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Sábado, 4 de Julho de 1992

II Série-A — Número 48

DIARIO

da Assembleia da República

VI LEGISLATURA

1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1991-1992)

SUMÁRIO

Decretos (n." 167VI e 17/V1):

N." I6/VI — Autoriza o Governo a estabelecer o regime contra-ordenacional aplicável à violação do exclusivo de

exploração de apostas mútuas hípicas.............................. 926

N.° 17/VI — Autoriza o Governo a rever o regime de entrada, permanência, saída e expulsão de estrangeiros do território nacional............................................................... 926

Projectos de lei (n." 48/VI, S9/VI, 81/VI e 82/VI, 109/ VI, 132/VI, 163/VI e 182/VI a 18S/VI):

N° 48/VI (bases de um plano de educação ambiental):

Relatório da Comissão de Administração do Território, Poder Local e Ambiente............................................... 927

N." 59/VI — Acesso ao ensino superior (nova versão apresentada pelo PS)......................................................... 927

N.°* 81/VI (programa de rearborização para áreas percorridas por inofndios florestais) e 82/VI (programa de emergência para a defesa da floresta portuguesa):

Relatório da Comissão de Agricultura e Mar............. 929

N.° 109/V1 (lei dos baldios):

Relatório e parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias............... 929

N.° 109/VI e 163/VI (lei sobre os baldias):

Relatório da Conússão de Administração do Território, Poder Local e Ambiente............................................... 954

N.° 132/VI (reformula o subsídio de integração dos jovens na vida activa):

Relatório e parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitas, Liberdades e Garantias............... 954

N.° 182/VI — Reelevação da povoação de Vilar de

Maçada à categoria de vila (apresentado pelo PS)......... 955

N." 183/VI — Criação da freguesia de Vila Verde no

concelho de Seia (apresentado pelo PS).......................... 957

N.° 184/VI — Criação da freguesia de Serem (apresentado

pelo PSD)........................................................................... 959

N.° 185/VI — Lei das associações de defesa do ambiente (apresentado pelo PSD)..................................................... 960

Projecto de deliberação n.' 34WI):

Constituição de uma Comissão Eventual para a Revisão Constitucional..................................................................... 962

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DECRETO N.2 16/VI

AUTORIZA 0 GOVERNO A ESTABELECER 0 REGIME CONTRA-ORDENACIONAL APLICÁVEL À VIOLAÇÃO DO EXCLUSIVO DE EXPLORAÇÃO DE APOSTAS MÚTUAS HÍPICAS

A Assembleia da República decreta, nos termos dos artigos 164.°, alínea e). 168°, n.° 1. alínea d), e 169.°, n.° 3, da Constituição, o seguinte:

Artigo 1,° Fica o Governo autorizado a legislar no sentido de punir com coima até 50 000 000$ a violação, por pessoas singulares ou colectivas, do exclusivo de exploração das apostas mútuas hípicas, nomeadamente mediante a venda, distribuição ou publicitação de bilhetes de concursos estrangeiros, bem como a promoção, organização ou exploração de outros concursos de apostas mútuas hípicas, incluindo a emissão, a distribuição ou venda dos respectivos bilhetes ou boletins e a publicitação da sua realização.

Art. 2." A autorização legislativa concedida pela presente lei tem a duração de 60 dias.

Aprovado em 24 de Junho de 1992.

O Presidente da Assembleia da República, António Moreira Barbosa de Melo.

DECRETO N.2 17/VI

AUTORIZA 0 GOVERNO A REVER O REGIME DE ENTRADA, PERMANÊNCIA, SAÍDA E EXPULSÃO DE ESTRANGEIROS DO TERRITÓRIO NACIONAL

A Assembleia da República decreta, nos termos dos artigos 164°, alínea e), 168°, n.° 1, alíneas b), c) e d), e 169.°, n.° 3, da Constituição, o seguinte:

Artigo 1.°

Objecto c sentido

É concedida ao Governo autorização para alterar o regime legal de entrada, permanência, saída e expulsão de estrangeiros do território nacional, no sentido de o adequar ao disposto no n.° 5 do artigo 33." da Constituição e às obrigações decorrentes dos acordos de que a República Portuguesa seja signatária e para aprovar medidas excepcionais destinadas a regularizar a situação dos cidadãos não comunitários que no País se encontrem em situação ilegal.

Artigo 2.° Extensão

A legislação, a elaborar ao abrigo do artigo anterior, tem a seguinte extensão:

a) Transpor as directivas comunitárias aplicáveis e regular as condições especiais de entrada e permanência de cidadãos comunitários em Portugal;

b) Aperfeiçoar a disciplina de concessão de vistos, adequando as suas modalidades, formalidades e duração às particulares exigências e à diversidade

de finalidades visadas pelos cidadãos estrangeiros requerentes;

c) Clarificar os critérios de concessão dc autorizações de residência;

d) Alterar o regime de expulsão, prevendo a determinação da expulsão por autoridade judicial nos casos em que esta constitua pena acessória ou relativamente a estrangeiro que tenha entrado ou permaneça regularmente em território nacional, ao abrigo de autorização de residência ou de pedido de asilo não recusado, e, sem diminuição das garantias fundamentais, constituir um processo mais célere, ao qual sejam aplicáveis subsidiariamente as disposições do Código de Processo Penal relativas ao processo sumário;

e) Prever a determinação da expulsão por autoridade administrativa, quando o estrangeiro penetre ou permaneça ilegalmente em território nacional, e criar para estes casos um processo adequado, com respeito das garantias fundamentais e das competências reservadas à autoridade judicial;

f) Prever a possibilidade de, nos processos de expulsão, o juiz competente determinar, para além das medidas de coacção previstas no Código de Processo Penal, a obrigação de apresentação periódica no Serviço de Estrangeiros e Fronteiras ou outras que se revelem adequadas;

g) Criar o tipo legal de crime de violação da ordem de expulsão, punindo com prisão até 2 anos ou multa até 100 dias a entrada em território nacional de estrangeiros durante o período por que a mesma lhe foi vedada;

h) Criar o tipo legal de crime de auxílio à imigração ilegal, prever a punibilidade da sua tentativa e a pena de prisão até dois anos para quem favorecer ou facilitar a entrada irregular de cidadão estrangeiro em território nacional ou a pena de prisão de um a três anos para quem agir com intenção lucrativa;

/) Criar o tipo legal de crime de associação de auxílio à imigração ilegal, prever a punibilidade da sua tentativa e as penas de prisão de um a cinco anos para quem fundar ou fizer parte de grupos, organizações ou associações cuja actividade seja dirigida à prática do crime de auxílio à imigração ilegal e de dois a oito anos para quem os chefiar ou dirigir;

j) Prever a aplicação do regime das contra-ordenações à permanência ilegal, à falta de declaração úe entrada, ao transporte de cidadãos com entrada não autorizada no País, à falta de visto de trabalho, ao uso indevido de título de viagem, à falta de apresentação de documento de viagem, à falta de título de residência individual, à inobservância de deveres do residente e à falta de comunicação do alojamento;

0 Definir as condições de regularização da situação dos cidadãos estrangeiros não comunitários que, em violação das normas respeitantes à concessão de autorização de residência, se encontrem em território nacional, podendo ser prevista a não sujeição a procedimento judicial dos comportamentos que constituam infracção àquelas normas, quer dos estrangeiros quer das entidades empregadoras que colaborem no processo, bem como a suspensão ou extinção da instância em relação aos procedimentos administrativos ou judiciais cm curso;

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m) Prever que as entidades habilitadas para a recepção dos requerimentos de regularização possam solicitar ao Centro de Identificação Civil e Criminal o certificado de registo criminal dos requerentes para instrução do respectivo processo.

Artigo 3."

Durava»

A presente autorização legislativa tem a duração de 180 dias.

Aprovado em 9 de Junho de 1992.

O Presidente da Assembleia da República, António Moreira Barbosa de Melo.

Relatório da Comissão de Administração do Território, Poder Local e Ambiente sobre o projecto de lei n.e 48/VI (bases de um plano de educação ambiental)

O presente projecto de lei propõe, designadamente, que:

«A educação ambiental integra a educação global dos cidadãos constituindo um processo permanente e participativo de explicitação de valores [...]» (Arügo 1.°);

«É elaborado um plano de educação ambiental que respeite as seguintes características:

a) Promover uma educação permanente virada para o íuturo;

b) Criar uma perspectiva educativa interdisciplinar;

c) Desenvolver uma educação ambiental orientada para a solução dos problemas;

d) Proporcionar a ligação escola/comunidade.» (Arügo 3o);

Se distinga entre educação ambiental formal e educação ambiental não formal. (N.° 1 do artigo 4.°);

«O plano de educação ambiental será elaborado por uma comissão criada para o efeito, a funcionar no Instituto Nacional do Ambiente (INAMB), com a seguinte composição:

a) Quatro representantes do Ministério da Educação a nível dos ensinos básicos secundário e superior,

b) Quatro representantes do INAMB;

c) Dois representantes do Ministério da Saúde.» (Artigo 5.");

Seja utilizado um determinado timing (n.os 2, 3 e 4

do artigo 5.u); Sejam criadas comissões regionais para a educação

ambiental e define as funções a desenvolver.

(Artigos 7o e 8").

Em termos específicos, salienta-se o seguinte:

a) A reforma educativa em curso, nomeadamente na sua vertente curricular concretizada em alguns as-

pectos pelo Decreto-Lei n.° 286/89, de 29 de Agosto, incluiu, já, medidas que viabilizam a educação ambiental;

b) No ensino regular, a criação da área-escola área curricular não disciplinar, especialmente vocacionada para projectos interdisciplinares, de articulação entfe a escola e o meio será um espaço voca-

. cionado para projectos de educação ambiental, projectos esses que poderão também ter desenvolvimento nas actividades de complemento curricular;

c) Por outro lado, os programas das disciplinas constantes dos novos planos curriculares incluem já objectivos no âmbito da educação ambiental, preconizando metodologias activas viabilizadoras de projectos na área do ambiente e inserindo conteúdos no domínio da vertente em análise;

d) A criação da disciplina de Desenvolvimento Pessoal de Social aparece, também, como vocacionada para o desenvolvimento de projectos no âmbito da educação ambiental.

De salientar que a aprovação de legislação nesta área deverá ter em consideração as conclusões do grupo de trabalho criado pelo despacho conjunto dos Secretários de Estado do Ambiente e dos Recursos Naturais, da Reforma Educativa e Adjunto do MinisUo da Educação.

A Comissão de Administração do Território, Poder Local e Ambiente é do seguinte parecer.

O projecto de lei n.° 48/VI, do PCP, sobre bases de um plano de educação ambiental, preenche os requisitos constitucionais e regimentais para subir a Plenário.

Palácio de São Bento, 1 de Julho de 1992. — O Deputado Relator, Fernando Pereira.

PROJECTO DE LEI N.9 59/VI

ACESSO AO ENSINO SUPERIOR

Exposição de motivos

Depois de quase duas décadas de aplicação do numerus clausus, não foi feita a avaliação das consequências daquele mecanismo na qualidade do ensino e da investigação.

O nutnerus clausus surge como que um dispositivo para colmatar as insuficiências estruturais dos estabelecimentos universitários.

A existência de numerus clausus cria inúmeras dificuldades aos jovens que terminam o 12." ano, agravadas pela ausência de critérios claros na selecção dos candidatos.

A informação dos candidatos c sua família é insuficiente e tardiamente divulgada, aumentando a injustiça do sistema de acesso em vigor.

A célebre PGA, tida corno instrumento de «medida» da «maturidade» e das «capacidades de expressão» dos candidatos, criou as maiores injustiças e agravou as desigualdades no acesso ao ensino superior. Causou as maiores perturbações no sistema de ensino de que há

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memória no Portugal democrático. E só foi possível pela ausência de estudos, análises e avaliação das transformações sociais e económicas ocorridas nos últimos 20 anos, e das suas consequências no meio universitário.

O vazio informativo a esse respeito mantém-se. Paradoxalmente, multiplicam-se as escolas de ensino superior privado, que têm visto os seus cursos reconhecidos sem critérios de rigor e qualidade. O numerus clausus e o aumento da procura, alimentada com os excluídos do sistema público, têm favorecido o crescimento anárquico do ensino superior particular e cooperativo.

A criação de condições de igualdade no acesso ao ensino superior rclaciona-se também com esta oferta do ensino privado. Sem a garantia de critérios de rigor e qualidade no seu licenciamento, estas escolas potenciam reduzidas possibilidades de saídas profissionais para os seus formandos, ampliando, desse modo, as desigualdades sociais.

Os problemas que o acesso ao ensino superior coloca exigem igualmente um exame aprofundado das taxas de sucesso e de repetência nas universidades, da sua qualidade pedagógica, científica e da sua eficácia.

Entretanto, é necessário pôr termo às situações injustas e arbitrárias que os diferentes regimes de acesso ao ensino superior têm originado, e corrigir as disfunções conhecidas, por forma a atingir os seguintes objectivos:

Aumentar a capacidade de acesso ao ensino superior aos alunos que concluem o ensino secundário;

Favorecer melhores oportunidades para aqueles que, ao longo da sua vida, decidam ingressar ou reingressar no ensino superior,

Garantir a estabilidade de critérios e transparência nos processos de selecção;

Permitir a transformação da vida escolar no ensino secundário, através da valorização de actividades de âmbito cultural, científico, desportivo e cívico, por forma a promover o desenvolvimento e a individualidade dos alunos e o respeito pela sua personalidade e opções.

Aumentar a qualidade e a justiça no sistema de avaliação do ensino secundário, designadamente criando as condições favoráveis a uma maior igualdade de critérios entre estabelecimentos de ensino.

O acesso ao ensino superior far-se-á de acordo com os elementos constantes de um processo de candidatura que incluirá os percursos escolares nos anos terminais, através das notas finais de cada ano; provas nacionais sobre saberes e competências trabalhadas no ciclo terminal e provas específicas da responsabilidade do ensino superior.

As provas nacionais contribuirão para garantir uma maior igualdade de critérios na avaliação.

A conclusão das provas nacionais conferirá um diploma de estudos secundários que facilitará a inserção profissional dos que não prosseguirem os estudos e facilitará o acesso ao ensino superior de segunda oportunidade.

A seriação dos candidatos ao ensino superior far-se-á, de acordo com os critérios de avaliação dos elementos constantes do processo de candidatura, valorizando devidamente o percurso do aluno no ensino secundário.

Com vista a corrigir situações de injustiça relativa que se têm verificado, serão reformulados os contingentes especiais de acesso ao ensino superior.

O ensino superior de segunda oportunidade será desenvolvido por forma a estimular o reingresso de alunos que

o abandonaram, antes de o terem concluído, bem como de alunos que nele não puderam ingressar na idade escolar normal,

É abolido o actual regime de acesso ao ensino superior,

designadamente a PGA.

Nestes termos, ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, os deputados abaixo assinados, do Grupo Parlamentar do Partido Socialista, apresentam o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.°

Orientação e InTormação escolar e profissional

1 — É constituído nas escolas dos ensinos básico e secundário um gabinete de orientação e informação escolar e profissional que desenvolva nos alunos a capacidade para fazerem opções e serem protagonistas do seu próprio futuro.

2 — As famílias receberão igualmente informação e apoio para a orientação dos seus educandos.

3 — Na informação fornecida a alunos e famílias constarão índices estatísticos sobre o mercado de emprego no País e informação detalhada das características dos vários cursos que se oferecem à opção dos jovens.

Artigo 2.°

Desenvolvimento do ensino superior público

O Governo implementará um programa que preveja de forma quantificada e escalonada no tempo o desenvolvimento do ensino superior público de forma a abolir o numerus clausus, a fim de garantir a efectividade do direito de acesso ao ensino superior.

Artigo 3.°

Acesso ao ensino superior

0 acesso ao ensino superior dos candidatos far-se-á de acordo com os elementos constantes do seu processo de candidatura, que incluirá:

a) Os percursos escolares dos alunos ao longo dos anos terminais do ensino secundário (10.°, 11.° e 12 .° anos), ou equivalente, através das suas notas finais de cada ano;

b) Provas nacionais sobre os saberes e competências trabalhados no ensino secundário, prelendendo-se que tenham um efeito regulador;

c) Provas específicas da responsabilidade dos estabelecimentos do ensino superior, tendo em consideração os programas do ensino secundário.

Artigo 4.°

Provas nacionais

1 — As provas nacionais previstas na alínea b) do artigo anterior realizam-se no final do 12.° ano de escolaridade.

2 — As provas nacionais realizadas no 12.° ano de escolaridade incidem sobre duas das disciplinas leccionadas nesse ano, sendo uma delas obrigatoriamente a língua portuguesa e a outra da escolha do aluno.

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Artigo 5.° Diplomo do ensino secundário

1 — É instituído o diploma do ensino secundário.

2 —A nota Final do diploma do ensino secundário é constituída pela média da soma das médias dos 10.°, 11.° e 12.° anos com a média das duas provas nacionais.

Artigo 6.° Cundldutos

São candidatos a qualquer curso do ensino superior todos aqueles que preencham as condições referidas nos artigos 3.° e 4.° deste diploma, independentemente da natureza das disciplinas de formação específica que possuam.

Artigo 7.°

Svriuçüo dos candidatos

A seriação dos candidatos a cada estabelecimento de ensino far-se-á de acordo com os seguintes critérios de valoração dos diferentes elementos que compõem o processo da candidatura:

a) A média dos 10.°, 11.° e 12." anos —40%;

b) A média das provas nacionais — 30 %;

c) A média da prova específica — 30 %.

Artigo 8.°

Contingentes especiais

1 — Serão reformulados os contingentes especiais de acesso ao ensino superior.

2 — As vagas destinadas aos contingentes especiais que não hajam sido preenchidas desta forma serão preenchidas por candidatos ao acesso do contingente geral.

Artigo 9.°

Ensino superior de segunda oportunidade

O Governo desenvolverá um sistema de ensino superior de segunda oportunidade de forma a estimular o reingresso no ensino superior de alunos que o abandonaram antes de o terem concluído, bem como de alunos que não puderam nele ingressar na idade escolar normal.

Artigo 10°

Regulamentação

O Govemo regulamentará o presente diploma no prazo de 90 dias a contar da data da sua publicação.

Artigo 11.°

Norma revogatória

Fica revogado o Decreto-Lei n.° 354/88, de 12 de Outubro, e demais legislação complementar.

Artigo 12.° Entrada em vigor

O presente diploma entra em vigor no ano lectivo de 1992-1993.

Os Deputados do PS: António Braga — Jaime Cama — Fernando de Sousa —Ana Maria Bettencourt — Julieta Sampaio — Marques da Silva.

Relatório da Comissão de Agricultura e Mar sobre os projectos de lei n.os 81/VI (programa de rearborização para áreas percorridas por Incêndios florestais) e 82/VI (programa de emergência para a defesa da floresta portuguesa).

Os projectos de lei em causa foram discutidos na generalidade no Plenário da Assembleia da República de 7 de Maio de 1992, tendo baixado à Comissão de Agricultura, por um prazo de 30 dias, para melhor apreciação.

Na apreciação em sede da Comissão os partidos aqui representados mantêm as posições expressas em Plenário, pelo que não há alterações a introduzir e por isso os diplomas estão em condições de ser votados.

Palácio de São Bento, 11 de Junho de 1992.— O Deputado Relator, José Fortunato Freitas Costa Leite.

Relatório e parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias sobre o projecto de lei n.fi 109/VI (lei dos baldios).

A Comissão, na sua reunião de 25 de Março de 1992, distribui ao signatário para parecer o projecto de lei n.° 109/VI, da autoria do Sr. Deputado Almeida Santos, do PS, intitulado «Lei dos baldios».

Trata-se de uma matéria complexa objecto de muitas iniciativas legislativas ao longo da última década algumas das quais terminaram por decretos do Parlamento que, presentes à fiscalização preventiva da constitucionalidade, foram declarados inconstitucionais pelo Tribunal.

A importância dos baldios constata-se, desde logo, do facto de eles abrangerem, ainda hoje, uma área do território nacional que, apesar da inexistência de um cadastro completo, se calcula que ultrapasse os 400 000 ha.

Devido a legislação produzida há cerca de 50 anos, fizeram-se, numa parte significativa da sua superfície global (cerca de 385 000 ha), investimentos públicos em florestação. Os números indicados mostram a importância relevante destes terrenos em termos quer das economias locais quer da economia nacional.

Após o 25 de Abril, ao abrigo de legislação ainda vigente, foram devolvidos 141 000 ha (ou seja 37 %) às comunidades locais (e são geridos por estas), tendo continuado a ser administrados pelo Estado, através quer da Direcção-Geral das Florestas, quer das autarquias, os restantes 243 000 ha (63 % da área total registada).

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O presente relatório apresenta um conjunto de elementos pertinentes de informação, referentes à evolução do regime jurídico dos baldios ao longo dos tempos (capítulo i). a análise das iniciativas legislativas que deram origem a dois decretos da Assembleia da República declarados inconstitucionais (capítulo n), visando ajudar à compreensão dos comentários efectuados aos acórdãos do Tribunal Constitucional (capítulo ni, onde também se tecem considerações sobre a propriedade, a fruição e a gestão dos baldios no quadro da Constituição da República Portuguesa) e depois resume as grandes linhas do projecto de lei (capítulo tv), terminando por, sem entrar propriamente no debate na especialidade, introduzir já algumas reflexões sobre soluções concretas apontadas no mesmo (capítulo v).

Por fim, e à parte, para facilitar também a consulta, anexa-se o conjunto de intervenções parlamentares mais significativas efectuadas no pós-25 de Abril:

CAPÍTULO I Evolução do Estatuto Jurídico dos Baldios

O que são os baldios? Como os configurou e enquadrou o legislador ao longo do tempo?

Há traços comuns de estabilidade e de tensão permanentes no direito histórico, que podem ajudar a compreender esta realidade. Estamos perante bens que resistem a conformar-se com os padrões correntes dos actuais direitos reais; património difícil de configurar e titular; objecto de soluções gestionárias variando com as atitudes ideológicas e os regimes.

Pertencendo ao Estado ou aos moradores; geridos pelo poder ou pelo povo; ocupados, vendidos e devolvidos, sempre os baldios estiveram presentes na história portuguesa.

Permanentemente em redução, mas ainda existentes por quase todo o País, como aliás no estrangeiro, procurando adaptar-se a outros fins, que já não os tradicionais que os justificaram, pedindo cada vez mais que se lhes garanta na lei a manutenção de uma natureza, que de facto já mudou na grande maioria deles, empurrados sobretudo pelos ventos da evolução e do progresso da sociedade, o que se esquece, e não tanto pela cobiça dos poderes públicos, como a miúde se grita.

Cunha Gonçalves, no Tratado, vol. in, p. 145, dá uma definição de baldios em que se limita a desenvolver o conceito das Ordenações Filipinas (livro 4.", título 43, § 9.°): «chamam-se baldios os terrenos em geral incultos ou de pastagem que, por força dos antigos forais, são usufruídos em logrados em comum, somente pelos vizinhos de certos lugares ou povoações».

O Código Civil de Seabra de 1987, no artigo 279.°, classificou as coisas em relação as pessoas a quem a propriedade pertence, em públicas, comuns e particulares. Coisas comuns são aquelas não individualmente apropriadas das quais só é permitido tirar proveito (...) aos indivíduos compreendidos em certa circunscrição administrativa ou que fazem parte de certa corporação pública (artigo 381.°). Na categoria das coisas comuns, os baldios vêm mencionados à cabeça. Portanto, considerava os baldios como coisas comuns sob o ponto de vista das pessoas a quem pertencem, ou seja, da sua propriedade, não integrando, pois, nem as coisas públicas nem as coisas particulares das autarquias ou de qualquer entidade pública.

Ele referia-se a baldios municipais e paroquiais (artigo 381.°), mas isso não significa que todos os habitantes de um concelho ou de uma freguesia pudessem disfrutar os baldios. Este direito, pela legislação anterior ao Código de Seabra de 1867, só pertencia aos vizinhos dos respectivos lugares que estivessem na antiga posse de os usufruir, a qual devia ter durado, pelo menos, 30 anos fl-eis de 19 de Julho de 1839, artigo 2.°, e de 26 de Julho de 1850, artigos 1.° e 2.°).

A Lei de 28 de Agosto de 1869 impôs a desamortização parcial dos baldios que não fossem logradouro comum, o que se manteve nos Códigos Administrativos de 2 de Março de 1895 (artigo 44.") e de 4 de Maio de 1896 (artigo 429.°) que deixam de falar em vizinhos para se referir a «todos os chefes de família que, há mais de um ano, fossem comparles na fruição deles conforme os usos e coslumes estabelecidos», a favor de quem reverteram os desamortizáveis e pertencerá a fruição dos que são indispensáveis ao logradouro comum.

Todos os outros podiam lambem beneficiar da desamortização através de aforamentos, com excepção dos terrenos arborizados cuja arborização se impusesse para fixação de dunas (confirmado pelos Decretos-liéis de 24 de Dezembro de 1901 e de 24 de Dezembro de 1903).

Os baldios não sujeitos à alienação continuam a ser coisas comuns, mas já a sua natureza como coisas fora do comércio jurídico divide os autores, não a aceitando Cunha Gonçalves, contrariamente a Guilherme Moreira (As Águas, vol. ni, i, p. 322) que os considera fora do comércio jurídico devido à sua inalienabilidade. Cunha Gonçalves, no Tratado, argumenta que não deve confundir-se inalienabilidade (transitória) com incomerciabilidade. A doulrina dominante considera os alienáveis e passíveis de usucapião.

A partir do princípio do século, a legislação foi-se orientando para uma quase completa aceitação da alienação dos baldios não pertencentes ao logradouro comum, dadas as preocupações com a deficiente produção agrícola.

O Decreto n.° 4918, de 14 de Setembro de 1918, veio permitir a alienação de partes dos baldios, a pedidos dos chefes de família locais. E este regime foi-se ampliando com os Decretos n.0" 7127, de 17 de Novembro de 1920, e 7993, de 10 de Dezembro de 1921. E depois com os Decretos n.™ 9843, de 20 de Junho de 1924, 10 552, de 10 de Fevereiro de 1925, 13 229, de 7 de Março de 1927, e 13 663, de 24 de Maio de 1927, é estendido a todos os cidadãos, mesmo que não chefes de família ou seja, de qualquer idade, sexo e estado civil, que tradicionalmente venham usufruindo tais terrenos.

O Decreto n.° 9843, de 1924, veio também autorizar a alienação de dois terços de terrenos afectos a logradouro comum desde que fossem susceptíveis de cultura arvense.

O Código Administrativo de 1936-1940, no seu artigo 388.°, definia os baldios de acordo com a definição do Código de Seabra, então em vigor (e até 1966) para as coisas comuns e, nada estabelecendo quanto à sua propriedade, parecia aceitar a qualificação do Código Civil.

O Código atribui a sua administração às autarquias locais interessadas (freguesia ou municípios) e permitiu que os baldios fossem considerados «dispensáveis do logradouro comum» dos moradores e divididos e alienados a particulares (artigo 397.°) ou integrados no domínio privado disponível do concelho ou da freguesia (artigo 399.°).

Portanto, no Estado Novo, o Código Administrativo regulava sobre a gestão dos baldios, atribuída aos corpos

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administrativos locais enquanto, na falta de atribuição às autarquias da sua titularidade, parece que ela continua definida por referência às coisas comuns do Código Civil de 1867.

O novo Código Civil de 1966 deixa de classificar as coisas quanto à sua titularidade, embora considere «fora do comércio todas as coisas que não podem ser objecto de direitos privados, tais como as que se encontram no domínio público e as que são por sua natureza, insusceptíveis de apropriação individual (artigo 202.°).

As disposições do actual Código não significam a abolição da concepção dos baldios como categoria a se, embora a doutrina se tenha dividido quanto à sua natureza e, designadamente, durante muito tempo, Marcelo Caetano (Manual de Direito Administrativo, 6." ed., p. 221), para quem os baldios eram uma «forma de propriedade comunal», pertencendo «à colectividade indivisível dos moradores vizinhos a quem está afecta a fruição», embora também se defendesse que os baldios deveriam ser qualificados como bens do domínio particular das autarquias locais em cuja circunscrição se situassem, sem prejuízo de se considerarem afectados ao logradouro da comunidade de utentes, dado «a figura dos baldios ser impensável sem se atribuir uma especial consistência à posição dos utentes» (Rogério Soares, «Sobre os baldios», in Revista de Direito e de Estudos Sociais, ano xiv, 1967, p. 301).

A verdade é que, no período anterior a 25 de Abril, independentemente da natureza jurídica dos baldios quanto à propriedade, enquanto estiverem confiados às autarquias, ao abrigo ou não da lei, verificaram-se ocupações e alienações de baldios ou parcelas destes por particulares, e uma área enorme destes terrenos foram desapossados, mesmo com resistência dos seus utentes tradicionais, para ficarem a ser geridos pelo Estado em regime florestal.

As leis dos baldios em vigor

Os diplomas de 1976 visaram não só a devolução dos baldios «ao uso, fruição e administração dos respectivos compartes» (artigo 3." do Decreto-Lei n.u 39/76, de 19 de Janeiro), investindo na sua administração «a assembleia de compartes» e «o conselho directivo» por aquela eleito, mas também recuperar para as comunidades locais os baldios «indevidamente apropriados pelos particulares» (preâmbulo do Decreto-Lei n.° 40/76, da mesma data).

Com estas leis dos baldios operaram-se três mudanças jurídicas essenciais em relação às disposições do Código Administrativo do anterior regime político:

a) Acabou a administração dos baldios pelas autarquias locais, tendo ela sido transferida para as comunidades de utentes;

b) Ordenou-se a restituição dos baldios de que o Estado se apossara para flores tacão ou povoamento (baldios que eram arborizáveis e foram arborizados, ficando sujeitos ao regime florestal ou sob reserva ao abrigo dos Decretos-Leis n.0" 27 207, de 16 de Novembro de 1936, e 36 053, e que efectivamente nao chegaram a ser objecto de instalação de casais agrícolas);

c) Estatui-se sobre a devolução dos baldios indevidamente apropriados por particulares.

Mas as leis dos baldios de 1976 não tomaram posição sobre a questão da propriedade destes terrenos, uma vez que os mesmo são, então, definidos como «terrenos

comunitários usados e fruídos por moradores de determinada freguesia ou freguesias ou parte delas» e, em conformidade, ordenada a restituição do seu «uso, posse e administração».

O regime ora instituído tanto podia admitir uma concepção de propriedade comunitária nos termos do Código de Seabra, como uma concepção que os considerasse domínio público ou privado da autarquia, ou seja, propriedade da autarquia embora com separação do uso, fruição e administração.

Os artigos 1.° e 2° do Decreto-Lei n.° 39/76 revogam os artigos 395.° a 400.° do Código Adminisuativo, que consentia a desamortização dos baldios, em dadas condições, e o § único do artigo 388.°, que os declarou passíveis de «prescrição positiva».

Estes terrenos são declarados «fora do comércio jurídico, não podendo, no todo ou em parte, ser objecto de apropriação privada por qualquer forma ou título, incluindo o usucapião». Com efeito, coisas fora do comércio jurídico são, por definição, aquelas que não podem ser objecto de apropriação, nem pelo modo originário da ocupação, nem pelo derivado dos contratos ou disposições da última vontade (n.u 2 do artigo 22.° do Código Civil actual e n.° 1 do artigo 371.° do Código de Seabra). Estas coisas ficam fora do quadro da legislação civil, não podem ser objecto de propriedade privada, de posse civil nem sobre elas celebrarem-se quaisquer contratos de direito privado (Manual de Direito Administrativo, Marcelo Caetano, 891, 9." ed., t. n) e assim não podem ser objecto de contratos de arrendamento (parecer da Procuradoria-Geral de República n.° 162/82, livro 62, Diário da República, de 29 de Junho de 1983).

O artigo 3.°, que estipula a devolução dos baldios, é a norma de maior alcance prático, dado que uma percentagem elevada da superfície baldia nacional foi submetida ao regime florestal e uma parte relevante foi «reservada», ao abrigo do n.° 4 do artigo 173." do Decreto-Lei n.° 27 207, de 16 de Novembro de 1936, mas de facto não utilizada.

A submissão dos baldios ao regúne florestal, nos tennos da Lei n.° 1971, operava-se através de decretos-leis que estabeleciam a actuação dos serviços da administração central, a participação das autarquias nos rendimentos da sua exploração e as condições em que os moradores podiam utilizá-los.

A arborização, a exploração e a conservação pertenciam à administração central (v. artigo 2.° do Decreto-Lei n." 47 943, de 15 de Setembro de 1967).

Independentemente da natureza jurídica do direito atribuído ao Estado para utilizar os baldios para fins florestais (sem dúvida de qualquer modo, um direito real, sujeito a um regime de direito público), este ficava com a posse correspondente a esse direito. E, assim, a utilização pelos moradores (v. corte de arvoredo, a roça de matos, desvios e aproveitamentos da água etc.) dependiam de autorização dos serviços florestais (artigo 5.° do Decreto-Lei n.° 45/58, de 24 de Julho de 1953).

O Decreto-Lei n.° 39/76 pretende que se devolva o uso, fruição e administração dos baldios aos moradores que exerçam a sua actividade no local e que, segundo os usos e costumes reconhecidos pela comunidade, tenham direito à sua fruição (artigo 4.°).

No entanto, enquanto não se proceder à enUega, nos tennos do disposto no seu artigo 18.°, aquela situação mantém-se, ou seja os serviços florestais continuam a possuir os baldios, administrando-os nos termos habituais, embora agora com a imposição da entrega às autarquias locais da

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parte das receitas da exploração florestal fixada no artigo 19.° do referido decreto-lei (v. artigo 6." do Decreto-Leí n0 128/77, de 2 de Abril).

Quanto aos particulares que sejam autores de plantações ou seus sucessores como acontece em Torres Novas, com os seus 6 ha a 8000 ha de baldios na serra de Aire, cobertos de oliveiras (o que, aliás, já era recomendado pelas Ordenações Fdipinas, livro i, título 58.°, § 46, e título 66, § 26, respeitado por alvará de 27 de Novembro de 1804, § 9.°), podem também continuar a dispor dessas plantações enquanto a assembleia de compartes não exercer o direito de acessão imobiliária, tendo direito à indemnização do valor das mesmas (artigos 1340.°, n.° 3, e 1341.° do Código Civil).

O sistema de intervenção da administração central no sentido de regulamentar as várias formas de utilização dos baldios e seus quanta aparece enquadrado de modo instrumental em ordem a ajudar a uma fruição igual por parte dos compartes (artigo 5.°).

Esta intervenção, mesmo fora do regime de administração em associação, traduzida na elaboração de «projectos de regulamentação do uso e fruição adaptados às caracterísücas próprias dos vários tipos de baldio» (n.° 2 do artigo 5."), no apoio técnico e até na intromissão em questões fundamentais como a utilização dos recursos, aplicação da técnica de instalação e condução de povoamentos [alínea b) do artigo 12.°], será complementada posteriormente com a obrigação de o Estado «apoiar e promover a actividade de esclarecimento» dos compartes sobre política florestal e estimular a sua adesão as acções a desenvolver pelo MAP [Decreto-Lei n.° 221/ 77, de 28 de Maio, artigo 34.u, alínea a)].

O artigo 6.° impõe a constituição dos compartes em assembleia, a quem compete não só decidir sobre a forma de gestão dos baldios como aprovar o seu plano de utilização, a aplicação das receitas e disciplinar a fruição dos terrenos.

Quanto à forma de gestão, a assembleia pode optar ou por uma administração directa ou em associação com o Estado (artigo 9.u). A administração directa é efectivada por meio de um conselho directivo exclusivamente formado por compartes, enquanto em associação um dos elementos do conselho será um representante do Ministério da Agricultura, que gerirá apenas o património florestal (alínea b) do artigo 13.°].

A legislação sobre as atribuições das autarquias e competências dos seus órgãos modificou profundamente este regime da lei dos baldios, mas a sua vigência durou pouco mais de um mês.

A Lei n.° 79/77, de 25 de Outubro, revogou, no seu artigo 109.°, o Decreto-Lei n.° 39/76, ao dispor que «a definição das coisas comuns, designadamente baldios e outros bens do logradouro comum, pertence à assembleia municipal ou à assembleia de freguesia, consoante se trate, respectivamente, de coisas municipais ou de coisas da freguesia, competindo a sua administração aos respectivos órgãos executivos autárquicos».

No entanto, apesar de o diploma não represtimar expressamente a legislação de 1976, esta voltou a reger, por intenção inequívoca do legislador da Lei n.° 91/77, de 31 de Dezembro (artigo único e texto explicativo no preâmbulo).

Assim, as autarquias, afastadas da administração dos baldios, têm apenas o direito de receber uma percentagem das receitas provenientes da venda dos produtos da exploração florestal (Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 9 de Junho de 1988, p. 75 960, Boletim

do Ministério da Justiça, n.os 378, 735), enquanto não se operar a entrega objecüva da administração dos baldios aos cotnparleí!.

E o processo de entrega pode, ainda hoje, verificar-se, pois a elaboração do recenseamento provisório, condição da constituição da assembleia de compartes, pode fazer-se a todo o tempo.

É certo que o prazo fixado pela lei (60 dias, n.° 2 do artigo 18.°), e sucessivamente prorrogado por vários diplomas até 31 de Dezembro de 1979 (Decreto-Lei n.° 39/79, de 5 de Março), já passou. Mas estes prazos, visando a aceleração do processo devolutivo do Estado ou dos particulares (Decreto-Lei n.° 40/76), eram imposições aos órgãos do Estado; como se deduz do texto do diploma, pretendia-se disciplinar a actividade dos órgãos da administração central e local e não impor quaisquer ónus aos compartes (parecer da Procuradoria-Geral da República n.° 53/84, livro 63, Diário da República, de 21 de Setembro de 1984).

Em relação à devolução de terrenos na posse de particulares, o Decreto-Lei n.° 40/76 salvaguardou as parcelas ocupadas ou edifícios para habitação e fins agrícolas, comerciais e industriais e seus acessos, bem como uma área de logradouro à sua volta 10 vezes superior à área de terreno ocupado pelas construções [alínea a)] e, ainda, as parcelas cultivadas por pequenos agricultores [alínea b) do artigo 2.u], mas apenas quando estas situações decorrem de actos administrativos anuláveis e não as originadas por actos administrativos feridos de nulidade, e desde que elas sejam anteriores ao início da vigência deste diploma, não cobrindo, pois, aquelas que foram criadas já após a entrada em vigor das «leis dos baldios» (Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 3 de Maio de 1988, p. 25 599, Boletim do Ministério da Justiça, n.os 377 e 296).

CAPÍTULO II As iniciativas legislativas da anterior legislatura

Projectos de lei n.os 64/V, do CDS, 90/V, do PSD, e 41/V, do PS

Análise efectuada pelas Comissões de Administração do Território, Poder Local e Ambiente e pela Comissão de Agricultura e Pescas:

[...] Examinando os princípios fundamentais consagrados em cada um dos projectos, conclui-se que todos eles são concordes em considerar os baldios, não só como terrenos de uso e fruição comunitários [...], mas ainda como bens excluídos de todo o comércio jurídico, admitindo, embora, excepções a esta regra.

O regime das excepções é, porém, diverso em cada um dos projectos [...]

Com efeito, todos os projectos admitem a alienação de baldios para fins de interesse público ou social, atinentes à instalação de equipamentos sociais e ao fomento turístico, industrial ou habitacional.

Mas se todos os projectos convergem assim quanto aos fins da alienação, divergem, no entanto, quanto à forma e à natureza da mesma, pois nos projectos do PS e do PSD aquela só pode verificar-se mertMswa. expropriação por utilidade pública pelo Estado, aprovada em Conselhos de Ministros, o que implica, por lei, o pagamento da justa indemnização ao expropriado.

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Ao invés, no projecto do CDS a alienação dos baldios para os assinalados fins ocorrerá a título gratuito a favor do Estado ou das autarquias locais, sem necessidade de qualquer expropriação e dispensando-se mesmo a formalidade da escritura pública, quando a transmissão se operar a favor destas últimas [...]

Acresce ainda que no projecto do CDS, e ao contrário do que acontece com os restantes, é também admitida a alienação de terrenos baldios, quando confinantes com lugares ou outros aglomerados populacionais, desde que se destine à construção de habitações ou de qualquer edifício de interesse social.

O condicionalismo da expropriação por utilidade pública, imposto nos projectos do PSD e do PS, é mais apertado neste último, já que o fun industrial só releva se se tratar da instalação de pequenas indústrias, ligadas ao aproveitamento de recursos locais, e, quanto ao fun habitacional, a habitação terá de ser permanente e destinada a compartes ou utentes do baldio.

Note-se, ainda nesta matéria, que as causas justificativas da expropriação por utilidade pública podem também no projecto do PS fundamentar o arrendamento compulsivo [...] Mas, em contrapartida, o projecto do PSD consagra a figura da destinação do baldio não usado e fruído comunitariamente a fins de carácter mareailamente social e de manifesto interesse para a população da freguesia, destinação essa que não acarretará a uansferência do domínio de baldio.

É, no entanto, quanto à gestão ou administração dos baldios que surge a divergência mais radical enue o projecto do PS, por um lado, e os restantes projectos, por outro.

Os projectos do PSD e do CDS são concordes em atribuir originalmente essa adminisuação as juntas de freguesia e assembleias de freguesia, revogando, assim, o regime estatuído pelo Decreto-lei n.° 39/76, que confere tal poder às assembleias de compartes e conselhos directivos.

Pelo contrario, o projecto do PS defere aquela adminisuação aos conselhos directivos, eleitos em assembleias de compartes, ou à entidade que pelo antigo costume venha administrando o baldio.

Vê-se, assim, que o projecto do PS só admite a adminisuação originaria do baldio pela junta de freguesia se ela corresponder ao antigo costume.

Mas os três projectos confluem de algum modo ao instituírem lodos a faculdade de delegação da administração; só que, de acordo com as posições de princípio neles assumidas, os lugares de entidade delegante e delegada se encontram, obviamente, invertidos. Com efeito, o poder de delegação nos projectos do PSD e do CDS pertence sempre às assembleias de freguesia, mas de uma forma mais resüita no último daqueles diplomas.

Com eleilo, enquanto no projecto do PSD a gestão pode ser delegada em utentes do baldio, no do CDS essa delegação só é possível se a gestão passar a ser exercida por organizações que o costume fixou.

Ao contrário, no projecto do PS o poder de delegação pertence, naturalmente, as assembleias de compartes, aparecendo a junta de freguesia ou o Estado como destinatárias dessa delegação.

Mas o projecto do PS consagra ainda uma terceira via para a gestão dos baldios pela junta de freguesia...

Na verdade, os baldios cuja adminisuação não seja reivindicada pelos utentes ou compartes no prazo de um ano a contar da data da entrega dos respectivos projectos de utilização serão administrados pelas juntas de freguesia.

Inscreve-se ainda em todos os projectos a possibilidade de submissão ao regime florestal dos baldios constituídos por terrenos com capacidade de uso predominantemente não agrícola sem que isso afecte a sua natureza e dominialidade.

Consagra-se também no projecto do PS a possibilidade de co-gestão entre os conselhos directivos e as juntas de freguesia ou o Estado.

Todos os projectos declaram ainda a nulidade dos actos de alienação de baldios, fora dos casos em que a admitem, com algumas diferenças no regime da respectiva arguição, que aqui não importa desenvolver, mas só assinalar.

O diploma do PS cria a figura dos «projectos de utilização», preparados por «comissões regionais para os baldios», com a participação dos compartes ou dos utentes ou das entidades que os representem ou substituam, que comportarão a definição dos objectivos de carácter sócio-económico e ambiental, de níveis regional e nacional, a salvaguardar.

As despesas dos investimentos iniciais para execução dos projectos de utilização serão suportadas inteiramente pelo Estado, salvo se o baldio proporcionar rendimentos susceptíveis de participarem no financiamento.

As referidas comissões regionais, em número de três, com áreas de actuação nas regiões do planeamento Norte, Centro e Ribatejo e Oeste, asseguram pela sua constituição, com representantes de diversos departamentos e de serviços do poder central, uma intervenção imperativa do Estado, que é recusada nos projectos do PSD e do CDS, onde impera, quanto à gestão dos baldios, a vontade dos órgãos do poder local da freguesia.

Assim apreciados no grupo de trabalho, conclui-se que os três projectos em referência eram irredutíveis a um texto alternativo que pudesse contemplar lianno-nicamente as diversas perspectivas e soluções que encaram, por serem inspirados em ideias e metodologias diversas e até, em largos campos, opostas.

Os representantes do PS e do PCP suscitaram mesmo a inconstitucionalidade de algumas nonnas dos projectos do PSD e do CDS, na parte em que atribuem a título originário a gestão dos baldios às juntas e assembleias de freguesia, por a reputarem ofensiva do disposto no artigo 89", n.° 1, alínea b), da Constituição. Por seu turno, os representantes do PSD e do CDS contestaram este ponto de vista, sustentando a perfeita compatibilidade de todos aqueles preceitos. [Relatórios de 11 de Fevereiro de 1988, dos Deputados Oliveira e Silva e João Maçãs, in Diário da Assembleia da República, 2." série, n.0" 50, de 26 de Fevereiro de 1988, e 51, de 27 de Fevereiro de 1988].

Os projectos de lei n.° 64/V e 90/V deram origem ao decreto da Assembleia da República n.° 132/V, que foi objecto de fiscalização preventiva da constitucionalidade (Acórdão n." 325/89, de 4 de Abril) e declarado inconstitucional.

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Projecto de lei n* 532/V, do PSD

a) Análise das soluções apresentadas efectuada pela Comissão de Administração do Território, Poder Local e Ambiente:

[...], o projecto de lei n.° 532/C, do PSD, agora apresentado, intenta estabelecer uma nova disciplina jurídica dos baldios com respeito pelas balizas constitucionais fixadas naquele acórdão do Tribunal Constitucional.

Mantém, por isso, como órgãos de administração dos baldios o conselho directivo e a assembleia de compartes, criados pelo Decreto-Lei n.° 39/76, regulando pormenorizadamente as suas competencias, mas cria um regime de tutela da legalidade da sua constituição e funcionamento, que é deferida ao governador civil.

O diploma contém ainda outras inovações de vulto, traduzidas em normas que regulam a instituição e extinção dos baldios, bem como a desintegração de terrenos, que deles façam parte, para fins de utilidade pública.

Estas e outras disposições, cuja análise não cabe aqui desenvolver, designadamente à luz do texto constitucional, alteram profundamente o regime jurídico dos baldios posto em vigor pelos Decretos--Leis n.os 39/76 e 40/76, de 19 de Janeiro, cuja total revogação, aliás, é proposta pelo projecto de lei. [...] [Relatório de 9 de Novembro de 1990, do Deputado Oliveira e Silva, Diário cia AssenMeia cia República, 2.* série-A, n.° 11, de 28 de Novembro de 1990.]

b) Análise apresentada no relatório-parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias:

[...]

Questão prejudicial — à data do douto Acórdão (n.° 325/89, do Tribunal Constitucional) regiam constitucionalmente a matéria o artigo 89.°, n.° 2, alínea c), em conjugação com os artigos 80.°, alínea d), e 99.°, n.° 1, da Constituição, que de fundamental significavam o seguinte:

É garantia a existencia de tres sectores de

propriedade; Esses sectores são definidos em função da sua

titularidade e do respectivo modo social de

gestão;

Um desses sectores é o sector público — constituído pelos bens e unidades de produção pertencentes a entidades públicas ou a comunidades —, do qual constituem subsector os bens comunitários com posse útil e gestão das comunidades locais;

Esses bens comunitários constituem, a latere de outros, a base do desenvolvimento da propriedade social;

É princípio de organização económico-social o desenvolvimento da propriedade social.

Daqui as seguintes conclusões: se o sector constituído pelos bens comunitários, como é reconhecido, tem os baldios por conteúdo quase exclusivo c, em qualquer caso principal, tem de existir. A constituição garante a existência, logo, nao pode ser esvaziado,

transferindo a sua propriedade e a sua gestão, isto é, o que os define, para as juntas de freguesia. Ficou, implícita esta outra consideração: o que, por princípio, deve desenvolver-se —a propriedade social — não pode constitucionalmente restringir-se.

Tudo de acordo com a alógica mais elementar, pese a tradição polémica das sensibilidades de escola.

Entretanto, ocorreu a segunda revisão constitucional, que operou no texto em que se fundou o acórdão as seguintes alterações, em resumo de sentido:

Em vez de se garantir a existência, garante-se agora a coexistência de três sectores de propriedade dos meios de produção;

Desaparece a referência à propriedade social e ao seu desenvolvimento;

Os meios de produção comunitários, possuídos e geridos por comunidades locais, deixam de integrar o sector público e passam a integrar o sector cooperativo e social;

Continua a ser princípio de organização económico-social a protecção (já não o desenvolvimento) deste sector.

Tudo isto que significado relevante tem no âmbito das soluções contidas nos dispositivos em causa?

Nenhum que possa justificar a conclusão da sua constitucionalidade superveniente. Quando muito, pode pretender-se que sofreu alguma redução o «favor» de que gozava a propriedade social —em que se integrava o subsector dos bens comunitários — traduzida na substituição da garantia do seu desenvolvimento pela garantia da sua protecção.

Mas, embora tenha desaparecido a expressão «bens e unidades de produção pertencentes a comunidades», para apenas se continuarem a referir os meios de produção comunitários possuídos e geridos por comunidades locais, nem por isso é licito julgar-se afastada a conclusão de que é elemento identificador dos meios de produção comunitários a atribuição da propriedade desses bens às próprias comunidades locais: quer consideradas universalmente, enquanto tais —ainda que sem personalidade jurídica—, quer como soma de compartes titulares de um direito comum e indivisível. Na primeira destas versões, retomam-se as «angústias» técnico-jurídicas em torno da questão de saber quem era o «proprietário», titular da «propriedade social». Não assim na segunda.

Em abono da conclusão supra o fado de no n.° 1 do artigo 82.° da Constituição se falar em «três sectores de propriedade», um dos quais será agora o «cooperativo e social» em que os meios de produção comunitária se integram. Conclusão que, acrescente-se, de algum modo põe em causa a fuga do novo projecto a clarificar de uma vez por todas a velha questão da titularidade dominial dos baldios. Seria pena que se não aproveitasse o impulso constitucional para, a esse respeito, decretar a paz entre os doutores.

Posto isto, cumpre deduzir que continuam a ser invocáveis contra as soluções em causa do decreto n.° 132/V os vícios de inconstitucionalidade declarados nos acórdãos do Tribunal Constitucional, para que de novo se não caia nelas.

É, porém, lícita a abordagem de um novo caminho para, se for caso disso, recuperar, sem incorrer em nova inconstitucionalidade, a solução, perfilhada com

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manees em todos os projectos de alteração da lei de baldios contribuintes do decreto vetado, ou seja, a de dar cobertura legal à transferência de facto de poderes de gestão dos baldios que a prática quase sem excepção consagrou, das comunidades locais para as juntas de freguesia em cuja área os baldios se localizem.

Neste domínio, com efeito, a vida antecipou-se à lei. E em reconhecimento de que os órgãos eleitos pelos condóminos na prática se revelaram menos eficazes gestores do que as novas juntas de freguesia legitimadas pelo voto popular, transferiu para estas os poderes de administração daqueles. O fim da gestão paralela ensaiada após a restituição dos baldios às comunidades vem tendo expressão crescente e tem colhido generalizado consenso. Não obstante, remanescem excepções que não podem deixar de ser tomadas em conta.

Tudo isto para dizer que, sendo constitucionalmente possível, deve procurar-se uma cobertura legal para a situação criada, que, aliás, se não tem por de fácil recuo.

Um caminho possível, que teria o mérito, entre outros, de se traduzir numa opção dos condóminos, sendo pois casuista, seria o de virar do avesso o disposto no artigo 2.° do decreto vetado.

Assim: a administração dos baldios continuaria a competir às respectivas comunidades locais, e não às respectivas juntas de freguesia, e em vez de serem estas a poder delegar a sua gestão numa comissão eleita — como no decreto veiado — dos seus utentes, ou em organizações que o costume tiver fixado, seriam agora as comunidades locais, representadas por qualquer dos seus órgãos, a delegar nas juntas de freguesia na totalidade ou em parte, os respectivos poderes de gestão.

É isto inconstitucional? Tem-se por certo que sim. Por um lado, o n.u 2 do artigo 114.° da Constituição só veda a delegação dos poderes dos órgãos de soberania, de região autónoma ou de poder local noutros órgãos, não a delegação nas juntas de freguesia de poderes originariamente detidos por outros órgãos. E se é certo que a competência e o funcionamento dos órgãos de soberania são os definidos na Constituição, o mesmo não acontece relativamente aos órgãos do poder local.

Acresce que, mesmo em relação às competências das juntas de freguesia, a Constituição permite a sua delegação em organizações de moradores.

Por último, é próprio do instituto da delegação de poderes a retenção na fonte da matriz dos poderes delegados, pelo que à fonte podem retornar a todo o tempo, pela via da livre revogação do mandato implícito no acto de delegar.

E é sabido que o mandatário exerce os poderes delegados em nome e em representação do mandante, tudo se passando como se fosse a própria entidade delegante a exercê-los.

A par da representação política que justifica a sua existência, a junta de freguesia exerceria assim uma forma de representação jurídica de titulares de direitos que em parte se confundem com os politicamente por ela representados. Nada, pois, de conflituante ou de abnorme.

Quanto aos actos de disposição, esses devem sem reserva permanecer não só na titularidade, mas na

disponibilidade dos compartes, e ser exercidos através dos respectivos órgãos representativos.

É claro que também nada impede que aqueles órgãos afectem às juntas de freguesia, no todo ou em parte, as receitas da exploração dos baldios. Nem que o façam por acto genérico, e não ano a ano ou caso a caso. Mas têm de ser eles a deliberar em qualquer dos casos.

Quer se diga expressamente quer não que a propriedade dos terrenos baldios pertencem às comunidades, ou em comunhão aos compartes, a Constituição já diz o bastante — aliás em confirmação de uma arreigada convicção de base consuetudinária — para se não poder ignorar a existência, o significado e a força desse vínculo dominial.

Daí que não seja nem pacífico nem porventura constitucional impor a formalização de uma nova instituição de baldios que têm séculos de existência consensual, ou mesmo a consagração de uma intervenção do Conselho de Ministros que não revista, quando muito, natureza meramente ratificativa.

O caso é este: se o baldio é dos compartes, se esse sector de propriedade tem os compartes por proprietários (ainda que em regime de comunhão indivisa), esse direito encontra garantia constitucional no artigo 62." da Constituição, pelo que dele não pode dispor o Estado, através do Conselho de Ministros, a menos que lance mão do instituto da expropriação por utilidade pública.

Não basta assim a proposta dos condóminos. Faz--se mister a sua decisão. [Deputado Almeida Santos, Diário da Assembleia da República, 2." série, n.° 12, de 3 de Dezembro de 1990.]

CAPÍTULO III Enquadramento constitucional

A) Os princípios gerais sobre a propriedade, a fruição e a gestão

A Constituição de 1976, no seu artigo 89.°, n." 2, refere, a propósito do sector público, a existência de um subsector comunitário: o dos «bens comunitários com posse úül e gestão das comunidades locais» [alínea c)].

No plano qualitativo e quantitativo, os bens comunitários quase se resumem aos baldios, dado que, além deles, apenas restam vestígios, sem significado de equipamentos comunitários cm zonas bem localizadas (eiras, fornos, moinhos, azenhas, etc), que são verdadeiras realidades marginais irrelevantes no plano económico. A existência dos baldios e a sua importância levou o legislador a constitucionalizar, no pós-25 de Abril, um subsector de bens comunitários, preocupando-se, no contexto histórico da formação da parte económica da Constituição, em garantir a sua existência (n.° 1 do artigo 89.°).

No entanto, os baldios aparecem no texto original da Constituição revestidos de uma linguagem que não parece clara: bens «comunitários» inseridos no «sector público».

Ainda na vigência deste texto, a Procuradoria-Geral da República veio considerar que «os baldios constituem propriedade comunal dos moradores de determinada freguesia ou freguesias ou parte delas que exerçam a sua actividade no local, só por eles podendo ser usados ou fruídos» (parecer n.° 136778).

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A Lei Constitucional n.° 1/82 alterou o n.°2 do artigo 89.° da Constituição, passando a dizer que «o sector público é constituído pelos bens e unidades de produção pertencentes a entidades públicas ou a comunidades».

Fica agora claro que os baldios são propriedade das comunidades locais, pelo que acabam as divergências na doutrina: propriedade comunitária ou propriedade comunal dos moradores, e não bens do património (público ou privado) das autarquias.

Com a segunda revisão constitucional, a Lei n.° 1/89 veio alterar o seu enquadramento em termos do sector de propriedades dos meios de produção (n.° 1 do artigo 82.°), deixando os meios de produção comunitários, possuídos e geridos pelas comunidades locais, de integrar o sector público e passando a integrar «o sector cooperativo e social».

A alteração reforçou a ideia da sua natureza específica dc bens comunitários, dando-lhe total autonomia em face quer do sector público quer do sector privado da propriedade dos meios de produção.

B) A jurisprudência do Tribunal Constitucional

1 — Acórdão n.° 325/89, de 4 de Abril (decreto da Assembleia da República n.° 132/V) — comentário efectuado pela Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades c Garantias a propósito do projecto de lei n.° 532/V, do PSD (decreto da Assembleia da República n.°317/V):

[...], o Tribunal Constitucional assentou nos seguintes pressupostos: os baldios integram a categoria dos bens comunitários prevista na Constituição;

A Constituição garante a existência do subsector público comunitário, não sendo constitucionalmente lícita a sua inutilização prática;

A amputação dos baldios reduziria drasticamente a dimensão dc lai subsector e retirar-lhe-ia todo e qualquer sentido relevante no quadro do complexo constitucional dos sectores dos meios de produção.

E considerando que as normas questionadas se propõem fundamentalmente:

Integrar os baldios no domínio público das freguesias em cuja circunscrição eles existiam;

Transferir para os órgãos da freguesia a administração dos baldios, relir;uido-a aos compartes, os quais só podem administrar mediante delegação, a todo o tempo revogável, dos órgãos da autarquia, e sempre sob tutela destes;

Permitir a afectação dos baldios a outros fins de interesse público mediante livre decisão dos órgãos da freguesia, bem como a desafectaçâo e alienação dos próprios baldios mediante decisão governamental, sob proposta da freguesia.

Julgou «forçosa» a conclusão de que são inconstitucionais «todas as normas questionadas». E especificou:

O artigo 1.°, n.u 2, na parte em que integra os baldios no domínio público das freguesias;

Os artigos 2." c 5.ü, ao transferirem para as freguesias a administração dos baldios, só a título de delegação precária a consentindo aos próprios compartes;

Os artigos 3.", n.'" 1 e 2, e 4.°, n.°3, ao conferirem poderes aos órgãos da freguesia para regularem e

tutelarem a constituição e a actividade das comissões utentes;

O artigo 11.°, ao declarar as comissões de utentes responsáveis perante os órgãos de freguesia;

Os artigos 6.°, 8.° e 9.° ao permitirem, respectivamente, quer a alteração do fim comunitário de baldios, por deliberação da junta de freguesia, quer a desafectaçâo e alienação de baldios por decisão do Conselho de Ministros sob prévia deliberação da assembleia de freguesia, quer a submissão de baldios ao regime florestal a requerimento das juntas de freguesia, em todos os casos sem consideração pela posição ou manifestação de vontade dos interessados. [Deputado Almeida Santos, Diário da Assembleia da República, 2° série-A, n.° 12, de 3 de Dezembro de 1990.]

2 — 0 Acórdão n.° 240/90, de 28 de Junho (Diário da República, 1." série, suplemento, n.° 146).

As questões apreciadas pelo Tribunal Constitucional e que levaram à declaração de inconstitucionalidade de um grande conjunto de normas do decreto da Assembleia da República n." 317/V foram os seguintes:

«) A eficácia de certas deliberações da assembleia de compartes pode depender da sua aprovação pelo governador civil (para o efeito devendo existir um representante deste junto dos órgãos dos baldios)?

b) Os terrenos que já possuem a natureza própria de baldios podem ficar dependentes, para existirem como tal, de uma deliberação da administração, de natureza constitutiva?

c) Enquanto esse processo de instituição administrativa decorre, os baldios podem ser entregues à gestão das autarquias e continuar obrigatoriamente por devolver aos compartes?

d) E pelo facto de essa instituição não ocorrer, no prazo de cinco anos, os baldios podem passar a integrar o domínio privado das autarquias?

e) Os terrenos dos baldios podem ser desintegrados por razões de utilidade pública? Sem indemnizações aos compartes?

f) Os baldios podem extinguir-se pelo seu não uso? Por um período mínimo de dois anos?

Abordemos estas questões concretas em face do enquadramento constitucional vigente e na perspectiva perfilhada pelo Tribunal Constitucional:

a) Representante do governo civil e papel deste. — Com a revisão constitucional de 1989 deu-se uma alteração da filosofia política que conduziu ao desenvolvimento dc uma lógica de autonomia acrescida dos bens comunitários face ao Estado e ao desenvolvimento de uma lógica de desestatização, numa linha dc clara distinção entre titularidade comunitária e propriedade pública, entre domínio cívico e domínio público, ou seja dc clara demarcação dos bens comunitários face ao domínio público ou privado do Estado ou de quaisquer outras entidades públicas, e que não permite que o sector público se sobreponha ao sector cooperativo c social impondo-lhe «condicionalismos limitadores».

Apesar de a recusa de aprovação das deliberações dos órgãos das comunidades ltKais se fundar em ilegalidade das mesmas, «tem de reconhecer-se que esta espécie de tutela inspecliva ou de controlo preventivo subsequewc da

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gestão das assembleias de compartes acaba, indirectamente, por vincular essa gesülo ao próprio governo», uma vez que as deliberações só adquirem «dcfinilividade e executo-riedade se e quando a aprovação for concedida», pois se isso não acontecer, para que a deliberação possa ser executada, impõe-se um ónus de impugnação contenciosa do acto praticado pelo representante do Govemo.

Estamos perante «uma tutela que envolve uma intervenção, desproporcionada e excessiva da Administração».

Portanto, o que se tem por «constitucionalmente ilegítimo» é que a gestão dos baldios fique dependente quanto à sua eficácia jurídica e, portanto, quanto a sua eficiência, de actos da Administração que se lhe sobrepõem em termos de a vincular e, eventualmente, paralizar, mas «não se recusa que os interesses de ordem nacional que podem estar associados aos baldios, [...], não possam ser objecto de uma representação adequada junto dos seus órgãos de gestão».

A existência de representantes do Estado junto dos órgãos dos baldios, desde que não se traduza no exercício de qualquer competência específica que possa colidir, directa ou indirectamente, com a autonomia própria da gestão dos baldios, mas apenas se circunscreva «à prática de actos externos, de conteúdo essencialmente informativo, servindo também como elemento de ligação com os serviços públicos e o governador civil», não é inconstitucional.

b) Existência dos baldios. — As normas do decreto da Assembleia da República n."317/V declaradas inconstitucionais colocavam na dependência de pareceres e actos de certos órgãos e serviços da Administração e na esfera de competência do Conselho de Ministros a apreciação e decisão do processo administrativo de instituição de baldios, ou seja, positivava-se um regime de disciplina administrativa para a instituição dos baldios.

O actual regime consignado no ordenamento jurídico fundamental sobre os baldios (Decreto-Lei n.° 39/76 e, também 40/76, de 19 de Janeiro) estabelece a sua inegocia-bilidade, a atribuição às comunidades de utentes, além do uso e a fruição, a administração (a exercer, directamente, pelo conselho directivo) e restituição, desde logo, dos terrenos sujeitos a regime florestal ou a reserva para os fins de junta de colonização intensa, ou os organismos que lhe sucederam, desde que esta lhes tivessem dado efectivo destino.

Em face disto se conclui que os terrenos compreendidos no artigo 16.° do decreto não precisam de processos administrativos ou judiciais, de instituição do seu estatuto de baldio.

Com efeito:

Os terrenos tradicionalmente baldios, ou seja, aqueles que, na data da entrada em vigor do Decreto-Lei n." 39/76, são utilizados como logradouro comum e eram considerados indispensáveis a esse logradouro passaram a ter a natureza própria de baldios, sem necessidade de sujeição a qualquer processo constitutivo.

Os terrenos que eram considerados baldios e foram submetidos ao regime florestal ou de reserva para povoamento, mas como tal não foram aproveitados e, agora, se destinam a ser utilizados como logradouro comum, dispõem já e também da natureza própria dos baldios, pois que, além de já o serem aquando da apropriação pelo Estado, continuaram a sê-lo por força do Decreto-Lei n." 39/76, não im-

portando, para o efeito, que o processo previsto no artigo 18.° não tenha eventualmente sido «cumprido».

Terrenos cuja entrega aos compartes tenha sido validamente efectuada ao abrigo do n.° 1 do artigo 18.° do Decreto-Lei n.° 39/76 e que agora tenham conselhos directivos eleitos de acordo com o mesmo diploma e no pleno exercício das suas funções c que o decreto da Assembleia da República já considera automaticamente instituídos.

Os terrenos aptos a atribuir a comunidades locais para serem aproveitados como logradouro comum e regidos segundo o estatuto dos baldios.

Todos estes terrenos já possuem a natureza própria e específica dos baldios, pois, mesmo quando o seu uso e fruição foi limitado ou retirado forçadamente aos compartes, ao abrigo das disposições do Código Administrativo e da Lei n." 2069, de 24 de Abril de 1954, eles nunca perderam a sua natureza de meios de produção comunitários e, como tal, agora se encontram integrados no sector de propriedade social e cooperativo.

Em relação a todos estes terrenos o que é preciso é que se devolvam aqueles que ainda o não foram ou, pelo menos, se enquadram nas situações existentes de modo a haver coerência com o seu estatuto jurídico, passando a ficar sujeitos à disciplina que, no futuro, se considere a mais adequada para regular os baldios.

c) Extinção por utilidade pública — A desintegração de terrenos que façam parte de baldios ou a extinção destes por motivos de utilidade pública deve ter em conta a manifestação de vontade das comunidades locais, em ordem a respeitar o princípio da autonomia dominial comunitária e a ressarcir a comunidade local pela amputação do direito real de gozo sobre a coisa de que é privada.

A Constituição obriga a que a expropriação por utilidade pública dê origem a uma indemnização mas não impede a extinção, total ou parcial, do baldio por utilidade pública e nada impede que seja o Conselho de Ministros, através de resolução, a declarar essa expropriação.

Assim, compreende-se o teor do acórdão de onde se conclui que, desde que «do respectivo acto expropriativo, lato sensu, resulte uma qualquer compensação ou reparação derivada da desapropriação forçada imposta às respectivas comunidades locais», nada há de inconstitucional. De qualquer modo, a compensação pode «ser atribuída em espécie, alravés de melhoramentos em benefícios a lavor das comunidades».

d) Extinção de baldios por desuso. — A expropriação devida ao abandono dos meios de produção, dentro de parâmetros a fixar em lei, é um princípio constitucional que parece legítimo deduzir do n.° 1 do artigo 89." da Constituição da República Portuguesa, com aplicação também aos baldios.

Desde que o baldio deixe de ser utilizado como logradouro comum e nenhum outro fim, economicamente adequado e com proveito para a comunidade lhe esteja a ser dado, mesmo que através de uma gestão associada ou delegada, decorrido que seja um período suficiente para se poder concluir do abandono pelos compartes, porque não aceitar a sua extinção mesmo que se exija a verificação objectiva das suas causas por via judicial, permitindo ao Estado intervir em ordem a reconduzir um imóvel de propriedade social à função social que a CRP pretende que toda a propriedade, mesmo privada (e portanto na social por maioria de razão), desempenha.

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Neste sentido, há um «dever de exploração dos baldios».

A Constiluiçáo garante a existência de baldios, mas não de cada baldio em concreto, pelo que se o terreno estiver abandonado, seja por despovoamento das populações, seja pelas mudanças na estrutura das economias locais, ele deixa de estar coberto pela garantia constitucional, por falhar, por desinteresse dos próprios beneficiários, as razões que pesaram na constilucionalização dessa garantia.

No entanto, o conceito de abandono tem de ser preenchido por um lapso de tempo adequado, proporcional e razoável, à gravidade da «sanção» pretendida. Como afirma o acórdão, «no caso dos baldios, a dimensão temporal não pode ser insuficiente para uma caracterização rigorosa da situação de abandono que através dele se prefigura, a qual sempre há-de exigir uma permanência da situação de não utilização em lermos de ser indiscutida a omissão reiterada do dever de exploração e do desvio dos meios de produção da sua função social».

CAPÍTULO IV O conteúdo do projecto de lei

O projecto de lei n.° 109/VI visa instituir um novo regime legal dos baldios, em substituição das normas vigentes, nomeadamente os Decretos-Leis n.os 39/76 e 40/76, de 19 de Janeiro, normalmente designados «leis dos baldios», os quais são expressamente revogados quando «colidem com o previsto na presente lei» (artigo 41.°).

Os seus autores pretendem uma lei de baldios «que supere indefinições, que ponha ordem no caos reinante por reposição de um nível aceitável de dignidade e que se revista do mérito elementar de respeitar a Constituição».

Na exposição de motivos, após se efectuar um relato da evolução histórica do enquadramento constitucional dos baldios no pós-25 de Abril (parte final do ponto 1) e que justifica a norma constante do n.° 2 do artigo 1.° do projecto, avança-se com considerações sobre a propriedade dos baldios («a quem pertence o domínio dos baldios»? Ponto n.° 2: «os baldios constituem propriedade das comunidades locais»; há que reconhecer «o domínio único das comunidades locais sobre os terrenos baldios»), sobre a titularidade da propriedade («quem na comunidade local é o titular ou são os titulares da relação de domínio»? Ponto n.° 3: «ou a comunidade se ipsa ou em comunhão indivisa os próprios compartes) e termina-se com argumentos na delesa de que, em matéria de gestão, apenas é possível a administração dos baldios em nome próprio pelas próprias comunidades locais, afastando de todo em todo uma solução que atribua esta competência às autarquias locais.

Admite, além disso, uma expropriação nos termos da legislação própria, a alienação privada «devidamente justificável por valores compartilháveis pelo interesse geral» e a cessão de exploração em que se deverão «enquadrar as situações criadas no domínio do povoamento e da exploração florestal».

O diploma tem seis capítulos, assim distribuídos:

O capítulo i, em que são focados os princípios gerais: dá-sé a definição de baldios («terrenos possuídos e geridos pelas comunidades locais», artigo 1." n.° 1); situam-se os baldios no respectivo sector constitucional dos meios de produção («sector cooperativo e social da propriedade dos meios de produção», n.° 2); enquadra-se o seu estatuto jurídico («fora do comércio», n." 1 do arligo 2.°), com a res-

pectiva consequência em relação aos actos negociais que os tenham por objecto («nulos», n.° 2 do artigo 2.°), com atribuição de personalidade judiciária, para pedir a nulidade, «nomeadamente» a «qualquer dos órgãos da respectiva comunidade local», ou a «qualquer dos respectivos compartes» (n.° 2, artigo 2°, in fine), com as excepções referidas no arligo 7.° e regulamentadas no artigo 8.° (expropriação por motivos de interesse público), artigo 9.° (alienações por razões de interesse privado) e artigo 10.° (cessão de exploração).

Neste capítulo refere-se, ainda, a localização destes terrenos (artigo 3.°), as suas finalidades («os baldios constituem em regra logradouro comum das comunidades», n.° 1 do artigo 4.°) e define-se, ainda a comunidade local como «universo dos residentes» (n.° 1 do artigo 5.°), e, portanto, os compartes como «residentes maiores» mesmo que «a título de segunda residência» (n.° 1 do artigo 6.°), aos quais são atribuídos iguais direitos ao uso e fruição do baldio, independentemente do modo como aproveitam em concreto esses direitos (n.° 2 do artigo 6.°).

Os baldios podem ser constituídos por diversas áreas descontínuas, e situar-se em territórios de várias freguesias (artigo 3.°).

Destinam-se, em regra, a aproveitamento como logradouro comum da comunidade local, ou seja do universo dos residentes maiores, ainda que a título de segunda residência, na freguesia ou freguesias ou parte delas que, segundo os usos e costumes aplicáveis, têm direito ao seu uso e fruição (n.° 1 do artigo 5.° e n.° 1 do artigo 6.°), servindo-lhe para a apascentação do gado, recolha de lenha ou mato, cultura e outras fruições, nomeadamente de natureza agrícola, silvícola, silvopastoril ou apícola (n.° 1 do arligo 4.°).

Quando são utilizados por terceiros, em especial pelo Estado, continua a ser-lhes aplicável o seu regime jurídico, na parte em que isso continue a ser possível (n.° 2 do artigo 4o).

Estes direitos ao uso e fruição existem, de modo igual, por estes residentes, chamados compartes, sem dependência da frequência ou efectividade do seu exercício, e em regime de compropriedade indivisa e indivisível (n?* 2 do artigo 5." e artigo 6o).

O direito sobre os baldios podem ser expropriados, no todo ou em parte, por motivos de interesse público, em princípio, mediante o pagamento de justa indemnização ao universo dos compartes (arligo 8.°, n.° 1, primeira parte).

A expropriação só pode efectivar-se após consulta à assembleia de compartes. Se esta der um parecer positivo, bastará uma resolução do Conselho de Ministros para a efectivar; caso contrário, exige-se um decreto-lei (arligo 3.°, arligo 8.°). Não será necessário um acto expropriatório quando houver acordo, mesmo que se remeta para o tribunal algumas questões em contencioso (n.° 5 do artigo 8.°).

A expropriação deve limitar-se apenas à área necessária à concretização do objectivo pretendido, impondo-se a revisão quer do todo quando tiver havido afectação a fim diferente, quer da parle quando no prazo declarado tiver havido áreas não utilizadas (n.° 2 do artigo 8.°).

O capítulo n refere-se à administração dos baldios, atri-buindo-a, por direito próprio, aos compartes «através de órgão democraticamente eleilo» (artigo 11."), podendo eles delegar estes poderes em entidades da administração pública (n.° 1 do artigo 12.°), «sem prejuízo da sua revogação a todo o tempo» (n.° 5 do artigo 12.°), a qual pode processar-se apenas com «reserva de co-exercício» desses poderes «regime de co-gestão», arligo 13.°).

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Assim:

A delegação dos poderes de administração, revogável a todo o tempo, é passível de efectivação também com reserva de regime de «co-gestão», pode verificar-se em termos a acordar, quer em relação a parte ou a todo o terreno baldio, sem ter de abranger todas as modalidades possíveis de aprovei lamento e tanto pode efeclivar-se na ou nas juntas de freguesia ou mesmo na câmara municipal de localização do baldio como nos serviços da administração central interveniente nas modalidades de aproveitamento verificadas. Os órgãos políticos locais que recebam a delegação de poderes ficam sujeitos à fiscalização da assembleia de compartes, que também lhes pode endereçar «directivas» sobre matérias da sua competência [alínea m) do artigo 22.°].

O cálculo da indemnização tomará em conta «o grau de aproveitamento e utilização» do baldio, o valor comunitário do respectivo logradouro e a vantagem compensatória que a comunidade tirar da concretização do objectivo que leva à expropriação (n.° 1, segunda parte, do artigo 8.°); se for considerada suficientemente compensatório para a comunidade, a implantação de infra-estruturas e de outros equipamentos sociais não dará lugar a qualquer indemnização (n.° 4 do artigo 8.°).

O projecto prevê também a alienação de direitos sobre áreas limitadas, por deliberação da assembleia de compartes, em concurso público e mediante a fixação de um preço determinado em função do aproveitamento e utilização do terreno (artigo 9.°). Mas só quando a alienação for necessária para a expansão urbana da povoação contígua [alínea a)] ou se destine à instalação de medidas industriais, de infra-estruturas e outros empreendimentos de interesse para a comunidade local [alíneas b) e ;') do n." 1] e com área estritamente necessária ao fim visado (primeira parte do n.° 2).

Para habitação só podem ser vendidas áreas até 2000 m2 (segunda parle do n." 2) e, em geral, a venda de áreas superiores a 5000 m2 depende da aprovação da maioria de dois terços dos compartes presentes na assembleia (n." 4).

Os baldios podem ainda ser cedidos em exploração pela assembleia de compartes (artigo 10.°).

A cessão de exploração pode recair sobre lodo ou parte do terreno, sujeita ao pagamento das prestações acordadas (n.° 1), por um período máximo até 20 anos, prorrogáveis, (n.° 2 e n.° 4), visando o povoamento, a exploração florestal ou o aproveitamento agrícola, mas neste caso apenas entre os compartes (n.u 1, parte final, e n." 3), sem prejuízo da satisfação normalmente retirada pelos compartes do logradouro comum e com consideração pelas consequências ambientais (n.° 5).

O capítulo iu trata do plano de utilização dos baldios, atribuindo a competência para o propor e actualizar ao conselho directivo e para o aprovar â assembleia de compartes (n.° 1 do artigo 14."), após elaboração, em cooperação com os serviços do Estado que «superintendem no ordenamento do território e na defesa do ambiente» (n.° 2 do artigo 14"). O seu objectivo prende-se com «o planeamento e a programação da utilização racional dos recursos potenciais do baldio» (n.° 1 do artigo 15.°).

Sempre que a administração de vários baldios próximos ou afins o queir;un, podem elaborar planos de utilização comuns, caso em que recorrerão a figura da gestão conjunta (n.OJ! 1 e 2 do artigo 15.°).

A Administração Pública deve fornecer projectos-tipos adequados às diferentes situações paia ajudar ao cumprimento eficaz do disposto nesta lei (n." 1 do artigo 16.").

No capítulo iv fixam-se os órgãos de administração dos baldios («uma assembleia de compartes e um conselho directivo», n.° 1 do artigo 18.°) e o período dos seus mandatos («três anos»), sem limitação à sua renovação (n.os 2 e 3 do artigo 18") e definem-se as respectivas composições e competências (artigos 21.° a 28.") e o quórum de reunião e deliberação («reúnem validamente com a presença da maioria dos seus membros e deliberam validamente por maioria absoluta dos membros presentes», artigo 19.°).

Só têm direitos eleitorais os compartes constantes do respectivo caderno de recenseamento (artigo 21.°), cuja actualização cabe à assembleia [alínea c) do artigo 22."].

Sob proposta do conselho directivo, compete-lhe regulamentar e disciplinar o uso e fruição dos baldios, aprovar e actualizar o plano de utilização dos seus recursos, votar o relatório e contas do exercício, votar a aplicação das receitas [alíneas (f), e), h) e i)].

Ele delibera, ainda, ouvido o conselho directivo, sobre a extinção do baldio [alínea p)}.

Além disso, compete-lhe autorizar o conselho directivo a recorrer ao crédito, caso a caso, ou pela fixação de um limite máximo [alínea /)], a estabelecer os condicionamentos à comercialização dos frutos e produtos do baldio [alínea g)}, deliberar sobre a alienação e a cessão de exploração [alínea j)] e sobre a delegação de poderes [alínea /)]•

Em geral, deliberar sobre todos os assuntos cuja competência não pertença ao conselho directivo [alínea g)] e sobre os recursos interpostos dos actos deste [alínea n)].

As deliberações da assembleia sobre a alienação ou a cessão de exploração de direitos sobre os baldios [alínea ;')], sobre a delegação de poderes [alínea /)] e sobre a extinção do baldio [alínea p) do n." 1 do artigo 22.°] e naquelas que se referem a afectação das receitas aos próprios compartes exige-se a maioria de dois terços dos compartes presentes (n.os 2 e 3 do artigo 22.°)

Impõe-se a eleição do conselho directivo por lista completa (n.° 1 do artigo 27.") e alribui-se-lhe, além do mais, «o cumprimento e execução das deliberações da assembleia» [alínea «)], «zelar pela defesa dos valores ecológicos no espaço do baldio» [alínea /«)], exercer em geral todos os actos de administração ou co-administraçâo do baldio» [alínea j) do artigo 28.°] e resolver lodos os assuntos da competência da assembleia de compartes, que esta lhe delegue nos termos do n." 4 do artigo 25."

Este capítulo contém, ainda, uma secção sobre o recenseamento dos compartes (secção tv: definição — artigo 29.°; recenseamento de pretérito — artigo 30."; novos recenseamentos —artigo 31.°, e recenseamento supletivo — artigo 32")

Só os compartes têm direito a participar na assembleia dos usufruidores do baldio, mas o seu registo não é condição sine qua non para o exercício dos respectivos direitos, pois basta ser-se reconhecido como membro da comunidade local à base dos usos e costumes aplicáveis (n.° 2 do artigo 29."), ou estar-se inscrito no recenseamento eleitoral dos residentes (n.° 1 do artigo 32.°), embora se aceitem, desde já, os recenseamentos anteriores c mesmo os provisórios efectuados ao abrigo do n." 2 do artigo 18." do Decreto-Lei n.° 39/76, de 19 de Janeiro, sem prejuízo de, inexistindo qualquer registo, a assembleia, uma parte dos compartes ou, na sua inércia, a junta de freguesia deverem fazer a identificação dos compartes, num dado prazo (artigo 31°).

No capítulo v é regulada a extinção dos baldios (suas causas, no artigo 33." e consequências no artigo 34."), ad-

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milida, para alem das situações já previstas no capítulo t, por vontade unânime dos compartes [alínea a)] e por não uso por um período de 10 anos, judicialmente comprovado [alínea c) do artigo 33."], passando nestas situações para o domínio privado da freguesia ou freguesias da sua área [alínea a) do artigo 34.°].

O capítulo vi engloba um conjunto de disposições gerais e transitórias: no domínio dos pleitos judiciais, refere-se à regra da jurisdição comum, isentando de preparos e custas judiciais as entidades que actuem em defesa dos baldios (n.° 2 do artigo 35.°). No plano da administração dos baldios pode considerar-se transitoriamente delegada a gestão que esteja a ser praticada por entidade administrativa ou atribuir-lha em caso de vazio administrativo (artigo 36."). Vem, ainda, regular-se transitoriamente as situações de «cessão de exploração, nomeadamente para efeitos de aproveitamento florestal» que continuam até ao termo do prazo previsto, no máximo de 20 anos, excepto se não houve legitimidade formal, em que, à falta de negociação, terminam ao fim de três anos (n.° 1 do artigo 37."). O projecto dispõe quer sobre as situações previstas no artigo 3.° do Decreto-Lei n.° 39/76, de 19 de Janeiro, que, de facto, não tenham dado origem à devolução dos baldios durante estes 16 anos, quer sobre as situações feridas ao abrigo do regime de associação previsto na alínea b) do artigo 9.° do mesmo diploma de 1976.

No primeiro caso, impõe-se a sua devolução logo que constituída a assembleia de compartes (artigo 39.°), enquanto no segundo, se a assembleia de compartes não as der por lindas, elas continuarão até ao termo do prazo previsto ou, se for superior, até ao 3.° ano posterior à entrada em vigor da lei (artigo 40.").

Quanto aos actuais titulares dos órgãos do baldio, eles vêem terminados os seus mandatos à data da entrada em vigor da lei (artigo 38.°).

Por fim, dá ao Governo 60 dias para criar as normas necessárias à boa execução desta lei paia o que lhe impõe a forma de decreto-lei (artigo 41.").

CAPÍTULO V Reflexão sobre as soluções propostas

Não parece ser a altura de iniciar já um debate aprofundado sobre as soluções concretas, dado que estão anunciadas outras iniciativas legislativas sobre os baldios.

No entanto, avança-se, desde já, não com argumentos de contestação ou apoio a esta ou aquela solução, ou com propostas alternativas e respectiva justificação sobre o seu mérito, mas com algumas propostas de reflexão que, mesmo ficando para já sem resposta neste debate da Comissão, podem ler o interesse, não só de mostrar que as soluções podem ser variadas, como sobretudo de lançar algumas pistas para tomar mais vivo o debate futuro.

Assim:

1.° «São baldios os terrenos [...]» (artigo 1.°).

Embora se reconheça que os bens comunitários são quase completamente preenchidos por terrenos, por que não aplicar, adaptatis adaptandis, lambem a equipamentos sociais ainda existentes, numa ou noutra zona do País, a disciplina aplicada à utilização e gestão dos terrenos baldios?

2." Os baldios «encontram-se fora do comércio jurídico, não podendo ser objecto de apropriação [...], incluindo usucapião, com ressalva das excepções previstas na lei» (artigo 2.". n.° 1) mas o projecto permite quer a cessão de

exploração quer a venda para certos fins de interesse económico e social.

No lundo, são bens fora do comércio jurídico?, ou seja, insusceptíveis üe qualquer negócio de direito civil?, ou s&o bens no comércio jurídico, embora só em certas situações e dentro de certos limites previstos na lei?

Não estão sujeitos à usucapião. Só que o afastamento da usucapião não resulta apenas da natureza das coisas. Pode resultar de disposição da lei. Sempre que a lei queira afastar um bem «no comércio jurídico» da possibilidade de «prescrição positiva», di-lo e o assunto fica resolvido.

De qualquer modo, no nosso direito histórico, os baldios não estiveram, a maior parte do tempo, sujeitos ao instituto da usucapião. Será que agora se justifica manter a solução de 1976, explicável pela necessidade de não deixar criar direitos, numa época em que, neste domínio, tudo era confuso e a usucapião podia resultar da inércia dos órgãos que impropriamente geriam estes terrenos, num panorama geral em que o novo regime ia tentar reconstruir tudo, depois de décadas de alheamento forçado e sem órgãos de administração próprios?

E, sobretudo, se o projecto quer fazer passar ao domínio privado da autarquia um terreno que esteja em desuso durante 10 anos, podendo logo ser sujeito a usucapião, por que não admitir que isso aconteça quando há um desuso dos compartes aproveitado por terceiro, desde que se dê à «fulura proprietária» (autarquia) a possibilidade de, se estiver interessada, lazer interromper a usucapião?

3." «Os actos e negócios jurídicos não permitidos por lei são nulos» (artigo 2", n." 2).

A actual legislação, em relação às situações irregulares referia as «sanções» quer de nulidade quer da anulabilidade arguível a todo o tempo (artigo 1.° do Decreto-Lei n.° 40/76). Agora refere-se apenas que os actos ou negócios jurídicos contrários à lei são nulos. A nulidade opera sempre ipso iure, sem necessidade de acção judicial; é insarável e invocável por qualquer pessoa interessada a todo o tempo, podendo mesmo ser declarada ex officio pelo Tribunal. Nos termos gerais de direito, tal não é oponível, em certas situações, a terceiros de boa fé adquirentes dos bens a título oneroso. Esta solução e o facto de se acabar com o regime especial da anulabilidade previsto no Decreto-Lei n.° 40/76, reduzindo tudo às regras gerais de direito, parece de aplaudir, por não se verem razões que justifiquem regras especiais.

4." Os terrenos baldios «constituem, em regra, logradouro comum». Com efeito, os terrenos podem não ser, ou não ser apenas, logradouro comum, pois se admilem outras formas de exploração, até por terceiros, sem perda da sua natureza, pelo que a redacção usada se considera uma precisão clarificadora.

5." Compropriedade indivisa e indivisível (artigo 5.°, n." 2).

Será necessário caracterizar o regime do exercício de direitos? Como de compropriedades? Não se diz que os bens são património em compropriedade, mas em todo o caso parece apontar-se para um enquadramento doutrinário. Ora, quer a doutrina nacional quer a estrangeira ou consideram os baldios um património sui generis ou discutem se os hão-de catalogar na propriedade em comum ou como património colectivo.

Partindo da afirmação feita no Acórdão do Supremo Tribunal Justiça de 27 de Junho de 1961, segundo o qual «há quem perlilhe a propriedade comunal ou uma compropriedade desses moradores, mas há também partidários do domínio da entidade de direilo público», Marcelo Caetano (Revista, «O direito», ano 94, 1962, pp. 140 e 141), a

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propósito da confusão do Supremo que critica, dizia que a «propriedade comunal e compropriedade são institutos absolutamente diferentes», dado que as coisas de propriedade comunal «sao da colectividade indivisível dos moradores vizinhos a que está afecta a respectiva fruição sem que estes nelas tenham quota ideal ou direito a requerer a divisão».

O património colectivo é uin património com vários sujeitos em que a massa dos bens pertence em bloco solidariamente a todas as pessoas, sem que nenhuma tenha qualquer fracção de que possa dispor; a sua fruição pertence indivisamente aos membros da colectividade que a exercitam, na medida das suas necessidades. Enquanto, em compropriedade como tal, cada comparte teria direito a uma quota ideal ou fracção de terreno cuja divisão poderia exigir (a não haver acordo entre todos para o manter indivisível: artigo 1413.°); e o terreno seria fruído por cada um, mesmo que isoladamente, mas apenas na proporção das suas quotas (artigo 1415.°).

Claro que aqui se declara o baldio indivisível, pelo que estaríamos perante uma excepção ao modo como o direito positivo português perspectiva a compropriedade: aceita-a sem a estimular, favorecendo o seu termo, o que não aconteceria com os baldios. Estaríamos perante o único exemplo de compropriedade querido pelo legislador, ao ponto de modificar um elemento fundamental do seu regime geral. Mas dado que, apesar das semelhanças, há outros elementos distintos na sua caracterização, não seria preferível deixar funcionar o artigo 1404.° do Código Civil que permite a aplicação das regras da compropriedade quando pertinentes, mas com as necessárias adaptações, aos vários patrimónios comuns cujas disciplinas a lei não regule ou na medida em que não as regule?

6.° «Compartes são os residentes maiores, mesmo que a título de segunda residência» (artigo 6.u, n.u 1).

Por que só os maiores entram no conceito de moradores, se a tradição não fecha a menores a fruição dos baldios? E por que também são compartes as pessoas que têm no local uma segunda residência, se realmente não tiverem qualquer ligação efectiva com a economia local?, ou seja, por que não usar uma linguagem talvez menos técnica, mas que dè um conceito mais fácil de preencher, até porque já testado, sem qualquer problema, no direito anterior: simplesmente «moradores»?

7.° Acto expropriatório e indemnização (artigo 8°, n.°*5 e 4) como interpretar estes dois números conjugados do artigo 5.°? «No caso previsto no número anterior (implantação de infra-esuuturas e outros equipamentos sociais [...] de interesse [...] suficientemente compensatório [...1 e no demais em que exista acordo [...] é dispensado d acto expropriatório [...]».

Não se diz: nos casos em que exista acordo.

Pelo contrário, distinguem-se os casos do número anterior e os outros «os demais» em que há acordo. Portanto, não há necessidade de acto expropriatório nas situações de implantação de infra-estruturas e outros equipamentos sociais, isto é, naquelas situações em que também não há «percepção de qualquer indemnização».

Mas se há expropriação, mesmo sem indemnização e não há acordo, tem que haver acto expropriatório.

E, aliás, se não houver acordo, tem que haver indemnização.

O direito ajusta indemnização é um direito fundamental de natureza análogo à dos direitos, liberdades e garantias, pelo que as suas resuições deverão limitar-se ao necessário para salvaguardar outros direitos ou interesses constitucionalmente protegidos.

É possível retirar o direito à indemnização dos compartes só porque as infra-estruturas e equipamentos sociais têm um interesse que compensa a comunidade local.

Mas trata-se da satisfação de outras necessidades que não as que estão ligadas à fruição dos baldios. Pelo que, ou há acordo, e a ideia de compensação pode funcionar, ou não há, como o admite a primeira parte do n.° 5, e então importa perguntar: não há lugar a indemnização?, ou há indemnização, parcial ou totalmente preenchida pelo acesso à fruição dos equipamentos considerados suficientemente compensatórios para os compartes?

8.° Alienações a título oneroso (artigo 9.°, n.° 1).

As situações de alienação a admitir para o futuro têm que ver com as necessidades de expansão urbana de infra-estruturas e de industrialização.

A não existência de uma disposição deste género era uma falha do decreto n.° 317/V pois que há interesses superiores que se impõem e que se prendem com a necessidade de não asfixiar os centros populacionais ou não os obrigar a crescerem, com prejuízo económico regional e até nacional, para terras de alto valor agrícola, que escasseiam no País, sendo certo que o Decreto-Lei n.° 40/76 já havia excepcionado da devolução, entre outros, os baldios ou suas parcelas apropriadas por particulares, e ocupadas por edificações destinadas a habitação, fins agrícolas, comerciais ou industriais, acessos às mesmas e suas áreas de logradouro [artigo 2.u, alínea tf)], para «salvaguarda dos usos em que o aproveitamento teve em vista edificações que na maior parte dos casos foram obras de vizinhos de fracos recursos ou para fins agrícolas, comerciais ou industriais, de manifesto interesse para a economia local».

Isto é, apesar de não se tratar aí, compreensivelmente, de uma regulamentação virada para o futuro, dado que se tratou de legislação preocupada sobretudo em regularizar situações passadas, de esvaziamento dos baldios, não deixa de afirmar um dado princípio que, previsivelmente, poderia vir a poder ganhar estatura positiva no regime jurídico dos baldios.

9." Cessões de exploração (artigo 10.°, n.os 2 e 4).

Haverá razões para dois regimes de duração dos contratos, em que a única diferença parece estar no enquadramento das prorrogações que, com aproveitamento florestal, podem ser «sucessivamente prorrogáveis por sucessivos períodos de até 10 anos», enquanto na exploração agrícola a cessão pode ser «eventualmente renovável por sucessivos períodos de 10 anos».

Ou seja, no primeiro caso, há um limite à prorrogação: ela pode ser por um período de 10 anos ou por vários períodos até uma soma global de 10 anos. Enquanto, no segundo caso, não há limite nenhum ? Ou a diferença vai mesmo mais além, devendo ser procurada no uso plural do tempo considerado normal, ou seja 20 anos, que poder ser negociado logo de uma vez ou por várias vezes de modo parcelar, o que nesta situação de tempo global limitado garante sempre um tempo mínimo de 30 anos, o que, com a redacção do n.° 4 («não pode ser efectuado por período superior a 20, eventualmente [...]») não estaria garantido, porque, mesmo que não se esgotasse no conuato inicial o tempo possível, todos os aditamentos temporais já seriam considerados prorrogações por conta do limite de 10 anos?

10.° Conselho directivo [artigos 11.°, n.° 1, 13.°, n.°s 1 e 2, 22.°, n.° 1, alínea b), e 27.°, n.° 1]:

a) O conselho directivo existe por recriação do Decreto-Lei n.° 39/76, mas no direito histórico dos baldios, ele é algo de excepcional.

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Normalmente, os baldios foram administrados pelos próprios compartes; obviamente, que há situações complexas que aconselharão, para o bom funcionamento, planificação e aproveitamento, quer dos recursos naturais quer das receitas, que exista um conselho directivo. Mas há muitas situações de pequenos baldios, baldios em regime florestal, em cessão de exploração para os fins previstos no projecto, em que não se vê que seja necessário existir este órgão.

Por que obrigar à sua existência? Por que não deixar à vontade dos utentes a administração directa, eventualmente com o apoio burocrático da mesa da assembleia dos compartes?

b) E, quando exista, por que impedir a sua livre demissão pelos compartes, exigindo-se actuações dolosas ou negligentes e um processo disciplinar «à legislação laboral»? [alínea b) do artigo 22.°]. E, ainda por cima, prevendo-se um mandato longo, que, em geral, nada tem que ver com o ciclo natural das produções, amadurecimento de frutos e vendas, etc. (n.° 2 do artigo 18.°), num baldio directamente fruído?

c) E, finalmente, por que exigir em lei aquilo que devem os interessados decidir por si, no plano do método de apresentação de candidaturas? Por quê a obrigação de votação em listas completas?

11° Gestão delegada (artigos 12°, n.os 1 e 4, e 13.°, n.° 1).

O projecto admite a delegação de poderes de administração revogável a todo o tempo, podendo ela processar-se com reserva de co-exercício pelo órgão delegante.

Quer no direito societário quer no direito administrativo, a delegação enquanto tal pressupõe o assumir poderes de uma pessoa ou de um órgão por outra pessoa ou órgão que se situa num escalão inferior, tratando das mesmas questões a um nível mais reduzido, ou mesmo por uma pessoa desse órgão, quer num escalão igual (administração empresarial, etc.) quer num escalão hierárquico inferior (administração pública, etc).

Aqui, tratar-se-ia de aplicar a figura da delegação de poderes a um órgão (assembleia de compartes) em relação a outra entidade totalmente alheia à administração do baldio, para permitir enquadrar as situações em que são as juntas de freguesia a gerir os baldios e não os conselhos directivos. Mas porque não aceitar que as juntas ou serviços da administração central giram os baldios ou parte destes enquanto conselhos directivos, com o estatuto legal dos conselhos directivos, sem prejuízo de delegações de poderes dentro do conselho directivo ein certos dos seus membros, para acompanharem especialmente certas partes ou certas modalidades de exploração do baldio? Se os conselhos directivos deixassem de ter limitação de mandatos, não poderia chegar-se aos mesmos resultados, evitando-se a duplicação de soluções, com o mesmo estatuto: conselho directivo quando a gestão é atribuída aos compartes e delegação quando é atribuída a entidades públicas?

12.° Recenseamento (artigos 21.u, 29.°, n." 1 e 2, e 32.°, n.° 1).

«A assembleia de compartes é constituída pelos compartes constantes do respectivo recenseamento» (artigo 21.").

Não seria preferível a fórmula do artigo 7.° do decreto n.° 317/V, falando apenas em compartes?

Aliás, a própria lógica do projecto ao preencher o conteúdo do conceito de «compartes» com toda a amplitude, apontaria para aí. Com efeito, o projecto admite que são compartes com assento na assembleia os membros da comunidade local não inscritos no recenseamento próprio de baldio («do respectivo recenseamento». Com efeito, o artigo 29.°, n.° 2, já não diz que a assembleia é constituída apenas pelos recenseados, pois repete o conteúdo do artigo 21.°, com outra amplitude, afirmando que «só tem assento na assembleia de compartes» os recenseados ou «ou na sua falta» os reconhecidos como compartes pelos usos. E mesmo assim, este «só» ainda está a mais, porquanto, o artigo 32.°, n.° 1, vem contrariá-lo, ao dizer que, «na falta delas (regras consuetudinárias inequívocas, ou seja, os usos e costumes, referidos no artigo 29.°, n.° 2) rege o recenseamento eleitoral dos residentes [...]».

Ou seja, se os conceitos de comparte e membro da assembleia são preenchidos pela mesma realidade, então não seria mais rigoroso não tratar nem um nem outro por referência aos registos, evitando possíveis interpretações perniciosas dos interessados e isto por maior que possa ser o interesse na sua existência e a orientação de preferência que o legislador entenda únprimir à matéria?

13.° Afectação de receitas a terceiros (artigo 22.°, n." 3).

Nem sempre os compartes terão condições de planificar melhor, de realizar com menores custos, de acompanhar empreendimentos que legalmente até cabem à autarquia realizar, como caminhos, etc.

E quantas vezes «a comunidade local» dos compartes corresponde ao universo dos residentes da freguesia E mesmo que não corresponda exactamente, poderá ser o único meio de se fazer obras públicas, na área populacional do baldio, por escassez de meios do órgão político.

É, pois, de aplaudir que as receitas possam vir a ser geridas e afectadas a planos da junta de freguesia.

Mas então por que dificultar aquilo que é louvável? Por quê exigir, para que se processe validamente a transferência das verbas por vontade dos próprios compartes, que a assembleia reúna o apoio de dois terços do colégio presente?

14.° Extinção dos baldios [artigo 33.°, alínea cj].

O decreto n.° 317/V fixava num mínimo de dois anos o tempo necessário para que o baldio não se extinguisse.

O Tribunal Constitucional considerou a norma inconstitucional por entender que o prazo era escasso (Acórdão n.° 240/90). O baldio é um meio de produção e, portamo, dadas as razões económicas que explicam o conteúdo do artigo 89." da Constituição, que não dá liberdade para manter ao abandono os meios de produção (e pune mesmo aqueles que não cumprem o dever de exploração, com a expropriação sem indemnização, ou, no mínimo, com arrendamento ou concessão de exploração compulsiva), compreende-se o presente dispositivo.

Mas será de exigir a manutenção de uma situação de abandono durante tanto tempo (10 anos)?

A Lei n.° 77/77 legislou sobre esta matéria de abandono, exigindo apenas três anos sem utilização? Se o decreto dos baldios tivesse remetido para o prazo da lei geral, que teria dito o Tribunal Constitucional?

Mas a entender-se propor o prazo de 10 anos, será que, tratando-se de situação de abandono, que, por força da lei, vai funcionar como propiciador de uma espécie de «usucapião» a favor de um não ocupante (a junta de freguesia), não se justificaria que, logo após os três anos, o futuro previsível proprietário, enquanto aguarda os restantes e longos sete anos, pudesse ocupar o terreno,

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enquanto os compartes não o queiram e não se oponham, dando-lhe utilidade, podendo explorá-lo ou mesmo arrendando-o, pelo menos fazendo concessões de exploraçáo por curtos períodos?

Compreende-se que dois anos seja curto para fazer perder direitos, mas 10 anos não será longo de mais para se poder considerar que não são postas em causa as razões do preceito constitucional que obriga à exploração, tanto mais a cumprir quanto aqui nem se trata de um bem regido pelo «direito civil», mas de um bem que só tem um regime de justificação própria na perspectiva da sua necessidade para a comunidade local?

15.° Regime de associação (artigo 40.°).

O projecto não prevê a sua continuação, porquanto todo o seu favor vai para a figura da delegação de poderes.

Mas por que não admitir, quer aqui, quer em relação às cessões de exploração (artigo 37.°), figura que até colhe amplo apoio, que se mantenham os acordos anteriormente existentes, enquanto vigorarem os prazos por que estão previstos?

16.° Receitas.

Todo o tipo de receitas, mesmo num baldio sem qualquer uso tradicional, deve reverter livremente para o bolso dos compartes?

E por que hão-de os órgãos dos baldios de arrecadar os montantes da floresta ardida antes do tempo normal de maturação das árvores, quando foi o Estado que investiu no povoamento?

Suponhamos que o conselho directivo pretende verbas para qualquer empreendimento, ou para dividir pelos compartes e não obtém o acordo, nesse momento prematuro, dos serviços florestais. «Pode deitar o fogo» à floresta e arrecadar todo ou quase todo o dinheiro da venda do material ardido.

Independentemente de, mesmo contra o proprietário singular da floresta, se dever prever um crime, que uluapasse a dinâmica clássica do direito de propriedade, punindo-o por ataque aos valores ambientais (incêndios com significado ambiental), um tipo de «crime contra a natureza», na expressão do Dr. Antunes da Silva actual presidente da Comissão Parlamentar de Agricultura (com sanção adequada e que se aplicaria em geral, e, portanto, também nestas situações), aqui estamos, desde logo, perante um problema que nem tem que ver com o dolo ou culpa, que é o de o Estado se dever pagar pelos investimentos mínimos que ele fez.

17.° Fiscalização da actuação dos gestores dos baldios.

Não seria de prever um órgão fiscalizador da actividade dos gestores de baldios que muitas vezes, sobretudo nos de maior dimensões, funcionam sem controlo regular?

Quem controla normalmente as contas, os movimentos de facturação, compras, vendas, pagamentos de execução de obras, no mundo empresarial, que certos baldios, a um dado nível, também são?

Conclusão

O projecto de lei n.° 109/VI aponta enquadramentos concretos que, independentemente do acolhimento que venham a ter no final, após o embate global com ouuas soluções e a reflexão a efectuar em sede de especialidade, procuram fugir a soluções que possam vir a ser consideradas inconstitucionais.

Nos tennos regünentais pode ser apreciado e votado na generalidade em Plenário.

Palácio de São Bento, 1 de Julho de 1992. —O Vice--Presidente da Comissão, Jorge Lacão. — O Relator, Fernando Condesso.

Anexo: bibliografia e uni texto sobre «Os baldios no üebale parlamentar da última década».

Bibliografia

A Forniação de Portugal Contemporâneo: 1900-1980, vol. n,

João Antunes Estêvão, pp. 1157 a 1260. «O direito», Revista de Ciências Jurídicas e de

Administração Pública, Marcelo Caetano, ano 94.°,

1962, fase. 2, Abril-Junho, pp. 129 a 143. Os Baldios, Manuel Rodriguez, pp. 59 a 80. Legislação de Direito Económico, 1987, pp. 527 a 538. «Baldios — Uma solução para breve», Revista

Municipalismo, ano rv, n.° 27, 1984, pp. 36737. «A exploração agro-silvo-pastoril em comum e baldios»,

Francisco J. Velozo, in Sciencia Jurídica, pp. 95 a 110. «Sobre os baldios», Rogério E. Soares, Revista do Direito

e de Estudos Sociais, anexo xiv, n.os 3 e 4, Julho-

Dezembro 1967, pp. 259 a 313. Reconhecimento dos Baldios do Continente, M. A. J. C.

I., 1939.

Direito Económico, n parte, Carlos de Almeida, p. 393. Política Florestal, A. M. de Azevedo Gomes (Negócios,

Fevereiro de 1985). Zonas de Montanlui, Maria Leonor Caxarias Ferreira, (ISA,

1985).

«La proteccion registrai de los montes», Francisco Coural Duenas, in Revista de Estudos Agro-Sociales, Octubre/ Dicieinbre 1982.

ANEXO I

Os baldios no debate parlamentar da última década

Ao longo das várias legislaturas, o tema dos baldios esteve presente nas preocupações do Parlamento Português.

Este foi o domínio legislativo onde a repelida iniciativa legislativa viabilizou um intenso, embora, até agora infrutífero, debate parlamentar.

Enumeram-se os projectos apresentados ao longo dos tempos no pós-25 de Abril e seguidamente seleccionam-se extractos de textos ou discursos em que aparecem, por vezes, com riqueza de léxico ou com bela construção literária muito do que caracteriza os baldios: a sua importância, a sua história considerações sobre o regime jurídico actual e os objectivos de renovação propostos.

Eis os projectos:

Projecto de lei n.° 272/11, do CDS, de 14 de

Novembro de 1981 (Diário da Assembleia da

República, 2." série, n.° 14); Projecto de lei n.° 289/11, do PPM, de 8 de Janeiro

de 1982 (Diário da Assem}>leia da República, 2.*

série, n.° 36); Projecto de lei n." 291/11, do PSD, de 9 de Janeiro

de 1982 (Diário da Assetnbleia da República, 2.'

série. n.° 37); Projecto de lei n.° 361/11, do PSD, CDS e PPM, de

23 de Julho de 1982 (Diário da Assembleia da

República, 2." série, n.° 129);

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Projecto de lei n.° 199/III, do CDS, de 15 de Julho de 1983 (Diário da AssemIAeia da República, 2." série, n.° 22);

Projecto de lei n.° 281/III, do PSD, de 3 de Fevereiro de 1983 (Diário da Assembleia da República, 2." série, n.u 82);

Projecto de lei n.° 13/IV, do PSD, de 13 de Novembro de 1985 (Diário da Assembleia da República, 2.' série, n.° 2);

Projecto de lei n.° 21/IV, de 13 de Novembro de 1985 (Diário da Assembleia da República, 2.* série, n.u 2);

Projecto de lei n.° 174/IV, do Deputado independente Ribeiro Teles, de 9 de Abril de 1986 (Diário da Assembleia da República, 2." série, n.° 50);

Projecto de lei n.° 287/IV, do PSD, de 12 de Novembro de 1986 (Diário da Assembleia da República, 2." série, n.u 8);

Projecto de lei n.u 4/V, do PS, de 17 de Outubro de 1987 (Diário da Assembleia da República, 2.* série, n.° 10);

Projecto de lei n.° 64/V, do CDS, de 30 de Outubro de 1987 (Diário da Assembleia da República, 2.* série, n.° 15);

Projecto de lei n.° 90/V, do PSD, de 13 de Novembro de 1987 (Diário da Assembleia da República, 2.' série, n.ü 21);

Projecto de lei tt.° 532IW, do PSD, de 28 de Abril de 1990 (Diário da Assembleia da República, 2.* série-A, n.° 36);

A seguir transcrevem-se os textos e os discursos, embora por vezes só em partes consideradas mais significativas:

A) A Importância dos baldios 1 — O baldio representava a libcrdudc de viver

«Os baldios nasceram de doações ou aforamentos feitos aos moradores de determinada freguesia ou freguesias ou parte delas com o objectivo de promover o povoamento de certas áreas.

Os vizinhos viviam à sombra do baldio. [...] o baldio era o complemento indispensável da sua subsistência. [...]

Os baldios, a maior parte das vezes, eram zonas de serra e serviam para a apascentação do gado, para o corte de lenhas, era o local onde se ia buscar uma ou outra árvore para a construção ou conserto da casa ou da mobília e ainda para o aproveitamento dos matos destinados à fertilização das suas courelas e para retirar o barro para a construção das suas casas e de alguns utensílios domésticos.

Mais perto das povoações e com a mesma natureza de bens comuns, ou logradouros para corar e enxugar ou para fazer a barreia da roupa no invento, para juntar os matos que tinham sido curtidos na rua na época das chuvas por calçamento das pessoas e animais. Ali se depositava a lenha antes de ser arrumada; ali se construíam os canastros ou espigueiros para secar o milho, se faziam as medas ou rolheiros de palha para alimento do gado e também para a sua cama ou para a enxerga do proprietário; na eira comum se debulhava o milho ou se malhavam os cereais.

Tudo bens comunitários.

Alguns baldios destinavam-se a agricultar em geral, não colectivamente; cada um fazia a sua arada, a florestação resultava da regeneração natural. Aproveitava-se aquilo que a serra dava.

Do baldio vinha a carne, o leite e a lã e a água para as regas.

Mas o baldio representava ainda a liberdade de viver, de caçar e de pescar. [...]

Nem todos os baldios foram restituídos aos utentes, por inércia natural ou procurada das juntas de freguesia, mas sempre com algumas culpas ou com o desinteresse dos utentes; há baldios que, por abandono de funções dos conselhos directivos e por falta de previsão legal, não possuem entidade administrante; o plano de aplicação das receitas deve ser homologado [...] nos planos de aplicação de receitas há verbas consignadas a acções paralelas àquelas que devem desenvolver a autarquia local como, por exemplo, a construção de cemitério, electrificações, abastecimentos de água, campos de futebol, etc, etc; os rendimentos baldios florestados são, às vezes, mais avultados que os das juntas de freguesia o que cria uma situação de conflito entre populações e órgãos; o conselho directivo dos baldios não tem de prestar contas a não ser à assembleia de compartes e, se não o fizer ou fizer irregularmente, não há sanção especifica para a omissão, negligência ou dolo, o que parece inadequado quando se trata da administração de uma propriedade social: nunca foi definido qual o fim das receitas nem os objectivos gerais dos conselhos directivos no que concerne à melhor rentabilidade do baldio, pelo que tem havido mais interesse em beneficiar as populações em geral com as receitas dos baldios do que aplicar os rendimentos na melhoria dos factores de produção. [...] do ponto de vista do interesse geral, [...] não têm sido aproveitados e os planos de utilização, sendo feitos ou não, não são aplicados e constituem assim um obstáculo a uma política real do respectivo aproveitamento.

[..,] as juntas de freguesia recorreram muitas vezes ao expediente da justificação notarial para efeitos de registo predial e os baldios passaram assim de bens comunitários a propriedade privada das autarquias; há vendas de lotes de terreno onde se esconde, com generalizada cumplicidade, a situação de terreno baldio; há loteamentos de baldios feitos pelas autarquias perfeitamente ilegais e em que a venda não pode ser realizada mas o adquirente já tem ali casa feita.

[...] Há arrendamentos que têm a natureza de urbanos feitos por conselhos directivos e juntas de freguesia para instalar depósitos de madeiras e outros que são destinados a plantações, como rezam os arestos dos tribunais [...]» (António Costa, PS, Diário da Assembleia da República, 1.' série, n.° 116, de 31 de Maio de 1984, pp. 4908 a 4910.)

2 — Modelos e poios de desenvolvimento

Localizam-se os baldios, fundamentalmente, nas zonas de serra e mais serra das Regiões Centro e Norte. Cobrindo mais de 500 000 ha, a sua área encontrava-se no início da década de 40 distribuída por mais de 7500 unidades.

Anda pelos 375 000 ha a área baldia submetida ao regime florestal ao abrigo da Lei do Povoamento Florestal de 1938, processo de submissão que apenas incidiu sobre os baldios de aptidão essencialmente não agrícola com mais de 500 ha. Se para o conjunto dos baldios não se dispõe neste momento de estatísticas disponíveis que permitam avaliar a respectiva área média já é possível afirmar que área total submetida ao regime florestal engloba unidades de grande ou muito grande dimensão.

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De tacto, não são raros baldios com alguns milhares de hectares, havendo até casos em que estilo constituídas com terrenos baldios, ou com eles é possível constituir unidades de ordenamento de recursos com mais de 10 000 ha.

A realidade acabada de diagnosticar, em termos gerais e necessariamente aproximados, por deficiências estatísticas, é tanto mais relevante quanto é certo estarem os baldios localizados, para o essencial da sua área total, em zonas e sub-regiões deprimidas, de minifúndio, pequena e média propriedade, cuja valorização unanimemente se considera necessário promover a escalas e a ritmos que possam realmente contribuir em tempo útil para a escalada europeia, que, em matéria de desenvolvimento, constitui objectivo prioritário.

Acresce tratar-se, para a grande percentagem da área total envolvida, de unidades com característica vocação para múltiplas utilizações e para o desempenho simultâneo de funções tanto de produção de bens como de benefícios indirectos, em qualquer dos casos de grande significado social, económico e ambiental.

Por outro lado, da aplicação da Lei do Povoamento Florestal, atrás referida, que acarretou, sem dúvida, custos sociais, económicos e financeiros não menores, resultaram quatro ordens de benefícios. Segue-se a respectiva enumeração, dado convir tê-los presentes numa altura em que se pretende dotar o País de uma nova legislação sobre os baldios capaz de atender aos interesses locais, zonais, regionais e nacionais e de os compatibilizar em termos que, possuindo coerência interna e externa, melhor possam satisfazer todas as partes interessadas.

Em primeiro lugar, foi contemplado numa fracção altamente significativa dos baldios, pela área e pela localização, o principal conjunto de benefícios indirectos pretendidos (contenção do processo de degradação do solo e correcção do desregularizado regime das águas), embora em graus não só variáveis, como, em regra, acentuadamente inferiores aos que estariam no espírito da lei e teria sido possível e desejável alcançar.

Em segundo lugar, foi criada uma importantíssima rede de estrada e caminhos florestais, infra-estrutura cujos benefícios sociais e económicos se realça.

Acresce a criação de patrimónios vivos renováveis, ocupando grandes extensões, produtores de bens e origem dos correlativos rendimentos, cujos efeitos se fazem hoje sentir a todos os níveis, desde o local ao nacional, do primário ao secundário e ao terciário.

Por último, foi criada uma organização sem paralelo e só substituível com pesados custos, regionalizada, de malha relativamente apertada e com elevada capacidade executiva potencial em áreas com as difíceis características geográficas dos baldios, quantas vezes abrangendo situações ecologicamente muito sensíveis, embora os níveis quantitativos e qualitativos da sua realização média hajam ficado, e continuem a ficar, muito aquém dos níveis potenciais, tanto por carência da necessária vontade política dos órgãos de decisão, como por carência de planeamento e de convergência funcional das entidades naturalmente i/ííeressadas, bem como por característica falta de responsabilização. Estrangulamentos esses que importa decididamente corrigir.

Encontrando-se o País num estádio da sua história e do seu processo de desenvolvimento no qual, hoje mais do que ontem, nada justifica, antes tudo desaconselha, a manutenção de um certo estado de desprendimento e de apatia no aproveitamento de recursos renováveis disponíveis, de potencialidades bem ao alcance de

oportunidades convergentes, e por vias disso, malbaratados uns e minimizadas ou correntemente ignoradas e perdidas outras, não se afigura sequer legítimo que o órgão de soberania legislativo descura, na feitura de uma lei dos baldios, a questão fundamental, que consiste na criação de condições efectivas para a transformação de uma elevada quota-parte da área baldia em unidades de gestão que possam aplicar, com eficácia e pleno proveito colectivo, uma política concertada de desenvolvimento sustentável.

O ficar nesta matéria apenas, ou mesmo sobretudo, ao nível elementar de definir quem irá administrar os baldios, a começar nas apetecidas receitas que muitos deles já hoje facultam, constituía um lamentável equívoco legislativo.

Os baldios, para a esmagadora quota-parte da área total abarcada, deverrão converter-se, no interior das fronteiras das zonas deprimidas, de minifúndio, pequena e média propriedade, em que, no geral, se encontram, em verdadeiros modelos e pólos de desenvolvimento, criadores ou promotores de emprego especializado, e como tal qualificado, produtores de sustentáveis fluxos de bens múltiplos e de múltiplos benefícios indirectos, graduados em termos que melhor sirvam e harmonizem os interesses locais com o desenvolvimento regional e nacional, e isto qualquer que seja a modalidade adoptada para a sua gestão, ou melhor, qualquer que seja a gama das modalidades adoptadas para a respectiva gestão em correspondência com a diversidade de situações que entre nós envolve a realidade «baldios».

De resto, o País iniciou um período assaz favorável ao lançamento de uma política de desenvolvimento nos baldios, fundamentalmente orientada para o aproveitamento das duas potencialidades florestais, senso lato (arborização de múltiplo uso, silvo-pastorícia, cinegética, aquacultura, apicultura), e turísticas, já que será possível contar durante uma década com importantes auxílios financeiros a fundo perdido provenientes da CEE.

Pelas razões atrás aduzidas, fica justificada a importância dada no articulado seguinte a questões básicas de que dependerá a viabilização de uma tal política.

Como atrás ficou referido, a realidade «baldios» consubstancia-se através de uma diversidade de situações que justificam e solicitam tratamentos diferenciados, nomeadamente no que respeita à modalidade de administração.

De facto, sob a designação única de «baldios» foram no anterior regime, e à sombra da Lei do Povoamento Florestal, e não só, englobados terrenos que por antigo costume vinham sendo administrados por entidades diversas, como resultado de uma política centralizadora, avessa a ludo o que representasse poder autárquico, descentralizado, tanto quanto qualquer traço de organização comunitária. Embora sem retomar, em termos de nomenclatura, especificidades com raízes no passado remoto, desde o tempo do domínio romano, com sua organização administrativa e do domínio dos povos que o antecederam e seguiram, com sua preferência pelo regime comunitário, e, assim, mantendo a designação genérica de baldios, no articulado que se segue contemplam-se, em matéria de direito de administração ou de sua delegação, realidades de natureza diversa, embora sujeitas tradicionalmente a modalidades idênticas de utilização.

Por outro lado, e sempre na óptica de uma política concertada que considere e contemple os baldios como pólos de desenvolvimento nas zonas deprimidas em que, no geral, se localizam, abre-se um leque amplo de possíveis modalidades capaz de cobrir situações diversas, a

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justificarem a adopção de soluções distintas de gestão ou de co-gestão.

Por força do mesmo princípio, no caso em que se justifique ou se solicite a intervenção do Estado, confere-se-lhe uma representação também diversificada que possibilite tirar partido efecüvo da sua organização florestal regional, isto é, da sua elevada capacidade executiva potencial para o cumprimento de programas de envergadura, envolvendo acções múltiplas, coadjuvada em áreas, no geral, ecologicamente sensíveis, por diversas outras entidades de âmbito regional. (Azevedo Gomes, PS, preâmbulo do projecto de lei n.° 4l/V, de Outubro de 1987).

3 — O desaproveitamento dos baldios

«Outrora, os terrenos baldios incultos e marinhos tinham fins específicos para aqueles que não possuíam terrenos: a manutenção e apascenlação de gados —a produção e corte de matos nos montados e logradouros para acamar os animais—, originando os estrumes e o abastecimento de lenha usada como combustível.

Estas razões já não existem e por isso os baldios estão a ser desaproveitados e não ocupados e por conseguinte lançados ao abandono, porque não são úteis à comunidade.

Destas consequências resultou já um aproveitamento por parte do Estado, através da silvicultura, de alguns terrenos baldios, sendo certo que a lei em vigor obstacula a sua continuidade. Pode, pois, dizer-se que a única maneira de evitar a continuação do desaproveitamento dos baldios consistirá na sua entrega à entidade pública responsável — freguesia ou município —, pois são estes órgãos e só eles os legítimos representantes das populações, e que melhor assegurarão o seu aproveitamento, nas diversas formas ou serviços que lhes podem prestar — reservatórios de água, florestação, explorações agrícolas adequadas, miradouros; e até um desenvolvimento pecuário cooperativo.

[...] não havendo entendimento entre os órgãos autárquicos da freguesia ou município e a assembleia de compartes ou o conselho directivo — e normalmente não há—, sucede que os rendimentos dos baldios, e alguns têm largos proventos — sobretudo os florestados —, não podem ser utilizados sem o acordo dos autarcas, e, sendo assim, é manifesto o prejuízo das populações.» (Alexandre Reigoto, CDS, Diário da Assembleia da República, 1." série, n.° 116, de 31 de Maio de 1984, p. 4894.)

4 — Os baldios na economia local

«[...] que utilidade e que peso representam hoje os baldios na economia local.

Ao tempo da apanha da lenha sucedeu-se o da venda do pinhal com a florestação; os tempos do enxugo e da barreia da roupa seguiu-se o da maquina de lavar, ao tempo da caruma para iluminação seguiu-se a electrificação; ao lavadouro e à nascente sucedeu a água canalizada; os matos curtidos substituíram-se por abudos industriais; os fenos e medas de palha deram lugar às rações; os rebanhos, na maior parte dos casos, abandonaram o baldio c passaram à engorda mais rápida no curral e o baldio vai ficando abandonado, quase esquecido pela comunidade, a que, durante muitos séculos, deu carne, leite, pão e liberdade; sim, liberdade, porque era o baldio o local quase único de uma vida dura, daquela vida da aldeia separada do mundo, que no baldio

buscava as coisas comuns, numa vivência de partilha colectiva onde ludo era de lodos.

É importante a filosofia envolvente e subjacentes aos baldios — realidades antigas, é certo, mas que não podem dissociar-se da evolução dos tempos e do interesse dos povos [...]

[•••]

[...] o próprio aproveitamento do baldio hoje não é o mesmo de há alguns anos atrás — da lenha para consumo doméstico, do mato para o estrume da horta, ou até da própria apascentação do gado; hoje o baldio é quase unicamente fornecedor de madeiras, que se destinam às diversas indústrias e cujo rendimento as autarquias procurarão aplicar em obras que as populações esperam e justamente merecem e exigem.» (Roleira Marinho, PSD, Diário da Assembleia da República, 1." série, n.° 88, de 2 de Julho de 1986, pp. 3363/65.)

5 — A necessidade de uma análise sensata e profunda

«Nasceram os baldios de doações ou aforamentos feitos aos moradores de determinada freguesia ou freguesias ou parte delas, com o objectivo de promover o povoamento. Os que não tinham quaisquer terras tinham e têm nos baldios um contributo decisivo para a sua sobrevivência.

Para os que tinham alguns pedaços de terra o baldio era e é o complemento indispensável da sua subsistência. Os produtos agrícolas, as pequenas explorações de cereais, um ou outro animal, seriam o que os habitantes tinham de seu.

A maior parte das vezes, os baldios eram zonas de serra e serviam para a apascentação do gado, para a busca de lenhas, era o local onde se ia buscar um ou outro tronco de árvore para a construção ou restauro da casa e ainda para o aproveitamento dos matos destinados às camas dos animais e fertilização das courelas e para retirar o barro para a construção das casas e de alguns utensílios domésticos.

Mais perto das povoações e com a mesma natureza de bens comuns, os logradouros para corar e enxugar as roupas ou para fazer a barreia da roupa, para juntar os matos que tinham sido curtidos na rua na época das chuvas, por calçamento das pessoas e dos animais.

Ali se depositava a lenha, antes de ser arrumada; ali se construíam os canasiros ou espigeiros para secar o milho; ali se faziam as medas ou rolheiros de palha para alimento do gado e também para a sua cama ou para a enxerga do proprietário; na eira comum se debulhava o milho ou se malhavam os cereais.

Tudo bens comunitários.

Alguns baldios destinavam-se a agricultar em geral, não colectivamente; cada um fazia a sua lavoura; a florestação resultava da regeneração natural; aproveitava-se aquilo que a serra dava.

As condições de vida foram-se modificando, o baldio deixou de ser tão necessário [...] levou à florestação desmedida de tudo ou quase tudo era baldio [...]

[...]

Daí [...] a necessidade da análise sensata e profunda desta realidade chamada baldios, distribuídos por cerca de 7500 unidades e cobrindo mais de 500 000 ha, localizados em zonas e sub-regiões deprimidas de minifúndio, de pequena e média propriedade, cuja valorização se considera necessário promover a escalas e a ritmos que possam realmente contribuir, em tempo útil, para a escalada

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europeia que, em matéria de desenvolvimento, constitui objectivo prioritário.» (Alberto Avelino, PS, Diário da Assembleia da República, 1." série, de 24 de Abril de 1988, p. 3204.)

6 — Os baldios ocupam um vasta área

«Os baldios ocupam em Portugal uma vasta área, estimada cm cerca de 400 000 ha, com maior incidência no Norte e Centro do Pais.

[...] os baldios situam-se normalmente nas zonas de montanha, menos férteis e maioritariamente ocupadas com povoamentos florestais constituídos por uma flora diversificada e desordenada.» (Carlos Duarte, PSD, Diário da Assembleia da República, l." série, de 24 de Abril de 1988, p. 3228.)

B) Enquadramento histórico 1 — A distinção entre baldio e logradouro comum

«A evolução histórica da legislação relativa aos baldios, considerada a partír das Ordenações Filipinas (1602), permite observar a transformação do conceito e do uatamento político-jurídico dado a essas terras incultas, matos daninhos ou matos bravios que nunca foram aproveitados ou não há memória do homem que o fossem e que, não tendo sido contados nem reservados pelos reis, passaram geralmente pelos forais com outras terras aos povoados delas, para os haverem por seus e defenderem [...]

Os baldios são tidos, originariamente, como verdadeiras coisas comuns, na posse ou mesmo na propriedade dos 'vizinhos', que os administram e que deles necessitam para o seu sustento; nesta fase, as alienações, totais ou parciais, dos baldios são 'sentidas como autênticos esbulhos pelas populações.

A noção de propriedade dos baldios perde-se progressivamente com a sua apropriação pelas freguesias e concelhos, confundindo-se com os bens próprios destas autarquias, que deles dispõem, iniciando a sua venda a particulares, venda essa muitas vezes ilegal e abusiva.

Adquire foros de categoria legal a distinção entre 'baldio' e 'logradouro comum', reservando-se para o primeiro a titularidade das autarquias e para o segundo o uso ou usufruto por parte das populações vizinhas, mas já não a propriedade, e nem sequer a posse.

A administração central começa, por sua vez, a 'reservar' baldios, subtraindo-os à tutela quer dos órgãos locais quer dos povos.

A partir da República e com especial incidência no 'Estado Novo', administração central e autarquias disputam entre si a posse dos baldios, destinando-os aos objectivos macroeconómicos da chamada 'recuperação da economia nacional*. Não se discute a propriedade dos baldios— é do Estado. Partilha-se a sua administração em função da respectiva aptidão económica, e vende-se a entidades privadas boa parte do restante. O usufruto dos logradouros comuns sobreviventes é severamente espartilhado pelo Código Administrativo, cabendo a sua administração aos 'corpos administrativos'.» (Gonçalo Ribeiro Teles, PPM, Diário da Assembleia da República, 1 .* série, n.° 50, de 9 de Abril de 1986, p. 1836, preâmbulo do projecto de lei n.° 174/VI, de 3 de Abril de 1986.)

«Pretende-se definir o regime jurídico dos baldios.

Os baldios são tidos originariamente como verdadeiras 'coisas comuns' na posse dos povos (vizinhos) que habitam e trabalham determinados povoados e terras. São admi-

nistrados por todos os utentes e indispensáveis à economia dos seus agregados familiares e respectivas explorações agrícolas.

Na realidade os baldios, termo proveniente ao árabe 'baladi', que quer dizer terreno não cultivado e, portanto, bravio, são 'logradouro comum' dos povos e vizinhos que os possuem.

A distinção que por vezes se faz entre baldio e logradouro comum não emana do direito consuetudinário mas de tentativas ilegítimas de apropriação dos baldios por parte de autarquias e posteriormente por parte de particulares.

Os reis respeitaram (e refiro-me às Ordenações Manuelinas) os baldios ao promoverem, pela aplicação da Lei das Sesmarias, o aproveitamento das terras incultas ressalvando os terrenos destinados ao 'geral proveito dos moradores dos lugares, nos pastos e criações e logramento da lenha e madeira para as suas casas e lavouras'.

Os baldios só podiam ser aproveitados pelos vizinhos da povoação a que pertencessem e não por estranhos.

Os baldios foram, e devem continuar a ser, bens comuns dos moradores rurais de uma povoação e não pertencem ao património da pessoa moral, concelho ou freguesia.

Dentro de uma visão capitalista e fisiocrática, o poder central passou a considerar, a partir da segunda metade do século xviii, os baldios como terrenos estéreis, desaproveitados e é sintomática a legislação que tentou a sua pariilha (1766, 1774, 1804, 1815, 1850, 1869, 1918, 1921) e contribuiu para a sua diminuição. Diminuição, no entanto, principalmente devida a apropriações ilegítimas por parte de particulares.

Apesar de toda esta legislação, o Código Civil de 1867 reconheceu os baldios e certas águas como domínio comum em face do domínio público e do domínio privado e patrimonial.

A partir da República e com especial incidência no Estado Novo, a disputa pela posse dos baldios e sua reutilização passa a ser feiui entre o poder central e as autarquias. Primeiro com vista ao parcelamento e distfibuição por trabalhadores rurais e após para florestação. Esta segunda fase teve como objectivo a chamada 'recuperação económica nacional' a realizar ein termos macroeconómicos e com completo desprezo pelas populações serranas.

Das partilhas realizadas a favor de uabalhadores no sul do País, entre 1918 e 1921, nada ficou de útil para a agricultura e para a poupança rural. Ao fim de pouco tempo essas parcelas eram vendidas a grandes proprietários.

O Código Administrativo de 1939-1940 classificou os baldios em quatro categorias: baldios indispensáveis ao logradouro comum; baldios dispensáveis e propícios para cultura; baldios impróprios para cultura e baldios arborizados ou destinados à arborização.

Em 1939, no entanto, ainda 4,6 % da área do continente era logradouro comum das populações. 150 anos antes, mais de 25 % da área total do continente deveria ser constí-tuída por baldios.

[...] No projecto de lei que apresento reconhece-se e defende-se que os terrenos baldios são propriedade comum e indivisível dos povos que retêm a sua posse e os têm vindo a usufruir desde tempos imemoriais.

É necessário ainda salientar que os limites geográficos dos baldios são anteriores aos actuais limites das freguesias.

É, por isso, que muitos baldios pertencentes a determinado povo ocupam áreas de várias freguesias e por vezes

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os utentes de um baldio vivem em povoados de outra freguesia.

A posse comunitária dos baldios e a sua utilização, sempre complementar de explorações agrícolas de natureza familiar, não podem ser alteradas por apropriação privada ou pública ou desviada do seu uso, sem motivos justificadamente importantes.

Exceptuam-se os actos do Governo que tenham por objecto a declaração de utilidade pública de baldios ou suas parcelas com vista à construção de equipamentos sociais, confinantes com povoações, estradas ou prossecução de florestações tidas como imprescindíveis e que não prejudiquem o equilíbrio e zonamento das áreas agricultadas.

É, no entanto, necessária, no projecto de lei que apresento a consulta prévia às assembleias de utentes, devendo ser aplicadas as indemnizações previstas na lei geral.

Não devemos deixar de apontar que muitos terrenos baldios confinam com povoações que, geralmente, na face oposta confinam com solos de aptidão agrícola e que, por isso, são explorados individualmente. É evidente que o crescimento da povoação se deve fazer à custa do baldio onde estão os solos menos favorecidos. As assembleias de utentes deverão poder, por conseguinte, decidir excepcionalmente, a concessão do direito de superfície para habitação própria em parcelas de baldio confinantes com povoações, a favor de utentes ou seus familiares directos emigrantes no estrangeiro.

De facto, o poder local autárquico está mais próximo dos povos utentes dos baldios do que do poder central.

Deverá, portanto, recair nas juntas de freguesia a aprovação e fiscalização da assembleia de utentes.

O costume de cada povo que usufrui um baldio determinou as normas e regras seguidas que são aceites por consenso entre todos os utentes, pelo que só actos excepcionais de administração poderão ser executados, segundo as determinações da assembleia de utentes, pela junta de freguesia.

Em face daquele costume, julgamos que um órgão próprio de administração ou direcção é dispensável e pode comprometer a participação directa de todos os utentes na gestão e administração dos baldios.

Na impossibilidade total de se construir a assembleia de utentes — impossibilidade que já é vulgar nalgumas situações — deverá a junta de freguesia assumir os direitos e deveres que deveriam ser daquela assembleia, que já não existe.

[...]

Tem, contudo, por finalidade uma maior transparência na orgânica dos utentes (compartes) que deverão manter, permanentemente, como foi sempre o costume, uma participação activa e directa na administração e gestão de baldios. [...]

É a democracia directa da base.

[...]

O projecto de lei n.° 174/IV tem como objectivo essencial encontrar uma fórmula que permita respeitar a verdade histórica dos baldios (que por isso se consagram como propriedade dos povos vizinhos), coaduná-la com o verdadeiro papel económico e social que hoje desempenham e podem vir ainda a desempenhar, que se estende como um factor extremamente importante na sedimentação das populações, capaz de fornecer um adequado suporte territorial ao desenvolvimento e ao reequilíbrio económico e demográfico das comunidades e de ser um obstáculo ao despovoamento do território, principalmente nas zonas serranas onde os povos se redram das suas terras dada a florestação indiscriminada com espécies estremes como, por exemplo, o eucalipto.

Este projecto de lei não é a indispensável lei quadro do domínio comum que deve incluir terrenos e água mas um contributo para definição do regime jurídico dos baldios.

[...] repor o poder na totalidade dos membros da assembleia de utentes, que são quem tem o direito histórico de herança dos baldios. Se depois, para determinados efeitos, aqueles que quiserem mandatar uma comissão directiva com parte desse poder, estou absolutamente de acordo. A criação de uma direcção permanente está contra o costume da maior parte dos povos que detém os baldios.

[...]

[...] quando falo em equipamentos de interesse social, sei que as povoações cuja economia dos respectivos agregados familiares depende dos baldios estão geralmente situadas no limite, entre as terras pouco férteis, que são baldias e as mais férteis, que são as explorações intensivas familiares. É evidente que, para não obrigar as povoações a crescer para cima das terras mais ricas, é necessário que aquelas cresçam para cima dos terrenos baldios. Portanto, o que vejo é a construção de escolas, de habitações, que possa resolver o problema do crescimento dessas povoações sem que seja para cima dos terrenos férteis. No fundo, islo é o cumprimenlo da Lei de Reserva Agrícola Nacional.

[...]

A existência dos baldios, no futuro, é importantíssima. É com eles que poderemos repovoar muitas zonas do interior do País, é com esse domínio comum, é com essa propriedade colectiva quando existe uma agricultura de recursos e não pode existir outra. [...] Infelizmente, os baldios do sul praticamente desapareceram, foram indevidamente divididos em parcelas que hoje desapareceram e que foram todas adquiridas por grandes proprietários. Como agricultura de recursos, o baldio é uma das mais úteis explorações para a agricultura moderna e, portanto, tem uma vivência total.

[...]

[...] muitos povos, muitos lugares são comunidades integradas numa freguesia mas não absorvidas pela freguesia — têm a sua liberdade própria. Ora estas comunidades com essa liberdade própria— até de administração — é que são, evidentemente, as donas dos baldios.

Portanto, se o baldio é para funcionar como complemento da agricultura familiar dessas povoações, desses povos, desses vizinhos, não vejo que esle não possa estar sob a sua directa gestão e administração. [...] muitos baldios não têm utentes e então, nesse caso, o herdeiro legítimo é de facto o poder local, é de facto a junta de freguesia. Mas só nesses casos.» (Gonçalo Ribeiro Teles, PPM, Diário da Assembleia da República, 1." série, n.° 88, de 2 de Julho de 1986, pp. 3371-75).

2 — Os utentes têm um direito ao seu uso

«Perdendo-se a origem dos baldios na longa noite dos tempos, pacífico ou unânime não tem sido, tanto nas antigas legislações como nas informações que nos transmitem os historiadores e os juristas, o entendimento acerca da qualificação jurídica dos baldios.

[...]

(...] os utentes tradicionais dos baldios agem no exercício de um indiscutível direito ao seu uso — apascentação de gados, cortes de lenha para consumo, cones de mato, efe. — e não por qualquer acto de mera tolerância, nomeadamente dos poderes públicos.

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[...] porque sao moradores e que lhes pertence desde o momento em que o sao, mas que também se extingue, sem mais, quando deixam de morar nesse mesmo local.

É como que um direito real, embora com características e contornos especiais, que o nosso direito consuetudinário, acolhido e respeitado pelo direito positivo, deliniou e consagrou; porém, e contrariamente ao que por vezes se taz com certas afirmações, esse direito ao uso dos baldios distingue-se também claramente da compropriedade, no rigorismo do seu conceito.

Este direito ao uso dos baldios por parle dos seus tradicionais utentes transcende o exclusivo interesse individual de cada um, para ser realmente um direito radicado no interesse colectivo de todos eles.

Daqui que— salvo o ocorrido conjunturalmente em certos períodos históricos — sempre que se tenha considerado, e bem, a regra de que os baldios não podem ser apropriados individualmente por qualquer utente, seja a que título for; por isso, a consagração do princípio, tal como sucede no projecto de lei em debate— que os mesmos estño fora do 'comércio jurídico'. Eles são objecto de uma afectação especial, qual seja a da satisfação de determinadas necessidades colectivas das populações, consoante as utilidades que deles possam ser obtidas.» (Marques Mendes, PSD, Diário da Assembleia da República, 1." série, n.° 116, de 1 de Maio de 1984, pp. 4886-7).

3 —Tradição dc coinunilarismo agro-pusloril

«Perdendo-se numa tradução de comunitarismo agro--pastoril, a origem dos baldios, entre nós, estará nos Celtas, ou até antes deles. Vem dos Castros e Citânicas, com a sua agricultura de meia encosta e o pastoreio dos gados nos descampados dos montes vizinhos.

Continuou com as aldeias comunitárias durante a colonização romana, acompanhando a conquista das várzeas, ganhando o espaço de cultivo aos pântanos e florestas, e resistiu à implantação do domínio urbano e privado do latifúndio romano.

Passou pelas invasões germânicas e preservou os fundamentos comunitários, mantendo as instituições comunitárias apoiadas em baldios ao longo do domínio visigótico e da consolidação do cristianismo em dioceses e paróquias.

Resistiu às guerras e pilhagens, preterindo a protecção das montanhas à protecção dos nobres e ao sistema feudal que estes impuseram.

Refugiado nas montanhas, resistiria ainda à invasão muçulmana e reforçar-se-ia com o alargamento para sul do novo reino de Portugal, através da atribuição, mediante foral, de uma parte da 'presúria' real.

Conquistado o sul do Tejo, a nobreza e as ordens religiosas repartiram as terras. Surgirá o baldio de vizinhança aldeã, onde cada um dispõe de um pedaço de terra para cultivar a seara de pão para comer.

E assim os baldios sobreviveram durante séculos à evolução do regime de propriedade, às crises das guerras, às usurpações das classes e interesses dominantes — prelados, mestres, priores, conservadores, fidalgos, administradores de municípios e misericórdias'.

E será só com o advento do liberalismo, defensor do 'direilo de propriedade livre', que os baldios, que haviam resistido ao confronto com o 'direito de propriedade plena' dos romanos e ao conceito de posse germânico, irão enfrentar a mais dura batalha da sua existência.

Ao abrigo das leis liberais é abolido, na região ao latifúndio, o compáscuo e dividido o baldio, cujas parcelas

são sorteadas pelos proprietários dos latifúndios circundantes ou pura e simplesmente usurpados por único proprietário.

E assim que desaparecem quase totalmente os baldios do sul.

No resto, a legislação tende apenas a preservar as áreas tidas por indispensáveis ao logradouro comum dos povos, e mesmo assim impondo taxas de usufruição dos baldios.

É a partir da vigência do Código Civil de 1867 que começam a ser dadas diferentes interpretações quanto à natureza jurídica dos baldios. Se o Decreto de 19 de Julho de 1839 declarava expressamente que apesar da alteração da divisão administrativa 'os baldios continuavam a pertencer aos povos que tradicionalmente os vinham usufruindo e só a estes', surgiam agora os que classificavam os baldios como propriedade pública das autarquias locais. [...] Os baldios foram ainda incluídos no domínio das coisas comuns, categoria diferente da do domínio público, 'caracterizado sobretudo pela propriedade comunal dos vizinhos de certa circunscrição ou parte dela'.

Posteriormente, a categoria das coisas comuns viria a ser suprimida com a entrada em vigor do Código Civil de 1966. Passaram então alguns autores a sustentar a tese que estaria ultrapassada a fase da propriedade comunal dos vizinhos, devendo os baldios ser definidos como coisas particulares, pertencentes ao património da autarquia, mas 'sujeitos a afectação especial*.

É neste contexto que se vai avolumando legislação que não só porá em causa os direitos seculares dos povos dos baldios como escandará as portas do Estado, às usurpações por parte das juntas de freguesia e de câmaras municipais, à conveniência destas nas apropriações privadas.

O Decrcto-Lei n.° 27 207, de 1936, que permitiu ao Estado estabelecer, como lhe aprouvesse, a reserva de terrenos baldios ou sujeição dos mesmos a regime florestal, completando-se com o Código Administrativo, que cometia às juntas de freguesia e câmaras municipais a administração dos baldios, completava o cerco.

O equilíbrio das economias serranas foi devastado pela alienação dos baldios e pela monoflorestaçâo.

Aldeias ficaram privadas da juventude, muitas desapareceram após a emigração dos jovens e a morte dos velhos. Foram muitos os que sofreram a prisão, os que derramaram o seu sangue na defesa dos baldios contra a prepotência e a corrupção do poder.

[...] a luta das comunidades locais em defesa dos baldios remonta à érxx:a da colonização romana.

[...] apesar das constantes usurpações das classes dominantes, os baldios acompanharam durante séculos a evolução do regime de propriedade, só começando a ser verdadeiramente contestados e transformados (por outros, que não os seus utentes), na sua forma e conteúdo, a partir do século xix e, sobretudo, durante o regime fascista.

Até então, sempre haviam sido possuídos e fruídos, em total liberdade, pelos seus povos.

[...] O Decreto-Lei n.° 39/76, de 19 de Janeiro, viria a estabelecer, como aliás o reconhece o próprio parecer da Procuradoria-Geral da República:

1) [...] são terrenos comunitariamente usados e fruídos por moradores [...];

2) [...] estão fora do comércio jurídico, são inalienáveis e imprescritíveis;

3) [...] são administrados exclusivamente pelos compartes ou em regime de associação (...];

4) [...] incumbe apoiar e promover a actividade de esclarecimento [...] dar apoio na gestão das matas e produção.

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[...] a Constituição da República viria a precisar a natureza jurídica dos baldios ao incluí-los no sector público de propriedade dos meios de produção, como bens comunitários com posse útil e gestão das comunidades locais.

[...] muitos desses interesses serem estrangeiros e decorrentes da filosofia subjacente aos projectos de florestação do Banco Mundial e das Celuloses.

[...] dificuldades de toda a ordem, grande parte delas levantadas pelos próprios serviços oficiais, [...] dentro dos próprios serviços oficiais, chegou-se ao ponto de serem dadas instruções no sentido de os Decretos-Leis n.03 39/76 e 40/76 não deverem ser aplicados e de os Conselhos Direcüvos dos Baldios serem ignorados ou preteridos em relação às autarquias. Passaram, ilegalmente, a exigir a homologação de segundos mandados dos CDB. Procederam ao congelamento indiscriminado das contas bancárias dos CDB e das receitas dos baldios. Têm efectuado cortes, vendas de madeira e leilões de resina sem conhecimento prévio dos CDB e dos compartes.

[...] por parte das autarquias, constantes tentativas, muitas delas concretizadas, de apropriação das receitas dos baldios, de cedência, de arrendamento ou venda de parte ou do todo dos baldios.

É que não é possível constitucionalmente confundir comunidades locais com autarquias locais, posto que estas estão claramente idenüfícadas nos artigos 237.° e seguintes como pessoas colectivas territoriais [...] a referida destrinça estar claramente feita na Constituição, designadamente no artigo 65.°, n.os 2, alínea b), e 4, no artigo 94.°, n.° 2, e no artigo 89.°, n.° 2, alíneas a) e c).

(...] no Conselho Nacional do Plano [...] em representação das comunidades locais, está o Conselho Nacional dos Baldios.» (Rogério de Brito, PCP, Diário da Assembleia da República, 1.* série, n.° 80, de 26 de Abril de 1988, p. 3215-6.)

4 — A posse sobre os terrenos

«[...] nas Ordenações Filipinas, só os logradouros eram dados aos povoadores de terras 'para os haverem como seus'. [•••]

Na propriedade comunal são os vizinhos ou moradores, de determinado lugar que, sem possibilidade de determinação de quota, exerciam em determinadas áreas indivisivel-mente a sua posse.

A comunidade dos vizinhos era, assim, uma entidade abstracta mas a única proprietária. Aqueles que, por um dado momento, integrarem essa comunidade exerciam a posse sobre os terrenos que variavam no tempo à medida que ganhavam ou perdiam a qualidade de moradores ou vizinhos.

[...] Mouzinho da Silveira: 'proprietário é a união dos habitantes; ninguém tem posse, todos têm direito de usar'.

Por isso, a administração desses bens era exercida por toda a comunidade, normalmente reunida em assembleias, ein exercício conseguido da democracia directa, de que chegaram até ao nosso tempo exemplos como os chamados coutos, concelhos ou adjuntos de vários lugares do norte do País.

[•••]

[...] o liberalismo tentara a apropriação individual, transformando-os em propriedade privada; o Código Administrativo permitia a sua prescrição e que fossem julgados dispensáveis do logradouro comum.

Os terrenos baldios existentes, em muitas freguesias, para utilização de água, minas, pedreiras, etc, ou foram indevidamente apropriados ou, não o tendo sido, devem ser excluídos do comércio jurídico e integrar o domínio público da autarquia em que se localizam.

[...]

[...] terrenos de aptidão e uso agrícola, poucos ou nenhuns restarão que possam classificar-se como baldios. [...]

[...] o problema da manutenção, através dos tempos, de formas comunitárias, de utilização de terrenos, só se coloca em relação a terrenos de aptidão florestal, utilizados como tal ou para a pastoricia.

[...] se procurou corrigir, por acção contrária, as acções desencadeadas a partir da década de 40, pelos serviços florestais, ao abrigo da Lei n.° 1971 e que teve consagração legislativa no Decreto-Lei n.° 39/76, de 19 de Janeiro, pelo qual se faria 'a entrega de terrenos baldios às comunidades', revogando-os os artigos 359.° a 400." do Código Administrativo e tornando-se claro que os baldios constituem propriedade comunal dos moradores de determinada freguesia ou freguesias ou parte delas, e nunca bens do património das autarquias locais.» (Barbosa da Costa, PS, Diário da Assembleia da República, 1." série, n.° 88, de 2 dc Julho de 1986, p. 3390.)

5 — Os ataques desferidos ao longo dos tempos

«[...] o uso e fruição comunitários dos baldios têm sobrevivido aos ataques contra si desferidos ao longo dos tempos, quer pelos particulares, que, não obstante, lograram consumir ilegítimas apropriações de extensas áreas, sobretudo de terrenos de aptidão agrícola, quer do poder central, a partir da segunda metade do século xvni, como se documenta com a legislação que tentou a sua partilha em 1766 e se renovou na década e século seguintes, como até durante a vigência da 1 República, com as leis promulgadas em 1918 e 1921.

Mas o mais rude golpe viria a ser vibrado durante o regime anterior, com o Decreto-Lei n.° 27 707, de 16 de Novembro de 1936, ao estabelecer a reserva de parte deles para efeitos de colonização e ao submeter outros ao regime florestal, e ainda com o Código Administrativo que, divi-dindo-os em indispensáveis ao logradouro comum e deste dispensáveis, atribui aos corpos administrativos, a par da administração e polícia quanto aos primeiros, amplos poderes de alienação sobre os últimos.» (Oliveira e Silva, PS, Diário da Assembleia da República, 1." série, n.° 80, de 26 de Abril de 1988, pp. 3223-4.)

C) Comentários ao regime actual 1 — Unidades de gestão bem dimensionadas

«Quando da aplicação, [...] do Decreto-Lei n.° 39/76, chegaram a estar em funcionamento uns 600 concelhos directivos [...]. Destes, 83 % na modalidade 'co-gestão com o Estado', representado pelos serviços florestais, por intermédio dos quais o Estado investiu, desde 1939, grandes somas na criação de um conjunto muito valioso de patrimónios vivos e de vias de comunicação (a célebre rede de estradas e caminhos florestais tão útil às populações dos povoados ermos (...]

[...] A maior parte dos 420 000ha de baldios submetidos ao regime florestal encontra-se na modalidade 'co-gestão' entre compartes c Estado. [...] os baldios constituem unidades de gestão bem dimensionadas, não sendo raras

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unidades contínuas, ou praticamente contínuas, de 5000 ha a 10 000 ha, alcançando mesmo os 15 000 ha, encravadas como regra em zonas de minifúndio e de pequena propriedade.

Da nossa floresta de 3 milhões de hectares, o que os serviços florestais do Estado administram para além dos escassíssimos 47 000 ha das chamadas inatas nacionais e de algumas dezenas de milhares de hectares de áreas florestais (fundamentalmente montados) na zona de intervenção da reforma agrária, são cerca de 300 000 ha de matas baldias em regime de co-gestão com os compartes, por livre decisão das respectivas assembleias.

[...] em França, por exemplo, o Office National des Forêts administra cerca de 4 milhões de hectares dos 11 milhões da sua área ílorestíd total, sendo boa parte desses 4 milhões exactamente constituída por florestas comunais. Como Portugal é o país da Europa em que os serviços florestais estatais administram, a grande distância, a menor percentagem da sua área florestal global.» (Azevedo Gomes, PS, Diário cia AssenMeia da República, i: série, n.° 88, de 2 de Julho de 1986, p. 3390.)

2 — Dificuldades na utilização comunitária dos baldios

«A fuição e gestão comunitária dos baldios é u/na tradição secular consagrada no direito consuetudinário e no direito positivo português que aparece posta em causa a partir da década de 30, nomeadamente quando o Governo estabelece, através do Decreto-Lei n." 27 707, o princípio da reserva de baldios para eleitos de colonização, submete outros ao regime florestal e introduz a noção de baldios dispensáveis ao logradouro comum, ao aprovar o Código Administrativo do Prof. Marcelo Caetano.

[...]

[...] em Janeiro de 1976 [...] o princípio da gestão comunitária dos baldios e se criavam os instrumentos jurídicos necessários à sua entrega às populações que deles tinham sido desapossados, mais não se fez do que [...] restabelecer o regime de fruição e gestão comunitária dos terrenos baldios, reatando uma tradição interrompida pelo regime fascista, e criar as bases da devolução dos bens comunitários às populações.

Princípio que pouco depois a Constituição da República consagraria.

O retomo às fonnas comunitárias de utilização dos baldios não se tem feito sem dificuldades, é certo. Mas essas dificuldades radicam essencialmente nos obstáculos burocráticos que lhe são levantados, no desinteresse dos serviços oficiais e nas campanhas que contra ela têm sido desenvolvidas.

(...] cerca de meio milhar as assembleias de compartes que sob uma ou outra das duas formas de gestão previstas no Decreto-Lei n.° 39/76 se encontram em funcionamento.» (Lopes Cardoso, PS, Diário da Assembleia da República, 1." série, n.° 116, de 31 de Maio de 1984, p. 4904.)

3 — Os projectos de florestação dos baldios

«[...] O Decreto-Lei n." 39/76, de 19 de Janeiro, viria a estabelecer, como aliás o reconhece o próprio parecer da Procuradoria-Geral da República:

1) [...] são terrenos comunitariamente usados e fruídos por moradores [...];

2) [...] estão fora do comércio jurídico, são inalienáveis e imprescritíveis;

3) [...] são adminisuados exclusivamente pelos compartes ou em regime de associação [...];

4) [...] incumbe apoiar e promover a actividade de esclarecimento [...] dar apoio na gestão das malas e produção.

[...] a Constituição da República viria a precisar a natureza jurídica dos baldios ao incluí-los no sector público de propriedade dos meios de produção, como bens comunitários com posse útil e gestão das comunidades locais.

[...] muitos desses interesses serem estrangeiros e decorrentes da filosofia subjacente aos projectos de florestação do Banco Mundial e das Celuloses.

[...] dificuldades de toda a ordem, grande parte delas levantadas pelos próprios serviços oficiais, [...] dentro dos próprios serviços oficiais chegou-se ao ponto de serem dadas insUuções no sentido de os Decretos-Leis n.08 39/76 e 40/76 não deverem ser aplicados e de os Conselhos Directivos dos Baldios serem ignorados ou preteridos em relação às autarquias. Passaram, ilegalmente, a exigir a homologação de segundos mandatos dos CDB. Procederam ao congelamento indiscriminado das contas bancárias dos CDB e das receitas dos baldios. Têm efectuado cortes, vendas de madeira e leilões de resina sem conhecimento prévio dos CDB e dos compartes.

[...] por parte das autarquias, constantes tentativas, muitas delas concretizadas, de apropriação das receitas dos baldios, de cedência, de arrendamento ou venda de parte ou do todo dos baldios.

É que não é possível constitucionalmente confundir comunidades locais com autarquias locais, posto que estas estão claramente identificadas nos artigos 237.° e seguintes como pessoas colectivas territoriais [...] a referida destrinça estar claramente feita na Constituição, designadamente no artigo 65.°, n.os 2, alínea b), e 4, no artigo 94.°, n." 2, e no artigo 89.°, n.° 2, alíneas a) e c).

[...] no Conselho Nacional do Plano [...] em representação das comunidades locais, está o Conselho Nacional dos Baldios.

Entrou-se assún numa fase de continuado desgaste dos povos dos baldios e dos seus conselhos directivos, sujeitando-os à erosão provocada por dificuldades de toda a ordem, grande parte delas levantadas pelos próprios serviços oficiais, cuja actuação acabou por pôr em causa a própria autoridade democrática do Estado.

Com efeito, dentro dos próprios serviços oficiais chegou-se ao ponto de serem dadas instruções no sentido de os Decretos-Leis n.os 39/76 e 40/76 não deverem ser aplicados e de os conselhos directivos dos baldios serem ignorados ou preteridos em relação às autarquias. Passaram, ilegalmente, a exigir a homologação de segundos mandatos dos conselhos directivos dos baldios; procederam ao congelamento indiscriminado de contas bancárias e das receitas dos baldios; têm efectuado cortes, vendas de madeira e leilões de resina sem conhecimento prévio desses conselhos e autorização dos compartes.

A todas estas acções acrescem, por parte das autarquias [...], constantes tentativas, muitas delas concretizadas, de apropriação das receitas dos baldios, de cedência de arrendamento ou venda de parte ou do todo dos baldios.

[...] pela primeira vez populações desde sempre esquecidas e marginalizadas pelo poder central, e mesmo pelas autarquias, terem tido a possibilidade de abrir caminhos e estradões, terem assegurado o fornecimento de água para consumo doméstico e agrícola, terem dotado as comunidades de equipamentos sociais e culturais como, por

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exemplo, fontanários, lavadouros, centros sociais, postos de saúde, viaturas de bombeiros, etc, e tudo isto nas condições de boicote e erosão já denunciadas.

Tão pouco poderiam refutar a falta de apoio dos serviços oficiais, que, aliás, até na sua representação, aquando da gestão mista, a remeteu, única e exclusivamente, para os guardas florestais.

Do mesmo modo, não poderiam deixar de reconhecer que, na esmagadora maioria dos casos, os problemas que se têm levantado em matéria de florestação são resultantes dos próprios defeitos de uma política orientada para a florestação industrial, que inviabiliza o seu uso múltiplo e compromete a economia das populações.

Sem possibilidades de prova de generalização, seriam ainda os alegados casos de conflito entre populações. Nos tribunais não há expressão dos mesmos. O mesmo já não se passa quanto a processos judiciais interpostos pelos conselhos directivos dos baldios contra autarquias e particulares, por apropriação ou uso indevido dos terrenos baldios, sendo sintomático que a esmagadora maioria dos casos tenha sido decidido a favor dos conselhos directivos.» (Rogério de Brito, PCP, Diário da Assembleia da República, l.' série, n.u 116, de 31 de Maio de 1984, pp. 4905-7.)

4 — O incumprimento dus actuais leis

«[...] não têm sido cumpridos os Decretos-Leis n.08 39/76 e 40/76 [..,]

[...] desde o congelamento de contas bancárias à falta de apoio jurídico e técnico, ao não reconhecimento de conselhos direcüvos de baldios e de comissões de compartes, tudo tem sido feito para que os Decretos-Leis n.05 39/76 e 40/76 não tenham sido devidamente aplicados.» (João Abrantes, PCP, Diário da Assembleia da República, 1." série, n.° 116, de 1 de Maio de 1984, pp. 4886-7.)

S — Os conselhos directivos furam uma solução razoável

«[...] Nada nos move contra os conselhos directivos. Foi uma solução razoável no momento político em que surgiram, dada a não existência de um poder local autêntico e democrático. A experiência, os tempos, se encarregaram de levar os povos a, sucessivamente, fazerem coincidir os conselhos directivos de baldios com os órgãos da administração local, e porque entre o que se dispõe na lei sobre baldios, na existente, se é que existe, se diz que os conselhos directivos não podem ser reeleitos, norma que não se aplica nas eleições autárquicas, logo, inviabilizar-se-ia pof &s,a v'3-aquilo que, como dissemos, é vontade crescente dos utentes, dos vizinhos, dos compartes.

Por outro lado, hoje, se a lei está em vigor, o plano de actividades aprovado pela assembleia de compartes necessita ser homologado pelo governo civil e pelos serviços regionais do Ministério da Agricultura, Pescas e Alimeniação; ora, a independência dos órgãos autárquicos, a sua tão próxima vivência junto dos povos, possibilita uma muito maior operacionalidade e capacidade de adequar a sua acção aos interesses das comunidades locais.

[...]

[...] Em qualquer freguesia rural os elementos coincidem exactamente com os compartes e têm vindo a pôr sucessivamente nas mãos da junta de freguesia a administração desses bens públicos [...]

Hoje verificamos que já existem muitas juntas de freguesia a administrar os baldios, mas a lei dos baldios, na sua regulamentação, impede que haja uma reeleição

desses órgãos, isto é, se durante o mandato a junta de freguesia exerce a administração dos baldios, no seguinte ela está impedida de o fazer. [...]

[...] nesles sete anos houve um decréscimo acentuado do número de conselhos directivos que delegaram essas funções nas respectivas juntas de freguesia ao ponto de concelhos que tinham 13 baldios há 5 anos atrás hoje não terem nenhum.

Em muitas freguesias fizeram-se já coincidir ajunta de freguesia com o conselho directivo dos baldios, no sentido de colocar os baldios sob a administração da junta de freguesia, só que tal situação não resolveu totalmente os problemas existentes, e isto porque:

Continuaram a depender da aprovação do governo civil e os serviços regionais do Ministério da Agricultura as deliberações da assembleia de compartes que aprovam o plano anual de aplicação das respectivas receitas;

Os elementos do conselho directivo não podem ser reeleitos, logo, caso não sejam membros da junta de freguesia por mais que um mandato, mesmo que se verifique interesse da assembleia de compartes, não poderão exercer em simultâneo tais funções;

A escrituração dos movimentos da junta de freguesia terá de fazer-se em separado dos livros da assembleia de compartes, quando tudo se refere à própria freguesia e aos seus bens.

[...]

[...] dotar as comunidades locais com a riqueza que efectivamente lhes pertence, desbloqueando, ao mesmo tempo, avultadas verbas que se encontram calivas por não existirem órgãos legalmente constituídos que possam levantar e movimentar tais importâncias.

[...] tornar aproveitados terrenos, quantas vezes impróprios alé para sementeiras de pinhal, e que, pela sua localização dentro das povoações, seriam extremamente úteis para urbanizações (quantas pessoas, quantos cidadãos existem sem um palmo de terra e pretendem construir a sua pequena habitação, e, sem meios para comprar um terreno sujeito aos condicionalismos do mercado normal, não conseguem materializar um sonho de qualquer homem livre — ter a sua casa) [...]. Trabalhos de simples alinhamentos e até aproveitamentos para instalação de equipamentos sociais colectivos, de que todas as nossas aldeias estão tão carenciadas, como jardins infantis, lares de idosos, ginásios, escolas, campos desportivos, piscinas [•••].

[.-]»

6 — O regime jurídico actual é inadequado

«[...] o regime instituído pelos Decretos-Leis n.0* 39/76 e 40/76 não responde, actualmente, às exigências de um adequado aproveitamento dos baldios.

Em 1938, com o plano de povoamento florestal, o Estado apropriou-se dos baldios com aptidão não agrícola com mais de 500 ha, submetendo-os a regime florestal.

[...] Decorridos 12 anos, constata-se que esta filosofia de administração, embora verosímil pela ausência na altura de um poder local democrálico representativo das comunidades locais, era o reflexo da conjuntura política de então, que pretendia fomentar estas organizações populares de base (tais como as comissões de moradores),

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o que se revelou ineficaz.» (Carlos Duarte, PSD, Diário da Assembleia da República, 1." série, n.° 80, de 26 de Abril de 1988, p. 3228.)

7 — Os factores do malogro da uctuul legislação

«[...] estas providências, em grande número de casos, não tiveram o condüo de reconduzir o baldio ao seu papel tradicional. [...]

Entre os principais factores desse malogro [...] a falta de vontade política das próprias autarquias e dos serviços oficiais, que não se mostraram receptivos a implementar na esfera das suas competências o regime instituído por aquele diploma, quando não se dispuseram mesmo, deliberadamente, a bloqueá-lo, mediante a recusa injustificada a homologação de eleições dos conselhos directivos ou o congelamento de receitas avultadas, indispensáveis à prossecução das suas atribuições.

[...] a inércia das populações, o abandono de funções e a omissão de responsabilidades por parte de vários conselhos directivos, a ausência de mecanismos legais de controlo e de responsabilização, a par de causas mais gerais atinentes ao declínio da agricultura e consequente desertificação dos campos, ligadas, por seu turno, ao incremento da industrialização e da imigração, foram, indubitavelmente, outras causas geradoras da crise que mina o regime instituído por aqueles diplomas de Abril.

[...]

O que, sobretudo, imporut é conciliar as formas tradicionais de gestão comunitária dos baldios com os novos condicionamentos da agricultura, tendo em conta a previsível evolução desta, e com os objectivos de uma política de desenvolvimento [...]

Muitos baldios se (ornanun imprestáveis para qualquer destes fins e, apurada tal circunstância, urge destiná-los a outros aproveitamentos em nome da função social, que hoje se reclama de todos os sectores da propriedade, incluindo a privada.

[...] o terreno baldio sem aptidão agrícola ou silvo-pas-toril deverá destinar-se à instalação de infra-estruturas ou equipamentos sociais, urbanização ou a quaisquer outras formas de aproveitamento que dêem resposta às necessidades reais das populações.» (Oliveira e Silva, PS, Diário da Assembleia da República, 1." série, n.° 80, de 26 de Abril de 1988, p. 3224.)

«[...] a par da florestação, destinada à produção de material lenhoso, que tem sido o tipo de exploração predominante, impõe-se desenvolver nos baldios outras formas de aproveitamento, como a produção de madeiras de qualidade para mobiliário, o fomento da silvo-pastorícia, espécies cinegéticas e piscícolas, bem como a criação de espaços verdes, que, com a fauna selvagem, possam constituir áreas de lazer, de desporto e de turismo. E, paralelamente, importa adoptar providências que garantam a preservação desse importante patrimônio, cuidando da regularização do regime de águas, para protecção do solo contra a erosão, tomando medidas contra as práticas agrícola e pastoril depradalórias e contra o flagelo dos incêndios.

[...]

[...] agarrar a conjuntura extremamente favorável, que lhe permitirá durante uma década beneficiar de vultosos auxílios financeiros a fundo perdido provenientes da CEE para lançar as bases e concretizar uma política de fomento nos baldios, entendidos como pólos de criação de bens

múltiplos, que logre conciliar os interesses locais com o desenvolvimento regional e nacional.

Daí que se instituam projectos de utilização, a preparar por comissões regionais, com a participação dos compartes ou das entidades que os representem ou substituam, para os baldios de maior dimensão, constituídos em unidades de ordenamento, que viabilizem, com as demais utilizações, os objectivos de carácter socio-económico e ambiental que importe assegurar.» (Oliveira e Silva, PS, Diário da Assembleia da República, 1." série, n.° 80, de 26 de Abril de 1988, p. 3223.)

8 — 0 Decreto-Lel n." 40/76 é insuficiente

Fala da insuficiente regulamentação da matéria por parte do Decreto-Lei n.° 40/76.

D) Objectivos Inovadores

1 — A vocação florestal dos baldios

«Atendendo que grande parte dos baldios têm vocação florestal, a sua exploração deverá ser executada e orientada por princípios de um correcto ordenamento do território com utilização de uma flora adequada às condições edafo-climâticas do meio e com um maneiro tecnicamente aconselhável, de forma a retirar o máximo de rentabilidade destas terras, mas com a preocupação de evitar impactes ambientais negativos. Sabendo-se que neste sector a legislação existente era escassa e ultrapassada, é de realçar o conjunto de diplomas que o actual governo, há poucos dias, publicou e que responde a esta carência, implementando vários mecanismos de controlo e de coordenação do sector florestal. Saliento, entre outros, os seguintes: proibição do corte prematuro de povoamentos florestais; condicionamento da arborização com espécies florestais de rápido crescimento; manifesto de corte ou arranque de árvores; comissão coordenadora interministerial para o subsector florestal; ordenamento das áreas percorridas por incêndios florestais.» (Carlos Duarte, PSD, Diário da Asseml)leia da República, 1.° série, n.° 80, de 26 de Abril de 1988, p. 3229.)

2 — Os problemas mais prementes

«[...] os problemas mais prementes estão ligados à necessidade de definir e pôr em prática uma política geral para o aproveitamento desses bens, que, abrangendo uma área superior a 500 000 ha, podem ser objecto de acções planeadas, que não sirvam apenas para assegurar e potenciar a função económica e social que consuetudinariamente têm sido chamados a desempenhar, para crescente melhoria das condições de vida das respectivas populações.

Em muitas regiões do País é grande o número de casos de apropriação indevida de baldios, seja através de actos de ocupação de facto, seja através de actos e negócios jurídicos feridos de nulidade.

[...] muitos desses actos de apropriação só foram possíveis com a conivência das juntas de freguesia, acrescentando ainda a circunstância de as assembleias de compartes nem sempre se acharem constituídas ou dificilmente se poderem constituir.

[...] a necessidade de alargar a outras pessoas e entidades a legitimidade para intentar as competentes acções, com o objectivo de pôr cobro à delapidação dos baldios e à sua crescente apropriação privada [...]

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O alargamento proposto estende-se à câmara [...] e ao Ministério Público [...]

[...] a possibilidade de anulação dos actos ou negócios jurídicos de que se trata de poder ter lugar, também, através da chamada acção popular.» (Vilhena de Carvalho, ASDI, Dirírío da Assemiüeia da República, 1.° série, n.° 116, de 31 de Maio de 1984, p. 4896.)

3 — Regulitnivntuvüu direraiU- puni diferentes situações

«[...] pensamos serem perfeitamente distintos e deverem merecer regulamentação específica os casos em que se verifica o uso, a fruição e a gestão pelos utentes, assentes numa prática consuetudinária consolidada e, por outro, aqueles em que ela desapareceu ou nunca existiu e se toma necessário organizar a sua gestão por outra forma, ou seja, através dos órgãos autárquicos.» (Cunha e Sá, PS, declaração de voto, Diário da Assembleia da República, 1." série, n.° 116, de 31 de Maio de 1984, p. 4912.)

«[...] ninguém quer grande intervenção dos órgãos do Estado na administração autárquica. Os serviços florestais não podem sobrepor-se aos autarcas eleitos, mas não podemos esquecer o extraordinário valor que hoje representam os produtos florestais e o mais que podem representar. São detentores, os serviços florestais, de uma técnica de utilização e exploração. [...]

[...] vectores que não podem deixar de ser: o respeito pelos órgãos políticos de administração local e pelas suas competências; a defesa consequente das formas tradicionais da utilização dos baldios pelos utentes; a organização de formas que possam minorar o abandono a que têm sido votadas as populações utentes dos baldios; a defesa dos interesses gerais do Estado com vista â protecção dos solos e dos recursos hídricos e h protecção das espécies cinegéticas e piseícolas que o ordenamento florestal naturalmente há-de prever.» (António Costa, PS, Diário da Assembleia da República, 1." série, n.° 116, de 31 de Maio de 1984, p. 4910.)

Relatório da Comissão de Administração do Território, Poder Local e Ambiente sobre os projectos de lei n.os 109/VI (lei dos baldios) e 163/VI (lei sobre os baldios).

Os presentes projectos de lei apresentados pelo PS e pelo PSD, respectivamente, têm como objectivo a definição da posse, fruição e administração dos baldios.

Sem entrar na análise aprofundada dos projectos, eles são na generalidade idênticos, embora com diferenças de conteúdo em situações pontuais, que poderão ser compatibilizadas na especialidade.

Os projectos pretendem pôr termo a situações de indefinição e de degradação dos últimos anos, que nos Decretos--Leis n.ta 39/76 e 40/76 pretenderam corrigir sem o conseguirem, agravando em muitos casos ainda a situação que se verificava.

Os projectos de lei em apreço respeitam as normas constitucionais e regimentais, pelo que somos de parecer que os mesmos se encontram em condições de subir a Plenário para debate e votação na generalidade.

Palácio de São Dento, 1 de Julho de 1992. — O Relator, Luís Martins.

Relatório e parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias sobre o projecto de lei n.9132/VI (reformula o subsídio de integração dos jovens na vida activa).

1 — Da iniciativa do Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português, o projecto de lei n.° 132/VI reformula o subsídio de inserção dos jovens na vida activa.

2 — Este subsídio, previsto na Lei n.° 50/88, de 19 de Abril, institui, «no âmbito do regime não contributivo de segurança social, uma prestação pecuniária para os jovens à procura do primeiro emprego, designada por 'subsídio de inserção de jovens na vida activa'».

3 — A Lei n.° 50/88, de 19 de Abril, revogou, ao tempo, a Lei n.° 35/87, que previa um «subsídio social de desemprego aos jovens à procura do primeiro emprego» que, por sua vez, tinha revogado o Decreto-Lei n.° 156/87, de 31 de Março, sobre a mesma matéria.

4 — O projecto de lei n.° 132/VI em análise propõe-se, designadamente:

íí) Alargar substancialmente o âmbito pessoal de atribuição do subsídio;

b) Eliminar o lünile mínimo de 18 anos de idade para concessão do SIJVA, substituindo-o pela idade legal de acesso ao trabalho;

c) Alargar o conceito de «jovem à procura do primeiro emprego» também aos que, tendo frequentado um estágio profissional ou programa ocupacional, não tenham obtido colocação na empresa;

d) Eliminar a exigência de seis meses de inscrição em centro de emprego, bastando, para atribuição do subsídio, a simples inscrição;

e) Alargamento de concessão do subsídio aos jovens cujo rendimento familiar per capita não exceda 80 % do valor mais elevado do salário mínimo nacional;

f) Aumento do montante do subsídio para 70 % ou 80 % do valor mais elevado do salário mínimo nacional, conforme se trata, respectivamente, de jovens sem ou com pessoas a cargo;

g) Finalmente, o projecto de lei n.° 132/VI propõe 180 dias de intervalo entre o fim do período de concessão de um subsídio e o início de novo período em caso, claro esta, de subsistência de situação de procura de primeiro emprego.

5 — Todas estas alterações alargam o âmbito, incidência e montante do subsídio de inserção dos jovens na vida activa previsto na Lei n.° 50/88, de 19 de Abril, com as implicações orçamentais daí decorrentes.

6 — Daí que, no despacho que determina a lama à Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, o Sr. Presidente da Assembleia da República fundamenta a sua decisão «[...] pelas dúvidas acerca de compatibilidade do conteúdo dispositivo do presente projecto de lei com o n.u 2 do artigo 170." da Constituição da República Portuguesa».

7 — Recortado que fica, por despacho do Sr. Presidente da Assembleia da República, o âmbito do parecer desta Comissão, importa recordar o disposto no n.° 2 do artigo 170." da Constituição da República Portuguesa. .

Aí se dispõe que «os Deputados, os grupos parlamentares e as assembleias legislativas regionais não podem apresentar projectos de lei, propostas de lei ou propostas de alteração que envolvam, no ano económico em curso, aumento das despesas ou diminuição das reccilas do Estado previstas no Orçamento».

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8 — Tudo resulta em saber, a final, se o disposto no artigo 2.° do projecto de lei n." 132/VI, que dispões que «a presente lei entra em vigor na data da sua publicação, sem prejuízo do disposto no n." 2 do artigo 170.° da Constituição» constitui ou não violação da chamada «norma-travão».

9 — Tem esta Comissão mantido assinalável estabilidade de opinião quanto ao alcance do disposto no n.°2 do artigo 170." Fê-lo, aliás, recentemente, em parecer que recaiu sobre o projecto de lei n.° 30/V1, da autoria do Sr. Deputado Almeida Santos, e não veinos razões substanciais para alterar, a esle propósito, aquele entendimento.

10 — Sumariamente, do entendimento lixado nesta Comissão sobre o alcance do disposto no n.° 2 do artigo 170.° da Constituição da República Portuguesa, na síntese feliz do Sr. Deputado Almeida Santos, que aqui reproduzimos, decorre que «nem o projecto, à data da sua apresentação, nem a lei que lhe corresponde, à data da sua entrada em vigor, podem conter medida que aumente as despesas ou diminua as receitas do ano económico em curso em qualquer daquelas datas».

11—Ora, consolidado este entendimento, somos confrontados com a redacção do artigo 2." do projecto de lei n.° 127/VI, que é, no mínimo, infeliz.

12 — Com efeito, não vemos sentido cm consagrar que «a lei entre em vigor na data da sua publicação sem prejuízo do disposto no n." 2 do artigo 170." da Constituição».

13 — Atento o conteúdo do projecto de lei em apreço e supondo a sua aprovação na presente sessão legislativa, nos termos da norma recorrida, a lei aprovada entrava em vigor na data da sua publicação, mas só eram constitucionalmente exigíveis as prestações aí previstas no ano económico de 1993.

14 — Ou seja os destinatários potenciais da lei podendo, desde logo, invocá-la para obtenção de um apoio — só materializdvel em ternws financeiros — viam, também por força de lei, temporalmente deferido o efeito útil — e único — paia, pelo menos, o início da vigência da Lei do Orçamento de Estado para 1993.

15 — Se os absurdos não merecem consagração legislativa por boas c abundantes razões doutrinárias, nem assim ficam resolvidas todas as dúvidas que fundamentam o despacho de S. Ex." o Presidente da Assembleia da República.

16 — É que, a final, resta conhecer da concreta conformidade constitucional deste projecto de lei, designadamente do previsto no seu artigo 2." com o n."2 do artigo 170.° da Constituição da República Portuguesa.

17 — Ponderada esta questão, comparada a opinião repetidamente expressa pela Comissão sobre esta matéria, atentos os fundamentos formais e materiais que relevam na aferição da constitucionalidade questionada somos de parecer que o projecto de lei n.° 132/VI não respeita a norma do n.l> 2 do artigo 170." da Constituição da República Portuguesa.

É que, não esqueçamos, o n.° 2 do artigo 170." da Constituição da República Portuguesa impede a apresentação de projectos de lei que envolvam aumento de despesas no ano económico em curso.

18 — O projecto de lei n." 132/VI deu entrada na Mesa em 23 de Abril de 1992 quando estávamos já na pendência do actual ano económico e, aumentando as despesas, viola o disposto no n.ü2 do artigo 170." da Constituição da República Portuguesa mesmo que, artificialmente, invoque expressamente a sua conformidade com aquele normativo constitucional.

19 — É que do conteúdo útil do projecto resultam não só o aumento das prestações pecuniárias a que o Estado ficaria obrigado como lambem o alargamento do âmbito

de aplicação da lei actualmente em vigor, tudo contribuindo para um indesmentível, óbvio e não previsto aumento de despesa.

20 — Objeclar-se-á que o artigo 2.° do projecto de lei em apreço salvaguarda expressamente o disposto no n." 2 do artigo 170." da Consumição da República Portuguesa.

21 —Contrapomos com a substância do previsto no projecto de lei n.° 132/VI, bem como com o facto de, também expressamente, ficar consagrada a entrada em vigor no dia da publicação da lei dele resultante.

22 — Ou seja, entraria em vigor uma lei que, constitucionalmente, não pode vigorar por ofensa do n.° 2 do artigo 170." da Constituição da República Portuguesa.

23 — Tudo visto, somos de parecer que são fundadas as dúvidas suscitadas pelo despacho de S. Ex.m o Presidente da Assembleia da República.

Palácio de São Bento, 1 de Julho de 1992. — O Presidente da Comissão, Guilherme Silva. — O Deputado Relator, Miguel Macedo.

PROJECTO DE LEI N.9 182/VI

REELEVAÇÃ0 DA POVOAÇÃO DE VILAR DE MAÇADA À CATEGORIA DE VILA

Vilar de Maçada é a sede da freguesia com o mesmo nome, no concelho de Alijó, distrito de Vila Real.

História

Vilar de Maçada é povoação muito antiga e importante desde tempos remotos. Recebeu foral de D. Alonso III no dia 2 de Maio de 1253. Segundo Alexandre Herculano, na sua História de Portugal, D. Sancho I, estando em Mirandela, deu o reguengo de Vilar de Maçada a Garcia Mendez, em Julho de 1198. Nesta data, portanto, Vilar de Maçada não só existia como era reguengo, isto é, propriedade da coroa.

Vilar de Maçada é hoje das mais prósperas e importantes freguesias do concelho de Alijó, ao qual pertence desde 31 de Dezembro de 1853, data em que, por decreto, foi extinto o concelho de que foi sede, na condição de vila que foi até esta data.

Para o seu desenvolvimento actual conuibuiu decisivamente o enorme desenvolvimento agrícola dos últimos 15 anos. Não é por acaso que Vilar de Maçada é das freguesias do Douro que mais vinha plantou ao abrigo da Lei n.° 43/80 (a quarta) e a primeira no concelho de Alijó, o que revela a diiiâmica empresarial da freguesia. Por outro lado, no sector do comércio, deu-se a abertura de grande número de estabelecimentos e a criação de pequenas indústrias, pelo que, mantendo o mesmo ritmo de trabalho e espírito de iniciativa, Vilar de Maçada desenvolve-se cada vez mais, lutando hoje pelo reconhecimento do lugar que sabe poder e dever ocupar.

Economia

A cultura da vinha é a base da economia desta região, tudo dependendo, em maior ou menor grau, quer do vinho fino, quer do vinho de consumo branco, de excepcional qualidade nesta zona. Dependendo Vilar de Maçada de uma economia agrícola de base, aqui

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proliferam, lambem, actividades de índole comercial, industrial e artesanal.

População

Vilar de Maçada consta no Censo de 1991 com 2187 habitantes e 1467 eleitores.

Agricultura

Vilar de Maçada situa-se naquela zona de transição do vinho generoso para o vinho de consumo. Aqui termina o xisto e se dá a transição para o granito. No que respeita a atribuição de benefício pela Casa do Douro, Vilar de Maçada é a 4." das 15 freguesias de Alijó.

Desta distribuição se pode avaliar o grau de importância que Vilar de Maçada assume no contexto económico deste concelho. Se se atentar ao que atrás já foi referido sobre as plantações de vinhas ao abrigo da Lei n.° 43/80, Vilar de Maçada produzirá, neste momento, cerca de 350 000 1 de vinho generoso. A produção vinícola de Vilar de Maçada rondará, nesta data, as 7000 pipas, das quais 2300 serão de generoso. É fácil concluir da importância económica que a agricultura tem para Vilar de Maçada, nomeadamente o sector vinícola. Deve referir-se, ainda, que Vilar de Maçada possui uma importante mancha florestal.

Comércio

São diversificadas as áreas comerciais hoje implantadas cm Vilar de Maçada. Vestuário, calçado, papelaria, mercearias, supermercados, cafés, electrodomésticos, artigos eléctricos, etc. São essencialmente jovens os proprietários destas empresas que asseguram praticamente tudo o que seja necessário.

A existência em Vilar de Maçada de cafés, restaurantes, salão de jogos, salão de cabeleireiro, é a prova do grande centro populacional e comercial que hoje esta localidade é.

Indústria

Numa região de forte incidência de vinho generoso e de vinhos brancos de grande categoria, são já duas as moderníssimas adegas insudadas por jovens agricultores em Vilar de Maçada, estando em execução os trabalhos para mais três, o que constitui uma boa parte da actividade industrial desta terra. Mas outras actividades industriais são também exploradas. Quatro lagares de azeite, cinco alambiques, três empresas de construção civil, três padarias onde se fabrica o célebre «uigo de Vilar de Maçada» e a broa de milho, esta ainda segundo os métodos tradicionais, duas pocilgas, uma carpintaria, uma fábrica de móveis, fazem parte do parque industrial de Vilar de Maçada.

Vilar de Maçada no plano sócio-económico, cultural e recreativo

Indústrias:

a) Serralharia de feno e alumínio....................... 1

b) Marcenaria......................................................... 1

c) Pocilgas............................................................. 2

d) Pichelaria........................................................... 1

e) Ferrador............................................................. 1

/) Panificação........................................................ 3

g) Construção civil................................................ 3

h) Táxis.................................................................. 4

/') Lagares de azeite.............................................. 4

;) Alambiques....................................................... 5

Oficinas:

a) Reparação de motociclos................................. 3

b) Reparação de automóveis................................ 3

c) Reparação de electrodomésticos...................... 3

d) Sapateiro............................................................ 1

Comércios:

á) Supennercado (o maior do concelho)............. 1

b) Mercearias......................................................... 5

c) Talho................................................................. 1

d) Frutarias............................................................ 3

e) Feirantes............................................................ 3

j) Alfaiataria.......................................................... 1

g) Pronto-a-vestir................................................... 1

h) Papelarias.......................................................... 3

i) Bazares.............................................................. 1

j) Ferragens........................................................... 1

/) Electrodomésticos............................................. 1

Hi) Sapataria............................................................ 1

ri) Malhas............................................................... 3

o) Cabeleireira....................................................... 1

p) Barbeiro............................................................. 1

q) Agência funerária............................................. 1

r) Armador de andores para procissões.............. 1

s) Ornamentações de festas.................................. 1

í) Electricistas....................................................... 3

u) Costureiras........................................................ 4

Serviços sociais:

a) Centro de saúde................................................ 1

b) Consultório médico privado............................. 1

c) Farmácia............................................................ 1

il) Igreja matriz de 1753....................................... 1

e) Salão Paroquial................................................. 1

f) Capelas.............................................................. 5

g) Agentes de seguros.......................................... 1

li) Posto TELECOM............................................. 1

0 Edifício dos correios........................................ 1

j) Junta de freguesia............................................. 1

/) Casa do Povo.................................................... 1

ni) Praça de quatro táxis....................................... 1

n) Parque infantil.................................................. 1

o) Campo de futebol............................................. 1

p) Infantário (50 crianças).................................... 1

q) Apoio domiciliário à terceira idade................ 1

r) Polivalente a construir em 1992 ..................... 1

s) Centro de dia para a terceira idade em construção 1

t) Cemitério........................................................... 1

Cultura e recreio:

a) Centro recreativo e cultural............................. 1

b) GADEC (futebol e teatro)............................... 1

c) Rancho infantil................................................. 1

d) Biblioteca da Casa do Povo............................ I

Ensino:

a) Escola pré-primária.......................................... 1

b) Infantário particular.......................................... 1

c) Escolas do ensino básico................................. 7

Hotelaria:

a) Snack-bares....................................................... 3

b) Restaurantes...................................................... 1

c) Turismo rural, em execução............................ 1

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Monumentos:

a) Castro de Vilar de Maçada e muralha;

b) Castro de Francelos e muralha;

c) Igreja matriz do século xvtn;

d) Capela de Borba:

e) Capela de Santa Bárbara;

f) Santuário do Senhor Jesus da Capelinha;

g) Capela de Fiães;

h) Casa do Infantário, brasonada, que pertenceu à família Pinto Pizarro Portocarrero;

t) Casa dos Pinto Pizarros, também brasonada, que pertenceu a Rodrigo de Almeida Carvalhais Pinto Pizarro, 1.° barão da Ribeira de Sabrosa, nascido e falecido em Vilar de Maçada em 30 de Março de 1788 e 8 de Abril de 1841, respectivamente. Foi presidente do Conselho do Reino, de 18 de Abril de 1838 a 16 de Novembro de 1839, tendo sido considerado um dos mais hábeis estadistas do seu tempo, na Europa;

j) Casa da Fonte, também brasonada, que pertenceu à família dos Pinto Pimentéis;

D Casa de Vinheiros, brasonada, que pertenceu também à família dos Pinto Pimentéis; m) Casa brasonada, que pertenceu à família Pinto Mesquita;

n) Fonte pública e lavadouros anexos antiquíssimo o) Quatro moinhos desactivados e um em funcionamento, ao longo da margem esquerda do rio Pinhão, numa extensão de cerca de 2 km; p) Praia fluvial na margem esquerda do rio Pinhão, junto à ponte de Parada e próximo aos viveiros de trutas.

Quintas circundantes. — As quintas de Favaios, Fornos, Porto, Cipreste, Rio, Braga, Costa, Marinha Moura, Ranginha, Fatinho, são as mais importantes. .

Transportes. — Vilar de Maçada é servida por três carreiras diárias entre Alijó-Vilar de Maçada-Vila Real e vice--versa.

Actividade religiosa. — Vilar de Maçada possui uma igreja, construída em 1753, ano das comemorações do 500.° aniversário do foral, templo de uma só nave, com altar-mor e quatro altares laterais de antiga talha dourada e tecto apainelado de madeira, valorizado com belas pinturas a óleo.

Existe ainda nesta localidade o Santuário de Santa Bárbara com enorme Capela de Santa Bárbara e duas mais pequenas, numa das quais se encontra o Senhor Jesus da Capelinha, imagem maravilhosa do Senhor Caído, padroeiro de Vilar de Maçada, com festa e romaria que lhes são dedicadas no 2.° domingo de Julho.

A propósito deste Santuário diz Pinho Leal no seu livro Portugal Antigo e Moderno:

É este Santuário um dos pontos mais vistosos da Província de Trás-os-Montes. Dali se avistam vinte e quatro freguesias de Trás-os-Montes e grande extensão da Província da Beira Alta.

Conclusão

A elevação de Vilar de Maçada à categoria de vila é uma questão do mais elementar sentido de justiça. A sua história que se perde na memória dos tempos é brilhante ftvtv crescimento económico, na criação de infra-estruturas e no desenvolvimento cultural desta lindíssima terra.

A agricultura modernizada, fruto do espírito empreendedor dos jovens agricultores que aqui se têm instalado, o comércio inserido no contexto específico que o rodeia, a tradição artesanal, de que são belos exemplos o moinho na margem do Pinhão, o ferrador c o fabrico de pão de milho, encaram o futuro com optimismo.

A indústria, com alguns empreendimentos, procura adaptar-se às últimas inovações tecnológicas e novas técnicas de gestão, com a certeza de colher, no futuro, os benefícios do investimento agora feito.

A cultura, através do teatro, rancho infantil e da biblioteca agora instalada na Casa do Povo, vivifica-se ano após ano, transmilindo-se de geração em geração.

As infra-estruturas, como a luz, saneamento básico, água ao domicílio a 100 %, os arruamentos melhores do concelho, com uma artéria principal ao longo de 1500 m, há já muito que foram criadas.

Pelo exposto resulta que a povoação de Vilar de Maçada reúne os requisitos exigidos pela Lei n.° 11/82, de 2 de Junho, para a reelevação à categoria de vila.

Nestes termos, ao abrigo das normas constitucionais e regimentais aplicáveis, os Deputados abaixo assinados, do Grupo Parlamentar do Partido Socialista, apresentam o seguinte projecto de lei:

Artigo único. A povoação de Vilar de Maçada, no concelho de Alijó, distrito de Vila Real, é reelevada à categoria de vila.

Assembleia da República, 25 de Junho de 1992. — Os Deputados do PS: José Sócrates — António Martinho — Eurico Figueiredo.

PROJECTO DE LEI N.2 183/VI

CRIAÇÃO DA FREGUESIA DE VILA VERDE NO CONCELHO DE SOA

O povo de Vila Verde tem, desde há 25 anos, vindo a tentar criar a sua freguesia.

Foram 25 anos de dificuldades, mas felizmente acompanhados de um crescimento que hoje toma imparável a sua concretização.

Hoje, Vila Verde conta com uma economia de progresso. Perde-se no tempo a tradição de as gentes da terra se dedicarem à comercialização e curtume de peles de ovino e caprino.

São por isso chamadas «samarreiros», o que muito as honra.

• Há um pregão que hoje faz parte das suas memórias, que parece ser o único verdadeiramente original nesta região, que é: «Há peles que vendem».

Era assim que desde tempos remotos os rapazes iam de terra em terra à procura de peles para negociar.

Vila Verde é, da freguesia de Tourais, a povoação com maior número de eleitores (516 num total de 1653) e também com o maior número de habitantes e de fogos.

É a única freguesia com desenvolvimento económico de vulto.

No presente, Vila Verde é uma povoação muito interessante e com boas grandes possibilidades futuras, devido ao dinamismo das suas gentes.

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A lista que se segue dá uma ideia do que a povoação

é nos diversos aspectos. Nos campos.

Das comunicações e transportes:

Táxis;

Carreira irregular de autocarros; Rede de distribuiçáo de energia eléctrica; Rede telefónica com telefones, telexes e telefaxes;

Distribuiçáo diária do correio.

Da cultura e desporto:

Uma escola pré-primária; Três escolas primárias; Uma Telescola;

Dois centros culturais e desportivos; Um campo de jogos.

Da beneficência:

Beneficência Vilaverdense, Newark, USA.

Religioso: Capela;

Irmandade de Santo António;

Cemitério;

Duas festas anuais.

Da saúde:

Extensão de saúde em instalações para o efeito; Rede de abastecimento de águas domiciliárias; Recolha de lixo.

Perspectivas a curto prazo: Económicas:

Um polo industrial;

Uma rede de saneamento de efluentes industriais c urbanos no valor de 100 000 contos;

Uma nova fábrica de curtumes de peles para substituir parcialmente as do Norte do País;

Três fábricas de curtumes;

Uma exploração agro-pecuária;

Três empresas de construção civil;

Três supermercados;

Quatro cafés;

Agência de seguros;

Correspondentes bancários;

Empresários de serviços;

Vários rebanhos de ovelhas para Queijo da Serra.

Religiosas:

Uma igreja. De saúde:

Ampliação do posto médico.

Político-administrativas: 516 eleitores;

Uma assembleia de voto própria; Instalações novas para a futura junta de freguesia.

DemogrâTicas e habitacionais:

Cerca de 1000 habitantes; 264 fogos.

Com a criação da nova freguesia de Vila Verde não se põem em causa valores culturais, históricos ou económicos da freguesia de Tourais.

Nestes termos, o Deputado abaixo assinado, do Partido Socialista, apresenta à Assembleia da República o seguinte projecto de lei:

Artigo 1:° É criada no concelho de Seia a freguesia de Vila Verde.

Art. 2.° Os limites da freguesia de Vila Verde, conforme representação cartográfica anexa, são:

A norte faz fronteira com a freguesia de Paranhos, cuja divisão começa na estrada de Vila Verde, no lugar do Termo, seguindo uma linha até à ribeira das Corgas em direcção à sua nascente, até encontrar, a 50 m da estrada de Vila Verde, uma linha de água vinda das Alecrieiras, seguindo esta até ao caminho da Cantina;

A nascente faz fronteira com a freguesia de Tourais, através do caminho da Cantina, atravessando a estrada de Vila Verde, seguindo o caminho em frente, passando pela Mata da Misericórdia segue o caminho que passa no Penedo do Escorregadio, seguindo a um cruzamento nas imediações do ex--campo de futebol do Pereiro, que é circundado até à estrada velha. Segue esta durante 900 m até à Mata dos Bicos. Aqui segue em linha recta em direcção norte-sul, durante cerca de 575 m, até encontrar o caminho situado a norte dos baldios do Pereiro;

A sul segue este caminho até ao rio Seia, seguindo este até ao ponto em que ele entra no concelho de Oliveira do Hospital;

A poente com o concelho de Oliveira de Hospital, na extensão de 2300 m.

Art. 3.°— 1 — A comissão instaladora da nova freguesia será constituída nos termos e no prazo previstos no artigo 10." da Lei n.° 11/82, de 2 de Junho.

2 — Para efeitos do disposto no número anterior, a Assembleia Municipal de Seia nomeará uma comissão instaladora constituída por

a) Um membro da Assembleia Municipal de Seia;

b) Um membro da Câmara Municipal de Seia;

c) Um membro da Assembleia de Freguesia de Tourais;

d) Um membro da Junta de Freguesia de Tourais;

e) Cinco cidadãos eleitores da área da nova freguesia de Vila Verde.

Ari. 4.° A comissão instaladora exercerá as suas funções até â tomada de posse dos órgãos autárquicos da nova freguesia.

Art. 5.° As eleições para a Assembleia da nova freguesia realizar-sc-ão no prazo de 90 dias após a publicação da presente lei.

Assembleia da República, 30 de Junho de 1992. — O Deputado do PS, EduarJo Brito.

Nota.— O mapa referido no artigo 2." será publicado oportunamente.

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PROJECTO DE LEI N.« 184/VI

CRIAÇÃO DA FREGUESIA DE SEREM

Há já alguns anos que a população de Serem e lugares circunvizinhos têm vindo a exteriorizar a veemente vontade de ver criada a freguesia de Serem.

A nova freguesia a criar possui todos os requisitos constantes nos aiügos 6.° e 7° da Lei n.° ll/o2. Por outro lado, a criação da freguesia de Serem não colide com os limites do concelho de Águeda, e a freguesia de Macinhata do Vouga continuará a dispor dos meios indispensáveis ao seu desenvolvimento social e económico.

Nestes termos, os Deputados abaixo assinados, do Partido Social-Democrata, apresentam à Assembleia da República o seguinte projecto de lei:

Artigo 1." É criada, no concelho de Águeda, a freguesia de Serem.

Art. 2.° Os limites da nova freguesia de Serem, conforme representação prática anexa, são:

A norte: freguesia de Vale Maior, do concelho de

Albergaria:a-Velha; A sul: rio Vouga e freguesia de Lamas do Vouga,

do concelho de Águeda; A nascente: rio Vouga e freguesia de Macinhata do

Vouga, do concelho de Águeda; A poente: freguesia de Alquerubim, do concelho de

Albergaria-a-Velha.

A freguesia de Serem, a consumir, terá uma área de 5km2, a demarcar da freguesia de Macinhata do Vouga, do concelho de Águeda, e ficará delimitada a sul e nascente pelo rio Vouga e a norte e poente pelo concelho de Albcrgaria-a- Velha.

A limitação a nordeste, assinalada na representação cartográfica com as letras A (norte) e B (sul), situa-se a

norte da localidade de Cavada Nova, sendo a delimitação concretizada pelo denominado «Vale do Inferno» desde o pontão da IPS, no ponto em que cruza a estrada n.° 1-11 (Cavada Nova-Semada do Vouga). O ponto designado por A corresponde ao futuro limite das freguesias de Vale Maior, Macinhata do Vouga e Serem, situando-se o ponto B na margem norte do rio Vouga e a poente da freguesia de Macinhata do Vouga.

Art. 3.°— 1 —A comissão instaladora da nova freguesia será constituída nos termos e no prazo previstos no artigo 10.° da Lei n.° 11/82, de 2 de Junho.

2 — Para efeito do disposto no número anterior, a Assembleia Municipal de Águeda nomeará uma comissão instaladora assim constituída:

a) Um membro da Assembleia Municipal de Águeda;

b) Um membro da Câmara Municipal de Águeda;

c) Um membro da Assembleia de Freguesia de Macinhata do Vouga;

d) Um membro da Junta de Freguesia de Macinhata do Vouga;

e) Cinco cidadãos eleitores da área da nova freguesia de Serem.

Art. 4° A comissão instaladora exercerá as suas funções até à tomada de posse dos órgãos autárquicos da nova freguesia.

Art. S.° As eleições para os órgãos autárquicos da nova freguesia realizar-se-ão no prazo de 90 dias, após a publicação da presente lei.

Assembleia da República, 25 de Fevereiro de 1992. — Os Deputados do PSD: José Júlio Ribeiro — Olinto Ravara — Manuel Baptista Cardoso.

"VER DIÁRIO ORIGINAL"

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PROJECTO DE LEI N.2 185/VI

LEI DAS ASSOCIAÇÕES DE DEFESA DO AMBIENTE

Nota justificativa

O presente projecto de lei tem por objectivo rever a Lei n.° 10/87, de 4 de Abril (lei das associações de defesa do ambiente).

Esta revisão vai no sentido de adequar a lei à realidade associativa nacional. Assim, reduz-se o número de associados para 1000, 500 e 100, relativamente às associações de defesa do ambiente de âmbito nacional, regional ou local.

Por outro lado, articula-se o projecto de lei com os diplomas publicados no domínio do ordenamento do território e do planeamento urbanístico (v. Decreto-Lei n.° 69/90, de 2 de Março).

Acresce ainda que este projecto de lei remete para os importantes meios administrativos de defesa, agora consagrados no artigo 53.° do Código de Procedimento Administrativo, aprovado pelo Decreto-Lei n.° 442/91, de 15 de Novembro.

Estabelece, pela primeira vez, a possibilidade de serem celebrados contratos-programa de natureza sectorial ou plurisectorial no âmbito da cooperação lécnico-financeira entre as associações de defesa do ambiente e a adminstração central, regional e local, associações de municípios e empresas.

Este projecto de lei estabelece, de forma inovadora, o regime específico dos dirigentes das associações de defesa do ambiente, que, assim, passam a dispor de um regime laboral específico com vista a permitir o exercício das suas funções.

Outro aspecto que importa salientar, pela importância que a sua prática poderá implicar nas acções de promoção da defesa do ambiente e no apoio às associações, consiste na consagração de uma forma paradigmática do Mecenato a favor daquelas actividades e ainda nas acções de defesa do património natural e construído, da conservação da natureza e promoção da qualidade de vida.

Assim, ao abrigo das disposições regimentais e constitucionais aplicáveis, os Deputados do Partido Social--Democrata abaixo assinados apresentam o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.°

Âmbito da lei

A presente lei define os direitos de participação e de intervenção das associações de defesa do ambiente junto da administração central, regional e local com vista à promoção do direito a um ambiente de vida humano, sadio e ecologicamente equilibrado.

Artigo 2."

Associações de defesa do ambiente

1 — Para os efeitos da presente lei, entende-se por associações de defesa do ambiente as associações dotadas de personalidade jurídica constituídas nos termos da lei geral, que não tenham por fun o lucro económico dos seus associados, e que sejam constituídas exclusivamente para defesa do ambiente, do património natural e construído, conservação da natureza e promoção da qualidade de vida.

2 — As associações de defesa do ambiente são de âmbito nacional, regional ou local, consoante a área a que circunscrevem a sua acção e tenham, pelo menos, 1000, 500 e 100 associados, respectivamente.

Artigo 3.°

Associações com representatividade genérica

São associações de defesa do ambiente com representatividade genérica as de âmbito nacional e as de âmbito regional que para tal sejam equiparadas pelo Instituto Nacional do Ambiente.

Artigo 4.°

Direito de participação e intervenção

1 — As associações de defesa do ambiente, conforme o seu âmbito, têm o direito de participar e intervir na definição da política do ambiente e nas grandes linhas de orientação legislativa.

2 — As associações de defesa do ambiente com representatividade genérica gozam do estatuto de parceiro social para todos os efeitos legais, designadamente, e de representação directa ou indirecta no Conselho Económico--Social, no conselho directivo do Instituto Nacional do Ambiente e nos órgãos consultivos da Administração Pública que funcionem junto de entidades com competência em matérias que digam respeito ao ambiente, conservação da natureza património natural e construído e ordenamento do território, nos termos da lei.

3 — As associações de defesa do ambiente de âmbito regional e local têm direito à representação directa ou indirecta nos conselhos gerais das áreas protegidas existentes na área onde exerçam a sua acção, nos termos da lei.

Artigo 5.°

Direito de consulta

1 — As associações de defesa do ambiente, no âmbito da sua área de intervenção, gozam do direito de consulta e informação junto dos órgãos da administração central, regional e local, designadamente em relação a:

a) Planos regionais e municipais de ordenamento do território e instrumentos de planeamento urbanístico;

b) Planos integrados de desenvolvimento regional;

c) Planos e projectos de ordenamento ou fomento florestal ou agrícola, planos de ordenamento cinegético, planos de exploração cinegética e de albufeiras de águas públicas;

d) Estudos de impacte ambiental;

e) Criação e gestão de áreas protegidas;

J) Estudos e projectos de recuperação de áreas degradadas, recuperação de centros históricos, reabilitação e renovação urbana.

Artigo 6.°

Procedimentos administrativos graciosas

As associações de defesa do ambiente podem promover junto das entidades competentes todos os meios administrativos de defesa do ambiente, nos termos e para

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os efeitos do disposto na Lei das Bases do Ambiente e no artigo 53.° do Decreto-Lei n.° 442/91, de 15 de Novembro.

Artigo 7."

Direitos de prevenção e controlo

As associações de defesa do ambiente tem legitimidade para:

fl) Propor acções necessárias à prevenção ou ^ cessação de. actos ou omissões de entidades públicas ou privadas que constituam factor de degradação do ambiente;

b) Recorrer contenciosamente dos actos administrativos que violem as disposições legais que, nos lermos do artigo 66.° da Constituição da República, protegem o ambiente e a qualidade de vida;

c) Constituir-se, de acordo com o seu âmbito, assistente nos processos crime contra o ambiente e o equilíbrio ecológico previstos na Lei de Bases do Ambiente e demais legislação complementar;

d) Solicitar aos laboratórios oficiais a efectivação de análises sobre a composição ou o estado de quaisquer componentes do ambiente e de tornarem públicos os correspondentes resultados, nos termos a fixar por despacho do Ministro do Ambiente e Recursos Naturais.

• Artigo 8.°

Dever de colaboração

As. autarquias locais e as associações de defesa do ambiente da respectiva área deverão colaborar nos projectos e acções que respeitem à protecção e valorização da natureza e do ambiente.

Artigo 9.°

Contratos-programa

Podem ser celebrados contratos-programas de natureza sectorial ou plurisectorial no âmbito da cooperação técnica e financeira entre as associações de defesa do ambiente e administração central, regional e local, associações de municípios e empresas, no âmbito da protecção e valorização da natureza c do ambiente.

Artigo 10.°

Apoio às associações

1 — As associações de defesa do ambiente têm direito ao apoio do Estado, através da administração central, regional e local, para a prossecução dos seus fins, nomeadamente no exercício da sua actividade no domínio da informação e formação dos cidadãos.

2 — O Instituto Nacional do Ambiente prestará, nos termos da Lei de Bases do Ambiente, apoio técnico e financeiro às associações de defesa do ambiente que o solicitarem.

3 — As associações de defesa do ambiente que aufiram apoio financeiro obrigam-se a apresentar ao Instituto Nacional do Ambiente relatórios de actividades, balancetes e facturas justificativas das despesas efectuadas com

dinheiros públicos, bem como informar e facultar todos os elementos julgados necessários para o acompanhamento e controlo daquelas actividades.

4 — A irregularidade na aplicação dos apoios financeiros implica a suspensão dos mesmos para além da responsabilidade civil e criminal prevista na lei.

Artigo 11.°

Regime específico dos dirigentes dos associações de defesa do ambiente

1 — Sempre que um dirigente de uma associação de defesa do ambiente registada, nos lermos do artigo 17.°, seja designado para a representar num órgão consultivo legalmente constituído, disporá para o exercício daquelas funções de um regime laboral específico com vista a permitir aquela participação, nos termos definidos nos números seguintes.

2 — Sempre que a participação referida no número anterior represente uma diminuição de remuneração, o dirigente da associação de defesa do ambiente deverá receber do Estado uma compensação monetária, em termos a definir por decreto-lei.

3 — As faltas devidas ao efectivo exercício do direito de participação previsto no n.° 1 não devem ultrapassar nove dias de trabalho por ano, considerando-se justificadas para esse efeito.

4 — A autorização para faltar ao trabalho, para os efeitos previstos no n.° 1, não deve ser recusada, excepto no caso de essa ausência, justificadamente, prejudicar a actividade da própria empresa.

5 — Sem prejuízo de incompatibilidade insuprível com o plano de férias da entidade empregadora, as férias dos dirigentes associativos são marcadas de acordo com as necessidades que decorrerem da sua actividade.

Artigo 12.°

Acções de sensibilização e formação da juventude

O Ministério da Educação deve orientar os programas e os planos de estudo no sentido de sensibilizar e formar a juventude para a preservação do ambiente e do património natural e construído, recorrendo para o efeito à colaboração das associações de defesa do ambiente.

Artigo 13.°

Acções de divulgação

As entidades da administração central, regional e local, no âmbito das suas competências, em colaboração com as associações de defesa do ambiente, devem promover junto de toda a população, e em particular das crianças em idade pré-escolar, acções de sensibilização e de conhecimento da natureza.

Artigo 14.°

Direito de antena

As associações de defesa do ambiente, com representatividade genérica, têm direito a tempo de antena na rádio e na televisão, nos mesmos termos das associações profissionais.

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II SÉRIE - A — NÚMERO 48

Artigo 15.°

Isenção de cusías

As associações de defesa do ambiente estilo isentas de preparos, custas e imposto do selo devidos pela sua intervenção nos processos referidos nos artigos 6.° e 7."

Artigo 16.°

Oulras isenções

1 — As associações de defesa do ambiente beneficiam das seguintes isenções fiscais:

a) Imposto do selo;

b) Impostos alfandegários para os equipamentos e materiais indispensáveis ao integral desempenho das suas funções;

c) Impostos sobre equipamentos e materiais indispensáveis ao integral desempenho das suas funções;

d) Demais benefícios fiscais legalmente atribuídos às pessoas colectivas de utilidade pública.

2 — As associações de defesa do ambiente beneficiam das regalias previstas no artigo 10.° do Decreto-Lei n.° 460/77, de 7 de Novembro.

Artigo 17°

Donativos e abatimentos paru fiivs de protecção do ambiente

1 — São considerados custos ou perdas do exercício, nos lermos dos n.os 1 e 2 do artigo 39." do Decreto-Lei n.° 442-D/88, de 30 de Novembro, os donativos concedidos pelos contribuintes, se as entidades beneficiárias:

a) Forem associações de defesa do ambiente de âmbito nacional, regional e local;

b) Desenvolverem acções no âmbito de defesa do ambiente, do património natural e construído, da conservação da natureza e promoção da qualidade de vida, desde que assumam manifesto interesse, reconhecido por despacho conjunto dos Ministros das Finanças e do Ambiente e Recursos Naturais.

2 — Serão considerados como abatimentos, nos termos do disposto nos n.as" 2 e 3 do artigo 56.° do Decreto-Lei n.° 442-A/88, de 30 de Novembro, o valor dos donativos em dinheiro ou espécie concedidos às entidades beneficiárias que:

a) Forem associações de defesa do ambiente nacional, regional e local;

¿7) Desenvolverem acções no âmbito da defesa do ambiente, do património natural e construído, da conservação da natureza e promoção da qualidade de vida desde que assumam manifesto interesse, reconhecido por despacho conjunto dos Ministros das Finanças e do Ambiente e Recursos Naturais.

Artigo 18°

Registo

1 — O Instituto Nacional do Ambiente organizará um registo das associações que beneficiam das regalias e direitos atribuídos pela presente lei.

2 — Para efeitos do número anterior será remetida oficiosamente ao Instituto Nacional do Ambiente competente cópia dos actos de constituição e dos estatutos das associações de defesa do ambiente.

3 — A inscrição numa associação de uma pessoa colectiva corresponde apenas a um associado.

Lisboa 2 de Julho de 1992. — Os Deputados do PSD: Manuel Moreira — Mário Maciel — Silva Marques e mais cinco assinaturas.

PROJECTO DE DELIBERAÇÃO N.« 34/VI

CONSTITUIÇÃO DE UMA COMISSÃO EVENTUAL PARA A REVISÃO CONSTITUCIONAL

Tendo o Plenário da Assembleia da República, ao abrigo do disposto no n.°2 do artigo 284° da Constituição da República Portuguesa, assumido poderes de revisão constitucional, delibera-se, ao abrigo do disposto no artigo 40." do Regimento:

I — Que seja constituída uma Comissão Eventual para a Revisão Conslilu cional que aprecie os projectos de revisão constitucional que derem entrada até 24 de Julho de 1992, pelo prazo de ires meses. . 2 — Que a Comissão tenha a seguinte constituição:

PSD—13 representantes; PS — 7 representantes; PCP — 2 representantes; CDS — 1 representante; PEV — 1 representante; CDS — 1 representante.

Palácio de São Bento, 30 de Junho de 1992. — Os Deputados: Duarte Lima (PSD) — Carlos Coelho (PSD) — Jaime Gama (PS) — António Braga (PS).

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DIÁRIO

da Assembleia da República

Depósito legal n.º 8819/85

IMPRENSA NACIONAL-CASA DA MOEDA, E. P. AVISO

Por ordem superior e para constar, comunica--se que não serão aceites quaisquer originais destinados ao Diário da República desde que não tragam aposta a competente ordem de publicação, assinada e autenticada com selo branco.

1 — Preço de página para venda avulso, 6$ +IVA; preço por linha de anúncio, 178$ +IVA.

2 — Para os novos assinantes do Diário da Assembleia da República, o período da assinatura será compreendido de Janeiro a Dezembro de cada ano. Os números publicados em Novembro e Dezembro do ano anterior que completam a legislatura serão adquiridos ao preço de capa.

3 — Os prazos de reclamação de faltas do Diário da República para o continente e regiões autónomas e estrangeiro são, respectivamente, de 30 e 90 dias à data da sua publicação.

PREÇO DESTE NÚMERO 252$00 (IVA INCLUÍDO 5%)

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