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22 DE SETEMBRO DE 1994

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O que pontribui para fortalecer a participação popular e impedir ,o. divórcio entre os cidadãos e a vida política não é a manipulação do sistema eleitoral, conseguindo que certos partidos tenham mais Deputados com menos votos e outros menos Deputados mesmo com mais votos ou criando aberta ou encapotadamente novas formas de caciquismo, mas sim uma mudança de política tendo em vista a resposta aos problemas e anseios dos cidadãos, uma actividade dos partidos caracterizada por um completo respeito pelos seus compromissos, a defesa dos direitos fundamentais, incluindo os direitos dos trabalhadores, o estímulo e apoio às formas de participação e intervenção dos cidadãos e das suas organizações em todos os planos da Administração, o respeito pela opinião e pelo papel das organizações sociais.

3 — Como era previsível, os partidos de direita, PSD e CDS, querem aproveitar este processo de revisão constitucional para desferir golpes mortais nos múltiplos aspectos da Constituição em que está moldada pelos ideais da Revolução de Abril. Não só quanto ao sistema eleitoral, matéria em que, acompanhando o PS, apresentam propostas das quais resulta também a adulteração do princípio da representação proporcional, mas também noutros aspectos essenciais do sistema político, no campo dos direitos dos trabalhadores e dos direitos fundamentais, bem como no campo dos direitos sociais, económicos e culturais.

O projecto apresentado pelo PSD, agravando por vezes o conteúdo do próprio projecto do CDS, contém propostas que alteram radicalmente o sentido da Constituição, por tal forma que se todas essas propostas fossem aprovadas, já não estaríamos perante a Constituição com as características democráticas que marcam a sua especificidade, mas perante outra Constituição, consubstanciando uma profunda subversão e liquidação do regime democrático, tal como emergiu da Revolução de Abril.

O projecto do PSD visa atingir direitos fundamentais dos trabalhadores, desde logo o direito à greve e o direito à constituição de comissões de trabalhadores. Visa a desresponsabilização do Estado nas áreas sociais e culturais, designadamente no campo da saúde, da educação e da segurança social, abrindo caminho para transformar esses sectores em terrenos de chorudos negócios privados. Visa eliminar os traços e imposições da Constituição que apontam para uma organização económica democrática, querendo garantir o primado do grande capital e a defesa dos seus interesses. Visa reforçar o centralismo, acabando com a previsão constitucional das regiões administrativas, visa a limitação da autonomia do Ministério Público e do autogoverno da magistratura judicial com uma maior govemamentalização do regime. Visa a alteração do sistema eleitoral, com uma profunda distorção da representação proporcional, tendo em vista a obtenção de mais Deputados com menos votos.

Visa garantir a possibilidade de controlar e manipular a eleição do Presidente da República, com a admissão do voto dos emigrantes sem nenhuma garantia da sua genuinidade. Visa, em suma, a criação de um regime autoritário, centralizado, onde o grande capital possa reinar %&tr\ peias.

O projecto do PSD constitui a prova insofismável de que os objectivos últimos da sua política no Governo afrontam a Constituição da República e que ela é, por isso mesmo, um poderoso obstáculo aos seus projectos.

Igualmente o projecto do CDS se apresenta como um projecto de ruptura com o regime democrático configurado com a Revolução de Abril.

Expressando o seu reaccionarismo e saudosismo, o projecto do CDS visa eliminar a proibição de organizações que perfilhem a ideologia fascista, limitar o direito à greve, permitir o lock-out, limitar os direitos dos trabalhadores, eliminar o Serviço Nacional de Saúde, a progressiva gratuitidade de todos os graus de ensino e o direito à criação e fruição cultural, reescrever a Constituição económica, subordinando-a exclusivamente aos ditames do capital. Explicitando a sua vontade de ruptura constitucional, o projecto do CDS visa a criação de círculos uninominais na eleição para a Assembleia da República, afrontando descaradamente o limite material de revisão do sistema de representação proporcional.

4 — As mais importantes propostas de revisão constitucional do PS são elas próprias gravemente lesivas do regime democrático.

Numa lógica de alcançar o poder a todo o custo, o Partido Socialista não esconde que o seu objectivo principal é conseguir alterações ao sistema eleitoral para, através de operações de engenharia eleitoral e da mutilação do sistema proporcional, poder obter Deputados que, democraticamente, se a vontade do eleitorado tivesse a devida correspondência, deveriam caber a outros partidos. Por isso, o PS propõe uma grave entorse do sistema de representação proporcional. Por isso, com a introdução da moção de censura construtiva, o PS visa a protecção artificial dos governos,, particularmente dos minoritários. Por isso, com as alterações em matéria de eleição e formação da câmara municipal, o PS quer acabar com a eleição directa e com o pluralismo que hoje existe e que é uma garantia de transparência da actividade municipal e de maior aproximação entre os eleitos autárquicos e os munícipes eleitores.

O PS, sabe que, se efectivamente pretendesse que estas propostas fossem aprovadas, só o poderiam fazer através de entendimentos e da conjugação de votos com o PSD, partido maioritário na Assembleia e cujos votos pesam decisivamente para a formação da maioria de dois terços, necessária para fazer qualquer revisão constitucional. O entendimento com a direita em matéria constitucional conduziria inevitavelmente, como mostra o projecto do PSD, a gravíssimas mutilações do regime democrático. Recentes declarações do secretário-geral do PS mostram uma preocupante disponibilidade para entendimentos com o PSD. Aliás, confrontado com a possibilidade de fazer a «troca» da regionalização pelas alterações do regime eleitoral, o secretário-geral do PS não só não negou com clareza essa hipótese como desde logo deu um passo nesse sentido, abandonando a proposta de os círculos eleitorais serem de base regional. Procurando consensos a toda a pressa, tendo em vista concluir a revisão constitucional em curto espaço de tempo para a afastar o mais possível da data das eleições (e assim poder simular uma oposição ao PSD, acreditando que os eleitores esqueçam, entretanto, os compromissos firmados para a revisão), o PS vai ficando cada vez mais prisioneiro da vontade do PSD e mais disposto a compromissos lesivos da democracia e dos interesses do povo.

Ao decidir desempenhar o papel de impulsionador da revisão constitucional, o PS incorre na grave responsabilidade de contribuir para um processo de enorme gravidade.

Por isso e mais uma vez, o PCP afirma que é uma exigência democrática que o PS tome de imediato a única decisão possível se quer pôr termo a esta situação: abandonar e adiar este processo de revisão constitucional!