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Quinta-feira, 10 de Dezembro de 2009 II Série-B — Número 19

XI LEGISLATURA 1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2009-2010)

SUMÁRIO Inquérito parlamentar n.o 1/XI (1.ª): Comissão Eventual de Inquérito Parlamentar à actuação do Governo em relação à Fundação para as Comunicações Móveis (apresentado pelo PSD).

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INQUÉRITO PARLAMENTAR N.º 1/XI (1.ª) COMISSÃO EVENTUAL DE INQUÉRITO PARLAMENTAR À ACTUAÇÃO DO GOVERNO EM RELAÇÃO À FUNDAÇÃO PARA AS COMUNICAÇÕES MÓVEIS

A FCM – Fundação para as Comunicações Móveis, é uma fundação de direito privado, constituída pelas operadoras de telecomunicações TMN – Telecomunicações Móveis Nacionais, SA, Sonaecom – Serviços de Comunicações Pessoais, SA, e Vodafone Portugal – Comunicações Pessoais, SA.
Esta fundação foi constituída em 11 de Setembro de 2008, tendo sido objecto de reconhecimento do Estado, através do Despacho n.º 28305-A/2008, de 4 de Novembro, do Secretário de Estado da Presidência do Conselho de Ministros.
Nos termos do n.º 1 do artigo 3.º dos respectivos estatutos, a FCM tem por objectivo dinamizar o uso de novas tecnologias e, designadamente a «promoção, desenvolvimento, generalização e consolidação do acesso às comunicações, em particular móveis, e, bem assim, garantir a ampla utilização das novas tecnologias de informação e comunicação, contribuindo para o desenvolvimento económico, sociale tecnológico de Portugal».
Estes mesmos estatutos prevêem ainda, no n.º 2 do seu artigo З.º que a fundação deve financiar ou subsidiar projectos definidos e promovidos pelo Estado Português, bem como financiar o acesso a computadores, incumbindo-lhe, também, ―conceder financiamento ou subsídios a quaisquer pessoas singulares ou colectivas e desenvolver, promover, financiar ou subsidiar quaisquer projectos, acções ou campanhas".
Como órgão de cúpula, a FCM dispõe de um Conselho Geral, composto por seis membros, três dos quais nomeados pelo Governo, incluindo o seu presidente. É ao Conselho Geral que incumbe, nomeadamente "definir e estabelecer as políticas gerais de funcionamento da FCM" e, bem assim, "designar e exonerar os membros do Conselho de Administração, bem como nomear o respectivo Presidente" [cfr. alíneas a) e e) do artigo 8.º].
A direcção superior da FCM cabe, deste modo e indiscutivelmente, ao Governo, apesar de se tratar de uma entidade formalmente com natureza jurídica privada.
No que se refere ao elemento patrimonial, verifica-se a maior incerteza a propósito dos financiamentos de que a FCM tem sido beneficiária, a qual não é dissipada pelo respectivo Relatório & Contas 2008, divulgado apenas há escassos dias.
Na verdade, se por um lado os estatutos da FCM prevêem, como dotação das três operadoras privadas instituidoras, o capital de 24,9 milhões de euros, por outro, a mesma instituição terá recebido, e ntre o final de 2008 e 2009, cerca 36,5 milhões de euros de fundos públicos, obtidos através da ANACOM.
Os valores referidos evidenciam que o financiamento público de que a FCM tem sido destinatária se revelou determinante para a prossecução da actividade desta entidade que era suposto ter um substrato privado.
Com efeito, o Estado criou diversas iniciativas através das quais foi distribuído cerca de um milhão de computadores a alunos de estabelecimentos de ensino portugueses (Programa e.escola e a Iniciativa e.escolinha).
Sucede que, ao invés de ser o Estado a fornecer, por si ou através de organismos públicos competentes, os referidos equipamentos informáticos, o Governo entendeu criar um artifício através do qual esse fornecimento é efectuado pelos operadores privados instituidores da FCM, os quais, para o efeito, e sem prejuízo do próprio financiamento, receberam já do Estado a quantia de 47,7 milhões de euros.
A questão que neste quadro assume a maior gravidade é, assim, a de o Estado, através de uma entidade privada fictícia, criada sob os seus auspícios e gerida por pessoas da sua confiança política, estar a contornar as disposições legais, nacionais e comunitárias, aplicáveis à contratação pública e, desse modo, a fugir ao controlo da utilização de fundos públicos.

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Com efeito, atento o número de computadores distribuídos, não oferece dúvida de que a despesa inerente à sua aquisição ultrapassa largamente os limites máximos legalmente definidos para a dispensa de concurso público.
Refira-se, aliás, que as dúvidas que os procedimentos adoptados pelo Governo a este respeito suscitam, constam, também, das conclusões preliminares do relatório do Comissário Europeu Charlie McCreevy, titular da pasta do Mercado Interno e Serviços.
Se o que acaba de se referir sempre se aplicaria à contratação pública, stricto sensu, o mesmo se poderá sustentar relativamente à obrigatoriedade de cumprimento dessas imposições legais no caso de financiamentos com fundos públicos.
Para este entendimento concorre, aliás, o próprio comunicado conjunto do Ministério das Obras Públicas, Transportes e Comunicações e das três operadoras móveis instituidoras da FCM, de 1 de Julho de 2009, quando reconhece que "A natureza jurídica de fundação de direito privado não dispensa a aplicação do Código dos Contratos Públicos e, consequentemente, as regras de contratação pública, na medida em que a FCM é considerada entidade adjudicante, nos termos do disposto no artigo 2.º, n.º 2, alínea a), daquele Código, uma vez que esta se encontra sujeita ao controlo de gestão por parte do Estado Português, qualificando-se, por esta razão, como organismo de direito público‖.
Acontece que, sem prejuízo do comunicado que se acabou de referir, o Governo, ao longo dos últimos meses, ora tem invocado a condição de fundação privada da FCM – quando se trata de justificar a não obrigação de realização de concurso público nas aquisições realizadas –, ora tem declarado que é o Estado que gere a FCM – para provar que os fundos públicos não estão entregues à gestão de privados.
Esta argumentação dúplice só acentua as dúvidas que, sobre a transparência de todo este processo, perpassam na sociedade portuguesa.
De facto, os adquirentes dos computadores Magalhães poderão ser formalmente operadores privados, mas a aquisição desses equipamentos é necessariamente efectuada a uma só empresa – a JP Sá Couto –, indicada pelo Estado, que definiu as características técnicas dos computadores, as quais são coincidentes com as dos fabricados por essa mesma empresa.
Além disso, mal se compreende que uma fundação de direito privado seja, de facto, efectivamente controlada pelo Governo, em particular no que concerne à respectiva direcção, gestão e funcionamento.
Quem o assume foi o próprio Governo quando, no ponto 5.º de um Comunicado do Ministério das Obras Públicas, Transportes e Comunicações, de 24 de Junho de 2009, referiu que "O Estado Português é responsável pela gestão da Fundação, designando, através do Conselho Geral, a totalidade dos membros do Conselho de Administração, disponibilizando instalações para o seu funcionamento e atribuindo verbas para cumprimento das obrigações de acção social assumidas pelo Estado no Programa e escola‖.
Neste contexto, já na passada Legislatura o Grupo Parlamentar do PSD não deixou de exercer as suas prerrogativas na fiscalização do Governo a propósito do caso da Fundação para as Comunicações Móveis, apesar das dificuldades então criadas pela anterior maioria socialista.
Importa realçar, aliás, que o anterior Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações afirmou na Assembleia da República, a 7 de Julho de 2009, que, até ao final desse mês, seriam divulgadas as contas da FCM, sendo certo que tal apenas sucedeu quatro meses depois do prometido.
Com efeito, o Relatório & Contas 2008, da FCM – Fundação para as Comunicações Móveis, apenas foi divulgado no sítio dessa entidade no final do passado mês de Novembro, não tendo о documento referido permitido pôr termo às dúvidas que se colocam sobre a justificação da existência daquela entidade e sobre o seu próprio modo de funcionamento.
Desde logo, não se vislumbra uma razão válida, do ponto de vista do respeito pelos princípios da legalidade e transparência administrativas, para que o Estado tenha criado uma entidade formalmente privada mas sob a sua direcção efectiva, a fim de desenvolver uma actividade que também ao Estado cumpriria prosseguir.

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Ademais, permanecem por explicar as verdadeiras razões que estiveram na origem da aquisição, por ajuste directo, à empresa JP Sá Couto, de centenas de milhar de computadores, ao invés de se ter recorrido ao concurso público, o procedimento exigível por força das leis da concorrência.
Esta opção do pretérito executivo torna-se particularmente incompreensível atento o facto de o Ministério da Educação ter anunciado, a 23 de Novembro de 2009, que o prosseguimento do programa de aquisição de novos computadores portáteis será efectuado através de concurso público internacional e já não por ajuste directo.
Com efeito, em face desta recente escolha pelo procedimento concursal, como explicar que o anterior Governo tenha determinado a aquisição por ajuste directo, de mais de um milhão de computadores, a uma determinada e específica empresa? Ainda no que concerne ao Relatório & Contas 2008 da FCM, o mesmo apresenta-nos um balanço sintético, como tal omitindo informação relevante para a avaliação correcta da respectiva actividade, designadamente com a aquisição de computadores portáteis. A informação disponibilizada pelo Relatório apresenta mesmo dados que suscitam especial perplexidade, como é o caso dos que a seguir, a titulo meramente exemplificativo, se realçam: • A opaca rubrica ‗Outros Custos e perdas', refere 321 mil euros sendo que a mesma representa 53,7% entre os custos registados; • A rubrica «Custo com Internet» ascende a 130 mil euros; • A rubrica «Consultores» atinge o montante de 83 mil euros; • O saldo da conta 'fornecedores' regista 211,5 mil euros de «fornecimentos com desenvolvimento de Site», 106 mil euros de «fornecimentos com eventos», 63 mil euros de «fornecimentos de advogados» e outros, num total de 437,5 mil euros; • Ausência de referência detalhada a fornecedores; • São referidos mas não explicados adiantamentos aos operadores ascendendo a 6,5 milhões de euros; • A FCM apresenta três administradores (com salários totais de 72 mil euros no período que funcionou) e três outros colaboradores, referindo a existência de recurso a 'consultores externos'.

Estes dados são tanto mais incompreensíveis quanto é certo que a FCM funcionou no ano de 2008 apenas quatro meses.
Sem prejuízo das dúvidas que adensam a existência e o funcionamento da FCM, está igualmente por clarificar qual a sua articulação com o Fundo para a Sociedade da Informação (FSI), criado em Junho de 2007 – com o qual está umbilicalmente relacionada –, bem como a forma como as contrapartidas pelas licenças atribuídas aos telemóveis de 3.a geração, e que serviriam igualmente para financiar projectos da responsabilidade do Governo, vêm sendo geridas e contabilizadas.
E não pode a este respeito ignorar-se o montante inicialmente estimado em cerca de 1.300 milhões de euros que chegou a ser referido como contrapartida no âmbito das licenças UMTS, associado ao FSI, tanto mais devido ao facto de ser sabido que a FCM sucede ao FSI, partilhando pontualmente alguns dos seus responsáveis e instalações.
Acontece que, até à data não foi a Assembleia da República esclarecida sobre a forma como os fundos públicos envolvidos estão a ser geridos, por esta ou qualquer outra entidade no âmbito da atribuição de computadores, de forma gratuita ou subvencionada, nem sobre o cumprimento integral da legislação nacional e europeia, nomeadamente em matéria de concorrência.
As dúvidas que se suscitaram supra têm sido agravadas, não apenas pela escassez ou irrelevância da informação disponibilizada pelo Governo e pela FCM, de que o Relatório & Contas 2008 não constitui excepção, mas, também, por sucessivas e contraditórias declarações de responsáveis governamentais.
Neste cenário, o Grupo Parlamentar do PSD tomou mesmo a iniciativa de, no passado dia 8 de Julho, submeter esta matéria à consideração do Tribunal de Contas, solicitando a este Órgão de Soberania a realização de uma auditoria que permita a fiscalização da forma como têm sido geridos os fundos públicos

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envolvidos nestas iniciativas, a sua legalidade, bem como o apuramento de responsabilidades que couberem no caso de violação de normas legais.
Importa, pois, que a Assembleia da República exerça cabalmente as suas competências no domínio da fiscalização política da actuação do Governo e, bem assim, assuma o papel que lhe cabe na defesa dos princípios da prossecução do interesse público e da transparência.
Assim, o Grupo Parlamentar do PSD vem requerer a Sua Excelência o Sr. Presidente da Assembleia da República, ao abrigo do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 2.º da Lei n.º 5/93, de 1 de Março, republicada após a sua segunda alteração introduzida pela Lei n.º 15/2007, de 3 de Abril, a constituição de uma Comissão Eventual de Inquérito Parlamentar para apreciar os actos do Governo em relação à Fundação para as Comunicações Móveis e ao Fundo para a Sociedade de Informação, de acordo com o objecto e fundamentos a seguir explicitados.
A Comissão Parlamentar de Inquérito tem por objecto, designadamente: 1. Apurar a forma como têm sido geridos os fundos públicos atribuídos à FCM – Fundação para as Comunicações Móveis, e ao Fundo para a Sociedade de Informação, incluindo as verbas resultantes de contrapartidas pelas licenças atribuídas aos telemóveis de 3.a geração; 2. Identificar todas as pessoas públicas ou privadas, singulares ou colectivas, que tenham sido, directa ou indirectamente, a qualquer título, objecto de financiamento ou que tenham recebido pagamentos da FCM; 3. Identificar as entidades, integradas ou exteriores ao Ministério das Obras Públicas, Transportes e Comunicações, sobre as quais tenha recaído o acompanhamento e fiscalização dos actos praticados pela FCM ou pelo Fundo para a Sociedade de Informação, bem como o respectivo acompanhamento e controlo orçamental е о destino dado às informações recolhidas; 4. Verificar o cumprimento de todas as disposições legais aplicáveis, nacionais e comunitárias, designadamente em matéria de contratação, por parte da FCM ou no âmbito dos projectos definidos e promovidos pelo Estado Português e por ela, directa ou indirectamente, geridos, financiados, subsidiados ou acompanhados; 5. Conhecer a justificação apresentada pelo Governo Português à Comissão Europeia, na decorrência da suspeita de incumprimento da legislação comunitária da concorrência, no âmbito dos procedimentos de aquisição de computadores Magalhães por ajuste directo; 6. Apurar se a escolha da natureza jurídica da FCM foi determinada ou não pelo objectivo de contornar a obrigatoriedade de observar procedimentos de consulta e concurso públicos prévios à adjudicação da aquisição de hardware e software; 7. Verificar a eventual existência de uma situação de monopólio na produção e fornecimento de computadores Magalhães pela empresa JP Sá Couto e, em caso afirmativo, apurar o fundamento de tal facto; 8. Avaliar em que grau os procedimentos seguidos pelo Estado Português foram de total transparência no que se refere à FCM e, designadamente, no âmbito do Programa e.escola e da Iniciativa e.escolinha; 9. Confirmar se as obrigações assumidas pelo Governo perante os operadores privados, através da intervenção na FCM, foram ou têm vindo a ser cumpridas.

Assembleia da República, 10 de Dezembro de 2009.
Os Deputados do PSD: José Pedro Aguiar Branco — Jorge Costa — Pedro Duarte.
A Divisão de Redacção e Apoio Audiovisual.

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