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2071 | II Série A - Número 063 | 02 de Junho de 2001

 

PROJECTO DE LEI N.º 455/VIII
INFORMAÇÃO GENÉTICA PESSOAL

Exposição de motivos

Com a apresentação do mapa genético do ser humano a 12 de Fevereiro deste ano, deu-se um passo fundamental para o conhecimento em biologia e medicina. A investigação genética constitui uma das promessas mais importantes para o avanço científico, para a resposta a problemas graves da vida humana e para a procura de novos procedimentos, técnicas e terapêuticas, aumentando a capacidade de diagnóstico de várias doenças.
A possibilidade de utilização da biologia molecular como meio complementar de diagnóstico, acessível à utilização pelos profissionais de saúde, é por isso simultaneamente uma oportunidade de progresso dos cuidados de saúde e uma responsabilidade para o sistema de saúde.
A regulação do uso da técnica dos testes genéticos é tanto mais importante quanto esta permite o estudo de pessoas saudáveis, na sequência de aconselhamento genético em famílias em risco ou de rastreios genéticos na população.
Os resultados de um teste genético podem oferecer informação que era desconhecida para o próprio, podem fornecer informação cujo significado não seja suficientemente claro e possa ser mal interpretado, pode fornecer informação sobre outros familiares ou modificar o seu risco para certas doenças, e pode conduzir à classificação definitiva das pessoas testadas e seus familiares em categorias de risco que permitam ou promovam a sua discriminação. Embora o Estado português se baseie ainda fortemente no princípio da solidariedade, através das prestações fornecidas pelo Serviço Nacional de Saúde e pela Segurança Social, o princípio da mutualidade tem vindo a aumentar recentemente de importância, quer na procura de seguros de vida (necessários na maioria das circunstâncias para a obtenção de crédito à aquisição de habitação própria), quer na procura de seguros de saúde (em complementaridade aos serviços de saúde públicos). As seguradoras contabilizam já de qualquer modo os seus próprios riscos, no montante dos prémios que estabelecem e que se baseiam em riscos populacionais médios. Os testes pré-sintomáticos, os únicos que permitem uma alta fiabilidade, aplicam-se no entanto apenas no caso de doenças monogénicas, as quais são muito raras. Os testes de genes de susceptibilidades para as doenças comuns (de etiologia complexa), por outro lado, não têm, na esmagadora maioria das situações, um valor predictivo que permita afirmar ou excluir um risco significativamente aumentado que seja relevante para cada caso individual.
Pelas mesmas razões e ainda pelos custos elevados que teriam para as entidades patronais, os testes genéticos deverão ter um interesse muito relativo para os empregadores. Torna-se, no entanto, também necessário regulamentar a realização de testes genéticos no trabalho, em nome do direito ao emprego e da solidariedade social, tanto mais que o consentimento informado adquire um valor muito relativo em situações de vulnerabilidade social como são as do emprego e consequente estabilidade económica.
Nomeadamente, tornam-se hoje possíveis:

a) A detecção pré-sintomática de portadores para doenças autossómicas dominantes;
b) A detecção do estado de heterozigotia para doenças autossómicas recessivas e ligadas ao sexo;
c) A detecção de genes de susceptibilidades para doenças comuns com hereditariedade complexa (predisposições herdadas).

Ora, a aplicação destes testes em pessoas saudáveis é adequada, desde que tal seja a vontade dessas pessoas, e se os testes predictivos e pré-sintomáticos estiverem indicados por razões médicas e forem precedidos e seguidos de aconselhamento genético. Mas, do mesmo modo, é indispensável estabelecer condições de acompanhamento psicológico e social no caso particular das doenças com início na vida adulta e ainda sem cura ou tratamento disponível, dado que podem ser geradas graves perturbações emocionais, familiares e sociais, se tais cuidados não acompanharem o teste.
Mais ainda: a possibilidade de detectar indivíduos saudáveis que, no futuro, poderão vir a ser afectados com uma doença grave suscita questões relevantes de ordem ética, atendendo à possibilidade de discriminação social ou económica. Pela razão inversa, diversas empresas, em particular companhias de seguros, empregadores e agências de adopção, têm procurado obter acesso privilegiado a essa informação, para minorarem os seus riscos ou determinarem procedimentos economicamente mais rentáveis. O mesmo risco existe quando médicos do trabalho facilitem às empresas com as quais têm vínculo laboral informação, que é, por definição, propriedade do indivíduo e que não pode ser divulgada sem a sua autorização explícita.
Em particular, deve ser evitado por todas as formas que considerações relativas a seguros de vida e de saúde, incluindo os respectivos critérios de selecção, influenciem negativamente as decisões de pessoas em risco de procurar e obter a realização de testes genéticos por motivos pessoais, clínicos e familiares.
Mas se é certo que no caso das doenças comuns existe quase sempre uma pequena percentagem de famílias com transmissão autossómica dominante, com risco bastante mais elevado, na grande maioria dos casos os genes envolvidos são múltiplos e em combinações variadas.
Assim sendo, pode ser complexa a interacção entre estes genes e entre eles e os factores ambientais, fazendo com que o valor predictivo destes testes seja muito pequeno, tornando-os muito incertos ou mesmo praticamente inúteis na maioria das situações, podendo mesmo ser prejudiciais, particularmente quando se trate de doenças sem cura conhecida ou em estudo, ou quando efectuados sem aconselhamento genético que permita obter informação sobre o significado real dos seus resultados. É por essa razão que, não sendo em muitos casos possível separar claramente as situações de risco um pouco aumentado ou um pouco diminuído, relativamente à população em geral, o uso de testes genéticos deve obedecer a estritas normas de acompanhamento que evitem criar situações de perturbação de comportamento, de mal estar e de receio, ou de atitudes sociais contra pessoas, nomeadamente no emprego e no acesso a garantias e direitos fundamentais.
A Convenção de Oviedo e outras resoluções do Conselho da Europa, bem como diversas recomendações das Comunidades Europeias, da OCDE, da UNESCO, da OMS, e da European Society of Human Genetics, têm vindo a apresentar recomendações para responder a estes riscos acrescidos, bem como para garantir a confidencialidade e evitar a discriminação em função do património genético. A prática clínica e de aconselhamento genético em Portugal deve seguir essas orientações.

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