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10 DE DEZEMBRO DE 2018

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alterou. Em 2015, foram enviados para o cárcere 40% dos agressores condenados. No ano anterior, a

percentagem ficou em 39%.

Destacar ainda que considerando o Relatório Anual de Segurança Interna referente ao ano de 2017,

depreende-se que o crime de violação foi um dos únicos crimes que subiu comparativamente ao ano anterior.

Isabel Ventura, Investigadora, que na elaboração da respetiva tese de doutoramento procedeu à análise de

centenas de acórdãos relacionados com crimes de foro sexual, havendo outrossim, estudado a história deste

tipo de crimes na legislação portuguesa desde a Idade Média, enfatiza que a alta frequência de penas suspensas

consubstancia uma mera decorrência dos traços históricos que desembocam na constante desvalorização

destes por parte dos Tribunais.

Como exemplo desta desconsideração histórica deste tipo de crimes, sublinha que «até 1982, se uma mulher

virgem com pouca idade fosse violada e o agressor se casasse com ela o procedimento criminal cessava»,

considerando-se que, o que a mulher perdia com a violação era o acesso a um bom casamento e com esse

prejuízo reparado, já não fazia sentido punir o agressor.

Sem qualquer desprimor pelos agentes envolvidos nas decisões expostas infra, trazemos à colação o teor

de uns singelos três acórdãos (e respetivos fundamentos) – existem muitos mais com argumentos similares –

dos Tribunais portugueses neste âmbito:

1 – Absolvição de violador de menor de 14 anos

Argumento utilizado pelo Tribunal do círculo de Santa Maria da Feira (1997): «Não gritou durante as relações

sexuais.» Acrescenta o coletivo que «o que se pune aqui não é o crime de violação (adlatere diga-se) que esse

facto – a ausência de gritos – implica a inexistência de elementos do crime de violação (…)».

Neste caso, o Tribunal chega a criticar a menor por esta não ter posto termo à convivência com o arguido,

como também pelo facto de não ter agido «de forma séria e resoluta» com vista a «evitar os avanços do vizinho».

2 – Violação de rapariga que anotou a matrícula do automóvel do violador

Argumento utilizado pelo Tribunal da Relação do Porto (2007): «Deve ainda dizer-se que o facto de a

ofendida, antes de abandonar o lugar onde ficou livre do arguido, ter anotado a matrícula do automóvel daquele,

pela presença de espírito que revela, é pouco compatível com um grande abalo psicológico.

E quanto a sofrimento físico provou-se apenas que o arguido ao introduzir o seu pénis no ânus da ofendida

provocou a esta dores, que a levaram a gritar. Mas essas dores, mesmo que tenham sido intensas, o que nem

está provado, foram pouco mais que instantâneas e não queridas pelo arguido, pois, ao verificar que com a

introdução do pénis no ânus da ofendida lhe causava dores, logo pôs termo a esse ato, retomando a cópula.»

3 – Psiquiatra absolvido do crime de violação sobre grávida de 8 meses

Fundamento utilizado pelo Acórdão do Tribunal da Relação do Porto (2011): «Caso não ocorra 'resistência'

a passividade da vítima é suscetível de ser, erradamente, tomada pelo agressor como consentimento, o que

excluiria o dolo, não sendo o crime de violação do artigo 164.º n.º 1 punível a título de negligência.

Se o agente atua convencido de que a objeção da vítima – máxime, porque ela se exprime, durante todo o

processo, apenas por palavras, mas não por qualquer resistência corporal – não é séria, o dolo não deve ser

afirmado» (sublinhado nosso).

Os exemplos explicitados representam uma manifestação clara de uma conjuntura, atestada pelos dados

históricos, assente numa hipervalorização dos crimes contra a propriedade, em detrimento de outros crimes,

como é o caso flagrante dos crimes de cariz sexual.

Conceição Cunha, professora de Direito Penal na Universidade Católica, a qual versa o seu estudo sobre os

crimes sexuais, assevera que os Tribunais exageram na frequência de aplicação de penas suspensas –

«concordo com a privação da liberdade como último recurso. Porém, face a crimes graves, como é claramente

o caso de crimes sexuais, que criam grave instabilidade na comunidade, danos dificilmente reparáveis (por

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