O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

1236 | I Série - Número 029 | 27 de Janeiro de 2001

 

PROJECTO DE LEI N.º 348/VIII
ESTABELECE MEDIDAS DE PROTECÇÃO DO PATRIMÓNIO URBANO

1 - A Constituição da República Portuguesa, no seu artigo 9.º, alínea e), constante da Parte Geral da Lei Fundamental do Estado Português, consagra como tarefa fundamental do Estado o dever de "proteger e valorizar o património cultural do povo português, defender a natureza e o ambiente, preservar os recursos naturais e assegurar um correcto ordenamento do território".
Reconhece, assim, que a valorização do património histórico e cultural de qualquer país é a melhor forma de as gerações contemporâneas homenagearem as suas antecessoras e assegurarem a transmissão dos valores nacionais às gerações vindouras. É por todos reconhecido que, em Portugal, este objectivo está longe de estar atingido, ocorrendo frequentemente casos de abandono de monumentos que são parte integrante do nosso património histórico.
Por outro lado, o bem público, enquanto conceito, tenha ele um carácter histórico ou não, deve ser preservado, porquanto resulta de um investimento do Estado, financiado por todos nós e para a satisfação de necessidades da comunidade.
Por fim, a protecção do ambiente e da arquitectura das nossas cidades deve ser um objectivo consensual, não só por proporcionar um ambiente saudável e melhor qualidade de vida, mas também por conferir uma boa imagem do nosso país a todos quanto nos visitam, e são muitos, assegurando a defesa de uma das actividades mais lucrativas da nossa economia - o turismo.
2 - Todos estes valores, pela sua importância, justificam que o Estado, através do poder legislativo, tome medidas contra a proliferação de inscrições de desenhos, pinturas e expressões nas paredes de monumentos, estátuas, meios de transporte, estações de transportes públicos, prédios públicos e privados, sinais de trânsito, todo o tipo de mobiliário urbano, etc., das nossas cidades.
Acresce que a realização desta actividade, geralmente designada por graffiti, está, não raro, associada à prática de outras, mais graves, que provocam a insegurança de todos os cidadãos. Estudos efectuados sobre esta matéria, revelam que um ambiente degradado tem efeitos negativos na sociedade que o envolve, promovendo o desleixo, a falta de qualidade de vida e, frequentemente, a violência, tanto mais que muitas destas inscrições têm, directa ou indirectamente, conotações agressivas.
Esta prática, que terá tido a sua origem em Nova Iorque, apresentando, inicialmente, ambições artísticas, passou a ser encarada como uma forma de degradação de cultura de "guerrilha urbana", segundo os seus próprios autores, proliferando hoje por todo o mundo. Frequentemente, é a face visível do vandalismo urbano organizado, funcionando como ritual de iniciação dentro dos próprios grupos ou gangs, que hoje atingem as nossas sociedades urbanas.
Basta este historial para distinguir, radicalmente, a motivação e a gravidade dos graffitis que hoje vemos nas cidades portuguesas, face aos célebres "murais revolucionários" que, à esquerda e à direita, recordam uma época importante da nossa história e deviam, por isso, ser conservados e, apropriadamente, mostrados como memória colectiva.
3 - Importa recordar que o combate aos graffitis é considerado elemento importante de combate à delinquência em nações tão diferentes como os Estados Unidos ou os Países Escandinavos.
A proliferação destas inscrições no nosso país, fundamentalmente nos grandes centros urbanos, não pode deixar de ser considerada como preocupante, não se verificando em nenhum outro país situações que se tornaram quotidianas em Portugal. Tanto mais que a reposição da situação anterior, para além de dispendiosa, jamais poderá acompanhar o ritmo em que estas inscrições, actualmente, são feitas.
Se é verdade que o ordenamento jurídico português consagra alguns institutos que poderão conferir o necessário revestimento jurídico desta conduta, não é menos certo que estes se têm revelado ineficazes ou insuficientes, quer no combate efectivo destas situações quer na sua prevenção.
Com efeito, os infractores poderão ser civilmente responsabilizados pelos proprietários dos locais onde são feitos os graffitis com recurso ao instituto da responsabilidade civil extra contratual prevista no artigo 483.º do Código Civil. No entanto, o desconhecimento, a dificuldade de identificação dos infractores e até a desmotivação provocada pela morosidade do nosso sistema judicial, fazem com que não existam registos de acções judiciais com este objectivo, apesar do descontentamento generalizado da nossa sociedade contra estes comportamentos.
De acordo com a Lei n.º 97/88, de 17de Agosto, compete às câmaras municipais, para salvaguarda do equilíbrio urbano e ambiental, a definição dos critérios de licenciamento para afixação e inscrição de mensagens publicitárias e propaganda, dependendo do consentimento do respectivo proprietário ou possuidor e respeitando as normas em vigor sobre protecção do património arquitectónico e do meio urbanístico, ambiental e paisagístico, sob pena de constituir matéria contra-ordenacional. São ainda proibidas as inscrições ou pinturas murais em monumentos nacionais, edifícios religiosos, sedes de órgãos de soberania, de regiões autónomas ou de autarquias locais, em sinais de trânsito, placas de sinalização rodoviárias, interior de quaisquer repartições ou edifícios públicos ou franqueados ao público, incluindo centros comerciais ou centros históricos. Mas estas normas, para além de se mostrarem insuficientes, referem-se especificamente à publicidade, só podendo ser aplicável aos graffitis por recurso à analogia, com todos os inconvenientes daí decorrentes. Acresce que, se uma actividade lícita com a publicidade está sujeita a estas limitações, não se vislumbram motivos para que este tipo de comportamentos ilícitos, não estejam sujeitos a uma disciplina específica.
Por fim, esta actividade poderia ainda ser enquadrada penalmente no crime previsto e punido no artigo 212.º do Código Penal que consagra uma moldura penal até três anos para quem "destruir, no todo ou em parte, danificar, desfigurar, ou tornar não utilizável coisa alheia (...)". De acordo com a doutrina, a expressão desfigurar poderá englobar esta actividade sem que esta interpretação viole o princípio da legalidade consagrado no artigo 1.º, n.º 3, do Código Penal e que impede o recurso à analogia para qualificar qualquer facto como crime. Neste contexto, não só a interpretação extensiva não é proibida, como a expressão desfigurar parece englobar a realização de inscrições em propriedade alheia.
Contudo, a natureza semi-pública deste crime, fazendo depender o procedimento criminal da apresentação de queixa pelo ofendido, e o facto de, no caso de o agente ser cônjuge, ascendente, descendente, adoptante, adoptado, parente ou afim até 3.º grau da vítima ou conviver com ela em condições análogas às dos cônjuges, para além de queixa, o procedimento ainda carecer de acusação particular pela vítima, dificulta enormemente a aplicação desta forma de responsabilização para os infractores. Ora, como atrás dissemos, as mais das vezes, para não dizer na sua totalidade,