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Sexta-feira, 22 de março de 2019 II Série-A — Número 78
XIII LEGISLATURA 4.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2018-2019)
S U M Á R I O
Projetos de Lei (n.os 1181 a 1183/XIII/4.ª):
N.º 1181/XIII/4.ª (BE) — Cria a prestação patrimonial sobre os ativos por impostos diferidos abrangidos pelo Regime Especial aprovado pela Lei n.º 61/2014, de 26 de agosto. N.º 1182/XIII/4.ª (PAN) — Privilegia o modelo de residência alternada sempre que tal corresponda ao superior interesse da criança. N.º 1183/XIII/4.ª (BE) — Protege as crianças que testemunhem crimes de violência doméstica e torna obrigatória a recolha de declarações para memória futura no decorrer do inquérito (sexta alteração ao regime jurídico aplicável à prevenção da violência doméstica e à proteção e à assistência das suas vítimas).
Projetos de Resolução (n.os 2055, 2059 e 2060/XIII/4.ª): N.º 2055/XIII/4.ª — Recomenda ao Governo que clarifique procedimentos para captar candidatos lusodescendentes e emigrantes para as instituições de ensino superior portuguesas: — Alteração do título e do texto do projeto de resolução. N.º 2059/XIII/4.ª (BE) — Recomenda ao Governo a proteção da rola-comum através de uma moratória temporária à sua caça. N.º 2060/XIII/4.ª (PSD) — Recomenda ao Governo Português a elaboração de um estudo epidemiológico e/ou ambiental para avaliar os efeitos das atividades económicas, nomeadamente, industriais, bem como dos passivos ambientais existentes na aldeia de Paio Pires, concelho do Seixal.
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PROJETO DE LEI N.º 1181/XIII/4.ª
CRIA A PRESTAÇÃO PATRIMONIAL SOBRE OS ATIVOS POR IMPOSTOS DIFERIDOS ABRANGIDOS
PELO REGIME ESPECIAL APROVADO PELA LEI N.º 61/2014, DE 26 DE AGOSTO
Exposição de Motivos
Em 2016 pôs-se fim ao regime especial aplicável aos ativos por impostos diferidos (AID), aprovado pela Lei
n.º 61/2014, de 26 de agosto. Embora este tenha sido um passo importante, o problema do stock entretanto
criado mantém-se, e, o seu impacto ainda será sentido durante muitos, muitos, anos pois sabemos que hoje
perduram no balanço dos bancos 3,8 mil milhões de euros de AID criados na altura e abrangidos por este
regime.
Os AID são ativos que surgem pelo facto de, em Portugal, existirem regras diferentes para a admissão de
perdas por imparidade, na contabilidade e na fiscalidade, sendo mais estritas nesta última por forma a evitar o
empolamento de perdas com vista à redução do imposto. A diferença entre estes dois registos, teoricamente,
leva ao pagamento de um imposto (IRC) superior no ano em que esta se verifica, constituindo-se este valor
como AID para posteriormente, este ser deduzido ao montante a liquidar de IRC no ano da aceitação fiscal do
registo da imparidade, ou nos 5 anos seguintes, em caso de prejuízo fiscal esse ano (como qualquer outro
prejuízo fiscal em IRC).
Com a crise financeira, o stock de perdas por imparidades e de AID teve um crescimento explosivo,
tornando-os uma parte substancial dos ativos e do capital dos bancos em Portugal.
Em 2013, é publicado o Regulamento UE n.º 575/2013, que dita que os AID por imparidade passam a ser
desvalorizados no apuramento dos rácios de capital dos bancos, poi é entendido que dado o valor enorme de
AID existente nalguns bancos e a perspetiva negativa de lucros no médio-prazo, não seria viável «escoar» o
stock de AID a 5 anos e, por conseguinte, a perspetiva de recuperação era nula.
Esta decisão colocava em risco os rácios de capital de vários bancos portugueses, artificialmente
sustentados pelos stocks de AID.
Neste contexto, foi criado pelo Governo PSD/CDS, através da Lei n.º 61/2014, o designado regime especial
aplicável aos ativos por impostos diferidos. Este regime veio consagrar uma garantia do Estado sobre os AID,
de forma a que estes pudessem ser aceites para o apuramento dos rácios de capital – denominando-se assim
AID «elegíveis».
De notar que este regime se aplicou não só aos AID gerados a partir de 2014, mas a todo o stock já
existente. Em linhas gerais, sob este regime, os AID elegíveis:
1) podem ser descontados ad aeternum – só entram para o apuramento do lucro fiscal se este for positivo,
de outra forma transitam para o ano seguinte, por oposição à obrigatoriedade dos AID anteriores de entrar
para o apuramento do lucro fiscal no ano em que são reconhecidos fiscalmente;
2) podem ser «reclamados», num ano em que haja prejuízo fiscal, pelo mesmo valor desse prejuízo, isto é,
o Estado não só não receberia qualquer imposto (porque não há lucro) como teria mesmo de pagar ao Banco
(na perspetiva de «devolução» de imposto «adiantado» pelo Banco);
3) podem ser «reclamados» num processo de liquidação do banco.
Também noutros países europeus, nomeadamente em Espanha, Itália e Grécia, existiam lógicas de AID
por imparidades semelhantes, que enfrentaram as mesmas questões com as novas regras de Basileia (III),
vertidas no Regulamento UE n.º 575/2013, e onde também forma adotados regimes especiais para AID
elegíveis semelhantes.
No entanto, no início de 2015, a DG COMP questiona estes regimes, que considera serem uma forma de
ajuda de Estado aos bancos, na medida em que constituem uma garantia Estatal ao capital Tier1 destes,
instigando estes quatro países a encontrar soluções para este problema, com dois enfoques: (1) limitar a
criação de novos AID elegíveis; (2) remunerar o stock de AID elegíveis já criado, e que se mantinha no
balanço das instituições financeiras.
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Diferentes países encontraram diferentes soluções para este problema.
Em Espanha manteve-se a possibilidade de gerar AID elegíveis, mas sob novas regras. A partir de 1
janeiro de 2016, passa a ser possível converter um AID num AID elegível apenas pelo valor máximo
equivalente aos impostos pagos no ano fiscal em que o AID foi gerado. De outro modo, se o AID gerado
exceder o imposto pago (IRC), então para ser convertido em AID elegível, esse direito terá de ser remunerado
ao Estado.
Em Itália, em 2016, o Estado acabou com os AID por imparidades, tornando a dedução, de imparidades
aceites fiscalmente, imediata (antes distribuída equitativamente num período de tempo).
Em Portugal revogou-se o regime especial de 2014, limitando a sua aplicação ao stock existente a 31 de
dezembro de 2015, e o Governo quer rever agora às regras fiscais, de modo a aproximar o momento do
registo contabilístico e da dedução fiscal das imparidades.
No entanto, e até esta data, os bancos registaram milhares de milhões de imparidades. Não pagaram IRC
porque apresentaram prejuízo, mas mesmo assim guardaram o direito de deduzir essas perdas nos seus
impostos futuros – para sempre. E mais, nos casos em que em vez de lucro registam prejuízos, podem pedir
esse dinheiro ao Estado.
Com efeito, na altura, o principal argumento da DG COMP contra esta garantia era precisamente o facto de
o Estado se comprometer a «devolver» algo que na realidade nunca tinha sido pago, porque foi gerado em
anos de prejuízo, e que se esperava nunca vir a ser recuperado, dadas as perspetivas de prejuízos futuros.
Efetivamente, a lógica subjacente a um AID fica subvertida quando este se converte num AID elegível. No
caso de um AID, o banco só consegue recuperar esse valor, se no prazo de 5 anos conseguir gerar lucro
tributável suficiente para os prejuízos fiscais gerados. Quando falamos de um AID elegível, estes, no limite,
podem ser constituídos sem que tenha tido lugar qualquer pagamento de imposto (IRC – num ano de prejuízos
fiscais), gerando ainda assim um direito eterno sobre impostos futuros, que se materializará na forma de
imposto não pago ou até de montante a receber.
E é precisamente por causa deste efeito que noutros países, e, recorde-se, até por recomendação da DG
COMP, foram tomadas medidas para a efetiva remuneração desta garantia dada pelo Estado.
Em Espanha, para converter o stock de AID criado até 2016 em AID elegíveis é preciso pagar uma taxa de
1,5% sobre a soma desses AID menos a soma dos lucros tributáveis nesses anos. Assim, só os AID a que
correspondeu um efetivo pagamento de impostos terão o direito de ser imediatamente convertíveis. Os
restantes deverão pagar uma espécie de «taxa de serviço» prestado pelo estado. Esta taxa é paga todos os
anos pelo valor remanescente de AID elegíveis.
Também em Itália é criada uma «taxa de serviço» para o stock de AID elegíveis gerado desde 2008, em
tudo semelhante à espanhola, até no valor: 1,5%. Também aqui esta taxa se aplica à diferença entre a soma
dos AID e os lucros tributáveis para o mesmo período. E também aqui esta taxa é paga anualmente pelo
remanescente do stock.
Para o grupo parlamentar do Bloco de Esquerda é muito claro que parte dos AID gerados nos anos da crise
financeira, e que têm vindo a sustentar os rácios de capital dos bancos portugueses, não foram criados como
qualquer contrapartida por impostos pagos nesses anos. Tão pouco configuram um direito de dedução futura,
à luz das regras fiscais existentes, uma vez que não poderiam, realisticamente, ser deduzidos nos cinco anos
subsequentes. Ou seja, os AID elegíveis foram uma forma pouco transparente de capitalizar os bancos
portugueses diferindo para o futuro os custos para o erário público.
No total, estes AID elegíveis somam cerca de 3800 milhões. Só o BCP tem quase 2000 milhões, o que
quer dizer que pode passar muitos e muitos anos sem pagar IRC. Em 2018 o Estado pagou ao Novo Banco
154 milhões por AID e, segundo o Tribunal de Contas, havia mais pedidos de seis bancos no valor de 632
milhões de euros.
Se temos de viver com estes valores, se o Estado presta esta garantia e assume este risco, então deve ter
uma remuneração efetiva por este serviço prestado à banca, acompanhando um mecanismo já aplicado
noutros países europeus e recomendada pela DG COMP. Para o Bloco de Esquerda isto é o mínimo que se
pode e deve exigir em contrapartida.
Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, as Deputadas e os Deputados do Bloco de
Esquerda apresentam o seguinte projeto de lei:
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Artigo 1.º
Objeto
O presente regime tem por objeto a criação de uma prestação patrimonial sobre os Ativos por Impostos
Diferidos abrangidos pelo Regime Especial aprovado pela Lei n.º 61/2014, de 26 de agosto, doravante
designados por “AID elegíveis”, determina as condições da sua aplicação e procede à alteração do Código do
IRC, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 442-B/88, de 30 de novembro.
Artigo 2.º
Incidência subjetiva
São sujeitos passivos da prestação patrimonial sobre os AID elegíveis todos os sujeitos passivos de IRC
que detenham AID elegíveis.
Artigo 3.º
Incidência objetiva
A prestação patrimonial sobre os AID elegíveis incide sobre o valor, quando positivo, que respeita à
diferença entre:
a) O montante total de AID elegíveis apurado no último dia do período de tributação, nos termos do Código
do IRC, e
b) A soma dos valores positivos das liquidações de IRC efetuadas pelo sujeito passivo referentes aos
períodos de tributação compreendidos entre 2009 e 2015.
Artigo 4.º
Taxa
A taxa aplicável à base de incidência definida no artigo anterior é de 1,5%.
Artigo 5.º
Liquidação
A liquidação é efetuada pelo próprio sujeito passivo, através de declaração de modelo oficial aprovada por
portaria do membro do Governo responsável pela área das finanças, que deve ser enviada anualmente por
transmissão eletrónica de dados, até ao último dia do mês de junho.
Artigo 6.º
Pagamento
1 – A prestação patrimonial sobre o sector bancário devida é paga até ao último dia do prazo estabelecido
para o envio da declaração referida no artigo anterior nos locais de cobrança legalmente autorizados.
2 – Não sendo efetuado o pagamento da prestação patrimonial até ao termo do respetivo prazo, começam
a correr imediatamente juros de mora e a cobrança da dívida é promovida pela administração fiscal, nos
termos do Código de Procedimento e de Processo Tributário.
3 – São aplicáveis as regras previstas na lei geral tributária e no Código de Procedimento e de Processo
Tributário, designadamente em matéria de fiscalização e de recurso aos meios processuais tributários.
Artigo 7.º
Alteração ao Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas
O artigo 23.º-A do Código do IRC aprovado pelo Decreto-Lei n.º 442-B/88, de 30 de novembro, passa a ter
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a seguinte redação:
«Artigo 23.º-A
[...]
1 – ................................................................................................................................................................... :
a) ..................................................................................................................................................................... ;
b) ..................................................................................................................................................................... ;
c) ..................................................................................................................................................................... ;
d) ..................................................................................................................................................................... ;
e) ..................................................................................................................................................................... ;
f) ...................................................................................................................................................................... ;
g) ..................................................................................................................................................................... ;
h) ..................................................................................................................................................................... ;
i) ...................................................................................................................................................................... ;
j) ...................................................................................................................................................................... ;
k) ..................................................................................................................................................................... ;
l) ...................................................................................................................................................................... ;
m) .................................................................................................................................................................... ;
n) ..................................................................................................................................................................... ;
o) ..................................................................................................................................................................... ;
p) ..................................................................................................................................................................... ;
q) ..................................................................................................................................................................... ;
r) ..................................................................................................................................................................... ;
s) ..................................................................................................................................................................... ;
t) A prestação patrimonial sobre os Ativos por Impostos Diferidos abrangidos pelo Regime Especial
aprovado pela Lei n.º 61/2014, de 26 de agosto.
2 – ................................................................................................................................................................... .
3 – ................................................................................................................................................................... .
4 – ................................................................................................................................................................... .
5 – ................................................................................................................................................................... .
6 – ................................................................................................................................................................... .
7 – ................................................................................................................................................................... .
8 – ................................................................................................................................................................... .
9 – ................................................................................................................................................................... ».
Artigo 8.º
Entrada em vigor
A presente lei entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.
Assembleia da República, 22 de março de 2019.
As Deputadas e os Deputados do BE: Mariana Mortágua — Pedro Filipe Soares — Jorge Costa — Pedro
Soares — Isabel Pires — José Moura Soeiro — Heitor de Sousa — Sandra Cunha — João Vasconcelos —
Maria Manuel Rola — Fernando Manuel Barbosa — Jorge Falcato Simões — Carlos Matias — Joana
Mortágua — José Manuel Pureza — Luís Monteiro — Moisés Ferreira — Ernesto Ferraz — Catarina Martins.
———
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PROJETO DE LEI N.º 1182/XIII/4.ª
PRIVILEGIA O MODELO DE RESIDÊNCIA ALTERNADA SEMPRE QUE TAL CORRESPONDA AO
SUPERIOR INTERESSE DA CRIANÇA
Exposição de motivos
São vários os estudos científicos efetuados nos últimos anos que atestam que o modelo de residência
alternada1 consubstancia a estrutura familiar que melhor preenche as necessidades (físicas, psicológicas,
emocionais, sociais e materiais) das crianças, garantindo uma maior igualdade entre ambos os progenitores
no envolvimento parental, promovendo uma melhor articulação entre o trabalho e família que será
determinante no acréscimo de bem-estar emocional, familiar e social das crianças2.
Este modelo assenta numa divisão rotativa e paritária dos períodos temporais em que efetivamente ambos
exercem a parentalidade, repercutindo-se no incremento de bem-estar das crianças que as investigações dos
últimos 30 anos têm evidenciado de forma clara e consistente.
Cumpre sublinhar que o envolvimento parental não se resume ao mero exercício de responsabilidades
parentais na vertente da verificação dos «atos de particular importância» (como prescreve a Lei), abarcando
outros vetores como:
a) uma vasta variedade de atividades e decisões (relativas a ensinar e educar; acompanhar, dar apoio e
afecto; brincar e partilhar lazeres; estar junto; levar/buscar à escola; fazer tarefas domésticas; gerir a vida
quotidiana da criança e a articulação trabalho-família, entre outras);
b) formas diversas de interação e relacionamento entre mãe e pai e entre cada um destes e os seus filhos
e filhas;
c) o significado que lhes é atribuído por mães e pais no exercício tanto autónomo como partilhado da
parentalidade na vida quotidiana – neste quadro, demonstra-se a igual importância do envolvimento materno e
paterno para a criança.
A residência alternada promove o envolvimento parental igualitário e a redução do conflito parental,
representando a melhor forma de garantir o superior interesse da criança.
Garante o exercício comum das responsabilidades parentais não apenas para os atos de particular
importância mas por via do estabelecimento de plena igualdade assente numa maior partilha do tempo e das
responsabilidades parentais quotidianas nos cuidados de ambos os pais e mães aos filhos/as.
O atual quadro legal dita uma notória desigualdade no exercício das responsabilidades parentais, sendo
que, em regra é atribuída a maior parcela temporal do poder de decisão em atos da vida corrente do filho a um
dos progenitores (o chamado «progenitor residente») conjugado com o facto de o outro (progenitor não
residente), nos parcos momentos passados com o filho, encontra-se impedido de ter influência relevante sobre
as orientações educativas mais importantes definidas pelo progenitor com quem a criança reside
habitualmente.
Neste âmbito invoca-se o princípio da autonomia da família, de que são reflexo os princípios da intervenção
mínima e da responsabilidade parental, consagrados no artigo 4.º, alíneas d) e f), da Lei de Proteção de
Crianças e Jovens em Perigo, aplicáveis também ao Regime Geral do Processo Tutelar Cível – ora, se no
decurso da vida em comum não se verificou qualquer perigo para a criança que motivasse a intervenção
estatal, reveste total legitimidade a conclusão que dita que ambos os pais cumpriram paritariamente os
poderes-deveres que as responsabilidades parentais encerram, sendo que tal cenário não deve ser
drasticamente alterado por via de decisão judicial face a rutura conjugal, assumindo-se como imperativo que
as responsabilidades parentais continuem a ser exercidas nos mesmos trâmites.
1 A residência alternada representa uma modalidade singular de coparentalidade após a dissensão conjugal caracterizada por uma divisão rotativa e tendencialmente paritária dos tempos de residência, dos cuidados e da educação da criança, entre o pai e a mãe ou pais/mães do mesmo sexo. 2 A este respeito, ver por exemplo, Marinho & Correia, 2017; Nielsen, 2011, 2014, 2017; Warshak, 2014.
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Cumpre sublinhar que o modelo visa primordialmente o superior interesse da criança, afigurando-se este
como o mais capaz de suprir as necessidades físicas, psicológicas, afetivas, emocionais, sociais e materiais
das crianças.
Pela análise da realidade dos países que adotaram uma política de implementação da residência alternada
(como é o caso da Austrália por exemplo), assistiu-se a um generalizado aumento de acordos neste sentido
conjugado com uma diminuição exponencial de conflitos. Mesmos nos casos em que exista alguma
conflitualidade, este modelo obriga os progenitores a promoverem um comportamento de cooperação.
A investigação realizada por Linda Nielsen, mostra que os conflitos, que são muito frequentes no ano da
separação e no ano seguinte à mesma, tendem a decrescer com o passar do tempo, em cerca de 50% a
seguir ao divórcio e 25% nos anos seguintes – a ciência mostra, outrossim que, os progenitores com crianças
em residência alternada têm menos conflitos e desenvolvem relações mais cooperantes do que crianças em
residência única3.
No mesmo sentido apontam outros trabalhos como o de Bauserman que identifica duas explicações para
esta diminuição de conflitos – primeiramente, este modelo implica menos intercâmbios (usualmente designado
por trocas ou entregas) entre pais e mães, pelo que é reduzida a probabilidade de conflito, face a uma
situação de residência única, mais ainda se nas regulações estiver previsto que esses intercâmbios se façam
em locais específicos, por exemplo, na escola.
Em segundo lugar, neste modelo existe uma tremenda diminuição da possibilidade de alguma das partes
se sentir marginalizada, o que se repercute direta e imediatamente na esfera de bem-estar das crianças,
sendo que estas são melhor protegidas quando ambos os progenitores estão envolvidos de forma igualitária
na vida delas.
Encontra-se plenamente assente na literatura que a residência alternada diminui o nível de stress das
crianças e melhora a adaptação à separação conjugal dos pais, em comparação com a residência única.
Estudos mais recentes, com amostras significativas e longitudinais, têm demonstrado que o envolvimento
parental igualitário traduz-se no melhor ajustamento ao divórcio conjugal e melhores indicadores físicos,
psicológicos, emocionais e de bem-estar da criança4.
Se uma criança está habituada a ter mães e pais envolvidos na sua vida quotidiana, a separação ou
divórcio provocará instabilidade se esse envolvimento parental (tempos, atividades parentais, cuidados e
relacionamento) for drasticamente alterado. É nesse envolvimento que se estabelece uma relação quotidiana
não só com os pais e mães, mas igualmente com a restante família alargada.
No que concerne ao bem-estar subjetivo das crianças que compreende a qualidade familiar e a relação
com os seus pares, os dados recolhidos indicam, outrossim, que as crianças em famílias nucleares
apresentam resultados elevados, em residência alternada resultados médios e em residência única resultados
baixos – as crianças em regime de residência alternada têm um maior nível de satisfação geral; mostram
melhores resultados quanto aos fatores psicológicos (ex.: menos depressões); mostram melhor
relacionamento com ambos os progenitores; estão mais satisfeitas com a sua situação escolar e são menos
vítimas de bullying.
Revelador é também este elemento obtido pela investigadora Linda Nielsen em 14 estudos – as crianças
sujeitas ao modelo de residência alternada apresentam uma elevada taxa de satisfação (acima dos 90%),
sendo que um número igualmente elevado de estudantes que viveram em residência única afirma que seria do
seu melhor interesse ter convivido mais com o seu pai – com a residência alternada 59% das situações o
conflito parental mantém-se, em 40% diminui e em apenas 1% aumenta, refletindo uma menor probabilidade
de expor a criança à violência interparental em comparação com a residência única.
Neste quadro, importante também será ter em consideração a conciliação da vida familiar e da vida
profissional, uma vez que esta conciliação será mais fácil se ambos estiverem presentes no quotidiano das
crianças.
Um estudo realizado pelo advogado e mediador familiar espanhol, José Luis Sariego Morillo e apresentado
na 7ª Conferência Internacional Igualdade Parental Séc. XXI, em Leiria, demonstrou que em residência única a
criança separa-se de cada um dos pais/mães, em média, 120 vezes ao ano de cada um, ou seja, 240 vezes.
Num modelo quinzenal a criança separar-se-ia 24 vezes de cada pai ou mãe ou num regime semanal na
3 O estudo realizado por Linda Nielsen concluiu que no modelo da residência alternada o conflito diminuía em 40% dos casos, mantendo-se em 59% e subindo apenas em 1%.
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ordem das 49 vezes. Contabilizou igualmente os quilómetros que uma criança faz em média, em Sevilha, por
semana, nos dois modelos. Verificou que em média em residência alternada a criança faz por semana cerca
de 120 km e uma média de 5 h de automóvel (seja com o pai ou com a mãe). Em residência única observou
que uma criança fazia cerca de 200 km e mais de 7 h por semana eram passados no automóvel.
A fixação do modelo de residência alternada pressupõe que haja uma tendencial escolha por residências
próximas uma da outra, para que seja evitado o desgaste das partes (progenitores e crianças).
Em resumo, a literatura científica tem mostrado que um maior envolvimento parental desembocará em
resultados positivos em vários domínios na relação com a criança. O envolvimento parental inclui 3
componentes primárias:
(1) um envolvimento positivo nas atividades e interação com a criança ao ponto de influenciar o seu
desenvolvimento;
(2) afetos e responsividade; e
(3) controlo, em particular monitorização e tomada de decisão.
Existem ainda dois domínios auxiliares a ter em consideração:
1 – Cuidados materiais indiretos – atividades que não envolvam interação direta com a criança (como
comprar coisas para a criança) ou cuidados sociais indiretos (como ligação com os pares, ligações com a
escola, etc.);
2 – Processo de responsabilização, onde o pai/mãe monitoriza em que medida o seu envolvimento parental
está a ser adequado às necessidades da criança em função das componentes anteriormente mencionadas.
Por sua vez o envolvimento parental pode processar-se de muitas formas, que passam pela comunicação,
educação, monitorização, processos cognitivos, de cuidados, de cuidados indiretos à criança, partilha de
interesses, disponibilidade, planeamento, partilha de atividades, prover, afetos, proteção e apoio emocional,
sendo o envolvimento em todas estas atividades que dão confiança e segurança à criança na relação com os
seus cuidadores.
Uma sondagem realizada pela Netsonda5, conclui que 68,8% dos pais e mães portugueses consideram
que o melhor para os seus filhos, numa situação de separação, é que estes fiquem a viver com os dois, o que
atesta que a forma como os portugueses olham para esta problemática tem mudado nas últimas duas
décadas6.
Afigura-se como fundamental sublinhar que a aplicação da residência alternada não colherá, obviamente,
aplicação em casos de violência doméstica ou abuso sexual ou mesmo alto conflito parental com violência.
Hotton destaca que metade das ocorrências na primeira situação de violência familiar surgem em pleno
decurso de separação entre os companheiros em disputa pela custódia do respetivo filho com privação de
convívio a uma das partes, sendo que situações desta índole fomentarão tendencialmente situações de
conflito parental.
No que concerne ao caso específico do nosso país, resta esclarecer que de acordo com os Relatórios
Anuais de Avaliação da Atividade das CPCJ e com o Relatório Anual de Segurança Interna, a residência
alternada não apresentou qualquer correlação com situações de violência doméstica ou abuso sexual.
À guisa de conclusão, ilaciona-se que a residência alternada não constituiu nenhum perigo adicional, bem
como, pelo facto de a criança ter os dois progenitores interessados no seu quotidiano fará com que exista
maior vigilância sobre o seu bem-estar, facilitando a sinalização de qualquer situação de violência ou abuso.
Isto conjugado com o facto de a ciência ser prolífica em demonstrar que as crianças desejam ter tempo de
qualidade com ambos os pais, numa situação de pós-divórcio/separação7, encontrando-se também
sobejamente assente que a maioria das crianças apresenta uma clara preferência pelo modelo da residência
4 Bergström, et al., 2013; Bergström, et al., 2015; Fransson, Låftman, Östberg, Hjern, & Bergström, 2017; Turunen, 2015. 5 Sondagem publicada em Setembro de 2018, com base em 1000 entrevistas online recolhidas junto do Painel Netsonda, entre os dias 24 de Maio e 18 de Junho de 2018, realizadas a indivíduos de ambos os sexos, com idade entre os 26 e 64 anos e com filhos(as) com 17 anos ou menos, residentes em Portugal Continental. 6 Tendência identificada por Sofia Marinho num inquérito do ISSP, de 2014, onde 47,5% dos inquiridos entendiam que a criança deveria residir alternadamente com ambos os pais.
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alternada pela conjuntura de continuidade do envolvimento parental de ambos os progenitores o qual abarca
um sentimento de segurança e estabilidade no desenvolvimento da criança.
– Da aplicação da residência do modelo da residência alternada aos bebés e crianças de tenra idade
Vários autores (a título de exemplo, traz-se à colação Warshak e Nielsen) advogam pela existência de um
consenso no que concerne ao facto de as pernoitas frequentes para crianças pequenas com ambos os
progenitores representarem um elemento de proteção, contribuindo para o respetivo bem-estar e não
acarretando a diminuição da qualidade da relação do outro progenitor com a criança.
No caso específico das crianças muito pequenas, afigura-se como muito importante a regularidade da
interação entre ambos os pais com a criança assente numa rotina que abarque pernoitas, maximizando-se
desta forma relações douradoras e vinculações seguras entre as partes.
Existem obviamente outros fatores a considerar na determinação da residência alternada como é exemplo
os horários de trabalho dos progenitores. De qualquer das formas, em situações normais, qualquer
condicionamento ou proibição de períodos temporais mais igualitários da criança com ambos os progenitores
com fundamento na idade precoce da criança, atenta contra a ciência que tem versado o seu estudo sobre o
desenvolvimento infantil, ainda para mais considerando que os primeiros anos de vida são fundamentais para
o desenvolvimento da criança, especialmente por via do estabelecimento de relações significativas com os
seus cuidadores.
Um estudo recente8 conclui, inclusivamente, que as crianças com menos de 3 anos que tiveram relações
significativas com ambos os progenitores (com pernoitas) apresentam em idade adulta melhores
relacionamentos com estes do que aquelas crianças que não tiveram esse tipo de relacionamento.
As alterações promovidas pela Lei n.º 61/2008, de 31 de outubro, introduzindo uma presunção jurídica de
exercício conjunto de responsabilidades parentais relativamente aos «atos de maior importância», apresentou
o condão de tentar instituir em regime assente na cooperação parental conjugada com uma proximidade
relacional entre a criança e os progenitores, em casos de inexistência de coabitação e de dissensão familiar.
Tal alteração legislativa foi produto da evolução sociológica registada nos últimos anos, a qual se encontra
vertida igualmente em instrumentos internacionais relativos a esta matéria.
As alterações explicitadas derivaram na implementação de um regime regra assente no exercício conjunto
das responsabilidades parentais quanto às questões de particular importância da vida do filho, presente nos
artigos 1901.º, 1906.º/1, 1911.º e 1912.º do Código Civil (doravante denominado CC).
O artigo 1906.º, n.º 2, prescreve que este regime pode ser alterado pelo Tribunal, através de decisão
fundamentada, determinando que questões de particular importância para a vida do filho sejam exercidas por
um dos progenitores, salvaguardando desta forma o superior interesse da criança em causa.
Por outro lado, e apresentando como cerne o superior interesse da criança, o n.º 7 do artigo 1906.º dita que
«o tribunal decidirá sempre de harmonia com o interesse do menor, incluindo o de manter uma relação de
grande proximidade com os dois progenitores, promovendo e aceitando acordos ou tomando decisões que
favoreçam amplas oportunidades de contacto com ambos e de partilha de responsabilidades entre eles».
Quando suscitada a questão concernente à admissibilidade da fixação da residência alternada, a Doutrina9
responde de forma inequívoca no sentido positivo, enfatizando ainda não representar um imperativo legal
o acordo dos pais neste sentido (negrito nosso).
Ana Vasconcelos10 sufraga, defendendo as repercussões positivas no crescimento e desenvolvimento da
criança por via da residência alternada, que «a residência alternada permite que os pais continuem a dividir
atribuições, responsabilidades e tomadas de decisões em iguais condições, reconhecendo as suas diferenças
e limitações bem como o valor do papel de cada um para a criança. Esta diferença clara e coerente de papéis
materno e paterno é fundamental para o saudável crescimento dos filhos pois permite uma estruturante
identificação aos modelos parentais, fundamental para um normal desenvolvimento da sua identidade
pessoal».
7 (Fabricius, 2003; Emery, 2006; Finley & Schwartz, 2007; Bauserman, 2002; Smith, Taylor, & Tapp, 2003; Nielsen, 2014). 8 Fabricius & Suh, 2017. 9 A título de exemplo, vide Guilherme de Oliveira in “ A nova lei do divórcio”. 10 In “Do cérebro à empatia. Do divórcio à Guarda Partilhada com Residência Alternada”, A tutela Cível do Superior Interesse da Criança, Tomo I, Julho 2014, Ebook Cej, p.10.
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10
Por seu turno, Catarina Ribeiro advoga que o estabelecimento da residência alternada apresenta a
virtualidade de contrariar, na prática, aquilo que alguns psicólogos e pedopsiquiatras apelidam de mito no que
refere à instabilidade da criança decorrente de passar a dividir o seu tempo de vida entre casas de ambos os
progenitores.
Todavia, continuamos a assistir a uma conjuntura – diagnosticada pela investigação – de desigualdade
parental, com reflexos negativos no bem-estar das crianças, por via da manutenção de um regime tradicional
assente na residência da criança com um dos progenitores (em regra, a mãe) e de períodos de contacto
quinzenais de curta duração com o outro (em regra, o pai) – predominantemente em 2 tardes ou em 2 a 4
pernoitas por mês.
Tal desigualdade origina desequilíbrios na vida da criança obstando a um envolvimento parental equitativo
e responsável por parte dos pais após dissolução conjugal, os quais fomentam conflitos parentais e lançam as
crianças num quadro de disparidade afetiva, relacional e social.
A jurisprudência – mormente os tribunais superiores – tem sido pródiga em afastar a aplicação do regime
da residência alternada ancorada em argumentos de várias índoles como é o caso da diminuta idade da
criança – a título de exemplo traz-se à colação o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 7 de novembro
de 201311, o qual sustenta o seguinte:
– «O regime de residência alternada não é, normalmente, o mais adequado no caso de conflito acentuado
entre os progenitores e em que estejam em causa crianças muito pequenas»;
– «Aceita-se que a residência alternada possa em alguns casos funcionar bem, garantindo um contacto
equivalente entre o menor e cada um dos progenitores, mas pressupondo que exista um relacionamento
civilizado entre estes e tratando-se de adolescentes ou jovens que já têm alguma autonomia e capazes de se
organizar em função de hábitos já adquiridos. No caso de crianças muito pequenas, como é o caso dos autos,
tal alternância é manifestamente inadequada».
Claramente contra a corrente jurisprudencial maioritária, importa sublinhar o acórdão do tribunal da
Relação de Lisboa de 12 de abril de 201812, por enfatizar que a residência alternada deve ser a primeira opção
aduzindo que:
De acordo com o novo regime, a regra é a do exercício em comum das responsabilidades parentais,
relativas às questões de particular importância para a vida do filho, com a residência exclusiva ou alternada,
questão que o julgador terá de decidir, em caso de desacordo dos progenitores, tendo em consideração o
superior interesse da criança e ponderando todas as circunstâncias relevantes, designadamente, a
disponibilidade manifestada por cada um deles para promover relações habituais do filho com o outro (artigo
1906.º, n.º 5 CC); o interesse da criança de manter uma relação de grande proximidade com os dois
progenitores (artigo 1906.º, n.º 7 CC), e sendo certo que esse desacordo dos pais não será, em princípio,
impeditivo da fixação de residência alternada com ambos os progenitores.
(…)
No entanto, alguns psicólogos e pedopsiquiatras classificam como mito a instabilidade da criança, quando
aplicada à modalidade de residência alternada, admitindo que a questão se pode colocar apenas
relativamente a crianças com idade inferior a dezoito meses.
Acrescenta ainda que:
«Considera-se ser hoje pacífico o entendimento que a figura tradicional do ‘pai de fim de semana’ já não é
aceite pelos progenitores, que exigem uma participação na vida dos filhos em igualdade de circunstâncias com
a mãe.
11 Passível de verificação em http://www.dgsi.pt/jtrl.nsf/33182fc732316039802565fa00497eec/7fc9968519affb4a80257c3e005c336f?OpenDocument 12 Possibilidade de consulta no link http://www.dgsi.pt/jtrl.nsf/-/9FB53DDAF20154A4802582A4004DC961 .
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O regime de residência alternada, a par da fixação da residência com apenas um dos progenitores tem,
atualmente de ser equacionado como uma das opções a ter em conta quando ocorre a separação do casal
com filhos menores.
Este regime da residência alternada, de acordo com os mais recentes ensinamentos da psicologia, é o que
melhor salvaguarda os interesses da criança, na medida em que permite que a mesma mantenha com ambos
os progenitores um relacionamento o mais próximo possível do existente no período de vivência em comum.»
(sublinhado nosso).
Num parecer sobre esta matéria, a Procuradoria-Geral da República (daqui para a frente denominada
PGR) defende que uma eventual alteração legislativa no sentido da promoção da residência alternada como
«regime preferencial» não deve ser «encarado como um regime excepcional, mas antes como normal e até
desejável (…) à residência alternada vêm sido reconhecidas múltiplas virtualidades, as mais relevantes das
quais se reportam à preservação da relação da criança com ambos os progenitores (podendo potenciar a
qualidade da relação recíproca), à susceptibilidade de diminuição do conflito parental e da litigância e à
promoção da igualdade na assumpção pelos progenitores das suas responsabilidades parentais».
A título de complemento, enfatiza-se que não existe qualquer proibição de fixação do regime de alternância
alternada, seja por acordo ou decisão judicial, bem como não se encontra subordinada ao preenchimento de
pressupostos isolados ou cumulativos.
Como sublinha a PGR, «o estabelecimento da residência alternada tem como propósito a aproximação do
modelo existente antes da dissensão familiar (ou daquele que desejavelmente seria concebível ter existido),
garantindo a cada um dos progenitores a possibilidade de (continuar) a exercer os direitos e obrigações
inerentes às responsabilidades parentais e de acompanhar e participar, em condições de igualdade e
activamente, no processo de crescimento e desenvolvimento dos filhos».
Cumpre referir outrossim que a jurisprudência13 e doutrina mais recente tem defendido unanimemente a
«susceptibilidade de fixação da residência alternada, adequando o seu concreto recorte aos desejos dos
progenitores, nos casos de acordo, e, perante a sua inexistência, deixando aos tribunais (e ao Ministério
Público) a tarefa, por vezes árdua, de definição dos tempos e do modo de a tornar apta a salvaguardar os
interesses em presença, com especial enfoque na observância do superior interesse da criança».
Por exemplo, o acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 27 de abril de 2017 advoga o seguinte: «é
posição dominante na jurisprudência a admissibilidade da guarda compartilhada (ou residência alternada), por
acordo ou por imposição do tribunal, desde que haja uma boa relação entre os pais ou que, pelo menos, os
conflitos entre os progenitores possam ser, de algum modo, amenizados».
Voltando ao parecer da PGR, esta entidade aduz ainda que «reconhece-se a vantagem de introduzir no
normativo em apreço um ligeiro ajustamento, na linha da recomendação constante do ponto 5.5 da resolução
2079 (2015) do Conselho da Europa, cujo cunho clarificador terá certamente a virtualidade de dissipar
quaisquer duvidas, ainda que por certo meramente residuais, relativamente à possibilidade de decretamento
da residência alternada, em caso de falta de acordo dos pais e, bem assim, promover o seu decretamento pela
consagração de principio que aponte a necessidade de, por regra, ser privilegiada a fixação da residência da
criança, atentos os benefícios que, seguramente, em assinalável número de casos, a mesma comporta para o
processo de crescimento e desenvolvimento da criança e para o seu bem-estar, conforme a doutrina e os
ensinamentos da psicologia vêm apontando.
O mencionado ajustamento decorre essencialmente da falta de referência expressa, no texto legal, à
residência alternada e da circunstância de a jurisprudência nos nossos tribunais, designadamente dos
tribunais superiores, mostrar constituir ainda a regra a fixação de uma residência única, em detrimento do
regime de residência alternada, ainda que paulatinamente pareça assistir-se a uma inversão desta tendência»
(sublinhado nosso).
Por fim, afigura-se como imperativo trazer à colação o parecer do Conselho Superior de Magistratura que
conclui que«o princípio de que, salvo motivos ponderosos, a residência dos filhos de pais separados deve ser
com ambos os progenitores, de forma alternada e com possível adequação ao caso concreto pelo juiz, é de
prever legalmente» (sublinhado nosso).
13 Como é possível verificar nos acórdãos patentes nos links http://www.dgsi.pt/jtrl.nsf/-/9FB53DDAF20154A4802582A4004DC961 e http://www.dgsi.pt/jtrl.nsf/33182fc732316039802565fa00497eec/38ce9059f1ef502b8025831a0047bd7a?OpenDocument .
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Conclui-se que a implementação da residência alternada não deverá suceder por via automática, havendo
que se efetivar uma avaliação casuística da vida da criança que permita concluir pela exequibilidade da
aplicação deste regime, sempre tendo em consideração o superior interesse da criança.
– Elementos internacionais sobre implementação do regime de residência alternada
Primeiramente, cumpre sublinhar que 20% dos pais e mães portugueses já têm os filhos/a em residência
alternada.
Face à análise da jurisprudência dominante relativamente a esta temática, é notória a presença vincada de
estereótipos de género.
Consequentemente, urge diligenciar pela implementação de iniciativas legislativas que promovam a
residência alternada, à semelhança do que aconteceu no Canadá (2014-2015), em Itália (onde o atual
Governo tem no seu Programa a alteração legislativa no sentido de uma presunção jurídica14), Austrália e em
alguns Estados dos EUA, como o Estado do Kentucky.
A implementação da parentalidade partilhada como regime preferencial tem espoletado uma notória
redução de conflitos conjugais – 35% a 40% na Suécia, mais de 16% na Austrália, 20% na Dinamarca e na
Alemanha, 15% na Finlândia, 12,8% no Canadá, 30% na Bélgica, 17% na França, 12,9% no Brasil, 10,5% na
Eslováquia, 25% na Noruega e 28,3% em Espanha.
Enfatiza-se que o ponto 5.5 da Resolução 207915 do Conselho da Europa prescreve aos Estados-Membros
a necessidade de introdução nos respetivos ordenamentos jurídicos do princípio da residência alternada,
ditando que estes devem «introduzir na sua legislação o princípio de residência alternada depois da
separação, limitando as excepções aos casos de abuso infantil ou negligência, ou violência doméstica,
ajustando o tempo em que a criança vive na residência de cada progenitor em função das suas necessidades
e interesses».
Apesar de as resoluções não serem juridicamente vinculativas, espelham a manifestação clara de uma
posição política concernente a um tema abarcado pelos domínios de atividade da União Europeia.
Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, o Deputado do PAN apresenta o seguinte
projeto de lei:
Artigo 1.º
Objeto
A presente lei altera o Código Civil, estabelecendo um princípio o qual dita que o Tribunal deverá privilegiar
o modelo de residência alternada independentemente de acordo dos pais, sempre que tal corresponda ao
superior interesse do filho, quando ponderadas todas as circunstâncias relevantes atendíveis.
Artigo 2.º
Alteração ao Código Civil
É alterado o artigo 1906.º do Código Civil, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 47 344, de 25 de novembro de
1966, com as alterações introduzidas pelos Decretos-Leis n.os 67/75, de 19 de fevereiro, 261/75, de 27 de
maio, 561/76, de 17 de julho, 605/76, de 24 de julho, 293/77, de 20 de julho, 496/77, de 25 de novembro, 200-
C/80, de 24 de junho, 236/80, de 18 de julho, 328/81, de 4 de dezembro, 262/83, de 16 de junho, 225/84, de 6
de julho, e 190/85, de 24 de junho, pela Lei n.º 46/85, de 20 de setembro, pelos Decretos-Leis n.os 381-B/85,
de 28 de setembro, e 379/86, de 11 de novembro, pela Lei n.º 24/89, de 1 de agosto, pelos Decretos-Leis n.os
321-B/90, de 15 de outubro, 257/91, de 18 de julho, 423/91, de 30 de outubro, 185/93, de 22 de maio, 227/94,
de 8 de setembro, 267/94, de 25 de outubro, e 163/95, de 13 de julho, pela Lei n.º 84/95, de 31 de agosto,
pelos Decretos-Leis n.os 329-A/95, de 12 de dezembro, 14/96, de 6 de março, 68/96, de 31 de maio, 35/97, de
31 de janeiro, e 120/98, de 8 de maio, pelas Leis n.os 21/98, de 12 de maio, e 47/98, de 10 de agosto, pelo
Decreto-Lei n.º 343/98, de 6 de novembro, pela Lei n.º 16/2001, de 22 de junho, pelos Decretos-Leis n.os
14 Pode ser consultada neste site: https://www.senato.it/japp/bgt/showdoc/18/DDLPRES/0/1071882/index.html
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13
272/2001, de 13 de outubro, 273/2001, de 13 de outubro, 323/2001, de 17 de dezembro, e 38/2003, de 8 de
março, pela Lei n.º 31/2003, de 22 de agosto, pelo Decreto-Lei n.º 199/2003, de 10 de setembro, pela Lei n.º
6/2006, de 27 de fevereiro, pelos Decretos-Leis n.os 263-A/2007, de 23 de julho, 324/2007, de 28 de setembro,
e 116/2008, de 4 de julho, pela Lei n.o 61/2008, de 31 de outubro, e pelo Decreto-Lei n.º 100/2009, de 11 de
maio, pelas Leis n.os 29/2009, de 29 de junho, 103/2009, de 11 de setembro, 9/2010, de 31 de maio, 23/2010,
de 30 de agosto, 24/2012, de 9 de julho, 31/2012 e 32/2012, ambas de 14 de agosto, 23/2013, de 5 de março,
79/2014, de 19 de dezembro, 82/2014, de 30 de dezembro, 111/2015, de 27 de agosto, 122/2015, de 1 de
setembro, 137/2015, de 7 de setembro, 143/2015, de 8 de setembro, 150/2015, de 10 de setembro, 5/2017, de
2 de março, 8/2017, de 3 de março, 24/2017, de 24 de maio, 43/2017, de 14 de junho, 48/2018, de 14 de
agosto, 49/2018, de 14 de agosto, 64/2018, de 29 de outubro, e 13/2019, de 12 de fevereiro, que passa a ter a
seguinte redação:
«Artigo 1906.º
(…)
1 – ................................................................................................................................................................... .
2 – ................................................................................................................................................................... .
3 – ................................................................................................................................................................... .
4 – ................................................................................................................................................................... .
5 – ................................................................................................................................................................... .
6 – O Tribunal deverá privilegiar o modelo de residência alternada da criança com cada um dos
progenitores, independentemente de acordo e sempre que, ponderadas todas as circunstâncias relevantes
atendíveis, estas correspondam ao superior interesse daquele.
7 – (anterior n.º 6)
8 – (anterior n.º 7).»
Artigo 3.º
Entrada em vigor
A presente lei entra em vigor no primeiro dia do mês seguinte ao da sua publicação.
Assembleia da República, 22 de março de 2019.
O Deputado do PAN, André Silva.
———
PROJETO DE LEI N.º 1183/XIII/4.ª
PROTEGE AS CRIANÇAS QUE TESTEMUNHEM CRIMES DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E TORNA
OBRIGATÓRIA A RECOLHA DE DECLARAÇÕES PARA MEMÓRIA FUTURA NO DECORRER DO
INQUÉRITO (SEXTA ALTERAÇÃO AO REGIME JURÍDICO APLICÁVEL À PREVENÇÃO DA VIOLÊNCIA
DOMÉSTICA E À PROTEÇÃO E À ASSISTÊNCIA DAS SUAS VÍTIMAS)
Exposição de motivos
O crime de violência doméstica, não é demais repeti-lo, é o crime contra as pessoas que mais mata em
Portugal. Em 2019, o número de vítimas não para de aumentar e tem compelido toda a sociedade portuguesa
15 De 2 de outubro de 2015.
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a debater este autêntico flagelo com o fim de encontrar soluções que atuem tanto na prevenção, como na
repressão deste crime que atinge, sobretudo e de forma esmagadora, as mulheres.
O Bloco de Esquerda não chega hoje a este debate. Na verdade, o primeiro projeto de lei que apresentou
enquanto Grupo Parlamentar, há mais de vinte anos, foi precisamente a mudança da natureza do crime de
violência doméstica para crime público. A juntar a esta proposta, muitas outras se seguiram, inclusivamente
nesta legislatura. Todas elas partiram da análise concreta da realidade e de quem sabe que a justiça não é um
sistema fechado em si mesmo, mas algo que serve um propósito social claro e inscrito na Constituição da
República Portuguesa. Noutro âmbito, e procurando ouvir todos e todas que têm um conhecimento concreto
da realidade, levou este grupo parlamentar uma audição pública para debater soluções de combate à violência
doméstica, ouvindo pessoas ligadas às Magistraturas, ao ativismo, à imprensa e à sociologia.
Esta audição foi decisiva para reforçar ideias e somar outras, sendo que, no imediato, urge avançar com
duas alterações que, apesar de pequenas na forma, farão uma enorme diferença material.
A primeira diz respeito ao facto de a Lei n.º 112/2009, de 16 de setembro, não colocar as crianças que
testemunham casos de violência doméstica como vítimas de violência doméstica. Mais do que uma omissão
que desrespeita a Convenção de Istambul, esta é uma situação que não protege as crianças, que menospreza
a violência que sobre elas é exercida quando testemunham casos de violência doméstica e que influencia toda
a forma como elas são tratadas no decorrer do processo penal. Alterar este estado de coisas, dando
cumprimento ao que estipula a Convenção de Istambul quando afirma que é necessário reconhecer «que as
crianças são vítimas de violência doméstica, designadamente como testemunhas de violência na família»,
é algo decisivo para a proteção do processo penal e de todas as vítimas. Opta este grupo parlamentar por
usar a fórmula quando vivam nesse contexto ou o testemunhem, algo que permitirá abranger não só as
agressões que as crianças presenceiam, mas também toda a violência que a vivência nesse contexto
acarreta.
A segunda alteração tem que ver com o tremendo desafio da recolha de prova que este crime encerra.
Passando-se no seio familiar, onde a cobardia e a violência do agressor prevalecem, é urgente tentar
contrariar a dificuldade da recolha de prova. Por este motivo, é necessário valorizar as declarações que a
vítima está disposta a prestar o mais cedo possível e garantir que estas poderão ser utilizadas numa futura
audiência de julgamento. Só respeitando este tempo, que todos/as os/as especialistas apontam para um prazo
máximo de 72 horas, é que se terá um testemunho rico em pormenores e fiável. Esta é uma solução que,
aliás, merece também a aprovação da Procuradora-Geral da República que ainda recentemente veio apelar a
esta alteração legislativa.
Neste ensejo, adequam-se também alguns artigos às alterações agora propostas.
Estas são alterações importantes que contribuirão de forma decisiva para que todas as vítimas tenham
uma resposta adequada e para que a prova de todos os crimes de violência doméstica seja protegida e
valorizada.
Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, as Deputadas e os Deputados do Bloco de
Esquerda, apresentam o seguinte projeto de lei:
Artigo 1.º
Objeto
A presente Lei procede à sexta alteração da Lei n.º 112/2009, de 16 de setembro, alterada pela Lei n.º
19/2013, de 21 de fevereiro, pela Lei n.º 82-B/2014, de 31 de dezembro, pela Lei n.º 129/2015, de 3 de
setembro, pela Lei n.º 42/2016, de 28 de dezembro, e pela Lei n.º 24/2017, de 24 de maio, colocando as
crianças como vítimas de violência doméstica quando vivam nesse contexto ou o testemunhem e tornando
obrigatória as declarações para memória futura por parte da vítima.
Artigo 2.º
Alteração à Lei n.º 112/2009, de 16 de setembro
São alterados os artigos 2.º, 31.º e 33.º da Lei n.º 112/2009, de 16 de setembro, com as posteriores
alterações, que passam a ter a seguinte redação:
Página 15
22 DE MARÇO DE 2019
15
«Artigo 2.º
(...)
Para efeitos da aplicação da presente Lei, considera-se:
a) ..................................................................................................................................................................... ;
b) «Vítima especialmente vulnerável» a vítima cuja especial fragilidade resulte, nomeadamente, da sua
diminuta ou avançada idade, do seu estado de saúde ou do facto de o tipo, o grau e a duração da vitimização
haver resultado em lesões com consequências graves no seu equilíbrio psicológico ou nas condições da sua
integração social e as crianças que vivam nesse em contexto de violência doméstica ou o testemunhem;
c) ..................................................................................................................................................................... ;
d) ..................................................................................................................................................................... ;
e) ..................................................................................................................................................................... ;
f) ...................................................................................................................................................................... .
Artigo 31.º
(…)
1 – Após a constituição de arguido pela prática do crime de violência doméstica, o tribunal decide, no prazo
máximo de 48 horas, a aplicação, com respeito pelos pressupostos gerais e específicos de aplicação das
medidas de coação previstas no Código de Processo Penal, de medida ou medidas de entre as seguintes:
a) ...................................................................................................................................................................... ;
b) ...................................................................................................................................................................... ;
c) ...................................................................................................................................................................... ;
d) ...................................................................................................................................................................... .
2 – ................................................................................................................................................................... .
3 – ................................................................................................................................................................... .
4 – ................................................................................................................................................................... .
Artigo 33.º
(…)
1 – O juiz, no prazo de 72 horas, procede à inquirição das vítimas, aqui se incluindo as crianças que vivam
nesse contexto ou o testemunhem, no decurso do inquérito, a fim de que o depoimento possa, se necessário,
ser tomado em conta no julgamento.
2 – ................................................................................................................................................................... .
3 – ................................................................................................................................................................... .
4 – ................................................................................................................................................................... .
5 – ................................................................................................................................................................... .
6 – ................................................................................................................................................................... .
7 – ................................................................................................................................................................... .»
Artigo 3.º
Entrada em vigor
A presente Lei entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.
Assembleia da República, 22 de março de 2019.
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As Deputadas e os Deputados do BE: Sandra Cunha — Pedro Filipe Soares — Jorge Costa — Mariana
Mortágua — Pedro Soares — Isabel Pires — José Moura Soeiro — Heitor de Sousa — João Vasconcelos —
Maria Manuel Rola — Fernando Manuel Barbosa — Jorge Falcato Simões — Carlos Matias — Joana
Mortágua — José Manuel Pureza — Luís Monteiro — Moisés Ferreira — Ernesto Ferraz — Catarina Martins.
———
PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 2055/XIII/4.ª (*)
RECOMENDA AO GOVERNO QUE CLARIFIQUE PROCEDIMENTOS PARA CAPTAR CANDIDATOS
LUSODESCENDENTES E EMIGRANTES PARA AS INSTITUIÇÕES DE ENSINO SUPERIOR
PORTUGUESAS
Exposição de motivos
O número de portugueses que estão emigrados pelos quatro cantos do mundo é de cerca de 2,3 milhões,
segundo estimativas da Organização das Nações Unidas. Alargar o número à diáspora é uma estimativa mais
complexa, mas é consensual situá-lo em 15 milhões de pessoas.
Os países da Europa representam cerca de 62% da emigração lusa, já que neles residem 1,4 milhões de
portugueses, sobretudo na União Europeia. Portugal é, de resto, o país da União Europeia com mais
emigrantes, em proporção da população residente. Mas há outros países relevantes como os Estados Unidos
da América ou a África do Sul, no que toca ao número de lusodescendentes, ou como a Venezuela, dada a
sua situação conjuntural.
De acordo com dados do Observatório da Emigração, a tendência global da emigração portuguesa é de
estabilização. O número de saídas reduziu e tende a estabilizar, assim como o número de residentes no
exterior. Os regressos são poucos e inferiores às saídas.
O Estado português deve estreitar cada vez mais as relações com a diáspora, promovendo a língua e a
cultura portuguesas, assim como facilitar a todos os portugueses e seus descendentes a viver no estrangeiro o
acesso ao ensino, nomeadamente às instituições de ensino superior portuguesas, nos vários ciclos de ensino
– desde logo, mas não só, como uma das formas de mitigar os efeitos negativos da demografia a curto prazo.
É fundamental que o País consiga atrair lusodescendentes para as suas universidades e institutos
politécnicos, sabendo que este desiderato não se atinge com aumento de contingentes especiais para filhos
de emigrantes e lusodescendentes. Prova disso é o facto de terem ficado por preencher mais de 3200 das
3500 vagas a que se puderam candidatar, através dos contingentes especiais, no último concurso de acesso.
A iniciativa Estudar e Investigar em Portugal (Study & Research in Portugal), promovida pelo Governo
português em cooperação com as instituições de ensino superior, ciência e tecnologia, é um instrumento no
sentido da promoção e internacionalização do país nesta área, materializando-se na plataforma onlinestudy-
research.pt.
Trata-se de uma forma de divulgação de informação sobre o sistema de ensino superior e de ciência
Português, a par de outras que o Governo tem vindo a realizar, como sejam as «Jornadas Estudar e Investigar
em Portugal 2019», lançadas no presente mês de março.
Estas iniciativas, no entanto, não atendem a questões específicas que muitas das vezes são impedimento
ao efetivo acesso destes potenciais candidatos, não por falta de interesse dos mesmos ou capacidade de
atração das nossas instituições, mas por que os processos (por exemplo, de obtenção de equivalências) não
estão estabelecidos nos ministérios responsáveis (da Educação, da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior e
dos Negócios Estrangeiros), não são claros para os interessados, nem existe um «ponto» de contacto e de
esclarecimento conhecido.
Nestes termos, o Grupo Parlamentar do CDS-PP, ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais
aplicáveis, propõe que a Assembleia da República recomende ao Governo que:
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1 – Crie um grupo de trabalho com o mandato de: estabelecer e divulgar os procedimentos e o calendário
que, filhos de emigrantes e lusodescendentes, devem tomar para acesso simplificado via o contingente
especial; e agilizar os processos de reconhecimento das equivalências e dos certificados de conclusão do
ensino não superior emitidos por outros países;
2 – Articulando a ação do Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior e do Ministério dos
Negócios Estrangeiros, e tendo em conta a atual conjuntura, promova um programa específico de acesso e
frequência do ensino superior para candidatos lusodescendentes provenientes da Venezuela.
Palácio de S. Bento, 22 de março de 2019.
Os Deputados do CDS-PP: Ana Rita Bessa — Ilda Araújo Novo — Nuno Magalhães — Telmo Correia —
Cecília Meireles — Hélder Amaral — João Pinho de Almeida — João Rebelo — Pedro Mota Soares —
Assunção Cristas — Álvaro Castello-Branco — António Carlos Monteiro — Filipe Anacoreta Correia — Isabel
Galriça Neto — João Gonçalves Pereira — Patrícia Fonseca — Teresa Caeiro — Vânia Dias da Silva.
(*)Título e texto iniciais substituídos a pedido do autor da iniciativa em 22 de março de 2019 [Vide DAR II Série-A n.º 75(2019.03.19)].
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PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 2059/XIII/4.ª
RECOMENDA AO GOVERNO A PROTEÇÃO DA ROLA-COMUM ATRAVÉS DE UMA MORATÓRIA
TEMPORÁRIA À SUA CAÇA
A rola-comum (Streptopelia turtur) é uma ave migratória que ocorre em todo o território nacional, com maior
incidência no norte do país. Está incluída na lista vermelha da União Internacional para a Conservação da
Natureza e dos Recursos Naturais das espécies ameaçadas (IUCN) com o estatuto de ameaçada com estado
vulnerável. Com efeito, a perda de habitat, a caça e a agricultura intensiva tem contribuído para a redução das
populações desta espécie.
A rola-comum é uma espécie protegida pela Diretiva Aves (2009/147/CE). No entanto, como integra o
anexo II desta diretiva europeia, «com base no seu nível populacional, na sua distribuição geográfica e na sua
taxa de reprodução no conjunto da Comunidade» os seus exemplares «podem ser objeto de atos de caça no
âmbito da legislação nacional». É ainda referido que «os Estados-Membros velam para que a caça a essas
espécies não comprometa os esforços de conservação empreendidos na sua área de distribuição».
Face à vulnerabilidade da espécie, a Coligação C6 que integra as maiores Associações de Defesa do
Ambiente portuguesas (GEOTA, FAPAS, LPN, QUERCUS, SPEA e ANP/WWF) defende a suspensão
imediata da caça à rola-comum em Portugal e em toda a Europa. Adiantam ainda que a informação científica
mais recente revela um decréscimo populacional da espécie no país na ordem dos 80% tendo como ano de
referência 1994.
No entanto, a Portaria n.º 150/2018, de 18 de abril, continua a classifica a rola-comum como espécie
cinegética e, no seu anexo, estipula como limite diário o abate de 4 espécimes por caçador.
Atendendo ao grau de vulnerabilidade da espécie, o Grupo Parlamentar do Bloco de esquerda considera
que deve ser introduzido um período de interdição de caça a esta espécie até à mesma ser classificada como
não ameaçada. Aliás, considera que essa é a forma eficaz de aplicar a proteção da espécie consagrada na
Diretiva Aves no que respeita à obrigação do Estado-Membro garantir os esforços de conservação.
Ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, o Grupo Parlamentar do Bloco de
Esquerda propõe que a Assembleia da República recomende ao Governo:
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– A introdução de uma moratória à caça da rola-comum enquanto a espécie estiver classificada como
ameaçada em relação à sua conservação.
Assembleia da República, 22 de março de 2019.
As Deputadas e os Deputados do BE: Maria Manuel Rola — Pedro Filipe Soares — Jorge Costa —
Mariana Mortágua — Pedro Soares — Isabel Pires — José Moura Soeiro — Heitor de Sousa — Sandra Cunha
— João Vasconcelos — Fernando Manuel Barbosa — Jorge Falcato Simões — Carlos Matias — Joana
Mortágua — José Manuel Pureza — Luís Monteiro — Moisés Ferreira — Ernesto Ferraz — Catarina Martins.
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PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 2060/XIII/4.ª
RECOMENDA AO GOVERNO PORTUGUÊS A ELABORAÇÃO DE UM ESTUDO EPIDEMIOLÓGICO
E/OU AMBIENTAL PARA AVALIAR OS EFEITOS DAS ATIVIDADES ECONÓMICAS, NOMEADAMENTE,
INDUSTRIAIS, BEM COMO DOS PASSIVOS AMBIENTAIS EXISTENTES NA ALDEIA DE PAIO PIRES,
CONCELHO DO SEIXAL
A Constituição da República Portuguesa consagra, no seu artigo 66.º, o direito ao Ambiente e Qualidade de
Vida, determinando que «todos têm direito a um ambiente de vida humano, sadio e ecologicamente
equilibrado e o dever de o defender», devendo este direito ser assegurado pelo Estado, por meio de
organismos próprios e juntamente com a participação dos cidadãos, com vista a um desenvolvimento
sustentável.
A atividade industrial da empresa SN Seixal – Siderurgia Nacional, S.A., tem dado origem, ao longo dos
anos, a algumas reclamações, designadamente ao nível da deposição de partículas na Aldeia de Paio Pires e
da produção de ruído.
No passado dia 15 de fevereiro, a Comissão de Ambiente, Ordenamento do Território, Descentralização,
Poder Local e Habitação, após ter realizado audições com o Presidente da Câmara Municipal do Seixal, o
Presidente da Agência Portuguesa do Ambiente, o Inspetor-Geral do IGAMAOT e o Vice-Presidente da CCDR
de Lisboa e Vale do Tejo, efetuou uma visita às instalações da SN Seixal.
Nessa deslocação foi possível constatar que a empresa, a SN Seixal, tem realizado investimentos, quer no
que concerne aos vários processos de laboração, quer às próprias instalações.
Ainda, durante a visita foi referido que a empresa se encontra em fase de implementação de mais medidas
com impacto ambiental positivo, como por exemplo, a introdução de uma cortina arbórea, reforçando a
existente, que poderá minimizar os diversos impactes da atividade da siderurgia.
Também pôde ser verificada a redução de armazenamento nas instalações da empresa de Agregado
Siderúrgico Inerte para Construção (ASIC), um subproduto do processo de produção, que pode ser utilizado
na construção civil, que tinha estado na origem de parte das reclamações.
Acresce que, entre os dias 1 e 28 de janeiro, segundo dados (ainda não validados) da Agência Portuguesa
do Ambiente (APA), na estação de medição da qualidade do ar da Aldeia de Paio Pires, foram identificados
vários dias de ultrapassagem dos valores-limites diários de emissão de partículas inaláveis PM10.
Não obstante, não existe qualquer evidência de que as referidas excedências possam apenas ser
imputadas à atividade da SN Seixal, conquanto que, durante esse período, dias houve em que a laboração da
fábrica esteve completamente parada.
É de destacar que em 6 de abril de 2017 a APA concedeu a licença ambiental à SN Seixal por um período
de sete anos, tendo em conta os contributos recebidos na fase de consulta pública e a aplicação exigente das
Melhores Tenologias Disponíveis (MTD) para o setor siderúrgica emanadas da União Europeia.
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Tendo em consideração que as questões ambientais se revestem de extrema importância, e podem
interferir na qualidade de vida das pessoas e na saúde pública, importa assegurar uma correta laboração das
atividades para um desenvolvimento ambiental e socioeconómico equilibrado e sustentável, sendo ainda
relevante a disponibilização de estudos que garantam a confiança das populações nos instrumentos de
licenciamento, bem como de fiscalização das diversas atividades económicas.
Assim, porque o PSD é um partido que, sem descurar a economia do País, pretende também assegurar o
direito a um ambiente de vida ecologicamente equilibrado e sadio, entende ser necessário averiguar a
eventual existência e proveniência de impactos e passivos sentidos na aldeia de Paio Pires.
Nestes termos, ao abrigo das disposições legais e regimentais aplicáveis, os Deputados abaixo assinados
do Grupo Parlamentar do Partido Social Democrata apresentam o presente projeto de resolução, que
recomenda ao Governo, através do Ministro do Ambiente, que:
1 – Proceda à realização de estudos epidemiológicos e/ou ambientais para averiguar o impacto das
atividades económicas, nomeadamente, industriais, bem como dos passivos ambientais existentes, na
qualidade do ar e na saúde da população residente em toda a área geográfica da envolvente da Aldeia de
Paio Pires.
2 – Proceda à divulgação pública dos estudos efetuados, deles dando conhecimento à Autarquia Local e à
Assembleia da República.
Palácio de São Bento, 22 de março de 2019.
Os Deputados do PSD: Maria Luís Albuquerque — Bruno Vitorino — Maria Das Mercês Borges — Pedro
do Ó Ramos — António Costa Silva — Jorge Paulo Oliveira — Bruno Coimbra — Manuel Frexes — António
Topa — Berta Cabral — Emília Cerqueira — Maria Germana Rocha — Maurício Marques — Ângela Guerra —
António Lima Costa — Emília Santos — Isaura Pedro — José Carlos Barros — Sandra Pereira.
A DIVISÃO DE REDAÇÃO.