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4076 | II Série A - Número 100 | 05 de Junho de 2003

 

higiene e saúde no trabalho, pode ser solicitada a "realização" ou "apresentação" de testes e exames médicos a candidatos a emprego ou aos trabalhadores:

- Sempre que "tenham por finalidade a protecção e segurança do trabalhador ou de terceiros";
- "Quando particulares exigências inerentes à actividade o justifiquem".

Desde logo, não se vislumbra que haja razões suficientes para fazer estes exames fora do âmbito das competências dos serviços de medicina do trabalho. Efectivamente, se consultarmos as disposições sobre as medidas a adoptar pelo empregador em sede de medicina do trabalho (artigos 267.º e 270.º) verificamos que as "finalidades de protecção e segurança do trabalhador ou de terceiros" e as "particulares exigências inerentes à actividade" estão subjacentes, nomeadamente, às previsões do artigo 267.º, n.º 2, alínea c), e artigo 270.º, alíneas b), e) e i).
Na previsão relativa à realização de testes ou exames para protecção da segurança do trabalhador ou de terceiros pode enquadrar-se, nomeadamente, a despistagem de consumo de álcool ou droga.
Podendo o estado de embriaguez, alcoolismo ou toxicodependência determinar a "privação permanente ou acidental do uso da razão do sinistrado", será de admitir que, em algumas circunstâncias, tal estado se apresente com relevância possível à descaracterização de um acidente de trabalho (cf. artigo 7.º da Lei n.º 100197, de 13 de Setembro) [Vejam-se, em duas perspectivas diversas, os acórdãos do STJ de 5 de Junho de 1991 (in BMJ n.º 408, pág. 353) e de 15 de Fevereiro de 1995 (in BMJ n.º 444, pág. 314)].
Por isso, justifica-se que a entidade empregadora tenha cuidados especiais, em matéria de prevenção de acidentes de trabalho, cabendo aos serviços de higiene e medicina de trabalho fazer um acompanhamento integrado do trabalhador [Cf., no mesmo sentido, Silvestre Sousa - Problemática da embriaguez e da toxicomania em sede de relação de trabalho in Revista de Direito e Estudos Sociais, Ano XXIX (II da 2.ª Série), Julho-Setembro de 1987, n.º 3, pág. 417]. Para além da protecção do trabalhador está em causa, também, a protecção de terceiros (beneficiários da prestação do trabalhador ou colegas de trabalho), que podem ver atingida a sua integridade física ou, até, a sua própria vida, em resultado de uma falta de cuidado ou falta de discernimento ocasional do trabalhador.
Nestas circunstâncias, parece-nos ser legítimo submeter o trabalhador aos exames necessários no âmbito da alcoolémia ou consumo de droga, especialmente quando se perspectivem riscos para o trabalhador ou para terceiros [Em França, onde os regulamentos internos têm uma consagração específica e vinculam os trabalhadores, foi estabelecida, em determinados regulamentos, uma cláusula que proibia os trabalhadores de "entrarem no estabelecimento em estado de embriaguez, reservando-se a direcção a faculdade de submeter os trabalhadores, em caso de dúvida, a testes de alcoolémia. Por isso, se entendeu que só deveriam ser submetidos a tal exame os trabalhadores afectos a certos trabalhos ou encarregados da condução de certas máquinas (cf. Pierre Kayser - La protection de la vie privée par le droit", 3.ª Edição, 1995, pág. 269)].
O Supremo Tribunal de Justiça, que foi chamado a pronunciar-se sobre a questão de saber se uma ordem da entidade empregadora de sujeição de trabalhador a testes de alcoolémia estava de acordo com os princípios constitucionais, considerou que essa ordem era legítima e que não violava a Constituição. Foi, ainda, mais longe e considerou que a imposição da obrigatoriedade de submissão dos trabalhadores a testes de alcoolémia, através do regulamento interno, está abrangida pelo seu poder directivo e regulamentar. A recusa do trabalhador em submeter-se ao exame viola o dever de obediência e constitui justa causa de despedimento [Ac. STJ de 24 de Junho de 1998 (Proc. 243/97). Veja-se, no mesmo sentido, o Acórdão do Tribunal Constitucional de 25 de Setembro de 2002, loc. cit. pág. 17788].
Os nossos tribunais têm entendido, de forma pacífica, que o facto de existirem interesses e valores dignos de protecção social (v.g. a segurança rodoviária ou a prevenção de acidentes de trabalho) justifica uma certa compressão de direitos do trabalhador. Daí que admitam como legítima a realização de testes de alcoolémia. Pela mesma ordem de fundamentos, não vemos que a solução possa ser diferente em relação a exames para detecção de drogas.
No domínio rodoviário, o Tribunal Constitucional [Acórdão de 20 de Junho de 1995, in DR II Série de 2 de Novembro de 95, pág. 13095] teve oportunidade de considerar que "a submissão do condutor ao teste de detecção de álcool não viola o dever de respeito pela dignidade da pessoa do condutor, nem o seu direito ao bom nome e à reputação, nem o direito que ele tem à reserva da intimidade da vida privada".
Em relação aos exames no âmbito da medicina do trabalho, o Acórdão do Tribunal Constitucional de 23 de Setembro de 2002 (loc. cit. pág. 17788) é claro ao consignar que o trabalhador não pode deixar de se sujeitar a tais exames, nomeadamente quando o seu comportamento pode representar um risco para terceiros: por exemplo, "para minimizar os riscos de acidentes de trabalho de que outros trabalhadores ou o público possam vir a ser vítimas, em função de deficiente prestação por motivo de doença no exercício de uma actividade perigosa, ou para evitar situações de contágio para os restantes trabalhadores ou para terceiros, propiciados pelo exercício da actividade profissional do trabalhador". O Tribunal Constitucional concluiu, assim, que se impõe "a obrigatoriedade dessa sujeição se não revele, pela natureza e finalidade do exame de saúde, como abusiva, discriminatória ou arbitrária".
Em face dos poderes conferidos à entidade empregadora, em sede de medicina do trabalho, tenderemos a admitir que esta, exclusivamente através destes serviços, poderá realizar os exames necessários ao trabalhador [Cf. Jorge Leite, Direito do Trabalho e de Segurança Social, Lições ao 3.º ano da Faculdade de Direito, Coimbra, 1982, pág. 289. Para Bernardo G. L. Xavier (in Direito e Estudos Sociais, XXIX, 1987, n.º 2, pág. 235) "há limites à realização de exames, nomeadamente quando estes são relativos à reserva da intimidade da vida privada do trabalhador"]. O direito à privacidade não é absoluto e a liberdade individual pode ser limitada se estiver em causa a protecção da saúde pública ou a segurança do próprio e, especialmente, de terceiros. Fazendo apelo à previsão que considera poderem ser feitos estes exames em função de certas actividades, tenderemos a considerar que existem actividades em que estes exames se justificam: condutores em transporte ferroviário, rodoviário, marítimo, pilotos, controladores de tráfego aéreo, condutores de máquinas (...).

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