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Quinta-feira, 2 de Dezembro de 2010 II Série-A — Número 43

XI LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2010-2011)

SUMÁRIO Projectos de lei [n.os 175, 205, 449 e 454 a 459/XI (2.ª)]: N.º 175/XI (1.ª) (Procede à terceira alteração à Lei n.º 23/96, de 26 de Julho, que «Cria no ordenamento jurídico alguns mecanismos destinados a proteger o utente de serviços públicos essenciais»): — Relatório da discussão e votação na especialidade e texto final da Comissão de Assuntos Económicos, Inovação e Energia.
N.º 205/XI (1.ª) (Procede à terceira alteração à Lei n.º 23/96, de 26 de Julho, estabelecendo a impossibilidade de suspensão dos serviços públicos essenciais em situações de carência económica): — Relatório da discussão e votação na especialidade da Comissão de Assuntos Económicos, Inovação e Energia.
N.º 449/XI (2.ª) [Tributa os dividendos distribuídos por sociedades gestoras de participações sociais (Altera o artigo 51.º do Código do Imposto sobre os Rendimentos das Pessoas Colectivas, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 442B/88, de 30 de Novembro, e o artigo 32.º do Estatuto dos Benefícios Fiscais, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 215/89, de 1 de Julho)]: — Parecer da Comissão de Orçamento e Finanças e nota técnica elaborada pelos serviços de apoio.
N.º 454/XI (2.ª) — Regime do fornecimento, pelos agentes económicos, de sacos de plástico destinados a serem utilizados para carregar e transportar as mercadorias adquiridas pelos consumidores finais no comércio a retalho, com vista a reduzir a utilização maciça daquele tipo de sacos e a encorajar a sua reutilização (apresentado pelo PS).
N.º 455/XI (2.ª) — Tributa as mais-valias mobiliárias realizadas por Sociedades Gestores de Participações Sociais (SGPS), Sociedades de Capital de Risco (SCR), Fundos de Investimento, Fundos de Capital de Risco, Fundos de Investimento Imobiliário em Recursos Florestais, Entidades não Residentes e Investidores de Capital de Risco (ICR) e fixa em 21,5% a taxa aplicável a todas as mais-valias mobiliárias tributadas em sede de IRS e em

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sede de IRC. (Altera o Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 442-A/88, de 30 de Novembro, e o Estatuto dos Benefícios Fiscais, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 215/89, de 1 de Julho) (apresentado pelo PCP).
N.º 456/XI (2.ª) — Estabelece as bases da política de ambiente (apresentado pelo PCP).
N.º 457/XI (2.ª) — Lei de Bases do Ambiente (apresentado por Os Verdes).
N.º 458/XI (2.ª) — Define o regime jurídico das condições de instalação, funcionamento e licenciamento dos estabelecimentos das instituições particulares de solidariedade social e de outras instituições sem fins lucrativos (apresentado pelo PSD).
N.º 459/XI (2.ª) — Dispensa da prestação de caução pelas Instituições Particulares de Solidariedade Social no âmbito da prestação de cuidados de saúde ou de apoio social (apresentado pelo PSD).
Proposta de lei n.º 44/XI (2.ª): Criminaliza o incitamento público à prática de infracções terroristas, o recrutamento para o terrorismo e o treino para o terrorismo, dando cumprimento à Decisão-Quadro n.º 2008/919/JAI, do Conselho, de 28 de Novembro de 2008, que altera a Decisão-Quadro n.º 2002/475/JAI, relativa à luta contra o terrorismo, e procede à terceira alteração da Lei n.º 52/2003, de 22 de Agosto.
Projectos de resolução [n.os 313 a 316/XI (2.ª)]: N.º 313/XI (2.ª) — Recomenda ao Governo a preservação da autonomia dos teatros nacionais e a sua não fusão (apresentado pelo BE).
N.º 314/XI (2.ª) — Recomenda ao Governo a criação de um grupo de trabalho para estudar a possibilidade de determinar o impedimento à mensão 100% biodegradável nos sacos de plástico oxibiodegradáveis e, ainda, à sua distribuição pelos agentes económicos, com base em fundamentos técnicos e científicos (apresentado pelo PS).
N.º 315/XI (2.ª) — Recomenda ao Governo a extinção da concessão à Companhia de Banhos de Vizela da exploração das Termas de Vizela e a adopção dos procedimentos necessários à reabertura da actividade (apresentado pelo BE).
N.º 316/XI (2.ª) — Recomenda a suspensão do actual processo de avaliação de desempenho docente (apresentado pelo PCP).

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PROJECTO DE LEI N.º 175/XI (1.ª) (PROCEDE À TERCEIRA ALTERAÇÃO À LEI N.º 23/96, DE 26 DE JULHO, QUE «CRIA NO ORDENAMENTO JURÍDICO ALGUNS MECANISMOS DESTINADOS A PROTEGER O UTENTE DE SERVIÇOS PÚBLICOS ESSENCIAIS»)

Relatório da discussão e votação na especialidade e texto final da Comissão de Assuntos Económicos, Inovação e Energia

Relatório da discussão e votação na especialidade

1 — O projecto de lei em epígrafe, da iniciativa do Partido Socialista, baixou à Comissão de Assuntos Económicos, Inovação e Energia em 24 de Junho de 2010, após aprovação, por unanimidade, do requerimento de baixa à Comissão para nova apreciação sem votação na generalidade, posteriormente reiterado em 22 de Julho de 2010.
2 — Foi constituído um grupo de trabalho para apreciar o referido projecto de lei, bem como o projecto de lei 205/XI (1.ª), do BE, e o projecto de lei 305/XI (1.ª), do PCP.
3 — Na sequência da proposta feita pelo grupo de trabalho, a Comissão solicitou pareceres às seguintes entidades: Conselho Superior da Magistratura, Conselho Superior do Ministério Público, Ordem dos Advogados, Associação Nacional de Municípios Portugueses, Associação de Consumidores de Portugal, Centro de Informação, Mediação e Arbitragem de Conflitos do Algarve, Centro de Arbitragem de Conflitos de Consumo do Distrito de Coimbra, Centro de Arbitragem de Conflitos de Consumo de Lisboa, Centro e Arbitragem de Conflitos de Consumo do Vale do Ave/Tribunal Arbitral, Centro de Informação, Mediação e Arbitragem de Consumo (Tribunal Arbitral) de Braga, Centro de Informação de Consumo e Arbitragem do Porto, Centro Nacional de Informação e Arbitragem de Conflitos de Consumo, DECO, Região Autónoma da Madeira e Região Autónoma dos Açores (através de ofício ao Sr. Presidente da Assembleia da República).
4 — Todos os pareceres recebidos estão disponibilizados na página internet da Comissão, bem como um quadro síntese dos mesmos, por iniciativa legislativa.
5 — Na sequência dos contributos recebidos e das sugestões de alteração de redacção apresentadas por várias entidades, foi apresentada uma proposta de alteração pelo Grupo Parlamentar do PSD, apreciada pelo grupo de trabalho, que posteriormente submeteu uma proposta de texto final do projecto de lei para votação em sede de plenário da Comissão.
6 — A votação na especialidade do projecto de lei teve lugar na reunião da Comissão de 30 de Novembro de 2010, na qual se encontravam presentes todos os grupos parlamentares, com excepção de Os Verdes. A reunião foi gravada em suporte áudio, que se encontra disponível na página da Comissão na Internet.
7 — De seguida, procedeu-se à discussão e votação, conforme os procedimentos regimentalmente previstos, nos termos a seguir referidos:

Artigo 1.º (Objecto): O grupo de trabalho apresentou uma proposta de aditamento de um novo artigo 1.º, votado e aprovado por unanimidade, com a seguinte redacção:

«Artigo 1.º Objecto

O presente diploma estabelece a criação de um mecanismo de arbitragem necessária no acesso à justiça por parte dos utentes de serviços públicos essenciais.»

Artigo 2.º (Alteração da Lei n.º 23/96, de 26 de Julho, que cria no ordenamento jurídico alguns mecanismos destinados a proteger o utente de serviços públicos essenciais): O grupo de trabalho apresentou uma proposta de alteração da redacção do artigo 2.º do projecto de lei (antigo artigo 1.º), que foi votada e aprovada por unanimidade, passando a constar da seguinte redacção:

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«Artigo 2.º Alteração da Lei n.º 23/96, de 26 de Julho, que cria no ordenamento jurídico alguns mecanismos destinados a proteger o utente de serviços públicos essenciais

O artigo 15.º da Lei n.º 23/96, de 26 de Julho, alterada pela Lei n.º 12/2008, de 26 de Fevereiro, e pela Lei n.º 24/2008, de 2 de Junho, passa a ter a seguinte redacção:

«Artigo 15.º Resolução de litígios e arbitragem necessária

1 — Os litígios de consumo no âmbito dos serviços públicos essenciais estão sujeitos a arbitragem necessária quando, por opção expressa dos utentes que sejam pessoas singulares, sejam submetidos à apreciação do tribunal arbitral dos centros de arbitragem de conflitos de consumo legalmente autorizados.
2 — Quando as partes, em caso de litígio resultante de um serviço público essencial, optem por recorrer a mecanismos de resolução extrajudicial de conflitos, suspende-se no seu decurso o prazo para a propositura da acção judicial ou da injunção.»

Artigo 3.º (Aplicação no tempo): O artigo 3.º do projecto de lei (antigo artigo 2.º) foi votado e aprovado por unanimidade.

Artigo 4.º (Entrada em vigor): O artigo 4.º do projecto de lei (antigo artigo 3.º) foi votado e aprovado por unanimidade.

8 — O Grupo Parlamentar do PSD efectuou uma declaração de voto oral, congratulando-se pela importância da participação das diversas entidades da sociedade civil no processo legislativo, bem como pelos contributos remetidos, na sequência dos quais havia sido preparada a proposta de alteração ao projecto de lei.
A declaração de voto consta, na sua forma integral, da gravação áudio da votação na especialidade.
9 — Segue em anexo o texto final do projecto de lei n.º 175/XI (1.ª).

Palácio de São Bento, 2 de Dezembro de 2010 O Presidente, António José Seguro.

Texto final

Artigo 1.º Objecto

O presente diploma estabelece a criação de um mecanismo de arbitragem necessária no acesso à justiça por parte dos utentes de serviços públicos essenciais.

Artigo 2.º Alteração da Lei n.º 23/96, de 26 de Julho, que cria no ordenamento jurídico alguns mecanismos destinados a proteger o utente de serviços públicos essenciais

O artigo 15.º da Lei n.º 23/96, de 26 de Julho, alterada pela Lei n.º 12/2008, de 26 de Fevereiro, e pela Lei n.º 24/2008, de 2 de Junho, passa a ter a seguinte redacção:

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«Artigo 15.º Resolução de litígios e arbitragem necessária

1 — Os litígios de consumo no âmbito dos serviços públicos essenciais estão sujeitos a arbitragem necessária quando, por opção expressa dos utentes que sejam pessoas singulares, sejam submetidos à apreciação do tribunal arbitral dos centros de arbitragem de conflitos de consumo legalmente autorizados.
2 — Quando as partes, em caso de litígio resultante de um serviço público essencial, optem por recorrer a mecanismos de resolução extrajudicial de conflitos, suspende-se no seu decurso o prazo para a propositura da acção judicial ou da injunção.»

Artigo 3.º Aplicação no tempo

A presente lei aplica-se às relações que subsistam à data da sua entrada em vigor.

Artigo 4.º Entrada em vigor

A presente lei entra em vigor no dia seguinte à sua publicação.

——— PROJECTO DE LEI N.º 205/XI (1.ª) (PROCEDE À TERCEIRA ALTERAÇÃO À LEI N.º 23/96, DE 26 DE JULHO, ESTABELECENDO A IMPOSSIBILIDADE DE SUSPENSÃO DOS SERVIÇOS PÚBLICOS ESSENCIAIS EM SITUAÇÕES DE CARÊNCIA ECONÓMICA)

Relatório da discussão e votação na especialidade da Comissão de Assuntos Económicos, Inovação e Energia

1 — O projecto de lei em epígrafe, da iniciativa do Bloco de Esquerda, baixou à Comissão de Assuntos Económicos, Inovação e Energia em 24 de Junho de 2010, após aprovação, por unanimidade, do requerimento de baixa à Comissão para reapreciação sem votação na generalidade, posteriormente reiterado em 22 de Julho de 2010.
2 — Foi constituído um grupo de trabalho para apreciar o referido projecto de lei, bem como o projecto de lei n.º 175/XI (1.ª), do PS, e o projecto de lei n.º 305/XI (1.ª), do PCP.
3 — Na sequência da proposta feita do grupo de trabalho, a Comissão solicitou pareceres às seguintes entidades: Conselho Superior da Magistratura, Conselho Superior do Ministério Público, Ordem dos Advogados, Associação Nacional de Municípios Portugueses, Associação de Consumidores de Portugal, Centro de Informação, Mediação e Arbitragem de Conflitos do Algarve, Centro de Arbitragem de Conflitos de Consumo do Distrito de Coimbra, Centro de Arbitragem de Conflitos de Consumo de Lisboa, Centro e Arbitragem de Conflitos de Consumo do Vale do Ave/Tribunal Arbitral, Centro de Informação, Mediação e Arbitragem de Consumo (Tribunal Arbitral) de Braga, Centro de Informação de Consumo e Arbitragem do Porto, Centro Nacional de Informação e Arbitragem de Conflitos de Consumo, DECO, Região Autónoma da Madeira e Região Autónoma dos Açores (através de ofício ao Sr. Presidente da Assembleia da República).
4 — Todos os pareceres recebidos estão disponibilizados na página internet da Comissão, bem como um quadro síntese dos mesmos, por iniciativa legislativa.
5 — Na sequência dos contributos recebidos e das sugestões de alteração de redacção apresentadas por várias entidades, o grupo de trabalho considerou submeter à Comissão o texto inicial do projecto de lei, para votação em sede de plenário da Comissão.

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6 — A votação na especialidade do projecto de lei teve lugar na reunião da Comissão de 30 de Novembro de 2010, na qual se encontravam presentes todos os grupos parlamentares, com excepção de Os Verdes. A reunião foi gravada em suporte áudio, que se encontra disponível na página da Comissão na Internet.
7 — De seguida, procedeu-se à discussão e votação, conforme os procedimentos regimentalmente previstos, nos termos a seguir referidos:

Artigo 1.º (Objecto): O artigo 1.º foi rejeitado, com os votos contra do PS, PSD e CDS-PP e os votos a favor do BE e PCP.

Artigo 2.º (Alteração da Lei n.º 23/96, de 26 de Julho): O artigo 2.º foi rejeitado, com os votos contra do PS, PSD e CDS-PP e os votos a favor do BE e PCP.

Artigo 3º (Regulamentação): O artigo 3.º foi rejeitado, com os votos contra do PS, PSD e CDS-PP e os votos a favor do BE e PCP.

Palácio de São Bento, 2 de Dezembro de 2010 O Presidente, António José Seguro.

——— PROJECTO DE LEI N.º 449/XI (2.ª) (TRIBUTA OS DIVIDENDOS DISTRIBUÍDOS POR SOCIEDADES GESTORAS DE PARTICIPAÇÕES SOCIAIS (ALTERA O ARTIGO 51.º DO CÓDIGO DO IMPOSTO SOBRE O RENDIMENTO DAS PESSOAS COLECTIVAS, APROVADO PELO DECRETO-LEI N.º 442-B/88, DE 30 DE NOVEMBRO, E O ARTIGO 32.º DO ESTATUTO DOS BENEFÍCIOS FISCAIS, APROVADO PELO DECRETO-LEI N.º 215/89, DE 1 DE JULHO)

Parecer da Comissão de Orçamento e Finanças e nota técnica elaborada pelos serviços de apoio

Parecer

Parte I — Considerandos

1 — Introdução: O Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português tomou a iniciativa de apresentar à Assembleia da República o projecto de lei n.º 449/XI (2.ª), que procede à alteração dos artigos 51.º do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (doravante IRC) e 32.º do Estatuto dos Benefícios Fiscais (doravante EBF), no sentido de tributar os dividendos distribuídos pelas Sociedades Gestoras de Participações Sociais (SGPS).
A apresentação do projecto de lei n.º 449/XI (2.ª) foi feita nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, encontrando-se reunidos os requisitos formais e de tramitação exigidos.
O referido projecto de lei, da autoria do Partido Comunista Português, deu entrada em 12 de Novembro de 2010, tendo sido admitido em 17 de Novembro e anunciado na sessão plenária de 23 de Novembro, ambos do mesmo ano de 2010. Por determinação de S. Ex.ª o Presidente da Assembleia da República, baixou de seguida à Comissão de Orçamento e Finanças para apreciação e emissão do respectivo relatório e parecer.

2 — Conformidade dos requisitos formais, constitucionais e regimentais, e do cumprimento da lei formulário: A iniciativa legislativa é apresentada sob a forma de projecto de lei e é subscrita por 6 (seis) Deputados do Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português, nos termos do n.º 1 do artigo 167.º da Constituição e do artigo 118.º do Regimento da Assembleia da República.

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Mostra-se redigida sob a forma de artigos, tem uma designação que traduz sinteticamente o seu objecto principal e é precedida de uma exposição de motivos, cumprindo assim os requisitos formais do n.º 1 do artigo 124.º do referido Regimento.
A matéria subjacente insere-se na reserva relativa de competência legislativa da Assembleia da República, nos termos da alínea i) do n.º 1 do artigo 165.º da Constituição da República Portuguesa.
A Lei n.º 74/98, de 11 de Novembro, alterada e republicada pela Lei n.º 42/2007, de 24 de Agosto, adiante designada como Lei Formulário, possui ainda um conjunto de normas sobre a publicação, a identificação e o formulário dos diplomas que são relevantes em caso de aprovação da iniciativa e que importa ter presentes, quer no decurso da discussão em especialidade em Comissão quer no momento da respectiva redacção final.
Esta iniciativa tem um título que traduz sinteticamente o seu objecto, de acordo com o artigo 7.º da Lei Formulário.
Nos termos do n.º 1 do artigo 6.º da Lei Formulário, «os diplomas que alterem outros devem indicar o número de ordem da alteração introduzida e, caso tenha havido alterações anteriores, identificar aqueles diplomas que procederam a essas alterações, ainda que incidam sobre outras normas». A presente iniciativa pretende introduzir alterações ao Código do IRC e ao EBF, pelo que deveria ser indicado o número de ordem da alteração a introduzir, bem como identificados os diplomas que procederam a outras alterações. Contudo, os códigos fiscais sofrem alterações muito frequentes, nomeadamente por força dos Orçamentos do Estado, sendo, portanto, difícil identificar com exactidão as alterações por eles sofridas, pelo que, pese embora o previsto na Lei Formulário, tem-se optado, nesses casos, por não mencionar o número de ordem da alteração a realizar no título do diploma.
A aprovação de alterações ao Código do IRC e ao EBF também não obrigará à sua republicação integral, uma vez que, de acordo com o previsto na última parte da alínea a) do n.º 3 do artigo 6.º da Lei Formulário, a republicação é expressamente afastada no caso de alterações a Códigos.
Finalmente, a disposição sobre a entrada em vigor desta iniciativa está em conformidade com o n.º 1 do artigo 2.º da Lei Formulário.
Face ao exposto, na presente fase do processo legislativo, a iniciativa em apreço não parece suscitar outras questões em face da Lei Formulário.

3 — Objecto e motivação:

a) Legislação em vigor: O artigo 51.º do Código do IRC tem por objectivo eliminar ou atenuar a dupla tributação económica dos lucros distribuídos.
O n.º 1 deste artigo prevê a dedução ao lucro tributável dos rendimentos incluídos na base tributável, correspondentes a lucros distribuídos por entidades com sede ou direcção efectiva em território português, sujeitas e não isentas de IRC, nas quais o sujeito passivo detenha directamente uma participação não inferior a 10% ou com um valor de aquisição não inferior a €20 000 000,00, e desde que esta participação tenha permanecido na sua titularidade, de modo ininterrupto, durante o ano anterior à data da colocação à disposição dos lucros ou, se detida há menos tempo, desde que seja mantida durante o tempo necessário para completar aquele período.
O disposto no n.º 1 do artigo 51.º é também aplicável quando uma entidade residente em território português detenha uma participação, nos termos e condições aí referidos, em entidades residentes noutro Estado-membro da União Europeia, desde que ambas preencham os requisitos estabelecidos no artigo 2.º da Directiva 90/435/CEE, de 23 de Julho, sendo sempre exigível, neste caso, uma participação mínima de 10% ou com um valor de aquisição não inferior a €20 000 000,00 e desde que esta participação tenha permanecido na sua titularidade, de modo ininterrupto, durante o ano anterior à data da colocação dos lucros ou, se detida há menos tempo, desde que seja mantida durante o tempo necessário para completar aquele período.
Relativamente ao mecanismo previsto no artigo 51.º, o modus operandi assume, assim, a forma de tributar a entidade geradora de rendimentos, e isentar as entidades destinatárias dos mesmos (quando sujeitas a IRC), de acordo com as participações sociais detidas.
O n.º 2 do mesmo artigo também permite a mesma dedução para os rendimentos de participações sociais, independentemente da percentagem e do prazo, relativamente às seguintes sociedades: sociedades de

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desenvolvimento regional, sociedades de investimento e sociedades financeiras de corretagem. Relativamente às SGPS, o regime é aplicável independentemente da percentagem de participação e do prazo em que esta tenha permanecido na sua titularidade, aos rendimentos das SGPS, por força do disposto no artigo 32.º do EBF.
Nos casos em que não se verifique o cumprimento das condições enunciadas no n.º 1, ocorrerá a atenuação da dupla tributação, nos termos do n.º 1 do artigo 51.º do Código do IRC, deduzindo-se, ao resultado líquido do exercício, 50% dos rendimentos incluídos na base tributável correspondentes aos lucros sempre que distribuídos por entidade com sede ou direcção efectiva em território português sujeita e não isenta a IRC.
A eliminação ali prevista consubstancia-se, assim, numa dedução ao resultado líquido do exercício (das sociedades comerciais ou civis sob a forma comercial, cooperativas e empresas públicas, com sede ou direcção efectiva em território português) de uma importância correspondente aos rendimentos, incluídos na base tributável, respeitantes a lucros distribuídos por entidades com sede ou direcção efectiva no mesmo território.
Se a detenção da participação mínima deixar de se verificar antes de completado um ano, deve corrigir-se a dedução (deixando de ser de 100% para passar a ser de 50%) ou anular-se a mesma, sem prejuízo da consideração do crédito de imposto por dupla tributação internacional a que houver lugar, de acordo com o disposto no artigo 91.º do Código do IRC (n.º 9 do artigo 51.º do Código do IRC).

b) Orçamento do Estado para 2011: As alterações introduzidas nos n.os 1 e 2 do projecto de lei n.º 449/XI (2.ª) são semelhantes a alterações já aprovadas, constantes dos artigos 95.º e 116.º da proposta de lei n.º 42/XI (2.ª) — Orçamento do Estado para 2011.
De facto, para beneficiar da exclusão de tributação sobre os dividendos recebidos por entidades residentes em Portugal (ou estabelecimentos estáveis em Portugal de sociedades residentes na União Europeia, nalgumas situações) de sociedades residentes em Portugal, noutro Estado-membro da União Europeia ou do EEE, passa a exigir-se sempre uma participação social igual ou superior a 10%. Presentemente, em alternativa à percentagem de participação, pode ser considerado o custo de aquisição da participação, se o mesmo for igual ou superior a 20 milhões de euros.
Por outro lado, é eliminada a dedução de 50% actualmente prevista para as situações em que não se verificam os requisitos para aplicação da dedução de 100%, nomeadamente a percentagem mínima de participação (10%) ou o valor de aquisição (20 milhões de euros).
A exclusão total de tributação passa a estar sujeita ao requisito de tributação efectiva dos rendimentos de que são provenientes os lucros distribuídos (v.g. dividendos), sendo eliminada a possibilidade de dedução de 50% para os casos em que não tenha havido essa tributação efectiva, bem como a excepção prevista para as SGPS (que ficam sujeitas ao regime geral, incluindo a necessidade de deter uma participação de pelo menos 10%, o que não se verifica actualmente).

c) Fundamentação dos proponentes: Os Deputados do Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português propõem, conforme foi referido, a tributação dos rendimentos resultantes da distribuição de dividendos, pelas SGPS, aos accionistas dos grupos económicos que as integram, introduzindo as alterações já constantes da proposta de Orçamento do Estado para 2011.
Na exposição de motivos é referida «a venda da participação privilegiada da Portugal Telecom (PT) na brasileira Vivo», na qual «aquele grupo empresarial realizou mais-valias que ascenderam a valores rondando os 7500 milhões de euros, no que ficou conhecido com um dos maiores negócios de alienação de participações sociais realizadas no ano de 2010 em todo o mundo».
Os proponentes alegam que a PT pretende «distribuir um total de 1,5 mil milhões de euros em dividendos extraordinários, dos quais cerca de 900 milhões ainda em 2010», os quais serão «distribuídos com total isenção de impostos, usando assim uma vantagem fiscal que o Governo lhes proporciona porque as alterações fiscais de que anunciou em Setembro só vão, afinal, produzir efeitos em 2011, sobre os dividendos que então forem distribuídos».

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É, portanto, intenção dos proponentes, com a introdução da redacção do artigo 3.º do referido projecto de lei, fazer com que esta alteração se aplique, já em 2010, «à determinação dos rendimentos tributáveis das sociedades comerciais ou civis sob a forma comercial, cooperativa e empresas públicas, com sede ou direcção efectiva em território em território português».
Finalmente, no que respeita à entrada em vigor do diploma, o artigo 4.º apenas determina que tal acontece no dia seguinte ao da sua publicação.

4 — Síntese das alterações propostas: A presente iniciativa legislativa é composta por quatro artigos, descrevendo, respectivamente, a alteração ao Código do IRC (artigo 51.º), a alteração ao EBF (artigo 32.º), o âmbito de aplicação e a entrada em vigor.
As alterações propostas em sede de IRC sintetizam-se da seguinte forma:

Redacção actual

«Artigo 51.º Eliminação da dupla tributação económica de lucros distribuídos

1 — Na determinação do lucro tributável das sociedades comerciais ou civis sob forma comercial, cooperativas e empresas públicas, com sede ou direcção efectiva em território português, são deduzidos os rendimentos, incluídos na base tributável, correspondentes a lucros distribuídos, desde que sejam verificados os seguintes requisitos:

a) (…) b) (…) c) A entidade beneficiária detenha directamente uma participação no capital da sociedade que distribui os lucros não inferior a 10% ou com um custo de aquisição não inferior a €20 000 000 e esta tenha permanecido na sua titularidade, de modo ininterrupto, durante o ano anterior à data da colocação à disposição dos lucros ou, se detida há menos tempo, desde que a participação seja mantida durante o tempo necessário para completar aquele período.

2 — (…) 3 — (…) 4 — (…) 5 — (…) 6 — (…) 7 — (…) 8 — A dedução a que se refere o n.º 1 é apenas de 50% dos rendimentos incluídos no lucro tributável correspondentes a:

a) Lucros distribuídos, quando não esteja preenchido qualquer dos requisitos previstos nas alíneas b) e c) do mesmo número e, bem assim, relativamente aos rendimentos que o associado aufira da associação à quota, desde que se verifique, em qualquer dos casos, a condição da alínea a) do n.º 1; b) Lucros distribuídos por entidade residente noutro Estado-membro da União Europeia quando a entidade cumpre as condições estabelecidas no artigo 2.º da Directiva 90/435/CEE, de 23 de Julho, e não esteja verificado qualquer dos requisitos previstos na alínea c) do n.º 1.

Redacção proposta

«Artigo 51.º (…) 1 — (…) a) (…) b) (…) c) A entidade beneficiária detenha directamente uma participação no capital da sociedade que distribui os lucros não inferior a 10% e esta tenha permanecido na sua titularidade, de modo ininterrupto, durante o ano anterior à data da colocação à disposição dos lucros ou, se detida há menos tempo, desde que a participação seja mantida durante o tempo necessário para completar aquele período.

2 — (…) 3 — (…) 4 — (…) 5 — (…) 6 — (…) 7 — (…) 8 — (revogado)

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9 — Se a detenção da participação mínima referida no n.º 1 deixar de se verificar antes de completado o período de um ano aí mencionado, deve corrigir-se a dedução em conformidade com o disposto no número anterior, sem prejuízo da consideração do crédito de imposto por dupla tributação internacional a que houver lugar, de acordo com o disposto no artigo 91.º, respectivamente.

10 — A dedução a que se refere o n.º 1 é reduzida a 50% quando os rendimentos provenham de lucros que não tenham sido sujeitos a tributação efectiva, excepto quando a beneficiária seja uma sociedade gestora de participações sociais.

11 — O disposto nos n.os 1, 2 e 8 é igualmente aplicável quando uma entidade residente em território português detenha uma participação, nos termos e condições aí referidos, em entidade residente noutro Estado membro do espaço económico europeu que esteja vinculado a cooperação administrativa no domínio da fiscalidade equivalente à estabelecida no âmbito da União Europeia, desde que ambas essas entidades preencham condições equiparáveis, com as necessárias adaptações, às estabelecidas no artigo 2.º da Directiva 90/435/CEE, do Conselho, de 23 de Julho.

12 — Para efeitos do disposto no n.º 5, na alínea b) do n.º 8 e no n.º 11, o sujeito passivo deve provar que a entidade participada e, no caso do n.º 6, também a entidade beneficiária cumprem as condições estabelecidas no artigo 2.º da Directiva 90/435/CEE, do Conselho, de 23 de Julho, ou, no caso de entidades do espaço económico europeu, condições equiparáveis, mediante declaração confirmada e autenticada pelas autoridades fiscais competentes do Estado-membro da União Europeia ou do espaço económico europeu de que é residente.

9 — Se a detenção da participação mínima referida no n.º 1 deixar de se verificar antes de completado o período de um ano, deve corrigir-se a dedução que tenha sido efectuada, sem prejuízo da consideração do crédito de imposto por dupla tributação internacional a que houver lugar, nos termos do disposto no artigo 91.º.

10 — A dedução a que se refere o n.º 1 só é aplicável quando os rendimentos provenham de lucros que tenham sido sujeitos a tributação efectiva.

11 — O disposto nos n.os 1 e 2 é igualmente aplicável quando uma entidade residente em território português detenha uma participação, nos mesmos termos e condições, em entidade residente noutro Estado membro do espaço económico europeu que esteja vinculado a cooperação administrativa no domínio da fiscalidade equivalente à estabelecida no âmbito da União Europeia, desde que ambas as entidades reúnam condições equiparáveis, com as necessárias adaptações, às estabelecidas no artigo 2.º da Directiva 90/435/CEE, do Conselho, de 23 de Julho de 1990.
11 — O disposto nos n.os 1 e 2 é igualmente aplicável quando uma entidade residente em território português detenha uma participação, nos mesmos termos e condições em entidade residente noutro Estado-membro do espaço económico europeu que esteja vinculado a cooperação administrativa no domínio da fiscalidade equivalente à estabelecida no âmbito da União Europeia, desde que ambas essas entidades reúnam condições equiparáveis, com as necessárias adaptações, às estabelecidas no artigo 2.º da Directiva 90/435/CEE, do Conselho, de 23 de Julho de 1990.

12 — Para efeitos do disposto nos n.os 5 e 11, o sujeito passivo deve provar que a entidade participada e, no caso do n.º 6, também a entidade beneficiária, cumprem as condições estabelecidas no artigo 2.º da Directiva 90/435/CEE, do Conselho, de 23 de Julho de 1990, ou, no caso de entidades do espaço económico europeu, condições equiparáveis, mediante declaração confirmada e autenticada pelas autoridades fiscais competentes do Estado-membro da União Europeia ou do espaço económico europeu de que é residente.

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As alterações propostas em sede de EBF sintetizam-se da seguinte forma:

Redacção actual

«Artigo 32.º Sociedades gestoras de participações sociais (SGPS), sociedades de capital de risco (SCR) e investidores de capital de risco (ICR)

1 — Às SGPS, às SCR e aos ICR é aplicável o disposto nos n.os 1 e 5 do artigo 46.º do Código do IRC, sem dependência dos requisitos aí exigidos quanto à percentagem ou ao valor da participação.

2 — (…) 3 — (…) 4 — (…) 5 — (…) 6 — (…) 7 — (…) 8 — (…) 9 — O disposto nos n.os 1 a 3 é igualmente aplicável a sociedades cuja sede ou direcção efectiva esteja situada em território português, constituídas segundo o direito de outro Estadomembro da União Europeia, que tenham por único objecto contratual a gestão de participações sociais de outras sociedades, desde que preencham os demais requisitos a que se encontram sujeitas as sociedades regidas pelo Decreto-Lei n.º 495/88, de 30 de Dezembro.»

Redacção proposta

«Artigo 32.º (…) 1 — (revogado)

2 — (…) 3 — (…) 4 — (…) 5 — (…) 6 — (…) 7 — (…) 8 — (…) 9 — O disposto nos n.os 2 e 3 é igualmente aplicável a sociedades cuja sede ou direcção efectiva esteja situada em território português, constituídas segundo o direito de outro Estadomembro da União Europeia, que tenham por único objecto contratual a gestão de participações sociais de outras sociedades, desde que preencham os demais requisitos a que se encontram sujeitas as sociedades regidas pelo Decreto-Lei n.º 495/88, de 30 de Dezembro.»

Parte II — Opinião da Relatora

Nos termos das disposições regimentais aplicáveis, a Relatora reserva para o debate a sua opinião sobre a iniciativa legislativa em análise.

Parte III — Conclusões

1 — O Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português apresentou à Assembleia da República o projecto de lei n.º 449/XI (2.ª) que altera o regime fiscal dos dividendos distribuídos pelas Sociedades Gestoras de Participações Sociais; 2 — A apresentação do projecto de lei n.º 449/XI (2.ª) foi efectuada nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, encontrando-se reunidos os requisitos formais e de tramitação exigidos; 3 — A Comissão de Orçamento e Finanças considera que o projecto de lei n.º 449/XI (2.ª) reúne os requisitos constitucionais, legais e regimentais, para subir a Plenário da Assembleia da República, reservando os grupos parlamentares as suas posições de voto para Plenário.

Palácio de São Bento, 2 de Dezembro de 2010 O Deputado Relator, Cecília Meireles — O Presidente da Comissão, Paulo Mota Pinto.

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Nota: — As Partes I e III foram aprovadas por unanimidade.

Nota técnica elaborada pelos serviços de apoio

Projecto de lei n.º 449/XI (2.ª), do PCP Tributa os dividendos distribuídos por sociedades gestoras de participações sociais (altera o artigo 51.º do Código do Imposto sobre os Rendimentos das Pessoas Colectivas, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 442-B/88, de 30 de Novembro, e o artigo 32.º do Estatuto dos Benefícios Fiscais, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 215/89, de 1 de Julho) Data de admissão: 17 Novembro 2010 Comissão de Orçamento e Finanças

Índice

I — Análise sucinta dos factos e situações II — Apreciação da conformidade dos requisitos formais, constitucionais e regimentais e do cumprimento da lei formulário III — Enquadramento legal e doutrinário e antecedentes IV — Iniciativas legislativas e petições pendentes sobre a mesma matéria

Elaborada por: Cristina Neves Correia (DAC) — Maria da Luz Araújo (DAPLEN) — Fernando Bento Ribeiro (DILP).
Data: 28 de Novembro de 2010

I — Análise sucinta dos factos e situações

O projecto de lei em análise foi apresentado por iniciativa do Partido Comunista Português, com o objectivo declarado de tributar os dividendos distribuídos por sociedades gestoras de participações sociais (SGPS), através da alteração dos artigos 51.º do Código do Imposto sobre os Rendimentos das Pessoas Colectivas, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 442-B/88, de 30 de Novembro, bem como do artigo 32.º do Estatuto dos Benefícios Fiscais, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 215/89, de 1 de Julho.
Entrada a 12 de Novembro e 2010 e admitida a 17 do mesmo mês, a iniciativa baixou, na generalidade, à Comissão de Orçamento e Finanças, tendo sido nomeada a Sr.ª Deputada Cecília Meireles, do CDS-PP, para elaboração do parecer da Comissão. A discussão na generalidade ocorrerá no próximo dia 2 de Dezembro, na sequência do agendamento potestativo requerido pelos seus proponentes.
Na sua exposição de motivos os autores da iniciativa começam por recordar os contornos da venda da participação privilegiada da Portugal Telecom (PT) na brasileira Vivo, alegando que o negócio terá rendido à PT cerca de 7500 milhões de euros, no que ficou conhecido com um dos maiores negócios de alienação de participações sociais realizadas no ano de 2010 em todo o mundo.
Os proponentes alegam que a PT pretende distribuir aos seus accionistas, ainda em 2010, grande parte dos dividendos extraordinários resultantes das mais-valias do referido negócio (900 milhões de euros) que, no ano em curso, não deverão pagar um cêntimo de imposto, quando, se o Governo tivesse tido a iniciativa de legislar com efeitos em 2010 (e não apenas em 2011), poderiam pagar de imposto cerca de 250 milhões de euros.
A partir do caso da PT, que considera paradigmático, o PCP alega que o Governo deveria já ter legislado sobre a tributação dos dividendos das SGPS, ainda com efeitos ao ano de 2010.
Acrescentam que, nestas circunstâncias, o Parlamento pode e deve ainda colmatar essa omissão, razão pela qual apresentam a iniciativa em análise.
Saliente-se, por fim, que a proposta de lei n.º 42/XI (2.ª) — Orçamento do Estado para 2011 — , aprovado em votação final global no passado dia 26 de Novembro, alterou o artigo 51.º do Código do IRC (v. artigo 95.º da proposta de lei n.º 42/XI (2.ª)), com um texto idêntico ao agora proposto. De igual forma, também o artigo

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32.º do EBF foi sujeito a alterações (artigo 116.º da proposta de lei 42/XI (2.ª))1. Ainda assim, continua por satisfazer a pretensão dos autores da iniciativa, porquanto as alterações introduzidas nos referidos diplomas não abrangem a tributação de dividendos das SGPS para o ano de 2010.

II — Apreciação da conformidade dos requisitos formais, constitucionais e regimentais e do cumprimento da lei formulário

Conformidade com os requisitos formais, constitucionais e regimentais: A presente iniciativa é apresentada pelo Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português (PCP), no âmbito do poder de iniciativa da lei, em conformidade com o disposto na Constituição (n.º 1 do artigo 167.º) e no Regimento (artigo 118.º). Exercer a iniciativa da lei é um dos poderes dos deputados [alínea b) do artigo 156.º da Constituição e alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º do Regimento] e um dos direitos dos grupos parlamentares [alínea g) do n.º 2 do artigo 180.º da Constituição e alínea f) do artigo 8.º do Regimento].
São observados os requisitos formais respeitantes às iniciativas em geral [n.º 1 do artigo 119.º e alíneas a), b) e c) do n.º 1 do artigo 124.º do Regimento] e aos projectos de lei, em particular (n.º 1 do artigo 123.º do Regimento), o que significa que a iniciativa originária toma a forma de projecto de lei, porque é exercida pelos Deputados ou grupos parlamentares, está redigida sob a forma de artigos, tem uma designação que traduz sinteticamente o seu objecto, é precedida de uma exposição de motivos e é subscrita por seis Deputados (o limite máximo de assinaturas nos projectos de lei é 20).
Não se verifica violação aos limites da iniciativa impostos pelo Regimento, no que respeita ao artigo 120.º (não infringe a Constituição, define concretamente o sentido das modificações a introduzir na ordem legislativa e não implica «no ano económico em curso, aumento das despesas ou diminuição das receitas do Estado previstas no Orçamento»).
A matéria em causa insere-se no âmbito da reserva relativa de competência legislativa da Assembleia da República [alínea i) do artigo 165.º da Constituição].
Este preceito tem correspondência com outras normas constitucionais, designadamente com os artigos 103.º e 104.º da Constituição.
A reserva da lei, uma das vertentes do princípio da legalidade, é entendida, historicamente, como uma forma de assegurar que a «agressão do Estado à esfera patrimonial privada», através dos impostos, é feita dentro de determinados limites, ou seja, faz depender a sua legitimação da aprovação pelos representantes da soberania («A Assembleia da República é a assembleia representativa de todos os cidadãos portugueses» — artigo 147.º da Constituição).
A Constituição, apesar de consagrar um princípio da legalidade em que há uma exigência de lei em sentido formal, expressa como já referimos na alínea i) do artigo 165.º, possibilita, nesta matéria, a intervenção legislativa do Governo, através da concessão de autorizações legislativas.

Verificação do cumprimento da lei formulário: A Lei n.º 74/98, de 11 de Novembro, estabelece regras a observar no âmbito da publicação, identificação e formulário de diplomas.
Como estamos perante uma iniciativa legislativa, caso a mesma venha ser aprovada sem alterações, em conformidade com algumas disposições da designada Lei Formulário, entendemos apenas de referir o seguinte:

— Esta iniciativa contém disposição expressa sobre a entrada em vigor, pelo que se aplica o disposto no n.º 1 do artigo 2.º da citada lei («A presente lei entra em vigor, no dia seguinte ao da sua publicação.»); — Será publicada na 1.ª série do Diário da República, revestindo a forma de lei [alínea c) do n.º 2 do artigo 3.º da Lei Formulário]; — A presente iniciativa tem um título que traduz sinteticamente o seu objecto, em conformidade com o disposto no n.º 2 do artigo 7.º da Lei Formulário. No que respeita ao disposto no n.º 1 do artigo 6.º da mesma 1 O texto dos artigos da proposta de lei n.º 42/XI (2.ª)e respectivas propostas de alteração podem ser consultados em: http://www.parlamento.pt/sites/COM/XILEG/5COF/OE2011/Paginas/PesquisaPPLOE2011.aspx

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lei, apesar de se referir, no título, entre parêntesis, «(… ) altera o artigo 51.º do Código do Imposto sobre os Rendimentos das Pessoas Colectivas, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 442-B/88, de 30 de Novembro, e o artigo 32.º do Estatuto dos Benefícios Fiscais, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 215/89, de 1 de Julho, não se menciona o número de ordem da alteração introduzida nos diplomas que se visam alterar. Importa informar que, em relação ao Código do Imposto sobre os Rendimentos das Pessoas Colectivas, tem-se invocado razões de segurança jurídica, face ao número elevado de alterações efectuadas até ao momento2, designadamente em sede de Orçamento do Estado, para não mencionar o número de ordem da alteração efectuada. Por razões de uniformidade de texto, entendemos que procedimento semelhante se deve verificar em relação ao Estatuto dos Benefícios Fiscais3, devendo manter-se o título tal como consta da iniciativa.

III — Enquadramento legal e antecedentes

Enquadramento legal nacional e antecedentes: Sem prejuízo de quanto foi referido, no ponto 1 da presente nota técnica, quanto às alterações que lhe foram introduzidas pelo Orçamento do Estado para 2011, refira-se que, actualmente, o artigo 51.º do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas4, aprovado pelo Decreto-lei n.º 442-B/88, de 30 de Novembro, regula a «Eliminação da dupla tributação económica de lucros distribuídos».
Com esta iniciativa pretende-se alterar a alínea c) do n.º 1, que hoje prevê que «a entidade beneficiária detenha directamente uma participação no capital da sociedade que distribui os lucros não inferior a 10% ou com um custo de aquisição não inferior a € 20.000.000 e esta tenha permanecido na sua titularidade, de modo ininterrupto, durante o ano anterior à data da colocação à disposição dos lucros ou, se detida há menos tempo, desde que a participação seja mantida durante o tempo necessário para completar aquele período».
Propõe ainda a revogação do n.º 8 do mesmo artigo que estipula o seguinte:

«8 — A dedução a que se refere o n.º 1 é apenas de 50% dos rendimentos incluídos no lucro tributável correspondentes a: A ) Lucros distribuídos, quando não esteja preenchido qualquer dos requisitos previstos nas alíneas b) e c) do mesmo número e, bem assim, relativamente aos rendimentos que o associado aufira da associação à quota, desde que se verifique, em qualquer dos casos, a condição da alínea a) do n.º 1; b) Lucros distribuídos por entidade residente noutro Estado membro da União Europeia quando a entidade cumpre as condições estabelecidas no artigo 2.º da Directiva 90/435/CEE, de 23 de Julho, e não esteja verificado qualquer dos requisitos previstos na alínea c) do n.º 1.»

Este artigo corresponde ao artigo 46.º, na redacção do CIRC em vigor previamente à produção de efeitos do Decreto-Lei n.º 159/2009, de 13/07, que republicou aquele Código. A sua redacção anterior pode ser consultada nesta ligação5.
No que concerne ao Estatuto dos Benefícios Fiscais, cujo artigo 32.º será, igualmente, alterado em 2011, por força da recente aprovação do Orçamento do Estado para 2011, cabe referir que, actualmente, o referido artigo 32.º, relativo às «Sociedades gestoras de participações sociais (SGPS), sociedades de capital de risco (SCR) e investidores de capital de risco (ICR)», cuja revogação se prevê na iniciativa em análise, estipula: «Às SGPS, às SCR e aos ICR é aplicável o disposto nos n.os 1 e 5 do artigo 46.º do Código do IRC6 (Conceito de mais-valias e de menos-valias), sem dependência dos requisitos aí exigidos quanto à percentagem ou ao valor da participação».
Propõe-se ainda a alteração da redacção do n.º 9 deste artigo, que actualmente é a seguinte: «O disposto nos n.os 1 a 3 é igualmente aplicável a sociedades cuja sede ou direcção efectiva esteja situada em território 2 Efectuada consulta à base DIGESTO, apurámos a existência de 80 alterações de redacção ao Código do Imposto sobre os Rendimentos das Pessoas Colectivas, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 442-B/88, de 30 de Novembro 3 A mesma base DIGESTO revelou a existência de 70 alterações de redacção ao Estatuto dos Benefícios Fiscais, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 215/89, de 1 de Julho.
4http://info.portaldasfinancas.gov.pt/pt/informacao_fiscal/codigos_tributarios/circ_rep/ra/ircra51_1209.htm 5http://info.portaldasfinancas.gov.pt/pt/informacao_fiscal/codigos_tributarios/circ_rep/ra/ircra51_1209.htm 6 http://info.portaldasfinancas.gov.pt/pt/informacao_fiscal/codigos_tributarios/circ_rep/irc46.htm

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português, constituídas segundo o direito de outro Estado-membro da União Europeia, que tenham por único objecto contratual a gestão de participações sociais de outras sociedades, desde que preencham os demais requisitos a que se encontram sujeitas as sociedades regidas pelo Decreto-Lei n.º 495/88, de 30 de Dezembro7, 8 que define o regime jurídico das sociedades gestoras de participações sociais).» A redacção anterior deste artigo, pode ser consultada nesta ligação9.

Enquadramento internacional: Legislação de países da União Europeia A legislação comparada é apresentada para os seguintes países da União Europeia: Espanha e Itália.

Espanha: No ordenamento espanhol não encontrámos uma figura jurídica reconduzível à existente em Portugal, de sociedade gestora de participações sociais.
A tributação das sociedades em Espanha é regulada antes de mais pelo Real Decreto Legislativo 4/2004, de 5 de Março10, pelo qual se aprova o texto actualizado da Lei do Imposto sobre as Sociedades. Deve-se ter em conta o Título IV, do referido diploma, relativo à «base tributável» (artigos 10.º a 25.º) e o Capítulo IV, do Título VI, relativo às «Deduções para incentivar a realização de determinadas actividades» (artigos 35.º a 44.º).

Itália: Em Itália também não encontrámos uma figura jurídica reconduzível à existente em Portugal, de sociedade gestora de participações sociais.
A tributação das sociedades em Itália é regulada pelo IRES, acrónimo de «Imposto sobre rendimento das sociedades», e que é um imposto proporcional e pessoal com uma taxa de 33 %. Foi criado pelo Decreto Legislativo n.º 344/2003, de 12 de Dezembro11. A base e modos de tributação dos rendimentos das empresas constam dos artigos 56.º e seguintes do diploma.
Para uma maior desenvolvimento ver este documento12 relativo à tributação das sociedades.

IV — Iniciativas legislativas e petições pendentes sobre a mesma matéria

Efectuada consulta à base de dados da actividade parlamentar e do processo legislativo (PLC) não apurámos a existência de iniciativas nem de petições pendentes sobre a mesma matéria.

——— 7 http://dre.pt/pdf1s/1988/12/30106/05540556.pdf 8 O Decreto-Lei n.º 495/88, sofreu as seguintes alterações: 1 — Revogado o artigo 7.º pela Lei n.º109-B/2001.2001.12.27.AR DR I Série A, 2. Alterados os artigos 3.º, 4.º, 5.º, 8.º, 9.º e 13.º e revogados os n.º 5 do artigo 4.º, o n.º 1 do artigo 10.º e o n.º 3 do artigo 12.º pelo Decreto-Lei n.º 378/98.1998.11.27. 3. Alterados os artigos. 1.º, 3.º, 4.º, 5.º, 9.º, 10.º, 12.º e 13º e revogado o artigo 6.º, pelo Decreto-Lei n.º.318/94.1994.12.24 9http://info.portaldasfinancas.gov.pt/pt/informacao_fiscal/codigos_tributarios/bf_rep/ra/bfra32_1209.htm 10 http://noticias.juridicas.com/base_datos/Fiscal/rdleg4-2004.html 11 http://www.camera.it/parlam/leggi/deleghe/testi/03344dl.htm 12 http://www.lombardia.legacoop.it/public/editoria/MARZO_2004.pdf

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PROJECTO DE LEI N.º 454/XI (2.ª) REGIME DO FORNECIMENTO, PELOS AGENTES ECONÓMICOS, DE SACOS DE PLÁSTICO DESTINADOS A SEREM UTILIZADOS PARA CARREGAR E TRANSPORTAR AS MERCADORIAS ADQUIRIDAS PELOS CONSUMIDORES FINAIS NO COMÉRCIO A RETALHO, COM VISTA A REDUZIR A UTILIZAÇÃO MACIÇA DAQUELE TIPO DE SACOS E A ENCORAJAR A SUA REUTILIZAÇÃO

Exposição de motivos

Introduzidos nos Estados Unidos da América a partir do final dos anos 50, os sacos de plástico vulgarizaram-se um pouco por todo o mundo, não só pela enorme versatilidade de usos, leveza e impermeabilidade mas, também, pelo seu baixo custo.
Foi neste sentido que o fornecimento gratuito de sacos de plástico no comércio a retalho se tornou, nos últimos anos, uma prática generalizada para os comerciantes e para os consumidores, à medida que se transformaram os hábitos de consumo dos cidadãos e se modernizou o sector da distribuição.
As estimativas actuais cifram em mais de 500 mil milhões o número de sacos de plástico consumidos anualmente em todo o mundo. No mercado interno os portugueses são responsáveis pelo consumo de mais de duas mil toneladas destes sacos, distribuídos ou vendidos nos supermercados.
O padrão de desenvolvimento conduziu à generalização do seu uso, o qual acabou por gerar um volume imenso de resíduos não biodegradáveis, em particular nos meios urbanos, a cuja recolha e tratamento estão associados custos muito significativos que a comunidade, como um todo, tem por suportar.
Trata-se, para além do referido, de uma prática que consome recursos elevados ao longo de todo o ciclo económico e que, por assentar em derivados do petróleo como matéria-prima, se revela insustentável, contribuindo, ainda, para emissões de gases com efeito de estufa que se poderiam facilmente prevenir pela alteração de hábitos colectivos de aprovisionamento e consumo.
A utilização maciça de sacos de plástico, sem reutilização, dificulta as operações de recolha e tratamento de resíduos sólidos, afecta as redes de saneamento de águas e contribui fortemente para a deterioração da paisagem e para a poluição de linhas de água, solos, costas, mares, com danos muitas vezes irreversíveis, como os que resultam da asfixia de animais marinhos por ingestão de fracções destes resíduos persistentes, dificilmente assimiláveis pela natureza.
Um relatório do Programa das Nações Unidas para o Ambiente de 2006 veio afirmar que, actualmente, os sacos de plástico são particularmente letais para tartarugas e mamíferos marinhos. Os números são, aliás, dramáticos: anualmente, os detritos de plástico são responsáveis pela morte de 1 milhão de aves marinhas e de mais de 100 000 peixes e mamíferos marinhos.
Para fazer face ao consumo alucinante de sacos de plástico, e aos impactos ambientais a eles associados, vários são os países que têm adoptado políticas que visam mitigar a sua utilização, o que tem vindo a ser feito, nalguns casos, pela proibição absoluta do fornecimento de sacos de plástico e, noutros, pela respectiva tributação.
É nesta lógica de gestão sustentável de recursos e de minimização de produção de resíduos que se insere a necessidade de restrição do fornecimento de sacos de plástico no comércio a retalho, sobretudo ao nível do comércio sedentário.
As experiências feitas noutros países têm-se mostrado claramente positivas, resultando na alteração dos hábitos de comerciantes e consumidores e, também, numa poupança de recursos económicos e ambientais que, com a presente iniciativa legislativa, se pretende alcançar de forma generalizada em Portugal.
O caminho está, aliás, traçado. No Programa do XVIII Governo Constitucional define-se, como uma das suas prioridades na área do ambiente, a prevenção da produção de resíduos, fomentando a sua reutilização e reciclagem, dando primazia, nomeadamente, ao desincentivo do uso dos sacos de plástico a favor da promoção de materiais e produtos mais ecológicos.
A redução da produção de resíduos urbanos, designadamente, através da substituição de sacos de utilização única por alternativas reutilizáveis é uma medida preconizada no Programa de Prevenção de Resíduos Urbanos, aprovado para o período de 2009-2016 através do Despacho n.º 3227/2010, 22 de Fevereiro, da Ministra do Ambiente e do Ordenamento do Território.

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Acresce que o regime geral de gestão da resíduos, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 178/2006, de 5 de Setembro, bem como a Directiva 2008/98/CE, relativa aos resíduos, consagram já os princípios da prevenção e redução e da hierarquia das operações de gestão de resíduos, que determinam, sempre que possível, a garantia de que à utilização de um bem sucede uma nova utilização. Como resultado, identifica-se, como objectivo prioritário da política de gestão de resíduos, a redução da sua produção e do seu carácter nocivo.
De acordo com o Decreto-Lei n.º 366-A/97, de 20 de Dezembro, todas as embalagens não reutilizáveis colocadas no mercado devem ter uma marcação que informe o consumidor que o Sistema de Gestão de Resíduos de Embalagens assegura o seu correcto encaminhamento para valorização e reciclagem. Ora, em Portugal, a generalidade dos sacos de plástico colocados no mercado não chega a entrar na fileira da reciclagem, por não serem colocados num ecoponto nem entregues a qualquer outro sistema de recolha para reciclagem, pelo que urge encontrar medidas que possam alcançar os objectivos definidos.
A necessidade de minimizar a produção de resíduos e de assegurar a sua gestão sustentável, prevista no regime jurídico relativo a embalagens e resíduos de embalagens (que veio também estabelecer a prevenção e reutilização como princípios fundamentais da gestão de resíduos), é hoje, mais do que nunca, uma questão de cidadania.
O presente projecto de lei constitui um primeiro passo no sentido dessa alteração de hábitos, prevendo um sistema inovador, de acordo com o qual os agentes económicos que operam no comércio a retalho passam a ter de aplicar um desconto em função do valor das mercadorias sempre que o consumidor prescinda totalmente dos sacos de plástico para carregar e transportar as mercadorias adquiridas.
O sistema de desconto mínimo afigura-se adequado ao fim a que se destina, ou seja, à sensibilização dos consumidores para o consumo sustentável de sacos de plástico, apresentando-se como uma solução equilibrada.
Atentas estão, ainda, as Resoluções da Assembleia da República n.º 32/2008 e n.º 33/2008, de 23 de Julho, e que recomendam ao Governo a promoção da redução do uso de sacos de plástico, e que prevêem, entre outras medidas, a promoção, junto das grandes superfícies comerciais, do desenvolvimento de estratégias para a redução do uso de sacos de plástico de compras convencionais, como a criação de condições para tornar mais fácil e apetecível a utilização de sacos reutilizáveis, disponibilizados, ou não, pelas superfícies, designadamente através de um desconto simbólico na factura das compras a quem prescindir de levar sacos de plástico convencionais.
Nestes termos, no âmbito da Semana Europeia para a Prevenção de Resíduos, e ao abrigo das disposições legais e regimentais aplicáveis, os Deputados abaixo assinados, do Grupo Parlamentar do Partido Socialista, apresentam o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.º Objecto

A presente lei regula o fornecimento, pelos agentes económicos, de sacos de plástico destinados a serem utilizados para carregar e transportar as mercadorias adquiridas pelos consumidores finais no comércio a retalho sedentário, com vista a reduzir a utilização maciça daquele tipo de sacos e a encorajar a sua reutilização.

Artigo 2.º Âmbito de aplicação

1 — A presente lei aplica-se aos sacos de plástico fornecidos pelos agentes económicos ao consumidor final no comércio a retalho sedentário, destinados a serem utilizados para carregar e transportar as mercadorias aí adquiridas.
2 — Para efeitos de aplicação da presente lei, é considerado comércio a retalho sedentário o conjunto das grandes superfícies comerciais definidas pelo Decreto-Lei n.º 258/92, de 20 de Novembro, com a redacção que lhe é dada pelo Decreto-Lei n.º 83/95, de 26 de Abril.
3 — Excluem-se do âmbito de aplicação da presente lei:

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a) Os sacos de plástico que constituam a forma de embalagem directa e exclusiva de peixe, crustáceos, moluscos e respectivos produtos, carne e produtos à base de carne, fruta, frutos secos e produtos hortícolas, pão, produtos de pastelaria e confeitaria, derivados do leite, comida cozinhada quente ou fria e gelo; b) Os sacos de plástico biodegradáveis, entendendo-se como tais os que não sejam produzidos a partir de hidrocarbonetos de origem fóssil e obedeçam à norma CEN EN 13432 — Embalagem — requisitos para embalagens valorizáveis por compostagem e biodegradação — Programa de ensaios e critérios de avaliação para a aceitação final das embalagens.

Artigo 3.º Sistema de desconto mínimo

1 — O fornecimento de sacos de plástico ao consumidor final para carregar e transportar as mercadorias adquiridas no comércio a retalho sedentário está sujeito ao sistema de desconto mínimo.
2 — O sistema de desconto mínimo traduz-se na aplicação de um desconto sobre o preço das mercadorias vendidas ao consumidor final, de valor não inferior a 0,05 € por cada 5,00 € de compras, com IVA incluído, sempre que este prescinda totalmente dos sacos de plástico fornecidos gratuitamente pelo agente económico.
3 — Os agentes económicos dão conhecimento aos consumidores do sistema adoptado no respectivo estabelecimento, através da afixação da respectiva informação em local visível.
4 — Os agentes económicos que optem pela aplicação de um preço simbólico aos sacos de plástico ficam excluídos da obrigatoriedade de aplicação do sistema de desconto mínimo.

Artigo 4.º Medidas complementares

1 — Os agentes económicos que disponibilizarem sacos de plástico destinados a serem utilizados para carregar ou transportar as mercadorias adquiridas pelos consumidores finais devem promover medidas complementares no domínio do consumo sustentável de sacos de plástico, designadamente:

a) Sensibilização e incentivo aos consumidores finais para a utilização de meios alternativos aos sacos de plástico, bem como a sua reutilização; b) Promoção, junto dos consumidores finais, de práticas de deposição selectiva dos sacos de plástico não passíveis de reutilização, tendo em vista a sua reciclagem; c) Disponibilização, aos consumidores finais, de meios de carregamento e transporte reutilizáveis, a preços acessíveis.

2 — Sem prejuízo do disposto no número anterior, os agentes económicos devem assegurar a existência de pontos de deposição de sacos de plástico usados que se destinem à reciclagem.

Artigo 5.º Fiscalização

A fiscalização do cumprimento do disposto na presente lei compete à Autoridade de Segurança Alimentar e Económica.

Artigo 6.º Contra-ordenações

A violação do disposto nos artigos 3.º e 4.º constitui contra-ordenação ambiental leve, punível nos termos da Lei n.º 50/2006, de 29 de Agosto, na redacção que lhe é dada pela Lei n.º 89/2009, de 31 de Agosto, com a rectificação da Declaração de Rectificação n.º 70/2009, 1 de Outubro.

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Artigo 7.º Instrução dos processos e aplicação das coimas

A instrução dos processos de contra-ordenação compete à Autoridade de Segurança Alimentar e Económica e a aplicação das respectivas coimas e sanções acessórias à Comissão de Aplicação de Coimas em Matéria Económica e de Publicidade.

Artigo 8.º Avaliação da execução

No final do primeiro ano a contar da data de entrada em vigor da presente lei, e bianualmente nos anos subsequentes, a Agência Portuguesa do Ambiente elabora um relatório de avaliação sobre a aplicação e execução da mesma, com base na informação disponibilizada pela Autoridade de Segurança Alimentar e Económica e noutra informação considerada adequada.

Artigo 9.º Regiões autónomas

A presente lei aplica-se às Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira, sem prejuízo das necessárias adaptações à estrutura própria dos órgãos das respectivas administrações regionais.

Artigo 10.º Entrada em vigor

A presente lei entra em vigor noventa dias após a data da sua publicação.

Assembleia da República, 26 de Novembro de 2010 Os Deputados do PS: Francisco Assis — Renato Sampaio — Marcos Sá — Jorge Seguro Sanches — Frederico Castro — Jorge Fão — Jamila Madeira — Paulo Barradas — João Sequeira — Vítor Fontes — Lúcio Ferreira — Pedro Farmhouse — Manuel Seabra — Acácio Pinto — Filipe Neto Brandão — Rui Pereira — Glória Araújo — Jorge Manuel Gonçalves — Miguel Freitas — Rui Prudêncio.

——— PROJECTO DE LEI N.º 455/XI (2.ª) TRIBUTA AS MAIS-VALIAS MOBILIÁRIAS REALIZADAS POR SOCIEDADES GESTORES DE PARTICIPAÇÕES SOCIAIS (SGPS), SOCIEDADES DE CAPITAL DE RISCO (SCR), FUNDOS DE INVESTIMENTO, FUNDOS DE CAPITAL DE RISCO, FUNDOS DE INVESTIMENTO IMOBILIÁRIO EM RECURSOS FLORESTAIS, ENTIDADES NÃO RESIDENTES E INVESTIDORES DE CAPITAL DE RISCO (ICR) E FIXA EM 21,5% A TAXA APLICÁVEL A TODAS AS MAIS-VALIAS MOBILIÁRIAS TRIBUTADAS EM SEDE DE IRS E EM SEDE DE IRC

(Altera o Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 442-A/88, de 30 de Novembro, e o Estatuto dos Benefícios Fiscais, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 215/89, de 1 de Julho)

Exposição de motivos

1 — Não obstante a retórica, a verdade é que o bloqueio político do Partido Socialista à tributação plena das mais-valias mobiliárias ainda não terminou.
Não é possível esquecer que entre o final do ano 2000 — quando foi aprovada uma reforma fiscal resultante de uma iniciativa legislativa então apresentada pelo PCP — e o ano de 2010 se passaram 10 longos

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anos durante os quais a tributação das mais-valias mobiliárias foi uma autêntica miragem. Uma tremenda reviravolta política por parte do PS e do seu Governo fez com que tivessem sido revogadas as normas legais consensualizadas no ano 2000 para tributar as mais-valias mobiliárias, independentemente do tempo de posse por parte dos respectivos titulares.
Durante 10 anos a tributação das mais-valias mobiliárias limitou-se, assim, à aplicação de uma taxa de 10% aplicável aos rendimentos das mais-valias mobiliárias realizadas pela alienação de participações sociais detidas por períodos inferiores a um ano.
2 — Ao longo de 10 anos perderam-se, assim, milhões e milhões de euros de receitas fiscais passíveis de terem sido recebidas pelo Estado, se a tributação das mais-valias tivesse entrado em vigor. Ao longo destes 10 anos inúmeras propostas e iniciativas legislativas do PCP para que fosse reposta a legislação abandonada no ano 2000 esbarraram na indiferença e no desprezo político de sucessivas maiorias parlamentares — do PSD/CDS, entre 2002 e 2004, do PS, a partir de meados de 2005 — irmanadas na mesma falta de vontade política em introduzir níveis aceitáveis de equidade fiscal, designadamente pelo alargamento da base de incidência fiscal a rendimentos vultuosíssimos que continuaram quase sem tributação.
3 — Em 2010, depois de ter passado duas campanhas eleitorais (2005 e 2009) e uma legislatura (20052009) a escrever — fosse nos programas eleitorais fosse nos próprios programas de Governo — que queria «melhorar a eficiência e equidade na obtenção de recursos», designadamente através da aproximação «do regime de tributação das mais-valias mobiliárias ao praticado na generalidade dos países da OCDE», o PS (depois de rejeitar inúmeras iniciativas e propostas do PCP e de outros partidos) acabou por ceder e propor a tributação das mais-valias mobiliárias em sede de IRS, à taxa de 20%.
4 — Mas, mais uma vez, o Governo e o PS se ficaram «a meio do caminho». É que, ao aceitarem finalmente passar a proceder à tributação das mais-valias mobiliárias em sede de IRS, deixaram de fora todas as restantes, mantendo a isenção fiscal plena, ou a quase total isenção fiscal, para os rendimentos resultantes de mais-valias mobiliárias obtidas por uma imensidade de entidades, sujeitos passivos de IRC.
Fundos de investimento, Sociedades Gestoras de Participações Sociais (SGPS), Sociedades de Capital de Risco (SCR) e Fundos de Capital de Risco, Fundos de Investimento Imobiliários em Recursos Florestais e Investidores de Capital de Risco (ICR), Entidades Não Residentes em Território Português permanecem quase totalmente isentos de tributação dos rendimentos das mais-valias realizadas com a alienação de bens imobiliários e participações sociais.
5 — Mais uma vez, o PS e o Governo fizeram «ouvidos de mercador» a parte importante da iniciativa legislativa que o PCP apresentou a debate — projecto de lei n.º 209/XI (1.ª) — , em conjunto com a proposta do Governo, e que propunha tributar as mais-valias mobiliárias obtidas por fundos de investimento, SGPS, SCR, ICR e entidades não residentes.
Durante este debate o Governo anunciou que apenas com a tributação das mais-valias bolsistas em sede de IRS a receita fiscal adicional anual estimada poderia ser superior a 200 milhões de euros. Mas a verdade é que, mantendo a quase isenção plena na tributação em sede de IRC, particularmente o que respeita às SGPS e à generalidade dos fundos de investimento, tal como a que incide sobre entidades não residentes, estava também a criar um caminho de fuga à tributação da maior parte (ou mesmo da totalidade) dos detentores de participações mobiliárias tributáveis em IRS.
6 — Ou seja, o PS e o Governo, ao manterem na quase total isenção de tributação as mais-valias imobiliárias obtidas em IRC, não só desprezou, deliberadamente, receitas fiscais adicionais certamente bem superiores a 200 milhões de euros, como também permitiu desenvolver o «caminho legal da evasão fiscal» para os rendimentos das mais-valias mobiliárias tributadas em sede de IRS.
7 — O País, com a aprovação do Orçamento do Estado para 2011, viabilizado pelo PS e pelo PSD, está confrontado com políticas sociais, económicas e fiscais que não só podem vir a causar uma nova estagnação económica, como agravarão ainda mais a nossa dependência externa, contribuindo de forma acentuada para o aumento do desemprego, para o agravamento das condições sociais e de vida dos trabalhadores e da esmagadora maioria da população, reforçando políticas de flagrante iniquidade fiscal. Neste caso em particular, o Orçamento do Estado para 2011, patrocinado por PS e PSD, ao mesmo tempo que agrava de forma inaceitável os impostos directos e indirectos, com consequências nefastas para o povo, continua a deixar incólumes de tributação adicional os grandes grupos económicos e o sistema financeiro e continua a

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deixar no «paraíso» de uma quase total ausência de tributação milhares de milhões de euros de rendimentos obtidos em Portugal.
8 — É neste preciso contexto que o PCP propõe que passem a ser tributados, em IRC, os rendimentos das mais-valias obtidas pela alienação de participações sociais ou de bens mobiliários. Designadamente, o PCP propõe que passem a ser tributados, à taxa de 21,5%, as mais-valias mobiliárias obtidas pelas sociedades gestoras de participações sociais, sociedades de capital de risco, investidores de capital de risco e, de forma global, entidades não residentes, e propõe igualmente que passem a ser tributadas, à taxa de 21,5% (em vez da taxa de 10%), as mais-valias mobiliárias obtidas por fundos de investimentos, fundos de capital de risco e fundos de investimento mobiliários em recursos florestais.
9 — Finalmente, o PCP propõe também que a taxa de tributação das mais-valias mobiliárias em sede de IRS passe de 20% para 21,5%. Ao propor alterar o n.º 4 do artigo 72.º do Código do IRS, o PCP repõe nesta iniciativa legislativa a proposta que fez recentemente em sede do debate do Orçamento do Estado para 2011, que visava equipar o valor da generalidade das taxas autónomas e especiais previstas no CIRS para rendimentos da mesma natureza.
Esta proposta do PCP mereceu, durante o debate orçamental, a aceitação pública do Governo, tendo mesmo o Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais admitido ter sido um «lapso do Governo o facto daquela taxa se ter mantido em 20% na proposta de lei».
Não obstante esta declaração, a proposta do PCP acabou por ser rejeitada por imposição do PSD que terá invocado os termos do «Protocolo de entendimento ente o Governo e o PSD» para aprovar o Orçamento do Estado para 2011.
Tendo, em nome daquele protocolo, a bancada do PS contrariado a posição do Governo, nada impede que a harmonização, pelo valor de 21,5%, das mais-valias mobiliárias não possa resultar da aprovação do projecto de lei que o PCP apresenta.
Tendo em conta o exposto, o Grupo Parlamentar do PCP, ao abrigo das disposições regimentais e constitucionais aplicáveis, apresenta o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.º Alteração ao Código do Imposto sobre os Rendimentos das Pessoas Singulares

O artigo 72.º do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares, aprovado pelo DecretoLei n.º 442-A/88, de 30 de Novembro, abreviadamente designado por Código do IRS, passa a ter a seguinte redacção:

«Artigo 72.º (…) 1 — (…) 2 — (…) 3 — (…) 4 — O saldo positivo entre as mais-valias e menos-valias, resultante das operações previstas nas alíneas b), e), f) e g) do n.º 1 do artigo 10.º, é tributado à taxa de 21,5%.
5 — (…) 6 — (…) 7 — (…) 8 — (…) 9 — (…) 10 — (…) »

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Artigo 2.º Alteração ao Estatuto dos Benefícios Fiscais

Os artigos 22.º, 23.º, 24.º e 32.º, que integram o Capítulo III — «Benefícios fiscais ao sistema financeiro e mercado de capitais» — do Estatuto dos Benefícios Fiscais, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 215/89, de 1 de Julho, abreviadamente designado por EBF, passam a ter a seguinte redacção:

«Artigo 22.º (…) 1 — (…) a) (…) 1) (…) 2) (…) 3) (…) b) (…) c) Tratando-se de mais-valias, obtidas em território português ou fora dele, há lugar a tributação, autonomamente, nas mesmas condições em que se verificaria se desses rendimentos fossem titulares pessoas singulares residentes em território português, à taxa de 21,5%, sobre a diferença positiva entre as mais-valias e as menos-valias obtidas em cada ano, sendo o imposto entregue ao Estado pela respectiva entidade gestora, até ao fim do mês de Abril do ano seguinte àquele a que respeitar.

2 — (…) 3 — (…) 4 — (…) 5 — (…) 6 — (…) 7 — (…) 8 — (…) 9 — (…) 10 — (…) 11 — (…) 12 — (…) 13 — Os rendimentos, de qualquer natureza, dos fundos de fundos, que se constituam e operem de acordo com a legislação nacional, têm um regime fiscal idêntico ao estabelecido no presente artigo para os rendimentos, de idêntica natureza, dos fundos de investimento.
14 — (…) 15 — (…) 16 — (revogado)

Artigo 23.º (… )

1 — (…) 2 — (…) 3 — (…) 4 — (…) 5 — (…) 6 — (…)

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7 — O saldo positivo entre as mais-valias e as menos-valias resultantes da alienação de unidades de participação em fundos de capital de risco é tributado à taxa de 21,5%, quando os titulares sejam entidades não residentes ou sujeitos passivos de IRS residentes em território português, que obtenham os rendimentos fora do âmbito de uma actividade comercial, industrial ou agrícola e não optem pelo respectivo englobamento.
8 — (…) 9 — (…) Artigo 24.º (…) 1 — (…) 2 — (…) 3 — (…) 4 — (…) 5 — (…) 6 — (…) 7 — O saldo positivo entre as mais-valias e as menos-valias resultantes da alienação de unidades de participação em fundos de capital de investimento imobiliários em recursos florestais é tributado à taxa de 21,5%, quando os titulares sejam entidades não residentes ou sujeitos passivos de IRS residentes em território português, que obtenham os rendimentos fora do âmbito de uma actividade comercial, industrial ou agrícola e não optem pelo respectivo englobamento.

Artigo 32.º (…) 1 — (revogado) (A Assembleia da República aprovou a revogação do n.º 1, constante da proposta de lei n.º 42/XI (2.ª) — Orçamento do Estado para 2011) 2 — (revogado) 3 — (revogado) 4 — (…) 5 — (…) 6 — (…) 7 — (…) 8 — (…) 9 — (revogado)»

Artigo 3.º Norma revogatória

É revogado o artigo 27.º do Estatuto dos Benefícios Fiscais, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 215/89, de 1 de Julho.

Artigo 4.º Entrada em vigor

A presente lei entra em vigor no dia imediato ao da sua publicação.

Assembleia da República, 26 de Novembro de 2010 Os Deputados do PCP: Honório Novo — Rita Rato — Jorge Machado — Miguel Tiago — Bernardino Soares — António Filipe.

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PROJECTO DE LEI N.º 456/XI (2.ª) ESTABELECE AS BASES DA POLÍTICA DE AMBIENTE

A política de ambiente conheceu, em Portugal e no mundo, desenvolvimentos muito significativos nas últimas décadas, essencialmente por força da aproximação dos limites materiais da renovação dos recursos naturais que o modelo produtivo actual atingiu. A percepção global de que a umanidade vive em plena dependência das condições naturais e ambientais em que se insere generalizou a consciência colectiva e a preocupação política perante a natureza.
A actual Lei de Bases do Ambiente, a Lei n.º 11/87, contém, no essencial, as linhas mestras de uma política ambiental orientada para a harmonização das actividades humanas com o equilíbrio e estabilidade dos ciclos ambientais.
Se a concretização dos direitos constitucionais, e em particular o direito ao ambiente, aprofundados com a Lei de Bases de 1987, não foi plenamente atingida, não foi por imperfeições da lei, mas porque, à semelhança do que se tem passado em grande parte das áreas de intervenção dos sucessivos governos, os conteúdos e orientações da lei nem sempre são a base da actuação política que, em muitos casos, se subordina aos interesses de grupos económicos privados que identificam na natureza apenas um mercado e nas suas riquezas mercadorias de que se pretendem apropriar.
No entanto, é certo que, passados 21 anos, a Lei de Bases tem hoje um desfasamento significativo com os resultados do progresso científico e tecnológico no plano dos meios de produção e no plano dos impactos ambientais das actividades humanas e que carece efectivamente de uma profunda adaptação às preocupações que assumem hoje relevo no quadro das políticas de ambiente.
O projecto de lei que o Grupo Parlamentar do PCP apresenta à Assembleia da República não é uma mera adição de temas à lei existente, mas uma reformulação da resposta ao momento presente de conturbada relação da sociedade com a natureza.
Ao contrário do pressuposto do antagonismo entre o homem e a natureza, que está frequentemente implícito nas abordagens mais superficiais de políticas de ambiente, o projecto de lei que o Grupo Parlamentar do PCP apresenta centra-se na harmonização do desenvolvimento humano com a natureza, na unidade do homem com a natureza, de que faz parte e da qual depende.
São introduzidos novos e inovadores mecanismos legais para dar combate à degradação dos recursos naturais e aos impactos negativos das actividades antropogénicas no meio do qual depende o bem-estar de todos os seres humanos. Este projecto de lei traz vectores de intervenção política que se assumem como fundamentais, nomeadamente sobre riscos, catástrofes ambientais, danos e segurança ambiental, sobre a utilização de organismos geneticamente modificados, sobre o habitat humano, o bem-estar e a qualidade de vida, sobre a integridade do ciclo da água, alterações climáticas, modelo produtivo e gestão de materiais obsoletos.
Institui a abordagem integrada do sistema produtivo e dos seus efeitos na natureza, a única capaz de conciliar o desenvolvimento humano com a preservação das condições naturais que lhe são essenciais.
Além disso, o PCP propõe também a introdução de disposições legais sobre a conservação da natureza, em torno de uma abordagem transversal das riquezas naturais, integrando a sua componente estética, cultural, económica, humana e ecológica, com especial relevo para a biodiversidade e geodiversidade.
Em termos gerais, o projecto de lei de bases que o PCP agora apresenta traduz-se num passo em frente para a concretização dos direitos previstos nos artigos 64.º, 65.º e 66.º da Constituição da República Portuguesa, particularmente no que diz respeito ao direito a um ambiente são, capaz de assegurar o bemestar e a qualidade de vida a todos os portugueses.
Mas este projecto de lei também aprofunda a articulação entre os diferentes mecanismos legislativos de protecção e gestão ambiental, nomeadamente a Reserva Ecológica Nacional, as áreas protegidas, as avaliações ambientais e os planos sectoriais. Além disso, este é um projecto de lei que introduz na discussão política a necessidade de intervir de forma transversal, aprofundando, simultaneamente, a possibilidade de acompanhamento público de todos os procedimentos de avaliação ou de análise prévia.
Este é um projecto de lei de bases do ambiente que não rompe com a legislação de bases actual mas, sim, com a prática política que temos vindo a conhecer, introduz questões centrais da política ambiental dos dias de hoje, não numa perspectiva meramente mitigadora, mas também transformadora, que faz do bem-estar das

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pessoas e da qualidade de vida o padrão e o motor para um desenvolvimento harmonioso com a natureza e em equilíbrio com a sua capacidade de suporte e de renovação.
Assim, o Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português, ao abrigo das disposições legais e regimentais aplicáveis, apresenta o seguinte projecto de lei:

Capítulo I Princípios, objectivos e conceitos

Artigo 1.º Âmbito

A presente lei define as bases da política de ambiente.

Artigo 2.º Princípios gerais

1 — Todos os cidadãos têm direito a um ambiente humano e ecologicamente equilibrado, incumbindo ao Estado, por meio de organismos próprios e por apoio a iniciativas populares e comunitárias, promover a melhoria da qualidade de vida, quer individual quer colectiva.
2 — A política de ambiente tem por fim optimizar e garantir a continuidade de utilização dos recursos naturais, qualitativa e quantitativamente, como pressuposto de um desenvolvimento social, económico e cultural harmonioso e em equilíbrio com a dinâmica e o ciclo de regeneração de cada recurso natural.
3 — Sem prejuízo dos regimes sectoriais e dos âmbitos de protecção específica previstos na presente lei, a política de ambiente é definida e executada partindo de uma abordagem geral e transversal, integrada e conciliadora dos mais diversos factores humanos e naturais, considerando a interpenetrabilidade dinâmica entre esses factores.
4 — As responsabilidades do Estado na gestão dos recursos naturais, no ordenamento do território e na fiscalização das actividades humanas com impactos no ambiente são da sua responsabilidade directa e desempenhadas directamente por organismos próprios da administração do Estado com a participação das autarquias locais, sem possibilidade de delegação.

Artigo 3.º Princípios específicos

A política de ambiente, a preservação e a conservação da natureza implicam a observância dos seguintes princípios específicos:

a) Da precaução: as actuações, actividades ou a utilização de tecnologias ou produtos com implicações negativas potenciais no ambiente, na qualidade de vida, na exposição ao risco, ou na saúde, ou cujas implicações se desconheçam são alvo de procedimento experimental em ambiente controlado até que seja possível determinar as acções de mitigação e antecipação dos seus efeitos; b) Da prevenção: as actuações com efeitos imediatos ou a prazo no ambiente devem ser consideradas de forma antecipada, reduzindo ou eliminando as causas, prioritariamente à correcção dos efeitos dessas acções ou actividades susceptíveis de alterarem a qualidade do ambiente, sendo o poluidor obrigado a corrigir ou recuperar o ambiente, suportando os encargos daí resultando e as compensações aplicáveis a terceiros, não lhe sendo permitido continuar a acção poluente ou de degradação ambiental; c) Do equilíbrio: devem ser criados os meios adequados para assegurar a integração da componente ambiental e de conservação da natureza nas políticas de desenvolvimento económico e social, tendo como finalidade o desenvolvimento integrado, harmonioso e sustentado; d) Da divulgação e publicitação: a planificação e a avaliação dos impactos das actividades humanas, bem como a execução de políticas e acções ambientais, são publicamente divulgadas e acessíveis a todos os cidadãos ao longo de todas as fases de cada respectivo processo;

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e) Da participação: todos podem intervir na formulação e execução da política de ambiente e ordenamento do território, através dos órgãos competentes de administração central, regional e local, de outras pessoas colectivas de direito público, de pessoas e entidades privadas e de órgãos consultivos; f) Da unidade de gestão e acção: cabe ao órgão nacional responsável pela política de ambiente e do ordenamento do território, normalizar e informar sobre a actividade dos agentes públicos ou privados interventores, como forma de garantir a integração da política ambiental e territorial no planeamento económico, quer ao nível global, quer sectorial; g) Da cooperação internacional: através da procura de soluções concertadas com outros países ou organizações internacionais para os problemas do ambiente e da gestão dos recursos naturais; h) Da subsidiariedade: através da execução de medidas de política ambiental deve ter em conta os diferentes graus de administração do Estado e o mais adequado grau de intervenção, seja ele de âmbito internacional, nacional, regional, local ou sectorial; i) Da função sócio-ambiental dos recursos: através da sobreposição dos valores, qualidade de vida e bemestar colectivos ao exercício do direito de propriedade, sem prejuízo das garantias constitucionalmente consagradas; j) Da satisfação das necessidades básicas: através da subordinação das opções energéticas e ambientais às necessidades básicas do bem-estar colectivo, particularmente as relativas à alimentação e à saúde; l) Da solidariedade territorial: através da justa compensação, do indivíduo ou da comunidade, sempre que, por limitações específicas às suas regulares actividades socioeconómicas em função da salvaguarda de valores ambientais, possam ser prejudicados; m) Da perenidade: através do combate à efemeridade dos bens, particularmente dos não recicláveis, com medidas concretas junto dos agentes económicos e do mercado de consumo, estimulando processos que atribuam maior tempo de vida dos bens de consumo; n) Da recuperação: através da adopção de medidas urgentes para limitar os processos degradativos nas áreas em que ocorram e promover a recuperação dessas áreas, tendo em conta os equilíbrios a estabelecer com as áreas limítrofes; o) Da redução: através da utilização, nos processos transformativos, industriais e comerciais, das quantidades mínimas necessárias de material passível de gerar resíduos supérfluos, independentemente da sua natureza; p) Da reciclagem: através do encaminhamento para processos de reciclagem todos os materiais ou resíduos passíveis de serem convertidos em novos materiais utilizáveis; q) Da reutilização: através da reutilização de todos os materiais cujo tempo de vida possa ser prolongado além do previsto para a sua função inicial, ainda que através de uso distinto; r) Da acção local: através de uma política de combate à dependência externa e de defesa da soberania alimentar e produtiva, estimulando sempre que possível, em território nacional, a produção correspondente ao consumo interno; s) Da democratização e universalidade: através da gestão dos recursos naturais e o ordenamento do território visando a fruição colectiva, democrática e universal do recurso, ainda que de forma adequada ao grau de protecção a que deve estar sujeito; t) Da responsabilização: através da responsabilização dos agentes interventores pelas consequências da sua acção, directa ou indirecta, sobre terceiros e sobre os recursos naturais.

Artigo 4.º Objectivos

São objectivos da política de ambiente e ordenamento do território, designadamente:

a) O desenvolvimento económico e social em harmonia com os ciclos de regeneração dos recursos naturais que, satisfazendo as necessidades actuais, não prejudique a satisfação das necessidades de gerações futuras; b) O equilíbrio ecológico, a estabilidade dos ciclos e das relações biológicas e geológicas;

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c) Garantir o mínimo impacto ambiental negativo, através de uma planificação para a instalação correcta das actividades produtivas em termos territoriais; d) A manutenção dos ecossistemas que suportam a vida, a utilização racional dos recursos vivos e a preservação do património genético e da sua diversidade; e) A conservação dos valores naturais de acordo com o grau de protecção a que estão sujeitos, garantindo o equilíbrio biológico e a estabilidade dos habitats, nomeadamente através da compartimentação e diversificação das paisagens, da constituição de parques e reservas naturais e outras áreas protegidas, corredores ecológicos e espaços verdes urbanos e suburbanos, de modo a preservar o continuum naturale; f) A plenitude da vida humana e a permanência dos habitats indispensáveis ao seu suporte, bem como a garantia da qualidade de vida e o acesso aos recursos naturais vitais, nomeadamente o ar e a água; g) A defesa, recuperação e valorização do património cultural e social, natural ou construído; h) Desenvolver, através da investigação e desenvolvimento, os processos económicos e sociais, bem como os meios de produção, no sentido da minimização dos seus impactos no ambiente e nos recursos naturais; i) A recuperação das áreas e recursos naturais degradados do território nacional.

Artigo 5.º Conceitos e definições

Para efeitos da presente lei são definidos os seguintes conceitos:

a) A qualidade de vida é o resultado da interacção de múltiplos factores no funcionamento das sociedades humanas e traduz-se na situação de bem-estar físico, mental e social e na satisfação e afirmação culturais, bem como em relações autênticas entre o indivíduo e a comunidade, dependendo da influência de factores inter-relacionados, que compreendem, designadamente, a capacidade de carga do território e dos recursos; a alimentação, a habitação, a saúde, a educação, os transportes e a ocupação do tempo livre; um sistema social que assegure a posteridade de toda a população e os consequentes benefícios da segurança social; a integração da expansão urbana e industrial na paisagem, funcionando como factor de valorização da mesma, e não como agente de degradação; b) Ambiente é o conjunto dos sistemas físicos, químicos, geológicos, biológicos e suas relações e dos factores económicos, sociais e culturais com efeito directo ou indirecto, mediato ou imediato, sobre os seres vivos e a qualidade de vida da população humana; c) Ordenamento do território é o processo integrado de organização do espaço biofísico, tendo como objectivo o uso e a transformação do território de acordo com as suas capacidades e vocações, e a permanência dos valores de equilíbrio biológico e estabilidade geológica, numa perspectiva de aumento da sua capacidade de suporte de vida; d) Paisagem é a unidade geográfica, ecológica e estética resultante da acção humana e da reacção da natureza, sendo primitiva quando a acção humana é mínima ou nula, natural quando essa acção é determinante, sem prejudicar o equilíbrio biológico, a estabilidade física e a dinâmica ecológica, e urbana quando predominantemente transformada e artificializada pela pela acção humana e ocupada por edificação concentrada; e) Continuum naturale é o sistema contínuo de ocorrências que constituem o suporte de vida silvestre e de manutenção do potencial genético que contribui para o equilíbrio e estabilidade do território; f) Qualidade do ambiente é a adequabilidade de todos os seus componentes e recursos às necessidades dos seres humanos e dos restantes seres vivos; g) Poluição é o conjunto dos efeitos negativos provocados directa ou indirectamente pela acção humana na natureza que degradem ou afectem a saúde, o bem-estar, as diferentes formas de vida, a harmonia ou a durabilidade dos ecossistemas naturais e transformados ou a estabilidade física e biológica do território; h) Fontes poluidoras são actividades ou processos geradores de poluição; i) Conservação da natureza é a gestão da utilização humana da natureza, de modo a compatibilizar de forma perene a sua máxima rentabilização com a manutenção da capacidade de regeneração de todos os recursos naturais;

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j) Biodiversidade é a variabilidade genética traduzida no número de espécies e de comunidades específicas do conjunto dos seres vivos, independentemente do seu grau de complexidade; k) Geodiversidade é a variabilidade litológica, fóssil, geomorfológica, estrutural e mineral traduzida no número de espécies minerais, de tipos rochosos, de formações geomorfológicas, estruturas geológicas e na diversidade do registo fóssil e icnofóssil.

Capítulo II Instrumentos

Artigo 6.º Instrumentos

Sem prejuízo de outros instrumentos sectoriais e, para o cumprimento dos objectivos enunciados no artigo 4.º, são instrumentos da política de ambiente:

a) Os diversos instrumentos legais de ordenamento do território, quer nacionais, regionais, locais ou sectoriais; b) As condicionantes legais de ordenamento do território, nomeadamente a Reserva Agrícola Nacional e a Reserva Ecológica Nacional; c) A criação de regimes especiais de protecção de valores naturais ou ambientais, nomeadamente através da criação de parques ou reservas naturais; d) Os processos de licenciamento e de autorização; e) A fiscalização, por organismos próprios, do cumprimento da legislação ambiental; f) A administração, por organismos próprios, do património, dos recursos naturais e dos valores ambientais protegidos; g) A cartografia e o cadastro do território nacional, da propriedade, dos valores biológicos, geológicos e hidrológicos, actualizados e correctamente elaborados; h) A consulta e os inquéritos públicos; i) Apoio ao movimento associativo, nomeadamente às associações de defesa do ambiente, de utentes e de moradores; j) A investigação e desenvolvimento orientados para o aperfeiçoamento dos processos produtivos e para a eficiência energética e ecológica das actividades humanas; l) A divulgação, educação e sensibilização ambiental da população em geral; m) O adequado financiamento dos organismos de fiscalização e administração e a sua dotação dos meios técnicos e humanos necessários; n) Os processos legais de estudo, de avaliação, de declaração de impacte ambiental, bem como os processos de avaliação ambiental estratégica; o) Os incentivos públicos, nos termos da lei, às práticas de modernização dos meios de produção e de aumento da eficiência energética; p) A penalização fiscal, contra-ordenacional e penal, das práticas poluentes, lesivas ou desajustadas, nos termos da lei.

Artigo 7.º Cartografia e cadastro

1 — A elaboração de cartografia apropriada para a prossecução dos objectivos previstos na presente lei é da responsabilidade do Estado, através das entidades públicas competentes.
2 — O Estado, através da entidade pública competente, elabora e mantém actualizado um cadastro territorial, florestal, fundiário e de identificação dos valores naturais e habitats.
3 — A monitorização das políticas de ambiente e ordenamento do território é da responsabilidade do Estado, através das entidades públicas competentes.

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Artigo 8.º Áreas protegidas

1 — As áreas protegidas de âmbito nacional, nomeadamente as reservas naturais, os parques naturais, os parques nacionais e os sítios da Rede Natura 2000 são geridas e fiscalizadas pela autoridade pública competente, sem possibilidade de concessão dessas actividades.
2 — A cada uma das áreas protegidas referidas no número anterior corresponde uma unidade orgânica de direcção intermédia da administração central, dotada dos meios humanos e técnicos para a satisfação das necessidades materiais, biofísicas, sociais e ecológicas da área protegida que tutela.
3 — A cada organismo de direcção das áreas protegidas em território nacional corresponde um director, nomeado pelo Governo.
4 — As áreas protegidas são alvo de uma política de ordenamento do território própria, devidamente enquadrada na envolvente social e ambiental em que se inserem, definida através de planos de ordenamento para cada uma das referidas áreas.
5 — As áreas protegidas são alvo de uma política de visitação planificada por cada uma das direcções intermédias referidas nos números anteriores, de acordo com as limitações físicas, biofísicas, sociais ou ecológicas de cada área.
6 — Todos podem aceder e visitar as áreas protegidas independentemente da sua condição socioeconómica, nos termos dos planos de ordenamento das respectivas áreas.
7 — As autarquias locais participam e intervêm na definição dos planos de ordenamento e na gestão das áreas protegidas, nos termos desses planos.
8 — Os planos de ordenamento das áreas protegidas são acompanhados por um plano de desenvolvimento e investimento que contempla as medidas de ordenamento e de intervenção do Estado no sentido de assegurar o desenvolvimento local e regional no interior e na envolvente da respectiva área protegida.

Artigo 9.º Reserva Ecológica Nacional

1 — A Reserva Ecológica Nacional (REN) é uma estrutura biofísica que integra o conjunto das áreas que são objecto de protecção especial e diferenciada por razões ambientais, inserindo-se na REN, nomeadamente as áreas, corredores e percursos que se diferenciam do território circundante pela função específica ou restrições especiais decorrentes da Lei de Bases do Ambiente e, em especial, pelo estipulado sobre âmbitos específicos de protecção e sobre danos e riscos nos Capítulos II e III deste diploma.
2 — A REN representa, sintetiza, diferencia geograficamente e mapeia inequivocamente os territórios com diferentes estatutos e enquadramentos normativos, legais ou regulamentares no domínio do ambiente e da segurança ambiental e é constituída por uma colecção de figuras ou camadas distintas, a cada uma das quais correspondendo um regime específico, que a diferencia do território exterior.
3 — As representações da REN e as suas transposições para instrumentos de ordenamento do território, de licenciamento, de avaliação ambiental ou outros individualizam obrigatoriamente cada figura ou camada, associando-a ao estatuto, normativo, regulamento e condicionantes específicas, que são únicos para cada figura e diferentes em figuras distintas.
4 — As áreas correspondentes a sobreposições de figuras ou camadas da REN são sujeitas cumulativamente aos regimes associados a cada uma das figuras ou camadas.
5 — A inclusão ou exclusão de determinada área ou território numa ou mais figuras da REN é um acto normativo com instrução técnica e não pode ser executada por acto administrativo.
6 — A REN obedece a legislação própria, subordinada à Lei de Bases do Ambiente.

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Artigo 10.º Avaliações ambientais

1 — As decisões passíveis de ter efeitos directos ou indirectos, a curto ou longo prazo, certos ou incertos, no ambiente, ou, através do ambiente, provocar danos, aumentar riscos ou alterar a distribuição de benefícios, danos e riscos, são previamente instruídas por avaliação ambiental.
2 — São instrumentos de avaliação de efeitos ambientais:

a) Os processos de avaliação de impactes ambientais; b) Os processos de avaliação ambiental estratégica; c) Os estudos de impacte ambiental.

3 — A avaliação ambiental inicia-se obrigatoriamente pela caracterização da decisão em avaliação e alternativas, pela definição de âmbito e pela definição de profundidade, de cuja aprovação pela entidade pública competente depende o prosseguimento da avaliação.
4 — São avaliadas obrigatoriamente alternativas, incluindo a alternativa nula.
5 — A definição de âmbito apresenta clara e detalhadamente, para cada disposição ou condicionante estipulada na Lei de Bases do Ambiente e para cada figura ou camada da REN, as potenciais implicações da decisão em apreciação e a zona geográfica a abranger pelo estudo da repercussão do efeito ou efeitos potenciais de cada alternativa e identifica explicitamente as disposições, condicionantes e figuras com as quais nenhuma alternativa interfere, justificando, quando pertinente.
6 — A definição de profundidade caracteriza os métodos, estudos, informação e o grau de precisão e rigor da análise de cada efeito.
7 — Se a avaliação ambiental aprovada incluir medidas de mitigação de danos, de compensação, de segurança ou outras, a decisão não é passível de prossecução sem que essas medidas sejam tomadas.
8 — As avaliações ambientais e as peças técnicas e descritivas necessárias à sua instrução são públicas e publicitadas em todas as fases de aprovação.
9 — As avaliações ambientais obedecem a legislação própria, subordinada à Lei de Bases do Ambiente.
10 — Os cidadãos têm direito a requerer a avaliação ambiental com processo de consulta pública de decisões com potenciais efeitos danosos no ambiente, bem como exigir a avaliação de impactes específicos ou de efeitos de medidas de mitigação através de mecanismo regulamentado em legislação própria.

Artigo 11.º Instrumentos contra-ordenacionais e penais

1 — A lei prevê um regime contra-ordenacional como instrumento dissuasor e sancionatório das práticas lesivas para o ambiente ou para a utilização indevida ou abusiva dos recursos naturais.
2 — A lei prevê um regime de aplicação de penas como instrumento dissuasor e sancionatório da prática criminosa que envolva utilização indevida de recursos naturais, poluição ou degradação de recursos ou qualquer outra forma de actuação que se revele lesiva para a integridade dos ecossistemas, da biodiversidade e geodiversidade ou que coloque em risco a saúde e o bem-estar públicos.

Capítulo III Âmbitos específicos de protecção

Artigo 12.º Âmbitos específicos de protecção

Nos termos da presente lei, são âmbitos de protecção específica:

a) O solo b) A água;

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c) O ar; d) O clima; e) A biodiversidade e os recursos biológicos; f) O habitat humano; g) O subsolo; h) Os outros recursos geológicos e a geodiversidade; i) A luminosidade; j) O som; l) A radiação; m) As fontes e os recursos energéticos; n) O património natural e construído; o) A paisagem; p) O litoral.

Artigo 13.º Defesa da qualidade do ambiente e protecções específicas

No sentido de assegurar a defesa da qualidade do ambiente em cada um dos âmbitos específicos referidos no artigo anterior, poderá o Estado, através do Ministério da tutela ou dos organismos competentes, proibir ou condicionar o exercício de actividades e desenvolver acções necessárias à prossecução dos mesmos fins, nomeadamente através da obrigatoriedade de realização de análise prévia de custos-benefícios, tendo em conta os impactos ambientais, culturais, económicos e sociais de cada actividade.

Artigo 14.º Solo

1 — A defesa e valorização do solo e da sua função social como recurso natural determina a adopção de medidas conducentes à sua racional utilização, a evitar a sua degradação e a promover a melhoria da sua fertilidade e regeneração, incluindo o estabelecimento de uma política de gestão de recursos naturais que salvaguarde as estabilidade ecológica e os ecossistemas de produção, regulação ou de uso múltiplo e que regule o ciclo da água.
2 — É condicionada a utilização de solos agrícolas de elevada fertilidade para fins não agrícolas, bem como plantações, obras e operações ou práticas agrícolas que provoquem erosão e degradação do solo, o desprendimento de terras, encharcamento, inundações, salinização e outros efeitos perniciosos.
3 — Aos proprietários ou utilizadores de terrenos agrícolas podem ser impostas medidas de defesa e valorização dos mesmos, nos termos do n.º 1 deste artigo, nomeadamente a obrigatoriedade de execução de trabalhos técnicos, agrícolas ou silvícolas, ou outras medidas agro-ambientais, em conformidade com a legislação em vigor.
4 — O uso de biocidas, pesticidas, herbicidas, adubos, correctivos ou quaisquer outras substâncias poluentes e persistentes no solo, bem como a sua produção e comercialização, são objecto de regulamentação especial.
5 — Para efeitos do número anterior, sem prejuízo da evolução tecnológica e da indústria química, são limitadas e condicionadas as utilizações dos produtos referidos, em função das propriedades do solo e da sua localização, nomeadamente da sua posição relativa a recursos hídricos de superfície ou subterrâneos.
6 — A utilização e a ocupação do solo para usos urbanos e industriais ou implantação de equipamentos e infra-estruturas são condicionados pela sua natureza, topografia e fertilidade.

Artigo 15.º Água

1 — A protecção da água visa assegurar, de forma integrada e transversal, as suas funções sociais, ecológicas e económicas, como fluxo contínuo, determinante da composição atmosférica, do clima, da

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morfologia, das transformações químicas e biológicas e das condições de toda a vida na terra, insubstituível e essencial nas suas funções de suporte à vida, ao bem-estar humano e à maioria dos processos produtivos, bem como a protecção das pessoas, do território, dos solos e subsolos, dos seres vivos, dos ecossistemas e do património natural e construído relativamente a ameaças associadas à água, nomeadamente a cheias, a tempestades, a episódios de precipitação intensa, a variações da energia gravítica e cinética do escoamento e variações anómalas de caudais por causas naturais ou provocadas, a secas, a descontinuidades ou interrupções dos caudais dos cursos de água permanentes, a carências de água, à contaminação das águas, à exaustão da capacidade depuração de meio hídricos, a anomalias na fase hídrica dos ciclos do oxigénio, do fósforo, do azoto e do carbono, à eutrofização, à estagnação e outros fenómenos conducentes à ocorrência de meios aquáticos propícios à proliferação de organismos patogénicos ou vectores de transmissão de doenças.
2 — Os riscos sanitários, os riscos de arrastamento pelas águas, afogamento, erosão, deslizamento, esqueletização de solos e arrastamento de finos, submersão, de exaustão ou degradação de reservatórios de água, de degradação dos usos, da biodiversidade ou da ictiofauna por inadequação do regime de escoamento ou da qualidade física, química, microbiológica, ecológica da água, de emissões gasosas nocivas ou com odores, de contaminação de solos ou subsolo, bem como todos os riscos de degradação da sanidade ou da qualidade do ambiente em todas as suas vertentes, incluindo a paisagem, são alvo de regulamentação própria, nos termos da presente lei.
3 — É dever do Estado assegurar a protecção da água, fazer as intervenções necessárias à recuperação dos aspectos degradados e administrá-la, com base na solidariedade, na unidade do ciclo hidrológico, na harmonia com a dinâmica dos processos naturais e norteada pela defesa do primado do seu carácter público.
4 — São enquadrados por legislação sectorial específica os principais usos da água, com ênfase para a captação de águas, rejeição de efluentes e construções junto aos cursos de água, o presente diploma endereça especialmente a integração intersectorial da administração da água com a administração do ambiente e do território, com ênfase para a interacção com o solo e incidindo especialmente na abordagem integrada e holística da parte do ciclo da água que se processa no solo e no subsolo.
5 — As disposições do presente diploma aplicam-se à protecção de todas as fases e processos do ciclo hidrológico, aos terrenos e infra-estruturas necessários ao adequado funcionamento do ciclo da água e dos processos físicos químicos e biológicos que nela se processam, assim como à protecção das funções sociais e ecológicas da água, dos seus usos instalados e potenciais, com ênfase para a utilização doméstica e saneamento, bem como para a protecção das espécies piscícolas e outros ecossistemas aquáticos ou associados à água.
6 — Incluem-se no estatuto especial de protecção das águas:

a) Águas marítimas, águas costeiras e águas de transição, com respectivos fundos, leitos e margens; b) Águas interiores, nomeadamente cursos de água permanentes e temporários, lagos, lagoas, valas, canais e albufeiras, com respectivos leitos e margens, as águas subterrâneas e as águas subsuperficiais; c) Fontes, nascentes e minas de água, assim como as origens que as alimentam; d) Todos os reservatórios naturais ou artificiais comunicantes com sistemas aquíferos ou cursos de água, abrangendo, nomeadamente, a retenção de humidade pelos solos; e) Todo o domínio público hídrico, as servidões públicas associadas à água, as áreas inundáveis, as zonas ameaçadas por cheias, as origens de água para abastecimento público e outras figuras designadas ou que venham a ser designadas por legislação específica como de importância relevante para a protecção da água.

7 — São condicionadas e objecto de regulamentação especial as acções e usos do solo compatíveis com a protecção da água.
8 — São condicionadas, sujeitas a autorização do Estado e objecto de regulamentação especial todas as alterações morfológicas, reconversões de uso do solo, construções, movimentos de terras, instalação de equipamento, impermeabilizações, abandono ou incorporação de substâncias nocivas ou potencialmente contaminantes, ou quaisquer outras acções que:

a) Alterem ou perturbem o regime de escoamento; b) Alterem ou perturbem o regime de recarga de aquíferos;

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c) Interfiram com a continuidade dos percursos de cursos de água permanentes ou temporários, em todos os troços do percurso, nomeadamente, naturais ou artificiais, a céu aberto, cobertos, subsuperficiais, ou no subsolo; d) Deteriorem a qualidade física, química, biológica ou ecológica das águas, reduzindo a sua aptidão para usos humanos exigentes, nomeadamente a potabilidade ou uso balnear, ou prejudicando os ecossistemas aquáticos ou associados, com ênfase para ictiofauna, ou diminuindo a capacidade de depuração do meio hídrico; e) Perturbem os processos de infiltração, evapotranspiração, evaporação, armazenamento de água no solo, de formação ou transporte das nuvens, ou de formação da precipitação; f) Perturbem os processos de transporte sólido, erosão ou deposição; g) Alterem as condições de drenagem, induzindo alagamentos ou aumentos de velocidade; h) Desviem o curso das águas ou alterem a energia do escoamento, reduzindo caudais ou provocando aumentos de velocidade erosivos; i) De qualquer forma prejudiquem localmente ou em maior extensão o bom funcionamento do sistema hídrico, ou a capacidade de satisfação das funções sociais, ecológicas e económicas da água.

9 — O represamento de cursos de água para qualquer fim, a extracção de inertes em cursos de água ou nas margens e bancos de cursos de água são sujeitos a medidas de minimização da contenção de sedimentos e obedecem a normas próprias, identificadas nos estudos de impacte ambiental e declarações de impacte ambiental, que defendem a estabilidade do ciclo sedimentar, e garantem a produção, transporte e deposição dos sedimentos.
10 — São incentivadas e promovidas as actividades e usos do solo que contribuam para a protecção da água ou proporcionem recuperação das situações de degradação.
11 — É proibida a interrupção da continuidade dos percursos da água, temporários ou permanentes, desde que a precipitação atinge o solo e até que a água chega ao oceano; sejam esses percursos naturais ou artificiais, superficiais ou subterrâneos, incorporando ou não reservatórios ou aquíferos e seja qual for o período de residência em cada reservatório e em cada fase do percurso.
12 — Para efeitos de delimitação dos percursos referidos no número anterior, é considerada a bacia de drenagem pertinente, a intensidade, duração e frequência de precipitação mais desfavorável para uma probabilidade de ocorrência que não exceda uma vez em 100 anos.
13 — A qualidade dos percursos refere-se à harmonização dos seguintes factores, tendo em conta a variabilidade hidrológica natural e as probabilidades de ocorrência de fenómenos extremos:

a) Adequada drenagem das águas pluviais e superficiais; b) Bom escoamento de cheias, minimizando as áreas inundadas, as velocidades e a erosão; c) Manutenção contínua dos regimes de caudais dos cursos de água adequados na perspectiva das utilizações humanas instaladas ou habituais, incluindo o lazer e balnear, bem como na perspectiva ecológica, de protecção das espécies vivas e nomeadamente adequadas condições de circulação e de desova das espécies piscícolas residentes e das migratórias; d) Condições adequadas de infiltração e recarga de aquíferos; e) Maximização dos tempos de permanência nos reservatórios e nos percursos, no sentido de prolongar a fase do ciclo hidrológico entre a precipitação e a incorporação no oceano, optimizando a disponibilidade de água doce; f) Preservação das fontes e nascentes naturais; g) Minimização das condições favoráveis à contaminação das águas, especialmente das contidas em reservatórios de mais longas residências, e nomeadamente por inundação transporte e lexiviamento ou por alterações à permeabilidade ou aos diferenciais de energia determinantes dos escoamentos no subsolo; h) Minimização das condições que possam criar zonas insanas, nomeadamente, que possam adequar-se à proliferação de microorganismos patogénicos ou geradores de substâncias tóxicas ou ao desenvolvimento de agentes ou vectores de transmissão de doenças, que produzam emissões poluentes do ar ou odoríferas; i) Manutenção das velocidades dos cursos de água e dos níveis de oxigenação adequados, nomeadamente garantindo a capacidade de depuração e as boas condições ecológicas do meio hídrico.

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14 — Incumbe ao Estado, em articulação com as autarquias, a recuperação dos percursos degradados e assegurar a preservação da qualidade dos percursos e reservatórios existentes.
15 — O Estado, em articulação com as autarquias, elabora os planos de recuperação e manutenção dos percursos da água, a entrar em vigor no prazo de cinco anos após a aprovação desta lei.
16 — O Estado poderá autorizar ou promover alterações aos percursos existentes, desde que seja assegurado que a qualidade e capacidade dos novos troços não diminuem a qualidade dos percursos, que são adequados aos caudais previsíveis e que a alteração não diminui a qualidade ambiental, nos termos deste diploma, nem imputa riscos ou prejudica terceiros, nomeadamente no uso actual ou potencial do solo.
17 — Incumbe ao Estado, em articulação com as autarquias, fazer o cadastro, caracterização, nomeadamente em termos de caudais, e cartografia cotada dos percursos das águas, com a escala e rigor adequado, num prazo de cinco anos após a publicação desta diploma.
18 — O cadastro, caracterização e cartografia é actualizado e republicado de cinco em cinco anos, registando e incorporando as alterações, devidamente documentadas.
19 — Os instrumentos de planeamento com incidência territorial incorporam estes cadastros, articulam-se com os planos de recuperação e impõem as condicionantes pertinentes à utilização do solo.

Artigo 16.º Ar

1 — A gestão da qualidade do ar é regulamentada por legislação própria no sentido de garantir a sua adequação às necessidades dos ecossistemas e das comunidades humanas, garantindo um controlo permanente com cobertura territorial representativa, da proporção e natureza da mistura de compostos gasosos que o compõem.
2 — O lançamento para a atmosfera de quaisquer substâncias, seja qual for o seu estado físico, susceptíveis de afectarem de forma nociva a qualidade do ar e o equilíbrio ecológico ou que impliquem risco, dano ou incómodo grave para as pessoas e bem é limitado e é objecto de regulamentação especial.
3 — As alterações do odor do ar, ou da carga de partículas em suspensão, em função de actividades industriais, de processamento de resíduos ou de outras actividades económicas são da responsabilidade da entidade promotora da actividade, a quem cabe o seu controlo ou eliminação.
4 — A produção de energia eléctrica através do vento é alvo de regulamentação específica e atenta aos seus impactos na qualidade e no valor da estrutura e funcionamento da paisagem.
5 — É proibido pôr em funcionamento novos empreendimentos ou desenvolver aqueles já existentes e que, pela sua actividade, possam constituir fontes de poluição do ar sem serem dotações de instalações, dispositivos ou mecanismos em estado de funcionamento adequado para reter ou neutralizar as substâncias poluentes ou sem se terem tomado as medidas para respeitar as condições de protecção da qualidade do ar estabelecidas pelo organismo competente.

Artigo 17.º Clima

1 — O Estado assegura uma política de planeamento que salvaguarde os valores naturais, o bem-estar e a saúde públicos, tendo em conta a instabilidade climática, as variações de pressão, temperatura e composição atmosféricas, bem como os seus impactos.
2 — Para efeitos do disposto no número anterior, o Estado, através de entidade pública competente, garante a monitorização, por observação directa e modelação, da pressão, temperatura e composição atmosféricas, bem como a sua publicitação.
3 — É da responsabilidade do Estado a elaboração, a fiscalização e o cumprimento de planos de adaptação, mitigação e combate às alterações climáticas que influam negativamente no território nacional, no plano social ou económico.

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4 — Para efeitos do número anterior, o Estado cria e mantém um fundo para as alterações climáticas destinado prioritariamente à intervenção em território nacional para cumprimento dos objectivos fixados no n.º 1 do presente artigo.
5 — No âmbito da mitigação, adaptação e combate às alterações climáticas o Estado assegura a participação nacional e a cooperação internacional em políticas concertadas para a redução das consequências da variabilidade climática, incluindo o estímulo ao desenvolvimento dos meios produtivos e da indústria em território nacional ou estrangeiro.
6 — A política de combate às alterações climáticas em Portugal assenta na redução de emissão de gases com efeito estufa, na racionalização da utilização dos solos, no estímulo às fontes de energia não poluentes e na concretização de uma política de eficácia energética e no uso da água, através dos mecanismos legais adequados.

Artigo 18.º Biodiversidade e recursos biológicos

1 — A variabilidade genética e os organismos vivos são protegidos através de legislação própria, atendendo ao seu papel nos ecossistemas, à sua utilização na actividade humana, ao seu bem-estar e à abundância e dimensão de cada comunidade específica.
2 — Toda a fauna é protegida através de legislação especial com vista a salvaguardar a conservação e a exploração das espécies, principalmente sobre as quais recai interesse científico, económico, ou social, garantindo o seu potencial genético e os habitats que asseguram a sua existência.
3 — A protecção dos recursos faunísticos autóctones pode implicar medidas de restrição, condicionamento ou proibição de actividades humanas, nomeadamente no âmbito de:

a) Manutenção ou activação dos processos biológicos de auto-regeneração; b) Recuperação dos habitats degradados essenciais para a fauna e criação de habitats de substituição, quando necessário; c) Comercialização de fauna silvestre, aquática ou terrestre; d) Introdução de espécies animais selvagens, aquáticas ou terrestres, no território nacional, com relevo para as áreas protegidas; e) Destruição de animais tidos por prejudiciais, sem excepção, através do recurso a métodos não autorizados e sempre sobre controle das autoridades competentes; f) Regulamentação e controlo da importação e comercialização de espécies exóticas; g) Regulamentação e controlo da utilização de substâncias que prejudiquem a fauna selvagem; h) Organização de lista ou listas de espécies animais e das biocenoses em que se integram, quando raras ou ameaçadas de extinção.

4 — A exploração e gestão dos recursos animais, cinegéticos e piscícolas de águas interiores e da orla costeira marinha é objecto de legislação especial que regulamenta a sua valorização, fomento e usufruição, prestando especial atenção ao material genético que possa ser utilizado no desenvolvimento da silvicultura e da aquicultura e atendendo aos impactos ambientais inerentes às actividades em causa.
5 — A exploração de recursos faunísticos, independentemente das suas características, obedece a normas específicas que assegurem um nível de bem-estar animal máximo, de acordo com a capacidade tecnológica, através de legislação especial.
6 — A utilização para fins experimentais, científicos, de investigação ou para testes, de seres vivos sencientes é regulamentada por diploma próprio e carece de autorização pelas autoridades competentes.
7 — A política de ambiente promove a adopção de medidas de:

a) Substituição das técnicas que usam material senciente para os fins referidos no número anterior por outras, ou substituição do material senciente por outro não senciente, no quadro das possibilidades tecnológicas disponíveis; b) Redução da utilização de seres vivos sencientes para os fins referidos no número anterior;

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c) Aperfeiçoamento das técnicas relacionadas com os referidos fins, no sentido da redução das necessidades de utilização de seres vivos sencientes nesses procedimentos.

8 — A utilização de seres vivos sencientes em qualquer actividade económica, desportiva, cultural ou recreativa é regulamentada por legislação própria e sujeita a autorização das autoridades competentes, bem como a inspecções periódicas.
9 — A utilização de seres vivos sencientes para fins de companhia é de notificação obrigatória junto das autoridades competentes, nos termos de legislação específica.
10 — As formações vegetais espontâneas e subespontâneas que constituem o património florestal e dos espaços verdes urbanos e periurbanos são protegidas por lei especial que visa a sua integridade, salvaguarda e valorização.
11 — São proibidos os processos ou actividades que impeçam o desenvolvimento normal ou a recuperação da flora e da vegetação espontânea que apresentem interesse científico, económico e paisagístico, designadamente da flora silvestre e da flora ripícola.
12 — A política de protecção da flora visa, designadamente:

a) A salvaguarda e valorização do património silvícola do país, bem como o seu ordenamento em função de objectivos científicos, económicos, sociais e paisagísticos; b) A recuperação dos recursos silvícolas degradados ou afectados por incêndios florestais; c) A conservação das espécies vegetais ameaçadas de extinção ou os exemplares botânicos isolados ou em grupo que, pelo seu potencial genético, porte, idade, raridade, ou outra razão, representem um valor ecológico, científico, económico, social, cultural ou paisagístico; d) O controlo da colheita, do abate da utilização e comercialização de certas espécies vegetais e seus derivados, da sua importação ou da introdução de exemplares exóticos, através de legislação adequada.
e) O combate à desertificação, acidificação ou salinização dos solos.

13 — A conservação da biodiversidade animal, vegetal ou dos restantes seres vivos, bem como dos correspondentes habitats, é inalienável e incumbe ao Estado, através dos seus organismos competentes.
14 — Para efeitos do disposto no número anterior, através dos organismos competentes, o Estado organiza, e actualiza sempre que necessário, a inventariação e identificação dos valores biológicos, bem como dos seus habitats, de acordo com a sua distribuição geográfica, com suporte em registo cartográfico com escala adequada.
15 — É proibida a libertação ou introdução em território nacional, em ambiente não controlado, de organismos geneticamente modificados.

Artigo 19.º Habitat humano

1 — O Estado assegura, nomeadamente através da política de ambiente, a qualidade do habitat humano, essencial à fruição plena e universal dos direitos ao ambiente, à habitação e à saúde garantidos, respectivamente, pelos artigos 66.º, 65.º e 64.º da Constituição da República Portuguesa.
2 — O habitat humano é fundamentalmente integrado pelas áreas naturais e urbanas que constituem ambiente e suporte da actividade humana nas suas diversas dimensões: na habitação, no trabalho, no estudo, no lazer, na organização comunitária e no viver colectivo.
3 — Estão abrangidas para efeitos da presente lei as componentes, funções, processos, infra-estruturas, equipamentos e serviços relevantes para a qualidade do habitat humano, incluindo, designadamente, a qualidade e segurança ambientais, sanitárias e estruturais dos espaços interiores e exteriores.
4 — Uma ocupação equilibrada em termos de usos e densidades assegura o desenvolvimento harmonioso e ambientalmente sustentado do território nacional no seu conjunto.
5 — O habitat humano assegura uma relação equilibrada com a paisagem e o ambiente natural. As formas de ocupação do solo que realiza são compatíveis e tiram vantagem dos processos naturais pré-existentes,

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nomeadamente no que diz respeito à drenagem natural das águas superficiais, à desobstrução das linhas de água, ao regime de ventos e brisas dominantes que asseguram a renovação e a qualidade do ar.
6 — O habitat humano tem as suas funções organizadas de forma a reduzir os custos energéticos dos diferentes modos de transporte, a facilitar as deslocações, a potencializar a oferta e a utilização das redes de transporte colectivo.
7 — Na relação entre a habitação, os locais de trabalho e os equipamentos colectivos a política de ambiente valoriza a proximidade e os pequenos percursos, privilegiando a continuidade da ocupação do espaço e a desobstrução dos percursos.
8 — A construção de espaços habitáveis privilegia as envolventes que asseguram menores custos energéticos e maior durabilidade.
9 — O planeamento urbano privilegia a contenção dos perímetros urbanos, e favorece a reabilitação e a reconversão da construção existente.

Artigo 20.º Subsolo

1 — A exploração dos recursos do subsolo, marítimo ou terrestre, deverá ter em conta:

a) As limitações impostas pelas necessidades de conservação da natureza e dos recursos naturais; b) A necessidade de obedecer a um plano global de desenvolvimento e, portanto, a uma articulação a nível nacional; c) Os interesses e questões que local e mais directamente interessem às regiões e autarquias onde se insiram.

2 — Sem prejuízo do disposto no n.º 1 do presente artigo, a exploração dos recursos do subsolo deverá ser orientada de forma a respeitar os seguintes princípios:

a) Garantia das condições que permitam a regeneração dos factores naturais renováveis e uma adequada relação entre o volume das reservas abertas e o das preparadas para serem abertas; b) Valorização máxima de todas as matérias-primas extraídas, independentemente de constituírem ou não o recurso nuclear da exploração; c) Exploração racional das nascentes de águas minerais e termais, fontes geotérmicas e hidrotermais, e determinação dos seus perímetros de protecção; d) Adopção de medidas preventivas de degradação do ambiente resultantes dos trabalhos de extracção de matéria-prima que possam pôr em perigo a estabilidade dos sistemas naturais e sociais; e) Adopção de medidas especiais de controlo e contenção de radioactividade sempre que a exploração do subsolo incida sobre matérias-primas radioactivas; f) Reconstrução obrigatória e reabilitação funcional da paisagem quando da exploração dos recursos do subsolo resulte alteração da topografia preexistente, do coberto vegetal ou outros valores naturais importantes, com vista à integração harmoniosa da área sujeita à exploração na paisagem envolvente.

3 — É proibida a concessão de novas explorações, ou o desenvolvimento daquelas que já existem, sempre que se verifique ou seja previsível, em análise prévia, o incumprimento, de qualquer um dos princípios referidos no número anterior.

Artigo 21.º Outros recursos geológicos e geodiversidade

1 — As formações geomorfológicas de relevante interesse, os monumentos geológicos, e as estruturas geológicas, as fontes geotermais e hidrotermais, as camadas litológicas de interesse paleo-estratigráfico, os fósseis e os icnofósseis constituem valores ambientais a salvaguardar, de acordo com a sua importância.

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2 — O Estado promove a preservação e salvaguarda do património geológico, litológico, estratigráfico e paleontológico, através de legislação especial de protecção da geodiversidade e da criação e funcionamento dos mecanismos e organismos adequados.
3 — A produção de energia através de recursos energéticos geológicos internos é alvo de regulamentação específica.
4 — O Estado pode impor, através do Ministério da tutela ou dos organismos competentes, impedimentos ou condicionantes ao exercício de actividades humanas que coloquem em risco ou sejam passíveis de degradar património geológico de relevante importância científica, social, cultural ou económica.

Artigo 22.º Litoral

1 — Todos têm direito a aceder e usufruir do litoral, nomeadamente da faixa compreendida entre os cordões dunares e o mar, das falésias e arribas estáveis e seguras.
2 — O âmbito específico litoral compreende a zona de interacção entre o mar e a terra e, designadamente, o domínio público hídrico marítimo e o território confinante, as terras reclamadas ao mar, os estuários, as águas costeiras, de transição e todas aquelas, superficiais ou subterrâneas, cujo regime seja influenciado pelas marés ou sujeitas a intrusão salina, com seus leitos, margens e formações que os delimitam, as praias, falésias e sistemas dunares, os solos associados com seu coberto vegetal, bem como os processos, os ecossistemas, incluindo o humano, as actividades, as construções, os equipamentos, as instalações e a laboração associados a esses espaços e compreende ainda as zonas passíveis de ser submersas, inundadas ou erodidas por causas associadas a ondulação excepcional ou subidas do nível do mar de curta ou de longa duração, incluindo marés vivas, maremotos ou outras.
3 — A política de gestão do litoral considera a influência das actividades humanas e limita a sua realização de acordo com a estabilidade da faixa costeira, nomeadamente face a fenómenos de avanço ou recuo da linha de costa, a tempestades ou cheias ou intrusão salina em aquíferos de abastecimento para qualquer fim.
4 — A política de gestão do litoral é transversal, nacional e da responsabilidade do Estado, nomeadamente no que toca a concertação internacional e transfronteiriça que se demonstre necessária para a estabilidade da faixa costeira continental.
5 — O litoral tem expressão territorial transposta nos instrumentos de ordenamento do território com a delimitação, expressão e regulamentação específica adequada.
6 — A gestão do litoral é definida por instrumentos de ordenamento do território próprios, os planos de ordenamento da orla costeira, definidos em articulação com as autarquias locais.

Artigo 23.º Luminosidade

1 — Todos têm direito a um nível de luminosidade natural conveniente à sua saúde, bem-estar e conforto na habitação, no local de trabalho e nos espaços públicos de recreio, lazer e circulação.
2 — Nos termos do número anterior, ficam condicionados:

a) A volumetria dos edifícios a construir, no sentido de impedir que prejudique a qualidade de vida dos cidadãos e a vegetação, pelo ensombramento, dos espaços públicos e privados; b) O regulamento e as normas específicas respeitantes à construção de fogos para habitação, escritórios, fábricas e outros locais de trabalho, escolas e restante equipamento social; c) A volumetria das construções a erigir na periferia de espaços verdes existentes ou a construir; d) Os anúncios luminosos só são permitidos nas áreas urbanas e são condicionadas as suas cor, forma, intensidade luminosa, localização e intermitência, por regulamentação especial.

3 — O nível de luminosidade para qualquer lugar deve ser o mais consentâneo com o equilíbrio dos ecossistemas transformados de que depende a qualidade de vida das populações.

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4 — Os anúncios luminosos, fixos ou intermitentes, não devem perturbar o sossego, a saúde e o bem-estar dos cidadãos.

Artigo 24.º Som

1 — Todos têm direito a um nível de ruído conveniente à sua saúde, bem-estar e conforto na habitação, no local de trabalho e nos espaços públicos de recreio, lazer e circulação.
2 — Nos termos do número anterior, compete ao Estado assumir o controlo do ruído através, designadamente:

a) Da normalização dos métodos de medida do ruído; b) Do estabelecimento de níveis sonoros máximos; c) Da redução do nível sonoro na origem, através da fixação de normas de emissão aplicáveis às diferentes fontes; d) Dos incentivos à utilização de equipamentos cuja produção de ruídos esteja contida dentro dos níveis máximos admitidos para cada caso; e) Da obrigação de os fabricantes de máquinas e electrodomésticos apresentarem informações detalhadas, homologadas, sobre o nível sonoro dos mesmos nas instruções de uso; f) Da introdução nas autorizações de construção de edifícios, utilização de equipamento ou exercício de actividades da obrigatoriedade de adoptar medidas preventivas para eliminação da propagação do ruído para o exterior e no interior, bem como das trepidações.
g) Da sensibilização das populações para os problemas associados ao ruído; h) Da localização adequada no território das actividades causadoras de ruído.

3 — Os veículos motorizados, incluindo as embarcações, aeronaves e transportes ferroviários, estão sujeitos a homologação e controlo no que se refere às características do ruído que produzem.
4 — Os avisadores sonoros estão sujeitos a homologação e controlo no que se refere às características das vibrações acústicas que produzem.
5 — Os equipamentos electromecânicos deverão ter especificadas as características do ruído que produzem.

Artigo 25.º Radiação

1 — O espaço hertziano e os campos electromagnéticos são recursos naturais regulamentados por legislação própria.
2 — A radiação solar é um bem comum de acesso público e livre.
3 — São proibidas as actividades ou processos que impeçam permanentemente ou de forma significativa, contra a vontade do proprietário, a incidência da radiação solar sobre os solos ou edifícios.
4 — A produção de energia eléctrica que use como fonte directa a radiação solar é regulamentada por legislação própria.

Artigo 26.º Fontes e recursos energéticos

1 — As fontes e recursos energéticos são alvo de uma gestão que visa, designadamente:

a) O aumento da eficácia energética e a democratização do usufruto das comodidades da energia; b) O desenvolvimento da produção nacional, em harmonia com o equilíbrio ecológico e a conservação da natureza; c) O aproveitamento optimizado das fontes e recursos naturais, com o menor impacto ambiental.

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d) A diminuição da dependência energética externa do País e a minimização do recurso à combustão como forma de produção de energia.

2 — As fontes e os recursos energéticos, ou seja, a água, as fontes hidrotermais e geotérmicas, os hidrocarbonetos., os recursos minerais, o ar, a radiação solar, são inalienáveis e a sua gestão cabe ao Estado, de acordo com legislação própria.
3 — A produção e utilização de biomassa para produção de energia eléctrica são regulamentadas por legislação própria.
4 — A produção e utilização de combustíveis, para qualquer fim, obtidos, em todo ou em parte, através de recursos biológicos produzidos no país ou no estrangeiro é regulamentada por legislação especial, salvaguardando a função social dos solos, nomeadamente no que diz respeito à produção alimentar.
5 — A implantação ou construção de infra-estruturas de produção ou transformação energética através de recursos naturais é alvo de planificação sectorial no plano nacional e regional que identifica as potencialidades e impactos da referida produção, nomeadamente nos planos económico, ecológico, paisagístico e humano.

Artigo 27.º Património natural e construído

1 — São deveres do Estado, através de legislação adequada:

a) A salvaguarda, conservação e valorização do património natural e construído, bem como do património histórico e cultural através, entre outros, de uma adequada gestão dos recursos existentes, da planificação das acções a empreender numa perspectiva de animação e utilização criativa; b) A recuperação e reabilitação dos centros históricos das áreas urbanas e rurais, a conservação ou recuperação de paisagens primitivas e naturais notáveis e de edifícios e conjuntos monumentais; c) A inventariação e a classificação do património histórico, cultural, natural e construído, em cooperação com as autarquias locais e com as associações locais de defesa do património e de defesa do ambiente; d) A promoção do desenvolvimento local e regional através da valorização do património cultural e construído identitário de cada região.

2 — Constitui responsabilidade do Estado a inventariação e classificação do património histórico, cultural, natural e construído, bem como de bens paleontológicos, em cooperação com as autarquias locais e com as associações locais de defesa do património e de defesa do ambiente.
3 — Aos proprietários de bens patrimoniais culturais e naturais incumbe a preservação e protecção dos mesmos.
4 — Os proprietários e usufrutuários têm o direito à informação quanto aos actos de administração do património, à indemnização, a pronunciarem-se quanto à definição da política, ao conhecimento das medidas aplicadas e a recurso à expropriação.
5 — Os proprietários e usufrutuários têm ainda os deveres de conservar e proteger o bem, de facilitar o acesso à informação necessária e de facilitar o acesso e usufruto físico do bem, nos casos em que não existam incompatibilidades.
6 — Os bens patrimoniais naturais e construídos são alvo de regulamentação específica, por parte de entidades responsáveis pela sua salvaguarda, designadamente medidas de estabelecimento de zonas de protecção e procedimentos específicos, relativos à intervenção nessas áreas, determinados pela tutela e delimitação zonas de protecção específica, em respeito pela defesa da qualidade ambiental e paisagística.
7 — As intervenções em monumentos, conjuntos e sítios são autorizadas por pareceres vinculativos das autoridades competentes tendo em conta o enquadramento paisagístico e regulamentar existente.
8 — Para efeitos do disposto no número anterior, a lei estabelece a orgânica e o modo de funcionamento dos organismos, existentes ou a criar, responsáveis e considerados necessários para o seu cumprimento.

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Artigo 28.º Paisagem

1 — Para a preservação da paisagem como unidade ecológica, estética e visual serão condicionados pela administração central, regional, ou local a implantação de construções, infra-estruturas viárias, novos aglomerados urbanos ou outras construções que, pela sua dimensão, volume, silhueta, cor ou localização, provoquem um impacto perturbante na paisagem preexistente, bem como a exploração de minas e pedreiras, evacuação e acumulação de resíduos e materiais usados e o corte maciço do arvoredo, nos termos de legislação específica.
2 — A ocupação marginal das infra-estruturas viárias, fluviais, portuárias ou aeroportuárias, qualquer que seja o seu tipo, hierarquia ou localização, é objecto de regulamentação especial.
3 — Para uma política de gestão da paisagem, são instrumentos:

a) A protecção e valorização das paisagens que, caracterizadas pelas actividades seculares do ser humano, pela sua diversidade, concentração e harmonia e pelo sistema sociocultural que criaram, se revelam importantes para a manutenção da pluralidade paisagística e cultural; b) A determinação de critérios múltiplos e dinâmicos que permitam definir prioridades de intervenção, quer no que respeita às áreas menos afectadas pela presença humana quer àquelas em que a acção humana é mais determinante; c) Uma estratégia de desenvolvimento que empenha as populações na defesa desses valores, nomeadamente, e sempre que necessário, por intermédio de incentivos financeiros ou fiscais e de apoio técnico e social; d) O inventário e a avaliação dos tipos característicos de paisagem rural e urbana, comportando elementos abióticos, bióticos e culturais; e) A identificação e cartografia dos valores visuais e estéticos das paisagens naturais.

Artigo 29.º Avaliação e protecção

1 — As políticas, planos, programas e outras decisões do Estado de promoção ou autorização de intervenções são acompanhadas de análise prévia dos seus potenciais efeitos e riscos ambientais.
2 — Os âmbitos específicos de protecção e as ameaças específicas são explicitamente considerados, em todas as suas vertentes, nos estudos e avaliações ambientais, assim como na tomada de decisões públicas sobre intervenções físicas no território ou nas águas, nomeadamente:

a) Nos processos de avaliação de impacte ambiental; b) Nos estudos de impacte ambiental; c) Nos processos de declaração ambiental e noutras avaliações ambientais;) d) Na instrução dos processos de licenciamento; e) Em processos de desafectação ou de alteração de condicionantes ao uso do solo; f) Nas avaliações ambientais estratégicas de planos e programas; g) Na instrução dos processos de declaração de interesse público; h) Na instrução do processo de classificação de qualquer projecto como de «Potencial Interesse Nacional»; i) Nos processos de concessão, com ou sem concurso público.

3 — São obrigatoriamente emitidos e publicitados gratuitamente relatórios técnicos e resumos não técnicos dos elementos apurados e postos à consulta pública, em moldes a definir por lei, antes da deliberação sobre o plano, programa, projecto ou acção.
4 — Exceptuam-se as intervenções necessárias em situações de emergência, de reparação urgente ou de socorro.

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Capítulo IV Segurança, danos e riscos

Artigo 30.º Danos e Riscos por causas naturais ou provocadas

1 — Incumbe ao Estado prevenir e mitigar os danos no ambiente e os prejuízos pessoais devidos a causas naturais, a acidentes ou a acções de terceiros e, designadamente, a acções que alterem a vulnerabilidade, a magnitude, a exposição ou a distribuição dos danos.
2 — Para efeitos do número anterior, a prevenção e mitigação dos danos compreende a segurança em relação a danos incertos ou riscos.
3 — O Estado inventaria e caracteriza as situações de vulnerabilidade e de risco existentes e elaborados planos de recuperação, redução da vulnerabilidade e mitigação dos danos, bem como programas operacionais de emergência nos casos de inevitabilidade dos riscos.
4 — O Estado garante a monitorização e fiscalização adequadas à minimização de danos e riscos e empreende as acções necessárias à cessação das situações irregulares.
5 — Legislação sectorial, designadamente, regulamentação técnica e de segurança de construção e de laboração, bem como condicionantes dos instrumentos de ordenamento do território e outra regulamentação específica, impõe limitações às actividades humanas, à construção e ao uso dos solos, de acordo com as condicionantes naturais verificadas no terreno, nomeadamente em relação às ameaças específicas objecto do artigo seguinte.
6 — Os cidadãos colocados em situação de risco provocado ou afectados por acidente decorrido desse risco têm direito a compensação, nos termos da lei.
7 — A lei proíbe a realização de acções indutoras de risco ou danosas para terceiros, sempre que os instrumentos de análise prévia indiquem a impossibilidade de serem tomadas medidas de mitigação que permitam, com elevado grau de certeza e razoabilidade, prever a contenção do risco para níveis de segurança que garantam o bem-estar das populações, o equilíbrio ecológico, a conservação da natureza ou a preservação de valores naturais e construídos de relevante interesse científico, económico, social ou cultural.
8 — O Estado dispõe de um fundo público de compensação para os danos materiais e humanos em caso de catástrofe natural, accionado sempre que o valor do prejuízo o justifique, nos termos de legislação própria.

Artigo 31.º Ameaças específicas

A legislação complementar e o planeamento sectorial para efeitos de medidas especiais de mitigação, protecção e segurança de pessoas, bens, qualidade do ambiente, do território e dos recursos naturais em relação aos danos e riscos, incide sobre as seguintes ameaças específicas:

a) Cheias, inundações e precipitações intensas; b) Sismos e maremotos; c) Vulcanismo; d) Seca e desertificação; e) Alterações locais, regionais ou globais às normais climáticas; f) Incêndios e fogos; g) Contaminação física; h) Contaminação química; i) Contaminação biológica; j) Ameaças pelas águas do mar; l) Instabilidade da costa ou de falésias; m) Anomalias na realimentação das praias ou das dunas; n) Tempestades e tornados;

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o) Erosão e deslizamentos; p) Rotura de estruturas naturais ou construídas; q) Disfunções, avarias e deficiências de instalações ou processos; r) Deficiências de estanquidade de reservatórios ou depósitos de matérias sólidas, líquidas ou gasosas; s) Meios, de génese natural ou antropogénica, favoráveis à proliferação de organismos patogénicos, geradores de substâncias tóxicas ou vectores de doenças; t) Alterações ou variações de génese antropogénica aos regimes de caudais, velocidades, níveis ou percursos das águas; u) Variações temporárias ou alterações, de génese natural ou antropogénica, às áreas inundáveis pelas águas costeiras ou interiores, incluindo as subterrâneas.

Artigo 32.º Regulamentação de segurança

1 — As actividades ou construções passíveis de gerar implicações na qualidade do ambiente ou de criar riscos para os seus trabalhadores, infra-estruturas ou para terceiros elaboram obrigatoriamente um regulamento de segurança e apresentam-no para homologação à autoridade pública competente antes do início da actividade ou da entrada em funcionamento da infra-estrutura construída.
2 — A regulamentação de segurança obedece a um enquadramento legal próprio, definido de acordo com o sector de actividade e com as exigências, limitações e condicionantes imposta pela circunstância ambiental em que se insere a actividade ou construção.
3 — O Governo elaborará, no prazo de um ano após a aprovação deste diploma, a regulamentação de segurança em relação a cada uma das ameaças específicas referidas no artigo 31.º.

Artigo 33.º Responsabilidade por danos, acidente ou risco e direito de compensação

1 — O proprietário, promotor ou concessionário de acção ou actividade que provoque acidente ou potencie risco de acidente é responsável pelas consequências geradas pelo acidente ou pela geração do risco, ainda que sem concretização de acidente, e é obrigado a compensar os cidadãos afectados, a reparar os danos ambientais e a cessar a actuação geradora ou potenciadora de risco.
2 — Os prejuízos para terceiros, os acidentes ou danos ambientais que decorram de actividade ou construção licenciada, por ausência de cumprimento pela entidade promotora ou proprietária das obrigações decorrentes dos termos do licenciamento, da declaração de impacte ambiental ou da legislação sectorial aplicável, são da responsabilidade exclusiva dessa entidade.
3 — O Estado é corresponsável pelos prejuízos para terceiros dos acidentes ou danos ambientais que decorram de actividade ou construção licenciada, concessionada ou autorizada, por ausência da identificação de riscos ou de medidas de mitigação ou adaptação e minimização dos impactos.
4 — A declaração de interesse público de qualquer projecto, actividade ou acção é precedida de processo de impacte ambiental, incluindo consulta pública e instrução com todas as peças e apreciações aplicáveis por lei à tipologia do empreendimento e condicionantes de localização, bem como a clara identificação de danos e riscos e uma declaração da aceitabilidade dos riscos emitida pelo membro do Governo com competências na área do ambiente.
5 — Exceptuam-se do estipulado no ponto anterior as acções de socorro ou mitigação de emergência.
6 — O licenciamento, concessão, autorização ou declaração de interesse público da actividade ou acto não isenta o seu proprietário, concessionário ou autor das responsabilidades relativamente a terceiros e ao ambiente e, nomeadamente, das indemnizações e recuperações devidas, bem como responsabilidade civil pelos danos e riscos, competindo-lhe a reposição das condições originais ou a indemnização a terceiros por danos, prejuízos, aumento ou geração de novos riscos tendo o direito de processar o Estado ou as entidades públicas licenciadoras para ressarcimento dos prejuízos próprios decorrentes.

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7 — O aumento ou geração de novos riscos que resultem do licenciamento de uma actividade, construção ou acção é identificado pelas entidades licenciadoras e emissoras da declaração de impacte ambiental, sendo equiparado a prejuízo para todos os efeitos.

Artigo 34.º Direito ao conhecimento do risco

1 — Os cidadãos têm direito a aceder a todos os estudos de análise prévia, bem como aos resultados de análises e avaliações de risco efectuadas a cada actividade ou construção.
2 — É da responsabilidade do Estado, em articulação com as autarquias, a criação e preparação de respostas céleres, no âmbito da intervenção ambiental ou protecção civil, em função dos riscos identificados.

Artigo 35.º Mitigação e adaptação

1 — Os instrumentos de análise prévia, bem como a declaração de impacte ambiental, devem conter as indicações necessárias para a mitigação dos impactes negativos identificados, sendo o seu cumprimento condição para o licenciamento e funcionamento da actividade ou construção em causa.
2 — Os instrumentos de análise prévia, bem como a declaração de impacte ambiental, devem conter indicações sobre as medidas de adaptação do projecto de actividade ou construção sob avaliação, sendo o seu cumprimento condição para o licenciamento e execução.

Artigo 36.º Declaração de zona crítica ou situação de emergência

1 — O Governo declarará como zonas críticas todas aquelas em que os parâmetros que permitem avaliar a qualidade do ambiente atinjam, ou se preveja virem a atingir, valores que possam pôr em causa a saúde humana ou o ambiente, ficando sujeitas a medidas especiais e acções a estabelecer pelo departamento encarregado da protecção civil em conjugação com as demais autoridades da administração central e local.
2 — Quando os índices de poluição, em determinada área, ultrapassarem os valores admitidos pela legislação regulamentar correspondente, ou por qualquer forma, colocarem em perigo a qualidade do ambiente, poderá ser declarada a situação de emergência, devendo ser previstas actuações específicas, administrativas ou técnicas para lhes fazer face, por parte da administração central e local, acompanhadas do esclarecimento da população afectada.
3 — Serão aplicadas as medidas imediatas necessárias para socorrer a casos de acidente sempre que estes provoquem aumentos bruscos e significativos dos índices de poluição ou que, pela sua natureza, façam prever a possibilidade dessa ocorrência.

Artigo 37.º Segurança ambiental

1 — A presente lei é regulamentada por legislação própria no que toca aos acréscimos de responsabilidade por imputação de riscos ou danos.
2 — Até à publicação da legislação regulamentar, os acréscimos de responsabilidade por imputação de riscos ou danos não são aplicáveis a construções, movimentos de terras ou equipamentos fixos já existentes e em condições legais à data de aprovação do presente diploma.

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Capítulo V Contenção da contaminação do ambiente e da exaustão dos recursos naturais

Artigo 38.º Abordagem integrada dos impactos do sistema produtivo

1 — A política de ambiente compatibiliza a melhoria de qualidade de vida da população e o desenvolvimento do sistema produtivo nacional com a contenção da contaminação e da exaustão dos recursos naturais, visando simultaneamente:

a) A redução de emissões poluentes, de resíduos e de desperdício; b) O controlo e protecção da qualidade física, química, biológica e ecológica do meio ambiente; c) A contenção da exploração dos recursos naturais dentro dos limites de renovação.

2 — A intervenção do Estado na adaptação ambiental do sistema produtivo e de consumo privilegia a maior utilidade dos bens e produtos para o bem-estar e qualidade de vida da população e combate os danos ambientais, ponderando, nomeadamente:

a) A necessidade e utilidade do bem ou produto, a acessibilidade e extensão da sua utilização, a importância objectiva e subjectiva para a qualidade de vida da população; b) A incorporação de materiais e a degradação de energia, bem como as emissões e resíduos no ciclo completo de vida do bem ou produto, nomeadamente a produção, a embalagem, o transporte, a importação, a comercialização, a fruição, o consumo, a duração útil, recolha, transporte, processamento e deposição final dos materiais sobrantes ou residuais; c) As matérias-primas consumidas, transformadas ou degradadas em relação com a sua taxa de renovação na natureza e com a taxa de consumo global, distinguindo os impactos em território nacional, nomeadamente na degradação ou risco de exaustão dos recursos naturais; d) O tipo e quantidade de emissões e resíduos, respectiva perigosidade, riscos ambientais associados e efeitos nos meios receptores, distinguindo os meios no território nacional e considerando o seu estado e capacidade de depuração disponível; e) A viabilidade de optimizar a relação utilidade-impactos por eliminação ou substituição de componentes ou fases do processo, com ênfase para os desperdícios, o transporte, as embalagens, a obsolescência precoce e a curta durabilidade de bens não consumíveis; f) A substituibilidade do bem ou produto por outro com melhor relação utilidade-impactos; g) A viabilidade de soluções de produção de proximidade, de manutenção, de reutilização e de reconversão dos bens ou produtos não consumíveis, das embalagens e dos resíduos sólidos não biodegradáveis; h) Os efeitos das intervenções no sistema produtivo nacional, na cadeia produtiva e no emprego; i) A contenção e redução dos custos ao consumidor ou utilizador final, a equidade social e o combate à pobreza.

3 — Os normativos, medidas e intervenções de contenção e redução dos impactos negativos do sistema de produção e utilização ou consumo não podem, em caso algum, provocar, directa ou indirectamente, discriminação negativa da produção nacional face à importação.
4 — O Estado publicita e promove a notícia rigorosa e completa aos consumidores sobre os impactos dos ciclos de vida dos produtos, em padrões idênticos para bens semelhantes, de forma a facultar a possibilidade de escolha informada.
5 — São monitorizados e publicitados os efeitos no ambiente e recursos naturais, na qualidade de vida, no sistema produtivo nacional e nos preços ao consumidor, das normas, medidas e intervenções no âmbito da contenção da contaminação do ambiente e da exaustão dos recursos naturais.

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Artigo 39.º Poluição química, resíduos e águas residuais

1 -— No âmbito da abordagem integrada de contenção da contaminação do ambiente e da exaustão dos recursos naturais, são aplicadas medidas específicas de controlo e redução da poluição, que incluem:

a) O estímulo à aplicação de tecnologias menos poluentes; b) A avaliação sistemática dos efeitos potenciais dos agentes químicos sobre o homem e sobre o ambiente; c) O controlo do fabrico, comercialização, utilização e eliminação dos agentes químicos; d) A aplicação de técnicas e metodologias preventivas orientadas para a reciclagem e reutilização de matérias-primas e produtos químicos; e) O controlo e inventariação da produção nacional, importação e e exportação de reagentes passíveis de constituir ou integrar arma química ou agente nocivo para a saúde e bem-estar públicos, bem como para o ambiente e os recursos naturais; f) O funcionamento de estruturas laboratoriais públicas que realizem ensaios destinados ao estudo dos impactos ambientais dos agentes químicos; g) A obrigatoriedade de avaliação dos impactos e riscos decorrentes da utilização ou deposição de agentes químicos, antes da sua comercialização, por parte dos seus produtores industriais; h) Estabelecimento de normas e dos mecanismos adequados de fiscalização para os níveis máximos admitidos para a presença de diferentes agentes químicos, elementos ou compostos, na água, no solo e subsolo, no ar, nos seres vivos e na cadeia trófica do ser humano.
i) A redução da produção e da importação de produtos inúteis, com ênfase nas embalagens, rótulos, tintas ou solventes, que não sejam imprescindíveis para a individualização ou manutenção do produto final ao consumidor; j) A hierarquização dos processos, considerando como primeira prioridade a reciclagem do resíduo, como segunda prioridade a reutilização e como última prioridade a sua eliminação, ainda que dessa resulte produção energética; l) Reencaminhamento de todos os materiais reutilizáveis ou recicláveis para o tratamento adequado após o seu tempo de vida útil; m) Estímulo ao aproveitamento dos desperdícios agro-pecuários; n) A reciclagem, incentivando o encaminhamento de todos os resíduos para processos de reconversão em matérias-primas; o) A reutilização, incentivando a utilização, ainda que em função e actividade distinta, do resíduo ou efluente, considerando como última opção a eliminação ou valorização energética; p) A aplicação de instrumentos fiscais e financeiros que incentivem a reciclagem e a reutilização de resíduos; q) A responsabilização do produtor ou importador e do distribuidor pela redução, reciclagem, reutilização e tratamento dos resíduos;

2 — A produção de efluentes implica o processamento e destino final adequado das fases sólida e líquida, com controlo por autoridade pública competente e de acordo com uma estratégia nacional de efluentes.
3 — É da responsabilidade do Estado, em articulação e cooperação com as autarquias, assegurar uma rede pública de saneamento de águas residuais e tratamento e recolha de resíduos sólidos urbanos que garanta a universalidade do acesso e a sanidade ambiental.

Artigo 40.º Substâncias radioactivas e controlo da radioactividade

1 — O Estado dispõe de entidade laboratorial capacitada para a realização de ensaios e estudos científicos que contribuam para a prossecução de uma política de controlo de poluição radioactiva e de gestão de substâncias radioactivas, nomeadamente no âmbito da investigação em tecnologias nucleares ou extracção de minério.

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2 — O controlo da poluição originada por substâncias radioactivas tem por finalidade eliminar a sua influência na saúde e bem-estar das populações e no ambiente e faz-se, designadamente, através:

a) Da avaliação dos efeitos das substâncias radioactivas nos ecossistemas receptores; b) Da fixação de normas de emissão para os efluentes físicos e químicos radioactivos resultantes de actividades que impliquem extracção, transporte, transformação, utilização ou armazenamento de material radioactivo; c) Do planeamento das medidas preventivas necessárias para a actuação imediata em caso de poluição radioactiva; d) Da avaliação e controlo dos efeitos da poluição transfronteiriça e actuação técnica e diplomática internacional que permita a sua prevenção; e) Da fixação de normas para o trânsito, transferência e deposição de materiais radioactivos no território nacional e nas águas marítimas territoriais e na zona económica exclusiva.

Capítulo VI Competência do Governo e organismos responsáveis

Artigo 41.º Competência do Governo e da Administração Regional e Local

1 — Compete ao Governo, de acordo com a presente lei de bases, a condução de uma política global nos domínios do ambiente, da qualidade de vida e do ordenamento do território, bem como a coordenação das políticas de ordenamento regional do território e desenvolvimento económico e progresso social e ainda a adopção de medidas adequadas à aplicação dos instrumentos previstos na presente lei.
2 — O Governo e a administração regional e local articulam entre si a aplicação das medidas necessárias à prossecução dos fins previstos na presente lei, no âmbito das respectivas competências.
3 — O Governo garante, através de uma agência pública e em articulação com as administrações regional e local, a realização de processos de avaliação de impacte ambiental que implica a elaboração do estudo de impacte ambiental, a participação e conhecimento públicos e a consequente declaração de impacte ambiental, nos termos de legislação própria.
4 — O Governo garante, através de uma agência pública, a realização dos estudos de impacte ambiental das actividades ou construções que deles careçam, cujos custos são assumidos pela entidade proprietária ou requerente da autorização e licenciamento ambiental, nos termos de legislação própria.
5 — O Governo garante, através de uma agência pública, a emissão de declaração de impacte ambiental, determinante para o licenciamento ou não licenciamento de cada actividade ou construção, nos termos de legislação própria.

Artigo 42.º Organismos responsáveis

1 — A entidade ou as entidades públicas competentes do Estado responsável pela coordenação da aplicação da presente lei tem por missão central promover, coordenar, apoiar e participar na execução da política nacional do ambiente e qualidade de vida constante deste diploma e a concretizar pelo Governo, em estreita colaboração com os diferentes serviços da administração central, regional e local.
2 — A nível de cada região administrativa existem organismos dependentes da administração regional, responsáveis pela coordenação e aplicação da presente lei, em termos análogos aos do organismo referido no número anterior e em colaboração com este, sem prejuízo de poderem existir organismos similares a nível municipal.

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Capítulo VII Direitos e deveres dos cidadãos

Artigo 43.º Direitos e deveres dos cidadãos

1 — É dever dos cidadãos, em geral, e dos sectores públicos, privado e cooperativo, em particular, colaborar na criação de um ambiente sadio e ecologicamente equilibrado e na melhoria progressiva e acelerada da qualidade de vida.
2 — Às iniciativas populares no domínio da melhoria do ambiente e da qualidade de vida, quer surjam espontaneamente quer correspondam a um apelo da administração central, regional ou local, deve ser dispensada protecção adequada, através dos meios necessários à prossecução dos objectivos do regime previsto na presente lei.
3 — O Estado e as demais pessoas colectivas de direito público, em especial as autarquias, fomentarão a participação das populações em iniciativas de interesse para a prossecução dos fins previstos na presente lei, nomeadamente as associações nacionais ou locais de defesa do ambiente, do património natural e construído e de defesa do consumidor.
4 — Os cidadãos directamente ameaçados ou lesados no seu direito a um ambiente de vida humana sadio e ecologicamente equilibrado podem pedir, nos termos gerais de direito, a cessação das causas de violência e a respectiva indemnização.
5 — Sem prejuízo do disposto nos números anteriores, é reconhecido às autarquias, às organizações de defesa do ambiente e aos cidadãos que sejam afectados pelo exercício de actividades susceptíveis de prejudicarem a utilização dos recursos do ambiente o direito às compensações por parte das entidades responsáveis pelos prejuízos causados.

Artigo 44.º Responsabilidade objectiva

1 — Existe obrigação de indemnizar, independentemente de culpa, sempre que o agente tenha causado danos no ambiente, em virtude de acção perigosa, ainda que em respeito pela legislação aplicável.
2 — O quantitativo de indemnização a fixar por danos causados no ambiente será estabelecido em legislação complementar.

Artigo 45.º Embargos administrativos

Aqueles que se julguem ofendidos nos seus direitos a um ambiente sadio e ecologicamente equilibrado poderão requerer que seja mandada suspender imediatamente a actividade causadora do dano, seguindo-se, para tal efeito, o processo de embargo administrativo.

Artigo 46.º Seguro de responsabilidade civil

Aqueles que exerçam actividades que envolvam alto grau de risco para o ambiente e como tal venham a ser classificados serão obrigados a segurar a sua responsabilidade civil.

Artigo 47.º Direito a uma justiça acessível e pronta

1 — É assegurado aos cidadãos o direito ao apoio judiciário, nomeadamente através da isenção de pagamento de taxa de justiça e custas judiciais, nos processos em que pretendam obter reparação de perdas

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e danos emergentes de factos ilícitos que violem regras constantes da presente lei e dos diplomas que a regulamentem, desde que o valor da causa não exceda o da alçada do Tribunal da Relação.
2 — É proibida a apensação de processos contra o mesmo arguido relativos a infracções contra o disposto na presente lei, salvo se requerida pelo Ministério Público.

Capítulo VIII Penalizações

Artigo 48.º Tribunal competente

1 — São competentes para as acções decorrentes da violação da presente lei e respectiva regulamentação os tribunais comuns, territorialmente competentes em função do dano causado ou da residência do denunciante.
2 — Sem prejuízo da legitimidade de quem se sinta ameaçado ou tenha sido lesado nos seus direitos, à actuação perante a jurisdição competente do correspondente direito à cessação da conduta ameaçadora ou lesiva e à indemnização pelos danos que dela possam ter resultado, ao abrigo do disposto no capítulo anterior, também ao Ministério Público compete a defesa dos valores protegidos pela presente lei, nomeadamente através da utilização dos mecanismos nela previstos.
3 — É igualmente reconhecido a qualquer pessoa, independentemente de ter interesse pessoal na demanda, bem como às associações e fundações defensoras dos interesses em causa e às autarquias locais, o direito de propor e intervir, nos termos previstos na lei, em processos principais e cautelares destinados à defesa dos valores protegidos pela presente lei.

Artigo 49.º Crimes contra o ambiente

Além dos crimes previstos e punidos no Código Penal, serão ainda consideradas crimes as infracções que a legislação complementar qualificar como tal, de acordo com o disposto na presente lei.

Artigo 50.º Contra-ordenações

1 — As restantes infracções à presente lei serão consideradas puníveis com coima, em termos a definir por legislação complementar, compatibilizando os vários níveis da Administração em função da gravidade da infracção.
2 — Se a mesma conduta constituir simultaneamente crime e contra-ordenação será o infractor punido a título de crime, sem prejuízo das sanções acessórias previstas para a contra-ordenação.
3 — Em função da gravidade da contra-ordenação e da culpa do agente, poderão ainda ser aplicadas as seguintes sanções acessórias:

a) Interdição do exercício de uma profissão ou actividade; b) Privação do direito de subsídio outorgado por entidades ou serviços públicos; c) Cessação de licenças ou autorizações relacionadas com o exercício da respectiva actividade; d) Apreensão e perda a favor do Estado dos objectos utilizados ou produzidos aquando da infracção; e) Perda de benefícios fiscais, de benefícios de crédito e de linhas de financiamento de estabelecimentos de crédito de que haja usufruído.

4 — A negligência e a tentativa são puníveis.

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Artigo 51.º Obrigatoriedade de remoção das causas da infracção e da reconstituição da situação anterior

1 — Os infractores são obrigados a remover as causas da infracção e a repor a situação anterior à mesma ou equivalente, salvo o disposto no n.º 3.
2 — Se os infractores não cumprirem as obrigações acima referidas no prazo que lhes for indicado, as entidades competentes mandarão proceder às demolições, obras e trabalhos necessários à reposição da situação anterior à infracção a expensas dos infractores.
3 — Em caso de não ser possível a reposição da situação anterior à infracção, os infractores ficam obrigados ao pagamento de uma indemnização especial a definir por legislação e à realização das obras necessárias à minimização das consequências provocadas.

Capítulo IX Disposições finais e transitórias

Artigo 52.º Relatório sobre cumprimento de políticas ambientais

1 — O Governo fica obrigado a apresentar à Assembleia da República, juntamente com as Grandes Opções do Plano de cada ano, um relatório sobre o cumprimento da legislação ambiental, referindo, designadamente, o número de processos criminais em curso e o montante de contra-ordenações instaurado e efectivamente cobrado em Portugal referente ao ano anterior.
2 — O Governo fica obrigado a apresentar à Assembleia da República, de três em três anos, um relatório sobre o estado do ambiente, investimento e grau de execução das políticas ambientais em Portugal.

Artigo 53.º Acordos e convenções internacionais

A regulamentação da presente lei e toda a legislação especial em matéria ambiental tem em conta as convenções e acordos internacionais aceites e ratificados por Portugal neste âmbito, assim como as normas e critérios aprovados multi ou bilateralmente entre Portugal e outros países.

Artigo 54.º Legislação complementar

Os diplomas legais necessários à regulamentação do disposto na presente lei são publicados no prazo de um ano a partir da data da sua entrada em vigor.

Artigo 55.º Norma revogatória

É revogada a Lei n.º 11/87 de 7 de Abril.

Artigo 56.º Entrada em vigor

A presente lei entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.

Assembleia da República, 29 de Novembro de 2011 Os Deputados do PCP: Bernardino Soares; António Filipe; João Oliveira; Paula Santos; João Ramos; Honório Novo; Jerónimo de Sousa; Rita Rato; Francisco Lopes; Miguel Tiago; Jorge Machado.

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PROJECTO DE LEI N.º 457/XI (2.ª) LEI DE BASES DO AMBIENTE

Nota justificativa

A Lei de Bases do Ambiente — Lei n.º 11/87, de 7 de Abril — vigora há 24 anos, tendo sofrido apenas duas alterações bastante residuais (em 1996 e em 2002) na área do acesso à justiça.
Foi uma lei aprovada por maioria na Assembleia da República (apenas com os votos contra do CDS-PP), tendo sido um diploma unificador e revelador da necessidade do nosso ordenamento jurídico levar o ambiente a ganhar maior relevância na política geral e de constituir, em si, um valor a defender.
De resto, era essa a concepção que a Constituição da República Portuguesa, de uma forma profundamente inovadora e progressista, determinava desde 1976.
Contudo, na perspectiva de Os Verdes, fruto de opções políticas bem evidenciadas levadas a cabo pelos sucessivos governos, Portugal ainda não conseguiu atingir um estádio de desenvolvimento onde se possa afirmar que a preservação dos valores naturais é um objectivo em si e que o ordenamento do território é feito de uma forma harmoniosa e respeitadora da promoção da qualidade de vida, de uma gestão racional do espaço e das suas características, bem como dos recursos naturais. Ou seja, muitas vezes essa conservação de património natural e de componentes naturais só é feita quando não interfere com outros objectivos, designadamente de cariz económica, porque, quando interfere, não raras vezes os objectivos ambientais ficam totalmente secundarizados ou são mesmo anulados. Outros valores, portanto, têm-se, amiúde, sobreposto a estes princípios e quantas vezes em prejuízo dos objectivos que a Lei de Bases do Ambiente visa proteger. A pressão urbanística, a má gestão territorial de grandes empreendimentos com danos irreversíveis de ordem ambiental e muitas vezes extremamente danosos do ponto de vista social, a gestão muitíssimo deficitária de vastas áreas protegidas, o despovoamento e a desactivação do mundo rural, gerando a saturação de uma curta faixa do território — no litoral, são alguns exemplos de entre tantos outros que aqui poderiam ser focados.
Olhando hoje para a Lei de Bases do Ambiente, à luz da realidade existente e do seu distanciamento em relação à realidade desejável, verificamos que ela deve tornar-se mais clara, determinada e exigente na definição de alguns mecanismos tendentes à defesa de valores nela inscritos, designadamente pela introdução de um capítulo sobre zonas vulneráveis, com estatuto de protecção especial, como o litoral, as zonas húmidas e o mundo rural; pela introdução de exigências de cadastros e cartografias rigorosas; pela introdução de regras quanto à gestão dos espaços florestais; pelo reforço generalizado da prevenção e racionalização do uso como forma de poupança de recursos, reforçando a ideia da perenidade e limitação dos recursos naturais; pela consagração das actividades de pequena escala e com menor impacto como mais consentâneas com a preservação ambiental; pela criação da obrigatoriedade de constituição de sistemas de monitorização e de sistemas de alerta para factores de risco; pela proibição da gestão e classificação de solos em função de factores especulativos; pelo reforço da componente da requalificação, seja de paisagens degradadas seja de exploração de inertes e materiais radioactivos (onde se adopta também um princípio de limitação e prevenção na exploração); pela determinação de criação de espaços urbanos onde se promova o embelezamento e a existência de equipamentos fundamentais determinantes para a promoção de uma vida saudável, através de mecanismos de compensação às populações que habitam em espaços classificados, promovendo o gosto pela criação e defesa de áreas protegidas; pelo alargamento da iniciativa de áreas protegidas nacionais à Assembleia da República, ou lembrando taxativamente, nesta lei de valor reforçado, que a avaliação de impacte ambiental também gera recusa de aprovação de projectos, questão de que as entidades públicas muitas vezes se esquecem; e pela garantia de financiamento e de meios técnicos e humanos para levar a cabo as determinações da Lei de Bases do Ambiente, entre outras questões.
Para além disso, torna-se igualmente visível que a actual Lei de Bases do Ambiente não toca alguns aspectos que se foram revelando domínios e desafios importantes da política para o ambiente, porque se trata de problemas e matérias que não eram estudados, avaliados e conhecidos devidamente à época da aprovação deste diploma, enquadrador da política de ambiente e de ordenamento do território, tais como a questão das alterações climáticas e da emissão de gases com efeito de estufa; ou a recusa de contaminação por organismos geneticamente modificados; ou a introdução do princípio da precaução que determina que em

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caso de dúvida não se implementem determinadas decisões e acções; ou pela criação de mais alguns instrumentos da política de ambiente necessários à melhoria de práticas como um código de boas condutas ambientais para diversos sectores de actividade.
É, ainda visível, feita a leitura da Lei de Bases do Ambiente, a necessidade de actualização de conceitos e mecanismos que, estando hoje generalizados na sua aplicação, não constam desta lei enquadradora, designadamente a avaliação de impacto ambiental (a actual lei só fala numa das suas componentes — o estudo de impacto ambiental), a avaliação ambiental estratégica, a licença ambiental, bem como a introdução de inúmeros instrumentos da política de ambiente e de ordenamento do território já concretizados.
Há, por outro lado, uma grande margem de manobra, ainda, na actual Lei de Bases do Ambiente para o reforço da participação pública, seja pela introdução de um artigo específico que dê nota da relevância do associativismo ambiental, seja pela inscrição de várias formas de participação dos cidadãos, seja, também, pela responsabilização legal dos agentes poluidores por mecanismos de prevenção, pela reparação de danos e pagamento de indemnizações devidas, acrescentando, em caso de denúncia e de completa indiferença das entidades públicas, a responsabilidade solidária destas últimas, em benefício da real existência dos direitos dos cidadãos.
Por último, torna-se confrangedor que a Lei de Bases do Ambiente tome, por exemplo, a poluição como uma componente ambiental (ainda que humana), conceito que urge alterar e deter numa formulação mais correcta (dentro das componentes antropogénicas, mas evidentemente não ambientais!).
São estes, assim, motivos suficientes para Os Verdes, nesta Legislatura, ter assumido o compromisso de dar um contributo, a nível parlamentar, para a alteração da Lei de Bases do Ambiente com os objectivos acima traçados e com as propostas acima exemplificadas. A opção foi a de revogação da Lei n.º 11/87, na medida em que o conjunto de alterações é bastante significativo e numeroso, mas, ao mesmo tempo, de manter a lógica e toda a base já construída pela actual Lei de Bases do Ambiente.
Este projecto de lei apresenta, desta forma, a seguinte estrutura de tratamento das matérias:

Capítulo I Princípios e objectivos

Artigo 1.º — Âmbito Artigo 2.º — Princípios gerais Artigo 3.º — Princípios específicos Artigo 4.º — Objectivos e medidas Artigo 5.º — Conceitos e definições

Capítulo II Componentes ambientais naturais

Artigo 6.º — Componentes ambientais naturais Artigo 7.º — Defesa da qualidade Artigo 8.º — Atmosfera Artigo 9.º — Luz Artigo 10.º — Água Artigo 11.º — Solo e subsolo Artigo 12.º — Flora Artigo 13.º — Fauna Artigo 14.º — Paisagem primitiva e natural

Capítulo III Componentes antropogénicas

Artigo 15.º — Componentes antropogénicas Artigo 16.º — Paisagem transformada

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Artigo 17.º — Património construído Artigo 18.º — Poluição Artigo 19.º — Ruído Artigo 20.º — Compostos químicos Artigo 21.º — Resíduos e efluentes Artigo 22.º — Substâncias radioactivas Artigo 23.º — Gases com efeito de estufa Artigo 24.º — Organismos geneticamente modificados

Capítulo IV Zonas vulneráveis

Artigo 25.º — Zonas vulneráveis Artigo 26.º — Litoral Artigo 27.º — Zonas húmidas Artigo 28.º — Mundo rural

Capítulo V Instrumentos da política de ambiente e do ordenamento do território

Artigo 29.º — Instrumentos Artigo 30.º — Áreas protegidas Artigo 31.º — Relatório e livro branco sobre o ambiente Artigo 32.º — Avaliação de impacto ambiental e avaliação estratégica ambiental Artigo 33.º — Licenciamento ambiental Artigo 34.º — Acesso a documentos administrativos

Capítulo VI Situações de emergência, críticas ou de necessidade

Artigo 35.º — Declaração de zonas críticas e de situações de emergência Artigo 36.º — Redução ou suspensão de actividades Artigo 37.º — Transferência de localização de actividades

Capítulo VII Direitos e responsabilidade

Artigo 38.º — Organismos responsáveis pela aplicação da lei Artigo 39.º — Direitos e deveres gerais dos cidadãos Artigo 40.º — Associativismo de ambiente Artigo 41.º — Responsabilidade ambiental Artigo 42.º — Tutela judicial

Capítulo VIII Penalizações

Artigo 43.º — Crimes contra o ambiente e contra-ordenações ambientais Artigo 44.º — Reposição da situação anterior

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Capítulo IX Disposições finais

Artigo 45.º — Meios humanos, técnicos e financeiros Artigo 46.º — Acordos internacionais Artigo 47.º — Concentração dos instrumentos e da legislação Artigo 48.º — Revogação Artigo 49.º — Entrada em vigor

No sentido de concretizar este desejo e ensejo de melhorar a nossa Lei de Bases do Ambiente, os Deputados abaixo assinados, do Grupo Parlamentar Os Verdes, apresentam, ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, o seguinte projecto de lei:

Capítulo I Princípios e objectivos

Artigo 1.º Âmbito

A presente lei define as bases da política de ambiente, em cumprimento do disposto nos artigos 9.º e 66.º da Constituição da República Portuguesa.

Artigo 2.º Princípios gerais

1 — Todos têm direito a um ambiente de vida humano, sadio e ecologicamente equilibrado e o dever de o defender.
2 — Incumbe ao Estado, por meio de organismos próprios e garantindo a participação dos cidadãos e associações, promover o bem-estar das populações, a qualidade de vida e a efectivação dos direitos ambientais, tendo em vista a sustentabilidade do desenvolvimento.
3 — A política de ambiente tem por fim garantir a conservação da natureza, a preservação e a utilização sustentável dos recursos naturais, por forma a impedir a sua degradação por factores de poluição, bem como a sua utilização desenfreada que fomente o respectivo esgotamento e destruição.

Artigo 3.º Princípios específicos

Os princípios gerais, constantes do artigo anterior, implicam a observância dos seguintes princípios específicos:

a) Da prevenção: são evitados consumos excessivos que impliquem gastos desnecessários de recursos naturais e são evitadas as acções que tenham efeitos negativos sobre o meio ambiente, de forma imediata ou a prazo, sendo previamente sujeitas a avaliação de impacto ambiental, de modo a impedir atempadamente decisões de localização e de licenciamento que impliquem danos irreversíveis sobre o ambiente ou a saúde pública; b) Da precaução: são impedidas decisões e acções relativamente às quais não existe uma certeza científica inequívoca de que são inócuas sobre a sustentabilidade, a qualidade de vida e a saúde pública, ou quando apresentarem riscos ou ameaças clara e gravemente danosos; c) Do nível mais adequado de acção: implica que a execução das medidas de política de ambiente tenha em consideração o nível mais adequado de acção com vista a uma elevada preservação e valorização do meio ambiente, quer ao nível internacional quer nacional, regional, local ou sectorial;

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d) Da participação: é garantida e fomentada a participação e o envolvimento de todos os interessados nas decisões, formulação e execução da política de ambiente e de ordenamento do território, através dos órgãos competentes da administração central, regional e local; e) Da informação: de modo a garantir o princípio da participação, as entidades públicas competentes obrigam-se a disponibilizar, por meios fáceis e acessíveis, toda a informação disponível ao público interessado, antes do processo decisório e com tempo adequado de conhecimento e avaliação de toda a documentação; f) Da integração: é garantida a integração dos princípios da política ambiental noutras decisões políticas, designadamente de carácter económico, social, fiscal, educacional e de saúde; g) Da responsabilidade política: deve existir, ao nível governamental, um Ministério que tutele directamente a política de ambiente e de ordenamento do território e que tenha a responsabilidade de aplicar, entre outros, o princípio da integração, bem como a normalização, informação e auxílio à sustentabilidade da actividade dos agentes públicos e privados; h) Da cooperação internacional: o Estado português deve cooperar na procura de soluções com outros países e com estruturas internacionais para prevenir e resolver problemáticas ambientais globais e a gestão harmoniosa, equilibrada e duradoura dos recursos naturais; i) Da investigação ambiental: o Estado deve incentivar e criar condições para a investigação científica e tecnológica, com o objectivo de gerar sustentabilidade das actividades e soluções que evitem danos para o meio ambiente e para a saúde; j) Da recuperação: devem ser tomadas medidas urgentes para impedir os processos degradativos nas áreas onde actualmente ocorrem e promover a respectiva recuperação, tendo também em conta os equilíbrios a estabelecer com as áreas limítrofes; k) Da fixação de limites: devem ser fixados limites máximos de emissões poluentes em diferentes sectores, como emissão de partículas, ruído ou de utilização de produtos poluentes, de modo a impedir a proliferação, tendo em conta a preservação ambiental e a salvaguarda da saúde pública; l) Da responsabilização: aos agentes é imputada a responsabilidade da sua acção directa ou indirecta sobre a degradação de recursos naturais e actos de poluição; m) Da correcção na fonte: aos agentes compete prevenir todas as formas de poluição e os mecanismos de correcção das acções prejudiciais ao ambiente devem localizar-se o mais próximo do seu centro de produção.

Artigo 4.º Objectivos e medidas

1 — O objectivo da presente lei e das políticas ambientais é proporcionar a sustentabilidade do desenvolvimento, a existência de um ambiente propício à saúde, à qualidade de vida e ao bem-estar das pessoas, bem como ao desenvolvimento social e cultural das comunidades, com respeito pela conservação da natureza e pelos valores e recursos naturais.
2 — O objectivo referido no número anterior implica a adopção de medidas que visem, designadamente:

a) A integração das políticas ambientais e dos seus resultados em todas as dimensões do desenvolvimento, com interacção das dimensões ambiental, social, cultural e económica; b) O ordenamento do território, com vista ao combate às assimetrias regionais, às grandes pressões das áreas urbanas, ao despovoamento e à desertificação do mundo rural, bem como à preservação da paisagem, do solo, da água, da biodiversidade e dos ecossistemas; c) O fomento e a implantação de actividades produtivas sustentáveis de forma descentralizada pelo território, com aferição criteriosa dos seus impactes ambientais; d) A preservação de sítios e paisagens naturais como garante de diversidade biológica e cultural e como fomento do desenvolvimento económico das regiões; e) A estabilidade geológica e biológica como factor de segurança; f) A conservação da biodiversidade e dos ecossistemas que suportam a vida; g) A utilização racional dos recursos vivos e a preservação do património genético e da sua diversidade;

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h) A conservação da natureza, designadamente através do respeito pela diversidade paisagística, da criação de áreas protegidas, de corredores ecológicos, de parques e espaços verdes urbanos de modo a estabelecer um continuum naturale; i) A gestão de actividades humanas de forma a garantir a conservação da natureza e a estabilidade dos diferentes habitats, compatibilizando a promoção da qualidade de vida a todos os seres humanos e a permanência da vida selvagem, assim como dos habitats necessários ao seu suporte; j) A promoção de estudos sobre os impactes das acções humanas sobre o ambiente, visando impedir, minimizar e corrigir danos sobre os valores ambientais, orientando intervenções que respeitem normas e valores que garantam a efectiva qualidade de vida das populações, tendo em conta a perenidade dos sistemas naturais; k) A introdução, na avaliação dos custos-benefícios, dos custos económicos, sociais e ambientais da degradação ambiental, tendo em conta as potencialidades de aproveitamento sustentável dos factores da natureza; l) A promoção de acções de investigação quanto aos factores ambientais, à conservação dos ecossistemas e aos impactos sobre a saúde pública; m) A concretização de uma política energética baseada na poupança e na eficiência de consumos, na diversificação e descentralização de formas de produção renováveis e de menos impacto; n) Uma política de produção em função das necessidades de consumo, da promoção do bem-estar e do desenvolvimento equilibrado, e não de interesses económicos e financeiros, de modo a garantir uma utilização racional de recursos naturais e a contribuir para a diminuição de resíduos; o) O reforço de acções e medidas de defesa do consumidor; p) O reforço de acções e medidas de apoio às actividades produtivas familiares ou de pequena escala que garantem a qualidade da produção e que melhor interagem com a valorização ambiental; q) A criação de condições e de meios adequados à participação das populações na formulação e na execução das políticas ambientais, bem como a garantia de disponibilização generalizada, atempada e completa de informação e documentação a todos os órgãos e entidades responsáveis e a todos os cidadãos interessados nessa participação; r) A promoção de acções e medidas de preservação e recuperação do património cultural, quer natural quer construído; s) A recuperação de áreas degradadas do território nacional, com garantias de tratamento dos passivos ambientais; t) O planeamento de todas as áreas sectoriais da política de ambiente e do ordenamento do território, com vista a garantir uma linha condutora nas decisões políticas a tomar, as quais devem estar vertidas em estratégias de acção que requerem obrigatoriamente a participação de todos os interessados; u) A inclusão da educação ambiental no ensino obrigatório e na formação profissional, bem como o incentivo à sua ampla divulgação, designadamente através dos meios de comunicação social e de instrumentos didácticos dirigidos a várias camadas populacionais, incluindo de apoio aos docentes; v) A possibilidade de criação de medidas de fiscalidade ambiental que promovam comportamentos e acções que beneficiem os princípios estabelecidos na presente lei.

Artigo 5.º Conceitos e definições

1 — A sustentabilidade do desenvolvimento é resultado da interacção de múltiplos factores no funcionamento e na harmonização das sociedades humanas com o meio natural e traduz-se na capacidade de gerar bem-estar físico, mental e social, bem como relações autênticas entre o indivíduo, a comunidade e a natureza, observando, designadamente, os seguintes factores:

a) A necessidade de ocupação harmoniosa do território e de utilização de recursos naturais de modo a garantir a sua regenerabilidade; b) Um sistema produtivo não delapidador nem poluidor dos recursos naturais, que assegure os direitos e as necessidades das gerações vindouras;

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c) A necessidade de garantir direitos essenciais como a alimentação, o acesso à água, a habitação, a saúde, a educação, uma rede de transportes colectivos, a cultura, a ocupação de tempos livres; d) Um sistema social que assegure a posteridade de toda a população e que apoie os cidadãos nas suas necessidades.

2 — Para efeitos do presente diploma, consideram-se as seguintes definições:

a) Alterações climáticas: variações das características do clima, temperatura, vento e precipitação, resultante de fenómenos naturais, mas agravado por causas antropogénicas, designadamente pela libertação de gases com efeito de estufa, que promovem e fomentam fenómenos climáticos extremos, com preocupantes consequências ambientais, sociais, económicas e territoriais; b) Ambiente: o conjunto dos sistemas físicos, químicos e biológicos e as suas relações, bem como os factores económicos, sociais e culturais com efeito directo ou indirecto, mediato ou imediato, sobre os seres vivos, as paisagens e a qualidade de vida dos seres humanos; c) Componentes ambientais naturais: elementos da natureza que compõem o ambiente e que constituem património a preservar dada a sua directa relação com os recursos naturais que importa preservar e gerir de forma regrada, sem comprometer a sua regeneração e a sua qualidade; d) Componentes antropogénicos: elementos resultantes de intervenção e de actividade humanas, que interferem e têm implicações sobre o meio natural e que importa regrar e reparar, de modo a não comprometer os componentes ambientais naturais; e) Conservação da natureza: preservação dos recursos naturais, de modo a gerir a sua utilização para as necessidades humanas de forma compatível com a garantia da capacidade de regeneração de todos os seres vivos, a manutenção da biodiversidade e a conservação das paisagens naturais; f) Continuum naturale: sistema contínuo de ocorrências naturais que constituem o suporte de vida silvestre e da manutenção do potencial genético e que contribui para o equilíbrio e a estabilidade do território; g) Ordenamento do território: processo integrado de ocupação do espaço biofísico, tendo como objectivo o uso ou a transformação do território e dos solos, de acordo com as suas capacidades e vocações, bem como a permanência dos valores de equilíbrio biológico e de estabilidade geológica, numa perspectiva de organização das sociedades; h) Organismos geneticamente modificados: organismos vivos transgénicos, nos quais foi introduzido artificialmente um ou mais genes, por meio de técnica ou engenharia de transformação genética; i) Paisagem: unidade geográfica, geológica, ecológica e estética resultante da reacção da natureza ou da acção do ser humano, sendo primitiva quando não há intervenção humana; natural quando a acção humana existe sem deixar de se verificar o equilíbrio biológico, a estabilidade física e a dinâmica ecológica; e transformada quando a intervenção do ser humano é determinante na alteração paisagística; j) Poluição: o resultado de acções e actividades que afectam negativamente o ambiente, a saúde, o bemestar, a biodiversidade, o equilíbrio e a perenidade dos ecossistemas naturais, a estabilidade física e biológica do território; k) Tecnologias limpas: utilização de equipamento e materiais que evitam a produção de resíduos, efluentes ou as emissões de gases nocivos, nos termos das melhores práticas ambientais e das melhores técnicas disponíveis; l) Zonas húmidas: zonas de pântano, charco, turfeira ou água, natural ou artificial, permanente ou temporária, com água estagnada ou corrente, doce, salobra ou salgada, incluindo águas marinhas cuja profundidade na maré baixa não exceda os seis metros, onde se concentram múltiplas espécies de aves aquáticas, mamíferos, répteis, anfíbios, peixes e invertebrados.

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Capítulo II Componentes ambientais naturais

Artigo 6.º Componentes ambientais naturais

Nos termos da presente lei, são componentes ambientais naturais:

a) A atmosfera; b) A luz; c) A água; d) O solo e o subsolo; e) A flora; f) A fauna; g) A paisagem primitiva e natural.

Artigo 7.º Defesa da qualidade

Em ordem a assegurar a defesa da qualidade apropriada dos componentes ambientais naturais, referidos no artigo anterior, o Estado:

a) Cria um sistema de monitorização e avaliação do estado desses componentes; b) Formula planos, programas e estratégias de preservação e protecção desses componentes; c) Proíbe ou condiciona o exercício de actividades de degradação desses componentes; d) Promove uma política de racionalização de gastos energéticos de modo a compatibilizar a preservação de todos os componentes ambientais naturais e as actividades humanas; e) Apoia projectos e acções de valorização dos componentes ambientais naturais; f) Desenvolve acções de conservação desses componentes; g) Cria um sistema de fiscalização adequado à garantia da protecção dos componentes ambientais naturais; h) Cria um sistema de aviso e alerta rápido para as situações em que a degradação de qualquer um dos componentes ambientais naturais constitui perigo para a saúde, bem-estar ou equilíbrio ecológico; i) Prima pela não extinção dos componentes ambientais naturais.

Artigo 8.º Atmosfera

1 — Todos têm direito a respirar um ar saudável, quer em ambientes livres quer fechados.
2 — É proibido ou condicionado o lançamento para a atmosfera de quaisquer substâncias, seja qual for o seu estado físico, susceptíveis de afectarem de forma nociva a qualidade do ar e o equilíbrio ecológico, ou que impliquem risco, dano ou incómodo para as pessoas e bens naturais ou construídos.
3 — É obrigatório o uso de dispositivos ou processos eficazes de retenção ou neutralização de substâncias poluidoras em todos os equipamentos, máquinas, instalações ou meios de transporte cuja actividade ou utilização afecte a qualidade da atmosfera.
4 — São estabelecidos parâmetros de qualidade do ar exterior e interior e sistemas de monitorização que permitam aferir do cumprimento desses parâmetros.
5 — É criado um sistema de alerta à população, para advertência nos casos em que as características do ar comportem risco de saúde para os grupos populacionais mais vulneráveis ou para a população em geral.
6 — A defesa da camada de ozono, dada a sua relevância para a saúde humana e para a defesa de componentes ambientais naturais, é um imperativo nacional e global.

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7 — As actividades humanas devem desenvolver-se de modo a não contribuir para o aquecimento global e para o agravamento das alterações climáticas.
8 — Os princípios contidos no presente artigo serão objecto de regulamentação.

Artigo 9.º Luz

1 — Todos têm direito a um nível de luminosidade adequado à sua saúde, bem-estar e conforto, quer em habitação quer no local de trabalho ou nos espaços livres públicos de recreio, lazer e circulação.
2 — Devem promover-se níveis de luminosidade natural consentâneos com a promoção da qualidade de vida das populações e com vista à poupança de recursos energéticos para gerar electricidade.
3 — Nos termos dos números anteriores do presente artigo, deve observar-se, designadamente:

a) O volume dos edifícios e outras construções de modo a que não prejudiquem, pelo ensombramento, a qualidade de vida dos cidadãos, os espaços verdes e a vegetação, nos espaços públicos e privados; b) Normas específicas de luminosidade respeitantes à construção de fogos para habitação, escritórios, unidades industriais ou outros locais de trabalho, escolas e demais equipamentos sociais; c) A preservação e criação de espaços verdes que criem ampla margem de luminosidade natural, bem como de normas de arborização e rearborização junto a aglomerados habitacionais garantindo níveis de luminosidade adequados à salvaguarda da qualidade de vida; d) A permissão de anúncios luminosos apenas em áreas urbanas, condicionados pela cor, forma, localização e intermitência, através de normas a fixar especificamente, com a garantia de que não são prejudiciais ao descanso, saúde e bem-estar dos cidadãos; e) A iluminação pública compatível com a segurança dos cidadãos e com o princípio da eficiência energética.

Artigo 10.º Água

1 — Todos têm direito ao acesso a água potável, independentemente da sua condição económica ou da sua localização geográfica.
2 — O Estado garante a gestão pública da água e dos recursos hídricos.
3 — As categorias de águas abrangidas pelo presente diploma são:

a) Águas interiores de superfície; b) Águas interiores subterrâneas; c) Águas marítimas interiores; d) Águas marítimas territoriais; e) Águas marítimas da zona económica exclusiva.

4 — O presente diploma abrange igualmente os leitos e margens dos cursos de água de superfície, os fundos e margens de lagoas, as zonas de infiltrações, a orla costeira, os fundos marinhos interiores da plataforma continental e da zona económica exclusiva.
5 — A política da água cumpre, designadamente, os seguintes objectivos:

a) A garantia da qualidade da água, por forma a assegurar o equilíbrio dos ecossistemas, a garantir a saúde pública e a permitir a sua utilização para diversos usos; b) A definição de parâmetros de qualidade em função dos diversos usos da água, e a hierarquização desses usos em função da sustentabilidade do desenvolvimento e não de interesses económicos; c) A criação de um sistema de alerta para a população, quando a água não atingir, em qualquer um dos parâmetros avaliados, qualidade necessária à salvaguarda da saúde pública; d) A abrangência da população por sistema de abastecimento de água e de tratamento de águas residuais;

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e) A utilização eficiente da água, garantindo a preservação e a conservação deste bem, essencial a todas as formas de vida e estratégico para o desenvolvimento; f) A generalização da reutilização da água, evitando o seu desperdício e incrementando a sua optimização; g) O escoamento adequado e o aproveitamento das águas pluviais; h) A gestão integrada do recurso através de um planeamento regional e nacional; i) A gestão dos recursos hídricos com base na bacia hidrográfica, a qual tem em conta as suas características sociais, económicas, culturais, ambientais e geográficas; j) A criação de mecanismos que interditem fontes de poluição dos recursos hídricos; k) A garantia de ligação de qualquer fonte poluidora, seja de origem industrial, comercial, agrícola, de serviços ou doméstica a sistemas de escoamento e tratamento das águas; l) A garantia de que as unidades industriais que libertam águas degradadas directamente para sistemas de esgotos sejam obrigadas a assegurar a sua depuração, de forma a evitar a degradação das canalizações e a perturbação e funcionamento da estação final de tratamento; m) A monitorização e garantia de funcionamento adequado das estações de tratamento de água; n) O desenvolvimento e aplicação de técnicas de prevenção e combate a derrames, sejam de origem industrial sejam de origem de transportes; o) O estabelecimento de uma faixa de protecção ao longo da orla costeira; p) A interdição de licenciamento de instalação de unidades ou empreendimentos que impliquem a degradação da qualidade da água; q) A garantia de preservação dos ecossistemas marinhos e da biodiversidade.

6 — Todas a utilizações de água carecem de autorização prévia das entidades competentes, devendo essa autorização ser acompanhada da garantia de boas práticas para assegurar a qualidade dos recursos hídricos.

Artigo 11.º Solo e subsolo

1 — Todos têm direito a uma gestão de actividades e de ordenamento do território que defenda a valorização do solo e do subsolo como fonte e suporte básico de vida e de recursos naturais fundamentais ao desenvolvimento.
2 — Tendo em conta o estabelecido no número anterior, a política de solos deve observar os seguintes objectivos:

a) A adopção de medidas conducentes à racional utilização do solo; b) A classificação e o planeamento de solos de acordo com as suas características biofísicas e actividades adequadas às suas condições, tendo em vista os seus diferentes usos; c) A definição de medidas que contrariem a desertificação dos solos e simultaneamente a sua saturação; d) A promoção e melhoria da fertilidade dos solos, bem como a sua regeneração; e) A proibição de utilização de solos de elevada fertilidade para fins não agrícolas; f) A salvaguarda da estabilidade ecológica e dos ecossistemas na produção; g) A proibição de actividades e de construção de empreendimentos ou outras obras que promovam a erosão, a grave impermeabilização e a degradação dos solos ou que impeçam a regulação do ciclo da água; h) A proibição de construção e de impermeabilização de solos em locais que promovam o desprendimento de terras, o encharcamento, a inundação, o excesso de salinidade ou outros efeitos lesivos; i) O combate eficaz à especulação imobiliária e a todas as formas de corrupção e de enriquecimentos indevidos decorrentes da classificação e re-classificação de solos; j) O combate eficaz à especulação imobiliária.

3 — Aos proprietários de terrenos, ou aos seus utilizadores, podem ser impostas medidas de defesa e valorização dos mesmos, nomeadamente através da obrigatoriedade de execução de trabalhos técnicos, agrícolas ou silvícolas, nos termos da legislação em vigor.

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4 — O uso de biocidas, pesticidas, herbicidas, adubos, correctivos ou quaisquer outras substâncias similares, bem como a sua produção e comercialização, será limitado nos termos de regulamentação especial.
5 — O licenciamento e a autorização para utilização e a ocupação do solo para fins urbanos, industriais ou implantação de equipamentos e infra-estruturas serão condicionados pela respeito pelas natureza, topografia, geologia, hidrogeologia e fertilidade dos solos.
6 — A exploração de recursos do subsolo tem em conta os interesses de conservação da natureza e dos recursos naturais, designadamente:

a) A garantia da regeneração dos recursos naturais renováveis; b) A monitorização do volume de extracção das reservas de matérias-primas exploradas; c) A definição de perímetros de protecção de áreas ricas em recursos naturais; d) A exploração racional das nascentes de água mineral e termal; e) O respeito pela paisagem onde se integram as explorações de recursos do subsolo; f) A obrigatoriedade de recuperação paisagística quando a exploração do subsolo resulta numa alteração da topografia existente, ou dos sistemas naturais relevantes, com vista à integração harmoniosa da área explorada na paisagem envolvente; g) A adopção de medidas preventivas da degradação do ambiente resultante dos trabalhos de extracção de matéria-prima que possam pôr em perigo a estabilidade dos sistemas naturais e sociais e a saúde pública.

Artigo 12.º Flora

1— A flora e os ecossistemas propícios ao seu desenvolvimento são preservados tendo em conta a importância da biodiversidade para a vida no planeta, nomeadamente como suporte alimentar e de habitats, como regulação climática e do ciclo da água, como recurso natural, tendo ainda em conta a importância da salvaguarda das paisagens e da segurança das populações.
2 — Com vista ao cumprimento do objectivo inscrito no número anterior:

a) São adoptadas medidas de salvaguarda e de valorização das formações vegetais espontâneas ou subespontâneas, nomeadamente a vegetação ripícola, do património florestal e dos espaços verdes e periurbanos; b) São proibidos os processos que impeçam o desenvolvimento normal ou a recuperação da flora e da vegetação espontânea que apresentem interesses científicos, de biodivesidade ou paisagísticos, designadamente da flora silvestre, essencial à manutenção do espaço rural e do equilíbrio biológico das paisagens e à diversidade dos recursos genéticos; c) São adoptadas medidas de planeamento e de ordenamento visando a defesa e promoção do património silvícola e dos espaços florestais ou de matas, tendo em conta o papel ambiental da floresta, nomeadamente o contributo que desempenha ao nível climático e no combate às alterações climáticas, como sumidouro de dióxido de carbono e tendo ainda em conta os inúmeros serviços que presta às populações, do ponto de vista económico e social, sendo um complemento fundamental da agricultura como suporte e dinamização do mundo rural; d) É promovido o ordenamento florestal de todo o território nacional, designadamente através da protecção e fomento de espécies florestais endógenas, da restrição da introdução de exóticas e de monoculturas intensivas e de espécies de crescimento rápido, como medida fundamental de prevenção de incêndios florestais e de combate ao empobrecimento dos solos e da biodiversidade; e) Para as áreas degradadas, ou nas atingidas por incêndios florestais ou afectadas por uma exploração desordenada, é concebida e executada uma política de gestão que garanta uma racional recuperação de recursos, através da beneficiação agrícola e florestal de uso múltiplo, privilegiando as espécies autóctones, e que impeça a especulação e o uso indevido e irrecuperável dessas áreas; f) As espécies vegetais de grande valor patrimonial e genético, especialmente as autóctones, bem como as espécies vegetais ameaçadas de extinção e outros exemplares botânicos que, isolados ou em grupo, tenham

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um valor decorrente do seu porte, raridade, idade ou de outra razão, são objecto de um estatuto de protecção, a regulamentar em legislação especial; g) É proibida a eliminação de montados de sobro e de azinho e outras árvores dispersas nas folhas de cultura, com excepção dos solos de classes A e B, nas paisagens de características mediterrânicas e continentais; h) É promovida a protecção da vegetação nas margens dos cursos de água e nas zonas estuarinas; i) É proibida a eliminação da compartimentação, sebes vivas, uveiras e muros, para além da dimensão da folha de cultura considerada mínima regionalmente; j) São objecto de regulamentação especial o controlo de colheita, o abate, a utilização e a comercialização de certas espécies vegetais e seus derivados, bem como a importação ou introdução de exemplares exóticos; k) São promovidas decisões eficazes com vista a impedir o cultivo e a contaminação de espécies vegetais por organismos geneticamente modificados.

3 — Todas as entidades responsáveis por licenciamentos ou autorizações de actividades ou de construções que tenham implicações directas na flora observam, nas suas decisões, os princípios enunciados nos números anteriores.

Artigo 13.º Fauna

1 — A fauna e os habitats necessários à sua sobrevivência são preservados, com vista à salvaguarda da biodiversidade e à valorização de todas as espécies.
2 — Tendo em vista a promoção da conservação de espécies:

a) Toda a fauna, sobre a qual recaia interesse genético, científico, social, ambiental ou biológico, é protegida, através de legislação especial; b) As espécies animais em vias de extinção são devidamente identificadas, monitorizadas e divulgadas, sendo alvo de legislação específica; c) A fauna migratória é protegida através de legislação especial que promova o levantamento, a classificação e a protecção, em particular dos montados e das zonas húmidas, ribeirinhas e costeiras; d) A fauna autóctone, de uma forma mais ampla, e a necessidade de proteger a saúde pública, implicam a adopção de medidas de controlo efectivo, restritivas ou de proibição, a desenvolver pelos organismos competentes e autoridades sanitárias; e) Os recursos animais, cinegéticos e piscícolas das águas interiores e do meio marinho, serão objecto de legislação especial que regulamente a sua valorização, preservação e usufruição.

3 — Com o objectivo de cumprimento dos princípios enunciados nos números anteriores determina-se:

a) A manutenção ou activação dos processos biológicos de auto-regeneração; b) A proibição de destruição de habitats determinantes para a sobrevivência e reprodução de espécies; c) A recuperação dos habitats degradados essenciais para a fauna e, quando necessário, a criação de habitats de substituição; d) A regulamentação da comercialização da fauna silvestre, aquática ou terrestre; e) A permissão de introdução de espécies animais selvagens, aquáticas ou terrestres, com relevo para as áreas naturais e para a preservação dos habitats; f) A possibilidade de restrição de animais tidos por prejudiciais, com o devido controlo das autoridades competentes; g) A regulamentação e o controlo da importação de espécies exóticas; h) A proibição, restrição, regulamentação e controlo da utilização de substâncias ou de intervenções que prejudiquem a fauna selvagem; i) A organização de listas de espécies ameaçadas ou raras, e das biocenoses em que se integram.

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Artigo 14.º Paisagem primitiva e natural

1 — A paisagem primitiva ou natural é preservada como elemento fundamental para a defesa dos princípios inscritos na presente lei, bem como para a defesa da unidade estética, visual e patrimonial que representa.
2 — Com o objectivo de conservação da paisagem primitiva e natural são cumpridas as seguintes orientações:

a) Protecção e valorização das paisagens, através de medidas especiais de defesa, salvaguardando as suas características e os recursos existentes; b) Proibição ou forte condicionamento da implantação de infra-estruturas, ou empreendimentos, incluindo hidro-eléctricos, ou aglomerados urbanos ou outras construções, bem como de actividades, tais como exploração de minas e pedreiras, despejo e acumulação de resíduos ou o corte de árvores, que, pela sua dimensão, volume, silhueta, cor ou impacto, provoquem significativas alterações paisagísticas; c) Avaliação obrigatória de localizações alternativas para implantação das infra-estruturas, empreendimentos, aglomerados urbanos e outras construções ou de actividades, que recaiam nas situações referidas na alínea anterior; d) Adequação das actividades humanas às paisagens em causa, de modo a garantir a sua não degradação ou descaracterização; e) Identificação, avaliação e monitorização das características dessas paisagens, com inventariação e cartografia dos seus valores visuais e estéticos; f) Definição de estratégia de desenvolvimento que empenhe as populações na defesa dos valores paisagísticos, através de apoio técnico e social e, se considerado relevante, por via de incentivos financeiros ou fiscais.

Capítulo III Componentes antropogénicos

Artigo 15.º Componentes antropogénicos

Nos termos da presente lei, são componentes antropogénicos:

a) A paisagem transformada; b) O património construído; c) A poluição.

Artigo 16.º Paisagem transformada

1 — A paisagem transformada, caracterizada pelas actividades seculares dos seres humanos, desenvolvidas na sua diversidade, concentração e harmonia, e que geraram e influenciaram sistemas socioculturais, podem revelar-se importantes para a manutenção da pluralidade paisagística e cultural e são alvo de protecção e valorização.
2 — A intervenção humana que desenvolveu desestruturação, descaracterização e degradação paisagística deve ser alvo de requalificação, por forma a que sejam obtidas melhorias significativas ao nível paisagístico e na promoção da harmonia dos espaços, com o objectivo de garantia de mais qualidade de vida e identidade cultural para as populações.
3 — As políticas de ordenamento do território promovem o respeito pelas características paisagísticas, gerando a harmonia de ocupação do território.

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4 — Promove-se o inventário e avaliação dos tipos e características das paisagens transformadas, em meio urbano ou em meio rural, comportando os seus elementos abióticos e culturais.
5 — O ordenamento do território e a gestão urbanística têm em conta o disposto na presente lei, designadamente em relação ao planeamento económico e social, tendo, igualmente, em conta as competências da administração central, regional e local.
6 — Os espaços urbanos são geridos e construídos promovendo o embelezamento do espaço público, a presença de espaços verdes e de equipamentos determinantes para a fruição de direitos fundamentais pelas populações, como educação, saúde, mobilidade, desporto e lazer.
7 — A ocupação marginal de infra-estruturas viárias, fluviais, portuárias e aeroportuárias são objecto de regulamentação especial.

Artigo 17.º Património construído

1 — O património construído, com valor histórico e cultural, é objecto de medidas especiais de defesa, salvaguarda e valorização, através, designadamente, de reabilitação das suas estruturas, da sua fruição pela população de forma regrada, incluindo, sempre que possível, planificação de acções numa perspectiva de bom uso, animação e utilização criativa.
2 — O património histórico e cultural pode ser objecto de classificação, por forma a promover o reconhecimento do seu valor e a divulgar a sua importância.
3 — São definidas medidas de recuperação dos centros históricos, de áreas urbanas e rurais, de edifícios e conjuntos monumentais, em cooperação com as autarquias locais e com as associações de defesa do património e do ambiente.
4 — É estabelecida a orgânica e o modo de funcionamento dos organismos responsáveis pela política de defesa do património.

Artigo 18.º Poluição

1 — São causas de poluição do ambiente todas as substâncias, organismos, produtos ou radiações lançadas na atmosfera, na água, no solo ou subsolo que afectam ou alterem, parcial ou totalmente, temporária ou irreversivelmente, a sua qualidade, as suas características ou a sua normal conservação ou evolução.
2 — Em território nacional, ou área sob jurisdição portuguesa, é proibido poluir, lançar, depositar ou, sob qualquer outra forma, introduzir na atmosfera, na água, nos solos ou subsolos, directa ou indirectamente, substâncias, organismos, produtos ou resíduos que contenham componentes que possam danificar, contaminar, tornar impróprios ou alterar as características desses componentes ambientais, contribuindo, assim, para a degradação do ambiente.
3 — As políticas de combate à poluição assumem uma forte componente de prevenção, designadamente através de mecanismos de fomento de tecnologias limpas, da fixação de limites de emissões, de sistemas e regras de manuseamento, transporte, recolha, depósito e tratamento de substâncias poluidoras e da monitorização e fiscalização das actividades e acções potencialmente poluidoras, bem como do seu estudo e pesquisa com vista à permanente actualização sobre métodos mais adequados de prevenção.
4 — As disposições previstas no presente artigo são objecto de regulamentação, a qual obrigatoriamente define os limites de tolerância admissíveis da presença de elementos poluentes na atmosfera, na água, no solo ou subsolo, nos seres vivos, nas paisagens e como salvaguarda da saúde pública, bem como as proibições e os condicionamentos necessários à defesa e melhoria da qualidade do ambiente.
5 — São, ainda, estabelecidos os meios de punição dos agentes poluidores e as formas da sua assumpção de responsabilidade em relação à reparação dos danos que causaram ao ambiente, sempre sob o princípio de que compensará prevenir e não poluir.
6 — Os factores de poluição são objecto de regras específicas e devidamente publicitadas, designadamente:

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a) O ruído; b) Os compostos químicos; c) Os resíduos e efluentes; d) As substâncias radioactivas; e) Os gases com efeito de estufa; f) Os organismos geneticamente modificados.

Artigo 19.º Ruído

1 — O controlo dos níveis de ruído promove-se através, designadamente:

a) Da normalização dos métodos de medida do ruído; b) Do estabelecimento de níveis sonoros máximos, tendo em conta os conhecimentos científicos e tecnológicos; c) Da redução dos níveis sonoros na origem, através da fixação de normas de emissão aplicáveis às diferentes fontes; d) Da homologação de equipamentos e máquinas que se enquadrem nos níveis de ruído admitidos para cada situação; e) Da proibição da utilização de equipamentos cuja produção de ruído ultrapasse os níveis máximos admitidos em cada caso; f) Da obrigação dos fabricantes de equipamentos, e de quaisquer máquinas, apresentarem informação detalhada sobre os níveis de ruído na rotulagem dos mesmos; g) Da adopção, na construção de edifícios, utilização de equipamentos ou exercício de actividades, de medidas preventivas para eliminação da propagação do ruído exterior e interior, bem como de trepidações; h) Da sensibilização da população para os problemas do ruído, com adequada informação sobre intensidade, locais e horários de impedimento de emissão de ruído; i) Da localização adequada, no território, de actividades causadoras de ruído, com respeito pela salvaguarda da saúde pública.

2 — Os veículos motorizados, incluindo embarcações, aeronaves e transportes ferroviários, estão sujeitos a homologação e controlo das características do ruído que produzem.
3 — Os avisadores sonoros estão sujeitos a homologação e controlo quanto às características dos sinais acústicos que produzem.
4 — Nos equipamentos electromecânicos são especificadas as características do ruído que produzem.

Artigo 20.º Compostos químicos

1 — O combate à poluição derivada do uso de compostos químicos processa-se, designadamente, através:

a) Da aplicação de tecnologias limpas; b) Da avaliação sistemática dos efeitos potenciais dos compostos químicos sobre o ambiente e a saúde pública; c) Da definição de normas e controlo do fabrico, comercialização, utilização, manuseamento e eliminação dos compostos químicos; d) Da aplicação de princípios limitadores e de técnicas preventivas de utilização, assim como da orientação para reciclagem e reutilização de matérias-primas e produtos, gerando condições para a sua concretização; e) Da homologação de laboratórios de ensaio e análise destinados à avaliação das características dos compostos químicos e do seu impacto sobre o ambiente e a saúde pública; f) Do esclarecimento e informação à população sobre impactos da utilização de compostos químicos.

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2 — É produzida legislação especial que garanta, designadamente:

a) A biodegradabilidade dos detergentes; b) A homologação, o condicionamento e a rotulagem dos pesticidas e herbicidas, solventes, tintas, vernizes e outros produtos tóxicos; c) A restrição da utilização de cloro-flúor-carbonetos e de outros componentes utilizados nos aerossóis, os quais têm forte impacto sobre a camada de ozono, o ambiente e a saúde pública; d) A criação de um sistema de informação sobre novas substâncias químicas, com a devida divulgação; e) A obrigatoriedade dos industriais actualizarem e avaliarem os riscos potenciais dos produtos que fabricam, antes da sua comercialização; f) O estabelecimento de limite máximo da presença de amianto, chumbo, mercúrio, cádmio, e de outros metais pesados, no meio natural e no património edificado.

Artigo 21.º Resíduos e efluentes

1 — A política de gestão de resíduos e efluentes toma como prioridade as seguintes operações, pela seguinte ordem hierárquica, de modo a evitar a poluição e a gerir racionalmente a utilização de recursos naturais:

a) Redução e prevenção da produção de resíduos; b) Redução da perigosidade dos resíduos; c) Reutilização de resíduos; d) Reciclagem de resíduos; e) Valorização e aproveitamento de resíduos para produção energética, quando compatível com a defesa do ambiente.

2 — A redução e prevenção de resíduos e a redução da sua perigosidade são obtidas, designadamente, pelo recurso a tecnologias limpas e pela eliminação de materiais supérfluos para o fabrico, embalagem ou transporte dos produtos.
3 — Quando os resíduos e efluentes não forem tecnicamente susceptíveis de serem submetidos às operações definidas no número anterior, tornam-se desperdícios, os quais requerem uma eliminação definitiva, designadamente a sua deposição em aterro controlado, localizado de forma a não prejudicar o ambiente e o bem-estar das populações.
4 — Com vista a facilitar o correcto encaminhamento dos resíduos, efluentes e desperdícios, em função das suas características, as autoridades competentes pugnam pela criação de sistemas de recolha e transporte das diversas fileiras, fomentando a triagem e separação de resíduos na origem por parte do produtor.
5 — A lei define a responsabilidade da gestão de resíduos por fileira.
6 — A política fiscal fomenta o incentivo à redução, à prevenção, à reciclagem e à reutilização de resíduos, bem como a produtos que sejam derivados dessas operações, os quais devem conter essa informação na rotulagem.
7 — Os órgãos competentes da administração central, regional e local promovem regularmente acções de esclarecimento e sensibilização à população, aos autores de actividades produtivas e de serviços, de modo a garantir maior eficiência nas prioridades estabelecidas para a gestão de resíduos, designadamente na correcta separação de resíduos em função das suas características.
8 — A emissão, transporte e destino final de resíduos e efluentes ficam condicionados a autorização prévia.
9 — A responsabilidade do destino dos diversos tipos de resíduos e efluentes é de quem os produz.
10 — Os resíduos e efluentes só podem ser recolhidos, armazenados, transportados, tratados e eliminados de forma a não constituírem perigo para o ambiente e a para a saúde pública.
11 — A descarga de resíduos e efluentes só pode ser efectuada em locais autorizados para o efeito pelas entidades competentes.

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Artigo 22.º Substâncias radioactivas

1 — O controlo da poluição originada por substâncias radioactivas promove-se, designadamente, através:

a) Da avaliação e monitorização dos efeitos das substâncias radioactivas nos ecossistemas receptores e na população alvo; b) Da fixação de normas de emissão para os desperdícios físicos e químicos radioactivos, resultantes de actividades que impliquem extracção, transporte, transformação, utilização ou armazenamento de material radioactivo; c) Do planeamento de medidas preventivas em relação aos efeitos das substâncias radioactivas e de actuação imediata em caso de poluição radioactiva, com sistemas de alerta rápidos e eficazes para informação da população; d) Do acompanhamento, avaliação e controlo dos efeitos da poluição radioactiva transfronteiriça, através de uma actuação técnica, política e diplomática que permita a sua prevenção; e) Da fixação de regras para o trânsito, transferência e deposição de materiais radioactivos no território nacional, nas águas marítimas territoriais e na zona económica exclusiva.

2 — São criados e elaborados planos e concretizadas acções que promovam a requalificação ambiental das áreas onde foi explorada matéria radioactiva, com a devida responsabilização dos que promoveram essa exploração.

Artigo 23.º Gases com efeito de estufa

1 — A libertação de gases com efeito de estufa, designadamente do dióxido de carbono, metano, óxido nitroso, fluorcarbonetos, é objecto de regulamentação específica, com vista à sua redução substancial, de modo a evitar o agravamento do fenómeno das alterações climáticas.
2 — O Estado promove políticas e medidas concretas direccionadas para todos os sectores de actividade que libertam gases com efeito de estufa, de modo a reduzir as suas emissões.
3 — É criado um sistema de monitorização e avaliação que seja apto a quantificar as emissões de gases com efeito de estufa.
4 — São apoiadas e desenvolvidas investigações científicas que actualizem permanentemente conhecimentos sobre as causas e efeitos das alterações climáticas.
5 — As políticas de energia, de transportes, de economia, de resíduos, de água, entre outras, têm em conta as influências das medidas adoptadas em relação ao fenómeno das alterações climáticas.
6 — São desenvolvidos esforços internacionais de cooperação na prevenção e no combate às alterações climáticas.
7 — São, simultaneamente, desenvolvidas medidas de mitigação e de adaptação dos efeitos das alterações climáticas em território nacional.

Artigo 24.º Organismos geneticamente modificados

1 — São definidas e executadas medidas de impedimento de culturas geneticamente modificadas, exceptuando para efeitos científicos desde que limitadas no espaço e devidamente controladas.
2 — É proibida, por qualquer meio, qualquer grau de contaminação de espécies por organismos geneticamente modificados.
3 — No sentido de dar cumprimento ao estipulado nos números anteriores é fomentada a criação alargada e contínua de zonas livres de organismos geneticamente modificados em território nacional.

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4 — O Governo obriga-se a informar, de forma clara, inequívoca e actualizada, e de forma acessível a aos cidadãos, todos os dados para efeitos de conhecimento de contaminação por organismos geneticamente modificados.
5 — Qualquer produto introduzido no mercado que tenha, qualquer que seja o grau, presença de organismos geneticamente modificados tem obrigatoriamente que conter essa informação, para efeitos de comercialização.
6 — É promovida a fiscalização para efeitos de cumprimento do presente artigo.

Capítulo IV Zonas vulneráveis

Artigo 25.º Zonas vulneráveis

1 — As zonas vulneráveis são todas aquelas que, pelo seu valor patrimonial, biológico, territorial, ambiental, social, cultural ou outros, apresentam características de fragilidade ou de risco, causado por factores naturais de agressão ou por intervenção e acção antropogénica.
2 — As zonas vulneráveis requerem uma intervenção urgente por parte do Estado e das demais entidades competentes e responsáveis, com vista a prevenir factores de risco, bem como a reparar danos causados que contribuam para a continuação da fragilidade dessas áreas.
3 — São zonas vulneráveis, designadamente:

a) O litoral; b) As zonas húmidas; c) O mundo rural.

Artigo 26.º Litoral

1 — A gestão do litoral é promovida tendo em conta a prevenção de riscos para o ambiente e para a segurança das populações e tendo, ainda, em conta o papel estratégico que desempenha para o país ao nível económico e de defesa nacional, combatendo designadamente:

a)A erosão; b) A destruição de sistemas dunares; c) A instabilidade de arribas e falésias; d) A elevação do nível do mar; e) A poluição do meio marinho e dos recursos a ele ligados.

2 — A gestão do litoral, tendo em conta o número anterior, integra, designadamente:

a) A identificação rigorosa das zonas de risco e elaboração das respectivas cartas de risco; b) A monitorização contínua do estado do litoral e dos recursos marinhos; c) A definição de zonas de não construção e de margens de total interdição de construção; d) A gestão adequada das bacias hidrografias e dos rios, em concreto, garantindo o transporte de inertes e de sedimentos até à costa; e) A vigilância e fiscalização rigorosas do domínio público hídrico; f) A instalação de um sistema de vigilância marítima e costeira que cubra toda a faixa litoral; g) A criação de corredores marítimos que afastem o transporte de substâncias perigosas das zonas costeiras; h) A proibição ou forte restrição de actividades lesivas para a sustentabilidade do litoral;

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i) A promoção de actividades consentâneas com a exploração de recursos racional e não agressiva para o litoral; j) O planeamento da orla costeira, tendo em conta os objectivos traçados nas alíneas anteriores.

3 — É criada uma entidade de âmbito nacional que tenha competências de coordenação da gestão do litoral em todas as suas vertentes, de modo a não dispersar interesses e opções de gestão diversificadas que se incompatibilizam e que fragilizam o litoral.

Artigo 27.º Zonas húmidas

1 — As zonas húmidas são determinantes para a defesa do equilíbrio ecológico, da biodiversidade e da segurança das populações e constituem dos ecossistemas mais produtivos e de maior diversidade biológica.
2 — As zonas húmidas são determinantes, designadamente, para:

a) O controlo de inundações; b) A reposição de águas subterrâneas; c) A disponibilidade de água doce; d) A regulação do ciclo da água; e) A retenção de sedimentos e de nutrientes; f) A mitigação dos efeitos das alterações climáticas; g) A preservação de valores científicos, ambientais, culturais, turísticos, sociais e recreativos.

3 — A defesa das zonas húmidas pressupõe, designadamente:

a) A proibição ou forte restrição de actividades ou acções que as ameacem ou contribuam para a sua degradação; b) A regular monitorização do seu estado de conservação e evolução das suas características; c) O apoio ao estudo científico sobre as zonas húmidas; d) A plena identificação de todas as zonas húmidas do país; e) O planeamento e garantia de ordenamento das mesmas; f) A identificação criteriosa das zonas de risco, complementada com a definição de medidas para a recuperação das zonas húmidas ameaçadas.

Artigo 28.º Mundo rural

1 — As políticas económicas, sociais, ambientais e de ordenamento territorial tomam como objectivo a dinamização do mundo rural, prevenindo o seu despovoamento e a sua desertificação.
2 — Com vista ao cumprimento dos objectivos traçados no artigo anterior, a gestão do mundo rural promove, designadamente:

a) A preservação e o fomento da actividade agrícola, através do apoio aos sistemas de produção tradicionais que são mais compatíveis com a conservação da natureza; b) O fomento dos espaços florestais, da floresta de uso múltiplo e da exploração sustentável dos recursos silvícolas; c) A proibição ou forte restrição a actividades que, em função das suas características ou da sua escala, gerem desertificação dos solos; d) A contínua monitorização das características e do estado dos solos férteis e a aferição das consequências das alterações climáticas sobre os mesmos; e) A garantia do direito de todos no acesso à terra e à água;

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f) A fixação de serviços públicos essenciais, nomeadamente de educação, saúde, comunicações, segurança e transporte; g) O apoio à fixação de actividades produtivas sustentáveis do ponto de vista ambiental, nomeadamente através do sistema fiscal e da política económica.

3 — A dinamização do mundo rural é crucial para a defesa da floresta de uso múltiplo e para o combate aos incêndios florestais, para o que as acções de limpeza de matas e de vigilância da floresta se torna fulcral.
4 — É elaborado um cadastro florestal que permita o conhecimento rigoroso e facilite a aferição de responsabilidades sobre o espaço florestal.

Capítulo V Instrumentos da política de ambiente e do ordenamento do território

Artigo 29.º Instrumentos

1 — São instrumentos nacionais da política de ambiente e do ordenamento do território, designadamente:

a) Um plano nacional para a política de ambiente; b) Uma estratégia nacional para o desenvolvimento com sustentabilidade ecológica; c) Uma estratégia nacional de conservação da natureza e da biodiversidade; d) Planos de ordenamento das áreas protegidas; e) Planos de gestão da rede natura 2000; f) Enquandramento da gestão da reserva agrícola nacional e da reserva ecológica nacional; g) Um programa nacional de política de ordenamento do território; h) Um programa de acção nacional de combate à desertificação; i) Uma estratégia nacional para as florestas; j) Um plano nacional da defesa da floresta contra incêndios; l) Um programa nacional de acção para o litoral; l) Uma estratégia para a gestão integrada da zona costeira; m) Planos de ordenamento da orla costeira; n) Uma estratégia nacional para o mar; o) Um plano nacional da água; p) Planos de gestão das bacias hidrográficas; q) Planos de abastecimento de água e de saneamento de águas residuais; r) Um plano nacional para o uso eficiente da água; s) Planos de ordenamento das albufeiras; t) Planos de ordenamento das zonas húmidas; u) Uma estratégia nacional de gestão de resíduos, incluindo planos estratégicos de gestão de cada grupo de resíduos, como sólidos urbanos, hospitalares, industriais e agrícolas; v) Planos de prevenção de produção de resíduos; w) Uma estratégia nacional para efluentes agro-pecuários e agro-industriais; x) Uma estratégia nacional para a energia; y) Um plano nacional de acção para a eficiência energética; z) Uma estratégia de prevenção e combate às alterações climáticas; aa) Uma estratégia de mitigação e adaptação às alterações climáticas; bb) Uma estratégia para a educação ambiental; cc) Uma estratégia nacional para as compras públicas ecológicas; dd) Um plano nacional para o ambiente e saúde; ee) Códigos de boas práticas ambientais para diversos sectores de actividade.

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2 — São igualmente instrumentos de política de ambiente e de ordenamento do território, tendentes a concretizar políticas, decisões e medidas, de acordo com as melhores formas de defesa do ambiente, da promoção da qualidade de vida e da defesa dos recursos naturais, designadamente:

a) Relatórios sobre o estado do ambiente e do ordenamento do território; b) Livro branco sobre o ambiente; c) Avaliação de impacte ambiental de projectos e de avaliação ambiental estratégica de planos e programas; d) Processos e mecanismos de licenciamento e suspensão de licenciamentos, incluindo o licenciamento ambiental; e) Embargos administrativos; f) Sistemas de inventariação, vigilância, monitorização e controlo da qualidade ambiental; g) Cadastro nacional e cartografia ambiental e territorial; h) Acesso a documentos administrativos.

3 — Ao nível local e regional as autarquias locais devem, em razão da sua competência, promover planeamento e definição de estratégias para diversos sectores com relevância ambiental, designadamente no âmbito da gestão de resíduos sólidos urbanos e da recolha selectiva de resíduos, bem como na gestão do abastecimento e saneamento de água, na criação de áreas protegidas, na classificação de solos e na gestão do território, nomeadamente por via dos planos directores municipais e outros instrumentos de gestão e ordenamento territorial e ambiental, bem como na definição de uma estratégia de política ambiental para o respectivo município e região.
4 — Os instrumentos previstos no n.º 1 do presente artigo são obrigatoriamente sujeitos a consulta pública, nos termos de legislação especial.

Artigo 30.º Áreas protegidas

1 — É criada, implementada e regulamentada uma rede nacional contínua de áreas protegidas, abrangendo áreas terrestres, águas interiores e marítimas e outras ocorrências naturais, que, pelo seu valor científico, social, cultural ou ambiental, requeiram um estatuto de protecção especial, submetidas a medidas de classificação, preservação e conservação, visando a salvaguarda de espécies, hatitats, paisagens ou outros ecossitemas importantes para o equilíbrio biológico, estético e estabilidade ecológica.
2 — As populações residentes nas áreas protegidas não podem ser prejudicadas por essa classificação, devendo ser compensadas, aquando na necessidade de restrição de actividades e acções ou da exigência de processos ou elementos decorrentes do estatuto de protecção.
3 — A rede nacional de áreas protegidas compõe-se, designadamente por:

a) Parques nacionais; b) Parques naturais; c) Parques marinhos; d) Reservas naturais; e) Paisagens protegidas; f) Sítios classificados; g) Monumentos naturais.

4 — Podem também ser criadas áreas protegidas de âmbito regional ou local.
5 — A iniciativa da classificação das áreas protegidas é, em função do seu âmbito, da competência da administração central, regional ou local, podendo também ser da Assembleia da República, quando de âmbito nacional.

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Artigo 31.º Relatório e livro branco sobre o ambiente

1 — O Governo fica obrigado a apresentar à Assembleia da República, juntamente com as Grandes Opções do Plano de cada ano, um relatório sobre o estado do ambiente e do ordenamento do território em Portugal.
2 — O Governo fica obrigado a apresentar à Assembleia da República, de quatro em quatro anos, um livro branco sobre o estado do ambiente em Portugal.

Artigo 32.º Avaliação de impacto ambiental e avaliação estratégica ambiental

1 — Os projectos, trabalhos, acções que possam afectar o ambiente, o território ou a qualidade de vida dos cidadãos, quer sejam da responsabilidade ou iniciativa de organismo da administração central, regional ou local, ou de entidade ou instituição pública ou privada, de pessoa colectiva ou particular, são sujeitos a avaliação de impacte ambiental, nos termos definidos em legislação especial.
2 — A avaliação de impacte ambiental visa a identificação, descrição e aferição dos efeitos dos projectos, trabalhos ou acções sobre o ambiente, de modo a determinar uma decisão sustentada sobre a respectiva recusa ou autorização e licenciamento.
3 — Nenhuma obra pode ser licenciada, nem iniciados os seus trabalhos, mesmo que preparatórios, sem a conclusão de todo o processo de avaliação de impacto ambiental.
4 — Os planos e programas, gerais ou sectoriais, de âmbito nacional, regional ou local, são sujeitos a avaliação estratégica ambiental, de modo a que sejam avaliados os efeitos que têm sobre o ambiente, o território ou a qualidade de vida dos cidadãos.
5 — A avaliação estratégica ambiental ocorre durante o procedimento de preparação e elaboração dos planos e programas, sendo o seu resultado determinante para a sua aprovação.
6 — A avaliação de impacto ambiental e a avaliação estratégica ambiental compreendem momentos de consulta pública.
7 — A avaliação de impacto ambiental e a avaliação estratégica ambiental estudam, para além do projecto, trabalho, acção, plano ou programa em concreto, os seus efeitos cumulativos com outros já licenciados ou aprovados ou em vias de licenciamento ou autorização.

Artigo 33.º Licenciamento ambiental

1 — As actividades, nomeadamente industriais, com impacto de emissões ou poluição, são obrigatoriamente sujeitas, no processo de licenciamento geral, a uma licença especial, designada de licença ambiental, emitida através de regime e entidade definida em legislação específica.
2 — As licenças ambientais emitidas são obrigatoriamente tornadas públicas.
3 — O início de exploração e instalação das actividades em causa depende da licença ambiental e da conclusão de todos os procedimentos de atribuição de licença geral.
4 — As alterações de instalação ou de exploração ficam igualmente dependentes de licença ambiental.

Artigo 34.º Acesso a documentos administrativos

1 — Os cidadãos, designadamente para efeitos de consulta pública ou acompanhamento de todos os processos ou procedimentos decisórios, que têm impacto directo ou indirecto sobre o ambiente, têm obrigatoriamente acesso, em tempo útil e de forma gratuita, a todos os documentos administrativos que sejam por eles solicitados às entidades competentes.
2 — A definição dos termos do acesso dos cidadãos a documentos administrativos é regulada em legislação especial.

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Capítulo VI Situações de emergência, críticas ou de necessidade

Artigo 35.º Declaração de zonas críticas e de situações de emergência

1 — O Governo declara como zonas críticas todas aquelas que possam constituir perigo para a segurança das populações, para a saúde pública ou para o ambiente, ficando sujeitas a medidas especiais e acções a estabelecer pelas autoridades competentes da protecção civil, em conjugação com as demais autoridades da administração central, regional e local.
2 — Quando os índices de poluição, em determinada área, ultrapassarem os valores admitidos pela legislação em vigor, por qualquer forma, puserem em perigo a qualidade do ambiente ou a saúde pública, é declarada situação de emergência, pela administração central, regional ou local, devendo ser adoptadas acções e medidas específicas, administrativas ou técnicas para lhe fazer face, pelas entidades competentes.
3 — Em qualquer das situações previstas nos números anteriores é criado um sistema de alerta rápido e eficaz à população, com esclarecimento e informação visível, clara e inequívoca.
4 — Nas situações previstas nos n.os 1 e 2 é elaborado um planeamento de medidas imediatas necessárias para repor a situação e para ocorrer a casos de acidente que possam agravar aumentos dos índices de poluição e de insegurança.
5 — O Governo pugna pela existência, ao nível nacional, de meios de prevenção e de actuação imediata em caso de acidentes que provoquem danos significativos no ambiente.

Artigo 36.º Redução ou suspensão de actividades

1 — Pode ser determinada, pelos órgãos competentes, a redução ou a suspensão, temporária ou definitiva, parcial ou total, de actividades geradoras de poluição, de modo a manter as emissões e resíduos dentro dos limites legais estipulados, nos termos estabelecidos em legislação específica.
2 — O Governo poderá celebrar contratos-programa, ou concretizar outras formas de incentivo, com vista a reduzir gradualmente a carga poluente das actividades poluidoras, desde que da continuação da laboração nessas actividades não decorram riscos significativos para a saúde pública e para o ambiente.

Artigo 37.º Transferência de localização de actividades

As actividades e respectivas instalações que alterem as condições normais de salubridade, higiene e equilíbrio do ambiente podem ser obrigadas a transferir-se para local mais apropriado, com as condições definidas em lei especial.

Capítulo VII Direitos e responsabilidade

Artigo 38.º Organismos responsáveis pela aplicação da presente lei

1 — O Governo, na condução da sua política global, designadamente nos domínios económico, social, ambiental e de ordenamento territorial, aplica e dá cumprimento à presente lei.
2 — A orgânica do Governo contempla um Ministério que tutele directamente as matérias de ambiente e de ordenamento do território, sem prejuízo do domínio transversal a todos os Ministério da aplicação da presente lei.
3 — O Ministério que tutela o ambiente e o ordenamento do território cria, na sua orgânica, organismos que dão resposta às diversas áreas e exigências previstas na presente lei.

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4 — A administração local e regional decide e implementa as medidas necessárias à prossecução dos fins previstos na presente lei, no âmbito das respectivas competências.
5 — Os órgãos da administração central, regional e local cooperam, entre si, com vista à plena execução dos objectivos e princípios constantes da presente lei.

Artigo 39.º Direitos e deveres gerais dos cidadãos

1 — É dever dos cidadãos, em geral, e dos sectores público, privado e cooperativo, em particular, colaborar na criação de um ambiente sadio e ecologicamente equilibrado e na melhoria da qualidade de vida, promovendo o progresso social e ambiental.
2 — Às iniciativas populares no domínio da melhoria do ambiente e da qualidade de vida, quer surjam de forma espontânea quer por via de um apelo da administração central, regional ou local, deve ser dispensada protecção adequada, através dos meios necessários à prossecução dos objectivos do regime previsto na presente lei.
3 — Os cidadãos directamente ameaçados ou lesados no seu direito a um ambiente de vida humana sadio e ecologicamente equilibrado têm direito, nos termos da lei, a requerer a cessação das causas de violação, a sua reparação e a respectiva indemnização.
4 — Sem prejuízo do disposto nos números anteriores, é reconhecido às autarquias e aos cidadãos que sejam afectados pelo exercício de actividades susceptíveis de prejudicar a utilização dos recursos naturais e o ambiente o direito às compensações por parte das entidades responsáveis pelos prejuízos causados, bem como a exigir a reparação dos danos da actividade lesiva.

Artigo 40.º Associativismo de ambiente

1 — Os cidadãos têm o direito de se constituir em associações, organizações ou plataformas de defesa do ambiente, formais ou informais, gerais ou sectoriais, com o objectivo de defesa do ambiente, do património, do ordenamento territorial ou dos consumidores.
2 — As associações, organizações ou plataformas de defesa do ambiente podem ter um âmbito internacional, nacional, regional ou local e podem associar-se entre si.
3 — As associações, organizações ou plataformas de ambiente gozam de direitos procedimentais, administrativos e judiciais, bem como de participação especial, nos termos regulados por legislação especial.
4 — A Administração central, regional e local fomenta a participação das associações, organização e plataformas de defesa do ambiente nos processos decisórios que se enquadrem na presente lei.

Artigo 41.º Responsabilidade ambiental

1 — Os prejuízos ou riscos causados por agentes ao ambiente, e por essa via, directa ou indirectamente, a pessoas ou a bens, constituem danos ambientais.
2 — A adopção de medidas e pagamento de reparação ambiental, decorrente dos danos causados, é do agente poluidor, sem prejuízo de responsabilidade solidária de entidade pública que, depois de comprovada denúncia de pessoa lesada, tenha omitido totalmente o seu dever de acção para impedir a concretização ou continuidade dos danos.
3 — Existe obrigação de indemnizar, independentemente da culpa, sempre que o agente tenha causado danos no ambiente, em virtude de acção perigosa, com respeito pelo normativo aplicável.
4 — O regime jurídico da responsabilidade ambiental, incluindo o quantitativo de indemnização a fixar por danos causados ao ambiente, é estabelecido em legislação específica.
5 — O regime jurídico da responsabilidade ambiental é regulado em legislação específica.
6 — Aqueles que exerçam actividade que envolva significativo grau de risco para o ambiente são obrigados a segurar a sua responsabilidade civil.

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Artigo 42.º Tutela judicial

1 — Sem prejuízo do direito, de quem se sinta ameaçado ou lesado nos termos da presente lei, à actuação perante a jurisdição competente do correspondente direito à cessação da conduta ameaçadora ou lesiva e à indemnização e reparação pelos danos causados, também ao Ministério Público compete a defesa dos valores protegidos pela presente lei.
2 — É igualmente reconhecido a qualquer pessoa, independentemente de ter interesse pessoal ou demanda, bem como às associações defensoras dos interesses em causa e às autarquias locais, o direito de propor ou intervir, nos termos previstos na lei, em processos judiciais principais e cautelares destinados à defesa dos valores protegidos pela presente lei.
3 — As providências cautelares instauradas pelo Ministério Público, sustentadas em ameaça ou risco de danos ambientais, têm efeito suspensivo automático.
4 — É assegurado aos cidadãos o direito à isenção de taxas e encargos judiciais nos processos em que pretendam obter reparação de perdas e danos emergentes de factos ilícitos que violem as regras constantes da presente lei e dos diplomas que a regulamentam.

Capítulo VIII Penalizações

Artigo 43.º Crimes contra o ambiente e contra-ordenações ambientais

1 — Para além dos crimes tipificados e punidos pelo Código Penal, são considerados crimes as infracções que a legislação complementar vier a qualificar como tal, de acordo com o disposto na presente lei.
2 — As restantes infracções à presente lei são contra-ordenações puníveis com coima, podendo, em função da sua gravidade e da culpa do infractor, ser cumuladas com sanções acessórias, nos termos definidos em legislação especial.
3 — Se a mesma conduta constituir simultaneamente crime e contra-ordenação, o infractor é punido a título de crime, sem prejuízo das sanções acessórias previstas para as contra-ordenações.

Artigo 44.º Reposição da situação anterior

1 — Sempre que possível, e sem prejuízo das restantes penalizações, o infractor é sempre obrigado a remover as causas da infracção e a repor a situação anterior à mesma ou situação muito aproximada, em prazo definido para o efeito.
2 — Se os infractores não cumprirem as obrigações acima referidas no prazo que lhes for estabelecido, as entidades competentes procedem às devidas demolições, obras, trabalhos ou outras intervenções necessárias à reposição da situação anterior à infracção, sendo da responsabilidade do infractor não cumpridor o pagamento dessas acções.
3 — Quando não for possível a reposição da situação anterior à infracção, por irreversibilidade dos danos causados, o infractor fica obrigado ao pagamento de uma indemnização especial, nos termos a definir em legislação especial, e à realização das obras necessárias à minimização máxima dos danos provocados.

Capítulo IX Disposições finais

Artigo 45.º Meios humanos, técnicos e financeiros

1 — A presente lei implica um conjunto de meios humanos, técnicos e financeiros determinantes para a sua aplicação, cabendo ao Governo garantir, designadamente através do Orçamento do Estado e da realização de

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concursos e admissão de pessoal, a quantidade suficiente de recursos que promovam eficazmente a capacidade de garantir o sucesso das determinações e objectivos constantes deste diploma.
2 — As autarquias locais promovem igualmente, nos termos das suas competências e atribuições, condições humanas, técnicas e financeiras para o cumprimento da presente lei.

Artigo 46.º Acordos internacionais

O Estado português empenha-se na realização e assinatura e no cumprimento de protocolos, acordos e convenções internacionais que pugnem pela defesa do meio ambiente, pela resolução de problemas ambientais globais e pela erradicação da pobreza.

Artigo 47.º Concentração dos instrumentos e da legislação

Para efeitos de concentração e facilitação de conhecimento e consulta de todos os instrumentos de política do ambiente e de ordenamento do território, bem como de toda a legislação ambiental actualizada, designadamente da decorrente da regulamentação da presente lei, e, ainda, de todos os acordos, protocolos e convenções internacionais relativos a matérias ambientais assinados por Portugal, o Ministério que tutela o ambiente e o ordenamento do território faculta a listagem e o conteúdo dos mesmos, designadamente através da internet.

Artigo 48.º Revogação

A presente lei revoga a Lei n.º 11/87, de 7 de Abril.

Artigo 49.º Entrada em vigor

1 — O presente diploma entra em vigor após a sua publicação.
2 — As disposições do presente diploma dependentes de regulamentação, que ainda não esteja produzida, entram em vigor após a publicação dos respectivos diplomas regulamentares.

Assembleia da República, 30 de Novembro de 2010 A Deputada de Os Verdes, Heloísa Apolónia.

——— PROJECTO DE LEI N.° 458/XI (2.ª) DEFINE O REGIME JURÍDICO DAS CONDIÇÕES DE INSTALAÇÃO, FUNCIONAMENTO E LICENCIAMENTO DOS ESTABELECIMENTOS DAS INSTITUIÇÕES PARTICULARES DE SOLIDARIEDADE SOCIAL E DE OUTRAS INSTITUIÇÕES SEM FINS LUCRATIVOS.

Exposição de motivos

Os estabelecimentos de apoio social têm um papel decisivo no apoio à população e merecem, portanto, um tratamento especial, uma discriminação positiva no que respeita à sua actividade.
Num contexto de emergência social, como o que se vive actualmente em Portugal, esta atenção por parte dos poderes públicos reveste-se de uma importância acrescida.
De facto, a actividade das instituições que actuam no sector da economia social é, sem dúvida, merecedora por parte do Estado do maior apoio, uma vez que nele confia para delegar funções que são suas e porque ele

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assegura também, numa complementaridade inquestionável, as responsabilidades face aos cidadãos em geral e aos mais carenciados em particular que o Estado não pode ou não consegue assegurar.
Numa altura em que estas instituições são, muitas vezes, o último reduto de apoio às populações fragilizadas e/ou carenciadas, e em que se verificam crescentes solicitações, importa facilitar ao máximo as regras a que são sujeitas sem, contudo, prejudicar os níveis de qualidade, segurança para os utentes e trabalhadores, higiene ou outros, impostos pelo estado da arte e do bom senso.
Ora, a actividade das instituições que intervém no sector da economia social materializa-se num conjunto de equipamentos sociais que servem as populações, nomeadamente os idosos.
Quatro diplomas regem o licenciamento e funcionamento de equipamentos sociais destinados a idosos: o Decreto-Lei n.º 133-A/97, de 30 de Maio, o Despacho Normativo n.º 12/98, de 25 de Fevereiro, o Despacho Normativo n.º 30/2006, de 8 de Maio e, ainda, o Decreto-Lei n.º 64/2007, de 14 de Março.
Acontece, porém, que, apesar do esforço de simplificação e modernização invocados no preâmbulo do último decreto-lei publicado, o certo é que a aplicação destes diplomas não se tem revelado a mais adequada.
Na verdade, verifica-se uma manifesta inadequação da legislação existente porque é confusa e porque nela se verificam exigências diferentes para realidades semelhantes, como é o caso, por exemplo, do número de quartos individuais que é exigido aos equipamentos destinados aos idosos.
Verifica-se que as exigências para o sector privado são, neste particular, muito inferiores às que são feitas para o sector da economia social.
Há na legislação existente uma discriminação negativa para as instituições que operam no sector da economia social.
Mais, hoje o facto de uma simples remodelação ou actualização de um equipamento, muitas vezes em funcionamento há longos anos, determinar um licenciamento à luz das novas regras e exigências tem determinado um cautelar imobilismo, que determina inexoravelmente a degradação dos equipamentos.
Fica, portanto, a rede de equipamentos da economia social muitas vezes perante uma impossibilidade prática, não legal, de ir melhorando as suas instalações e, com elas, o seu apoio às populações.
Estes constrangimentos têm de ser ultrapassados no sentido de tratar igualmente o que é igual e, também, de favorecer a gradual melhoria da rede de apoio social.
Impõe-se relembrar que, por exemplo, muitos equipamentos estão sediados em instalações classificadas.
Na impossibilidade de as converter e adaptar às novas exigências devem elas fechar? Deve permitir-se a sua degradação, nada fazendo para as melhorar, apenas para evitar um novo processo de licenciamento que impõe novas regras impossíveis de implementar dada a classificação do imóvel? É de elementar justiça aclarar as regras, e determiná-las com precisão, para facilitar a construção de obra nova ou a remodelação dos estabelecimentos de apoio social que facilitem, numa óptica de responsabilidade, a agilização dos processos, maior racionalidade nas exigências, e igualdade de tratamento para realidades semelhantes.
Assim, nos termos legais e regimentais aplicáveis, os Deputados do Partido Social Democrata abaixo assinados apresentam o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.º Objecto

A presente lei define o regime jurídico das condições de instalação, funcionamento e licenciamento dos estabelecimentos das instituições particulares de solidariedade social e de outras instituições sem fins lucrativos.

Artigo 2.º Regime aplicável

1 — Os estabelecimentos das instituições particulares de solidariedade social e de outras instituições sem fins lucrativos estão sujeitos às condições de funcionamento e obrigações estabelecidas:

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a) Para obra nova, ou remodelação superior a 75% da obra existente, aplicam-se as normas legais reguladoras das condições de instalação de lares previstas no Decreto-Lei n.º 64/2007, de 14 de Março; b) Para remodelações inferiores a 75% da obra existente é repristinado e aplicado o disposto no DecretoLei n.º 133-A/97, de 30 de Maio.

2 — A capacidade máxima dos estabelecimentos para idosos é de 120 camas.
3 — O número mínimo de quartos individuais é de 25% da capacidade instalada.

Artigo 3.º Entrada em vigor

A presente lei entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.

Assembleia da República, 30 de Novembro de 2010 Os Deputados do PSD: Miguel Macedo — Luís Montenegro — Adão Silva.

——— PROJECTO DE LEI N.º 459/XI (2.ª) DISPENSA DA PRESTAÇÃO DE CAUÇÃO PELAS INSTITUIÇÕES PARTICULARES DE SOLIDARIEDADE SOCIAL NO ÂMBITO DA PRESTAÇÃO DE CUIDADOS DE SAÚDE OU DE APOIO SOCIAL

Exposição de motivos

É hoje incontestável a importância do terceiro sector na prossecução das políticas públicas sociais, nomeadamente no que se refere à criação das redes de equipamentos e serviços indispensáveis a uma equitativa cobertura do território nacional.
Com efeito, o terceiro sector tem vindo a contribuir de forma determinante para a materialização das respostas sociais consagradas na legislação em vigor, quer no sector da saúde quer no da segurança e solidariedade social.
No âmbito deste terceiro sector destacam-se, para além das mutualidades, das IPSS e das fundações, também as misericórdias, as quais, desde há mais de cinco séculos, exercem, em Portugal, relevantíssima actividade de apoio social, muitas vezes desenvolvendo as suas actividades em substituição ou em complementaridade com o Estado, facto que lhes confere a condição de parceiros preferenciais na prossecução da missão solidária que a este primordialmente incumbe.
Com efeito, as santas casas dispõem de uma vasta e bem implantada rede de apoio social e têm, também, assumido crescente participação e responsabilidade na prestação de cuidados de saúde diferenciados aos utentes do SNS, bem como no desenvolvimento da Rede Nacional de Cuidados Continuados Integrados (RCCI), assumindo, além da prestação de cuidados, parte substancial dos encargos com a construção e manutenção desses equipamentos.
No domínio da saúde, a Lei n.º 48/90, de 24 de Agosto, estipula, como uma das directrizes da política de saúde, que «É apoiado o desenvolvimento do sector privado da saúde e, em particular, as iniciativas das instituições particulares de solidariedade social (…) » [cfr. Base II, n.º 1, alínea f)].
E a singularidade das actividades de saúde desenvolvidas pelo sector social, em geral, e pelas misericórdias, em particular, é ainda realçada pela referida Lei de Bases da Saúde, conforme resulta da confrontação entre a Base XXXVIII, que regula a participação das instituições particulares de solidariedade social no sistema de saúde, e a Base XXXIX, que regula as organizações de saúde com fins lucrativos.
Esta diferença de regimes decorre, naturalmente, do facto de as misericórdias serem instituições particulares de solidariedade social (IPSS) às quais a lei atribui a natureza jurídica de pessoas colectivas de utilidade pública, donde resulta não pertencerem ao sector privado, stricto sensu.

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Sucede que, por inexistência de uma derrogação expressa do regime geral da contratação pública, as IPSS, não obstante essa sua especial natureza, têm sido, na prática, obrigadas ao pagamento de caução nos acordos que celebram com as Administrações Regionais de Saúde (ARS), no sector da saúde, e com o Instituto de Segurança Social, IP (ISS), no do apoio social, circunstância que dificulta gravemente a realização da respectiva vocação de solidariedade.
Com efeito, o Código dos Contratos Públicos (CCP) prevê que, «quando a entidade adjudicante seja uma das referidas no n.º 1 do artigo 2.º [onde se incluem as ARS e o ISS], (…) ç ainda aplicável, com as necessárias adaptações, o disposto nos Capítulos VIII e IX do Título II da Parte II do presente Código», os quais se referem à habilitação e à caução.
Se, em relação à habilitação, é aceitável e conveniente a apresentação da documentação necessária à instrução do processo e formação do contrato, garantindo dessa forma a legitimidade da instituição e dos seus representantes, bem como a sua idoneidade, já o mesmo não se pode sustentar relativamente à caução, exigida por força do disposto no artigo 88.º do CCP.
Com efeito, um dos corolários do estatuto das IPSS é densificado no artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 119/83, de 25 de Fevereiro, segundo o qual «O contributo das instituições e o apoio que às mesmas é prestado pelo Estado concretizam-se em formas de cooperação a estabelecer mediante acordos».
E, como já se referiu, as IPSS actuam a nível nacional na área social, em substituição ou complementaridade do Estado — portanto de forma não meramente supletiva — , prestando os serviços sociais essenciais à população, que o Estado, pelas mais diversas razões, não tem capacidade de prestar.
Estas instituições, como é consabido, são desprovidas de fins lucrativos, servindo única e exclusivamente os interesses alheios.
O Estado, através dos aludidos acordos de cooperação, financia não as instituições, mas, sim, os utentes.
Tanto assim é que as comparticipações são pagas em função do número de utentes que as IPSS têm capacidade para acolher. E se o Estado não financia directamente os cidadãos com necessidades ou carências especiais, para depois estes reembolsarem na parte correspondente os custos pelos serviços prestados por aquelas instituições, tal só não sucede por manifesta inexequibilidade prática. Dito de outro modo, a transferência de verbas directamente para as IPSS apenas se verifica por razões de mera economia processual contabilística e em ordem a garantir que os fundos são efectivamente aplicados ao fim a que se destinam.
Ademais, e no que se refere à RCCI, o tipo de acordos em causa — de prestação de serviços — designadamente no caso das Unidades de Cuidados Continuados (UCC) — , nos moldes em que é celebrado, não é passível de ser incumprido, pelo que a aplicação das regras do CCP relativas à caução carece de sentido.
Com efeito, os acordos com as UCC incluem, obrigatoriamente, o internamento de utentes e a única forma de a IPSS não cumprir o acordo celebrado com o Estado seria não acolher os referidos utentes nos equipamentos apenas destinados a esse fim. Ora, se como já se referiu, as comparticipações são pagas de acordo com a ocupação do equipamento, em caso de incumprimento não haverá, pura e simplesmente, qualquer pagamento por parte do Estado.
As IPSS devem, pois, ser dispensadas do pagamento de caução nos acordos que celebram, no sector da saúde, com as Administrações Regionais de Saúde e, no do apoio social, com o Instituto de Segurança Social, IP.
Este entendimento parece ser acolhido pela ratio do n.º 1 do artigo 5.º do CCP, na medida em que esta disposição exclui a aplicação das normas da Parte II do referido Código — onde se inclui o regime da caução — aos contratos que «não estão nem sejam susceptíveis de estar submetidas à concorrência de mercado, designadamente em razão da sua natureza ou das suas características, bem como da posição relativa das partes no contrato».
Uma outra situação que justifica a intervenção do legislador refere-se ao período de vigência dos acordos celebrados entre as IPSS e o Estado, latu sensu, no âmbito do apoio social ou da prestação de cuidados de saúde, qualquer que seja a sua natureza.
Actualmente, verificam-se situações em que aos referidos acordos é imposto um prazo de vigência de cinco anos, o qual não pode nunca ser ultrapassado. Ora, esta situação, para além de errada, porquanto compromete a estabilidade das relações entre os sectores público e social, desse modo afectando a desejável

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complementaridade entre ambos, pode mesmo revelar-se perversa na medida em que, não raro, as IPSS têm de realizar avultados investimentos de forma a poder dar satisfação às expectativas dos beneficiários do SNS, cujo direito à saúde o Estado tem, constitucionalmente, o dever de efectivar.
Importa, pois, assegurar que os referidos acordos tenham um prazo de vigência determinado, mas que possa ser sucessivamente renovado, apenas podendo ser rescindido por incumprimento ou pela superveniente verificação da não prossecução dos objectivos que presidiram à sua celebração.
Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, os Deputados abaixo assinados apresentam o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.º Dispensa de caução

As instituições do sector social estão dispensadas da prestação da caução prevista no Capítulo IX do Título II da Parte II do Código dos Contratos Públicos, aprovado pelo Decreto n.º 18/2008, de 29 de Janeiro, relativamente aos contratos ou acordos celebrados com:

a) As administrações regionais de saúde, IP, e que visem:

i) A realização de projectos que se insiram no processo de instalação ou de requalificação dos serviços de saúde; ii) A prestação de cuidados de saúde;

b) O Instituto da Segurança Social, IP, para prestação de apoio social, nomeadamente no que respeita a lares de idosos, creches, jardins-de-infância e instalações vocacionadas para apoio às pessoas com deficiência.

Artigo 2.º Período de vigência

1 — Os contratos ou acordos celebrados entre as instituições do sector social e as entidades públicas referidas no artigo anterior têm a duração de cinco anos, considerando-se automática e sucessivamente renovados por iguais períodos de tempo, sem prejuízo do ajustamento anual dos valores dos serviços a prestar.
2 — Os contratos ou acordos podem ser rescindidos a todo o tempo com fundamento na falta de cumprimento, pelas instituições do sector social, das respectivas obrigações ou da verificação superveniente da não prossecução dos objectivos que presidiram à sua celebração.

Artigo 3.º Entrada em vigor

A presente lei entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.

Palácio de São Bento, 22 de Julho de 2010 Os Deputados do PSD: Miguel Macedo — Luís Montenegro — Adão Silva.

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PROPOSTA DE LEI N.º 44/XI (2.ª) CRIMINALIZA O INCITAMENTO PÚBLICO À PRÁTICA DE INFRACÇÕES TERRORISTAS, O RECRUTAMENTO PARA O TERRORISMO E O TREINO PARA O TERRORISMO, DANDO CUMPRIMENTO À DECISÃO-QUADRO N.º 2008/919/JAI, DO CONSELHO, DE 28 DE NOVEMBRO DE 2008, QUE ALTERA A DECISÃO-QUADRO N.º 2002/475/JAI, RELATIVA À LUTA CONTRA O TERRORISMO E PROCEDE À TERCEIRA ALTERAÇÃO DA LEI N.º 52/2003, DE 22 DE AGOSTO

Exposição de motivos

A presente proposta de lei altera a Lei de Combate ao Terrorismo, aprovada pela Lei n.º 52/2003, de 22 de Agosto, com vista a assegurar a criminalização do incitamento público à prática de infracções terroristas, do recrutamento para o terrorismo e do treino para o terrorismo, sempre que cometidos de forma dolosa, adaptando ao direito interno a Decisão-Quadro n.º 2008/919/JAI, do Conselho, de 28 de Novembro, que altera a Decisão-Quadro n.º 2002/475/JAI, do Conselho, de 13 de Junho de 2002, relativa à luta contra o terrorismo.
Pretende-se, concretamente, punir quem difunda mensagens destinadas a um grupo indeterminado de pessoas incitando à prática de actos terroristas, quem faça recrutamento de outras pessoas para a prática desses actos e quem treine para o fabrico de explosivos, armas de fogo ou outras substâncias nocivas ou perigosas para efeitos da prática de actos terroristas. As penas de prisão propostas para a prática destes actos variam entre os dois e os cinco anos.
A obtenção de um quadro normativo comum a todos os Estados-membros, em especial de uma definição harmonizada de infracção terrorista, determinou o surgimento da Decisão-Quadro n.º 2002/475/JAI, do Conselho, de 13 de Junho de 2002, relativa à luta contra o terrorismo, que constituiu a base da política antiterrorista da União Europeia.
Foi neste contexto e da necessidade de garantir uma adequação eficaz do ordenamento jurídico português à Decisão-Quadro n.º 2002/475/JAI que foi aprovada a Lei de Combate ao Terrorismo. Não obstante o Código Penal prever nessa altura os crimes de «Organizações terroristas» e de «Terrorismo», o legislador português optou, face aos aspectos inovadores do acto jurídico europeu e à natureza e gravidade intrínsecas das infracções ligadas às actividades terroristas, pela criação de uma lei autónoma do terrorismo e pela consequente revogação das normas correspondentes do Código Penal.
Face à evolução dos instrumentos internacionais ligados à matéria e à alteração do modo de actuação dos activistas e dos apoiantes do terrorismo, surgiu a necessidade de se proceder à alteração da legislação europeia neste âmbito, mediante a aprovação de uma nova decisão-quadro que previsse a incriminação do incitamento público à prática de infracções terroristas, do recrutamento para o terrorismo e do treino para o terrorismo, sempre que cometidos de forma dolosa. Foi este o objectivo que esteve na génese da DecisãoQuadro n.º 2008/919/JAI, do Conselho, de 28 de Novembro, cujo cumprimento implica, neste momento, uma alteração da Lei de Combate ao Terrorismo.
A observância dos novos preceitos comunitários no ordenamento jurídico português pode concretizar-se quer através da alteração da Lei de Combate ao Terrorismo quer através do aditamento de novos tipos penais.
Neste contexto, porque se mostra necessário manter a harmonia e a estabilidade do articulado do Código Penal, e de forma a evitar o regresso à inclusão das infracções ligadas às actividades terroristas no Código Penal, pretende-se seguir a anterior opção do legislador e propor a alteração da Lei n.º 52/2003, de 22 de Agosto.
Assim, nos termos da alínea d) do n.º 1 do artigo 197.º da Constituição, o Governo apresenta à Assembleia da República a seguinte proposta de lei:

Artigo 1.º Objecto

A presente lei altera a Lei n.º 52/2003, de 22 de Agosto, e visa dar cumprimento à Decisão-Quadro n.º 2008/919/JAI, do Conselho, de 28 de Novembro de 2008, que altera a Decisão-Quadro n.º 2002/475/JAI, do Conselho, de 13 de Junho de 2002, relativa à luta contra o terrorismo.

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Artigo 2.º Alteração à Lei n.º 52/2003, de 22 de Agosto

Os artigos 4.º e 5.º da Lei n.º 52/2003, de 22 de Agosto, alterada pelas Leis n.º 59/2007, de 4 de Setembro, e n.º 25/2008, de 5 de Junho, passam a ter a seguinte redacção:

«Artigo 4.º (… )

1 — (… ) 2 — (… ) 3 — Quem, por qualquer meio, difundir mensagem ao público incitando à prática dos factos previstos no n.º 1 do artigo 2.º, com a intenção nele referida, é punido com pena de prisão de dois a cinco anos.
4 — Quem, por qualquer meio, recrutar outrem para a prática dos factos previstos no n.º 1 do artigo 2.º, com a intenção nele referida, é punido com pena de prisão de dois a cinco anos.
5 — Quem, por qualquer meio, treinar ou instruir outrem sobre o fabrico ou a utilização de explosivos, armas de fogo ou outras armas e substâncias nocivas ou perigosas, ou sobre outros métodos e técnicas específicos para a prática dos factos previstos no n.º 1 do artigo 2.º, com a intenção nele referida, é punido com pena de prisão de dois a cinco anos.
6 — (anterior n.º 3)

Artigo 5.º (… )

1 — (… ) 2 — É correspondentemente aplicável o disposto nos n.os 2 a 6 do artigo anterior.»

Artigo 3.º Entrada em vigor

A presente lei entra em vigor 30 dias após a sua publicação.

Visto e aprovado em Conselho de Ministros de 11 de Novembro de 2010 O Primeiro-Ministro, José Sócrates Carvalho Pinto de Sousa — O Ministro da Presidência. Manuel Pedro Cunha Silva Pereira — O Ministro dos Assuntos Parlamentares, Jorge Lacão Costa.

——— PROJECTO DE RESOLUÇÃO N.º 313/XI (2.ª) RECOMENDA AO GOVERNO A PRESERVAÇÃO DA AUTONOMIA DOS TEATROS NACIONAIS E A SUA NÃO FUSÃO

Na apresentação do Orçamento do Estado para 2011 o Governo anunciou a intenção de integrar na OPAR, EPE, entidade pública empresarial que gere o Teatro Nacional de São Carlos e a Companhia Nacional de Bailado, os outros dois Teatros Nacionais existentes: o Teatro Nacional D. Maria II, em Lisboa, e o Teatro Nacional São João, no Porto.
Imediatamente se seguiram as mais diversas reacções de repúdio por esta decisão e que culminaram, no dia 24 de Novembro de 2010, com um «Abraço pelo Teatro» que juntou cerca de 2000 pessoas no Teatro Nacional São João, com a palavra de ordem «é nosso». O que adultos, crianças, artistas, técnicos, estudantes, público, unidos no cordão humano em torno do teatro não compreendem é o que ninguém pode compreender: como pode um teatro ser gerido por uma estrutura a mais de 300 km de distância? Como pode existir autonomia artística sem autonomia de gestão?

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A verdade é que a intenção anunciada no Orçamento do Estado para 2011 de fusão dos teatros nacionais não foi acompanhada de qualquer fundamentação por parte do Governo. Não se conhece no mundo qualquer exemplo de tal concentração e não foi feito qualquer estudo que a sustente. E sabemos todos que esta será uma decisão com peso orçamental irrelevante, mas com consequências políticas e culturais necessariamente desastrosas.
A criação da OPART, que o Bloco de Esquerda sempre contestou, levantou e levanta as maiores reservas no sector. Colocar sob a mesma administração o Teatro Nacional São Carlos e a Companhia Nacional de Bailado está longe de ser um modelo adequado para qualquer das estruturas, para os seus trabalhadores e para os públicos. Submeter os dois outros teatros nacionais, com perfis tão distintos, a essa estrutura é uma irresponsabilidade.
E não será demais lembrar que, aquando da criação da OPART, o grupo de trabalho que se reuniu para a sua constituição estudou o assunto ao longo de seis meses e decidiu que não teria sentido incluir nesta nova entidade o outro teatro nacional sediado em Lisboa, o Teatro Nacional D. Maria II. Como poderemos agora aceitar que em poucas semanas se decida não só que afinal o Teatro Nacional D. Maria II, como até o Teatro Nacional São João, devem integrar a OPART? Assim, e considerando que:

— Os teatros nacionais são garantes primeiros do direito à cultura e da democracia cultural e são centrais em qualquer projecto de país e de futuro; — Não existe qualquer estudo que fundamente a razoabilidade económica da fusão dos teatros nacionais; — A autonomia dos teatros nacionais é uma condição essencial para assegurar a pluralidade e complementaridade fundamentais ao cumprimento das suas missões; — Não existem exemplos de concentração de estruturas tão diversas nas suas competências e responsabilidades artísticas e territoriais; — As decisões irreflectidas e irresponsáveis não são inconsequentes;

A Assembleia da República não pode alhear-se dos destinos dos teatros nacionais.
O Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda, ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, propõe que a Assembleia da República recomende ao Governo que:

Preserve a autonomia dos teatros nacionais e que não proceda à sua fusão.

Assembleia da República, 25 de Novembro de 2010 As Deputadas e os Deputados do BE Catarina Martins — José Moura Soeiro — João Semedo — Cecília Honório — Pedro Soares — José Manuel Pureza — Mariana Aiveca — Helena Pinto — Rita Calvário — Pedro Filipe Soares — Francisco Louçã — Heitor Sousa — José Gusmão — Ana Drago — Jorge Duarte Costa — Luís Fazenda.

—— — PROJECTO DE RESOLUÇÃO N.º 314/XI (2.ª) RECOMENDA AO GOVERNO A CRIAÇÃO DE UM GRUPO DE TRABALHO PARA ESTUDAR A POSSIBILIDADE DE DETERMINAR O IMPEDIMENTO À MENÇÃO 100% BIODEGRADÁVEL NOS SACOS DE PLÁSTICO OXIBIODEGRADÁVEIS E, AINDA, A SUA DISTRIBUIÇÃO PELOS AGENTES ECONÓMICOS, COM BASE EM FUNDAMENTOS TÉCNICOS E CIENTÍFICOS

Exposição de motivos

Introduzidos nos Estados Unidos da América a partir do final dos anos 50, os sacos de plástico vulgarizaram-se um pouco por todo o mundo, não só pela enorme versatilidade de usos, leveza e impermeabilidade, mas, também, pelo preço, e foi por essa razão que o seu fornecimento no comércio a

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retalho se tornou, nos últimos anos, uma prática generalizada para os comerciantes e para os consumidores, à medida que se transformaram os hábitos de consumo dos cidadãos e se modernizou o sector da distribuição.
As estimativas actuais prevêem em mais de 500 mil milhões o número de sacos de plástico consumidos anualmente em todo o mundo, e só em Portugal consomem-se, anualmente, mais de duas mil toneladas destes sacos, distribuídos ou vendidos nos supermercados, e é neste sentido que se afigura necessário acautelar a minimização da produção de resíduos e assegurar a sua gestão sustentável.
Entre outros, foi com esse objectivo que se desenvolveu a tecnologia oxibiodegradável, destinada a permitir uma rápida degradação dos plásticos, mantendo as suas propriedades físicas e mecânicas. Esta tecnologia prevê que degradação se inicia pela presença de oxigénio no meio ambiente, sendo acelerada pelas radiações ultra-violeta ou pelo calor.
Sucede, no entanto, que estudos recentes, como o promovido pela Universidade de Loughborough, no Reino Unido, sobre plásticos considerados degradáveis ou biodegradáveis, concluíram que existem incertezas sobre o seu verdadeiro impacto no ambiente.
Com efeito, o estudo financiado levado a cabo pelo Governo britânico provou que os sacos de plástico oxibiodegradáveis — com distribuição generalizada no comércio a retalho, sedentário ou não sedentário e com a chancela de 100% biodegradáveis — podem levar mais de cinco anos a degradar-se.
As principais conclusões permitem aferir que os sacos oxibiodegradáveis, apesar de não serem tóxicos, não conterem materiais pesados, serem seguros para o contacto alimentar e não libertarem metano na sua decomposição, não trazem vantagens ambientais acrescidas, porquanto o tempo para a sua degradação é longo e os aludidos sacos não servem para compostagem nem tão pouco para reciclagem.
Acresce que o processo de biodegradação, iniciado apenas quando o saco está fragmentado em partículas de dimensões muito reduzidas, poderá acarretar impactos acrescidos, porquanto tais partículas podem ser ingeridas por animais, em quaisquer posições da cadeia alimentar.
Apesar de o estudo não ser conclusivo, vem apontar pistas para uma melhor compreensão sobre a tecnologia oxibiodegradável e sobre os impactos ambientais que a mesma acarreta, o que se afigura da maior relevância, no sentido que se estimam ser colocadas mensalmente nos mercados português e espanhol mais de mil toneladas deste produto, o que equivale a cerca de 50 milhões de sacos de plástico, muitos dos quais vão parar ao ecoponto.
A este propósito, veio recentemente a Associação de Recicladores de Plástico alertar para a circunstância de os sacos oxibiodegradáveis tornarem mais difícil a reciclagem, alterando as propriedades mecânicas do produto final.
Nestes termos, atentos os considerandos descritos e ao abrigo das disposições legais e regimentais aplicáveis, os Deputados abaixo assinados, do Grupo Parlamentar do Partido Socialista, propõem que a Assembleia da República, nos termos do disposto na alínea b) do artigo 156.º da Constituição da República Portuguesa, adopte a seguinte resolução:

Recomenda ao Governo a criação de um grupo de trabalho para estudar a possibilidade de determinar o impedimento à menção 100% biodegradável nos sacos de plástico oxibiodegradáveis e, ainda, à sua distribuição pelos agentes económicos, com base em fundamentos técnicos e científicos.

Assembleia da República, 26 de Novembro de 2010 Os Deputados do PS: Francisco Assis — Renato Sampaio — Marcos Sá — Jorge Seguro Sanches — Frederico Castro — Jorge Fão — João Sequeira — João Portugal — Rui Prudêncio — Eurídice Pereira — Jorge Manuel Gonçalves — Paula Barros — Filipe Neto Brandão — Miguel Freitas — Rui Pereira — Paulo Barradas — Glória Araújo — Vítor Fontes — Lúcio Ferreira — Pedro Farmhouse — Jamila Madeira — Manuel Seabra — Acácio Pinto.

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PROJECTO DE RESOLUÇÃO N.º 315/XI (2.ª) RECOMENDA AO GOVERNO A EXTINÇÃO DA CONCESSÃO À COMPANHIA DE BANHOS DE VIZELA DA EXPLORAÇÃO DAS TERMAS DE VIZELA E ADOPTE OS PROCEDIMENTOS NECESSÁRIOS À REABERTURA DA ACTIVIDADE

Consideradas, até há alguns anos atrás, o maior balneário do País, as Termas de Vizela são, porventura, o mais importante símbolo identitário deste jovem concelho do distrito de Braga.
As suas águas e potencialidades terapêuticas eram conhecidas dos romanos e terão mesmo estado na origem da criação do povoado inicial, como atestam os achados arqueológicos. A sua importância está comprovada na extensa bibliografia e em documentos oficiais, onde não faltam sequer referências a grandes vultos da literatura portuguesa, como Ramalho Ortigão ou Camilo Castelo Branco.
A Companhia de Banhos de Vizela, empresa concessionária das termas, foi fundada em 1873, mantém ainda hoje a concessão da exploração, a par do Hotel Sul-Americano e do magnífico Parque das Termas, onde o cenário bucólico e romântico só não é perfeito porque aos seus pés corre o poluído Rio Vizela, reflexo nefasto da história económica mais recente daquela cidade e da inércia das entidades responsáveis. O facto de o concelho ter abraçado a indústria têxtil não implicava necessariamente relegar para segundo plano as termas e negligenciar o estado do rio.
Agora que as grandes fábricas marcam a paisagem por via das suas ruínas, pois o têxtil já deixou de ser o motor da economia vizelense, e as termas ainda garantem algum dinamismo ao comércio e asseguram dezenas de postos de trabalho, o concelho experimentou, de novo, o sentimento de perda com o fecho do balneário e do Hotel Sul Americano.
Com uma estrutura accionista dividida e pouco empenhada na realização dos investimentos necessários à manutenção da atractividade das termas (é visível a necessidade de obras, quer no Hotel quer no Parque) — apesar de, ironicamente, 2009 ser um ano de aumento de aquistas — , e após um conturbado período de layoff e de rescisões selectivas de contratos de trabalho, as termas encerraram em Outubro de 2009.
Do ponto de vista formal, o que a concessionária solicitou à Direcção-Geral de Geologia e Energia foi uma suspensão da exploração das termas, pedido esse que seria repetido desta feita com vista à prorrogação da suspensão da exploração durante o corrente.
Este prazo, no entanto, não seria aceite, tendo a Direcção-Geral de Geologia e Energia autorizado a suspensão de exploração num prazo de apenas 90 dias, prazo esse que seria aproveitado para a concessionária realizar trabalhos de melhoramentos na estância termal com vista à sua reabertura.
A mesma DGGE anunciou igualmente que, após o cumprimento das obrigações impostas à Companhia de Banhos de Vizela, o Estado assinaria com aquela empresa um contrato de concessão, documento esse que substituirá o antigo alvará, datado de 1893. Desse contrato, entre outras cláusulas, deverá constar a obrigatoriedade da concessionária realizar obras mais amplas de requalificação do balneário.
Entretanto, ao longo do último ano, a questão das termas continua a ter grande destaque nos órgãos de comunicação social local, com a opinião pública a pressionar a autarquia para resolver o problema.
O Presidente da Câmara Municipal de Vizela, Dinis Costa, aparenta ter uma posição dúplice sobre esta matéria, pois ora admite solicitar ao Governo que a concessão passe para as mãos do município ora refere negociações com os accionistas da Companhia de Banhos e outros empresários supostamente interessados no negócio.
Certo é que, mesmo não se sabendo qual é a data em que a DGGE notifica a Companhia de que a suspensão da concessão é aceite por 90 dias, parece evidente que esse prazo já expirou, como, aliás, o confirma o próprio Presidente da Câmara, em declarações à imprensa publicadas no passado dia 27 de Outubro (Correio do Minho).
Este impasse está, no entanto, a inquietar a população. Há várias semanas que está a correr uma petição e, no passado dia 26 de Outubro, um grupo de cidadãos promoveu uma manifestação que juntou mais de 2000 pessoas.
Do lado dos accionistas da Companhia de Banhos de Vizela, Carlos Coutinho, que vai jogando uma espécie de esconde-esconde com a imprensa, ora fazendo declarações ora recusando pronunciar-se, parece, no entanto, desafiar a autoridade do Estado, ao ter afirmado recentemente que «as termas vão reabrir, se não for daqui a seis meses, será daqui a um ou dois anos» (Jornal de Notícias de 27 de Outubro).

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Ora, segundo a alínea d) do n.º 2 do artigo 35.º da Lei n.º 86/90, de 16 de Março (Regulamento das Águas Minerais), «para efeitos de rescisão do contrato de concessão por parte do Estado, considera-se que se verifica o não cumprimento das obrigações do concessionário, nomeadamente quando (…) coloque a exploração na situação de suspensão ilícita».
O n.º 1 do artigo 32.º da mesma lei explicita este conceito: «Quando verifique a suspensão não autorizada da exploração, a Direcção-Geral notificará o concessionário respectivo para, no prazo que lhe for, fundamentalmente fixado, pôr termo à aludida situação».
E o n.º 2 do mesmo artigo 32.º refere «se findo o prazo fixado previsto no número anterior, se mantiver a situação aí mencionada a suspensão de exploração é considerada ilícita».
Se considerarmos que os 90 dias de prorrogação da suspensão da exploração solicitados pela empresa à DGGE já expiraram, estamos, no mínimo, perante uma situação de «suspensão não autorizada da exploração».
Se consideramos que o parecer da DGGE e o prazo fixado à empresa decorre já de uma situação prevista no n.º 1 do artigo 32.º, temos então que a concessionário, ao manter uma situação de «suspensão não autorizada», está, efectivamente, a incorrer numa «suspensão ilícita», um dos motivos previstos na referida lei para a «rescisão do contrato de concessão por parte do Estado».
Perante a leitura da lei, não deixa de ser surpreendente o conteúdo das declarações do accionista maioritário da empresa concessionária das termas que, ao colocar a hipótese destas voltarem a abrir apenas daqui a dois anos, indicia gozar de um estranho estatuto de impunidade porque vai reflectindo a confiança de que a concessão se manterá nas mesmas mãos, mesmo não cumprindo a lei.
Assim, ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, o Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda propõe que a Assembleia da República recomende ao Governo que:

1 — Rescinda, com justa causa, o contrato de concessão da exploração das Termas de Vizela à Companhia de Banhos de Vizela; 2 — Procure encontrar com a Câmara Municipal de Vizela uma solução de carácter municipal para a concessão; 3 — Caso não seja possível uma solução municipal, proceda à abertura de concurso público internacional equacionando a possibilidade da atribuição de mais do que uma concessão de exploração; 4 — Sejam garantidos os direitos dos pequenos accionistas; 5 — Fique assegurada a reintegração dos trabalhadores das termas actualmente com contratos suspensos.

Assembleia da República, 25 de Novembro de 2010 As Deputadas e os Deputados do BE: Pedro Soares — Rita Calvário — Catarina Martins — José Manuel Pureza — Mariana Aiveca — Helena Pinto — José Moura Soeiro — Pedro Filipe Soares — Cecília Honório — João Semedo — Francisco Louçã — Heitor Sousa — José Gusmão — Ana Drago — Jorge Duarte Costa — Luís Fazenda.

——— PROJECTO DE RESOLUÇÃO N.º 316/XI (2.ª) RECOMENDA A SUSPENSÃO DO ACTUAL PROCESSO DE AVALIAÇÃO DE DESEMPENHO DOCENTE

A continuidade, por parte do actual Governo, da linha ofensiva dirigida contra a escola pública e, nomeadamente, contra os direitos dos trabalhadores da educação, docentes e não docentes, tem vindo a colocar as comunidades escolares numa situação de permanente instabilidade. A vida quotidiana das escolas está indelevelmente marcada por uma política que identificou na escola pública, particularmente nos professores, um obstáculo à prossecução de um projecto que, nos seus traços essenciais, é contrário à Constituição da República Portuguesa e que se traduz na fragilização das capacidades e potencialidades da escola pública, na introdução de clivagens sociais cada vez mais acentuadas em meio escolar e na conversão

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da escola num espaço de reprodução das assimetrias, subvertendo as suas características republicanas e democráticas.
No que toca à política de recursos humanos do Ministério da Educação, o Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português tem vindo a combater e a denunciar empenhadamente as suas causas e consequências. Orientada por uma visão economicista do sistema educativo e da política nacional e pela perspectiva empresarial da escola, a intervenção do Governo e do Ministério da Educação junto da carreira docente gerou um processo complexo que tem vindo a significar o agravamento da qualidade do ensino, a degradação acentuada da profissão docente e os consequentes custos emocionais, pessoais e profissionais junto das pessoas que a desempenham. O Estatuto da Carreira Docente, mesmo após as inúmeras alterações que lhe foram introduzidas por força da luta dos professores portugueses, continua a ser um factor de instabilidade nas escolas e um entrave à realização das potencialidades dos docentes na prestação do serviço que lhes deveria caber, ou seja, ensinar. Depois de uma negociação a que o Governo foi obrigado por força da manifestação de determinação dos professores e do seu movimento sindical, continua a verificar-se a existência de um conjunto de constrangimentos no Estatuto da Carreira Docente que não são coadunáveis com a missão docente. No entanto, decorre em sede de Comissão Parlamentar de Educação e Ciência um processo de apreciação parlamentar desse Estatuto, resultante da intervenção do PCP. Além desse processo e da possibilidade que existe para a introdução de alterações no diploma, importa não ignorar os impactos que ainda produz nas escolas o processo de avaliação de desempenho docente. Na verdade, as escolas estão confrontadas com dúvidas sobre a aplicabilidade e a legalidade de um conjunto de procedimentos que resultam da aplicação do actual regime e os professores encontram-se assoberbados com a já conhecida carga horária que sobre eles recai, resultante principalmente também da injusta definição dos critérios que determinam a componente lectiva e não lectiva dos seus horários.
Perante um conjunto de dúvidas colocadas pelas estruturas sindicais de professores, nomeadamente as estruturas da FENPROF, o Governo responde, através da Direcção-Geral de Recursos Humanos da Educação, com circulares que indicam procedimentos manifestamente à margem da legislação em vigor e criando mecanismos que, além de provocarem injustiças entre professores, vêm significar uma ainda maior carga horária de trabalho para os professores, sem remuneração.
O acordo assinado pelo Governo e sindicatos de professores foi, entretanto, grosseiramente violado pelo Governo através da apresentação do Orçamento do Estado para 2011, nomeadamente no que diz respeito à progressão na carreira, impedindo-a para já e alterando o posicionamento dos escalões em termos de índices salariais. Isso significa em boa medida que a avaliação de desempenho docente, que tantos custos profissionais, pessoais, pedagógicos e escolares têm vindo a implicar, não terá qualquer tipo de repercussão, pelo menos no curto prazo, para efeitos de carreira. Ou seja, os procedimentos injustificadamente burocráticos, geradores de uma instabilidade e confusão enormes que desafiam a criatividade de todos os órgãos de direcção das escolas, revelam-se como um mecanismo inútil, cujo único efeito é a introdução de factores de entropia nas escolas.
Tal como o PCP sempre defendeu, uma vez mais se justifica a suspensão da vigência deste modelo de avaliação sem componente formativa para que seja possível construir, de facto, um modelo de avaliação de desempenho integrado num mais vasto processo de avaliação dos contextos escolares e com uma forte componente formativa. A suspensão do modelo vigente é, uma vez mais, a forma mais justa e adequada para a criação de um espaço de real maturação e discussão em torno da revisão de um novo modelo. Aliás, a revisão do modelo e a eventual negociação de um novo modelo de avaliação foram um dos pontos de partida para o acordo que vigorava entre professores e Governo antes do incumprimento assumido por parte do segundo.
Assim, e tendo em consideração o acima exposto, nos termos regimentais e constitucionais aplicáveis, os Deputados abaixo assinados, do Grupo Parlamentar do PCP, propõem que a Assembleia da República adopte a seguinte resolução:

A Assembleia da República recomenda ao Governo, nos termos do n.º 5 do artigo 166.º da Constituição da República:

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88 | II Série A - Número: 043 | 2 de Dezembro de 2010

1 — Que proceda à suspensão imediata do actual processo de avaliação de desempenho docente, dada a manifesta impossibilidade de ser aplicado, mantendo-se até ao final do presente ano lectivo a apreciação intercalar; 2 — Que antecipe a discussão e negociação de um modelo de avaliação de desempenho no qual a componente determinante seja a formativa.

Assembleia da República, 29 de Novembro de 2010 Os Deputados do PCP: Bernardino Soares — António Filipe — Paula Santos — João Ramos — Honório Novo — Jerónimo de Sousa — Francisco Lopes — Rita Rato — João Oliveira — Miguel Tiago — Jorge Machado.

A Divisão de Redacção e Apoio Audiovisual.

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