatam que não conseguem pagar as mensalidades destes equipamentos, mensalidades essas que,

em muitos casos, se mantiveram na totalidade. Muitos destes equipamentos foram aplicando descontos

diferenciados nas mensalidades relativas aos meses em que houve encerramentos, e às dificuldades das

famílias junta-se também o peso da sustentabilidade das próprias instituições e do esforço de manutenção dos

seus funcionários, que também terão famílias.

Muitas famílias têm tentado junto das creches conseguir uma redução das mensalidades. Quando tal não é

conseguido, veem-se forçadas a anular as matrículas, correndo o risco de perderem as vagas.

Já pela parte das instituições, para além dos salários dos funcionários, existe um conjunto de custos que não

desapareceram nem se reduziram com o encerramento temporário das instalações e que são contabilizados na

anuidade paga pelas famílias.

O PAN considera urgente a criação de mecanismos de apoio, garantindo especial proteção àquelas famílias

que sofreram maiores quebras de rendimentos, bem como a estes equipamentos, como forma de garantir a sua

sustentabilidade até ao final do presente ano escolar.

Defendemos, então, que deve ser criado um sistema de repartição de custos entre o Estado, as famílias e

os equipamentos educativos para fazer face às despesas — tendo em consideração os esforços já

desenvolvidos durante este período —, mas também garantindo que os agregados familiares que tenham tido

uma quebra de rendimento superior a 20%, ficam isentos do pagamento da respetiva mensalidade.

Devem ser ainda criados mecanismos de proteção dos funcionários das creches e jardins de infância,

condicionando estes apoios do Estado à não existência de despedimentos, e deve ser garantido que aqueles

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funcionários que têm dependentes até aos 12 anos de idade tenham acesso, sempre que possível, ao regime

de horário flexível. Não podemos esquecer que as famílias que até aqui tinham o apoio, na retaguarda, de

pessoas mais velhas da família — muitas vezes os avós — para irem levar e buscar as crianças, se verão agora

sem esse apoio, porque estes configuram, de facto, um grupo de risco elevado de contração de COVID-19.

Assim, o Estado deve implementar modos de organização do trabalho capazes de responder a esta

necessidade.

De forma a garantir a estabilidade das famílias, deve, no nosso entendimento, ser garantida a manutenção

de vaga a todas as crianças matriculadas nos respetivos equipamentos, não podendo as crianças ser excluídas

em virtude do não pagamento da mensalidade.

Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A integração das crianças nestes equipamentos desempenha um

papel fundamental no desenvolvimento infantil, permite uma maior igualdade de oportunidades e de inclusão

social, pelo que não podemos deixar de fora deste cenário a garantia de apoio a estas crianças, às suas famílias

e às instituições.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Tem a palavra, para uma intervenção, a Sr.ª Deputada não inscrita

Joacine Katar Moreira.

A Sr.ª Joacine Katar Moreira (N insc.): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O Estado anda

sucessivamente a desresponsabilizar-se do investimento nas creches e nos equipamentos de apoio à infância,

dando-nos a ideia de que o ensino pré-escolar é um ensino facultativo.

Ora, não é facultativo para a maioria das famílias ficar ou não ficar em casa a cuidar das crianças.

Então, enquanto isto não for facultativo, enquanto o Estado não arranjar apoio social para que estes milhares

de famílias possam optar por estar, ou não, em casa, o Estado tem a obrigação de investir em equipamentos de

apoio à infância e tem, também, a obrigatoriedade de universalizar o acesso a estas instituições.

Como é óbvio, votarei favoravelmente estas iniciativas legislativas, exatamente por entender que têm o

objetivo de resgatar alguma justiça social, que este ambiente de pandemia e de confinamento nos revelou, as

imensas desigualdades e, especialmente, a relação entre as entidades e as famílias.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Marina Gonçalves,

do Grupo Parlamentar do PS.

A Sr.ª Marina Gonçalves (PS): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O combate à crise de saúde

pública que vivemos tem sido pautado por duas grandes mensagens. Elas são, por um lado, a excecional

resposta de todos os portugueses, a necessidade de adaptação do nosso quotidiano, inclusive na fase atual,

em que iniciamos uma retoma parcial e progressiva da nossa vida em sociedade, e, por outro lado, a resposta

dada pelo Estado, enquanto garante de trabalhadores de empresas e de respostas sociais e enquanto garante

de serviços públicos essenciais.

Como hoje mesmo referiu o Sr. Primeiro-Ministro — e vale sempre a pena reafirmá-lo —, esta crise tem sido

muito pedagógica para aqueles que tinham muitas dúvidas sobre a importância do nosso Estado social e dos

nossos sistemas públicos. Não há, hoje, qualquer dúvida sobre o papel de um Estado robusto para dar uma

resposta eficaz à sociedade. Não há, hoje, qualquer dúvida sobre o insubstituível papel da segurança social

neste esforço coletivo.

O Sr. João Paulo Correia (PS): — Muito bem!

A Sr.ª Marina Gonçalves (PS): — Esta tem sido, aliás, a tónica dos debates que temos feito nesta Casa,

sublinhando a necessidade de respostas, evoluindo a cada momento em função das necessidades que vão

surgindo. É evidente que esta resposta passou, também, pelo apoio às famílias com crianças em creches e pelo

apoio aos trabalhadores, nestas respostas sociais.

No momento em que se decretou o encerramento das creches, foram salvaguardados compromissos

cruciais. Para as famílias, salvaguardou-se a possibilidade de acompanhar os filhos em casa, através da

atribuição de um apoio financeiro e da salvaguarda da sua vida profissional, através de um modelo de faltas

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justificadas. Já para as creches, desenharam-se duas respostas: a natural manutenção das mensalidades

respeitantes aos acordos de cooperação com as IPSS, no âmbito da segurança social, durante o período de

encerramento e a extensão do regime de layoff simplificado às creches que vejam os seus rendimentos

reduzidos, nos termos previstos.

Isto dito, foi desenhada uma resposta global e excecional para um período, também ele, excecional. O

objetivo último foi o de salvaguardar a continuidade da resposta e, em simultâneo, o rendimento das famílias e

dos trabalhadores.

Com a proximidade da reabertura das creches, coloca-se uma nova preocupação: a de continuar a

salvaguardar a sustentabilidade da resposta e, sobretudo, garantir que nenhuma família seja prejudicada no

acesso a essa resposta social. Já hoje, no âmbito das respostas protocoladas com a segurança social, é possível

rever e reduzir a comparticipação familiar, sempre que haja uma redução do rendimento mensal do agregado.

Esse instrumento pode e deve ser utilizado pelas famílias nesta fase, em função da quebra dos seus

rendimentos. O objetivo será sempre o de garantir a retoma à normalidade possível e isso passa pela análise

de instrumentos capazes de dar uma resposta equilibrada entre os dois vetores.

É importante dar uma resposta célere a curto prazo e o Estado, nas respostas protocoladas, deve encontrar

modelos flexíveis que salvaguardem este equilíbrio. O mesmo se pode pedir às restantes respostas. Esta

flexibilidade imediata na relação entre as instituições e as famílias pode, inclusive, passar por planos de

pagamento de mensalidades em atraso, mas deve também contar com os instrumentos já referidos de apoio às

próprias creches, de forma a equilibrar a sua liquidez com a necessidade de respostas às famílias.

A cooperação e a solidariedade são pilares centrais para responder a este esforço coletivo e, por isso, é

devido este trabalho conjunto.

Termino, salientando, mais uma vez, a importância da manutenção desta resposta, a importância que estes

instrumentos têm para a salvaguarda da mesma e a necessidade de todos, conjuntamente, contribuirmos para

o bem comum.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Carla Madureira,

do Grupo Parlamentar do PSD.

A Sr.ª Carla Madureira (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: No âmbito das medidas

excecionais e temporárias relativas ao surto epidémico da COVID-19, foram suspensas as atividades

presenciais nas creches, nos jardins de infância e nos demais estabelecimentos de ensino.

Sendo certo que o Governo procurou, de alguma forma, responder ao impacto das medidas de contenção

do vírus nos rendimentos das famílias, nas empresas, nas IPSS, a verdade é que os sucessivos anúncios de

apoios a uns e a outros não tiveram ainda a desejada correspondência prática: os processos de layoff

emperraram na máquina burocrática do Estado e os trabalhadores estão desesperados, sem rendimentos e sem

capacidade de fazer face às suas despesas essenciais; as linhas de financiamento prometidas tardam em

chegar às empresas e às organizações da economia social.

Se as circunstâncias excecionais que vivemos poderão, em certa medida, servir de pretexto a certas

ineficiências crónicas do aparelho do Estado, outras há que são reveladoras de um certo modo de governar.

Soubemos que o Estado está em falta no que se refere ao pagamento das dívidas às IPSS, desde janeiro. É

uma situação inaceitável, anterior ao surto, que contraria a ideia de um milagre económico de Mário Centeno.

Tivesse o Governo cumprido os seus compromissos, estas instituições teriam, hoje, outro estofo e outras armas

para responder às exigências do momento.

Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O PSD concorda com muitos dos princípios que norteiam as

iniciativas hoje em análise,…

O Sr. João Oliveira (PCP): — Mas…!

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A Sr.ª Carla Madureira (PSD): — … seja as que vão no sentido de proteger as famílias mais vulneráveis e

as que foram duramente penalizadas com a perda de rendimentos por causa deste surto, seja as que procuram

acautelar a sustentabilidade deste importantíssimo pilar, que é o do setor social e solidário.

É nosso entendimento que o Estado não poderá deixar as famílias e as IPSS desprotegidas e entregues à

sua sorte, mas também consideramos que a resposta a esta crise não deve entrar numa roda livre de medidas

isoladas, desgarradas e bem-intencionadas, com sentido meramente conjuntural.

Impõe-se que o Governo comece a pensar e a agir no sentido de dar respostas estruturadas e articuladas

também aos problemas com que o nosso País se vai confrontar em vários setores, como o acesso ao emprego,

as dificuldades das empresas, as situações de carência alimentar e habitacional, a nova realidade e os novos

desafios no ensino e na formação profissional, entre muitos outros.

Por isso, propomos e defendemos que este projeto de lei e estes projetos de resolução baixem à comissão,

sem votação, para que seja encontrada uma solução que garanta a proteção das crianças e das famílias, mas

também que salvaguarde a sustentabilidade das IPSS, integrada num quadro de medidas e num horizonte mais

alargado.

Aplausos do PSD.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Almeida, do

Grupo Parlamentar do CDS-PP.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A matéria que

discutimos é, no contexto da COVID-19 e de toda a realidade que foi criada em função da situação que vivemos,

muito importante.

O que estamos a discutir é a compatibilidade entre as necessidades das famílias que têm filhos em idade de

frequentar a creche e a sustentabilidade da rede de creches que temos no País. É do facto de conseguirmos,

ou não, esse equilíbrio que se poderá aferir o sucesso destas medidas.

Em primeiro lugar, é preciso responder às famílias que perderam rendimento, ou na totalidade ou

parcialmente. É preciso responder, também, às famílias que, com o desconfinamento, não têm ainda solução

para compatibilizar a vida profissional com a vida dos seus filhos em idade de frequentarem a creche, indo levá-

los à creche ou ficando em casa a tomar conta deles. Por outro lado, também existem famílias, vidas e

instituições que é preciso proteger.

Aquilo que, do nosso ponto de vista, é errado, está plasmado nalguns dos projetos que aqui nos são

presentes: uma guerra entre famílias e instituições, pondo as famílias contra as instituições ou as instituições

contra as famílias. Ou é porque são as instituições que cobram e não deviam cobrar, portanto, abusam, ou é

porque são as famílias que não pagam, porque não podem pagar, e também são punidas… Não é por aí que

passa a solução. A solução vai, exatamente, no caminho contrário.

Portanto, do nosso ponto de vista, e porque também não se pode pôr as famílias a pagar o dinheiro que não

têm, nem as instituições a permitir que não se pague aquilo que precisam para poder, por exemplo, continuar a

pagar os salários dos seus empregados, a resposta tem, naturalmente, de passar pela dimensão social do

Estado, pela segurança social, que deve, por um lado, apoiar as famílias que perderam recursos na totalidade

ou parcialmente, para que possam manter os seus filhos nas creches, e, por outro lado, assegurar que uma

diminuição das receitas das instituições que detêm essas creches não determine que elas, no limite, deixem de

poder funcionar ou deixem de poder pagar os salários aos seus trabalhadores.

Uma outra questão importante que devemos salvaguardar tem a ver com funcionários não só das creches,

mas também das escolas. Há muitos funcionários — professores, educadores, auxiliares — que trabalham em

escolas e em creches que também têm filhos em idade de frequentar a escola, jardins de infância ou creches e

com quem estão, neste momento, em casa. Essa é a maior dificuldade, de todas, de articulação.

É preciso, neste momento, haver a capacidade de perceber que todas estas situações sociais, principalmente

as mais extremas, têm de ter uma resposta. Essa é a obrigação de todos nós! Estas iniciativas, com certeza,

dão um contributo nesse sentido e o CDS, com o seu voto, também dará um contributo para que possamos

encontrar o caminho que, a cada momento, dê a melhor resposta a cada uma destas situações.

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A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para encerrar o debate, tem a palavra a Sr.ª Deputada Joana Mortágua,

do Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda.

A Sr.ª Diana Ferreira (PCP): — Sr.ª Presidente, permita-me que faça uma intervenção.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Não estava inscrita, Sr.ª Deputada, e por isso não lhe dei a palavra.

Em todo o caso, e porque ainda dispõe de 17 segundos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Diana Ferreira, do

Grupo Parlamentar do PCP.

A Sr.ª Diana Ferreira (PCP): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Gostaria de fazer duas observações muito

breves.

O PCP apresenta o projeto de lei porque considera manifestamente insuficientes as medidas que o Governo

apresentou nesta matéria e, até no que se refere ao apoio financeiro para pais e mães ficarem em casa com os

filhos, o que isto significa é perda de salário para estes trabalhadores, com a qual o PCP nunca concordou,

tendo apresentado alterações no sentido de garantir a remuneração a 100%, as quais foram rejeitadas nesta

Casa.

É preciso garantir respostas às famílias, no imediato. É preciso rever as mensalidades de forma a que reflitam

os rendimentos que as famílias têm, neste momento, havendo quebras no rendimento familiar, nomeadamente

nos salários. É preciso que os rendimentos sejam calculados em função dos rendimentos dos últimos dois meses

e não do IRS (imposto sobre o rendimento das pessoas singulares) do ano anterior, como, aliás, está estipulado.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Peço-lhe que conclua, Sr.ª Deputada, pois já excedeu largamente o seu

tempo.

A Sr.ª Diana Ferreira (PCP): — Estou mesmo a terminar, Sr.ª Presidente.

É preciso reduzir o valor das mensalidades. É preciso proibir a anulação de matrículas e a possibilidade de

haver penalizações sobre as famílias, bem como alargar as vagas nos acordos de cooperação.

É isto que o PCP propõe, estas são as soluções de que as famílias precisam e, se os grupos parlamentares

estão preocupados com as famílias, podem votar a favor deste projeto de lei.

Aplausos do PCP e do PEV.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Uma vez que a Mesa não regista mais inscrições, para encerrar este

debate, tem a palavra a Sr.ª Deputada Joana Mortágua, do Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda.

A Sr.ª Joana Mortágua (BE): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Esta medida que propomos é,

claramente, de emergência, desenhada para fazer face a uma situação de emergência provocada pela COVID-

19, uma crise que não afeta todos por igual, que não afeta todas as famílias por igual, mas que, certamente, nos

afeta a todos, em alguma medida. É, portanto, um projeto desenhado para impedir que as crianças fiquem

excluídas das creches e percam o acesso à vaga pelo facto de os seus pais terem perdido rendimentos por

causa da pandemia, sem que isso prejudique a sustentabilidade das instituições que detêm as creches, num

momento económico tão difícil.

Não é uma medida feita para proteger os lucros destas instituições, quando elas são privadas, nem é uma

medida desenhada para resolver os problemas estruturais do acesso das famílias às creches. É uma medida de

intervenção de emergência, e por isso saudamos os Deputados que demonstraram o seu acordo em relação à

necessidade de uma resposta de emergência para garantir o acesso destas crianças a estas vagas.

Porém, não podemos deixar de lamentar que o Partido Socialista traga novamente aquela que foi a

justificação do Primeiro-Ministro para não intervir nesta matéria: a de afirmar que o acesso das crianças à creche

é uma matéria de mercado, portanto, uma matéria de relações privadas, nas quais o Estado não deve interferir

e, por isso, o Estado não dá orientações sobre como se devem relacionar as famílias com as creches, mesmo

numa altura de crise em que está em causa o direito das crianças a frequentar estas creches. Ao afirmar que

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esta é uma matéria de mercado, o que o Governo diz é que se trata uma creche como se trata o pagamento de

um ginásio: quando as famílias podem pagar, pagam; quando não podem pagar, não pagam.

Ao ver o direito à creche como um direito da família e como um depósito de crianças, aquilo que acontece é

que o Estado apenas apoia, de forma caritativa, as famílias que não têm dinheiro para pagar as creches e

continua a ver a frequência das creches como uma questão opcional ou como um luxo para aqueles que o

podem pagar.

Do nosso ponto de vista, a frequência da creche é um direito da criança e, portanto, é uma matéria de serviço

público. Se há coisa que esta pandemia nos mostrou foi que defender, apostar e investir nos serviços públicos

é a única forma de defender os nossos direitos. Deixar os direitos destas crianças nas mãos dos privados —

neste caso, das creches ou de outras instituições — significa não ter nenhuma garantia de que não acontece

aquilo que aconteceu agora, que é a possibilidade de haver crianças excluídas, porque as suas famílias viveram

a tragédia do desemprego ou da perda de rendimentos.

Gostava de deixar a seguinte nota final: para além desta pandemia e para além desta resposta de

emergência, temos de ter a capacidade de entender que tem de haver um serviço público…

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Tem de concluir, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Joana Mortágua (BE): — Vou terminar, Sr.ª Presidente.

Como eu estava a dizer, tem de haver um serviço público de creches, não só para responder ao direito das

famílias, mas também ao direito de as crianças terem um desenvolvimento acompanhado, do ponto de vista

pedagógico e educacional, por educadoras com tutela pedagógica do Ministério da Educação, em instituições

públicas de educação de infância.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Passamos ao quinto ponto da ordem do dia, que consiste na apreciação,

na generalidade, dos Projetos de Lei n.os 341/XIV/1.ª (PCP) — Proíbe a distribuição de dividendos na banca,

nas grandes empresas e grupos económicos, 356/XIV/1.ª (PEV) — Regime excecional e temporário de proibição

de distribuição de dividendos para a banca, o setor financeiro, as grandes empresas e os grupos económicos e

362/XIV/1.ª (PAN) — Impede o pagamento de remunerações acionistas e de bónus por instituições de crédito e

por empresas que tenham recebido apoios públicos em virtude da situação epidemiológica provocada pela

doença COVID-19 (2.ª alteração do Decreto-Lei n.º 10-G/2020, de 26 de março).

Para abrir o debate e apresentar o projeto de lei do PCP, tem a palavra o Sr. Deputado Duarte Alves, do

Grupo Parlamentar do PCP.

O Sr. Duarte Alves (PCP): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Tantas vezes se tem ouvido, nos últimos

meses, que, perante esta crise da COVID-19, estamos todos no mesmo barco — é uma expressão que se usa

muitas vezes —, mas sabemos que a realidade não tem sido bem assim.

Ao mesmo tempo que os trabalhadores veem os seus rendimentos abruptamente reduzidos —

nomeadamente, devido a medidas como o layoff —,ou são ilegalmente despedidos, ao mesmo tempo que os

pequenos empresários fazem enormes esforços para as suas empresas poderem sobreviver, sem que os apoios

cheguem, temos tido vários exemplos de como os grandes grupos económicos mantêm as suas benesses

intocadas.

A EDP (Energias de Portugal), em plena pandemia, decidiu distribuir 694 milhões de euros aos seus

acionistas, acima do lucro da empresa, ou seja, descapitalizando-a.

Também a Galp, depois de ter distribuído 262 milhões de euros, que foram adiantados em setembro, não se

coibiu de aprovar a distribuição de mais 318 milhões de euros, já em abril, ao mesmo tempo que despede

trabalhadores com vínculos precários, com a conivência do Governo, que representou o seu segundo maior

acionista da Galp — o Estado português.

Tanto o Banco de Portugal como a CMVM (Comissão do Mercado de Valores Mobiliários) publicaram

recomendações para a não distribuição de dividendos, relativamente aos exercícios de 2019 e 2020. E diz o

Banco de Portugal: «para que as instituições mantenham a capacidade para absorverem potenciais perdas num

ambiente de incerteza» — é o Banco de Portugal que o diz.

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No entanto, já conhecemos os resultados deste modelo de supervisão, dita «independente», em que são

feitas «recomendações» que podem ser mais ou menos respeitadas pelos bancos e pelas empresas, com as

desastrosas consequências que conhecemos num passado recente.

Por outro lado, muito provavelmente será necessário estender esta medida para lá de 2020, contrariamente

ao que já foi anunciado por alguns bancos, que pretendem distribuir, em 2021, os dividendos deste ano.

A proposta que o PCP aqui apresenta visa, essencialmente, garantir que não há distribuição de dividendos

na banca, nas grandes empresas e nos grupos económicos.

No mesmo sentido, propomos que, no quadro atual, sejam proibidos bónus, comissões e gratificações a

gestores e membros dos órgãos sociais dos bancos e de outras grandes empresas.

Srs. Deputados, os próximos tempos vão requerer investimento. Investimento público, em primeiro lugar,

para relançar a economia e alavancar o investimento privado. Mas, para haver também investimento privado, é

preciso que as empresas não sejam descapitalizadas.

Foi isso que perceberam até países como a Alemanha ou a França, longe das nossas opções políticas, que

estão a criar mecanismos que impedem ou limitam a distribuição de dividendos e os prémios aos gestores. Por

cá, o Governo não teve ainda a coragem de avançar com essas medidas.

Esta proposta do PCP, a par de outras propostas de reforço dos apoios às micro, pequenas e médias

empresas, é parte da resposta que o País precisa de dar para enfrentar as adversidades do futuro próximo.

Enquanto não se garantir que setores estratégicos da economia estejam sob controlo público, ao serviço do

País e não dos lucros, pelo menos tem de se garantir que esses setores — hoje, nas mãos de privados, por

ação de diversos Governos do PS, do PSD e do CDS — não se descapitalizam, pondo em causa o futuro de

setores-chave da economia nacional, num contexto de grande incerteza no futuro próximo.

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para apresentar o projeto de lei do PEV, tem a palavra o Sr. Deputado

José Luís Ferreira.

O Sr. José Luís Ferreira (PEV): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A situação que estamos a viver

está a ter vários impactos, não apenas na saúde, mas também em termos económicos e sociais, provocando

uma desaceleração da economia, com consequências negativas e graves em múltiplos setores de atividade.

Perante este quadro, o Governo tomou um conjunto de medidas que, a nosso ver, não são apenas

insuficientes, como pecam ainda por, direta ou indiretamente, acabar por privilegiar as grandes empresas e os

grandes grupos económicos, em detrimento das micro, pequenas e médias empresas.

Dito por outras palavras, estas pequenas empresas, apesar de assumirem um papel absolutamente decisivo

na nossa economia, porque representam cerca de 99% do número total de empresas do nosso País, sendo

ainda responsáveis por 80% do total de emprego, acabam por ser prejudicadas, enquanto as grandes empresas

são, mais uma vez, beneficiadas.

Trata-se de uma situação repleta de injustiça e de imoralidade, sendo possível e até desejável adotar

algumas medidas com vista à sua correção e que procurem trazer ao sistema algum equilíbrio e alguma

moralidade.

Aliás, a opção do Governo em colocar a banca e o sistema financeiro como intermediário dos apoios às

empresas, ainda por cima atribuindo aos bancos o poder de decidir, de forma discricionária, quais as empresas

que têm acesso e quais as que não têm acesso às linhas de crédito, mesmo que essas empresas reúnam os

critérios legais, não representa apenas uma forma de aumentar os lucros da banca, através de apoios públicos

que deveriam servir para apoiar a atividade produtiva, mas representa ainda um conjunto de dificuldades para

as pequenas empresas, como seja a negociação das taxas de juros, spreads e outros encargos.

Estamos, assim, perante mais uma evidência de que a banca, mesmo numa situação excecional e extrema

como aquela que estamos a viver hoje em dia, não está a cumprir a sua função, que pode e que deve assumir

do ponto de vista da economia do País. Particularmente nesta fase excecional que vivemos, não é, a nosso ver,

minimamente aceitável que a banca, o setor financeiro ou os grandes grupos económicos continuem,

escandalosamente, a distribuir dividendos, ao mesmo tempo que uma parte considerável das famílias e das

empresas se depara com inúmeras dificuldades, até do ponto de vista da sua sobrevivência.

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Recorde-se, a este propósito, que o Banco de Portugal, como aqui já foi referido, emitiu um comunicado

chamando a atenção para a necessidade de as instituições de crédito desempenharem o seu papel no

financiamento da economia real e recomendando expressamente a essas instituições a não distribuição de

dividendos.

Ora, no entendimento do Partido Ecologista «Os Verdes», fará todo o sentido elevar essas recomendações

para um patamar vinculativo do ponto de vista legal, do ponto de vista jurídico. Ou seja, pretende-se, com esta

proposta, proibir a distribuição de dividendos e de outras remunerações acionistas a todas as instituições de

crédito, bem como estendê-las também às grandes empresas e aos grandes grupos económicos.

De facto, esta pandemia está a ter consequências negativas em todos os setores da economia e os

trabalhadores estão, desde o início, a sentir esses impactos, assim como muitas pequenas empresas estão a

enfrentar enormes dificuldades para manter os seus compromissos, não sendo, por isso, justo que as instituições

de crédito e as grandes empresas não sejam convocadas a contribuir para o equilíbrio da economia do País e

possam passar ao lado deste esforço e até lucrar com a crise e os mais prejudicados acabarem por ser sempre

os mesmos, os mais vulneráveis.

É, portanto, na perspetiva do Partido Ecologista «Os Verdes», altura para avançar de forma excecional e

temporária com esta medida, não permitindo qualquer tipo de aproveitamento com a crise que atravessamos,

porque, no mínimo, é imoral e incompreensível que, nestas circunstâncias e depois de tudo o que estamos a

viver, haja lugar a remunerações extraordinárias por parte dos administradores dessas empresas ou instituições

de crédito.

Por isso mesmo, Os Verdes propõem, através deste projeto de lei, a proibição da distribuição de dividendos

e de outras remunerações acionistas a todas as instituições de crédito, a todas as grandes empresas e aos

grandes grupos económicos.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para apresentar o projeto de lei do PAN, tem a palavra o Sr. Deputado

André Silva.

O Sr. André Silva (PAN): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: As medidas criadas pelo Governo

cumprem pela metade o que o PAN defendeu no que respeita a moratórias dos empréstimos às empresas e dos

créditos à habitação das famílias, uma vez que, na prática, são medidas que fazem com que a banca lucre à

conta da COVID-19, das empresas e das famílias. Isto porque, apesar de as moratórias darem no imediato um

balão de oxigénio às empresas e às famílias, a verdade é que, no final da moratória, haverá uma dupla

penalização para quem a ela tenha recorrido, porque os juros vão ficar a capitalizar no empréstimo. Ou seja, ao

fim de seis meses, os bancos vão ganhar mais do que ganhariam se não houvesse a suspensão do empréstimo.

Estas operações poderão render à banca, no seu conjunto, um lucro de 600 milhões de euros, o que

demonstra uma ganância desmedida da banca e uma subserviência total do Governo aos seus interesses.

Mas relembro que no mês passado, apesar dos lamentos de Rui Rio e de António Costa, e das afirmações

de que quereriam travar os lucros imorais da banca e assegurar a sua responsabilidade social, vimos o

Parlamento chumbar, com os votos contra do PS, do PSD, do CDS e do Iniciativa Liberal e a abstenção do

Chega, as propostas do PAN que visavam precisamente impedir a cobrança de taxas de juros no âmbito das

linhas de apoio à economia e impedir a dupla penalização das famílias e empresas que recorrem às moratórias.

Hoje, têm uma terceira oportunidade de mostrar que querem, de facto, travar as imoralidades da banca,

impedir a distribuição de dividendos a acionistas e o pagamento de chorudos bónus a administradores.

Com esta proposta do PAN, no caso de os bancos terem lucro, esse lucro deverá servir para assegurar a

viabilidade e a sustentabilidade da banca, por via do reforço da base de fundos próprios, ou seja, da almofada

financeira dos bancos.

A proposta do PAN vai ao encontro das recomendações feitas pelo BCE e pelo Ecofin (Conselho dos

Assuntos Económicos e Financeiros), que defendem a não distribuição de dividendos relativamente aos

exercícios de 2019 e 2020, de modo a assegurar a sustentabilidade da banca e a capacidade de financiar as

necessidades de liquidez da economia. Irão, o PS e o PSD, como partidos europeístas que são, seguir estas

recomendações e dar-lhes força de lei? Ou só são europeístas quando é para impor apertos de cinto aos

contribuintes ou para cortar na despesa pública?

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Relembro, ainda, que a recomendação do Banco de Portugal só proíbe a distribuição de dividendos para as

instituições de crédito menos significativas. Ficam, assim, de fora, os maiores bancos a operar em Portugal.

Estão ou não, o PS e o PSD, disponíveis para ir mais longe do que o Banco de Portugal?

Mas mais: é surreal que, relativamente às empresas que acedem ao layoff simplificado, o Governo tenha —

e muito bem! — proibido a distribuição de lucros, mas que depois, quanto à banca, que recebeu 25 000 milhões

de euros em apoios públicos nos últimos anos, nada regule ou limite quanto à distribuição de lucros.

Por fim, como para o PAN o dinheiro público não pode servir para financiar os ativos de acionistas,

administradores e gestores de empresas, propomos que todas as empresas que estejam a receber apoios

públicos neste momento, por exemplo, por via das linhas de apoio à economia, não possam, também, distribuir

dividendos aos acionistas ou pagar bónus a administradores e gestores. De resto, no caso do layoff, o Governo

proibiu — e bem! — a distribuição de lucros, mas esqueceu-se de proibir o pagamento de bónus a gestores e

administradores, omissão que o PAN também se propõe corrigir com esta proposta.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Cotrim de

Figueiredo, do Iniciativa Liberal.

O Sr. João Cotrim de Figueiredo (IL): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Karl Marx teria feito, ontem,

202 anos, se fosse vivo. Se fosse vivo… Quer dizer, ele continua vivo no espírito do PCP, do Bloco e de alguns

jovens, e não tão jovens, turcos do PS.

Tão vivo está que continuam a ver a História como uma eterna luta de classes. Só que agora, em vez de

classes sociais, aos comunistas, em particular, só interessam duas classes: a dos comunistas e do Estado, de

um lado, e a dos portugueses comuns, do outro.

É que o PCP quer proibir a distribuição de dividendos, se forem pagos aos portugueses comuns, mas, se

forem pagos ao Estado, já são permitidos. Porquê? Se for ao Estado já não é capitalista e exploração?

Protestos do Deputado do PCP Duarte Alves.

É uma proposta tão discriminatória e tão prejudicial ao funcionamento da economia que nem o Governo a

apoia, embora imagine que isso custe muito a alguns neomarxistas do PS!

Mas há mais exemplos desta nova luta de classes dos comunistas: os portugueses comuns devem acatar as

decisões dos tribunais, mas os comunistas já acham, e cito, «inaceitável» quando o Tribunal da Relação de

Lisboa condena o PCP a reintegrar um trabalhador ilegalmente despedido.

E todos assistimos ao que se passou no 1.º de Maio: os comunistas querem regras rígidas para os

portugueses comuns e privilégios para si próprios e para o Estado.

Nós temos chamado a este triste estado de coisas, na ótica liberal: «um país, dois sistemas». Na ótica

marxista, talvez fosse: «um país, duas classes».

Não aceitamos qualquer destas duas discriminações marxistas: todos os portugueses são iguais e todos os

portugueses têm os mesmos direitos, a começar no direito aos frutos do seu esforço.

O Sr. João Oliveira (PCP): — O Mouzinho da Silveira está cada vez mais moderno!

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Silva, do

Grupo Parlamentar do PSD.

O Sr. Carlos Silva (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: É por todos reconhecido que as medidas

dirigidas à economia são insuficientes. De resto, as que existem estão envoltas em burocracia e mecanismos

nos quais ninguém se entende, deixando as empresas estranguladas e as famílias em desespero à espera de

uma ajuda que não chega. Isto é fatual, não é retórica!

Consideramos que agiu como deve ser o Banco de Portugal, quando recomendou a não distribuição de

dividendos por parte da banca, até porque gerem depósitos dos portugueses e vão ser muito pressionados pelo

aumento do crédito malparado ao longo deste e do próximo ano. Além do mais, é justo que todo o capital

disponível no sistema financeiro seja alocado ao financiamento da economia real.

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Os bancos aceitaram essas recomendações e, como tal, as preocupações inscritas pelo PCP neste projeto

de lei estão ultrapassadas pelo tempo e pelas circunstâncias. Agora, é de todo injustificável a segunda parte do

projeto de lei, quando, do mesmo modo, propõem a proibição da distribuição de dividendos nas empresas do

setor não financeiro.

É bom recordar que foi o dinamismo da economia privada que alavancou decisivamente o impulso para que

Portugal saísse com sucesso e de forma limpa do processo de ajustamento da troica.

Se uma empresa é sustentável no médio e longo prazo, se a empresa tem uma almofada de capital que

permite fazer face aos tempos mais difíceis, se a empresa honra todos os seus compromissos com os

trabalhadores e com os fornecedores, se a empresa paga todos os seus impostos e obrigações para com a

segurança social, se a empresa não recebeu ajuda do Estado — repito, se não recebeu ajuda do Estado —, por

que carga de água vem a esquerda, numa atitude paternalista, criar uma espécie de sanção a empresas que

são sustentáveis, como desejaríamos que todas fossem, num país onde a poupança definha e o capital

escasseia?

Pena é não termos mais empresas e, lamentavelmente, não vislumbrarmos qualquer estratégia por parte do

Governo para inspirar a criação de novas empresas que acrescentem valor, que criem bom emprego, mais

qualificado, mais produtivo, mais bem remunerado e que ajudem a economia a tornar-se mais competitiva e a

criar riqueza para todos os portugueses.

Se a distribuição de dividendos é efetuada com responsabilidade social e critério, por que tem de ser o Estado

a interferir na liberdade individual da gestão privada, se não há razões para isso?

Não estranhamos esta atitude por parte da esquerda radical; estranhamos é que esta cegueira ideológica

também esteja instalada no Partido Socialista e com algumas ramificações no Governo, tendo como

consequência para Portugal o afastamento de possíveis investidores, retraindo a capacidade de investimento

das empresas.

Só se compreende um projeto de lei com estas características por pura fúria ideológica da esquerda na sua

obsessão de castigar o capital.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Queira concluir, Sr. Deputado.

O Sr. Carlos Silva (PSD): — Vou terminar, Sr.ª Presidente.

A esquerda está a tentar realizar um velho sonho, que é a nacionalização de todos os setores da economia

e com isso colocar os contribuintes portugueses a pagar os desmandos da vossa luta ideológica.

Não admitimos que o façam a pretexto da crise da COVID. Connosco não contam!

Aplausos do PSD.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Moisés Ferreira,

do Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda.

O Sr. Moisés Ferreira (BE): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Nas últimas semanas, muitos

trabalhadores perderam os seus rendimentos, muitos outros perderam o seu trabalho, o seu emprego, muitas

empresas foram forçadas a encerrar definitivamente as portas, muitas outras lutam pela sobrevivência e

sabemos que, nas próximas semanas, é preciso mobilizar todos os recursos do País para reconstruir a

economia, para proteger emprego, para criar investimento.

Ainda assim, no meio e perante tudo isto, há quem insista em viver acima das possibilidades do País, há

quem insista em distribuir dividendos milionários aos seus acionistas e há também, aqui, quem feche os olhos

e quem permita ou incentive a ganância desses acionistas.

Há já algumas semanas, a Assembleia da República debateu uma proposta do Bloco de Esquerda que incide

exatamente sobre isto: proibir a distribuição de dividendos na banca e nas grandes empresas. PS, PSD e a

restante direita chumbaram esta proposta.

Agradeceram os acionistas da EDP, que embolsaram mais 700 milhões de euros com essa votação, mas

sofreram todos os consumidores que precisavam de ver reduzido o valor na sua fatura e que não o tiveram no

final do mês. Num dia, 700 milhões de euros — 10 anos da tarifa social da energia!

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Agradeceram os acionistas da Galp essa votação dos Srs. Deputados do PS, do PSD e da restante direita,

porque embolsaram mais de 300 milhões de euros, mas sofreram as dezenas de trabalhadores precários que

foram, entretanto, despedidos pela Galp.

Quando se acha que a conta bancária de meia dúzia é mais importante do que a vida e o emprego de

milhares no País, presta-se um péssimo serviço ao País. E não é assim que se vai recuperar o País, podem ter

a certeza!

O Bloco de Esquerda votará novamente, e obviamente, pela proibição da distribuição de dividendos na banca

e nas grandes empresas. O que é preciso, neste momento, é que esse dinheiro seja aplicado em investimento

e na criação de emprego. O que é preciso é que este dinheiro fique cá e não seja distribuído por acionistas que,

muitas vezes, nem estão cá nem investem no País. O que é preciso é que este dinheiro seja financiamento para

as micro e pequenas empresas. É para aqui que os dividendos devem ser aplicados.

Nós bem sabemos que não é possível pedir decoro à ignorância — isso seria um exercício infrutífero, uma

vez que a ganância não tem qualquer tipo de decoro —, mas exige-se que aos Deputados desta nação seja

pedida responsabilidade. Responsabilidade para defender pessoas e não os grupos acionistas;

responsabilidade para defender o emprego e não os lucros de acionistas; responsabilidade para defender o País

e não os lucros de acionistas.

O Bloco não falha a isto!

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Queira concluir, Sr. Deputado.

O Sr. Moisés Ferreira (BE): — Vou concluir, Sr.ª Presidente.

Será que o PS, o PSD e a restante direita vão voltar a falhar ao País?

Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Cecília Meireles,

do Grupo Parlamentar do CDS.

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Creio que alguém que entrasse

hoje à tarde aqui e ouvisse esta discussão ficava convencido de que a grande solução para a crise era a de que

nenhuma empresa tivesse lucro.

Para grande parte dos Srs. Deputados, aparentemente, pelo que aqui vos ouvi dizer, se nunca mais nenhuma

empresa tiver lucro, se todas tiverem prejuízo e se nunca nenhuma distribuir dividendos, magicamente, todos

os problemas dos portugueses ficam resolvidos!

Com toda a franqueza, é uma visão curiosa que, atrevo-me a dizer, não levaria a que os trabalhadores

tivessem salários mais elevados; levaria, sim, todos os trabalhadores para o desemprego e para salários de

miséria, que é, aliás, para onde eles foram, sempre que os senhores tiveram oportunidade de pôr as vossas

teorias em prática no mundo, fosse onde fosse.

Já agora, gostava de lembrar alguns factos que se estão a viver em Portugal e para os quais estas propostas

contribuem zero.

Temos, Sr.as e Srs. Deputados, mais de 1 milhão e 200 mil trabalhadores em layoff e esses trabalhadores

vão receber, na melhor das hipóteses, 70% do seu salário, ou, por outra, iriam receber, porque, em relação a

900 000 trabalhadores, tudo o que sabemos é que a segurança social não processou os pedidos de layoff das

empresas. Por outro lado, temos o Banco Alimentar contra a Fome a dizer que recebeu 55 000 pedidos de

pessoas com fome.

Este Parlamento faz o quê? Discute um programa de emergência social? Não! Discute como é que a

segurança social pode passar a processar os pedidos para que as empresas e os trabalhadores não esperem

45 dias para saber se vão, ou não, ter salário? Não! Isso não faz! Discute, por exemplo, se seria mais sensato

o Estado criar apoios que passam pela banca ou se, pelo contrário, faria mais sentido que houvesse apoios

objetivos dados diretamente pelo Estado, com critérios simples, rápidos e práticos? Não! Aliás, nesta matéria

até chumbou o «cheque de emergência» que o CDS aqui propôs.

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Aquilo que esta Casa faz é discutir projetos que, sim, são um «número»; são um «número» para encontrar

culpados e, habilmente, desviar as culpas da incompetência do Governo e, basicamente, assim fingir que

resolvem os problemas para não resolverem problema algum.

Srs. Deputados, para «números» acho que já chega aquilo que chega!

Em relação ao projeto de lei do PAN, que tem um detalhe em que equipara as remunerações e os bónus de

administradores à distribuição de lucros, o que me parece uma equiparação que faz sentido, gostava de lhe

perguntar, já que estamos a falar dos lucros que a banca vai ter — e, Sr.as e Srs. Deputados, espero que daqui

a um ou dois anos possamos estar aqui a discutir os lucros da banca, porque a suspeita seriíssima que tenho

neste momento é a de que vamos estar a discutir os prejuízos, e lembro aos Srs. Deputados que ainda estamos

a pagar prejuízos da banca —, se também propõe o mesmo para a garantia mútua, sim, porque parte dos

encargos que as empresas pagam são para as sociedades de garantia mútua.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Queira concluir, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Gostava ainda de lhe perguntar o que acha de a entidade coordenadora

do Sistema Português de Garantia Mútua ser, sobretudo, participada pelo IAPMEI (Instituto de Apoio às

Pequenas e Médias Empresas e à Inovação) e, já agora, se vai fazer alguma pergunta ao Governo ou se entende

que os bancos vão continuar a ser os culpados, porque se põem a jeito, e para os senhores tudo o que o Governo

faz está bem.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para uma intervenção tem a palavra a Sr.ª Deputada não inscrita Joacine

Katar Moreira.

A Sr.ª Joacine Katar Moreira (N insc.): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: As medidas avançadas pelo

Governo têm, sobretudo, privilegiado os grandes grupos e as grandes empresas, em detrimento das micro,

pequenas e médias empresas. Isto é, naturalmente, incompreensível, especialmente numa altura em que grande

parte da população — trabalhadores e trabalhadoras de micro e de pequenas empresas — se depara com

inúmeras dificuldades e com imensos problemas de liquidez.

É incompreensível e inaceitável que a banca e o setor financeiro, neste ambiente, continuem a distribuir

dividendos. As recomendações do Banco de Portugal de não distribuição de dividendos nas instituições de

crédito merecem todo o nosso apoio e devem, igualmente, ser alargadas às grandes empresas.

Neste sentido, estas iniciativas legislativas merecem o meu voto favorável.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado André Ventura, do

Chega.

O Sr. André Ventura (CH): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Ficamos com a ideia de que uma parte da

esquerda parlamentar não leu os projetos que estão aqui em causa, porque não é da banca que se trata. Quem

lesse os projetos de lei do PCP e de Os Verdes perceberia que se fala em banca, em grupos económicos, em

empresas, no setor financeiro… Ou seja, no fundo, vamos proibir a distribuição de todos os dividendos. De

todos! É assim que tratam das coisas: mais impostos, menos dividendos!

Protestos do Deputado do BE Jorge Costa.

É este o espírito que a esquerda traz para o nosso País!

Independentemente de terem, ou não, recebido ajudas do Estado, independentemente de estarem, ou não,

a despedir, independentemente de terem, ou não, cumprido as suas obrigações fiscais, é «ganância», diz o Sr.

Deputado Moisés Ferreira! Sabe o que está a dizer quem está lá fora, Sr. Deputado? «Ganância a sua! Ganância

a sua!» Lá fora, podem estar a dizer-lhe o mesmo.

Protestos do BE.

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Lá fora, longe destas câmaras, podem estar a dizer-lhe, por exemplo: «Abdique do seu salário!»

O Sr. Jorge Costa (BE): — Tenha vergonha! Aldrabão!

O Sr. André Ventura (CH): — E o Sr. Deputado fecha-se, senta-se, e diz assim: «Não vou falar sobre…»

Protestos do BE.

Dos meus dois, três… Abdicaria de todos.

Continuação de protestos do BE.

Mas, lá fora, os portugueses olham para isto e dizem: «Não se pode distribuir dividendos, não se pode pagar

ao setor financeiro, aos grupos económicos. Que esquerda é esta, que parece trazer-nos de volta para um

mundo qualquer que desapareceu há 60 ou 70 anos?!» É o mesmo que dizer: regras para os outros, não regras

para nós!

Protestos do BE.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Peço-lhe que conclua, Sr. Deputado.

O Sr. André Ventura (CH): — Vou terminar, Sr.ª Presidente.

Meus Amigos, muitas destas empresas sustentam a economia do País, sustentam-nos, a nós, sustentam o

povo português, que também vive disso. Deveriam perceber isso antes de falarem destas empresas!

O Sr. Jorge Costa (BE): — Tem dois salários!

O Sr. André Ventura (CH): — Abdicas do teu?! Se abdicares do teu, abdico do meu, já! É preciso teres

coragem para isso!

O Sr. Jorge Costa (BE): — Aldrabão!

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Sr. Deputado André Ventura, agradeço que guarde silêncio, pois o seu

tempo de intervenção já terminou há muito.

Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Paulo Correia, do Grupo Parlamentar do PS.

O Sr. João Paulo Correia (PS): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Estamos aqui a debater a vida

das empresas e o Grupo Parlamentar do PS gostaria de deixar uma palavra de enorme reconhecimento aos

empresários, às empresas e aos seus trabalhadores, que tudo têm feito para preservar a vida e a atividade das

respetivas empresas e também perspetivando um futuro com confiança. O País e a economia precisam muito

desse espírito e desse esforço das empresas e dos seus trabalhadores.

Gostaria de começar por dizer que, neste como em qualquer outro contexto, o Partido Socialista valoriza a

iniciativa privada. Mas neste contexto em particular reconhecemos que é importante estabelecer limitações e

condicionantes, e isso já está em vigor. Com a medida do layoff, todas as empresas que aderem ao layoff

simplificado já estão impedidas de distribuir dividendos ou outras formas de remuneração aos seus acionistas

ou sócios. As mais de 100 000 empresas que aderiram ao layoff simplificado já estão impedidas de o fazer.

Se olharmos para as recomendações do Banco Central Europeu para com os maiores bancos que operam

em Portugal… Há pouco, o PAN disse que havia bancos que estavam fora da esfera do Banco de Portugal e,

portanto, fora das recomendações do Banco de Portugal, o que é verdade, mas estão dentro do perímetro das

recomendações do Banco Central Europeu. São bancos que não são supervisionados pelo Banco de Portugal,

atendendo à sua grandeza, mas são supervisionados pelo Banco Central Europeu, que foi claro ao recomendar

a não distribuição de dividendos a todos os bancos supervisionados por si.

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O Banco de Portugal fez o mesmo e alguns bancos que operam em Portugal e bancos portugueses já

anunciaram que não vão distribuir dividendos. A Caixa Geral de Depósitos, o Santander, o BCP, já anunciaram

que não vão distribuir dividendos.

Para além disto, a própria Autoridade de Supervisão de Seguros e Fundos de Pensões também fez as

mesmas recomendações e, portanto, as seguradoras, que são grandes empresas, grandes grupos económicos,

também não vão distribuir dividendos.

O que é que poderá ficar de fora deste perímetro de empresas e de grandes empresas do setor financeiro?

Quais as empresas que ficam de fora? Certamente um conjunto de empresas em Portugal que não aderiram ao

layoff, que não são do setor financeiro nem do setor segurador, mas são empresas que, obviamente, vão ter

cautelas, porque este ano que estamos a viver é um ano em que a atividade económica vai decrescer

brutalmente, de forma nunca vista, e é um ano em que as empresas vão ter de constituir mais reservas, mais

provisões, vão necessitar de fundos para cobrir os prejuízos neste mundo de incertezas.

Protestos do PCP.

Portanto, estar à espera que as empresas venham a ser irresponsáveis, distribuindo dividendos ou lucros

como se nada se estivesse a passar, é uma visão curta com a qual não pactuamos.

Protestos do PCP.

Por isso, deixamos bem claro que concordamos que as empresas que recebem apoio do Estado não devem

distribuir dividendos, e isso está a acontecer através do layoff simplificado. O setor financeiro não deve distribuir

dividendos, e isso está a acontecer através das recomendações do Banco Central Europeu e do Banco de

Portugal. As seguradoras são grandes empresas e não devem distribuir dividendos, e isso está a acontecer por

recomendação da Autoridade de Supervisão de Seguros e Fundos de Pensões.

Portanto, achamos que generalizar a proibição da distribuição de dividendos pode ser um ataque à iniciativa

privada com prejuízos ainda maiores, iniciativa privada da qual muito precisamos que floresça com grande

confiança nos próximos tempos.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para encerrar este debate, tem a palavra o Sr. Deputado Duarte Alves,

do Grupo Parlamentar do PCP.

O Sr. Duarte Alves (PCP): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Muito obrigada pelas várias intervenções

proferidas.

Relativamente às questões colocadas no que diz respeito às medidas para as micro, pequenas e médias

empresas, a intervenção do PCP fala por si: o conjunto de propostas que temos feito sobre essa matéria, muitas

delas foram já rejeitadas por parte de PS, PSD e CDS, seriam medidas muito importantes de ajuda às micro,

pequenas e médias empresas.

O nosso projeto é bem claro: distingue as micro, pequenas e médias empresas das grandes empresas, que

ficariam impossibilitadas de distribuir lucros, se este projeto fosse aprovado.

E, sim, Sr. Deputado João Cotrim de Figueiredo, excecionamos o Estado desta questão sobre a distribuição

de dividendos, porque o cidadão comum, de que o senhor falou, é aquele que utiliza o SNS, que utiliza a escola

pública e, portanto, esses dividendos que vão para o Estado vão financiar esses serviços públicos, não vão para

os acionistas, que ninguém conhece, dos grandes grupos económicos. É aí que está a diferença entre o cidadão

comum que defende o PCP e os cidadãos que são defendidos pela Iniciativa Liberal.

Aplausos do PCP e do PEV.

Relativamente à posição do PSD, ficou já clara, mais uma vez, a sua incoerência, depois de o Sr. Deputado

Rui Rio ter dito que «a banca não pode querer ganhar dinheiro com a crise», «isto tem de ficar claro», «o objetivo

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da banca tem de ser lucro zero», mas, sempre que há uma iniciativa legislativa que prevê essa proibição, a

posição do PSD é exatamente a contrária.

O PSD diz que confia nas recomendações do supervisor, tanto do Banco de Portugal como da CMVM, o PS

também o referiu, mas o problema que temos tido nos últimos anos é este próprio sistema de confiança cega no

sistema de supervisão dita «independente». Os Governos confiam nos supervisores, os supervisores confiam

nos auditores, os auditores confiam nos administradores que, por sua vez, têm a confiança dos acionistas. Toda

a gente confia cegamente uns nos outros e o que acaba por acontecer é a situação que tivemos nos anos

passados: problemas devidos à má gestão, não só na banca como noutros setores.

Relativamente ao que também foi dito pelo PSD, de que é possível, sim, distribuir lucros com

responsabilidade, perguntamos: qual é a responsabilidade de uma empresa como a EDP, que distribui

dividendos acima dos seus lucros? Ou da Galp, que distribui dividendos, apesar de estar a despedir

trabalhadores com vínculos precários? Ou qual é a responsabilidade de grupos da imprensa, que dizem que o

apoio do Estado não é suficiente, mas preparam-se também para distribuir dividendos?

Quando falamos em responsabilidade é isto que se passa em grande parte das grandes empresas deste

País.

Portanto, esta é, por um lado, uma questão de justiça, porque não é aceitável que os trabalhadores e os

pequenos empresários paguem a fatura do confinamento, enquanto os grandes grupos económicos fiquem

intocados nos seus lucros e rendas, mas também é uma questão de prudência e de preparação do País para

um futuro incerto.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Tem de concluir, Sr. Deputado.

O Sr. Duarte Alves (PCP): — Termino já, Sr.ª Presidente.

É verdade que PS, PSD e CDS entregaram setores estratégicos do País a grupos privados, mas esses

grupos não podem agora distribuir dividendos e pôr em causa setores estratégicos como, por exemplo, o da

energia, que pode ficar descapitalizado, com graves consequências para o futuro do País.

Por isso é importante defender o fim da possibilidade da distribuição de dividendos, sobretudo aos grandes

grupos económicos.

Aplausos do PCP e do PEV.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Sr.as e Srs. Deputados, concluímos o ponto cinco da ordem de trabalhos

de hoje.

Vamos passar ao ponto 6, com a discussão do Projeto de Resolução n.º 397/XIV/1.ª (CDS-PP) — Criação

do «cheque emergência» para as micro e pequenas empresas cuja atividade se suspendeu.

Para apresentar o projeto de resolução do CDS-PP, tem a palavra o Sr. Deputado João Gonçalves Pereira.

O Sr. João Gonçalves Pereira (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O CDS traz hoje a

debate um projeto de resolução para a criação de um «cheque de emergência» para as micro e pequenas

empresas cuja atividade se mantém suspensa.

No momento em que propomos esta iniciativa, é exatamente o momento em que sabemos que as micro e

pequenas empresas estão com enormes dificuldades de acesso às linhas de crédito COVID. Apenas 3% destas

empresas conseguiram aderir a estas linhas de crédito, o que significa que existe um enorme problema para

estas empresas.

Este «cheque de emergência» pode chegar até aos 15 000 € a fundo perdido. Esta é uma medida de apoio

à economia e à tesouraria das empresas. Aliás, ainda nesta semana o Governo veio propor algo parecido, algo

idêntico: um apoio, a fundo perdido, entre 500 € e 5000 €.

O caricato é que, quando vamos ver qual o tipo de requisitos que as empresas necessitam ter para aderir a

esses apoios, percebemos que as regras são muitas, é tudo muito complicado, tudo muito poucochinho, diria

eu.

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O CDS compreende a dificuldade de governar em tempos de crise. Infelizmente, a direita teve de o fazer

ainda bem recentemente e, por isso, não tentaremos, ao longo deste período, retirar ganhos políticos, fazendo

aquilo que não gostámos que nos tivessem feito no passado.

Mas uma coisa é certa: este Governo anuncia uma coisa e gasta outra. Dou-vos o exemplo do layoff, que

começou como simplificado e acabou como complicado.

Tivemos, neste Parlamento, o Ministro Mário Centeno, que, a 16 de abril, dizia que previa ter um milhão e

meio de trabalhadores em layoff e uma despesa de mais de 1000 milhões de euros. A realidade hoje é que há

menos de meio milhão de trabalhadores em layoff e o Governo apenas teve de gastar qualquer coisa como 200

milhões de euros, ou seja, um quinto do que estava previsto. E nós dizemos que algo aqui está errado e está a

penalizar milhares e milhares de empresas. Já sabíamos que havia uma marca pré-COVID deste Governo, que

eram as cativações. Será que este Governo, em pleno período de COVID, está a fazer cativações nos apoios

às empresas? Se sim, isso é algo de muito grave. É bom que tenhamos todos a noção de que o dinheiro que

não for gasto hoje é dinheiro que será gasto amanhã, por via das insolvências, no desemprego. Se aquilo que

o Governo anunciava, e anuncia, fosse concretizado nas respetivas datas, muitos dos problemas, muitos dos

debates que aqui temos, não os teríamos, seguramente.

Sr.as e Srs. Deputados, as alturas de crise são também momentos de clarificação sobre as discussões que,

muitas vezes, temos e que são muito mais retóricas do que propriamente ideológicas e verdadeiras. Nenhum

partido em Portugal defende a anulação do Estado, muito menos o CDS; nenhum partido em Portugal é contra

a existência de empresas e de trabalhadores, muito menos o CDS. É importante lembrar que desde a fundação

da democracia em Portugal que se escolheu um modelo económico: o modelo da economia social de mercado.

Esta economia social de mercado deriva de uma saudável convivência entre o empreendedorismo do setor

privado e as preocupações sociais e reguladoras do Estado.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Sr. Deputado, tem de concluir, por favor.

O Sr. João Gonçalves Pereira (CDS-PP): — Vou já terminar, Sr.ª Presidente.

Estas duas dimensões não são contrastantes, apoiam-se uma na outra.

Por isso — para terminar e agradecendo a sua tolerância, Sr.ª Presidente —, na COVID e no pós-COVID, o

Estado deve proteger a dimensão do empreendedorismo do setor privado e, simultaneamente, a dimensão

social e reguladora do Estado. Só assim sairemos da crise.

Aplausos do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Cotrim de

Figueiredo, da Iniciativa Liberal.

O Sr. João Cotrim de Figueiredo (IL): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Esta crise sanitária levou

ao encerramento compulsivo, por decisão do Governo, de dezenas de milhares de micro e pequenas empresas.

Para salvaguarda da saúde de todos, estas empresas acataram esta decisão, colocando em risco a sua

subsistência e os empregos que asseguravam. Agora que essas empresas terão oportunidade de retomar a sua

atividade, ainda que muito gradualmente, importa garantir que o sacrifício que foram obrigadas a fazer não

resulta na impossibilidade de aproveitarem essa oportunidade.

Porque as receitas e a faturação que não tiveram não serão recuperadas, porque os custos fixos que

continuaram a suportar não serão recuperados, porque os stocks e o fundo de maneio que se perderam ou

deterioraram terão de ser repostos, porque o capital que foi consumido já não existe para poderem investir e

porque para todas, sem exceção, a situação de tesouraria constitui uma enorme preocupação, por tudo isso, e

para compensar muito parcialmente este esforço que tantas micro e pequenas empresas fizeram para ajudar o

País a conter a epidemia, iremos votar favoravelmente este projeto de resolução que prevê a atribuição de um

apoio de tesouraria a fundo perdido.

Já sei que haverá quem venha dizer que, em alturas de aperto, os liberais esquecem os seus princípios e

defendem apoios do Estado. Pois estão enganados.

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Se calhar, prefeririam que defendêssemos que o Estado pudesse proibir o exercício da atividade económica

— neste caso, por atendíveis motivos de saúde pública e em nome do bem comum, como é evidente — sem se

preocupar em compensar minimamente o sacrifício que decretou.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Tem de concluir, Sr. Deputado.

O Sr. João Cotrim de Figueiredo (IL): — Vou concluir, Sr.ª Presidente, dizendo que, mais uma vez, mesmo

em situação de emergência, somos coerentes. Defendemos o interesse das pessoas e, neste caso, defendemos

também o interesse das empresas em que elas trabalham.

As micro, pequenas e médias empresas ajudaram no combate à doença e cabe agora ao Estado, que não

aliviou impostos nem lhes simplificou a vida, ajudá-las a recomeçar. E o Estado, se não serve para isso, Sr.ª

Presidente, serve para quê?

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Hugo de Carvalho,

do Grupo Parlamentar do PSD.

O Sr. Hugo Martins de Carvalho (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Face a uma das maiores

crises que vivemos, todos, incluindo os adeptos da antipolítica e do populismo, reconheceram o papel do Estado

na preservação do bem-estar social. No momento de proteger vidas, mas também de proteger empregos, de

proteger os rendimentos e a economia, o Governo virou-se para esses cidadãos, para essas famílias e para

essas empresas, pedindo-lhes que combatessem o coronavírus em conjunto.

Pode estar para vir, sim, o apoio às empresas sobre o qual versa esta iniciativa, porque o que houve até

agora foi um apoio social à manutenção de rendimentos das pessoas; um apoio, aliás, feito nos ombros das

empresas a que o Governo pediu que, face a uma quebra nas suas receitas, adiantassem, ainda assim, os

salários dos seus trabalhadores para que, mais tarde, o mesmo Governo viesse a falhar no prazo para as

reembolsar.

Propusemos que esses pagamentos fossem feitos diretamente às pessoas, mas o Governo decidiu pedir aos

empresários para os irem adiantando. Estes são os mesmos empresários que, sendo sócios-gerentes, o

Governo tratou de acordo com uma qualquer cartilha partidária, pedindo a pessoas com pequenos restaurantes

ou pequenos comércios para fecharem portas, adiantarem o salário dos seus trabalhadores e irem para casa

sem direito a nada, apenas porque gerem um pequeno negócio. Foi assim que, tendo tido o tempo e o espaço

dado pela oposição, nomeadamente, o Governo tratou gerentes de empresas que ajudaram o País e que agora

ficam, mais uma vez e sem surpresa, em casa à espera.

Na hora de recuperar a economia, temos todos de nos virar para as empresas, e é preciso reconhecer que

muitas continuaram a trabalhar. Existe no nosso tecido empresarial a vontade de recuperar, assim valha a pena.

Mas, nessa missão, o Governo não pode ter umas soluções para quem tem mais poder de reivindicação e outras

para quem tem menos, não pode ter medidas para todos, quando elas são absorvidas apenas por uns quantos.

É por isso que me arrisco a dizer que as empresas precisam agora do mesmo de que sempre precisaram:

que o Governo as ajude a respirar, para que se possam reinventar num novo normal que a economia nos vai

impor, em vez de continuar a asfixiá-las em dívida, em burocracia e sempre — sempre! — em mais e mais

impostos.

É por isso que precisamos de medidas ágeis, direcionadas à capitalização das empresas, e que devemos

partilhar o seguinte critério: os apoios devem ser dados pelo Estado a quem mais precisa e, portanto, devem

ser dados de forma justa, mas, por uma vez, de forma célere, para que se possa ajudar quem quer trabalhar.

Aplausos do PSD.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Pires, do

Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda.

A Sr.ª Isabel Pires (BE): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados e Sr.as Deputadas: Na verdade, neste ponto,

acabamos por voltar um pouco ao debate que já fizemos num ponto anterior e que, de facto, é muito relevante.

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O Parlamento tem tido oportunidade de debater com vários ministros e com o Primeiro-Ministro aquilo que é

mais relevante neste momento, que é a resposta à crise económica e social que se segue, que vai de braços

dados com uma resposta sanitária à crise pandémica que temos pela frente. Isto significa que, como já dissemos

anteriormente, quanto mais cedo tomarmos medidas corajosas de apoio àqueles que mais necessitam, do ponto

de vista económico e social, mais fácil será a resposta da retoma económica, daqui a alguns meses.

Sobre esta matéria, ou seja, sobre o que está em causa com a proposta que o CDS nos traz neste ponto,

quero lembrar, tal como lembrei ao PSD na minha intervenção anterior, que, há algumas semanas, já tivemos a

oportunidade de aprovar neste Parlamento uma medida que tinha que ver, precisamente, com apoios diretos às

empresas, com o número de trabalhadores de cada empresa, no caso das micro e pequenas empresas, mas

que, infelizmente, foi chumbada.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Bem lembrado!

A Sr.ª Isabel Pires (BE): — À semelhança do debate anterior, o que importa clarificar para estes

microempresários e para os sócios-gerentes é a razão por que estas medidas não foram aprovadas mais cedo.

Ora, elas não foram aprovadas mais cedo porque a direita se recusou a aprová-las.

Estas medidas têm de ir lado a lado com outras que estarão em votação amanhã e que têm a ver com os

custos fixos, que pesam muito, especialmente nas micro e pequenas empresas, como é o caso dos preços da

energia, dos seguros automóveis e outros. Lado a lado com estas medidas de apoio direto, é preciso avançar

também com a defesa do salário e com o apoio direto para o pagamento do salário destas micro e pequenas

empresas.

Portanto, o que queria perguntar ao Sr. Deputado do CDS vem no mesmo sentido do que questionámos

anteriormente: o que é que vai dizer aos milhares de sócios-gerentes de micro e pequenas empresas, que já

poderiam ter estas medidas aprovadas há semanas e não as têm, porque houve uma recusa de uma maioria

neste Parlamento em aprovar essas mesmas medidas?

O Sr. João Gonçalves Pereira (CDS-PP): — Isso não é verdade!

A Sr.ª Isabel Pires (BE): — Da nossa parte, temos uma proposta que estará em votação amanhã, a qual

esperamos que seja aprovada para, finalmente, estas pessoas e estas micro e pequenas empresas terem a

resposta que já deveriam ter tido há semanas.

Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Bruno Dias, do

Grupo Parlamentar do PCP.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Ao ler o projeto de resolução que o CDS

agendou para este debate, fica claramente evidenciada a ideia de que esta iniciativa há de ser muito mais

importante para o CDS do que para as micro e pequenas empresas. Estamos perante uma proposta que nada

garante nas soluções necessárias para este tecido económico, numa altura em que, mais do que nunca, é

preciso decidir de forma rápida, acertada e eficaz sobre o apoio a estes setores.

O PCP apresentou, na Assembleia da República, propostas concretas para medidas de apoio às micro e

pequenas empresas e aos empresários em nome individual, para fazer face a esta situação. Haverá, esperamos,

oportunidade para debater essas novas propostas legislativas do PCP: a criação do apoio ao rendimento dos

microempresários, a atribuir em função do rendimento de 2019 e de forma proporcional às perdas pelo

encerramento de atividade ou perda de trabalho, dando resposta à situação de milhares e milhares de

microempresários e empresários em nome individual que estão excluídos dos apoios em vigor; a garantia de

que ninguém pode ser limitado no acesso a linhas de crédito, layoff ou outra qualquer ajuda ou apoio por motivo

de incumprimentos ou incidentes bancários; a criação de uma rede de contacto e apoio a microempresários e

empresários em nome individual, destinada a assegurar o esclarecimento e a orientação no acesso às medidas

de apoio no contexto das respostas públicas à epidemia por COVID-19, através de linha de atendimento

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telefónico, sítio na internet e gabinetes de apoio destinados ao atendimento presencial; a possibilidade de

suspender, durante esta situação excecional, os contratos de fornecimento dos serviços de energia e de

comunicações eletrónicas para que sejam retomados a curto prazo, mas sem penalizações ou perdas

contratuais, evitando situações de incumprimento ou acumulação de dívidas; a suspensão temporária do

pagamento por conta de IRC (imposto sobre o rendimento das pessoas coletivas) para micro, pequenas e

médias empresas e cooperativas e a definição de um prazo de 15 dias para a devolução de IVA (imposto sobre

o valor acrescentado), IRC e IRS, para além de outras medidas de apoio ao nível fiscal.

São propostas objetivas, concretas e eficazes, no plano legislativo, que o PCP apresenta como solução para

problemas concretos que as micro e pequenas empresas estão a atravessar.

Para já, o melhor que o CDS consegue apresentar é uma proposta sem tradução concreta, sem efeito prático

do ponto de vista legal, que serve mais para publicidade enganosa do que para responder aos problemas

concretos das micro e pequenas empresas.

Não será por nós que hão de faltar as propostas de apoio à economia portuguesa, mas não podemos deixar

de sublinhar que é preciso dar ao País uma resposta muito diferente desta que temos agora pela mão do CDS.

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Ricardo Leão, do

Grupo Parlamentar do PS.

O Sr. Ricardo Leão (PS): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: As pequenas e microempresas têm

uma importância decisiva no nosso tecido empresarial. Somos dos países da União Europeia onde o seu peso

é mais elevado, constituído na sua maioria por pequenos negócios e mesmo por situações de criação do próprio

emprego, representando quase todos os setores da nossa economia.

Com o início desta pandemia, muito deste pequeno comércio teve de encerrar. Nenhum país, nenhum

Governo, nenhuma empresa estava preparado para esta realidade do ponto de vista do seu impacto, quer na

saúde pública, quer nas respetivas economias.

No entanto, hoje enfrentamos esta crise em condições bem diferentes de momentos anteriores. Portugal teve

o seu primeiro excedente orçamental em 2019, um crescimento robusto, assente em vários setores, que traduziu

a aposta que o País fez nos últimos anos no seu principal ativo, que são as pessoas e os trabalhadores, muito

esquecidos, aliás, na recente intervenção do PSD.

Tem sido, por isso, determinante a capacidade de resposta do Governo no atual esforço de tesouraria do

Estado, através da criação e implementação de um conjunto de medidas, num tão curto espaço de tempo, em

prol da tesouraria das empresas para, com isso, continuar a assegurar o rendimento das famílias e a capacidade

produtiva do País e para que, assim, sintam o menor impacto possível em resultado desta crise.

Entre outras medidas, destaco a do acesso das empresas ao apoio extraordinário à manutenção de contratos

de trabalho (regime de layoff simplificado), que prevê um apoio financeiro extraordinário atribuído à empresa,

por trabalhador, destinado exclusivamente ao pagamento de remunerações. As empresas que beneficiem deste

apoio terão ainda direito a receber um incentivo financeiro extraordinário para apoio à retoma da atividade da

empresa, pago de uma só vez e com o valor de 635 € por trabalhador, tratando-se, assim, de um apoio concedido

à própria empresa a fundo perdido.

Destaco ainda medidas como a do acesso das empresas às linhas de crédito criadas pelo Governo, com

vista a financiarem em melhores condições as suas necessidades de fundo de maneio e de tesouraria, como,

por exemplo, o pagamento de salários, ou como a recentemente apresentada pelo Governo, dentro do atual

quadro de abertura faseada da nossa economia, no sentido de apoiar as microempresas, em particular, no

esforço de adaptação e de investimento nos seus estabelecimentos face às novas condições em contexto da

pandemia de COVID-19, uma medida que, aliás, se traduz num apoio de 80% das despesas elegíveis, com um

limite de 5000 €.

Assim, a presente iniciativa do CDS apenas difere de outras em debate no sentido em que prevê um montante

fixo máximo por empresa, não densificando as condições aplicáveis e podendo, inclusivamente, ser menos

vantajosa para a empresa e para os respetivos trabalhadores, consoante o número de trabalhadores por

empresa.

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A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Tem de concluir, Sr. Deputado.

O Sr. Ricardo Leão (PS): — Termino já, Sr.ª Presidente.

Por fim, o Grupo Parlamentar do PS está plenamente convicto de que o Governo continuará a fazer a sua

parte, a acompanhar a evolução da atividade económica em permanência e a trabalhar no reforço do apoio às

nossas empresas, em particular às micro e pequenas empresas.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Cristina Rodrigues,

do Grupo Parlamentar do PAN.

A Sr.ª Cristina Rodrigues (PAN): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados e Sr.as Deputadas: A propagação do

novo coronavírus, para além de representar uma crise de saúde pública, terá enormes impactos sociais e

económicos no nosso País, que teremos de ser capazes de enfrentar.

As micro, pequenas e médias empresas, em Portugal, representam cerca de 99,9% do tecido empresarial, o

que significa que as medidas de apoio a estas empresas têm de ser a nossa prioridade nos apoios à economia.

De resto, são estas também as que mais dificuldades têm sentido, sofrendo abruptas quedas de volume de

negócios e não conseguindo fazer face às obrigações fiscais e salariais nos meses de março e abril. Muitas

empresas temem mesmo que, sem um apoio para as necessidades de tesouraria, não consigam chegar ao fim

do mês de maio.

Contrariamente a outras crises do passado, em que a receita passava por incentivos ao consumo, esta crise

económica causada pelo novo coronavírus só pode resolver-se por via de injeções de capital na economia. Só

assim podemos garantir de forma direta a liquidez do tecido produtivo e assegurar o respeito pelos direitos

laborais, ao mesmo tempo que importa implementar medidas de apoio social que colmatem as perdas de

rendimento das famílias.

A injeção direta de capital nas empresas foi recomendada até pelas instituições europeias, mas exige

compensações orçamentais. Essas compensações podem passar por mecanismos de mutualização de dívida,

mas também por opções orçamentais capazes de afrontar certos interesses instalados, o que inclui a

recuperação dos milhões de euros em impostos perdidos anualmente para paraísos fiscais ou o fim dos apoios

públicos à banca.

A proposta que o CDS nos traz hoje apresenta uma espécie de rendimento básico incondicional para as

micro, pequenas e médias empresas, uma vez que o que está em jogo é uma subvenção que nem sequer exige

uma quebra do volume de negócios e que é atribuída a todas as empresas que não tenham tido prejuízo nos

últimos dois exercícios.

Perante tal proposta generosa, não podemos deixar de lamentar que o CDS tenha rejeitado propostas

apresentadas pelo PAN, no mês passado, que asseguravam apoio imediato às empresas e que não custariam

um cêntimo ao País. É o caso da proposta do PAN que impedia a cobrança de juros e comissões no âmbito das

linhas de apoio à economia ou de uma outra que impedia a dupla penalização das empresas que pedissem

moratórias dos seus créditos.

Parece que a grande preocupação do CDS é marcar a agenda mediática e não assegurar, de facto, a liquidez

às empresas, preferindo que a banca lucre à conta das dificuldades que a COVID-19 gerou. Em suma, a

proposta gera dúvidas quanto aos critérios de atribuição do referido «cheque», além de se desconhecer qual a

forma de financiamento do mesmo.

O que deverá resultar claro desta discussão é que é absolutamente necessário que, por um lado, o Governo

tome diligências para assegurar que o dinheiro das linhas de apoio à economia e do regime de layoff simplificado

chegue o mais depressa possível às empresas e que os empréstimos das linhas de apoio à economia não

estejam sujeitos a juros e comissões impostos pela banca e, por outro lado, haja um esforço para assegurar a

desburocratização e simplificação de todos os mecanismos de apoio existentes.

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A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado André Ventura, do

Chega.

O Sr. André Ventura (CH): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: De facto, a proposta que o CDS nos traz hoje

pode ser melhorada, mas tem uma vantagem, a de falar em liquidez, algo que temos de fazer chegar

rapidamente às nossas empresas.

Só para que se perceba: os Estados Unidos injetaram 10% do seu PIB (produto interno bruto) na economia

real; na União Europeia, estamos a falar de um valor entre 0,2% e 0,8%. A diferença é abissal para aqueles que,

tantas vezes, olham para fora com critérios errados.

Precisamos de fazer chegar a liquidez rapidamente às empresas, e isso é feito através do layoff e também

do crédito e das garantias estatais. Sobretudo, é preciso que o dinheiro chegue, mas a verdade é que falhou o

primeiro prazo, falhou o segundo e não sabemos quando é que isso vai acontecer.

O Sr. Deputado Ricardo Leão terminou a sua intervenção dizendo: «O Grupo Parlamentar do PS está

particularmente convicto…» Não nos chega, Sr. Deputado! Não basta que o Grupo Parlamentar do PS esteja

convicto, é preciso que o dinheiro chegue às empresas. E a verdade é que não tem chegado — ou, então, as

empresas estão a enganar-nos e estão a enganar o Parlamento.

Não há de haver um grupo parlamentar nesta Sala que não receba, todos os dias, queixas de apoios que

não chegam, de apoios que tardam e de uma burocracia interminável, que parece que aumenta cada vez mais,

em vez de diminuir.

Esta proposta tem uma vantagem: é simplificada. Pode ser melhorada, mas é simplificada.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Queira concluir, Sr. Deputado.

O Sr. André Ventura (CH): — Vou concluir, Sr.ª Presidente.

Anunciaram-nos um layoff simplificado, mas temos um dos mais complexos da história. Anunciaram-nos

apoios rápidos e diretos, mas eles tardam em chegar.

Acho que é tempo de pararmos e pensarmos nisto.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Sr.as e Srs. Deputados, concluída a apreciação do Projeto de Resolução

n.º 397/XIV/1.ª (CDS-PP), vamos passar à discussão conjunta, na generalidade, dos Projetos de Lei n.os

338/XIV/1.ª (PAN) — Altera o Decreto-Lei n.º 14-G/2020, de 13 de abril, possibilitando a realização de exame

de melhoria de nota interna no ensino secundário e 360/XIV/1.ª (PCP) — Procede à primeira alteração ao

Decreto-Lei n.º 14-G/2020, de 13 de abril, que estabelece as medidas excecionais e temporárias na área da

educação, no âmbito da pandemia da doença COVID-19, juntamente com os Projetos de Resolução n.os

381/XIV/1.ª (CH) — Pela garantia de acesso de todos os docentes do País a meios informáticos que lhes

permitam lecionar à distância, 404/XIV/1.ª (CDS-PP) — Recomenda ao Governo que permita a realização de

exames nacionais para efeito de melhoria da classificação final e 406/XIV/1.ª (IL) — Pela reposição do normal

funcionamento dos exames finais nacionais.

Uma vez que a Sr.ª Deputada Bebiana Cunha, do PAN, não se encontra na Sala, tem a palavra, para

apresentar o projeto de lei do PCP, a Sr.ª Deputada Ana Mesquita.

A Sr.ª Ana Mesquita (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Urge resolver várias questões

decorrentes da adoção dos procedimentos de prevenção e contenção do surto epidémico nas escolas.

Se a falta de trabalhadores era já um problema grave, face ao novo cenário, é forçoso proceder à contratação

de mais trabalhadores e à abertura dos concursos necessários para a integração de todos os que supram

necessidades permanentes nas escolas. Além disso, são precisos todos os recursos didáticos necessários e

adequados para que ninguém — ninguém! — fique excluído. E tem de ser o Ministério da Educação, em

articulação com as escolas, a assegurar o acesso e a distribuição gratuita, a todos os alunos e docentes, do

equipamento tecnológico e informático necessário, incluindo o acesso gratuito à internet.

Quanto à conclusão do ensino secundário e ao acesso ao ensino superior, tem havido muitas preocupações

manifestadas pelos estudantes e pelas suas famílias em relação ao prosseguimento dos estudos. O PCP

defende há muito que os exames nacionais, no atual modelo de acesso ao ensino superior, são uma barreira

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que não resolve as desigualdades e que até contribui para o seu aprofundamento, algo que se torna mais

evidente com a situação extraordinária que vivemos. A solução encontrada pelo Governo acarreta dificuldades

que não podem ser ignoradas, até porque as vagas de acesso continuam a ser limitadas. E temos algumas

dúvidas de que seja pelo regresso ao que estava antes previsto que os problemas se resolvam.

Assim, propomos que os estudantes possam realizar exames finais nacionais apenas nas disciplinas

escolhidas para acesso ao ensino superior, sendo ainda permitida a realização desses exames para melhoria

de nota, relevando o seu resultado para a classificação de prova de ingresso e para a melhoria da classificação

interna final do ensino secundário, no caso dos alunos autopropostos.

Parece-nos que os estudantes não devem ser impedidos de melhorar as suas notas para efeitos de acesso

ao ensino superior, sobretudo se tal pode ser determinante para que não exista o abandono de um percurso

escolar que poderia continuar. E, por exemplo, há o caso daquele aluno que, no ano passado, fez exame e até

não baixou a nota, mas que, mesmo assim, não entrou no ensino superior. Por isso, ele precisa de melhorar a

nota da disciplina, subindo-a umas décimas, para, assim, poder entrar no ensino superior. Se ficar impedido de

o fazer, se ficar novamente de fora, a probabilidade maior é que não tente uma terceira vez.

Por fim, porque é preciso preparar o próximo ano letivo, ouvindo um amplo leque de entidades e membros

da comunidade educativa e nunca ultrapassando a necessária e obrigatória negociação sindical, o PCP propõe

a criação de um grupo de trabalho para planificar a organização do ano letivo de 2020/2021, incluindo ao nível

das necessidades de contratação de pessoal docente e não docente, da alteração e adequação de conteúdos

programáticos e curriculares e do reforço de recursos pedagógicos e didáticos.

Estas e outras propostas deste projeto de lei pretendem ser soluções para problemas identificados, que têm

de ser resolvidos muito rapidamente, com medidas eficazes, estando o PCP disponível para encontrar caminhos

para que essas soluções sejam implementadas.

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para apresentar o projeto de lei do PAN, tem a palavra, agora sim, a

Sr.ª Deputada Bebiana Cunha.

A Sr.ª Bebiana Cunha (PAN): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Em contexto de COVID-19, o

Governo implementou um conjunto de medidas no âmbito da educação, destinadas a estabelecer um regime

excecional e temporário, de modo a assegurar a continuidade do ano letivo de 2019/2020, procurando fazê-lo

de uma forma justa, equitativa e o mais normalizada possível.

Para o PAN, sempre foi muito claro que este ano letivo não tinha de ser perdido devido ao contexto que

vivenciamos e, por isso, após as explicações do Governo, compreendemos que se possa procurar reiniciar as

atividades letivas presenciais nos 11.º e 12.º anos de escolaridade e nos 2.º e 3.º anos dos cursos de dupla

certificação do ensino secundário.

Foi, aliás, proposta do PAN que se retirassem da equação do Governo as aulas presenciais no 10.º ano de

escolaridade e no 1.º ano do curso de dupla certificação do ensino secundário, permitindo, assim, uma redução

significativa do número de alunos presentes e, por consequência, um menor risco para a sua saúde, para a

saúde das comunidades educativas e para a saúde pública.

Noutro momento faremos, então, a análise das normas que o Governo forneceu às escolas para o retomar

destas atividades. Hoje, com esta proposta, iremos falar daquilo que nos parece consolidar uma injustiça para

os estudantes, mas que ainda pode ser resolvida.

Sabemos que se teve de tomar medidas excecionais. O PAN vê, aliás, com bons olhos a redução do número

de exames, numa perspetiva geral, e a separação da conclusão do ensino secundário do acesso ao ensino

superior. Entendemos, até, que isto poderá permitir, num outro momento, começar a fazer o debate do modelo

do acesso ao ensino superior, em Portugal, mas também não é isso que pretendemos com esta proposta. O

que pretendemos é que o excecional não se confunda com o injusto e discriminatório.

Por isso, trazemos, hoje, uma proposta que visa permitir que todos os estudantes que pretendiam e

necessitavam de fazer alguma melhoria à sua nota possam também propor-se a exame para esse efeito.

Não compreendemos que se determine, este ano, que os alunos que realizem exames finais nacionais nas

disciplinas que elejam como provas de ingresso no ensino superior se vejam impedidos de utilizar a nota do

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exame para a melhoria da classificação final nessas disciplinas e, por consequência, impedidos de melhorar a

nota do ensino secundário. Não compreendemos que um estudante que precise de fazer um exame para

melhorar a sua nota do ensino secundário não possa fazê-lo.

Com esta regra, imposta pelo Governo, não só se alteram os pressupostos de partida de todos estes

estudantes e suas famílias, o que, em primeiro lugar, é incorreto, como também não se consegue entender a

sua pertinência num momento em que o número de alunos que irão participar presencialmente nas aulas do

terceiro período será garantidamente muito superior ao número de alunos que possam vir a pretender fazer

exame de melhoria de nota e em que nem por isso se impediu a sua frequência.

Segundo uma sondagem disponível, estima-se que 19 000 alunos pretendessem fazer exame de prova de

ingresso e de melhoria de nota interna. Os 38 000 exames que são normalmente realizados para melhoria serão

reduzidos, com esta medida, em apenas cerca de 5000 — isto, de acordo com a proposta do Governo —, visto

que os restantes terão de continuar a ser obrigatoriamente realizados para efeitos de exame, pelo que não nos

parece razoável que não se encontrem soluções.

Esta limitação não se percebe num cenário com a implementação de outras medidas de desconfinamento já

definidas e a sua persistência limitará, de forma séria, as oportunidades de acesso dos estudantes a escolhas

importantes do seu projeto escolar, do seu projeto pessoal, do seu projeto profissional.

Ainda que compreendendo a necessidade de proteger a saúde dos estudantes nesta fase excecional,

consideramos que essa proteção poderá manter-se encontrando soluções que permitam aos alunos fazer os

exames em segurança, ao mesmo tempo que não se frustram expectativas nem se desfazem sonhos.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para apresentar o seu projeto de resolução, tem a palavra o Sr.

Deputado André Ventura, do Chega.

O Sr. André Ventura (CH): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Este é um tema que deveria ter merecido a

nossa atenção desde o início.

Com o ensino à distância, o Governo definiu que os meios teriam de ser disponibilizados quando não

existissem. Estima-se que Portugal esteja muito abaixo da média da União Europeia em matéria de

disponibilização de equipamentos, quer para docentes quer para discentes. E isto é algo que nos deve

preocupar.

Já falámos dos discentes, dos alunos. Evidentemente, se eles não tiverem acesso a estes equipamentos,

cria-se um fosso muito maior entre os que podem e os que não podem. Mas também os docentes devem merecer

a nossa preocupação, porque muitos deles não tinham os meios que foram exigidos, nomeadamente pela

regulamentação, para poderem transmitir conteúdos em segurança, da forma sólida que se exigia, até do ponto

de vista da transmissão das comunicações. Por isso, sim, é fundamental que todos, sem exceção, de todos os

setores do ensino, tenham acesso a estes meios informáticos.

O Chega concorda com o PAN nesta matéria: não se podem mudar as regras a meio do jogo. Esta inversão

da lógica dos exames vai não só prejudicar muitas expectativas como impedir muitos de continuar na realização

do seu percurso, e isso não deveria ser feito, pelo menos na lógica de desconfinamento que o Governo já

anunciou.

Por isso, é fundamental, na nossa opinião, que se permita, nomeadamente com o recurso às autarquias, aos

seus equipamentos, aos seus pavilhões, a realização de todos os exames, inclusivamente os de melhoria de

nota.

Isto era fundamental, não só porque a educação assume aqui uma especial importância, mas também para

se conseguir uma normalização das relações. Se queremos voltar a um cenário minimamente normal, se

queremos voltar, também na educação, a um cenário de uma nova normalidade, os exames seriam o melhor

momento para fazermos essa diferença.

Infelizmente, nem os meios nem a regulamentação vieram a tempo de garantir essa nova normalidade e, por

isso, é fundamental que, nesta Câmara, ainda se possa fazê-lo.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para apresentar o projeto de resolução do CDS-PP, tem a palavra a

Sr.ª Deputada Ana Rita Bessa.

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A Sr.ª Ana Rita Bessa (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: No Decreto-Lei n.º 14-G/2020,

que estabelece as medidas excecionais para a educação, o Governo tomou duas decisões que alteram quer as

regras de conclusão do ensino secundário, quer as regras de acesso ao ensino superior. Por um lado, os exames

nacionais, este ano, são apenas prova de ingresso, pelo que a conclusão do ensino secundário depende apenas

da avaliação interna; por outro, não se podem fazer exames de melhoria de nota a disciplinas que não sejam

prova de ingresso.

O CDS entende que, por muito que se vivam circunstâncias especiais e por muito que esteja em cima da

mesa, até há bastante tempo, a necessidade de repensar o modelo de acesso, não é agora, num ano atípico,

que o Governo deve induzir ainda maior incerteza, mudando as regras não a meio, mas praticamente no final

do jogo.

Portanto, discordamos destas decisões. E discordamos porquê? Quanto à conclusão do ensino secundário

passar apenas a depender das notas internas, sabemos — todos sabemos! — que isso faz aumentar a

variabilidade das notas entre escolas. Sabemos nós e sabe o Sr. Secretário de Estado João Costa, que disse,

em julho do ano passado, que, na generalidade, sim, é um problema acentuado nas escolas privadas, mas

também se deteta este fenómeno em escolas públicas, tanto de inflação das notas, o que é uma fraude, do

ponto de vista da formação dos alunos, como de deflação, porque os alunos trabalham, esforçam-se e as notas

não correspondem àquilo que eles efetivamente fizeram. Nós concordamos com o Sr. Secretário de Estado,

aparentemente ele é que não concorda consigo próprio.

Quanto à impossibilidade de fazer melhorias, o Governo invocou razões logísticas, ou seja, para mitigar o

risco de contágio há que reduzir o número de exames. Ontem, em comissão, o Sr. Ministro da Educação

justificou esta decisão com um princípio de previsibilidade, isto é, anunciou-se, em 9 de abril, uma decisão para

que houvesse previsibilidade no sistema.

Bom, mas não foi um princípio de previsibilidade que impediu o Governo de mudar quatro vezes a lei do

layoff, e ainda bem, porque estava errada e, portanto, foi uma boa decisão. A verdade é que a realidade também

mudará desde o dia 9 de abril até à altura em que os alunos farão o exame, em julho. Por exemplo, teremos as

creches e os ATL abertos, teremos as lojas do cidadão abertas, teremos os restaurantes abertos, teremos

cinemas, teatros e centros comerciais abertos e, portanto, a logística também poderia ser um tema ajustável,

mas não será, para um grupo circunscrito de alunos, por decisão do Governo.

Dito de forma muito clara, os alunos que quiserem melhorar as suas notas do secundário, a sua média do

secundário, que agora só depende da avaliação da escola, que se quiseram esforçar e que até têm vindo a

investir nisso ao longo destes anos, não o poderão fazer.

Entretanto, ontem, o Sr. Secretário de Estado João Costa explicou até melhor o porquê desta decisão e disse

que a razão logística também tem a ver com o propósito de poupar os professores a terem de corrigir tantos

exames para poderem ter mais férias. Não desfazendo do direito às férias, não penso ser razoável subverter a

ordem das coisas e penalizar o percurso e as expectativas dos alunos também por essa razão.

Portanto, o CDS apela ao Governo para corrigir esta injustiça, porque até dia 11 de maio ainda o pode fazer

sem danos, e manter a previsibilidade inicial, aquela que nunca deveria ter sido alterada.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para apresentar o projeto de resolução do Iniciativa Liberal, tem a

palavra o Sr. Deputado João Cotrim de Figueiredo.

O Sr. João Cotrim de Figueiredo (IL): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O regime de exames

nacionais proposto pelo Governo impede os alunos de realizar o exame nacional final para melhoria da

classificação interna. A iniciativa legislativa que hoje aqui trazemos visa corrigir esta enorme injustiça.

O regime previsto muda as regras a meio do jogo e desconsidera totalmente o esforço e o planeamento dos

estudantes, dos encarregados de educação e dos professores ao longo do ano letivo. E os estudantes mais

prejudicados serão, evidentemente, aqueles, mais esforçados, que mais tempo e meios investiram com o

objetivo de poder melhorar a sua classificação e, agora, veem as suas legítimas expectativas frustradas pelo

Governo. Trata-se de um sinal que não podemos dar aos jovens.

E os argumentos do Governo não colam. Primeiro, era uma questão de segurança sanitária: evitar que

houvesse demasiados alunos a fazer os exames. Como se não fosse possível utilizar as numerosas salas de

aula do ensino básico, que não terão aulas até setembro, só para dar um exemplo de solução.

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Depois, o argumento já era o de que os professores teriam demasiados exames para classificar e que isso

poderia prejudicar as suas férias. Portanto, se bem entendemos, o Governo pretende prejudicar os interesses

dos alunos para satisfazer os interesses dos professores. Percebemos: uns tendem a votar mais do que os

outros, mas, quanto a prioridades, estamos conversados.

E a cereja no topo do bolo: para corrigir uma óbvia situação de injustiça dos alunos deste ano, face a alunos

de anos anteriores, no acesso ao ensino superior, o Governo propõe deixar de considerar as notas do exame

nacional também para os alunos dos anos anteriores. É inacreditável! O Governo não só quer mudar as regras

a meio deste jogo como propõe alterá-las depois de o jogo do ano passado ter acabado.

O Iniciativa Liberal não aceita esta solução e insta o Governo a repor urgentemente o normal funcionamento

dos exames finais nacionais para o presente ano letivo. Não há nenhum motivo atendível para não o fazer, a

menos que os interesses dos alunos venham, uma vez mais, atrás dos interesses eleitorais do PS.

E queria aproveitar esta defesa dos alunos para, na mesma linha, voltar a insistir, conforme fizemos durante

a discussão do Orçamento do Estado para este ano, para que o Governo alargue o número de alunos abrangidos

pelos contratos simples de apoio às famílias.

Já que os Governos do PS, movidos apenas por preconceito ideológico, acabaram com 70% dos contratos

de associação, que eram uma peça importante do elevador social, o alargamento dos contratos simples seria

uma forma de corrigir parcialmente a desigualdade de oportunidades que esta crise vem pôr a nu e de dar a

alunos mais carenciados a liberdade de poderem escolher a sua escola, pública ou privada.

Portanto, Srs. Deputados, não vamos pôr os interesses eleitorais nem os preconceitos ideológicos à frente

dos interesses dos nossos jovens.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Sr. Deputado, peço-lhe que conclua.

O Sr. João Cotrim de Figueiredo (IL): — Vou terminar, Sr.ª Presidente, com esta simples frase: vamos repor

o regime dos exames nacionais e alargar a aplicação dos contratos simples.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Cunha,

do Grupo Parlamentar do PSD.

O Sr. António Cunha (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O surto epidémico da COVID-19

impôs medidas de distanciamento social e provoca alterações na vida dos cidadãos.

Em vários países europeus, os exames foram suspensos ou eliminados. O Governo não optou por uma

solução tão radical, ao restringir o número de provas a realizar às 22 disciplinas que compõem as combinatórias

de pares de disciplinas para ingresso no ensino superior.

O PSD valoriza a avaliação, os exames e o mérito. Aliás, na organização atual do ensino, o PSD considera

que a avaliação externa das aprendizagens é um dos mais eficazes instrumentos de regulação, indispensável a

um adequado desenvolvimento do currículo e das aprendizagens. Entende também que a avaliação externa

deverá evoluir para que se avaliem não só os conhecimentos mas também a capacidade dos alunos em

mobilizarem esse conhecimento para a resolução de problemas, bem como para pensar e questionar de forma

crítica.

Para o PSD, as alterações propostas pelo PAN, para corrigir uma aparente injustiça, podem introduzir uma

situação de favorecimento dos alunos autopropostos, em detrimento dos alunos internos que assistiram às aulas

durante este ano letivo. Acresce ainda que a aprovação deste projeto de lei terá, objetivamente, implicações no

contingente de professores disponíveis para a tarefa da classificação das provas de exame, nomeadamente as

da 2.ª fase, que exigirá, certamente, o reajuste do calendário escolar, colocando em causa a normal abertura do

próximo ano letivo.

Por outro lado, o impacto que o impedimento da melhoria de notas tem na opção de escolha, dos alunos

empenhados e trabalhadores, por um curso com notas de ingresso mais elevadas é relevante e, factualmente,

frustra, para muitos deles, a expectativa legítima de o poderem fazer. Há alunos cujo projeto de vida para o

presente ano letivo se cingiu quase exclusivamente a fazer uma preparação sistemática e intensa para se

poderem propor novamente à realização de exames, tendo em vista melhorar a sua média de ingresso.

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Esta questão tem sido assumida, por parte do Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior e do Ministro

da Educação, como um filho enjeitado. Aliás, nas audições parlamentares de 28 de abril e de 5 de maio —

ontem, portanto —, os responsáveis das pastas nunca foram muito claros quanto ao efetivo número de alunos

envolvidos neste processo. Literalmente, andam aos papéis! Foram-se protegendo na delimitação da

responsabilidade entre pastas, ou seja, entre a conclusão do ensino secundário e o acesso ao ensino superior.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Queira concluir, por favor, Sr. Deputado.

O Sr. António Cunha (PSD): — Concluo já, Sr.ª Presidente.

O acesso à possibilidade de se fazerem melhorias de notas, segundo as regras há muito legalmente

estabelecidas, apesar do estado de calamidade atual em que o nosso País se encontra, não pode ser posto em

causa, por inoperância ou incapacidade deste Governo.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Tem de terminar, Sr. Deputado.

O Sr. António Cunha (PSD): — Sr.as e Srs. Deputados, e termino, Sr.ª Presidente, as escolas, os diretores

e o corpo docente têm sido sempre inteligentes e diligentes na resolução dos problemas das escolas, grande

parte delas em condições de verdadeiro estado de calamidade.

Aplausos do PSD.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Joana Mortágua,

do Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda.

A Sr.ª Joana Mortágua (BE): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, há aqui um problema de fundo que

não deve ser ignorado: nas palavras do Sr. Secretário de Estado João Costa, o ensino secundário está

completamente refém do acesso ao ensino superior. E não é apenas o Secretário de Estado que o diz, também

o CNE (Conselho Nacional de Educação) já veio alertar para esse problema.

Várias associações de pais, assim como associações de diretores, já pediram a alteração do modelo, que

faz refém de uma prova de duas horas e meia o trabalho de três anos de secundário. Também associações

profissionais de professores se juntaram a este apelo. É o caso da Associação de Professores de Matemática,

cuja presidente veio lembrar a perversidade que é um sistema que promove más práticas, como o anular de

matrículas para que, em duas horas e meia de exame, se substituam três anos de aprendizagem.

Muita gente tem vindo a alertar para este problema, menos os reitores, que se consideram confortáveis com

a ideia de que o sistema obrigatório esteja a ser manipulado para seriar e selecionar os alunos que vão entrar

no ensino superior.

Parece-nos evidente que temos aqui um problema para resolver e aquilo que estamos a discutir hoje decorre

desse problema. A subordinação do secundário aos exames levou o Governo a optar pela reabertura das

escolas, para preparação de exames. Não é a reabertura das escolas, em si, que nos preocupa, desde que ela

seja gradual, rigorosa nos critérios sanitários e respeitadora dos direitos laborais, é o facto de a escola presencial

ser reduzida a um centro de explicações para exames, quando havia tantas outras prioridades, sociais e

pedagógicas, no acompanhamento presencial dos alunos.

A Sr.ª Ana Rita Bessa (CDS-PP): — Então, vai propor o fim dos exames?!

A Sr.ª Joana Mortágua (BE): — E embora o regresso às aulas possa atenuar algumas das assimetrias do

ensino à distância, ele não apaga as desvantagens dos alunos que não tiveram condições para aceder a esse

ensino à distância e vai criar outras desigualdades, nomeadamente entre quem pode regressar às aulas

presenciais e quem não pode regressar às aulas presenciais, entre quem regressa com o seu professor e quem

regressa acompanhado por outro professor qualquer, porque vai ser preciso desdobrar turmas, entre outras

desigualdades.

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A estes problemas e a estas desigualdades juntam-se outros problemas que têm a ver com as expectativas

e com todos os cálculos e estratégias que os alunos têm de adotar para fazer face a um sistema de entrada no

ensino superior e de conclusão do ensino secundário que está demasiadamente centrado em exames. Para

estes alunos, as alterações à beira do 3.º período são legitimamente vistas como injustas.

A Sr.ª Ana Rita Bessa (CDS-PP): — Não estou a perceber!

A Sr.ª Joana Mortágua (BE): — Este é um ano atípico, mas é precisamente por isso que não podemos

deixar que ninguém fique para trás.

Quando outros países optaram por soluções diferentes, questionamos se insistir em expor as famílias e os

estudantes a exames de acesso ao ensino superior, à saída de uma pandemia que mudou a vida de toda a

gente, é o mais eficaz para garantir a igualdade e se o sistema educativo não teria outras prioridades e outras

soluções neste momento. No entanto, a opção do Governo…

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Queira concluir, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Joana Mortágua (BE): — Termino, Sr.ª Presidente.

A opção do Governo foi a de manter os exames em julho. O que o Governo tem de fazer agora é garantir

que toma todas as medidas necessárias para que ninguém fique para trás, para que ninguém fique prejudicado,

e o ensino superior também terá de fazer a sua parte.

Estamos disponíveis para discutir todas as formas de mitigação das desigualdades, mas uma coisa é certa:

esta pandemia veio, mais uma vez, mostrar…

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Tem de terminar, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Joana Mortágua (BE): — Vou terminar, Sr.ª Presidente.

Como estava a dizer, esta pandemia veio, mais uma vez, mostrar que o atual modelo de acesso ao ensino

superior não é correto, não é justo e tem de ser alterado.

Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada não inscrita

Joacine Katar Moreira.

A Sr.ª Joacine Katar Moreira (N insc.): — Sr.ª Presidente, esta é a época de reformar o sistema de ensino;

esta é a época de encontrarmos um sistema de ensino que não esteja tão centrado na avaliação, nos exames,

no cumprimento, independentemente das circunstâncias, daquele currículo predefinido, globalizado e

impessoal.

Esta é a época de tentarmos ensaiar, usando exatamente este estado excecional, um modelo de ensino, um

sistema de avaliação que esteja mais centrado nas necessidades e nas expectativas dos alunos. Isto vai exigir-

nos, também, repensar a obsessão absoluta com a entrada na universidade, como se fosse esse o único

caminho de milhares de indivíduos que fazem o ensino superior.

Esta exigência, hoje, também nos mostra algo a que estamos completamente alheios: a imensa desigualdade

que toda esta situação nos revelou. Há estudantes que estiveram a ver as aulas pelo telemóvel, há estudantes

que não têm computador, há estudantes que, independentemente destas situações, hoje são obrigados a estar

numa suposta igualdade, a concorrer ao ensino universitário quando as condições são completamente

diferentes.

Queria ainda referir que este ensino à distância, com as suas enormes desigualdades e enorme dificuldade,

é também um sinal de que esta é a época da mudança, há muito tempo aguardada, para a melhoria do sistema

de ensino…

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Tem de concluir, Sr.ª Deputada.

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A Sr.ª Joacine Katar Moreira (N insc.): — … e para darmos resposta efetiva às expectativas dos estudantes

e dos professores.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Porfírio Silva, do

Grupo Parlamentar do PS.

O Sr. Porfírio Silva (PS): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Vimos pronunciar-nos, neste debate,

especificamente sobre a questão da conclusão do ensino secundário e do acesso ao ensino superior.

Estamos na situação ideal? Não estamos. Aliás, já antes não estávamos na situação ideal, com o peso

desmesurado que o acesso ao ensino superior tem sobre o ensino secundário. Desejável seria não mudar

nenhuma regra no decorrer de um processo para o qual alunos e famílias tinham expectativas formadas, mas

esse «normal» não é possível nestas circunstâncias.

A resposta encontrada pelo Governo parece-nos ajustada aos condicionalismos presentes. Neste ano, só há

provas a contar para o ingresso no ensino superior, a classificação do secundário resulta exclusivamente das

classificações internas e, assim, as melhorias de nota relevam apenas para o ingresso. Os estudantes que

realizaram exames nacionais em anos letivos anteriores terão a situação mais favorável no cálculo da nota de

candidatura, integrando ou não o efeito dos resultados dos exames na classificação final do secundário.

Não havendo, neste contexto, soluções perfeitas, o nosso critério para ajuizar de qualquer modelo é o

seguinte: não podemos introduzir novas desigualdades. No modelo definido pelo Governo, os alunos que

terminam o 12.º ano este ano estão em situação de igualdade uns com os outros e os alunos que terminaram

em anos anteriores estão em situação de igualdade entre si.

A atitude do PS tem sido de abertura para encontrar as melhores soluções para esta crise. Estamos

disponíveis, mais uma vez, para considerar um modelo que não introduza novas desigualdades, mas há

propostas em debate que têm claramente o efeito de introduzir novas desigualdades. Permitir que as melhorias

de nota relevem para a classificação interna de alunos de 12.º ano de anos anteriores será introduzir uma

desvantagem para os alunos do corrente ano. E, para dar a mesma oportunidade aos alunos deste ano, teríamos

de realizar todos os exames como num ano normal e este não é um ano normal.

Temos de agir dentro do princípio de adesão à realidade. O sistema educativo está a responder, mas à custa

de um enorme esforço de todos os intervenientes. Ora, a operação «exames» é tremendamente pesada e

complexa — da sua elaboração à respetiva classificação, passando pela distribuição segura em todo o território

e pela realização em sala. Só para melhoria de nota, no ano passado, tivemos mais de 100 000 alunos a prestar

provas. Põe-se então a questão: é razoável investir toda a capacidade operacional da escola pública nos

exames? Queremos consumir todo o trabalho docente e as próprias férias na classificação e reapreciação de

exames, quando há tanto a fazer para preparar o próximo ano letivo de forma robusta e com qualidade? Sim,

porque temos de saber que temos de começar já a salvar o próximo ano letivo. Isso é decisivo para os nossos

jovens!

A Sr.ª Ana Rita Bessa (CDS-PP): — Está a ser demagógico!

O Sr. Porfírio Silva (PS): — Em resumo: não seremos obstáculo a uma análise mais aprofundada desta

questão, mas, finalmente, não daremos o nosso voto a nenhuma solução que favoreça uns para prejudicar

outros ou que seja impraticável no atual estado do mundo.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Mesquita, do

Grupo Parlamentar do PCP.

A Sr.ª Ana Mesquita (PCP): — Sr.ª Presidente, hoje, os vários grupos parlamentares que intervieram em

Plenário identificaram problemas que precisam de ser rapidamente resolvidos, assinalando-se a questão do

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acesso ao ensino superior e do prosseguimento de estudos como uma preocupação transversal, apesar de não

ser, evidentemente, a única.

Ora, o PCP considera que, havendo a possibilidade de uma efetiva resolução de, pelo menos, um problema

específico, seria muito importante que a oportunidade de legislar para esse efeito não fosse desperdiçada, para

que, daqui a 15 dias ou um mês, dois meses ou sabe-se lá quantos, não estejamos aqui todos, novamente, em

busca de remendos para situações que comportem injustiças. É este o apelo que gostaríamos de deixar.

De facto, há, neste momento, propostas, nomeadamente a proposta do PCP, que podem permitir a resolução

de um ou mais problemas concretos. São propostas que podem, naturalmente, ser trabalhadas, num curto

período de tempo.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Tem de concluir, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Ana Mesquita (PCP): — Vou mesmo concluir, Sr.ª Presidente.

Sim, é verdade, quanto a nós, urge repensar o modelo de acesso ao ensino superior, sendo esta uma

proposta que o PCP tem trazido há anos à Assembleia da República.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Tem de concluir, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Ana Mesquita (PCP): — Mas estamos num tempo muito contado e, até dia 11, temos um primeiro

prazo, por isso é urgente tomar medidas para resolver uma situação que está à porta.

Aplausos do PCP e do PEV.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para encerrar este debate, tem a palavra a Sr.ª Deputada Bebiana

Cunha, do PAN.

A Sr.ª Bebiana Cunha (PAN): — Sr.ª Presidente, gostaria aqui de dizer e de lembrar o seguinte: a

impossibilidade de melhoria da classificação final das disciplinas por exames tem tido, de facto, a contestação

dos estudantes do ensino secundário, sendo esta, para muitos deles, a única opção viável de melhoria da sua

média interna, permitindo-lhes aumentar a possibilidade de ingressar no curso superior que pretendem. Há uma

petição com mais de 8000 assinaturas.

Gostava, também, de desconstruir o que tem sido dito relativamente aos números. Na sondagem que temos

disponível, a menos que o Ministério efetivamente nos apresente outra, estima-se que 19 000 alunos pretendiam

fazer exame de prova de ingresso e melhoria de nota interna. Com a medida que o Governo, neste momento,

implementou apenas se prevê uma redução de 5000 exames.

Foi aqui repetido um outro aspeto, que, ontem, nos foi também veiculado na Comissão de Educação, e

parece-nos que há aqui uma confusão. É dito repetidamente que, na segunda fase, tradicionalmente, dois terços

das provas realizadas são para efeito de melhoria de nota e isto pode comprometer a atividade dos professores

em setembro, quando se pretende que estejam concentrados no início do próximo ano letivo. Só que a nossa

proposta não é referente aos alunos internos que vão fazer melhorias na segunda fase. Aqui faço um reparo ao

Grupo Parlamentar do PSD, que parece que quer discriminar os alunos que já concluíram as suas disciplinas

em anos anteriores e que sempre tiveram a oportunidade de ver a sua nota interna relevada para este efeito.

Portanto, fazemos este alerta, inclusivamente reiterando que o parecer da CNAES (Comissão Nacional de

Acesso ao Ensino Superior), que tem sido invocado como aquilo que vem resolver as injustiças e as

desigualdades, não acautela os alunos que, neste ano, concluem o 12.º ano e que correspondem a 70% dos

alunos que fazem exames de melhoria.

Por isso, se há uma abertura e uma vontade de resolver, de facto, o problema dos nossos estudantes e de

não frustrar sonhos, expectativas e a construção de projetos, então apelo a que possa resolver-se cirurgicamente

o que há a ser resolvido.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Passamos ao ponto 8 da nossa ordem de trabalhos que consiste na

discussão conjunta do Projeto de Resolução n.º 405/XIV/1.ª (PEV) — Informação aos cidadãos sobre as

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melhores práticas de deposição de resíduos, como máscaras e luvas protetoras, do Projeto de Lei n.º 353/XIV/1.ª

(PCP) — Definição de normas e regulamentos para operações de gestão de resíduos, na generalidade, e dos

Projetos de Resolução n.os 417/XIV/1.ª (PSD) — Recomenda ao Governo a criação e ampla divulgação de uma

campanha de comunicação destinada à sensibilização das populações para o correto acondicionamento e

depósito dos resíduos domésticos, 418/XIV/1.ª (BE) — Campanha nacional de sensibilização sobre a correta

deposição de resíduos de materiais de proteção individual contra a pandemia de COVID-19 e, quando possível,

o recurso a materiais reutilizáveis, 424/XIV/1.ª (PAN) — Pela realização de uma campanha de informação

nacional sobre a deposição de resíduos utilizados na prevenção da atual crise sanitária e 425/XIV/1.ª (PS) —

Recomenda ao Governo que promova boas práticas relativamente aos equipamentos de proteção individual

para efeitos de prevenção do contágio do novo coronavírus (SARS-CoV-2).

Para apresentar o projeto de resolução do PEV, tem a palavra a Sr.ª Deputada Mariana Silva.

A Sr.ª Mariana Silva (PEV): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A pandemia da COVID-19 veio impor

um conjunto bastante alargado de restrições e de alterações aos hábitos diários da generalidade das pessoas,

com vista a prevenir, a conter, a mitigar e a tratar esta doença.

A imposição do confinamento teve, obrigatoriamente, de deixar de fora muitas pessoas que, de uma forma

heroica, tendo em conta a exposição ao perigo a que ficaram sujeitas, fizeram com que o País continuasse a

funcionar naquilo que era essencial. Desde logo, os profissionais de saúde, que estão na primeira linha, mas

também as forças de segurança, os trabalhadores de recolha de resíduos e todos aqueles que permitiram, pelo

seu trabalho, o fornecimento de outros serviços essenciais à população. A todos, voltamos a reforçar o nosso

profundo agradecimento e reconhecimento.

As regras estabelecidas de confinamento voluntário e, mais tarde, obrigatório permitiram que as pessoas

continuassem a dar apoio a quem dele precisasse e a comprar os bens essenciais, o que significa que, por uma

razão ou por outra, houve sempre quem continuasse a deslocar-se à rua.

Face à situação, muitas pessoas, mesmo sem a recomendação expressa das autoridades de saúde, optaram

logo por usar máscara protetora e luvas. E, como temos assistido, com o passar do tempo e com os

conhecimentos mais consolidados, a própria Direção-Geral da Saúde (DGS), tendo em conta também as

indicações da Organização Mundial da Saúde (OMS), passou a recomendar o uso de máscara como

complemento de proteção, mas nunca como substituto de outros comportamentos determinantes, como lavar

adequadamente as mãos, tossir para o antebraço, evitar levar as mãos à cara, entre outros. Assim sendo, um

número considerável de pessoas optou pelo uso da máscara, tornando-o mais comum.

A questão que se colocou de seguida, relativamente ao uso de máscaras descartáveis com mais frequência,

foi a forma inaceitável como muitos começaram a deitar as máscaras e as luvas descartáveis para o chão. Por

outro lado, outras pessoas, por desconhecimento, entenderam que, pela composição do material, era correto

depositar estes materiais no depósito de resíduos destinado ao plástico e às embalagens. A recomendação,

contudo, é que esse material seja colocado num saco e que este saco seja depositado no contentor destinado

aos resíduos indiferenciados.

No entanto, é visível que essa recomendação não está a chegar de forma massiva e intensa à generalidade

da população. O Partido Ecologista «Os Verdes» entende que é fundamental proceder a essa informação de

uma forma eficaz, sob pena de se estar a acrescentar um problema, que é o do tratamento de resíduos, a outro

problema, que é o da própria pandemia.

Assim sendo, Os Verdes recomendam que o Governo promova uma intensa campanha de informação e de

esclarecimento aos cidadãos sobre as melhores práticas de deposição de resíduos, como as máscaras e as

luvas usadas para proteção à COVID-19.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para apresentar o projeto de lei do PCP, tem a palavra a Sr.ª Deputada

Alma Rivera.

A Sr.ª AlmaRivera (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Todas as dimensões das nossas vidas

sofreram as consequências da pandemia. Para além da resposta de saúde aos infetados, a progressão da

COVID-19 coloca-nos perante a tarefa de aprender a viver com precauções e medidas para contenção da

doença.

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O Estado tem aqui um papel fundamental, utilizando todos os meios para quebrar os mecanismos de

disseminação pela população, nomeadamente protegendo aqueles que se encontram mais expostos à infeção.

Entre os serviços públicos essenciais, aqueles que não podem parar, temos a recolha e tratamento de

resíduos, setor cujos trabalhadores podem estar particularmente expostos a fontes de contágio da COVID-19.

Foi por isso que a Agência Portuguesa do Ambiente apresentou um conjunto de recomendações e

orientações para garantir a proteção da saúde pública, dos trabalhadores e prevenir a disseminação da doença,

compatibilizando-a com a necessidade de uma gestão eficaz e eficiente dos resíduos.

Assim, e aproveitando para relembrar, luvas, máscaras e outros materiais de proteção, mesmo que não

estejam contaminados, não devem, em caso algum, ser colocados no contentor de recolha seletiva nem

depositados no ecoponto. Devem, sim, ser colocados em sacos de lixo resistentes e descartáveis e,

posteriormente, depositados no contentor de resíduos indiferenciados.

A questão que se coloca é a seguinte: a quem chegou, de facto, essa informação? Será que essas normas

foram amplamente publicitadas, permitindo a sua adoção por parte de toda a população?

Achamos que, ao dia de hoje, o respeito por esses procedimentos não está de modo algum garantido, porque

a maior parte das pessoas não teve acesso a essa informação.

Por isso, o PCP propõe a realização de uma campanha de divulgação de normas e procedimentos que os

cidadãos devem seguir para a deposição de resíduos urbanos nos contentores destinados para esse efeito.

Por outro lado, como é conhecido, em diversos municípios optou-se pela interrupção preventiva da recolha

seletiva de resíduos urbanos, de modo a evitar a contaminação dos trabalhadores deste setor. Mas é da maior

importância que a recolha seletiva seja mantida ou retomada, evitando aumentar os resíduos destinados a

incineração e deposição em aterro, e, assim, promover a valorização dos resíduos e a salvaguarda dos valores

ambientais.

Para isso, o PCP propõe que se implementem normas e procedimentos a tomar no âmbito da operação de

triagem manual de resíduos urbanos, assegurando a manutenção da saúde pública e a salvaguarda da saúde

dos trabalhadores do setor, devendo as diferentes entidades gestoras de resíduos urbanos adaptar as condições

de operação das suas unidades às novas exigências que o surto epidémico veio impor.

Tal como temos dito, o vírus não mata direitos, e os direitos a um ambiente sadio e à segurança no trabalho

também não são exceção.

Aplausos do PCP e do PEV.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Bruno Coimbra,

do PSD.

O Sr. BrunoCoimbra (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Hoje, debatemos iniciativas com a

mesma preocupação, que apontam no mesmo sentido e que até se complementam, iniciativas sobre a recolha

e tratamento de resíduos — um importante setor que durante este período de emergência não parou, para nos

poder servir continuamente a todos —, iniciativas com preocupações ambientais e, sobretudo, com

preocupações com a saúde pública.

Em tempos de crise pandémica a gestão de resíduos urbanos ganha ainda maior importância. Primeiro, com

os portugueses fechados em casa, a produzir maior quantidade de resíduos e a sobrecarregar os sistemas.

Depois, com milhares de cidadãos infetados, em convalescença em suas casas, cujos resíduos seguem os

mesmos circuitos que os demais. E, agora, com os portugueses a regressarem às suas atividades e a utilizarem,

em grandes quantidades, máscaras, luvas e outros equipamentos de proteção individual.

Sr.as e Srs. Deputados, é preciso garantir a eficácia e o funcionamento dos sistemas de gestão de resíduos.

É preciso divulgar e publicitar eficazmente as boas práticas que os portugueses devem ter em conta no

acondicionamento e deposição dos seus resíduos. É preciso sensibilizar, é preciso formar. Só assim poderemos

evitar problemas de salubridade, evitar o contágio por essa via, garantir a segurança daqueles que trabalham

na recolha e gestão de resíduos e contribuir para o bem de todos.

É por isso imperativo que seja feita uma campanha nacional que chegue a todos e informe todos sobre este

assunto. Só assim poderemos ter em cada português um agente de saúde pública também neste aspecto.

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Foi isso que o PSD instou o Governo a fazer já no início do passado mês de abril e que agora reafirma com

este projeto ao verificar que alguma informação foi divulgada, mas não por iniciativa do Governo, nem com

abrangência e a quantidade que entendemos ser necessárias.

Aplausos do PSD.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Nelson Peralta,

do Bloco de Esquerda.

O Sr. NelsonPeralta (BE): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Em resultado da pandemia COVID-

19, o número de máscaras, luvas e outros materiais de proteção individual que estão a ir para o lixo aumentou.

É um resultado natural da proteção das pessoas, mas é também um problema novo para a sociedade e um

problema que necessita de uma solução nova.

É, por isso mesmo, um problema que é perigoso, porque pode haver maior contaminação se existirem mais

resíduos contaminados, e em especial deste material de proteção.

É uma situação de risco especialmente para quem trabalha nas limpezas, para quem trabalha na recolha e

tratamento de resíduos e para todos os profissionais que trabalharam na primeira linha da resposta a esta

pandemia, homens e mulheres que, com o seu trabalho, com o seu suor, permitiram-nos ultrapassar a primeira

fase da epidemia e encarar, agora, esta segunda fase. E é também um risco para toda a sociedade, que pode

aumentar o risco de contaminação por parte destes materiais.

Temos, portanto, que encontrar soluções. A proposta que o Bloco de Esquerda aqui traz é muito simples e

tem esse objetivo. Trata-se de uma campanha nacional de sensibilização e de divulgação de boas práticas na

utilização, reutilização e deposição desses materiais nos resíduos. Uma campanha a ser difundida, por várias

formas, através de todos os meios de comunicação disponíveis e em parceria com as autarquias e com as

entidades gestoras de resíduos.

Propomos, desde logo, que seja divulgada uma coisa essencial: que, sempre que possível e sempre que

isso mantenha a proteção da saúde pública, o material de proteção em causa, nomeadamente máscaras, sejam

reutilizáveis.

É uma resposta essencial reduzir os resíduos. Reduzir a quantidade de resíduos protege os recursos, o

ambiente e o planeta e contribui para não sobrecarregar os serviços de recolha e tratamento de resíduos. Mas

permite ainda mais, uma proteção da sociedade: menos resíduos contaminados reduzem os riscos para toda a

sociedade e protegem toda a sociedade.

Há, portanto, que difundir como usar corretamente as máscaras e outros equipamentos reutilizáveis,

nomeadamente como os usar, como os lavar e como os reutilizar.

Relativamente aos materiais reutilizáveis em final de linha ou descartáveis, é também necessário divulgar a

boa forma de os depositar nos resíduos. Essas normas já existem, mas, infelizmente, não têm uma divulgação

sobre toda a população e é essencial que isso assim aconteça, essencial para proteger os profissionais, mas

também, como disse, para proteger todas as pessoas.

Por fim, propomos a criação de um sistema de depósito e recolha deste tipo de resíduos em zonas onde

exista bastante afluência de pessoas, nomeadamente supermercados, caixas de multibanco e parques de

estacionamento.

A informação pública é sempre importante, mas é ainda mais preciosa nestes tempos de pandemia. Uma

sociedade informada está mais protegida. A sociedade está a ter um papel fundamental na proteção de cada

pessoa e, em particular, das pessoas mais suscetíveis de contraírem a doença.

A adesão voluntária da sociedade na resposta à pandemia tem sido um dos bens mais eficazes deste

processo. Fomentemos, pois, esta resposta e essa sociedade solidária, toda a informação para escolhas mais

conscientes e mais seguras e serviços públicos que respondam aos grandes desafios que a pandemia nos

apresenta.

Aplausos do BE.

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A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado André Silva, do

PAN.

O Sr. AndréSilva (PAN): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A presente crise sanitária veio,

novamente, mostrar-nos que muitas pessoas não se encontram na posse de informação sobre a correta

deposição dos resíduos, em especial dos utilizados na prevenção da atual epidemia.

Temos constatado na comunicação social e nas redes sociais várias imagens de descarte inadequado de

máscaras e luvas na via pública e também da sua deposição incorreta nos ecopontos de plástico e embalagens.

Ainda na passada quinta-feira, ouvimos, neste Parlamento, a Secretária de Estado do Ambiente dizer,

enfaticamente, que «máscaras no chão, não». Ao que devemos acrescentar: «máscaras e luvas no ecoponto

também não». Contudo, a mensagem continua a não passar para todos os cidadãos.

O problema da deposição incorreta de resíduos em ecopontos é anterior à presente pandemia e coloca em

risco a saúde dos trabalhadores nas estações de triagem, onde existe intervenção humana e contacto manual

com os resíduos.

Os resíduos de plástico e embalagens são, em primeiro lugar, depositados nos ecopontos e, posteriormente,

são encaminhados para uma estação de triagem onde são separados manualmente pelos operadores. A correta

deposição de resíduos de caráter perigoso, por estarem potencialmente contaminados por agentes patogénicos,

como bactérias e vírus, é fundamental para reduzir o risco de acidentes de trabalho de contaminação dos

operadores das estações de triagem.

Nos próximos tempos, provavelmente por bastante tempo, iremos, como é devido, usar máscaras e luvas. O

descarte inadequado ou a deposição das máscaras e luvas usadas em recetores impróprios pode provocar a

contaminação do meio ambiente ou aumentar o risco de contaminação dos trabalhadores do setor dos resíduos.

É isso que queremos evitar e, por isso, defendemos que o Governo desenvolva uma campanha de

informação, a nível nacional, sobre a correta deposição de resíduos em ecopontos e também sobre a correta

deposição das luvas e máscaras usadas nos contentores dos resíduos indiferenciados.

Esta campanha de informação deverá também salientar os benefícios do uso de máscaras reutilizáveis.

Apesar dos constrangimentos sanitários, devemos, dentro do possível, continuar a apostar na redução e

reutilização de bens com o objetivo de reduzir resíduos. Serão utilizadas, em Portugal, milhões de máscaras por

mês e devemos fazer o esforço, obviamente sem comprometer a saúde pública, de reduzir ao máximo os

resíduos que provocam.

É fundamental que a correta informação chegue a todas e todos os cidadãos, pela nossa saúde e pela saúde

dos trabalhadores do setor dos resíduos.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Hugo Pires, do

PS.

O Sr. HugoPires (PS): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A recomendação que o Partido Socialista

hoje aqui apresenta diz respeito à promoção de boas práticas relativamente à deposição de resíduos de

equipamentos de proteção individual, para efeitos de prevenção do contágio do novo coronavírus (SARS-CoV-

2).

O Grupo Parlamentar do Partido Socialista tem três objetivos: proteger, alertar e consciencializar. Proteger

do contágio da COVID-19 os trabalhadores da recolha e tratamento de resíduos — a quem o PS aproveita para

prestar aqui a sua homenagem, mulheres e homens que asseguram um serviço essencial na vida de todos nós.

Proteger cada um de nós, porque só a prevenção continuará a evitar a proliferação de casos registados.

Tem o objetivo de alertar, para que a mensagem certa chegue aos portugueses porque a deposição de

equipamentos de proteção individual fora dos pontos de recolha de resíduos indiferenciados, além de causar

um problema ambiental, é também um risco sério para a saúde pública.

E tem o objetivo de consciencializar: consciencializar para o uso preferencial de máscaras sociais

reutilizáveis, porque a reutilização das máscaras é essencial para reduzir o impacte ambiental e social,

permitindo reduzir a produção de resíduos.

Para dar resposta a estes três objetivos, o Partido Socialista propõe que o Governo promova uma campanha

de sensibilização que reforce a informação sobre a correta deposição dos equipamentos de proteção individual

Página 62

I SÉRIE — NÚMERO 50

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para efeitos de prevenção do contágio e informe sobre os impactes da deposição incorreta destes equipamentos.

Aliás, o Governo comprou antecipadamente 15 milhões de euros de publicidade em órgãos de comunicação

social, com o intuito de divulgar informação oriunda da Direção-Geral da Saúde relacionada com a pandemia

COVID-19 como, também, relacionada com outros assuntos de caráter social, que incentive a produção, a

comercialização e a utilização de máscaras sociais reutilizáveis — repito, máscaras reutilizáveis — de acordo

com as normas já estabelecidas pelo CITEVE (Centro Tecnológico das Indústrias Têxtil e do Vestuário), e que,

em diálogo com as autarquias, garanta o reforço de contentores de lixo indiferenciado junto de empresas de

grande dimensão, em supermercados, hospitais, edifícios públicos, escolas, transportes públicos.

Só assim os portugueses perceberão, desde o primeiro momento, que o combate à COVID-19 depende de

todos nós. E esse combate está a correr bem.

Agora, chegada a hora de regressar gradualmente à normalidade, o combate à COVID-19 continua a

depender de todos.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado João Gonçalves

Pereira, do CDS-PP.

O Sr. João Gonçalves Pereira (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Sobre o projeto de lei

do PCP não nos vamos pronunciar, porque ainda estamos a analisá-lo com mais detalhe, mas em relação às

outras iniciativas que são aqui apresentadas, elas, de alguma forma, visam colmatar uma lacuna.

A pandemia de COVID-19 levou, por parte da população em geral, à utilização de máscaras, ao uso de luvas,

ao uso de vários equipamentos de proteção individual para proteção do coronavírus. O Ministério do Ambiente

e da Ação Climática, a APA (Agência Portuguesa do Ambiente) e a ERSAR (Entidade Reguladora dos Serviços

de Águas e Resíduos) criaram orientações para a população quanto à gestão de resíduos. Fizeram-no, e bem.

O problema é que a população em geral não tem conhecimento dessas mesmas orientações e, portanto, elas

servem de muito pouco, uma vez que não foram divulgadas.

Portanto, há aqui, como já foi referido neste debate, um problema ao nível do que pode ser a própria

contaminação e a disseminação do vírus, seja com trabalhadores, seja para a população em geral. Mas há algo

também de extremamente positivo, que é o incentivo à utilização e ao recurso a materiais reutilizáveis, e que

deve ser também uma prioridade.

Em relação à campanha nacional, o CDS acompanha a proposta apresentada nesse sentido, como é

evidente. É pertinente divulgar e difundir as orientações e as recomendações para proteção da saúde pública e

deve haver aqui um particular envolvimento das próprias autarquias, que têm aqui, como é evidente, um papel

essencial de sensibilização das suas populações.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Tem a palavra, para uma intervenção, a Sr.ª Deputada não inscrita

Joacine Katar Moreira.

A Sr.ª Joacine Katar Moreira (N insc.): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A questão sanitária não

pode ser dissociada da questão ambiental. Salvar o planeta é cada dia mais óbvio, significa também salvar as

nossas existências, a nossa, a dos animais e a de todos os seres que habitam este planeta.

Mas, para nos salvaguardarmos individualmente, coletivamente, socialmente, é importante não nos

esquecermos de que tanto as luvas de plástico como as máscaras descartáveis não estão a ajudar a esse

objetivo. Portanto, é necessário começar por limitar o consumo exponencial de plástico descartável que se tem

vindo a verificar nesta situação de pandemia. Isto vai levantar-nos um enorme problema de aumento de resíduos

e, igualmente, do respetivo tratamento.

Concordo, como é óbvio, com todas as intervenções anteriores no que diz respeito à necessidade de o

Governo apostar o mais rapidamente possível numa pedagogia musculada, e de, igualmente, incentivar o uso

de máscaras não descartáveis. É mais ecológico e também é mais económico. E a Assembleia pode dar o

exemplo, evitando, cada um e cada uma de nós, individualmente, usar máscaras descartáveis.

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7 DE MAIO DE 2020

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A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Chegámos ao fim deste debate.

Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Mariana Silva, do PEV.

A Sr.ª Mariana Silva (PEV): — Sr.ª Presidente e Srs. Deputados: No final deste debate, não podemos deixar

de registar o facto de quase todos os partidos terem vindo ao encontro das preocupações de Os Verdes, o que

atesta bem a importância do assunto que trouxemos a debate, ou seja, a necessidade de dar um destino

adequado aos materiais de proteção individual depois de utilizados, evitando problemas com o tratamento de

outros resíduos e salvaguardando os trabalhadores que têm de lidar com os mesmos.

A esses homens e mulheres anónimos não será demais agradecer e lembrar que a sua valorização não

passa apenas por boas palavras e elogios que o vento levará. Valorizar os trabalhadores dos resíduos sólidos

é corresponder às suas exigências e reclamações, é atribuir-lhes salários justos e atribuir-lhes o subsídio de

risco e salubridade.

Entretanto, parece-nos necessário reforçar a ideia de que se devem usar devidamente os materiais de

proteção individual, porque, além de proteger quem os usa, é também uma forma de podermos socializar e

trabalhar de forma mais segura. Relembramos que podemos optar por usar máscaras reutilizáveis, que terão

um tempo de vida útil mais prolongado. Não podemos é esquecer-nos de cumprir todas as outras medidas de

proteção, que devem, também elas, ser exaustivamente relembradas.

Em tempos de pandemia não será uma atitude responsável deixar de separar os resíduos. É necessário

continuar a colocá-los nos ecopontos mais próximos. Mesmo que a recolha porta a porta de resíduos como o

plástico, o papel e o vidro tenha sido interrompida em alguns municípios, é necessário que todos façamos um

esforço adicional para que se continuem a separar os resíduos. Os comportamentos adquiridos ao longo dos

anos devem manter-se em nome de uma maior qualidade de vida para todos e do respeito ambiental.

Aplausos da Deputada do PCP Alma Rivera.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Srs. Deputados, chegámos ao fim da nossa ordem de trabalhos.

Amanhã, dia 7, temos sessão plenária às 15 horas, com a seguinte ordem do dia: debate quinzenal com o

Primeiro-Ministro, ao abrigo da alínea b) do n.º 2 do Artigo 224.º do Regimento, seguido da discussão da

Proposta de Lei n.º 30/XIV/1.ª (GOV) — Altera as medidas excecionais e temporárias de resposta à pandemia

da doença COVID-19, terminando com as votações regimentais.

Desejo-lhes um bom resto de dia. Até amanhã.

Está encerrada a sessão.

Eram 19 horas e 25 minutos.

Presenças e faltas dos Deputados à reunião plenária.

A DIVISÃO DE REDAÇÃO.

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