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5 DE JUNHO DE 2013

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Reportando-nos ao regime da delegação de poderes em apreciação, a exigência de densidade normativa

impõe que a lei habilitante não se apresente com um conteúdo de tal forma geral e indeterminado que redunde

no exercício livre, por parte da administração, do poder de delegação. Ao deixar “em branco” a definição do

núcleo e dos pressupostos do poder administrativo visado, o legislador não cumpre a exigência constitucional

de elaboração de normas habilitantes da atuação administrativa num sentido material, porque permite que a

administração delegue discricionariamente a sua própria competência, de forma não vinculada a uma lei prévia

suficientemente precisa.

Ora, a Lei Fundamental não permite conceder à administração uma tal autonomia de determinação

primária, em matéria que está confiada ao legislador.

A aprovação de normas habilitantes meramente formais, por falta de densidade, deixa a atuação da

administração a descoberto da definição de critérios legais orientadores, inviabilizando o seu controlo e

permitindo alterar a distribuição de competências legalmente previstas através de meros atos da função

administrativa, em desrespeito do parâmetro constitucional contido no artigo 111.º, n.º 2 da CRP.

47. É certo que o grau concreto de densidade constitucionalmente exigida da lei habilitante pode variar em

função dos interesses em presença e da forma como a CRP regula a matéria, ou seja, na medida reservada

para o legislador.

Assim, nada impede a existência de espaços ou margens de livre decisão administrativa ou de autonomia

contratual à administração, nos termos da lei. Existe, portanto, toda a flexibilidade para, dentro do quadro

legal, proceder a uma distribuição eficiente de tarefas entre o poder legislativo e o administrativo e entre os

diversos titulares do poder administrativo.

Este aspeto é especialmente importante na área das relações entre Estado e autarquias locais. Neste caso,

não existe uma separação constitucionalmente estabelecida, estanque e inflexível de atribuições do Estado e

das autarquias, fundada numa distinção material rígida entre assuntos locais – que competiriam inteiramente e

em exclusivo às autarquias – e assuntos nacionais. Significa isto que «a separação nítida entre a zona dos

interesses nacionais e a zona dos interesses locais, como se de dois compartimentos estanques se tratasse,

já só subsiste em alguns casos. É errado dizer que desapareceu por completo; mas deixou de corresponder à

grande maioria dos casos» (Freitas do Amaral, Curso de Direito Administrativo, I, 2006, p. 491). Assim, a atual

“miscigenação” de interesses implica «uma indispensável divisão de trabalho entre o Estado e as coletividades

locais» (J. C. Vieira de Andrade, “Distribuição pelos municípios da energia elétrica de baixa tensão”, CJ, ano

XIV/I, 1989, pp. 15 e seguintes, em especial, p. 19).

A jurisprudência do Tribunal Constitucional tem considerado que existem domínios que não podem

pertencer em exclusivo aos municípios, já que incidem sobre matérias que têm de ser vistas e prosseguidas

em conexão com o todo nacional, pelo que devem estar abertas à intervenção concorrente das autarquias e

do Estado (Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 674/95; cfr. ainda Acórdãos deste Tribunal n.os

432/93,

674/95, 379/96, 548/97, 329/99, 517/99 e 560/99).

A autonomia local é, assim, em larga medida, uma autonomia sub legem – o que tem importantes

consequências no que respeita à definição e à densificação das atribuições e das competências

administrativas das autarquias locais. O âmbito da autonomia administrativa varia em função das opções do

legislador democrático, permitindo o acolhimento de diversas formas de articulação entre Estado e autarquias.

48. O reconhecimento de uma margem de liberdade de conformação do legislador na definição do estatuto

e regime autárquico não significa, contudo, que seja possível prescindir-se de vinculações jurídico-

constitucionais e da ponderação equilibrada dos interesses – locais, regionais e nacionais – em presença,

respeitando as exigências que se extraem do princípio da proporcionalidade. Menos ainda, numa matéria

abrangida por reserva de lei, na medida em que está compreendida no estatuto das autarquias locais (artigo

165.º, n.º 1, alínea q), da CRP).

De facto, por força da Constituição, a autonomia administrativa, onde se inclui a autonomia contratual e o

poder de delegação de poderes, tem sempre que resultar de lei. E a norma habilitante deve ter algum

conteúdo – mesmo que mínimo. Se a Lei Fundamental estabeleceu a necessidade de regulação por ato

legislativo, não pode o legislador, através da publicação de uma norma habilitante “em branco”, remeter o

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