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9 DE SETEMBRO DE 2015 23

assinalado, e que releva da ordem da observação empírica - os titulares de cargos políticos, aos quais são

conferidos poderes de decisão que afetam a comunidade, encontram-se em situação fáctica de vantagem

quanto à possibilidade de captura, em proveito próprio ou alheio, de bens que a essa mesma comunidade

pertenceria fruir -, reunidas estão as condições para que se não possa sem mais «aplicar» a este tipo de crime

todas as ponderações que foram feita aquando da análise do enriquecimento injustificado do «cidadão comum».

Disse-se, a propósito deste último tipo de crime, que a formulação lassa da incriminação não permitia que se

divisasse nela a prossecução de um qualquer bem jurídico que fosse digno de tutela penal; e que, se assim era

em geral, também o seria em relação àquele particular bem que o legislador, no n.º 2 do artigo 335.º-A –

textualmente reproduzido no n.º 2 do artigo 27.º-A – invocava como sendo o que, a seus olhos, justificaria a

incriminação. Ora, é esta afirmação, relativa à manifesta impossibilidade de discernir no tipo incriminador o bem

que é digno de tutela penal, que não pode ser repetida face à incriminação resultante do artigo 27.º-A. Seja pelo

acervo de deveres que impende sobre o titular de cargos políticos e que não impende sobre o cidadão comum,

e que se traduz na condição especial em que aquele se encontra de desvelo constante de toda e qualquer

variação que ocorra em património que seja seu; seja pela posição fáctica em que o exercício de poderes

públicos o coloca, posição essa que favorece empiricamente a ocorrência da hipótese de captura para fins

privados de bens comuns, a verdade é que, no que lhe diz respeito [ao titular de cargo político], a verificação da

mera «incompatibilidade» entre o património «tido» e o «declarado» adquire, para o direito, um sentido

qualitativamente diverso daquele que vimos poder ser atribuído à mesma «incompatibilidade», quando prevista

no tipo incriminatório constante do artigo 335.º-A. E, dentro desse diverso sentido, não pode manifestamente

excluir-se a hipótese do estabelecimento, pela ordem jurídica, de uma relação de articulação entre o «facto»

incriminado - a discrepância entre as duas grandezas - e o bem valioso que se quis proteger. A previsão,

estabelecida pelo legislador, de uma atual ou potencial relação de «danosidade» ou de «ofensividade» entre

uma coisa e outra - entre a discrepância detetada entre o que se tem e o que se declara ou deva declarar, por

um lado, e a capacidade que essa discrepância terá para erodir o bem jurídico valioso que é a confiança no

Estado de direito e na democracia - não é coisa que, no contexto do artigo 27.º-A, apareça destituída de qualquer

credenciação racional. E esta é uma conclusão à qual o Tribunal, que tem neste contexto um controlo limitado

pela margem de liberdade conformadora do legislador (ponto 9), não pode deixar de estar vinculado.

6 – No entanto, não basta, para que se legitime constitucionalmente uma nova incriminação, que seja ainda

discernível num certo «tipo incriminador» um bem jurídico digno de tutela penal, ou que, pelo menos - em

formulação mais adequada ao âmbito de controlo que é próprio do Tribunal -, seja impossível sustentar-se,

perante certa incriminação, que os termos em que ela é feita não permite, manifestamente, que se divise um

qualquer bem que seja dotado daquela dignidade. Imprescindível é ainda, nos termos do disposto no n.º 2 do

artigo 18.º da CRP, que, perante cada nova incriminação que é decretada, um tal bem se mostre ainda carente

ou precisado de tutela penal. Ou por outras palavras, usadas aliás no Acórdão: não basta que em cada nova

incriminação se divise a intenção de preservar um valor social que, de acordo com a Constituição, possa ser

tido como merecedor do mais elevado grau de proteção jurídica; é ainda necessário que o fim almejado - a

preservação de tal valor - não possa ser realizado por outro meio de política legislativa que não aquele que se

traduz no recurso à nova intervenção penal.

Ora a indeterminação, que permanece na construção típica do crime de enriquecimento injustificado dos

titulares de cargos políticos, não permite que se conclua que, através dele, se prossegue ainda um bem jurídico

que seja «carente» ou «precisado» de tutela penal. Perante a ausência de uma qualquer indicação precisa de

qual seja, no caso, o «comportamento» punível, fica-se sem saber o que acrescenta o novo tipo incriminador ao

conjunto de normas já existentes, e já dispostas a prosseguir o mesmo fim valioso que o artigo 27.º-A se propõe

realizar. E sem que se saiba o que acrescenta a nova intervenção penal ao conjunto de medidas já previstas

para a preservação da confiança no Estado de direito democrático não pode afirmar-se a sua necessidade.

Com efeito, o artigo 3.º da Lei 4/83, de 2 de abril, já prevê, em relação aos titulares de cargos políticos,

consequências para a não apresentação das declarações devidas ou para a apresentação de declarações

falsas. O novo tipo incriminador, ao considerar a incompatibilidade do património adquirido, possuído ou detido

por tais titulares não só com os bens e rendimentos por si já declarados, mas também com aqueles que os

mesmos titulares devessem declarar, revela-se por isso, inadequado a reforçar a tutela atualmente já

dispensada ao bem jurídico-penal visado, nomeadamente através do sancionamento autónomo do

incumprimento do dever especial de declaração a que se encontram obrigados os titulares de cargos políticos.

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