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II SÉRIE-A — NÚMERO 29

uma maternidade responsável», importando «resolver esse conflito na óptica da protecção de bens jurídico-consütucionalmente consagrados». Para tal, «sem pôr em causa o princípio fundamental do direito à vida, é possível encontrar formas de conciliação entre os valores a salvaguardar»;

Ainda não está esgotado, bem pelo contrário, o quadro legal decorrente da Lei n.° 6/84, de 11 de Maio, com as alterações introduzidas pelo Decreto-Lei n ° 48/95, de 15 de Março-, e pela Lei n.° 90/97, de 30 de Julho, que determina a exclusão da ilicitude no caso do aborto terapêutico, eugénico e ético;

É de difícil compreensão o facto de no país vizinho existir uma lei praticamente idêntica à portuguesa, de eficácia, todavia, superior.

E concluem:

Todos nos devemos sentir envergonhados enquanto for possível invocar como razão para a prática do aborto condições sócio-económicas. Uma sociedade justa, pela qual pugnamos, tem obrigação de produzir respostas eficazes para a eliminação dessas causas.

Propõem, em consequência, que ao regime hoje previsto no Código Penal seja aditada uma nova causa de exclusão da ilicitude da interrupção voluntária da gravidez, configurando um regime com as seguintes características:

Exclusão da ilicitude da interrupção voluntária da gravidez quando realizada nas primeiras 12 semanas devidamente autorizada por uma comissão de apoio à maternidade, a pedido da mulher e apenas por motivos sócio-económicos;

Tratando-se de menor, o pedido deve ser acompanhado de consentimento dos seus representantes legais;

Criação em cada sede de distrito ou região de uma comissão de apoio à maternidade, com competência para analisar os motivos invocados pela requerente da interrupção voluntária da gravidez, promover as condições adequadas à prossecução ou interrupção da gravidez e esclarecer a requerente da interrupção voluntária da gravidez quanto ao significado e consequências da interrupção voluntária da gravidez;

A Comissão deverá no prazo de cinco dias a contar da apresentação do requerimento autorizar ou indeferir fundamentadamente o pedido de interrupção voluntária da gravidez, com reclamação para o Ministro da Justiça e recurso contencioso urgente para o Supremo Tribunal Administrativo;

A Comissão é composta por cinco elementos, com formação nas seguintes áreas: um médico com título da especialidade em obstetrícia, um médico com o título de especialidade em psiquiatra, um psicólogo, um magistrado e um técnico de serviço social.

É conferido aos pedidos de interrupção voluntária da gravidez carácter urgente, gratuito e sigiloso.

2 — Algumas questões suscitadas pelos projectos em debate

2.1 —Aborto a pedido. — Em 1997, a Assembleia da República apreciou dois projectos que aventavam a consagração do aborto a pedido da mulher até à 12.° semana, segundo o chamado «método dos prazos» (projecto de lei n.° 177/VTJ) ou até à 12.° semana segundo o método das

indicações, com definição de uma «indicação social» formulada em termos latos (projecto de lei n.° 236/VTI).

O projecto de lei n.° 417/VTI reedita a opção anteriormente apresentada pelo PCP. Abrange quaisquer motivos, e a interrupção voluntária da gravidez não carece de invocação expressa de qualquer razão.

A redacção proposta para o n.° 3 do artigo 142." do Código Penal («Sempre que se trate de mulher toxicodependente, não é punível a interrupção da gravidez efectuada a seu pedido nas condições referidas no n.° 1, durante as primeiras 16 semanas de gravidez») suscita problemas não equacionados'no articulado (v. g., conceito de «mulher toxicodependente», regime de formação da vontade de pessoa afectada por toxicodependência).

Quanto ao projecto de lei do PS, ele surge reformulado por forma a instituir modalidades de informação e aconselhamento^ prévios à decisão de interromper a gravidez. O projecto de lei tem em conta a mais recente evolução do debate sobre o tema no ordenamento jurídico alemão, implicando uma estratégia de envolvimento activo do Estado na criação de estruturas que propiciem à mulher condições de escolha livre e informada, incentivando a responsabilidade cívica e a maternidade consciente.

Nenhum dos projectos de lei viu impugnada a. sua admissão com base em alegações de inconstitucionalidade.

No relatório aprovado pela Comissão, em 1997, observou-se a este propósito o que agora se reafirma:

As razões a favor e contra tal mudança lega) foram exaustivamente discutidas [...] e constituem ponto de divergência entre os parlamentares e a sociedade portuguesa.

Na interpretação do Supremo Tribunal dos EUA, expoente do chamado «modelo dos prazos», a autonomia pessoal da mulher deve prevalecer sobre a vida intra-uterina que não tenha ainda viabilidade autónoma.

No seu Acórdão de 25 de Fevereiro de 1975, e mais recentemente no acórdão de 28 de Maio de 1993, o Tribunal Constitucional alemão, célebre guardião do «modelo das indicações», entendeu que, nos termos constitucionais, recai sobre a mulher o dever de garantir o normal desenvolvimento do feto, merecedor de protecção jurídica como vida em projecto. Tal só não acontecerá excepcionalmente, em circunstâncias que justifiquem considerar-se excessivo e logo «inexigível» o cumprimento desse dever.

Ressalvadas as significativas diferenças de filosofia, as soluções fundadas num e noutro dos modelos podem diluir-se, sobretudo face a normas que construam «indicações sociais», segundo fórmulas de contornos amplos.

No caso português, desde 1994-1995, é relevante lembrar que as indicações eugénica e ética, nos seus contornos actuais, já são na substância «indicações sociais».

As complexas questões que as propostas agora apresentadas suscitam no plano constitucional nunca foram apreciadas pelo órgão supremo de fiscalização em Portugal (por, em sede parlamentar, terem sido sempre reprovadas inicia-uvas legislativas com tal objectivo) e não serão analisadas no presente parecer.

O relator poderia, sem dúvida, submeter nesta sede uma proposta de enquadramento das questões em apreço. Mas, segundo a orientação constante da Comissão, não tendo sido deduzido recurso contra a admissão dos projectos de lei n.os 177/VJJ e 236/VTJ por alegação de inconstitucionalidade, é no Plenário que tais questões podem vir a ser examinadas e nada poderia neste momento impedir o acesso a tal debate.

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