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Sábado, 19 de outubro de 2013 II Série-B — Número 5
XII LEGISLATURA 3.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2013-2014)
S U M Á R I O
Apreciação parlamentar n.º 64/XII (3.ª):
Requerimento do PCP solicitando a apreciação pela Assembleia da República ao Decreto-Lei n.º 133/2013, de 3 de outubro, que «estabelece os princípios e regras aplicáveis ao sector público empresarial» Petição n.º 291/XII (3.ª):
Apresentada pela Confederação do Comércio e Serviços de Portugal, solicitando à Assembleia da República a revisão do regime jurídico do arrendamento urbano não habitacional através da alteração de um conjunto de artigos do Código Civil e do NRAU e aditamento de novos artigos.
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APRECIAÇÃO PARLAMENTAR N.º 64/XII (3.ª)
DECRETO-LEI N.º 133/2013, DE 3 DE OUTUBRO, QUE «ESTABELECE OS PRINCÍPIOS E REGRAS
APLICÁVEIS AO SECTOR PÚBLICO EMPRESARIAL»
Publicado em Diário da República n.º 191, Série I, de 3 de outubro de 2013
Exposição de motivos
A Constituição da República aponta para a existência de uma economia mista, com um forte e dinâmico
sector empresarial do Estado e um papel fundamental das pequenas e médias empresas. A situação do país é
hoje caracterizada, no plano económico, por uma ditadura dos grupos monopolista associados, e muitos deles
dependentes, do grande capital estrangeiro, num processo de crescente ruína das micro, pequenas e médias
empresas, e de desqualificação ou destruição da presença do Estado na atividade económica nacional.
Com o decreto-lei em apreço, o Governo prossegue o caminho da criação de condições para a privatização
de empresas públicas e a destruição das funções sociais e económicas do Estado, consagradas na
Constituição.
No diploma estabelece-se que as empresas públicas serão extintas se apresentarem capital próprio
negativo durante três anos consecutivos. É a hipocrisia política de quem persiste, ao longo de décadas e
sucessivos governos, numa política de subfinanciamento crónico e desorçamentação, provocando a pura e
simples impossibilidade de um equilíbrio económico e financeiro nas empresas – e agora aponta desta forma o
caminho da extinção das empresas, sem dedicar uma única palavra à questão de saber o que sucede aos
serviços públicos prestados por estas. Em nenhum momento se explicita o que o Governo pretende que
aconteça aos serviços públicos destas empresas que planeia extinguir.
As conceções que presidiram à elaboração desta proposta de lei são um espelho das conceções sobre as
quais assenta a política do Governo e da “troika”: uma obsessão doentia pelas questões financeiras e pela
consolidação orçamental.
Efetivamente, os princípios e as regras que o Governo pretende aplicar ao setor público empresarial,
incluindo o setor empresarial do Estado e o setor empresarial local, são focados na componente financeira,
sujeitando a gestão das empresas e até a sua existência a critérios financeiros e orçamentais enquanto a
prestação do serviço público e os objetivos sociais das empresas são relegados para um secundaríssimo
plano.
Para o PCP, uma gestão sustentada e equilibrada não pode evidentemente descurar a componente
financeira, pois ela é necessária para a disponibilização dos recursos monetários, para a concretização do
investimento e da despesa necessários à prossecução da missão das empresas. Mas é inaceitável que se
ignore e subestime, como o Governo faz, a componente económica e social dos objetos das empresas e que
se ataque os direitos individuais e coletivos dos trabalhadores.
Como o PCP oportunamente alertou, esta obsessão do Governo e da maioria que o suporta pelas questões
financeiras e orçamentais e a secundarização das questões económicas, sociais e laborais não deixará de ter
repercussões muito negativas na capacidade de estas empresas prestarem serviços públicos de qualidade.
A sobrestimação da componente financeira (sem no entanto tomar qualquer medida para sanear as
empresas) está bem patente no facto de se pretender que a responsabilidade e a decisão sobre todas as
matérias relevantes da vida e do funcionamento das entidades do “setor público empresarial” passe a
pertencer ao membro do Governo com a tutela das finanças, o qual, de acordo com a proposta de lei, designa
um membro para o conselho de administração das empresas públicas, com direito a veto sob quaisquer
operações em matéria financeira, e exerce em exclusivo a função acionista, incluindo a aprovação dos planos
de atividades e dos orçamentos das empresas.
Esta concentração de poderes nas finanças e a consequente limitação dos poderes de tutela dos
ministérios sectoriais, remetidos agora para um mero papel de articulação, significa, na prática, que será o
Ministério das Finanças a determinar as políticas setoriais em vez de se limitar a garantir o financiamento
destas mesmas políticas.
Este decreto-lei, como já vai sendo habitual, serve também para desferir um novo ataque aos
trabalhadores. Na verdade, no seu artigo 18.º, em total desrespeito do que foi acordado em contrato coletivo
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de trabalho, duma penada manda aplicar aos trabalhadores do sector empresarial do estado os montantes do
subsídio de refeição; do abono; de ajudas de custo e de transporte que se aplicam aos trabalhadores em
funções pública. Assim, além de desfalcar uma parte dos rendimentos dos trabalhadores, o Governo viola o
que, fruto da luta dos trabalhadores, acordou. Não satisfeito, o Governo PSD/CDS também neste artigo corta
nos montantes pagos a título de trabalho suplementar e pelo trabalho noturno.
Ao impor estes cortes e ao impor a prevalência desta norma sobre os instrumentos de regulamentação
coletiva de trabalho, além de violar a constituição, uma vez que o direito de negociação coletiva é pertença dos
sindicatos, está a violar o que foi acordado, a palavra dada, o contrato assinado. Importa dizer, estes direitos
resultam da negociação entre os sucessivos Governos e os sindicatos, em função da luta que os
trabalhadores organizaram no sentido de melhorar as suas condições de vida e trabalho, pelo que agora
violar, por via de um decreto, o que foi conquistado é uma inconstitucionalidade e uma tremenda injustiça.
Importa ainda referir que este decreto-lei mantem os trabalhadores afastados da fiscalização das
empresas. Sem prejuízo do papel que a DGTF possa assumir, a verdade é que o problema da falta de
transparência está ligado à destruição dos mecanismos que permitiam o controlo de gestão por parte dos
trabalhadores – que aliás foram os primeiros a alertar para infames situações de gestão ruinosa (ou mesmo
corrupção) como foi o caso da venda de sucatas na rede ferroviária ou os milhares de milhões perdidos em
contratos “swap”. De resto, a existência de um artigo (45.º) relativo à questão da transparência apenas se
dirige ao acionista da empresa e ao público em geral. O Sector Empresarial do Estado tem futuro – com os
trabalhadores, e não contra os trabalhadores ou à margem destes.
Este decreto-lei não assegura o cumprimento das funções económicas e sociais do setor público
empresarial nem respeita os direitos dos trabalhadores; não garante a existência de um sector público
empresarial dinâmico e eficiente, capaz de desempenhar um papel determinante no desenvolvimento
económico nacional; representa mais um passo no caminho, que o Governo insiste em trilhar, de
reconfiguração do Estado e das suas funções sociais e económicas de acordo com o seguinte princípio:
Estado mínimo para os trabalhadores e para o povo, Estado máximo para os grandes grupos económicos e
financeiros.
É uma evidência, perante a gravidade das opções consagradas neste decreto-lei, que se impõe a
necessidade de travar este caminho e proceder à sua apreciação parlamentar, para que este diploma deixe de
estar em vigor.
Nestes termos, ao abrigo do artigo 169.º da Constituição e do artigo 189.º e seguintes do Regimento
da Assembleia da República, os Deputados do Grupo Parlamentar do PCP requerem a Apreciação
Parlamentar do Decreto-Lei n.º 133/2013, publicado em Diário da República n.º 191, Série I, de 3 de
outubro de 2013, que «estabelece os princípios e regras aplicáveis ao sector público empresarial».
Assembleia da República, 18 de outubro de 2013.
Os Deputados do PCP, Bruno Dias — João Ramos — João Oliveira — António Filipe — Rita Rato —
Bernardino Soares — Carla Cruz — Paula Baptista — Jerónimo De Sousa — Miguel Tiago — Francisco Lopes
— Paula Santos.
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PETIÇÃO N.º 291/XII (3.ª)
Apresentada pela Confederação do Comércio e Serviços de Portugal, solicitando à Assembleia da
República a revisão do regime jurídico do arrendamento urbano não habitacional através da alteração
de um conjunto de artigos do Código Civil e do NRAU e aditamento de novos artigos
1. A Lei n.º 31/2012, de 14 de Agosto, que procede à revisão do regime jurídico do arrendamento urbano,
introduziu profundas modificações no arrendamento não habitacional. Os primeiros meses de vigência desta
Lei revelam já que a mesma é profundamente desadequada ao desenvolvimento das atividades económicas.
Mais, os últimos meses permitiram ainda perceber que alguns dos objetivos previstos na Lei n.º 31/2012,
designadamente o de Promover um mercado de arrendamento, que, em conjunto com o impulso à reabilitação
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urbana, possa requalificar e revitalizar as cidades, não se irá concretizar e, pelo contrário, algumas zonas de
excelência das principais cidades do País arriscam-se a uma ainda maior degradação.
Com efeito, são múltiplos os aspetos desta Lei com um impacto negativo nas empresas de comércio e
serviços, designadamente o regime de denúncia do contrato pelo senhorio, o prazo dos contratos de
arrendamento para fins não habitacionais, o prazo para desocupação do locado em caso de cessação do
contrato, o regime de atualização de rendas "antigas", entre outros aspetos.
Os elementos até agora recolhidos pela estrutura associativa do sector do comércio e serviços, permitem
concluir que este regime está a suscitar profundas preocupações aos empresários, essencialmente em torno
das seguintes questões:
i) Exponencial aumento das rendas;
ii) Possibilidade de despejo caso os arrendatários ponham em causa a renda que é proposta pelo senhorio;
iii) O conceito de microentidade deixa de fora demasiadas empresas e aquelas que se enquadram nesta
categoria manifestam grande incerteza quanto ao que ocorrerá passados os 5 anos do regime transitório, o
que preocupa os empresários e favorece o desinvestimento;
iv) Insegurança com o novo prazo de arrendamento.
Em matéria de atualização de rendas, a média dos aumentos propostos rondará os 150%-200%. Mas casos
há de valor percentual muito superior, atingindo os 900% de aumento. Trata-se de aumentos perfeitamente
incomportáveis no momento económico e social que vivemos.
Os peticionantes entendem que na definição de um regime de arrendamento não habitacional é necessário
compatibilizar os interesses, legítimos, dos senhorios com a dinâmica da atividade económica.
Ou seja, é fundamental um regime jurídico que não ignore:
— o investimento inicial necessário à instalação de muitas atividades de comércio e serviços;
— que o retorno económico-financeiro do investimento, principalmente num quadro de baixo crescimento é
feito a médio/longo prazo, variando em função da natureza das atividades;
— que muitas atividades, em cumprimento de obrigações legais, nomeadamente de higiene ou segurança,
realizam investimentos que não são passíveis de deslocalização;
— que rendas incomportáveis ou despejos levam ao encerramento de muitas empresas com consequências
inevitáveis ao nível do desemprego.
2. Nestes termos os peticionantes requerem à Assembleia da República que altere um conjunto de
disposições relativas ao regime jurídico do arrendamento não habitacional, de acordo com as seguintes
propostas:
i. Prazo dos contratos a termo certo:
a) prazo supletivo 10 anos (artigo 1110.º/2 C. Civil);
b) prazo mínimo 5 anos (novo, em aditamento ao artigo 1110.º C. Civil).
ii. Renovação dos contratos a termo certo:
a) renovação pelo prazo mínimo de 3 anos (nova disposição a aditar ao artigo 1110.º do C. Civil e artigo
26.º/3 NRAU)
iii. Denúncia do contrato pelo senhorio (em geral):
a) denúncia para habitação do senhorio ou para realização de obras de conservação ou restauro
profundo com antecedência mínima de um ano (artigo 1110.º C. Civil, na medida em que remete para o
artigo 1103.º/1).
b) denúncia sem invocação causa com antecedência mínima 5 anos (artigo 1110.º C. Civil, na medida
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em que remete para o artigo 1101.º-c)).
c) em caso de denúncia, deve o arrendatário receber compensação pelo investimento realizado no locado
em valor correspondente a 30% da faturação média anual dos últimos dois anos de exercício (disposição
nova, específica para os arrendamentos para fins não habitacionais, que retoma parcialmente o anterior
regime e que deverá ser aditada na Subsecção do C. Civil — artigos. 1108.º e seguintes — relativa ao
arrendamento para fins não habitacionais).
iv. Denúncia para obras de remodelação ou restauro profundos (em especial):
1. Nos arrendamentos para fins não habitacionais, a denúncia do contrato pelo senhorio para demolição ou
realização de obras de remodelação ou restauro profundos obriga este:
a) ao pagamento de indemnização ao arrendatário por danos, patrimoniais e não patrimoniais, suportados
por este no seu giro empresarial em consequência da denúncia.
b) a garantir a sua expensas o realojamento do arrendatário no mesmo concelho, em condições análogas
às que este já detinha (disposição nova específica para os arrendamentos para fins não habitacionais).
2. Para efeito do disposto no número anterior, considera-se obra de remodelação ou restauro profundos
aquela que impeça a continuação do giro empresarial habitual no locado por período superior a um mês (novo
em alteração ao artigo 1103.º/11 C. Civil e em legislação especial)
v. Atualização de rendas antigas:
a) substituir noção "microentidade" por "microempresa", idêntico ao Código do Trabalho (artigo 51.º/5
NRAU);
b) atualização faseada em, pelos menos, 10 anos (novo, em alteração aos artigos 33.º e, em especial,
54.º/1 NRAU).
c) caso venha a merecer acolhimento a proposta de atualização faseada em, pelo menos, 10 anos, este
prazo deve igualmente ser aplicado, imperativamente, aos contratos que já foram renegociados ao abrigo
do NRAU atual (novo).
vi. Atividades cuja instalação e funcionamento se encontra legalmente regulamentada/limitada:
a) introdução conceito "entidade interesse público e prever regime exceção análogo ao das
"microentidades" (novo);
b) indemnização em caso de denúncia de valor superior a 5 anos de renda, que tenha em conta a
dificuldade/impossibilidade de deslocalização do estabelecimento e que remunere todos os investimentos
no locado (novo, também em alteração ao artigo 1103.º/6-a) C. Civil, que também alargue a aplicação da
nova norma à denúncia com outro fundamento e à denúncia ad nutum).
vii. Transmissão por morte do arrendamento:
a) admitir a transmissão para o sucessor do arrendatário comercial que "não trabalhe efetivamente" com o
locatário, mas pretenda continuar o giro comercial no locado;
b) admitir a transmissão para quem "trabalhe efetivamente" com arrendatário no locado, mas não seja seu
sucessor, (artigo 58.º/1 NRAU)
viii. Fundamentos de denúncia do contrato de arrendamento.
Manutenção da possibilidade de exercício de uma atividade secundária não autorizada pelo objeto do
contrato, desde que a mesma não implique maior desgaste ou desvalorização para o imóvel (artigos 1038.º-c),
1083.º/2-c) e 1112.º/5 C. Civil).
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ix. Conceito "Loja Histórica"
Considera-se "loja histórica" o estabelecimento de comércio e serviços que funciona continuamente há
mais de 25 anos no mesmo locado, laborando no mesmo ramo de atividade e podendo preservar os traços
arquitetónicos fundacionais fundamentais, (novo)
x. Resolução contrato por falta de pagamento de renda
Não há lugar a resolução do contrato por falta de pagamento de renda em caso de mora no pagamento por
facto não imputável ao arrendatário, designadamente obras realizadas na via pública que afetem o normal
funcionamento do estabelecimento de comércio e serviços (novo, em aditamento ao artigo 1048.º C. Civil).
xi. Desocupação do espaço arrendado em caso de estabelecimentos sujeitos a autorização
A desocupação de espaço arrendado em consequência de extinção do arrendamento no caso de
estabelecimento de comércio e serviços cujo funcionamento seja sujeito a autorização ou parecer de
autoridades públicas ou equiparadas será diferida pelo prazo de:
a) um ano, no caso de atividade cujo funcionamento esteja sujeita a alvará ou licenciamento administrativo;
b) seis meses, no caso de atividades sujeitas a outra modalidade de autorização de funcionamento (novo,
em alteração e aditamento aos artigos 15.º e 15.º-J NRAU).
Lisboa, 24 de setembro de 2013.
O primeiro subscritor, Confederação do Comércio e Serviços de Portugal.
Nota: — Desta petição foram subscritores 4540 cidadãos.
A DIVISÃO DE REDAÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL.