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15 DE MAIO DE 2020

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Não é justo nem aceitável que um reduzido número de cidadãos e empresas, precisamente aqueles que

dispõem de maiores níveis de rendimento, disponham simultaneamente de instrumentos legais que lhes

permitem furtar-se ao contributo fiscal adequado à riqueza de que dispõem, eximindo-se no plano de fiscal das

suas obrigações perante a sociedade.

Um estudo publicado pelas universidades de Berkeley e Copenhaga1, aponta para que Portugal perca

quase 630 milhões de euros por ano (11% do IRC) pela transferência de lucros de grandes empresas para

regimes fiscais mais favoráveis. Um valor que é, seguramente, uma gota de água num oceano de fuga e

evasão fiscal (mesmo que a coberto de enquadramento legal) e branqueamento de capitais.

Quanto ao segundo aspeto enunciado, relacionado com as práticas criminosas que surgem frequentemente

associadas aos centros offshore, é igualmente necessário considerar medidas adequadas.

Mais do que paraísos fiscais, algumas jurisdições e territórios identificados como centros offshore

constituem-se como autênticas zonas insondáveis do ponto de vista da supervisão financeira e da cooperação

judicial.

O papel de veículos, contas e empresas sediadas em paraísos fiscais e jurisdições não cooperantes surge

como o denominador comum num vasto conjunto de operações, geralmente detetadas a posteriori, ocultando

práticas de fraude fiscal, fuga e branqueamento de capitais e, esse facto por si, deve convocar a ação política

e diplomática visando a extinção dos centros offshore à escala global.

Enquanto tal objetivo não é atingido, deve assumir-se a necessidade da ação legislativa no sentido da

limitação das possibilidades de utilização de centros offshore, com o reforço das medidas de controlo e

prevenção por parte das autoridades fiscais, judiciais, económicas e financeiras no sentido de prevenir, detetar

e combater práticas criminosas, bem como assegurar a defesa dos interesses nacionais que são comummente

lesados pelo crime financeiro, pelo desvio de recursos e a fraude fiscal.

A existência de centros offshore, independentemente da região do globo em que se inserem, tem

desempenhado um papel determinante no funcionamento e desenvolvimento do capitalismo, na crescente

concentração e centralização de capital, na erosão da base tributária dos Estados, no empobrecimento e

degradação das condições de vida da população, deitando por terra qualquer ilusão de um sistema capitalista

disciplinado e regulado.

Dos sucessivos casos de colapso bancário com que Portugal tem vindo a ser confrontado pode com

grande grau de certeza afirmar-se que, além das falhas matriciais do sistema de supervisão e regulação, a

utilização de complexos esquemas e redes de empresas, muitas das quais sediadas em paraísos fiscais ou

jurisdições não cooperantes é um elemento comum que dificulta e, em alguns casos impossibilita, qualquer

intervenção das entidades de supervisão ou das entidades judiciais.

O Partido Comunista Português tem um longo património de combate à existência de paraísos fiscais e

sempre denunciou a utilização dos centros offshore como plataformas utilizadas para concretizar esquemas de

fraude fiscal e crime económico.

A realidade vem demonstrando a justeza dessas considerações. Igualmente, a realidade vem

demonstrando a incompatibilidade da transparência e da justiça na distribuição da riqueza e a existência de

«espaços jurídicos» cujos regimes legais e fiscais funcionam como zonas livres de vigilância, supervisão ou

ação judiciária. Ao mesmo tempo que os governos, entre os quais o português, tentam – muitas vezes em

nome dos próprios grupos económicos e financeiros – tranquilizar as populações com a ilusão de que a

supervisão e a lei tudo resolvem, permitem as relações comerciais e profissionais, os fluxos e operações

financeiras com regiões jurídicas onde não é possível qualquer espécie de supervisão ou controlo. Tal

contradição demonstra que não podem coexistir regras de transparência e combate à fraude fiscal,

branqueamento de capitais e financiamento ao terrorismo verdadeiramente eficazes com jurisdições não

cooperantes ou com plataformas offshore.

Se, por um lado, é fundamental uma ação concertada no plano internacional para o fim da existência e da

criação de novos offshore; por outro é determinante que se inicie em cada país a aplicação de normas que

limitem desde logo a exposição das suas economias e dos seus sistemas financeiros à utilização de

companhias, contas bancárias ou entidades de propósitos especiais sediadas em paraísos fiscais ou

jurisdições não cooperantes. Exige-se a forte limitação, ou mesmo a proibição de relacionamentos com

1 Jornal de Negócios, 1 de outubro de 2019.

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