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0041 | II Série A - Número 004 | 02 de Abril de 2005

 

A contradição entre estes avanços e o quadro legislativo vigente no que diz respeito à IVG coloca Portugal como o país mais atrasado da Europa nesta questão, à excepção da Irlanda. No entanto, ainda assim se regista um avanço simbolicamente significativo na Irlanda, onde em referendo foram rejeitadas as tentativas de impedir o direito a realizar uma IVG por parte de mulheres que tivessem sido violadas. A extrema violência desta proposta, que procurava impor a proibição absoluta de mulheres violadas e em risco de sobrevivência física ou psíquica de abortarem, mereceu uma resposta popular que constitui o primeiro sinal de mudança da legislação irlandesa. A vitória do não no referendo abre uma via para o aborto legal na Irlanda. Tem que ser encarada como um sinal extremamente positivo atendendo a todo o circunstancialismo social, cultural, religioso e político da Irlanda, onde a proibição do aborto obriga anualmente cerca de 7000 mulheres irlandesas a deslocarem-se até Londres para abortar, de acordo com os dados publicados no jornal Público (3 de Março de 2002).
Também é de registar outra alteração fundamental no panorama europeu, que decorre da aprovação, através de um referendo, da despenalização do aborto na Suiça, registando-se 72% de votos favoráveis à despenalização. A Suécia vai estender a interrupção da gravidez a estrangeiras não residentes.
A Itália aceita as condições económicas e sociais como motivo para recorrer à IVG até aos 90 dias. A Holanda aceita o aborto a pedido da mulher até às 24 semanas, sendo um dos países com menor índice de abortos.

O julgamento da Maia e o debate político e jurídico em Portugal

O julgamento da Maia resumiu todas as dificuldades dramáticas suscitadas pela legislação actual. É, no entanto, de assinalar que não houve nenhuma voz que se tivesse levantado para pedir a condenação e a prisão dessas 17 mulheres, e que mesmo os que mais se destacaram na campanha contra a alteração da legislação optaram por aceitar o princípio da absolvição - e, portanto, por aceitar a inaplicabilidade da lei, cuja manutenção, no entanto, ainda defendem.
Como refere o Procurador da República, nas alegações de recurso, "Este processo veio demonstrar que o aborto clandestino existe. Existe e vai continuar a existir enquanto se mantiver o actual estado de coisas". "Para uns o julgamento a decorrer no tribunal da Maia vem recolocar dramaticamente no primeiro plano, perante o País e perante os nossos representantes eleitos, o drama do aborto clandestino" (Maia Costa, Público, de 6 de Novembro de 2001). Para outros, a actual lei de criminalização do aborto é "injusta socialmente. É uma lei que aos ricos não afecta porque podem ir fora do País e fazer o aborto" (Paula Regi, Público, idem) (…). Curiosamente, ou talvez não, só em casos muito raros os tribunais têm sido chamados a julgar aquele tipo de crime. As causas para o aborto evidenciam os autos são várias: porque as mulheres já tinham filhos; porque eram novas; porque foram abandonadas pelo respectivo companheiro; porque não tinham condições para o criar; ou porque, pura e simplesmente, não queriam. Neste caso, ora em apreciação, evidencia-se uma grande inadequação da lei à realidade (…) As mulheres que foram julgadas no processo viram-se confrontadas com uma verdadeira situação de conflito, foram deixadas à sua sorte e tiveram de tomar uma decisão solitária e, seguramente pouco informada".
Maria Antónia Fiadeiro, jornalista, investigadora e mestre em estudos sobre as mulheres, em resposta à questão: "Que consequências deve ter este julgamento no quadro legislativo e na acção social?" afirmou que "os diplomas devem voltar ao Parlamento e ser resolvidos o mais depressa possível. Deve haver informação generalizada que permita difusão ampla e desculpabilização para as pessoas recorrerem sem medos e sem obstáculos. Já se arrasta há muito tempo o impasse que é um produto da religião católica. Quem como eu é a favor da despenalização não quer impor nada, quer apenas o direito de opção que poupa o sofrimento e a dor que essa discussão envolve" (Público, de 19 de Janeiro de 2002).
O julgamento da Maia provocou também um grande impacto nos meios de comunicação social internacionais. James Westhead, repórter da BBC, explicava o interesse internacional, afirmando: "Para os ingleses é muito estranho que cá em Portugal as mulheres sejam consideradas criminosas por fazer um aborto" (DN, de 19 de Janeiro de 2002).
No mesmo sentido, e a 26 de Janeiro de 2002, escrevia Inês Pedrosa, no Expresso: "Por que é que há, logo ali em Badajoz, uma clínica de tratamento voluntário da gravidez que se anuncia nos jornais portugueses e em Portugal, com uma lei igual à espanhola, estas clínicas são proibidas, empurrando as mulheres do povo (aquela silenciosa maioria que não tem posses ou apoio para se deslocar a Badajoz) para a mais cruel - e muitas vezes mortal - clandestinidade? A quem recorrerão agora as mulheres tristes e desesperadas, esmagadas pela miséria, pelo excesso de filhos, pela brutalidade dos maridos, que recorriam aos serviços da enfermeira-parteira Maria do Céu? Às agulhas de crochet? Ao veneno dos ratos?".
Numa entrevista concedida à BBC o Presidente da República, Jorge Sampaio, pronunciou-se a favor do regresso do tema do aborto à agenda política, tendo mesmo afirmado que a questão do aborto está a ser "camuflada" e que isso não pode acontecer porque é preciso alterar a actual lei.
O grande impacto do julgamento do Maia deve-se, sem dúvida, ao facto de ter ocorrido após uma campanha demagoga e desmobilizadora dos movimentos antiescolha que afirmavam que as mulheres não eram condenadas pela prática do aborto e ao número de mulheres acusadas.
De acordo com os dados disponibilizados pelo Ministério da Justiça, desde 1998 até 2003, registaram-se

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