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II SÉRIE-A — NÚMERO S6

Parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias sobre o projecto de lei n.° 402/V (direito de queixa dos elementos das forças armadas ao Provedor de Justiça) e a proposta de lei n.° 112/V (estabelece o regime jurídico do exercício do direito de queixa de elementos das forças armadas ao Provedor de Justiça).

O Governo apresentou, na Assembleia da República, a proposta de lei n.° 112/V, que estabelece o regime jurídico do exercício do direito de queixa de elementos das forças armadas ao Provedor de Justiça.

De acordo com a respectiva justificação de motivos, ta] iniciativa visa regular as condições de exercício do direito de queixa, em cumprimento do disposto no n.° 3 do artigo 33.° da Lei de Defesa Nacional e das Forças Armadas.

Nos termos prescritos na Lei de Defesa Nacional e das Forças Armadas (artigo 33.°, n.° 2), o referido direito de queixa só pode ser exercido «uma vez esgotadas as vias hierárquicas estabelecidas na lei», não podendo, além disso, versar sobre a matéria operacional ou classificada.

Trata-se, ao que se vê, não de alterar a substância das disposições constantes da Lei de Defesa Nacional e das Forças Armadas mas de alcançar a sua regulamentação.

Em todo o caso, e face ao ordenamento constitucional resultante da última revisão constitucional, em matéria de forma dos actos (artigo 169.°, n.° 2, da Constituição da República Portuguesa), importa suscitar a dúvida sobre se não estaríamos —pelo que se refere à definição de deveres no âmbito das forças armadas — perante uma lei com estatutos de lei orgânica.

Mas porventura mais decisivo — pelas implicações no processo legislativo — é saber se regular o exercício de direitos por militares não implica que as respectivas normas, nos termos da alínea p) do artigo 167.° e do n.° 6 do artigo 171.° da Constituição da República Portuguesa, devam carecer de aprovação por maioria qualificada no Plenário da Assembleia da República.

Esse foi — recorde-se — o entendimento recentemente perfilhado pela Assembleia da República quando aprovou (artigo 6.° da Lei n.° 6/90, de 20 de Fevereiro) o «regime de direitos do pessoal da PSP», o qual, na matéria em apreço, vinha até então sendo transitoriamente regulado pela Lei de Defesa Nacional e das Forças Armadas.

Afigura-se que a solução dependerá da qualificação da situação jurídico-constitucional constante da proposta do Governo: se ela configurou uma situação da restrição de direitos, o caminho parece não poder deixar de ser o da qualificação supra-referida; se se entende que a regulação das condições de exercício do direito de queixa ao Provedor de Justiça não constitui matéria de restrição de direitos, dispensar-se-ia, de toda a evidência, a exigência de maioria qualificada em Plenário e na especialidade.

Adiantam-se, assim, alguns elementos de ponderação sobre o problema suscitado.

Em primeiro lugar, importará realçar a natureza do Provedor de Justiça como órgão não jurisdicional de garantia de direitos. Em face do qual é reconhecido aos cidadãos — a todos os cidadãos — o direito de «apresentar queixas por acções ou omissões dos poderes públicos».

Realce-se, em segundo lugar, que a Constituição estabelece a actividade do Provedor de Justiça como «independente dos meios graciosos e contenciosos previstos na Constituição e nas lei».

Perante o normativo constitucional e a natureza da sua força jurídica, directamente aplicável e vinculando as entidades públicas e privadas (artigo 18.°, n.° 1), parece que soluções restritivas do exercício do direito a militares caem, inevitavelmente, nos condicionalismos previstos na alínea p) do artigo 167.° e no n.° 6 do artigo 171.° da Constituição da República Portuguesa, tranduzindo-se na exigência de aprovação, na especialidade, por maioria de dois terços dos deputados.

A questão esteve já presente na última revisão constitucional.

Só que as interpretações do dispositivo constitucional afastam as hipóteses de restrição, por via legislativa ordinária, do conteúdo do direito.

Com efeito, perante a observação formulada na CERC (2.8 série, n.° 8 — RC, p. 178) de que as queixas apresentadas ao Provedor de Justiça deveriam poder ocorrer independentemente de quaisquer outros meios graciosos ou contenciosos, foi respondido (p. 179) pelo deputado Rui Machete que «o texto da Constituição é claríssimo quanto a essa independência [à do Provedor de Justiça], que não pode ser condicionada ao esgotamento de quaisquer meios».

Foi com esta interpretação que a CERC concluiu não ser necessário precisar mais o alcance das normas referentes ao Provedor de Justiça.

Acresce que o artigo 270.° da Constituição da República Portuguesa, no qual se define o elenco dos direitos fundamentais susceptíveis de restrição de exercício a militares e agentes militarizados, não contempla o direito de queixa individual ao Provedor de Justiça.

Tal sugere a insusceptibilidade constitucional de medidas restritivas, neste domínio, por via da lei ordinária.

Em conclusão e propondo-se o cumprimento das exigência constitucionais relativas ao processo de aprovação, do mesmo passo que se salienta ser a solução defendida distinta da recentemente confirmada para o pessoal da PSP, admite-se que a proposta de lei n.° 112/V pode subir a Plenário para discussão e votação na generalidade, sem embargo das dúvidas de inconstitucionalidade e tramitação legislativa, nos termos supra-referidos.

Quanto ao projecto de lei n.° 402/V, mutatis mu-tandis, é-se de opinião que prevalecem as mesmas razões.

Palácio de São Bento, 4 de Julho de 1990. — O Relator, Jorge Lacão. — O Presidente da Comissão, Guilherme Silva.

Nota. — Este parecer foi aprovado por unanimidade.

Parecer da Comissão de Defesa Nacional sobre o projecto de lei n.° 402/V e a proposta de lei n.° 112/V

A Comissão Parlamentar de Defesa Nacional, tendo apreciado, na sua reunião de 3 de Julho, a proposta de lei n.° 112/V e o projecto de lei n.° 402/V, referentes ao regime de direito de queixa de elementos das forças armadas ao Provedor de Justiça, deliberou emitir o parecer de que os mesmos se encontram em condições de ser apreciados em Plenário.

Assembleia da República, 4 de Junho de 1990. — O Presidente da Comissão, Jaime Gama.