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Segunda-feira, 17 de Abril de 2006 II Série-B - Número 40

X LEGISLATURA 1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2005-2006)

S U M Á R I O

Comissão Parlamentar de Inquérito à Gestão do Processo Eurominas:
Relatório final dos trabalhos da Comissão.

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COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUÉRITO À GESTÃO DO PROCESSO EUROMINAS

APRECIAÇÃO DOS ACTOS DOS XII, XIII E XIV GOVERNOS CONSTITUCIONAIS, NO ÂMBITO DO PROCESSO QUE LEVOU AO PAGAMENTO DE CONTRAPARTIDAS E INDEMNIZAÇÕES À EMPRESA EUROMINAS

Relatório final

A - Introdução

O Diário da Assembleia da República II Série A, n.º 64, de 30 de Novembro de 2005, publicou, a pp. 66 e 67, um pedido para a constituição de uma comissão parlamentar de inquérito à gestão do processo Eurominas, apresentado por vários Deputados do Partido Social Democrata, nos termos dos artigos 156.º, alínea e), da Constituição da República Portuguesa, 11.º, n.º 1, alínea h), do Regimento e 2.º, n.º 2, alínea a), da Lei n.º 5/93, de 1 de Março, com as alterações que lhe foram introduzidas pela Lei n.º 126/97, de 10 de Dezembro.
No seu seguimento, a Assembleia da República, pela Resolução publicada no Diário da Assembleia da República II Série A, n.º 65, de 3 de Dezembro de 2005, deliberou "a constituição de um comissão parlamentar de inquérito aos actos da responsabilidade dos sucessivos governos constitucionais, seus membros, e dos demais órgãos do Estado e entidades públicas ou por estas participadas, no âmbito do processo que levou à implantação, laboração, encerramento e pagamento de contrapartidas e indemnizações à empresa Eurominas, com instalações na Península da Mitrena, em Setúbal, junto ao estuário do rio Sado. O inquérito teve por objecto, designadamente, o integral esclarecimento e a apreciação dos actos alegadamente praticados por antigos e actuais membro do Governo da Nação, antigos e actuais Deputados à Assembleia da República, bem como de mais entidades e cidadãos relacionados no que respeita: a) Aos pressupostos, às circunstâncias e aos fundamentos que determinaram o pagamento à Eurominas de contrapartidas e indemnizações por parte, designadamente, da, então, EDP - Electricidade de Portugal e do Estado português; b) Às posições oficiais assumidas sobretudo pelos XII, XIII e XIV Governos Constitucionais quanto ao pagamento à Eurominas de tais contrapartidas e indemnizações, bem como ao conteúdo das posições assumidas, relativamente a essa matéria, pelo Ministério Público, enquanto legitimo representante dos interesses do Estado; c) À existência ou não de prejuízos para o Estado decorrentes de todo o contexto atrás descrito.
A Resolução da Assembleia da República foi publicada com o n.º 65/2005 no Diário da República I-A Série, n.º 237, de 13 de Dezembro de 2005.
O Sr. Presidente da Assembleia da República, através de Despacho n.º 55/X, de 2 de Dezembro de 2005, rectificado pelo Despacho n.º 55-A/X, publicados nos Diários da Assembleia da República, II Série C, n.º 30, de 3 de Dezembro de 2005, e II Série C, n.º 31, de 5 de Dezembro de 2005, fixou em 23 o número de membros da comissão de inquérito, cuja composição ficou estabelecida nos seguintes termos:

- Doze Deputados do Grupo Parlamentar do PS;
- Cinco Deputados do Grupo Parlamentar do PSD;
- Dois Deputados do Grupo Parlamentar do PCP;
- Dois Deputados do Grupo Parlamentar do CDS-PP;
- Um Deputado do Grupo Parlamentar do BE;
- Um Deputado do Grupo Parlamentar de Os Verdes.

Pelos respectivos grupos parlamentares foram então indicados para integrarem a Comissão de Inquérito os seguintes Srs. Deputados:

Ana Catarina Veiga Santos Mendonça Mendes (PS);
António Ramos Preto (PS);
Jorge Manuel Gouveia Strecht Ribeiro (PS);
José Carlos Correia Mota de Andrade (PS);
José Eduardo Vera Cruz Jardim (PS) (substituído a partir de 24 de Janeiro de 2006 pelo Deputado Marcos Sá Rodrigues);
Luís Afonso Cerqueira Natividade Candal (PS);
Luís Garcia Braga da Cruz (PS);
Luísa Maria Neves Salgueiro (PS);
Maria Antónia Moreno Areias de Almeida Santos (PS);
Maria de Belém Roseira Martins Coelho Henriques de Pina (PS);
Ricardo Manuel de Amaral Rodrigues (PS);
Rui do Nascimento Rabaça Vieira (PS);
Emídio Guerreiro (PSD);

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Fernando Mimoso Negrão (PSD);
Luís Filipe Alexandre Rodrigues (PSD);
Luís Filipe Montenegro Cardoso de Morais Esteves (PSD);
Paulo Artur dos Santos Castro de Campos Rangel (PSD) (substituído a partir de 10 de Janeiro de 2006 pelo Deputado Agostinho Correia Branquinho);
Artur Jorge da Silva Machado (PCP);
José Batista Mestre Soeiro (PCP);
Diogo Nuno de Gouveia Torres Feio (CDS-PP);
Luís Pedro Russo da Mota Soares (CDS-PP);
Helena Maria Moura Pinto (BE);
Francisco Miguel Baudoin Madeira Lopes (Os Verdes).

Aos 7 dias do mês de Dezembro, pelas 14.45 horas, foi, pelo Sr. Presidente da Assembleia da República, conferida a posse à Comissão, conforme consta do respectivo registo de presenças, tendo, nesta reunião, sido eleita a Mesa, que passou a ter a seguinte constituição:

Presidente: Fernando Mimoso Negrão (PSD);
Vice-Presidente: Luís Garcia Braga da Cruz (PS);
Secretário: Artur Jorge da Silva Machado (PCP);
Secretário: Diogo Nuno de Gouveia Torres Feio (CDS-PP).

Iniciados os trabalhos, a Comissão adoptou o seu regulamento interno, publicado no Diário da Assembleia da República, II Série B, n.º 28, de 21 de Janeiro de 2006, e elegeu para relator o Sr. Deputado Jorge Manuel Strecht Ribeiro.
A Comissão realizou as seguintes reuniões:

Dia: 7 de Dezembro de 2005
Ordem de trabalhos: posse e eleição da Mesa
Início: 14.45 horas
Encerramento: 15.30 horas

Dia: 12 de Dezembro de 2005
Ordem de trabalhos: contagem do prazo de funcionamento da Comissão; definição da metodologia de trabalhos; diligências a efectuar tendo como objectivo o cumprimento da metodologia de trabalhos definida
Início: 15.00 horas
Encerramento: 15.45 horas

Dia: 10 de Janeiro de 2006
Ordem de trabalhos: aprovação do Regulamento da Comissão (já distribuído); designação dos relatores; indicação de novas diligências, designadamente audições
Início: 10.30 horas
Encerramento: 13.20 horas

Dia: 12 de Janeiro de 2006
Ordem de trabalhos: audição do Sr. Dr. Bernardo de Arrochela Alegria (14.00 horas); audição do Sr. Dr. Vitalino José Ferreira Prova Canas (17.00 horas).
Início: 14.00 horas
Encerramento: 21.15 horas

Dia: 17 de Janeiro de 2006
Ordem de trabalhos: audição do Sr. Dr. José Alberto Rebelo dos Reis Lamego (10.00 horas); audição do Sr. Eng.º João Cardona Gomes Cravinho (12.00 horas); audição do Sr. Dr. António Manuel de Carvalho Ferreira Vitorino (15.00 horas); audição do Sr. Dr. Vitalino Canas (17h30 horas); organização - continuação - dos trabalhos da Comissão; discussão da natureza dos documentos não comunicáveis; e marcação de novas audições
Início: 10.00 horas
Encerramento: 22.00 horas

Dia: 18 de Janeiro de 2006
Ordem de trabalhos: audição do Sr. Eng.º João Cardona Gomes Cravinho
Início: 10.00 horas
Encerramento: 14.30 horas

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Dia: 19 de Janeiro de 2006
Ordem de trabalhos: audição do Sr. Dr. Vitalino Canas (10.00 horas); continuação da audição do Sr. Eng.º João Cravinho (15.00 horas); organização - continuação - dos trabalhos da Comissão; discussão da natureza dos documentos não comunicáveis; e marcação de novas audições.
Início: 13.00 horas
Encerramento: 20.40 horas

Dia: 25 de Janeiro de 2006
Ordem de trabalhos: audição do Sr. Narciso Miranda (10.00 horas); audição do Sr. Dr. José Junqueiro (15.00 horas); audição do Sr. Juiz Conselheiro Luciano Patrão (17.30 horas)
Início: 10.00 horas
Encerramento: 20.05 horas

Dia: 26 de Janeiro de 2006
Ordem de trabalhos: audição do Sr. Comandante Eduardo Azevedo Soares (09.30 horas); audição do Sr. Eng.º António Duarte Silva (11.30 horas); e programação de novas diligências, nomeadamente audições
Início: 09.30 horas
Encerramento: 20.05 horas

Dia: 1 de Fevereiro de 2006
Ordem de trabalhos: aprovação das actas das reuniões da Comissão, realizadas nos dias 25 e 26 de Janeiro de 2006; e apresentação e discussão do questionário
Início: 14.30 horas
Encerramento: 16.45 horas

Dia: 2 de Fevereiro de 2006
Ordem de trabalhos: prorrogação do prazo de funcionamento da Comissão
Início: 19.00 horas
Encerramento: 19.20 horas

Dia: 7 de Fevereiro de 2006
Ordem de trabalhos: audição do Sr. Dr. Luís Pais Antunes
Início: 10.00 horas
Encerramento: 12.00 horas

Dia: 8 de Fevereiro de 2006
Ordem de trabalhos: audição do Sr. Eng.º Consiglieri Pedroso (10.00 horas) e do Sr. Dr. Jorge Dias
Início: 10.00 horas
Encerramento: 19.40 horas

Dia: 9 de Fevereiro de 2006
Ordem de trabalhos: audição do Sr. Dr. Aragão Botelho
Aprovação das actas das reuniões da Comissão, já distribuídas. Votação dos requerimentos já apresentados à Comissão e marcação de nova reunião e respectivo âmbito
Início: 10.00 horas
Encerramento: 13.15 horas

Dia: 14 de Fevereiro de 2006
Ordem de trabalhos: aprovação das actas das reuniões da Comissão, já distribuídas; votação dos requerimentos já apresentados à Comissão e marcação de nova reunião e respectivo âmbito
Início: 19.00 horas
Encerramento: 20.30 horas

Dia: 16 de Fevereiro de 2006
Ordem de trabalhos: discussão sobre as propostas de quesitos apresentadas pelos diferentes grupos parlamentares
Início: 19.00 horas
Encerramento: 20.16 horas

Dia: 17 de Fevereiro de 2006
Ordem de trabalhos: continuação da discussão sobre as propostas de quesitos apresentadas pelos diferentes grupos parlamentares

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Início: 10.35 horas
Encerramento: 13.25 horas

Prestaram juramento quanto à confidencialidade e segredo de justiça relativo a todos os actos do processo de inquérito a que a Comissão procedeu os funcionários da Assembleia da República que colaboraram no apoio à Comissão: a Chefe de Divisão de Apoio às Comissões Alexandra Fonseca Pereira da Graça, a Técnica Superior Principal Jurista Maria Filomena Aveiro Alves, o Técnico Parlamentar Principal António Carlos Silva Pereira, a Assistente Administrativa Principal Isabel Maria da Silva Cascalheira Cabrita, a Assessora Principal Isabel Maria Dominguez Barral, os Técnicos Superiores Principais Isabel Maria Martins de Campos, Vera Maria Carvalho de Andrade, José Mendes Marques, Maria Emília Madeira Mendes Ribeiro, Margarida Sofia Romão Ascensão, Maria Cecília Barata, Maria Manuela da Costa, João Nuno de Melo Amaral, Maria Jorge de Carvalho, Maria Teresa Carvalho, Maria Fernanda Lopes Pereira e Sónia Cristina Godinho Milhano, os Técnicos Superiores de Primeira Classe Elisabete da Cruz Silva, Maria do Rosário Tavares, Maria Teresa Coelho e Maria Emília Azevedo Machado, a Adjunta Parlamentar Especialista Maria Carla Gomes Rodrigues, o Adjunto Parlamentar de Primeira Classe Miguel António de Campos Caria, o Secretário Parlamentar Especialista Idalécio José dos Santos Martins e os Auxiliares Parlamentares Ricardo Manuel Oliveira Gonçalves, Maria dos Prazeres Guerreiro de Brito Correia, Maria João de Jesus Alves da Costa e Paula Cristina Garcia dos Santos.
Em 21 de Dezembro de 2005 o Sr. Procurador Geral da República informou o Sr. Presidente da Assembleia da República que não se encontrava pendente qualquer processo de natureza criminal relacionado com o inquérito parlamentar em curso, existindo, apenas, uma averiguação preventiva nos termos do n.º 1 do artigo 1.º da Lei n.º 36/94, de 29 de Setembro. Por despacho do Sr. Presidente da Assembleia da República, de 29 de Dezembro de 2005, esta informação foi transmitida à Comissão.
Na prossecução dos seus trabalhos, a Comissão realizou reuniões nas quais foram ouvidos os seguintes depoentes:

- Dr. Bernardo de Arrochela Alegria, ex-administrador da empresa Eurominas, Electro Metalurgia, SA - 12 de Janeiro de 2006;
- Dr. José Alberto Rebelo dos Reis Lamego, ex-Secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros e da Cooperação - 17 de Janeiro de 2006;
- Dr. António Manuel de Carvalho Ferreira Vitorino, ex-Ministro da Presidência do Conselho de Ministros - 17 de Janeiro de 2006;
- Dr. Vitalino José Ferreira Prova Canas, ex-Secretário de Estado da Presidência do Conselho de Ministros - 17 e 19 de Janeiro de 2006;
- Eng.º João Cardona Gomes Cravinho, ex-Ministro do Equipamento, Planeamento e Administração do Território - 18 e 19 de Janeiro de 2006;
- Sr. Narciso Miranda, ex-Secretário de Estado da Administração Marítima e Portuária - 25 de Janeiro de 2006;
- Dr. José Junqueiro, ex-Secretário de Estado da Administração Marítima e Portuária - 25 de Janeiro de 2006;
- Juiz Conselheiro Luciano Patrão, presidente do grupo de trabalho criado no âmbito do protocolo assinado entre o Estado e a Empresa Eurominas - 25 de Janeiro de 2006;
- Comandante Eduardo Azevedo Soares, ex-Ministro do Mar - 26 de Janeiro de 2006;
- Eng.º António Duarte Silva, ex-Ministro do Mar - 26 de Janeiro de 2006;
- Dr. Luís Pais Antunes, ex-Director-Geral da Direcção-Geral de Concorrência e Preços - 7 de Fevereiro de 2006;
- Eng.º José Manuel Costa Monteiro Consiglieri Pedroso, ex- Secretário de Estado Adjunto do Ministro do Equipamento, Planeamento e Administração do Território - 8 de Fevereiro de 2006;
- Jorge Dias, ex-Chefe de Gabinete do Ministro da Presidência - de Fevereiro de 2006;
- Aragão Botelho, vogal do Conselho de Administração da Administração dos Portos de Setúbal e Sesimbra - de Fevereiro de 2006.

A Comissão, no âmbito do processo de inquérito, solicitou cópias de elementos procedimentais e processuais a diversas entidades, a saber:

Ao Governo, através do Ministro dos Assuntos Parlamentares:

- Relativos às diligências, designadamente pareceres externos e internos, ao processo administrativo e legislativo que levou à determinação da reversão, operada pelo Decreto n.º 14/95, de 22 de Maio, para o domínio público marítimo dos terrenos do estuário do rio Sado desafectados pelo Decreto n.º 337/73, de 5 de Julho (ofício da Comissão n.º 03/CEI/Eurominas);
- Relativos às comunicações, actas de reuniões e documentos oficiais existentes na Presidência de Ministros, MEPAT (Ministério do Equipamento, Planeamento e Administração do Território), expediente na

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Secretaria de Estado dos Assuntos Portuários, na Administração do Porto de Setúbal e Sesimbra (APSS) e EDP, relativos ao processo que levou à concessão da indemnização à empresa Eurominas, bem como aos trabalhos do grupo de peritos que se reuniu em 1999 (ofício da Comissão n.º 03/CEI/Eurominas);
- Relativos aos processos judiciais entre a empresa Eurominas e o Estado (ofício da Comissão n.º 03/CEI/Eurominas);
- Relativos aos processos judiciais entre as empresas Eurominas e EDP - Electricidade de Portugal (ofício da Comissão n.º 03/CEI/Eurominas);
- Relativos ao grupo técnico (ou de trabalho), criado pelo Governo para a fixação do valor da indemnização à empresa Eurominas (ofício da Comissão n.º 03/CEI/Eurominas);
- Documentação existente na Direcção-Geral do Tesouro, relativamente ao "Processo Eurominas" (ofício da Comissão n.º 11/CEI/Eurominas);
- Documentação referente à intervenção do Sr. Ministro da Presidência, Sr. Dr. António Vitorino, nomeadamente actas das reuniões e de todo o processo judicial entre o Estado e a empresa Eurominas (ofício da Comissão n.º 11/CEI/Eurominas);
- Actas do grupo de trabalho constituído no âmbito do "Processo Eurominas" (ofício da Comissão n.º 11/CEI/Eurominas);
- Informação 37/96, do Ministério do Equipamento, Planeamento e Administração do Território, dirigido ao Secretário de Estado Adjunto do Ministério do Equipamento, Planeamento e Administração do Território (ofício da Comissão n.º 13/CEI/Eurominas);
- Eventual despacho proferido pelo Ministro do Mar, ao abrigo do artigo 36.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 298/93, de 28 de Agosto, na redacção que lhe foi conferida pelo Decreto-Lei n.º 324/94, de 30 de Dezembro, relativamente à SAPEC, bem como as condições em que foi dada à SAPEC a concessão de serviço público referida na comunicação da SETEFRETE (ofício da Comissão n.º 13/CEI/Eurominas);
- Informação sobre a identificação dos elementos, à data, do Gabinete da Presidência do Conselho de Ministros - à excepção do Ministro e do Secretário de Estado - e se foi o Sr. Chefe de Gabinete que recebeu o documento ou se foi algum dos assessores, relativo a uma audiência concedida, em Novembro de 1995, à empresa Eurominas (ofício da Comissão n.º 15/CEI/Eurominas);

Ao Presidente do Conselho de Administração da EURODEL - Indústrias Metalúrgicas e Participações, SA

- Toda a documentação relevante sobre o "Processo Eurominas", no âmbito do processo de inquérito parlamentar em curso (ofício da Comissão n.º 05/CEI/Eurominas).
- Toda a documentação relativa ao litígio entre a empresa Eurominas e a EDP (ofício da Comissão n.º 09/CEI/Eurominas);
- Petição apresentada ao Parlamento Europeu pela empresa Eurominas (ofício da Comissão n.º 09/CEI/Eurominas).

Ao Presidente do Conselho de Administração da EDP - Electricidade de Portugal

- Toda a documentação relevante que o Conselho de Administração da EDP tenha em sua posse e que seja objecto do inquérito parlamentar em curso (ofício da Comissão n.º 06/CEI/Eurominas);
- Toda a documentação relativa ao litígio entre a EDP - Electricidade de Portugal e a empresa Eurominas (ofício da Comissão n.º 10/CEI/Eurominas).

Ao Sr. Deputado José Alberto Rebelo dos Reis Lamego:

- Cópia de toda a documentação que tivesse em sua posse relativa ao "Processo Eurominas" (ofício da Comissão n.º 12/CEI/Eurominas).

A Comissão solicitou, ainda, ao Sr. Presidente da Assembleia da República:

- A publicação da composição da Mesa da Comissão no Diário da Assembleia da República (ofício da Comissão n.º 02/CEI/Eurominas);
- A publicação do regulamento da Comissão no Diário da Assembleia da República (ofício da Comissão n.º 07/CEI/Eurominas);
- A elaboração pelos serviços de um dossier com cópias de todos os artigos publicados nos órgãos de comunicação social (imprensa escrita), que fossem objecto do âmbito da Comissão (ofício da Comissão n.º 04/CEI/Eurominas);
- A elaboração pelos serviços de um dossier contendo toda a legislação referente à empresa Eurominas, desde a sua criação (1973) até à data (ofício da Comissão n.º 04/CEI/Eurominas);

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- As diligências junto do Parlamento Europeu para que fosse enviada à Comissão cópia da petição apresentada pela empresa Eurominas a esta instituição comunitária (ofício da Comissão n.º 08/CEI/Eurominas).

Na sequência dos pedidos formulados, a Comissão recebeu a seguinte documentação:

Do Governo, através do Ministro dos Assuntos Parlamentares:

- Nove dossiers com documentação relativa aos procedimentos processuais existentes no Ministério das Obras Públicas, Transportes e Comunicações (resposta ao ofício da Comissão n.º 03/CEI/Eurominas);
- Oito dossiers com documentação relativa aos procedimentos processuais existentes na Presidência do Conselho de Ministros (resposta ao ofício da Comissão n.º 03/CEI/Eurominas);
- Dois conjuntos de elementos enviados pelo Ministério da Economia e da Inovação em complemento à documentação atrás referenciada (resposta ao ofício da Comissão n.º 03/CEI/Eurominas);
- Um conjunto de elementos enviados pelo Gabinete do Ministro de Estado e das Finanças (resposta ao ofício da Comissão n.º 11/CEI/Eurominas);
- Descrição técnica efectuada pelos serviços de tratamento arquivístico da Secretaria-Geral da Presidência de Conselho de Ministros relativamente às unidades de instalação correspondentes ao processo Eurominas existente no arquivo dos Gabinetes do Ministro da Presidência António Vitorino e do Secretário de Estado Vitalino Canas a guarda desta Secretaria-Geral (resposta ao ofício da Comissão n.º 11/CEI/Eurominas);
- Um dossier, composto por três conjuntos de documentação, remetido pelo Gabinete do Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações (resposta ao ofício da Comissão n.º 13/CEI/Eurominas).

Do Presidente do Conselho de Administração da EURODEL - Indústrias Metalúrgicas e Participações, SA:

- Um dossier (resposta ao ofício da Comissão n.º 05/CEI/Eurominas) com os seguintes documentos: brochura de apresentação da fábrica da Mitrena; cópia da escritura pública de compra e venda; petição do pedido de indemnização apresentada em 10 de Abril de 1997; carta da Samancor ao Primeiro-Ministro, em 26 de Junho de 1996; resposta do Gabinete do Primeiro-Ministro à Samancor, em 5 de Julho de 1996; acordo de transacção com a EDP assinado em 27 de Setembro de 1996; proposta apresentada pelo Ministro do Equipamento, entregue em 5 de Dezembro de 1996; despacho do Ministro do Equipamento de 27 de Janeiro de 1997, concordando com a proposta da Eurominas; exposição entregue pela Eurominas ao Primeiro-Ministro em 26 de Setembro de 1997; resposta do Gabinete do Primeiro-Ministro à empresa em Outubro de 1997; exposição entregue pela Eurominas ao Primeiro-Ministro em 29 de Dezembro de 1997; proposta de protocolo apresentada à empresa pelo Governo, em 3 de Março de 1998; resposta da empresa à proposta de 3 de Março; posição do Governo (com conhecimento às várias Secretarias de Estado envolvidas) à resposta da Eurominas de 3 de Março, apenas admitindo a solução indemnizatória; protocolo de 8 de Abril de 1998; indicação pelo Governo do nome do antigo Presidente do Supremo Tribunal Administrativo para presidir ao grupo de trabalho; comunicação do Governo, confirmando o acordo de 5 de Julho e enviando cópia da proposta de acordo do Juiz Conselheiro; protocolo/acordo de 31 de Maio de 2001; carta da Companhia Portuguesa de Electricidade (CPE), de 4 de Dezembro de 1972, que esteve na origem do investimento; contrato de fornecimento energético entre a Eurominas e a CPE assinado em 27 de Junho de 1973; estudo da Arthur Andersen sobre a importância do impacto do custo energético na indústria de ligas de manganês; parecer do Prof. Doutor Antunes Varela sobre a validade das garantias contratuais de fornecimento de energia eléctrica; parecer do Prof. Doutor Marcelo Rebelo de Sousa sobre a inconstitucionalidade da reversão dos activos da Mitrena; parecer do Prof. Doutor Diogo Freitas do Amaral e do Prof. Doutor João Caupers, sobre a reversão como inconstitucional e violadora da boa-fé; parecer do Prof. Doutor Menezes Cordeiro, sobre os direitos da empresa sobre os seus activos da Mitrena; petição, nos termos do artigo 138.º-D do Tratado de Roma, apresentada ao Parlamento Europeu pela empresa Eurominas (resposta ao ofício da Comissão n.º 09/CEI/Eurominas).

Do Presidente do Conselho de Administração da EDP - Electricidade de Portugal:

- Acordo celebrado entre a EDP - Electricidade de Portugal e a empresa Eurominas e documentação relativa à extinção dos litígios recíprocos (resposta ao ofício da Comissão n.º 06/CEI/Eurominas);
- Acervo dos diferentes processos administrativos e judiciais: Geral, Cível, Tribunal de Setúbal e Relação de Évora, Administrativo, Arbitral e Acordo de Transacção (resposta ao ofício da Comissão n.º 10/CEI/Eurominas).

Do Sr. Deputado José Alberto Rebelo dos Reis Lamego:

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- Informação de que não tinha em sua posse qualquer documentação relativa ao processo, para além dos pareceres jurisconsultos que a Comissão também tem em seu poder (resposta ao ofício da Comissão n.º 12/CEI/Eurominas).

No decurso da audição, realizada no dia 19 de Janeiro de 2006, o Sr. Eng.º João Cardona Gomes Cravinho entregou a seguinte documentação à Comissão:

- Um conjunto de documentos sobre o decreto regulamentar que procede à reversão para o domínio público marítimo dos terrenos desafectados pelo Decreto n.º 337/73, de 5 de Julho, nomeadamente notas nele manuscritas; notas manuscritas da reunião de Secretários de Estado de 27 de Março de 1995; nota manuscrita do Gabinete do Secretário da Presidência do Conselho de Ministros; informação do centro jurídico da Presidência do Conselho de Ministros relativa ao processo de recurso n.º 37933, acompanhando o respectivo projecto de resposta a ser assinado pelo Sr. Primeiro-Ministro e a ser entregue no Supremo Tribunal Administrativo.

Em complemento, e tendo em vista o mais completo apuramento da matéria constante do objecto da Comissão, foi adoptado o seguinte questionário, apresentado pelo Sr. Deputado Relator Jorge Manuel Strecht Ribeiro, que integra os contributos apresentados pelos diversos grupos parlamentares:

I - Da desafectação do domínio público marítimo:

Quesito 1:
A desafectação do domínio público marítimo e venda dos 90 hectares pelo Estado garantiam à Eurominas a propriedade plena dos mesmos, ou foi uma venda condicionada de carácter resolúvel, a favor do Estado, do terreno e respectivas benfeitorias em caso de incumprimento pela Eurominas dos compromissos assumidos para a sua desafectação?

Quesito 2:
Quais os pressupostos e termos do contrato que foi assinado com a empresa Eurominas para a cedência dos terrenos?

II - Do conflito entre a CEP/EDP e a Eurominas:

Quesito 3:
Constituindo a ruptura contratual da CPE/EDP com a Eurominas o elemento que objectivamente conduziu às condições de não cumprimento por parte da Eurominas dos compromissos que levaram à desafectação, importa clarificar:

a) Quais foram as condições, cláusulas e duração do contrato de fornecimento de energia estabelecido entre a CPE/EDP e a Eurominas em 27 de Junho de 1973?
b) Foi ou não legal a denúncia do referido contrato por parte da CPE/EDP no início de 1983?
c) Quais foram as razões que conduziram ao corte de fornecimento de energia eléctrica por parte da CPE/EDP à Eurominas em 8 de Agosto de 1986? O corte de fornecimento de energia efectuou-se imediatamente a seguir à ruptura do contrato?
d) Houve ou não tratamento discriminatório da Eurominas por parte da CPE/EDP relativamente a outras empresas?
e) Houve conhecimento ou intenção da tutela de promover a ruptura contratual com visto ao confisco dos bens da Eurominas?
f) Poderiam a EDP e a Eurominas ter agido de forma diferente, nomeadamente a EDP, continuado a fornecer energia pelos valores pretendidos e a Eurominas ter optado por outra solução?

Quesito 4:
Que razões levaram à assinatura do acordo entre a EDP e a Eurominas em 1986, e quais os critérios subjacentes à fixação do valor envolvido?
Quesito 5:
Quem, por parte do Estado, impulsionou o processo que culminou com a celebração no acordo supra mencionado?

III - Da reversão:

Quesito 6:
Existiam razões para a reafectação ao domínio público marítimo dos terrenos da Eurominas? Desde quando? Foram estas razões contrariadas ou corrigidas pela Eurominas?

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Quesito 7:
Quando é que foi determinada a reafectação?

Quesito 8:
Dos instrumentos jurídicos disponíveis, a reversão foi a melhor opção?

Quesito 9:
A forma escolhida, decreto, constituiu forma legal bastante para operar a reversão e poderia esta, face ao ordenamento jurídico em vigor, à época, efectuar-se sem qualquer tipo de indemnização?

Quesito 10:
Quais os fundamentos invocados pelo Estado para decretar a reversão?

Quesito 11:
Em que contexto se desenvolveu o processo de reversão?

Quesito 12:
Perante o pedido de suspensão do acto de reversão contido no Decreto n.º 14/95, de 22 de Maio, algum Governo efectuou diligências cujo resultado tenha sido o termo dessa suspensão?

IV - Resolução de conflitos:

Quesito 13:
O que propôs a Eurominas para a resolução dos litígios com o Estado e a EDP?

Quesito 14:
Teve o Governo, nomeadamente através do Gabinete do Ministro da Presidência, Dr. António Vitorino, contactos com a banca, na sequência dos contactos da Eurominas?

Quesito 15:
Qual foi a posição do XIII Governo Constitucional sobre as propostas da Eurominas, nomeadamente em que momento e quem decidiu explorar a via extra-judicial? Que outros condicionalismos contribuíram para esta posição do Governo?

Quesito 16:
Em que momento e quem decidiu a elaboração e o conteúdo do protocolo que veio a ser assinado, em 8 de Abril de 1998, entre o Estado e a Eurominas? Este acordo era vinculativo para as partes?

Quesito 17:
Quais as rubricas acordadas no protocolo assinado entre o Estado e a Eurominas, em 8 de Abril de 1998, para apuramento do valor da indemnização eventualmente a pagar à Eurominas?

Quesito 18:
O grupo de trabalho presidido pelo Sr. Juiz Conselheiro Dr. Luciano Patrão limitou-se a avaliar as rubricas contempladas no protocolo ou alargou o seu âmbito?

Quesito 19:
Que razões inviabilizaram o acordo quanto aos montantes a considerar como eventual indemnização a atribuir à Eurominas?

Quesito 20:
Que razões levaram o XIV Governo a retomar as negociações com a Eurominas? Quem teve a iniciativa de as retomar?

Quesito 21:
Que consideração mereceram por parte do Governo as declarações, os pareceres e as informações prestadas pelos representantes do Estado no grupo de trabalho envolvidos nas negociações com a Eurominas?

Quesito 22:
Qual foi a resolução final? Que desenvolvimentos registaram as pretensões originárias da Eurominas?

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Quesito 23:
Como e quando decorreu a execução concreta da reversão? Esta reversão foi operada num quadro pleno de segurança jurídica?

Quesito 24:
Como e por quem foi determinado o montante da indemnização? Quando e por quem foi decidido o seu pagamento e quem o efectuou?

Quesito 25:
Houve oposição do Ministério Público ao arquivamento, decorrente do acordo extra-judicial, dos processos cruzados que opunham a Eurominas e o Estado?

V- Ganhos e prejuízos para o Estado no processo Eurominas:

Quesito 26:
Que ganho obteve o Estado da conclusão deste processo por via extra-judicial que não obtivesse por via judicial?

B - Matéria de facto e de direito

I - Da desafectação do domínio público marítimo:

Quesito 1:
A desafectação do domínio público marítimo e venda dos 90 hectares pelo Estado garantiam à Eurominas a propriedade plena dos mesmos, ou foi uma venda condicionada de carácter resolúvel, a favor do Estado, do terreno e respectivas benfeitorias em caso de incumprimento pela Eurominas dos compromissos assumidos para a sua desafectação?
No início da década de 70 a Societé Française de Fonderies et Aciéries Électriques. SA, [SFFAE] que esteve na origem da criação da Eurominas, Indústrias Mineiras Limitada, iniciou conversações com as autoridades portuguesas com vista à instalação em Portugal de uma fábrica produtora de ligas de manganês.
Nas declarações que prestou à Comissão de Inquérito o Dr. Bernardo Alegria afirmou:

"A Eurominas é um projecto de investimento estrangeiro, que nasce em Portugal no início da década de 70 - os primeiros contactos surgiram em 1971 e 1972 -, tendo em vista a implementação de um projecto de uma fábrica de ligas de manganês. Para quem não sabe, o manganês é um minério que é utilizado como aditivo nas siderurgias, nas fundições, dando propriedade ao aço. As minas de manganês encontram-se essencialmente em África, no Gabão, na África do Sul e em Angola, e no Brasil. (…) foi negociado com o governo português da época um sapal na Mitrena, com cerca de 90 ha, que - e insisto nesta questão, porque isto é um pressuposto de tudo o que se vai seguir - e o governo entendia que o interesse público da preservação de um determinado espaço no domínio público era inferior ao interesse público do projecto industrial que ira ser desenvolvido nesse mesmo espaço (…)."

Da prova documental depositada na Comissão de Inquérito, constata-se, efectivamente, que a Eurominas requereu, em Julho 1972 (em dia que não é possível identificar), ao Ministro das Obras Públicas e Comunicações a desafectação do domínio público marítimo, nos termos dos artigos 1.º e 2.º do Decreto-Lei n.º 48 784, de 21 de Dezembro de 1968, de uma parcela de terreno, situada no Estuário do Rio Sado. Tal pretensão tinha por objectivo a instalação de uma unidade industrial de metalurgia de ligas de manganês, cuja autorização para a instalação e exploração foi requerida aos Ministros da Economia e do Ultramar, em 28 de Julho de 1972.
No aludido requerimento a Eurominas solicitou, em concreto, a desafectação "(…) da parcela de terreno cuja localização, área, limites e confrontação são as seguintes: Estuário do Sado a leste das instalações dos estaleiros navais da Setenave, numa área aproximada de 90 hectares (…)".
A fundamentar a sua pretensão a Eurominas alegava à época que "a indústria de exportação (metalurgia) que Eurominas pretende montar no nosso país à beira de água, irá receber, anualmente, em primeira fase, 200 000 a 250 000 toneladas de matérias-primas, por barco e expedirá, também, por barco, 100 000 a 150 000 toneladas de produtos, a maior parte dos quais destinados a países Mediterrânicos, norte da Europa, Estados Unidos e Japão. (…) A indústria só terá viabilidade se dispuser das indispensáveis bases de competição, em que é primordial a localização geográfica e a sua construção à beira de água, com cais privativo, que permita receber inicialmente minereleiros de 15 000 toneladas, e no futuro de 30 000 toneladas (…)".
O Decreto-Lei n.º 48 784, de 21 de Dezembro de 1968, diploma legal invocado pela Eurominas, permite, nos termos da norma contida no seu artigo 1.º, que os terrenos do domínio público sob a administração da Direcção-Geral dos Serviços Hidráulicos possam ser desafectados quando se considerem prevalecentes em

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relação ao uso público a que estão destinados, outros fins de interesse geral para que os terrenos sejam aptos e para cuja conveniente satisfação seja inadequado o regime de dominialidade.
Nos termos do artigo 2.º do aludido diploma legal, a desafectação compete ao Ministério das Obras Públicas e reveste a forma de decreto, referendado pelo respectivo Ministro e pelo Ministro das Finanças (n.º 1), dependendo, ainda, tratando-se de terrenos situados no litoral ou nas faixas marginais dos rios, dentro das zonas de jurisdição dos departamentos marítimos e capitanias, de parecer favorável da Comissão do Domínio Público Marítimo, homologado pelo Ministro da Marinha (n.º 2). A citada disposição legal estabelece, também, que o decreto de desafectação deverá indicar os fins a que os terrenos ficam destinados e o condicionamento a que eventualmente a sua utilização fique sujeita (n.º 3).
Importa, de igual modo, ter presente o teor do n.º 1 do artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 48 784, de 21 de Dezembro de 1968, que permite que os bens desafectados possam, conforme as circunstâncias, ser arrendados, vendidos, trocados ou cedidos, gratuita ou onerosamente e a título definitivo ou precário, ou, ainda, transferidos para outros serviços do Estado.
Finalmente, o n.º 1 do artigo 5.º do citado diploma legal estatui que reverterão para o domínio público os terrenos a que for dada utilização diferente da fixada no decreto de desafectação ou em relação aos quais não seja observado o condicionalismo nele estabelecido. Por seu turno, o n.º 2 da mesma norma legal determina que a reversão importa a perda a favor do Estado das obras e benfeitorias realizadas nos terrenos e não conferem direito a qualquer indemnização nem à restituição do preço por eles pago ou dos bens por ele permutados. O n.º 3 da mencionada norma estatui que a reversão revestirá a forma de decreto fundamentado.
Da prova documental depositada na Comissão de Inquérito ressalta, também, que ouvidas as entidades públicas competentes (Junta Autónoma do Porto de Setúbal (20/10/72), Direcção-Geral dos Portos a propósito de um requerimento da Eurominas solicitando autorização para a execução de um projecto de dragagens e aterros (30/10/72) e a Comissão do Domínio Público Marítimo (13/03/73), todas se pronunciaram favoravelmente à desafectação dos terrenos requerida pela Eurominas, considerando que o projecto reunia as condições de interesse geral e salientando que tal investimento fabril traria um incremento apreciável ao movimento do Porto de Setúbal e o desenvolvimento para a economia local.
Foi neste quadro que ocorreu a publicação do Decreto n.º 337/73, de 5 de Julho, aprovado de harmonia com o disposto no Decreto-Lei n.º 48 784, de 21 de Dezembro, que procedeu à desafectação do domínio público marítimo dos terrenos do Estuário do Rio Sado, limitados a norte pelo paralelo 38.º 29´ 10"N., a oeste pelo meridiano 8.º 47´ 3" W. de Greenwich, a leste pelo meridiano 8.º 46´ 42" W. de Greenwich e a sul pelo paralelo 38.º 28´ 15 N., estabelecendo relativamente aos mesmos o ónus de afectação especial à implantação de uma unidade industrial de produção de ligas de manganês.
A desafectação do domínio público marítimo dos terrenos do Estuário do Rio Sado para a Eurominas ficou, assim, desde o início, sujeita, como expressamente resulta do artigo 2.º do Decreto n.º 337/73, de 5 de Julho, ao ónus de afectação especial à implantação de uma unidade industrial de produção de ligas de manganês. A norma contida na aludida disposição legal determina, ainda, que os referidos terrenos se mantêm sob jurisdição da Junta Autónoma do Porto de Setúbal e quaisquer obras de estabelecimento ou complementares, ou ainda, de futura ampliação ou modificação não poderão neles ser executadas sem que os projectos hajam sido previamente aprovados pelo Ministro das Comunicações.
Com o mesmo espírito viria a dispor o clausulado do contrato de compra e venda dos aludidos terrenos, celebrado entre o Estado e a Eurominas, em 11 de Fevereiro de 1974. Com efeito, o aludido ónus de afectação especial está presente no ponto quatro deste contrato que estatui que "Os terrenos vendidos são destinados (…) à implantação de uma unidade industrial de produção de ligas de manganês, continuarão sob a jurisdição da Junta Autónoma do Porto de Setúbal e quaisquer obras de estabelecimento ou complementares, ou ainda, de futura ampliação ou modificação, não poderão neles ser executadas sem que os projectos hajam sido previamente aprovados pelo Ministro das Comunicações".
Por seu turno, o ponto cinco do mesmo contrato veio acrescentar um novo condicionalismo ao prever expressamente que "Os terrenos são alienados, para além dos condicionamentos próprios do regime a que legalmente estão sujeitos, com a limitação de o seu uso e fruição não poderem ser cedidos, parcial ou totalmente, por venda, arrendamento ou qualquer outra forma ou título, sem prévia autorização do Ministro das Finanças".
Os pontos seis e sete do contrato de compra e venda dos terrenos à Eurominas estabelecem as consequências do incumprimento do estipulado nos pontos quatro e cinco, isto é, "(…)a reversão dos terrenos para o domínio público" com "(…) a perda a favor do Estado de todas as obras e benfeitorias realizadas nos terrenos, sem direito a qualquer indemnização, nem à restituição do preço pago, ou à devolução da quantia adicional que porventura haja sido liquidada ao Estado nos termos do ponto oito".
Consta-se, assim, que quer o Decreto n.º 337/73, de 5 de Julho, que operou a desafectação dos terrenos do Estuário do Rio Sado, quer o contrato de compra e venda dos mesmos seguiram de perto o regime estabelecido nas normas contidas nos artigos 2.º e 5.º do Decreto-Lei n.º 48 784, de 21 de Dezembro, nomeadamente impondo o ónus de afectação especial e prevendo como consequência para o seu incumprimento a reversão para o domínio público dos terrenos, com perda a favor do Estado de todas as obras e benfeitorias realizadas nos mesmos, sem direito a qualquer indemnização, nem à restituição do preço pago (disposições legais que, à luz da evolução dos princípios gerais do direito administrativo e da própria

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Constituição da República Portuguesa são de duvidosa constitucionalidade e legalidade, pelo menos, na douta opinião de alguns ilustres juristas portugueses, de que se destacam o Prof. Marcelo Rebelo de Sousa e os Prof. Diogo Freitas do Amaral e Prof. João Caupers, cujos pareceres jurídicos sobre a matéria se encontram depositados na Comissão de Inquérito).
Em suma, da análise ao Decreto n.º 337/73, de 5 de Julho, e do contrato de compra e venda dos terrenos parece ser forçoso concluir, salvo melhor e mais qualificado entendimento, que a Eurominas não exercia sobre os terrenos desafectados um direito de propriedade plena, dado que a aquisição ficou sujeita ao continuado cumprimento de um dever especial, isto é, a instalação e funcionamento de uma unidade industrial de produção de ligas de manganês.
Esta consideração é, de resto, aceite pela própria Eurominas que, ao longo de todo o litígio que a opôs ao Estado português, nunca a pôs em crise, referindo, nomeadamente, na exposição que remeteu em 5 de Dezembro de 1996 ao Ministro do Equipamento e Administração do Território: "Sobre o supra referido imóvel recai um ónus de afectação especial, estabelecido nos termos do Decreto n.º 337/73, de 5 de Julho, segundo o qual o imóvel foi destinado à implantação de uma unidade industrial de produção de ligas de manganês".

Quesito n.º 2:
Quais os pressupostos e os termos do contrato que foi assinado com a empresa Eurominas para a cedência dos terrenos?
Da prova documental depositada na Comissão de Inquérito deriva que a parcela de terrenos a desafectar do domínio público marítimo destinava-se à implantação de uma unidade industrial de produção de ligas de manganês. A indústria só teria viabilidade, de acordo com a fundamentação expendida pela Eurominas, se dispusesse das indispensáveis bases de competição, para o que seria determinante a localização geográfica e, em concreto, a sua implantação à beira de água com cais privativo. A referida parcela de terrenos, logo que desafectada, destinava-se a ser alienada a favor da Eurominas para implantação da aludida indústria, para o que a Eurominas se propunha a realizar a compra da mesma ao Estado.
A desafectação da parcela de terrenos do domínio público marítimo e a sua alienação à Eurominas teve como pressuposto primordial, como fica amplamente demonstrado, a implantação de uma unidade fabril de produção de ligas de manganês. Todavia, do acervo documental depositado na Comissão de Inquérito outros pressupostos, para além do supra mencionado, podem ser identificados como tendo sido igualmente consagrados no processo que culminou com a desafectação e venda dos terrenos à Eurominas, nomeadamente: (i) investimento inicial de 250 a 300 000 contos; (ii) criação de cerca de 320 postos de trabalho; (iii) utilização e valorização de matérias-primas nacionais; (iv) duplicação da produção em três a quatro anos, o que representaria para o porto de Setúbal a movimentação de mais de 700 a 800 000 toneladas; (v) entrada líquida de divisas superiores a 200 000 contos/ano; (vi) o consumo anual de energia eléctrica em cerca de 400 000 000 Kwh.
Operada a desafectação do domínio público marítimo, a Eurominas requereu, ao abrigo do n.º 1 do artigo 4.º, do Decreto-Lei n.º 48 784, de 21 de Dezembro, que lhe fossem vendidos os terrenos referidos na resposta ao quesito que antecede, com uma área total de 863 325 m2, pretensão que acabaria por ser deferida por despacho do Secretário de Estado do Tesouro, de 17 de Novembro de 1973.
Assim, e consequentemente, em 11 de Fevereiro de 1974, no 8.º Cartório Notarial de Lisboa, foi celebrada uma escritura de compra e venda dos aludidos terrenos, de que se destacam, respectivamente, os pontos três, quatro, cinco, seis, sete e oito, que aqui se reproduzem:

"--- TRÊS - A venda é feita pelo preço total de SEIS MILHÕES NOVECENTOS E SEIS MIL E SEISCENTOS ESCUDOS, correspondente a metade do seu valor real resultante de avaliação que, para o efeito da presente cessão, se mandou efectuar, montante que neste acto recebeu e do qual dá quitação à compradora. ----------------------------------------------------------------------------------------
--- QUATRO - Os terrenos vendidos são destinados, nos termos do artigo segundo do Decreto número trezentos e trinta e sete/setenta e três, de cinco de Julho, à implantação de uma unidade industrial de produção de ligas de manganês, continuarão sob a jurisdição da Junta Autónoma do Porto de Setúbal e quaisquer obras de estabelecimento ou complementares, ou ainda, de futura ampliação ou modificação, não poderão nele ser executadas sem que os projectos hajam sido previamente aprovados pelo Ministro das Comunicações. ------------------------------------------------------------------------------------
--- CINCO - Os terrenos são alienados, para além dos condicionamentos próprios do regime a que legalmente estão sujeitos, com a limitação de o seu uso e fruição não poderem ser cedidos, parcial ou totalmente, por venda, arrendamento ou qualquer outra forma ou titulo, sem prévia autorização do Ministro das Finanças. ------------------------------------------------------------------------------- SEIS - O não cumprimento do estipulado nos números quatro e cinco importará a reversão dos terrenos para o domínio público. ----------------------------
--- SETE - A reversão prevista no número anterior importa a perda a favor do Estado de todas as obras e benfeitorias realizadas nos terrenos, sem direito a qualquer indemnização, nem à restituição do preço pago, ou

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à devolução da quantia adicional que porventura haja sido liquidada ao Estado nos termos do número oito -----------------------------------------------------------------------------------------
--- OITO - Na hipótese de cedência autorizada, nos termos do número cinco, da totalidade ou de qualquer fracção do terreno em causa, e tendo em atenção que o preço praticado corresponde a metade do apurado na avaliação mencionada, será a sociedade EUROMINAS - ELECTRO-METALURGIA, S.A.R.L., obrigada a pagar ao Estado, relativamente à área cedida, a importância de oito escudos por metro quadrado, ficando este montante sujeito a actualização em função dos coeficientes que forem fixados pela Portaria publicada nos termos do parágrafo terceiro do artigo vinte e cinco do Código da Contribuição Industrial e, na inexistência deles, em função do que se acha estabelecido no artigo quinhentos e cinquenta e um do Código Civil para as obrigações pecuniárias -------------------------------------------------------------------------"

Relativamente ao cumprimento dos pressupostos e dos termos do contrato celebrado com a Eurominas para a cedência dos terrenos, da prova documental depositada na Comissão de Inquérito foi possível apurar o seguinte:

a) A Eurominas cumpriu inicialmente o pressuposto principal inerente à desafectação dos terrenos do domínio público marítimo, bem como os termos do contrato de compra e venda dos aludidos terrenos, já que, efectivamente, procedeu à instalação nos mesmos de uma unidade industrial de produção de ligas de manganês;
b) Com o corte do fornecimento de energia eléctrica por parte da EDP, em 8 de Agosto de1986, a Eurominas cessou a sua actividade industrial de produção de ligas de manganês, tendo a partir desse momento desenvolvido exclusivamente actividades acessórias, designadamente a preparação da matéria-prima (manganês), através da unidade de sintetização, para além do empenhamento que, a partir de 1990, desenvolveu tendente à realização de novos projectos com vista à rentabilização dos terrenos e infra-estruturas neles existentes.
A este respeito, o Dr. Bernardo Alegria declarou à Comissão de Inquérito: "Como já referi, a fábrica iniciou a sua laboração em 1974, pouco antes do 25 de Abril. Ora, penso que não pode haver ninguém com memória para se lembrar de ter havido algum conflito social, algum problema de qualquer natureza, de que a Eurominas tivesse sido notícia, ou má notícia, enquanto laborou, até 1986 (…). Este aspecto da afectação especial para o projecto é extremamente importante, porque a fábrica foi construída, iniciou a sua laboração, desenvolveu-se e, na altura, tínhamos ali, talvez, o projecto mais ambicioso de ligas de manganês da Europa. Os barcos vinham, essencialmente, de África, do Gabão e da África do Sul, carregados de minério. Descarregavam o minério na Mitrena, no próprio cais da empresa, e eram os mesmos barcos que carregavam o produto acabado que seguiam para o norte da Europa onde se consumia esse tipo de produto". E, mais à frente no seu depoimento, precisou: "No início da minha exposição, insisti nesta ideia porque, para mim - e peço desculpa por insistir -, a afectação especial era a construção de uma fábrica de ligas de manganês. Ora, esse investimento foi feito e estava a decorrer uma arbitragem que era um elemento essencial para a laboração poder continuar";
c) O investimento inicial conducente à implantação da unidade industrial de produção de ligas de manganês foi cumprido;
d) Da movimentação portuária prevista para o Porto de Setúbal em resultado da instalação da unidade de produção de ligas de manganês (importação de 200 000 a 250 000 toneladas de matéria-prima e exportação de 100 000 a 150 000 toneladas de produtos numa primeira fase e a sua duplicação representando mais de 700 000 a 800 000 toneladas por ano numa segunda fase) apenas foi atingida a movimentação máxima de 338.337,7 toneladas ano, em 1978;
e) Dos cerca de 320 postos de trabalho previstos, a Eurominas tinha em Dezembro de 1985 ao seu serviço 175 trabalhadores; em Agosto de 1986, 174; em Dezembro de 1986, 146; em Maio de 1987, 32; em Janeiro de 1991, 11 e em Setembro de 1993, cessou a entrega de declarações à segurança social.

Quanto aos demais pressupostos inicialmente previstos, não é possível, com suficiente grau de certeza, avaliar o seu grau de cumprimento, sendo certo que podemos, ainda assim, considerar que o projecto desenvolvido pela Eurominas nos terrenos desafectados do domínio público marítimo, embora possa ter ficado aquém das expectativas iniciais, terá contribuído para a utilização e valorização de matérias-primas nacionais, para o desenvolvimento do Porto de Setúbal e Sesimbra e para um significativo consumo anual de energia eléctrica.
Vejam-se a este respeito as afirmações do Dr. Bernardo Alegria, prestadas perante a Comissão de Inquérito:

"(…) acredito que o projecto apresentado em 1972, 1973 ao governo de então fosse mais ambicioso do que veio a acontecer, mas é que para uma empresa que começa a laborar dois meses antes do 25 de Abril, com toda agitação social e todas as incertezas que surgiram, nos primeiros anos, é perfeitamente normal que os investidores fossem cautelosos, para além de que estamos a falar de uma actividade cíclica de capitais intensivos."

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Mais adiante, no seu depoimento o Dr. Bernardo Alegria, referiu, ainda:

"Quando adquirimos essa propriedade a afectação especial destinava-se à implementação de uma unidade industrial de manganês. Construímo-la. Depois fomos confrontados, pelos motivos que já falámos, ao ponto de não conseguirmos laborar, a determinada altura. Desenhámos uma estratégia que nos garantisse vir a laborar, até com algumas inovações, com algumas ligações a países com os quais Portugal deveria ter um melhor relacionamento do que outros (…)."

II - Do conflito entre a CEP/EDP e a Eurominas:

Quesito 3:
Constituindo a ruptura contratual da CPE/EDP com a Eurominas o elemento que objectivamente conduziu às condições de não cumprimento por parte da Eurominas dos compromissos que levaram à desafectação, importa clarificar:

a) Quais foram as condições, cláusulas e duração do contrato de fornecimento de energia estabelecido entre a CPE/EDP e a Eurominas em 27 de Junho de 1973?
De modo a poder compreender-se melhor os contornos do litígio que opôs a Eurominas à EDP, cumpre, previamente, antes de se fazer menção ao conteúdo (condições e duração) do contrato de fornecimento de energia eléctrica celebrado entre a Eurominas e a CPE/EDP, em 27 de Junho de 1973, referir a fase pré-contratual que antecedeu a celebração do referido contrato.
Assim, consta-se da vasta prova documental depositada na Comissão de Inquérito que:
- Em 13 de Novembro de 1970 a Societé Française de Fonderies et Aciéries Électriques. SA [SFFAE], que esteve na origem da criação da Eurominas, enviou à Companhia Portuguesa de Electricidade uma "carta preparatória", solicitando informações sobre o tarifário de energia eléctrica a aplicar à futura Eurominas. A sua intenção era conseguir junto da CPE um preço competitivo de energia eléctrica, considerando que "(…) esta competitividade deve ser assegurada não apenas no presente mas também no futuro para permitir a estabilidade desta indústria. Nestas condições é necessário que tenhamos garantias quanto à estabilidade do preço da energia" (tradução do relator);
- Em 20 de Janeiro de 1971 a CPE referindo que "(…) acolhe favoravelmente a iniciativa da SFFAE com vista à prática de uma tarifa especialmente reduzida para o fornecimento de energia" (tradução relator) propõe, por carta, uma tarifa especial, a rever de acordo com o preço do fuel;
- Em 19 de Fevereiro de 1971 a CPE confirmou e desenvolveu a sua proposta, comunicando as condições para a celebração de um contrato de fornecimento de energia com a duração de 10 anos, sendo que nos primeiros cinco anos a tarifa seria fixa e, nos restantes cinco anos, a tarifa seria revista de acordo com determinada fórmula;
- As negociações entre as duas entidades prosseguiram e em, 4 de Dezembro de 1972, a CPE enviou uma carta à Eurominas, onde refere "no seguimento das conversações havidas e da correspondência trocada anteriormente, cumpre-nos esclarecer alguns pontos da minuta de contrato, já acordada em princípio e a submeter à aprovação da Direcção-Geral dos Serviços Energéticos:
(…)
1) O facto de se consignar um primeiro período de validade de 10 anos não significa, da parte da CPE, qualquer intenção de, ulteriormente, fazer cessar o fornecimento de energia eléctrica ou de alterar as bases essenciais do contrato, o qual se prevê, de bona fide, sucessivamente prorrogável enquanto durar a laboração fabril, obviamente com adequada revisão tarifária (…)".

Concluídas as negociações entre a Eurominas e a CPE, estas entidades celebraram, em 27 de Junho de 1973, um contrato de fornecimento de energia eléctrica, em alta tensão, homologado pelo Governo, cujas cláusulas mais relevantes estabelecem as seguintes condições:

i) O contrato tem a duração de 10 anos civis completos (a contar da data da sua assinatura, acrescidos do período que decorrer entre essa data e o dia 31 de Dezembro do mesmo ano), findos os quais o mesmo considera-se renovado por períodos sucessivos de cinco anos, salvo se qualquer das partes o denunciar, por carta registada com aviso de recepção, pelo menos com seis meses de antecedência do termo do período que então decorrer;
ii) Durante os primeiros cinco anos de vigência do contrato a energia fornecida é facturada à razão de $17/kwh, nos cinco anos subsequentes aquele preço seria corrigido ano a ano de acordo com a fórmula de revisão ali estabelecida;
iii) As dúvidas e divergências quanto à interpretação e execução das cláusulas constantes do contrato são decidias, em única instância, por uma comissão arbitral composta por três peritos-árbitros, sendo um indicado pela CPE, outro pela Eurominas e o terceiro designado pelo Secretário de Estado da Indústria;

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iv) A constituição da comissão arbitral pode ser requerida por qualquer das partes à Direcção-Geral dos Serviços Eléctricos, que fixará um prazo não inferior a 15 dias para a indicação dos peritos-árbitros das partes. A falta de indicação do respectivo perito implica a desistência da reclamação ou a equiescência a ela, consoante a falta for do requerente ou do requerido. Se nenhuma das partes indicar o seu perito árbitro, extinguir-se-á o processo.

b) Foi ou não legal a denúncia do referido contrato por parte da CPE/EDP no início de 1983?
De acordo com a prova documental depositada na Comissão de Inquérito, em 1982, a CPE/EDP, invocando a cláusula 2.ª do contrato de fornecimento de energia eléctrica, celebrado entre as partes, em 27 de Junho de 1973, comunicou à Eurominas a denúncia do referido contrato de fornecimento de energia eléctrica, pondo, assim, termo à sua vigência em 31 de Dezembro de 1983.
Não tendo as partes chegado a acordo quanto ao estabelecimento de um novo contrato de fornecimento de energia eléctrica, a EDP passou a partir de 1 de Janeiro de 1984 e até 30 de Setembro de 1985 a facturar a Eurominas, pelos fornecimentos de energia que lhe foi fazendo, de acordo com o tarifário oficial em vigor, tendo, contudo, a Eurominas pago tal facturação de acordo com o tarifário estabelecido no contrato de fornecimento celebrado com a CPE em 1973.
A partir de 1 de Outubro de 1985 a EDP passou a aplicar aos fornecimentos de energia eléctrica que fazia à Eurominas uma tarifa mais baixa, prevista num contrato em negociação entre as partes que, contudo, nunca chegou a ser assinado, continuando a Eurominas a efectuar os pagamentos com base no contrato celebrado com a CPE em 1973.
Em 8 de Agosto de 1986, depois de, por carta de 28 de Julho de 1986, ter solicitado à Eurominas a satisfação dos pagamentos em divida, a EDP interrompeu o fornecimento de energia eléctrica àquela empresa.
Estes factos, para além de resultarem da documentação depositada na Comissão de Inquérito, estão presentes no depoimento prestado pelo Dr. Bernardo Alegria perante a Comissão de Inquérito, quando o mesmo, referindo-se às relações entre a Eurominas e a EDP, afirma:

"Entre 1984 e 1986 a empresa laborou num regime em que mensalmente liquidava as facturas, as suas responsabilidades, ao preço contratual e a EDP emitia facturas ao preço doméstico. Chega-se a Agosto de 1986 e é a ruptura (…)". Tendo mais à frente corrigido, referindo:

"É óbvio que quando eu disse consumo "doméstico" queria dizer industrial, atenção."

No que concerne, em concreto, à questão de (i)legalidade da denúncia do contrato de fornecimento de energia eléctrica celebrado entre a CPE/EDP e a Eurominas, não cabe à Comissão de Inquérito, no estrito âmbito das suas atribuições e competências, pronunciar-se sobre a mesma, até porque, não tendo a sua interpretação qualquer vinculação e ou eficácia jurídica, não se vislumbra do seu mérito.
Não deixará, contudo, de mencionar-se, tendo em conta a documentação depositada na Comissão de Inquérito, que a denúncia do contrato de fornecimento de energia eléctrica pela CPE/EDP não é pacífica, sendo que ilustres juristas portugueses, como é o caso do Prof. António Meneses Cordeiro e do Prof. Antunes Varela, consultados pela Eurominas sobre a questão, concluíram no sentido da sua ilegalidade.
Questionado sobre a questão da legalidade da denúncia contratual, o Dr. Bernardo Alegria declarou perante a Comissão de Inquérito, o seguinte:

"O que posso dizer-lhe, em relação ao contrato com a EDP, às garantias contratuais, etc., é que os Professores Antunes Varela e Menezes Cordeiro pensam, de certeza, muito melhor do que eu. Portanto, quanto à consistência dessas garantias contratuais, remeto-lhe para esses dois pareceres, até por falta de memória minha."

Finalmente, e porque assume particular relevância neste quadro, importa referenciar, também, a decisão do Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa, de 21 de Abril de 1988, que determinou que o litígio entre a EDP e a Eurominas deveria ser dirimido pela Comissão Arbitral prevista na cláusula 49.ª das Condições Gerais de Venda de Energia Eléctrica em Alta Tensão (CGVEEAT), pressuposto processual da acção judicial. Se a aludida Comissão Arbitral tivesse, de facto, tido lugar nos termos legais previstos e reforçados pela citada decisão judicial, a ruptura contratual teria, certamente, aí sido objecto de competente apreciação e até, possivelmente, resolvido em definitivo o litígio tarifário que opunha as partes em presença, sem prejuízo do ulterior recurso à via judicial.
c) Quais foram as razões que conduziram ao corte de fornecimento de energia eléctrica por parte da CPE/EDP à Eurominas em 8 de Agosto de 1986? O corte de fornecimento de energia efectuou-se imediatamente a seguir à ruptura do contrato?
De acordo com a prova documental depositada na Comissão de Inquérito, o corte do fornecimento de energia eléctrica em alta tensão por parte da CPE/EDP à Eurominas ficou a dever-se ao facto de, após a EDP ter denunciado, com efeitos a partir de 1 de Janeiro de 1984, o contrato de fornecimento de energia eléctrica

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celebrado entre as partes, em 27 de Junho de 1973, a Eurominas ter-se recusado a pagar a facturação da energia eléctrica fornecida de acordo com os novos tarifários.
Com efeito, entre 1 de Janeiro de 1984 e 30 de Setembro de 1985, a EDP passou a facturar a Eurominas, pelos fornecimentos de energia que lhe foi fazendo, durante esse período, pelo tarifário oficial em vigor. A partir de 1 de Outubro de 1986 a EDP passou a aplicar aos fornecimentos de energia eléctrica que fazia à Eurominas, uma tarifa mais baixa, prevista num contrato em negociação entre as partes que, contudo, nunca chegou a ser assinado. Durante todo esse período a Eurominas efectuou o pagamento da energia eléctrica que foi recebendo com base nas condições contratuais previstas no contrato de fornecimento de energia eléctrica celebrado entre as partes em 27 de Junho de 1973.
A propósito do corte do fornecimento de energia eléctrica, o Dr. Bernardo Alegria afirmou, no depoimento que prestou perante a Comissão de Inquérito, o seguinte:

"(…) lembrei-me de algo sobre este assunto da EDP - digo-o com o rigor de quem se lembra de uma conversa de há 10 anos atrás. É que a própria suspensão de fornecimento, por parte da EDP, em sede de energia de alta tensão era ilegal, ou seja, tratando-se de alta tensão, a EDP só a podia suspender após a arbitragem (…)."

Relembra-se, aqui, uma vez mais, o que o Dr. Bernardo Alegria afirmou, quando prestou o seu depoimento perante a Comissão de Inquérito:

"Entre 1984 e 1986 a empresa laborou num regime em que mensalmente liquidava as facturas, as suas responsabilidades, ao preço contratual e a EDP emitia facturas ao preço doméstico. Chega-se a Agosto de 1986 e é a ruptura (…)", tendo mais à frente corrigido, referindo "É óbvio que quando eu disse consumo "doméstico" queria dizer industrial, atenção".

Do exposto, também, se conclui facilmente que o corte do fornecimento de energia eléctrica não se efectuou imediatamente a seguir à denúncia do contrato. O contrato de fornecimento de energia eléctrica celebrado em 27 de Junho de 1973 foi denunciado pela EDP com efeitos a partir de 1 de Janeiro de 1984 e o corte do fornecimento de energia eléctrica só veio a ocorrer em 8 de Agosto de 1988, ou seja, volvidos mais de quatro anos.
d) Houve ou não tratamento discriminatório da Eurominas por parte da CPE/EDP relativamente a outras empresas?
Quer da prova documental depositada na Comissão de Inquérito quer da prova testemunhal prestada à Comissão de Inquérito, não parece resultar que a CPE/EDP tenha adoptado, em qualquer momento, comportamento que indicie prática discriminatória da Eurominas relativamente a outras empresas.
A confirmar esta tese, abona o facto de, durante todo o litígio que opôs a Eurominas à EDP, nunca aquela empresa, pelo menos assim parece resultar da prova documental depositada na Comissão de Inquérito, contestou a denúncia do contrato de fornecimento de energia eléctrica, celebrado em 27 de Junho de 1973, nem tão pouco o corte do fornecimento de energia promovido em 8 de Agosto de 1986, com base em violação do princípio da igualdade e não discriminação.
Acresce que, do depoimento prestado pelo Dr. Bernardo Alegria à Comissão de Inquérito em momento algum é referida tal hipótese de discriminação, antes pelo contrário, quando o mesmo em determinado momento refere "Chega-se a Agosto de 1986 e é a ruptura, mas a empresa honrou todas as sua obrigações para com os seus fornecedores, para com os seus trabalhadores e realço este aspecto porque é importante - aliás, havia outra empresa, paralela à da Eurominas, em Portugal, que era a Fornos Eléctricos, que todos sabemos que acabou por falir mas que tem uma história mais ou menos parecida só que com menos garantias contratuais do que as que nós tínhamos", parece evidenciar que uma outra empresa terá tido tratamento idêntico por parte da EDP.
e) Houve conhecimento ou intenção da tutela de promover a ruptura contratual com vista ao confisco dos bens da Eurominas?
Atenta a documentação depositada na Comissão de Inquérito, bem como os depoimentos prestados perante a Comissão de Inquérito, não é possível determinar que houve conhecimento ou intenção da tutela de promover a ruptura contratual com vista ao confisco dos bens da Eurominas.
A única alusão encontrada no acervo documental depositado na Comissão de Inquérito relativamente a este assunto consta de uma carta enviada, em 28 de Novembro de 2005, ao Sr. Presidente da Comissão de Inquérito pelo Eng.º Gerard Gamet, ex-administrador da Eurominas, que refere: "(…) Em Agosto de 1986 a EDP (empresa pública), dando seguimento às instruções recebidas da respectiva tutela, violando abruptamente as suas obrigações contratuais, interrompeu o fornecimento de energia eléctrica (…)".
Da consulta do vasto acervo documental e testemunhal depositado na Comissão de Inquérito não é possível apurar elementos susceptíveis de confirmar a tese expendida pelo Sr. Gerard Gamet.
Finalmente, ainda que se defendesse que a Direcção-Geral de Energia não actuou da melhor forma, quanto à constituição de uma comissão arbitral para dirimir o conflito tarifário entre a Eurominas e a EDP,

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continuariam a faltar bases sustentadas para daí se extrair que houve conhecimento ou intenção da tutela de promover a ruptura contratual entre as partes, visando o confisco dos bens da Eurominas.
f) Poderiam a EDP e a Eurominas ter agido de forma diferente, nomeadamente a EDP continuado a fornecer energia pelos valores pretendidos e a Eurominas ter optado por outra solução?
Da prova documental depositada na Comissão de Inquérito não se afigura possível concluir, com suficiente grau de certeza, que a EDP podia ter continuando a fornecer a energia eléctrica à Eurominas pelo tarifário previsto no contrato de fornecimento de energia eléctrica celebrado entre as partes em 27 de Junho de 1973.
A este respeito, numa alusão a uma petição apresentada pela Eurominas ao Parlamento Europeu, o Deputado António Vitorino declarou perante a Comissão de Inquérito:

"Penso que a razão que estava por detrás desta iniciativa foi porque, de alguma forma, o Estado português, isto é, a EDP e a Direcção-Geral de Energia invocavam regras comunitárias atinentes ao regime das ajudas de Estado, para não permitir a subsistência de um regime tarifário mais favorável. (…) A questão que se colocava era portanto a de aquilatar do bem fundado da razão comunitária invocada. Isto é, a impossibilidade da prática de um regime tarifário mais favorável, por causa das regras de concorrência no mercado interno. É uma questão complexa (…) porque nem todas ajudas de Estado são proibidas e algumas ajudas de Estado são consentidas e, muitas vezes, pode haver regimes excepcionais que permitam a derrogação da proibição das ajudas de Estado."

No decurso do depoimento que prestou à Comissão de Inquérito, o Deputado António Vitorino viria a reforçar esta tese, referindo:

"Sobre a retoma da actividade da Eurominas, devo dizer-lhe o seguinte: também não queria que ficasse aqui a ideia de que, para mim, este era um caso totalmente perdido. Não era, forçosamente, um caso totalmente perdido, de facto, por uma razão simples. A verdade é que, tendo eu acompanhado durante 10 anos o que são as negociações das ajudas de Estado em Bruxelas, do que são os argumentos utilizados pelos Estados para abrir excepções às ajudas de Estado em Bruxelas, já vi muita coisa (…).A questão, porém, era a de saber se essa era a via que o Estado estava disposto a empreender, a de uma complexa negociação com Bruxelas para permitir uma derrogação ao regime das ajudas de Estado que criasse um regime tarifário e energético excepcional para a Eurominas. Quero deixar-lhe apenas esta ideia: não se tratava de um sonho de "1001 noites". Era exequível, mas exigiria um investimento negocial muito significativo do Estado português e, por isso, eu não entendia que fosse uma via de execução fácil."

De salientar, também, que do acervo documental depositado na Comissão de Inquérito deriva que a EDP, a partir do momento em que promoveu a denúncia do contrato de fornecimento celebrado com a Eurominas, em 27 de Junho de 1973, nunca decaiu nessa sua decisão, tendo, contudo, a partir de 1 de Outubro de 1986, passado a aplicar aos fornecimentos de energia eléctrica que fazia à Eurominas uma tarifa mais baixa relativamente ao tarifário oficial em vigor, prevista num contrato em negociação entre as partes que, contudo, nunca chegou a ser assinado.
Relativamente à posição da Eurominas, da prova documental depositada na Comissão de Inquérito, assim como do depoimento prestado pelo Dr. Bernardo Alegria, ressalta que a mesma não aceitou a ruptura contratual promovida pela EDP, tendo no decurso do litígio, pese embora a EDP alegue que a Eurominas aceitou expressamente a denúncia "(…) através da sua carta de 15 de Dezembro de 1983 (…)", juntado os pareceres dos ilustres juristas Prof. António Meneses Cordeiro e do Prof. Antunes Varela, para sustentar a sua posição.
Quanto à questão de se saber se a Eurominas poderia ter optado por outra solução para manter a unidade industrial de produção de ligas de manganês em funcionamento, para além da aceitação do novo tarifário imposto pela ruptura contratual levada a cabo pela EDP, da prova documental depositada na Comissão de Inquérito ressalta que a Eurominas terá equacionado, em determinado momento, outras soluções energéticas alternativas, nomeadamente a importação de energia e o recurso ao gás natural.
Com efeito, num documento da APSS, de 1994, refere-se que "Em 21 de Junho de 1990 a Eurominas dirige ao Sr. Secretário de Estado das Obras Públicas entidade tutelar da APSS, um requerimento solicitando autorização para "ceder parcialmente o uso e fruição de uma fracção de terreno (área marítima onde, após aterro, foi implantada a unidade industrial de produção de ligas de manganês)", com a área de 35 000 m2, à Elf-Gás para instalação de recepção de gás industrial (propano) e secundariamente de gás para fins industriais e domésticos (butano)".
Acresce, ainda, que tal hipótese se encontra expressamente espelhada no acordo de transacção celebrado, em 27 de Setembro de 1996, entre a EDP e a Eurominas, quando esta última no considerando identificado como "s) expressamente refere "Que a actual implantação do gás natural em Portugal e a possibilidade de a médio prazo poder a EUROMINAS importar energia eléctrica de outros países membros da União Europeia, permitirá encontrar soluções energéticas alternativas".
A este propósito cumpre, ainda, assinalar as declarações prestadas pelo Dr. Bernardo Alegria perante a Comissão de Inquérito:

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"Quanto ao gás natural, o Sr. Deputado tem toda a razão. Toda a razão! Se houvesse gás natural… É que o gás natural só chegou a Setúbal no final da década de 90 e, portanto, já não me situo… Às tantas, devo dizer que já estou um bocadinho perdido em relação a datas, mas sei que o projecto que o Eng.º Mira Amaral tinha para o terminal de gás natural em Setúbal era no terreno ao lado das nossas instalações, um terreno que reverteu para o domínio público, o tal da CUF, onde nunca chegou a ser construído seja o que for - depreendi, na tal notícia do Semanário Económico, que era onde a tal fábrica da Teixeira Duarte podia nascer. É evidente que, com um terminal de gás paredes-meias, muita coisa podia ser pensada e muitas sinergias podiam ser tiradas. Mas penso que esse projecto abortou em 1992, é a ideia que tenho, sem rigor."

E, quando instado, expressa e precisamente para esclarecer se "a Eurominas não tinha outra alternativa para manter a sua unidade produtiva e, desse modo, cumprir o fim a que estavam destinados os terrenos? Sim ou não? Esta é a dúvida que subsiste", o Dr. Bernardo Alegria respondeu:

"O que abortou em 1992 foi o terminal de gás natural em Setúbal, junto às instalações da Eurominas. O gás natural passou a ter outro projecto, o famoso gasoduto que vem da Argélia, e, mais tarde - muito mais tarde -, o terminal passou para Sines. Só nessa altura é que o gás chegou a Setúbal, a meados da década. Mas já estava anunciado! É evidente que o gás natural não é como o gás de botija - temos de ter a instalação, não o podemos ir buscar! A haver infra-estrutura, admitia-se soluções alternativas."

Quesito 4:
Que razões levaram à assinatura do acordo entre a EDP e a Eurominas em 1996, e quais os critérios subjacentes à fixação do valor envolvido?
Da vasta prova documental depositada na Comissão de Inquérito, bem como dos depoimentos prestados perante a Comissão de Inquérito, constata-se que, em 27 de Setembro de 1996, a EDP e a Eurominas celebraram um acordo de transacção que pôs termo aos processos resultantes do litígio tarifário existente entre as duas entidades.
Os termos do citado acordo, podem resumir-se, no essencial, ao seguinte:

i) As partes obrigaram-se a desistir, reciprocamente, de todos os processos arbitrais ou de qualquer outra ordem, em tudo o que às mesmas diga respeito;
ii) A Eurominas obrigou-se a transferir para a propriedade e posse da EDP a subestação existente nas instalações industriais da Eurominas, junto da qual se encontra um edifício cujo uso exclusivo passaria a pertencer, enquanto se mantiver a subestação, à EDP;
iii) Como compensação global pelas obrigações assumidas e como contrapartida da propriedade e posse da subestação a EDP pagaria à Eurominas o valor total de 400 000 contos, correspondendo o valor da subestação a 10 mil contos;
iv) A Eurominas pagaria à EDP a quantia de Esc. 624 572$00 correspondente a 31,9% dos créditos reconhecidos no processo especial de recuperação da empresa que correu no Tribunal do Círculo de Setúbal;
v) A EDP obrigou-se a manter o fornecimento de energia eléctrica em média tensão, disponibilizando-se para logo que estivesse restabelecida a possibilidade de reiniciar a electro-metalurgia cooperar com a Eurominas, em condições de mercado, no fornecimento directo e ou indirecto de energia em alta tensão.

Da prova documental depositada na Comissão de Inquérito, assim como da prova testemunhal prestada perante a Comissão de Inquérito, infere-se que as razões que levaram à celebração do acordo de transacção celebrado entre a Eurominas e a EDP, para além do termo do processo que envolvia um pedido de indemnização à EDP na ordem dos 16 milhões de contos e que, nota do respectivo Gabinete de Apoio Jurídico havia considerado "perturbador", estiveram intimamente ligadas à necessidade do Estado garantir que o processo de privatização da EDP pudesse decorrer com toda a normalidade e confiança, isto é, sem as consequências que eventualmente resultariam com a manutenção do pedido de indemnização de 16 milhões de contos por parte da Eurominas, reclamados aquando do pedido de constituição de uma comissão arbitral para a resolução do litígio tarifário.
De um documento com papel timbrado da Presidência do Conselho de Ministros, não assinado, nem tão pouco datado, que se encontra depositado na Comissão de Inquérito, pode ler-se o seguinte:

"(…) Após sucessivos contactos foi considerado útil a constituição de um grupo de trabalho participado pelos Ministérios referidos e ainda por representante do Ministro da Presidência. Tendo-se admitido, em reunião deste G.T. que em determinadas circunstâncias poderia ser admissível uma solução negociada. Realizou-se e, 30.05.96. reunião de todas as entidades envolvidas em que, após clarificação das diferentes posições, foi equacionada a seguinte hipótese de resolução não contenciosa, a ser apreciada globalmente:

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1) Encerramento do contencioso com a EDP, abandonando a Eurominas o processo contra esta empresa, mediante a aquisição da subestação existente nas instalações da Mitrena, de acordo com a avaliação pela EDP;
Valor pretendido pela Eurominas. 1 milhão de contos.
Valor estimado da referida estação. " 400 mil contos.

Nota: sujeito a confirmação, existirá disponibilidade mútua para valores da ordem dos 500 mil contos.

(…) Considera-se de sublinhar que, salvo melhor opinião, uma hipótese de solução como a atrás configurada permitirá:

Encerrar o contencioso Eurominas/EDP com um valor de acordo (- 500 m.c), reduzido face ao valor da acção em curso e com os consequentes benéficos reflexos face à futura privatização da EDP; (…)"

Também na carta que o Eng.º Gerard Gamet (ex-administrador da Eurominas) enviou ao Sr. Presidente da Comissão de Inquérito, já referenciada no presente relatório, é afirmado que "(…) foi possível aceitar um acordo em Setembro de 1996 com a EDP para permitir que esta fosse privatizada sem a provisão contabilística exigida pelos auditores internacionais de 16 milhões de contos (…)".
Sobre este aspecto também se referiu o Dr. Bernardo Alegria, quando prestou declarações perante a Comissão de Inquérito, tendo então afirmado:

"Em 1996, começámos a ter alguns contactos com os Ministérios do Equipamento e da Presidência, sendo que o Ministério da Presidência acolheu o assunto com grande atenção, muito cortês, e penso que o seu gabinete recebeu o Conselho de Administração em fins de fins de 1995 ou princípios de 1996, não me lembro bem. Depois, entrámos num processo de tentativa de conciliação. Nesta tentativa a EDP surge como um elemento importante, nomeadamente a vontade de a EDP ser privatizada é coincidente e a questão que se punha em relação às consequências da segunda arbitragem é que havia auditores internacionais na EDP que exigiam que essa responsabilidade pudesse ter de ser provisionada. Portanto, houve ali interesses e houve uma reunião na Presidência do Conselho de Ministros, na Gomes Teixeira, com um administrador da EDP tendo em vista aproximar as partes, mas sempre numa lógica de reinício da actividade laboral. Há uma carta do gabinete do próprio primeiro-ministro quando cá esteve o actual presidente da África do Sul, e que também juntei, onde manifesta interesse numa solução concertada, penso que o termo é este. Há entrevistas dadas a vários jornais, o assunto, nesta altura, foi notícia e no Verão de 1996 foi possível à empresa e à EDP chegarem a um entendimento, mas houve logo, à partida, um pressuposto de que este entendimento era parte da solução global."

Das declarações prestadas pelo Dr. Bernardo Alegria parece poder inferir-se que, pelo menos, na concepção da Eurominas, o acordo de transacção com a EDP constituía apenas uma parcela da solução global dos litígios que opunham aquela empresa ao Estado.
Mais à frente o Dr. Bernardo Alegria voltou a abordar esta questão, declarando em concreto que:

"Em relação à questão da privatização da EDP, Sr. Deputado, digo-lhe com toda a objectividade que o assunto foi apresentado pelo Dr. Saldanha Bento, que era administrador da EDP, não sei o que é hoje em dia, mas o Dr. Saldanha Bento, nas tais reuniões na Gomes Teixeira, em determinada altura, quando as partes já estavam mais próximas e já havia um compromisso de cavalheiros quanto à solução do acordo que ia haver, disse mesmo: temos lá duas auditoras internacionais - que eu não sei quais eram - que fizeram as due diligence à EDP no processo de privatização e este era um assunto que os incomodava. Aliás, a prova de que os incomodava é que a decisão do Tribunal Administrativo de 30 de Agosto é de anular o despacho e de repor o despacho que os tinha citado e que eles não tinham contestado."

Também o Sr. Deputado José Lamego referiu, quando prestou declarações perante a Comissão de Inquérito, o seguinte:

"A situação que o XIII Governo herda é complexíssima nessa matéria. Depois, podemos entrar nesses pormenores, mas esta não é, obviamente, uma Comissão de avaliação sobre o rigor jurídico da actuação mas, sim, sobre o rigor político, administrativo e de defesa do interesse público. De qualquer modo, em relação a esses 16 milhões de contos, que, provavelmente, não eram fundamentados, do ponto de vista jurídico-formal, já poderia ter havido uma condenação de preceito e, portanto, uma confissão do pedido pela não contestação da EDP. Na privatização da EDP, com certeza que, do ponto de vista da auditoria às contas, esse montante teria de ser provisionado antes de a EDP ser lançada nos mercados. Portanto, esta era uma liability que tinha de ser provisionada com 16 milhões de contos. São essas as boas regras quando se faz uma due diligence a uma empresa. E quais são as responsabilidades? São as que estão indicadas na acção e não vão os contabilistas ou os auditores ver se a acção é rigorosamente procedente ou não. Mas, de facto, era esse o pedido formulado e as

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pessoas nunca formulam pedidos muito elevados, porque têm de pagar custas sobre eles. Portanto, alguma viabilidade havia e, em consequência, teriam de ser provisionados esses 16 milhões de contos."

Por seu turno, o Sr. Deputado António Vitorino, nas declarações que prestou perante a Comissão de Inquérito, referiu o seguinte:

"(…) Colocado perante este conspecto de conflitos, a avaliação que foi feita pelo Governo, sob a minha responsabilidade, chegou a conclusões preliminares, que resumiria desta forma: reconhecia-se, por parte do Governo, que, no litígio que opunha a Eurominas à EDP, havia vulnerabilidades na posição pública, que, aliás, já tinha sido objecto de uma ou duas decisões desfavoráveis à parte pública por parte dos tribunais. Em segundo lugar, ainda ligado ao conflito sobre o fornecimento energético, colocava-se um problema delicado que tinha a ver com a invocação, por parte da Eurominas, de um conjunto de prejuízos resultante da não laboração da fábrica ou da cessação da laboração da fábrica, essencialmente ligado a compromissos contratuais e a lucros cessantes, no valor de 16 milhões de contos (moeda da época), questão esta que, na avaliação do Governo, era sensível, na medida em que ela poderia ter impacto no processo em curso de privatização da EDP e levar à necessidade de fazer provisões na EDP para sustentar o valor de mercado da empresa, tendo em vista a sua privatização.
(…) Neste quadro, o Governo, em Maio de 1996, reuniu um grupo de trabalho interministerial, ao qual foi submetida uma proposta da Eurominas que tinha um conjunto de elementos que visavam ultrapassar todos estes litígios, de forma acordada, e que levariam a que a Eurominas desistisse de todas as acções que tinha interposto nos tribunais contra o Estado português.
(…) Em Setembro desse ano, penso (é a minha conclusão), graças ao clima de abertura e de diálogo que tinha sido criado em Maio de 1996, foi possível chegar a um acordo directo entre a Eurominas e a EDP, quanto ao contenciosos que os opunha. Esse acordo traduziu-se: na aquisição, por parte da EDP, da subestação instalada nos terrenos da Eurominas; no pagamento, por parte da Eurominas, de uma compensação financeira à EDP; e na desistência dos processos judiciais. Desta forma, afastou-se, em meu entender, aquilo que era, na óptica do Governo, à época, o perigo mais eminente do conflito com a Eurominas e que tinha a ver com o impacto negativo que esse conflito poderia ter sobre a avaliação do valor da EDP e, consequentemente, sobre o seu processo de privatização."

No depoimento prestado perante a Comissão de Inquérito o Sr. Deputado António Vitorino, na resposta às questões que lhe foram colocadas, referiu, ainda:

"Em Novembro de 1995 o meu gabinete recebeu, de facto, a Eurominas, e foi a seguir a essa audiência que a questão foi colocada ao Sr. Primeiro-Ministro, dizendo: "há aqui uma questão que tem sensibilidade, do ponto de vista da privatização da EDP, que tem natureza transversal, qual é o papel que a presidência do Conselho de Ministros deve desempenhar nesta matéria?"
(…) Quanto ao acordo entre a EDP e a Eurominas, estou convencido de que o clima, pelo menos o de conversações, que foi iniciado em Maio de 1996 abriu caminho para que tenha sido possível o acordo em Setembro de 1996. E nisto, desde logo, há um enorme ganho para o Estado, porque afastámos, definitivamente, da operação de avaliação do valor da EDP o espectro dessa responsabilidade financeira. E isto foi um ganho para o Estado inequívoco.
(…) E esta questão não é de menor importância, porque o acordo parcelar com a EDP permitiu libertar definitivamente a avaliação da EDP do espectro desta acção de responsabilidade civil extracontratual, que, assim, passou a ser exclusivamente dirigida contra o Estado.
(…) E o acordo de Setembro de 1996 com a EDP permitiu retirar a EDP deste processo. Penso sinceramente que isto é um ganho substancial para a posição do Estado, sobretudo na perspectiva da sustentabilidade da posição da EDP e da sua privatização.
(…) Em 1997 o contencioso com a EDP está resolvido e, devo dizer-lho mais uma vez, a minha convicção é a de que a sua resolução em Setembro em 1996, que constituía, aliás, a principal preocupação do governo pelas razões que já lhe expus, atinentes às liabilities, às vulnerabilidades ou responsabilidades da EDP no momento em que estava a ser avaliada para efeitos de privatização, só foi possível porque se tinha aberto uma via de diálogo com a Eurominas. Não creio, contudo, que se possa, a partir das suas palavras - porque não lhe faria essa injúria -, dizer que, uma vez que o Estado já tinha tirado as "castanhas" mais quentes do lume, a partir daí, fiat gloria, pereat mundus, porque o Estado é uma pessoa de bem. Isto é, se o clima de confiança, porque se tinha aberto um processo negocial, permitiu resolver aquilo que era a principal preocupação do Estado, que era retirar a EDP do collimateur, não me parecia, sequer, de pessoa de bem dizer depois "Agora que tenho o que quero, não falo mais do resto".

Esta questão é igualmente abordada pelo Dr. Jorge Dias, no depoimento que prestou perante a Comissão de Inquérito, nos seguintes termos:

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"Concretamente, tínhamos pela frente uma situação em que havia, no mínimo, dúvidas sobre o decreto da reversão e um contencioso com a EDP, portanto, existia o perigo de o Estado vir a ser confrontado com uma situação em que, por um lado, poderia haver uma acção indemnizatória de largos milhões de contos contra a EDP, com os consequentes prejuízos para a empresa, que, como sabem, era pública, mas estava a caminho do seu processo de privatização, e, por outro lado, existia a questão de o decreto de reversão, nessa matéria, ser considerado ilegal e inconstitucional.
(…) a informação de que dispúnhamos, que nos foi transmitida, que estava consubstanciada nas acções interpostas contra a EDP e que causavam sérias preocupações à EDP eram no sentido de haver um risco grave de a EDP perder uma acção de 15 milhões de contos, ou qualquer coisa assim parecida, e, consequentemente, isso iria ter implicações sobre a empresa e sobre o seu processo de privatização. Essa preocupação foi-nos evidenciada mais do que uma vez pelo Dr. Saldanha Bento e era também essa a posição da Eurominas."

Quesito 5:
Quem, por parte do Estado, impulsionou o processo que culminou com a celebração no acordo supra mencionado?
Da resposta ao quesito que antecede e, sobretudo, atentas as declarações prestadas à Comissão de Inquérito pelo Dr. Bernardo Alegria, pelo Sr. Deputado António Vitorino e pelo Dr. Jorge Dias, pode inferir-se que o acordo de transacção celebrado entre a Eurominas e a EDP foi impulsionado por aquelas entidades no seio do grupo de trabalho interministerial criado, em Maio 1996, sob os auspícios da Presidência do Conselho de Ministros para a resolução do litígio, contando, naturalmente, com o patrocínio do Governo, já que aquele acordo, como foi amplamente referido, permitiu retirar a EDP do litígio entre a Eurominas e o Estado, o que representou um ganho para a posição do Estado, sobretudo na perspectiva da sustentabilidade da posição da EDP e da sua privatização.
Nas declarações que prestou perante a Comissão de Inquérito, o Dr. Jorge Dias deixou claro que o acordo de transacção celebrado entre a EDP e a Eurominas que pôs termos ao litígio que as opunham partiu da iniciativa das duas entidades em causa, quando referiu:

"Como imaginam, essa disponibilidade ter-nos-ia sido transmitida pelas partes em presença, senão não adivinhávamos, designadamente eu."

E, quando directamente instado a responder se houve participação do Ministério da Presidência na negociação com a EDP e a Eurominas, o Dr. Jorge Dias, foi peremptório, afirmando:

"Não, Sr. Deputado, por amor de Deus, isso infere-se das minhas palavras. Com a Eurominas, com certeza; com a EDP, acabei de dizer que o Dr. Saldanha Bento fez vários contactos."

E mais adiante, o depoente, referiu, ainda:

"Em relação à questão da EDP, o Sr. Deputado também já fez referência a um documento que foi assinado por uma adjunta do gabinete, a Dr.ª Leonor Trindade, em que precisamente se diz: EDP: Através de informação vinculada através da própria empresa, teve lugar uma reunião, em 25 de Março, com o Dr. Saldanha Bento, pelo Conselho de Administração, tendo ficado a EDP de apresentar uma proposta de resolução do contencioso, através da compra de infra-estruturas eléctricas, etc. Penso que isto é completamente claro! Volto a repetir: Através de informação vinculada através da própria empresa." E, depois, mais à frente, diz-se: "Contactada directamente a EDP, hoje (...) - que era o trabalho do gabinete do Ministro do Presidência -, o Sr. Dr. Saldanha Bento afirmou que, uma vez que existe vontade política de resolução do problema, estão disponíveis para chegar a um acordo sobre dois tipos…".
Ora bem! Acho que isto responde cabalmente à sua questão.

III - Da reversão:

Quesito 6:
Existiam razões para a reafectação ao domínio público marítimo dos terrenos da Eurominas? Desde quando? Foram estas razões contrariadas ou corrigidas pela Eurominas?
As razões para a reafectação ao domínio público marítimo dos terrenos da Eurominas remontam a 8 de Agosto de 1986, quando, depois de por carta de 28 de Julho de 1986, ter solicitado à Eurominas a satisfação do pagamento em dívida, a EDP interrompeu o fornecimento de energia eléctrica àquela empresa. Este corte no fornecimento de energia teve como efeitos imediatos uma reestruturação interna da Eurominas, designadamente:

i) O encerramento do forno eléctrico, sua principal unidade industrial;
ii) Redução do pessoal com pagamentos de compensações aos trabalhadores;

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iii) Venda de existências e de matéria-prima para assegurar o pagamento das suas dividas;
iv) Limitação da actividade industrial a actividades acessórias, designadamente a preparação da matéria-prima.

Inconformada, a Eurominas não aceitou a denúncia feita pela EDP, tendo-se munido para fazer valer a sua posição dos pareceres jurídicos que se encontram depositados na Comissão de Inquérito, produzidos pelo Prof. Antunes Varela, em 31 de Maio de 1987, e pelo Prof. António Meneses Cordeiro, em 10 de Julho de 1987, que no geral consideram abusiva e violadora dos ditames da boa-fé a actuação da EDP.
Entretanto, a APSS, em 17 de Julho de 1991 solicita à Eurominas autorização para fazer uma auditoria técnica às infra-estruturas e instalações das unidades industriais, dada a urgência em tomar medidas para a revitalização do cais e infra-estruturas conexas.
Estas duas entidades (APSS e Eurominas) foram mantendo contactos, de tal forma que, em 16 de Agosto de 1991, a APSS enviou à Eurominas um pedido de esclarecimento de alguns elementos para a concretização de um protocolo entre as duas entidades, após reunião entre as mesmas no dia 13 do mesmo mês. Nesse pedido de esclarecimento a APSS considera que:

"(…)
- O desenvolvimento actual do mercado interno justifica, como atrás ficou referido, o interesse manifestado por algumas unidades industriais na criação de um graneleiro de carvão e minérios, reconhecendo-se desde já, a possibilidade de movimentação de carvão na ordem das 300 tons;
- A existência deste terminal poderá suscitar interesse por parte de outras unidades industriais em face de uma oferta mais vantajosa que o Porto de Setúbal possa oferecer; (…)"

Além disso, a APSS ainda afirma neste documento que:

"(…) face ao interesse afirmado de reactivar o cais da Eurominas por forma a evitar os inconvenientes decorrentes da reversão que a lei estabelece como consequência da sua utilização para fim diverso do inicialmente previsto afigura-se que a solução jurídica a adoptar deverá passar, em nosso entender, pela celebração de um protocolo entre a APSS e a Eurominas nos termos do qual esta empresa cederia o uso das suas infra-estruturas à APSS (…)."

Nesta altura, e de acordo com o documento supra mencionado, a posição da APSS relativamente ao cais da Eurominas era de aceitação de uma possível alteração do objecto da actividade dos terrenos que haviam sido afectos à empresa.
Em 31 de Maio de 1993 a sociedade de advogados Noronha e Andrade, Cardoso Alves e Associados, que representa a Eurominas, solicita à APSS autorização de alteração de finalidade da utilização dos terrenos e dos cais da Eurominas. De acordo com o ponto 16 deste documento:

"(…) estão em curso negociações com um importante grupo espanhol interessado em participar em conjunto numa redefinição da rentabilidade e utilização das instalações da Eurominas. (…) Actividades de importação, exportação, comercialização, transformação e industrialização de produtos minerais sólidos susceptíveis de serem comercializados directamente ou após processo industrial correspondente, (…). Pretende também instalar naves de montagem de vários tipos de maquinaria para a sua comercialização tanto na CEE como para a sua reexportação para países terceiros. Está interessado igualmente no trânsito de todo o tipo de mercadorias comerciais e industriais com uma previsão de tonelagem anual de cerca de 2 milhões de toneladas (…);"

Posteriormente, a 4 de Julho de 1993, a APSS, em resposta à carta da Sociedade de Advogados Noronha e Andrade, Cardoso Alves e Associados, refere ser de todo o interesse para o Porto de Setúbal um novo projecto que viabilize a exploração das instalações da Eurominas e respectivo terminal portuário, ficando a apreciação do projecto da Eurominas sujeita ao mérito do mesmo e às considerações das outras entidades que intervenham na sua aprovação. A APSS parece indicar que é favorável a uma alteração de finalidade de uso dos terrenos e do cais da empresa.
O Conselho de Administração da Eurominas deliberou, em 30 de Novembro de 1993, que face à difícil situação económica que afectava a empresa, e caso as negociações com a APSS para a utilização das infra-estruturas da Eurominas fossem suspensas, apresentar de imediato um processo especial de recuperação de empresas.
Entretanto, a APSS recebe, a 21 de Dezembro de 1993, um pedido de informação enviado pela ANESUL, relativamente à utilização do cais Eurominas e no qual afirma o seguinte:

"(…) de acordo com informação de que dispomos, uma das empresas de estiva do porto de Setúbal tem-se apresentado junto de potenciais clientes, garantindo poder operar em exclusivo no cais da Eurominas isto,

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obviamente, com intuito de obtenção de vantagens comerciais(…), também segundo informação de que dispomos, a empresa SETEFRETE prepara-se para operar no cais da Eurominas com uma grua que adquiriu e sem recurso a trabalhadores portuários (…)."

Tal denúncia é indiciadora de que o cais da Eurominas estaria a ser utilizado para outros fins que não aqueles relacionados com a sua actividade de produção de ligas de manganês.
Na sequência deste pedido de informação, o Presidente do Conselho de Administração da APSS solicitou, ainda em Dezembro de 1993, ao respectivo gabinete jurídico informação sobre a situação dos terrenos desafectados do domínio público marítimo cedidos à Eurominas, face ao encerramento desta em 1986.
A resposta do gabinete jurídico da APSS, de 9 de Fevereiro de 1994, encontra-se na Informação n.º 2/94-GJ, onde é apresentado todo o historial da desafectação dos terrenos e cedência à Eurominas. Este documento conclui no seguinte sentido:

"i) A cessação da actividade por parte da Eurominas em 1986 constitui causa para promover a reversão dos terrenos desafectados do domínio público marítimo, através do Decreto n.º 333/73, de 5 de Julho e cedidos àquela empresa;
ii) Compete aos Ministros do Mar e das Finanças operar a reversão mediante decreto fundamentado e referendado, após audição prévia da Eurominas;
iii) A reversão importa a perda a favor do estado das obras e benfeitorias realizadas nos terrenos e não confere direito a qualquer indemnização nem à restituição do preço por eles pago."

Consequentemente, e com base na informação que obteve do gabinete jurídico, o Presidente da APSS, em 11 de Fevereiro de 1994, despachou no seguinte sentido:

"Ao CA para deliberação: é de todo o interesse promover a reversão de todos os terrenos desafectados do domínio público marítimo que não estejam a ser devidamente utilizados por forma a constituir uma reserva fundiária que permita o desenvolvimento e expansão ao Porto de Setúbal. Tem a APSS que desencadear todos os processos conducentes a esse objectivo concordando-se com a metodologia proposta e as conclusões desta informação. Deverá ser enviado este processo ao Gabinete de S. Ex.ª o Sr. SEAP para apreciação a solicitar às suas Ex.as os Srs. Ministro do Mar e Ministro das Finanças a execução do decreto que promoverá a referida reversão."

Por seu lado, a Eurominas, face à situação em que se encontrava, resultante do corte do fornecimento de energia pela EDP, apresentou, em 14 de Fevereiro de 1994, no Tribunal Judicial de Setúbal, um processo especial de recuperação de empresas (proc. 1409/94, 2.º Juízo), no qual se propõe realizar uma reestruturação da empresa e dos seus principais activos.
Em 21 de Fevereiro de 1994 o Conselho de Administração da APSS aprovou a proposta de reversão para o domínio público dos terrenos desafectados e vendidos à Eurominas, com a seguinte anotação:

"Nas condições do despacho do PCS, de 94.02.11, exarado na inf. 2/94-GJ, de 9 de Fevereiro."

Após esta deliberação, a APSS propôs ao Secretário de Estado da Administração Portuária, através do ofício n.º 517, de 23 de Fevereiro de 1994, a reversão para o domínio público dos terrenos desafectados e vendidos à Eurominas. Mais tarde, em 21 de Março de 1995, o gabinete jurídico da APSS elaborou a Informação n.º 42/95-GJ em resposta à argumentação aduzida pela Eurominas em 23 de Janeiro de 1995 contra a reversão dos terrenos, concluindo no seguinte sentido:

"i) Apesar da afirmação reiterada pela Eurominas da intenção de retoma da actividade, o facto é que não foram trazidos ao processo elementos que convençam a APSS da existência de condições que objectivamente permitam concluir pela possibilidade efectiva de tal retoma;
ii) O projecto industrial que a Eurominas pretende apresentar até 30 de Março de 1995 enquadra-se no âmbito de actividades secundárias da empresa pelo que nada tem que ver com a referida intenção de retoma de actividade."

No dia seguinte à emissão desta informação, o Presidente da APSS exara sobre a referida informação o seguinte despacho:

"Ao CA p/deliberação. Concordo com as conclusões da presente informação. Assim, e caso o CA delibere no sentido de que se mantêm sem alteração os pressupostos que justificam a reversão, deverá disso ser dado conhecimento à tutela de modo a que esta trate da publicação do decreto-lei."

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Na sequência deste despacho, o gabinete jurídico procede em conformidade e, em 5 de Abril de 1995, remete ao Gabinete do Ministro do Mar elementos relativos à fundamentação para a reversão dos terrenos desafectados do domínio público marítimo e vendidos à Eurominas.
Por último, as razões para a reafectação ao domínio público marítimo dos terrenos do Estuário do Sado não foram contrariadas ou corrigidas pela Eurominas, pese embora, como resulta da documentação depositada na Comissão de Inquérito e de vários depoimentos prestados, esta sempre tenha defendido o reinício da sua actividade.

Quesito 7:
Quando é que foi determinada a reafectação?
Tal como foi referido na resposta ao quesito anterior, em 9 de Fevereiro de 1994, o gabinete jurídico da APSS encontra-se na posse da Informação n.º 2/94-GJ, onde é apresentado todo o historial da desafectação dos terrenos e cedência à Eurominas. Este documento conclui no seguinte sentido:

"i) A cessação da actividade por parte da Eurominas em 1986 constitui causa para promover a reversão dos terrenos desafectados do domínio público marítimo, através do Decreto n.º 333/73, de 5 de Julho e cedidos àquela empresa;
ii) Compete aos Ministros do Mar e das Finanças operar a reversão mediante decreto fundamentado e referendado, após audição prévia da Eurominas;
iii) A reversão importa a perda a favor do estado das obras e benfeitorias realizadas nos terrenos e não confere direito a qualquer indemnização nem à restituição do preço por eles pago."

Consequentemente, e com base na informação que obteve do gabinete jurídico, o Presidente da APSS, em 11 de Fevereiro de 1994, despachou no seguinte sentido:

"Ao CA para deliberação: é de todo o interesse promover a reversão de todos os terrenos desafectados do domínio público marítimo que não estejam a ser devidamente utilizados por forma a constituir uma reserva fundiária que permita o desenvolvimento e expansão ao Porto de Setúbal. Tem a APSS que desencadear todos os processos conducentes a esse objectivo concordando-se com a metodologia proposta e as conclusões desta informação. Deverá ser enviado este processo ao Gabinete. de S. Ex.ª o Sr. SEAP para apreciação a solicitar às suas Ex.as os Srs. Ministro do Mar e Ministro das Finanças a execução do decreto que promoverá a referida reversão."

Em 8 de Março de 1995 o Gabinete do Ministro do MAR (Comandante Eduardo Azevedo Soares) remeteu ao SEPCM o projecto de decreto regulamentar e respectiva nota justificativa, que procede à reversão para o domínio público marítimo dos terrenos da Eurominas, solicitando o seu agendamento.
O mesmo foi remetido porque, de acordo com as declarações do Comandante Azevedo Soares prestados à Comissão de Inquérito em 26 de Janeiro de 2006:

"(…) Fica aqui claro que estive na iniciativa deste decreto de reversão (…). Acontece, por razões diversas, que essa empresa deixou de poder cumprir os fins para que tinha pedido a desafectação do domínio público marítimo, e nessa situação se manteve continuadamente durante uns anos, até que o Estado entendeu intervir, ao abrigo escrupuloso da lei."

O aludido projecto de decreto regulamentar, com data de 15 de Março de 1995, previa o seguinte, no seu artigo 1.º:

"Revertem para o domínio público marítimo os terrenos do estuário do rio sado desafectados pelo Decreto n.º 333/73, de 5 de Julho, nele devidamente identificados"

E no artigo 2.º que:

"A reversão implica a perda a favor da Administração dos Portos de Setúbal e Sesimbra de todas as obras e benfeitorias realizadas nos terrenos e não confere o direito a qualquer indemnização nem à restituição do preço por eles pago ou de quaisquer outras quantias a pagas por causa da alienação dos terrenos."

Já no âmbito da PCM (GSEPCM) foi feita a seguinte anotação da autoria de José Amaral Lopes, relativa ao projecto de decreto regulamentar do Ministério do Mar:

"Uma vez que a desafectação foi feita por CL - o 333/73, de 5 de Julho -, e apesar da regra do n.º 1 do artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 48 784 prever que a reversão é feita por decreto, penso que o excesso de forma

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na desafectação recomenda que a reversão seja feita por decreto-lei" e acrescenta, "Solicitar o contrato de cessação celebrado entre a Eurominas e a APSS".

Em 16 de Março toma posse o novo Ministro do Mar, o Eng.º Duarte Silva, o qual afirmou perante a Comissão de Inquérito, na audição de 25 de Janeiro de 2006, que:

"(…) tomando posse a 16 de Março, relativamente a um agendamento de um assunto para reunião de secretários de Estado a 27 de Março, vê-se bem onde já estava o trânsito desta proposta, que foi da iniciativa do governo, de que já fazia parte, mas depois vim a ter esta responsabilidade acrescida.
Por isso, toda a proposta feita pelo Ministério, que depois, obviamente, subscrevi, vinha devidamente preparada e justificada pelo meu antecessor e, de facto, temos aqui uma questão de dias. Não faria qualquer sentido, e não havia nada que me levasse a poder fazê-lo, repensar esse assunto. Quer dizer, não tinha razão nenhuma para tal, aquilo que me foi dado relembrar foi que havia um incumprimento relativo à justificação de ter sido em tempo feita uma desafectação do domínio público marítimo com determinado fim e entendeu governo, e eu, naturalmente, o subscrevi, que haveria que repor a legalidade."

O projecto de decreto regulamentar de reversão dos terrenos da Eurominas foi registado pela PCM (GSEPCM) com o n.º 126/95, tendo sido agendado como ponto 21 da Reunião de Secretários de Estado de 27/03/95, com a seguinte nota:

"Todos os requisitos legais para a reversão parecem preenchidos. Temos dúvidas é que, dada a evolução dos princípios gerais do direito administrativo, possa ainda considerar-se em vigor o artigo 5.º, n.º 2, do Decreto-Lei n.º 48784, que não faz corresponder às benfeitorias qualquer indemnização (agora reiterado no artigo 2.º do projecto)."

Com data de 27 de Março de 1995, data em que ocorreu a reunião de Secretários de Estado, aquele projecto foi alterado, de forma que o artigo 1.º estabelecesse que a reversão é feita de acordo com o disposto no artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 48 784, de 21 de Dezembro. Além disso, também se optou por deixar de mencionar no artigo 2.º o seguinte: "(...) e não confere o direito a qualquer indemnização nem à restituição do preço por eles pago ou de quaisquer outras quantias a pagas por causa da alienação dos terrenos".
Nessa mesma data o referido diploma foi aprovado sob a forma de "decreto" e assinado pelo Primeiro-Ministro, Prof. Cavaco Silva, e pelo novo Ministro do Mar, Eng.º Duarte Silva. Entre a aprovação e a sua publicação mediaram cerca de dois meses, ou seja, foi assinado e referendado em 10/05/95, dando origem ao Decreto n.º 14/95, de 22 de Maio.
Em 22 de Maio de 1995 foi publicado o Decreto n.º 14/95, que procedeu à reversão dos terrenos da Eurominas situados no Estuário do Rio Sado, desafectados pelo Decreto n.º 337/73, de 5 de Julho, para o domínio público marítimo.

Quesito 8:
Dos instrumentos jurídicos disponíveis, a reversão foi a melhor opção?
Da prova documental e testemunhal depositada na Comissão de Inquérito resulta com clareza que a reafectação ao domínio público marítimo do terrenos alienados à Eurominas em 1974, poderia ter sido alcançada por outras vias, nomeadamente através do instituto jurídico da expropriação por utilidade pública.
Refira-se, aliás, como resulta de diversos documentos oriundos da Presidência do Conselho de Ministros, que se encontram depositados na Comissão de Inquérito que um dos pontos da proposta que a Eurominas apresentou ao Estado em 1996 para a resolução global do litígio latente consistia precisamente na suspensão da eficácia do acto de reversão, transformando-o num acto de expropriação por utilidade pública.
Facto que é expressamente mencionado no depoimento prestado pelo Senhor Eng.º Consiglieri Pedroso, perante a Comissão de Inquérito:

"(…) em carta enviada ao MEPAT, a Eurominas propõe uma de duas soluções): expropriação por utilidade pública com o posterior lançamento de um concurso público para a concessão de um serviço público de movimentação de cargas - queria passar a operadora portuária - e alargamento da afectação especial em entreposto comercial de matérias-primas, em geral, e de minérios, em especial - queria que se lhe outorgasse, que se lhe concedesse a exploração da sua plataforma logística para entreposto comercial de matérias-primas, em geral, e de minérios, em especial, solução idêntica à verificada com a empresa Lis Sado, SA, do Grupo José de Mello/Lisnave, através do Decreto n.º 28/93, de 7 de Setembro."

Não cabe, certamente, no âmbito das estritas atribuições e competência da Comissão de Inquérito determinar se o instituto jurídico da reversão foi a melhor opção do legislador ou se, pelo contrário, existiam outras vias susceptíveis de melhor atingirem o objectivo da reafectação em vista.
Não deixará, contudo de se mencionar que o instituto da reverão surge, à luz do disposto no n.º 1 do artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 48 784, de 21 de Dezembro de 1968, como adequado ao fim em vista, isto,

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naturalmente, sem se prescindir da consideração que ao exercício do direito de reversão deve estar associado, sob pena de configurar um confisco, o direito a uma justa compensação, nos termos dos princípio expressos na Constituição da República Portuguesa e atenta a natural evolução dos princípios gerais do direito administrativo.
Nesta concepção não deixará, também, de referir-se que dos depoimentos prestados perante a Comissão de Inquérito, nomeadamente pelos depoentes que no exercício de funções governativas intervieram na resolução do conflito entre o Estado e a Eurominas, resulta claro que se o legislador tivesse optado pelo recurso ao instituto da expropriação por utilidade pública o montante de uma indemnização a arbitrar à Eurominas teria sido, certamente mais elevado do que aquele que foi arbitrado na sequência do processo de resolução extra-judicial.
A este propósito o Sr. Deputado João Cravinho, quando questionado sobre a matéria, referiu perante a Comissão de Inquérito o seguinte:

"(…) quanto à questão das diferenças entre a indemnização por benfeitorias e a expropriação, o seu ponto de vista é totalmente correcto. Quer dizer, enquanto que na indemnização por expropriação o valor a considerar tem que ver com o modo como o proprietário investiu, com o que fez ou deixou de fazer, portanto, o ponto de vista é o do valor na óptica do proprietário, quando se faz a indemnização por benfeitoria, ela tem que ver com o valor adicionado, nem sequer é valor integral, neste caso, é o valor adicionado, na óptica da utilização futura. Portanto, no caso concreto, isto pode dar grandes discrepâncias, porque se qualquer pessoa perguntasse na óptica do proprietário o que é que isto vale, o que é que entra para a avaliação entre isto, aquilo e aqueloutro? E na óptica da utilização futura? Até pode não entrar nada ou só uma fracção, seja ela qual for. Ou seja, são duas ópticas totalmente distintas, com fundamentações distintas: a primeira é de longe muito mais favorável ao proprietário que tem a posse efectiva, porque cobre coisas muito para além da benfeitoria, portanto, a óptica da expropriação pública seria de longe sempre mais onerosa para o Estado do que a da benfeitoria e por alguma razão nunca se considerou por aí, até porque também não era justo."

Pode, assim, concluir-se que o recurso à reversão, associado ao arbitramento de uma indemnização à Eurominas, afigura-se uma solução conforme e equitativa à luz dos factos e do direito.

Quesito 9:
A forma escolhida, decreto, constituiu forma legal bastante para operar a reversão e poderia esta, face ao ordenamento jurídico em vigor, à época, efectuar-se sem qualquer tipo de indemnização?
A reversão para o domínio público marítimo dos terrenos desafectados do mesmo, em 1973, e alienados à Eurominas, em 1974, foi operada, como é consabido, por decreto. Esta é a forma legal expressamente prevista no n.º 3 do artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 48 784, de 21 de Dezembro de 1968, que estatui que "A reversão revestirá a forma de decreto fundamentado e referendado (...)".
Pese embora a forma legal utilizada para operar a reversão, tanto quanto é possível saber, não tenha sido objecto de impugnação, a verdade é que, como bem se compreende, não é uma questão pacífica do ponto de vista jurídico, porquanto o decreto constitui uma figura que, já ao tempo da aprovação do Decreto n.º 14/95, de 22 de Maio, não tinha acolhimento na Constituição da República Portuguesa.
A este respeito, o Deputado Vitalino Canas foi bastante clarificador, no depoimento que prestou perante a Comissão de Inquérito, quando referiu:

"(…) Para além disso, se me permitem dizê-lo, este decreto tinha outras fragilidades que depois, à medida que o processo ia decorrendo, também fomos detectando. Em primeiro lugar, havia logo uma questão de natureza formal, porque não existe enquadramento constitucional para este tipo de decretos. A previsão de um decreto contendo um mero acto administrativo, que fosse fundamentado e promulgado pelo Presidente da República, é uma figura anterior à Constituição de 1976, ou seja, a Constituição de 1976 não admite esta figura. E aquilo que sei hoje é que, inicialmente, se pensou fazer um decreto regulamentar e depois evoluiu-se para a figura do decreto que contém um acto administrativo e que é promulgado pelo Presidente da República, figura essa que não existe na Constituição Portuguesa."

Também o Sr. Eng.º Consiglieri Pedroso, no depoimento que prestou perante a Comissão de Inquérito, referiu a este propósito que:

"(…) considerámos que o Estado devia situar-se numa linha de continuidade em relação à decisão política tomada em 1995 pelo anterior governo, o XII Governo Constitucional, quando, através do Decreto n.º 14/95, decidiu accionar a reversão dos terrenos da Eurominas para o domínio público marítimo, para o Estado, embora reconhecêssemos que quanto à segurança jurídica do documento poderiam, porventura, suscitar-se algumas fragilidades em termos de eventuais vícios de forma, de eventuais inconstitucionalidades e de uma insuficiente fundamentação jurídico-formal da urgente necessidade da reversão por utilidade pública."

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Da prova documental depositada na Comissão de Inquérito pode, também, inferir-se que as dúvidas que acabam de ser expressas, já ao tempo da aprovação do Decreto n.º 14/95, de 22 de Maio, assolaram o espírito do legislador.
Como já foi mencionado no presente relatório, na sua versão originária, com data de 15 de Março de 1995, o Ministro do Mar, à época, o Comandante Eduardo Azevedo Soares, propunha que a reversão se fizesse por decreto regulamentar.
Também com referência ao dia 15 de Março de 1995 surge no processo instrutório da Presidência do Conselho de Ministros uma nota que refere expressamente o seguinte: "uma vez que a desafectação foi feita por Decreto - o n.º 337/73, de 5 de Julho -. apesar da regra do n.º 1 do artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 48 784 prever que a reversão é feita por decreto penso que o excesso de forma na desafectação recomenda que a reversão seja feita por decreto-lei (…)."
Contudo, contrariando estas dúvidas relativas à forma legal a utilizar para a reversão dos terrenos da Eurominas para o domínio público marítimo, verifica-se que na reunião de Secretários de Estado, de 27 de Março de 1995, a mesma já foi discutida sob a forma de decreto, que acabaria por dar origem ao Decreto n.º 14/95, de 22 de Maio.
Finalmente, no que concerne à questão de saber se a reversão poderia, face ao ordenamento jurídico vigente e ao teor do Decreto n.º 14/95, de 22 de Maio, à época, efectuar-se sem qualquer tipo de indemnização, cumpre salientar que se trata de uma questão eminentemente jurídica abordada abundantemente quer na prova documental depositada na Comissão de Inquérito quer no âmbito dos depoimentos que foram prestados perante a Comissão de Inquérito.
Estando claro, como já atrás se referiu, que não compete à Comissão de Inquérito substituir-se aos tribunais quanto à fixação de um qualquer entendimento jurídico em torno desta e doutras questões relevantes no quadro do processo Eurominas, não deixa, contudo, por razões objectivamente justificáveis, de referir-se que do acervo documental e testemunhal a que a Comissão de Inquérito teve acesso ao longo de dois meses de trabalho é prevalecente a posição que aponta na direcção da tese da inconstitucionalidade e da ilegalidade o Decreto n.º 14/95, de 22 de Maio, na parte em que o mesmo não associa à reversão dos terrenos a favor do Estado o direito à indemnização por parte da Eurominas.
Como já foi referido no presente relatório, o Decreto-Lei n.º 337/73, de 5 de Julho, que operou a desafectação dos terrenos do domínio público marítimo, foi aprovado de harmonia com o Decreto-Lei n.º 48 784, de 21 de Dezembro de 1968, cujo n.º 2 do artigo 5.º determina que a reversão importa a perda a favor do Estado das obras e benfeitorias realizadas nos terrenos e não conferem direito a qualquer indemnização nem à restituição do preço pelos mesmo pago. O contrato de compra e venda dos terrenos, celebrado entre o Estado e a Eurominas, em 11 de Fevereiro de 1974, integrou cláusulas que reproduzem o disposto na citada norma legal.
Contudo, o Decreto n.º 14/95, de 22 de Maio, que veio operar a reversão para o domínio público marítimo dos terrenos da Eurominas, não previu expressamente a inexistência do direito a indemnização, tendo o legislador optado por uma remissão difusa para o artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 48 784, de 21 de Dezembro.
Ora, o Decreto n.º 14/95, de 22 de Maio, ao estabelecer no seu artigo 2.º, como efeitos da reversão, apenas a perda a favor da Administração dos Portos de Setúbal e Sesimbra de todas as obras e benfeitorias realizadas nos terrenos, sem fazer menção expressa à inexistência do direito a indemnização, suscitou, desde logo, dúvidas, quanto àquela que foi a real vontade do legislador.
Da prova documental depositada na Comissão de Inquérito conclui-se que as dúvidas quanto à (in)constitucionalidade e (i)legalidade da reversão sem direito a indemnização surgem logo no decurso do processo legislativo conducente à aprovação do Decreto n.º 14/95, de 22 de Maio, no momento em, que na Presidência do Conselho de Ministros, é anexada uma nota para a reunião de Secretários de Estado, de 17 de Março de 1995, que expressamente refere: "Todos os requisitos legais para a reversão parecem preenchidos. Temos dúvidas é que, dada a evolução dos princípios gerais do direito administrativo, possa ainda considerar-se em vigor o artigo 5.º, 2 do Decreto-Lei n.º 48 784, que não faz corresponder às benfeitorias qualquer indemnização (agora reiterado número artigo 2.º do projecto)."
Acresce que, constata-se, igualmente, da prova documental depositada na Comissão de Inquérito, que o Decreto n.º 14/95, de 22 de Maio, na sua versão originária, ainda apresentado sob a forma de decreto regulamentar, estabelecia, no seu artigo 2.º, que "A reversão implica a perda, a favor da Administração dos Portos de Setúbal e Sesimbra, de todas as obras e benfeitorias realizadas nos terrenos e não confere direito a qualquer indemnização nem à restituição do preço por eles pago ou de quaisquer outras quantias pagas por causa da alienação dos terrenos."
Foi, portanto, a segunda parte desta disposição legal que acabaria por ser eliminada no diploma aprovado pelo Governo à época, e substituída por uma remissão difusa para o já citado artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 48 784, de 21 de Dezembro.
Quando questionado sobre estes factos o Comandante Eduardo Azevedo Soares declarou perante a Comissão de Inquérito o seguinte:

"Quanto ao decreto regulamentar, a expressão, o apontamento da Secretaria de Estado da Presidência do Conselho de Ministros, quem andou por estas coisas sabe perfeitamente que é banal. Os ministérios elaboram

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os seus diplomas, levam-nos para decisões do Conselho de Ministros ou vão a conselhos de secretários de Estado, e depois são discutidos, são melhorados, são aprovados. Mesmo depois de aprovados, passam outra vez pela Presidência do Conselho de Ministros, onde levam normalmente redacções, aprimoramentos, desde que não mexam na essência do problema, são melhorados do ponto de vista, suponho eu, das técnicas jurídicas e das melhores práticas legislativas. O que vi do decreto que propus e do decreto que já não assinei, mas que veio a ser publicado, e é como se eu tivesse assinado, é apenas a mudança de uma expressão em que dizia (…) Que repetia a lei, para "pura remissão à lei". Não sou jurista, mas suponho que isto é uma prática jurídica perfeitamente banal e usual. Portanto, para mim, oficial de marinha, é uma questão estética e de técnica legislativa, não vejo onde esteja a diferença. Ficava claro é que não havia lugar a indemnização, isso é que era preciso ficar acautelado"

Referindo-se à mesma questão o Eng.º Duarte Silva, referiu perante a Comissão de Inquérito:

"Toda a proposta feita pelo Ministério, que depois, obviamente, subscrevi, vinha devidamente preparada e justificada pelo meu antecessor e, de facto, temos aqui uma questão de dias. Não faria qualquer sentido, e não havia nada que me levasse a poder fazê-lo, repensar esse assunto. Quer dizer, não tinha razão nenhuma para tal, aquilo que me foi dado relembrar foi que havia um incumprimento relativo à justificação de ter sido em tempo feita uma desafectação do domínio público marítimo com determinado fim e entendeu governo, e eu, naturalmente, o subscrevi, que haveria que repor a legalidade. (…) Tem vindo na imprensa, até vinha na de hoje, que da proposta inicial do meu antecessor para a proposta final, que foi subscrita por mim, foi feita uma alteração. (…)Aliás, acho que a redacção adoptada até dá um sentido mais lato, porque não refere que sejam os n.os 1, 2 ou 3 do artigo 5.º, fala do artigo 5.º e, ao fazê-lo, está claramente previsto, até como o Sr. Deputado reconhece, o "não direito a indemnizações". Portanto, quanto a isso, confesso que não sei dizer-lhe mais nada do que isto."

Já após a publicação do Decreto n.º 14/95, de 22 de Maio, pronunciaram-se sobre o mesmo, do ponto de vista jurídico, a pedido da Eurominas, o Prof. Marcelo Rebelo de Sousa, o Prof. Freitas do Amaral e o Prof. João Caupers, cujos doutos pareceres, que se encontram depositados na Comissão de Inquérito, são conclusivos no sentido de que o mesmo está inquinado de vicio de violação de lei. Em simultâneo, os aludidos pareceres apontam, de igual modo, para a inconstitucionalidade do artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 48 874, de 21 de Dezembro, na justa medida em que à reversão não se faz corresponder o direito a indemnização.
A concorrer para a tese de que à desafectação dos terrenos da Eurominas para o domínio público marítimo deve corresponder o direito a indemnização enquadra-se a resposta preparada pela Dr.ª. Maria Teresa dos Prazeres Beleza, da CEJUR, para o Primeiro-Ministro, Prof. Cavaco Silva, dirigir ao Supremo Tribunal Administrativo, em resposta à impugnação da Eurominas, na qual o Estado procurando defender os fundamentos da reversão considera que os interesses da empresa poderão vir a ser ressarcidos pecuniariamente.
Finalmente, dos depoimentos prestados perante a Comissão de Inquérito, pelos depoentes que no exercício de funções governativas intervieram no processo Eurominas, transparece uma forte convicção de que a reversão dos terrenos, no plano jurídico, não ficaria bem resolvida se não fosse acompanhada de um indemnização.
Assim, o Sr. Deputado Vitalino Canas, no depoimento que prestou perante a Comissão de Inquérito, referiu:

"Do ponto de vista da constitucionalidade, era óbvio que não podia haver o confisco de benfeitorias, nomeadamente das benfeitorias portuárias que a empresa tinha construído e que o Estado pretendia utilizar (…). A Constituição não permitia, no meu entender, que se fizesse uma reversão sem indemnização."

Já o Sr. Deputado João Cravinho declarou, a esse propósito, o seguinte:

"(…) a probabilidade de a Eurominas ganhar em tribunal os processos que aí fez entrar são escassas, não é o caso sobre a EDP, é o caso sobre a reversão, excepto no que diz respeito a um ponto: o relativo à necessidade constitucional - e perfeitamente lógica e de um mínimo de decência pública - de indemnizar por benfeitorias, quer dizer, uma coisa é o Estado não pagar a indemnização alegando e justificando que a reversão estava fundamentada pelo facto de a Eurominas não cumprir o objectivo e outra coisa é dizer: 'Bom, eu aproprio-me de tudo, volta a mim, e não quero saber de benfeitorias!'. Isso já não, é um enriquecimento sem causa, na medida em que fosse, digamos assim, legítimo o conceito de benfeitoria.
(…) teria de haver indemnização e esta diabolização da indemnização não tem lugar num Estado de direito. Eu próprio, que entrei nisto muito contrário a qualquer tipo de indemnização, devo confessá-lo, fui-me apercebendo que, de facto, não era legítima num Estado de direito e era perfeitamente impugnável em qualquer tribunal decente a ideia de que o Estado se estava a aproveitar de algo que tinha sido criado com o investimento da empresa, que era a parte da benfeitoria marítima e só dessa. O sustentar-se que não havia lugar à benfeitoria marítima só porque há um decreto-lei que diz isto é ignorar o enquadramento desse

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decreto-lei nos preceitos constitucionais. E eu, que era muito contrário a qualquer tipo de indemnização e que entrei muito orientado por aí, fui-me apercebendo que, de facto, existe uma coisa chamada Constituição e fui-me apercebendo que, de facto, não é admissível, com Constituição ou sem ela, que haja o tal enriquecimento sem causa, que é um dos "cancros" da vida nacional. Logo, não era o Estado que o devia praticar."

Em suma, do vasto acervo documental e testemunhal depositado na Comissão de Inquérito, em torno da reversão versos direito a indemnização, assumem carácter manifestamente maioritário os que consideram que a haver reversão, a mesma deveria ter associada uma indemnização, sob pena de se estar perante uma situação de confisco e de enriquecimento sem causa, violadora dos princípios inscritos na nossa Lei Fundamental.

Quesito 10:
Quais os fundamentos invocados pelo Estado para decretar a reversão?
Através do Decreto n.º 14/95, de 22 de Maio, publicado no Diário da República, I Série B, o Estado decretou a reversão dos terrenos do Estuário do Rio Sado, que haviam sido desafectados do domínio público marítimo através do Decreto n.º 337/73, de 5 de Julho, com vista à implantação de uma unidade industrial de ligas de manganês, invocando os seguintes fundamentos:

- A recente cessação da actividade cujo interesse público justificou a alienação e consequente encerramento da referida unidade industrial;
- A inexistência, na opinião do Estado, de perspectivas razoáveis de alteração desta situação.

Ora, de acordo com o artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 48 784, de 21 de Dezembro de 1968, os terrenos a que for dada utilização diferente da fixada no decreto de desafectação ou em relação ao quais não seja observado o condicionalismos estabelecido nesse diploma, deverão reverter ao domínio público.

Quesito 11:
Em que contexto se desenvolveu o processo de reversão?
Numa carta de 16 de Agosto de 1991, que consta da documentação depositada nesta Comissão de Inquérito, dirigida pelo Conselho de Administração da APSS à Eurominas, é referido que se encontra quase em fase de conclusão a assinatura de um protocolo entre estas entidades, com o objectivo de operar, em regime de serviço público, no terminal, no cais da Eurominas. Nela, inclusivamente é referido, pela Administração dos Portos de Setúbal e Sesimbra:

"Assim, face ao interesse afirmado de reactivar o cais da Eurominas, por forma a evitar os inconvenientes decorrentes da reversão, que a lei estabelece como consequência da sua utilização para fim diverso do inicialmente previsto, afigura-se que a solução jurídica a adoptar deverá passar, em nosso entender, pela celebração de um protocolo entre a APSS e a Eurominas, nos termos do qual esta empresa cederia o uso das suas infra-estruturas à APSS."

Ora, este documento denota que as conversações entre a APSS e a Eurominas já iam adiantadas no sentido de assinar um protocolo para utilização pública do cais da Eurominas. Além disso, posteriormente, em 26 de Outubro de 1994, a própria Eurominas cria uma nova empresa, a Eurocais - Terminal Portuário, Lda., DR-III, em sociedade com a SETEFRETE vocacionada essencialmente para a operação portuária, onde consta, no artigo 3.º do Capítulo I, que:

"A sociedade tem como objecto a promoção e a gestão do terminal portuário da Eurominas, sito em Setúbal, na península da Mitrena, bem como o exercício de actividades conexas;"

Os documentos em posse desta Comissão de Inquérito indicam que entre 1991 e 1994 existia um apoio e um estímulo à empresa Eurominas para que a mesma enveredasse para a vertente de operação portuária, o que implicava que a mesma iria manter a titularidade dos terrenos e cais, não obstante os operadores poderem ser entidades terceiras. Inclusive, a mesma apresentou, em 14 de Fevereiro de 1994, no Tribunal Judicial de Setúbal um processo especial de recuperação de empresas (proc. 1409/94 - 2.º Juízo), no qual se propõe realizar uma reestruturação da empresa e dos seus principais activos. Também indicam que a empresa Eurominas tinha a intenção de reiniciar a sua actividade de produção de ligas de manganês logo que resolvido o litígio com a EDP, pois enviou um ofício ao Ministro do Mar, Comandante Eduardo Azevedo Soares, em 2 de Novembro de 1994, com conhecimento à APSS, informando-o desta intenção. No mesmo documento também informam o Ministro do Mar que se encontra em fase de elaboração um conjunto de estudos com vista à produção alternativa de outro tipo de ligas de manganês e à utilização do futuro gás natural como energia alternativa, manifestando, assim, a sua disponibilidade para com o Ministério do Mar e com a APSS encontrar uma solução para aquela situação, nomeadamente através da cedência temporária à APSS do cais com vista a uma eventual concessão do mesmo para os fins descritos.

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A EDP é informada da existência da hipótese de utilização de gás natural como energia alternativa para a actividade da Eurominas pois, em 7 de Novembro de 1994, o Administrador da EDP, Dr. Saldanha Bento recebe uma informação confidencial do Director do Gabinete de Apoio Jurídico da empresa sobre o Project Finance sugerido pela Ansaldo Internacional. Neste documento é referida uma reunião entre o subscritor da informação e os interlocutores da Ansaldo, onde se refere que:

"(…) Vinham sondar no sentido de averiguar da viabilidade de com a transformação dos créditos da EDP e da Banca sobre a Eurominas em capital de uma 'empresa projecto' (…) que teria como objectivo a construção de uma central eléctrica a gás que não só seria suficiente para a postura em funcionamento - em condições de rentabilidade económica das instalações industriais de silico manganês (que o primeiro dos interlocutores asseguraria) como ainda um excedente de energia que a REN absorveria.
3 - O estudo deste projecto exigiria que na próxima Assembleia de Credores (…), nada fosse deliberado sobre o futuro da EUROMINAS SA, que a viesse a inviabilizar definitivamente.
E seria talvez de aproveitar como 'moeda de troca' para a reconsideração da actuação do Bancos, na sua actual posição, relativamente ao crédito EDP, SA, sobre a Eurominas SA (…)."

Contrariando as expectativas da empresa de voltar à actividade, mesmo que noutra vertente, e para surpresa da mesma, percebe-se pelos documentos depositados nesta Comissão de Inquérito que desde Fevereiro de 1994 se encontrava em curso um processo com vista à reversão dos terrenos, propriedade da Eurominas, nomeadamente em 11 de Fevereiro de 1994, o Presidente da APSS despachou no seguinte sentido:

"Ao CA para deliberação: é de todo o interesse promover a reversão de todos os terrenos desafectados do domínio público marítimo que não estejam a ser devidamente utilizados por forma a constituir uma reserva fundiária que permita o desenvolvimento e expansão ao Porto de Setúbal. Tem a APSS que desencadear todos os processos conducentes a esse objectivo concordando-se com a metodologia proposta e as conclusões desta informação. Deverá ser enviado este processo ao Gabinete de S. Ex.ª o Sr. SEAP para apreciação a solicitar às suas Ex.as os Srs. Ministro do Mar e Ministro das Finanças a execução do decreto que promoverá a referida reversão."

Em 21 de Fevereiro de 1994 o Conselho de Administração da APSS aprovou a proposta de reversão para o domínio público dos terrenos desafectados e vendidos à Eurominas, com a seguinte anotação:

"Nas condições do despacho do PCS, de 94.02.11, exarado na Inf. 2/94-GJ, de 9 de Fevereiro".

Após esta deliberação, a APSS propôs ao Secretário de Estado da Administração Portuária através do ofício n.º 517, de 23 de Fevereiro de 1994, a reversão para o domínio público dos terrenos desafectados e vendidos à Eurominas.
Ao mesmo tempo era concedida a oportunidade a outras empresas de mudarem o objecto da sua actividade como é, por exemplo, o caso da SAPEC. Em 28 de Junho de 1995, o Ministro do Mar, António Duarte Silva, emite um despacho em que declara:

"(…) declaro, por razões de conveniência e oportunidade, o interesse público da convolação do título da empresa SAPEC AGRO SA, em concessão de serviço público de movimentação de cargas (…)."

Este despacho é feito apesar do facto de no mesmo dia o Presidente da ter recebido do Director-Geral da Concorrência e Preços, Luís Pais Antunes, o parecer da Direcção-Geral da Concorrência e Preços relativamente aos contratos de concessão de serviço público da SAPEC AGRO e Pirites Alentejanas, onde se considera que:

"(…), o estabelecimento de prazos de concessão extremamente dilatados pode apresentar inconvenientes na óptica da concorrência, pelo risco de encerramento do mercado durante um largo período de tempo. Em particular, os elementos disponíveis - nomeadamente no que diz respeito às necessidades de investimento - não permitem aferir da indispensabilidade de um prazo de 30 anos como forma de garantir aos interessados uma exploração conveniente dos respectivos direitos."
(…), por um lado, seja efectivamente garantido o respeito da exigência da constituição dos concessionários como empresas de estiva, sob pena de resolução dos contratos, e que, por outro lado, estes consagrem, de forma explícita, o principio da especialização dos terminais."

Em 30 de Junho de 1995 é assinado o contrato de concessão do serviço público de movimentação de cargas no terminal portuário da SAPEC, no Porto de Setúbal, com a duração de 25 anos.

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De acordo com a documentação em posse da Comissão de Inquérito, já em Julho de 1995, a SETEFRETE envia uma queixa em relação ao comportamento da APSS, c/c ao Ministérios do Mar, Secretário de Estado Adjunto das Pescas, Direcção Geral da Concorrência e Preços, APSS, onde informava do seguinte:

"(…) a APSS proibiu as operações de descarga de adubos no cais Eurominas sem indicarem o motivo desta decisão, nem alternativas. Apenas para vossa orientação, informamos que a decisão da APSS de não autorizar descargas no cais Eurominas foi feita em simultâneo com a concessão de serviço público que foi dada à SAPEC, sem abertura de concurso público, tendo neste momento esta empresa o monopólio para o manuseamento destes produtos em Setúbal, sem quaisquer condições fixadas, incluindo tabela de preços. (…)"

Encontram-se também na documentação depositada nesta Comissão de Inquérito, outras queixas da SETEFRETE Setefrete, e alguma troca de correspondência entre a Setefrete e a Administração do Porto de Setúbal em que esta se queixa, nomeadamente de não estarem definidos quais os tipos de mercadorias que podem ser descarregadas no terminal SAPEC. Mais, a associação de operadores portuários do sul levanta várias objecções, onde diz, inclusivamente: "assiste-se ao ridículo de a única entidade que dispõe de uma concessão de serviço público de movimentação de cargas não ser, mesmo até esta data, empresa de estiva, apesar dos princípios definidos nos preceitos legais suprareferido". Verifica-se um quadro de alguma irregularidade no cais da SAPEC, enquanto que a Eurominas estava explicitamente impedida de utilizar o seu cais para fins de operação portuária.
Este quadro irregular de utilização do cais da SAPEC é referido num documento de trabalho, não assinado, que se encontra em posse da Comissão, onde se efectua uma breve análise sobre a evolução dos granéis sólidos no porto de Setúbal, e que menciona:

"Concluindo: no primeiro semestre de 1995, no cais da Eurominas, ter-se-ia operado mais tonelagem de granéis sólidos do que se descarregaram em todos os outros cais juntos - Fontainhas, SAPEC, Eurominas - no período análogo do ano de 1994. Pensámos que havia que defender a política do passado, para conseguir que a SAPEC voltasse aos seus anos de ouro, mesmo que para tal fosse necessário pôr em causa o desenvolvimento do porto de Setúbal, os importadores que nele apostam e os agentes privados que neles investem. Este é o prémio para quem, ao longo destes anos, cometeu gravíssimas irregularidades. Chocante é o facto de ser a APSS a dar cobertura a toda esta situação".

O Sr. Deputado José Lamego também referiu este contexto que ocorria no Porto de Setúbal, pois em depoimento à Comissão de Inquérito referiu que: "(…) há aqui, pelo menos, para além da violação do princípio da proporcionalidade e de outras violações, um tratamento desigual. Quer a Lisnave quer a SAPEC obtiveram o alargamento da afectação de uso especial. Ora, se qualquer dos governos tivesse procedido com a Eurominas como procedeu com a Lisnave ou com a SAPEC, obviamente que a solução indemnizatória não se colocava. E a solução indemnizatória coloca-se quando? Quando o Governo decide que há que alargar o porto e há que candidatar as obras aos apoios comunitários do QCA III.
Aliás, lembro-me que - e outros membros do governo na altura irão depor aqui -, numa visita do anterior MEPAT ao Porto de Setúbal, algures em 1997, 98, fala-se do investimento na melhoria deste porto e diz-se que o alargamento do Porto de Setúbal não é para compensar o facto de o aeroporto ir para Ota e não para Rio Frio, é porque há um intenção do Governo em melhorar esta infra-estrutura portuária. E como é que faz? Concorrendo às verbas do III Quadro Comunitário de Apoio! Para isso, obviamente que tinha de ter a empresa calada e satisfeita, não podia estar a dirimir conflitos em tribunal sobre a propriedade e a posse dos terrenos e ao mesmo tempo estar a candidatar terrenos e instalações, que não eram suas, ao QCA III. Era, pelo menos uma trapalhada administrativa, com um sucesso mais do que previsível, isto é, insucesso!."
Foi no contexto descrito que se operou a reversão do Cais da Eurominas. Em suma, os documentos depositados na Comissão de Inquérito evidenciam que:

- Havia conversações bastante avançadas entre a Eurominas e a APSS, no sentido da assinatura de um protocolo com vista a conceder licença de uso privado para a utilização do cais da empresa;
- A empresa pretendia recuperar a sua actividade principal de produção de ligas de manganês, tendo, inclusive, informado o Estado da possibilidade de utilizar outra fonte de energia, o gás natural;
-- Em 10 de Março de 1995 foi realizada uma assembleia de credores da Eurominas, na qual foi aprovada uma concordata com o voto favorável Estado, homologada pelo Tribunal da Comarca de Setúbal, visando a recuperação da empresa, nos termos da qual a Eurominas se comprometia a pagar 31,9% dos créditos aprovados, os detentores de garantias reais manteriam as mesmas até ao integral pagamento dos valores aprovados e relativamente aos créditos fiscais e à segurança social ocorreria a adesão ao Decreto-Lei n.º 225/94, de 5 de Setembro;
- Ao mesmo tempo que era negada à Eurominas a possibilidade de alterar o objecto da sua actividade e que era operada a reversão, empresas que também operavam no Porto de Setúbal tinham autorização para mudar o objecto da sua actividade, mesmo havendo pareceres da Direcção-Geral de Concorrência e Preços de que essa situação poderia não trazer um balanço positivo para o mercado.

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Quesito 12:
Perante o pedido de suspensão do acto de reversão contido no Decreto n.º 14/95, de 22 de Maio, algum Governo efectuou diligências cujo resultado tenha sido o termo dessa suspensão?
Da documentação que se encontra na posse da Comissão de Inquérito à Gestão do Processo Eurominas, a sequência de acontecimentos é a que se apresenta em seguida.
Logo após a publicação do decreto sobre a reversão dos terrenos do Estuário do Sado, a Eurominas intentou, em 8 de Junho de 1995, no Supremo Tribunal Administrativo (STA) uma acção (Proc. 37 933) requerendo a suspensão da eficácia do acto administrativo contido no Decreto n.º 14/95, de 22 de Maio, invocando, entre outros argumentos, que sempre pretendeu reiniciar a sua actividade, e que a reversão causaria prejuízos irreparáveis ou de difícil reparação e inviabilizariam esta intenção, padecendo do vício de inconstitucionalidade. No mesmo dia o STA notificou de imediato a Presidência do Conselho de Ministros (PCM) da referida acção, fixando como prazo de resposta 14 dias.
Em 28 de Junho de 1995 Maria dos Prazeres Pizarro Beleza, da CEJUR, enviou ao SEPCM informação relativa à acção interposta pela Eurominas, através da qual requereu a suspensão da eficácia do acto administrativo contido no Decreto n.º 14/95, de 22 de Maio, juntando projecto de resposta a entregar no STA, onde procura demonstrar que a referida suspensão de eficácia não causa prejuízos de difícil reparação para a Eurominas, ao invés provoca uma grave lesão para o interesse público.
Com o intuito de reforçar os argumentos da sua acção (Proc. 37 933), a Eurominas requereu, em 30 de Junho de 1995, ao STA a junção do parecer do Professor Marcelo Rebelo de Sousa, lavrado em 22 de Junho de 1995, que conclui no seguinte sentido:

"i)"É ilegal, por vício de forma e por violação da lei, o Decreto n.º 14/95, de 22 de Maio;
ii) É materialmente inconstitucional a norma do n.º 1 do artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 48 784, de 21 de Dezembro de 1968;
iii) É consequencialmente inconstitucional a norma do n.º 2 do artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 48 784, de 21 de Dezembro de 1968."

Em 14 de Julho de 1995 a PCM foi notificada pelo STA, da junção ao Proc. 37 933, por parte da Eurominas, do supra mencionado parecer.
Em 6 de Setembro de 1995 o STA proferiu acórdão no sentido de indeferir liminarmente o pedido de suspensão da eficácia do acto contido no Decreto n.º 14/95, de 22 de Maio, requerido pela Eurominas, por ilegitimidade passiva causada pela falta de indicação da APSS como contra-interessada, tendo a PCM sido do mesmo notificado no dia seguinte.
Não se revendo nesta decisão, a Eurominas interpôs recurso, em 19 de Setembro de 1995, e este foi admitido em 25 de Outubro de 1995.
Por sua vez, a PCM foi notificada, em 25 de Janeiro de 1996, pelo STA para alegar face ao recurso interposto pela Eurominas para o Pleno, do acórdão que julgando procedente a questão prévia da ilegitimidade passiva suscitada pelo Estado, rejeitou o pedido de suspensão da eficácia do acto recorrido.
Em 7 de Outubro de 1996 a PCM foi notificada do acórdão do Pleno da 1.ª Secção do STA que negou provimento ao recurso da Eurominas interposto relativamente ao acórdão de 6 de Setembro de 1995 do STA.
Em 21 de Outubro de 1996 a Eurominas, inconformada, interpôs para o Tribunal Constitucional recurso do acórdão, proferido pelo Pleno da 1.ª Secção do STA, tendo o STA notificado o Primeiro-Ministro para se pronunciar sobre o recurso da Eurominas, em 28 de Outubro de 1996.
Em 21 de Janeiro de 1997 a Eurominas apresentou as suas alegações relativas ao recurso que interpôs junto do Tribunal Constitucional (Proc. 825/96) do acórdão do Pleno da 1.ª Secção do STA, que indeferiu o recurso sobre a suspensão da eficácia do acto recorrido por falta de indicação da parte interessada, ou seja, a APSS.
Na sequência das negociações iniciadas com o Estado com vista a uma solução negociada, a Eurominas, em 5 de Maio de 1998, requereu ao Tribunal Constitucional a suspensão da instância do Processo 825/96, alegando que recentemente foi "(…) celebrado um protocolo que fixa a metodologia a seguir com o objectivo de conduzirem a uma resolução extrajudicial do pleito (…)".

Posteriormente, em 3 de Novembro do mesmo ano, João Raposo da CEJUR enviou ao Gabinete. do SEPCM informação sobre o Processo 825/96 (suspensão da eficácia do acto de reversão) solicitando orientações quanto ao despacho do Tribunal Constitucional que refere "considerando que o prazo previsto na cláusula terceira do protocolo de 8 de Abril de 1998 entretanto terminou, notifiquem-se as partes para dizer, no prazo de dez dias, se entendem justificada ainda a suspensão da instância".
Em 14 de Julho de 1999 o Gabinete do SEPCM respondeu ao CEJUR que nada tinha a opor à manutenção da suspensão da instância, requerida pela Eurominas.
Da documentação depositada na Comissão de Inquérito ressalta que, em 2 de Novembro de 2000, foi publicado o Acórdão n.º 241/2000 do Tribunal Constitucional, que nega provimento ao recurso da Eurominas relativo à suspensão da eficácia do acto administrativo, contido no Decreto n.º 14/95, de 22 de Maio.

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Finalmente, em 14 de Dezembro de 2000, João Raposo do CEJUR informou o Gabinete do SEPCM da notificação do acórdão do Tribunal Constitucional, proferido no processo de suspensão da eficácia do acto contido no Decreto n.º 14/95, de 22 de Maio, que nega o provimento do recurso interposto pela Eurominas. Nessa informação é, ainda, referido que, embora rejeitada definitivamente a suspensão da eficácia do acto administrativo de reversão, se mantinha, no entanto, um outro recurso para anulação do mesmo, embora com instância suspensa face às negociações em curso com o Estado.
Em síntese, dos factos que se acabam de elencar, amplamente suportados na prova documental e testemunhal depositada na Comissão de Inquérito, resulta claramente que os XII, XIII e XIV Governos Constitucionais promoveram durante todo o processo diligências tendentes à defesa do Estado no plano judicial, face ao recurso de suspensão do acto administrativo contido no Decreto n.º 14/95, de 22 de Maio, interposto pela Eurominas.
No entanto, nenhuma outra diligência foi realizada tendo em vista o termo da suspensão da eficácia do acto administrativo, não obstante, em determinado momento, ter sido ponderada a adopção de uma resolução do Conselho de Ministros para colmatar as deficiências formais atribuídas ao despacho do Primeiro-Ministro Prof. Cavaco Silva, tal como mencionado nos depoimentos prestados pelo Eng.º Consiglieri Pedroso e pelo Dr. Aragão Botelho.

IV - Resolução de conflitos:

Quesito 13:
O que propôs a Eurominas para a resolução dos litígios com o Estado e a EDP?
Da prova documental depositada na Comissão de Inquérito constam elementos que permitem, com elevado grau de segurança, conhecer as propostas apresentadas pela Eurominas para a solução dos litígios que a opunham ao Estado e à EDP, que, de resto, são coincidentes com o depoimento prestado perante a Comissão de Inquérito pelo Sr. Deputado António Vitorino, no qual explicou que as mesmas surgiram na sequência de um contacto efectuado por parte da empresa junto do XIII Governo Constitucional, logo no início da laboração do Governo, em Novembro de 1995. De acordo com o Sr. Deputado António Vitorino, a empresa apresentou uma exposição dirigida ao Primeiro-Ministro, onde descrevia o que, em sua opinião, entendia ser uma situação de litígio e de incorrecto tratamento da sua posição, enquanto empresa industrial, por parte do Estado português. Juntou a essa exposição três pareceres jurídicos, a saber, dois, dos Professores Antunes Varela e Menezes Cordeiro, sobre um litígio referente ao conflito tarifário com a EDP, e um terceiro, do Prof. Marcelo Rebelo de Sousa, já sobre a questão do decreto de reversão, que tinha sido aprovado pelo XII Governo Constitucional, em Maio de 1995.
Acresce que na referida exposição, "a Eurominas propunha que o Governo mostrasse disponibilidade para encontrar uma solução global para os vários litígios, a qual permitisse aquilo que era o seu objectivo central, segundo assim diziam, que era a retoma da laboração da fábrica de produção de ligas de manganês instalada no distrito de Setúbal".
Em suma, existiam quatro grandes tipos de litígios entre o Estado e a Eurominas, a saber: litígio entre a Eurominas e a EDP; litígio entre a Eurominas e a Direcção-Geral de Energia; litígio atinente à interposição de uma providência cautelar, tendente a promover a suspensão da executoriedade do decreto de reversão; a impugnação judicial contenciosa do próprio decreto de reversão, com fundamento em ilegalidade e inconstitucionalidade.
Após uma avaliação preliminar da situação, efectuada pelo Ministério da Presidência, o Primeiro-Ministro pediu ao Ministro da Presidência que, "tendo em linha de conta a natureza interministerial das questões que se suscitavam - na medida em que a controvérsia sobre a EDP e sobre o fornecimento de energia tinha a ver com o Ministério da Economia e a Secretaria de Estado da Indústria e Energia e que a controvérsia sobre o decreto de reversão tinha a ver, na altura, com o Ministério do Mar, que, depois, foi substituído nas suas competências pelo Ministério do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território -, assegurasse a coordenação interministerial, para tentar apurar uma posição conjunta do Estado face às pretensões apresentadas pela Eurominas".
Como resultado deste pedido, o Governo reuniu um grupo de trabalho interministerial, em Maio de 1996, ao qual foi submetida uma proposta da Eurominas. Nas palavras do Sr. Deputado António Vitorino a proposta da empresa "tinha um conjunto de elementos que visavam ultrapassar todos estes litígios, de forma acordada, e que levariam a que a Eurominas desistisse de todas as acções que tinha interposto nos tribunais contra o Estado português. Essa proposta era centrada no objectivo fundamental de recolocar a Eurominas em laboração. E tinha como objectivo: a resolução do contencioso com a EDP através de um acordo sobre o destino a dar a uma subestação instalada no terreno da Eurominas; em segundo lugar, a Eurominas pretendia a suspensão do decreto de reversão, de maneira a criar as condições para que a Administração do Porto de Setúbal pudesse ter acesso ao cais da Eurominas que era considerado um cais prioritário para a operação do próprio porto de Setúbal; e, em terceiro lugar, nessa reunião de Maio de 1996, ficou entendido que, quanto ao contencioso sobre o decreto de reversão, se deveria remeter a respectiva decisão para os tribunais. E no caso de a decisão dos tribunais ser desfavorável à Eurominas, o processo obviamente terminaria aí, no caso de decisão ser favorável à Eurominas, ter-se-ia de considerar, como decorrência, aliás, da própria decisão

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judicial, a utilização da figura da expropriação por utilidade pública, para que a Administração do Porto de Setúbal pudesse tomar posse dos terrenos e do cais que, na altura, eram detidos pela Eurominas".
O Sr. Deputado António Vitorino explicou ainda que na reunião de Maio de 1996:

"A Eurominas exprimiu ainda a sua intenção de persistir na exploração do cais da Mitrena, o que pressuporia uma alteração da afectação especial desse mesmo cais, que tinha sido objecto de uma concessão do domínio público para efeitos de exploração da fabricação de ligas de manganês, para uma operação portuária de âmbito mais vasto, que a Eurominas ligava, à época, a um projecto que pretendia desenvolver em Angola, aquilo que hoje provavelmente se chamaria uma deslocalização, isto é, a perspectiva de colocar a laboração da fabricação de ligas de manganês em Angola, com parceiros portugueses, funcionando o cais da Eurominas na Mitrena como a placa giratória para esse processo de exploração de ligas de manganês em Angola".

Quesito 14:
Teve o Governo, nomeadamente através do Gabinete do Ministro da Presidência, Dr. António Vitorino, contactos com a banca, na sequência dos contactos da Eurominas?
Quando questionado perante a Comissão de Inquérito, na audição de 17 de Fevereiro, sobre se o Gabinete do Ministro da Presidência teria efectuado contactos com a banca, na sequência dos contactos da Eurominas, o Sr. Deputado António Vitorino afirmou: "respondo com muita clareza: não só não fiz contactos como não mandei, não autorizei nem tenho conhecimento de que alguém do meu gabinete os tenha feito".
Por sua vez, o Dr. Jorge Dias, na audição de 8 de Fevereiro, respondeu a esta questão da seguinte forma: "Relativamente ao Sr. Ministro da Presidência, para que não fiquem mais dúvidas, quero desde já dizer, começando até um pouco pelo fim, que as afirmações do Sr. Ministro da Presidência de que não sabe, de que não deu ordens, etc., para qualquer tipo de diligência são rigorosamente verdadeiras"".
Acrescentou ainda que: "Tanto quanto consigo recordar, dez anos depois, o que aconteceu foi que a Eurominas, quando nos transmitiu a situação em que estava, disse-nos ou disse-me que tinha havido um acordo com a banca, que tinham pago uma primeira tranche ainda em 1995, antes da reversão, que, depois, tinha havido o decreto de reversão e a situação tinha-se complicado, porque tinham previsto um aumento de capital ou coisa que o valha e não podiam honrar os compromissos. E, portanto, tinham dito à banca, e foi-nos sempre sendo dito, o seguinte (…) E se falaram já com o Dr. Bernardo Alegria podem, se quiserem, voltar a perguntar-lhe. O que aconteceu foi que o Dr. Bernardo Alegria comunicou-me todas as diligências que foram feitas com a banca, concretamente, com os diferentes bancos, incluindo o BPA mas com os diferentes bancos, porque havia mais, havia o Banco Pinto & Sotto Mayor e o Banco Espírito Santo, pelo menos, que me recorde. E penso que não é relevante dizer-vos aqui, sequer, com quem esses contactos foram feitos mas foram com pessoas sobejamente idóneas e conhecidas do mercado financeiro e precisamente no sentido de, indo haver uma solução ou admitindo-se que podia haver uma solução, digamos, negociada, não litigiosa, os bancos terem alguma compreensão, aguardarem, como é normal. Enfim, como trabalhei muitos anos no sistema bancário, estou à vontade para dizer isto e os Srs. Deputados, com certeza, alguns de vós também trabalharam e sabem que é assim. Para os bancos, entre a perspectiva de uma solução contenciosa, que, provavelmente, lhes traria mais prejuízos, e a perspectiva de aguardar algum tempo por uma solução que permitisse salvaguardar os interesses de todos, era natural que esperassem. E, da mesma forma que o Dr. Bernardo Alegria me transmitiu os contactos que teve com a banca, a informação de que disponho é a de que o Dr. Bernardo Alegria transmitiu à banca os contactos que tinha tido com o Ministério da Presidência, concretamente, comigo. Portanto, se essa expressão pode ser mal… A expressão 'acalmar a banca' não é minha, aliás, nos documentos vêem que tem aspas e, provavelmente, se fosse do próprio, não teria aspas, porque, normalmente, nós pomos aspas quando as declarações são de terceiros. Além de que, e porque não quero fugir a nenhuma questão, rigorosamente nenhuma, dentro do princípio de que 'quem não deve, não teme', o documento que me mostrou, embora, pelos vistos, reservado… Bom! A gente já não sabe o que é reservado mas, enfim, até ao momento em que mo mostrou, para mim, era reservado, para outras pessoas, não sei. Mas o documento que me mostrou é meu e está lá dito aquilo que o Sr. Deputado sabe. E, concretamente, isto, posso garantir-lhe, um contacto feito com o Banco Português do Atlântico, do meu ponto de vista, não tem nada de excepcional ou anormal. Como imaginam, eu não tinha, não tenho e nunca teria, se voltasse, alguma vez, a desempenhar essas funções, de explicar ao Ministro de quem dependo, rigorosamente todos os passos que dou, como é óbvio. Isto é das coisas mais normais e elementares. Portanto, o Dr. António Vitorino, quando disse que não fez, não deu, não sei quê, não sei quê, está a falar verdade. Agora, também sendo claro, o contacto de que não me lembro mas que admito, pela leitura que fiz, que terei feito, porque não me lembrar é normal mas se está escrito, pela minha letra, é porque o terei feito, não foi nada, seguramente, para acalmar a banca, porque trabalhei na banca muitos anos - e, portanto, até lhe agradeço a questão que colocou sobre o meu curriculum, para nada ficar mal entendido - (…) Exactamente! Porquê? Porque, naturalmente, nem eu tinha poder, nem capacidade, nem sequer a veleidade de que, tendo trabalhado na banca e tendo decidido muitas coisas na minha longa actividade profissional, me viesse um chefe de gabinete qualquer - passo a expressão - dizer "Eh pá, vocês tenham lá calma ou vejam

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lá se facilitam a vida aos homens". Não! O que eu admito que possa ter feito, não me lembrando, é uma coisa muito simples, ou seja, é dizer: 'confirmem-me se têm um processo em relação à Eurominas'. Isto, porque a defesa dos direitos e dos interesses do Estado, e desculpem que vos diga isto, sem qualquer presunção, passa muito por nós sermos, às vezes, juízes sobre o que é melhor para defender os interesses do Estado. E temos de ser juízes na altura! (…)".
Pelos testemunhos prestados a esta Comissão de Inquérito pode concluir-se que o Sr. Deputado António Vitorino, enquanto Ministro da Presidência, não fez, não ordenou e não teve conhecimento de qualquer contacto com a banca, pese embora o seu Chefe de Gabinete, o Dr. Jorge Dias, o tenha feito com o intuito, segundo as suas próprias palavras, de saber qual a situação da empresa junto da banca, dado que a mesma o havia contactado no sentido de resolver o litígio pendente com o Estado.

Quesito 15:
Qual foi a posição do XIII Governo Constitucional sobre as propostas da Eurominas, nomeadamente em que momento e quem decidiu explorar a via extra-judicial? Que outros condicionalismos contribuíram para esta posição do Governo?
Do vasto acervo documental e testemunhal depositada na Comissão de Inquérito deriva que, logo no início do XIII Governo Constitucional, a Eurominas contactou o Governo com o objectivo de tentar arranjar uma solução extra-judicial para os litígios que tinha com o Estado e com a EDP. Na exposição que apresentou a Eurominas propunha que o Governo mostrasse disponibilidade para encontrar uma solução global para os vários litígios, visando a retoma da laboração da fábrica de produção de ligas de manganês instalada no distrito de Setúbal. Perante este contacto, o Ministério da Presidência decidiu fazer uma avaliação preliminar da situação e, de acordo com a declaração do Sr. Deputado António Vitorino:

"Sumariando, na prática, existiam quatro grande tipos de litígios entre o Estado e a Eurominas.
Havia um litígio entre a Eurominas e a EDP, referente ao contrato de fornecimento de energia eléctrica, à alteração tarifária superveniente, findo o prazo de 10 anos de vigência desse contrato, e, decorrente desse litígio, ao corte do fornecimento de energia que tinha levado à cessação da laboração da fábrica.
O segundo litígio opunha a Eurominas e a Direcção-Geral de Energia, estava ligado ao primeiro e tinha a ver com a questão da constituição da comissão arbitral que o contrato de 1973 previa para resolver diferendos que pudessem surgir no âmbito da execução do contrato então celebrado e da razão pela qual o Estado tinha conseguido os terrenos da Mitrena para efeitos de instalação da fábrica de produção de ligas de manganês.
O terceiro litígio - e, se quiserem, quarto, porque é um litígio que se desdobra em dois elementos fundamentais - tinha a ver com o decreto de reversão de Maio de 1995. Assim, tínhamos, por um lado, um litígio atinente à interposição de uma providência cautelar, tendente a promover a suspensão da executoriedade do decreto de reversão e, por outro, a impugnação judicial contenciosa do próprio decreto de reversão, com fundamento em ilegalidade e inconstitucionalidade.
Colocado perante este conspecto de conflitos, a avaliação que foi feita pelo Governo, sob a minha responsabilidade, chegou a conclusões preliminares, que resumiria desta forma: reconhecia-se, por parte do Governo, que, no litígio que opunha a Eurominas à EDP, havia vulnerabilidades na posição pública, que, aliás, já tinha sido objecto de uma ou duas decisões desfavoráveis à parte pública por parte dos tribunais.
Em segundo lugar, ainda ligado ao conflito sobre o fornecimento energético, colocava-se um problema delicado que tinha a ver com a invocação, por parte da Eurominas, de um conjunto de prejuízos resultante da não laboração da fábrica ou da cessação da laboração da fábrica, essencialmente ligado a compromissos contratuais e a lucros cessantes, no valor de 16 milhões de contos (moeda da época), questão esta que, na avaliação do Governo, era sensível, na medida em que ela poderia ter impacto no processo em curso de privatização da EDP e levar à necessidade de fazer provisões na EDP para sustentar o valor de mercado da empresa, tendo em vista a sua privatização.
Em relação à terceira questão, ao decreto de reversão, a avaliação que fizemos era que a posição do Estado era mais confortável do que nas duas outras situações. Não é que a questão não fosse controversa - ela era susceptível de controvérsia, dos pontos de vista da legalidade e da constitucionalidade -, mas a avaliação que era feita era de que, quanto à substância da decisão do processo de reversão, havia uma causa objectiva que estava na base da decisão do governo anterior. A questão poderia apresentar-se mais complexa do ponto de vista jurídico, quanto à componente da decisão de reversão que previa a perda, a favor do Estado, de todos os bens, isto é, não previa qualquer tipo de compensação, nem em relação a benfeitorias nem em relação a edifícios ou equipamentos, em virtude de essa ter sido a decisão do governo no decreto de reversão.
De todo o modo, havia argumentação jurídica para os dois lados, digamos, e a única questão que parecia evidente à época era a de que se tratava de um tipo de litígio que tinha todas as condições para se arrastar no tempo para ser decidido pelos tribunais.
Feita esta avaliação preliminar, o Primeiro-Ministro pediu ao Ministro da Presidência que, tendo em linha de conta a natureza interministerial das questões que se suscitavam - na medida em que a controvérsia sobre a EDP e sobre o fornecimento de energia tinha a ver com o Ministério da Economia e a Secretaria de Estado da Indústria e Energia e que a controvérsia sobre o decreto de reversão tinha a ver, na altura, com o Ministério do Mar, que, depois, foi substituído nas suas competências pelo Ministério do Equipamento, do Planeamento e da

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Administração do Território - assegurasse a coordenação interministerial, para tentar apurar uma posição conjunta do Estado face às pretensões apresentadas pela Eurominas."

Ou seja, a posição do XIII Governo Constitucional de procurar uma solução extra-judicial para os litígios entre a Eurominas e o Estado e a EDP foi tomada pelo Primeiro-Ministro António Guterres, após a análise da avaliação preliminar efectuada pelo Ministério da Presidência. Para esta tomada de posição também contribuiu outro condicionalismo, nomeadamente, e como foi explicado pelo Sr. Deputado António Vitorino: "(…) adiciona-se uma questão que refiro porque tem algum melindre de natureza política, na medida em que, em Julho de 1996, no decurso de uma visita a Portugal do Vice-Presidente da União Sul-Africana, Thabo Mbeki, foi referenciado este litígio como um litígio que estaria a criar algum incómodo a uma empresa sul-africana, a Samancor, que era um dos accionistas da Eurominas. E foi entendido que este tipo de questão deveria ser objecto de uma análise particularmente cuidada, sobretudo porque essa visita tinha como objectivo, em simultâneo, que o Estado português sensibilizasse o Governo sul-africano para uma especial atenção de protecção dos interesses económicos, investimentos, bens e até da situação das pessoas da colónia portuguesa na África do Sul, que envolvia cerca de 700 000 pessoas - e, naturalmente, quando se tratava de um relacionamento de bom entendimento com a União Sul-Africana, não podíamos ignorar a existência de um litígio que envolvia um importante investidor sul-africano no nosso país, senão mesmo provavelmente à época o mais importante investimento da União Sul-Africana em Portugal".
Este aspecto também foi referido pelo Sr. Deputado José Lamego em depoimento prestado à Comissão de Inquérito, no qual afirmou que:

"Para além disso, qual foi a sensibilidade e como é que este caso foi reconfigurado de novo, em termos políticos? Um dos accionistas desta empresa - a empresa sul-africana Samancor -, aquando da visita do então Vice-Presidente Thabo Mbeki, colocou a questão junto do então Primeiro-Ministro António Guterres, dizendo: "Estamos aqui numa fase de transição, desejamos um bom entendimento entre Portugal e a África do Sul".
Nessa altura, estava indirectamente relacionado, apesar de não ter acompanhado esta conversa entre o Vice-Presidente Thabo Mbeki e o Primeiro-Ministro António Guterres, porque estávamos a discutir com a ESCOM, a empresa de electricidade sul-africana, o problema de Cahora Bassa, e eles disseram: "Como é que querem uma benevolência do Estado português perante o dossier Cahora Bassa quando aqui produzem o confisco de uma empresa, em que uma sociedade importante nossa é accionista?. Houve, portanto, pela primeira vez, a sensibilização política do Primeiro-Ministro, por via do Vice-Presidente Thabo Mbeki, que lhe colocou o problema do confisco de activos de uma empresa de que era accionista a Samancor sul-africana."

Foi neste contexto que, em Maio de 1996, foi constituído um grupo de trabalho interministerial com vista a ultrapassar todos os litígios supra mencionados, de forma acordada, para que a Eurominas desistisse de todas as acções que tinha interposto nos tribunais contra o Estado português.

Quesito 16:
Em que momento e quem decidiu a elaboração e o conteúdo do protocolo que veio a ser assinado, em 8 de Abril de 1998, entre o Estado e a Eurominas? Este acordo era vinculativo para as partes?
O Sr. Deputado Vitalino Canas, enquanto Secretário de Estado da Presidência do Conselho de Ministros, emitiu, em 5 de Janeiro de 1998, um despacho a determinar a elaboração de protocolo para a formação de um grupo de trabalho cujo objectivo seria o de solucionar por via extra-judicial os litígios entre o Estado e a Eurominas, documento esse que consta da documentação da Comissão de Inquérito.
A primeira vez que o Sr. Deputado Vitalino Canas teve contacto com o processo Eurominas foi no final de 1997, logo após a demissão do Ministro da Presidência Dr. António Vitorino. De acordo com as declarações prestadas à Comissão de Inquérito no dia 17 de Fevereiro do corrente ano: "O dossier Eurominas não começou a ser tratado de imediato assim que houve essa transferência de responsabilidades. Tratava-se de um dossier que não tínhamos acompanhado, que ignorávamos. Começou a ser tratado, sensivelmente, se bem me recordo, no final de 1997, talvez já no final de Dezembro de 1997".
O dossier foi tratado pelo Dr. Paulo Tavares, assessor do então Secretário de Estado da Presidência do Conselho de Ministros. Este assessor emitiu um parecer que consta da documentação desta Comissão de Inquérito, e foi com base neste mesmo parecer que o Sr. Deputado Vitalino Canas achou que se deveria ir mais além da constituição de um grupo de trabalho, pois de acordo com as suas palavras: "(…) até porque a simples criação de um grupo de trabalho não constituiria fundamento para uma eventual suspensão das várias instâncias do processo que estava em curso. Portanto, foi-se evoluindo e decidiu-se que a melhor fórmula deveria ser a de criar um grupo de trabalho através de um protocolo, que já estava mais ou menos nas intenções anteriores, mas que ainda não estava desenhado, e passámos a procurar fazer o desenho desse protocolo a partir desse meu despacho, que é de 5 de Janeiro de 1998.

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Fomos contactando com os vários gabinetes envolvidos e pedimos também a colaboração do Dr. Jorge Dias, que era quem conhecia o processo, como chefe de gabinete do Dr. António Vitorino, e que nos deu uma ajuda na exacta definição daquilo que já vinha de trás.
A 26 de Fevereiro de 1998, houve um acontecimento que reputo de importante, porque nos fez andar um pouco mais depressa: recebemos um parecer da autoria do Prof. Freitas do Amaral e do Prof. João Caupers, que era um parecer inequivocamente a favor da resolução extrajudicial deste conflito, por motivos vários."
Também o conteúdo do protocolo foi determinado pela Secretaria de Estado da Presidência do Conselho de Ministros. O Sr. Deputado Vitalino Canas explicou que: "O protocolo foi materialmente elaborado pelo meu gabinete, mas tivemos a contribuição não apenas dos gabinetes dos outros secretários de Estado, que deveriam depois subscrevê-lo, mas também do Dr. Jorge Dias, uma vez que solicitámos a sua ajuda, pois que era quem conhecia o processo antecedente", referindo, também que "A 3 de Março de 1998, há um despacho meu determinando a remessa oficial do projecto de protocolo, que entretanto estava a ser elaborado mas que ainda não era definitivo, a vários secretários de Estado.
Também a 3 de Março, há uma carta da Eurominas a sugerir alterações ao projecto de protocolo. É uma carta em que a Eurominas apresentava a pretensão de procurar alargar o protocolo.
Depois, em 10 de Março de 1998, o meu então gabinete envia o projecto de protocolo a várias entidades sem a aceitação de sugestões da Eurominas, mas com a alteração da Cláusula V, de modo a ficar bem claro que, no caso de acordo no grupo de trabalho, este se limitaria a elaborar a minuta de transacção que submeteria à apreciação das partes, isto é, o acordo atingido no grupo não era definitivo, estaria sujeito ao acordo por parte do Governo, de um lado, e da Eurominas, de outro lado.
A 8 de Abril de 1998, um mês e tal depois disso, é assinado o protocolo".
O possível acordo entre as partes a que se poderia chegar no âmbito dos trabalhos deste grupo de trabalho interministerial não era vinculativo para as partes, como se pode verificar pela redacção da cláusula IV do referido protocolo de 8 de Abril de 1998 assinado pelo Estado e a Eurominas, a saber: "As conclusões das discussões do Grupo de Trabalhos não vinculam as partes, nem constituem qualquer tomada de posição em concreto sobre a questão em análise".

Quesito 17:
Quais as rubricas acordadas no protocolo assinado entre o Estado e a Eurominas, em 8 de Abril de 1998, para apuramento do valor da indemnização eventualmente a pagar à Eurominas?
Podem encontrar-se rubricas referentes ao apuramento da indemnização que eventualmente o Estado pagaria à Eurominas na cláusula primeira e no n.º 2 da cláusula quinta do Protocolo de 8 de Abril de 1998.
Nomeadamente, na cláusula primeira:

"É constituído no prazo máximo de dez dias úteis a contar da celebração deste protocolo, um grupo de trabalho tendo em vista a obtenção de um acordo sobre os montantes a pagar, a título de indemnização, pelos Terrenos e pelas Benfeitorias, de modo a pôr termo aos litígios existentes entre a Eurominas e o Estado."

Além disso, no n.º 2 da cláusula quinta:

"A minuta referida no número anterior estabelecerá a calendarização dos compromissos assumidos, quer por parte da Eurominas, nomeadamente no que respeita à desistência de todas e quaisquer acções judiciais ou outros procedimentos judiciais - incluindo incidentes e recursos - que tenha interposto, ou pretenda interpor, por força do diferendo objecto deste protocolo, e à entrega dos Terrenos, incluindo de todas as benfeitorias neles realizadas, quer parte do Estado, quanto ao pagamento dos montantes indemnizatórios."

Quesito 18:
O grupo de trabalho presidido pelo Sr. Juiz Conselheiro Dr. Luciano Patrão limitou-se a avaliar as rubricas contempladas no protocolo ou alargou o seu âmbito?
Efectivamente, o grupo de trabalho presidido pelo Sr. Juiz Conselheiro Dr. Luciano Patrão limitou-se a avaliar as rubricas contempladas no protocolo. De acordo com as suas declarações prestadas à Comissão de Inquérito em 25 de Janeiro:

"(…) devo dizer que, quanto aos objectivos do grupo, nada tenho a acrescentar a não ser o protocolo que estava estabelecido entre o Estado e a Eurominas, que se cingia exclusivamente à obtenção de um acordo sobre os montantes a pagar a título de indemnização pelos terrenos e pelas benfeitorias. Bom, não era outro o objectivo, foi isto que foi explicado, aliás, foi este o documento que me foi entregue quando aceitei presidir ao grupo de trabalho."

Quesito 19:
Que razões inviabilizaram o acordo quanto aos montantes a considerar como eventual indemnização a atribuir à Eurominas?

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No âmbito do grupo de trabalho presidido pelo Sr. Juiz Conselheiro Dr. Luciano Patrão foram apresentadas avaliações, quer por parte do Estado quer por parte da Eurominas (ambas constam da documentação depositada na Comissão de Inquérito).
No que diz respeito à avaliação apresentada pelo Estado, o Sr. Deputado Vitalino Canas, em depoimento a esta Comissão de Inquérito explicou que:

"O Estado iria fazer uma avaliação, sendo que, em todo o caso, já existia uma avaliação mandada fazer pela Administração dos Portos de Setúbal e Sesimbra, que tinha sido comunicada ainda ao Ministro da Presidência em Outubro ou Novembro de 1997, ou seja, antes de o processo passar para as minhas mãos.
Esta avaliação preliminar tinha sido feita por uma sociedade designada American Appraisal, tendo o Estado uma noção mais ou menos certa daquilo que poderia estar em causa. Pareceu, contudo, que era necessário mandar fazer uma outra avaliação mais circunstanciada e que pudesse sustentar melhor quaisquer posições que o Estado assumisse no âmbito deste grupo de trabalho.
Em 16 de Outubro de 1998 é comunicada à Administração dos Portos de Setúbal e Sesimbra e, depois, é-nos comunicada a nós, a avaliação feita em Agosto por esta mesma empresa, American Appraisal - chamo a vossa atenção para o facto de esta ser a segunda avaliação -, onde se refere que o que estava em causa era um custo de reposição depreciado da propriedade imobiliária do cais da Mitrena, no valor de 2 066 000 contos, mais equipamento, no valor de 1 326 000 contos, num total de quase 4 milhões de contos.
Ora, esta avaliação da American Appraisal, de alguma forma, surpreendeu os representantes do Estado no grupo de trabalho, visto que era muito díspar da avaliação anterior feita pela mesma American Appraisal."

O Sr. Deputado Vitalino Canas acrescentou que:

"Da parte do Estado, dizia, esta avaliação foi recebida com alguma inquietação e entenderam os membros do grupo que representavam os vários gabinetes ministeriais ou os gabinetes dos secretários de Estado que deveriam fazer, com recurso a serviços do Estado, uma reponderação dessa mesma avaliação.
E é assim que, em 17 de Novembro de 1998, há documentação que mostra que a Direcção-Geral do Património, a estrutura do Estado mais habilitada para fazer este tipo de trabalho, fez alguns comentários à avaliação da American Appraisal, chegando à conclusão de que, no seu entender, o imóvel valeria cerca de 1 milhão de contos, mais 130 000 contos.
Só então os representantes dos secretários de Estado no grupo de trabalho se sentiram devidamente munidos dos elementos para reiniciarem o trabalho dentro do grupo, levando esta proposta para o seu seio. É certo que, obviamente, esta proposta suscitou dúvidas nos próprios representantes do Estado no grupo de trabalho, visto que havia aqui uma grande disparidade entre as outras avaliações que já existiam e esta, que era uma avaliação muito conservadora, como era óbvio.
Mas os representantes dos vários secretários de Estado no grupo de trabalho entenderam que era esta a nossa proposta base nesse grupo e foi ela que foi feita em 14 de Janeiro de 1999 nesse mesmo grupo de trabalho. A Eurominas, nessa ocasião, rejeitou liminarmente esta proposta e solicitou prazo para apresentação do seu próprio estudo."

Por outro lado, e segundo explicou o Sr. Deputado Vitalino Canas:

"No dia 9 de Março de 1999 a Eurominas terá apresentado a sua própria avaliação, feita por uma empresa chamada Euromarítima, em que se concluía que o que estava em causa eram 3 503 000 contos, mais 1 052 500 contos, valores de 1999. Se fossem valores de 1996 ou de 1995, seriam superiores. Esta avaliação da Euromarítima criou algum desconforto entre os representantes do grupo Estado (permitam-me que o designe assim), uma vez que os parâmetros, os fundamentos e a justificação apresentados inicialmente por esta empresa Euromarítima eram quase uma cópia daqueles que estavam na nossa própria avaliação, feita pela American Appraisal. Isto suscitou, na altura, alguma preocupação, uma vez que pareceu que havia ali qualquer problema que teria de ser esclarecido.
Todavia, a noção que tenho é a de que houve um grande debate em relação às duas propostas que, no fundo, estavam sobre a mesa, uma do Estado e outra da Eurominas, sendo que essas propostas eram manifestamente inconciliáveis, por serem muito díspares entre si e por nenhuma das partes parecer disponível para evoluir no sentido de encontrar um ponto intermédio que fosse aceitável para ambas."

Como consequência, em 12 de Julho de 1999, o presidente do grupo de trabalho, o Dr. Juiz Conselheiro Jubilado Luciano Patrão, por sugestão do próprio grupo de trabalho, fez uma proposta de acordo, a submeter à consideração superior, preparada por ele, dada a grande discrepância que havia entre as duas propostas, a da Eurominas e a do Estado. Esta proposta perfazia o total 3 058 901 contos, pois era a que em seu entender era um valor justo e que poderia ser aceite pelas duas partes. No entanto, a mesma não foi aceite por nenhuma das partes, inclusive, e de acordo com as declarações do Sr. Deputado Vitalino Canas: "Em 17 de Setembro de 1999 os representantes dos secretários de Estado no grupo de trabalho fizeram comentários à

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proposta do presidente, tendo contestado o conceito amplo de benfeitorias que ele tinha empregue, a utilização dos valores base da Eurominas que ele tinha, em certa medida, adoptado e a possibilidade de indemnizar pelos equipamentos (porque eram considerados pelos representantes do Estado no grupo de trabalho meramente sucata), e, portanto, concluindo pela não aceitação da proposta do presidente do grupo de trabalho.
Nesse mesmo dia 17 de Setembro de 1999, o presidente do grupo de trabalho enviou uma carta para o meu gabinete, dando por concluído o seu trabalho e dizendo que não tinha sido possível chegar a acordo. Nessa carta, há um 'Visto' meu e um despacho de conhecimento aos outros secretários de Estado."

Em 9 de Dezembro de 1999 o então Secretário de Estado da Presidência do Conselho de Ministros emite um despacho comunicado a várias entidades, tomando a posição de que o assunto em causa deixava de estar na alçada do gabinete do Secretário de Estado da Presidência logo que o grupo de trabalho pois este havia terminado as suas funções, uma vez que não se chegou a acordo.
Ou seja, conclui-se que não houve consenso entre as partes pois havia uma grande diferença entre os valores propostos pelo Estado e a Eurominas, os quais se basearam nas respectivas avaliações apresentadas. Além disso, as partes não concordaram com a proposta apresentada pelo presidente do grupo de trabalho, Sr. Juiz Conselheiro Dr. Luciano Patrão. Nas palavras deste: "Uma vez que não havia acordo, limitei-me a permitir, a possibilitar às partes as observações que entendessem ao trabalho que eu tinha feito. Nada mais."

Quesito 20:
Que razões levaram o XIV Governo a retomar as negociações com a Eurominas? Quem teve a iniciativa de as retomar?
A iniciativa partiu do Secretário de Estado da Administração Marítima e Portuário, Sr. Narciso Miranda, que, pouco tempo depois de ter assumido funções, recebeu uma carta do advogado da Eurominas (carta que se encontra na documentação desta Comissão de Inquérito), onde esta se mostrava disponível para retomar as negociações com vista a uma solução extra-judicial do litígio que tinha com o Estado e, mais ainda, admitia a hipótese de aceitar uma valor de indemnização inferior à proposta que a mesma havia apresentada no âmbito das actividades do grupo de trabalho, cujo protocolo foi assinado em 8 de Abril de 1998.
Nas palavras do Dr. Narciso Miranda, da sua audição de 25 de Janeiro:

"(…) Eu recebo, portanto, um processo com tudo isto que eu disse agora: com resultados 'zero', com eficácia "zero", com um plano estratégico do porto de Setúbal 'zero' - que tinha sido anunciado, tendo sido apresentada uma candidatura, no âmbito do III Quadro Comunitário de Apoio, com cativação de verbas - com prejuízo evidente para a economia nacional e com prejuízo acumulado, dia após dia, para o Estado português. E isto com instalações que continuavam a ser utilizadas pela entidade privada a quem o Estado disse 'entregue!' E não aconteceu nada e ninguém fez contas e está bem!… É o desfasamento entre a burocracia e a decisão substantiva; é a diferença que existe entre aquilo que é o exercício do poder efectivo e o exercício do poder de uma forma burocrática ou administrativa. E os resultados são sempre estes, não apenas neste caso, mas em todos.
Isto para ir agora ao meu despacho, para o justificar com esta coerência que estou a transmitir. O processo chega-me às mãos parado no tribunal. Parado! Já estava parado há não sei quanto tempo e assim ia continuar, até que o Estado português ou alguém dissesse: vamos avançar. Remetem-me o processo para o que está aqui escrito, dizendo, entre outras coisas: não há acordo, em princípio isto apenas se resolve por via judicial, já não é nada connosco, você veja lá se não sei o quê… Pronto! E eu estudo o processo. Quando começo a estudar o processo e começo a manifestar as preocupações que aqui tive a coragem de transmitir, recebemos, dois meses e meio depois, o que não é muito tempo (reparem que já estou em seis anos)… Aliás, do ponto de vista da eficácia, ou, melhor, para o grau de exigência que me orgulho de ter, até já considero muito, mas, para aquilo que vejo e para aquilo que é o exemplo deste processo, este período de tempo é pouquinho.
Bom, dois meses e meio depois recebo uma disponibilidade, uma carta. O meu ex-chefe de gabinete recebe uma carta da Eurominas a dizer: nós estamos disponíveis. Mas, pela primeira vez, eles dizem uma coisa diferente da posição que defenderam no âmbito da comissão onde disseram assim: nós só fazemos acordo com este valor. Mas depois não conseguiram. Jogaram todos os seus trunfos, naturalmente, e deram mais um passinho, ainda que discreto, mandando uma carta a dizer: nós aceitamos retomar as negociações e até aceitamos na base, não do que sempre defendemos e que conduziu à inviabilização do acordo, daquilo que o presidente sintetizou, que era um valor mais baixo. Não sei se era muito ou pouco, mas era mais baixo. Portanto, a Eurominas disse que aceitava."

Quesito 21:
Que consideração mereceram por parte do Governo as declarações, os pareceres e as informações prestadas pelos representantes do Estado no grupo de trabalho envolvidos nas negociações com a Eurominas?

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Os comentários apresentados pelos representantes do Estado no grupo de trabalho foram tidos em consideração no momento da determinação do valor de indemnização a atribuir à Eurominas.
Tal facto foi assumido expressamente pelo Sr. Deputado José Junqueiro aquando do depoimento prestado a esta Comissão de Inquérito, em 25 de Janeiro de 2006 (reproduzido na resposta ao quesito seguinte), onde explicou o processo de determinação deste montante e fundamentou a decisão tomada com base nos comentários feitos pelos representantes do Estado, assim como na avaliação apresentado pelo Estado ao presidente do grupo de trabalho.

Quesito 22:
Qual foi a resolução final? Que desenvolvimentos registaram as pretensões originárias da Eurominas?
A resolução final traduziu-se na assinatura de um protocolo entre o Estado português e a Eurominas, em 31 de Maio de 2001.
Neste protocolo a Eurominas compromete-se a, de acordo com as cláusulas primeira e segunda, respectivamente: " (…) proceder à devolução e entrega dos terrenos, obras e benfeitorias, no prazo de três meses a contar da data da assinatura do presente protocolo com excepção dos equipamentos não revertidos que serão desmantelados e removidos a seu cargo dentro dos prazos estabelecidos na cláusula quinta e a contar da data do pagamento da primeira prestação acordada"; "(…) desistir de todas e quaisquer acções judiciais ou outros procedimentos - incluindo incidentes e recursos - que tenha interposto, ou pretenda interpor, que tenham por objecto, directa ou indirectamente, litígios relativos à reversão do terrenos, benfeitorias neles realizados, e equipamentos das instalações da Mitrena e respectiva indemnização".
Por sua vez, e de acordo com a cláusula segunda do protocolo supra mencionado, o Estado compromete-se a "a pagar à Eurominas, SA, a título indemnizatório, o montante global de 2 384 861 (dois milhões trezentos e oitenta e quatro mil e oitocentos e sessenta e um contos) a realizar em três prestações iguais, sendo a primeira paga no prazo de três meses a contar da data da assinatura do presente protocolo, a segunda no primeiro trimestre do ano 2002 e a terceira no primeiro trimestre de 2003".
Quanto às demais pretensões originárias da Eurominas, nenhuma delas foi satisfeita. Com efeito, operada efectivamente a reversão dos terrenos da Eurominas para o domínio público marítimo e celebrado o acordo extra-judicial que culminou com a atribuição de uma indemnização, a Eurominas desistiu de todas as acções contra o Estado e deixou de exercer qualquer actividade nos referidos terrenos.

Quesito 23:
Como e quando decorreu a execução concreta da reversão? Esta reversão foi operada num quadro pleno de segurança jurídica?
Em depoimento prestado à Comissão de Inquérito, o Sr. Deputado José Junqueiro esclareceu os presentes que:

"Na altura - depois de, enfim, procurar insistir- de, entretanto, o Tribunal Constitucional produzir um acórdão, que não dava razão à empresa. Não dando esse acórdão razão à empresa, o que fizemos, de imediato, com os portos de Setúbal foi, em conversa com a Administração, assumir a posse administrativa de tudo aquilo que estava estipulado e, de alguma forma, cumprir, ao fim de cinco ou seis anos, aquilo que tinha sido dito e estipulado para se cumprir ao fim de 20 dias.
Foi exactamente nesta altura que isso foi cumprido.
Ao cumprir, havia que notificar as partes, para que ambas tivessem nota da tomada de posse administrativa. Logo nos primeiros dias, houve um pequeno desencontro: ou não estavam a esta hora, ou àquela hora, de modo que solicitei, sem qualquer hesitação à Administração que diligenciasse, ela própria, no sentido de pedir a intervenção da Polícia Marítima.
A Polícia Marítima interveio, selámos as instalações. E pusemos, naquela altura - penso que a empresa se queixa, hoje em dia, por entender que tudo isto foi muito violento, da parte do Estado mas, da nossa parte, não podíamos consentir que este problema se arrastasse por mais tempo. Tivemos uma actuação que foi a que julgámos proporcional à necessidade de resolver, com urgência, os interesses do Estado, já que, durante estes anos, eles nunca tinham sido resolvidos, e já que, aquilo que deu origem a este problema, que era um decreto que previa 20 dias para solucionar esta questão, só foi possível fazê-lo ao fim destes meses.
A verdade é que a empresa fez logo uma contestação a isto, para o tribunal administrativo de Lisboa; e os portos de Setúbal responderam, imediatamente, e nós, solicitados a emitir parecer sobre essa matéria, acompanhámos - como, aliás, está nos documentos - a administração dos portos de Setúbal, mas a tutela, sobretudo, fez aquilo que entendia fazer, que era cumprir o decreto. E, portanto, o decreto foi cumprido.
É evidente que isto não foi agradável para muita gente, nomeadamente não foi, certamente, do agrado da empresa. Mas era aquilo que se impunha fazer."

Ou seja, pode-se concluir que, de facto, a execução da reversão foi efectuada num quadro de relativa segurança jurídica, uma vez que o Secretário de Estado da Administração Marítima e Portuária agiu com base no Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 241/2000 (Proc. 825/96), de 2 de Novembro de 2000, que consta da documentação desta Comissão de Inquérito, proferido no processo de suspensão da eficácia do acto contido

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no Decreto n.º 14/95. O referido acórdão nega o provimento do recurso da Eurominas, concluindo pela rejeição definitiva da suspensão da eficácia daquele acto, mantendo-se; no entanto, o recurso contencioso de anulação do mesmo, embora com instância suspensa, face às negociações existentes com o Estado.

Quesito 24:
Como e por quem foi determinado o montante da indemnização? Quando e por quem foi decidido o seu pagamento e quem o efectuou?
O montante de indemnização foi decidido pelo Secretário de Estado da Administração Marítima e Portuário, o Dr. José Junqueiro, em 31 de Maio de 2001, data da assinatura do protocolo entre o Estado português e a Eurominas (documento que se encontra na documentação da Comissão), nomeadamente na cláusula terceira do referido protocolo, onde ficou estabelecido o seguinte:

"O Estado compromete-se a pagar à Eurominas SA, a título indemnizatório, o montante global de 2 384 861 (dois milhões trezentos e oitenta e quatro mil e oitocentos e sessenta e um contos) a realizar em três prestações iguais, sendo a primeira paga no prazo de três meses a contar da data da assinatura do presente protocolo, a segunda no primeiro trimestre do ano 2002 e a terceira no primeiro trimestre de 2003."

Em depoimento a esta Comissão, em 25 de Janeiro de 2006, o Sr. Deputado José Junqueiro explicou como chegou ao valor da indemnização, a saber:

"E isto até podia ser uma novidade se o protocolo não fosse antecedido de uma explicação de todos os critérios e diz na alínea d) desse protocolo que "as partes assinaram em 31 de Março de 1998, um protocolo no âmbito do qual foi constituído um grupo de trabalho para definir o quantum a pagar pelos terrenos e benfeitorias a título de indemnização de modo a pôr termo aos litígios entre a Eurominas e o Estado.
Ora, isto é público, tinha mesmo de ser publicado, faz parte dos pressupostos do protocolo e isto para dizer, também, ao Sr. Deputado, de uma forma muito concreta que, de facto, esse protocolo teve influência está aqui plasmado e por escrito.
(…) Nesse sentido, foi dito à empresa que deveríamos encontrar uma solução para o quantum e essa solução é baseada em que critérios? Porque é que se encontrou aquele montante? A alínea k) do protocolo justifica: "os valores apresentados para a rubrica construções nas propostas dos representantes do Estado, em 14 de Janeiro de 1999, em 9 de Março de 1999, do presente grupo de trabalho em 12 de Junho de 1999, não serem significativamente divergentes foi adoptado como critério objectivo obter o valor médio resultante das três propostas que perfaz 1,584 milhões de contos.
É evidente que o Estado tinha feito uma avaliação de 1,5 milhão de contos, a empresa também de um valor superior, o Juiz Conselheiro tinha, também, um valor aproximado e, portanto, aqui não havia grande divergência, mas dizia-se que o Estado avaliou em 1,5 milhão e depois só ofereceu 1,143 milhões de contos por tudo. É evidente que o Estado e o grupo de trabalho fizeram isso, e penso que isso ficou já aqui claro, numa perspectiva negocial, numa perspectiva de evolução, mas relativamente às construções este é o critério.
Está aqui assumido por escrito e publicado, é a média, porque todas as avaliações estavam à volta de 1,5 milhão.
Agora vem a questão dos terrenos, e eu refiro das benfeitorias nos próprios terrenos, e o que é que se passa aqui? O que se passa é que o Estado pensou que o valor justo seria a actualização do dinheiro que foi pago, uma actualização feita à taxa de inflação e que daria 0,5 milhão de euros, sensivelmente, ou 100 000 contos, como, aliás, os papeis estavam traduzidos na altura e a empresa achava que deveria ter 1,8 milhões, quer dizer a empresa pedia 18 vezes mais e o Estado oferecia 18 vezes menos.
O Juiz Conselheiro fez uma avaliação nesta matéria, que eu acho que foi equilibrada, que fixava este valor na casa dos 800 000 contos. De facto, foram feitas um conjunto de benfeitorias que só elas é que dão valor ao próprio terreno e o dotaram de um cais. Houve uma conquista de vários hectares feita ao mar, houve possibilidade de tornar a operação dos navios uma realidade e depois tínhamos o espaço de movimentação de cargas, a questão das acessibilidades, das mercadorias, uma questão geral de mobilidade e que conferia lógica, digamos, aquela obra é o coração daquilo que está ali.
E, Sr. Deputado, não sei se o senhor conhece o local, mas eu fui lá ver. Primeiro, mandei tirar fotografias e depois fui lá ver que era para poder perceber no local o que é que, de facto, aquilo representava como estratégia para o porto de Setúbal. E eu sei que muita gente falou disto sem ir ver, mas eu fui ver.
E houve, também, muita gente que foi ver, porque é algo que é fundamental para formar um juízo, ora aquelas obras que ali foram feitas, foram obras fundamentais e, certamente, o Juiz Conselheiro ao entrar em linha de conta com os valores investidos, com as benfeitorias que ali foram realizadas e com um sentido dado à globalidade daqueles terrenos, entendia que o Estado não podia fazer uma valorização apenas à taxa de inflação, mas que a empresa também não tinha razão ao estar a pedir um valor excessivo e o Juízo Conselheiro o que refere é esta importância.
Acompanhei este raciocínio, tomei o raciocínio como o raciocínio correcto e, por isso, também se responde porque é que em tão pouco tempo se começou a chegar a estes valores. Foi assim, Sr. Deputado, foi estudando o problema, tomando em boa conta os critérios do Estado, tomando em boa conta os critérios o

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Juiz Conselheiro, deixando, como já verificou, de parte as pretensões da empresa em tudo aquilo que respeitava aos valores apresentados.
Por isso, quando se caminha para uma proposta final já o valor da empresa desceu não de 4 ou 4,5 milhões de euros, como ele dizia, mas tinha descido de 13 milhões de euros, portanto que eram 22,5 milhões, que pedia a empresa, para menos dos 15 milhões que o Sr. Juiz Conselheiro propunha para ficar nos 11,8 milhões que era, de facto, o somatório daquelas duas partes: construções e as benfeitorias globalmente enquadradas na questão e na rubrica terrenos.
Finalmente, seguindo, também, o critério do Estado e do grupo de trabalho, que eu li e cujas críticas observei o que é que eu verifico? Verifico que pelo que eles disseram, mas também por aquilo que eu vi e por aquilo que eu falei com a própria administração constatei o seguinte: aquele material que lá estava não era material que interessasse à APSS.
Portanto, não só, ao seguir a proposta do Sr. Juiz Conselheiro estaríamos a pagar a globalidade daqueles equipamentos, como tínhamos de acrescentar a estes equipamentos a remoção dos mesmos, porque tínhamos de demolir os pavilhões, as casas, aquilo que lá estava e proceder a essa limpeza do terreno, que é uma limpeza que prepara o terreno não definitivamente, porque depois isso exigirá um conjunto de intervenções que está a ser realizado.
Portanto, não pondo em causa a avaliação, como eu nunca pus, daquilo que é a ideia do Juiz Conselheiro, pus, pelo menos a hipótese de não considerar aqueles valores e considerar aquele material, como um material que não interessava ao porto.
Assim, se passa neste capítulo dos equipamentos que o Estado não despende um tostão com estes equipamentos e a acrescentar a este valor de 3 milhões e tal de euros desses mesmos equipamentos, era preciso, ainda, acrescentar aquilo que nós gastaríamos, e não gastámos, na remoção dos mesmos e em outras operações que tinham de ser feitas nessa altura e também na retirada desse terreno de algumas centenas de toneladas de escórias que se encontravam ali e que era material que não interessava ao porto de Setúbal.
Somando, portanto, o valor das construções, como diz aqui no protocolo, com o valor do terreno, aceitando como bom o processo de juízo, do próprio Juiz Conselheiro, e fazendo digamos que uma primeira média dos valores e das diferentes avaliações, chegou-se a uma avaliação que é exactamente muito próxima de qualquer das outras que foi feita. Relativamente à questão dos terrenos foi assim explicado quanto à questão dos equipamentos foi assim que se passou.
Diria, portanto, que estes pressupostos dão corpo ao clausulado e ao próprio protocolo e a cláusula 2 é coincidente, na sua quase totalidade, com a cláusula 4 do protocolo de 1998, a terminologia é idêntica. Ou seja, tudo aquilo que foi feito aqui foi aproveitando os trabalhos anteriores."

O pagamento do montante da indemnização foi decidido em Conselho de Ministros, através da Resolução n.º 116/2001 (2.ª Série), de 30 de Agosto de 2001, de acordo com o n.º 1 da referida resolução:

"1 - Autorizar nos termos do n.º 2 do artigo 16.º e da alínea e) do n.º 1 do artigo 17.º do Decreto-Lei n.º 197/99, de 8 de Junho, a realização da despesa no montante global de € 11 895 637, a que correspondem 2 384 861 000$, para pagamento de indemnização à Sociedade Comercial Eurominas Electro-Metalúrgica, SA."

De acordo com a documentação da Comissão de Inquérito o pagamento da referida indemnização foi efectuado da seguinte forma:
A 1.ª prestação do acordo entre Estado e Eurominas, no valor de 794 954 000$00, foi liquidada em 7 de Setembro de 2001;
A 2.ª prestação do acordo entre Estado e Eurominas, no valor de 3 965 213,83 €, foi liquidada em 16 de Maio de 2002;
A 3.ª prestação do acordo entre Estado e Eurominas, no valor de 3 965 209,34 €, foi liquidada em 3 de Abril de 2003.

Quesito 25:
Houve oposição do Ministério Público ao arquivamento, decorrente do acordo extra-judicial, dos processos cruzados que opunham a Eurominas e o Estado?
Não. Pela documentação que se encontra na posse da Comissão de Inquérito pode-se confirmar que, em 6 de Novembro de 2001, a Eurominas requereu ao STA a desistência do recurso contencioso de anulação do acto administrativo contido no Decreto n.º 14/95, de 22 de Maio, e o mesmo notificou o Primeiro-Ministro da extinção da instância por desistência do recurso contencioso, em 22 do mesmo mês, não tendo o Ministério Público exercido oposição.

V - Ganhos e prejuízos para o Estado no processo Eurominas

Quesito 26:
Que ganho obteve o Estado da conclusão deste processo por via extra-judicial que não obtivesse por via judicial?

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Da documentação depositada na Comissão de Inquérito e, sobretudo, dos depoimentos prestados perante a mesma, pode concluir-se que a solução extra-judicial do litígio que opunha a Eurominas ao Estado e que culminou com o arbitramento de uma indemnização teve por base três pressupostos essenciais: i) libertar a EDP de um processo judicial que poderia comprometer o respectivo processo de privatização; ii) a forte convicção de que o arrastamento e a eternização dos processos judiciais movidos pela Eurominas contra o Estado poderiam pôr em crise o projecto de revitalização do Porto de Setúbal e Sesimbra com a consequente perda dos apoios financeiros do QCA III e, finalmente; iii) a convicção de que a reversão dos terrenos sem que à mesma estivesse associada uma indemnização, era susceptível de colidir com princípios inscritos na Constituição da República Portuguesa.
A este respeito, o Sr. Deputado José Lamego, referiu perante a Comissão de Inquérito que:

"(…) na base dos princípios gerais do Direito Administrativo quer a reversão dos terrenos (que eram propriedade e estavam registados em nome da Eurominas) quer as benfeitorias configuram um direito a indemnização, até porque o nosso direito constitucional não admite o confisco e isso seria um confisco. (…) qualquer jurista minimamente informado saberia que, perante os princípios gerais do Direito, nomeadamente perante o artigo 18.º da Constituição, não pode haver reversão sem qualquer direito a indemnização, porque tal configura um confisco."

Nas declarações que o Sr. Deputado Vitalino Canas, realizou perante a Comissão de Inquérito também está patente tal preocupação:

"(…) o que interessava era que aquilo regressasse ao Estado para que o Estado pudesse beneficiar daquelas instalações portuárias e reconverter o porto de Setúbal do ponto de vista estratégico, utilizando aquelas instalações. (…) fiquei totalmente convencido de que não havia outra maneira de resolver aquela complicação toda que não através de uma solução extrajudicial daquele conflito, ou seja, através da possibilidade de uma contrapartida para a Eurominas."

Também o Sr. Deputado António Vitorino referiu à Comissão de Inquérito o seguinte:

"Penso que o ordenamento jurídico constitucional português dificilmente concebe essa forma de confisco, e não tenho qualquer pejo em escondê-lo. (…) na Revisão Constitucional de 1982 (…) foi introduzida, no artigo 82.º da Constituição, uma alteração onde precisamente, por dúvidas de compatibilidade com a solução que a Constituição consagrava com o ordenamento comunitário, foi afastada a hipótese de expropriação sem indemnização, por se entender exactamente que se tratava de um confisco."

No seu depoimento o Sr. Deputado António Vitorino referiu ainda que:

"(…) o acordo de Setembro de 1996 com a EDP permitiu retirar a EDP deste processo. Penso sinceramente que isto é um ganho substancial para a posição do Estado, sobretudo na perspectiva da sustentabilidade da posição da EDP e da sua privatização (…). Até ao Verão de 1997, quando o APSS invoca dois argumentos de peso contra esta solução. O primeiro é a queixa de outros operadores na zona, de que uma solução deste género poderia falsear a concorrência - operadores portuários e não apenas portuários -, havendo uma referência a isso num ofício da APSS, dirigido ao Secretário de Estado Adjunto do MEPAT. Em segundo lugar, há um argumento, o da APSS e o do MEPAT, que é dizer que o plano de expansão do porto de Setúbal exige a mobilização de fundos do QCA III e a tomada de posse efectiva do cais da Mitrena por parte do porto de Setúbal, para poder integrar plenamente o cais da Mitrena no plano de expansão do porto de Setúbal. Portanto, a solução terá de ser a de encontrar um acordo com a Eurominas, para que o Estado possa apossar-se do cais e garantir a expansão do porto de Setúbal."

Estando claras as motivações que estiveram na origem da solução extra-judicial que pôs termo ao litígio existente entre a Eurominas e o Estado, e tendo em conta que os diversos processos judiciais cruzados interpostos pela Euromina contra o Estado não chegaram ao fim, não é possível no âmbito desta Comissão de Inquérito determinar quais foram ganhos que o Estado obteve com a conclusão deste processo por via extra-judicial que não obtivesse por via judicial. Em todo o caso, sempre se dirá que a obtenção de um acordo pela via extra-judicial veio permitir a certeza e segurança jurídicas na resolução do litígio entre as partes, afastando, assim, os efeitos negativos, nomeadamente no plano económico, necessariamente associados a uma eternização dos processos judiciais.
Assim, a única conclusão objectiva que é possível tirar é a de que a solução extra-judicial alcançada pelas partes, além de ter posto termo a um litígio que remontava a 1986, concorreu para afastar em definitivo o risco de uma condenação judicial do Estado e, simultaneamente, permitiu o desenvolvimento do Porto de Setúbal e Sesimbra. Neste contexto e, finalmente, tendo em conta que o valor da indemnização alvitrado à Eurominas, se situou abaixo do valor proposto pelo presidente do grupo de trabalho, Dr. Luciano Patrão, julga-se razoável e aceitável a actuação do Governo nesta matéria.

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C - Conclusões

Atentos todos os considerandos que antecedem, bem como todo o acervo documental e testemunhal depositado na Comissão de Inquérito, conclui-se que:

1 - A EDP denunciou, nos termos contratuais previstos, com efeitos a partir de 1 de Janeiro de 1984, o contrato de fornecimento de energia eléctrica, em alta tensão, celebrado com a Eurominas em 1973, passando a partir daquela data a facturar a energia de acordo com o tarifário oficial. Por seu turno, a Eurominas não aceitou esta decisão da EDP, alegando não dispor de condições para suportar o inerente acréscimo dos custos de produção.
2 - Apesar da tentativa de negociação de um novo tarifário entre a EDP e a Eurominas, esta última continuou a efectuar, entre 1984 e 1986, os pagamentos de energia eléctrica com base no contrato celebrado com a CPE em 1973. Consequentemente, em 8 de Agosto de 1986, a EDP interrompeu o fornecimento de energia eléctrica àquela empresa.
3 - Em virtude do corte do fornecimento de energia eléctrica, a Eurominas viu-se impossibilitada de manter a sua actividade de produção de ligas de manganês.
4 - Em 1995 o XII Governo Constitucional determinou, através do Decreto n.º 14/95, de 22 de Maio, a reversão dos terrenos da Eurominas para o domínio público marítimo, com o fundamento de que a mesma havia cessado a actividade que justificou a desafectação dos aludidos terrenos, não havendo perspectivas razoáveis da alteração da situação, isto é, pelo facto de ter deixado de cumprir o ónus de afectação especial a que estava obrigada.
5 - Pese embora o XII Governo Constitucional não ter previsto, no Decreto n.º 14/95, de 22 de Maio, a atribuição de uma indemnização à Eurominas, nos trabalhos preparatórios do processo legislativo que conduziram à aprovação daquele diploma estão patentes dúvidas sobre a conformidade legal da reversão sem indemnização.
6 - Na sequência da publicação de Decreto n.º 14/95, de 22 de Maio, inconformada com o mesmo, a Eurominas intentou vários processos judiciais contra o Estado, a saber:

a) Em 8 de Junho de 1995, intentou acção, junto do STA, (processo n.º 37 933), requerendo a suspensão da eficácia do acto administrativo contido no referido diploma legal, que, após diversos recursos, viria a ser indeferida pelo Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 241/2000, de 2 de Novembro de 2000;
b) Em 14 de Junho de 1995 intentou acção, junto do STA (processo 38 244), requerendo a anulação do Decreto n.º 14/95, de 22 de Maio, e em 10 de Abril de 1997 intentou, junto do Tribunal Administrativo do Círculo de Lisboa, contra o Estado português acção de indemnização por responsabilidade civil extra-contratual (processo n.º 295/97), no valor de 15 600 000 000$00 (quinze milhões e seiscentos mil contos), as quais decaíram em virtude do acordo extra-judicial celebrado com o Estado, em 31 de Maio de 2001.

7 - Os XIII e XIV Governos Constitucionais nunca puseram em causa a legalidade e a constitucionalidade da reversão dos terrenos da Eurominas para o domínio público marítimo. Entenderam, contudo, que à mesma devia estar associado, de acordo com os princípios gerais do direito administrativo e com disposições e princípios inscritos na Constituição da República Portuguesa, o direito a indemnização pelos terrenos e respectivas benfeitorias.
8 - Nessa conformidade, os XIII e XIV Governos Constitucionais mantiveram contactos com a Eurominas, com vista à resolução extra-judicial do conflito com o Estado.
9 - Em 27 de Setembro de 1996 a Eurominas e a EDP celebraram um acordo de transacção que pôs termo aos processos resultantes do litígio tarifário existente entre as duas entidades, o que permitiu que o processo de privatização da EDP decorresse sem a necessidade de provisionamento de uma verba na ordem dos 16 milhões de contos, valor correspondente à acção intentada pela Eurominas contra a EDP. Através deste acordo a EDP pagou à Eurominas o montante de 400 mil contos a título de compensação global e por uma subestação, pondo termo aos recíprocos processos, nada mais tendo a exigir-se mutuamente.
10 - 8 de Abril de 1998 foi celebrado um protocolo entre o Estado e a Eurominas para a constituição de um grupo de trabalho tendo em vista a obtenção de um acordo sobre os montantes a pagar, a título de indemnização, pelos terrenos e pelas benfeitorias de modo a pôr termo aos litígios existentes entre as partes, cujas conclusões não assumiam carácter vinculativo.
11 - No âmbito do grupo de trabalho referido na conclusão que antecede, o Estado propôs o pagamento de uma indemnização à Eurominas no valor de 1143 (um milhão, cento e quarenta e três mil contos), enquanto que esta reclamava uma indemnização na ordem dos 4,5 (milhões de contos). Não tendo chegado a acordo, o presidente do grupo de trabalho formulou uma proposta de 3 058 901 (três milhões e cinquenta oito mil novecentos e um contos), que também não foi aceite pelas partes, tendo o Secretário de Estado da Presidência do Conselho de Ministros declarado extinto o grupo de trabalho.
12 - Posteriormente, em Março de 2000, a Eurominas manifestou ao Secretário de Estado da Administração Marítima e Portuária a sua disponibilidade para aceitar um valor indemnizatório inferior ao que

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inicialmente havia proposto no âmbito do grupo de trabalho referido na conclusão que antecede. Nessa conformidade, foi reaberto o processo de negociação que conduziu à celebração, em 31 de Maio de 2001, de um acordo, através do qual o Estado pagou à Eurominas a título de indemnização pelos terrenos objecto da reversão e respectivas benfeitorias, o montante de 2 384 861 (dois milhões trezentos e oitenta e quatro mil oitocentos e sessenta e um contos).
13 - Por via deste acordo, de que se não conhece qualquer oposição do Ministério Público, foi colocado termo aos litígios relativos à reversão dos terrenos para o domínio público marítimo, tendo a Eurominas desistido de todas e quaisquer acções judiciais contra o Estado.
14 - O pagamento da indemnização referida no ponto anterior foi autorizado pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 116/2001, de 30 de Agosto, tendo sido efectuada em três tranches que tiveram lugar, respectivamente, em 7 de Setembro de 2001, 16 de Maio de 2002, e 3 de Abril de 2003.
15 - As duas últimas tranches da indemnização à Eurominas foram efectuadas pelo XV Governo Constitucional, sem que fosse suscitado impedimento de qualquer natureza relativamente a este pagamento.
16 - Sendo certo que não compete à Comissão de Inquérito determinar o valor da indemnização a arbitrar à Eurominas, ainda assim podemos afirmar com suficiente grau de segurança que o valor pago foi adequado, considerando o risco, a posição das partes e os interesses em jogo.
17 - Acresce que a prossecução do interesse público exigia também uma solução atempada do problema, de cujo arrastamento vinha resultando claro prejuízo para o plano de expansão do Porto de Setúbal e Sesimbra.

Assembleia da República, 16 de Março, de 2006.
O Deputado Relator, Jorge Strecht.

Nota: - O relatório final foi aprovado.

Anexo

Declaração de voto apresentada pelos Deputados do PS

Os Deputados do Grupo Parlamentar do Partido Socialista votaram favoravelmente o relatório final da Comissão Parlamentar de Inquérito à Gestão do Processo Eurominas na profunda convicção de que o mesmo corresponde, nas conclusões que avança, ao veredicto que resulta da documentação e dos vários depoimentos depositados na Comissão de Inquérito.
Com efeito, no entendimento dos Deputados do Partido Socialista, uma análise assente no rigor e na independência ao vasto acervo documental e testemunhal depositado na Comissão Parlamentar de Inquérito, permite com segurança concluir que:

1 - O XII Governo Constitucional esteve bem ao decidir a reversão para o domínio público marítimo dos terrenos desafectados em 1973 e alienados à Eurominas em 1974, pois já não estava a ser cumprido o ónus de afectação especial que sobre os mesmos recaía, isto é, a instalação e funcionamento de uma unidade de produção de ligas de manganês.
2 - O XII Governo Constitucional esteve mal quanto ao momento em que decidiu a reversão, pois fê-lo em Maio de 1995 quando o fundamento legal para a desafectação remontava a 1986, ano em que a Eurominas deixou de cumprir o ónus de afectação especial referido no ponto que antecede.
3 - O XII Governo Constitucional esteve mal quanto à forma legal utilizada para operar a reversão, decreto, uma vez que o mesmo exigia um auto de entrega assinado pelas partes, que só foi possível concretizar em meados de 2001, contrariando, assim, as perspectivas irrealistas para que a reversão se pudesse observar nos 20 dias seguintes à data da publicação do decreto, ou seja, até ao dia 11 de Junho de 1995.
4 - O XIII Governo Constitucional esteve bem ao aproximar a Eurominas e a EDP no processo de negociação directo que pôs fim a um conflito em que o Estado incorria com forte probabilidade na condenação do pagamento de uma indemnização à Eurominas no valor de cerca de 80 milhões de euros (16 milhões de contos).
5 - O XIII Governo Constitucional esteve bem ao criar, em 1998, um grupo de trabalho exploratório, cujas conclusões não eram vinculativas para as partes, com vista a uma solução extra-judicial dos litígios existentes entre o Estado e a Eurominas.
6 - O XIII Governo Constitucional esteve bem ao não aceitar quer a proposta de 22 milhões de euros apresentada pela Eurominas no âmbito do grupo de trabalho nem tão pouco a proposta do Presidente do Grupo de Trabalho, Juiz Conselheiro Jubilado Luciano Patrão, tendo por objectivo a aproximação das partes - de 15 milhões de euros (cerca de 3,1 milhões de contos) -, como ficou demonstrado pela solução final obtida que ficou abaixo destes valores.

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7 - O XIV Governo Constitucional esteve bem ao retomar as conversações com a Eurominas após manifestação de disponibilidade desta de abandonar o valor de partida de 22 milhões de euros, assumindo o novo valor de 15 milhões.
8 - O XIV Governo Constitucional esteve bem ao obter um acordo extra-judicial com a Eurominas que pôs termo a todos os litígios existentes entre as partes, mediante uma indemnização de cerca de 12 milhões de euros (cerca de 2.4 milhões de contos).
9 - O XV Governo Constitucional esteve bem ao efectuar os pagamentos das duas últimas tranches acordadas.

Neste contexto, e porque vai em direcção similar, os Deputados do Grupo Parlamentar do Partido Socialista votaram favoravelmente o relatório final da Comissão Parlamentar de Inquérito à Gestão do Processo Eurominas, não obstante entenderem que as conclusões fixadas pelo Relator poderiam e deveriam ser mais afirmativas quanto à inequívoca vantagem para o interesse público da solução global dos litígios que opunham o Estado à Eurominas, alcançada através do processo extra-judicial, considerando, nomeadamente:

a) A forte probabilidade de condenação do Estado no conflito que opunha a Eurominas à EDP, e que representaria um encargo para o erário público de 80 milhões de euros;
b) A probabilidade do Estado ser obrigado a pagar à Eurominas uma compensação financeira pelas benfeitorias, terrenos e construções por esta realizadas na área desafectada em 1973, que poderia representar um encargo para o erário público de 15 milhões de euros - proposta apresentada pelo Juiz Conselheiro Jubilado Luciano Patrão, que permite admitir que se a matéria tivesse sido motivo de pronunciamento do STA, do qual o proponente foi Presidente, este seria o valor apurado;
c) Que os valores dispendidos pelo Estado totalizaram 14 milhões de euros, havendo uma evidente vantagem de 81 milhões de euros.

Acresce que a resolução extra-judicial dos litígios existentes entre o Estado e a Eurominas, ao permitir a concretização do plano de expansão do Porto de Setúbal e Sesimbra, com acesso a fundos comunitários do QCA Ill, bem como a cessação dos prejuízos resultantes da não utilização dos terrenos objecto da desafectação, implicou, por si só, ganhos inequívocos para o Estado.
Em suma, os Deputados do Grupo Parlamentar do Partido Socialista entendem, atentos os interesses em presença, que a solução extra-judicial do litígio que opunha o Estado à Eurominas foi adoptada com respeito pelo interesse público, daí resultando evidentes ganhos que de outra forma não seriam alcançados.

Os Deputados do PS: Ricardo Rodrigues - Afonso Candal - Mota Andrade - Maria Antónia de Almeida Santos - Luísa Salgueiro - Marco Sá - Rui Vieira - Ana Catarina Mendonça - mais duas assinaturas ilegíveis.

Declaração de voto apresentada pelos Deputados do Partido Social Democrata

Os Deputados do Partido Social Democrata na Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) à Gestão do Processo EUROMINAS aprovam, em absoluto, a posição adoptada pelo XII Governo Constitucional, pelos seguintes motivos:

1 - O Decreto n.º 337/73, de 5 de Julho, que operou a desafectação do domínio público marítimo dos terrenos do estuário do Sado a favor da Eurominas, baseou a sua edição no preenchimento das condições previstas no Decreto-Lei n.º 48 784, de 21 de Dezembro, designadamente na ocorrência de "fortes razões de interesse geral que prevaleçam sobre os fins justificativos da integração dos mesmos terrenos no domínio público". Este diploma assumiu que se encontravam em tais condições "os terrenos do estuário do rio Sado necessários à implantação de uma indústria de metalurgia de ligas de manganés, fundamentalmente destinada à exportação". Para além disso, no seu artigo 2.º o aludido Decreto de desafectação estabelecia que esses terrenos continuavam "sob a jurisdição da Junta Autónoma do Porto de Setúbal".
2 - Por seu turno, o n.º 1 do artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 48 784 estabelece que "a desafectação (…) revestirá a forma de decreto". O n.º 1 do artigo 3.º prevê que "os bens desafectados poderão (…) ser vendidos". E o artigo 5.º do mesmo diploma legal estatui, no seu n.º 1, que "reverterão ao domínio público os terrenos a que for dada utilização diferente da fixada no decreto de desafectação ou em relação aos quais não seja observado o condicionamento nele estabelecido"; no seu n.º 2 que "a reversão importa a perda a favor do Estado das obras e benfeitorias realizadas nos terrenos e não confere direito a qualquer indemnização nem à restituição do preço por eles pago (…)"; finalmente, o seu n.º 3 prevê que "a reversão revestirá a forma de decreto fundamentado e referendado, nos termos do n.º 1 do artigo 2.º".
3 - A escritura de compra e venda destes terrenos, com uma área de 873 325 m2, e o registo predial respectivo reflectem - como não poderia deixar de ser - toda esta disciplina legal, revestindo, por isso, a venda um carácter resolúvel a favor do Estado, designadamente quando verificado o incumprimento pela

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Eurominas das condições que fundamentaram a desafectação. O preço pago pela Eurominas nesta transacção foi de seis milhões novecentos e seis mil e seiscentos escudos, "correspondente a metade do seu valor real", tendo em conta os compromissos assumidos então pela Eurominas. No essencial, de acordo com os documentos disponíveis na CPI, a Eurominas deveria:

a) Construir e manter em laboração contínua, nos terrenos desafectados, uma fábrica de produção de ligas de manganés, destinadas à exportação;
b) Criar 320 postos de trabalho;
c) Movimentar anualmente, num período inicial, cerca de 300 000 a 400 000 toneladas de carga de matérias-primas;
d) Aumentar tais fluxos, num prazo de três a quatro anos, para 700 000 a 800 000 toneladas.

4 - Contudo, a Eurominas só registou uma movimentação máxima de 338.330,7/ano em 1978 - cfr. Informação da Administração dos Portos de Setúbal e Sesimbra, de 5 de Junho de 1997, para o Gabinete do Secretário de Estado Adjunto do Ministro do Equipamento, Planeamento e Administração do Território - e nunca excedeu os 175 postos de trabalho. Aliás, segundo a própria Eurominas, o número de trabalhadores era de 150 em 1986, segundo a sua exposição de 5 de Dezembro de 1986.
5 - Para além disso, a Eurominas celebrou com a então CPE, antecessora da EDP, em 27 de Junho de 1973, um contrato de fornecimento de energia eléctrica em alta tensão, por um preço de favor, válido para um período de 10 anos, renovável por períodos sucessivos de cinco anos, "salvo se qualquer das partes o denunciar, por carta registada com aviso de recepção, pelo menos seis meses antes do termo do período então a decorrer".
6 - Devido aos compromissos internacionais assumidos entretanto por Portugal, no quadro da sua pré-adesão à então CEE, aos acordos firmados com o FMI e às crises petrolíferas internacionais que se reflectiram num "acréscimo muito significativo do preço do fuelóleo", necessário para a laboração das suas centrais térmicas, a EDP viu-se, no termo desse contrato de fornecimento celebrado com a Eurominas, na impossibilidade de manter tal "preço de favor" na venda da energia eléctrica, razão, de resto, pela qual muitas outras indústrias, também de intensivo consumo energético, acabaram por falir no nosso país. Por isso, denunciou o contrato com a Eurominas em 1 de Março de 1982, ou seja, cerca de um ano e quatro meses antes do seu termo.
7 - A Eurominas nunca contestou esta denúncia contratual.
8 - A partir de 1 de Janeiro de 1984 a EDP, que nunca interrompera os fornecimentos à Eurominas, e com base num acordo aceite por esta em 29 de Dezembro de 1983, começa a praticar as tarifas industriais em vigor.
9 - Mas a Eurominas apenas lhe vai processando, doravante, os pagamentos com base no anterior tarifário contratual.
10 - Ainda assim, a EDP fornece continuamente à Eurominas energia eléctrica até Agosto de 1986, altura em que, com uma dívida acumulada da Eurominas de 4 486 920 000$00, opera o corte desse abastecimento por não pagamento. Era então Primeiro-Ministro do Governo de Portugal o Dr. Mário Soares e o Prof. Veiga Simão o seu Ministro da Indústria e Energia, com a tutela da EDP.
11 - Por razões que se desconhecem e que derivam directamente do facto de o Grupo Parlamentar do PS haver obstacularizado a vinda à CPI de entidades que pudessem lançar luz sobre estes factos, a comissão arbitral, prevista no contrato Eurominas/EDP, nunca funcionou.
12 - Deste modo, o XII Governo ao decretar a reversão em Maio de 1995 cumpriu - e bem - a lei e os acordos aplicáveis a estas relações jurídicas, entre o Estado, a EDP e a Eurominas, visto que esta não só não cumprira, como se demonstrou, as condições legais e acordadas para a desafectação . designadamente criação do número de postos de trabalho e índices de movimentação de cargas -, como se colocou na situação de incumprimento da obrigação fundamental de manutenção da sua laboração.
13 - Os Deputados do Grupo Parlamentar do PSD apresentaram, de resto, oportuna e formalmente, nesta CPI o documento que consubstancia as suas observações, comentários e sugestões ao relatório final apresentado pelo Sr. Deputado Relator, o Sr. Jorge Strecht, em ordem a, do nosso ponto de vista, colocar os factos e as análises deste caso nos seus devidos, precisos e verdadeiros termos. Documento que, todavia - dada a "ditadura da maioria" que sempre foi imposta pelo Grupo Parlamentar do PS ao longo de todo o desenvolvimento dos trabalhos desta CPI - nunca chegou a ser, sequer, considerado pelo Sr. Deputado Relator, como, de resto, se verificou relativamente às demais propostas de alteração apresentadas pelos grupos parlamentares da oposição.
Nestes termos:
Os Deputados abaixo assinados, do Grupo Parlamentar do PSD apresentam, nos termos do disposto na alínea c) do n.º 1 do artigo 20.º da Lei n.º 5/93, de 1 de Março, e da alínea f) do n.º 6 do artigo 7.º do Regulamento da Comissão Parlamentar de Inquérito à Gestão do Processo Eurominas, a seguinte declaração de voto:

1 - Os Deputados do PSD lamentam a falta de isenção protagonizada pelos Deputados do Grupo Parlamentar do Partido Socialista (GP/PS) na CPI na selecção das entidades que foram ouvidas, a qual

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inviabilizou a prestação de depoimentos por parte de elementos tão essenciais para o apuramento da verdade dos factos, como, por exemplo, os representantes do Estado no grupo de trabalho que foi encarregado de apurar o montante da indemnização a atribuir à Eurominas - principalmente o Eng.º Alfredo Neves -, os representantes da administração da EDP que foram directamente envolvidos neste caso ou os Drs. Tiago Silveira, Miguel Serpa Soares, Fernanda Simões e Beatriz Martins que, enquanto adjuntos de gabinetes de membros dos Governos socialistas e membros proeminentes de serviços da administração directa do Estado, protagonizaram posições técnico-jurídicas em defesa dos interesses do Estado - e em divergência com a orientação que viria a ser adoptada neste processo -, para além de serem depositários directos de informações e factos reputados como vitais para a total descoberta da verdade;
2 - Não obstante terem sido ouvidos na CPI, os responsáveis políticos do Partido Socialista nos XIII e XIV Governos Constitucionais exibiram, entre os depoimentos que prestaram, um verdadeiro "jogo de sombras" em que a "paternidade" pela responsabilidade política da mudança de orientação da reversão pura e simples - assumida pelo XII Governo - para a indemnização à Eurominas se acabou por manifestar num manto diáfano de diluição das suas responsabilidades pessoais;
3 - Ao invés, os responsáveis políticos do XII Governo, ouvidos pela CPI, os Srs. Comandante Azevedo Soares e o Eng.º Duarte Silva, assumiram, na íntegra, as suas responsabilidades políticas pela clara opção da reversão dos bens em poder da Eurominas sem direito a qualquer indemnização;
4 - Não obstante o "jogo de sombras" protagonizado pelos responsáveis políticos do Partido Socialista nos XIII e XIV Governos Constitucionais em relação à "paternidade" pela responsabilidade política da mudança de orientação, foi possível, em sede da CPI, apurar que foram os Gabinetes do Ministro da Presidência, António Vitorino, e do seu sucessor, Secretário de Estado da Presidência do Conselho de Ministros, Vitalino Canas, que protagonizaram a decisão política de proceder ao pagamento de uma indemnização à Eurominas;
5 - Em face do que foi apurado dos depoimentos prestados na CPI, os Deputados do PSD consideram inadmissível a conduta do Sr. Dr. José Lamego de um ponto de vista ético, moral e político, ao ter, decorridos escassos meses da sua saída do Governo, onde teve participação directa no dossier, passado de defensor dos interesses do Estado a defensor dos interesses da Eurominas contra o Estado;
6 - Os Deputados do PSD lamentam a posição assumida na CPI pelo ex-Secretário de Estado da Administração Marítima e Portuária, Sr. Narciso Miranda, quando este pressionou a APSS a capitular na sua posição de defesa dos interesses do Estado.
7 - Considera-se que o Secretário de Estado da Administração Marítimo-Portuária que lhe sucedeu, Dr. José Junqueiro, protagonizou a rendição final do Governo ao assinar o Protocolo de 2001, após a acórdão do TC favorável ao Estado;
8 - O relatório final ora apresentado, por ser tendencioso e se encontrar manipulado no seu conteúdo, não deixa clara a relação de favor e a intervenção directa, que efectivamente se registaram, por parte do Gabinete do ex-Ministro António Vitorino, nos contactos que membros daquele Gabinete empreenderam com a banca, com vista a obter moratórias na cobrança dos seus créditos e, por isso, favoráveis à Eurominas. Relembre-se que o Dr. Jorge Dias mentiu à CPI;
9 - De todo o acervo documental carreado e dos depoimentos prestados perante a CPI resulta, de forma inequívoca, que, em nenhum momento, o Estado foi destinatário de qualquer decisão judicial contrária aos seus interesses, no contencioso que manteve com a Eurominas. Pelo contrário, as decisões judiciais conhecidas, do Supremo Tribunal Administrativo e do Tribunal Constitucional, foram favoráveis ao Estado;
10 - Não obstante, os XIII e XIV Governos Constitucionais, ao aceitarem a suspensão dos processos judiciais que corriam os seus trâmites entre a Eurominas, o Estado português e a EDP, prejudicaram o interesse público.
11 - O XIII Governo Constitucional, ao ter negociado isoladamente o contencioso que opunha a Eurominas à EDP, prejudicou o interesse público.
12 - Os XIII e XIV Governos Constitucionais, ao não terem aprovado uma resolução do Conselho de Ministros que declarasse a grave urgência para o interesse público dos terrenos da Mitrena, não acautelaram os interesses do Estado.
13 - O XIV Governo Constitucional, ao executar a reversão apenas dez meses após o Acórdão do Tribunal Constitucional, demonstrou, de forma clara e inequívoca, que o seu primeiro objectivo não era transferir os terrenos da Mitrena, de novo, para o domínio público marítimo, mas, antes, dar uma indemnização à Eurominas.
14 - A decisão política do Governo do Partido Socialista de atribuir uma indemnização de 2,4 milhões de contos à Eurominas foi indevida e constituiu uma lesão objectiva dos interesses do Estado. A este último montante poderão, eventualmente, acrescer os relativos ao crédito pelo fornecimento de energia eléctrica que a EDP deixou de receber da Eurominas, no valor de 4,5 milhões de contos, e os 400 000 contos pagos por aquela a esta última, uma vez as negociações entre a EDP e a Eurominas tiveram inicialmente lugar no Ministério da Presidência, na altura tutelado pelo Dr. António Vitorino. Estes valores totalizam 7,3 milhões de contos, ou seja, cerca de € 35 milhões.

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15 - A estes valores deverão, ainda, ser adicionados os resultantes das indispensáveis operações de descontaminação dos solos que foram ocupados pela Eurominas, bem como da demolição de edifícios e, ainda, as receitas que a Administração dos Portos de Setúbal e Sesimbra deixou de receber pelo impedimento da utilização do cais da Mitrena, causado pela ocupação pela Eurominas.
16 - O Ministério Público não se opôs nem se poderia opor à desistência da acção de indemnização, já que essa desistência foi requerida pela autora da mesma, a Eurominas. Nem podia tão pouco dizer o que quer que fosse sobre um acordo que é extra-judicial. Mas uma vez que o PS questiona a acção do MP, cumpre relembrar que em Julho de 1997 o Ministério Público, em nome do Estado, contestou o dito pedido de indemnização nos termos que passamos a citar:

"O que o Estado não pode aceitar é que a Eurominas pretenda agora responsabilizá-lo por eventualmente não ter efectuado um bom acordo, obtendo dele, por via da presente acção, o que não logrou obter por via negocial com a EDP."

17 - Ficaram por esclarecer duas questões fundamentais:

a) As razões objectivas que levaram os governos do PS a alterar a estratégia, desconsiderando e desconfiando do mérito do sistema judicial, e a determinar a via negocial tendo sempre como objectivo o pagamento de uma indemnização;
b) Os critérios objectivos que levaram a determinar o valor dessa mesma indemnização.

Concluindo:

Relembramos que o Grupo Parlamentar do PSD ao propor a constituição desta Comissão Parlamentar de Inquérito apenas o fez com o objectivo aferir se o interesse do Estado foi bem defendido, eliminar suspeições e, consequentemente, apurar a verdade.
O Partido Socialista, recorrendo à ditadura da maioria, não permitiu o apuramento de toda a verdade.
O relatório que hoje foi votado é a verdade socialista.
Para o PS tudo foi feito de uma forma correcta, honesta e transparente. Estranha-se que, assim sendo, os membros dos ex-governos socialistas ouvidos nesta Comissão não tenham revelado a coragem política de assumir as suas responsabilidades, tendo pelo contrário entrado num jogo de sombras.
Os Deputados do PSD na CPI entendem que os XIII e XIV Governos Constitucionais capitularam neste contencioso, tendo perdido o combate por deliberada falta de comparência.
Ao permitir que, através de uma coordenação de intenções, actos e omissões políticas protagonizados por António Vitorino, Vitalino Canas, Narciso Miranda, José Junqueiro e José Lamego, o Estado viesse a ser - como acabou por ser - lesado directamente em 2,4 milhões de contos (cerca de € 12 milhões), podendo este valor ascender a um montante superior de 7,3 milhões de contos (cerca de € 35 milhões).
Consideramos o relatório apresentado pelo ilustre Deputado Jorge Strech manipulado e totalmente tendencioso nos considerandos e principalmente nas conclusões.
Recorrendo a uma expressão utilizada nesta Comissão pelo ex-Secretário de Estado Narciso Miranda, o relatório do Partido Socialista vale "ZERO".
Assim, os Deputados do Grupo Parlamentar do PSD votam contra o relatório oficial desta Comissão Parlamentar de Inquérito.

Palácio de São Bento, 16 de Março de 2006.
Os Deputados do PSD: Fernando Negrão - Luís Rodrigues - Luís Montenegro - Agostinho Branquinho - Emídio Guerreiro.

Declaração de voto apresentada pelos Deputados do PCP

Relatório final alternativo

A - Introdução

O Diário da Assembleia da República II Série A, n.º 64, de 30 de Novembro de 2005, publicou, a pp. 66 e 67, um pedido para a constituição de uma comissão parlamentar de inquérito à gestão do processo Eurominas, apresentado por vários Deputados do Partido Social Democrata, nos termos dos artigos 156.º, alínea e), da Constituição da República Portuguesa, 11.º, n.º 1, alínea h), do Regimento e 2.º, n.º 2, alínea a), da Lei n.º 5/93, de 1 de Março, com as alterações que lhe foram introduzidas pela Lei n.º 126/97, de 10 de Dezembro.
No seu seguimento, a Assembleia da República, pela resolução publicada no Diário da Assembleia da República II Série A, n.º 65, de 3 de Dezembro de 2005, deliberou "a constituição de um comissão parlamentar de inquérito aos actos da responsabilidade dos sucessivos governos constitucionais, seus

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membros, e dos demais órgãos do Estado e entidades públicas ou por estas participadas, no âmbito do processo que levou à implantação, laboração, encerramento e pagamento de contrapartidas e indemnizações à empresa Eurominas, com instalações na Península da Mitrena, em Setúbal, junto ao estuário do rio Tejo. O inquérito teve por objecto, designadamente, o integral esclarecimento e a apreciação dos actos alegadamente praticados por antigos e actuais membro do Governo da Nação, antigos e actuais Deputados à Assembleia da República, bem como de mais entidades e cidadãos relacionados no que respeita:

a) Aos pressupostos, às circunstâncias e aos fundamentos que determinaram o pagamento à Eurominas de contrapartidas e indemnizações por parte, designadamente, da, então, EDP - Electricidade de Portugal e do Estado português;
b) Às posições oficiais assumidas sobretudo pelos XII, XIII e XIV Governos Constitucionais quanto ao pagamento à Eurominas de tais contrapartidas e indemnizações, bem como ao conteúdo das posições assumidas, relativamente a essa matéria, pelo Ministério Público, enquanto legitimo representante dos interesses do Estado;
c) À existência ou não de prejuízos para o Estado decorrentes de todo o contexto atrás descrito.

A Resolução da Assembleia da República foi publicada com o n.º 65/2005 no Diário da República I-A Série, n.º 237, de 13 de Dezembro de 2005.
O Sr. Presidente da Assembleia da República, através de Despacho n.º 55/X, de 2 de Dezembro de 2005, rectificado pelo Despacho n.º 55-A/X, publicados nos Diários da Assembleia da República, II Série C, n.º 30, de 3 de Dezembro de 2005, e II Série C, n.º 31, de 5 de Dezembro de 2005, fixou em 23 o número de membros da comissão de inquérito, cuja composição ficou estabelecida nos seguintes termos:

Doze Deputados do Grupo Parlamentar do PS;
Cinco Deputados do Grupo Parlamentar do PSD;
Dois Deputados do Grupo Parlamentar do PCP;
Dois Deputados do Grupo Parlamentar do CDS-PP;
Um Deputado do Grupo Parlamentar do BE;
Um Deputado do Grupo Parlamentar de Os Verdes.

Pelos respectivos grupos parlamentares foram então indicados para integrarem a Comissão de Inquérito os seguintes Srs. Deputados:

Ana Catarina Veiga Santos Mendonça Mendes (PS)
António Ramos Preto (PS)
Jorge Manuel Gouveia Strecht Ribeiro (PS)
José Carlos Correia Mota de Andrade (PS)
José Eduardo Vera Cruz Jardim (PS) (substituído a partir de 24 de Janeiro de 2006 pelo Deputado Marcos Sá Rodrigues)
Luís Afonso Cerqueira Natividade Candal (PS)
Luís Garcia Braga da Cruz (PS)
Luísa Maria Neves Salgueiro (PS)
Maria Antónia Moreno Areias de Almeida Santos (PS)
Maria de Belém Roseira Martins Coelho Henriques de Pina (PS)
Ricardo Manuel de Amaral Rodrigues (PS)
Rui do Nascimento Rabaça Vieira (PS)
Emídio Guerreiro (PSD)
Fernando Mimoso Negrão (PSD)
Luís Filipe Alexandre Rodrigues (PSD)
Luís Filipe Montenegro Cardoso de Morais Esteves (PSD)
Paulo Artur dos Santos Castro de Campos Rangel (PSD) (substituído a partir de 10 de Janeiro de 2006 pelo Deputado Agostinho Correia Branquinho)
Artur Jorge da Silva Machado (PCP)
José Batista Mestre Soeiro (PCP)
Diogo Nuno de Gouveia Torres Feio (CDS-PP)
Luís Pedro Russo da Mota Soares (CDS-PP)
Helena Maria Moura Pinto (BE)
Francisco Miguel Baudoin Madeira Lopes (Os Verdes)

Aos 7 dias do mês de Dezembro, pelas 14.45 horas, foi, pelo Sr. Presidente da Assembleia da República, conferida a posse à Comissão, conforme consta do respectivo registo de presenças, tendo, nesta reunião, sido eleita a Mesa, que passou a ter a seguinte constituição:

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Presidente: Fernando Mimoso Negrão (PSD);
Vice-Presidente: Luís Garcia Braga da Cruz (PS);
Secretário: Artur Jorge da Silva Machado (PCP);
Secretário: Diogo Nuno de Gouveia Torres Feio (CDS-PP).

Iniciados os trabalhos, a Comissão adoptou o seu regulamento interno, publicado no Diário da Assembleia da República, II Série B, n.º 28, de 21 de Janeiro de 2006, e elegeu para relator o Sr. Deputado Jorge Manuel Strecht Ribeiro.
A Comissão realizou as seguintes reuniões:

Dia: 7 de Dezembro de 2005
Ordem de trabalhos: Posse e eleição da Mesa
Início: 14.45 horas
Encerramento: 15.30 horas

Dia: 12 de Dezembro de 2005
Ordem de trabalhos: contagem do prazo de funcionamento da Comissão; definição da metodologia de trabalhos; e diligências a efectuar tendo como objectivo o cumprimento da metodologia de trabalhos definida
Início: 15.00 horas
Encerramento: 15.45 horas

Dia: 10 de Janeiro de 2006
Ordem de trabalhos: aprovação do regulamento da Comissão (já distribuído); designação dos relatores; indicação de novas diligências, designadamente audições
Início: 10.30 horas
Encerramento: 13.20 horas

Dia: 12 de Janeiro de 2006
Ordem de trabalhos: audição do Sr. Dr. Bernardo de Arrochela Alegria (14.00 horas); e audição do Sr. Dr. Vitalino José Ferreira Prova Canas (17.00 horas)
Início: 14.00 horas
Encerramento: 21.15 horas

Dia: 17 de Janeiro de 2006
Ordem de trabalhos: audição do Sr. Dr. José Alberto Rebelo dos Reis Lamego (10.00 horas); audição do Sr. Eng.º João Cardona Gomes Cravinho (12.00 horas); audição do Sr. Dr. António Manuel de Carvalho Ferreira Vitorino (15.00 horas); audição do Sr. Dr. Vitalino Canas (17h30 horas); organização - continuação - dos trabalhos da Comissão; discussão da natureza dos documentos não comunicáveis; e marcação de novas audições
Início: 10.00 horas
Encerramento: 22.00 horas

Dia: 18 de Janeiro de 2006
Ordem de trabalhos: audição do Sr. Eng.º João Cardona Gomes Cravinho
Início: 10.00 horas
Encerramento: 14.30 horas

Dia: 19 de Janeiro de 2006
Ordem de trabalhos: audição do Sr. Dr. Vitalino Canas (10.00 horas); continuação da audição do Sr. Eng.º João Cravinho (15.00 horas); organização - continuação - dos trabalhos da Comissão; discussão da natureza dos documentos não comunicáveis; e marcação de novas audições.
Início: 13.00 horas
Encerramento: 20.40 horas

Dia: 25 de Janeiro de 2006
Ordem de trabalhos: audição do Sr. Narciso Miranda (10.00 horas); audição do Sr. Dr. José Junqueiro (15.00 horas); e audição do Sr. Juiz Conselheiro Luciano Patrão (17.30 horas)
Início: 10.00 horas
Encerramento: 20.05 horas

Dia: 26 de Janeiro de 2006
Ordem de trabalhos: audição do Sr. Comandante Eduardo Azevedo Soares (09.30 horas); audição do Sr. Eng.º António Duarte Silva (11.30 horas); e programação de novas diligências, nomeadamente audições

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Início: 09.30 horas
Encerramento: 20.05 horas

Dia: 1 de Fevereiro de 2006
Ordem de trabalhos: aprovação das actas das reuniões da Comissão, realizadas nos dias 25 e 26 de Janeiro de 2006; e apresentação e discussão do questionário
Início: 14.30 horas
Encerramento: 16.45 horas

Dia: 2 de Fevereiro de 2006
Ordem de trabalhos: prorrogação do prazo de funcionamento da Comissão.
Início: 19.00 horas
Encerramento: 19.20 horas

Dia: 7 de Fevereiro de 2006
Ordem de trabalhos: audição do Sr. Dr. Luís Pais Antunes
Início: 10.00 horas
Encerramento: 12.00 horas

Dia: 8 de Fevereiro de 2006
Ordem de trabalhos: audição do Sr. Eng.º Consiglieri Pedroso (10.00 horas) e do Sr. Dr. Jorge Dias
Início: 10.00 horas
Encerramento: 19.40 horas

Dia: 9 de Fevereiro de 2006
Ordem de trabalhos: audição do Sr. Dr. Aragão Botelho
Aprovação das actas das reuniões da Comissão já distribuídas, votação dos requerimentos já apresentados à Comissão e marcação de nova reunião e respectivo âmbito
Início: 10.00 horas
Encerramento: 13.15 horas

Dia: 14 de Fevereiro de 2006
Ordem de trabalhos: aprovação das actas das reuniões da Comissão já distribuídas, votação dos requerimentos já apresentados à Comissão e marcação de nova reunião e respectivo âmbito
Início: 19.00 horas
Encerramento: 20.30 horas

Dia: 16 de Fevereiro de 2006
Ordem de trabalhos: discussão sobre as propostas de quesitos apresentadas pelos diferentes grupos parlamentares
Início: 19.00 horas
Encerramento: 20.16 horas

Dia: 17 de Fevereiro de 2006
Ordem de trabalhos: continuação da discussão sobre as propostas de quesitos apresentadas pelos diferentes grupos parlamentares
Início: 10.35 horas
Encerramento: 13.25 horas

Prestaram juramento quanto à confidencialidade e segredo de justiça relativo a todos os actos do processo de inquérito a que a Comissão procedeu os funcionários da Assembleia da República que colaboraram no apoio à Comissão: a Chefe de Divisão de Apoio às Comissões Alexandra Fonseca Pereira da Graça, a Técnica Superior Principal Jurista Maria Filomena Aveiro Alves, o Técnico Parlamentar Principal António Carlos Silva Pereira, a Assistente Administrativa Principal Isabel Maria da Silva Cascalheira Cabrita, a Assessora Principal Isabel Maria Dominguez Barral, os Técnicos Superiores Principais Isabel Maria Martins de Campos, Vera Maria Carvalho de Andrade, José Mendes Marques, Maria Emília Madeira Mendes Ribeiro, Margarida Sofia Romão Ascensão, Maria Cecília Barata, Maria Manuela da Costa, João Nuno de Melo Amaral, Maria Jorge de Carvalho, Maria Teresa Carvalho, Maria Fernanda Lopes Pereira e Sónia Cristina Godinho Milhano, os Técnicos Superiores de Primeira Classe Elisabete da Cruz Silva, Maria do Rosário Tavares, Maria Teresa Coelho e Maria Emília Azevedo Machado, a Adjunta Parlamentar Especialista Maria Carla Gomes Rodrigues, o Adjunto Parlamentar de Primeira Classe Miguel António de Campos Caria, o Secretário Parlamentar Especialista Idalécio José dos Santos Martins e os Auxiliares Parlamentares Ricardo Manuel

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Oliveira Gonçalves, Maria dos Prazeres Guerreiro de Brito Correia, Maria João de Jesus Alves da Costa e Paula Cristina Garcia dos Santos.
Em 21 de Dezembro de 2005 o Sr. Procurador Geral da República informou o Sr. Presidente da Assembleia da República que não se encontrava pendente qualquer processo de natureza criminal relacionado com o inquérito parlamentar em curso, existindo, apenas, uma averiguação preventiva nos termos do n.º 1 do artigo 1.º da Lei n.º 36/94, de 29 de Setembro. Por despacho do Sr. Presidente da Assembleia da República de 29 de Dezembro de 2005, esta informação foi transmitida à Comissão.
Na prossecução dos seus trabalhos, a Comissão realizou reuniões nas quais foram ouvidos os seguintes depoentes:

- Dr. Bernardo de Arrochela Alegria, ex-administrador da empresa Eurominas, Electro Metalurgia, SA - 12 de Janeiro de 2006;
- Dr. José Alberto Rebelo dos Reis Lamego, ex-Secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros e da Cooperação - 17 de Janeiro de 2006;
- Dr. António Manuel de Carvalho Ferreira Vitorino, ex-Ministro da Presidência do Conselho de Ministros - 17 de Janeiro de 2006;
- Dr. Vitalino José Ferreira Prova Canas, ex-Secretário de Estado da Presidência do Conselho de Ministros - 17 e 19 de Janeiro de 2006;
- Eng.º João Cardona Gomes Cravinho, ex-Ministro do Equipamento, Planeamento e Administração do Território -18 e 19 de Janeiro de 2006;
- Sr. Narciso Miranda, ex-Secretário de Estado da Administração Marítima e Portuária - 25 de Janeiro de 2006;
- Dr. José Junqueiro, ex-Secretário de Estado da Administração Marítima e Portuária - 25 de Janeiro de 2006;
- Juiz Conselheiro Luciano Patrão, presidente do grupo de trabalho criado no âmbito do protocolo assinado entre o Estado e a empresa Eurominas - 25 de Janeiro de 2006;
- Comandante Eduardo Azevedo Soares, ex-Ministro do Mar - 26 de Janeiro de 2006;
- Eng.º António Duarte Silva, ex-Ministro do Mar - 26 de Janeiro de 2006.
- Dr. Luís Pais Antunes, ex-Director-Geral da Direcção-Geral de Concorrência e Preços - 7 de Fevereiro de 2006;
- Eng.º José Manuel Costa Monteiro Consiglieri Pedroso, ex- Secretário de Estado Adjunto do Ministro do Equipamento, Planeamento e Administração do Território - 8 de Fevereiro de 2006;
- Dr. Jorge Dias, ex-Chefe de Gabinete do Ministro da Presidência - 8 de Fevereiro de 2006;
- Dr. Aragão Botelho, vogal do Conselho de Administração da Administração dos Portos de Setúbal e Sesimbra - 9 de Fevereiro de 2006.

Foram ainda apresentados atempadamente pelo PCP, PSD, CDS-PP e BE vários requerimentos para que também prestassem depoimentos entidades que pela sua ligação e actividade iriam certamente contribuir positivamente para o esclarecimento dos factos a apurar, designadamente: Eng.º António Guterres (pelo PCP); Eng.º Gerard Gamet (Eurominas) pelo PS, PSD e PCP; Dr. Fernando Teixeira dos Santos (pelo PSD, PCP, CDS-PP e BE); Dr. Fernando Pacheco (pelo PSD, PCP, CDS-PP e BE); Dr. João Tiago Silveira (pelo PCP, PSD e CDS-PP); Dr. Rui Barreira (pelo PSD e CDS-PP); Dr. Pedro Homem Souza (pelo PCP, PSD, CDS-PP e BE); Administradores da EDP/CPE (ao tempo do conflito com a Eurominas) pelo PCP; Dr. Paulo Tavares (pelo PSD, CDS-PP, PCP e BE); Juiz Conselheiro Messias Bento (pelo PCP); Dr. Miguel Serpa Soares (pelo PCP e PSD); Dr. Saldanha Bentes (pelo PCP); Dr. Alfredo Neves (pelo PCP, PSD, CDS-PP e BE); Dr. Jorge Coelho (pelo BE); Dr. Oliveira Martins (pelo BE); Eng.º Gonçalo Monteiro (pelo CDS-PP, BE e PSD); Presidente do Conselho e Administração da ANESUL (pelo BE); Dr.ª Maria Fernanda Simões, Dr.ª Maria do Carmo Viegas, Dr. Duarte Lince Faria, Dr. João Nunes de Almeida, e Dr. Miguel Ataíde (pelo PSD); Dr.ª Beatriz Martins (pelo PSD e CDS-PP); Dr. Rui Nelson (pelo CDS-PP).
Os Deputados do PS, em maioria na Comissão, assumiram uma postura de obstrução às propostas apresentadas inviabilizando as audições requeridas.
A Comissão, no âmbito do processo de inquérito, solicitou cópias de elementos procedimentais e processuais a diversas entidades, a saber:

Ao Governo, através do Ministro dos Assuntos Parlamentares:

- Relativos às diligências, designadamente pareceres externos e internos, ao processo administrativo e legislativo que levou à determinação da reversão, operada pelo Decreto n.º 14/95, de 22 de Maio, para o domínio público marítimo, dos terrenos dos estuário do rio Sado desafectados pelo Decreto n.º 337/73, de 5 de Julho (ofício da Comissão n.º 03/CEI/Eurominas);
- Relativos às comunicações, actas de reuniões e documentos oficiais existentes na Presidência de Ministros, MEPAT (Ministério do Equipamento, Planeamento e Administração do Território), expediente na Secretaria de Estado dos Assuntos Portuários, na Administração do Porto de Setúbal e Sesimbra (APSS) e EDP, relativos ao processo que levou à concessão da indemnização à empresa Eurominas, bem como aos trabalhos do Grupo de Peritos que se reuniu em 1999 (ofício da Comissão n.º 03/CEI/Eurominas);

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- Relativos aos processos judiciais entre a empresa Eurominas e o Estado (ofício da Comissão n.º 03/CEI/Eurominas);
- Relativos aos processos judiciais entre as empresas Eurominas e EDP - Electricidade de Portugal (ofício da Comissão n.º 03/CEI/Eurominas);
- Relativos ao grupo técnico (ou de trabalho), criado pelo Governo para a fixação do valor da indemnização à empresa Eurominas (ofício da Comissão n.º 03/CEI/Eurominas);
- Documentação existente na Direcção-Geral do Tesouro, relativamente ao "Processo Eurominas" (ofício da Comissão n.º 11/CEI/Eurominas);
- Documentação referente à intervenção do Sr. Ministro da Presidência, Senhor Dr. António Vitorino, nomeadamente actas das reuniões e de todo o processo judicial entre o Estado e a empresa Eurominas (ofício da Comissão n.º 11/CEI/Eurominas);
- Actas do grupo de trabalho constituído no âmbito do "Processo Eurominas" (ofício da Comissão n.º 11/CEI/Eurominas);
- Informação n.º 37/96, do Ministério do Equipamento, Planeamento e Administração do Território, dirigido ao Secretário de Estado Adjunto do Ministério do Equipamento, Planeamento e Administração do Território (ofício da Comissão n.º 13/CEI/Eurominas);
- Eventual despacho proferido pelo Ministro do Mar, ao abrigo do artigo 36.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 298/93, de 28 de Agosto, na redacção que lhe foi conferida pelo Decreto-Lei n.º 324/94, de 30 de Dezembro, relativamente à SAPEC, bem como as condições em que foi dada à SAPEC a concessão de serviço público referida na comunicação da SETEFRETE (ofício da Comissão n.º 13/CEI/Eurominas);
- Informação sobre a identificação dos elementos, à data, do Gabinete da Presidência do Conselho de Ministros - à excepção do Ministro e do Secretário de Estado - e se foi o Sr. Chefe de Gabinete que recebeu o documento ou se foi algum dos assessores, relativo a uma audiência concedida, em Novembro de 1995, à empresa Eurominas (ofício da Comissão n.º 15/CEI/Eurominas).

Ao Presidente do Conselho de Administração da EURODEL, Indústrias Metalúrgicas e Participações, SA

- Toda a documentação relevante sobre o "Processo Eurominas", no âmbito do processo de inquérito parlamentar em curso (ofício da Comissão n.º 05/CEI/Eurominas);
- Toda a documentação relativa ao litígio entre a empresa Eurominas e a EDP (ofício da Comissão n.º 09/CEI/Eurominas);
- Petição apresentada ao Parlamento Europeu pela empresa Eurominas (ofício da Comissão n.º 09/CEI/Eurominas).

Ao Presidente do Conselho de Administração da EDP - Electricidade de Portugal

- Toda a documentação relevante que o Conselho de Administração da EDP tenha em sua posse e que seja objecto do inquérito parlamentar em curso (ofício da Comissão n.º 06/CEI/Eurominas);
- Toda a documentação relativa ao litígio entre a EDP - Electricidade de Portugal e a empresa Eurominas (ofício da Comissão n.º 10/CEI/Eurominas).

Ao Sr. Deputado José Alberto Rebelo dos Reis Lamego:

- Cópia de toda a documentação que tivesse em sua posse, relativa ao "Processo Eurominas" (ofício da Comissão n.º 12/CEI/Eurominas).

A Comissão solicitou, ainda, ao Sr. Presidente da Assembleia da República:

- A publicação da composição da Mesa da Comissão no Diário da Assembleia da República (ofíio da Comissão n.º 02/CEI/Eurominas);
- A publicação do regulamento da Comissão no Diário da Assembleia da República (ofício da Comissão n.º 07/CEI/Eurominas);
- Elaboração pelos serviços de um dossier com cópias de todos os artigos publicados nos órgãos de comunicação social (imprensa escrita), que fossem objecto do âmbito da Comissão (ofício da Comissão n.º 04/CEI/Eurominas);
- A elaboração pelos serviços de um dossier contendo toda a legislação referente à empresa Eurominas, desde a sua criação (1973) até à data (ofício da Comissão n.º 04/CEI/Eurominas);
- As diligências junto do Parlamento Europeu para que fosse enviada à Comissão cópia da petição apresentada pela empresa Eurominas a esta instituição comunitária (ofício da Comissão n.º 08/CEI/Eurominas).

Na sequência dos pedidos formulados, a Comissão recebeu a seguinte documentação:

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Do Governo, através do Ministro dos Assuntos Parlamentares:

- Nove dossiers com documentação relativa aos procedimentos processuais existentes no Ministério das Obras Públicas, Transportes e Comunicações (resposta ao ofício da Comissão n.º 03/CEI/Eurominas);.
- Oito dossiers com documentação relativa aos procedimentos processuais existentes na Presidência do Conselho de Ministros (resposta ao ofício da Comissão n.º 03/CEI/Eurominas);
- Dois conjuntos de elementos enviados pelo Ministério da Economia e da Inovação em complemento à documentação atrás referenciada (resposta ao ofício da Comissão n.º 03/CEI/Eurominas);
- Um conjunto de elementos enviados pelo Gabinete do Ministro de Estado e das Finanças (resposta ao ofício da Comissão n.º 11/CEI/Eurominas);
- Descrição técnica efectuada pelos serviços de tratamento arquivístico da Secretaria Geral da Presidência de Conselho de Ministros relativamente às unidades de instalação correspondentes ao processo Eurominas existente no arquivo dos Gabinetes do Ministro da Presidência António Vitorino e do Secretário de Estado Vitalino Canas a guarda desta Secretaria Geral (resposta ao ofício da Comissão n.º 11/CEI/Eurominas);
- Um dossier, composto por três conjuntos de documentação, remetido pelo Gabinete do Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações (resposta ao ofício da Comissão n.º 13/CEI/Eurominas).

Do Presidente do Conselho de Administração da EURODEL - Indústrias Metalúrgicas e Participações, SA:

- Um dossier (resposta ao ofício da Comissão n.º 05/CEI/Eurominas) com os seguintes documentos: brochura de apresentação da fábrica da Mitrena, cópia da escritura pública de compra e venda, petição do pedido de indemnização apresentada em 10 de Abril de 1997, carta da Samancor ao Primeiro-Ministro, em 26 de Junho de 1996, resposta do Gabinete do Primeiro-Ministro à Samancor, em 5 de Julho de 1996, acordo de transacção com a EDP assinado em 27 de Setembro de 1996, proposta apresentada pelo Ministro do Equipamento, entregue em 5 de Dezembro de 1996, despacho do Ministro do Equipamento de 27 de Janeiro de 1997, concordando com a proposta da Eurominas, exposição entregue pela Eurominas ao Primeiro-Ministro em 26 de Setembro de 1997, resposta do Gabinete do Primeiro-Ministro à empresa em Outubro de 1997, exposição entregue pela Eurominas ao Primeiro-Ministro em 29 de Dezembro de 1997, proposta de protocolo apresentada à empresa pelo Governo, em 3 de Março de 1998, resposta da empresa à proposta de 3 de Março, posição do Governo (com conhecimento às várias Secretarias de Estado envolvidas) à resposta da Eurominas de 3 de Março, apenas admitindo a solução indemnizatória, protocolo de 8 de Abril de 1998, indicação pelo Governo do nome do antigo Presidente do Supremo Tribunal Administrativo para presidir ao grupo de trabalho, comunicação do Governo, confirmando o acordo de 5 de Julho e enviando cópia da proposta de acordo do Juiz Conselheiro, protocolo/acordo de 31 de Maio de 2001, carta da Companhia Portuguesa de Electricidade (CPE), de 4 de Dezembro de 1972, que esteve na origem do investimento, contrato de fornecimento energético entre a Eurominas e a CPE assinado em 27 de Junho de 1973, estudo da Arthur Andersen sobre a importância do impacto do custo energético na industria de ligas de manganês, parecer do Prof. Doutor Antunes Varela, sobre a validade das garantias contratuais de fornecimento de energia eléctrica, parecer do Prof. Doutor Marcelo Rebelo de Sousa, sobre a inconstitucionalidade da reversão dos activos da Mitrena, parecer do Prof. Doutor Diogo Freitas do Amaral e do Prof. Doutor João Caupers, sobre a reversão como inconstitucional e violadora da boa-fé, parecer do Prof. Doutor Menezes Cordeiro, sobre os direitos da empresa sobre os seus activos da Mitrena, petição, nos termos do artigo 138.º-D do Tratado de Roma, apresentada ao Parlamento Europeu pela Empresa Eurominas (resposta ao ofício da Comissão n.º 09/CEI/Eurominas).

Do Presidente do Conselho de Administração da EDP - Electricidade de Portugal:

- Acordo celebrado entre a EDP - Electricidade de Portugal e a empresa Eurominas e documentação relativa à extinção dos litígios recíprocos (resposta ao ofício da Comissão n.º 06/CEI/Eurominas);
- Acervo dos diferentes processos administrativos e judiciais: Geral, Cível, Tribunal de Setúbal e Relação de Évora, Administrativo, Arbitral e Acordo de Transacção (resposta ao ofício da Comissão n.º 10/CEI/Eurominas).

Do Sr. Deputado José Alberto Rebelo dos Reis Lamego:

- Informação de que não tinha em sua posse qualquer documentação relativa ao processo, para além dos pareceres jurisconsultos que a Comissão também tem em seu poder (resposta ao ofício da Comissão n.º 12/CEI/Eurominas).

No decurso da audição, realizada no dia 19 de Janeiro de 2006, o Sr. Eng.º João Cardona Gomes Cravinho entregou a seguinte documentação à Comissão:

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- Um conjunto de documentos sobre o decreto regulamentar que procede à reversão para o domínio público marítimo dos terrenos desafectados pelo Decreto n.º 337/73, de 5 de Julho, nomeadamente notas nele manuscritas; notas manuscritas da reunião de Secretários de Estado de 27 de Março de 1995; nota manuscrita do Gabinete do Secretário da Presidência do Conselho de Ministros; Informação do Centro Jurídico da Presidência do Conselho de Ministros relativa ao processo de recurso n.º 37933 acompanhando o respectivo projecto de resposta a ser assinado pelo Sr. Primeiro-Ministro e a ser entregue no Supremo Tribunal Administrativo.
Considerando o conjunto dos depoimentos e a documentação entregue em sede Comissão, após análise da proposta de quesitos apresentada pelos Deputados do PS, e atendendo a que esta não estava estruturada de forma a facilitar uma visão global e cronológica de todas as questões levantadas no processo da Eurominas, os Deputados do PCP decidiram apresentar a sua própria proposta de quesitos, a qual, estruturada em cinco capítulos correspondendo às questões fundamentais do processo, mereceu a concordância geral, sendo votada por unanimidade pela Comissão.
Foram também apresentadas propostas de quesitos pelos Deputados do PSD, do CDS-PP e do BE, as quais contaram com os votos a favor do PSD, PCP, CDS-PP e BE e o voto contra do PS no primeiro caso e a abstenção nos dois seguintes.
Os quesitos finais aprovados pela Comissão, apesar de terem por base a proposta apresentada pelos Deputados do PCP, introduziram no entanto alterações na formulação de alguns, incluindo, de forma avulsa, novos quesitos oriundos de outras propostas e deram uma ordenação final que não facilita a leitura e compreensão de um processo de tamanha complexidade.
Entendendo que a ordenação proposta pelos Deputados do PCP valoriza o entendimento de todo o processo reiteramo-la no presente relatório, sem, contudo, deixar de procurar responder ao conjunto de quesitos aprovados pela Comissão e cujas respostas constituem o seu relatório, sendo a correspondência a seguinte:

Quesitos aprovados por Quesitos inseridos no Relatório
unanimidade pela Comissão apresentado pelo Deputado J.Strecht R.

1……………………………………………. 1
2 ……………………………………………. 2
3…………………………………………….. 2, 6
4……………………………………………. 2, 6, 10, 11
5……………………………………………. 9
6…………………………………………….. 3
7…………………………………………….. alínea f)
8…………………………………………….. 4, 22
9…………………………………………….. 5
10 …………………………………………… 7, 8, 9, 10, 11, 12, 13
11……………………………………………. 14, 15
12……………………………………………. 16
13……………………………………………. 26
14……………………………………………. 17
15……………………………………………. 18
16……………………………………………. 19
17……………………………………………. 20
18……………………………………………. 21
19……………………………………………. 23, 24, 25
20…………………………… ……………… 22, 26

O presente "Relatório alternativo" encontra justificação no facto de o relatório final e respectivas conclusões, apresentado à Comissão pelo relator, não traduzir nem esclarecer de forma clara e cabal aspectos considerados essenciais do processo, que estiveram presentes no decurso dos trabalhos da Comissão e que encontram sustentação na documentação e depoimentos prestados perante esta e ainda o facto de não sublinhar aspectos relevantes e contradições existentes nos diferentes depoimentos prestados perante a Comissão, como adiante se poderá constatar.
Assim:

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B - Quesitos

I
Justeza e legalidade da reversão para o domínio público marítimo dos terrenos do estuário do rio Sado desafectados pelo Decreto n.º 337/73, de 5 de Julho, determinada pelo Decreto n.º 14/95, de 22 de Maio

1 - A desafectação do domínio público marítimo e venda dos 90 hectares pelo Estado garantiu à Eurominas a propriedade plena dos mesmos, ou foi uma venda condicionada de carácter resolúvel, a favor do Estado, do terreno e respectivas benfeitorias em caso de incumprimento pela Eurominas dos compromissos assumidos para a sua desafectação?
2 - Em que condições é realizada a venda dos 90 hectares à Eurominas?
3 - A empresa Eurominas estava a cumprir ou alguma vez cumpriu as premissas avançadas inicialmente (entre 1972 e 1974), designadamente a criação de 320 postos de trabalho; a movimentação de 400 000 toneladas de matérias-primas e produtos acabados, numa primeira fase, e a respectiva duplicação num prazo de três a quatro anos; e a ocupação de todo o território afectado?
4 - Quando deixaram de ser cumpridas as condições acordadas entre o Estado e a Eurominas que conduziram à publicação do Decreto n.º 14/95, de 22 de Maio, por parte do XII Governo Constitucional?
5 - A reversão do terreno e benfeitorias implicava ou não um direito à indemnização?

II
Conflito entre a CPE/EDP e a Eurominas

6 - Constituindo a rotura contratual da CPE/EDP com a Eurominas o elemento que objectivamente conduziu às condições de não cumprimento por parte da Eurominas dos compromissos que levaram à desafectação, importa clarificar:

a) Quais foram as condições, cláusulas e duração do contrato de fornecimento de energia estabelecido entre a CPE/EDP e a Eurominas em 27 de Junho de 1973?
b) Foi ou não legal a denúncia do referido contrato por parte da CPE/EDP no início de 1983?
c) Quais as razões que conduziram ao corte de fornecimento de energia eléctrica por parte da CPE/EDP à Eurominas em 8 de Agosto de 1986? O corte de fornecimento de energia efectuou-se imediatamente a seguir à rotura do contrato?
d) Houve ou não tratamento discriminatório da Eurominas por parte da CPE/EDP relativamente a outras empresas?
e) Houve conhecimento ou intenção da tutela de promover a rotura contratual com vista ao confisco dos bens da Eurominas?
f) Podia a Eurominas optar por outra solução que o não pagamento da energia à EDP?

7 - A CPE/EDP poderia ter agido de forma diferente e continuado a fornecer energia pelos valores pretendidos pela Eurominas ou estava impossibilitada de o fazer?
8 - Que razões levaram a CPE/EDP a acordar o pagamento de uma verba correspondente a 400 000 contos à Eurominas?
9 - Esteve ou não esse acordo associado à vontade de privatização da EDP? Quem determinou este processo por parte do Estado português e em que momento foi determinado?

III
Da reversão à indemnização

10 - Foi ou não justo e legal o Decreto n.º 14/95, de 22 de Maio? Havia da parte da Eurominas esforços para retomar o objecto da desafectação ou, pelo contrário, esta empresa vinha desenvolvendo actividades não contempladas no objecto e a procurar alterá-lo?
11 - Considerando que até Dezembro de 1995 o Governo português manteve inalterada a sua posição relativamente à justeza da reversão, porque razão e em que momento se verificou uma mudança de orientação em relação ao Decreto n.º 14/95, de 22 de Maio?
12 - Em que momento foram decididos a elaboração e o conteúdo do protocolo que veio a ser assinado posteriormente, em 8 de Abril de 1998, entre o Estado (representado pelos Secretário de Estado da Presidência do Conselho de Ministros, Dr. Vitalino José Ferreira Prova Canas, Secretário de Estado do Tesouro e das Finanças, Professor Doutor Fernando Teixeira dos Santos, Secretário de Estado Adjunto do Ministro do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território, Eng.º José Manuel da Costa Monteiro Consiglieri Pedroso, e Secretário de Estado da Indústria e Energia, Professor Doutor Fernando Manuel dos Santos Vigário Pacheco), e a Eurominas representada pelo seu administrador-delegado, Dr. Bernardo Arrochela Alegria?

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IV
Do valor da indemnização à sua legalidade

13 - A atribuição de uma indemnização como solução extrajudicial foi legal considerando que o Decreto n.º 14/95, de 22 de Maio se mantém em vigor até hoje? A solução extrajudicial era a única para a resolução do conflito?
14 - Quais as rubricas acordadas no protocolo assinado entre o Estado e a Eurominas, em 8 de Abril de 1998, para efeitos de pagamento de indemnização admitida pelo mesmo?
15 - O grupo de trabalho presidido pelo Sr. Juiz Conselheiro Dr. Luciano Patrão limitou-se a avaliar as rubricas contempladas no protocolo ou alargou o seu âmbito?
16 - Que razões inviabilizaram o acordo quanto aos montantes a considerar como indemnização a atribuir à Eurominas?
17 - Que razões levaram o Governo a retomar as negociações com a Eurominas considerando as discordâncias entre as partes (Estado e Eurominas) e que, de resto, levaram à dissolução do grupo de trabalho?
18 - Que consideração mereceram por parte do Governo as declarações, os pareceres e as informações prestadas pelos representantes do Estado no grupo de trabalho envolvidos nas negociações com a Eurominas?
19 - Que instrumentos legais foram aprovados no sentido da anulação da reversão decretada pelo Decreto n.º 14/95, de 22 de Maio, e que base legal sustenta o pagamento efectivo das indemnizações atribuídas à Eurominas?

V
Ganhos e prejuízos para o Estado no processo Eurominas

20 - Que ganho obteve o Estado da conclusão deste processo por via extrajudicial que não obtivesse por via judicial?

C - Matéria de facto e de direito

I
Justeza e legalidade da reversão para o domínio público marítimo dos terrenos do estuário do rio Sado desafectados pelo Decreto n.º 337/73, de 5 de Julho, determinada pelo Decreto n.º 14/95, de 22 de Maio

1 - A desafectação do domínio público marítimo e venda dos 90 hectares pelo Estado garantiu à Eurominas a propriedade plena dos mesmos, ou foi uma venda condicionada de carácter resolúvel, a favor do Estado, do terreno e respectivas benfeitorias em caso de incumprimento pela Eurominas dos compromissos assumidos para a sua desafectação?
A desafectação do domínio público marítimo de cerca de 90 hectares e a sua venda pelo Estado à Eurominas foi uma venda condicionada de carácter resolúvel a favor do Estado que não garantiu à Eurominas a propriedade plena dos mesmos. Conforme consta da escritura de compra e venda e do registo predial subsequente, em caso de incumprimento por parte da Eurominas do objecto que levou à desafectação o terreno e todas as benfeitorias nele construídas revertiam para o Estado sem direito a qualquer indemnização. A perda em favor do Estado do terreno e benfeitorias constituía uma forma de salvaguardar o interesse público, funcionando como uma sanção em caso de incumprimento das premissas subjacentes à sua desafectação e às condições especiais de que beneficiou a Eurominas na sua aquisição.
Sublinhe-se, desde logo, a diferença entre reversão com perda de benfeitorias sem direito a indemnização, ainda hoje consagrada como regime sancionatório em caso de incumprimento, por parte das entidades concessionárias, de deveres constantes nos contractos de concessão, e requisição ou expropriação por utilidade pública, que, de acordo com a Constituição da República Portuguesa, obriga ao pagamento de uma indemnização.
Este sublinhado é tanto mais relevante quanto ao longo de todo o processo se procurou confundir os conceitos e fazer crer que a reversão para o domínio público marítimo do terreno e respectivas benfeitorias, sem direito a indemnização, configuraria um "confisco" ou um "enriquecimento ilícito por parte do Estado", o que é falso, pois a Constituição não permitiria a expropriação sem indemnização - isso, sim, é verdadeiro, mas não se aplica ao caso em análise.
2 - Em que condições é realizada a venda dos 90 hectares à Eurominas?
Os cerca de 90 hectares foram vendidos à Eurominas pelo "preço total de SEIS MILHÕES NOVECENTOS E SEIS MIL E SEISCENTOS ESCUDOS, correspondente a metade do seu valor real" atendendo aos compromissos assumidos pela Eurominas e que, como constam dos requerimentos apresentados ao Governo e da acta da Comissão do Domínio Público Marítimo, datada de 13 de Março de 1973, que declarou a

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desafectação, consistiam no fundamental na construção e laboração contínua de uma unidade industrial de produção de ligas de manganês destinadas à exportação, na criação de 320 postos de trabalho, na movimentação inicial de carga de matérias-primas de cerca de 300 a 400 000 toneladas, as quais seriam duplicadas decorridos três a quatro anos depois, o que iria representar para o "(...) porto de Setúbal a movimentação de mais de 700 000 a 800 000 toneladas por ano". O investimento inicial previsto era de cerca de 250 a 300 000 contos e a Eurominas assumia a responsabilidade de indemnizar os proprietários de concessões de estabelecimentos ostreícolas ou congéneres.
3 - A empresa Eurominas estava a cumprir ou alguma vez cumpriu as premissas avançadas inicialmente (entre 1972 e 1974), designadamente a criação de 320 postos de trabalho; a movimentação de 400 000 toneladas de matérias-primas e produtos acabados, numa primeira fase, e a respectiva duplicação num prazo de três a quatro anos; e a ocupação de todo o território afectado?
A Eurominas nunca cumpriu plenamente os compromissos assumidos com o Governo português. Os volumes de carga movimentados no porto de Setúbal atingiram, segundo informação da APSS de 5 de Junho de 1997, dirigida ao Chefe de Gabinete do Secretário de Estado do MEAPAT, "(...) a movimentação máxima de 338.330,7 toneladas/ano em 1978 (o valor indicado abrange importação e exportação), menos de metade dos assumidos; os postos de trabalho criados nunca ultrapassaram os 175 e eram, segundo a própria Eurominas na sua exposição de 5 de Dezembro de 1996, de 150 em 1986 quando se verificou o encerramento" e "Da área abrangida e vendida à Eurominas (873 325 m2) apenas foi aterrada uma área de 249 000 m2 (cerca de 28%) e desta apenas uma parte (11%) foi ocupada com instalações industriais". (APSS em 5 de Junho de 1997).
Esta situação demonstra que "Muito antes do litígio com a EDP que terá conduzido à cessação da laboração, já a Eurominas apresentava um grau de cumprimento dos objectivos por ela livremente assumidos muito abaixo do garantido às entidades públicas autorizantes. Tal violação não pode deixar de configurar um desrespeito evidente pelas condições que determinaram a desafectação e possibilitava por si só a reversão. Se a administração a ela não recorreu anteriormente não foi decerto por falta de fundamento. Também aqui é pois detectável responsabilidade subjectiva da Eurominas (...)", como muito bem expressa o Professor Sérvulo Correia no seu parecer de 12 de Agosto de 1996.
A invocação pelo relator no seu relatório das declarações feitas pelo Dr. Bernardo Alegria sobre o "(...) 25 de Abril (…)" e de "(...) todas as incertezas que surgiram, nos primeiros anos (…)" para justificar como "(...) perfeitamente normal que os investidores fossem cautelosos (…)" e assim tentar justificar o incumprimento por parte da Eurominas dos seus compromissos não é de todo aceitável pois em momento algum o Estado português ou a CPE/EDP deixaram de honrar os compromissos assumidos para com a Eurominas ou tomaram decisões que pusessem em causa os seus interesses.
4 - Quando deixaram de ser cumpridas as condições acordadas entre o Estado e a Eurominas que conduziram à publicação do Decreto n.º 14/95, de 22 de Maio, por parte do XII Governo Constitucional?

Em rigor os compromissos assumidos pela Eurominas para com o Estado português, e que justificaram a desafectação dos cerca de 90 hectares do domínio público, nunca foram plenamente cumpridos, como já se demonstrou, pois não se criaram os 320 postos de trabalho, não se intensificou o tráfego marítimo e portuário entre Setúbal e Figueira da Foz como se previa, nem se atingiu a movimentação das 700 a 800 000 toneladas constantes nos requerimentos da Eurominas. Com o encerramento da unidade de produção de ligas de manganês em Agosto de 1986, o principal dos compromissos assumidos pela Eurominas e o despedimento colectivo de 143 dos 150 trabalhadores ao seu serviço a Eurominas colocou-se em definitivo na situação de total incumprimento das condições fundamentais acordadas com o Estado português e logo sujeita à sanção prevista no contrato de compra e venda de reversão dos terrenos e benfeitorias para o domínio público sem direito a indemnização. A tese de que com a construção das instalações a Eurominas teria cumprido o acordado com o Estado não tem acolhimento pois como consta dos requerimentos da Eurominas dirigidos ao Governo e que servem de fundamento à desafectação os terrenos destinam-se à instalação e laboração de uma unidade de produção de ligas de manganês destinadas à exportação. Produção e exportação que deveriam, no momento do encerramento em 1986, estar a garantir um movimento no porto de Setúbal de 700 a 800 000 toneladas e a garantir emprego a 320 trabalhadores. Mesmo admitindo como boa a tese de que a actividade complementar de sinterização de finos de minério de manganês justificaria o objecto da desafectação a verdade é que esta actividade terminou em 1991, data a partir da qual, já sem qualquer tipo de subterfúgio, estariam plenamente preenchidas as condições para a reversão dos terrenos e benfeitorias para o domínio público, o que deveria ter sido feito imperativamente, não se compreendendo porque razão só em Maio de 1995 a mesma tenha sido decretada pelo Governo. O parecer do Professor Sérvulo Correia já referido é peremptório sobre a matéria.
5 - A reversão do terreno e benfeitorias implicava ou não um direito à indemnização?
De acordo com o contrato de compra e venda, e como consta no registo predial, o incumprimento do mesmo por parte da Eurominas implicava "(...) a perda a favor do Estado de todas as obras e benfeitorias realizadas nos terrenos, sem direito a qualquer indemnização, nem à restituição do preço pago (…)". Como anteriormente se referiu convém ter presente que reversão não é sinónimo de requisição ou expropriação por utilidade pública figura a que tentou recorrer a Eurominas para, por essa via, reclamar uma indemnização de

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acordo com os preceitos constitucionais. A reversão do terreno e benfeitorias a favor do estado sem direito a indemnização é consagrada como uma sanção por forma a salvaguardar o interesse público em caso de incumprimento por parte da Eurominas do objecto que justificou a desafectação do domínio público marítimo.

II
Conflito entre a CPE/EDP e a Eurominas

6 - Constituindo a rotura contratual da CPE/EDP com a Eurominas o elemento que objectivamente conduziu às condições de não cumprimento por parte da Eurominas dos compromissos que levaram à desafectação, importa clarificar:

a) Quais foram as condições, cláusulas e duração do contrato de fornecimento de energia estabelecido entre a CPE/EDP e a Eurominas em 27 de Junho de 1973?
A CPE/EDP e a Eurominas, após prolongadas negociações, assinaram em 27 de Junho de 1973, de livre e espontânea vontade, um contrato de fornecimento de energia eléctrica com a Eurominas por um período de 10 anos, o qual se consideraria "(...) renovado por períodos sucessivos de cinco anos, salvo se qualquer das partes o denunciar, por carta registada com aviso de recepção, pelo menos seis meses antes do termo do período então a decorrer".
A Eurominas e os defensores da solução extrajudicial invocaram sistematicamente, como um compromisso de eterno fornecimento de energia nas condições constantes no contrato firmado em 27 de Junho de 1973, uma carta anterior à assinatura deste, datada de 4 de Dezembro de 1972 onde o então presidente do conselho de gerência da CPE, afirma que "1) O facto de se consignar no contrato um primeiro período de validade de 10 anos não significa, da parte da CPE, qualquer intenção de, ulteriormente, fazer cessar o fornecimento da energia eléctrica ou de alterar as bases essenciais do contrato, o qual se prevê, de bona fide, sucessivamente prorrogável enquanto durar a vossa laboração fabril, obviamente com a adequada revisão tarifária".
Ora, nem a carta em questão pode prevalecer sobre o contrato, que é assinado à posteriori e que não consagra a perpetuidade do mesmo, antes estatui a sua duração em 10 anos e o direito à sua denúncia com seis meses de antecedência, como dela não se pode inferir que as condições de fornecimento são imutáveis, sobretudo no que ao preço das tarifas a praticar se refere, pois é bem explicita a intenção de manter o fornecimento da energia mas "(...) obviamente com a adequada revisão tarifária", situação que a Eurominas e os defensores da solução extrajudicial compreensivelmente procuram ignorar e fazer esquecer.
b) Foi ou não legal a denúncia do referido contrato por parte da CPE/EDP no início de 1983?
A EDP cumpriu integralmente o contrato assinado fornecendo energia à Eurominas nas condições acordadas durante os 10 anos contratualizados, apesar das profundas alterações verificadas nos custos de produção da energia serem cada vez mais penalizadores e insustentáveis para a EDP.
No respeito pelo contrato assinado a EDP, assumindo a impossibilidade de continuar a praticar as tarifas contratualizadas, denunciou o contrato assinado com a Eurominas pela primeira vez em 1 de Março de 1982, não em 1983 como refere o relator no seu relatório, confirmou essa denúncia em 4 de Março de 1982 e tornou firme essa denúncia em 28 de Junho de 1982, muito antes do prazo previsto no mesmo, seis meses, por forma a dar tempo, quase dois anos, à negociação de um novo contrato para poder garantir a continuidade do fornecimento de energia "(...) obviamente com a adequada revisão tarifária", como constava do compromisso assumido pela CPE/EDP na sua carta de 4 de Dezembro de 1972.
Aliás, a denúncia do contrato pela EDP não mereceu, por parte da Eurominas, qualquer contestação no sentido de invocar a ilegalidade da mesma. O que a Eurominas invoca é a necessidade da prorrogação do contrato que findava em 31 de Dezembro de 1983, ou a assinatura de um novo contrato que lhe garantisse tarifas de favor próximas das acordadas no anterior contrato, o que a EDP sempre afirmou não estar em condições de assegurar.
Considerar, como fez o relator, que "No que concerne, em concreto, à questão de (i)legalidade da denúncia do contrato de fornecimento de energia eléctrica celebrado entre a CPE/EDP e a Eurominas, não cabe à Comissão de Inquérito (...), pronunciar-se sobre a mesma, até porque, não tendo a sua interpretação qualquer vinculação e ou eficácia jurídica, não se vislumbra do seu mérito" para em seguida invocar pareceres pagos pela Eurominas e declarações do Dr. Bernardo Alegria, Administrador da Eurominas, para fazer crer da ilegalidade da sua denúncia por parte da EDP é de todo inaceitável e revelador da ausência da imparcialidade e da objectividade que se requeriam do relator.
Esta atitude do relator é tanto mais inaceitável quanto é evidente:
1 - Ser a atempada denúncia do contracto pela EDP e a comprovada impossibilidade desta de manter as tarifas de favor que vinha praticando e que está na génese do conflito da EDP com a Eurominas;
2 - Ser o corte de energia, consumado em Agosto de 1986, o resultado do não pagamento por parte da Eurominas dos valores facturados pela EDP, desde 1 de Janeiro de 1984 com base nas tarifas em vigor, condição que a Eurominas havia aceite expressamente em 29 de Dezembro de 1983 mas que depois nunca cumpriu, situação que o relator ignora em absoluto apesar de documentalmente provado;

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3 - Ser o corte de energia a causa principal de todos os diferendos e ser a pretensa mas nunca provada culpa da EDP um dos principais argumentos para a aceitação e justificação da via extrajudicial por parte dos defensores desta opção;
4 - Ser a opção da Eurominas da não assinatura do novo contracto proposto pela EDP, "(...) obviamente com a adequada revisão tarifária", como constava do compromisso assumido pela CPE/EDP na sua carta de 4 de Dezembro de 1972, que levou ao encerramento da empresa, o que evidencia a responsabilidade subjectiva da Eurominas no processo que conduziu à reversão.

c) Quais as razões que conduziram ao corte de fornecimento de energia eléctrica por parte da CPE/EDP à Eurominas em 8 de Agosto de 1986?
O corte de fornecimento de energia efectuou-se imediatamente a seguir à rotura do contrato?
O corte de energia verificou-se na sequência do não pagamento pela Eurominas da totalidade do valor da energia fornecida e facturada regularmente pela EDP de acordo com as tarifas em vigor e expressamente aceites pela Eurominas em 29 de Dezembro de 1983 e na recusa da Eurominas, durante três anos, em assinar o novo contrato proposto pela EDP que já contemplava tarifas de favor, particularmente reduzidas, factos essenciais que, como atrás se referiu, o relator omite no seu relatório. A EDP, ao contrário do que afirma a Eurominas e o relator implicitamente assume, quando afirma que "Em 8 de Agosto de 1986, depois de, por carta de 28 de Julho de 1986 (...), a EDP interrompeu o fornecimento de energia (…)", não procedeu a qualquer corte abrupto do fornecimento de energia, antes mantendo o seu fornecimento no período decorrido entre 1 de Janeiro de 1984 e Agosto de 1986, apesar da Eurominas não estar a cumprir com os pagamentos devidos e manter uma persistente recusa em assinar um novo contrato.
d) Houve ou não tratamento discriminatório da Eurominas por parte da CPE/EDP relativamente a outras empresas?
A EDP aplicou as tarifas decretadas pelo Governo para os clientes do "tipo" da Eurominas não fazendo qualquer discriminação desta face às restantes indústrias similares.
A haver discriminação, a mesma terá sido em favor da Eurominas, a qual, não cumprindo com os pagamentos de energia de acordo com os valores comprovadamente acordados com EDP e recusando a assinatura de um novo contrato, continuou a beneficiar do fornecimento de energia nos anos de 1984, 1985 e 1986.
Não deve haver muitos consumidores, industriais ou domésticos, se é que há algum, que possam invocar tanta compreensão por parte da EDP e durante tanto tempo, três anos, perante o incumprimento do pagamento devido pela energia fornecida e a recusa de assinatura de um novo contrato.
e) Houve conhecimento ou intenção da tutela de promover a rotura contratual com vista ao confisco dos bens da Eurominas?
É uma evidência que não houve qualquer intenção de instrumentalizar a EDP para promover a rotura do contrato e muito menos proceder ao confisco dos bens da Eurominas. Pelo contrário, admitiram-se soluções diversas no sentido de evitar o encerramento da Eurominas, como o demonstram as conversações havidas entre a Eurominas e o Ministério da Economia, então tutelado pelo Ministro Eng.º Veiga Simão, e que constam da documentação em posse da Comissão. Desde o alargamento da actividade da Eurominas em Portugal até à importação de energia de França em condições de favor à Eurominas, várias foram as soluções equacionadas mas que, por distintas razões, não foi possível concretizar nenhuma delas.
O que se pode verificar pela documentação é que não houve rotura contratual, ao contrário do que afirma em diferentes momentos o relator no seu relatório, mas, sim, denúncia atempada e término em 31 de Dezembro de 1983 do contrato existente entre a EDP e a Eurominas, ficando a prevalecer provisoriamente, a partir de 1 de Janeiro de 1984, o acordo firmado entre ambas de fornecimento e facturação de energia pela primeira com base nas tarifas legais em vigor e pagamento pela segunda dos valores facturados nestas condições, com acerto posterior de contas com base no valor que viesse a ser consagrado no novo contrato e que seria aplicado retroactivamente a 1 de Janeiro de 1984. A recusa da Eurominas de assinar um novo contrato deixou-a na situação de dívida à EDP de um valor de 4 486 920 contos referente à energia fornecida, facturada mas nunca paga no período decorrido entre 1 de Janeiro de 1984 e 8 de Agosto de 1986.
f) Podia a Eurominas optar por outra solução que o não pagamento da energia à EDP?
A Eurominas poderia e deveria ter assumido o pagamento da energia pelo valor das tarifas em vigor, como havia acordado com a EDP, e na ausência de um novo contrato no curto prazo recorrer para o tribunal arbitral, e da decisão deste para o tribunal judicial, caso esta não merecesse a sua concordância.
A Eurominas, ao recusar-se a assinar um novo contrato e ao optar pelo não pagamento dos valores facturados de acordo com as tarifas em vigor como havia assumido pagar em 29 de Dezembro de 1983, decidiu optar efectivamente por não manter a laboração da empresa, uma vez que sabia que o não pagamento dos valores em atraso conduziria à suspensão do fornecimento de energia e, consequentemente. ao encerramento da actividade, o que veio a efectivar-se em Agosto de 1986.
Com esta sua opção a Eurominas colocou-se na condição de incumprimento do objecto que conduziu à desafectação dos terrenos e, consequentemente, à imperativa reversão dos mesmos e de todas as benfeitorias para o domínio público marítimo sem direito a qualquer indemnização.

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7 - A CPE/EDP poderia ter agido de forma diferente e continuado a fornecer energia pelos valores pretendidos pela Eurominas ou estava impossibilitada de o fazer?
Terminado em 31 de Dezembro de 1983 o contrato de fornecimento de energia que vinculava a EDP e a Eurominas passou a primeira, com o acordo da segunda, assumido em 29 de Dezembro de 1983, a debitar a energia com o valor das novas tarifas, tendo em conta a alteração legal do sistema tarifário.
A EDP estava impossibilitada de prosseguir o fornecimento de energia pelos valores pretendidos pela Eurominas por força das novas directrizes da Comunidade Europeia (então CEE), dos acordos firmados com o Fundo Monetário Internacional (FMI) e "o acréscimo muito significativo do preço do fuelóleo".
Ao manter o fornecimento da energia durante os anos de 1984, 1985 e 1986 apesar do incumprimento do seu pagamento e da recusa da Eurominas em assinar o novo contrato, a EDP e a tutela deixaram claro o seu empenho em não contribuir para o encerramento da empresa.
8 - Que razões levaram a CPE/EDP a acordar o pagamento de uma verba correspondente a 400 000 contos à Eurominas?
A documentação apresentada à Comissão indica que o pagamento de 400 000 contos à Eurominas por parte da EDP foi feito tendo por base um acordo de transacção do qual consta a aquisição pela EDP de uma subestação localizada nas instalações da Eurominas.
Importa, desde logo, referir que por força do Decreto n.º 14/95, de 22 de Maio, os terrenos e todas as benfeitorias nele construídas revertiam para o Estado sem direito a qualquer indemnização à Eurominas pelo que, a ser dado cumprimento ao mesmo, não haveria lugar a qualquer pagamento.
Os elementos constantes na documentação referida revelam valores muito díspares, porquanto, se no memorando de 27 de Junho de 1996, subscrito pelo Chefe de Gabinete do Ministro da Presidência, Dr. Jorge Dias, se afirma pretender a Eurominas um valor de 1 milhão de contos pela referida subestação e se diz estar a EDP disponível para pagar a quantia de 500 000 contos pela mesma, já em memorando de 21 de Dezembro de 1995, subscrito pelo Director do Gabinete de Apoio Jurídico da EDP, dirigido ao Dr. Saldanha Bento, se afirma que "essas instalações da subestação custaram em 1975 um montante de 25 000 contos, pelo que a Eurominas pretenderia agora um valor actualizado que calcula em cerca de 450 mil contos".
Registe-se a ausência da referida avaliação da subestação por parte da EDP no processo documental entregue à Comissão, mas à qual, na cláusula terceira do acordo firmado em 27 de Setembro de 1996, é atribuído expressamente um valor de apenas "(...) 10 000 contos (…)", correspondendo os restantes 390 000 contos a uma compensação.
Refira-se ainda que este acordo se estabelece imediatamente a seguir à intervenção do Gabinete do Ministro da Presidência no processo, logo após as diligências feitas por este Gabinete junto da EDP e atendendo à existência de "(...) vontade política de resolução do problema (…)".
Com efeito, uma das acções resultantes da reunião realizada em 29 de Novembro de 1995 entre o Gabinete do Ministro da Presidência e a Eurominas foi a de "saber o ponto da situação com a EDP via Secretário Estado da Energia da negociação de indemnização a arbitrar à empresa", conforme consta em "memorando" de 7 de Maio de 1996.
No referido memorando" de 7 de Maio de 1996 pode ler-se ainda: "Decorridos estes cinco meses, o ponto da situação é o seguinte: EDP - através de informação veiculada pela própria empresa, teve lugar uma reunião, em 25 de Março, com o Dr. Saldanha Bento (pelo Conselho de Administração da EDP), tendo ficado a EDP de apresentar uma proposta de resolução do contencioso através da compra das infra-estruturas eléctricas de alta tensão da Eurominas, e de uma proposta de apoio técnico para implantação em Angola. Contactado directamente, hoje, o Dr. Saldanha Bento afirmou que, uma vez que existe vontade politica de resolução do problema, estão disponíveis para chegar a um rápido acordo por dois tipos de razões: a acção que a Eurominas tem contra a EDP é no montante de 15 milhões de contos; a EDP gostaria de participar no desenvolvimento do projecto de Angola. A proposta de acordo da EDP, neste momento, é de desistirem das acções cruzadas, ressarcir a Eurominas num montante da ordem dos 450 000 contos através da aquisição da linha de 60 KW de ligação à rede e da subestação existente em Mitrena. O atraso em formular esta proposta à Eurominas (o que ainda não foi feito) deve-se ao facto de se constatar que a propriedade da linha já é da EDP, embora tenha sido custeada pela Eurominas e houve dificuldade em estabelecer qual a empresa do Grupo EDP que irá avaliar a subestação. É previsível que no espaço de 15 dias a EDP possa fazer uma proposta definitiva".
O ofício de 5 de Dezembro do Gabinete do Ministro da Presidência dirigido ao Secretário de Estado da Energia confirma as diligências feitas na sequência da reunião de 29 de Novembro de 1995.
Registe-se a ausência da resposta a este ofício no processo entregue à Comissão pelo Governo.
9 - Esteve ou não esse acordo associado à vontade de privatização da EDP? Quem determinou este processo por parte do Estado português e em que momento foi determinado?
Pela correspondência fornecida pela Eurominas e pelas declarações prestadas à Comissão por diferentes intervenientes no processo pode concluir-se que o acordo EDP-Eurominas não só esteve associado à vontade de criar as condições para a sua privatização como esteve presente na opção de solução extrajudicial assumida pelo XIII Governo presidido pelo Eng.º António Guterres e conduzida através do Gabinete do Ministro da Presidência, sob a direcção do Ministro Dr. António Vitorino.

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Refira-se que a generalidade dos decisores políticos ouvidos pela Comissão assumiram desconhecer ou conhecer mal o dossier EDP-Eurominas, adoptando como critério de avaliação do mesmo os pareceres encomendados e pagos pela Eurominas e que, naturalmente, lhes eram favoráveis.
Sendo recusadas as audições de diferentes personalidades ligadas a este processo - Dr. Saldanha Bento, Dr. Tiago da Silveira e Dr. Miguel Serpa Soares -, não foi possível determinar de onde emanou a ideia existente e expressa em vários documentos de que a EDP seria culpada e que esta primeiro e o Estado mais tarde poderiam ser condenados com grande probabilidade. A verdade é que, da documentação disponível, não se pode retirar, com segurança, uma tal conclusão em relação à EDP e muito menos em relação ao Estado, pois, se outras razões não existissem, o acordo entre a EDP e a Eurominas, firmado em Setembro de 1996, incluía a desistência desta de todos os processos existentes entre as partes "(...) incluindo o processo que corria no Tribunal Administrativo do Círculo de Lisboa relativo ao pedido de anulação do despacho do Sr. Director Geral de Energia de 4 de Agosto de 1993 (…)".
A persistência da Eurominas na reclamação ao Estado de uma indemnização no valor de 15 400 00 contos, diferença entre os 16 milhões de contos reclamados à EDP e os 400 000 recebidos pelo acordo, só pode ser entendida como uma manobra de má-fé destinada a manter uma posição negocial face ao Estado que em boa verdade a Eurominas nunca chegou a ter e que só a assumpção da via extrajudicial efectivamente acabou por lhe reconhecer. Isto mesmo está reconhecido em diferentes memorandos/pareceres de que são exemplo o memorando de Miguel Serpa Soares de 24-6-97 onde se afirma "(...) os representantes do Ministério da Economia defendem que não existe probabilidade de condenação neste último litígio" e o Memorando n.º 03/FS/00, de 8-10-2000, de Maria Fernanda Simões, dirigido ao Secretário de Estado da Administração Marítima e Portuária, onde se diz "Temos fundadas suspeitas que, por força deste acordo, não existirá qualquer acção de indemnização no montante de 15,5 milhões de contos intentada contra o Estado/Direcção-Geral de Energia por facto ilícito, como ainda alega a Eurominas, para manter o valor de cerca de 3 milhões que pretende a título de indemnização".
De resto, não pode deixar de se sublinhar vários factos: o facto de a Eurominas só ter fornecido à Comissão a documentação que lhe era favorável no conflito com a EDP alegando a perda da restante documentação; o facto de na documentação enviada pela Presidência do Conselho de Ministros não existir a documentação referente ao conflito com a EDP na parte que justifica a razão desta no mesmo; de a EDP se ter limitado a enviar o acordo firmado com a Eurominas só enviando mais documentação depois de instada a fazê-lo pela Comissão; de na documentação do Ministério do Equipamento não haver documentação relevante sobre este conflito e ainda a oposição e recusa dos deputados do PS em auditar, designadamente, o Dr. Saldanha Bento apesar da insistência de todos os outros partidos nesse sentido.
É, aliás, também muito significativo que se invoquem repetidamente os pareceres encomendados e pagos pela Eurominas e que naturalmente lhe são favoráveis, apesar de ninguém poder garantir que estes tenham sido elaborados tendo presente toda a documentação deste complexo processo, mas nunca se refiram os pareceres ou documentos que demonstram o contrário.
Trata-se de um facto politicamente relevante pois, na mais favorável das várias leituras possíveis, revela a falta de rigor na avaliação deste processo por parte dos decisores políticos que optaram pela solução extrajudicial e que conduziu ao acordo EDP - Eurominas de 27 de Setembro de 1996 em que esta última não só se liberta da dívida para com a EDP como recebe ainda 400 000 contos.

III
Da reversão à indemnização

10 - Foi ou não justo e legal o Decreto n.º 14/95, de 22 de Maio? Havia da parte da Eurominas esforços para retomar o objecto da desafectação ou, pelo contrário, esta empresa vinha desenvolvendo actividades não contempladas no objecto e a procurar alterá-lo?
Independentemente de aspectos de carácter formal, a reversão determinada em 22 de Maio de 1995, através do Decreto n.º 14/95, de 22 de Maio, só pode ser criticada pelo seu atraso na medida em que as condições que impunham a reversão dos terrenos e benfeitorias já se verificavam desde Agosto de 1986, com o encerramento da unidade industrial e o despedimento colectivo de 143 dos 150 trabalhadores ao serviço da Eurominas.
A reversão do terreno e benfeitorias, sem direito a indemnização, constituía, sem dúvida, a opção adequada pois era a forma consagrada no contrato de compra e venda firmado entre o Estado e a Eurominas, constituía o regime sancionatório para o incumprimento por parte da Eurominas do objecto que levou à desafectação do terreno do domínio público marítimo e tinha sustentação legal. É preciso ter presente que foi com base no Decreto n.º 14/95 que a reversão, com seis anos de atraso, se concretizou em 2001.
A Eurominas, consciente da inviabilidade de retomar a produção de ligas de manganês, procurou por diversas vezes proceder à alteração ou alargamento do âmbito do objecto da desafectação, podendo afirmar-se que, de acordo com documentação existente, estava mesmo a desenvolver actividades de natureza portuária de forma ilegal com conhecimento de sucessivos governos e perante a passividade destes.
De resto, a Eurominas desde 1991 que vinha desmantelando a sua unidade industrial de produção de manganês, transferindo parte importante do seu equipamento industrial, designadamente para França.

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Como refere a APSS e comprova a proposta apresentada em 31 de Maio de 1993 à mesma APSS, através do Escritório de Advogados Noronha e Andrade, Cardoso Alves e Associados, em nome da Eurominas, esta, considerando que "(...) a actividade para que a sociedade foi constituída anteriormente está irremediavelmente comprometida (…)", vinha desenvolvendo esforços no sentido de alterar o objecto da desafectação por forma a poder usar o seu cais noutras actividades.
Na proposta referida propunha-se em concreto que um grupo espanhol, em conjugação com a Eurominas, pudesse utilizar as instalações da Mitrena para desenvolver "(...) actividades de importação, exportação, comercialização, transformação e industrialização de produtos minerais sólidos susceptíveis de serem comercializados directamente ou após o processo industrial correspondente, de bens secos, moídos, empacotados, etc., nomeadamente venda de produtos alimentares, tanto para consumo humano como animal, matérias-primas, produtos manufacturados ou semifacturados. Pretende também instalar naves de montagem de vários tipos de maquinaria para a sua comercialização tanto na CEE como para a sua reexportação para países terceiros. Está interessado igualmente no trânsito de todo o tipo de mercadorias comerciais e industriais com uma previsão de tonelagem de cerca de 2 milhões de toneladas".
Na sua primeira abordagem junto do XIII Governo Constitucional, em Outubro de 1995, dos conflitos que opunham a Eurominas à EDP e ao Governo/APSS, a Eurominas volta a insistir na alteração do objecto da desafectação apontando para a actividade portuária através do projecto Eurocais.
Suspender o Decreto n.º 14/95, vender a subestação da Mitrena à EDP e conseguir o projecto portuário correspondendo este ao valor de uma indemnização a pagar pelo Estado por expropriação, constituíam as principais bases do acordo extrajudicial avançado pela Eurominas em Outubro de 1995.
Sublinhe-se, desde logo, que não obtendo a suspensão do Decreto n.º 14/95, de 22 de Maio, como pretendia, a Eurominas conseguiu, no entanto, que a reversão não se materializasse antes de alcançado o acordo com a EDP e com o Estado, obtendo a anuência deste para os sucessivos requerimentos que foi interpondo junto do Supremo Tribunal Administrativo a solicitar a suspensão da instância no processo de anulação do Decreto n.º 14/95, por si requerido, conforme consta da certidão do Supremo Tribunal Administrativo de 26 de Janeiro de 2006, enviada à Comissão.
11 - Considerando que até Dezembro de 1995 o Governo português manteve inalterada a sua posição junto dos tribunais relativamente à justeza da reversão, porque razão e em que momento se verificou uma mudança de orientação em relação ao Decreto n.º 14/95, de 22 de Maio?
A documentação e os depoimentos prestados em Comissão permitem concluir que com a tomada de posse do XIII Governo Constitucional se verifica uma mudança da posição assumida pelo Governo anterior, abrindo caminho a uma solução extrajudicial sob a direcção do Gabinete do Ministro da Presidência.
Pelos depoimentos prestados à Comissão a entrega das alegações assinadas pelo Sr. Primeiro-Ministro Eng.º António Guterres não corresponderam a uma continuidade da política do governo anterior, constituindo apenas uma resposta formal no processo que decorria em tribunal.
Pelas declarações prestadas pelo Dr. Jorge Dias, Chefe de Gabinete do Ministro da Presidência, e pela documentação existente, pode concluir-se que a solução extrajudicial é, ou já está, assumida, aquando ou imediatamente a seguir à reunião de 29 de Novembro de 1995, marcada de acordo com a agenda do Ministro da Presidência, que teve lugar no seu gabinete e cujas diligências posteriores se desenvolveram sob a sua orientação mas relativamente às quais o próprio, inexplicavelmente, afirmou: "não fiz, não mandei, não autorizei, não tenho conhecimento de qualquer iniciativa do meu gabinete sobre essa matéria".
Sublinhe-se que, como está documentado em acta de 7 de Maio de 1996 e em outra documentação cuja autoria foi assumida pelo Chefe de Gabinete do Ministro da Presidência, Dr. Jorge Dias, da reunião de 29 de Novembro de 1995 resultaram as seguintes acções: "'Acalmar' a Banca; informar o Ministro do Equipamento Social sobre a hipótese de reversão da concessão para exploração do terminal portuário; saber o ponto da situação com a EDP (…); informar o Secretário Estado da Cooperação sobre o interesse de transferir o equipamento para instalação de uma refinaria em Angola".
Sublinhe-se ainda que é na sequência das acções desenvolvidas pelo Gabinete do Ministro da Presidência que foi contactado o BPA (em 5 de Dezembro) que ficou de propor moratória. Os resultados foram segundo ofício da Eurominas, de 31 de Janeiro de 1996, dirigido ao Ministério da Presidência "(...) na passada semana para chegar a um acordo de princípio de uma nova moratória".
Sublinhe-se ainda que sem esta nova moratória a Eurominas estava condenada à falência.
12 - Em que momento foram decididos a elaboração e o conteúdo do protocolo que veio a ser assinado posteriormente, em 8 de Abril de 1998, entre o Estado (representado pelos Secretário de Estado da Presidência do Conselho de Ministros, Dr. Vitalino José Ferreira Prova Canas, Secretário de Estado do Tesouro e das Finanças, Prof. Doutor Fernando Teixeira dos Santos, Secretário de Estado Adjunto do Ministro do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território, Eng.º José Manuel da Costa Monteiro Consiglieri, Pedroso e Secretário de Estado da Indústria e Energia, Professor Dr. Fernando Manuel dos Santos Vigário Pacheco) e a Eurominas representada pelo seu administrador-delegado, Dr. Bernardo Arrochela Alegria.
O protocolo, ainda que só formalizado em 8 de Abril de 1998, é o resultado do processo iniciado sob a orientação do Gabinete da Presidência do Concelho de Ministro a partir 1995.

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É de sublinhar o facto do protocolo persistir na solução extrajudicial, contrariando o despacho de 17 de Julho de 1997, proferido pelo então Ministro do Equipamento, Eng.º João Cravinho, oposto sobre o memorando apresentado pelo Adjunto do Secretário de Estado Adjunto do Ministro, Dr. Miguel Serpa Soares, em que se afirma, designadamente, que: "na medida em que desaparece o interesse global do Estado numa perspectiva extrajudicial, deve ser estudada a forma de consolidar, com efectividade, o decreto de reversão; (...) para além do compromisso genérico de indemnizar no caso de uma anulação do decreto de reversão, o que, aliás, seria uma consequência posterior necessária da declaração judicial da invalidade do acto, não devem ser tomados compromissos quanto às formas concretas pelas quais essa eventual indemnização se configurará; em qualquer caso deve ser consolidado o acto de reversão pela efectiva integração das instalações em causa na área de jurisdição da APSS".

IV
Do valor da indemnização à sua legalidade

13 - A atribuição de uma indemnização como solução extrajudicial foi legal considerando que o Decreto n.º 14/95, de 22 de Maio, se mantém em vigor até hoje? A solução extrajudicial era a única para a resolução do conflito?
Não sendo objecto de alteração ou revogação o Decreto n.º 14/95, de 22 de Maio, que impunha a reversão para o domínio público dos terrenos e benfeitorias sem direito a indemnização, é legitimo questionar a legalidade do pagamento à Eurominas de uma indemnização por um património que, considerando o conteúdo do referido decreto, constituía património do Estado.
Segundo a documentação disponível, eram muitos os representantes do Estado a defender que se devia esgotar a via judicial antes de qualquer acordo, solução que a persistência na solução extrajudicial prejudicou, sem explicação plausível e bem sustentada.
Não pode deixar de se chamar a atenção, pelo profundo significado político que tem, ao facto dos decisores políticos ouvidos pela Comissão terem quase todos bem presente na sua memória o despacho de 27 de Janeiro de 1997 do então Ministro do Equipamento, Engenheiro João Cravinho, em que este manifestava a sua "(...) concordância de princípio à constituição de um grupo de trabalho interministerial ad hoc, que tenha como objectivo a resolução extrajudicial deste litígio (…)", mas nenhum deles parecer ter presente, para explicar à Comissão que consideração lhes mereceu, e porque razão não foi dada sequência às medidas propostas, o Despacho de 17 de Julho de 1997, do mesmo Ministro do Equipamento, Eng.º João Cravinho, de concordância com o memorando de 10 de Julho de 1997, do Adjunto Dr. Miguel Serpa Soares, enviado em 30 de Julho de 1997 aos Gabinetes do Ministro da Presidência, Dr. António Vitorino, e Ministro da Economia Dr. Augusto Mateus, e do qual, pela sua importância, se transcrevem as seguintes ideias e propostas:

"A posição que tem vindo a ser defendida por este Ministério, desde Abril de 1996, pode ser resumida do seguinte modo:

- A procura de uma solução extra-judicial teria o máximo interesse na perspectiva global da posição do Estado e sempre que não fossem separados o litígio contra a EDP e o litígio relativo à reversão para o domínio público portuário das instalações em causa;
- Na nossa análise preliminar, foi entendido como desprovido de fundamentação relevante e, portanto, com hipóteses de sucesso limitado, o recurso de anulação do decreto de reversão;
- De modo contrário, foi entendido que existiria uma probabilidade séria de condenação do Estado no litígio contra a EDP;
- Em função de novos elementos respeitantes a este último processo, os quais no decurso deste ano nunca se encontraram disponíveis para este Gabinete, os representantes do Ministério da Economia defendem que não existe probabilidade de condenação neste último litígio.

Convém ainda atentar no seguinte:

- A necessidade de concretização da reversão em causa nunca foi questionada por este Gabinete (...)
- Na medida em que desaparece o interesse global do Estado numa perspectiva extrajudicial, deve ser estudada a forma de consolidar, com efectividade, o decreto de reversão;
(...)

Nestes termos:

(…)
- Considerando a natureza contestável e parcialmente improcedente da fundamentação jurídica da posição da Eurominas quanto à anulação de tal acto, sustentada por este Gabinete e por parecer do Prof. Sérvulo Correia;
(...)

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- É duvidoso que o Estado deva indemnizar a Eurominas pelas benfeitorias realizadas no imóvel. Parece apenas aceitável que essas benfeitorias se refiram a infra-estruturas de natureza marítima, pressupondo-se sempre a rigorosa avaliação do montante envolvido antes de qualquer compromisso nesse sentido;
- Para além do compromisso genérico de indemnizar no caso de uma anulação do decreto de reversão, o que aliás seria uma consequência posterior necessária da declaração judicial da invalidade do acto, não devem ser tomados compromissos quanto às formas concretas pelas quais essa eventual indemnização se configurará;
- Em qualquer caso, deve ser consolidado o acto de reversão pela efectiva integração das instalações em causa na área de jurisdição da APSS."

Esta era sem dúvida uma solução distinta que manifestamente quem dirigia o processo não quis assumir, persistindo na via da negociação extrajudicial que abriu portas ao protocolo de 1998.
14 - Quais as rubricas acordadas no protocolo assinado entre o Estado e a Eurominas, em 8 de Abril de 1998, para efeitos de pagamento de indemnização admitida pelo mesmo?
O protocolo assinado em 8 de Abril de 1998 previa na sua cláusula primeira que as rubricas a considerar para efeitos de indemnização deveriam incidir sobre "terrenos e benfeitorias", sendo entendimento por parte dos representantes do Estado que os terrenos e benfeitorias a considerar deveriam ser apenas os que eventualmente pudessem vir a ter "utilização futura na actividade portuária", de acordo, de resto, com o já anteriormente expresso pelo Ministério do Equipamento.
15 - O grupo de trabalho presidido pelo Sr. Juiz Conselheiro Dr. Luciano Patrão limitou-se a avaliar as rubricas contempladas no protocolo ou alargou o seu âmbito?
No grupo de trabalho manifestaram-se desde o início profundas divergências quanto à consideração das rubricas a considerar à luz do protocolo e, consequentemente, em relação aos respectivos valores, pois, conforme consta no "Comentário da parte representante do Estado à informação-proposta de 12 de Julho de 1999 do Presidente do Grupo de Trabalho" e este confirma na sua proposta, enquanto os representantes do Estado na sua proposta de 14 de Janeiro de 1999 consideravam "(...) apenas a componente imobiliária (terreno e edificações) que eventualmente pudesse vir a ter utilização futura na actividade portuária, no montante de 1 143 000 contos. A Eurominas, por sua vez, socorrendo-se de uma avaliação efectuada por uma empresa que consultou, a Euromarítima - Consultores Técnicos e Projectos Navais, Lda., formulou uma proposta que, em síntese, atribuía ao imobiliário o valor de 3 503 000 000$00 e ao equipamento, o de 1 052 500 000$00".
Ao incluir por sua iniciativa e sem que para tal tenha sido mandatado, na sua informação-proposta de 12 de Julho de 1999, todo o terreno, todas as construções e benfeitorias, e os equipamentos, o presidente do grupo de trabalho extravasou claramente o estatuído pelo protocolo, como, aliás, contestaram os representantes do Estado em 17 de Setembro de 1999 no seu comentário "à informação-proposta de 12 de Julho de 1999" apresentada por aquele.
No seu relatório o Relator não responde a esta pertinente questão de acordo com a documentação disponível e com as declarações prestadas na Comissão.
Na verdade, o que resulta da documentação e das declarações do presidente do grupo de trabalho à Comissão, é que este adoptou no fundamental os critérios da Eurominas e os valores propostos pela Euromarítima de onde, como afirmou, retirou grande parte dos elementos que lhe serviram de base para as conclusões a que chegou.
Por outro lado, resulta clara a contradição entre a repetida afirmação do presidente do grupo de trabalho de que a proposta apresentada pela Eurominas "(...) não mereceu grandes observações da parte do Estado (…)" ou que "(...) não houve grande oposição (...)", como declarou à Comissão, ou ainda "como a generalidade dos valores constantes do relatório apresentado pela Eurominas não mereceu reparos de vulto (...)", como escreveu no ponto 13 da sua informação-proposta e o que afirmam, em sentido contrário, os representantes do Estado no referido grupo de trabalho no seu comentário.
Isto mesmo é reconhecido pelo presidente do grupo de trabalho na sua informação proposta quando afirma no ponto 9 "Dada a disparidade de valores e a dificuldade sentida na obtenção de qualquer consenso, face à irredutibilidade das partes (...)" ou quando afirmou perante a Comissão "É que as partes estavam com dificuldade de entendimento e permanentemente contrariavam as posições que sucessivamente iam sendo tomadas por outra parte".
16 - Que razões inviabilizaram o acordo quanto aos montantes a considerar como indemnização a atribuir à Eurominas?
Como consta do Comentário da parte representante do Estado à informação-proposta de 12 de Julho de 1999 do Presidente do Grupo de Trabalho:

- "Em 14 de Janeiro de 1999 o Estado apresentou uma proposta em que se ponderava para efeitos de indemnização apenas a componente imobiliária (terreno e edificações) que eventualmente pudesse vir a ter utilização futura na actividade portuária, no montante global de 1 143 000 contos;

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- A Eurominas (…), socorrendo-se de uma avaliação de uma empresa que consultou, a Euromarítima, (...) formulou uma proposta que, em síntese, atribuía ao imobiliário o valor de 3 503 000 000$00 e ao equipamento o de 1 052 500 000$00;
- Perante as divergências manifestadas "o Presidente do Grupo de Trabalho propõe um valor indemnizatório de 3 058 901 000$00 obtido pela soma das parcelas seguintes: a) Benfeitorias: 710 766 000$00; b) Infra-estruturas e obras: 202 297 000$00; c) Construções: 736 838 000$00; d) Equipamento: 609 000 000$00 e e) Terrenos: 800 000 000$00;
- Sobre esta informação-proposta dizem os representantes do Estado '(...) salvo o devido respeito, não pode a parte representante do Estado acompanhar as considerações e as conclusões apresentadas pelo Presidente do Grupo (…)';
- Contrariamente ao que parece resultar (…) da proposta do Presidente do Grupo de Trabalho, nunca a parte representante do Estado qualificou os terrenos em causa como bens no pleno domínio do comércio jurídico, livres de ónus naturais ou de quaisquer limitações especiais, com vocação e potencialidades generalistas idênticas às da propriedade privada plena;
- Importa (...) sublinhar que qualquer caracterização que se faça dos terrenos terá sempre que ter em conta o facto de 614 325 m2 dos 863 325 m2 desafectados ao domínio público marítimo - isto é, mais de 2/3 da sua área - ainda se manterem como sapal;
- Atentas a natureza e vocação exclusivamente portuária (ou similar) dos terrenos defendidas pelo Presidente do Grupo de Trabalho (…) não se afigura possível uma interpretação ampla da Cláusula Primeira do Protocolo relativamente ao conceito de benfeitorias, como aduzido (…);
- (...) a idoneidade do relatório elaborado pela Euromarítima foi, desde logo, questionada pela parte representante do Estado por se tratar de mera cópia, aqui e ali alterada, da avaliação encomendada pela Administração dos Portos de Setúbal e Sesimbra (APSS) à American Appraisal Portugal (...);
- Crê, antes, a parte representante do Estado que, dada a natureza desta questão, se imporá uma investigação séria, levada às últimas consequências, afim de se apurarem as responsabilidades no caso e eventuais intenções menos transparentes por parte dos seus autores e responsáveis;
- Assim, e objectivando as suas críticas, não pode a parte representante do Estado acolher a argumentação exposta pelo Presidente do Grupo de Trabalho nos pontos 10, 13 a 15 e 18 a 23 da sua proposta".

Sublinham-se as contradições entre o Presidente do Grupo de Trabalho ao afirmar perante a Comissão desconhecer o argumentário dos representantes do Estado no grupo de trabalho e as declarações do Dr. Aragão Botelho, representante do Ministério do Equipamento no referido grupo, em sentido contrário.
Aliás, a confirmar a veracidade das declarações do Dr. Aragão Botelho está a informação do Presidente do Grupo de Trabalho enviada em 17 de Setembro de 1999 ao "Sr. Secretário de Estado da Presidência do Conselho de Ministros", onde o próprio assume enviar em anexo "Posição final da Eurominas, bem como posição final conjunta dos organismos oficiais intervenientes" sobre a sua proposta de 12 de Julho de 1999.
Particularmente grave é a afirmação do Presidente do Grupo de Trabalho perante a Comissão de que não alteraria a sua proposta, mesmo que tivesse tido conhecimento de novos factos, designadamente da grave acusação de plágio e suspeita quanto às avaliações que lhe serviram de base para os valores propostos e da sugestão feita pelos representantes do Estado sobre as mesmas no sentido de serem alvo de investigação séria levada às ultimas consequências.
Refira-se ainda que, ao contrário do que afirma o Relator no seu relatório sobre a proposta apresentada pelo Presidente do Grupo de Trabalho no sentido de que "(...) a mesma não foi aceite por nenhuma das partes (…)" a Eurominas considerou-a através dos seus representantes em 6 de Setembro de 1999 "(...) em termos globais, uma proposta que julgamos equilibrada e justa" e em 19 de Março de 2000 reafirma a sua aceitação considerando em concreto que "(...) Só a irredutibilidade do representante da Direcção-Geral do Património impediu a progressão das negociações no sentido de um acordo balizado pela proposta conciliatória do presidente do grupo de trabalho, Juiz Conselheiro Luciano Patrão" pois "(...) a Eurominas, SA, manifestou disponibilidade para um acordo com base nos parâmetros da proposta conciliatória apresentada pelo Juiz Conselheiro Luciano Patrão".
17 - Que razões levaram o Governo a retomar as negociações com a Eurominas considerando as discordâncias entre as partes (Estado e Eurominas) e que, de resto, levaram à dissolução do grupo de trabalho?
Pela documentação existente e declarações prestadas à Comissão pode concluir-se que, ao contrário do afirmado por vários dos subscritores do protocolo de 1998 que declararam não ter o referido protocolo vinculado o Estado ao pagamento de qualquer indemnização, foi este, à posteriori, invocado e aceite pelas partes (Governo e Eurominas) como o documento que vinculou o Estado à obrigação de indemnizar a Eurominas, não obstante o desacordo verificado no seio do grupo de trabalho, que levou à sua dissolução e remissão do processo da Secretaria de Estado da Presidência para a Secretaria de Estado da Administração Portuária.
Este facto está claro quer na carta de 19 de Março de 2000 do Dr. António Lamego em nome da Eurominas quer no Memorando n.º 03/FS/00, do Gabinete do Secretário de Estado da Administração Marítima e Portuária, onde se pode ler, no ponto 4, "(...) foram restabelecidos contactos com os representantes legais da Eurominas (Dr. José Lamego) no sentido de negociar o quantum da indemnização que o Estado, por protocolo entretanto celebrado com Eurominas em 31 de Março de 1998, aceitou pagar os terrenos e benfeitorias de

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modo a pôr termo aos litígios existentes"; e no ponto 7 "(...) mantém-se o diferendo entre aquela empresa e a APSS, nomeadamente sobre o montante exacto que, a título de indemnização, o Estado se comprometeu (e deve) pagar pela reversão dos terrenos e pelas benfeitorias (…)".
A retoma do processo é da iniciativa da Eurominas, representada pelo Dr. António Lamego, que terá substituído o seu irmão, Dr. José Lamego, representante da Eurominas no grupo de trabalho, que, em carta de 19 de Março de 2000, dirigida ao Chefe de Gabinete do Secretário de Estado da Administração Portuária, invoca a necessidade de "(...) proceder à liquidação da indemnização cujo direito o Estado explicitamente reconhece no protocolo assinado em 8 de Abril de 1998 (…)" declarando "(...) a disponibilidade da Eurominas em aceitar a solução conciliatória proposta pelo Juiz Conselheiro Luciano Patrão em 12 de Julho de 1999". Facto aceite pelo Estado, pelo então Secretário de Estado da Administração Marítima e Portuária, Narciso Miranda, através do que foi considerado o "despacho da capitulação", segundo palavras do Dr. Aragão Botelho, na medida em que foi este que levou a APSS a uma mudança radical de posição relativamente ao pagamento de uma indemnização à Eurominas cujo direito a APSS sempre havia contestado.
Sublinha-se, ainda, o facto de o Dr. José Lamego, que esteve associado ao processo na sua qualidade de Secretário de Estado da Cooperação ter, logo após a sua saída do Governo, assumido funções de, utilizando a sua própria expressão, "jurisconsulto" ou de "perito avaliador" ao serviço da Eurominas, como declarou o Dr. Bernardo Alegria, administrador da empresa, no grupo de trabalho constituído ao abrigo do protocolo de 1998, onde, de resto, apenas terá estado uma ou duas vezes, segundo afirmou o Presidente do Grupo de Trabalho Juiz Conselheiro Luciano Patrão.
18 - Que consideração mereceram por parte do Governo as declarações, os pareceres e as informações prestadas pelos representantes do Estado no grupo de trabalho envolvidos nas negociações com a Eurominas?
A documentação disponível e as respostas prestadas pelos depoentes às questões colocadas pelos Deputados no âmbito das audições em Comissão sobre esta matéria permitem concluir que nem sempre lhes foi dada a atenção devida por parte dos decisores políticos, sobretudo tendo em conta a gravidade de algumas delas, situação tanto mais estranha quanto se tratavam de considerações feitas por membros por eles nomeados e em sua representação.
Tenha-se, por exemplo, em conta a opinião expressa pelos representantes do Estado no grupo de trabalho, no seu Comentário à informação-proposta de 12 de Julho de 1999 do Presidente do Grupo de Trabalho, quer no que concerne aos valores que defenderam e os considerandos que fizeram a contrariar a proposta apresentada pelo Presidente do Grupo de Trabalho quer em particular quando consideram que "(...) se imporá uma investigação séria, levada às últimas consequências, a fim de se apurarem as responsabilidades (…)" no que se refere à idoneidade do relatório elaborado pela Euromarítima, que, como já se referiu, serviu de base ao Presidente do Grupo de Trabalho para determinar os valores a pagar à Eurominas.
19 - Que instrumentos legais foram aprovados no sentido da anulação da reversão decretada pelo Decreto n.º 14/95, de 22 de Maio, e que base legal sustenta o pagamento efectivo das indemnizações atribuídas à Eurominas?
Não houve qualquer instrumento legal ou judicial de revogação, anulação, alteração ou declaração de inconstitucionalidade do Decreto n.º 14/95, de 22 de Maio.
A execução da reversão concretizou-se em Novembro de 2000, depois do acórdão do Tribunal Constitucional ter recusado o recurso da Eurominas e tendo por base o Decreto n.º 14/95, de 22 de Maio, o qual pressupunha a transferência para o domínio público marítimo dos terrenos e benfeitorias existentes no mesmo sem direito a indemnização.
O XIV Governo decidiu, no entanto, reabrir as negociações com a Eurominas tendo por base a proposta apresentada pela Eurominas nesse sentido e partindo do pressuposto que o Estado estava vinculado pelo protocolo de 1998 ao pagamento de uma indemnização como já atrás se demonstrou.
Tendo como base de partida a proposta do Presidente do Grupo de Trabalho, como proposto pela Eurominas na sua carta de 19 de Março de 2000, foi decidido pelo Secretário de Estado da Administração Marítima e Portuária o pagamento pelo Estado de uma indemnização no valor de 2 384 861 contos à Eurominas conforme consta no protocolo assinado em 31 de Maio de 2001, cujo pagamento se fixou em três prestações, a primeira das quais a pagar três meses depois da assinatura do protocolo, a segunda no primeiro trimestre do ano de 2002 e a terceira no primeiro trimestre de 2003.
Na sequência da assinatura do protocolo e do pagamento da primeira prestação da indemnização, foi encerrado o processo de anulação do Decreto n.º 14/95 que decorria no Supremo Tribunal Administrativo sem que tenha havido oposição do Ministério Público.
Sublinhe-se a cumplicidade do Estado com a Eurominas ao aceitar os sucessivos pedidos de suspensão do processo de anulação requerido pela própria Eurominas no Supremo Tribunal Administrativo.
Sublinhe-se, ainda, a afirmação do Conselho de Administração da Administração dos Portos de Setúbal e Sesimbra (APSS) em ofício dirigido em 31de Março de 1998, ao Chefe de Gabinete do Secretário de Estado Adjunto do Ministro do Equipamento de que "Tanto quanto é do conhecimento desta Administração, o processo que corre seus termos no Tribunal Constitucional encontra-se concluso desde 9 de Junho de 1997

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(projecto de acórdão elaborado)", acórdão esse que só foi publicado em 2 de Novembro de 2000 (Acórdão n.º 241/2000/Tribunal Constitucional, publicado no Diário da República II Série n.º 253, de 2 de Novembro de 2000).

V
Conclusões

Ganhos e prejuízos para o Estado no processo Eurominas

20 - Que ganho obteve o Estado da conclusão deste processo por via extrajudicial que não obtivesse por via judicial?
Ao alterar a orientação assumida pelo XII Governo Constitucional em vez de assumir a concretização da reversão de acordo com o Decreto n.º 14/95, de 22 de Maio, o XIII Governo não acautelou os interesses do Estado, na medida em que, aos atrasos já existentes na aplicação da reversão, que deveria ter tido lugar em Agosto de 1986 ou no máximo em 1991, data em que terminam todas as actividades da empresa, veio acumular novos atrasos. Com efeito, o processo seguido após a publicação do Decreto n.º 14/95 arrastou-se por mais seis anos, sem que daí tenham advido quaisquer benefícios para o Estado, ficando por demonstrar que o prosseguimento da via judicial não teria sido mais rápida e benéfica para o interesse público.
Em contrapartida, a Eurominas conseguiu através do processo extrajudicial iniciado em Novembro de 1995, sob a direcção do Gabinete da Presidência do Conselho de Ministros, evitar a falência eminente através de uma moratória da banca, suspender durante seis anos a execução do Decreto n.º 14/95 e usar em seu benefício o cais da Mitrena nesse mesmo período, desenvolvendo no mesmo, com os respectivos dividendos, actividades que lhe estavam vedadas, suspender a decisão do Supremo Tribunal Administrativo sobre a acção por si requerida no sentido da anulação do Decreto n.º 14/95 e que com grande probabilidade poderia perder, vender ou transferir para o estrangeiro todo o equipamento com algum valor e que a Eurominas avaliava em 1 052 500 000$00, resolver a sua dívida para com a EDP, no valor de 4 486 920 532$50 e receber mais 400 000 contos pelo acordo firmado, e ainda receber do Estado mais 2 384 861 000$00 a título indemnizatório, o que perfaz, só nas três últimas rubricas, um ganho total de 8 324 261 532$50.

Assembleia da República, 7 de Março de 2006.
Os Deputados do PCP, José Soeiro - Jorge Machado.

Declaração de voto apresentada pelo PCP, sobre a avaliação ao relatório final apresentado pelo Deputado Relator Jorge Strecht e justificação do relatório final alternativo

Numa avaliação global pode afirmar-se que todo o relatório final, apresentado pelo Deputado Relator, Deputado Jorge Strecht é construído no sentido de justificar como boas as opções extrajudiciais do XIII e XIV Governos Constitucionais, avançando ou deixando implícitas conclusões ou leituras que, em nosso entender, não só não têm sustentação na documentação disponibilizada à Comissão como, nalguns casos, vão ao arrepio das conclusões passíveis de retirar dessa mesma documentação.
É um relatório que peca pela omissão de factos relevantes para a compreensão e apuramento da verdade sobre o processo, um relatório que ignora factos fundamentais levantados na Comissão com comprovação na documentação disponível e que se limita, no essencial, a transcrever para o mesmo os pontos de vista favoráveis aos defensores da opção extrajudicial.
É um relatório que consideramos não ser passível de reformulações pontuais, pois está em contradição em questões essenciais com a leitura que fazemos dos acontecimentos a partir da documentação em posse da Comissão e que é a base que sustenta o relatório final alternativo que apresentamos à Comissão.
É um relatório que, como adiante se demonstrará, põe em evidência a forma pouco atenta e superficial como o relator acompanhou as audições nos poucos momentos em que nestas esteve presente, a falta de rigor que teve na leitura das actas pois apenas teve em consideração as respostas dos auditados ignorando as questões colocadas e que não tiveram resposta, bem como os documentos que sustentavam as perguntas e que contrariam em muitos casos as respostas dadas.
Reafirmamos, por isso, a justificação do relatório final alternativo entregue à Comissão em 7 de Março de 2006 e que, como iremos defender e justificar, é aquele que, sustentado na documentação e questões levantadas nas audições realizadas nesta Comissão, melhor responde ao objecto que justificou a criação desta Comissão Parlamentar de Inquérito à Gestão do Processo Eurominas.
Assim:

Capítulo I - Desafectação (1 e 2):
Quesito 1 - pág. 20, parágrafo 2º - o Relator tem a preocupação de invocar as doutas opiniões, encomendadas e pagas pela Eurominas, "(…) de alguns ilustres juristas portugueses, de que se destacam o Prof. Marcelo Rebelo de Sousa e os Professores Diogo Freitas do Amaral e João Caupers (…)" para deixar a ideia de que "(…) a reversão para o domínio público dos terrenos, com perda a favor do Estado de todas as obras e benfeitorias realizadas nos mesmos, sem direito a qualquer indemnização, nem à restituição do preço

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pago (…)" seria de "(…) duvidosa constitucionalidade e legalidade (…)" mas omite a opinião contrária fundamentada e desenvolvida pelo Professor Sérvulo Correia no parecer que elaborou a pedido da APSS como se poderá comprovar através, designadamente da leitura do Capítulo III, pontos 33 a 49, inscritos nas páginas 25 a 35 do referido parecer e em que se conclui, ponto 49, que "não é inconstitucional o artigo 5.º, n.º 2, do Decreto-Lei n.º 48 784, pelo menos quando interpretado restritivamente no sentido de consagrar uma sanção para o particular que culposamente incumpra o dever especial de utilização e, simultaneamente, fixar com antecipação uma indemnização a favor da Administração, compensatória da frustração simultânea do interesse público que dita a dominialidade do bem e do interesse público especial que motivara a desanexação e a transmissão de propriedade sob dever de utilização ou afectação especial; no caso em exame o comportamento da Eurominas violou as condições que determinaram a desafectação, pelo que não só a reversão deve ser considerada adequada, como é lícita a perda em favor do Estado de todas as obras e valores no terreno situados e a não restituição do preço pago pelo terreno."
Quesito 2 - pág. 22, parágrafo 5º, alínea a) - Sendo verdade que "A Eurominas cumpriu inicialmente o pressuposto principal (…)" como afirma o Relator, não é menos verdade que a Eurominas em rigor nunca cumpriu plenamente os pressupostos que sustentaram a desafectação dos terrenos do domínio público marítimo e isso não só é omitido pelo Relator como é desvalorizado quando escreve - parágrafo seguinte à alínea e), página 23, "Quanto aos demais pressupostos, inicialmente previstos, não é possível, com suficiente grau de certeza, avaliar o seu grau de cumprimento, sendo certo que podemos, ainda assim, considerar que o projecto desenvolvido pela Eurominas nos terrenos desafectados do domínio público marítimo, embora possa ter ficado aquém das expectativas iniciais, terá contribuído para a utilização e valorização de matérias-primas nacionais, para o desenvolvimento do Porto de Setúbal e Sesimbra e para o significativo consumo anual de energia eléctrica". Ora a verdade é que a documentação disponível não só permite avaliar como demonstra cabalmente o elevado grau de incumprimento por parte da Eurominas das premissas que justificaram a desafectação o que leva o Professor Sérvulo Correia a concluir no seu parecer, ponto 47, página 33, "Muito antes do litígio com a EDP que terá conduzido à cessação da laboração, já a Eurominas apresentava um grau de cumprimento dos objectivos por ela livremente assumidos muito abaixo do garantido às entidades públicas autorizantes. Tal violação não pode deixar de configurar um desrespeito evidente pelas condições que determinaram a desafectação e possibilitava por si só a reversão. Se a Administração a ela não recorreu anteriormente não foi decerto por falta de fundamento. Também aqui é, pois, detectável responsabilidade subjectiva da Eurominas, que não poderá alegar que lhe não tenha sido deixado tempo mais que razoável para se recompor de qualquer crise momentânea e granjear os meios indispensáveis ao desempenho da actividade industrial a que se encontrava vinculada sob pena de reversão do terreno".
Página 22, parágrafo 6º, alínea b) - Sé é verdade como afirma o Relator que "Com o corte do fornecimento de energia eléctrica por parte da EDP, em 8 de Agosto de 1986, a Eurominas cessou a sua actividade (…)" não é menos verdade que o corte de energia referido se deve ao não pagamento por parte da Eurominas do valor da energia fornecida entre 1 de Janeiro de 1984 e 8 de Agosto de 1986 (3 anos) e facturada na base do acordado entre a EDP e a Eurominas, situação que o relator omite.
Página 23, penúltimo parágrafo - A invocação pelo relator no seu relatório das declarações feitas pelo Dr. Bernardo Alegria sobre o "(…) 25 de Abril (…)" e de "(…) todas as incertezas que surgiram, nos primeiros anos (…)" para justificar como "(…) perfeitamente normal que os investidores fossem cautelosos (…)" e assim tentar justificar o incumprimento por parte da Eurominas dos seus compromissos não é de todo aceitável pois em momento algum o Estado português ou a CPE/EDP deixaram de honrar os compromissos assumidos para com a Eurominas ou tomaram decisões que pusessem em causa os seus interesses.

Capítulo II - Eurominas/EDP (3 a 5)
Quesito 3, alínea b), página 26, parágrafo 1º - a CPE/EDP denunciou o contrato pela 1.ª vez em 1 de Março de 1982, com quase dois anos de antecedência em vez dos seis meses previstos no contrato, e não "1983" em abstracto como afirma o relator.
Parágrafo 2º - o relator omite, como sempre fez a Eurominas, um facto essencial deste conflito e que é o de ter sido com a aceitação expressa da Eurominas, conforme comprova o telex de 29 de Dezembro de 1983 dirigido pela Eurominas à EDP que "(…) a EDP passou a partir de 1 de Janeiro de 1984 e até 30 de Setembro de 1985 a facturar a Eurominas, pelos fornecimentos de energia que lhe foi fazendo, de acordo com o tarifário oficial em vigor (…)", situação que a Eurominas nunca cumpriu como muito bem reconhece o relator quando afirma "(...), tendo, contudo, a Eurominas pago tal fornecimento de acordo com o tarifário estabelecido no contrato de fornecimento celebrado com a CPE em 1973", mas que, como bem reconhece o relator no 1º parágrafo, foi denunciado pela EDP "(…) pondo assim termo à sua vigência em 31 de Dezembro de 1983".
A fuga à assumpção deste facto essencial está, aliás, patente em todo o capítulo pois o relator sabe que este é mais um facto documentado que comprova a responsabilidade subjectiva da Eurominas na situação de incumprimento do objecto que justificou a desafectação do terreno e que comprova a justeza e legalidade da reversão para o domínio público dos terrenos e de todas as benfeitorias sem direito a indemnização.
Parágrafo 3º - o Relator insiste em afirmar que continuou "(…) a Eurominas a efectuar os pagamentos com base no contrato celebrado com a CPE em 1973" e a omitir que este contrato deixou de existir em 31 de

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Dezembro de 1983 e que os pagamentos deveriam ser feitos com base no acordo firmado entre a EDP e a Eurominas o que esta última nunca respeitou.
Parágrafos 4º, 5º e 6º - o Relator procura deixar implícita a tese do "corte abrupto" ou de "ruptura" no fornecimento de energia por parte da EDP e justificar o incumprimento dos pagamentos da Eurominas quando afirma que "Em 8 de Agosto de 1986, depois de, por carta de 28 de Julho de 1986 (…) a EDP interrompeu o fornecimento de energia (…)", (parágrafo 4º), apesar da Eurominas liquidar as facturas "(...) as suas responsabilidades, ao preço contratual (…) Chega-se a Agosto de 1986 e é a ruptura (…)" (parágrafo 6º).
Parágrafo 7º e seguintes até à alínea c) - o Relator procura condicionar o direito da Comissão se pronunciar sobre a questão central que esteve na génese do conflito a "(…) (i)legalidade da denúncia do contrato de fornecimento de energia eléctrica celebrado entre a CPE/EDP e a Eurominas (…)" (parágrafo 7º), mas não se inibe de nos parágrafos seguintes procurar deixar a ideia da culpabilidade da EDP no processo ao invocar os "(…) ilustres juristas portugueses (…)" pagos pela Eurominas para concluir "(...) no sentido da sua ilegalidade" o que nunca foi demonstrado e que a documentação disponível, em nosso entender, contraria de forma muito clara.
Desde logo importaria saber se a Eurominas forneceu aos "ilustres juristas portugueses" toda a documentação relativa ao seu conflito com a EDP, designadamente o seu telex de 29 de Dezembro de 1983 em que aceita pagar a energia pelas novas tarifas, ou se, a exemplo do que fez com a Comissão, apenas forneceu a documentação que lhe era favorável.
É preciso ter presente a abundante documentação fornecida pela EDP que comprova ser condição para a continuidade de fornecimento de energia a partir de 1 de Janeiro de 1984 a aceitação por parte da Eurominas da assinatura de um novo contrato ou, como se veio a verificar em 29 de Dezembro de 1983 a aceitação expressa da aceitação do pagamento da energia pelo tarifário em vigor até à assinatura do mesmo. É este acordo firmado entre a EDP e a Eurominas e que deverá vigorar a partir de 1 de Janeiro de 1984 que a Eurominas nunca chega a cumprir o que o relator omite deliberadamente no seu relatório.
Com esta atitude o Relator revela a sua falta de isenção e imparcialidade na avaliação do processo, assumindo claramente partido por uma das partes em conflito, no caso o partido da Eurominas.
Alínea c), páginas 27 e 28, 1º parágrafo - o relator mais uma vez omite o essencial ao afirmar "(…) a Eurominas ter-se recusado a pagar a facturação da energia eléctrica fornecida de acordo com os novos tarifários", sem entretanto dizer que o faz depois de os ter aceite em 29 de Dezembro de 1983, como o comprova a documentação em posse da Comissão.
2º parágrafo - o relator repete a mesma falta ao afirmar "(…) a EDP passou a facturar a Eurominas (…) pelo tarifário em vigor" sem dizer que tal era feito com o acordo da Eurominas e termina afirmando que "(…) a Eurominas efectuou o pagamento da energia eléctrica que foi recebendo com base nas condições contratuais previstas no contrato de fornecimento de energia eléctrica celebrado entre as partes em 27 de Junho de 1973" sem dizer que o mesmo deixara de vigorar em 31 de Dezembro de 1983, por denúncia atempada da EDP e que os pagamentos efectuados pela Eurominas não só não tinham suporte contratual como não respeitavam o acordado com a EDP em 29 de Dezembro de 1983.
Alínea e), 2º parágrafo, página 29 - o Relator ignora a muita documentação que comprova o empenho da tutela, designadamente do Ministro Veiga Simão, no sentido de encontrar soluções alternativas que viabilizassem a continuidade da Eurominas.
Alínea f), página 30, último parágrafo - o Relator afirma que "(…) da prova documental depositada na Comissão de Inquérito (…) ressalta que a mesma (leia-se a Eurominas) não aceitou a ruptura contratual promovida pela EDP (…)". Ora, a verdade é que esta afirmação não tem comprovação pois não se conhece um só documento datado do período entre 1 de Março de 1982, data da 1.ª denúncia por parte da EDP do contrato estabelecido com a Eurominas e não "ruptura" como insistentemente diz o relator (2º parágrafo da página 31), e Janeiro de 1984, data em que a EDP aplica as tarifas em vigor como acordado com a Eurominas, que confirme uma tal afirmação. A documentação comprova é que a Eurominas desenvolve esforços no sentido de obter por parte da EDP a prorrogação do contrato atempadamente denunciado pela EDP ou a assinatura de um novo contrato que mantivesse no essencial as tarifas de favor de que vinha beneficiando desde 1973 o que a EDP sempre afirmou não estar em condições de garantir.
Importa dizer que na resposta a este item o relator foge, mais uma vez, a uma questão crucial que é o facto da Eurominas ter outras opções como se demonstra cabalmente no relatório final alternativo apresentado em 7 de Março em que se afirma que:

"A Eurominas poderia e deveria ter assumido o pagamento da energia pelo valor das tarifas em vigor, como havia acordado com a EDP, e na ausência de um novo contrato no curto prazo recorrer para o Tribunal Arbitral, e da decisão deste para o Tribunal Judicial caso esta não merecesse a sua concordância.
A Eurominas ao recusar-se a assinar um novo contrato e ao optar pelo não pagamento dos valores facturados de acordo com as tarifas em vigor como havia assumido pagar em 29 de Dezembro de 1983 decidiu efectivamente por não manter a laboração da empresa, uma vez que sabia que o não pagamento dos valores em atraso conduziria à suspensão do fornecimento de energia e consequentemente ao encerramento da actividade, o que veio a efectivar-se em Agosto de 1986.

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Com esta sua opção a Eurominas colocou-se na condição de incumprimento do objecto que conduziu à desafectação dos terrenos e consequentemente à imperativa reversão dos mesmos e de todas as benfeitorias para o domínio público marítimo sem direito a qualquer indemnização."

Quesito 4, páginas 32, 33, 34, 35, 36 o Relator, como se pode ver no ponto 8 do relatório final alternativo, ignora factos relevantes constantes na documentação na posse da Comissão, nalguns casos contraditórios com os depoimentos prestados em Comissão.
Desde logo o Relator invoca o acordo de 27 de Setembro de 1996 firmado entre a EDP e Eurominas, mas omite o facto relevante de no mesmo ser atribuído, na sua clausula terceira, o valor de "(...) 10 000 contos (…)" à subestação e os restantes 390 mil contos a uma "compensação", o que é contraditório com outros valores, que variam entre os 400 e 1 milhão de contos atribuídos à mesma subestação que o próprio Relator invoca mas que não lhe merecem qualquer reparo (página 32), ignora o memorando de 21 de Dezembro de 1995, que consta da documentação na posse da Comissão, subscrito pelo Director do Gabinete de Apoio Jurídico da EDP, dirigido ao Dr. Saldanha Bento, onde se afirma que "essas instalações da subestação custaram em 1975 um montante de 25 mil contos, pelo que a Eurominas pretenderia agora um valor actualizado que calcula em cerca de 450 mil contos", o que levanta desde logo legítimas interrogações sobre os valores em questão, ignora a ausência no processo da avaliação da referida subestação por parte da EDP e assume como "(...) não assinado, nem tão pouco datado (…)" (página 33, parágrafo 3º) o relatório do Chefe do Gabinete do Ministro da Presidência, Dr. Jorge Dias, de 27 de Junho de 1996, onde constam os valores de 400 mil a um milhão de contos atribuídos à citada subestação, o que revela a forma no mínimo superficial e pouco atenta como o relator acompanhou os trabalhos da Comissão e a documentação invocada nas audições que esta levou a cabo.
O Relator considera que "Das declarações prestadas pelo Dr. Bernardo Alegria parece poder inferir-se que, pelo menos, na concepção da Eurominas, o acordo de transacção com a EDP constituía apenas uma parcela da solução global dos litígios que opunham aquela empresa ao Estado" (página 34, parágrafo 2º), mas a verdade é que, em primeiro lugar, não se pode apenas inferir na medida em que o que é dito é, como transcreve o relator, "(...) foi possível à empresa e à EDP chegarem a um entendimento, mas houve logo, à partida, um pressuposto de que este entendimento era parte da solução global". Em segundo lugar, não terá sido apenas "na concepção da Eurominas" que o acordo "constituía apenas uma parcela da solução global", pois se assim não fosse decerto que o Dr. António Vitorino não teria afirmado, como afirmou, e o Relator cita, que "(…) uma vez que o Estado já tinha tirado as "castanhas" mais quentes do lume, a partir daí, fiat gloria, pereat mundus, porque o Estado é uma pessoa de bem. Isto é, se o clima de confiança, porque se tinha aberto um processo negocial, permitiu resolver aquilo que era a principal preocupação do Estado, que era retirar a EDP do collimateur, não me parecia, sequer de pessoa de bem dizer depois "agora que tenho o que quero, não falo mais do resto" (página 36, parágrafo 5º).
O Relator omite ainda as diligências efectuadas a partir do Gabinete do Ministro da Presidência a 5 de Dezembro de 1995, imediatamente a seguir à reunião tida com a Eurominas em 29 de Novembro de 1995.
Quesito 5, página 37 - o Relator assenta a sua resposta nas declarações prestadas por Dr. Bernardo Alegria, Dr. António Vitorino e Dr. Jorge Dias, ignorando questões relevantes constantes nos documentos disponíveis e contradições latentes entre estes e os depoimentos prestados.
Logo no parágrafo 1º a seguir ao quesito diz o relator "(...) poder inferir-se que o acordo de transacção celebrado entre a Eurominas e a EDP foi impulsionado por aquelas entidades no seio do grupo de trabalho interministerial criado, em Maio 1996, sob os auspícios da Presidência do Conselho de Ministros para a resolução do litígio, contando, naturalmente, com o patrocínio do Governo (…)".
Ora, os factos que os documentos evidenciam vão no sentido de diligências efectuadas e compromissos assumidos muito antes da criação do grupo de trabalho interministerial, como se demonstra na resposta ao quesito 8 do relatório final alternativo.
Com efeito "(...) saber o ponto da situação com a EDP via Secretário Estado da Energia da negociação de indemnização a arbitrar à empresa" foi uma das acções resultantes da reunião de 29 de Novembro de 1995 como se refere em "memorando" de 7 de Maio de 1996, referindo-se no mesmo que "(...) teve lugar uma reunião, em 25 de Março, com o Dr. Saldanha Bento (…) tendo ficado a EDP de apresentar uma proposta de resolução do contencioso através da compra das infra-estruturas eléctricas de alta tensão da Eurominas (…)" e que a o acordo tem em conta "(…) a vontade política de resolução do problema (…)" vontade política que não é, naturalmente, da EDP.
Perante estes factos que o Relator não desconhece se alguma coisa se pode inferir é que os depoimentos prestados à Comissão não têm correspondência com a documentação disponível e que o acordo EDP-Eurominas tem a sua origem na vontade de um acordo extrajudicial manifestado pela Eurominas ao Ministro da Presidência em Outubro de 1995 e que quando é formado o Grupo de Trabalho interministerial em Maio de 1996 já o desenho do acordo havia sido estabelecido na sequência das diligências feitas a partir do Gabinete do Ministro da Presidência.

Capítulo III - Reversão (6 a 12)
Quesito 6, página 38 - pela sua natureza, e como sempre defendemos este quesito tem enquadramento mais adequado no Capítulo I pelo que é nos quesitos 3 e 4 do relatório final alternativo que o mesmo encontra resposta adequada.

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Importa, no entanto, relevar que, ao contrário do que se pode inferir dos parágrafos 1º e 2º a seguir ao quesito, em que o relator refere a data de 8 de Agosto de 1986 data em "(...) a EDP interrompeu o fornecimento de energia eléctrica (…)" (parágrafo 1º) e que "Inconformada, a Eurominas não aceitou a denúncia feita pela EDP (…)" (parágrafo 2º) que a denúncia do contracto foi feita em 1 de Março de 1982 e não em 1986 e que essa denúncia atempada do contrato pela EDP não mereceu contestação da Eurominas como já se referiu.
É, aliás, significativo, como o Relator refere, que só cinco anos depois de denunciado o contrato e nove meses depois do corte de energia a Eurominas apareça em 31 de Maio de 1987 a contestar a denúncia do mesmo com o parecer que encomendou e pagou ao Professor Antunes Varela.
Quesito 7 - a resposta ao quesito 7 encontra-se na resposta ao quesito 10 do relatório final alternativo.
Quesito 8 - encontra-se igualmente respondido na resposta do quesito 10 do relatório final alternativo.
Importa, no entanto, dizer que, se é verdade como afirma o relator no parágrafo 1º, "(...) que a reafectação (…) poderia ter sido alcançada por outras vias, nomeadamente através do instituto jurídico da expropriação por utilidade pública" não é menos verdade que, no caso em apreço, não faz sentido invocar tal instituto, pois, como se demonstrou nas respostas ao Capítulo I, estamos perante uma situação de reversão consagrada legal e contratualmente como regime sancionatório por incumprimento do objecto que justificou a desafectação.
O que seria inaceitável era o Estado recorrer à requisição ou expropriação por utilidade pública que, como já se referiu, obrigaria, face à Constituição da República Portuguesa, ao pagamento de uma indemnização em vez de decretar a reversão que, como muito bem demonstra o Professor Sérvulo Correia, não implica obrigatoriamente qualquer indemnização, ao contrário do que pretende o Relator no último parágrafo da página 44 quando diz que "(…) ao exercício do direito de reversão deve estar associado, sob pena de configurar um confisco, o direito a uma justa compensação, nos termos dos princípios expressos na Constituição (…)".
Também não é aceitável que o relator pretenda, como o faz no penúltimo parágrafo da página 44, não caber no âmbito da Comissão a resposta à pergunta sobre se a reversão foi a melhor opção para depois acabar afirmando: "Pode, assim, concluir-se que o recurso à reversão, associado ao arbitramento de uma indemnização à Eurominas, afigura-se uma solução conforme e equitativa à luz dos factos e do direito", como consta no último parágrafo relativo a este quesito.
Trata-se de uma conclusão abusiva e que em nosso entendimento não tem sustentação.
À luz dos factos e do direito o que é de muita duvidosa legalidade é o pagamento de uma indemnização por um bem que, pelo Decreto n.º 14/95, de 22 de Maio, nunca revogado, já era propriedade do domínio público marítimo.
Quesitos 9, 10 e 11 - a resposta a estes quesitos está consubstanciada nas respostas 4, 5 e 10 do relatório final alternativo que contrariam as teses e conclusões expressas pelo relator, designadamente no quesito 9, no 4º parágrafo da página 47 e no último parágrafo referente ao quesito na página 50.
Invocar dúvidas anteriores à aprovação do Decreto n.º 14/95 e depoimentos dos defensores da solução extrajudicial, ignorando pareceres e opiniões contrárias como as expressas por diversos assessores e sobretudo pelo parecer do Professor Sérvulo Correia, como faz o relator para tentar justificar teses nunca demonstradas como as referidas no parágrafo anterior não só descredibilizam o relatório que apresentou como denotam a sua excessiva preocupação de justificar as opções e decisões tomadas pelo XIII e XIV Governos.
Quesito 12 - a resposta a este quesito está dada na resposta 10 do relatório final alternativo.

Capítulo IV - Resolução de conflitos (13 a 25):
Quesito 13 - a resposta a este quesito está dada no número 10 do relatório final alternativo.
Atente-se, no entanto, nas seguintes imprecisões e contradições constantes na resposta ao quesito 13: no parágrafo 1º da página 58 diz-se "De acordo com o Sr. Deputado António Vitorino, a empresa apresentou uma exposição ao Primeiro-Ministro (…)" quando, na verdade, a exposição foi dirigida ao Ministro da Presidência António Vitorino e ao Ministro do Equipamento. No parágrafo 1º da página 59 diz-se, nas palavras do Sr. Deputado António Vitorino, "(…) Essa proposta era centrada no objectivo fundamental de recolocar a Eurominas em laboração. E tinha como objectivo a resolução do contencioso com a EDP através de um acordo sobre o destino a dar a uma subestação instalada no terreno da Eurominas (…), ou seja, a Eurominas pretendia vender a subestação que era essencial para assegurar o seu objectivo fundamental que era recolocar a Eurominas em laboração".
Finalmente, atente-se na afirmação contida no mesmo parágrafo, também do Sr. Deputado António Vitorino, "(…) nessa reunião de Maio de 1996, ficou entendido que, quanto ao contencioso sobre o decreto de reversão, se deveria remeter a respectiva decisão para os tribunais. E no caso de a decisão dos tribunais ser desfavorável à Eurominas, o processo obviamente terminaria aí, no caso da decisão ser favorável à Eurominas, ter-se-ia que considerar, como decorrência, aliás, da própria decisão judicial, a utilização da figura da expropriação por utilidade pública, para que a Administração do Porto de Setúbal pudesse tomar posse dos terrenos e do cais que, na altura, eram detidos pela Eurominas". Trata-se de uma afirmação da maior importância, pois entra em contradição com as teses de que Eurominas sairia ganhadora do processo, que o Decreto n.º 14/95 seria inconstitucional ou que não poderia haver reversão sem indemnização porque isso

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prefiguraria um confisco, argumentos recorrentes dos defensores da solução extrajudicial como a melhor solução. Porque decerto quando se decidiu deixar aos tribunais a decisão era porque havia a convicção de que a Eurominas não iria sair ganhadora do processo já que se assim não fosse havia a consciência de que o Governo teria que recorrer à expropriação e esta tornava obrigatória a indemnização que seria sempre superior à resultante de uma reversão. Assim sendo, só se poderá admitir que a decisão de deixar a resolução para os tribunais partiu do pressuposto de que a Eurominas sairia perdedora do processo, como, aliás, era convicção de muitos dos juristas que participaram no processo e como consta do parecer do Professor Sérvulo Correia, o que quer dizer que o Estado, nesta circunstância não teria que pagar qualquer indemnização pela reversão dos terrenos e respectivas benfeitorias.
Quesito 14 - a resposta a este quesito é dada no número 11 do relatório final alternativo.
Não se pode, no entanto, deixar de chamar a atenção para as afirmações do Dr. Jorge Dias, Chefe do Gabinete do Ministro da Presidência.
Referindo apenas as que o Relator reproduz no seu relatório importa, desde logo, a afirmação contida no parágrafo 3º da página 60 em que declara, ainda que atribuindo a afirmação ao Dr. Bernardo Alegria, "(…) indo haver uma solução ou admitindo-se que podia haver uma solução, digamos, negociada, não litigiosa, os bancos terem alguma compreensão, aguardarem, como é normal". Depois o facto de omitir inicialmente as suas próprias diligências junto do BPA e negar ser sua a expressão "acalmar a banca" para uma vez confrontado com o seu manuscrito assumir ter contactado o BPA.
Não se pode deixar de sublinhar, como consta do relatório final alternativo que "(...) como está documentado em acta de 7 de Maio de 1996 e em outra documentação cuja autoria foi assumida pelo Chefe de Gabinete do Ministro da Presidência, Dr. Jorge Dias, da reunião de 29 de Novembro de 1995 resultaram as seguintes acções: - 'Acalmar' a Banca; informar o Ministro do Equipamento Social sobre a hipótese de reversão da concessão para exploração do terminal portuário; saber o ponto da situação com a EDP (…); informar o Secretário Estado da Cooperação sobre o interesse de transferir o equipamento para instalação de uma refinaria em Angola".
Sublinhe-se ainda que é na sequência das acções desenvolvidas pelo Gabinete do Ministro da Presidência que "foi contactado o BPA (em 5 de Dezembro) que ficou de propor moratória. Os resultados foram segundo ofício da Eurominas, de 31 de Janeiro de 1996, dirigido ao Ministério da Presidência "(...) na passada semana para chegar a um acordo de princípio de uma nova moratória".
Sublinhe-se ainda que sem esta nova moratória a Eurominas estava condenada à falência.
Face ao atrás referido a conclusão contida no último parágrafo deste quesito não nos parece correcta, na medida em que os testemunhos e documentos disponíveis o que mostram é que houve acções desenvolvidas ainda no ano de 1995 a partir do Gabinete da Presidência do Conselho de Ministros, que algumas das acções mais polémicas e pertinentes foram desenvolvidas pelo Chefe de Gabinete do Ministro António Vitorino, Dr. Jorge Dias, que este último daria conhecimento ao Ministro da Presidência Dr. António Vitorino do fundamental mas que, pelas declarações de ambos, o Dr. António Vitorino não sabia nada das diligências do seu Chefe de Gabinete, como consta da sua peremptória afirmação "não fiz, não mandei, não autorizei, não tenho conhecimento de qualquer iniciativa do meu gabinete sobre essa matéria".
Quesito 15 - a resposta a este quesito é dada no número 11 do relatório final alternativo.
Importa, no entanto, sublinhar contradições evidentes que constam no relatório do relator.
Nas afirmações do Dr. António Vitorino, transcritas pelo Relator, pode ler-se, na página 63, parágrafo 2º, que "(...) o Primeiro-Ministro pediu ao Ministro da Presidência que (…) assegurasse a coordenação interministerial (…)" e prossegue o Relator "Ou seja, a posição do XIII Governo Constitucional de procurar uma solução extra-judicial para os litígios entre a Eurominas e o Estado e a EDP foi tomada pelo Primeiro-Ministro António Guterres, após análise da avaliação preliminar efectuada pelo Ministério da Presidência".
Para esta tomada de posição também contribuiu outro condicionalismo, nomeadamente, e como foi explicado pelo Sr. Deputado António Vitorino: "(…) adiciona-se uma questão que refiro porque tem algum melindre de natureza política, na medida em que, em Julho de 1996, no decurso de uma visita a Portugal do Vice-Presidente da União Sul Africana, Thabo Mbeki, foi referenciado este litígio (…)".
Ora, a verdade dos factos é que já em 1995 se desenvolviam diligências e se admitia a solução extrajudicial, em Maio de 1996 já havia o grupo de trabalho e conclusões deste nesse mesmo sentido, pelo que a conversa com Primeiro-Ministro com o Vice-Presidente Thabo Mbeki não pode ser invocada como factor que explique as opções do Governo, como faz o Relator na medida em que a mesma só teve lugar em Julho de 1996.
O mesmo se pode dizer da afirmação do Sr. Deputado José Lamego, referida pelo Relator, em que este afirma, página 64, parágrafo 2º, "Houve, portanto, pela primeira vez, a sensibilização política do Primeiro-Ministro, por via do Vice-Presidente Thabo Mbeki, que lhe colocou o problema do confisco de activos de uma empresa (…)"
Não se pode, assim, aceitar a conclusão do Relator de que "Foi neste contexto que, em Maio de 1996, foi constituído um grupo de trabalho interministerial (…)", como consta do último parágrafo do quesito.
Quesito 16 - a resposta a este quesito é dada nos n.os 12 e 17 do relatório final alternativo.
A conclusão do Relator, constante no último parágrafo do quesito na página 65, de que "O possível acordo entre as partes a que se poderia chegar no âmbito dos trabalhos deste grupo de trabalho interministerial não era vinculativo para as partes, como se pode verificar pela redacção da cláusula IV do referido protocolo de 8

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de Abril de 1998 assinado pelo Estado e a Eurominas, a saber: as conclusões das discussões do grupo de trabalho não vinculam as partes nem constituem qualquer tomada de posição em concreto sobre a questão em análise" é uma conclusão que não corresponde à realidade dos factos pois, como se demonstra no n.º 17 do relatório final alternativo, "Pela documentação existente e declarações prestadas à Comissão pode concluir-se que, ao contrário do afirmado por vários dos subscritores do Protocolo de 1998, que declararam não ter o referido protocolo vinculado o Estado ao pagamento de qualquer indemnização, foi este, à posteriori, invocado e aceite pelas partes - Governo e Eurominas - como o documento que vinculou o Estado à obrigação de indemnizar a Eurominas, não obstante o desacordo verificado no seio do grupo de trabalho, que levou à sua dissolução e remissão do processo da Secretaria de Estado da Presidência para a Secretaria de Estado da Administração Portuária".
Este facto está claro quer na carta de 19 de Março de 2000, do Dr. António Lamego em nome da Eurominas, quer no Memorando n.º 03/FS/00, do Gabinete do Secretário de Estado da Administração Marítima e Portuária, onde se pode ler no ponto 4 "(...) foram restabelecidos contactos com os representantes legais da Eurominas (Dr. José Lamego) no sentido de negociar o quantum da indemnização que o Estado, por protocolo entretanto celebrado com Eurominas em 31 de Março de 1998, aceitou pagar os terrenos e benfeitorias de modo a pôr termo aos litígios existentes"; e no ponto 7 "(...) mantém-se o diferendo entre aquela empresa e a APSS, nomeadamente sobre o montante exacto que, a título de indemnização, o Estado se comprometeu (e deve) pagar pela reversão dos terrenos e pelas benfeitorias (…)".
Quesito 17 - a resposta a este quesito é dada no n.º 14 do relatório final alternativo.
Quesito 18 - resposta a este quesito é dada no n.º 15 do relatório final alternativo.
A resposta do Relator a este quesito é de todo inaceitável pois em nada corresponde aos factos relevantes constantes da documentação existente nem reflecte nada do que se passou na audição do Sr. Juiz Conselheiro Luciano Patrão.
Quer por omissão quer pelo que escreve, o Relator revela mais uma vez não ser isento e objectivo no relatório que apresenta à Comissão.
Com efeito, e como consta na resposta ao quesito n.º 15 do relatório final alternativo, "No grupo de trabalho manifestaram-se desde o início profundas divergências quanto à consideração das rubricas a considerar à luz do protocolo e, consequentemente, em relação aos respectivos valores, pois, conforme consta no Comentário da parte representante do Estado à informação-proposta de 12 de Julho de 1999 do presidente do grupo de trabalho e este confirma na sua proposta, enquanto os representantes do Estado na sua proposta de 14 de Janeiro de 1999 consideravam (...) apenas a componente imobiliária (terreno e edificações) que eventualmente pudesse vir a ter utilização futura na actividade portuária, no montante de 1.143.000 contos, a Eurominas, por sua vez, socorrendo-se de uma avaliação efectuada por uma empresa que consultou, a Euromarítima - Consultores Técnicos e Projectos Navais, Lda, formulou uma proposta que, em síntese, atribuía ao imobiliário o valor de 3.503.000.000$00 e ao equipamento, o de 1.052.500.000$00".
Ao incluir por sua iniciativa, e sem que para tal tenha sido mandatado, na sua informação-proposta de 12 de Julho de 1999, todo o terreno, todas as construções e benfeitorias e os equipamentos, o presidente do grupo de trabalho extravasou claramente o estatuído pelo protocolo, como, aliás, contestaram os representantes do Estado em 17 de Setembro de 1999 no seu comentário "à informação-proposta de 12 de Julho de 199 apresentada por aquele."
No seu relatório o Relator não responde a esta pertinente questão de acordo com a documentação disponível e com as declarações prestadas na Comissão.
Na verdade, o que resulta da documentação e das declarações do presidente do grupo de trabalho à Comissão é que este adoptou no fundamental os critérios da Eurominas e os valores propostos pela Euromarítima de onde, como afirmou, retirou grande parte dos elementos que lhe serviram de base para as conclusões a que chegou.
Por outro lado, resulta clara a contradição entre a repetida afirmação do presidente do grupo de trabalho de que a proposta apresentada pela Eurominas "(...) não mereceu grandes observações da parte do Estado (…)" ou que "(…) não houve grande oposição (…)", como declarou à Comissão, ou ainda "como a generalidade dos valores constantes do relatório apresentado pela Eurominas não mereceu reparos de vulto (…)" como escreveu no ponto 13 da sua informação-proposta e o que afirmam, em sentido contrário, os representantes do Estado no referido grupo de trabalho no seu comentário.
Isto mesmo é reconhecido pelo presidente do grupo de trabalho na sua informação proposta quando afirma, no ponto 9, "Dada a disparidade de valores e a dificuldade sentida na obtenção de qualquer consenso, face à irredutibilidade das partes (…)" ou quando afirmou perante a Comissão "É que as partes estavam com dificuldade de entendimento e permanentemente contrariavam as posições que sucessivamente iam sendo tomadas por outra parte".
Quesito 19 - a resposta a este quesito é dada no n.º 16 do relatório final alternativo.
Também na resposta a este quesito o relator omite o "Comentário da parte representante do Estado à informação-proposta de 12 de Julho de 1999 do presidente do grupo de trabalho" em que estes, como consta no relatório final alternativo, afirmam designadamente:

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"(...) a idoneidade do relatório elaborado pela Euromarítima foi, desde logo, questionada pela parte representante do Estado por se tratar de mera cópia, aqui e ali alterada, da avaliação encomendada pela Administração dos Portos de Setúbal e Sesimbra (APSS) à American Appraisal Portuga (…)";
"Crê antes a parte representante do Estado que, dada a natureza desta questão, se imporá uma investigação séria, levada às últimas consequências, afim de se apurarem as responsabilidades no caso e eventuais intenções menos transparentes por parte dos seus autores e responsáveis";

Importa ainda dizer que, ao contrário do que afirma o relator no parágrafo 4º da página 68, quando afirma em relação à proposta de indemnização à Eurominas apresentada pelo Dr. Juiz Conselheiro Jubilado Luciano Patrão, que "No entanto, a mesma não foi aceite por nenhuma das partes (…)" a Eurominas manifestou a sua concordância com a mesma. Tal facto está cabalmente demonstrado no relatório final alternativo onde se pode ler "(...) que, ao contrário do que afirma o relator no seu relatório sobre a proposta apresentada pelo presidente do grupo de trabalho no sentido de que (…) a mesma não foi aceite por nenhuma das partes (…) a Eurominas considerou-a através dos seus representantes em 6 de Setembro de 1999 (…) em termos globais, uma proposta que julgamos equilibrada e justa e em 19 de Março de 2000 reafirma a sua aceitação considerando em concreto que (…) Só a irredutibilidade do representante da Direcção-Geral do Património impediu a progressão das negociações no sentido de um acordo balizado pela proposta conciliatória do presidente do grupo de trabalho, Juiz Conselheiro Luciano Patrão pois (…) a Eurominas, SA, manifestou disponibilidade para um acordo com base nos parâmetros da proposta conciliatória apresentada pelo Juiz Conselheiro Luciano Patrão".
Quesito 20 - este quesito encontra resposta no n.º 17, sendo de relevar o facto de que, ao contrário do que afirma o relator, no parágrafo 1º da sua resposta ao quesito, a iniciativa partiu da Eurominas e não do Secretário da Administração Marítima e Portuária como está documentalmente comprovado.
Quesito 21 - este quesito encontra resposta no n.º 18 do relatório final alternativo.
Ao contrário do que afirma o Relator no parágrafo 1º da sua resposta ao quesito, os comentários dos representantes do Estado no grupo de trabalho nem sempre mereceram a devida atenção. Como se afirma na resposta de relatório final alternativo, "A documentação disponível e as respostas prestadas pelos depoentes às questões colocadas pelos Deputados no âmbito das audições em Comissão sobre esta matéria, permitem concluir que nem sempre lhes foi dada a atenção devida por parte dos decisores políticos, sobretudo tendo em conta a gravidade de algumas delas, situação tanto mais estranha quanto se tratavam de considerações feitas por membros por eles nomeados e em sua representação".
Tenha-se, por exemplo, em conta a opinião expressa pelos representantes do Estado no grupo de trabalho no seu "Comentário (…) à informação-proposta de 12 de Julho de 1999 do presidente do grupo de trabalho", quer no que concerne aos valores que defenderam e os considerandos que fizeram a contrariar a proposta apresentada pelo presidente do grupo de trabalho quer em particular quando consideram que "(...) se imporá uma investigação séria, levada às últimas consequências, a fim de se apurarem as responsabilidades (…)" no que se refere à idoneidade do relatório elaborado pela Euromarítima que, como já se referiu, serviu de base ao presidente do grupo de trabalho para determinar os valores a pagar à Eurominas.
Quesito 22 - este quesito encontra resposta no n.º 20 do relatório final alternativo, não merecendo qualquer comentário especial.
Quesitos 23, 24 e 25 - estes quesitos encontram resposta no n.º 19 do relatório final alternativo, merecendo apenas a afirmação contida no penúltimo parágrafo da página 73, onde se afirma que, "O Juiz Conselheiro fez uma avaliação nesta matéria que eu acho que foi equilibrada, que fixava este valor na casa dos 800.000 contos" e que nada tem a ver com a opinião dos técnicos que representavam o Estado no grupo de trabalho e que respondem a esta questão de forma bastante circunstanciada afirmando, designadamente, como se refere no n.º 16 do relatório final alternativo:

"Contrariamente ao que parece resultar (…) da proposta do presidente do grupo de trabalho, nunca a parte representante do Estado qualificou os terrenos em causa como bens no pleno domínio do comércio jurídico, livres de ónus naturais ou de quaisquer limitações especiais, com vocação e potencialidades generalistas idênticas às da propriedade privada plena";
"Importa (…) sublinhar que qualquer caracterização que se faça dos terrenos terá sempre que ter em conta o facto de 614.325 m2 dos 863.325 m2 desafectados ao domínio público marítimo - isto é, mais de 2/3 da sua área - ainda se manterem como sapal";
"Atentas a natureza e vocação exclusivamente portuária (ou similar) dos terrenos defendidas pelo presidente do grupo de trabalho (…) não se afigura possível uma interpretação ampla da Cláusula Primeira do Protocolo relativamente ao conceito de benfeitorias, como aduzido (…)".

Capítulo V - Conclusão:
Quesito 26 - este quesito encontra resposta nos n.os 13 e 20 do relatório final alternativo.
A resposta do relator não merece a nossa concordância, na medida em que, tal como se afirma no n.º 20 do relatório final alternativo, "ao alterar a orientação assumida pelo XII Governo Constitucional em vez de

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assumir a concretização da reversão de acordo com o Decreto n.º 14/95, de 22 de Maio, o XIII Governo não acautelou os interesses do Estado, na medida em que, aos atrasos já existentes na aplicação da reversão, que deveria ter tido lugar em Agosto de 1986 ou no máximo em 1991, data em que terminam todas as actividades da empresa, veio acumular novos atrasos. Com efeito, o processo seguido após a publicação do Decreto n.º 14/95 arrastou-se por mais seis anos sem que daí tenham advido quaisquer benefícios para o Estado, ficando por demonstrar que o prosseguimento da via judicial não teria sido mais rápida e benéfica para o interesse público.
Em contrapartida, a Eurominas conseguiu através do processo extrajudicial iniciado em Novembro de 1995, sob a direcção do Gabinete da Presidência do Conselho de Ministros, evitar a falência eminente através de uma moratória da banca, suspender durante seis anos a execução do Decreto n.º 14/95 e usar em seu benefício o cais da Mitrena nesse mesmo período desenvolvendo no mesmo, com os respectivos dividendos, actividades que lhe estavam vedadas, suspender a decisão do Supremo tribunal Administrativo sobre a acção por si requerida no sentido da anulação do Decreto n.º 14/95 e que com grande probabilidade poderia perder, vender ou transferir para o estrangeiro todo o equipamento com algum valor e que a Eurominas avaliava em 1.052.500.000$00, resolver a sua dívida para com a EDP, no valor de 4.486.920.532$50 e receber mais 400 mil contos pelo acordo firmado, e ainda receber do Estado mais 2.384.861.000$00 a título indemnizatório o que perfaz, só nas três últimas rubricas um ganho total de 8.324.261.532$50".

C - Conclusões

Tendo presente o exposto no relatório final alternativo e as considerações feitas na presente avaliação as conclusões apresentadas pelo Relator não podem globalmente ser consideradas justas, isentas e objectivas porque não traduzem, em nosso entender, o que foi o processo Eurominas.

A presente avaliação ao relatório final apresentado pelo Relator à Comissão constitui um anexo complementar ao relatório final alternativo apresentado pelos Deputados José Soeiro e Jorge Machado.

Assembleia da República, 14 de Março de 2006.
Os Deputados do PCP: José Soeiro - Jorge Machado.

Requerimento

Considerando:

- A discussão realizada na Comissão Parlamentar de Inquérito à Gestão do Processo Eurominas e a manifesta e assumida indisponibilidade do Deputado Relator para rever o conteúdo do relatório que apresentou a esta Comissão;
- A divergência profunda em questões nucleares do processo Eurominas entre a leitura do mesmo, feita pelo Deputado Relator no seu relatório, e aquela que defendemos e fundamentamos no relatório final alternativo, apresentado em 7 de Março de 2006, e a avaliação do relatório final e justificação do relatório final alternativo, entregue na Comissão em 14 de Março de 2006;
- Que se mantêm os pressupostos que justificam, em nosso entender, o voto contra o relatório final do Deputado Relator e a adopção do relatório final alternativo como relatório final da Comissão;
- A manifesta contestação por parte de todos os partidos da oposição (PCP, PSD, CDS-PP e BE) do relatório final apresentado pelo Deputado Relator.

Os Deputados abaixo assinados requerem a submissão a votação do relatório final alternativo, apresentado à Comissão, em alternativa ao relatório final apresentado pelo Deputado Relator.

Assembleia da República, 16 de Março de 2006.
Os Deputados do PCP: José Soeiro - Jorge Machado.

Declaração de voto apresentada pelos Deputados do CDS-PP

O Grupo Parlamentar do CDS-PP votou contra o relatório final da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) à Gestão do Processo Eurominas, fundamentalmente pelas razões que passa a enumerar.

1 - Tratou-se, em primeiro lugar, de uma oportunidade perdida.
Esta Comissão teve nas suas mãos a oportunidade de demonstrar ao Parlamento e ao País que as comissões parlamentares de inquérito podem efectivamente funcionar, podem efectivamente cumprir as suas funções de instrumento parlamentar de controlo da acção do Governo.
O Partido Socialista teve nas suas mãos a oportunidade de demonstrar, ao Parlamento e ao País, que não iria abusar da maioria parlamentar para conduzir esta Comissão exactamente ao resultado que lhe convinha.

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Os Deputados do CDS-PP e dos restantes grupos parlamentares da oposição empenharam-se em alcançar o primeiro daqueles objectivos, mas foram os Deputados do Partido Socialista que alcançaram o segundo: impuseram um único relator do seu próprio grupo parlamentar, negaram a realização de audições que toda a oposição entendia necessárias ao completo esclarecimento da verdade e obstaculizaram até a requisição de documentos igualmente importantes para a descoberta da verdade.
2 - Em segundo lugar, figuram entre as audições negadas pelo Partido Socialista as de entidades essenciais para o esclarecimento da verdade.
Foi matéria consensualizada em sede de CPI - e, consequentemente, vertida para os quesitos a responder - que a ruptura contratual da CPE/EDP com a Eurominas constitui o elemento que objectivamente conduziu ao não cumprimento por parte da Eurominas dos compromissos que levaram à desafectação dos terrenos.
Teria sido essencial ouvir a posição dos responsáveis da EDP.
O Partido Socialista negou!
Foi igualmente debatida, em sede de CPI, e na sequência do vasto acervo documental remetido aos membros da Comissão, a posição da APSS em todo este processo, que oscilou entre a constante insistência pela desafectação dos terrenos da Eurominas e a sua efectiva execução e entrega à APSS e uma mudança de posição que chegou a ser classificada de "capitulação" (depoimento do Dr. Aragão Pinto, prestado no dia 9 de Fevereiro perante a CPI).
Teria sido de todo o interesse ouvir o que os responsáveis da APSS, à data dos factos, tinham a dizer sobre o assunto.
O Partido Socialista negou!
Por último, da documentação remetida aos membros da Comissão resulta que os representantes do Estado no grupo de trabalho criado em cumprimento do determinado no protocolo celebrado de 8 de Abril de 1999 não concordaram com os fundamentos da avaliação, feita pelo presidente do grupo de trabalho, da quantia indemnizatória a pagar à Eurominas, por considerarem tal avaliação extremamente subjectiva.
Teria sido essencial a audição dos representantes do Estado.
O Partido Socialista negou!
Com efeito, num processo em que era essencial apurar se a determinação do quantum a pagar teria, ou não, sido o mais correcto, o Partido Socialista negou, pasme-se, a audição do único avaliador representante do Estado.
3 - A terceira razão para o voto contra do CDS-PP prende-se com o facto de a actuação da tutela e dos responsáveis políticos à data dos factos não ter sido clara, assistindo-se mesmo, no decurso dos depoimentos que foram prestados na CPI, a um "passar de culpas" muito pouco digno das responsabilidades governativas que os depoentes assumiram.
O Dr. António Vitorino, Ministro da Presidência até Novembro de 1997, garantiu que não propôs nenhuma solução indemnizatória para o litígio que se arrastava há mais de 10 anos. No entanto, o Dr. Vitalino Canas, que foi Secretário de Estado da Presidência do Conselho de Ministros e assumiu a coordenação deste processo a partir de Novembro de 1997, assegura que a primeira vez em que se fala da possibilidade do acordo indemnizatório em documentos do Ministério do Equipamento e da Presidência do Conselho de Ministros é em 1996 e 1997 - portanto, quando o Dr. António Vitorino é Ministro da Presidência.
Não podemos deixar, contudo, de referir que o relatório atribui a responsabilidade pela opção pela via da indemnização ao Dr. António Vitorino: "(…) das declarações prestadas à Comissão de Inquérito pelo Dr. Bernardo Alegria, pelo Sr. Deputado António Vitorino e pelo Dr. Jorge Dias, pode inferir-se que o acordo de transacção celebrado entre a Eurominas e a EDP foi impulsionado por aquelas entidades no seio do grupo de trabalho interministerial criado, em Maio de 1996, sob os auspícios da Presidência do Conselho de Ministros, para a resolução do litígio (…)".
4 - Não obstante a dificuldade em proceder a diligências probatórias, é possível afirmar que os representantes do Estado não agiram com a diligência a que estavam obrigados.
Prova disso é o facto dos vários responsáveis governativos que tinham a condução e participação no processo, entre os quais o Dr. Vitalino Canas, Secretário de Estado da Presidência do Conselho de Ministros, e o Eng.º Consiglieri Pedroso, SEAMEPAT não terem procedido à investigação solicitada pela parte representante do Estado no grupo de trabalho criado pelo protocolo de 8 de Abril de 1998, a qual, no documento que elaborou em 17 de Setembro de 1999, expressamente advertiu que "(..) a idoneidade do relatório elaborado pelo Euromarítima foi, desde logo, questionada pela parte representante do Estado por se tratar de mera cópia, aqui e ali alterada, da avaliação encomendada pela Administração dos Portos de Setúbal e Sesimbra (APSS) à American Appraisal Portugal - Consultores de Avaliação, Lda. (a American Appraisal)" e, em consequência, pronunciou-se expressamente no sentido de que "(…) dada a natureza desta questão, se imporá uma investigação séria, levada ate às últimas consequências, a fim de se apurarem as responsabilidades no caso e eventuais intenções menos transparentes por parte dos seus autores e responsáveis, documento designado Comentários dos representantes do Estado à proposta apresentada pelo presidente do grupo de trabalho - o que nunca veio a acontecer!
Negligente também foi a acção de definição do montante indemnizatório a pagar à Eurominas, realizada pelo Dr. José Junqueiro, Secretário de Estado com a tutela da Administração Portuária, feita com base no trabalho produzido pelo presidente do grupo de trabalho criado no âmbito do protocolo de 1998, e que não

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teve em conta a contestação apresentada pelos representantes do Estado aos montantes defendidos. O montante final foi classificado pelo Eng.º João Cravinho, ex-Ministro do Equipamento, Planeamento e Administração do Território, como sendo "uma pipa de massa".
Na gestão de dinheiros públicos exige-se aos responsáveis políticos uma diligência e responsabilidade acima da média, e essa diligência não foi integralmente seguida neste processo.
5 - Em quinto lugar, há a referir que, no entendimento do CDS-PP, os representantes do Estado não defenderam convenientemente o interesse público, ao não determinarem a execução atempada da reversão.
O decreto de reversão apontava o prazo de 20 dias para a execução da reversão. A verdade é que esta reversão só veio a ser totalmente executada no ano de 2001.
Entendemos, da análise dos documentos e das audições produzidas, que os representantes do Estado não fizeram tudo o que estava ao seu alcance para executarem devidamente a reversão, com a consequente penalização do interesse do Estado.
A título de exemplo desta inacção, refira-se que não só a documentação existente nos autos (despacho do Secretário de Estado Adjunto do Ministro do Equipamento, Planeamento e Administração do Território de 22 de Junho de 1999) como o depoimento prestado pelo próprio ex-SEAMEPAT, Eng.º Consiglieri Pedroso, vão no sentido de que a reversão do terminal da Eurominas para a plena jurisdição da APSS deveria ser executada num prazo máximo de três meses. Contudo, nada de concreto foi feito para cumprir este despacho.
6 - Acresce, por fim, que o relatório se revela parcial e tendencioso e chega inclusive não referenciar documentos e depoimentos que constam do processo, e que são essenciais para o apuramento da verdade.
São exemplos destas omissões:

- Ignora totalmente o despacho referido no ponto anterior, explicado de viva voz pelo seu autor em Comissão;
- Ignora totalmente a audição do Dr. Aragão Botelho, nomeadamente quanto à alteração da posição da APSS;
- Ignora olimpicamente o teor e a existência do parecer subscrito pelo Prof. Sérvulo Correia e Dr. Matos Correia, jurisconsultos contratados pelo Estado que defendem uma posição diferente da expandida pelos responsáveis do XIII e XIV Governos Constitucionais;
- Não menciona o preço pelo qual foram avaliados os equipamentos que ficaram na posse da Eurominas aquando da transacção final, sendo certo que o Juiz Conselheiro Luciano Patrão avançou o valor de 1 052 500 contos, cuja fundamentação explicou no seu depoimento;
- Ignora os documentos provenientes do Ministério da Presidência, da autoria do Dr. Jorge Dias, ex-Chefe de Gabinete do Dr. António Vitorino, em que são referidas diligências de representantes do Gabinete da Presidência junto da Banca no sentido de a "acalmar" e de esta propor uma moratória à Eurominas, documentos que estão até em contradição com o depoimento prestado pelo Dr. Jorge Dias.

7 - O Partido Socialista mostrou ao longo de toda a CPI, e particularmente na discussão do presente relatório, uma postura de arrogância e de imposição da sua maioria, que se expressou bem no facto de não admitirem qualquer das sugestões, correcções ou aditamentos sugeridos pelos grupos parlamentares da oposição.
Não podemos aqui deixar de expressar o nosso veemente repúdio a esta forma de exercício do poder político, que é atentatória dos poderes dos Parlamentos de fiscalização da actividade política dos governos.
Entendemos, assim, que os Deputados do PS nesta CPI, com esta postura, prestaram um mau serviço ao Parlamento, um mau serviço à democracia e um mau serviço a Portugal

Palácio de São Bento, 16 de Fevereiro de 2006.
Os Deputados do CDS-PP: - Pedro Mota Soares - João Rebelo.

Declaração de voto apresentada pela Deputada Helena Pinto, do BE

O Bloco de Esquerda vota contra o relatório elaborado pelo Sr. Deputado Jorge Strecht e as conclusões por considerar que estas são incompatíveis com a missão desta Comissão de Inquérito e o dever de total esclarecimento do processo que foi objecto de análise.
Apresentámo-nos nos trabalhos desta Comissão sem juízos preconcebidos, com a consciência de que o total esclarecimento dos contornos do processo Eurominas só poderia ser do interesse de todos quantos agiram de boa-fé e movidos pela defesa do interesse do Estado.
Esse esclarecimento exigia:

- Determinar se a via extra-judicial foi o caminho que melhor acautelou a defesa do interesse público;
- A clarificação da fundamentação jurídica para o acordo extrajudicial com a Eurominas e a sua validade;
- O apuramento das razões políticas e jurídicas que estiveram na base da decisão de indemnizar a Eurominas;
- A avaliação dos critérios que foram utilizados na definição do valor da indemnização;
- A verificação da existência ou não de violações da legislação sobre titulares de cargos políticos por parte de representantes da Eurominas.

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Infelizmente, todo o trabalho desta Comissão ficou marcado pelo desejo do Partido Socialista de despachar o assunto da forma mais rápida e indolor possível.
Foi recusada a proposta de eleição de uma equipa de vários Deputados relatores, que tinha por objectivo assegurar uma maior isenção e qualidade no trabalho de elaboração do relatório final.
Não foram fornecidos inicialmente, pelo Governo, documentos que se mostraram essenciais, e outros foram mesmo recusados, quando o Partido Socialista votou contra os requerimentos que solicitavam mais documentação. Posição inexplicável no âmbito de uma Comissão de Inquérito.
A Informação n.º 37/96/MSS, do Ministério do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território (fornecida após requerimento do Bloco de Esquerda), que trazia em anexo uma informação da Administração do Porto de Setúbal e Sesimbra, que se revelou fundamental para a realização da audição com o seu representante, é por si só um exemplo.
Foram recusados pedidos de audição que decorriam do mais elementar bom senso e direito ao contraditório e solicitados por todos os partidos da oposição. Foi ouvido o representante da Eurominas, mas nenhum dos representantes da EDP, com responsabilidades neste processo. Não foi ouvido o representante da Direcção-Geral do Património no grupo de trabalho que tinha por objectivo definir o quantum da indemnização, sendo este a única pessoa com competências na área da avaliação. Ficou, assim, a Comissão privada de ouvir em audição um especialista nesta área.
Foram recusadas, no âmbito da proposta de quesitos, muitas das questões fundamentais que esta Comissão tinha o dever de abordar: a posição assumida durante todo o processo pela administração da APSS, o papel desempenhado durante todo o processo pelo Dr. José Lamego e o historial dos posicionamentos assumidos sobre esta questão pelos vários decisores políticos. Por isso também votámos contra os quesitos, incompletos e da responsabilidade de quem os aprovou.
Em suma, e sobre as questões substanciais:
O Estado ganhou em três instâncias o recurso interposto pela Eurominas no sentido da suspensão da eficácia do acto de reversão dos terrenos.
Em nome de que interesse se abandonou a via judicial, na qual o Estado somava ganho de causa em cima de ganho de causa?
Em nome de que interesse se ignoraram as várias posições e decisões que iam no sentido da resolução judicial do processo? Em nome de que interesse se ignorou a posição assumida pelos representantes do Estado no grupo de trabalho em relação ao valor da indemnização?
A ponderação entre os factores de risco de uma decisão e o tempo que os tribunais levariam a decidi-la determinariam que se optasse pela via extra-judicial? Estavam comprovadas as fortes probabilidades do Estado ser condenado a pagar uma indemnização ainda maior?
A nossa resposta, pelos documentos, informações e depoimentos a que tivemos acesso no âmbito da Comissão de Inquérito é: Não!
No relatório final não são valorizados os pareceres jurídicos, de assessores do governo e do Professor Sérvulo Correia, este último encomendado pelo Estado, que apontavam no sentido de optar pela via judicial. Pelo contrário são valorizados todos os pareceres encomendados e pagos pela Eurominas que, como é lógico, vão no sentido contrário.
Ficou comprovada a tese do confisco e a inconstitucionalidade do Decreto n.º 14/95 que determinou a reversão? Não, de modo nenhum e em qualquer circunstância!
A constitucionalidade do decreto nunca foi posta em causa e foi ao seu abrigo que a reversão se vem a efectivar em 2001.
Ficou explicado porque é que não se deu sequência ao despacho do Secretário de Estado Adjunto do Ministro do Equipamento que determinava a execução da reversão no prazo de dois meses?
Não!
Ficou explicado que o acto de reversão, mesmo depois de se ter chegado a acordo com a Eurominas teve várias peripécias e que o acto de reversão só foi de facto efectuado após a ordem de pagamento da 1.ª tranche da indemnização à Eurominas?
Não. É que é mesmo Não!
Agiu a Eurominas sempre com lisura durante todo este processo negocial? Não. Aliás o comportamento da Eurominas que utilizou todos os expedientes ao seu dispor:

- Acções em Tribunal,
- Pedidos de suspensão dessas mesmas acções quando isso era conveniente para as negociações (aos quais o Estado anuiu sempre);
- Propostas paralelas como o projecto de cooperação com Angola, muito importante no início mas que se esfumou no momento em que a indemnização é assumida no protocolo de 8 de Abril de 1998;
- Uma proposta de protocolo com a APSS para a utilização privativa do Cais;
- Assim como todas as peripécias que envolveram o acto de reversão;
- Evidenciam as fragilidades da sua credibilidade em todo o processo.

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De ressaltar que a Eurominas conseguiu ainda uma moratória junto da banca, que serviu os seus interesses enquanto empresa apesar de estar à beira da falência. Também este aspecto fica muito longe do seu total esclarecimento no relatório final e ficará como um episódio pouco digno das audições, e revelador da falta de respeito pelo Parlamento e pela opinião pública. As notas pessoais do Dr.º Jorge Dias, Chefe de Gabinete do Ministro António Vitorino, tornadas blindadas, deixam nesta oportunidade a razão para todas as dúvidas fundamentais. Quem escolheu o encobrimento não pode esperar elogio público.
Por tudo isto só podemos concluir que os interesses do Estado não foram devidamente acautelados. Dever-se-ia ter, por um lado, executado de imediato a reversão dos terrenos, e por outro, ter seguido a via judicial para a resolução do conflito com a Eurominas.
A leitura da responsabilidade política é a de que a Eurominas foi indevidamente beneficiada em prejuízo do erário público.
Este inquérito ficou marcado pela opacidade. Não se abriram todos os documentos, não se ouviram todas as pessoas.
A diferença entre este inquérito e uma farsa é que ficou pela comédia.

Palácio de São Bento, 16 de Março de 2006.
A Deputada do BE, Helena Pinto.

A Divisão de Redacção e Apoio Redacção.

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