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26 DE ABRIL DE 1991

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mesmo o fenómeno de manutenção de certas vogais abenas por motivação etimológica já inconsciente, em casos como pregar (are. preegar, de predicare), corar (are. coorar, de colorare), padeiro (are. paadeiro, de panatariu); e há casos de "fechamento" não impedido pela manutenção do grafema de origem consonantica, como em exactidão, actual ou actualidade, pelo menos cm pronuncias correntes; mas há também casos, talvez de ultracorrecção, que revelam a importância, mesmo analógica, desse factor etimológico: inflação, retórica (talvez por confusão entre o étimo grego do termo rhetor, ou orador, e o latino rector).

Um dado analógico a ponderar quanto à hipótese (agora proposta do projecto) no sentido de se eliminarem os grafemas de origem consonantica que indiciam o carácter "aberto" da vogal átona anterior é o de que tais grafemas são abolidos quando se não pronunciam a seguir a vogais fechadas do tipo i e u: aflição, rotura (divergente de ruptura), ou quando se seguem a vogais cuja abertura se não manteve (cativo). Outro dado a ponderar é o de qual será a evolução cm curso nos lusofalantcs africanos: segundo informação do foncticista Ernesto Pardal, nem esses grafemas nem a consoante / (velar a fechar sílaba) impedem que cm Cabo Verde se feche já a vogal pretónica grafada a de acalmar, Almeida c activo.

O principal inconveniente quanto à omissão do grafema de origem consonantica e que no portugués europeu ainda assinala vogal anterior aberta consiste na discrepancia que isso vem criar cm relação a urna larga área de línguas com léxico românico (incluindo o ingles c o alemão): a grafia colecção é coerente com o castelhano colección, o francês collecUon, o ingles collection, o alemão kollektiv; abstracto (português c castelhano) condiz com o francês abstrait, o italiano asiraiio, o ingles absiract, o alemão abstrakt, de acordo com regras gerais de correspondência.

Há dc facto preferência cm leitorados, mesmo europeus, pela pronúncia c grafia brasileiras; mas isso deve relacionar-se sobretudo com a mais diferenciada (e por isso didácticamente mais difícil) gama do vocalismo da variante portuguesa, e com a maior importância demográfica e outra do Brasil, pois, como acabamos dc recordar, a grafia portuguesa ainda hoje oficial está mais próxima das tradicionais e hoje vigentes nas línguas ocidentais europeias; a adopção da actual grafia brasileira mantém os próprios brasileiros alfabetizados mais distantes das culturas estrangeiras que, a muitos títulos, mais imporiam aos lusofalantes: as culturas dc expressão inglesa, castelhana, francesa e alemã.

De qualquer modo, é inconsequente e contraproducente que em Portugal se passe a escrever conceçâo e receção, enquanto no Brasil se continua a escrever concepção, recepção pelo facto idiossincrático de lá se pronunciar ainda em casos como estes a etimológica consoante grafada p, com o risco de cm Portugal se fomentarem indesejáveis homonímias dessas palavras com concessão e recessão, respectivamente, c uma indiferenciação vocálica que não existia.

Quer em aulas do ensino secundário, quer mesmo na Faculdade, verifiquei ser necessário pronunciar o primeiro c dc intersecção para eviuir que tal termo

se confundisse com o termo intercepção; traia-sc dc uma confusão dc tipo frequente, que se agravará se a omissão do grafema c ou p produzir uma homonímia com intercessão.

Embora não seja possível dirimir esta questão com argumentos formalmente demonstrativos, parccc-mc mais sensato manter-se a escrita correspondente a consoantes etimológicas que assinalam vogal anterior aberta, ou que evitam a ambiguidade.

Em casos como Egipto/egípcio,ou apocalipse/ apocalíptico parece-me que o p é dc manter, por motivo de coerência etimológica muito óbvia.

Sublinhe-se, ainda, que a eliminação das chamadas consoantes mudas vai provocar, paradoxalmente, divergências ortográficas em diversas palavras que, de acordo com a norma ortográfica vigente, se escrevem agora do mesmo modo em Portugal e no Brasil. Cilem-sc, a u'tulo de exemplo: excepcional, excepcionalidade, excepcionar, excepcionável, recepção, recepcionar, recepcionista, receptacular, receptáculo, receptibilidade, receptível, receptividade, receptivo, receptor.

Outras reservas e críticas dizem respeito a incongruências de algumas normas reguladoras do hífen. É incongruente escrever bem-criado, bem-ditoso, bem-falante, bem-manaado, bem-nascido, bem-soante, bem-visto, a par dc malcriado, malditoso, malfalante, malmandado, malnascido, malsoante, malvisto. Seria mais coerente preceituar que os advérbios bem e mal se não podem aglutinar com palavra seguinte começada por vogal, h, m ou n {bem-estar e mal-estar, bem-humorado e mal--humorado, bem-manaado e mal-mandado, bem-nascido e mal-nascido), subslituindo-se bem por ben quando aglutinado com palavra seguinte não começada por b ou p (bensoanie, benvisto).

Suscita lambem reservas o uso de k, w e y tal como se encontra preceituado na base i, 2.9, b). Com efeito, o uso de k, w e y em topónimos (e seus derivados) apenas se poderá aceilar em atenção à coerência ortográfica interna de determinada origem nacional (Kwanza) ou de origem mais amplamente bania (Malawi, malawiano), embora à custa da coerência ortográfica interna do domínio lusofalante (a não ser que, por exemplo, se passasse a escrever kwando cm vez de quando); mas parece totalmente inaceitável esse uso em topónimos originários dc outras línguas, sobretudo quando exigem a transi iteração de outros alfabetos, e sobretudo a transcrição de escritas não-alfabélicas, como é o caso de um exemplo citado: Kuwait.

Provoca igualmente discordâncias a designação proposta, na base i, 1.°, para a letra w. Ao contrário do "Anteprojecto de Bases da Ortografia Unificada da Língua Portuguesa" (1988), o "Acordo Ortográfico" propõe uma designação dc origem inglesa —"dáblio"—, em vez de um nome consistente com a origem latina ou (indirectamente) helénica do alfabeto.»

2.5:

«Uma reforma ortográfica tem necessariamente numerosas e extensas incidências no domínio pedagógico--didáctico, particularmente no âmbito dos dois primeiros ciclos do ensino básico. É estranhávcl, por conseguinte, que o Ministério da Educação, aparentemente, não tenha intervindo no processo dc negociação que conduziu à assinatura do "Acordo Ortográfico", visto que se trata