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6 | II Série A - Número: 027 | 10 de Setembro de 2011

(») Portanto, não entrarei nesse ponto, mas devo dizer que o estudei profundamente. Conheço bem, designadamente, a legislação de Hong Kong e não sou um entusiasta dela.»

2 – Provedor de Justiça, Dr. Alfredo José de Sousa (Acta n.º 5, de 26 de Janeiro de 2010): «Quanto a esta área, sem querer antecipar‐ me, já sei que porventura me irão questionar — também está na ordem do dia — sobre aquilo que penso, enquanto cidadão e enquanto participante que fui em funções públicas que alguma coisa têm a ver com o fenómeno da corrupção, relativamente ao enriquecimento ilícito, que está muito na discussão pública.
Curiosamente, antes de vir para cá, estava a arrumar um Boletim da Ordem dos Advogados e vi exactamente um artigo recente do Bastonário da Ordem dos Advogados sobre esta matéria — o boletim era talvez do último trimestre, e também me dei conta da apresentação de um projecto de lei, que me foi mandado pelo Grupo Parlamentar do PCP, sobre o enriquecimento ilícito.
(») Em princípio, discordo de mais um tipo legal de crime que, em vez de facilitar, pode complicar dada a rede de tipos legais que o nosso ordenamento jurídico já prevê, nomeadamente as chamadas infracções conexas – aliás, gostaria mais da terminologia da Convenção de ONU Contra a Corrupção, a Convenção de Mérida, que fala em infracções subjacentes.
Efectivamente, a própria Convenção de Mérida prevê, e recomenda, que os Estados partes possam, de alguma maneira, tipificar este tipo legal de crime – o enriquecimento ilícito –, sem prejuízo da sua Constituição, dos princípios fundamentais do seu sistema jurídico.
Nesta matéria, acharia bastante mais eficaz, perante as situações de facto indiciadoras de enriquecimento ilícito, isto é o aumento significativo do património de um agente público para o qual ele não consegue apresentar uma justificação razoável face ao seu rendimento legítimo — esta décalage entre o rendimento legítimo e o rendimento que o agente público (e aqui há outro problema) aparenta ou o rendimento que pode ser comprovado —, atacar o mesmo problema de duas maneiras.
Em primeiro lugar, caso fosse encontrada esta décalage entre o rendimento legítimo e o rendimento ilegítimo, ou alegadamente ilícito, fá-lo‐ ia através do sistema fiscal, através de um agravamento fiscal. Julgo que há já legislação nesse sentido. Mas faria ainda outra coisa, porque normalmente o enriquecimento ilícito tem aquilo a que a Convenção chama as infracções subjacentes.
Ora, o enriquecimento ilícito, na medida em que nem sequer foi declarado ao sistema fiscal, seria uma circunstância agravante da pena. Quer dizer, se isso se verificasse para o regime da corrupção, mas não só, nomeadamente para o tráfico ilícito de pessoas e de droga, e não apenas dos agentes públicos, porque também me parece que estes outros crimes podem ser praticados por particulares.
Curiosamente, a própria Convenção de Mérida, à frente deste normativo que prevê ou aconselha a tipificação do enriquecimento ilícito, também prevê o branqueamento do produto do crime, o chamado branqueamento de capitais» Aliás, há aqui uma norma que acho interessantíssima e que poderia ser adaptada em legislação que, de alguma maneira, quisesse abordar o enriquecimento ilícito não na perspectiva de mais um tipo legal de crime mas na perspectiva de sancionar através do agravamento fiscal ou através de circunstâncias atenuantes do agravamento da pena dos crimes subjacentes.
Dizia eu que a Convenção de Mérida, efectivamente, tem para o branqueamento do produto do crime, o branqueamento de capitais, uma norma — julgo que é artigo 23.º, n.º 2, alínea e) — que ao fim ao cabo se traduz nisto: se, porventura, as infracções subjacentes forem descobertas, poderá estabelecer‐ se que o próprio branqueamento de capitais enquanto crime não será aplicado às pessoas que foram autoras de infracções penais subjacentes, como sejam todos tráficos, nomeadamente o de drogas.
Portanto, se o exigirem os princípios fundamentais do direito interno de um Estado parte, poderá estabelecer‐ se que as infracções enunciadas no n.º 1 do artigo — são justamente as que estão na base do branqueamento de capitais — não serão aplicáveis às pessoas que tenham cometido a infracção subjacente.
Ora, julgo que um princípio deste género também seria transponível para uma eventual, que não me parece desejável, tipificação do próprio enriquecimento ilícito como crime. Isto é, se porventura se for para essa solução, que me parece desaconselhável, extrema de tipificar o enriquecimento ilícito como mais um crime, dever‐ se‐ á adoptar o mesmo princípio de que, no caso de haver crimes ou infracções penais subjacentes puníveis do mesmo autor, obviamente já não haveria necessidade de lançar mão deste novo tipo legal do enriquecimento ilícito, tal como acontece no branqueamento de capitais.»