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Sábado, 27 de Janeiro de 2001 II Série-A - Número 29

VIII LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2000-2001)

S U M Á R I O

Projectos de lei (n.os 348 a 353/VIII):
N.º 348/VIII - Estabelece medidas de protecção do património urbano (apresentado pelo CDS-PP).
- Texto e despacho n.º 79/VIII de admissibilidade.
N.º 349/VIII - Compensações a empresas comerciais e outros agentes económicos afectados por obras públicas (apresentado pelo PSD).
N.º 350/VIII - Reforça os direitos das crianças na adopção (apresentado pelo BE).
N.º 351/VIII - Altera a Lei n.º 170/99, de 18 de Setembro (Adopta medidas de combate à propagação de doenças infecto-contagiosas em meio prisional) (apresentado por Os Verdes).
N.º 352/VIII - Intervenção de forças militares portuguesas no estrangeiro (apresentado pelo PSD).
N.º 353/VIII - Criação de um observatório nacional dos efeitos das alterações climáticas (apresentado pelo PS).

Proposta de lei n.º 53/VIII (Reforça as garantias do contribuinte e a simplificação processual, reformula a organização judiciária tributária e estabelece um novo regime geral para as infracções tributárias):
- Relatório e parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias.
- Relatório e parecer da Comissão de Economia, Finanças e Plano.

Projecto de resolução n.º 101/VIII
Sobre política de transportes colectivos, particularmente um novo regime de passes sociais (apresentado pelo PSD).

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PROJECTO DE LEI N.º 348/VIII
ESTABELECE MEDIDAS DE PROTECÇÃO DO PATRIMÓNIO URBANO

1 - A Constituição da República Portuguesa, no seu artigo 9.º, alínea e), constante da Parte Geral da Lei Fundamental do Estado Português, consagra como tarefa fundamental do Estado o dever de "proteger e valorizar o património cultural do povo português, defender a natureza e o ambiente, preservar os recursos naturais e assegurar um correcto ordenamento do território".
Reconhece, assim, que a valorização do património histórico e cultural de qualquer país é a melhor forma de as gerações contemporâneas homenagearem as suas antecessoras e assegurarem a transmissão dos valores nacionais às gerações vindouras. É por todos reconhecido que, em Portugal, este objectivo está longe de estar atingido, ocorrendo frequentemente casos de abandono de monumentos que são parte integrante do nosso património histórico.
Por outro lado, o bem público, enquanto conceito, tenha ele um carácter histórico ou não, deve ser preservado, porquanto resulta de um investimento do Estado, financiado por todos nós e para a satisfação de necessidades da comunidade.
Por fim, a protecção do ambiente e da arquitectura das nossas cidades deve ser um objectivo consensual, não só por proporcionar um ambiente saudável e melhor qualidade de vida, mas também por conferir uma boa imagem do nosso país a todos quanto nos visitam, e são muitos, assegurando a defesa de uma das actividades mais lucrativas da nossa economia - o turismo.
2 - Todos estes valores, pela sua importância, justificam que o Estado, através do poder legislativo, tome medidas contra a proliferação de inscrições de desenhos, pinturas e expressões nas paredes de monumentos, estátuas, meios de transporte, estações de transportes públicos, prédios públicos e privados, sinais de trânsito, todo o tipo de mobiliário urbano, etc., das nossas cidades.
Acresce que a realização desta actividade, geralmente designada por graffiti, está, não raro, associada à prática de outras, mais graves, que provocam a insegurança de todos os cidadãos. Estudos efectuados sobre esta matéria, revelam que um ambiente degradado tem efeitos negativos na sociedade que o envolve, promovendo o desleixo, a falta de qualidade de vida e, frequentemente, a violência, tanto mais que muitas destas inscrições têm, directa ou indirectamente, conotações agressivas.
Esta prática, que terá tido a sua origem em Nova Iorque, apresentando, inicialmente, ambições artísticas, passou a ser encarada como uma forma de degradação de cultura de "guerrilha urbana", segundo os seus próprios autores, proliferando hoje por todo o mundo. Frequentemente, é a face visível do vandalismo urbano organizado, funcionando como ritual de iniciação dentro dos próprios grupos ou gangs, que hoje atingem as nossas sociedades urbanas.
Basta este historial para distinguir, radicalmente, a motivação e a gravidade dos graffitis que hoje vemos nas cidades portuguesas, face aos célebres "murais revolucionários" que, à esquerda e à direita, recordam uma época importante da nossa história e deviam, por isso, ser conservados e, apropriadamente, mostrados como memória colectiva.
3 - Importa recordar que o combate aos graffitis é considerado elemento importante de combate à delinquência em nações tão diferentes como os Estados Unidos ou os Países Escandinavos.
A proliferação destas inscrições no nosso país, fundamentalmente nos grandes centros urbanos, não pode deixar de ser considerada como preocupante, não se verificando em nenhum outro país situações que se tornaram quotidianas em Portugal. Tanto mais que a reposição da situação anterior, para além de dispendiosa, jamais poderá acompanhar o ritmo em que estas inscrições, actualmente, são feitas.
Se é verdade que o ordenamento jurídico português consagra alguns institutos que poderão conferir o necessário revestimento jurídico desta conduta, não é menos certo que estes se têm revelado ineficazes ou insuficientes, quer no combate efectivo destas situações quer na sua prevenção.
Com efeito, os infractores poderão ser civilmente responsabilizados pelos proprietários dos locais onde são feitos os graffitis com recurso ao instituto da responsabilidade civil extra contratual prevista no artigo 483.º do Código Civil. No entanto, o desconhecimento, a dificuldade de identificação dos infractores e até a desmotivação provocada pela morosidade do nosso sistema judicial, fazem com que não existam registos de acções judiciais com este objectivo, apesar do descontentamento generalizado da nossa sociedade contra estes comportamentos.
De acordo com a Lei n.º 97/88, de 17de Agosto, compete às câmaras municipais, para salvaguarda do equilíbrio urbano e ambiental, a definição dos critérios de licenciamento para afixação e inscrição de mensagens publicitárias e propaganda, dependendo do consentimento do respectivo proprietário ou possuidor e respeitando as normas em vigor sobre protecção do património arquitectónico e do meio urbanístico, ambiental e paisagístico, sob pena de constituir matéria contra-ordenacional. São ainda proibidas as inscrições ou pinturas murais em monumentos nacionais, edifícios religiosos, sedes de órgãos de soberania, de regiões autónomas ou de autarquias locais, em sinais de trânsito, placas de sinalização rodoviárias, interior de quaisquer repartições ou edifícios públicos ou franqueados ao público, incluindo centros comerciais ou centros históricos. Mas estas normas, para além de se mostrarem insuficientes, referem-se especificamente à publicidade, só podendo ser aplicável aos graffitis por recurso à analogia, com todos os inconvenientes daí decorrentes. Acresce que, se uma actividade lícita com a publicidade está sujeita a estas limitações, não se vislumbram motivos para que este tipo de comportamentos ilícitos, não estejam sujeitos a uma disciplina específica.
Por fim, esta actividade poderia ainda ser enquadrada penalmente no crime previsto e punido no artigo 212.º do Código Penal que consagra uma moldura penal até três anos para quem "destruir, no todo ou em parte, danificar, desfigurar, ou tornar não utilizável coisa alheia (...)". De acordo com a doutrina, a expressão desfigurar poderá englobar esta actividade sem que esta interpretação viole o princípio da legalidade consagrado no artigo 1.º, n.º 3, do Código Penal e que impede o recurso à analogia para qualificar qualquer facto como crime. Neste contexto, não só a interpretação extensiva não é proibida, como a expressão desfigurar parece englobar a realização de inscrições em propriedade alheia.
Contudo, a natureza semi-pública deste crime, fazendo depender o procedimento criminal da apresentação de queixa pelo ofendido, e o facto de, no caso de o agente ser cônjuge, ascendente, descendente, adoptante, adoptado, parente ou afim até 3.º grau da vítima ou conviver com ela em condições análogas às dos cônjuges, para além de queixa, o procedimento ainda carecer de acusação particular pela vítima, dificulta enormemente a aplicação desta forma de responsabilização para os infractores. Ora, como atrás dissemos, as mais das vezes, para não dizer na sua totalidade,

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o proprietário por desconhecimento do autor, desinteresse, desmotivação ou medo de represálias, a experiência demonstra que jamais são apresentadas as competentes queixas.
Neste contexto, torna-se imperioso criar um regime específico para este tipo de actividade ilícita, que vem proliferando no nosso país e cuja inacção por parte das autoridades, em grande medida causada pelo vazio legal existente, tem originado que o nosso país venha referenciado como um "paraíso" para aqueles que desenvolvem esta actividade.
Manifestamente, só com muito voluntarismo se poderá dizer que a lei, em Portugal, está atenta a esta forma de vandalismo massificado.
4 - Experiências ocorridas em outros países, nomeadamente na Escandinávia, mostram-nos que a esmagadora maioria dos jovens detidos pela primeira vez por realizarem esta actividade, deixaram de o fazer, porquanto adquiriam a noção da gravidade do seu comportamento, que muitas vezes era desculpabilizado, sendo encarado como uma espécie de "crime inocente" e não com a verdadeira dimensão que pode assumir, nomeadamente pela iniciação ao mundo do crime que, frequentemente, constitui.
A criação de um regime específico do crime de dano, justifica-se pela natureza pública dos bens jurídicos que, para além do direito de propriedade, são colateralmente afectados com a prática deste crime. É que a aposição dos chamados graffitis não viola exclusivamente o bem jurídico direito de propriedade, mas também o direito público a um ambiente sadio e equilibrado, a protecção do património cultural e artístico, a paisagem, a paz e tranquilidade pública, a segurança, a salubridade pública, etc. Qualquer destes bens jurídicos, reportam-se à comunidade e aos seus membros, pelo que, uma qualquer violação dos mesmos, legitima sempre uma intervenção das autoridades judiciárias. Justifica-se, assim, a atribuição de natureza pública deste tipo de crimes.
Tanto mais que, pela sua frequência e diversidade, o dano resultante dos graffitis, assume grande relevo, condicionando decisivamente o quotidiano dos cidadãos. Não só pelo carácter avultado dos prejuízos materiais que provoca, como pela insegurança e falta de confiança que induz. Isso vale sobretudo para o vandalismo que se caracteriza pela destruição de coisa alheia, sem explicação nem sentido aparente, particularmente explicita pela ausência de uma relação de conflitualidade entre a vítima e o autor neste tipo de crime, que normalmente nem se propõe retirar vantagens do acto. Para mais, as suas manifestações atingem normalmente coisas ou equipamentos colectivos e de utilização pública; cabinas telefónicas, bancos de jardins, sanitários, transportes públicos, etc.
Configurando este crime nesta circunstância específica, enquanto protector do direito de propriedade e, ao mesmo tempo, do direito ao ambiente, segurança, paz e tranquilidade pública, poderemos considerar que se trata de um tipo de crime de dano peculiar que justifica uma incriminação autónoma, à semelhança do que já se verifica para outras situações na nossa ordem jurídica que igualmente configuram crimes de dano, mas que tutelam objectos específicos.
No próprio Código Penal assim ocorre, prevendo-se os crimes de dano específico de destruição de monumentos (artigo 242.º), danificação ou subtracção de documento e notação técnica (artigo 259.º), danos contra a natureza (artigo 278.º), descaminho ou destruição de objectos colocados sob o poder público (artigo 355.º). E em legislação avulsa onde se encontram previstos os crimes de destruição de bens próprios com relevante interesse para a economia nacional (artigo 31.º do Decreto-Lei n.º 28/84, de 20 de Janeiro), incêndios florestais (artigo 3.º, n.º 2, da Lei n.º 19/86, de 19 de Julho), dano relativo a dados ou programas informáticos (artigo 5.º da Lei n.º 109/91, de 17 de Agosto). É esta última hipótese, e pela criação de uma incriminação específica, que o presente projecto lei consagra.
5 - Importa, desde já, afastar eventuais questões de natureza constitucional, designadamente o direito à liberdade de expressão (artigo 37.º da Constituição da República Portuguesa), porquanto esta medida visa igualmente a protecção do direito à propriedade privada (artigo 62.º da Constituição da República Portuguesa), o direito ao ambiente e qualidade de vida (artigo 66.º da Constituição da República Portuguesa), fruição e criação cultural (artigo 78.º da Constituição da República Portuguesa), também eles princípios constitucionalmente protegidos.
Acresce que qualquer destes direitos, como é sabido, não constituem direitos absolutos e ilimitados, não abrangendo todas as situações, formas ou modos pensáveis de exercício, pois terá de sofrer os limites inerentes a uma convivência social ordenada. A pintura de inscrições em imóveis públicos ou particulares não é um meio normal ou habitual de utilizar a liberdade de expressão.
A própria Declaração Universal dos Direitos do Homem, no artigo 29.º, permite que o legislador estabeleça certos limites aos direitos fundamentais para assegurar o reconhecimento ou o respeito dos valores aí enunciados; nomeadamente os "direitos e liberdades de outrem", justas exigências da moral e da ordem pública e do bem-estar geral numa sociedade democrática.
A incriminação desta actividade reveste assim um carácter fundamental de criação de bem-estar social, que tem merecido de outros países também uma atenção específica, referindo-se a título de exemplo o ordenamento jurídico francês.
6 - Nestes termos, o Grupo Parlamentar do CDS-PP cria um regime específico para este tipo de ilícito que, baseando-se no crime de dano previsto e punido actualmente pelo Código Penal português, atende às especificidades próprias desta actividade, criando um regime que incrimina a realização de inscrições de sinais, símbolos, pinturas, dísticos os expressões, vulgo graffitis, sem autorização prévia do proprietário, podendo o infractor ser punido com uma pena de prisão até um ano ou pena de multa, sendo a tentativa punida. No artigo 2.º deste diploma prevê-se um conjunto de circunstâncias qualificantes, de acordo com as que se encontram previstas para o crime de dano no ordenamento jurídico português, com a consagração de outras específicas deste tipo de crime.
Por outro lado, limita-se o acesso dos mais novos aos instrumentos de realização destas inscrições, com a proibição de venda destes produtos a menores de 18 anos.
Por fim, de forma a desenvolver um esforço coordenado de prevenção e combate a este crime, cria-se a Comissão Nacional de Protecção do Património Urbano, composta por representantes do Ministério do Ambiente e do Ordenamento do Território, do Instituto Português do Património Arquitectónico e Arqueológico (IPPAR), do Equipamento Social, da Administração Interna e da Secretaria de Estado da Habitação em nome do Governo e membros da sociedade civil como representantes das associações de proprietários e inquilinos, bombeiros voluntários, Polícia de Segurança Pública, Associação Nacional de Municípios Portugueses, psicólogos, sociólogos, juristas, etc., para o desempenho de funções preventivas e executivas da realização dos chamados graffitis.

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Entre as competências desta Comissão, destaca-se a realização de um esforço global e coordenado de prevenção destes comportamentos, elaborando um estudo que identifique as causas, a localização e as melhores formas de combate a estes comportamentos; alertar a sociedade civil para as consequências negativas que deles podem resultar, realizar acções de esclarecimento, debates, colóquios, etc., nos estabelecimentos de ensino de todo o País, sensibilizando alunos, professores e pais para este problema; promover campanhas publicitárias de sensibilização; criar uma linha de atendimento ao público de acompanhamento e informação da forma de actuar perante a realização das inscrições, elaborar um relatório onde constem propostas de aperfeiçoamento da legislação existente e do enquadramento legal adequado para dissuadir e erradicar este fenómeno; estudar os meios técnicos adequados de limpeza, manutenção e reabilitação dos locais atingidos; promover a participação da sociedade civil no combate a este fenómeno, constituindo grupos de voluntários na prevenção e remoção destas inscrições, designadamente através da realização de protocolos com as escolas, envolvendo toda a comunidade educativa, desde alunos, professores, pais e os demais auxiliares da acção educativa; recomendar ao Governo a realização de iniciativas que possam contribuir para a resolução deste problema, etc.
Nestes termos, o Grupo Parlamentar do CDS-PP apresenta o seguinte projecto de lei, que estabelece novas regras de protecção do património urbano.

Artigo 1.º
(Norma incriminadora)

1 - Quem, no todo ou em parte, destrua ou desfigure coisa alheia, móvel ou imóvel com a inscrição de sinais, símbolos, desenhos, pinturas, dísticos ou expressões, sem autorização prévia, é punido com pena de prisão até um ano ou com pena de multa.
2 - A tentativa é punível.

Artigo 2.º
(Qualificação)

1 - Quem praticar os actos descritos no artigo anterior em

a) Coisa alheia de valor elevado;
b) Monumento público;
c) Coisa pública ou destinada ao uso e utilidade pública;
d) Sinais de trânsito;
e) Coisa pertencente ao património cultural e legalmente classificada ou em vias de classificação;
f) Coisa alheia afecta ao culto religioso ou à veneração da memória dos mortos e que se encontre em lugar destinando ao culto ou em cemitério;
g) Coisa natural ou produzida pelo homem, oficialmente arrolada ou posto sob a protecção oficial da lei;
h) Coisa que possua importante valor científico, artístico ou histórico e se encontre em colecção ou exposição públicas ou acessíveis ao público; ou
i) Que possua significado importante para o desenvolvimento tecnológico ou económico;
j) Local de habitação ou em lugar destinado ao depósito de bens, mercadorias e valores penetrando de forma ardil ou astuciosa por arrombamento, escalamento ou chaves falsas;
k) Grupo e de forma organizada ou reiterada;
É punido com pena de prisão até três anos ou com pena de multa até 240 dias.

Artigo 3.º
(Responsabilidade pelos danos)

1 - Quem praticar os factos previstos no artigo 1.º será ainda responsável por todas as despesas necessárias à remoção das inscrições e reposição da situação anterior à prática dos factos.
2 - A remoção imediata das inscrições é da competência das câmaras municipais da área da sua localização, podendo posteriormente accionar o responsável por estas a título de direito de regresso.

Artigo 4.º
(Comissão Nacional de Protecção do Património Urbano)

1 - É criada a Comissão Nacional de Protecção do Património Urbano, que funcionará junto da Presidência do Conselho de Ministros e que tem por fim a prevenção da realização do crime previsto no artigo 1.º.
2 - O Governo fará inscrever no Orçamento do Estado uma verba destinada a custear as despesas de funcionamento desta Comissão.
3 - A Comissão é independente do Governo, regendo-se pelo respectivo regulamento de funcionamento.
4 - O presidente da Comissão, ao qual compete encetar as diligências necessárias à sua formação, será requisitado ao Conselho Superior da Magistratura pelo Presidente do Conselho de Ministros, que pode delegar no Secretário de Estado da Presidência do Conselho de Ministros.
5 - A Comissão tomará posse perante o Presidente do Conselho de Ministros.

Artigo 5.º
(Composição da Comissão)

1 - A Comissão prevista no artigo anterior tem a seguinte composição:

a) Um magistrado judicial, que preside;
b) Um representante do Ministério do Ambiente e do Ordenamento do Território;
c) Um representante do IPPAR;
d) Um representante do Ministério da Administração Interna;
e) Um representante do Ministério do Equipamento Social;
f) Um representante da Secretaria de Estado da Habitação,
g) Um representante da Polícia de Segurança Pública;
h) Um representante das associações de proprietários;
i) Um representante das associações de inquilinos;
j) Um representante das associações de bombeiros;
k) Um representante da Associação Nacional de Municípios.

2 - A Comissão referida no número anterior será ainda composta por um gabinete de estudo permanente formado por psicólogos, sociólogos e juristas, a nomear pelo Presidente da Comissão.

Artigo 6.º
(Competências da Comissão)

Compete à Comissão prevista no artigo anterior realizar os actos necessários na prossecução do seu fim, nomeadamente:

a) Elaborar e aprovar o regulamento de funcionamento;

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b) Elaborar um relatório anual que proceda ao levantamento da situação actual e que, designadamente, identifique as causas, a localização e as melhores formas de combate a este fenómeno;
c) Promover a realização de acções de sensibilização da sociedade civil, designadamente através da realização de acções de esclarecimento, debates, colóquios, campanhas publicitárias, etc.;
d) Criar uma linha de atendimento permanente ao público, fornecendo apoio jurídico;
e) Elaborar um relatório anual com propostas de aperfeiçoamento da legislação existente;
f) Estudar os meios técnicos adequados de limpeza, manutenção e reabilitação dos locais atingidos;
g) Promover a participação da sociedade civil no combate a este fenómeno, constituindo grupos de voluntários na prevenção e remoção destas inscrições;
h) Realizar protocolos com as escolas, autarquias locais, forças de segurança e demais agentes para o combate concertado a este fenómeno;
i) Recomendações ao Governo.

Artigo 7.º
(Limitação da venda de sprays)

É proibida a venda a menores de 18 anos de sprays de tinta e demais produtos conexos com a realização dos factos previstos no artigo 1.º.

Artigo 8.º
(Direito subsidiário)

Ao crime previsto nos artigos anteriores é subsidiariamente aplicável as disposições do Código Penal.

Artigo 9.º
(Entrada em vigor)

O presente diploma entra em vigor no dia 1 de Janeiro de 2001.

Palácio de São Bento, 23 de Janeiro de 2001. - Os Deputados do CDS-PP: Paulo Portas - Pedro Mota Soares - Basílio Horta - Alves Pereira - Nuno Teixeira de Melo.

Texto e despacho n.º 79/VIII de admissibilidade

Admito o presente projecto de lei com as seguintes reservas:

1 - Não se me afigura compaginável com a garantia constitucional da independência dos juízes, designadamente com a regra constante do artigo 216.º, n.º 4, da Constituição da República Portuguesa, o recurso à figura da "requisição" de um magistrado judicial para o exercício das funções de Presidente da Comissão Nacional de Protecção do Património Urbano.
2 - No artigo 9.º do projecto prevê-se a sua entrada em vigor em 1 de Janeiro de 2001, o que, a verificar-se, contraria o princípio constitucional da não rectroactividade da lei criminal penalizadora (artigo 29.º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa).
3 - Finalmente, e porque esta iniciativa legislativa implica um aumento das despesas do Estado previstas no Orçamento, não me parece estar devidamente salvaguardado o disposto no artigo 167.º, n.º 2, da Constituição da República Portuguesa.
Baixa à 1.ª Comissão.
Registe-se, notifique-se e publique-se.

Palácio de São Bento, 25 de Janeiro de 2001. - O Presidente da Assembleia da República, António de Almeida Santos.

PROJECTO DE LEI N.º 349/VIII
COMPENSAÇÕES A EMPRESAS COMERCIAIS E OUTROS AGENTES ECONÓMICOS AFECTADOS POR OBRAS PÚBLICAS

Exposição de motivos

No âmbito de alguns processos de modernização e de revitalização de certas zonas urbanas, tem o País assistido à realização de obras de duração indeterminada, as quais afectam gravemente a normal circulação de pessoas e bens nas vias públicas e, em especial, de todos aqueles que têm a sua actividade económica centrada nesses locais. Acresce que, não raras vezes, essas mesmas obras são levadas a cabo de forma totalmente descoordenada e sem o devido respeito pelas pessoas.
Com efeito, tais intervenções, da competência, tanto da administração central, como do poder local, ou de outras entidades a quem o Governo atribui determinadas responsabilidades, ao afectarem decisivamente o trânsito, degradam o tecido económico, tradicionalmente estabelecido nas zonas urbanas afectadas pelas obras.
Em muitos casos, essas intervenções são realizadas ao abrigo de polémicos planos que não mereceram a concordância dos mais directamente interessados, que acabam, assim, por ficar totalmente alheios a tais soluções, apesar de estas serem invariavelmente apelidadas de "revitalização económica e de requalificação urbana" das zonas em causa.
Ao originar um prolongado condicionamento da circulação das pessoas, essas obras de "Santa Engrácia", arrastam, assim, muitas vezes, imensas famílias para uma situação económica verdadeiramente dramática, sempre que as suas vidas dependem das actividades aí desenvolvidas.
Nesse sentido, o Grupo Parlamentar do PSD considera imperioso e, acima de tudo, inteiramente justo e humano que esses pequenos empresários tenham à sua disposição mecanismos legislativos que, de alguma forma, os compensem dos prejuízos sofridos durante os períodos de duração das obras. Não é justo que sejam só eles a pagar, quando o sentido dessas intervenções urbanísticas mais prolongadas têm por objectivo beneficiar toda a cidade globalmente considerada.
Existem, no entanto, alguns constrangimentos constitucionais, nomeadamente a designada "lei travão", que impede que a Assembleia da República legisle com efeitos imediatos sobre matérias que impliquem o aumento da despesa do Estado ou que obriguem a transferências de dotações orçamentais quando há uma Lei Orçamental em curso. Esse constrangimento não existe do lado do Governo, pelo que, aprovado o presente projecto de lei, pode ele produzir efeitos imediatos, caso seja essa a vontade política do Executivo. A Assembleia da República pode conferir desde já o direito aos comerciantes prejudicados, não pode, no entanto, obrigar o Governo a transferir as verbas necessárias antes de 2002. Tem, no entanto, esse mesmo Governo, múltiplos meios para accionar, já, as justas contrapartidas que se

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pretende que sejam conferidas a quem está a sofrer as terríveis consequências que não podemos ignorar.
Ciente que essas situações dramáticas que afectam muitas das famílias envolvidas não se compadecem com limitações jurídicas desta natureza, o PSD procura ultrapassá-las, atribuindo ao Governo a competência para a regulamentação das normas agora propostas, comprometendo, também, o Executivo na necessidade de, com urgência, se porem em prática as soluções que possam minorar, em tempo útil, os efeitos nefastos de todas as obras que os provocam.
Nestes termos, ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, os Deputados abaixo assinados do Grupo Parlamentar do Partido Social Democrata apresentam o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.º
(Objecto)

A presente lei cria um regime excepcional de medidas de apoio e compensação financeira destinadas a empresas comerciais e outros agentes económicos com estabelecimentos em locais anormalmente afectados pela realização de obras públicas, cuja duração seja igual ou superior a 120 dias.

Artigo 2.º
(Definições)

Para os efeitos da presente lei entende-se por obras públicas quaisquer obras de construção, reconstrução, ampliação, alteração, reparação, conservação, limpeza, restauro, adaptação, beneficiação e demolição de bens imóveis, destinadas a preencher, por si mesmas, uma função económica ou técnica, executadas por conta de um dono de obra pública, considerando-se como tal as entidades abrangidas pelo âmbito de aplicação subjectiva do Decreto-Lei n.º 59/99, de 2 de Março.

Artigo 3.º
(Âmbito)

1 - Para efeitos da presente lei, são susceptíveis de apoio as empresas e outros agentes económicos cuja actividade exercida nas zonas beneficiárias se enquadre nas seguintes divisões da Classificação Portuguesa das Actividades Económicas CAE, revista pelo Decreto-Lei n.º 182/93, de 14 de Maio:

a) Comércio divisões 50 a 52 da CAE;
b) Alojamento e restauração (restaurantes e similares) divisão 55.

2 - As candidaturas são formuladas, nos termos de diploma próprio do Governo, através das associações empresariais interessadas ou, na falta delas, através das câmaras municipais da área respectiva, que devem, para o efeito, instruir os respectivos processos e emitir parecer fundamentado.
3 - Sempre que a realização de obras públicas afecte anormalmente empresas comerciais e outros agentes económicos não abrangidos pelo disposto no n.º 1, pode aos mesmos ser aplicável, mediante requerimento fundamentado do interessado, apresentado com observância do disposto no número anterior, o regime constante da presente lei.

Artigo 4.º
(Classificação e delimitação geográfica)

A classificação e a delimitação geográfica das zonas nas quais a normal circulação de pessoas e mercadorias na via pública é afectada pelas obras públicas, bem como a definição dos critérios de candidatura dos estabelecimentos aos apoios previstos e a regulação do respectivo processo são objecto de regulamentação a aprovar pelo Governo, mediante proposta das câmaras municipais, ouvidas as associações empresariais e comerciais, nacionais e locais, interessadas.

Artigo 5.º
(Início das obras públicas)

1 - Salvo casos excepcionais, devidamente justificados, as obras públicas apenas podem ter início após o Governo ter procedido à classificação e delimitação geográfica a que se refere o artigo anterior.
2 - O disposto no número anterior não prejudica quaisquer outras obrigações, legal ou contratualmente aplicáveis à realização de obras públicas.

Artigo 6.º
(Contribuições para a Segurança Social)

1 - No âmbito do regime excepcional de apoio e compensação, as entidades afectadas ficam isentas do pagamento das contribuições para a Segurança Social devidas, em relação ao período que decorre desde o início dos trabalhos que afectam a circulação de pessoas e mercadorias na via pública até ao seu termo.
2 - Após o termo do prazo referido no número anterior, a isenção do pagamento das contribuições para a Segurança Social é prorrogada pelo período correspondente a metade do tempo da duração das obras públicas.

Artigo 7.º
(Taxas municipais)

1 - No âmbito do regime excepcional do apoio e compensação, as entidades afectadas ficam também isentas do pagamento de taxas municipais devidas em relação ao período que decorre desde o início dos trabalhos que afectam a circulação de pessoas e mercadorias na via pública até ao seu termo.
2 - Caso as obras públicas tenham uma duração plurianual, a isenção do pagamento de taxas municipais abrange todos os anos civis até ao do seu termo.

Artigo 8.º
(Fundo de compensação)

1 - É criado um fundo de compensação destinado às empresas comerciais e os agentes económicos afectados pela realização das obras públicas, cujo montante deve ser adequado a essa finalidade.
2 - O acesso ao fundo é concedido, em relação a cada estabelecimento afectado pela realização das obras públicas, até ao montante anual de 40% da facturação constante da última declaração para efeitos de imposto sobre o rendimento, nos seguintes termos:

a) 20% a fundo perdido;
b) 80% reembolsável sem juros, até dois anos após o termo das obras públicas.

3 - O apoio concedido às empresas comerciais e aos agentes económicos afectados pela realização das obras públicas não constitui proveito para efeitos de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares e Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas.
4 - O limite global do fundo de compensação e as condições de acesso previstas no presente artigo são estabelecidos em diploma próprio do Governo.

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Artigo 9.º
(Entidades excluídas)

O disposto na presente lei não é cumulável com quaisquer outras formas de compensação ou apoio financeiro, legal ou contratualmente devidos, pelos prejuízos directa ou indirectamente resultantes da realização das obras públicas abrangidas pelo seu âmbito de aplicação.

Artigo 10.º
(Norma transitória)

1 - O regime excepcional estabelecido na presente lei aplica-se às situações já criadas ou a criar a partir da data da sua publicação, designadamente na cidade do Porto em virtude da realização de obras públicas inseridas na iniciativa "Capital Europeia da Cultura", e nos municípios abrangidos pelo denominado "Programa Polis" Programa de Requalificação Urbana e Valorização Ambiental das Cidades , sem prejuízo do disposto nos números seguintes.
2 - Nos casos previstos no número anterior, o Governo deve, no prazo de 30 dias, a contar da recepção das propostas efectuadas pelas câmaras municipais, nos termos do artigo 4.º, proceder à classificação e delimitação das zonas nas quais a normal circulação de pessoas e mercadorias na via pública é afectada, bem como à definição dos critérios de candidatura dos estabelecimentos aos apoios previstos e do respectivo processo.

Artigo 11.º
(Regulamentação)

Incumbe ao Governo aprovar, no prazo de 60 dias, a regulamentação necessária à execução da presente lei.

Artigo 12.º
(Entrada em vigor)

A presente lei entra em vigor na data da sua publicação, sem prejuízo de, na parte em que envolva aumento das despesas ou diminuição das receitas do Estado previstas no Orçamento, produzir os seus efeitos desde ou a partir da data determinada pelo Governo.

Palácio de São Bento, 23 de Janeiro de 2001. - Os Deputados do PSD: António Capucho - Rui Rio - Manuel Moreira - David Justino - Luís Marques Guedes - Manuela Ferreira Leite - Carlos Antunes - Sérgio Vieira.

PROJECTO DE LEI N.º 350/VIII
REFORÇA OS DIREITOS DAS CRIANÇAS NA ADOPÇÃO

Os processos de adopção em Portugal não têm garantido, de forma plena, o direito de as crianças viverem num ambiente familiar estável do ponto de vista afectivo e económico.
Em Portugal, muitas crianças crescem sozinhas em instituições. Para que possam ser adoptadas terá que existir o consentimento dos pais biológicos ou a declaração da situação de abandono, que se caracteriza, segundo a actual lei, por um tempo mínimo de seis meses sem manifestação de interesse por parte dos familiares. Pelo que, se uma criança for visitada de seis em seis meses pelos progenitores torna-se difícil declarar o "estado de abandono". Privilegia-se fundamentalmente o direito de os pais terem filhos(as) em detrimento do direito de as crianças terem pais.
Torna-se fundamental inserir na actual legislação um conjunto de responsabilidades a exigir aos pais biológicos, no sentido de reforçar a sua ligação afectiva com as crianças na altura em que as crianças mais precisam dos pais. Uma vez não cumpridas essas responsabilidades, torna-se mais evidente a necessidade de conceder a confiança judicial, o que poderá facilitar a inserção da criança numa nova família, evitando tempos de espera lesivos dos seus direitos. O sistema de adopção, no seu actual funcionamento, acaba por favorecer mais a família biológica do que a necessidade de a criança ter uma família. Os vínculos biológicos acabam por se sobrepor aos da afectividade, na medida em que, muitas vezes, a aposta na recuperação social da família biológica é demasiado prolongada. Até quando uma criança pode esperar pela "recuperação" dos pais? Muitas crianças são sujeitas a situações deste tipo, de indefinição do seu projecto de vida, por demasiado tempo. A cultura e tradição dominantes tendem a reforçar a escolha de crianças semelhantes às que o casal poderia ter gerado biologicamente, propiciando, assim, a exclusão de crianças de idade mais avançada, de grupos de irmãos, de crianças deficientes ou de etnia diferente dos adoptantes.
Dois grandes princípios devem nortear as normas legislativas sobre adopção: a configuração deste instituto como um instrumento de integração familiar e a sobreposição do interesse do adoptando a qualquer outro. Esses são os princípios que determinam este projecto de lei.
Uma análise comparativa das legislações sobre adopção de vários países da União Europeia leva-nos a concluir que, em muitos países, existe uma maior facilidade nos processos de adopção, com o objectivo de salvaguardar os direitos das crianças. É o caso dos requisitos colocados aos adoptantes, onde não se exige que sejam casados ou, quando tal exigência existe, não está condicionada a uma duração mínima de casamento, à excepção da Itália onde se exige três anos. Em relação à idade mínima para adoptar, esta é de 21 anos na Inglaterra e no País de Gales e de 25 anos na Alemanha e Espanha, onde, no caso de um casal, apenas se exige que um deles tenha pelo menos 25 anos.
Embora em todos os países exista a intervenção de organismos públicos ou similares em matéria de adopção, existem também excepções em relação a algumas situações no que respeita ao pedido de adopção.
Um despacho conjunto dos Ministérios da Justiça e da Solidariedade e Segurança Social lançou, em 1997, o Programa Adopção 2000, que procurava intervir em diversas vertentes: reforma da legislação sobre adopção, reestruturação dos serviços de adopção da segurança social, articulação entre serviços públicos e privados. Criou-se, para o efeito, um grupo coordenador, agora em fase de extinção pelo facto de os objectivos previstos terem sido alcançados.
Consideramos, no entanto, a necessidade da existência de um organismo com efectivos poderes em matéria de adopção, que estabeleça a articulação entre as áreas da Justiça e da Solidariedade Social, coordenando o funcionamento dos serviços de adopção numa perspectiva interdisciplinar.
O presente diploma introduz alterações ao regime jurídico da adopção numa perspectiva de reforço dos direitos das crianças e cria um organismo responsável pela adopção.
Por outro lado, a exclusão do direito de adoptar a casais que vivam em união de facto, que decorria do n.º 1 do artigo 1979.º do Código Civil, encontra-se agora revogado pela disposição da alínea e) artigo 3.º da Lei n.º 135/99, pelo que se impõe a actualização daquela norma.
Os casais do mesmo sexo que vivem em união de facto são também abrangidos pelo presente projecto de lei. Um conjunto considerável de estudos realizados em diversos paí

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ses demonstra que não há diferenças significativas de desenvolvimento social e psíquico entre crianças em famílias homossexuais e as outras. Estes estudos desmistificaram, por exemplo, as ideias de que existam diferenças, nestas crianças, em termos do desenvolvimento da sua identidade de género (ex. Green, Mandel, Hotvedt, Gray & Smith,1986 [Green, R; Mandel; J.B.; Hotveldt, M.E.; Gray, J. & Smith, L. (1986) Lesbian Mothers and their children: A comparison and psychiatric apparaisal. Journal of Child Psycology and Psychiatry, 24, 551]; Kirkpatrick, Smith & Roy, 1981 [Kilkpatrick, M.; Smith, C.; & Roy, R. (1981. Lesbian mothers and their children. American journal of orthopsychiatry, 51, 545-551]; Golumbok e outros, 1983 [Golumbok, S.; Spencer, A. & Rutter, M. (1983). Children in lesbian and single-parent households: Psychosexual and psychiatric appraisal. Journal of Child Psychology and Psychiatry, 24, 551], da sua orientação sexual (Bozet, 1980 [Bozet, F. W. (1980) Gay fathers: How and way they disclose their homosexuality to their children. Family relations, 29 (2), 173-179], 1987 [Bozet, F. W. (1987). Gay fathers. In F. W. Bozet (Ed.), Gay and lesbian parents (pp.3-22). New York: Praeger], 1989 [Bozet, F. W. (1989). Fathers who are gay. In R. Kus (Ed.), Helping Gay and lesbian client: A psychosocial approach from gay and lesbian perspectives. Boston: Alyson] ou nas suas relações sociais, seja com outras crianças, seja com outros adultos (ex. Golombok e outros, 1983; Green e outros, 1986; Harris &Turner, 1985/86 [Harris, M. B. & Turner, P. H. (1985-1986). Gay and lesbian parents. Journal of homosexiality, 12 (2), 101-113].
A verdade é que, de entre a abundância de estudos realizados, "nenhuma base científica confirma que os gays ou as lésbicas não sejam pais apropriados, ou que o desenvolvimento psicosocial das suas crianças seja comprometido, em qualquer aspecto que seja" (Patterson 1995) [Paterson. Lesbian and Gay Parentig, Associação Americana de Psicologia, 1995]. De salientar também que a existência de crianças de famílias homossexuais é já hoje uma realidade social, também em Portugal, que deve, portanto, ter reflexo legislativo. Embora o facto não esteja estudado no nosso país, em França calcula-se que 7% dos gays e 11% das lésbicas têm filhos a seu cargo (Éric Dubreuil, Des Parents de Même Sexe, 1998). Vários estudos indicam também que as famílias homossexuais não deixam de proporcionar às crianças referências masculinas ou femininas, tal como acontece no caso das famílias monoparentais, que podem já adoptar, de acordo com a lei portuguesa. As crianças têm sempre objectos de identificação vária e saber gerir as diferenças passa por se aceitar crianças que vivem em contextos diferentes. O afecto, a confiança, o conforto, são questões essenciais na construção da identidade de uma criança. E essas referências podem acontecer em qualquer família independentemente da orientação sexual das pessoas que a constituem, preceito que está na base da legislação de cinco estados norte-americanos e da recente aprovação de legislação que permite a adopção por casais do mesmo sexo, tanto na Holanda como na comunidade autónoma de Navarra. Na Catalunha e em Valência, as autoridades regionais preparam legislação no mesmo sentido.
Nestes termos, os Deputados do Bloco de Esquerda apresentam o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.º

Os artigos 1973.º, 1978.º, 1979.º e 1981.º do Código Civil passam a ter a seguinte redacção:

"Artigo 1973.º
(Constituição)

1 - A adopção constitui-se por decisão judicial, que deve ter sempre em conta os interesses do adoptando.
2 - Para iniciar o processo de adopção é necessária uma proposta prévia de uma entidade pública, à excepção dos seguintes casos:

a) O adoptando ser parente em terceiro grau do adoptante por consaguinidade ou afinidade.
b) O adoptando ser filho do cônjuge ou convivente em união de facto.
c) O adoptando estar há mais de um ano acolhido legalmente pelo adoptante ou estar sob a sua tutela pelo mesmo período de tempo.

3 - Nos casos excepcionais do número anterior podem os interessados requerer a adopção directamente junto do tribunal competente em matéria de família.
4 - O processo será instruído com um inquérito, que deverá incidir, nomeadamente, sobre a personalidade e a saúde do adoptante e do adoptando, a idoneidade do adoptante para criar e educar o adoptando, a situação familiar em termos afectivos e económicos do adoptante e as razões determinantes do pedido de adopção.

Artigo 1978.º
(Confiança com vista a futura adopção)

Com vista a futura adopção, o tribunal pode confiar o menor a pessoa singular ou a instituição em qualquer das situações seguintes:

a) (...)
b) (...)
c) (...)
d) (...)
e) Se os pais do menor acolhido por um particular ou por uma instituição não cumprirem os deveres consignados no artigo 1978.º-A durante os seis meses que precederam o pedido de confiança.

Artigo 1979.º
(Quem pode adoptar plenamente)

1 - Podem adoptar plenamente duas pessoas casadas e não separadas judicialmente de pessoas e bens ou de facto, ou duas pessoas a viver em união de facto, se uma delas tiver pelo menos 25 anos de idade.
2 - Pode ainda adoptar plenamente quem tiver mais de 25 anos, ou mais de 21 anos no caso do adoptando ser filho do cônjuge, ou do convivente em união de facto, do adoptante.
3 - Só pode adoptar plenamente quem não tiver mais de 55 anos à data em que o menor lhe tenha sido confiado, salvo se o adoptando for filho do cônjuge ou do convivente em união de facto, do adoptante.
4 - Excepcionalmente, quando motivos ponderosos o justifiquem, pode adoptar plenamente quem tiver menos de 60 anos à data em que o menor lhe tenha sido confiado, desde que não seja superior a 55 anos a diferença de idades entre o adoptante e o adoptando ou, pelo menos, entre este e um dos cônjuges ou um dos conviventes em união de facto que figuram como adoptantes.

Artigo 1981.º
(Consentimento para a adopção)

1 - (...)

a) (...)
b) (...)

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c) Dos pais do adoptando, ainda que menores, salvo se inibidos do exercício do poder paternal por sentença transitada em julgado ou se tiver havido confiança judicial.
d) ........

2 - (...)
3 - (...)

a) (...)
b) (...)
c) (Revogado)"

Artigo 2.º

É aditado ao Código Civil o artigo 1978.º-A com a seguinte redacção:

"Artigo 1978.º-A
(Deveres dos pais biológicos de crianças acolhidas por particulares ou instituições)

1 - Os pais dos menores acolhidos por um particular ou por uma instituição têm os seguintes deveres:

a) Manter contactos regulares, directos e pessoais com os menores, de forma a não quebrar os vínculos afectivos próprios da filiação;
b) Interessar-se, com regularidade, junto das pessoas ou entidades de acolhimento sobre a situação dos seus filhos;
c) Manifestar a vontade inequívoca de tornar a viver com os filhos, demonstrando, para tal, empenhamento em providenciar as condições materiais e afectivas que permitam uma vida em comum.

2 - É da responsabilidade das instituições garantir condições que permitam a regularidade dos contactos previstos na alínea a) do ponto anterior, em relação aos pais em regime prisional.

Artigo 3.º
(Organismo responsável pela adopção)

É criado um organismo interministerial responsável pela adopção, no âmbito das áreas governativas da Justiça, da Solidariedade e da Segurança Social.

Artigo 4.º
(Funções)

O organismo enunciado no artigo anterior tem as seguintes funções:

1 - Coordenar a actividade dos núcleos interdisciplinares de menores e adopção, existentes em cada distrito.
2 - Definir grandes linhas de orientação em matéria de adopção que privilegiem as relações afectivas às relações biológicas, no sentido da sobreposição dos interesses dos adoptandos a quaisquer outros.
3 - Estabelecer a articulação com todos os ministérios e sectores intervenientes, nomeadamente Justiça, Segurança Social, Saúde, Instituições Particulares de Solidariedade Social.
4 - Desenvolver meios que possibilitem, no mais curto espaço de tempo, a entrega das crianças adoptáveis aos candidatos a adoptantes.
5 - Simplificar os procedimentos, no período de pré-adopção, desde os inquéritos à elaboração de relatórios.
6 - Planear e implementar a criação de novos centros de acolhimento transitório e de emergência para crianças em risco, na perspectiva do seu encaminhamento para adopção.

Artigo 5.º
(Regulamentação)

A presente lei será regulamentada no prazo de 60 dias após a sua entrada em vigor.

Assembleia da República, 22 de Janeiro de 2001. - Os Deputados do BE: Helena Neves - Francisco Louçã.

PROJECTO DE LEI N.º 351/VIII
ALTERA A LEI N.º 170/99, DE 18 DE SETEMBRO (ADOPTA MEDIDAS DE COMBATE À PROPAGAÇÃO DE DOENÇAS INFECTO-CONTAGIOSAS EM MEIO PRISIONAL)

A incidência de doenças infecto contagiosas em meio prisional continua a ser extremamente elevada no nosso país.
Uma realidade preocupante que é reconhecida por todos e que, apesar da ausência, ainda, de estudos caracterizadores e dados rigorosos sobre a situação, reclama assim, e reconhece o próprio Governo, a adopção de novos passos e medidas inovadoras capazes de suster uma realidade que corre o risco de se tornar incontrolável, a curto prazo.
A lei n.º 170/99, de 18 de Setembro, que teve na sua origem uma iniciativa legislativa de "Os Verdes" veio procurar dar resposta a este problema e propor, com respeito pelos direitos, liberdades e garantias dos reclusos, um conjunto de medidas que visavam precisamente inverter esta situação nas prisões e prevenir, dentro delas, a propagação de doenças infecto-contagiosas.
Medidas várias que correspondiam, muitas delas, a recomendações do Provedor de Justiça, constantes nos seus relatórios sobre as prisões dirigidos à Assembleia da República.
Medidas positivas, mas que se revelam contudo insuficientes e que no tocante à questão da distribuição e troca de seringas não foi possível, como então pretendíamos, tomar. É, pois, essa medida que agora nos propomos retomar e aprofundar, tal aconselha a experiência.
Reconhece-se, assim, que o problema da droga existe e é um dos mais delicados com que os sistemas prisionais se confrontam.
Assume-se que circula em Portugal, como acontece aliás na generalidade dos países, droga dentro das prisões. Constata-se ainda o facto de a toxicodependência atingir particularmente os grupos de reclusos mais jovens e ser uma realidade em termos de saúde preocupante nas prisões. Realidade essa de saúde intimamente ligada e ampliada, pela sua incidência, na evolução de doenças infecto-contagiosas como a sida, a tuberculose ou a hepatite B, que se situam a níveis alarmantes entre a população prisional.
Reflecte-se, por último, de modo sustentado sobre uma realidade que reclama, com cuidados embora, uma resposta institucional diferente da que tem sido dada e que permita minimizar os riscos que resultam da actual partilha de seringas por vários reclusos.
Uma medida que propomos, a troca de seringas em meio prisional, de há muito constante nas recomendações do Provedor da Justiça, presente no relatório da Comissão Nacional de Luta Contra a Sida, e que o último Relatório Anual Sobre a Evolução do Fenómeno da Droga na União Europeia, identifica em países como a Espanha ou a Alemanha como medida experimental em instalações prisionais, numa tentativa de redução de riscos.
O que se propõe, em concreto, com o presente projecto de lei é permitir a criação de locais protegidos, dentro dos

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quais o recluso se possa, em segurança, injectar. Compartimentos, onde à entrada o recluso receberá uma seringa para utilização, que restituirá à saída, ficando assim ressalvada a questão da segurança, o argumento sistematicamente invocado para a não adopção desta medida.
Uma proposta que não dispensa, antes pressupõe, o acompanhamento médico do recluso toxicodependente pelo Serviço de Prevenção e Tratamento da Toxicodependência, sobre o qual recai responsabilidade de, em articulação com os serviços de saúde da respectiva Direcção Regional, acompanhar este doente.
Assim, as Deputadas abaixo assinadas do Grupo Parlamentar Os Verdes apresentam, nos termos regimentais e constitucionais aplicáveis, o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.º

É aditado o artigo 5.º-A, à Lei n.º 170/99, de 18 de Setembro, com a seguinte redacção:

"Artigo 5.º-A
(Distribuição de seringas)

1 - Aos reclusos toxicodependentes que o solicitarem serão fornecidas seringas para consumo de estupefacientes por via endovenosa.
2 - Os estabelecimentos prisionais devem criar, em articulação com os respectivos Serviços Regionais de Saúde, compartimentos especificamente vocacionados para que os toxicodependentes possam consumir estupefacientes em condições de higiene e segurança.
3 - Os compartimentos a que se refere o número anterior devem dispor de material esterilizado e de assistência de técnicos de saúde.
4 - Para efeitos do n.º 1 do presente artigo, a entrega da seringa é efectuada à entrada do compartimento, devendo o recluso toxicodependente restituí-la à saída do mesmo.
5 - A aplicação do disposto do n.º 1 do presente artigo, está dependente do consentimento do responsável do Serviço de Saúde Prisional.
6 - O consentimento é dado sempre que se coloque a necessidade de redução de riscos e prevenção de danos".

Artigo 2.º

A presente lei entra em vigor 60 dias após a sua publicação.

Palácio de São Bento, 23 de Janeiro de 2001. - As Deputadas de Os Verdes: Isabel Castro - Heloísa Apolónia.

PROJECTO DE LEI N.º 352/VIII
INTERVENÇÃO DE FORÇAS MILITARES PORTUGUESAS NO ESTRANGEIRO

Exposição de motivos

O envolvimento de contingentes militares portugueses no estrangeiro, por princípio sempre determinado em nome do superior interesse nacional, constitui, não apenas um importante corolário natural das directrizes constitucionais que presidem à definição da política externa e de defesa nacional do Estado, como um decisivo instrumento da prossecução dos compromissos assumidos por Portugal na ordem internacional.
Com efeito, é também através desse envolvimento que Portugal participa activamente no estabelecimento de um sistema de segurança colectiva, com vista à criação de uma ordem internacional capaz de assegurar a paz e a justiça nas relações entre os povos, desiderato proclamado, desde logo, no artigo 7.º da Constituição da República Portuguesa.
A transcendente importância de que o envolvimento de contingentes militares portugueses no estrangeiro se reveste é sobejamente evidenciada nas operações de manutenção e de restabelecimento de paz em que as Forças Armadas Portuguesas têm estado abnegadamente envolvidas nos últimos anos, primeiro em Angola e Moçambique, depois na Bósnia Herzegovina e no Kosovo e, mais recentemente, em Timor Leste.
Não oferece dúvida, por conseguinte, a pertinência de o legislador constituinte ter consagrado, aquando da quarta revisão da Lei Fundamental, aprovada pela Lei Constitucional n.º 1/97, de 20 de Setembro, na alínea j) do seu artigo 163% como competência de fiscalização política da Assembleia da República quanto a outros órgãos, o acompanhamento do envolvimento de contingentes militares portugueses no estrangeiro.
Esta inovação, de largo alcance político-constitucional tem em vista assegurar uma participação plena e efectiva do Parlamento no que ao envolvimento de contingentes, militares portugueses no estrangeiro diz respeito, quer na fase prévia a decisão quer em todas as circunstâncias que rodeiem de forma relevante esse envolvimento.
Através dela, o legislador constituinte erigiu como questão de regime o envolvimento de contingentes militares portugueses no estrangeiro, remetendo embora para a lei a delimitação da sua extensão e alcance exactos do papel da Assembleia da República no processo.
O texto consagrado na Lei Fundamental, tão amplo no seu alcance, revelou-se também prudente devido ao carácter dinâmico e relativamente recente do problema do envolvimento de contingentes militares portugueses no estrangeiro e, em todo o caso, a extrema diversidade de situações a que pode respeitar.
Passados mais de três anos, ao longo dos quais, como já se referiu, sempre estiveram envolvidos contingentes militares portugueses no estrangeiro, a referida norma da lei fundamental, apesar de literalmente reiterada na Lei de Defesa Nacional e das Forças Armadas, com a redacção dada pela sua quinta alteração, aprovada pela Lei Orgânica n.º 3/99, de 18 de Setembro, não encontra ainda a sua regulação cabalmente dilucidada, nem o seu alcance temporal devidamente delimitado, circunstância que, aliada à inexistência de instrumentos jurídicos densificadores, tem justificado alguma doutrina considerar estar-se na presença de uma inconstitucionalidade por omissão, a qual os Deputados subscritores da presente lei intentam preencher.
Assim, a presente lei estabelece, como princípio geral, que toda a decisão de envolver contingentes militares portugueses no estrangeiro é comunicada previamente à Assembleia da República para efeitos de apreciação, nos termos do seu Regimento.
Em qualquer caso, o Governo deve manter a Assembleia da República permanentemente informada sobre o envolvimento de contingentes militares portugueses no estrangeiro, comunicando-lhe, designadamente, e relativamente a esse envolvimento, os pedidos efectuados por organizações internacionais de que Portugal faça parte, os projectos de decisão ou de proposta, os meios militares envolvidos ou a envolver e a previsível duração da missão, bem como os elementos, informações e publicações oficiais considerados úteis e necessários para o exercício do direito de acompanhamento.
Finalmente, institui-se a obrigação de, sempre que se encontrem envolvidos contingentes militares portugueses no

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estrangeiro, o Governo apresentar à Assembleia da República um relatório semestral que permita o acompanhamento desse desenvolvimento.
Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, os Deputados abaixo assinados do Grupo Parlamentar do Partido Social Democrata apresentam o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.º
Contingentes, militares portugueses no estrangeiro

1 - A participação da Assembleia da República no envolvimento de contingentes militares portugueses no estrangeiro em missões humanitárias e de paz assumidas pelas organizações internacionais de que Portugal faça parte; desenvolve-se, quer antes de ser tomada a decisão final de início ou termo da intervenção quer com carácter permanente, no decurso das operações dela decorrentes, nos termos da presente lei e do seu Regimento.
2 - Para os efeitos do disposto no número anterior, o envolvimento de contingentes militares portugueses no estrangeiro abrange as seguintes modalidades:

a) Missões humanitárias e de evacuação;
b) Missões de manutenção da paz;
c) Missões de restabelecimento da paz ou de gestão de crises que impliquem ou possam implicar, em qualquer caso, a utilização de forças em acções militares.

Artigo 2.º
Processo de envio

A decisão de envolver contingentes militares portugueses no estrangeiro é comunicada previamente à Assembleia da República para efeitos de apreciação e posterior acompanhamento.

Artigo 3.º
Informação à Assembleia da República

1 - O Governo deve manter a Assembleia da República permanentemente informada sobre o envolvimento de contingentes militares portugueses no estrangeiro, comunicando-lhe, designadamente:

a) Os pedidos efectuados por organizações internacionais de que Portugal faça parte, solicitando esse envolvimento acompanhados da respectiva fundamentação;
b) Os projectos de decisão ou de proposta desse envolvimento;
c) Os meios militares envolvidos ou a envolver, o tipo e grau dos riscos envolvidos e a previsível duração da missão;
d) Os elementos, informações e publicações oficiais considerados úteis e necessários para monitorização desse envolvimento.
2 - Sempre que se encontrem envolvidos contingentes militares portugueses no estrangeiro, o Governo apresenta à Assembleia da República um relatório semestral circunstanciado desse envolvimento, sem prejuízo de outras informações pontuais ou urgentes que lhe sejam solicitadas.

Palácio de São Bento, 23 de Janeiro de 2001. - Os Deputados do PSD: Durão Barroso - Carlos Encarnação - Luís Marques Guedes - António Capucho - Henrique Rocha de Freitas.

PROJECTO DE LEI N.º 353/VIII
CRIAÇÃO DE UM OBSERVATÓRIO NACIONAL DOS EFEITOS DAS ALTERAÇÕES CLIMÁTICAS

Exposição de motivos

O aquecimento global é indubitavelmente um dos mais sérios problemas ambientais deste milénio. Assim sendo, a certeza do aumento da temperatura média do planeta e da consequente subida do nível do mar assumem contornos de problemática política que deverá exigir uma atenção especial da Assembleia da República e do Governo.
Portugal, pelas suas características geográficas, encontra-se mais exposto aos riscos de destruição de zonas ribeirinhas, de mais inundações, de desaparecimento de aglomerados populacionais, enfim, de todos os efeitos nocivos do aumento dos gases que estão na origem do "efeito de estufa".
Estamos perante uma questão que é responsabilidade de toda a comunidade internacional. Assim sendo, deve Portugal, para além de cumprir os compromissos assumidos em Quioto, constantes da Agenda de Buenos Aires e confirmados em Bona, avançar para uma forma mais ponderada de estudo e análise do fenómeno do aquecimento climático, por forma a reduzir os seus custos sociais, ambientais e económicos.
Portugal, através do seu governo, em 1998, demonstrou estar atento ao fenómeno das alterações climáticas quer pelos seus efeitos estritamente ambientais quer económico-sociais pelas necessárias políticas de redução da emissão de gases ao criar, na dependência do Ministério do Ambiente e do Ordenamento do Território, uma Comissão Inter-Ministerial para as Alterações Climáticas.
Contudo, ao longo dos últimos meses, tem-se assistido à apresentação pública de diversos trabalhos de investigação científica neste domínio, assim como a reportagens levadas a cabo por órgãos de comunicação social que, por um lado, pela sua pertinência deveriam ser objecto de uma apreciação cuidada e servir para fundamentar o acompanhamento político desta situação e, por outro lado, despertam a curiosidade, nalguns casos o receio, da opinião pública nacional.
Assim, entende-se que a elaboração de uma estratégia nacional para fazer face às alterações climáticas deverá resultar de um esforço alargado de todos os agentes científicos, universitários e técnicos deste domínio, mas institucionalmente concentrado num só órgão de acompanhamento, quer do Governo quer da Assembleia da República.
A consideração, pela Assembleia da República, do fenómeno do aquecimento climático como prioridade nacional, confere uma relevância política particular a esta questão, permitindo mesmo uma afectação dos meios orçamentais julgados necessários.
Uma problemática tão actual e de contornos ambientais, sociais e económicos tão consideráveis deve exigir, só por si, o mais lato acompanhamento pelos titulares dos órgãos de soberania e o maior dos consensos para o seu combate nacional.
A criação de um Observatório Nacional contribuirá para aproximar as opções políticas nacionais, neste domínio, das europeias e salvaguardará decisivamente a imperiosa necessidade de integrar as políticas sectoriais nas opções ambientais de fundo.
Destarte, pretende-se com o presente projecto criar um Observatório Nacional que estude e analise com a profundidade científica e ambiental necessárias as mutações climáticas e os consequentes efeitos em Portugal, nos Açores e Madeira, envolvendo as demais entidades em razão da matéria e servindo ainda como entidade que prestará aos decisores políticos um contributo decisivo para a definição correcta das medidas a tomar neste domínio.
Deverá caber ao Governo a determinação do local para a sede, a composição, os mecanismos de designação dos mem

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bros e o regulamento de funcionamento do supra mencionado Observatório Nacional.
Nestes termos, os Deputados abaixo assinados do Grupo Parlamentar do Partido Socialista apresentam, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.º

São reconhecidas como prioridades nacionais a luta contra a intensificação do efeito estufa e a prevenção dos riscos associados às alterações climáticas.

Artigo 2.º

É criado um Observatório Nacional dos efeitos inerentes às alterações climáticas em Portugal Continental e nos Arquipélagos dos Açores e da Madeira.

Artigo 3.º

1 - O Observatório Nacional terá por funções a recolha, a análise e a difusão de toda a informação, estudos e pesquisas sobre os riscos associados às alterações climáticas ocorridas em Portugal Continental, nos Açores e Madeira.
2 - Para o cumprimento dos objectivos propostos no número anterior pode o Observatório Nacional agir em articulação com outros organismos públicos, institutos e organizações não governamentais que tenham idêntico objecto de intervenção.

Artigo 4.º

1 - É elaborado, anualmente, pelo Observatório Nacional um relatório pormenorizado sobre os efeitos em Portugal Continental, Açores e Madeira das alterações climáticas, sendo o mesmo entregue ao Ministro do Ambiente e do Ordenamento do Território e ao Presidente da Assembleia da República.
2 - O relatório anual pode conter recomendações sobre as medidas consideradas necessárias para a prevenção e redução dos riscos associados ao aquecimento climático.

Artigo 5.º

A sede, a composição, os mecanismos de designação dos membros e o regulamento de funcionamento do Observatório Nacional são fixados pelo Governo, nos 90 dias subsequentes à aprovação do presente projecto.

Palácio de São Bento, 25 de Janeiro de 2001. - Os Deputados do PS: Ricardo Castanheiro - Jamila Madeira - Afonso Candal - Gonçalo Almeida Velho - Bruno Almeida - Sónia Fertuzinhos - Filipe Vital - Casimiro Ramos - Maria Santos - Francisco Torres - Francisco de Assis - Ana Catarina Mendonça - António Galamba - Dinis Costa - e mais uma assinatura ilegível.

PROPOSTA DE LEI N.º 53/VIII
(REFORÇA AS GARANTIAS DO CONTRIBUINTE E A SIMPLIFICAÇÃO PROCESSUAL, REFORMULA A ORGANIZAÇÃO JUDICIÁRIA TRIBUTÁRIA E ESTABELECE UM NOVO REGIME GERAL PARA AS INFRACÇÕES TRIBUTÁRIAS)

Relatório e parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias

1 - Enquadramento

Recentemente, a Assembleia da República deliberou acerca da proposta e projectos de lei sobre a reforma dos impostos directos (IRS e IRC) e matérias conexas, nomeadamente alterações da Lei Geral Tributária. Estas iniciativas foram depois consagradas em texto de substituição proposto pela Comissão de Economia, Finanças e Plano, que foi aprovado em votação na especialidade e em votação final global em Dezembro de 2000.
O Governo e os diversos grupos parlamentares manifestaram-se então acerca do que entendiam ser os próximos passos necessários na reforma fiscal. A proposta de lei agora em apreciação responde à prioridade do Governo que, depois das alterações introduzidas nos impostos directos, entendeu que uma nova definição das infracções tributárias, a alteração da organização judiciária tributária e uma ampliação dos direitos dos contribuintes dentro do novo enquadramento processual, deveriam ser os passos seguintes no processo de reforma fiscal.
O Governo anunciou - e já foram apresentados e admitidos na Assembleia da República projectos de lei nessa mesma matéria - que, em breve, apresentará uma nova proposta acerca da reforma da tributação do imobiliário.

2 - Organização da proposta

O texto da proposta de lei inclui os seguintes capítulos:

- Capítulo I, que define o Regime Geral das Infracções Tributárias, que é incluído em anexo, dele fazendo parte integrante,
- Capítulo II, trata da organização judiciária tributária,
- Capítulo III, fixa as garantias do contribuinte e modifica a organização processual.

O Regime Geral das Infracções Tributárias, que constitui o Capítulo I, é a parte mais desenvolvida da presente proposta de lei. Substitui a legislação em vigor: Decretos-lei n.os 45/89, 376-A/89 e 20-A/90, e partes do Decreto-Lei n.º 394-B/84, do Código do Processo Tributário e da Lei Geral Tributária. Assim, trata-se de uma alteração em profundidade, que revoga e substitui o Regime Jurídico das Infracções Fiscais Aduaneiras e o Regime Jurídico das Infracções Fiscais Não Aduaneiras, unificando o direito penal tributário.
Reformulam-se neste Capítulo as definições de crimes de fraude fiscal e de abuso de confiança fiscal, introduzindo-se um novo crime de fraude fiscal qualificada.
O Capítulo II altera a organização judiciária tributária, passando a integrar organicamente os tribunais tributários no Ministério da Justiça e modificando a definição da competência para a cobrança coerciva de receitas tributárias cobradas pelas Câmaras de Lisboa e do Porto.
O Capítulo III determina a simplificação de regras processuais e define os direitos de defesa dos contribuintes, incluindo ainda a determinação de medidas especiais para a recuperação de processos atrasados.

3 - Principais inovações introduzidas pela proposta

São as seguintes as principais alterações introduzidas pela proposta de lei:

Capítulo I, Regime Geral das Infracções Tributárias

- São revogados os Decretos-lei n. os 45/89, 376-A/89 e 20-A/90, e alterados o Decreto-Lei n.º 394-B/84, o Código do Processo Tributário e a Lei Geral Tributária.
- Unifica-se o conceito de fraude fiscal, nomeadamente relacionando-o com as infracções aduaneiras.
- Definem-se as penas aplicáveis aos crimes tributários.

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- Reformulam-se as definições de crimes de fraude fiscal e de abuso de confiança.
- Define crimes contra a Segurança Social, incluindo o abuso de confiança.
- Introduz-se um novo crime de fraude fiscal qualificada.
- Anula-se a possibilidade de cúmulo jurídico entre as penas de multa e de prisão nos casos de crime, formulando-as alternativamente.
- Define a obrigação de qualquer autoridade judiciária de dar conta, a órgão competente da administração tributária, de todo o indício de crime tributário estabelecido em qualquer outro âmbito de actuação.
- Define o delito de desobediência qualificada em relação a recusa de obediência quanto a ordem ou mandato legítimo regularmente comunicado por autoridades competentes em matéria de derrogação do sigilo bancário.
- Define a pena aplicável a violação do segredo fiscal.

Capítulo II, organização judiciária tributária

- É alterado o Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais e a Lei das Finanças Locais.
- Os tribunais tributários deixam de depender do Ministério das Finanças e passam a depender do Ministério da Justiça.
- É reposta a competência das Câmaras de Lisboa e Porto para procederem à cobrança coerciva das receitas tributárias por si cobradas, sendo definido um período de transição em relação ao regime actual.

Capítulo III, garantias do contribuinte e organização processual

- É alterado o Código de Procedimento e de Processo Tributário.
- Simplifica-se a apresentação de petição no processo de impugnação.
- Reformulam-se prazos e regras de apreciação dos processos.
- Altera-se e simplifica-se o procedimento para a inquirição de testemunhas, bem como as regras de notificação.
- Determina-se, em alguns casos, o levantamento das garantias apresentadas pelos contribuintes para suspender a execução.
- Simplifica-se o recurso ao arresto, nos casos em que o contribuinte tenha feito repercutir sobre terceiros o imposto.
- São alterados os prazos e simplificados os procedimentos em alguns dos processos de reclamação.
- Abandona-se o sistema de venda de bens penhorados por leilão e utiliza-se em exclusivo o sistema de proposta em carta fechada.
- São definidos os casos em que a venda de bens penhorados pode proceder por negociação particular.
- As entidades não residentes submetidas a regime fiscal mais favorável ou cujo regime não permite identificar categoricamente o detentor efectivo do capital são excluídas do direito de apresentarem proposta de compra de bens penhorados.
- São definidas medidas especiais para a recuperação de processos atrasados há mais de três anos.

4 - Parecer

Em consequência, conclui-se que:

1 - A proposta de lei n.º 53/VIII está em condições de subir a Plenário.
2 - Deve realizar-se, com a brevidade necessária, audições com o Ministro da Justiça, o Ministro das Finanças e outras entidades competentes em função da matéria em apreço, para tratar, em sede de especialidade, de esclarecimentos que sejam pedidos ou de modificações que venham a ser propostas, antes da votação final na comissão do texto que venha a ser submetido a Plenário.
Os grupos parlamentares reservam a sua posição para o debate em Plenário.

Palácio de São Bento, 25 de Janeiro de 2001. - O Deputado Relator, Francisco Louçã - O Presidente da Comissão, Jorge Lacão.

Nota: O relatório e o parecer foram aprovados por unanimidade (PS, PSD, PCP, CDS-PP e BE).

Relatório e parecer da Comissão de Economia, Finanças e Plano

I - Nota prévia

A apresentação da proposta de lei n.º 53/VIII do Governo que "Reforça as garantias do contribuinte e a simplificação processual, reformula a organização judiciária tributária e estabelece um novo regime geral para as infracções tributárias" foi efectuada ao abrigo da alínea d) do n.º 1 do artigo 197.º da Constituição da República Portuguesa e dos artigos 130.º e 137.º do Regimento da Assembleia da República.
Por despacho de S. Ex.ª o Sr. Presidente da Assembleia da República, a citada proposta de lei baixou às Comissão Parlamentares de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias e Economia, Finanças e Plano para, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, emissão do competente relatório e parecer.
A discussão na generalidade da proposta de lei vertente encontra-se agendada para o próximo dia 25 de Janeiro de 2001.

II - Do objecto da proposta de lei n.º 53/VIII

Através da proposta de lei n.º 53/VIII, composta por III Capítulos, visa o Governo estabelecer um novo regime geral para as infracções tributárias, reformular a organização judiciária tributária e reforçar as garantias do contribuinte e a simplificação processual, nos seguintes termos:

2.1. Capítulo I (Das Infracções Tributárias)

Com vista a conferir maior unidade e coerência interna ao Direito Penal Tributário, aprova um Novo Regime para as Infracções Tributárias que resulta da fusão do Regime Jurídico das Infracções Fiscais Aduaneiras, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 376-A/89, de 25 de Outubro, e do Regime Jurídico das Infracções Fiscais Não Aduaneiras, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 20-A/90, de 15 de Janeiro, prevendo também no mesmo texto legal disposições sancionatórias avulsas.
Do Novo Regime Geral para as Infracções Tributárias, importa destacar os seguintes aspectos:

a) Acaba com a penalidade cumulativa de prisão e multa nos casos de crime, cominando-as sempre como alternativas;
b) Consagra com clareza o carácter especial das infracções tributárias;
c) Clarifica as regras relativas ao concurso de infracções;
d) Põe termo à regra da responsabilidade cumulativa das pessoas colectivas e dos seus administradores e representantes em matéria contra-ordenacional tributária;
e) No que se refere às infracções aduaneiras, procede a uma reformulação dos crimes de contrabando e

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contra-ordenação de descaminho, aproximando-os do crime de fraude fiscal e unifica a disciplina penal e contra-ordenacional dos impostos especiais de consumo, integrando no novo Regime Geral o crime de introdução fraudulenta no consumo e a contra-ordenação de introdução irregular;
f) No domínio fiscal, prevê um tipo autónomo de burla fiscal, introduz como novo tipo de crime a fraude fiscal qualificada, dirigida aos casos de maior gravidade, e reformula os crimes de fraude fiscal e de abuso de confiança fiscal;
g) Limita muitos dos tipos penais a um valor mínimo das mercadorias objecto dos crimes aduaneiros ou da prestação tributária em falta para os crimes fiscais, convertendo os factos constitutivos desses crimes em contra-ordenação abaixo desse limite;
h) Em matéria processual, acaba com a fase de averiguações, competindo ao Ministério Público a primeira fase do processo, o inquérito, embora consagre a presunção da delegação de poderes nos órgãos competentes da administração tributária.

2.2. - Capítulo II (Da Organização Judicial Tributária)

O Capítulo II da proposta de lei n.º 53/VIII refere-se à organização judicial tributária e prevê em concreto o seguinte:

a) A integração da organização administrativa dos tribunais tributários de 1ª instância na dependência do Ministério da Justiça;
b) Acaba com a situação de algumas entidades públicas beneficiarem da reserva de um juízo dos tribunais tributários de Lisboa e Porto para conhecimento do contencioso relativo às respectivas receitas fiscais;
c) Altera o artigo 30.º, n.º 4, da Lei das Finanças Locais no sentido de deixar de aproveitar às Câmaras Municipais de Lisboa e do Porto o direito de procederem nos tribunais tributários da respectiva área à cobrança coerciva de taxas, encargos e mais-valias e restantes receitas de natureza tributária por si cobradas, passando estas a ter essa competência, continuando contudo a correr naqueles tribunais as execuções para cobrança coerciva das receitas tributárias dos Municípios de Lisboa e do Porto instauradas até 90 dias após a publicação da presente lei.

2.3. - Capítulo III (Do Reforço das Garantias do Contribuinte e da Simplificação Processual)

O Capítulo III, atinente ao reforço das garantias do contribuinte e da simplificação processual, prevê como aspectos mais significativos os seguintes:

a) Altera as regras relativas à apresentação da petição no processo de impugnação, no sentido de tornar mais célere e fácil o seu envio ao tribunal competente e o pagamento da taxa de justiça inicial;
b) Consagra um novo modo de articulação entre a introdução em juízo e a organização do processo administrativo e reformula as regras e prazos de apreciação do processo pelos órgãos periféricos locais da administração tributária, estabelecendo que, logo que recebida a petição inicial, o juiz ordena ao representante da Fazenda Pública que conteste, cabendo a este pedir ao órgão periférico local o envio daquele processo;
c) Altera as regras atinentes à inquirição de testemunhas, devendo os depoimentos ser, em princípio, gravados ou, em caso de impossibilidade, reduzidos a escrito e feitos constar em acta, cabendo a sua redacção ao juiz.
d) Estabelece que a falta de testemunha, do representante da Fazenda Pública ou de advogado, deixa de constituir motivo para adiamento da diligência;
e) Simplifica as regras de notificação e audição de testemunhas;
f) Nos casos em que a reclamação graciosa não se encontre decidida no prazo de 12 meses ou a impugnação judicial não esteja julgada em primeira instância, determina o levantamento das garantias prestadas pelo contribuinte para suspender a execução;
g) Revê as normas do Código de Procedimento e de Processo Tributário, com vista a facilitar o recurso ao arresto nas situações em que o executado tenha já retido ou repercutido sobre terceiros o imposto, sem o ter entregue nos prazos legais;
h) Flexibiliza a apresentação de declaração de substituição pelo contribuinte, evitando o esforço da reclamação graciosa, recurso hierárquico ou impugnação judicial, ainda que da declaração substitutiva resulte imposto inferior ao originariamente liquidado;
i) Revê as regras relativas aos prazos para vista do Ministério Público e para a prática de actos pelo Representante da Fazenda Pública, com vista a uma maior celeridade processual;
j) Permite a desistência pelo contribuinte sem custas do processo, quando este esteja sem decisão de primeira instância há mais de três anos e determina a criação de uma comissão destinada a identificar as causas dos actuais atrasos dos processos judiciais tributários, competindo-lhe apresentar propostas destinadas à sua supressão;
k) Por último, no quadro do processo de execução fiscal, revê o Código do Procedimento e de Processo Tributário, visando o abandono do sistema de venda de bens penhorados por arrematação em hasta pública, passando a venda a ser feita exclusivamente por meio de proposta em carta fechada, introduzindo novas regras de publicidade com vista a assegurar a transparência e rigor do processo e adaptando as normas relativas ao valor base dos bens para venda, ao local de entrega das propostas, à adjudicação dos bens e às formalidades da venda.

III - Da motivação da proposta de lei n.º 53/VIII

De acordo com os autores da proposta de lei n.º 53/VIII "O combate às infracções tributárias pressupõe um regime sancionatório justo e eficaz, que assente na fiscalização rigoroza mas selectiva dos factos tributários e do cumprimento dos deveres que impendem sobre os contribuintes", mostrando-se imprescindível para tal efeito "(...) fundir num só texto o Regime Jurídico das Infracções Fiscais Aduaneiras, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 376-A/89, de 25 de Outubro, e o Regime Jurídico das Infracções Não Aduaneiras, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 20-A/90, de 15 de Janeiro, de modo a trazer unidade de forma ao Direito Penal Tributário, juntando no mesmo texto também disposições sancionatórias avulsas (...)". A este respeito, adiantam, ainda, que "Para além da unificação formal do Direito Penal Tributário, introduzem-se por meio do novo Regime Geral Inovações de substância importantes, capazes de transformar positivamente a justiça fiscal portuguesa".

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No que concerne à organização judiciária tributária, os autores da proposta de lei vertente justificam as alterações que pretendem ver aprovadas, referindo que "a aprovação do Estatuto dos Tribunais Administrativos (...) veio consagrar no âmbito da jurisdição administrativa e fiscal um modelo de organização judiciária paralelo ao dos tribunais comuns, dando assim plena tradução à natureza jurisdicional dos tribunais administrativos e fiscais, como se impunha (...) porém, esse passo fundamental não foi suficiente para que os tribunais tributários pudesse corresponder plenamente às expectativas dos cidadãos, garantindo-lhes uma adequada defesa dos seus direitos e legítimos interesses", e concluem que não obstante as importantes alterações ocorridas a diferentes níveis "(...) continua a existir a necessidade de eliminar disfuncionalidades e introduzir aperfeiçoamentos, que se julga poderão contribuir de modo muito significativo para uma melhor justiça tributária".
Por último, de acordo com a exposição de motivos da proposta de lei em apreço, as medidas de reforço das garantias do contribuinte e de simplificação processual previstas surgem "como vertente fundamental da reforma fiscal em curso (...)".
São estas, fundamentalmente, as razões que apresentam para justificar as medidas que preconizam através da proposta de lei n.º 53/VIII e que, na sua perspectiva, contribuirão para reforçar a coerência do sistema tributário e transformar positivamente a justiça fiscal portuguesa.

IV - Do enquadramento constitucional

A Constituição da República Portuguesa consagra no seu artigo 266.º os princípios fundamentais que regem o funcionamento da administração pública, estando os órgãos e agentes administrativos obrigados a actuar, no exercício das suas funções, com respeito pelos princípios da igualdade, da proporcionalidade, da justiça, da imparcialidade e da boa fé.
Entre os direitos e garantias dos administrados, previstas no artigo 268.º da Lei Fundamental, destaca-se o estatuído no n.º 5 que estabelece "É garantida aos administrados tutela jurisdicional efectiva dos seus direitos e interesses legalmente protegidos, incluindo, nomeadamente, o reconhecimento desses direitos e interesses, a impugnação de quaisquer actos administrativos que os lesem (...)".
No que concerne aos tribunais administrativos e fiscais, é da sua competência, nos termos do artigo 212.º da Constituição da República Portuguesa, "(...) o julgamento das acções e recursos contenciosos que tenham por objectivo dirimir os litígios emergentes das relações jurídicas administrativas e fiscais".

V - Do enquadramento legal

As matérias objecto da proposta de lei n.º 53/VIII, encontram-se actualmente reguladas através de um vasto conjunto de diplomas legais, de que se destacam os seguintes:
Decreto-Lei n.º 376-A/89, de 25 de Outubro, que aprova o Regime Jurídico das Infracções Fiscais Aduaneiras;
Decreto-Lei n.º 20-A/90, de 15 de Janeiro, que aprova o Regime Jurídico das Infracções Fiscais Não Aduaneiras;
Capítulo VIII, do Código do IVA, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 394-B/84, de 26 de Dezembro;
Decreto-Lei n.º 45/89, de 11 de Fevereiro, que estabelece normas sobre os documentos que devem acompanhar as mercadorias em circulação;
O Decreto-Lei n.º 433/99, de 26 de Outubro, que aprova o Código de Procedimento e de Processo Tributário;
O Decreto-Lei n.º 129/84, de 27 de Abril, que aprova o Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais;
O Decreto-Lei n.º 374/84, de 29 de Dezembro, que estabelece disposições complementares e regulamenta o Estatuto dos Tribunais Administrativos Fiscais, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 129/84, de 27 de Abril.
O Título V, da Lei Geral Tributária, aprovada pelo Decreto-Lei n.º 398/98, de 17 de Dezembro.

VI - Parecer da Comissão de Economia, Finanças e Plano

A Comissão de Economia, Finanças e Plano é do seguinte:

Parecer

a) A proposta de lei n.º 53/VIII preenche os requisitos constitucionais, legais e regimentais para subir ao Plenário da Assembleia da República para apreciação e votação;
b) Os grupos parlamentares reservam as suas posições para o Plenário da Assembleia da República.

Palácio de São Bento, 23 de Janeiro de 2001. - O Deputado Relator, João Pedro Correia - O Presidente da Comissão, Fernando Serrasqueiro.

Nota: O relatório e o parecer foram aprovados por unanimidade (PS, PSD e CDS-PP, registando-se a ausência do PCP e do BE).

PROJECTO DE RESOLUÇÃO N.º 101/VIII
SOBRE POLÍTICA DE TRANSPORTES COLECTIVOS, PARTICULARMENTE UM NOVO REGIME DE PASSES SOCIAIS

Exposição de motivos

Na sequência do compromisso assumido pelo Grupo Parlamentar do PSD aquando da apresentação e discussão do projecto de lei n.º 316/VIII, da autoria do Grupo Parlamentar do PCP, é apresentado o seguinte projecto de resolução.
Constam dos Programas dos XIII e XIV Governos compromissos que incluem diversas medidas para aumentar a mobilidade em áreas urbanas, favorecendo a atractividade do transporte colectivo e incentivando o seu uso em alternativa ao transporte privado.
Afirma-se a aposta na articulação entre TI-TC/transporte individual e transporte colectivo, através da concepção e viabilização de uma política integrada de transportes, circulação e estacionamento.
Defende-se a criação de autoridades metropolitanas que assegurem a coordenação estratégica do sistema de transportes metropolitanos, garantindo as sua melhoria e uma boa articulação das políticas de mobilidade e acessibilidade com o ordenamento do território.
Concretamente para a Área Metropolitana do Porto - AMP, prevê-se ainda a "Alteração do sistema tarifário que integre os operadores públicos e privado e criação de um verdadeiro passe multimodal".
A filosofia emanente daqueles documentos para o sector dos transportes inclui, em suma, a "Aposta de forma clara nas articulações intermodais (...)", "Promovendo a eficiência da rede urbana (...)", anunciando como objectivo "Promover a coesão e a solidariedade internas".
No entanto, para que as boas intenções não constituam apenas meros chavões, há que tomar iniciativas e avançar

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com medidas concretas, o que não tem acontecido, graças à inércia total do Governo socialista.
Com o projecto lei n.º 316/VIII, da autoria do Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português, era apresentada a pretensão de conseguir uma maior afirmação e utilização do passe social intermodal nos transportes colectivos de passageiros, promovendo uma actualização do âmbito geográfico das coroas respectivas.
A utilização deste título, regulamentado pela última vez em 1976/77, carece de inquestionável actualização que tenha em conta a dinâmica dos últimos 20 anos, ultrapassando os desajustamentos entretanto instalados entre os passes sociais existentes e as reais necessidades das populações que utilizam os transportes públicos.
O alargamento da linha das coroas a novos núcleos residenciais, em regra mais distantes dos locais de actividade profissional, visa não apenas ampliar o universo dos utentes com acesso a passe, mas também a servir melhor as populações utilizadoras, nomeadamente através da redução dos encargos a suportar pelas famílias.
Reconhecendo a importância e bondade da medida legislativa discutida, bem como a necessidade eminente de se proceder a ajustamentos no sistema em vigor, entendeu o Grupo Parlamentar do PSD apresentar o presente projecto de resolução, dado que se suscitam algumas questões relevantes que importa enquadrar.
Desde logo, a questão da vocação dos órgãos de soberania e da nacionalidade na utilização dos meios existentes, assim como a necessidade de abranger outras áreas geográficas que não apenas a Área Metropolitana de Lisboa.
Em nosso entender, a definição de uma política de transportes colectivos parece tratar-se de matéria para a qual o Governo se encontra especialmente vocacionado, caindo no âmbito da sua esfera de actuação política e administrativa.
Na verdade, o Governo dispõe de instrumentos e mecanismos que melhor possibilitam ajustar as normas vigentes às novas realidades existentes, instrumentos e mecanismos esses que não estando directamente ao alcance da Assembleia da República não a devem impedir de exercer sua actividade fiscalizadora.
A tutela directa pelo Governo de diversas direcções-gerais, em cujas funções se incluem a elaboração de estudos sectoriais e pareceres, a aferição de necessidades e a estimativa de custos constitui, aliás, garante da habilitação permanente do Governo para proceder aos ajustamentos mais consentâneos com as necessidades das populações e com a realidade do País.
Depois de analisar esses estudos, de ouvir as autarquias locais e de auscultar as necessidades das populações, deve o Governo definir, com clareza, que modelo preconiza e adoptar uma política para o sector dos transportes, em coerência aliás com os objectivos que declarou ao País como seus.
Evocando o espírito do recém-comemorado "dia sem carros", é urgente promover verdadeiras alternativas ao transporte individual, incentivando a utilização dos transportes colectivos, protegendo o ambiente e melhorando a qualidade de vida de todos os portugueses que trabalham longe da sua área de residência.
Apesar de ser a grande Área Metropolitana de Lisboa aquela que mais reclama uma intervenção urgente, dado o seu crescimento exponencial nas últimas décadas, não pode a Assembleia da República esquecer a Área Metropolitana do Porto, para a qual foi prometida "a criação de um verdadeiro passe multimodal" nem tão-pouco a realidade decorrente do todo nacional.
Assim, reconhecendo a importância de uma política nacional de transportes colectivos que se pretende adequada e actual, lança-se ao Governo o desafio de a promover, convidando-o a assumir cabalmente as suas funções e em particular nesta matéria, reestruturando o sistema vigente.
Assim, nos termos das disposições regimentais e constitucionais em vigor, a Assembleia da República aprova a seguinte resolução:
A Assembleia da República recomenda propor ao Governo a tomada das seguintes medidas:

1 - Definir uma política de transportes colectivos que contemple um novo regime jurídico de passes sociais, que assegure o alargamento do âmbito geográfico dos mesmos, o aumento da intermodalidade e a contenção de custos por forma a favorecer a utilização do transporte público em detrimento do transporte individual.
2 - Que seja dada prioridade às Áreas Metropolitanas de Lisboa e Porto, saindo a regulamentação respectiva num prazo não superior a 60 dias.

Palácio de São Bento, 24 de Janeiro de 2001. - Os Deputados do PSD: Lucília Ferra - Cruz Silva - Luís Marques Guedes - Castro de Almeida - Virgílio Costa - Artur Torres Pereira.

A Divisão de Redacção e Apoio Audiovisual.

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