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II SÉRIE-A — NÚMERO 70 38

substratos neurológicos que geram a consciência. Animais não humanos, incluindo todos os mamíferos e as

aves, e muitas outras criaturas, incluindo polvos, também possuem esses substratos neurológicos".

A teoria da evolução de Charles Darwin em 1859 veio confirmar que o homem evoluiu de espécies de animais

irracionais, pondo em causa a crença religiosa de que o homem teria sido criado por Deus. Darwin concluiu que

não existem diferenças acentuadas entre o ser racional e o não racional, quer a nível emocional, quer funcional.

Lamentavelmente, a teoria da evolução ainda é hoje alvo de resistência por parte de algumas sociedades, que

submetem animais a maus tratos, abandono, tortura e morte. Continua a ser a teoria antropocêntrica, errada e

ultrapassada, que permite a descriminação, a violência, a utilização do animal irracional na qualidade de objeto,

a dominar países cientificamente pouco evoluídos.

Esta teoria antropocêntrica, apoiada há mais de 2000 anos pelas mais diferentes culturas ocidentais, tem

vindo a ser progressivamente alvo de abandono. A ciência aponta para que todos os seres vivos sensíveis

devam ser titulares de direitos legalmente reconhecidos.

Na Constituição da República Portuguesa encontra-se consagrado o princípio da igualdade — o que é igual

deve ser tratado de forma igual e o que é diferente de forma diferente. Mas os seres com sistema nervoso central

não são todos tratados da mesma maneira. Falta a preocupação, respeito, igualdade e segurança por quem

sente prazer e sofrimento. E é esta sensibilidade que, em primeira linha, deve ser salvaguardada por lei,

evitando-se atitudes especistas.

A diferenciação de níveis ou formas de inteligência dos animais não humanos, que constitui, em suma, a

base da discriminação por parte do ser humano, não pode ser utilizada como argumento para que aqueles não

sejam tratados com respeito.

Em 1988, pela primeira vez, a Igreja Católica Romana, através de uma encíclica do Papa João Paulo II, fez

referência à necessidade do ser racional proteger o ser irracional. A mentalidade de um povo é o que faz atrasar

o seu desenvolvimento. Muitos anos foram volvidos e a teoria antropocêntrica vai sucumbido diariamente.

Assim, não podem os animais não humanos continuar a ser equiparados na lei civil portuguesa a coisas. O

animal não é um ser inanimado, que pode ser abandonado, torturado, espezinhado, estropiado, morto. O animal

tem o direito de ver os seus valores, direitos e princípios protegidos pelo ser racional. É necessário criar uma

figura jurídica com uma tutela própria e específica para os animais não humanos.

Urge por isso alterar a ideologia erradamente implementada, contribuindo assim para a preservação de todas

as espécies animais, atribuindo-lhes direitos e garantias que permitam a sua defesa.

A Declaração Universal dos Direitos dos Animais proclamada em 1978 pela UNESCO define, no seu âmago,

os direitos e princípios dignos de proteção a nível mundial, direitos, muitos deles, inatos, como o direito à vida e

o direito de viver em meio que reúna as condições ideias para a sua sobrevivência e pleno desenvolvimento.

Aos seres não humanos deve ser reconhecida a titularidade de vários direitos fundamentais que devem ser

defendidos, em primeira linha, pelo Estado português. Só assim, os direitos podem ser salvaguardados na sua

plenitude.

A nível mundial, ainda não existe uma igualdade de critérios referente à natureza jurídica dos animais, mas

é patente que a consciência de países espalhados pelos cinco continentes tem vindo a ser alterada. Trata-se

de uma preocupação alicerçada em argumentos científicos, no princípio da igualdade e na humanização. A

proteção e evolução da humanidade está intrinsecamente relacionada com a proteção e auxilio à natureza, à

forma como esta é tratada e, como parte dela integrante, aos cuidados prestados aos animais e à defesa dos

seus interesses.

A Áustria foi o primeiro país a aprovar um estatuto jurídico do animal em 1988, tendo incluído o sujeito jurídico

animal3 no conceito extensivo de “coisa”. Com efeito, dispõem o artigo 285.º-A do código civil austríaco que as

normas dedicadas às “coisas” são aplicáveis aos animais, em tudo o que não contrarie o regime legislativo

especial a estes aplicáveis. Entre outras disposições deste diploma, foi consagrado o dever de indemnização a

quem lesar a integridade física de um animal. Não foi necessário personificar o animal, isto é, não lhe foi atribuída

personalidade jurídica, mas foi-lhe garantido o direito a um regime jurídico especial, que protege os seus

interesses e a sua sensibilidade, na qualidade de ser vivo que é, na qualidade de sujeito jurídico.

O regime jurídico alemão já há muitos anos que consagrou a proteção da natureza nas suas normas, tendo,

em 1990, procedido ao aditamento do artigo 90.º-A no código civil, que veio determinar o que já se tinha

3 E não a coisa.

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