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II SÉRIE-A — NÚMERO 184 46

Nada autoriza, pois, a admitir uma eventual extensão do âmbito da ressalva final do n.º 4 do artigo 34.º - para

a qual, aliás, o intérprete, neste contexto concreto, não dispõe de instrumentos metodológicos adequados.

De facto, a referência ao processo criminal não é apenas uma indicação teleológica, mas também a

localização da restrição à proibição de ingerência numa área estruturada normativamente em termos de oferecer

garantias bastantes contra intromissões abusivas. Ao autorizar a ingerência das autoridades públicas nos meios

de comunicação apenas em matéria de processo penal, e não para quaisquer outros efeitos, a Constituição quis

garantir que o acesso a esses meios, para salvaguarda dos valores da “justiça” e da “segurança”, fosse efetuado

através de um instrumento processual que também proteja os direitos fundamentais das pessoas. Porque a

ingerência nas comunicações põe em conflito um direito fundamental com outros direitos ou valores

comunitários, considerou-se que a restrição daquele direito só seria autorizada para realização dos valores da

justiça, da descoberta da verdade material e restabelecimento da paz jurídica comunitária, os valores que ao

processo criminal incumbe realizar. Assim, remeteu para o legislador processual penal a tarefa de “concordância

prática” dos valores conflituantes na ingerência nas comunicações privadas: por um lado, a tutela do direito à

inviolabilidade das comunicações; por outro, a viabilização da justiça penal. Na verdade, como escreve

Figueiredo Dias, «o processo penal é um dos lugares por excelência em que tem de encontrar-se a solução do

conflito entre as exigências comunitárias e a liberdade de realização da personalidade individual» (cfr. Direito

Processual Penal, Coimbra Editora, 1974,pág. 59).

Assim, a referência ao processo criminal, encontrando-se estreitamente associada à Constituição, onde se

detetam normas diretamente atinentes a essa matéria e que condensam os respetivos princípios estruturantes

(artigo 32.º) – a ponto de se falar numa constituição processual criminal –, tem um sentido hermenêutico

inequívoco, não podendo deixar de ser entendido como a «sequência de atos juridicamente preordenados

praticados por pessoas legitimamente autorizadas em ordem à decisão sobre a prática de um crime e as suas

consequências jurídicas».

Nesse plano, o artigo 34.º, n.º 4, ao delimitar a restrição à matéria de processo penal tem também outras

consequências com reflexo no estatuto constitucional do arguido.

Desde logo, a realização da justiça, não sendo um fim único do processo criminal, apenas pode ser

conseguida de modo processualmente válido e admissível e, portanto, com o respeito pelos direitos

fundamentais das pessoas que no processo se veem envolvidas. O respeito desses direitos conduz, por

exemplo, a considerar inadmissíveis certos métodos de provas e a cominar a nulidade de «todas as provas

obtidas mediante tortura, coação, ofensa da integridade física ou moral da pessoa, abusiva intromissão na vida

privada, no domicílio, na correspondência ou nas telecomunicações» (cfr. artigo 32.º, n.º 8, da CRP). A nulidade

das provas, com a consequente impossibilidade da sua valoração no processo, quando sejam obtidas por

ingerência abusiva nas comunicações, corresponde assim a uma garantia do processo criminal e resulta de ter

havido acesso à informação fora dos casos em que a própria Constituição consente a restrição ao princípio da

inviolabilidade dos meios de comunicação privada.

Por outro lado, a referência ao processo criminal implica que a intervenção restritiva careça de prévia

autorização judicial. Sendo o processo criminal uma forma heterocompositiva através da qual se realizam as

funções de jurisdictio referidas à atuação de pretensões baseadas em normas públicas de direito criminal, exige-

se a intervenção de um órgão qualificado para essas funções (cfr. artigo 202.º da CRP). Embora se não trate de

um caso em que a reserva do juiz ou a reserva de primeira decisão se encontre especialmente individualizada

na Constituição (cfr. Acórdãos n.os 4/06 e 426/2005), como sucede em matéria de privação de liberdade (artigos

27.º, n.º 2, e 28.º, n.º 1), entrada no domicílio sem consentimento do titular (artigo 34.º, n.º 2), inibição do poder

paternal (artigo 36.º, n.º 6), liberdade de associação (artigo 46.º, n.º 2) e regularidade e validade dos atos do

processo eleitoral (artigo 113.º, n.º 7), não pode deixar de reconhecer-se que a reserva absoluta do juiz tende a

afirmar-se quando não existe qualquer razão ou fundamento material para a opção por um procedimento não

judicial de resolução de litígio (Gomes Canotilho, ob. cit., pág. 663). O que é particularmente evidente quando

se trate de questões que se reportam ao núcleo duro da função jurisdicional, como é o caso das competências

exclusivas do juiz de instrução (artigos 268.º e 269.º do Código de Processo Penal), em que releva a prática de

atos que afetam direitos, liberdades e garantias das pessoas (cfr. Vieira de Andrade, “Reserva do juiz e

intervenção ministerial em matéria de fixação da indemnizações por nacionalizações”, Scientia ivridica, Tomo

XLVII, n.os 274-276, julho/dezembro, 1998,pág. 225). Esse é seguramente o caso quando está em causa a

interceção, gravação ou registo de comunicações (artigo 269.º, n.º 1, alínea c), do CPP).

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