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18 DE NOVEMBRO DE 2019

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PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 64/XIV/1.ª

CONCESSÃO DE HONRAS DO PANTEÃO NACIONAL A ARISTIDES DE SOUSA MENDES

Aristides de Sousa Mendes, enquanto figura heroica da memória portuguesa, é património nacional.

Legado ético de todas e todos, é uma herança da sociedade civil e, sobretudo, um exemplo virtuoso para as

gerações vindouras.

Aristides de Sousa Mendes priorizou a consciência ética sobre os ditames da lei de um estado fascista.

Nesse gesto, de dissidência, salvou milhares de vidas da morte por decreto, da perseguição, e da cultura de

violência do regime nazi. Pagou, por isto, um preço elevadíssimo, tendo morrido na miséria. Uma injustiça só

parcialmente retificada pelo estado democrático que, no artigo 21.º da Constituição da República Portuguesa,

consagra o direito de resistência.

Aquilo que legitima a heroicidade é a contemporaneidade da mesma. A vivificação dos havidos atos, que

assim permite aos heróis «da lei da morte libertarem-se», isto é, obter a imortalidade através do

reconhecimento dos seus valores, gestos e atitudes. Certas imagens do passado que interrompem o presente

são irrecuperáveis se este presente não se sentir por elas visado, lembra-nos o filósofo Walter Benjamin,

também ele vítima do nazismo. Por estas razões, e justamente em 1940, ano do gesto humanista e

humanitário de Aristides de Sousa Mendes, Benjamin, nas suas Teses Sobre o Conceito de História,

aconselhava-nos a que nos apoderássemos das «memórias que relampejam em momentos de perigo»,

porque até «os mortos não estão a salvo se o inimigo vencer».

Aristides de Sousa Mendes nasceu em Cabanas de Viriato a 19 de julho de 1885 e faleceu em Lisboa a 3

de abril de 1954. Reconhecido diplomata, desempenhava funções de cônsul em Bordéus quando se inicia a

Segunda Guerra Mundial. É aí que se encontra quando as tropas de Adolf Hitler avançam rapidamente sobre a

França e é aí que desobedecerá a António de Oliveira Salazar e à sua Circular 14, datada de novembro de

1939, que ordenava aos cônsules portugueses que recusassem conferir vistos às seguintes categorias de

pessoas: «estrangeiros de nacionalidade indefinida, contestada ou em litígio; os apátridas; os judeus, quer

tenham sido expulsos do seu país de origem ou do país de onde são cidadãos».

É então em 1940 que dezenas de milhar de refugiados fogem do avanço nazi, dirigindo-se a Bordéus.

Muitos deles afluem ao consulado português desejando obter um visto de entrada em Portugal e onde Sousa

Mendes distribuiria vistos sem parcimónia.

A 8 de julho de 1940 Aristides encontra-se regressado a Portugal. Será punido pelo Governo de Salazar,

que priva Sousa Mendes, pai de família numerosa, do seu emprego diplomático por um ano, diminui em

metade o seu salário, antes mesmo de o reformar compulsivamente.

Em 1966, o Memorial do Holocausto, em Jerusalém, presta-lhe homenagem, atribuindo-lhe o título de Justo

entre as nações. Já em 1961, haviam sido plantadas vinte árvores em sua memória nos terrenos do referido

museu. Apesar do reconhecimento internacional – inclusive recentemente pela UNESCO, que aprovou o Livro

de Registo de Vistos Concedidos como «Memória do Mundo» – o regime democrático tem sido moroso na

reabilitação de Aristides de Sousa Mendes e não sem controvérsia.

Em 1986, Mário Soares condecorou-o, a título póstumo, com o grau de Oficial da Ordem da Liberdade e,

no ano seguinte, a família recebe desculpas públicas. Em 1994, Mário Soares inauguraria um busto em

homenagem a Aristides, bem como uma placa comemorativa no endereço do consulado de Portugal em

Bordéus. No ano seguinte, foi agraciado, também por Mário Soares, com a Grã-Cruz da Ordem Militar de

Cristo. Em 1998, no seguimento do processo de reabilitação oficial da memória de Aristides de Sousa Mendes

no Ministério dos Negócios Estrangeiros, foi condecorado com a Cruz de Mérito pela sua ação em Bordéus.

Marcelo Rebelo de Sousa, em 2016, elevá-la-ia a Grã-Cruz da Ordem da Liberdade.

Conceder a Aristides de Sousa Mendes honras do panteão é reconhecer oficialmente uma referência ética

e cívica para todas e todos. É, pois, imperativo que o Estado português reconheça Aristides de Sousa Mendes

através da sua panteonização para que o possamos também reconhecer em cada um de nós.

Tendo em conta o exposto, e no sentido de se repor a justiça em relação a um cidadão português que se

distinguiu não só no exercício de um alto cargo público mas, precisamente, na defesa dos valores da

civilização, em prol da dignificação da pessoa humana e da causa da liberdade, a Deputada abaixo assinada

apresenta, nos termos da Lei n.º 28/2000, de 29 de novembro, e do Regimento, o seguinte projeto de

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