O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

10 DE MARÇO DE 1990

921

II

4.1 — A noção de serviço público, criada em França por Hauriou, Duguit, Jèze e outros administrativistas, está hoje em crise, enquanto acaba por associar à prossecução de uma necessidade pública um serviço administrativo.

E não será por certo pela via das figuras de «serviço público impróprio» e de «serviço público virtual», de origem, respectivamente, italiana e francesa, que a clarificação de todo se operará. Essas noções ajudarão, no entanto, a melhor compreender que certas actividades privadas deverão ser exercidas como se de um serviço público se tratasse, estando para tal sujeitas a uma prévia autorização e a uma estrita regulamentação.

O que decisivamente relevará é que estão em jogo actividades de «interesse público».

Por conseguinte, a fórmula constitucional usada no n.° 5 do artigo 38.° não se afigura inteiramente feliz. Valer-lhe-á a circunstância de, como observa Alessi (Le prestazioni amministrative rese ai privatti, Milão, 1956, p. 24), as noções de «serviço público» serem «tantas como os autores que delas se ocuparam, mesmo ocasionalmente».

4.2 — O que está em vista é, com efeito, a realização de certos fins e valores de interesse geral. Estar--se-á, nesta perspectiva, perante uma verdadeira «função pública» (Öffentliche Aufgabe), na expressão a que fez apelo o Tribunal Constitucional alemão exactamente na decisão de 4 de Novembro de 1986, em que consagrou o sistema dualista de televisão, numa coexistência de empresas privadas com entidades públicas.

Ligar a publicização tendencial das actividades de rádio e de televisão à ideia de dominialidade não será facilmente comportável no nosso ordenamento, em que as telecomunicações, em geral, não estão explicitamente incluídas na listagem feita no n.° 1 do novo artigo 88.° da Constituição, nem em qualquer lei ordinária.

Não restará dúvida sobre o propósito do legislador constitucional ao modelar o actual n.° 5 do artigo 8.°: foi o de criar ao Estado o encargo de assegurar que, a par de estações emissoras privadas, sempre existam estações de natureza pública. A forma jurídica dessas estações não será necessariamente, e nem sequer o será tendencialmente, a de serviços administrativos, mas a de empresas públicas. Sobre isso parece não haver discrepância.

5 — A distinção entre serviço público e serviço de interesse público ajudará, de qualquer modo, a melhor clarificar o sistema.

Na Lei espanhola n.° 10/1988, de 3 de Maio, respeitante à televisão privada, qualifica-se, logo no preâmbulo, qualquer tipo de televisão como um serviço público, cuja titularidade pertence ao Estado. «A titularidade estatal do serviço público não implica, porém, um regime de exclusividade ou de monopólio, mas, ao invés, que a gestão do serviço pode ser realizada de forma directa, pelo Estado, e de uma forma indirecta, pelos particulares que obtenham a respectiva concessão administrativa.» (Citado preâmbulo.)

Só que o modelo espanhol não coincide com o português, no que se pode extrair do nosso actual texto constitucional.

A titularidade das estações emissoras de radiotelevisão não terá de pertencer, como em Espanha, ao Estado, que estabelecerá com certas empresas privadas um

contrato de concessão. O que estará em causa é um licenciamento para o exercício de uma actividade de interesse público.

Não será o caso de uma gestão indirecta de um serviço público feita por particulares. A titularidade das estações emissoras passará a ser destes, embora com sujeição a um apertado elenco de requisitos e obrigações. E o licenciamento dependerá de concurso (n.° 7 do artigo 38.° e n.° 3 do artigo 39.°).

O regime de concessão apenas terá lugar quanto ao serviço público de radiotelevisão (n.° 1 do artigo 5.° da proposta de lei).

III

5.1 — Na proposta de lei as empresas privadas que explorarem a actividade de televisão deverão revestir a forma jurídica de sociedade anónima, com o capital social mínimo, inteiramente realizado, de 2,5 milhões de contos.

Não sofre dúvida que aquela forma jurídica é a solução correcta — de igual modo consagrada na aludida lei espanhola (artigo 2.°).

É, no entanto, de pôr interrogativa sobre se esse capital mínimo assegurará a viabilidade económica da empresa numa área em que o equipamento é extremamente dispendioso e em que a lucratividade imediata não se afigura fácil.

Bastará atentar, como exemplo, no caso francês.

Ao que informa Guy Drouot («Le statut de l'entreprise de communication audiovisuelle en France», in Revue internationale de droit comparé, Abril-Junho de 1989, pp. 449 e seguintes, maxime p. 456), a Télévision Française 1 (TF 1), atribuída ao grupo Bouygues e aos seus associados (Maxwell, Pergamon, etc), com a sua audiência de 47%, teve em 1987 um lucro de 20 milhões de francos. Mas não é de esquecer que é o canal «farol» da televisão francesa, com 47% de audiência, «herdeiro directo» do principal canal público.

Já, porém, a Société d'Exploitation de la Cinquième Chaîne (La Cinq), constituída pelo consórcio Hersant--Berlusconi e seus associados, teve no mesmo ano quase 700 milhões de francos de prejuízo.

E a Métropole Télévision (M 6) apresentou um défice de 350 milhões de francos.

5.2 — Como na Lei n.° 86-1067, de 30 de Setembro de 1986, as acções das sociedades anónimas deverão ser nominativas (artigo 36.° daquela lei e n.° 4 do artigo 10.° da proposta de lei).

Foi já observado por alguém especialmente qualificado na matéria (Francisco Pinto Balsemão, no Ex-presso, de 17 de Fevereiro de 1989) que a nominativi-dade se revela indesejável, já que isso impede os bancos e as seguradoras de participar em tais empresas.

Não se afigura, no entanto, que seja assim.

É através da nominatividade que se poderão controlar, com alguma eficácia, condições como as que constam dos n.os 2 e 3 da proposta de lei.

IV

6.1 — Adequa-se o regime constitucional português ao artigo 10.° da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, cujo n.° 1 dispõe:

Qualquer pessoa tem direito à liberdade de expressão. Este direito compreende a liberdade de opinião e a liberdade de receber ou de transmitir informações ou ideias sem que possa haver inge-