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5 DE FEVEREIRO DE 1998

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material e temporal de suporte para o agendamento do pretendido referendo».

Lê-se no referido despacho que, nos termos constitucionais e legais então aplicáveis — Constituição da República Portuguesa (versão de 1992), artigo )18.°,.n.° 2, e Lei n.° 45/91, de 3 de Agosto, artigo 4.°, n.° 1, «as convenções internacionais e os actos legislativos em processo de aprovação, mas ainda não definitivamente aprovados, podem constituir objecto de referendo» e «a admissão de propostas de referendo de iniciativa da Assembleia da República está temporal e materialmente condicionada pela existência de um processo legislativo em curso em sede parlamentan).

No'entanto, conclui o Sr. Presidente da Assembleia da República que, «não caducado o mesmo projecto com o fim da sessão legislativa, ele mantém-se potencialmente válido face à eventual expectativa de, finda a sessão legislativa, a iniciaüva de um projecto ou de uma proposta de lei de conteúdo idênúco aos projectos que foram rejeitados poder ser retomada». Acrescenta ainda que «a situação presente só impede que o referido projecto de resolução seja aprovado ou rejeitado sem que, à data, esteja preenchida de novo a condição de pender de processo legislativo de um projecto ou uma proposta de lei que convalide o mesmo projecto de resolução».

Tendo diferentes grupos parlamentares voltado, na presente sessão legislativa, a apresentar iniciativas idênticas às rejeitadas na sessão legislativa anterior com vista a introduzir alterações ao regime da interrupção voluntária da gravidez — projecto de lei n.c 451/VTJ, do PS, sobre a exclusão da ilicitude de casos de interrupção voluntária da gravidez, projecto de lei n.° 453/VII, do PS, sobre a interrupção voluntária da gravidez, e projecto de lei n.° 471/VII, PCP, sobre a interrupção voluntária da gravidez —, verifica-se estar preenchido o requisito de convalidação do projecto de resolução n.° 38/VTJ., do PSD.

Os autores do projecto de resolução apresentam, fundamentalmente, as seguintes razões para a sujeição de alterações ao regime jurídico do aborto a referendo:

1) Trata-se de uma matéria extremamente delicada e sensível que se inscreve na reserva mais íntima da consciência moral de cada cidadão, atravessando de forma indiscriminada os vários partidos e respectivos eleitorados;

2) A posição a adoptar sobre o regime legal da interrupção voluntária da gravidez não se pode catalogar na esfera das normais opções ideológicas ou político-partidárias, na medida em que é do foro individual de cada um, encontrando resposta nas convicções e posicionamento que cada qual assume perante valores e direitos fundamentais;

3) Enquanto a matéria respeitante à interrupção voluntária da gravidez com base em razões médicas deve ser eminentemente abordada de um ponto de vista técnico e científico, já a sua liberalização, ainda que temporalmente limitada, deve ser objecto de decisão dos Portugueses por via de referendo, por ser aquela que toca essencialmente valores e direitos fundamentais e cuja decisão deve ser assumida na base da liberdade de convicções próprias e íntimas de cada português.

Assim, pretendem os autores do projecto de resolução n.° 38/VTJ que os cidadãos eleitores sejam chamados a pro-

nunciar-se directamente, a titulo vinculativo, sobre a seguinte questão:

Não existindo razões médicas, o aborto deve ser livre durante as primeiras 12 semanas?

II — Enquadramento constitucional do instituto do referendo

Em Portugal a ideia do referendo aparece, pela primeira • vez, em 1872, na secção v do projecto de lei de reforma da Carta Constitucional, subscrito por José Luciano de Castro, sob forma de ratificação popular das alterações constitucionais. Segundo o autor, esta ideia poderia interessar ao País na manutenção das suas instituições políticas e daria a estas a força da opinião e o prestígio do sufrágio popular: «A soberania popular é inalienável» — Jorge Miranda em Polis Enciclopédia, p. 111.

No entanto, só muito mais tarde, no âmbito da 2.a revisão do texto da Constituição de 1976, é que veio a prevalecer a consagração do instituto do referendo nacional (Lei n.° 1/89), já que na sua versão original a Constituição da República Portuguesa não acolheu os instrumentos referendários. Assim, a partir de 1989, o artigo 118.° da Constituição passou a prever a possibilidade de- recurso a referendo nacional, dispondo no seu n.° 1:

Os cidadãos eleitores portugueses podem ser chamados a pronunciar-se directamente, a título vinculativo, através de referendo, por decisão do Presidente da República mediante proposta da Assembleia da República ou do Governo, nos casos e nos termos previstos na Constituição e na lei.

Até à revisão constitucional de 1997 a doutrina portuguesa era unânime no sentido de afirmar que oreferendo consagrado entre nós se regia, basicamente, por três princípios — v., por exemplo, Gomes Canotilho e Vital Moreira, Consti-. tuição da República Portuguesa Anotada:

a) O referendo nunca é obrigatório, mas sempre facultativo, ou seja, o recurso ao referendo implica sempre uma decisão livre dos órgãos de soberania competentes. Quer a prqposta quer a decisão são sempre actos discricionários, pelo que não existe nenhuma decisão cuja legitimidade careça de submissão a decisão referendária;

b) O direito de participação no referendo é limitado aos cidadãos eleitores recenseados no território nacional;

c) O resultado do referendo é vinculativo no sentido de os órgãos do Estado se deverem conformar com o seu resultado, decidindo em conformidade com ele, podendo o sentido ser negativo (impedindo a aprovação de leis ou de convenções internacionais cujo conteúdo tenha sido rejeitado por referendo), positivo (obrigando a Assembleia ou o Governo a aprovar, dentro de prazo razoável, o acto legislativo ou a convenção internacional correspondentes ao sentido da votação) e ainda, no que se refere ao Presidente da República, implicará a proibição do veto político de actos legislativos ou de recusa de ratificação ou assinatura das convenções internacionais na parte em que esses actos normativos se limitem a converter em regras jurídicas os resultados do referendo, bem como a obrigação de veto de quaisquer actos que sejam desconformes com os resultados de um referendo.

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