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0516 | II Série A - Número 017 | 29 de Junho de 2002

 

arguidas e cuja punibilidade constitui o cerne da chamada problemática do aborto, considera-se útil, antes de proceder à subsunção jurídica das condutas apuradas, deixar consignado o esclarecimento, sobretudo necessário para quem não conhece bem os critérios de decisão e regras próprias do funcionamento dos tribunais, de que não se ignoram nem esquecem aspectos, tão polémicos quanto respeitáveis e importantes, que vão do filosófico, moral e religioso, passando pelo científico até ao social e político, e que confluem na discussão pública do problema. (...) Ao tribunal, como órgão de soberania independente, cabe, apenas, a função de administrar a justa solução do caso objecto do processo, jamais os meios ou critérios de a conseguir poderão ser outros que não a Constituição e a lei a que deve obediência, independentemente do julgamento que sobre as respectivas soluções jusnormativas qualquer cidadão é livre de fazer ou defender, democraticamente".
Por tudo isto, e na convicção de que uma sociedade que penaliza as mulheres por serem mães e também lhes impede a decisão de escolher ou não uma maternidade não é uma sociedade digna, o Bloco de Esquerda propõe uma novo enquadramento para a prática da IVG no Serviço Nacional de Saúde a pedido da mulher.
A lei actualmente existente não previne o aborto clandestino, antes acarreta para as mulheres que optam pela interrupção voluntária da gravidez não só danos físicos de abortos feitos em condições clandestinas e deficientes em termos de saúde, mas também danos psicológicos agravados pela criminalização do acto praticado.
É bem sabido que não há nenhuma contracepção totalmente eficaz e à prova de erros, e que por isso uma gravidez não desejada pode sempre ocorrer. Por outro lado, no campo das escolhas reprodutivas há factores afectivos e sociais bivalentes que tornam difícil o uso da contracepção.
Manter em vigor uma lei que arrasta as mulheres para as redes da clandestinidade e insegurança, marcando de forma dramática as de menores recursos económicos que se sujeitam a formas quase artesanais de intervenção, reflecte uma falta de sensibilidade social e uma forma desumana de enfrentar este grave problema social e de saúde pública.
É neste contexto que o reconhecimento e o respeito do direito da mulher a decidir deve orientar a nova legislação: nesse sentido, o Bloco de Esquerda defende o direito das mulheres decidirem da sua maternidade, e este direito tem de ser levado às últimas consequências sem pôr em perigo a vida das mulheres.
Assim, nos termos constitucionais e regimentais, os Deputados do Bloco de Esquerda apresentam o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.º
(Direito de optar)

Todas as mulheres têm o direito de controlar os aspectos relacionados com a sua sexualidade, incluindo a sua saúde sexual e reprodutiva, e de decidir livre e responsavelmente sobre estas questões, sem coacção, discriminação ou violência.

Artigo 2.º
(Exclusão de ilicitude do aborto)

O artigo 142.º do Código Penal passa a ter a seguinte redacção:

"1 - Não é punível o aborto efectuado por médico, ou sob a sua orientação, em estabelecimento de saúde oficial ou oficialmente reconhecido, nas seguintes situações:

a) A pedido da mulher, nas primeiras 12 semanas de gravidez;
b) No caso de existirem seguros motivos para crer que o nascituro virá a sofrer, de forma incurável, de grave doença ou malformação e for realizada nas primeiras 24 semanas com consentimento da mulher;
c) Sempre que exista perigo de vida para a mulher grávida ou de grave e irreversível lesão para a sua saúde física e psíquica e for realizado com o seu consentimento até às 16 semanas de gravidez;
d) Sempre que existirem sérios indícios de que a gravidez resultou de crime contra a liberdade e autodeterminação sexual e for realizado, com consentimento da mulher grávida, nas primeiras 16 semanas, ou nas primeiras 24 semanas, no caso da vítima ser menor ou ser incapaz por anomalia psíquica;.
e) Quando se trate de grávida toxicodependente, desde que realizado, com o seu consentimento, nas primeiras 16 semanas de gravidez;
f) No caso de mulheres grávidas portadoras de HIV (síndroma de imunodeficiência adquirida) ou afectadas por este vírus, até às 24 semanas, se for esse o consentimento da mulher;
g) No caso de fetos inviáveis, a interrupção de gravidez poderá ser feita em qualquer idade gestacional;
h) Constituir o único meio de remover o perigo de morte ou de grave e irreversível lesão para o corpo ou para a saúde física ou psíquica da mulher grávida.

2 - (...)
3 - (...)
4 - (...)"

Artigo 3.º
(Despenalização da conduta da mulher grávida)

O artigo 140.º do Código Penal passa a ter a seguinte redacção:

"1 - (...)
2 - (...)
3 - (eliminado)"

Artigo 4.º
(Objecção de consciência)

1 - Os profissionais de saúde têm o direito de invocar objecção de consciência nos casos de interrupção de gravidez e o dever de encaminhar as utentes para outros profissionais de saúde dispostos a prestar o serviço solicitado.
2 - Este direito não é contemplado em casos de emergência para a vida da grávida.

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