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2973 | II Série A - Número 072 | 03 de Julho de 2004

 

3 - Razões da celebração da Concordata de 2004

A nova Concordata não pode ser analisada sem ter em conta o seu código genético e, designadamente, sem ter presente as opções que foram sendo feitas pelo Estado português e pela Igreja Católica desde a revolução democrática do 25 de Abril de 1974.
Como escreveu António de Sousa Franco, "Das mutações de regime ocorridas desde o liberalismo, o 25 de Abril de 1974 foi a única que se não traduziu nem em choque entre a Igreja e o Estado, nem em perseguição religiosa" - vide A Igreja e o Poder: 1974-1987, in Portugal, o Sistema Político e Constitucional: 1974-1987, Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa, p.410.
A celebração da Concordata da democracia, para usar o qualificativo que lhe deu Jaime Gama, "reflecte, com apreciável maturidade duas evoluções convergentes entre o Estado e a Igreja Católica, possibilitadas, de um lado, pela estabilização democrática no plano institucional, e, por outro, pela última actualização conciliar e pela nova doutrina do direito canónico" - vide A Concordata da democracia, in Diário de Notícias, de 17 de Maio de 2004.
Evoquemos alguns dos marcos dessa evolução. Desde logo, revestiu-se de grande significado o Protocolo Adicional (1975), em cuja negociação teve um papel determinante o então Ministro da Justiça, Francisco Salgado Zenha. Este protocolo não apenas veio pôr termo à inconstitucional proibição dos cidadão casados catolicamente poderem vir a celebrar novo casamento civil, após a dissolução do primeiro por divórcio, como acrescentou no n.º II: "Mantêm-se em vigor os outros artigos da Concordata de Maio de 1940".
A Concordata estava, contudo, manifestamente desactualizada e várias das suas disposições eram passíveis de serem consideradas inconstitucionais, ou pelo menos de constitucionalidade duvidosa, e permanecia a necessidade de uma nova Lei da Liberdade Religiosa conforme à Constituição da República. Veio a ser aprovada a Lei n.º 16/2001, de 22 de Junho, mas entendeu-se então deixar de fora a matéria abrangida pela Concordata. Com efeito, o artigo 58.º (legislação aplicável à Igreja Católica) estabeleceu que "Fica ressalvada a Concordata entre a Santa Sé e a República Portuguesa de 7 de Maio de 1940, o protocolo Adicional à mesma, de Fevereiro de 1975, bem como a legislação aplicável à Igreja Católica, não lhe sendo aplicáveis as disposições desta lei relativas às igrejas ou comunidades religiosas inscritas ou radicadas no país, sem prejuízo da adopção de quaisquer disposições por acordo entre o Estado e a Igreja Católica ou por remissão da lei".
Aliás, já em Janeiro de 2000, o Governo português manifestara a intenção de proceder a negociações de uma nova Concordata, ideia que mereceu o acordo da Conferência Episcopal Portuguesa em Fevereiro do mesmo ano. Por seu lado, a Assembleia da República aprovou a Resolução 39/2000, em 19 de Abril, instando o Governo a iniciar negociações com a Santa Sé, tendo sido proposto pelo Ministro dos Negócios Estrangeiros, Jaime Gama, o início das negociações em 24 de Abril de 2000.
A opção claramente assumida pela Assembleia da República em todas estas ocasiões foi sempre a de proceder à aplicação dos princípios constitucionais em matéria de liberdade religiosa à Igreja Católica através da revisão do tratado internacional em vigor, a Concordata, cuja vigência fora reafirmada pelo Estado português saído da revolução democrática do 25 de Abril. Esta solução é não só constitucionalmente admissível, como tem em conta realisticamente o facto da Igreja Católica ser sujeito de direito internacional público. Outros Estados, com afinidades institucionais com Portugal, como a Itália e a Espanha, tinham já celebrado novas Concordatas.
A nova Concordata foi o resultado de um sério trabalho de diálogo e de negociação, que se prolongou por um período de quatro anos, envolvendo diferentes governos sem que tenham sido postas em causa as orientações fundamentais.
A Concordata da democracia continua este processo de evolução nas relações entre o Estado português e a Igreja Católica, o que foi tornado possível pelas evoluções, entretanto verificadas. "Do lado do Estado - como referiu Jaime Gama -, com a emergência de valores democráticos, é agora possível garantir a plenitude da concretização da liberdade religiosa enquanto dimensão relevante dos direitos dos cidadãos" e acrescenta "é mesmo razoável entender que o exercício do direito à liberdade religiosa pode e deve fundamentar modalidades efectivas de cooperação entre o Estado e, neste caso, a Igreja Católica para a realização de finalidades partilhadas no plano social. Do lado da Igreja Católica, tendo por base a doutrinação conciliar e a actual moldura canónica, está seguramente aberta a uma mais amadurecida compreensão da esfera estadual contemporânea".
Este longo trabalho de negociação envolveu, para além das comissões negociadoras do Governo e da Santa Sé, o acompanhamento activo da Conferência Episcopal Portuguesa, sobretudo através do seu presidente.
Pretendeu-se, no dizer de António de Sousa Franco, que foi um dos seus negociadores em representação da Igreja Católica, "fazer um novo texto, uma Concordata para o século XXI, que tem um sentido mais positivo, criando quadros de cooperação no âmbito de uma sociedade onde os princípios de separação, de laicidade e de pluralismo se mantêm." - in www.ecclesia.pt.
A nova Concordata será complementada oportunamente com acordos complementares em áreas tão relevantes como o património e os bens culturais, o ensino, os meios de comunicação, as instituições privadas de solidariedade social, a assistência religiosa não militarizada aos militares, bem como aos doentes e presos, as organizações não governamentais, a cooperação para o desenvolvimento nos países de língua portuguesa, a regulamentação do registo de propriedade e das organizações e associações religiosas e a questão das isenções e das obrigações fiscais. A Conferência Episcopal Portuguesa, cuja personalidade jurídica é reconhecida pela nova Concordata, terá da parte da Igreja Católica uma posição central nestas negociações. A Conferência Episcopal Portuguesa ganha, desta forma, uma responsabilidade acrescida na criação de um relacionamento construtivo e moderno com a sociedade plural e democrática portuguesa.
Deste modo regulam-se de forma mais flexível as relações entre a Igreja Católica e o Estado. Para lá das matérias que são totalmente reguladas pela Concordata, outras serão, como vimos, objecto de acordos complementares que podemos aproximar da lógica dos acordos entre pessoas colectivas e o Estado, previstos na Lei da Liberdade Religiosa.
António de Sousa Franco analisou-o nos seguintes termos: "Para resolver eventuais dificuldades, criou-se uma solução que é original, mesmo no direito concordatário moderno.

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