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4 DE JULHO DE 2020

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Por outro lado, não é admissível, salvo nas circunstâncias expressamente previstas em relação ao trabalho

suplementar, que os trabalhadores excedam o número de horas diárias, sejam incomodados fora do horário de

trabalho, sejam malvistos por não estarem permanentemente disponíveis. Portanto, devem ser estabelecidos

limites claros à prestação de trabalho, nomeadamente a nível de horário, garantindo o direito à desconexão

profissional e à compatibilização da vida pessoal e familiar dos trabalhadores com a sua vida profissional.

Em suma, importa acautelar que não se promovam mais práticas de exploração dos trabalhadores,

assegurando a punição dos infratores, cabendo, obviamente, às entidades públicas ou financiadas por dinheiros

públicos dar o exemplo.

Assim, porque este debate é também sobre condições de trabalho, resta-nos saber que medidas vai o PAN

apresentar de promoção do emprego, em particular para os mais jovens, e que medidas irá apresentar para

combater os vínculos precários, que são o flagelo da nossa sociedade, como o uso excessivo do trabalho

temporário e a utilização abusiva dos falsos recibos verdes.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Soeiro, do

Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda.

O Sr. José Moura Soeiro (BE): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A pertinência deste debate é

inquestionável, mas ele só será equilibrado se recusarmos quer a ideia de que não há nada a fazer relativamente

ao teletrabalho, quer o deslumbramento acrítico e classista sobre o teletrabalho.

A Escola Nacional de Saúde Pública revelou, num inquérito, que 54% das pessoas que ganham menos de

650 € e 76% dos trabalhadores com escolaridade até ao 9.º ano tiveram de ir para os seus locais de trabalho.

Pelo contrário, 75% dos trabalhadores que ganham 2500 € mensais, ou mais, e 74% dos que têm ensino superior

puderam ficar em casa. Ou seja, o teletrabalho, tal como o confinamento, não é igualitário e reproduz

desigualdades. Ele foi mais existente nas grandes empresas do que nas pequenas e médias empresas, ele diz

respeito a alguns setores da economia, não diz respeito, por exemplo, ao alojamento e à restauração, às

limpezas, à distribuição, aos transportes e a grande parte da indústria transformadora. Muitos dos serviços e

das indústrias que servem de suporte básico à atividade económica não dispensam o trabalho presencial.

Mas o teletrabalho foi também um fenómeno de alguns trabalhadores, não de todos, e não foi igualitário em

termos de género.

É certo que a transição apressada e desregrada para o teletrabalho nos confronta com a necessidade de

pensarmos e de intervirmos na regulação desta forma de trabalho. É verdade que o Código do Trabalho é

incipiente e que a contratação coletiva raramente tem disposições sobre esta matéria. Ou seja, nós saltámos

para esta realidade sem os trabalhadores estarem devidamente protegidos pelas suas formas de regulação. E

há desafios importantíssimos precisamente por o teletrabalho se prestar a múltiplos abusos — abusos no tempo

de trabalho e no seu prolongamento, abusos que resultam do isolamento dos próprios trabalhadores, abusos na

invasão da esfera de intimidade e nos mecanismos de controlo — e também por se prestar ao reforço das

desigualdades e da divisão sexual do trabalho.

Estamos conscientes de que, em Portugal, como, aliás, a pandemia confirmou, somos melhores a legislar do

que a garantir que a lei é cumprida. Isto foi evidente, precisamente com a vaga de abusos que aconteceu neste

período no que diz respeito aos despedimentos, ao layoff, ao trabalho precário, ao trabalho temporário, à

imposição de férias e, claro, também ao teletrabalho.

O Sr. Jorge Costa (BE): — Muito bem!

O Sr. José Moura Soeiro (BE): — O lado solar do teletrabalho que o PAN aqui trouxe tem de ser confrontado

com o lado sombrio, que não pode ser ignorado. Aliás, é muito surpreendente que o entusiasmo com o

teletrabalho não se fundamente em opções, em dados e em estudos concretos. O próprio Governo anuncia 25%

da Administração Pública em teletrabalho — porquê 25%? Com que fundamento? Pensou-se nos riscos?

Acautelaram-se, por exemplo, as questões de género, a proteção dos direitos do trabalho? Ninguém sabe! Mas

sabemos que os riscos relacionados com o teletrabalho estão identificados. São riscos relativos ao tempo de

trabalho, a uma confusão de fronteiras entre vida pessoal e vida profissional, a uma ausência de horário claro,

à diluição de balizas que permitam, justamente, controlar os horários de trabalho, a solicitações permanentes e

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