Página 1
Sexta-feira, 12 de setembro de 2014 II Série-A — Número 168
XII LEGISLATURA 3.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2013-2014)
S U M Á R I O
Projetos de lei [n.os
646 e 647/XII (3.ª)]:
N.º 646/XII (3.ª) — Regime jurídico da partilha de dados informáticos (PCP).
N.º 647/XII (3.ª) — Altera o Código Penal, criminalizando a perseguição e o casamento forçado (PSD/CDS-PP).
Projetos de resolução [n.os
1102 a 1108/XII (3.ª)]:
N.º 1102/XII (3.ª) — Assegura que nenhum professor é penalizado ou prejudicado em concurso de colocação em virtude da prova de avaliação de conhecimentos e capacidades e garante a atribuição de componente letiva a todos os docentes dos quadros, contribuindo para uma escola pública de qualidade (PCP)
N.º 1103/XII (3.ª) — Recomenda ao Governo a adoção de medidas de informação e esclarecimento da população em geral quanto ao surto de doença provocado pelo vírus Ébola (PCP).
N.º 1104/XII (3.ª) — Em defesa dos cuidados de saúde primários na região algarvia (PCP).
N.º 1105/XII (3.ª) — Recomenda ao Governo a suspensão do processo de agregação/fusão dos cursos nas áreas das tecnologias da saúde (PCP).
N.º 1106/XII (3.ª) — Pelo cumprimento da Lei de Bases do Sistema Educativo e pela garantia de uma escola pública, gratuita, de qualidade e democrática para todos (PCP).
N.º 1107/XII (3.ª) — Reformula o sistema de incentivos que existem aos OCS locais e regionais, garantindo uma distribuição mais equitativa e mais adequada à nova realidade tecnológica e económica da comunicação social, nomeadamente através da criação de novos canais de apoio à profissionalização e qualificação dos órgãos deste setor (PSD/CDS-PP).
N.º 1108/XII (3.ª) — Garantir o direito aos cuidados de saúde hospitalares na península de Setúbal e salvaguarda o Serviço Nacional de Saúde (Os Verdes).
Página 2
II SÉRIE-A — NÚMERO 168
2
PROJETO DE LEI N.º 646/XII (3.ª)
REGIME JURÍDICO DA PARTILHA DE DADOS INFORMÁTICOS
A caraterização de um conjunto de práticas de partilha de dados ou de obras culturais e artísticas como
“pirataria”, “pirataria informática” e a sua tipificação como crime à luz da lei portuguesa tem vindo a evidenciar
diversas insuficiências e contradições. Na verdade, a fiscalização de atos de partilha de dados digitalmente, é
de extrema complexidade e levanta inúmeras preocupações sobre o direito à privacidade, não podendo ser
desconsiderada a pressão que se vai sentindo para um poder e legislação “hipervigilantes” a pretexto do
combate à “pirataria”.
Por outro lado, a circulação de obras e criações, a difusão do conhecimento, das artes e da cultura, é em si
mesma um elemento potenciador da criatividade, da elevação da consciência humana, individual e coletiva. O
acesso à Cultura, às Artes, além de previstos na Constituição da República Portuguesa como direitos dos
cidadãos, são instrumentos poderosos para o desenvolvimento, para a dinamização cultural e também social e
económica. O livre acesso e fruição culturais são, por isso mesmo, comandos constitucionais cuja garantia é
atribuída pelo texto constitucional diretamente ao Estado, nomeadamente através do artigo 78.º.
Tendo em conta que a partilha de dados informáticos ou de obras culturais, sem fins comerciais, constitui
uma forte expressão da difusão cultural e que a circulação de obras artísticas e culturais constitui, em si
mesma, uma mais-valia social e económica para toda a sociedade – da que não se excluem artistas, autores e
produtores – entende o Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português que incumbe ao Estado a
regulação do regime de partilha de dados informáticos, salvaguardando o objetivo superior da livre circulação
de conteúdos culturais e simultaneamente os interesses materiais e morais dos criadores e produtores.
A criminalização da partilha de dados e de obras, particularmente por via telemática, além de se
demonstrar cada vez mais ineficaz, é contraditória com os objetivos centrais da política cultural. Posto isto, a
política cultural não deve assentar na proteção dos direitos de propriedade, sacrificando a fruição, mas sim na
orientação de crescente massificação do acesso e fruição culturais, salvaguardando os direitos de propriedade
intelectual. O regime jurídico de partilha de dados e obras que o PCP propõe através do presente Projeto de
Lei reestrutura toda a forma como o Estado e a regulamentação intervêm na defesa do direito de propriedade
intelectual.
Na verdade, o PCP não propõe nenhuma supressão dos direitos de autor ou direitos conexos, antes abre a
possibilidade de serem os autores a decidir se querem ou não proteger a sua obra de partilha não comercial,
assim abandonando a conceção legal atual que cristaliza em torno da proteção do direito de autor e que a
essa intenção sacrifica os principais objetivos políticos que o Estado deve promover: a livre criação, fruição e
acesso.
O presente projeto de lei estabelece a total legalidade das partilhas de dados informáticos, mesmo que
comportem conteúdos protegidos por direitos de autor, na medida em que o Projeto de Lei reconhece a
vantagem social da partilha não a contrapondo a uma suposta desvantagem por parte do autor. Na verdade, o
autor/artista/produtor é beneficiado pela massificação do acesso ao seu trabalho, material e moralmente, na
medida em que esse é o principal desejo da maior parte dos autores. Todavia, o facto de não se considerar
antagónica a partilha livre com os direitos dos autores/artistas/produtores, não significa que o PCP não
considere a necessidade de remuneração de autores, artistas, criadores, produtores e outros titulares de
direito de autor e direitos conexos, no contexto em que a perceção de valores como resultado dos direitos de
autor continua a ser a forma como os grupos económicos do setor se negam a assumir a justa retribuição do
trabalho dos artistas e autores.
Nessa medida, o PCP propõe a compensação dos titulares de direitos de autor e direitos conexos que não
proíbam a partilha de dados informáticos contendo obras ou partes de obras protegidas, compensação esta
que será efetuada a partir do Fundo para a Partilha de Dados Informáticos constituído com as verbas
resultantes da cobrança aos fornecedores de serviços de acesso à internet de uma contribuição mensal
correspondente a € 0,75 por contrato de fornecimento de serviços de acesso à internet.
A confusão entre partilha de dados – gratuita e sem fins comerciais – e “pirataria” tem beneficiado a linha
política da censura, da hipervigilância, da punição, mesmo quando estas se demonstram prejudiciais à livre
Página 3
12 DE SETEMBRO DE 2014
3
circulação de obras, representam elevados custos e se provam socialmente ineficazes. O projeto de lei do
PCP vem propor que, finalmente, se separem os conceitos de “partilha” desinteressada de dados e os
conceitos de “contrafação”, “pirataria”, na medida em que os últimos ficam associados exclusivamente a
reproduções e cópias ou partilhas não autorizadas de dados e conteúdos protegidos por direito de autor
quando efetuadas com fins comerciais. Ora, no que toca à partilha de dados informáticos, como hoje se
conhece, não existe benefício para quem disponibiliza o ficheiro a não ser o de poder ser retribuído, obtendo
outro ficheiro que antes não possuía. Se na “pirataria” existe uma extração e apropriação ilegítima de uma
mais-valia material sobre uma obra de que o “pirata” não é detentor, o mesmo não se poderá dizer na mera
partilha não comercial.
Todavia, há um benefício cultural para quem partilha e um benefício material de facto para os fornecedores
de serviços de acesso à internet (FSI),ou seja, existe de facto a apropriação ilegítima de uma mais-valia sobre
os conteúdos que circulam por via telemática, mas não por parte do utilizador. Este, para todos os efeitos,
paga um serviço. Na verdade, o problema não reside em estarem disponíveis conteúdos gratuitamente,
porque não estão: o utilizador paga o acesso a um conjunto de conteúdos mas essa verba fica inteiramente
retida nos FSI, que se apropriam assim de uma mais-valia substantiva de obras sobre as quais não possuem
direitos. É claro que não são os FSI os responsáveis pela colocação de conteúdos protegidos de autor em
linha, mas são objetivamente os principais beneficiados financeira e economicamente.
Assim, tendo em conta os diversos aspetos e eventuais antagonismos de interesses, o presente Projeto de
Lei visa precisamente ultrapassá-los, assumindo como principal objetivo a difusão e fruição culturais livres,
sem esquecer a necessidade de salvaguardar os titulares de direitos de autor.
É importante referir que o sistema ora proposto é voluntário, pois nenhum autor/artista/produtor é obrigado
a aceitar a livre partilha das suas obras, sendo que apenas é remunerado aquele titular de direitos que aceite
essa partilha.
Apesar de Portugal ser um dos países europeus onde o acesso à banda larga é mais caro, existiam no
País, no segundo trimestre de 2014, 2,7 milhões de utilizadores de internet através de tecnologias fixas e 3,9
milhões através de tecnologias móveis. Assim sendo, o valor da receita angariada através do regime proposto
pelo PCP poderá atingir um valor aproximado de 59,4 milhões de euros anuais, sendo 17,82 milhões de euros
afetos diretamente ao apoio às artes e à produção cinematográfica, restando 40 milhões de euros para
distribuir pelos autores, intérpretes e produtores.
O debate que se tem desenvolvido na Assembleia da República e na sociedade em geral, nomeadamente
sobre o presente projeto que se encontrou durante vários meses em debate na Comissão de Educação,
Ciência e Cultura, bem como o debate sobre a cópia privada não são necessariamente sobrepostos. No
entanto, a total liberdade de partilha de conteúdos elimina a necessidade de taxar o suporte físico em que o
conteúdo reside ou venha a residir, na medida em que a taxa passa a incidir sobre o fluxo de dados e não
sobre o seu alojamento. Além disso, a forma agora proposta pelo PCP tem uma utilidade mais perene que as
taxas relacionadas com a cópia privada, pois incide sobre um serviço e um bem muito menos sensível à
alteração tecnológica e às evoluções. Assim, enquanto um suporte magnético ou digital rapidamente se torna
desatualizado, a ligação à internet ou a meios telemáticos será uma realidade, independentemente da
tecnologia. O PCP propõe que a partilha seja geradora de receita, paga por quem retira lucro pela sua
existência, ao invés de penalizada, mas aplicando uma taxa sobre o ato e não sobre a tecnologia.
A presente proposta do PCP afirma-se como profundamente inovadora na abordagem às questões da
partilha informática de conteúdos culturais e artísticos e é apresentada por este Grupo Parlamentar como um
contributo — que entende o PCP, valioso – para ultrapassar um conjunto de insuficiências do atual regime
legal de penalização e criminalização de atos que em nada justificam esse enquadramento legal, bem como
assegurar uma justa distribuição dos benefícios gerados pela partilha de obras culturais e artísticas, sem
esquecer o objetivo primordial consagrado na Constituição e com o qual o PCP se identifica plenamente:
“Todos têm direito à fruição e criação cultural” e para tal, “incumbe ao Estado incentivar e assegurar o acesso
de todos os cidadãos aos meios e instrumentos de ação cultural, bem como corrigir as assimetrias existentes
no país em tal domínio.
Nestes termos, ao abrigo da alínea g) do n.º 2 do artigo 180.º da Constituição e da alínea f) do artigo 8.º do
Regimento da Assembleia da República, o Grupo Parlamentar do PCP apresenta o seguinte projeto de lei:
Página 4
II SÉRIE-A — NÚMERO 168
4
Artigo 1.º
Objeto
A presente lei estabelece o regime jurídico da partilha de dados informáticos que contenham obras
protegidas pelo Código do Direito de Autor e Direitos Conexos.
Artigo 2.º
Âmbito
1 – A presente lei aplica-se a todas as transações gratuitas e sem fins comerciais, diretos ou indiretos,
realizadas por via telemática, de dados informáticos que contenham obras ou parte de obras protegidas pelo
Código do Direito de Autor e Direitos Conexos que tenham sido previamente publicadas, editadas
comercialmente ou colocadas à disposição do público com o consentimento dos respetivos titulares e cuja
partilha não tenha sido por estes expressamente proibida.
2 – Excluem-se do âmbito da presente lei os programas informáticos e as publicações periódicas.
Artigo 3.º
Definições
1 – Para os efeitos previstos na presente lei, entende-se por:
a) Disponibilização de dados informáticos: a disponibilização por meios telemáticos de dados informáticos
que contenham obras ou parte de obras protegidas pelo Código do Direito de Autor e Direitos Conexos;
b) Aquisição de dados informáticos: a aquisição, por via telemática, de dados informáticos que contenham
obras ou parte de obras protegidas pelo Código do Direito de Autor e Direitos Conexos;
c) Partilha de dados informáticos: a disponibilização e aquisição de dados informáticos, definidas nos
termos das alíneas anteriores;
d) Plataforma de partilha: o meio telemático que permite a realização da partilha de dados informáticos.
2 – Para os efeitos previstos na presente lei, aplicam-se subsidiariamente os conceitos e definições
estabelecidos no Código do Direito de Autor e Direitos Conexos, com as necessárias adaptações.
Artigo 4.º
Partilha de dados informáticos
1 – É permitida a partilha gratuita e sem fins comerciais de dados informáticos que contenham obras ou
parte de obras protegidas pelo Código do Direito de Autor e Direitos Conexos cuja partilha não tenha sido
expressamente proibida pelos respetivos titulares de direitos.
2 – A proibição prevista no número anterior pode ser realizada por um representante do titular do direito
desde que possuidor de uma procuração para o efeito.
2 – Para os efeitos previstos no número 1 podem ser utilizadas plataformas de partilha, independentemente
da localização do seu alojamento físico.
3 – A obtenção de obras através da partilha de dados informáticos não prejudica a necessidade de
obtenção da autorização por parte dos titulares do direito de autor e dos direitos conexos para a sua
comunicação, execução ou reprodução pública, aluguer ou qualquer forma de utilização ou exploração
comercial.
Página 5
12 DE SETEMBRO DE 2014
5
Artigo 5.º
Proibição da partilha de dados informáticos
1 – A proibição prevista no artigo anterior é declarada expressamente, pelos titulares de direitos de autor e
direitos conexos ou seus representantes, da seguinte forma:
a) Para as obras anteriores à entrada em vigor da presente lei: por declaração do titular do direito de autor
ou direito conexo dirigida ao membro do Governo responsável pela área da Cultura;
b) Para as obras posteriores à entrada em vigor da presente lei: por declaração do titular do direito de autor
ou direito conexo dirigida ao membro do Governo responsável pela área da Cultura ou explicitada nos originais
da obra.
2 – No caso de obras relativamente às quais exista mais do que um titular de direitos de autor e direitos
conexos, a proibição por um deles impede a partilha da obra e determina o dever de indemnizar os restantes
pelos benefícios cessantes.
3 – A listagem das obras cuja partilha por dados informáticos esteja proibida é disponibilizada de forma
permanente, pública e atualizada pelo membro do Governo responsável pela área da Cultura.
4 – Os titulares de direitos de autor e direitos conexos que proíbam a partilha de dados informáticos de
obras ou parte de obras que sejam objeto dos seus direitos ficam impedidos de receber a compensação
prevista no artigo 6.º na proporção correspondente às obras cuja partilha esteja proibida.
Artigo 6.º
Compensação dos titulares de direitos de autor e direitos conexos
1 – Os titulares de direitos de autor e direitos conexos têm direito a auferir uma compensação
correspondente, sem prejuízo de outras compensações a que tenham direito.
2 – A compensação dos titulares de direitos de autor e direitos conexos pela partilha de dados informáticos
é da responsabilidade das entidades de gestão coletiva de direitos, nos termos a definir por cada entidade em
regulamento próprio, presumindo-se a universalidade de representação nos termos estabelecidos no Código
do Direito de Autor e Direitos Conexos.
Artigo 7.º
Fundo para a Partilha de Dados Informáticos
1 – Para os efeitos previstos no artigo anterior é constituído um Fundo para a Partilha de Dados
Informáticos.
2 – O Fundo é constituído pelas verbas resultantes da cobrança aos fornecedores de serviços de acesso à
internet de uma contribuição mensal de € 0,75 por contrato de fornecimento de serviços de acesso à internet.
3 – O valor da contribuição referida no número anterior é atualizado, por Despacho do membro do Governo
responsável pela área da Cultura, em julho de cada ano à taxa de inflação anualizada verificada pelo Instituto
Nacional de Estatística no mês anterior.
4 – A contribuição referida no número dois não pode ser repercutida no preço do serviço prestado ao
utilizador final, sendo assumida pelos fornecedores de serviço de acesso à internet.
5 – A manutenção e gestão do Fundo é da responsabilidade do membro do Governo que tutela a área da
Cultura, nos termos previstos em regulamento próprio.
Artigo 8.º
Distribuição das verbas do Fundo para a Partilha de Dados Informáticos
1 – As verbas anuais do Fundo são distribuídas da seguinte forma:
Página 6
II SÉRIE-A — NÚMERO 168
6
a) 70% para as entidades de gestão coletiva de direitos;
b) 30% para o orçamento de investimento da Direção-Geral das Artes e do Instituto do Cinema e do
Audiovisual, para atribuição no âmbito dos concursos de apoio às artes e à produção cinematográfica.
2 – A verba prevista na alínea a) do número anterior é distribuída da seguinte forma:
a) 40% para as entidades de gestão coletiva de direitos de autores;
b) 30% para as entidades de gestão coletiva de direitos de intérpretes;
c) 30% para as entidades de gestão coletiva de direitos de produtores e editores.
Artigo 9.º
Divulgação da distribuição da compensação por parte das entidades de gestão coletiva de direitos
1 – As entidades de gestão coletiva de direitos que percebam qualquer verba por parte do Fundo para a
Compensação, nos termos do número anterior, divulgam anualmente junto da Inspeção Geral das Atividades
Culturais, ou membro do Governo que tutela a Cultura e através de sítio de internet, os resultados da
distribuição da verba pelos associados e representados.
2 – A divulgação deve compreender os artistas, intérpretes, produtores e editores, bem como a verba
auferida por cada um e referente a que obra geradora de direitos, bem como outros eventuais destinos de
financiamento, no âmbito dos regulamentos internos referidos no n.º 2 do artigo 6.º.
Artigo 10.º
Fiscalização
1 – A fiscalização do cumprimento da presente lei cabe à Inspeção-Geral das Actividades Culturais.
2 – Para os efeitos previstos no número anterior, a Autoridade Nacional de Comunicações fornece à
Inspecção Geral das Actividades Culturais, anualmente, os dados relativos ao número de contratos de
fornecimento de serviços de acesso à internet, através de tecnologias móveis e fixas.
Artigo 11.º
Entrada em vigor e regulamentação
1 – A presente lei entra em vigor 90 dias após a sua publicação.
2 – O prazo para entrega da declaração prevista na alínea a) do número dois do artigo 8.º termina 60 dias
após a publicação da presente lei.
3 – O regulamento previsto no número seis do artigo 7.º é aprovado pelo membro do Governo responsável
pela área da Cultura por Portaria no prazo de 60 dias após a publicação da presente lei, ouvidas as entidades
de gestão coletivas de direitos para o efeito.
Assembleia da República, 11 de setembro de 2014.
Os Deputados do PCP, Miguel Tiago — João Oliveira — Paula Santos — António Filipe — Carla Cruz —
Bruno Dias — Rita Rato — Diana Ferreira — David Costa — Paulo Sá.
———
Página 7
12 DE SETEMBRO DE 2014
7
PROJETO DE LEI N.º 647/XII (3.ª)
ALTERA O CÓDIGO PENAL, CRIMINALIZANDO A PERSEGUIÇÃO E O CASAMENTO FORÇADO
Exposição de motivos
A Convenção do Conselho da Europa para a Prevenção e o Combate à Violência contra as Mulheres e a
Violência Doméstica, adotada em 11 de maio de 20111, conhecida como Convenção de Istambul, constitui o
primeiro instrumento legal a nível europeu a criar um quadro legal para ação contra a incidência deste tipo de
violência.
Partindo da noção de que a violência de género é uma situação estrutural, a Convenção de Istambul
defende que a igualdade real entre homens e mulheres não poderá ser conseguida se ocorrências de violência
de género continuarem a suceder em larga escala sem que os Estados e respetivas instituições tomem
medidas para as impedirem.
O que torna este instrumento especialmente relevante na luta contra a desigualdade e a violência de
género é, entre outros, o facto de o Estado que ratifique a Convenção ficar imbuído do dever de aprofundar as
medidas de prevenção da violência contra as mulheres e violência doméstica, com a subsequente proteção
das vítimas e punição dos perpetradores.
A Convenção de Istambul entrou em vigor no passado dia 1 de agosto com o intuito declarado de constituir
uma ferramenta crucial para a redução das desigualdades de género, bem como travar a violência doméstica
e a violência contra as mulheres.
Portugal é reconhecido internacionalmente pelas suas boas práticas, concretizadas na promoção de
políticas públicas sustentáveis e sustentadas, através das quais sucessivos Governos vieram a implementar
planos de ação nacionais, dos quais se destacam os planos atualmente em aplicação – V Plano Nacional para
a Igualdade de Género, Cidadania e Não-discriminação 2014-2017, aprovado pela Resolução do Conselho de
Ministros n.º 103/2013, de 31 de dezembro; e o V Plano Nacional de Prevenção e Combate à Violência
Doméstica e de Género 2014-2017, aprovado pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 102/2013, de 31
de dezembro –, que dão concretização adequada às preocupações vertidas no Programa do XIX Governo
Constitucional e, também, às diretrizes orientadoras aprovadas em sede de Grandes Opções do Plano.
Tendo Portugal sido o primeiro País da União Europeia a ratificar a Convenção de Istambul, impõe-se
agora concretizar as implicações legislativas penais da ratificação dessa Convenção, nomeadamente
procedendo à criminalização autónoma da perseguição e do casamento forçado, desiderato da presente
iniciativa legislativa.
O artigo 34.º da Convenção prevê expressamente que os Estados signatários devem adotar as medidas
legislativas ou outras que se revelem necessárias para assegurar a criminalização da conduta de quem
intencionalmente ameaçar repetidamente outra pessoa, levando-a a temer pela sua segurança.
Por outro lado, o artigo 37.º da Convenção obriga os Estados signatários a criminalizarem o casamento
forçado.
A perseguição — ou stalking — é um padrão de comportamentos persistentes, que se traduz em formas
diversas de comunicação, contacto, vigilância e monitorização de uma pessoa-alvo. Estes comportamentos
podem consistir em ações rotineiras e aparentemente inofensivas (como oferecer presentes, telefonar
insistentemente) ou em ações inequivocamente intimidatórias (por exemplo, perseguição, mensagens
ameaçadoras).
Pela sua persistência e contexto de ocorrência, este padrão de conduta pode escalar em frequência e
severidade o que, muitas vezes, afeta o bem-estar das vítimas, que são sobretudo mulheres e jovens. A
perseguição consiste na vitimação de alguém que é alvo, por parte de outrem (o assediante), de um interesse
e atenção continuados e indesejados (vigilância, perseguição), os quais são suscetíveis de gerar ansiedade e
medo na pessoa-alvo.
Em Portugal, a perseguição não se encontra especificamente criminalizada, embora seja possível
enquadrar vários dos seus comportamentos ou contextos de ocorrência em algumas tipificações penais
1 Esta Convenção foi aprovada para ratificação pela Resolução da Assembleia da República n.º 4/2013, de 21 de janeiro, e ratificada pelo
Decreto do Presidente da República n.º 13/2013, de 21 de janeiro.
Página 8
II SÉRIE-A — NÚMERO 168
8
existentes, como a violência doméstica (artigo 152.º do CP), a ameaça (artigo 153.º do CP), a coação (artigo
154.º do CP), a violação de domicílio ou perturbação de vida privada (artigo 190.º do CP), a devassa da vida
privada (artigo 192.º do CP) ou as gravações e fotografias ilícitas (artigo 199.º do CP).
Num estudo recente realizado em Portugal por um grupo de investigadores universitários2, foi possível
obter um perfil da vítima e do assediante, as dinâmicas próprias do crime, o impacto nas vítimas e os cenários
em que eram conduzidas as perseguições.
Dos resultados obtidos nesse estudo, cumpre destacar os seguintes:
— 19,5% dos inquiridos já tinham sido alvo de stalking pelo menos uma vez na vida;
— 11% deles estavam a ser alvos de stalking à altura da realização da entrevista;
— A taxa de prevalência nas mulheres era de 25% e nos homens situava-se nos 13,3%.
Do disposto no já referido artigo 34.º da Convenção de Istambul decorre expressamente a obrigação de o
Estado português criminalizar a conduta de perseguição.
A necessidade de intervenção legislativa neste âmbito é reforçada pelo facto de a proteção da integridade
física e psíquica das vítimas e a repressão deste fenómeno não se encontrarem plena e cabalmente
asseguradas no ordenamento jurídico atual.
Considera-se, por isso, que a perseguição tem suficiente dignidade e valoração jurídico-penal para ser
integrada no elenco dos crimes contra a liberdade pessoal, pois é disso que efetivamente se trata.
Optou-se por denominar o ilícito como crime de perseguição visando oferecer uma tradução mais
adequada à obrigação imposta pela Convenção, ao mesmo tempo que se recorre a um conceito que hoje é
reconhecido pela generalidade das pessoas.
A tipificação proposta abrange quer o cyberstalking, quer o stalking indireto, prevendo-se uma moldura até
três anos de prisão ou pena de multa, que pode ser agravada nas situações previstas no artigo 155.º do CP,
com pena de prisão de um a cinco anos.
Pune-se a tentativa e prevê-se a aplicação das penas acessórias de proibição de contacto com a vítima
pelo período de seis meses a três anos, e de obrigação de frequência de programas específicos de prevenção
de condutas típicas da perseguição.
Considera-se, ainda, que o crime deve assumir natureza semipública, atendendo a que, antes de mais,
deve caber à vítima a avaliação concreta das condutas de assédio persistente como lesivas da sua liberdade
pessoal. Daí que se exija que o procedimento criminal dependa de queixa.
O artigo 37.º da Convenção é dedicado ao casamento forçado, uma prática que constitui uma realidade em
diversos países e que é alicerçada em tradições culturais e religiosas ancestrais.
A Convenção impõe, no referido artigo 37.º, que sejam adotadas medidas legislativas ou outras que se
revelem necessárias para assegurar a criminalização da conduta de quem intencionalmente forçar um adulto
ou uma criança a contrair matrimónio, bem como para assegurar a criminalização da conduta de quem
intencionalmente atrair uma criança ou um adulto para o território de outro Estado que não aquele onde
residam, com o intuito de os forçar a contrair matrimónio.
Nas audições realizadas na Assembleia da República, em sede de «Grupo de Trabalho — Implicações
Legislativas da Convenção de Istambul» criado no âmbito da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos,
Liberdades e Garantias, foi defendida, em matéria de casamento forçado, a necessidade de criação de um
ilícito criminal novo, com penas mais severas que as previstas para o crime de coação.
Nessa linha, pune-se com pena de prisão até cinco anos a conduta de quem constranger outra pessoa a
contrair casamento ou união equiparável à do casamento, conduta esta que pode ser agravada nas situações
previstas no artigo 155.º do Código Penal com pena de prisão de um a oito anos.
Por outro lado, punem-se os atos preparatórios deste crime, incluindo o de atrair a vítima para território
diferente do da sua residência com o intuito de a constranger a contrair casamento ou união equiparável à do
casamento, com pena de prisão até um ano ou pena de multa até 120 dias.
Por último, incluem-se os crimes de perseguição e de casamento forçado no âmbito de aplicação do artigo
5.º do Código Penal, por forma a permitir que a lei penal portuguesa seja aplicável a factos cometidos fora do
2 Matos, M., Grangeia, H., Ferreira, C., & Azevedo, V. (2011). Inquérito de Vitimação por Stalking. Relatório de Investigação. Braga: GISP
(Grupo de Investigação sobre Stalking em Portugal).
Página 9
12 DE SETEMBRO DE 2014
9
território nacional quando a vítima destes crimes for menor, desde que o agente seja encontrado em Portugal
e não possa ser extraditado.
Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, os Deputados do PSD e do CDS-PP, abaixo
assinados, apresentam o seguinte projeto de lei:
Artigo 1.º
Aditamento ao Código Penal
São aditados ao Código Penal, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 400/82, de 23 de setembro, e alterado pela
Lei n.º 6/84, de 11 de maio, pelos Decretos-Leis n.os
101-A/88, de 26 de março, 132/93, de 23 de abril, e
48/95, de 15 de março, pelas Leis n.os
90/97, de 30 de julho, 65/98, de 2 de setembro, 7/2000, de 27 de maio,
77/2001, de 13 de julho, 97/2001, 98/2001, 99/2001 e 100/2001, de 25 de agosto, e 108/2001, de 28 de
novembro, pelos Decretos-Leis n.os
323/2001, de 17 de dezembro, e 38/2003, de 8 de março, pelas Leis n.os
52/2003, de 22 de agosto, e 100/2003, de 15 de novembro, pelo Decreto-Lei n.º 53/2004, de 18 de março, e
pelas Leis n.os
11/2004 de 27 de março, 31/2004, de 22 de julho, 5/2006, de 23 de fevereiro, 16/2007, de 17 de
abril, 59/2007, de 4 de setembro, 61/2008, de 31 de outubro, 32/2010, de 2 de setembro, 40/2010, de 3 de
setembro, 4/2011, de 16 de fevereiro, 56/2011, de 15 de novembro, 19/2013, de 21 de fevereiro, 60/2013, de
23 de agosto, pela Lei Orgânica n.º 2/2014, de 6 de agosto, e pelas Leis n.os
59/2014, de 26 de agosto, e
69/2014, de 29 de agosto, os novos artigos 154.º-A a 154.º-C, com a seguinte redação:
«Artigo 154.º-A
Perseguição
1 — Quem, de modo reiterado, perseguir ou assediar outra pessoa, por qualquer meio, direta ou
indiretamente, de forma adequada a provocar-lhe medo ou inquietação ou a prejudicar a sua liberdade de
determinação, é punido com pena de prisão até três anos ou pena de multa, se pena mais grave não lhe
couber por força de outra disposição legal.
2 –A tentativa é punível.
3 – Nos casos previstos no n.º 1, podem ser aplicadas ao arguido as penas acessórias de proibição de
contacto com a vítima pelo período de seis meses a três anos e de obrigação de frequência de programas
específicos de prevenção de condutas típicas da perseguição.
4 – A pena acessória de proibição de contacto com a vítima deve incluir o afastamento da residência ou do
local de trabalho desta e o seu cumprimento deve ser fiscalizado por meios técnicos de controlo à distância.
5 – O procedimento criminal depende de queixa.
Artigo 154.º-B
Casamento forçado
Quem constranger outra pessoa a contrair casamento ou união equiparável à do casamento é punido com
pena de prisão até cinco anos.
Artigo 154.º-C
Atos preparatórios
Os atos preparatórios do crime previsto no artigo anterior, incluindo o de atrair a vítima para território
diferente do da sua residência com o intuito de a constranger a contrair casamento ou união equiparável à do
casamento, são punidos com pena de prisão até um ano ou pena de multa até 120 dias.»
Página 10
II SÉRIE-A — NÚMERO 168
10
Artigo 2.º
Alteração ao Código Penal
São alterados os artigos 5.º e 155.º do Código Penal, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 400/82, de 23 de
setembro, e alterado pela Lei n.º 6/84, de 11 de maio, pelos Decretos-Leis n.os
101-A/88, de 26 de março,
132/93, de 23 de abril, e 48/95, de 15 de março, pelas Leis n.os
90/97, de 30 de julho, 65/98, de 2 de setembro,
7/2000, de 27 de maio, 77/2001, de 13 de julho, 97/2001, 98/2001, 99/2001 e 100/2001, de 25 de agosto, e
108/2001, de 28 de novembro, pelos Decretos-Leis n.os
323/2001, de 17 de dezembro, e 38/2003, de 8 de
março, pelas Leis n.os
52/2003, de 22 de agosto, e 100/2003, de 15 de novembro, pelo Decreto-Lei
n.º 53/2004, de 18 de março, e pelas Leis n.os
11/2004 de 27 de março, 31/2004, de 22 de julho, 5/2006, de 23
de fevereiro, 16/2007, de 17 de abril, 59/2007, de 4 de setembro, 61/2008, de 31 de outubro, 32/2010, de 2 de
setembro, 40/2010, de 3 de setembro, 4/2011, de 16 de fevereiro, 56/2011, de 15 de novembro, 19/2013, de
21 de fevereiro, 60/2013, de 23 de agosto, pela Lei Orgânica n.º 2/2014, de 6 de agosto, e pelas Leis n.os
59/2014, de 26 de agosto, e 69/2014, de 29 de agosto, que passa a ter a seguinte redação:
«Artigo 5.º
(…)
1 – (…):
a) (…);
b) (…);
c) (…);
d) Quando constituírem os crimes previstos nos artigos 144.º, 154.º-A a 154.º-C, 163.º e 164.º, sendo a
vítima menor, desde que o agente seja encontrado em Portugal e não possa ser extraditado ou entregue em
resultado de execução de mandado de detenção europeu ou de outro instrumento de cooperação internacional
que vincule o Estado Português;
e) (…);
f) (…);
g) (…).
2 – (…).
Artigo 155.º
(…)
1 – Quando os factos previstos nos artigos 153.º a 154.º-C forem realizados:
a) (…);
b) (…);
c) (…);
d) (…);
e) Por determinação da circunstância prevista na alínea f) do n.º 2 do artigo 132.º;
o agente é punido com pena de prisão até dois anos ou com pena de multa até 240 dias, nos casos dos
artigos 153.º e 154.º-C, com pena de prisão de um a cinco anos, nos casos dos n.º 1 do artigo 154.º e do
artigo 154.º-A, e com pena de prisão de um a oito anos, no caso do artigo 154.º-B.
2 – As mesmas penas são aplicadas se, por força da ameaça, da coação, da perseguição ou do casamento
forçado, a vítima ou a pessoa sobra a qual o mal deve recair se suicidar ou tentar suicidar-se.»
Página 11
12 DE SETEMBRO DE 2014
11
Artigo 3.º
Entrada em vigor
A presente lei entra em vigor 30 dias após a sua publicação.
Palácio de São Bento, 11 de setembro de 2014.
Os Deputados, Luís Montenegro (PSD) — Nuno Magalhães (CDS-PP) — Carlos Abreu Amorim (PSD) —
Telmo Correia (CDS-PP) — Maria Paula Cardoso (PSD) — Teresa Anjinho (CDS-PP) — Mendes Bota (PSD)
— Ângela Guerra (PSD) — Teresa Caeiro (CDS-PP) — Mónica Ferro (PSD) — Hélder Amaral (CDS-PP) —
Carla Rodrigues (PSD).
———
PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 1102/XII (3.ª)
ASSEGURA QUE NENHUM PROFESSOR É PENALIZADO OU PREJUDICADO EM CONCURSO DE
COLOCAÇÃO EM VIRTUDE DA PROVA DE AVALIAÇÃO DE CONHECIMENTOS E CAPACIDADES E
GARANTE A ATRIBUIÇÃO DE COMPONENTE LETIVA A TODOS OS DOCENTES DOS QUADROS,
CONTRIBUINDO PARA UMA ESCOLA PÚBLICA DE QUALIDADE
A divulgação das listas de colocação de professores referentes ao concurso nacional para o exercício de
funções docentes em 2014/2015, por atribuição de componente letiva a docentes sem horário ou através de
contratação confirma as preocupações do PCP quanto à falta de resposta adequada do Governo para suprir
as necessidades permanentes das escolas e à gestão e organização do serviço docente.
Face ao número de aposentações – 4182 – que aconteceram entre setembro de 2013 e agosto de 2014 e
ao número de “rescisões” – 1889 – tudo indicava a garantia de absorção de todos os professores com horários
zero e o reforço do número de contratações.
Tendo saído dos quadros 6071 docentes o Governo PSD/CDS mantém, segundo os seus números,
917 docentes sem componente letiva atribuída e ainda contratou menos 2197 professores.
Se a isto aditarmos os 1954 docentes que, por via do concurso externo extraordinário terão entrado,
segundo o Ministério da Educação e Ciência, em quadros de zona pedagógica, conclui-se que, neste último
ano, foram destruídos mais alguns milhares de postos de trabalho de docentes.
Importa também referir a gravidade da data em que estas colocações acontecem (a poucos dias do início
do ano letivo). Tal significa um desrespeito pela vida profissional e familiar destes professores e pelas escolas,
sendo que os docentes agora colocados apresentar-se-ão nas escolas até dia 12 de setembro, dia em que
começa o trabalho com os alunos.
Para além da instabilidade gerada por estes atrasos, constata-se que o MEC excluiu das listas definitivas
de ordenação e colocação perto de 8000 docentes por não satisfazerem o “requisito” da Prova de Avaliação
de Conhecimentos e Capacidades (PACC).
Esta decisão é gravíssima e contraria o compromisso do Ministro da Educação e Ciência assumido no
passado mês de julho na Assembleia da República quando afirmou que nenhum docente seria penalizado ou
impedido de ser opositor a concurso.
Independentemente da posição de fundo do PCP contra a existência desta Prova, consideramos
inaceitável que o Governo PSD/CDS tenha utilizado este expediente como forma de retaliação sobre os
professores contratados que não a realizaram. Objetivamente, para além desta penalização nas listagens de
contratação inicial e reserva de recrutamento subsequente, tal indicia que estes cerca de 8000 professores
deixam de poder ser opositores ao concurso de oferta de escola e com isto são empurrados para o
desemprego.
Página 12
II SÉRIE-A — NÚMERO 168
12
De acordo com dados divulgados pela FENPROF, do total de exclusões ao concurso 96,5% estão
relacionadas com a PACC.
Esta situação é inseparável da política mais geral de desmantelamento e desinvestimento na Escola
Pública, de desvalorização sócio laboral dos docentes e da sua carreira, da diminuição do número de turmas
para reduzir o número de professores, do recurso ilegal à precariedade para suprir necessidades permanentes
das escolas.
Assim, a Assembleia da República, nos termos regimentais e constitucionais em vigor, recomenda
ao Governo que:
1- Assegure que nenhum professor é penalizado ou prejudicado para efeitos de concurso de colocação em
virtude da Prova de Avaliação de Conhecimentos e Capacidades, devendo para o efeito reintegrar as listas ora
divulgadas e atribuir-lhes colocação se a sua ordenação assim o ditar;
2- Suspenda qualquer medida que implique a redução de pessoal afeto ao sistema educativo, e promova a
concretização de concursos de colocação de profissionais docentes e não docentes, de professores e técnicos
de educação especial, de psicólogos e profissionais das ciências da educação de modo a que as
necessidades permanentes das escolas sejam supridas;
3- Tome as necessárias medidas para que o sistema de ensino não perca um único professor ou
funcionário para os contingentes de mobilidade especial, na medida em que subsistem carências nas Escolas
e persistem índices de abandono e insucesso graves, o que justifica plenamente a atribuição de componente
letiva aos 917 docentes que se mantêm em “horário-zero”, independentemente de lhes ser ou não atribuída a
titularidade de turma;
4- Revogue a designada Prova de Avaliação de Conhecimentos e Capacidades prevista no Decreto-
Regulamentar n.º 3/2008, de 21 de janeiro alterado pelo Decreto-Regulamentar n.º 7/2013, de 23 de outubro.
Assembleia da República, 11 de setembro de 2014.
Os Deputados do PCP, Rita Rato — Diana Ferreira — Paula Santos — Paulo Sá — João Oliveira — Carla
Cruz — Bruno Dias — David Costa — João Ramos — Miguel Tiago.
———
PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 1103/XII (3.ª)
RECOMENDA AO GOVERNO A ADOÇÃO DE MEDIDAS DE INFORMAÇÃO E ESCLARECIMENTO DA
POPULAÇÃO EM GERAL QUANTO AO SURTO DE DOENÇA PROVOCADO PELO VÍRUS ÉBOLA
A febre hemorrágica Ébola ou simplesmente Ébola é uma doença provocada pelo vírus Ébola. Após
infeção, o período de incubação pode ir até 20 dias. Febre, dores musculares, dores de cabeça ou dores de
garganta, são os primeiros sintomas da doença, aos quais sucedem-se náuseas, vómitos e diarreias e, na
última fase, surgem as hemorragias internas e externas. O facto de os primeiros sintomas serem semelhantes
a outras doenças torna o diagnóstico do Ébola mais difícil. A taxa de mortalidade da doença é bastante
elevada, podendo atingir os 90%, e não há tratamento específico com eficácia comprovada para esta doença .
Os profissionais de saúde procuram prestar cuidados para evitar a desidratação, controlar a coagulação e as
hemorragias, controlar a dor e a febre e tratar as infeções secundárias. Tudo indica que o vírus poderá ter
origem nalguns animais, designadamente primatas, antílopes ou morcegos e a transmissão entre humanos é
através de fluídos corporais ou contacto com pessoas mortas infetadas.
O vírus Ébola foi identificado em 1976 na Africa Central, tendo até hoje existido vários surtos da doença
nessa região do continente Africano.
É comummente referido que o atual surto do vírus Ébola é o mais grave de sempre. O surto teve início em
dezembro de 2013 na Guiné-Conacri e em poucos meses alastrou para a Libéria, Serra Leoa e Nigéria, tendo
Página 13
12 DE SETEMBRO DE 2014
13
sido já sido identificados casos na República Democrática do Congo. Mais recentemente foram colocados
outros países africanos em estado de alerta, dos quais países com fortes ligação a Portugal como Angola ou
Guiné Bissau.
No passado dia 8 de agosto, a Diretora-Geral da Organização Mundial de Saúde (OMS) declarou o “estado
de emergência de Saúde Pública de âmbito internacional”, tendo em conta1 que o surto de Ébola constitui um
“evento extraordinário" e um risco de saúde pública para todos os Estados; que um eventual agravamento da
propagação da doença poderá ter consequências sérias e que é essencial uma resposta internacional
coordenada para controlar a epidemia.
Segundo a última atualização dos dados da OMS (datados de 3 de setembro de 2014), tinham sido
identificadas 3500 pessoas infetadas pelo vírus Ébola e já morreram mais de 1900 pessoas na Guiné-Conacri,
Libéria e Serra Leoa. A OMS alerta para o crescimento acelerado da epidemia.
A Direção Geral de Saúde (DGS), no comunicado de 8 de agosto afirma que “a gravidade deste surto deve-
se não só às características do vírus mas também, certamente, às condições socioeconómicas e sanitárias
observadas nos países afetados” e que “até à data, não se verificou nenhum caso de doença por vírus Ébola
em Portugal, importado ou autóctone, sendo o risco de contágio interpessoal baixo na ausência de contacto
direto com fluídos corporais”.
Apesar de a DGS considerar ser baixo o risco da doença se propagar para a Europa, onde se inclui
Portugal, há alguns factos que merecem uma acrescida preocupação, designadamente o descontrolo da
epidemia a nível mundial e a propagação da doença em países com relações políticas e comerciais muito
próximas da Europa. Não podemos ignorar os grandes riscos que representam países com fortes relações
com Portugal, como Guiné Bissau, Angola, São Tomé e Príncipe ou Cabo Verde. A OMS recomenda que
todos os países, sem exceção, tomem medidas de prevenção.
Nas últimas semanas, têm vindo a público diversas declarações de responsáveis da DGS e de membros do
Governo, sobre as medidas adotadas no país. De acordo com as informações vindas a público, o INEM está
de prevenção para a eventualidade de ter de transportar doentes infetados com o vírus Ébola, os Hospitais de
São João, Curry Cabral e D. Estefânia estão de prevenção para o tratamento de doentes e isolamento, a Linha
Saúde 24 para o aconselhamento e encaminhamento, havendo ainda a articulação com o Instituto Nacional de
Saúde Doutor Ricardo Jorge. O comunicado de 8 de agosto da DGS refere ainda que foi criado um dispositivo
de coordenação no âmbito da Unidade de Apoio à Autoridade de Saúde Nacional e à Gestão de Emergências
em Saúde Pública da DGS para responder a eventuais casos que surjam no país. No sítio da internet da
Direção Geral é possível encontrar também um conjunto de recomendações para os profissionais de saúde e
para os viajantes sobre o Ébola.
Sem alarmismos, mas com seriedade, é necessário ir mais longe na informação, no esclarecimento e na
sensibilização dos portugueses sobre o vírus Ébola, para que efetivamente todos saibam como atuar caso
sejam confrontados com esta realidade. Embora a probabilidade da propagação da doença atingir Portugal
seja baixa, ela não é nula, tendo em conta as características da doença, particularmente a sua transmissão
por contágio e o elevado período de incubação, podendo uma pessoa estar infetada com o vírus Ébola sem
saber e disseminar a doença para outros locais.
Se toda a população portuguesa tiver informação que permita adotar os comportamentos adequados na
eventualidade de contactar com um doente infetado com vírus Ébola, evita-se o contágio da doença e
contribui-se para conter a propagação da doença. As recomendações não devem ser somente para os
profissionais de saúde e os viajantes, elas devem ser o mais abrangentes possível.
Cabe ao Governo promover as ações de informação, esclarecimento e sensibilização necessárias, para
que todos possam cooperar para conter a doença caso venhamos a ser confrontados com ela.
Há, no entanto, alguns setores profissionais, nomeadamente do turismo e dos aeroportos e transporte
aéreo que manifestaram preocupações quanto à vulnerabilidade e exposição dos trabalhadores a eventual
contacto com doentes infetados com o vírus Ébola. As respetivas empresas não estão a cumprir com a sua
responsabilidade e não estão a assegurar a formação aos trabalhadores sobre o vírus do Ébola, que
precauções devem ter e como agir perante um possível contacto com um doente infetado com o vírus Ébola.
Foram veiculadas notícias que expressam a preocupação dos trabalhadores dos aeroportos sobre como
agir em caso de contacto com doentes infetados com o vírus Ébola, à qual a empresa (a TAP) responde que a
formação não é necessária e que a DGS acreditava que essa formação estava a ser garantida.
Página 14
II SÉRIE-A — NÚMERO 168
14
Como já se referiu não se trata de alarmismo, trata-se de os trabalhadores e os portugueses em geral
terem acesso a informação credível e saberem agir perante a eventualidade de existirem situações concretas,
evitando riscos e perigos de contraírem a doença e de se instalar o pânico na sociedade portuguesa.
Neste caso concreto, o acesso à informação sobre a doença e as precauções e os comportamentos que se
deve adotar, é a “arma” mais eficaz para combater a doença.
Preocupa-nos também o facto da DGS, a entidade pública com responsabilidade de intervir nesta questão,
ter enormes limitações, designadamente no que respeita ao seu quadro de pessoal. De acordo com o
respetivo balanço social, em 31 de dezembro de 2013 a DGS tinha 137 trabalhadores, acrescidos de mais
nove em regime de prestação de serviços, o que é manifestamente insuficiente para as suas inúmeras
responsabilidades em saúde pública.
O PCP entende que a atuação do Governo não é suficiente e deve ir mais longe. Por um lado, dotar a DGS
dos recursos necessários para dar a resposta adequada e por outro, no plano da prevenção, desenvolver
ações de informação, esclarecimento e sensibilização dos portugueses em geral (e não só os profissionais de
saúde e os viajantes) sobre a doença e zelar para que os serviços de saúde ocupacional das empresas
cumpram as suas responsabilidades junto dos respetivos trabalhadores.
Nestes termos, ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, o Grupo Parlamentar do
PCP apresenta o seguinte projeto de resolução:
A Assembleia da República recomenda ao Governo que:
1 – Assegure que a Direção Geral de Saúde dispõe de todos os recursos necessários para uma resposta
adequada, na eventualidade de existirem doentes infetados com vírus do Ébola em Portugal;
2 – Desenvolva ações de informação, esclarecimento e sensibilização sobre o vírus Ébola à população
geral, no âmbito do combate e prevenção da doença, designadamente sobre as precauções e
comportamentos a adotar em caso de contacto com doentes infetados;
3 – Intervenha no sentido de zelar para que os serviços de saúde ocupacional das empresas cumpram as
suas responsabilidades e assegurem a informação, esclarecimento e sensibilização dos respetivos
trabalhadores sobre o vírus Ébola, que lhes permita atuar em conformidade no caso de contactarem com
doentes infetados, reduzindo os riscos de contraírem a doença e de a propagar;
4 – Apoie e colabore com países africanos de língua oficial portuguesa, de acordo com as suas
necessidades, através da disponibilização de recursos humanos e técnicos que contribuam para o controlo da
epidemia.
Assembleia da República, 11 de setembro de 2014.
Os Deputados do PCP, Paula Santos — Carla Cruz — João Oliveira — Paulo Sá — António Filipe — Diana
Ferreira — Rita Rato — David Costa — Bruno Dias — João Ramos — Miguel Tiago — Jerónimo de Sousa.
———
PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 1104/XII (3.ª)
EM DEFESA DOS CUIDADOS DE SAÚDE PRIMÁRIOS NA REGIÃO ALGARVIA
Os cuidados de saúde primários são parte integrante do Serviço Nacional de Saúde, de que constituem
função central e são o principal núcleo. Constituem, em Portugal, a primeira porta de acesso aos cuidados de
saúde.
Apesar da importância estratégica dos cuidados de saúde primários ser reconhecida mundialmente e dos
avanços registados em Portugal depois da Revolução de Abril, nos últimos anos sucessivos governos têm
conduzido uma política de progressivo desinvestimento nos cuidados de saúde primários por via da diminuição
da sua capacidade de resposta, da desvalorização social e profissional dos profissionais que neles trabalham
Página 15
12 DE SETEMBRO DE 2014
15
e, sobretudo, da carência de dotação de recursos humanos, financeiros e técnicos que possibilitem a
assunção dos objetivos que norteiam a prestação neste nível de cuidados de saúde.
O atual Governo PSD/CDS deu continuidade e aprofundou a ofensiva contra os cuidados de saúde
primários, através de uma política de desinvestimento público, de externalização e privatização de serviços, de
ataque aos direitos dos profissionais de saúde e de transferência de custos para os utentes. Em
consequência, por todo o país e também no Algarve, os cuidados de saúde primários degradam-se de forma
acelerada, privando os cidadãos de um direito fundamental consagrado na Constituição da República
Portuguesa, o direito à saúde.
Ao longo da presente legislatura, o PCP realizou um conjunto alargado de iniciativas com o objetivo de
avaliar a capacidade de resposta dos cuidados de saúde primários na região algarvia, incluindo reuniões com
os Diretores Executivos do Agrupamento de Centros de Saúde Algarve I – Central (ACES Central), do
Agrupamento de Centros de Saúde Algarve II – Barlavento (ACES Barlavento) e do Agrupamento de Centros
de Saúde Algarve III – Sotavento (ACES Sotavento) e visitas aos Centros de Saúde de Alcoutim, Castro
Marim, Loulé, Monchique, Olhão, S. Brás de Alportel e Vila Real de Santo António e às Extensões de Saúde
de Altura, Martim Longo, Monte Gordo, Pechão, Salir, S. Bartolomeu de Messines e Vila Nova de Cacela.
Nestas iniciativas, o PCP pôde inteirar-se de forma mais profunda e detalhada dos gravíssimos problemas
dos cuidados de saúde primários na região algarvia, nomeadamente ao nível da carência e diminuição de
recursos humanos, da deficiente articulação dos cuidados de saúde primários com os cuidados de saúde
hospitalares, das faltas de material clínico e de medicamentos, e da desadequada infraestrutura informática
que serve os centros e extensões de saúde.
A carência de recursos humanos nos três ACES algarvios é dramática. De acordo com os dados recolhidos
pelo PCP e confirmados pela Administração Regional de Saúde (ARS) do Algarve numa audição realizada
recentemente na Assembleia da República, no ACES Central faltam 42 médicos, 11 enfermeiros, 1 técnico
superior, 10 técnicos de diagnóstico e terapêutica, 14 assistentes técnicos e 68 assistentes operacionais, num
total de 146 profissionais de saúde; no ACES Barlavento faltam 56 médicos, 9 enfermeiros, 5 técnicos
superiores, 3 técnicos de diagnóstico e terapêutica, 32 assistentes técnicos e 39 assistentes operacionais,
num total de 144 profissionais de saúde; e no ACES Sotavento faltam 1 médico, 13 enfermeiros, 1 técnico
superior, 1 técnico de diagnóstico e terapêutica, 13 assistentes técnicos e 23 assistentes operacionais, num
total de 52 profissionais de saúde.
A carência destes pelo menos 342 profissionais de saúde nos centros e extensões de saúde algarvios
traduz-se numa real incapacidade de prestação de cuidados de saúde de qualidade às populações, bem
refletida no facto de 32% dos utentes (149.000) não terem médico de família, percentagem que atinge de
forma mais gritante os 52% no ACES Barlavento e 78% no concelho de Lagos. Estes valores para os utentes
sem médico de família pecam por defeito, já que na última atualização dos ficheiros muitos utentes foram
considerados “não frequentadores” por não terem recorrido nos últimos três anos aos centros de saúde.
A recente abertura de um procedimento concursal para a contratação de médicos para a região algarvia
pouco alterará este panorama desolador, já que o número de clínicos que serão efetivamente contratados –
como a própria ARS do Algarve já reconheceu – representa apenas uma pequena parcela das necessidades
da região (99 médicos).
Apesar da notória falta de enfermeiros (pelo menos 33 no conjunto dos três ACES), o Governo não coloca
a concurso um número de vagas suficiente para suprir as necessidades.
Saliente-se que o Governo se tem recusado a abrir concursos para assistentes técnicos e assistentes
operacionais, apesar de enorme carência destes profissionais (faltam 59 assistentes técnicos e 130
assistentes operacionais nos três ACES algarvios). Esta carência poderá agravar-se a curto prazo, já que um
número significativo de assistentes técnicos e assistentes operacionais (mantidos numa situação de
precariedade laboral há muitos anos – nalguns casos, há mais de 10 anos) tem contratos a termo resolutivo
certo que estão a chegar ao fim e ainda não foram abertos concursos para a regularização da sua situação.
Também ao nível das carreiras de técnico superior e de técnico de diagnóstico e terapêutica, o Governo
recusa-se a abrir concursos para a contratação destes profissionais.
Vários centros e extensões de saúde do Algarve, por imposição do Governo, em vez de contratarem
assistentes operacionais, recorrem aos serviços externos de empresas privadas para a limpeza das
instalações. Esta externalização de serviços – em si mesma parte da política de privatização da saúde – não
Página 16
II SÉRIE-A — NÚMERO 168
16
serve os interesses dos centros e extensões de saúde, já que o conteúdo funcional de um assistente
operacional no setor da saúde não se resume à mera limpeza das instalações. O recurso a empresas externas
para substituir profissionais de saúde é uma inaceitável prática do atual e de anteriores governos visando a
destruição do emprego com vínculo público e o favorecimento de interesses privados em detrimento do
interesse público.
O Governo aplica uma política de promoção de instabilidade e precariedade dos vínculos laborais com o
sistemático recurso à contratação de profissionais através de empresas de trabalho temporário ou de
trabalhadores em situação de desemprego através de contratos temporários cinicamente chamados de
“inserção”. Só no ACES Sotavento há 16 assistentes técnicos com contratos de emprego e inserção, sem
vínculo à Administração Pública, que exercem funções que correspondem a necessidades permanentes. O
recurso, por parte do Governo, à precariedade laboral é inaceitável, exigindo-se a conversão destes contratos
de trabalho precários em contratos de trabalho com vínculo público, inserindo-se os trabalhadores nas
respetivas carreiras.
A desvalorização e ataque aos direitos dos profissionais de saúde assumiu, nos últimos anos, uma
gravidade sem precedentes: cortes nos salários e nas remunerações, destruição das carreiras e dos direitos
laborais, agravamento das condições de trabalho, aumento da carga horária e da precariedade e instabilidade
nas relações laborais.
A falta de profissionais, a par da falta de motivação e da inexistência de uma política de recursos humanos
que garanta uma carreira pública e a valorização profissional e salarial dos profissionais de saúde, tem tido
como consequência uma sangria de recursos humanos qualificados do setor público para o setor privado.
A política do Governo para com os recursos humanos do Serviço Nacional de Saúde é caraterizada por
uma clara intenção de “empurrar” os profissionais de saúde para o setor privado, facilitando a transformação
da saúde num lucrativo negócio para os grandes grupos económicos do setor.
A carência de profissionais de saúde no Algarve (que também se verifica ao nível dos cuidados de saúde
hospitalares, onde faltam 183 médicos, 126 enfermeiros, 8 técnicos superiores, 8 técnicos de diagnóstico e
terapêutica, 42 assistentes técnicos e 114 assistentes operacionais) tem também sérias implicações na
referenciação dos utentes dos centros e extensões de saúde para as consultas externas de especialidade nos
hospitais algarvios, com total ausência de resposta em algumas especialidades e tempos de espera
excessivos noutras especialidades, que podem atingir vários anos.
Entre vários exemplos que poderiam ilustrar a realidade algarvia destacamos o caso de um utente do
Centro de Saúde de Monchique com cancro na próstata que foi referenciado para o Hospital de Portimão
como muito urgente, não tendo a consulta sido disponibilizada, obrigando-o a recorrer ao serviço de urgência,
onde também não foi atendido; a consulta acabou por se realizar um ano e meio depois.
De acordo com dados disponibilizados pelo próprio Ministério da Saúde em resposta a um requerimento do
Grupo Parlamentar do PCP, o tempo médio de espera até à realização da primeira de consulta é de 826 dias
em Neurocirurgia, de 587 dias em Oftalmologia e de 627 dias em Ortopedia, no Hospital de Faro, e de 612
dias em Urologia, no Hospital de Portimão.
Particularmente grave é o facto de, em algumas especialidades, em que não há capacidade de resposta,
os processos serem devolvidos aos centros e extensões de saúde – por vezes, ao fim de longos meses –
alegando “informação insuficiente” em vez de “incapacidade de resposta”. Esta prática obriga os médicos de
família a recomeçar os processos, ficando impossibilitados de referenciar os utentes para outras unidades
hospitalares. Com este expediente, o Centro Hospitalar do Algarve – recentemente criado por uma
desadequada fusão dos hospitais de Faro, Portimão e Lagos – tenta esconder a sua incapacidade de resposta
e o Governo reduz custos (já que os utentes ficam à espera de consulta, em vez de serem consultados, e
alguns, em desespero, acabam mesmo por recorrer a serviços de saúde privados).
O próprio Governo reconhece a existência deste problema ao afirmar, em resposta à denúncia do PCP,
que “a Administração Regional de Saúde do Algarve tem também promovido a realização de reuniões entre os
ACES e o Centro Hospitalar do Algarve com o intuito de melhorar os circuitos de referenciação à primeira
consulta e a comunicação entre os dois níveis de cuidados”. Contudo, apesar deste reconhecimento, no
terreno nada mudou.
Página 17
12 DE SETEMBRO DE 2014
17
Os centros de saúde algarvios têm sido severamente afetados por um problema de falta de material clínico
e de medicamentos, originado pela incapacidade da ARS do Algarve de repor stocks. Este problema, que é
indissociável dos constrangimentos financeiros impostos pelo Governo no quadro de uma política de
subfinanciamento premeditado e permanente do Serviço Nacional de Saúde, tem sérias repercussões na
prestação de cuidados de saúde aos utentes, particularmente, aos doentes crónicos.
O atual Governo PSD/CDS, assim como anteriores do PS, têm encerrado diversas extensões de saúde,
principalmente nas regiões serranas, agravando o processo de desertificação e despovoamento que afeta
estas regiões e privando as populações, muito envelhecidas, de cuidados de saúde de proximidade.
Depois de num passado recente as extensões de saúde de Giões e de Pereiro, no concelho de Alcoutim,
terem sido encerradas, o Governo lançou mais um ataque contra os cuidados de saúde do concelho algarvio
mais afetado pela desertificação demográfica e económica, encerrando, logo após as eleições autárquicas de
setembro de 2013, a Extensão de Saúde de Vaqueiros. Os utentes desta extensão de saúde passaram a ter
de se deslocar a Martim Longo, apesar de diversos núcleos habitacionais da freguesia de Vaqueiros se
encontrarem a mais de 30 km de Martim Longo (num território de orografia bastante acidentada em plena
Serra do Caldeirão e sem transportes públicos). Infelizmente, esta não é uma situação isolada, pois diversas
extensões de saúde na serra algarvia foram encerradas ou encontram-se sob ameaça de encerramento como
é o caso das extensões de saúde de Alcantarilha, Alferce ou Marmelete.
Os cidadãos do interior do país – e do interior serrano algarvio – não podem ver o seu acesso aos cuidados
de saúde primários dificultado ou impedido por decisões baseadas em critérios meramente economicistas; têm
direito, como todos os outros cidadãos, a cuidados de saúde primários de proximidade e de qualidade.
A infraestrutura tecnológica do sistema informático que serve os ACES algarvios está obsoleta. O facto de
ser antiquada, dispondo de uma largura de banda muito reduzida e falhando com muita frequência constitui
um sério obstáculo ao normal funcionamento dos centros e extensões de saúde. A aquisição de novos
computadores, anunciada para breve, não resolverá, obviamente, o problema, já que este reside na própria
rede. Este é um problema que se encontra referenciado há muito tempo, mas nada tem sido feito.
O atual Governo PSD/CDS aposta, claramente, no caminho da privatização dos cuidados de saúde,
transformando um direito fundamental num lucrativo negócio para os grandes grupos económicos que operam
no setor. Neste quadro, a degradação dos cuidados de saúde no setor público, promovida pelo Governo,
insere-se numa estratégia mais ampla, procurando descredibilizar o Estado perante os cidadãos, para justificar
a gradual entrega dos cuidados de saúde aos grandes grupos económicos. Este é um caminho que o PCP
rejeita veementemente, defendendo um Serviço Nacional de Saúde de qualidade, universal, geral e gratuito.
A este processo de degradação da prestação de cuidados de saúde na região do Algarve, têm respondido
os profissionais, as populações, os sindicatos, as comissões de utentes e os autarcas em numerosas ações de
luta exigindo a reposição de serviços retirados, combatendo a política de subfinanciamento e a retirada de
direitos aos trabalhadores, reclamando novas respostas aos seus problemas. Nesta região, cuja população
durante o período de verão chega a triplicar em alguns dos concelhos em resultado da procura turística, os
problemas relacionados com o Serviço Nacional de Saúde e em particular com os cuidados primários de
saúde constituem um fator de degradação profunda da qualidade de vida e de risco para as populações.
Pelo exposto, nos termos regimentais e constitucionais aplicáveis, os Deputados abaixo assinados do
Grupo Parlamentar do PCP propõem que a Assembleia da República adote a seguinte resolução:
Resolução
A Assembleia da República recomenda ao Governo que:
1. Planifique e implemente uma rede de cuidados de saúde primários de proximidade, em toda a região
algarvia, que responda às necessidades de prestação de cuidados de saúde às populações, atendendo às
características geográficas, demográficas e epidemiológicas do meio envolvente, às acessibilidades e às
condições sociais e económicas das populações.
2. Dote os cuidados de saúde primários do Algarve de meios financeiros e técnicos adequados ao
cumprimento das suas missões.
Página 18
II SÉRIE-A — NÚMERO 168
18
3. Promova a contratação dos 342 profissionais de saúde em falta nos ACES da região algarvia,
nomeadamente de médicos, enfermeiros, técnicos superiores, técnicos de diagnóstico e terapêutica,
assistentes técnicos e assistentes operacionais.
4. Melhore as condições de trabalho dos profissionais de saúde, reponha os seus direitos e dignifique as
suas carreiras, proporcionando uma efetiva valorização profissional e progressão na carreira.
5. Elimine a precariedade e restabeleça o vínculo público a todos os profissionais de saúde que exerçam
funções nos centros e extensões de saúde do Algarve, independentemente do atual vínculo laboral.
6. Crie um sistema de atribuição de incentivos que permita a fixação de profissionais de saúde na região
algarvia.
7. Garanta a atribuição de médico de família a todos os utentes inscritos nos centros de saúde do
Algarve.
8. Promova uma adequada articulação entre os cuidados de saúde primários e os cuidados de saúde
hospitalares, de forma a garantir que os utentes dos centros e extensões de saúde do Algarve, referenciados
para os hospitais da região, tenham acesso a consultas de especialidade num prazo que responda cabalmente
às suas necessidades clínicas.
9. Adote as medidas necessárias para garantir a resolução do problema crónico de falta de material
clínico e de medicamentos nos centros e extensões de saúde do Algarve.
10. Modernize a infraestrutura tecnológica do sistema informático que serve os ACES algarvios e garanta
a total operacionalidade dos diversos programas informáticos de suporte à atividade clínica.
Assembleia da República, 11 de setembro de 2014.
Os Deputados do PCP, Paulo Sá — Carla Cruz — Paula Santos — João Oliveira — António Filipe — Rita
Rato — Diana Ferreira — David Costa — Miguel Tiago — Jerónimo de Sousa — Bruno Dias — João Ramos.
———
PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 1105/XII (3.ª)
RECOMENDA AO GOVERNO A SUSPENSÃO DO PROCESSO DE AGREGAÇÃO/FUSÃO DOS
CURSOS NAS ÁREAS DAS TECNOLOGIAS DA SAÚDE
A Agência de Avaliação e Acreditação do Ensino Superior (A3ES) apresentou um relatório em dezembro de
2013 onde propõe a “agregação/fusão” de alguns cursos nas áreas das tecnologias de diagnóstico e
terapêutica.
No concreto, a A3ES propõe as seguintes alterações na formação inicial:
— Criação de um ciclo de estudos, designado por Imagem Médica e Radioterapia, que integra a formação
inicial em medicina nuclear, em radiologia e em radioterapia;
— Criação de um ciclo de estudos, designado por Fisiologia Clínica, que integra a formação inicial em
cardiopneumologia e neurofisiologia;
— Criação de um ciclo de estudos, designado por Ciências Biomédicas Laboratoriais, que integra a
formação inicial em análises clínicas e saúde pública e em anatomia patológica, citológica e tanatológica.
Mas no referido relatório não há uma abordagem detalhada sobre os impactos destas alterações ao nível
da qualidade da formação inicial e da prestação de cuidados de saúde aos utentes. São apenas abordadas as
questões referentes à demografia profissional, à empregabilidade e a uniformização destes ciclos de estudo a
nível europeu.
O parecer parcelar no âmbito da petição n.º 367/XII (3.ª) – Contra a fusão/agregação dos cursos nas áreas
das tecnologias de diagnóstico e terapêutica, aprovado pela Comissão de Saúde, “considera que poderia ser
Página 19
12 DE SETEMBRO DE 2014
19
útil a realização de uma avaliação dos impactos da fusão/agregação dos cursos nas áreas das tecnologias da
saúde, designadamente ao nível dos cuidados de saúde a prestar aos utentes e nas capacidades e
competências adquiridas pelos profissionais”.
Entendemos que é justa a preocupação de inúmeras associações de profissionais das profissões de
diagnóstico e terapêutica envolvidas neste processo de “agregação/fusão” das respetivas formações iniciais
A Petição n.º 367/XII (3.ª) considera que a fusão/agregação dos cursos nas áreas das tecnologias de
diagnóstico e terapêutica, mantendo o número de créditos e aumentando as áreas do conhecimento não
permite a especialização numa área concreta e que conduz a uma perda de diferenciação. Expressam ainda
preocupações com a qualidade dos serviços, a segurança dos doentes / utentes, dos próprios profissionais e
de quem os rodeia, bem como do público em geral.
Consideramos que as preocupações são sérias e que devem merecer uma maior ponderação na alteração
curricular na formação inicial das áreas envolvidas. Na nossa perspetiva, qualquer alteração curricular deve
ser precedida, entre outros, de uma avaliação da qualidade da formação, das competências que atribui, se
corresponde ou não às necessidades do desempenho profissional. Do que conhecemos, e segundo as
informações prestadas pelos subscritores da referida petição, em audiência na Comissão de Educação,
Ciência e Cultura, a A3ES ainda não efetuou a avaliação dos cursos nas áreas das tecnologias da saúde. Foi
dito ainda que estava previsto iniciar esse processo no ano letivo 2015/2016.
Efetivamente não se compreende que seja realizada uma alteração na formação inicial destas profissões,
sem a sua avaliação e sem tomar em consideração os expectáveis impactos na qualidade da futura formação
inicial, do desempenho profissional e da prestação dos cuidados de saúde aos utentes.
Entretanto, o Governo já deu o seu acordo a este processo e avançou com a publicação de três despachos
que definem o referencial de competências para os profissionais que concluírem os novos ciclos de estudos
(Despacho n.º 9363/2014, de 18 de julho que estabelece o referencial de competências conjunto para as
profissões de técnico de cardopneumologia e de técnico de neurofisiologia; Despacho n.º 9408/2014, de 21 de
julho que estabelece o referencial de competências conjunto para as profissões de técnico de medicina
nuclear, de técnico de radiologia e de técnico de radioterapia e o Despacho n.º 9409/2014, de 21 de julho que
estabelece o referencial de competências conjunto para as profissões de técnico de análises clínicas e de
saúde pública e de técnico de anatomia patológica, citológica e tanatológica). É de registar também que as
organizações representativas dos trabalhadores, assim como as associações dos respetivos profissionais
abrangidos não foram ouvidas pelo Governo.
Considerando que alteração curricular da formação inicial constitui matéria da maior relevância, o Grupo
Parlamentar do Partido Comunista Português entende que este processo de “fusão/agregação” de cursos na
área das tecnologias de diagnóstico e terapêutica deve ser acompanhado dos fundamentos do ponto de vista
da qualidade da formação inicial e da prestação dos cuidados de saúde aos utentes.
Neste sentido, o Grupo Parlamentar do PCP propõe a suspensão deste processo e que o Governo inicie
rapidamente a avaliação do impacto destas alterações, de forma a tomar uma decisão com base em
elementos mais concretos e que permitam assegurar a qualidade dos cuidados de saúde. Defendemos ainda
que neste processo o Governo deve auscultar e considerar os contributos dos estudantes, das instituições de
ensino superior, das associações profissionais e das organizações representativas dos trabalhadores.
Nestes termos, ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, o Grupo Parlamentar do
PCP apresenta o seguinte projeto de resolução:
A Assembleia da República recomenda ao Governo que:
a) Suspenda o processo em curso de “fusão/agregação” dos cursos na área das tecnologias de
diagnóstico e terapêutica;
b) Proceda à avaliação dos atuais cursos na área das tecnologias de diagnóstico e terapêutica, assim
como à avaliação dos impactos da proposta apresentada pela Agência de Avaliação e Acreditação do Ensino
Superior, no que respeita à qualidade da formação inicial e à qualidade da prestação de cuidados de saúde
aos utentes;
c) Proceda à realização de um processo de auscultação dos estudantes, das associações de profissionais,
das instituições de ensino superior e das organizações representativas dos trabalhadores envolvidos neste
Página 20
II SÉRIE-A — NÚMERO 168
20
processo.
Assembleia da República, 11 de setembro de 2014.
Os Deputados do PCP, Paula Santos — Carla Cruz — Rita Rato — Diana Ferreira — João Oliveira —
António Filipe — Francisco Lopes — João Ramos — Bruno Dias — Paulo Sá — David Costa — Miguel Tiago.
———
PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 1106/XII (3.ª)
PELO CUMPRIMENTO DA LEI DE BASES DO SISTEMA EDUCATIVO E PELA GARANTIA DE UMA
ESCOLA PÚBLICA, GRATUITA, DE QUALIDADE E DEMOCRÁTICA PARA TODOS
A Escola Pública é uma das mais importantes conquistas de Abril.
Na Constituição da República Portuguesa (CRP) e na Lei de Bases do Sistema Educativo (LBSE) está
consagrada como um instrumento de emancipação individual e coletiva, com um papel determinante na vida
de cada cidadão e no desenvolvimento do país.
Contudo, sucessivos governos PS, PSD/CDS-PP, e em particular o atual Governo, têm desenvolvido uma
política de desmantelamento da Escola Pública e do seu papel emancipador. Aliás, o Guiãodadita“Reforma
do Estado” apresentadopelo Governo PSD/CDS-PP exclui a Educação das funções sociais do Estado.
Esta opção de desresponsabilização do Estado – concretizada através de cortes brutais no investimento
público – tem tido impacto brutal na degradação da qualidade pedagógica; na desvalorização curricular e na
fragilização da formação da cultura integral do indivíduo; na desvalorização socio laboral da profissão docente
e no recurso ilegal à precariedade na contratação dos professores, funcionários e técnicos; no favorecimento
da escola privada e do “negócio” da educação.
Importa referir que só entre 2011 e 2014, o Governo PSD/CDS-PP aplicou um corte no financiamento
público ao Ensino Básico e Secundário de cerca de 1330 milhões de euros, uma redução percentual de
23,6%.
Nos últimos anos, medidas desenvolvidas pelo anterior Governo PS têm sido agravados pelo atual
Governo PSD/CDS com o objetivo de degradação das condições materiais e humanas de funcionamento e do
próprio papel da Escola Pública. De forma particularmente grave, e num período de tempo relativamente curto,
foram implementadas várias medidas com forte impacto na sua desvalorização: mutilação da gestão
democrática das escolas; criação de mega-agrupamentos; implementação do ensino dual e vocacional;
aumento do número de alunos por turma; reorganização e desvalorização curricular; despedimento de
milhares de professores, agravamento da precariedade, fragilização do Estatuto da Carreira Docente,
imposição de uma Prova de acesso à profissão; discriminação e segregação de milhares de alunos com
necessidades especiais e degradação da ação social escolar.
Como exemplo desta política de desresponsabilização do Estado e degradação da Escola Pública
podemos também referir a transferência de competências para as autarquias, criando uma situação de
desigualdade objetiva; a promoção dos “Contratos de Autonomia” (atualmente são cerca de 200 escolas)
indexando o financiamento aos resultados obtidos nos exames nacionais e reforçando os poderes do diretor; o
primado dos exames nacionais e desvalorização da avaliação contínua como um método mais eficaz de
avaliação dos alunos; o despedimento de mais de 25 000 professores desde 2011; a tentativa de destruição
do Concurso Nacional de Colocação de Professores e a generalização da “Oferta de Escola”.
Para além disto, à margem da LBSE o Governo PSD/CDS-PP criou vias paralelas de conclusão da
escolaridade obrigatória, direcionando os estudantes em função das suas condições socioeconómicas para o
ensino dual ou cursos de formação geral, negando objetivamente a igualdade de oportunidades e a
possibilidade de acesso ao ensino superior adequadas.
Em vez de trabalhar para a atenuação e eliminação das assimetrias regionais e permitir um maior
desenvolvimento regional, o Governo PSD/CDS-PP encerra escolas públicas e financia escolas privadas, não
Página 21
12 DE SETEMBRO DE 2014
21
permitindo a abertura de turmas no público mas autorizando e financiando a sua abertura no privado.
O PCP defende que, para que a Escola Pública consagrada na Constituição e na Lei de Bases seja uma
realidade, é indispensável assegurar os meios materiais e humanos adequados ao cumprimento do seu papel,
e num contexto de alargamento da escolaridade obrigatória para os 12 anos seriam necessários ainda mais
recursos e não a sua redução. Para o PCP a degradação da Escola Pública representa a degradação do
próprio regime democrático, a negação da igualdade de oportunidades, o que contribui para o agravamento
das desigualdades económicas e sociais.
Assim como no passado, agora no presente e no futuro o Partido Comunista Português não abdicará de
defender a Escola Pública como um pilar do regime democrático, instrumento fundamental para o
desenvolvimento económico e social do país, e por isso entende que é essencial a garantia das condições
materiais e humanas adequadas ao cumprimento do seu papel.
Assim, a Assembleia da República, nos termos regimentais e constitucionais em vigor, recomenda
ao Governo que:
1- Tome as necessárias medidas para que o Orçamento do Estado de 2015 contemple um aumento da
verba atribuída à Educação e à Escola Pública, incluindo o Ensino Superior e Ciência;
2- Planifique as medidas necessárias para os próximos anos, no sentido de assegurar um crescimento
sustentado do orçamento para a educação e ensino superior públicos até que seja atingido um investimento
por aluno com vista à plena satisfação das necessidades do país;
3- Suspenda qualquer medida que implique a redução de pessoal afeto ao sistema educativo, em qualquer
grau de ensino, e promova a concretização de concursos de colocação de profissionais docentes e não
docentes, de professores e técnicos de educação especial, de psicólogos e profissionais das ciências da
educação de modo a que as necessidades permanentes das escolas sejam supridas;
4- Assegure a realização de concurso de recrutamento regular para supressão das necessidades
permanentes das escolas, de serviço docente e não docente, e regularize a situação de vagas duradouras
classificadas como transitórias;
5- Tome as necessárias medidas para que o Sistema de Ensino não perca um único professor ou
funcionário para os contingentes de mobilidade especial, na medida em que subsistem carências nas Escolas
e persistem índices de abandono e insucesso graves;
6- Revogue a “Prova de Avaliação Conhecimentos e Capacidades” prevista no Decreto-Regulamentar n.º
3/2008, de 21 de janeiro, alterado pelo Decreto-Regulamentar n.º 7/2013, de 23 de outubro, e garanta um
regime remuneratório justo para docentes e não docentes;
7- Assegure o cumprimento cabal dos direitos dos alunos com necessidades especiais e garanta uma
Escola Pública Inclusiva;
8- Assegure que a existência de contratos de associação radique no princípio da supletividade, adequando
no curto e médio prazo a rede pública às necessidades das populações e do território;
9- Diminua o número de alunos por turma em todos os ciclos de ensino, assegurando o ensino
individualizado;
10- Reforce a ação social escolar e os apoios diretos e indiretos aos alunos;
11- Planifique, até ao início do próximo ano letivo, a modernização do Parque Escolar, identificando
prioridades e faseamentos e reiniciando de imediato todas as obras interrompidas mas já iniciadas no âmbito
da intervenção da Parque Escolar, EPE, prevendo nesse plano as condições e prazos de extinção da Parque
Escolar, EPE.
Assembleia da República, 11 de setembro de 2014.
Os Deputados do PCP, Rita Rato — Diana Ferreira — Paulo Sá — João Oliveira — Paula Santos —
António Filipe — Carla Cruz — João Ramos — Bruno Dias — David Costa — Miguel Tiago.
———
Página 22
II SÉRIE-A — NÚMERO 168
22
PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 1107/XII (3.ª)
REFORMULA O SISTEMA DE INCENTIVOS QUE EXISTEM AOS OCS LOCAIS E REGIONAIS,
GARANTINDO UMA DISTRIBUIÇÃO MAIS EQUITATIVA E MAIS ADEQUADA À NOVA REALIDADE
TECNOLÓGICA E ECONÓMICA DA COMUNICAÇÃO SOCIAL, NOMEADAMENTE ATRAVÉS DA
CRIAÇÃO DE NOVOS CANAIS DE APOIO À PROFISSIONALIZAÇÃO E QUALIFICAÇÃO DOS ÓRGÃOS
DESTE SETOR
A comunicação social local e regional desempenha um papel fundamental no reforço dos laços
comunitários, no exercício da cidadania e da intervenção política, na promoção e na dinamização da atividade
económica, na difusão do pulsar da vida das respetivas Comunidades.
No mundo globalizado, é um fator essencial de preservação das identidades e é também fator de
enraizamento, porque liga as comunidades à sua terra de origem.
Ao longo das décadas, tem dado um contributo decisivo na promoção da coesão regional, bem como tem
sido um estímulo à descentralização. Fatores essenciais ao desenvolvimento harmonioso do país.
Tem tido um papel altamente relevante, não só no âmbito territorial a que naturalmente diz respeito, mas
também na informação e contributo para a manutenção de laços de autêntica familiaridade entre gentes locais
e as comunidades locais e as comunidades de emigrantes dispersas pelas partes mais longínquas.
Tem sido, simultaneamente, um veículo de informação; um meio de promoção e mobilização local; um
meio de chamada de atenção para os anseios e projetos locais; um elo social e identitário, um elemento
socializador e agregador; um amplificador do espaço público local.
Cumpre várias funções: informar, formar, entreter… Entre todas essas funções, a mais importante e
característica é a função informativa e utilitária, na medida em que a comunicação social regional e local é ou
deve ser, em primeiro lugar, um útil veículo de informação.
Cumpre ainda a função de produção simbólica comunitária. Este papel é o que mais contribui para a
integração, socialização e aculturação dos membros da comunidade.
Funciona muitas vezes como veículo de petição e de representação ou de sectores da comunidade ou de
toda a comunidade perante terceiros, sobretudo quando se envolve num jornalismo de causas.
Como não podia deixar de ser, é também um espaço simbólico onde se desenvolvem competições,
principalmente entre os detentores do poder político local.
Nas últimas décadas, a comunicação social local e regional mudou, soube modernizar-se. Adotou modelos
empresariais mais dinâmicos e consentâneos com as novas realidades do nosso tempo. Profissionalizou-se e
tornou-se um suporte informativo e publicitário de grande potencial.
Nos tempos que vivemos, fortemente marcamos pelos media, é imperioso encontrar um modelo que
permita que as empresas de comunicação social local e regional ganhem dimensão e conquistem a
capacidade de potenciar o tecido empresarial e a própria região em que se inserem.
Apesar da sua importância, a verdade é que, ao longo das últimas décadas tem sido pouco contemplada –
por vezes, tem sido mesmo esquecida.
Esta situação não pode ser, necessariamente, uma fatalidade. Bem pelo contrário, a coesão nacional, o
desenvolvimento e a salvaguarda da identidade de cada uma das regiões exige o envolvimento e o contributo,
não só do Governo, mas também do poder local.
Neste sentido, e ao abrigo das disposições legais e regimentais aplicáveis, os Deputados abaixo assinados
apresentam o presente Projeto de Resolução que recomenda ao Governo que:
Reformule o sistema de incentivos que existem aos OCS locais e regionais garantindo uma
distribuição mais equitativa e também mais adequada à nova realidade tecnológica e económica da
comunicação social, nomeadamente, através da criação de novos canais de apoio à profissionalização,
qualificação e inovação nos órgãos deste setor.
Palácio de São Bento, 10 de setembro de 2014.
Página 23
12 DE SETEMBRO DE 2014
23
Os Deputados, Mónica Ferro (PSD) — Nuno Magalhães (CDS-PP) — Rosa Arezes (PSD) — Maria
Manuela Tender (PSD) — Sérgio Azevedo (PSD) — Raúl de Almeida (CDS-PP) — Paulo Almeida (CDS-PP)
— Hélder Amaral (CDS-PP) — Maria Da Conceição Caldeira (PSD).
———
PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 1108/XII (3.ª)
GARANTE O DIREITO AOS CUIDADOS DE SAÚDE HOSPITALARES NA PENÍNSULA DE SETÚBAL E
SALVAGUARDA O SERVIÇO NACIONAL DE SAÚDE
O Governo PSD/CDS-PP tem demonstrado, das mais diversas formas, que pretende fragilizar os serviços
públicos para obrigar os cidadãos a recorrer ao setor privado, gerando brutais negócios, para grandes grupos
económicos, em torno daquilo que são os direitos mais elementares dos cidadãos. O setor da saúde, por via
de um desinvestimento muito significativo no setor público, tem sido bem exemplificativo desta realidade. A
península de Setúbal, quer ao nível dos cuidados primários de saúde, quer ao nível dos cuidados hospitalares,
sofre hoje os efeitos desta opção ideológica de um Governo que percorre o caminho da destruição do serviço
nacional de saúde.
As unidades hospitalares da península de Setúbal têm revelado continuados riscos de rutura de serviços,
pondo em causa o direito à saúde dos cidadãos. Faltam profissionais, falta material (mesmo material básico de
higiene), faltam valências, faltam, portanto, condições de funcionamento e de garantia de qualidade dos
serviços de saúde hospitalares.
Não fora a dedicação dos profissionais de saúde e as coisas seriam ainda mais complicadas. Mas mesmo
a dedicação de médicos, enfermeiros e outros profissionais, não consegue fazer milagres. Se estivermos
conscientes que o Hospital Garcia de Orta foi construído para servir cerca de 150 000 cidadãos e que serve,
afinal, aproximadamente 400 000 cidadãos, torna-se fácil perceber que o risco de rutura é constante. Para
além do mais, se tivermos consciência da quantidade de pessoas que não tem médico de família na península
de Setúbal, bem como da redução de horários de funcionamento e de urgências nos centros de saúde,
fragilizando a resposta dos cuidados primários de saúde, determinada pelo Governo, percebemos por que
razão mais cidadãos se deslocam legitimamente às unidades hospitalares em busca de soluções para os
problemas de saúde que os afetam. E, nestas circunstâncias, para desincentivar os utentes da procura dos
serviços públicos e aliciá-los à busca de serviços privados de saúde, o Governo garante aos cidadãos longas
filas e horas de espera em urgências, longas listas e tempos de espera em consultas, exames, cirurgias e
outros tratamentos, e, para além disso, a cobrança de elevadas taxas moderadoras! É uma política
absolutamente inaceitável!
Repare-se que a alta sobrecarga com que se confronta o Hospital Garcia de Orta levou, por via de estudos
sobre as necessidades na área da saúde, à conclusão que a construção do Hospital do Seixal era um
imperativo e, consequentemente, uma prioridade. A opção do Governo foi, contudo, a de não avançar com a
construção deste Hospital!
Como se não bastasse esta incúria inaceitável do Governo, este ainda fez publicar a portaria 82/2014 que,
a pretexto de uma dita reorganização e categorização dos estabelecimentos do Serviço Nacional de Saúde,
veio retirar valências e especialidades ao Centro Hospitalar Barreiro/Montijo (perde, por exemplo, as
especialidades de cirurgia plástica e reconstrutiva) e ao Centro Hospitalar de Setúbal (perde, por exemplo, as
especialidades de cirurgia plástica e imunoalergologia), concentrando-as no Hospital Garcia de Orta,
sobrelotando mais esta unidade hospitalar! Mas mais: como a referida portaria condiciona a existência de
outras especialidades à rede de referenciação e a outros critérios, estas unidades hospitalares podem ainda
vir a perder outras especialidades como cardiologia, gastroenterologia, infeciologia, oftalmologia, oncologia,
otorrinolaringologia, pneumologia, radioterapia (Barreiro/Montijo) ou endocrinologia, gastroenterologia,
hematologia, infeciologia, nefrologia, oftalmologia, oncologia, otorrinolaringologia, pneumologia, urologia
(Setúbal). Estas perdas decorrem, ou podem vir a decorrer, da integração destes Centros Hospitalares no
Grupo I da classificação que a portaria estabelece. De resto, esse Grupo I não prevê a especialidade de
obstetrícia pelo que num futuro próximo podem perder também o serviço de maternidade. De resto, o Governo
Página 24
II SÉRIE-A — NÚMERO 168
24
ao responder a esta preocupação, refere que «atualmente» não se prevê o encerramento dessas
maternidades, mas não garante que esse não seja um objetivo.
Já vimos que a concentração de especialidades e valências no Hospital Garcia de Orta (classificado no
Grupo II) comporta enormes transtornos nos serviços e na garantia de qualidade nos cuidados prestados aos
doentes. Porém, este hospital perde também a especialidade de cirurgia pediátrica, concentrada em Lisboa
(na região de Lisboa e Vale do Tejo). A partir do que aqui é referido, percebe-se, com clareza, que a opção do
Governo é de promover um considerável afastamento dos serviços de saúde em relação às populações e que
esse distanciamento é um fator de desagregação do Serviço Nacional de Saúde, dificultando o acesso dos
doentes às unidades de saúde e reduzindo significativamente serviços hospitalares.
Esta (des)organização dos serviços hospitalares tem também sérias implicações para os profissionais de
saúde, promovendo despedimentos e obrigando a uma mobilidade forçada. Estamos a falar de um setor que
tem graves carências de profissionais. Só no Hospital Garcia de Orta faltam aproximadamente 80 médicos,
face às necessidades sentidas. Os Centros Hospitalares Barreiro/Montijo e de Setúbal confrontam-se também
com este problema, e não apenas de médicos, mas também de outros profissionais. Por exemplo, no hospital
do Barreiro já houve mesmo uma situação de rutura em serviço de urgência, tendo havido necessidade de
deslocar doentes para outros hospitais, por total incapacidade de resposta.
A contratação de profissionais de saúde através de empresas de trabalho temporário é também uma
realidade. Subcontratados, a recibo verde, para satisfazerem necessidades permanentes dos serviços de
saúde, como há pouco tempo de verificou no hospital Garcia de Orta. É a realidade a desmentir as afirmações
do próprio Ministro da Saúde que insiste em dizer que tudo vai bem, onde muito vai mal! E com custos para o
Serviço Nacional de Saúde.
Em suma, e face ao que anteriormente ficou descrito e a muito mais que tem sido denunciado,
inclusivamente pelo PEV, o Grupo Parlamentar Os Verdes acusa o Governo de estar, com a sua política, a
desqualificar os cuidados de saúde hospitalares na península de Setúbal. Estamos a falar de uma região que é
desfavorecida em termos de camas hospitalares, de taxa de mortalidade por doenças cardiovasculares, de
incidência de doenças infeciosas, entre outros indicadores.
De modo a gerar uma consciencialização da realidade que está criada e a inverter esta situação,
garantindo o acesso à saúde à população da península de Setúbal, direito constitucionalmente consagrado, o
Grupo Parlamentar Os Verdes apresente o seguinte Projeto de Resolução:
A Assembleia da República, ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, delibera
fazer as seguintes recomendações ao Governo, relativas às unidades hospitalares da península de Setúbal:
1. Revogar a Portaria n.º 82/2014, de 10 de abril, que inclui os Centros Hospitalares Barreiro/Montijo e de
Setúbal no Grupo I e o Hospital Garcia de Orta no Grupo II.
2. Promover a o envolvimento e a participação ativa dos órgãos autárquicos em qualquer processo de
reorganização da rede hospitalar, por serem os órgãos mais conhecedores e próximos do território e das
necessidades das populações.
3. Garantir as valências e especialidades (eliminadas ou colocadas em risco pelas referida portaria) nos
hospitais em causa.
4. Proceder a um levantamento exaustivo do material em falta e necessário para as resposta que se impõe
aos utentes.
5. Contratar profissionais de saúde em número adequado às necessidades, abrindo concurso público para
a sua contratação e integração na carreira.
6. Cumprir o protocolo, de agosto de 2009, para construção do Hospital do concelho do Seixal,
adjudicando o projeto de execução.
Assembleia da República, 12 de setembro de 2014.
Os Deputados do Os Verdes, Heloísa Apolónia — José Luís Ferreira.
A DIVISÃO DE REDAÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL.