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Quarta-feira, 16 de julho de 2014 II Série-B — Número 58
XII LEGISLATURA 3.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2013-2014)
S U M Á R I O
Comissão Parlamentar de Inquérito para Apuramento das Responsabilidades pelas Decisões que Conduziram ao Processo de Subconcessão dos Estaleiros Navais de Viana do Castelo:
— Relatório final e anexos, contendo as declarações de voto.
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COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUÉRITO PARA APURAMENTO DAS RESPONSABILIDADES
PELAS DECISÕES QUE CONDUZIRAM AO PROCESSO DE SUBCONCESSÃO DOS ESTALEIROS
NAVAIS DE VIANA DO CASTELO
Relatório final
ÍNDICE
1. Introdução
2. Organização Sistemática
a. Constituição e objeto
b. Composição e prazo
c. Funcionamento
d. Duração da comissão de inquérito
3. Cronologia
a. Criação da Estaleiros Navais de Viana do Castelo
b. De sociedade por quotas a sociedade anónima de responsabilidade limitada
c. Nacionalização dos Estaleiros Navais de Viana do Castelo
d. De sociedade anónima de responsabilidade limitada a empresa pública
e. De empresa pública a sociedade anónima de capitais maioritariamente públicos
f. Programa de investimentos e reestruturação empresarial da ENVC
g. Quadro resumo cronologia
4. Documentação
5. Audições
6. Averiguação das circunstâncias que levaram ao protelamento, cancelamento ou perda de
encomendas e as respetivas consequências no agravamento da situação da empresa ENVC
a. Gestão da empresa ENVC
b. Construções dos ENVC e navios cancelados
c. Encomendas da Marinha à ENVC
d. Atlântida e Anticiclone
e. Asfalteiros
f. Contrapartidas
7. Averiguação do modo como o Governo tem acompanhado junto da Comissão Europeia o
desenvolvimento do processo relativo ao procedimento pendente relativo à execução da política de
concorrência — auxílio estatal a favor dos Estaleiros Navais de Viana do Castelo, SA, e das
circunstâncias e os termos em que foi decidida a subconcessão da empresa ENVC
a. Planos de reestruturação
b. Auxílios de Estado 2006-2011
c. Parecer Cruz Vilaça
d. Reprivatização
e. Subconcessão West Sea
f. Acordo social trabalhadores
8. CONCLUSÕES
9. RECOMENDAÇÔES
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ANEXOS
ANEXO I –Lista da documentação solicitada e enviada à CPI com a respetiva classificação quanto ao
acesso/ divulgação.
ANEXO II –Requerimento potestativo de 23 de janeiro de 2014.
ANEXO III –Parecer do Dr. Prof. Mário Esteves de Oliveira – In (aplicabilidade) dos regimes de
contratação pública à formação do contrato de Subconcessão da utilização privativa do domínio público e
áreas afetas à concessão dominial da “Estaleiros Navais de Viana do Castelo, SA” – Vieira de Almeida &
Associados.
Anexo IV – Apresentação em Powerpoint deixada pelo Sr. Presidente da EMPORDEF, Dr. Vicente Ferreira
na CPI, na audição de 13 de março de 2014.
Anexo V – Parecer de José Luís da Cruz Vilaça – Relativo à compatibilidade com o regime jurídico dos
auxílios de Estado e das concentrações de empresas de contrato de compra de bens enquadrado em acordo
de contrapartidas, de transferência de ações e de outras operações envolvendo os ENVC.
Anexo VI – Apresentação em Powerpoint deixada pelo ex-Presidente do Conselho de Administração dos
ENVC no período de 2009 a 2010, Dr. António Jorge Garcia Rolo na audição de 30 de abril de 2014.
Anexo VII – Apresentação em Powerpoint deixada pelo Sr. Presidente do Conselho de Administração da
ENVC, Sr. Eng.º Jorge Camões, na CPI, audição de 7 de maio de 2014.
LISTA DE SIGLAS E ABREVIATURAS
AR Assembleia da República
BESI Banco Espírito Santo de Investimento, SA, ou
Espírito Santo Investment, plc
CE Comissão Europeia
CPI Comissão Parlamentar de Inquérito
DILP Divisão de Informação Legislativa e Parlamentar da AR
DGCOM Direção Geral da Concorrência da União Europeia
DGTF Direção-Geral do Tesouro e Finanças
ENVC Estaleiros Navais de Viana do Castelo
IGF Inspeção-Geral de Finanças
LFC Lancha de Fiscalização Costeira
LDP, LDM, LDG Lancha de Desembarque Pequena, Média e Grande
LFP, LFG Lancha de Fiscalização Pequena e Grande
MEF Ministro/a de Estado e das Finanças
NCP Navio de Combate à Poluição Marítima
NPL Navio Polivalente Logístico
NPO Navio Patrulha Oceânico
NRP Navio da República Portuguesa
PDVSA Petróleos da Venezuela
RAA Região Autónoma dos Açores
RAM Região Autónoma da Madeira
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1. Introdução
Sendo reconhecida a importância estratégica do mar para o desenvolvimento nacional, a especial vocação
do país para as questões marítimas, a sua localização geográfica privilegiada, a indispensabilidade de dotar a
Marinha Portuguesa com meios necessários à fiscalização e defesa das águas territoriais portuguesas, bem
como, a necessidade de desenvolvimento da indústria nacional e a defesa e promoção do emprego, sempre
assumiram a Estaleiros Navais de Viana do Castelo, importância económico-social para o Alto Minho e para o
País.
A Comissão Parlamentar de Inquérito para apuramento das responsabilidades pelas decisões que
conduziram ao processo de subconcessão dos Estaleiros Navais de Viana do Castelo foi requerida
potestativamente pelos Grupos Parlamentares do PCP, do BE e do PEV e por 22 Deputados do PS, nos
termos da alínea f) do artigo 156.º e do n.º 4 do artigo 178.º, ambos da Constituição da República Portuguesa,
da alínea b) do n.º 1 do artigo 2.º e do artigo 4.º da Lei n.º 5/93, de 1 de março, com as alterações introduzidas
pela Lei n.º 126/97, de 10 de dezembro, e pela Lei n.º 15/2007, de 3 de abril.
Através de Requerimento datado de 23 de janeiro de 2014, propuseram assim a constituição de uma
Comissão Parlamentar de Inquérito, pelo prazo de 120 dias para “apurar as circunstâncias e as
responsabilidades que levaram à decisão de extinção dos Estaleiros Navais de Viana do Castelo e de
concessão das suas instalações a uma empresa privada”, tendo o seu objeto sido devidamente estabelecido,
nos termos constantes na Resolução da Assembleia da República n.º 9/2014, publicada em Diário da
República, 1.ª série – N.º 21, de 30 de janeiro.
Ato contínuo, pelo Despacho n.º 76/XII da Ex.ma
Sr.ª Presidente da Assembleia da República, datado de 6
de fevereiro de 2014, foi fixado o número de membros da CPI, respetivo prazo e demais questões de natureza
formal, legal e de funcionamento para o referido Inquérito Parlamentar, ao qual, foi atribuído o n.º 8/XII.
Os trabalhos iniciaram-se no dia 11 de fevereiro de 2014, procedeu-se à realização de 18 audições, bem
como à solicitação de variada informação e documentação a diversas entidades, conforme expressamente se
menciona ao longo do presente relatório. Importa salientar e destacar a forma colaborante, ativa e empenhada
com que todos os Senhores Deputados, dos diferentes Grupos Parlamentares intervieram nesta CPI,
agilizando os trabalhos e permitindo concluir os mesmos, no espaço temporal então fixado.
O trabalho de todos os parlamentares foi acompanhado pela disponibilidade inexcedível dos Serviços da
Assembleia da República que apoiaram os trabalhos e transcrições das audições da CPI, entre os quais, se
destaca um excelente documento produzido pela Divisão de Informação Legislativa e Parlamentar (DILP), que,
pela sua qualidade e conteúdo se decidiu incorporar ao presente relatório, dele fazendo sua parte integrante,
com o prévio acordo dos seus autores.
Com o relatório que ora se elabora, culminam os trabalhos da CPI para apuramento das responsabilidades
pelas decisões que conduziram ao processo de subconcessão dos Estaleiros Navais de Viana do Castelo
(doravante ENVC), que, foi elaborado e sistematizado de acordo com o objeto de trabalho definido pela já
citada Resolução da Assembleia da República n.º 9/2014 e, de molde a fazer um enquadramento da situação
económica, social e financeira dos ENVC, bem como das encomendas e contratos que se delimitou apreciar,
as circunstâncias que conduziram a empresa ao processo de subconcessão e ainda, o modo de
acompanhamento que o Governo adotou, quer, quanto ao processo relativo aos auxílios estatais junto da
Comissão Europeia, quer, quanto a todos os procedimentos e circunstâncias que conduziram à subconcessão
à empresa Martifer.
O relatório termina com as conclusões e recomendações, restritas ao âmbito deste inquérito parlamentar e
assentes exclusivamente na prova documental junta, bem como, nos depoimentos diversos recolhidos durante
os trabalhos da Comissão, sendo que essas conclusões revestem caracter político e não judicial.
De referir, no entanto, que, matérias houve que, no decurso dos trabalhos, foi referido, terem sido
submetidas à Procuradoria-Geral da República, para que se proceda em conformidade com as normas legais
em vigor.
Designadamente, na audição de 11 de março de 2014 do Sr. Ministro da Defesa Nacional, Dr. José Pedro
Aguiar Branco:
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“Atlântida, 2009: porque é que foi rejeitado? Só sei aquilo que também consta da documentação que
mandámos para a Procuradoria-Geral da República…” pág. 13.
“Quanto ao navio Atlântida, enviámos para a Procuradoria-Geral da República toda a documentação,
porque para nós é uma situação realmente inadmissível. Como é possível não se ter feito um acordo que
acautelasse os interesses dos Estaleiros…” pág. 30.
Na audição de 13 de março de 2014, do Sr. Dr. Rui Jorge de Carvalho Vicente Ferreira, Presidente do
Conselho de Administração da EMPORDEF:
“No entanto, dada a relevância deste dossier, a EMPORDEF fez uma exposição à Procuradoria-Geral da
República no sentido de juntar factos, todos eles componentes públicos, como é o caso deste documento que
há pouco entreguei da Inspeção-Geral da Finanças sobre o tema, as auditorias do Tribunal de Contas, que
foram duas, à Atlânticoline e, enfim, mais alguns conjuntos de documentos existentes…” pág.44.
E, na audição de 28 de maio de 2014, do Sr. Eng.º José Maria Costa, Presidente da Câmara Municipal de
Viana do Castelo:
“(…) sobre estas matérias de que dei conhecimento, e que não vou agora entrar em detalhes, fiz uma
participação à Procuradoria-Geral da República, fiz uma participação à Provedoria e fiz uma participação ao
Tribunal de Contas, que estão em investigação.” pág. 18.
Muito já se escreveu na imprensa sobre os ENVC e, este processo será, certamente, ainda notícia, durante
alguns anos, até porque ao concurso para a venda do navio Atlântida, encomendado pela Atlânticoline
concorreram três empresas: a Mystic Cruises, do Grupo Douro Azul (cruzeiros turísticos), o consórcio M.D.
Roelofs Beheer BV e Chevalier Floatels BV (empresas holandesas representadas por um grupo espanhol) e
os Gregos da Thesarco Shipping.
E do navio Atlântida e das muitas viagens que este ainda fará “(…) por mares nunca antes navegados
(…)”, como dizia o poeta maior, sabe genericamente o povo português que todo aquele “dinheiro público” lá
continua atracado no Alfeite.
2. Organização sistemática
a. Constituição e objeto
O Diário da Assembleia da República II Série – A, N.º 60, de 4 de fevereiro de 2014, tendo presente o
requerimento potestativo1 de 23 de janeiro de 2014, do inquérito parlamentar n.º 8/XII (3.ª), publicou a
resolução de constituição de uma “comissão parlamentar de inquérito para apuramento das responsabilidades
pelas decisões que conduziram ao processo de subconcessão dos estaleiros navais de Viana do Castelo”. A
referida Resolução da Assembleia da República foi publicada no Diário da República, 1.ª série, n.º 21, de 30
de janeiro de 2014 – Resolução da Assembleia da República n.º 9/2014, constituição de uma “comissão
parlamentar de inquérito para apuramento das responsabilidades pelas decisões que conduziram ao processo
de subconcessão dos estaleiros navais de Viana do Castelo”.
Nos termos da Resolução da Assembleia da República aprovada, a CPI tem por objetivo apurar:
– As circunstâncias e os termos em que foi decidida pelo Governo a extinção da empresa dos Estaleiros
Navais de Viana do Castelo com o despedimento de todos os seus trabalhadores e em que foi efetuada a
concessão dos respetivos terrenos ao grupo empresarial vencedor;
– As circunstâncias que levaram ao protelamento, cancelamento ou perda de encomendas e as respetivas
consequências no agravamento da situação da empresa;
– O modo como o Governo tem acompanhado junto da Comissão Europeia o desenvolvimento do processo
relativo ao procedimento pendente relativo à execução da política de concorrência — auxílio estatal a favor
dos Estaleiros Navais de Viana do Castelo, SA.
1 Anexo II – Requerimento potestativo de 23 de janeiro de 2014
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b. Composição e prazo
Tendo presente a aprovação do Inquérito Parlamentar n.º 8/XII (3.ª), nos termos do disposto no n.º 4 do
artigo 178.º da Constituição e da alínea b) do n.º 1 do artigo 2.º da Lei n.º 5/93, de 1 de março, alterada pela
Lei n.º 126/97, de 10 de dezembro, e alterada e republicada pela Lei n.º 15/2007, de 3 de abril [regime jurídico
dos inquéritos parlamentares], e ouvida a Conferência de Líderes, na sua reunião de 5 de fevereiro de 2014,
foi determinado no Despacho n.º 76/XII, o seguinte:
1) A CPI para apuramento das responsabilidades pelas decisões que conduziram ao processo de
subconcessão dos estaleiros navais de Viana do Castelo, terá a seguinte composição:
Sete Deputados efetivos e dois suplentes do Grupo Parlamentar do PSD;
Cinco Deputados efetivos e dois suplentes do Grupo Parlamentar do PS;
Dois Deputados efetivos e um suplente do Grupo Parlamentar do CDS-PP;
Dois Deputados efetivos e um suplente do Grupo Parlamentar do PCP;
Um Deputado efetivo e um suplente do Grupo Parlamentar do BE.
2) A Presidência da Comissão pertencerá ao Grupo Parlamentar do PS, a 1.ª Vice-Presidência ao PSD e a
2.ª Vice-Presidência ao CDS-PP.
3) O período de funcionamento da Comissão é de 120 dias.
4) Pelos respetivos grupos parlamentares foram então indicados para integrarem a Comissão, na
qualidade de membros efetivos, os seguintes Srs. Deputados:
– Mónica Ferro, do PSD;
– Fernando Negrão, do PSD;
– Afonso Oliveira, do PSD;
– Eduardo Teixeira, do PSD;
– Nuno Sá Costa, do PSD;
– Jorge Paulo Oliveira, do PSD;
– Ângela Guerra, do PSD;
– Maria de Belém Roseira, do PS;
– António Gameiro, do PS;
– Agostinho Santa, do PS;
– Jorge Fão, do PS;
– Rui Paulo Figueiredo, do PS;
– Abel Baptista, do CDS-PP;
– Otília Ferreira Gomes, do CDS-PP;
– António Filipe, do PCP;
– Carla Cruz, do PCP;
– Mariana Aiveca, do BE.
5) Como membros suplentes, os grupos parlamentares indicaram os seguintes Srs. Deputados:
Carlos Abreu Amorim, do PSD;
Odete Silva, do PSD;
Rui Pedro Duarte, do PS;
Sandra Pontedeira, do PS;
João Rebelo, do CDS-PP;
Jorge Machado, do PCP; e
Pedro Filipe Soares, do BE.
Aos 11 dias do mês de fevereiro de 2014, pelas 16:00 horas, reuniu a CPI, tendo S. Ex.ª a Presidente da
Assembleia da República, conferido a posse à Comissão, realçando a importância do trabalho destas
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Comissões. Esta reunião contou com a presença de todos os membros, tendo sido eleita a Mesa, que passou
a ter a seguinte constituição:
Presidente: Maria de Belém Roseira (PS);
Vice-Presidente: Mónica Ferro (PSD); e
Vice-Presidente: Abel Baptista (CDS).
Nessa mesma reunião os representantes dos Grupos Parlamentares indicaram como Coordenadores os
seguintes Srs. Deputados:
Fernando Negrão, do PSD;
António Gameiro, do PS;
Abel Baptista, do CDS-PP;
António Filipe, do PCP; e
Mariana Aiveca, do BE.
A Sr.ª Deputada Otília Ferreira Gomes, do Grupo Parlamentar do CDS-PP, foi substituída pelo Sr.
Deputado Altino Bessa a 19 de abril de 2014.
c. Funcionamento
No início dos trabalhos foi consensualizado não fixar questionário, devendo respeitar-se o objeto da
Comissão, fixado na Resolução da Assembleia da República n.º 9/2014, que determinou a sua constituição.
A Comissão adotou o seu Regulamento de funcionamento, publicado no Diário da Assembleia da
República, II Série B, n.º 32, de 28 de fevereiro de 2014.
No tocante Regulamento distribuído a todos os membros da Comissão, adiantou a Sr.ª Presidente que, não
obstante a previsão feita no n.º 1 do artigo 1.º, havia já ficado decidido não se elaborar questionário indicativo,
orientador dos depoimentos, pois, tal consubstanciava uma limitação aos trabalhos da Comissão.
Referente ao n.º 4 do artigo 6.º do regulamento, que diz respeito à distribuição dos depoimentos
potestativos, ficou assente que os GP apresentariam os seus requerimentos, havendo certamente
sobreposições e que os agendamentos potestativos só seriam requeridos no final e caso se tornasse
necessário.
A Comissão, reunida no dia 11 de março de 2014, submeteu à votação a proposta feita pelo Grupo
Parlamentar do PCP, no sentido de ser a Sr.ª Deputada Carla Cruz a relatora desta Comissão. Foi rejeitada,
com votos contra do PSD e do CDS-PP e votos a favor do PS e do PCP, registando-se a ausência do BE.
Submeteu-se posteriormente à votação a proposta do Grupo Parlamentar do PSD que indicava a Sr.ª
Deputada Ângela Guerra para relatora do processo de inquérito parlamentar. A mesma foi aprovada com votos
a favor do PSD e do CDS-PP, votos contra do PS e do PCP, registando-se a ausência do BE.
Nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 5º do Regime Jurídico dos Inquéritos Parlamentares foi,
por S. Ex.ª a Presidente da Assembleia da República, comunicado à Sr.ª Procuradora-Geral da República o
conteúdo da resolução que determinou a realização do inquérito e a constituiçãode uma comissão
parlamentar de inquérito para apuramento das responsabilidades pelas decisões que conduziram ao processo
de subconcessão dos estaleiros navais de Viana do Castelo. Dada a natureza confidencial da resposta, foi
distribuído um exemplar impresso a cada grupo parlamentar, de acordo com o disposto no Regulamento da
Comissão.
d. Duração da comissão de inquérito
Relativamente à duração desta Comissão Parlamentar de Inquérito, o Despacho n.º 76/XII, estipula que a
mesma deverá funcionar pelo prazo de 120 dias, tendo em conta o que estava referido no requerimento de
inquérito parlamentar n.º 8/XII.
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O prazo de funcionamento da Comissão foi suspenso entre 15 e 25 de maio de 2014 (11 dias), conforme
Resolução da AR n.º 44/2014, publicada na 1.ª série do Diário da República, n.º 95/XII/3, de 19 de maio de
2014.
Foi prorrogado o período de funcionamento da CPI por 30 dias, a contar do dia 22 de junho de 2014,
conforme resolução n.º 1077/XII, aprovada no dia 20 de junho de 2014.
3. Cronologia2
a. Criação dos Estaleiros Navais de Viana do Castelo
Os Estaleiros Navais de Viana do Castelo (ENVC) foram criados por escritura pública de 3 de junho de
1944, no âmbito do programa do Governo para a modernização da frota de pesca do largo. De acordo com o
artigo 1.º a sua sede seria em Viana do Castelo e, a sua duração, por tempo indeterminado. Foi estabelecido
como seu objeto social a indústria de construção naval e o exercício de quaisquer atividades que pela
assembleia geral fosse resolvido exercer (artigo 3.º), tendo o capital inicial sido fixado em 3.740.95€, dividido
em dezassete quotas (artigo 4.º).
Os primeiros sócios eram técnicos e operários especializados oriundos dos Estaleiros Navais do Porto de
Lisboa, encabeçados por Américo Rodrigues, seu mestre geral. Em 7 de novembro de 1946, e segundo a
respetiva escritura, dois destes sócios cederam parte das suas quotas a um novo sócio, que acreditaria a
empresa junto da Lloyd’s Register of Shipping.
b. De sociedade por quotas a sociedade anónima de responsabilidade limitada
Por escritura pública de 30 de maio de 1949, a sociedade por quotas Estaleiros Navais de Viana do
Castelo, Lda. foi transformada em sociedade anónima de responsabilidade limitada, passando a usar a
denominação Estaleiros Navais de Viana do Castelo, SARL (artigo 1.º).
A sede da sociedade manteve-se em Viana do Castelo, continuando o seu objeto a ser a exploração da
indústria e comércio de construções navais e atividades correlativas (artigos 2.º e 3.º). Podia, ainda, explorar
outros comércios e indústrias por simples deliberação do conselho de administração, mediante parecer
favorável do conselho fiscal (artigo 3.º).
Nos termos do parágrafo 2.º do artigo 5.º, o conselho de administração, com parecer favorável do conselho
fiscal, podia aumentar o capital uma ou mais vezes e nas condições que entendesse, até ao limite de
349.158.52€.
Assim sendo, e também por escritura de 30 de maio de 1949, o capital dos Estaleiros Navais de Viana do
Castelo foi aumentado de 3.740.95 para 185.802.21€, dividido em 37.250 ações nominativas, com o valor
nominal de 4.98€.
c. Nacionalização dos Estaleiros Navais de Viana do Castelo
Após o 25 de abril, procedeu-se à nacionalização dos Estaleiros Navais de Viana do Castelo através do
Decreto-Lei n.º 478/75, de 1 de setembro. Segundo o preâmbulo foi tida em consideração a necessidade de
prosseguir na via da concretização de uma política económica posta ao serviço das classes trabalhadoras e
das camadas mais desfavorecidas da população portuguesa, em cumprimento do Programa do Movimento
das Forças Armadas; o papel vital desempenhado pela indústria da construção naval na economia portuguesa;
e a necessidade de um planeamento integrado no sector da construção e reparação naval com outros
sectores básicos da economia.
Nos termos do n.º 1 do artigo 3.º a universalidade dos bens, direitos e obrigações que integram o ativo e o
passivo da sociedade ou que se encontrem afetos à respetiva exploração são transferidos para o Estado,
integrados no património autónomo, ou afetos ao mesmo.
2 Cronologia elaborada pela DILP, Estaleiros Navais de Viana do Castelo, março de 2014.
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Acrescenta o artigo 2.º que o Estado pagará às entidades privadas titulares de ações da empresa
nacionalizada, contra a entrega dos respetivos títulos, uma indemnização a definir quanto ao montante, prazo
e forma de pagamento, em diploma legal a publicar no prazo de cento e oitenta dias, a contar da data do início
da eficácia da nacionalização.
O pessoal que à data do início da eficácia da nacionalização estivesse ao serviço da sociedade Estaleiros
Navais de Viana do Castelo transitaria automaticamente para a empresa nacionalizada (n.º 1 do artigo 5.º).
O n.º 2 do artigo 6.º determina que por despacho do Primeiro-Ministro, sob proposta do Ministro da
Indústria e Tecnologia, será nomeada uma comissão administrativa da sociedade nacionalizada, composta por
três a cinco membros de reconhecida competência. Estipula o n.º 4 do mesmo artigo que a comissão
administrativa exercerá funções até à designação dos titulares dos órgãos de gestão que venham a resultar da
respetiva reestruturação. Após o termo do seu mandato, a comissão executiva deverá elaborar relatório
circunstanciado para apreciação do Ministro da Indústria e Tecnologia (artigo 10.º).
A empresa nacionalizada será reestruturada por diploma a publicar no prazo de noventa dias contados a
partir da data da publicação deste decreto-lei (artigo 11.º). A fim de preparar a reestruturação será constituída,
no Ministério da Indústria e Tecnologia, uma comissão de reestruturação (n.º 1 do artigo 12.º).
d. De sociedade anónima de responsabilidade limitada a empresa pública
Pelo Decreto-Lei n.º 850/76, de 17 de dezembro, foi criada a empresa pública Estaleiros Navais de Viana
do Castelo, EP (ENVC), pessoa coletiva com personalidade jurídica, dotada de autonomia administrativa e
financeira e com património próprio.
Foi transferida para a ENVC a universalidade dos bens, direitos e obrigações da empresa que, nos termos
do Decreto-Lei n.º 478/75, de 1 de setembro, assumiu a posição jurídica da sociedade Estaleiros Navais de
Viana do Castelo, SARL, nacionalizada pelo mesmo diploma. (n.º 1 do artigo 2.º).
Transitaram para a nova empresa pública, independentemente de quaisquer formalidades, os
trabalhadores que, de harmonia com o Decreto-Lei n.º 478/75, de 1 de setembro, tivessem passado para a
empresa nacionalizada ou que tivessem sido admitidos posteriormente a esta data e estivessem efetivamente
ao serviço da empresa à data da publicação do Decreto-Lei n.º 850/76, de 17 de dezembro (n.º 1 do artigo
3.º). Estes trabalhadores transitaram para a ENVC integrados nos quadros de origem e com os direitos e
obrigações emergentes da respetiva situação nesses quadros (n.º 2 do artigo 3.º). No entanto, a consagração
destes direitos não prejudicou a faculdade de o conselho de gerência proceder à conversão dos quadros que
viesse a considerar conveniente (n.º 3 do artigo 3.º).
O Decreto-Lei n.º 850/76, de 17 de dezembro, aprovou, ainda, o novo estatuto dos Estaleiros Navais.
De acordo com o n.º 1 do artigo 2.º a ENVC tem a sua sede em Viana do Castelo. Tem por objeto principal
a indústria de construção e reparação naval, podendo também exercer atividades no domínio das indústrias de
metalurgia e metalomecânica e, ainda, outras que venham a ser consideradas de interesse para a empresa
(artigo 3.º).
A tutela ministerial da empresa continua a ser da competência do Ministério da Indústria e Tecnologia (n.º 1
do artigo 31.º).
e. De empresa pública a sociedade anónima de capitais maioritariamente públicos
Em 1991 dá-se nova alteração. A empresa pública Estaleiros Navais de Viana do Castelo, EP, é
transformada pelo Decreto-Lei n.º 55/91, de 26 de janeiro, em sociedade anónima de capitais maioritariamente
públicos, passando a denominar-se Estaleiros Navais de Viana do Castelo, SA.
Segundo o preâmbulo esta medida tem por objetivo dotar a empresa da flexibilidade necessária a um ritmo
de modernização adequado ao quadro de livre concorrência do mercado específico em que se insere e
permitir uma integral autonomia nos campos operacional e financeiro.
A sociedade Estaleiros Navais de Viana do Castelo, SA, sucede automática e globalmente à empresa
pública Estaleiros Navais de Viana do Castelo, EP, e continua a personalidade jurídica desta, conservando a
universalidade dos direitos e obrigações integrantes da sua esfera jurídica no momento da transformação (n.º
1 do artigo 2.º). Inicialmente, a ENVC, SA, tem um capital social de 14.963.936.91€ (n.º 1 do artigo 3.º).
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Os trabalhadores e pensionistas da empresa Estaleiros Navais de Viana do Castelo, EP, mantêm perante a
sociedade Estaleiros Navais de Viana do Castelo, SA, todos os direitos e obrigações que detinham à data da
entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 55/91, de 26 de janeiro (n.º 1 do artigo 6.º).
Em anexo a este diploma são aprovados os respetivos estatutos. Importa referir o n.º 1 do artigo 2.º que
determina que a sociedade tem duração por tempo indeterminado, e que a respetiva sede social situa em
Viana do Castelo, na Avenida da Praia Norte. A sociedade continua a ter por objeto a construção e reparação
navais, bem como o exercício de todas as atividades comerciais e industriais com ela conexas (n.º 1 do artigo
3.º) podendo, também, participar em sociedades de qualquer natureza e objetivo, associações, agrupamentos
complementares de empresas ou agrupamentos europeus de interesse económico (n.º 2 do artigo 3.º).
f. Programa de investimentos e reestruturação empresarial da ENVC
Foi em 1978 que pela primeira vez os projetos dos Estaleiros Navais de Viana do Castelo, EP, foram
incluídos no Programa de Investimentos do Setor Empresarial do Estado, conforme resulta do Despacho
Normativo n.º 202/78, de 31 de agosto. Tal situação veio a repetir-se nos anos de 1979, 1981 e 1982,
conforme resulta dos Despacho Normativo n.º 233/79, de 8 de setembro, Despacho Normativo n.º 266/81, de
26 de setembro, e Despacho Normativo n.º 110/82, de 28 de junho.
Também a reestruturação empresarial da ENVC já tinha sido colocada em 1979, pela Resolução n.º
311/79, de 31 de outubro, que aprovou as orientações em matéria de reequilíbrio económico-financeiro e de
dinamização do sector empresarial do Estado, e voltou a estar na ordem do dia com a aprovação da
Resolução do Conselho de Ministros n.º 55/98, de 29 de abril, que aprovou as bases do plano de
reestruturação empresarial da Estaleiros Navais de Viana do Castelo (ENVC).
De mencionar, ainda, que as Grandes Opções do Plano para 1999, 2004 e 2005, aprovadas,
respetivamente, pela Lei n.º 87-A/98, de 31 de dezembro (Declaração de Retificação n.º 8/99, de 3 de março),
Lei n.º 107-A/2003, de 31 de dezembro, e Lei n.º 55-A/2004, de 30 de dezembro, destacavam a viabilização
económico-financeira destes estaleiros como um dos objetivos a atingir.
g. Quadro resumo cronologia
1944 Criação dos Estaleiros Navais de Viana do Castelo
1946 Concessão de terrenos aos ENVC
1948 Alargamento do prazo de concessão dos terrenos aos ENVC Construção do primeiro navio pelos ENVC
1949 De sociedade por quotas a sociedade anónima de responsabilidade limitada Novo alargamento do prazo de concessão dos terrenos aos ENVC
1950 Alterações ao Pacto Social dos ENVC
1952 Alterações ao Pacto Social dos ENVC
1974 Novo alargamento do prazo de concessão dos terrenos aos ENVC
1975 Nacionalização dos ENVC
1976 De sociedade anónima de responsabilidade limitada a empresa pública
1989 Novo alargamento do prazo e da área de concessão dos terrenos aos ENVC
1991 De empresa pública a sociedade anónima de capitais maioritariamente públicos
1996/1997 Privatização dos ENVC no âmbito do programa de privatizações
2001 Contrato de aquisição de dois navios de patrulha oceânico e de combate à poluição
2004 Programa Relativo à Aquisição de Navios Destinados À Marinha Portuguesa - PRAN
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2005 Subconcessão de terrenos pelos ENVC EMPORDEF passa a deter 100% das ações dos ENVC
2006 Contrato de subconcessão entre os ENVC, SA, e a Enerconpor Processo C 26/2006 – Auxílio Estatal aos ENVC na Comissão Europeia
2007 Alargamento da área da subconcessão pelos ENVC
2009 Rescisão pelo Governo dos Açores do contrato do ferryboat Atlântida
2012 Processo de reprivatização do capital social da ENVC Processo sobre os ENVC na Comissão Europeia
2013
Redefinição da concessão dos terrenos aos ENVC Subconcessão à MARTIFER Declaração dos ENVC em situação económica difícil Processo, SA, 35546 (2013/C) – Auxílio Estatal aos ENVC na Comissão Europeia
2014 Comissão Parlamentar de Inquérito sobre os ENVC
4. Documentação
A Comissão, no âmbito do processo de inquérito, solicitou cópias de elementos procedimentais e
processuais a diversas entidades, tendo recebido a seguinte documentação:
DA COMISSÃO DE DEFESA NACIONAL
Navios “Atlântida” e “Anticiclone”
– Contratos das Construções 258 e 259, navios tipo “RO-RO DAY CAR & PASSENGERS FERRY”,
celebrados entre a Atlânticoline, SA, e a sociedade Estaleiros Navais de Viana do Castelo, SA;
– Sentença Arbitral;
– Relatório n.º 9/2009 – FS/SRATC do Reibunal de Contas, Auditoria à Atlânticoline, SA.
– Relatório n.º 930/2009 da Inspeção-Geral de Finanças (Confidencial)
Concurso para a “Subconcessão da Utilização Privativa do Domínio Público e das áreas afetas à
Concessão Dominial atribuída à Sociedade Estaleiros Navais de Viana do Castelo, SA.
– Despacho de nomeação do Júri – Despacho n.º 11029/2013 (DR 2.ª série, n.º 164, de 27 de agosto);
– Anúncio referente à abertura do procedimento
– Teaser sobre o procedimento
– Programa do Procedimento
– Caderno de Encargos
– Esclarecimento n.º 1
– Esclarecimento n.º 2
– Esclarecimento n.os
3 a 11
– Esclarecimento n.os
12 a 41
– Esclarecimento n.os
42 a 54
– Esclarecimento n.º 55
– Comunicação de não aceitação de caução a emitir pelo JSC Russian Standard Bank
– Comunicação de aceitação de caução a emitir pelo Montepio Geral
– Proposta subscrita pelo agrupamento Navalria/Martifer Energy
– Proposta subscrita pela AK Portugal
– Despacho de aperfeiçoamento sobre a Proposta subscrita pelo agrupamento Navalria/Martifer Energy
– Despacho de aperfeiçoamento sobre a Proposta subscrita pela AK Portugal
– Documentos em falta – Navalria/Martifer Energy
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– Requerimento de prorrogação de prazo AK Portugal
Despacho sobre o Requerimento de prorrogação de prazo AK Portugal
Despacho de admissão da Navalria/Martifer Energy
Despacho de exclusão da AK Portugal – Consultoria de Gestão, SA.
Requerimento para concessão de novo prazo abreviado pela AK Portugal
Despacho sobre Requerimento para concessão de novo prazo abreviado pela AK Portugal
Procedimento Concursal – Guião de Visita ao local (setembro 2013)
Ata n.º 1 do Júri
Ata n.º 2 do Júri
Ata n.º 3 do Júri
Ata n.º 4 do Júri
Relatório do Júri – outubro 2013
Sociedade Estaleiros Navais de Viana do Castelo, SA.
Antecedentes
– Contrato entre a Junta Autónoma dos Portos do Norte e Estaleiros Navais de Viana do Castelo, Limitada
– 02 de maio de 1946;
– Projeto do contrato de concessão Junta Autónoma dos Portos do Norte e Estaleiros Navais de Viana do
Castelo, EP – s/data
– Protocolo para a concessão de novos terrenos da Junta Autónoma dos Portos do Norte e Estaleiros
Navais de Viana do Castelo, EP – 23 de janeiro de 1988
– Contrato entre a Junta Autónoma dos Portos do Norte e Estaleiros Navais de Viana do Castelo, EP –
revisão do prazo de concessão de uso privativo e integração de mais área (DL n.º 11/89, 6 janeiro) – 24 de
maio de 1989
– Aditamento ao contrato de concessão celebrado a 2 de maio de 1946 com a Sociedade Estaleiros Navais
de Viana do Castelo, SA, relativo ao direito de uso privativo de uma parcela de domínio público marítimo no
Porto de Viana do Castelo – Parte: Instituto Portuário e dos Transportes Marítimos, IP – outubro 2006
– Segundo Aditamento ao contrato de concessão celebrado a 2 de maio de 1946 com a Sociedade
Estaleiros Navais de Viana do Castelo, SA, relativo ao direito de uso privativo de uma parcela de domínio
público marítimo no Porto de Viana do Castelo – 22 de novembro de 2007
– Concessão dominial
– Informação considerada relevante para efeitos do Procedimento de subconcessão da utilização privativa
do domínio público e das áreas afetas à concessão dominial atribuída à ENVC, SA, e a ENERCONPOR
(versão consolidada)
– Contrato de concessão entre a APVC – Administração do Porto de Viana do Castelo, SA, e os Estaleiros
Navais de Viana do Castelo, SA, – 30 de julho de 2013
Plantas e Ativos da Subconcessão
– Plantas dos terrenos
– Edifícios, infra-estruturas e demais equipamentos instalados na área afeta à concessão
– Edifícios, infra-estruturas e demais equipamentos instalados na área do domínio público
– Cadernetas prediais (caderneta predial urbana, descrições prediais e outras)
– Fichas Técnicas dos Ativos
– Planta Batimétrica
– Esquemas das redes
Licenciamentos
– Processos de licenciamento municipal e industrial
Planta do percurso; Percurso – Pontos Notáveis
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Projeto Icebreaker Plano de viabilidade empresarial dos Estaleiros Navais de Viana do Castelo – A.T.
Kearney
– Relatório final de 21 de janeiro de 2011
– Apresentação final de fevereiro de 2011, atualizada em 29 de junho de 2011
Relatório referente à reestruturação para posterior privatização dos ENVC –
Sociedade de Advogados, LCA, junho de 2011
Evolução do passivo financeiro dos ENVC
Navalria/Martifer Energy
– Relatório e Contas de 2010, 2011 e 2012
Procedimento no âmbito do processo instaurado pela Comissão Europeia – Auxílio estatal SA.
35546 (2013)
– Jornal Oficial da União Europeia, C 95/118, de 03 de abril de 2013, nas versões em língua portuguesa e
inglesa
Documentação entregue pela Sr.ª Eurodeputada Ana Gomes em audição na Comissão de Defesa no
dia 8-01-2014
– Carta da Sr.ª Eurodeputada Ana Gomes dirigida, em 20-12-2013, ao Senhor Joaquín Almunia, Vice-
Presidente da Comissão Europeia e Comissário para a Concorrência
– Queixa crime contra incertos apresentada pela Senhora Deputada ao Parlamento Europeu Ana Gomes à
Procuradora-Geral da República, por considerar que, na atribuição da subconcessão, por parte do Estado
Português, dos terrenos e infra-estruturas da empresa pública Estaleiros Navais de Viana do Castelo (ENVC)
ao agrupamento empresarial Navalria/Martifer Energy, anunciada pela Administração dos ENVC em 18
Outubro de 2013, terá havido violação de normas que, nos termos do Código Penal, punem a corrupção, o
tráfico de influência, o abuso de poder, o favorecimento de interesses privados.
Anexos:
– Auditoria Financeira aos ENVC da Inspeção-Geral de Finanças
– Correspondência com o Ministério da Economia sobre contrapartidas dos submarinos
– Carta de 30-09-2013, dirigida pela German Submarine Consortium ao Diretor Geral das Atividades
Económicas respeitante ao Programa relativo à aquisição de submarinos destinados à Marinha Portuguesa –
Contrato de Contrapartidas
-Comunicação da Comissão Europeia a Portugal, em 23.01.2013 (C(2013) 102 final)
– Jornal Oficial da União Europeia, C 95/118, de 03 de abril de 2013,
-Caderno de Encargos atinente ao procedimento Subconcessão da utilização privativa do domínio público e
das áreas afetas à concessão dominial atribuída à Sociedade “Estaleiros Navais de Viana do Castelo, SA”,
julho 2013
-Programa do Procedimento Subconcessão da utilização privativa do domínio público e das áreas afetas à
concessão dominial atribuída à Sociedade “Estaleiros Navais de Viana do Castelo, SA”, julho 2013
-Notícia do World Investment News sobre o grupo angolano GEFI – Sociedade de Gestão e Participações
Financeiras SARL.
E-mail de 21-12-2013 dirigido pela Eurodeputada Ana Gomes à Sr.ª Presidente da Assembleia da
República
DA COMISSÃO DE ECONOMIA E OBRAS PÚBLICAS
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Ofício n.º 16/CEOP, de 19 de fevereiro de 2014, indicando a ligação para a audiência concedida no GT –
Audiências à Comissão de Trabalhadores dos Estaleiros Navais e juntando dois documentos entregues
aquando da deslocação da Comissão aos ENVC (Comissão de Trabalhadores e Navios mais representativos),
bem como um memorando elaborado pelo Presidente da Câmara Municipal de Viana do Castelo que aborda a
questão dos Estaleiros Navais.
DA SR.ª PROCURADORA-GERAL DA REPÚBLICA
Ofício n.º 4759/2014, Proc. N.º 87/2012 Lº H, dando conhecimento que os dois processos de inquérito se
encontravam em segredo de justiça.
DO SR. PRIMEIRO-MINISTRO
Ofício n.º 1017, de 10.03.2014, dando satisfação ao solicitado com o envio de documentos coligidos (2
volumes) a respeito do Procedimento aberto pela Comissão Europeia sobre os auxílios estatais ao ENVC e
toda a documentação entregue pelo Governo Português, a saber:
– G-SET, Privatisation of ENVC, 03-10-2012
– European Commission, DG Competion, 11-10-2012
– G-SET, DGCOM, de 09.11.2012
– European Commission Competion, DG, SA 35546 – Privatisation ENVC, 22-11-2012
– European Commission Competion, DG, SA 35546 – Privatisation ENVC, 07-12-2012
– G-SET, DGCOM State Aid SA 35546, de 28.12.2012
– G-SET, DGCOM State Aid SA 35546 – Addicional Inf. From PT Authorities, de 28.12.2012
– G-SET, DGCOM State Aid SA 35546 – Addicional Inf. From PT Authorities, de 28.12.2012
– European Commission Secrétariat Général, State Aid SA 35546 (2012/Nn), de 22-01-2013
– G-SET, DGCOM State Aid SA 35546 – Addicional Inf. From PT Authorities, de 08.02.2013
– Comissão Europeia Concorrência, 2013/014377 – SA 35546 Addicional Inf. From PT Authorities, de 11-
02-2013
– Commission Européenne Secreériat Général, State Aid SA 35546 – Portugal, de 22-01-2013
– G-SET, DGCOM State Aid SA 35546 – PT – Privatisation of ENVC Confidentialities, de 13-02-2013
– GPEARI – MF, Auxilios de Estado SA 35546 – PT Medidas Anteriores em Benefício dos ENVC, de 21-02-
2013
– G-SET, DGCOM State Aid SA 35546 – PT – Privatisation of ENVC Confidentialities, de 05-03-2013
– Comissão Europeia Concorrência, SA 35546 (2013/C) (Ex 2012/NN) – Medidas Anteriores a Favor dos
ENVC, de 26-02-2013
– Conselho Europeu, ENVC Alternatives Being Envisaged, de 07-03-2013
– G-SET, ENVC Alternatives Being Envisaged, de 07-03-2013
– G-SET, DGCOM State Aid 35546 PT – Privatisation of ENVC – Addicional Information from PT
authorities, de 12-03-2013
– Official Journal of the European Union, Procedures Relating to the Implementation of – Competition Policy
– G-SET, DGCOM State Aid 35546 (2012/CPP) PT – Privatisation of ENVC, de 13-03-2013
– G-SET, DGCOM State Aid 35546 (2012/CPP) PT – Privatisation of ENVC, de 13-04-2013
– G-SET Additional Questions ENVC, de 16-05-2013
– G-SET Additional Question ENVC, de 27-05-2013
– G-SET, Requests, de 31-05-2013
– G-SET, Additional Questions ENVC, de 27-06-2013
– G-SET, Additional Questions ENVC, de 01-07-2013
– G-SET, ENVC Discontinuing Activities, de 02-07-2013
– G-SET, Conference Call – ENVC – Finalisation of Subconcession Documentation, de 27-07-2013
– Conselho Europeu, Conference Call – ENVC – Finalisation of Subconcession Documentation, de 29-07-
2013
– G-SET, ENVC Addicional Information, de 27-09-2013
– G-SET, ENVC Addicional Information, de 24-10-2013
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– G-SET, ENVC Addicional Information, de 20-11-2013
– G-SET, ENVC Addicional Information, de 12-12-2013
– Conselho Europeu, Request from DCIAP, de 20-01-2014
– G-SET, Request from DCIAP, de 31-01-2014
– G-SET, SA 35546 Past Measures in Favour of ENVC (CD), de 13-02-2014
– GPEARI – MF, SA 35546 (2013/C) – PT – Medidas Anteriores a favor dos ENVC, de 14-02-2014
– G-SET, SA 35546 Past Measures in Favour of ENVC, de 27-02-2014
DOS ESTALEIROS NAVAIS DE VIANA DO CASTELO
Ofício CADM 31/14, de 11 de março de 2014 – Envio de toda a documentação solicitada pela CPIENVC
através do ofício n.º 9/CPIENVC/2014, de 28 de fevereiro de 2014, com exceção do referente ao ponto 4.2. –
Pareceres técnico-jurídicos que coadjuvaram a celebração do contrato, na medida em que os mesmos não
foram solicitados pelos ENVC. Estes apenas se socorreram do Consultor Jurídico PBBR.A – Sociedade de
Advogados, RL para a elaboração das peças concursais.
Ofício CADM 33/14, de 13 de março de 2014 – Envio da documentação solicitada pela CPIENVC através
do ofício n.º 13/CPIENVC/2014, de 11 de março de 2014.
Ofício CADM 50/14, de 27 de março de 2014 – Envio adicional e por iniciativa dos ENVC do Relatório
elaborado em 30 de abril de 2009, pelo assessor do Conselho de Administração da EMPORDEF, Almirante
Luís Filipe Xavier Cabrita e a Análise do processo de projeto das construções C258 e C259 nos Estaleiros
Navais de Viana do Castelo, elaborada em 14 de agosto de 2009, pelo Centro de Engenharia e Tecnologia
Naval do Instituto Superior Técnico. Estes documentos reportam-se às construções C258 (navio “Atlântida) e
C259 (navio “Anti Ciclone”).
Ofício CADM 53/14, de 2 de abril de 2014 – Envio da documentação solicitada pela CPIENVC através do
ofício n.º 20/CPIENVC/2014, de 27 de março de 2014.
Ofício CADM 101/14, de 28 de maio de 2014 – Envio da documentação solicitada pela CPIENVC através
do ofício n.º 32/CPIENVC/2014, de 15 de maio de 2014.
DA EMPORDEF
Ofício n.º 160/PRCA, de 10 de março de 2014 – Envio de toda a documentação solicitada
DA COMISSÃO ESPECIAL DE ACOMPANHAMENTO DO PROCESSO DE PRIVATIZAÇÃO
Ofício de 10 de março de 2014 – Envio de toda a documentação solicitada
Ainda no respeitante a documentação, acresce que na decorrência das audições foram entregues pelos
depoentes os seguintes elementos:
Documentação entregue pelo Dr. Vicente Ferreira, Presidente do Conselho de Administração da
EMPORDEF
Apresentação efetuada na audição realizada a 13 de março de 2014.
Deliberação Social Unânime por Escrito (DUE) dirigida, em 13-01-2010, ao Presidente do CA da
EMPORDEF pela Direção Geral do Tesouro.
Ofício da EMPORDEF enviando documentação ao Tribunal de Contas, em 31-05-2013, sobre o processo
de reprivatização da empresa ENVC, SA.
Ofício da EMPORDEF enviando documentação ao Tribunal de Contas, em 29-08-2013, sobre o processo
de reprivatização da empresa ENVC, SA.
Ofício do Gabinete do Secretário de Estado da Defesa Nacional e dos Assuntos do Mar, n.º 5846/CG, de
23-12-2010 sobre o Contrato de fornecimento de navios patrulha oceânicos e navios de combate à poluição.
Ofício do Gabinete do Secretário de Estado da Defesa Nacional e dos Assuntos do Mar, n.º 2639/CG, de
20-06-2011,sobre Estudo de viabilidade empresarial da ENVC, SA.
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Ofício da Direção-Geral de Armamento e Infraestruturas de Defesa, n.º 5956, de 18-11-2010, sobre a
Alteração contratual n.º 2 ao contrato de aquisição dos Navios de Combate à Poluição (NCP).
Parecer da Sociedade de Advogados, Paz Ferreira e Associados, 16 de agosto de 2011, sobre os
mecanismos de auxílios de Estado atribuíveis à indústria de construção naval.
Programa ICEBREAKER – apresentação final atualizada a junho de 2011.
Projeto ICEBREAKER – Relatório Final, de 21 de janeiro de 2011.
Relatório da Sociedade de Advogados LCA, de 17 de junho de 2011, referente à reestruturação para
posterior privatização dos ENVC, SA.
Documentação entregue pelos Senhores Branco Viana e Martinho Cerqueira, Representantes da
União dos Sindicatos de Viana do Castelo
Informação distribuída aos trabalhadores dos ENVC
Documentação entregue pelos Srs. António Costa e Abel Viana, Coordenador e Representante da
Comissão de Trabalhadores dos ENVC
Comunicação n.º 08/13, de 02-12-2013, do Conselho de Administração dos ENVC
E-mail da Comissão de Trabalhadores enviado, em 01-03-2013, ao Sr. Secretário de Estado da Economia,
Dr. António Almeida Henriques – solicitação de audiência
E-mail da Comissão de Trabalhadores enviado, em 22-07-2013, ao Senhor Primeiro-Ministro, sobre a
Subconcessão dos terrenos onde operam os ENVC e a provável fraude à Lei dos Trabalhadores
E-mail da Comissão de Trabalhadores enviado, em 19-07-2013, ao Sr. Presidente da República, sobre a
Promulgação da Subconcessão dos terrenos onde operam os ENVC
E-mail da Comissão de Trabalhadores enviado, em 28-01-2013, ao Sr. Ministro da Economia e do
Emprego, Dr. Álvaro Santos Pereira – Pedido de audiência com urgência
E-mail da Comissão de Trabalhadores enviado, em 31-05-2013, ao Sr. Ministro de Estado e dos Negócios
Estrangeiros, Dr. Paulo Portas – Agradecimento pelo seu empenhamento pessoal e intervenção diplomática,
no Processo dos Navios Asfalteiros para a PDVSA da Venezuela
E-mail da Comissão de Trabalhadores enviado, em 25-09-2013, ao Sr. Ministro da Defesa Nacional, Dr.
José Pedro Aguiar Branco, sobre o Processo de Subconcessão dos ENVC
E-mail da Comissão de Trabalhadores enviado, em 14-02-2014, ao Sr. Ministro da Defesa Nacional, Dr.
José Pedro Aguiar Branco – Pedido de Informação relativa ao Processo da Subconcessão dos terrenos e
infraestruturas dos ENVC
E-mail da Comissão de Trabalhadores enviado, em 01-08-2013, ao BES a solicitar o caderno de encargos
da subconcessão
E-mail da Comissão de Trabalhadores enviado, em 01-02-2013, à Sr.ª Secretária de Estado do Tesouro,
Dra. Maria Luís Albuquerque sobre a iminência da rescisão do contrato dos Asfalteiros para a Venezuela,
devido à dificuldade de contratação pública
Documentação entregue pelo Prof. Dr. Augusto Santos Silva, Ministro da Defesa Nacional do XVIII
Governo Constitucional
Intervenção inicial
Documentação entregue pelo Engenheiro José Manuel Fernandes, Presidente da Comissão Especial
para o Acompanhamento de Reprivatização da ENVC, S.A.
Lista das reuniões de trabalho efetuadas no âmbito da Comissão Especial de Acompanhamento
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Documentação entregue pelo Dr. António Jorge Rolo, Presidente do Conselho de Administração
dos ENVC no período de 2009 a 2010
Apresentação efetuada no depoimento em Comissão em 30-04-2014
Auditoria Organizacional
-Relatório Final ENVC apresentado à Administração da EMPORDEF, em 27-02-2009, pela Egon Zehnder
International
-Futuro desenho organizacional dos ENVC, SA, apresentado em 03-02-2009, pela Egon Zehnder
International
BPI
-Plano de Reestruturação dos ENVC, S.A. – Documento de trabalho, 26-03-2010
– Plano de Reestruturação dos ENVC, S.A. – Documento de trabalho, 20-04-2010
– Medidas de Reestruturação (EUROGROUP) dos ENVC – Documento de trabalho, 02-06-2010
Contrato Atlântida
– Aditamento n.º 1 ao contrato de fornecimento de um navio do tipo RO-RO Day Car & Passengers Ferry
para operar no Tráfego Marítimo Internacional, com capacidade mínima para transportar 400 pessoas e 32
viaturas (Navio C259), 29-12-2006
– Aditamento n.º 2 ao contrato de fornecimento de um navio do tipo RO-RO Day Car & Passengers Ferry
para operar no Tráfego Marítimo Internacional, com capacidade mínima para transportar 790 pessoas e 140
viaturas (Navio C258)
EUROGRUPO CONSULTING ALLIANCE
-ENVC – “Assembly Shipyard”, Business Pane, june 2009
– Reconquer Trust and Credibility, Stakeholders map and Communication Plan, Initial draft, 7th of may 2009
– Recover ENVC’s Trust and Credibility, Internal diagnostic, june 10th 2009 (CONFIDENCIAL)
– Recover ENVC’s Trust and Credibility, Transformation Road Map, june 2009 (CONFIDENCIAL)
– Recover ENVC’s Trust and Credibility, Strategic Positioning, june 10th 2009 (CONFIDENCIAL)
– Reconquistar a confiança e a credibilidade dos ENVC, reunião de arranque do projeto, 24-04-2009
– Programa de transformação dos ENVC, 23-11-2009
– Macroestrutura organizacional, fevereiro 2010
– Posicionamento Estratégico – Recuperar confiança, credibilidade e competitividade
AT Kearney
– Projeto Icebreaker, Relatório final, 21 de janeiro de 2011
Ferries Hellinic Seaways
– Ofício do Banco Espírito Santo aos ENVC, N/Refª DBTNI/GTF-17102009, de 17 de novembro de 2009 –
Ship Building Contract Buyer’s Credit Facility
– Annex n.º 3 – Contract Price and Installments NB 268
– Notícia de Geoff Garfied, London – Hellenic Seaways linked to ferry deal
– Rina Iberia S.L.U. – Statement n.2010/XA/01/814-2, de 28-12-2010
– Shipbuilding Contract for RO-PAX Fast Ferry 2350 tDw NB 268
– Shipbuilding Contract for RO-PAX Fast Ferry 2350 tDw NB 269, 11th of june 2010
Documentação respeitante ao contrato com a Atlânticoline
– Ofício n.º 1673 da Atlânticoline, de 23-04-2009, dirigido à Caixa Geral de Depósitos sobre Garantias
Bancárias – Estaleiros Navais de Viana do Castelo.
– Ofício n.º 134/09 da Caixa Geral de Depósitos, de 28-04-2009, dirigido aos ENVC, S.A. sobre Navio C258
– acionamento de garantias bancárias pela Atlânticoline, SA.
– Fax de Abreu Advogados, de 28-04-2009, dirigido à Caixa Geral de Depósitos, em resposta ao ofício n.º
134/09 da CGD.
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– Fax da Caixa Geral de Depósitos à Sociedade Abreu Advogados, de 30 de abril de 2009, dando a
conhecer que estavam impedidos de proceder ao pagamento das garantias bancárias acionadas pela
Atlânticoline.
– Ofício n.º 1750 da Atlânticoline, de 14-05-2009, dirigido à Caixa Geral de Depósitos sobre o acionamento
da garantia bancária n.º 9140031683193.
– Ofício n.º 232/09 da Caixa Geral de Depósitos, de 2 de junho de 2009, dirigido aos ENVC acerca do
acionamento da garantia bancária n.º 9140031683193 pela Atlânticoline.
– Processo n.º 647/09BEBRG relativo à providência cautelar interposta pelos ENVC, S.A. junto do Tribunal
Administrativo e Fiscal de Braga.
– Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, de 29 de outubro de 2009, relativo ao Recurso
Jurisdicional Processo n.º 647/09.OBEBRG e peças processuais ao mesmo atinentes.
Documentação entregue pelo Sr. Contra-Almirante Victor Gonçalves de Brito, Presidente do
Conselho de Administração dos ENVC no período de julho a setembro de 2010
Intervenção inicial na audição
Quatro artigos escritos pelo próprio e referentes aos ENVC
Documentação entregue pelo Dr. Carlos Alberto Veiga Anjos, Presidente do Conselho de
Administração dos ENVC no período de setembro de 2010 a junho de 2011
Documentação dirigida pelo Presidente do CA dos ENVC, SA, à Câmara Municipal de Viana do Castelo:
– Ofício CADM69/11, de 07.07.11 com os seguintes anexos
– Ofício CADM27/11, de 26.04.11 dirigido ao CA da EMPORDEF – Assembleia Geral Extraordinária
– Ofício CADM26/11, de 26.04.11 dirigido ao Presidente do Conselho Fiscal dos ENVC, SA. –
Requerimento de convocação de Assembleia Geral Extraordinária dos ENVC, SA.
– Convocatória da Assembleia Geral dirigida à EMPORDEF
– Documento dirigido aos colaboradores pelo Presidente do CA dos ENVC, SA.
– Plano Social ENVC – maio de 2011
Documentação entregue pelo Engenheiro Jorge Camões, atual Presidente do Conselho de
Administração dos ENVC
Ata n.º 3/2011, de 28 de abril de 2011, da Comissão Executiva dos ENVC, S.A..
Historial dos C.258/C.259, elaborada pelo Gabinete de Gestão de Projetos GAGP dos ENVC, de 13 de
fevereiro de 2012.
Documentação entregue pelo Dr. Carlos Alberto Viveiros dos Reis, Presidente do Conselho de
Administração da Atlânticoline, SA
Contrato de fornecimento de um navio do tipo “RO-RO Day Car & Passengers Ferry” para operar no
Tráfego Marítimo Internacional, com capacidade mínima para transportar 400 pessoas e 32 viaturas, de 21 de
setembro de 2006
Contrato de fornecimento de um navio do tipo “RO-RO Day Car & Passengers Ferry” para operar no
Tráfego Marítimo Internacional, com capacidade mínima para transportar 790 pessoas e 140 viaturas, de 21
de setembro de 2006
Ship Speed and Power Measurements on MV “Atlântida”
Documentação entregue pelo Engenheiro José Maria Costa, Presidente da Câmara Municipal de
Viana do Castelo
Intervenção inicial no âmbito da audição
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Listagem das reuniões promovidas pela Câmara Municipal sobre os ENVC
Documentação entregue pelo Engenheiro João Moita, Consultor da Atânticoline e dos ENVC
Contrato de fornecimento entre a Atlânticoline e a Sociedade de Consultores Marítimos, Lda (SCMA) –
2005
Contrato de prestação de serviços entre a Atlânticoline e a Sociedade de Consultores Marítimos, L.da
(SCMA) – 2005
Contrato de prestação de serviços entre a Atlânticoline e a Sociedade de Consultores Marítimos, L.da
(SCMA) – 2007
E-mail do Eng.º João Moita dirigido à Atlânticoline, em 18 de setembro de 2006 – comentários à memória
descritiva do navio RO-RO Ferry de 97mts, com as alterações /comentários dos ENVC
Prova de mar
5. Audições
A CPI convocou para depor as seguintes entidades de acordo com a ordem que infra se apresenta:
DATA ENTIDADES
2014-03-11 Sr. Ministro da Defesa Nacional, Dr. José Pedro Aguiar Branco
2014-03-13 Sr. Presidente do Conselho de Administração da EMPORDEF, Dr. Vicente Ferreira
2014-03-18 União dos Sindicatos de Viana do Castelo, Sr. Branco Viana e Sr. Martinho Cerqueira
2014-03-26 Comissão de Trabalhadores dos Estaleiros Navais de Viana do Castelo, Sr. António Costa e Sr. Abel Viana
2014-03-27 Sr. Presidente do Júri do Concurso Público para a Subconcessão dos ENVC, Dr. João Cabral Tavares
2014-04-01 Sr. Prof. Dr. Augusto Santos Silva, na qualidade de ex-Ministro da Defesa Nacional do XVIII Governo
2014-04-03 Sr. Eng.º José Manuel Fernandes, Presidente Comissão Especial de Acompanhamento Privatização ENVC
2014-04-29 Sr. Dr. Fernando Manuel Geraldes, na qualidade de ex-Presidente do Conselho de Administração dos Estaleiros Navais de Viana do Castelo, no mandato de 2004 a 2007
2014-04-29 Sr. Eng.º Arnaldo Pedro Figueirôa Machado, na qualidade de ex-Presidente do Conselho de Administração dos Estaleiros Navais de Viana do Castelo, no mandato de 2007 a 2009
2014-04-30 Sr. Dr. António Jorge Garcia Rolo, na qualidade de ex-Presidente do Conselho de Administração dos Estaleiros Navais de Viana do Castelo, no mandato de 2009 a 2010
2014-05-06 Sr. Almirante Victor Manuel Gonçalves de Brito, na qualidade de ex-Presidente do Conselho de Administração dos Estaleiros Navais de Viana do Castelo, no mandato de julho a setembro de 2010
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DATA ENTIDADES
2014-05-06 Sr. Dr. Carlos Alberto Veiga Anjos, na qualidade de ex-Presidente do Conselho de Administração dos Estaleiros Navais de Viana do Castelo, no mandato de setembro de 2010 a junho de 2011
2014-05-07 Atual Conselho de Administração dos Estaleiros Navais de Viana do Castelo
2014-05-13 Sr. Presidente da Atlânticoline, SA, Dr. Carlos Alberto Viveiros dos Reis
2014-05-27 Sr. Eng.º António Martins Iglésias, na qualidade de ex-técnico dos Estaleiros Navais de Viana do Castelo
2014-05-28 Sr. Presidente da Câmara Municipal de Viana do Castelo, Sr. Eng.º José Maria Costa
2014-06-03 Sr. Eng.º João Moita, na qualidade de consultor da Atlânticoline e dos Estaleiros Navais de Viana do Castelo
2014-06-04 Sr. Prof. Duarte José Botelho da Ponte, na qualidade de Secretário Regional da Economia do Governo Regional dos Açores de 1996 a 2008
6. Averiguação das circunstâncias que levaram ao protelamento, cancelamento ou perda de
encomendas e as respetivas consequências no agravamento da situação da empresa ENVC.
a. Gestão da empresa ENVC
Por forma a averiguar as circunstâncias que levaram ao protelamento, cancelamento ou perda de
encomendas e as respetivas consequências no agravamento da situação da empresa ENVC, tentou-se
perceber qual foi o papel da Tutela sectorial, da Empordef, das Administrações da empresa e dos
Trabalhadores na ENVC.
Audição do Sr. Ministro da Defesa Nacional
Na primeira audição na CPI, o Sr. Ministro da Defesa Nacional, Dr. José Pedro Aguiar Branco, fez um
enquadramento sobre a atual situação da ENVC, aos Srs. Deputados e o que encontrou aquando da sua
tomada de posse.
Destaca-se a resposta dada ao Sr. Deputado António Filipe:
“(…) Sr. Deputado, quando em junho de 2011 o atual Governo tomou posse a EMPORFEF não tinha
presidente, os Estaleiros Navais de Viana do Castelo não tinham presidente e apresentavam um passivo de
mais de 250 milhões de euros; os capitais próprios negativos eram superiores a 100 milhões de euros; a dívida
bancária era de mais de 160 milhões de euros; os contratos estavam naquela situação de execução, como eu
lhe referi, e não havia encomendas para fazer, operar e executar. Esta era a realidade quando o Governo
tomou posse em 2011!
Nomeada uma nova administração, esta, numa primeira fase, tentou desenvolver contatos no sentido de ter
e encontrar os parceiros necessários para a privatização que permitisse injetar capital naquela empresa.
Talvez hoje por força da ação patriótica deste Governo se esqueça a situação existente em 2011, mas em
2011 não havia dinheiro para nada. Não havia dinheiro no País nem nos Estaleiros Navais de Viana do
Castelo e, portanto, o quadro de trabalho, em junho de 2011, era uma situação de não ter dinheiro e, como o
Estado não tinha dinheiro nem para as suas funções básicas, ainda menos tinha para poder usar, utilizar e
investir nos Estaleiros Navais de Viana do Castelo!”3
3 Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 11 de março de 2014, Sr. Ministro da Defesa Nacional, Dr. José Pedro Aguiar Branco, pág. 34.
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Audição do Sr. Prof. Augusto Santos Silva
Na sexta audição, o ex-Ministro da Defesa Nacional, Sr. Prof. Augusto Santos Silva, que tutelou área da
Defesa, entre outubro 2009 e junho de 2011, fez uma declaração inicial, onde afirmou:
“(…) Aquando da minha tomada de posse como Ministro da Defesa Nacional, os Estaleiros debatiam-se
com problemas muito graves. Um era estrutural e exógeno: a deslocação da construção naval para Leste e,
em particular, para a Ásia. Outros problemas eram internos e conjunturais, sendo o principal, a meu ver, a
debilidade da tecnoestrutura da empresa, mas as condições de financiamento também constituíam restrições
muito severas.
Neste contexto, o Governo a que tive a honra de pertencer definiu cinco objetivos essenciais.
O primeiro era concluir, com o menor prejuízo possível para o interesse público e a situação da empresa, o
problema que se encontrava ainda em aberto, referente à resolução do contrato do navio Atlântida.
O segundo objetivo era levar a bom termo a conclusão do primeiro navio de patrulha oceânica, o Viana do
Castelo, encomendado pela Marinha portuguesa, assim demonstrando prática e efetivamente a capacidade da
empresa para a construção naval militar.
O terceiro objetivo era garantir novas encomendas civis para os Estaleiros.
O quarto era dotar os Estaleiros de uma administração própria, com as competências necessárias para
concluir e aplicar uma profunda reestruturação organizacional.
E o quinto era aprovar e realizar esta reestruturação e articulá-la com a desejável entrada de capital
privado nos Estaleiros, para que a combinação entre a lógica do acionista público e a lógica de acionistas de
referência no mercado internacional da construção e reparação naval pudesse resultar na consolidação de
uma capacidade nacional neste importante setor de atividade.
Quando o XVIII Governo Constitucional cessou funções, a menos de metade do seu mandato, estava por
cumprir o quinto objetivo. Um primeiro programa de reestruturação ficou delineado, mas carecendo ainda de
afinações técnicas e subsequente implementação.
Vou indicar as medidas principais de concretização dos objetivos, para se ter uma ideia mais clara da
orientação prosseguida.
Nos fins de outubro de 2009, a situação da encomenda de dois navios pela empresa Atlânticoline era a
seguinte: decorriam diligências entre as partes contratantes para conseguir um acordo extrajudicial, cumprindo
desta forma os Estaleiros uma das recomendações feitas no relatório conjunto das inspeções das Finanças e
da Defesa, validado por despacho das respetivas tutelas; em simultâneo, estava em curso um processo
judicial, a partir da reclamação, pelo cliente ou armador, do pagamento da garantia bancária dita first demand,
em virtude de incumprimento contratual por parte do construtor, tendo este interposto uma providência
cautelar.
O acordo extrajudicial foi conseguido, assim se pondo termo a uma demanda judicial, na qual a posição
dos Estaleiros se tornava crescentemente mais frágil. A lógica do acordo foi a devolução das verbas já
adiantadas pelo cliente, ficando o construtor com a plena disponibilidade do navio construído — para o qual
havia outros potenciais interessados — e comprometendo-se ambas as partes a colaborarem em processos
contra terceiros responsáveis por falhas detetadas na construção.
Para que o acordo fosse alcançado, foi necessário autorizar os Estaleiros a contrair crédito bancário, o que,
após estudo e parecer favorável da Direção-Geral do Tesouro, foi feito por despacho conjunto das Finanças e
da Defesa, de 23 de dezembro de 2009.
Como se vê por esta brevíssima síntese — que detalharei se tal for do interesse de algum Deputado ou
Deputada —, a lógica da ação do Governo foi evitar que esse particularmente delicado incumprimento
contratual dos Estaleiros significasse o fim desta nossa importante capacidade económica e estratégica.
Por isso mesmo, o foco principal da ação subsequente foi a realização dos atrás referidos segundo e
terceiro objetivos, concluindo sem mais nenhum percalço técnico e/ou contratual a primeira encomenda do
programa de equipamento militar contratado com a Marinha.
Fazer e entregar o Viana do Castelo era importantíssimo por várias razões: porque mostrava
insofismavelmente o apetrechamento da empresa; porque assegurava a continuidade da relação com as
Forças Armadas (absolutamente essencial para a missão que vários governos, incluindo aqueles a que
pertenci, definiram para os Estaleiros); e porque abria um novo e decisivo campo de expansão para a
empresa, como, aliás, logo se viu, com o interesse manifestado por Marinhas estrangeiras.
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O navio Viana do Castelo foi entregue em dezembro de 2010, no que constituiu uma firme demonstração
de capacidade por parte de todo o pessoal dos Estaleiros. E eu gostaria de agradecer publicamente, mais uma
vez, o empenho que nisto colocou o então Secretário de Estado Marcos Perestrelo, hoje ilustre Deputado
nesta Câmara.
Por outro lado, o XVIII Governo empenhou-se, e ao mais alto nível, na facilitação de novas encomendas,
agora civis. A mais importante foi a dos dois navios ditos asfalteiros, por parte de uma empresa pública
venezuelana.
Estes dois pontos são determinantes. O programa de encomendas da Marinha — comportando navios de
patrulha oceânica e de combate à poluição e lanchas de fiscalização costeira — e a encomenda dos
asfalteiros (só para falar das encomendas contratualizadas) garantiam um volume de trabalho aos Estaleiros
que: a) lhes permitia superar o grave fracasso que havia constituído o processo do Atlântida e as suas
repercussões financeiras, técnicas, comerciais e reputacionais; b) proporcionava uma base sólida para a
indispensável e inadiável reestruturação profunda da empresa; e c) alavancava a gestão técnica e legal das
obrigações financeiras perante o seu acionista num plano que não fosse confundível com ajudas indevidas de
Estado.
Dessa reestruturação trataram as medidas que procuravam cumprir os dois últimos objetivos. Foi nomeada
uma administração própria para os Estaleiros, que conjugava competências nas áreas críticas da gestão, da
tecnologia, da ligação com a Marinha e do enraizamento local e regional. E essa administração conduziu as
etapas finais de realização de um plano de reestruturação da empresa, a que a tutela exprimiu o seu acordo
de princípio, pedindo desenvolvimentos parciais, e que o Governo seguinte tratou da forma que, muito
legitimamente, melhor entendeu.
Gostaria, se VV. Ex.as
me permitem, de dar conta da lógica global da opção de reestruturação que o XVIII
Governo aprovou na generalidade.
Os estudos apresentados pela empresa previam três cenários possíveis: continuidade, encerramento e
reestruturação profunda, com redimensionamento em baixa do número de trabalhadores e alteração profunda
dos processos técnicos, comerciais e de gestão. Os dois primeiros cenários eram inaceitáveis, até pelo seu
custo financeiro. Nada alterar na estrutura significava agravar os problemas da empresa. Encerrá-la significava
retirar a Portugal a possibilidade de manter uma capacidade própria e autónoma numa área tão sensível como
a reparação e construção naval. A reestruturação tinha de atacar a raiz dos problemas. Apresentado e
validado o estudo pela administração da empresa, obtido o parecer favorável do Tesouro, a opção só podia
ser, a meu ver, determinar à administração que prosseguisse e aprofundasse o plano de reestruturação
proposto.”4
EMPORDEF
A EMPORDEF, SGPS, SA, é uma empresa holding, criada em 1997 (DL 235-B/96 de Dezembro),
propriedade do Estado Português que administra outras empresas direta ou indiretamente ligadas ao sector da
defesa, tais como telecomunicações, tecnologia de informação, engenharia, construção aeronáutica e naval.
A partir de 2005, a ENVC passou a integrar a carteira de participações sociais da EMPORDEF – Empresa
Portuguesa de Defesa (SGPS), SA, sociedade holding do Estado para as indústrias da defesa, que passa a
deter 100 % das ações da ENVC, SA.
Para além da ENVC, as empresas que integram o grupo EMPORDEF, são: OGMA, DDI, EID, EDISOFT,
DEFAERLOC, DEFLOC, Naval Rocha, Arsenal do Alfeite, OGMA Imobiliária, SA, Ribeira d’Atalaia –
Sociedade Imobiliária, SA.
Analisa-se o que disse o Presidente do Conselho de Administração da Empordef, Sr. Dr. Rui Jorge de
Carvalho Vicente Ferreira, transcrevendo-se parte da sua exposição inicial, suportada num Powerpoint5:
“(…) A perspetiva que hoje vos trago aqui é, pura e simplesmente, de acionista, ou seja, o que é que um
acionista analisa numa empresa que recebe e, entrando na gestão, num universo de cerca de 12 empresas do
4 Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 1 de abril de 2014, Ministro da Defesa Nacional do XVIII Governo Constitucional, Sr. Prof. Augusto
Santos Silva, págs.3-7. 5 Anexo IV – Powerpoint apresentado pelo Sr. Presidente da EMPORDEF na CPI, audição de 13 de março de 2014.
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Grupo, como é que encara, como é que orienta a estratégia para uma solução, isto é, quais os passos
necessários para criar uma solução.
Em agosto de 2011, o Conselho de Administração da EMPORDEF tomou posse, assim como o Presidente
do Conselho de Administração dos Estaleiros de Viana do Castelo.
Os constrangimentos existentes à época eram muito claros: a empresa tinha 82 milhões de euros de
capitais próprios negativos, o que quer dizer que era financiada por terceiros, não tinha condições para se
autofinanciar; o passivo total estava em cerca de 255 milhões de euros; tinha financiamentos de três entidades
(o que depois veremos em detalhe) de cerca de 162 milhões de euros; adiantamentos de clientes de 27
milhões de euros; contingências diversas de 15 milhões de euros; 14 milhões de euros de outros credores; o
Fundo de Pensões — que é conhecido — tinha um défice de 12 milhões de euros; as dívidas a fornecedores
eram de 8 milhões de euros. Tinha, ainda, uma dívida à Atlânticoline de 7 milhões de euros, uma dívida à
Parpública (Parpública – Participações Públicas, SGPS, S.A.) de 1,4 milhões de euros, pelas rendas não
pagas nos dois anos anteriores e mais um semestre, e tinha penhoras a equipamentos, dois guindastes, a
favor da Autoridade Tributária. (slide 1)
Outros constrangimentos: Fundo de Pensões. A empresa tinha responsabilidades de cerca de 27 milhões
de euros, em relação ao universo dos beneficiários desse Fundo, quer reformados, quer pessoas ainda no
ativo e que viriam a estar reformadas; o valor do Fundo, os ativos existentes no Fundo eram, naquela altura,
de cerca de 17 milhões de euros e o défice teve, nos anos de 1999 a 2012, esta evolução, para atingir os 14
milhões de euros de défice que anteriormente tinha referido, de acordo com as prestações que a empresa ia
dando e com a variação do valor dos ativos no próprio Fundo.
Um dado importante, muito importante: só a gestão do Fundo pela entidade bancária que o fazia — BPI
Vida e Pensões — custava, grosseiramente, meio milhão de euros por ano. Outro dado relevante: os
trabalhadores não tinham qualquer contribuição para o Fundo (slide 2)
Para conseguir reequilibrar a situação, não debelar o défice, digamos que a empresa estava na
contingência de fazer uma contribuição, no mínimo, e em relação a exercícios passados, de 5,5 milhões de
euros, e de 724 000 € para o plano de amortização daquele ano (slide 3).
O endividamento da empresa — e isto olhando a sua evolução a um prazo relativamente grande, cerca de
10 anos, principalmente desde 2005 até 2010, digamos, inícios ou meados de 2011 — tinha aumentado em
100 milhões de euros, partindo de uma situação relativamente equilibrada nos anos de 2003, 2004 (ter até 50
milhões de endividamento, face ao volume de atividade que tinha, não era significativo, digamos que teria
meios para conseguir fazer o serviço da dívida), mas, de facto, de 2005 a 2010 foi galopante (slide 4).
A origem desse endividamento que, inicialmente, nos anos de 2003 a 2005, era um financiamento
estritamente da banca, alterou-se: em 2006, a empresa necessitou de financiamento do Tesouro para
conseguir gerir os seus negócios e ter a sua atividade. Portanto, logo em 2006, cerca de 65% do
endividamento passou a ser do Tesouro. Depois teve alguma flutuação e, no início de 2011, estava mais ou
menos um terço, um terço: Direção-Geral do Tesouro, banca (a vermelho no gráfico do slide 5) e o acionista,
que em 2009 teve de suprir a empresa. Para quê? Para uma transação que é conhecida, que foi o
financiamento da devolução do preço dos adiantamentos à Atlânticoline. Ou seja, a EMPORDEF, no final de
2009, mais precisamente em 23 de dezembro de 2009, financiou 37 milhões de euros ao Estaleiro, dos quais,
32 milhões de euros serviram para devolver o adiantamento de preço acordado em tribunal arbitral e mais 5
milhões de euros que ficaram na tesouraria da empresa. Portanto, a EMPORDEF teve de entregar 37 milhões
de euros. Esses 5 milhões de euros — também é bom que se refira — juntaram-se, no final do ano, a outros 5
milhões de euros que a empresa conseguiu cobrar a um dos seus clientes, a própria Marinha (Ministério da
Defesa, DGAE – Direção-Geral de Armamento), e pagou ao Tesouro, no final desse ano, 10 milhões de euros.
Portanto, pagou, em 23 de dezembro de 2009, 32 milhões de euros à Atlânticoline; ficou a dever sete milhões
e tal de euros, porque a dívida era quase de 40 milhões de euros, do acordo arbitral, mas pagou também,
nesse final de ano, 10 milhões de euros — devolveu 10 milhões de euros ao Tesouro. Isto é muito significativo
e conduz a esse reequilíbrio de um terço, um terço, um terço.
A partir de 2011, a empresa deixou de ter capacidade — face às circunstâncias em que vivia, e vamos ver
depois as razões mais profundas — de se financiar na banca. Pura e simplesmente, a empresa a partir de
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2011 não teve, de facto, condições para tal: estava numa situação de descrédito, o que levava a que a banca
não financiasse, de forma alguma, o Estaleiro.”6
O Sr. Presidente do Conselho de Administração da Empordef, Dr. Rui Jorge de Carvalho Vicente Ferreira
esclareceu o Sr. Deputado Jorge Fão, relativamente ao que foi feito nos ENVC, durante o seu mandato:
“(…) Foram tomadas diversas medidas, logo desde o início, que orientavam no sentido da redução de
pessoal.
Quero lembrar que saíram cerca de uma centena de pessoas no período que estamos a falar, mas eu até
abstraia o ano de 2013, porque no ano de 2013 as condicionantes legislativas travaram a possibilidade de
haver reformas antecipadas e, portanto, eu situar-me-ia apenas no primeiro ano e meio onde reduzimos de
cerca de 700 pessoas para cerca de 600.
Segundo aspeto, tomámos medidas logo no início, em janeiro de 2012, no sentido de cortar alguns dos
benefícios, que nos pareciam exagerados, ou fórmulas de remuneração, que não fossem direitos adquiridos,
porque aí teríamos, com certeza, uma outra complexidade — aliás, posso facultar à Comissão a comunicação
que fizemos aos Estaleiros nesse sentido — e algumas dessas medidas até foram transversais a todo o
Grupo, nomeadamente: isenções de horário de trabalho; seguros de saúde; seguros de vida; seguro de
acidentes pessoais; e outros benefícios, como telemóveis com a criação de plafonds para diversas despesas
com telecomunicações.
Portanto, desde a primeira hora, a primeira iniciativa de racionalização foi neste sentido e foi sempre esse o
nosso espírito.
Em março de 2012, foi tomada a decisão política da reprivatização, ou seja, a partir daí o nosso objetivo
prioritário deixou de ser o de criar condições diferentes em termos do processo produtivo ou económico da
própria empresa e passou a ser o da privatização.
Portanto, havia prioridades apesar do curso das medidas que tinham sido tomadas anteriormente e que
foram implementadas — e posso dizer que, relativamente a algumas delas, imediatamente as comissões
sindicais ou os sindicatos nos colocaram processos por considerarem injustas e, enfim, respeitamos…
A seguir, tínhamos o processo de privatização que passou a ser, para nós, o objetivo primordial e, na
sequência do processo de privatização, o da subconcessão.
Foi este o trilho. Nós temos prioridades e essas prioridades são, digamos, aquilo que uma administração
deve percorrer. Dispersar, depois dessa indecisão política em março de 2012 por outras medidas, só viria
complicar o processo e o seu resultado seria para nós, na altura, temporalmente irrelevante.”7
Perguntou ainda o Sr. Deputado Jorge Fão:
“(…) Durante este período de tempo, o que é que conseguiram angariar em termos de novas encomendas,
na tentativa de rentabilizar minimamente os cerca de 600 trabalhadores que estavam nos Estaleiros Navais de
Viana do Castelo?”8
Resposta do Sr. Dr. Rui Jorge de Carvalho Vicente Ferreira:
“(…) Já referi que, a partir dos finais de 2011, os Estaleiros deixaram de ter capacidade de se financiar na
banca e o principal objetivo da administração era concluir ou arrancar com aquilo que tinha entre mãos.
Assim, eu próprio tomei várias iniciativas — e a minha função é meramente institucional — em diferentes
mercados no sentido de tentar criar condições ou de cooperação tecnológica ou de encontrar parceiros no
sentido de melhorar as condições de atividade dos Estaleiros. Cito, por exemplo, que tivemos nesse período
inicial — principalmente até março de 2012 — uma avaliação da Fincantieri aos Estaleiros Navais de Viana do
6 Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 13 de março de 2014, Presidente do Conselho de Administração da EMPORDEF, Sr. Dr. Rui Jorge
de Carvalho Vicente Ferreira, págs. 5-7. 7 Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 13 de março de 2014, Presidente do Conselho de Administração da EMPORDEF, Sr. Dr. Rui Jorge
de Carvalho Vicente Ferreira, págs. 36-37. 8 Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 13 de março de 2014, Presidente do Conselho de Administração da EMPORDEF, Sr. Dr. Rui Jorge
de Carvalho Vicente Ferreira, pág. 37.
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Castelo e às encomendas que estavam em curso e tivemos o Gabinete de Projeto da Marinha brasileira nos
Estaleiros durante períodos significativos.
Portanto, tentámos diversas soluções que conduzissem a reativar a empresa, fosse pela via das
construções militares, nomeadamente com um cliente importantíssimo que tinha uma necessidade enorme, e
que continua a ter, de vasos de guerra, como é a Armada brasileira, e com a Fincantieri (um parceiro possível)
que é uma empresa que tem vários estaleiros quer na área militar quer na área da construção mercante e de
navios-hotel e de cruzeiro a uma escala impressionante.
De facto, procurámos soluções que trouxessem valor acrescentado para os Estaleiros e que pudessem ser
uma via, depois de os Estaleiros estarem reorganizados, de ter uma parceria, porque estes Estaleiros, na
dimensão em que se encontravam, nunca conseguiriam sobreviver, dada a sua pequena escala no mercado
aberto; teriam de ter sempre um parceiro tecnológico e foi neste sentido que a ação institucional da
EMPORDEF e até do Ministério da Defesa Nacional se desenvolveu.
A administração, propriamente dita, teve outras prioridades: foi procurar encomendas, teve várias
negociações e apresentou várias propostas. Mas há um dado relevante: não havia meios de financiamento
para arrancar com esse processo, nem havia sequer meios de financiamento para concluir os navios militares,
nem arrancar com os asfalteiros.”9
Sobre o que evoluiu de 2011 a 2014 nesta matéria, o Sr. Dr. Rui Jorge de Carvalho Vicente Ferreira,
esclareceu ainda o Sr. Deputado Jorge Fão:
“(…) Julgo que nós travámos um processo de destruição de valor galopante. Ou seja, a solução, fosse ela
pela via da privatização, fosse ela pela via da subconcessão, acho que acima de tudo o contribuinte português
pode pensar que houve alguém que teve a coragem de tomar medidas, enfrentando todas as dificuldades que
este processo, durante dois anos e meio, mostrou. Foi preciso uma grande coragem, porque, acima de tudo,
quando se olha para o passado, o que posso dizer é que tivemos muita gestão, tivemos pessoas de grande
craveira a liderar a gestão dos Estaleiros, mas praticamente ninguém terminava o mandato. É porque a
situação era, de facto, de grande gravidade e de grande complexidade.
Considero que, apesar de tudo, apesar das dificuldades, repito, transformámos uma adversidade numa
oportunidade. Espero que o desenvolvimento económico que vai surgir da atividade de reparação e
construção naval nos Estaleiros Navais de Viana do Castelo tenha valido a pena, não só por se travar a
delapidação do erário público mas, acima de tudo, por poder vir a ter um efeito multiplicador, do ponto de vista
social e económico, para a região.”10
O Sr. Dr. Rui Jorge de Carvalho Vicente Ferreira, respondeu ao Sr. Deputado Abel Baptista, sobre o papel
da EMPORDEF, na resolução do contrato do Atlântida:
“(…) tive o cuidado de procurar nas atas do Conselho de Administração da EMPORDEF se a EMPORDEF
teria dado alguma orientação — isto enquanto holding, na altura — no sentido de se realizar esse tipo de
acordo, mas não consigo ver, lendo as atas do Conselho, que essa orientação tenha sido dada. Entendo que
ela terá sido tomada no seio do Conselho de Administração dos Estaleiros, pelo que os Srs. Deputados irão ter
oportunidade de perguntar à administração dos Estaleiros se esta decisão está fundamentada em decisão do
Conselho e por que medidas.
O Sr. Abel Baptista (CDS-PP): — Sr. Presidente, essa era a questão que lhe ia colocar, se existia alguma
ata da EMPORDEF no sentido de dar essa orientação. Está respondida.
Já agora, Sr. Presidente, qual foi a data do acordo celebrado, do acordo arbitral?
O Sr. Dr. Rui Jorge de Carvalho Vicente Ferreira: — Se me permite, concluindo a questão anterior e já que
pergunta esse detalhe, avançaria uma outra questão. Não sei até que ponto a administração da EMPORDEF
teria de tomar essa decisão, dado que as tutelas decidiram-no. Ou seja, anteriormente ao acordo, a
administração da EMPORDEF recebeu um despacho conjunto (que deixo aqui) do Sr. Ministro das Finanças,
Teixeira dos Santos, e do Sr. Ministro da Defesa, Santos Silva, que autorizou a EMPORDEF a endividar-se em
37 milhões de euros. Portanto, certamente sancionaram a decisão do acordo anteriormente, porque esse nível
9 Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 13 de março de 2014, Presidente do Conselho de Administração da EMPORDEF, Sr. Dr. Rui Jorge
de Carvalho Vicente Ferreira, págs. 37-38. 10
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 13 de março de 2014, Presidente do Conselho de Administração da EMPORDEF, Sr. Dr. Rui
Jorge de Carvalho Vicente Ferreira, págs. 46-47.
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de endividamento, na altura, também deveria ultrapassar os índices legais que a administração da
EMPORDEF provavelmente teria nessa altura, isto é, os tetos de financiamento a que estamos obrigados, e,
portanto, necessitaram de uma decisão da tutela (que, como referi, deixo aqui). Portanto, as duas tutelas
tomaram a decisão.”11
Conselhos de Administração da ENVC
03-01-2002 Alm. Manuel Beirão Martins Guerreiro
Dr. Mário Alberto Alves Rodrigues Pinto
Eng.º Francisco Rodrigues Laranjeira
05-04-2004 Dr. Fernando Manuel Geraldes
Eng.º Fernando Sérgio de Abreu Duarte Fonseca
Dr. Manuel João Meira Fernandes (renunciou a 30/08/05)
Vice-Alm. Américo da Silva Santos
Dr. Mário Alberto Alves Rodrigues Pinto
03-11-2005 Dr. Fernando Manuel Geraldes
Dr. Adriano Mendes Telles de Menezes
Eng.º Fernando Sérgio de Abreu Duarte Fonseca (renunciou a 30/12/05)
Vice-Alm. Américo da Silva Santos
Dr. Mário Alberto Alves Rodrigues Pinto
09-01-2006 Dr. Fernando Manuel Geraldes
Dr. Adriano Mendes Telles de Menezes
Eng.º Carlos Augusto Diniz Pimpão (renunciou a 11/05/06)
Vice-Alm. Américo da Silva Santos
Dr. Mário Alberto Alves Rodrigues Pinto
18-05-2006 Dr. Fernando Manuel Geraldes
Dr. Adriano Mendes Telles de Menezes
Dr. José Fogaça Moniz de Bettencourt (renunciou a 13/10/06)
Vice-Alm. Américo da Silva Santos
Dr. Mário Alberto Alves Rodrigues Pinto
10-04-2007 Eng.º Arnaldo Pedro Figueirôa Navarro Machado
Dr. António José dos Prazeres Faria Luciano
12-06-2008 Eng.º Arnaldo Pedro Figueirôa Navarro Machado (renunciou a 29/12/08)
Dr. António José dos Prazeres Faria Luciano
Eng.º João Miguel Delgado Araújo
03-02-2009 Dr. António Jorge Fernandes Garcia Rolo
Dr. António José dos Prazeres Faria Luciano
Eng.º João Miguel Delgado Araújo
05-07-2010 Alm. Vítor Manuel Gonçalves de Brito
Dr. José Luís Serra Rodrigues
Eng.º Francisco Gallardo Duran
08-09-2010 Dr. Carlos Alberto Veiga Anjos
11
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 13 de março de 2014, Presidente do Conselho de Administração da EMPORDEF, Sr. Dr. Rui
Jorge de Carvalho Vicente Ferreira, pág. 51.
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Alm. Vítor Manuel Gonçalves de Brito (renunciou a 15/10/10)
Eng.º Óscar Napoleão Filgueiras Mota (renunciou a 29/12/10)
Dr. José Luis Serra Rodrigues
Eng.º Francisco Gallardo Duran
22-03-2011 Dr. Carlos Alberto Veiga Anjos (renunciou a24/06/11)
Dr. José Luís Serra Rodrigues
Eng.º Francisco Gallardo Duran
Dr. Jorge Manuel Moreira de Pinho
Alm. José Joaquim Conde Baguinho
16-08-2011 Eng.º Jorge Joaquim Crujo Camões
Dr. José Luís Serra Rodrigues
Eng.º Francisco Gallardo Duran
Dr. Jorge Manuel Moreira de Pinho
Alm. José Joaquim Conde Baguinho
Ouviram-se em Comissão 5 ex-Presidentes do Conselho de Administração dos ENVC, assim como o atual
Presidente.
Com os seus contributos, tenta-se reconstituir cronologicamente o trajeto e a situação da empresa ENVC,
nos últimos anos.
O primeiro ex-Presidente a ser ouvido na CPI foi o Sr. Dr. Fernando Geraldes que foi Presidente do
Conselho de Administração dos ENVC, entre abril de 2004 e março de 2007, passando por três governos e
três ministros da Defesa.
Destaca-se da sua intervenção inicial:
“(…) Em primeiro lugar, acho que tomei posse em março de 2004 e saí em março de 2007. Os aspetos
que, na altura, considerei mais relevantes foram os seguintes: a empresa tinha os capitais próprios negativos
em cerca de 48 milhões de euros e, com duas obras que estavam a decorrer, de um navio, salvo erro,
químico, contratado a um armador finlandês, acumulou, durante esse ano de 2004, mais cerca de 20 milhões
e, portanto, chegou ao final do ano com os capitais próprios negativos em 63 milhões de euros. Como, na
altura, o acionista não tinha capital para injetar, a única forma de repor os capitais foi através da reavaliação
de ativos que se fez e a empresa foi incorporada, se não me falha a memória, em 2005, na EMPORDEF. Qual
a razão? Na altura, a razão de incorporação desta empresa, que até poderia estar ligada ao Ministério das
Finanças ou ao Ministério da Economia, na EMPORDEF, teve um aspeto essencial: primeiro, tentar, de
alguma forma, incorporar mais valor acrescentado nacional nas construções que estavam a ser feitas.
Porquê? Porque, na altura, faziam parte do universo da holding, da EMPORDEF — e não tenho a certeza,
mas acho que ainda fazem —, duas empresas: a EID e a EDISOFT. Não sei se a situação ainda se mantém,
mas a parte das comunicações, telecomunicações e software desenvolvidos por essas empresas estava
incorporada nas construções militares, concretamente nos patrulhões, contrato, este, assinado anteriormente,
pelo que tinha alguma lógica essa integração, para incorporar mais valor acrescentado nas construções. É que
aquilo que era incorporado na construção naval, competindo com mercados bastante agressivos, era mão-de-
obra, já que todo o restante material — motores, hélices, o que fosse — era importado e, portanto, não era
valor acrescentado nacional. Este era o primeiro aspeto que gostava de salientar.
Segundo aspeto, e esta foi uma constatação a posteriori: se, na altura, a empresa tinha, penso eu, mão-de-
obra direta mais ou menos suficiente (não era muita nem pouca, acho que era suficiente), mesmo que
estivesse a construir cerca de duas embarcações/ano, tinha, do meu ponto de vista, mão de obra indireta em
excesso.
Outro aspeto relevante, que só depois de algum tempo de trabalho é que se consegue perceber, é que, do
ponto de vista da capacidade de gestão da parte do quadro diretivo, basicamente, não existia. Portanto, era
um quadro diretivo que estava incorporado nos restantes colaboradores da empresa, mas que, para além,
obviamente, da capacidade de construção e do respetivo know-how, não tinha capacidade de gestão e de
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motivação dos recursos humanos e até, muitas vezes, de forcing dos recursos humanos, por exemplo, quanto
à parte do controlo de custos e de horas extraordinárias.
Outro aspeto que acho relevante, por último e para me calar, é o facto de a empresa ter alguns riscos
contratuais. Vou dar só um exemplo, que ocorreu no final de 2004, porque nos apercebemos de que, no caso
deste navio químico que acabei de referir, que incorporou, em 2004, cerca de 20 milhões de euros de
prejuízos à empresa, o contrato não permitia que, por iniciativa do armador… Peço desculpa, por iniciativa do
armador, o armador podia rescindir o contrato com os Estaleiros Navais de Viana do Castelo, mas, por sua
vez, se os Estaleiros pretendessem rescindir o contrato com o armador, não o podiam fazer. E estou a dar-lhe
este exemplo, porque essas embarcações, salvo erro, foram vendidas por cerca de 25 ou 26 milhões cada
uma e só a primeira, além dos 25 milhões que a empresa recebeu, incorporou mais 20 milhões de prejuízo. As
embarcações tinham um preço superior, facto que observámos no mercado, tentámos colocar estes navios
químicos no mercado, rescindindo o contrato, mas, simplesmente, quando fomos ver, o contrato não permitia
que tal acontecesse.
Acho isto importante, porque os riscos contratuais que existiam não estavam devidamente suportados nem
identificados. Sendo assim, o importante era arranjar construções — passe a expressão —,
independentemente até, um pouco, do preço, não pensando na rentabilidade, mas, depois, quando davam
prejuízo, obviamente…”12
O Sr. Eng.º Arnaldo Figueiroa Machado, que foi Presidente do Conselho de Administração dos ENVC, entre
abril de 2007 e se demitiu em outubro de 2008, com efeitos em dezembro de 2008, esclareceu a CPI sobre a
situação na ENVC, durante o seu mandato.
Não tendo efetuado uma intervenção inicial, esclareceu a Sr.ª Deputada Carla Cruz, no início da audição:
“(…) Portanto, em abril de 2007, o que é que encontrei? Encontrei um Estaleiro antigo, com muito
equipamento também antigo e muito usado, situado num local onde chove (ou chovia, mas julgo que isso não
se terá alterado) cerca de 150 dias por ano, com poucas zonas cobertas para trabalhos de montagem,
soldadura e aprestamento, uma única doca de construções e 37 horas de trabalho semanais. O nível técnico
das pessoas que trabalhavam nas salas de desenho, em meu entender, era bom, embora o número de
especialistas fosse escasso (o que, sendo em Viana do Castelo, é natural), e o pessoal da produção tinha uma
média etária já um pouco elevada, mas era, na generalidade, competente.
Encontrei, ainda, muito equipamento armazenado — mal armazenado —, julgo que proveniente das
contrapartidas dos submarinos, material esse que tinha vindo, salvo erro, de um estaleiro que tinha fechado na
Alemanha, mas para o armazenamento do qual não havia espaço.
Encontrei um Estaleiro cheio de encomendas. Encontrei um mercado de fornecimento de materiais e
equipamentos muito aquecido, onde a entrega atempada de equipamentos por parte dos fornecedores era
muito problemática na altura. Hoje, isto parece um pouco estranho, mas, há seis ou sete anos, o mercado da
construção naval estava extraordinariamente aquecido e havia muita dificuldade em conseguir que os
fornecedores cumprissem prazos de entrega.
Encontrei um Estaleiro sem os meios humanos necessários à conclusão atempada dos navios contratados.
Encontrei um Estaleiro sem espaço na doca para construir um dos navios contratados. De facto, o navio
mais pequeno para os Açores foi contratado sem haver espaço na doca para o fazer. Assumo que terá sido
contratado na assunção de que seria subempreitado ao Estaleiro de Peniche, mas verificou-se mais tarde que
a plataforma de construção do Estaleiro de Peniche não tinha dimensão suficiente para albergar o navio.
Encontrei um Estaleiro com um navio militar em fase muito complicada, o primeiro patrulha, com um
contrato feito com a Marinha para a construção dos patrulhas em condições comerciais muito favoráveis à
Marinha, em que havia realmente muita capacidade de reivindicar muitas coisas.
Encontrei uma supervisão da Marinha muito crítica e muito pouco colaborante — não tanto as altas esferas
mas mais os residentes no Estaleiro, que pareciam até estar muito interessados em provar ao mundo que os
Estaleiros Navais de Viana do Castelo tinham muitas dificuldades em construir navios para a Marinha. É
12
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 29 de abril de 2014, Presidente do Conselho de Administração da ENVC de 2004 a 2007, Sr. Dr.
Manuel Fernando Geraldes, págs. 3-5.
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verdade que os Estaleiros só tinham construído um navio para a Marinha, há muitos anos, e também é
verdade que os navios para a Marinha têm algumas especificidades que os navios mercantes não têm.
Encontrei um acordo-programa que assumia a construção de oito lanchas – pequenas lanchas de patrulha
– e um LPD. E falo no LPD, porque o LPD, para mim, é um navio que podia ter sido usado para outros fins.
LPD é a sigla inglesa de landing platform dock, um navio estranho que serve para transporte de tropas, para
evacuação de civis, é um navio hospital, um navio que transporta helicópteros e que transporta também outro
tipo de navios mais pequenos.
Encontrei um contrato, assinado em setembro de 2006, para a construção de dois navios para os Açores,
cuja entrega, em meu entender, era completamente impossível de cumprir. Isto, porque o Estaleiro não tinha o
projeto minimamente feito e o navio não era um navio standard cuja construção fosse repetir-se. Era um navio
cujo projeto ia ser iniciado e construído e o Estaleiro não estava habituado a fazer aquele tipo de navios;
estava mais habituado a fazer cargueiros, porta-contentores (este era o tipo de navios que o Estaleiro estava
habituado a fazer). Ora, em meu entender, o prazo de entrega destes navios foi determinante para um certo
número de coisas que se passaram a seguir.
O projeto do navio maior, que é o C258, seria completamente projetado e desenhado pela Petrobalt, um
gabinete de projetos russo, em que os desenhos deveriam chegar prontos para serem enviados diretamente
para a produção. Nessa altura, estávamos completamente esgotados em termos de projeto, estávamos a fazer
os patrulhas e a alteração dos handy size, pelo que não tínhamos a menor capacidade, nessa altura, para
pegar nestes navios. E, por essa razão, terá sido entregue a um gabinete de projetos russo a realização do
navio C258 — e a atrapalhação era de tal ordem nos Estaleiros que os desenhos deveriam chegar aos
Estaleiros prontos para serem colocados em produção.
Em muito pouco tempo, verificámos que o gabinete de projetos russo não teria eventualmente as condições
necessárias, pelo menos, em tempo, na altura, para projetar o navio. Penso que, em abril, maio, o gabinete de
projetos russo teria já cerca de três meses de atraso, o que era completamente determinante para aquele
navio.
E encontrei um setor de reparação naval que faturava cerca de 10 milhões de euros e que podia ser
potenciado.
Esta é a radiografia que, muito sumariamente, faria dos Estaleiros Navais de Viana do Castelo.”13
E ainda:
“(…) Já agora, quero também dizer-lhe que encontrei um projeto para deitar abaixo praticamente todo o
Estaleiro e construir um outro Estaleiro, com cerca de 45 milhões de euros, 50 milhões de euros, à custa do
material que tinha vindo da Alemanha, o que, como é óbvio, teria dois problemas: em primeiro lugar, não sei
onde se iriam buscar os 50 milhões de euros para se fazer essa construção e, em segundo lugar, com um
Estaleiro com uma carteira de encomendas brutal, nessa altura (e depois podemos acrescentar mais sobre a
carteira de encomendas), não sei como é que parávamos o Estaleiro, porque teríamos de o fazer, para o deitar
abaixo e construir um outro. Portanto, nessa altura, não era sequer exequível fazê-lo.”14
Outro ex-presidente do Conselho de Administração dos ENVC, a ser ouvido na CPI, foi o Sr. Dr. António
Jorge Garcia Rolo que, foi Presidente do Conselho de Administração dos ENVC entre fevereiro de 2009 e
julho de 2010. Destaca-se da sua intervenção inicial:
“(…) A minha intervenção inicial é para chamar a atenção para um aspeto que, julgo, é importante. Entrei
para a EMPORDEF em junho de 2008, ao mesmo tempo que o Eng.º Arnaldo Navarro Machado, que
acumulava a presidência dos Estaleiros Navais de Viana do Castelo com a presidência da EMPORDEF.
Quando ele pediu a demissão e saiu, no final de dezembro de 2008, nós, eu e o Sr. Ministro Severiano
Teixeira, naquela primeira semana de janeiro, estivemos a discutir o perfil, o que havíamos de fazer. Faltava
um ano para o final do mandato do Eng.º Arnaldo Machado na presidência dos Estaleiros Navais de Viana do
Castelo e não era fácil encontrar uma pessoa que dominasse ou, pelo menos, conhecesse um pouco o setor
13
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 29 de abril de 2014, Presidente do Conselho de Administração dos ENVC no período de 2007 a
2009, Sr. Eng.º Arnaldo Pedro Figueirôa Navarro Machado, págs. 4-7. 14
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 29 de abril de 2014, Presidente do Conselho de Administração dos ENVC no período de 2007 a
2009, Sr. Eng.º Arnaldo Pedro Figueirôa Navarro Machado, pág. 8.
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da construção naval e que tivesse alguma experiência em liderar projetos de reestruturação. Essa foi a nossa
preocupação.
Mas também sabíamos que não podíamos demorar muito tempo, nem podíamos escolher uma pessoa que
levasse quatro ou cinco meses para entrar nos dossiers. É que, como sabem, infelizmente, quando há
mudanças, há empresas que, como alguns doentes, não aguentam esperar quatro ou cinco meses que entre
uma pessoa, estude os dossiers e só depois comece a decidir.
Portanto, por instruções do Sr. Ministro, convidei uma pessoa, que tinha mais ou menos esse perfil, mas
ela declinou o convite. Ora, durante o mês de janeiro, pensámos o que haveríamos de fazer e eu ofereci-me
ao Sr. Ministro para poder liderar Viana do Castelo no ano que faltava para concluir o mandato do meu
antecessor.
E por que é que me ofereci? Podem pensar: «É louco? É suicida?» Não, eu já conhecia minimamente os
dossiers de Viana do Castelo, aqueles que «herdei» no bom sentido. Só tomei posse em fevereiro, pelo que
tive algum tempo para estudar alguns dos dossiers, e o que precisávamos de fazer era atacar. Não podíamos
estar muito mais tempo a estudar melhores soluções, isto ou aquilo.
Quero apenas chamar a atenção para os dossiers que me comprometi com o Sr. Ministro atacar (slide 1).15
Passo a enunciá-los: havia o problema do relacionamento com a Marinha (e escuso de o referir, pois,
ontem, já tiveram oportunidade de saber até que ponto os navios militares seriam ou não importantes para os
Estaleiros); havia também algum (pouco ainda) barulho sobre os apoios da União Europeia; havia já coisas
feitas pelo meu antecessor, nomeadamente o finalizar de uma parceria com um estaleiro europeu; havia
também a necessidade de concluir as negociações e assinar o contrato dos asfalteiros [não sei se têm a
noção, mas, desde o primeiro contacto, até ao dia em que assinei o contrato na Venezuela, passaram «só»
nove anos (desde o primeiro contacto, o que não quer dizer que tivesse sempre havido negociações)], que era
uma das grandes preocupações que tínhamos; havia o dossier das contrapartidas, um dossier que vinha
também dos relatórios da Inspeção-Geral de Finanças; havia a história, que já conhecem, do megaiate, do tal
senhor que resolveu ir comer o melhor caril do mundo e teve o azar de ser assassinado; havia a necessidade
de procurar novas áreas de desenvolvimento para os Estaleiros; havia também algo para que a Inspeção-
Geral de Finanças tinha chamado a atenção, que era a aplicação ou não da contratação pública nos
Estaleiros; havia sempre esse problema dos apoios financeiros da Direção-Geral do Tesouro; e havia o plano
de reestruturação, que, para mim, era o grande dossier.
Relativamente a este último, o que eu disse ao Sr. Ministro, sendo eu Presidente da EMPORDEF e sendo o
principal problema da EMPORDEF os Estaleiros Navais de Viana do Castelo, é que achava que era minha
obrigação ir para a frente dos «ditos» do boi. Portanto, eu disse que, sim senhor, iria estudar um plano de
reestruturação, que não poderia limitar-se a uma folha Excel, pois isso era o que acontecia, por vezes, com os
anteriores, e que teríamos de arranjar uma fundamentação para que pudéssemos depois justificar o que fosse
necessário perante a Comissão Europeia. Mas aceitei esse desafio, de estudar um plano de reestruturação.
Tinha também o dossier do Atlântida, que, nessa altura, quando o aceitei, pensei tratar-se somente de um
problema de prazo de entrega. E havia também o fundo de pensões.
Estes eram os dossiers com que me comprometi perante o Sr. Ministro. Aceitei fazer isto porque não
podíamos estar à espera de escolher outra pessoa em vez daquela que recusou, e estarmos à espera cinco
ou seis meses que ele os concluísse, porque faltava menos de um ano para o fim do mandato. Aceitei, pois,
este desafio com a condição de que, acabando o mandato, ou seja, um ano depois, criadas as condições, eu
deixaria de acumular com os Estaleiros Navais de Viana do Castelo e ficaria só como Presidente da
EMPORDEF.”16
O Sr. Dr. António Jorge Garcia Rolo esclareceu o Sr. Deputado Abel Baptista sobre a capacidade de
gestão e cultura de empresa:
“(…) aquilo que eu tentei fazer, faseadamente, e, na altura, também expliquei isso, foi, primeiro, ver por que
é que os Estaleiros de Viana do Castelo funcionavam mal.
15
Anexo VI – Apresentação em Powerpoint deixada pelo ex Presidente do Conselho de Administração dos ENVC no período de 2009 a
2010, Dr. António Jorge Garcia Rolo na audição de 30 de abril de 2014. 16
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 30 de abril de 2014, Presidente do Conselho de Administração dos ENVC no período de 2009 a
2010, Sr. Dr. António Jorge Garcia Rolo, págs. 3-6.
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Houve uma auditoria organizacional — e também posso deixar cá os slides, mas da outra em que cá estive
mostrei-os —, a empresa não tinha cultura e as pessoas não tinham capacidade. Eu sei que o Eng.º Navarro
Machado, ontem, dizia bem dos gestores, mas eu tenho uma opinião diferente. Depois do insucesso do
Atlântida e do insucesso dos navios militares, eu não tinha confiança no diretor técnico. Portanto, eu não podia
manter essa pessoa, e essa é uma das conclusões da auditoria.
Outra coisa que essa auditoria organizacional apontava era para a necessidade de haver um diretor de
pessoal diferente e, portanto, eu fui buscar uma candidata para diretora de pessoal — e até fui buscar uma
senhora — e achei que era importante haver uma diversidade. Portanto, fui buscar uma outra equipa para
mudar a maneira. E porquê? O reworking, os erros de planeamento, os erros que as pessoas faziam… E não
era o trabalhador o culpado.
Uma coisa que é preciso perceber bem e as pessoas têm de ter essa noção é que o Japão, a Coreia do Sul
e a China têm setenta e tal por cento de quota de mercado dos navios standard.
Por exemplo, na Coreia e na China o custo dos homens por hora anda à volta dos 5 dólares, na Polónia e
na Roménia anda à volta de 16/18 €, em Viana são 23 €… Eu não acredito que haja alguém que conseguisse
ganhar encomendas quando partisse de um custo de 23 €!?
Eu sei que, ontem, os Srs. Deputados fizeram essa pergunta ao Eng.º Navarro Machado mas eu, porque
trabalhei vários anos na construção civil, direi que há coisas que quem manda é o mercado. Eu não vou
inventar um prédio e dizer que vou conseguir vendê-lo mais caro ou mais barato por metro quadrado, porque o
mercado já fixou o preço, aquele prédio custa x.
Com os navios standard é a mesma coisa. Por mais que eu somasse os custos e quisesse pôr uma
margem, eu não conseguiria ganhar nenhum concurso. Nenhum! Isso é uma coisa certa!
Portanto, como é que havemos de mudar? Bom, podem queixar-se que o diretor comercial não presta, mas
nunca iriam conseguir ganhar um concurso e a verdade é que conseguiram ganhar aqueles navios, os tais 10
ou 12 porta-contentores para a Alemanha, porque foi ao abrigo das contrapartidas. Havia uns a 19 milhões de
euros e outros a 21 milhões de euros e mesmo assim perdiam dinheiro, porque a empresa não era
competitiva. Isto é claro. Portanto, tínhamos de mudar as pessoas.
Agora, a empresa não é competitiva e engana-se como eles se enganavam? O reworking elevadíssimo,
superior a 50%? Isso era inaceitável. Nós não podíamos ter enganos daqueles, não podia vir o motor e não
caber na sala de máquinas ou, como dizia o Dr. Geraldes, o tanque daqueles químicos que custou mais 20
milhões de euros… Ninguém leu bem o caderno de encargos porque, se as pessoas o tivessem lido,
percebiam que não podia haver certas soldaduras no tanque… Não podia haver erros! Portanto, tínhamos de
mudar.
A primeira coisa que eu fiz foi anunciar ao diretor técnico e à diretora do pessoal que iria…
Outra coisa que também achei importante foi o relatório da Inspeção-Geral de Finanças, quando
mostra a rotação dos conselhos de administração. Como eu dizia há pouco, cada vez que há uma
rotação há sempre uma opinião, ninguém decide, espera-se pelo próximo estudo, ou coisa assim
parecida.
Eu tinha sugerido, no modelo que propus ao Sr. Prof. Severiano Teixeira, que devíamos ir para uma figura
diferente, para um diretor-geral. Portanto, devíamos ter alguém profissional. Eu propus que o Duarte Silva
fosse diretor-geral e que tivesse um diretor-geral de pessoal, um diretor-geral…, uma equipa que mudasse o
governo, mudasse o que mudasse, não havia automaticamente mudanças na maneira de conduzir os
Estaleiros Navais de Viana do Castelo. Porque esse é um problema grave — e não sou eu que o digo, é a
Inspeção-Geral de Finanças que o escreve.”17
O Sr. Contra-Almirante Victor Gonçalves de Brito, ex-Presidente do Conselho de Administração dos ENVC,
entre julho e setembro de 2010, justificou o facto de ter permanecido na ENVC, escassos cinco meses no total,
também como presidente-executivo, por não querer ser "o elo mais fraco" e porque sentiu não haver a coesão
necessária entre a equipa dirigente da empresa sobre o melhor caminho a seguir.
17
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 30 de abril de 2014, Presidente do Conselho de Administração dos ENVC no período de 2009 a
2010, Sr. Dr. António Jorge Garcia Rolo, págs. 30-32.
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Destaca-se da sua intervenção inicial:
“(…) Refiro que estive apenas um período de cinco meses em funções como presidente executivo dos
Estaleiros Navais de Viana do Castelo, de 5 de julho a 30 de novembro de 2010, por renúncia ao cargo. A
despeito de ser um curto período, considero que foi o encargo mais exigente da minha vida profissional, de
mais de 40 anos. Imediatamente antes tinha sido Administrador do Arsenal do Alfeite, durante 7 anos, aos
quais acresceram 14 noutras funções (diretor, chefe de divisão, etc.). Portanto, estive como Administrador, que
é o Presidente Executivo do Arsenal do Alfeite, desde 2002 até à extinção deste enquanto estabelecimento
fabril das Forças Armadas e passagem a sociedade anónima, e estive profundamente envolvido, obviamente,
nesta empresarialização do Arsenal do Alfeite.
Vou concentrar-me, sobretudo, nas fragilidades e nos problemas, que é isso que nos traz aqui, mas não
quero deixar passar o momento sem salientar o empenho e competência de uma boa parte dos profissionais
que conheci nos Estaleiros Navais de Viana do Castelo — quer trabalhadores diretos, quer indiretos, quer
chefias — e também quero salientar a qualidade da execução técnica comprovada em quase 70 anos de
atividade produtiva e mais de 200 navios construídos.
Passo a sintetizar a situação da carteira de encomendas e os aspetos mais significativos na gestão, à data
da minha posse nos Estaleiros Navais de Viana do Castelo, em meados de 2010:
Nas reparações de navios, havia uma atividade moderada com tendência para a redução de encomendas à
medida que o ano avançava, devido à crise que estava instalada e que afetava, naturalmente, o transporte
marítimo;
Dois contratos de construção de navios de comércio assinados e a aguardar a resolução dos respetivos
financiamentos da responsabilidade dos armadores, embora estivessem em causa entidades bancárias
portuguesas, concretamente um importante banco, o BES, quer num caso quer noutro;
A procura de compradores para o Atlântida e para o Anticiclone;
Três contratos de construção de navios militares celebrados com o Estado;
Um contrato-base assinado com o Estado, relativo ao LPD, oficialmente designado por «navio polivalente
logístico», com sucessivos adiamentos na passagem a contrato de construção. A propósito deste contrato, e
visando a participação na construção, saliento que havia um potencial interessado na entrada no capital dos
Estaleiros Navais de Viana do Castelo. Para tal havia já um acordo celebrado com a EMPORDEF, tratava-se
do Grupo DAMEN (Damen Shipyards Group) que, aliás, foi mencionada no depoimento do Dr. Rolo.
Os aspetos internos mais relevantes, que notei à entrada, eram os seguintes: grande expectativa e grande
entusiasmo dos quadros dos Estaleiros naquilo que se referia ao contrato dos dois ferries para o armador
grego. Esse grande entusiasmo era extensivo ao Administrador residente mais influente, porque era o único
que não estava doente e que estava sempre presente, que era o responsável do pelouro comercial.
Este assunto era tópico de discussão. Era, de alguma forma, uma tentativa que os quadros do Estaleiro
tinham de… Era, digamos, uma nova oportunidade, um novo projeto — projeto no sentido de empreendimento
—, que levasse a esquecer as más experiências do Atlântida e do Anticiclone e, de algum modo, do Lobo
Marinho, que também não foi propriamente uma coisa muito brilhante.
Um outro aspeto: havia um grande desencanto e uma grande desmoralização relativamente à evolução dos
contratos dos navios de patrulha oceânica.
(…)
Um outro aspeto importante era um paradoxo: havia muita disponibilidade de mão-de-obra. O problema
que se punha na altura, relativamente ao aprontamento do primeiro navio-patrulha oceânico, posteriormente
Viana do Castelo, era na área de automação, que levava meia dúzia de pessoas a trabalhar, e havia muita
gente disponível e que estava impossibilitada de trabalhar por obstáculos que impediam a boa execução de
outros contratos assinados. Quer dizer, havia um conjunto de impedimentos administrativos, burocráticos e
financeiros, em concreto referentes aos contratos dos navios de combate à poluição (NCP), que bem me
esforcei por tentar resolver, porque, enquanto isso não fosse resolvido, não se podia dar início à execução e
esses eram os navios que estavam mais na calha.
(…)
Os problemas de tesouraria eram apenas solucionados com o apoio do acionista Estado, e a Administração
preocupou-se, prioritariamente, em tomar medidas organizacionais para medir o desempenho a curto prazo,
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em fazer um levantamento exaustivo da situação dos recursos humanos e da situação patrimonial e financeira.
E, de alguma forma, foi feita uma auditoria interna, passo a expressão, no sentido de ver se se conseguia pôr
todos os aspetos financeiros no são, como julgo que se pôs (eu já não estava nos Estaleiros, mas julgo que
isso está refletido no relatório desse ano), e finalmente fixar (foi um trabalho bastante rápido e exaustivo de
que me honro ter feito juntamente com os outros membros da Administração) os termos de referência do
Estudo de Viabilização Empresarial que foi finalizado no início de 2011.
Foi um concurso, onde três entidades concorreram e que foi posteriormente adjudicado a uma dessas
entidades. Uma das entidades que concorreu era o Eurogrupo que vinha acompanhando a atividade da
EMPORDEF nesta matéria da análise da situação dos Estaleiros Navais.
Do meu conhecimento anterior dos Estaleiros Navais, porque conhecia a empresa desde 1978 — o meu
primeiro contacto foi nessa altura como cliente e tive vários contactos com os Estaleiros Navais —, do estudo
dos dossiers pendentes e do exercício desta qualidade de Presidente Executivo, passo a elencar o que
considero serem os principais problemas com que os Estaleiros Navais se debatiam e que contribuíram para o
desfecho conhecido.
Deficiências na estrutura comercial, nomeadamente em matéria de comercialização e de orçamentação: o
cargo de diretor comercial estava vago, salvo erro, desde 2003, altura em que faleceu o respetivo titular, que
era o Eng.º João Leite.
Insegurança e erros na área do projeto técnico: ausência de arquitetos navais experientes e de
engenheiros seniores em algumas das especialidades.
Ausência de uma cultura de cooperação com organizações nacionais afins para se resolverem as
debilidades internas. Aqui refiro que, no Arsenal do Alfeite, ofereci-me várias vezes para ajudar e colaborar
com os Estaleiros Navais. Agradeciam sempre, mas, salvo no tempo do Eng.º Duarte Silva, nunca houve,
digamos, grande interesse nessa colaboração com as pessoas. Em Viana do Castelo faziam gala em resolver
os problemas por si próprios e, às vezes, não tinham todas as capacidades e experiência.
Desde meados da década de 80 que o cargo de diretor técnico residente nos Estaleiros Navais não era
ocupado por um engenheiro construtor naval, o último, salvo erro, foi o Eng.º Óscar Mota que saiu por volta de
1985. Durante 4 anos, no âmbito das contrapartidas, esteve um engenheiro alemão na área da direção
técnica, e presumo que terá contribuído, de alguma forma, para a melhoria do sistema.
Deficiência no controlo financeiro dos projetos, nomeadamente no controlo, eficaz e atempado, de custos,
instrumentos de controlo financeiro sem referenciais de comparabilidade com o orçamentado. Isto é, havia um
orçamento e depois era difícil ir-se verificando se aquele orçamento estava a ser cumprido. Em construção
naval, com projetos de muito longa duração, o planeamento, o controlo do avanço da obra e o controlo de
custos são fundamentais para o sucesso, nomeadamente em matéria de resultados financeiros e de
cumprimento de prazos.
Deficiências no processo de aquisição de materiais e serviços, relativamente a intermediários e a deficiente
especificação. Refiro que não estou a falar de irregularidades, estou estritamente a falar de práticas, técnicas
deficientes. Não estou a falar de nada que tenha a ver com irregularidades ou com qualquer situação que
caísse no foro disciplinar ou criminal, porque, obviamente, se tomasse conhecimento disso, atuava. Estou a
falar, estritamente, de práticas.
No caso dos contratos com o Estado, o teor do respetivo clausulado jurídico, de configuração e de
conteúdo no caderno de encargos fragilizava a futura execução. Acresce a deficiência na respetiva gestão
desses contratos. Na minha opinião, esta foi a principal razão dos desaires nos contratos com o Estado — de
notar que eram navios simples e, portanto, não era por uma questão de complexidade dos navios. O que eu
penso é que os Estaleiros não se prepararam ou não se aperceberam das especificidades dos contratos com
o Estado. Provavelmente, consideraram que se tratava de contratos comerciais standard — porque há
standards internacionais para os contratos comerciais —, não se aperceberam de que havia ali muito fine
printing, muita letra miudinha e letra grossa, que tornavam extremamente complexos esses contratos, e não se
precaveram contra requisitos leoninos. Em concreto, e para não haver dúvidas, eu, se estivesse do lado do
Estaleiro, não teria assinado nenhum daqueles contratos tal como estavam e não estou a falar apenas do
clausulado jurídico, estou a falar, sobretudo, do clausulado técnico.
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Ausência de adequada liderança no sector da produção. O lugar de diretor de produção, à data de entrada
em funções, estava vago e passou a ser ocupado, em acumulação, em julho de 2010, por um administrador, o
Eng.º Francisco Gallardo.
Custos médios unitários de mão-de-obra elevados em consequência de encargos decorrentes de diversos
acordos laborais. Não havia nenhum contrato coletivo em vigor, tinha sido, pelas regras estabelecidas,
denunciado. De qualquer maneira, havia acordos laborais que tinham tanto valor como o contrato coletivo.
Como exemplo refiro a questão do horário de 37 horas de trabalho semanal e diversas remunerações
acessórias.
Elevado absentismo e encargos com o fundo de pensões, para o qual apenas contribuía a entidade
patronal.
Baixa produtividade, mão-de-obra envelhecida em diversos sectores, acrescida de excessivas situações de
limitações físicas. Havia muitas pessoas que não podiam subir escadas, não podiam descer escadas, não
podiam sair do local de trabalho, etc. Portanto, havia, infelizmente, pela maneira como as baixas médicas e as
situações de limitação são tratadas — e eu tenho experiência disso no Arsenal do Alfeite, durante os 21 anos
que lá estive —, muitos casos desses, que, obviamente, faziam encarecer o custo global médio da mão-de-
obra.
Insuficiência de disponibilidades financeiras para manutenção do parque industrial existente e
indisponibilidades para alguns investimentos essenciais em novos equipamentos industriais, factos que
perturbavam o desenrolar das operações nos Estaleiros. Não havia dinheiro e o dinheiro que havia era para os
vencimentos, para faturas que tinham de se pagar de imediato.
Tendência natural, em todas as construções, de acréscimo de custos induzido pelos atrasos e pela
dilatação de prazos nas parcelas medidas temporariamente. O que é que eu quero dizer com isto? Tudo o que
era pago ao mês, ou que era pago por tempo — seguros, garantias financeiras, contratos de prestação de
serviços, conservação, prolongamentos de garantias, alterações devido a descontinuidades de fabrico,
desvalorização natural do dinheiro, etc. — eram coisas em que demorar um ano ou demorar dois anos faz
muita diferença, mesmo que o trabalho seja rigorosamente o mesmo.
Afetação da competitividade devido aos requisitos de aplicação do Código dos Contratos Públicos nas
aquisições destinadas à execução dos contratos. Isto era fulcral, nomeadamente na questão dos contratos
comerciais, quer nas reparações quer nas construções, que não houve muito naquele período, mas, de
qualquer maneira, nas reparações. Isto é, o Código dos Contratos Público tem uma mecânica complexa e
demorada que afeta claramente a competitividade, afeta claramente a relação com aqueles que estão no
mercado. Não foi possível sensibilizar quem de direito para que o Código dos Contratos Públicos, pelo menos
nas aquisições destinadas aos contratos, fosse abolido ou fosse, de alguma forma, não considerado.
Nas reparações existiam problemas de competitividade devido a custos de produção acima da
concorrência, face ao padrão de produtividade, mas, de qualquer modo, a natureza dos trabalhos de
reparação fazia com que este fosse um setor lucrativo e menos problemático. Nas construções de navios
comerciais admito que orçamentações subavaliadas e a fixação de prazos otimistas fossem resultantes da
pressão para se conseguir trabalhos. As pessoas não estão imunes a essa pressão e, portanto, admito que
isso tivesse acontecido anteriormente.
Finalizando, os Estaleiros, para continuarem a funcionar e darem a volta à difícil situação em que se
encontravam em 2010, precisavam de tomar medidas.(…)”18
O Sr. Dr. Carlos Alberto Veiga Anjos, ex-Presidente do Conselho de Administração dos ENVC, entre
setembro de 2010 e junho de 2011, não fez uma intervenção inicial, referindo apenas:
“A primeira palavra era para dizer que fui convocado para vir a esta Comissão, mas gostava de chamar a
atenção para o facto de que o único Conselho de Administração dos Estaleiros que teve uma comissão
executiva foi aquele a que eu presidi.
Portanto, fui o presidente não executivo da empresa e, por isso, acharia que deviam ter sido convocados,
para estarem aqui presentes, os administradores executivos da empresa.”19
18
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 6 de maio de 2014, Presidente do Conselho de Administração dos ENVC no período de julho a
setembro de 2010, Sr. Contra-Almirante Victor Gonçalves de Brito, págs. 3-11.
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Afirmou que a sua prioridade foi vender o navio Atlântida:
“(…) a nossa prioridade foi, de facto, tentar vender o navio, uma vez que todas as decisões que havia do
tribunal arbitral eram que a empresa tinha sido condenada a pagar umas indemnizações, etc. Esse assunto
estava a correr e havia que fazer qualquer coisa.”20
Em resposta ao Sr. Deputado Agostinho Santa, sobre a situação dos ENVC, durante o seu mandato:
“(…) Repare que a história dos últimos vinte e tal anos dos Estaleiros – eu estava lá em 2010/2011 – era
com prejuízos todos os anos, com todas as construções de navios a dar prejuízo, sistematicamente, umas
atrás das outras.
Quer dizer, o senhor, se tivesse uma empresa em situação semelhante, tinha que fazer alguma coisa, o
senhor tinha que fazer um ponto da situação e perguntar-se: «Como isto é possível?». E foi esse ponto da
situação que devia ter sido feito há 10 ou 15 anos e que nunca ninguém teve a coragem de fazer.
Portanto, foi parar para ver onde é que estavam os pontos críticos que levavam, sistematicamente, esta
empresa a perder dinheiro e vamos atacar, como alguém me dizia, na altura, «o touro pelos cornos». Houve
um governante que me disse: «O senhor vá para lá e agarre ‘o touro pelos cornos’». Foi isso que ele me disse.
De maneira que era preciso um gestor com coragem e na sua terra para fazer aquilo que tinha que ser feito.
(…)
Então, o que é que se fazia? O que é que se fez nos anos anteriores? Foi meter encomendas nos
Estaleiros, embora, praticamente, não fossem os Estaleiros que ganhavam as encomendas. As
encomendas vinham por tabela ou da Marinha ou dos acordos das contrapartidas. Enfim, choviam
encomendas, ia-se arranjando algum dinheiro para os Estaleiros funcionarem, mas sempre a
endividarem-se cada vez mais – está a ver? —, e punha-se dinheiro e encomendas. Publicamente, diz-
se muito «mas os Estaleiros têm encomendas». Mas isso não chegava. Punha-se dinheiro e
encomendas em cima de uma empresa que estava moribunda. De maneira que isto redundava em
prejuízos atrás de prejuízos.
Nunca a empresa conseguiu, porque não se fez esse ponto da situação, não se fez aquilo que tinha que
ser feito e quando devia ser feito e foi-se deixando andar.
(…)
Até que apareceu um conselho de administração que teve a coragem de dizer: «Basta! Vamos pôr isto tudo
são e vamos fazer um plano de reestruturação, partindo do património são, partindo das contas sãs e se os
senhores nos derem mais esta ajuda, nós pomos esta empresa a mexer».
Mas por que é que a empresa perdia dinheiro sistematicamente nos navios? Porque a Europa, na
construção naval, começou a mudar profundamente nos anos 80, começou a fazer mudanças profundas com
a globalização. O senhor sabe que a globalização, tal como foi feita, é uma selva. Foi feita só para que as
grandes empresas e as grandes multinacionais arranjassem mercado onde fazer o que se fazia na Europa ou
na América a preços mais elevados e, portanto, arranjaram sítios onde fazer as coisas mais baratas. E a
construção naval também sofreu desse problema. E havia incentivos até da Europa para as empresas se
reestruturarem, fazendo aquisições, fazendo fusões, etc., e, sobretudo, modernizando-se de modo a poderem
ter custos competitivos com essas empresas da Ásia.
Ora, os Estaleiros Navais de Viana estavam numa gama de navios, se quiser, média-baixa. A experiência
dos Estaleiros era nesse tipo de navios e, portanto, esse tipo de navios eram feitos e são feitos nos países
asiáticos a custos mais baixos do que nos países europeus.
Portanto, o que é que aconteceu? A empresa ia aos concursos, ganhava navios para construir, mas
ia a preços inferiores ao preço do custo, só para arranjar trabalho. Porque naquela empresa a questão do
trabalho era fundamental e sempre se encarou isso assim. A empresa arranjava encomendas a preços que,
muitas vezes, ou eram ela por ela ou, depois, os desvios que havia iam redundar em prejuízos e, portanto, a
empresa não conseguia ser competitiva nessa gama de navios que, tradicionalmente, fazia nos Estaleiros.
19
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 6 de maio de 2014, Presidente do Conselho de Administração dos ENVC no período de setembro
de 2010 a junho de 2011, Sr. Dr. Carlos Alberto Veiga Anjos, págs. 3-4. 20
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 6 de maio de 2014, Presidente do Conselho de Administração dos ENVC no período de setembro
de 2010 a junho de 2011, Sr. Dr. Carlos Alberto Veiga Anjos, pág. 9.
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A grande oportunidade que surgiu nestes Estaleiros foi, exatamente, a vinda das encomendas dos navios
militares e dos asfalteiros. E porquê? Porque eram navios de gama superior e a possibilidade de construção
destes navios ia pôr os Estaleiros num patamar tão tecnológico que lhe aumentava muito a competitividade.
Portanto, em questão de preços, perdia-se dinheiro porque os preços, logo à partida, já eram muito baixos,
mas, mesmo assim, aceitavam-se as encomendas para arranjar trabalho. Depois, havia a questão dos custos.
Os Estaleiros de Viana, na altura em que fizemos esse estudo, tinham metade da produtividade média
europeia e um quarto da dos melhores estaleiros da Europa.
Os senhores têm que perceber o seguinte: na gestão das empresas nem sempre se faz o que se quer, faz-
se aquilo que se pode e, portanto, quanto à questão da produtividade, nós tínhamos que aumentá-la para os
níveis europeus. E quando se falou na reestruturação proposta, esta era também pensando na questão da
produtividade que, quer a gente queira quer não, é um fator determinante.
E não é só isso. No plano de reestruturação, o que veio à baila foi a questão da saída dos 380
trabalhadores. Inicialmente, eram quatrocentos e tal, mas, entretanto, foram saindo e ficaram em 380. Isso foi
o que deu brado e apareceu na televisão. Mas aquilo era fundamentalmente um plano de modernização dos
Estaleiros, modernização não só no espaço físico como também nos seus processos de trabalho, porque o
plano de reestruturação ia mudar completamente os processos de trabalho dos Estaleiros.
Não sei, Sr.ª Presidente, se posso explicar isto, mas é muito bom que os Srs. Deputados percebam esta
coisa dos Estaleiros e do que é, hoje, uma gestão moderna dos Estaleiros.
(…)
Nos Estaleiros de Viana, quando havia um desvio no custo, não se sabia quem era o responsável,
porque como havia vários responsáveis ao longo da cadeia de produção não era possível determinar
quem era o responsável. E o que nós íamos introduzir era essa figura do diretor do projeto.
Portanto, o diretor do projeto seria um indivíduo que era responsável pelo navio, desde a sua negociação
com os clientes até à entrega final e todos os outros teriam que obedecer a esse diretor de projeto.
Como está a ver, há uma diferença fundamental. Isto é uma mudança brutal na estrutura da empresa. E
isto só pode ser feito se houver um bom controlo de gestão.
O senhor sabe que, nos Estaleiros de Viana, em 2010 e 2011, que foi o que eu conheci, só se sabia
quanto o navio custava no fim de estar pronto? Isto é uma coisa inacreditável! De maneira que havia
também que introduzir um sistema de planeamento e controlo da produção de navios que permitisse saber se
o navio estava a cumprir determinadas tarefas e, portanto, o navio teria que ser todo descascado nas
diferentes tarefas que levam à sua construção e, semana a semana, fazer um acompanhamento da evolução
da construção do navio.
Isto é só para terem uma ideia.”21
Na última audição com elementos do Conselho de Administração da ENVC, esteve presente o Sr. Eng.º
Jorge Camões, atual Presidente do Conselho de Administração da Estaleiros Navais de Viana do Castelo,
acompanhado pelos restantes vogais do Conselho de Administração: o Sr. Dr. José Luís Serra, o Sr. Eng.º
Francisco Gallardo e o Sr. Almirante Conde Baguinho. Todos responderam às perguntas formuladas pelos
Srs. Deputados.
O Sr. Eng.º Jorge Camões fez uma intervenção inicial, que se transcreve quase integralmente pela sua
importância onde traçou alguns "pontos chave" do seu mandato, que começou em agosto de 2011:
“(…) Fundamentalmente, encontrámos um conjunto de constrangimentos — isto é conhecido, pois é
exatamente o mesmo PowerPoint22 que o Dr. Vicente Ferreira projetou —, como a situação do passivo, a
situação dos capitais próprios, a dívida à Atlânticoline, e também à Parpública, e a penhora de guindastes
(slide 1).
Portanto, isto é conhecido, depois, faz-se a distribuição de uma cópia destes documentos, que dou à Sr.ª
Presidente.
21
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 6 de maio de 2014, Presidente do Conselho de Administração dos ENVC no período de setembro
de 2010 a junho de 2011, Sr. Dr. Carlos Alberto Veiga Anjos, págs. 31-37, sublinhado do relator. 22
Anexo VII – Apresentação em Powerpoint deixada pelo Sr. Presidente do Conselho de Administração da ENVC, Sr. Eng.º Jorge
Camões, na CPI, audição de 7 de maio de 2014.
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O Fundo de Pensões estava, realmente, com esta não-provisão, tínhamos estas responsabilidades, e a
situação piorou (slide 2) Havia um constrangimento do Fundo de Pensões que exigia a previsão de um plano
de amortização anual no montante de 700 000 € (slide 3). Enfim, o endividamento total agravava-se ano a ano
(slide 4). Houve uma transformação deste endividamento, porque, inicialmente, era sobretudo à banca, mas,
depois, chegámos a 2011 praticamente equilibrados entre a DGTF, a banca e a holding e, neste momento, a
parte da banca foi praticamente toda transferida para a EMPORDEF (slide 5).
Financeiramente e de um ponto de vista patrimonial, os resultados operacionais e líquidos estão como
estão, quase em menos 290 milhões de euros (slide 6).
O capital próprio afundou. De cada vez que amortizava um pouco, havia aumento de capital ou havia
novamente reavaliações, mas, enfim, piorou (slide 7). Aconteceu o mesmo com o passivo (slide 8).
Espantosamente, nos resultados operacionais versus custos com pessoal, os custos com pessoal a
aumentarem e os resultados operacionais a piorarem (slide 9).
O VAB (valor acrescentado bruto) tem uma evolução, com gastos de pessoal, permanentemente, à volta de
450 milhões de euros (sklide 10).
Portanto, esta foi a situação que encontrámos.
Quero falar rapidamente do ponto de situação do Atlântida e do Anticiclone.
Como isto é uma synopsis, vou fazer uma breve referência: concluiu-se em 2009 e, como se sabe, foi
recusado pelo armador. Os custos totais do Atlântida, mais o Anticiclone, foram à volta de 74 milhões de
euros. Houve um endividamento bancário, para pagar à Atlânticoline, de 37 milhões de euros. O custo da
imobilização do navio Atlântida, no Arsenal do Alfeite, foi de 1 milhão de euros, que é o valor da manutenção
mais a parte que é paga ao porto. Perdemos a validade dos certificados de garantia dos equipamentos. Isso
traduziu-se, ao fim e ao cabo, em custos de imagem inquantificáveis, porque, por um lado, um estaleiro que vê
recusado um navio cria uma imagem muito má e, a seguir, tem o descrédito junto da banca (slide 11).
Aqui, acrescentei uma coisa, porque me pareceu importante, já que, na altura em que esteve aqui o Dr.
Vicente, não tinham esta informação — pelo menos, o Sr. Deputado disse-me que não tinham e eu próprio tive
o cuidado de ouvir todas as gravações até agora.
Realmente, neste acordo global entre a ENVC e a Atlânticoline, houve, digamos, pareceres e
recomendações que aparentemente não foram seguidos, quer técnicos, do IST (Instituto Superior Técnico) e
de um assessor da EMPORDEF, o Almirante Cabrita, quer jurídicos, de dois professores de Coimbra que
fizeram dois pareceres e que, à data, foram disponibilizados.
Foram pagos 40 milhões de euros à Atlânticoline, 32 dos quais já pagos em dezembro. Neste momento,
devemos 6 milhões de euros mais os juros (slide 12).
Qual é, neste momento, o ponto de situação do Atlântida? Entre 2011 e 2014, recebemos cerca de 60
visitantes de todo o mundo: canadianos, da União Europeia… Visitavam, inspecionavam, faziam perguntas, no
sentido de saber se podiam modificar, enfim, uma série de coisas. Portanto, foram 60 visitantes.
Finalmente, em fevereiro deste ano, o Conselho de Administração aprovou o lançamento de um
procedimento de concurso. Lançámos o concurso internacional em 12 de março, publicámo-lo na imprensa
internacional, disponibilizámo-lo na AICEP (Agência para o Investimento e Comércio Externo de Portugal), via
plataforma, abriram-se as propostas em 23 de abril e houve um relatório preliminar do júri. Porquê? Porque
faltava documentação que o júri, entretanto, pediu. Está em curso, neste momento, a análise da
documentação adicionalmente pedida. O relatório vai ser emitido, ainda não o temos, mas há de ser feito.
Aliás, a documentação foi recebida no dia 5 de maio, ou seja, na segunda-feira.
De acordo com o procedimento que está aprovado, sabemos que vai haver um best and final offer (BAFO),
isto é, os três melhores serão hierarquizados e convidados a produzir uma melhor oferta. Haverá novamente
um relatório do júri e, depois, o Conselho de Administração dos Estaleiros decidirá. Portanto, o timing que está
previsto é este (slide 13).
Há um outro gráfico que acho importante debatermos, que é o da rentabilidade, até agora, das nossas
construções. Vou falar de um dado que já conhecem: em 10 anos, em 22 navios, a melhor margem foi de um
navio-hotel, que, como sabem, foi para a Douro Azul; o pior foi um navio químico finlandês em que parece que
houve um excesso de qualidade e, portanto, o value for money não foi respeitado. De facto, nos 22 navios,
perdemos, em média, 19% por navio e, no total, cerca de 100 milhões de euros (slide 14).
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A rentabilidade dos navios entregues dá, em média, o valor negativo de 19% (slide 15). Quanto aos navios
cancelados, e estamos aqui, fundamentalmente, a falar dos navios Anticiclone e Atlântida, dos navios militares
e mais dois megaiates, resultaram em 65 milhões de euros de prejuízo (slide 16).
Quero dizer-vos que, como sabem, certamente, houve três navios em que perdemos 23 milhões de euros
para o Estado português: dois NPO e um para o Governo Regional da Madeira, que foi o Lobo Marinho. Nos
navios das contrapartidas, que eram 12, perderam-se 39 milhões de euros e em 7 navios para o mercado
perderam-se 42 milhões (slide 17).
Quanto às construções militares, também já viram o gráfico (slide 18). Realmente, como sabem, os dois
NPO não estão ainda definitivamente entregues, o primeiro vai ser entregue definitivamente este ano, o
segundo, que é o Figueira da Foz, também vai ser entregue definitivamente, porque a entrega provisória
verificou-se em novembro do ano passado.
Em relação aos outros, quer aos NCP, quer às lanchas de fiscalização costeira, como sabem, foram
revogados os contratos, por decisão do Conselho de Ministros.
Entendemos que é importante, até para debate, que se perceba uma coisa. Eu ouvi as gravações e uma
das preocupações dos Srs. Deputados, que é lógica, tem a ver com o que nós temos feito, com o que esta
administração fez em 32 meses, pelo menos de bom.
Ora, nós conseguimos elencar alguns pontos que depois podemos debater 8slide 19).
Acho que é importante que se saiba que nós conseguimos manter, até quando foi possível, a atividade de
reparação naval. Foi decrescendo, mas manteve-se, ou seja, conseguimos manter as pessoas e os meios e
atrair os agentes para trazerem navios — em 2011, 2012, 2013 e, depois, decresceu.
Conseguimos criar condições para concluir e entregar os dois NPO, que era uma preocupação séria da
Marinha.
Conseguimos, e o mais difícil foi isto, recuperar a confiança dos fornecedores dos NPO, porque tinha
havido uma descontinuidade muito grande e, realmente, uns tinham desaparecido e outros não queriam voltar
a fornecer para os NPO. Esta tarefa foi muito complicada.
Conseguiu-se, e também foi muito difícil, criar condições para cumprir o contrato dos asfalteiros. Depois,
falaremos em detalhe sobre isto, ou seja, por que conseguimos e como é que conseguimos — o Dr. Serra há
de falar sobre isto. Foi muito difícil, mas conseguimos.
Conseguimos colocar as compras-chave, as key points, para os asfalteiros.
Conseguimos garantir a manutenção do navio ferry Atlântida. Nós trouxemos o navio ferry para o Arsenal,
em primeiro lugar, para propiciar, de uma forma mais simples, a visita de potenciais clientes e, em segundo
lugar, porque nos parecia que teríamos mais calma, fora de Viana, para garantir a manutenção, isto é, circular
os equipamentos, garantir a manutenção do navio.
Conseguimos manter o link e a chama viva para potenciais interessados. Tivemos visitas, inspeções,
algumas das quais demoraram uma semana. Houve inspeções de alguns países que demoraram uma
semana, no ferry, a inspecionar tudo.
Conseguimos, e porque detetámos que isto não era exatamente assim quando chegámos, garantir a
aplicação de transparência nos procedimentos — depois, explicaremos em detalhe o que é isto.
Conseguimos garantir em permanência uma gestão controlada de custos, por um lado, por imposição de
lei, porque tinha de ser, por outro, porque entendíamos que devia ser.
Também garantimos, dentro do possível, a estabilidade social da empresa — houve o que houve, mas
garantimos.
Garantimos pagar salários atempadamente — num mês, houve um atraso de dois dias, mas garantimos.
Garantimos, com sucesso, um plano social — há quem não goste da palavra, eu gosto e foi por isso que a
impusemos. É um plano social, porque, realmente, foi um plano social.
Garantimos uma solução possível, não ótima, para garantir a empregabilidade, via procedimento de
subconcessão, já que a reprivatização tinha ficado… Stop, acabou!
Garantimos a manutenção das competências dentro do possível, ou seja, como os Estaleiros têm pessoas
muito competentes na área de projeto e construção, tivemos o cuidado de garantir a manutenção de
competências.
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Garantimos manter viva a preparação de propostas de construções. Ao contrário do que ouvi, nós não
recusámos, nunca, oferecer propostas de construções a quem nos pediu. Depois, algumas eram rejeitadas,
por razões que se conhecem, mas conseguimos garantir.
Finalmente, garantimos, com êxito, a implementação de uma gestão do acervo histórico dos Estaleiros, que
está em curso.
Tudo o que se me oferecia dizer, de momento, era isto.”23
Ainda, no que toca à atuação da Administração dos ENVC e nomeadamente ao seu esforço em obter
novas encomendas, o Sr. Ministro da Defesa Nacional, Dr. José Pedro Aguiar Branco, quando questionado
sobre este tema pelo Sr. Deputado António Filipe, responde:
“(…) O Sr. Deputado perguntou ainda o que fez a administração quanto às novas encomendas. Não havia
encomendas, Sr. Deputado, porque a da Marinha não era exequível e a dos asfalteiros estava em
incumprimento, o que significa que é fantasia dizer-se que estava cheia de encomendas, porque não estava! A
realidade é que, durante o mês de outubro e até março, o Conselho de Administração fez vários périplos por
todos os cantos do mundo para tentar encontrar encomendas para aqueles Estaleiros.
O Sr. Deputado fala dos contratos da Douro Azul — ainda bem. O que sei — e o Conselho de
Administração, à época, também já veio aqui explicar — é que, nos termos em que estava prevista a sua
execução, seria mais um que iria dar prejuízo aos Estaleiros. Tal como foi apresentado, tal como foi pedido o
projeto e tal como constava das alterações que tinham sido solicitadas, se fosse executado, a sua execução
iria dar um prejuízo aos Estaleiros, tal como, nas anteriores administrações (e não sei se o Sr. Deputado se
lembra, mas deve lembrar-se porque fez parte de todas as Comissões Parlamentares de Defesa onde já
falámos sobre isto, pois nós estamos em permanente comissão de inquérito desde que surgiu a questão dos
Estaleiros), desde 2006 até 2011, todas as encomendas que foram executadas pelos Estaleiros deram
prejuízo — mais de 100 milhões de euros! De facto, não houve nenhuma que tivesse sido construída dentro
daquilo que tinha sido a respetiva orçamentação, todas deram prejuízo — mais de 100 milhões de euros!
Tenho aqui um mapa (que irei entregar à Comissão), onde se pode verificar que, de julho de 2006 a 2011,
portanto, até aos contratos dos ferries Atlântida e Anticiclone serem rescindidos — ou seja, as 13 novas
construções elaboradas entre 2006 e 2010 —, os prejuízos acumulados foram superiores a 100 milhões de
euros e só os navios Atlântida e Anticiclone levam cerca de 70 milhões de euros.
Ora, esta Administração, a meu ver, num ato de grande responsabilidade, não agravou e não foi construir
mais dois navios que dariam prejuízo.24
Em relação à situação do aço vendido em concurso público, em 2012, responde o Sr. Ministro da Defesa
Nacional, Dr. José Pedro Aguiar Branco, ao Sr. Deputado António Filipe:
“(…) Como o Sr. Deputado é jurista e gosta de ser rigoroso com os factos, e espero que o seja, sabe que o
aço foi vendido em concurso público, em 2012, ainda antes da reprivatização. Portanto, a Martifer não foi tida
nem achada para qualquer coisa que tivesse a ver com a privatização ou a concessão, e o Sr. Deputado
invocou um facto falso, porque disse que o aço começou por ser vendido como sucata à Martifer e não é
verdade! O aço foi vendido por concurso público, em hasta pública. Este aço estava à época parado e a
deteriorar-se há cerca de sete anos nos Estaleiros Navais de Viana do Castelo e não havia dinheiro para
pagar salários, pelo que penso que é um ato responsável de uma administração — pode ser discutível, mas é
responsável — utilizar aquilo que estava lá há sete anos sem ser gasto em coisíssima alguma que faça uma
hasta pública, transparente e até acompanhada pela comunicação social, e que o aço tenha sido adjudicado
ao melhor preço a uma empresa que o comprou.
23
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 7 de maio de 2014, atual Presidente do Conselho de Administração dos ENVC, Sr. Eng.º Jorge
Camões, e restantes vogais do Conselho de Administração, Sr. Dr. José Luís Serra, Sr. Eng.º Francisco Gallardo e Sr. Almirante Conde Baguinho, págs. 3-9. 24
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 11 de março de 2014, Sr. Ministro da Defesa Nacional, Dr. José Pedro Aguiar Branco, págs. 29-
30.
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Depois, nas posteriores operações de revenda dessa empresa é evidente que foi parar a quem precisava
de construir, mas não é verdade — e o Sr. Deputado sabe disso — que tenha sido vendido como sucata em
2012 à Martifer.
Na verdade, está aqui a querer criar-se um plano de ligação, de nexos causais para uma coisa que
acontece dois anos depois; nem sequer naquela altura se estimava que pudesse acontecer, porque o que se
estimava que pudesse acontecer era o processo de reprivatização ter êxito, um processo de reprivatização ao
qual a Martifer nem sequer concorreu e aquilo poderia ter sido adjudicado ou a russos ou a brasileiros se não
tivesse havido a questão das ajudas da União Europeia.
Estes são factos, Sr. Deputado; não é discurso!”25
Ainda sobre esta questão o Sr. Presidente do Conselho de Administração da Empordef, Dr. Rui Jorge de
Carvalho Vicente Ferreira, esclarece a Sra Deputada Carla Cruz na 2.ª audição:
“(…) Nós não tínhamos dinheiro para pagar os salários, não tínhamos dinheiro para pagar as dívidas —
basta ver o que apresentei aqui no início —, não tínhamos financeiro bancário e tínhamos muita dificuldade.
Era necessário agarrar todos os ativos que não eram aplicáveis na atividade dos Estaleiros. E aí começa a
questão. É que é extremamente saudável uma empresa reduzir os seus stocks e, principalmente, alienar
ativos que não têm aplicação na atividade.
Essa situação que refere, em que diz que foi parar ao subconcessionário, imaginemos, dois anos antes, era
preciso muita imaginação, e não foi, porque na realidade houve, salvo erro, mais de duas dezenas de
concorrentes, ganhou quem apresentou o melhor preço e julgo que até foi um sucateiro, portanto, as
afirmações que fez intrínsecas na pergunta deixemo-las como estão. Mas, na realidade, deveriam ter exercido
toda a sua capacidade de gestão, mesmo que não tivessem de pagar os salários porque, quando temos
matéria-prima que foi adquirida sem destino e sem aplicação e que, ao fim de quase sete anos, não teve
qualquer aplicação, eu acho que até já deveria ter sido feita há mais tempo.”26
Trabalhadores
Neste capítulo, importa sublinhar algumas afirmações dos Depoentes na CPI, que ajudam a perceber como
se trabalhava na ENVC.
Salienta-se o que afirmou o Sr. Presidente do Conselho de Administração da Empordef, Dr. Rui Jorge de
Carvalho Vicente Ferreira, relativamente à falta de competitividade dos ENVC:
“(…) Cito mais um exemplo, que também está no estudo, que é o índice de produtividade média do
benckmark do mercado. O estudo refere que, na Europa, havia uma média de um índice 14 de produtividade e
os Estaleiros tinham pouco mais de um índice 7. Ou seja, a produtividade média dos Estaleiros era metade da
média dos estaleiros europeus.”27
Em audição com a Comissão de Trabalhadores dos Estaleiros Navais de Viana do Castelo, com os Srs.
António Costa e Abel Viana, [coordenador e representante da referida Comissão], os mesmos responderam
sobre o número de trabalhadores, absentismo e produtividade na empresa ENVC.
Pergunta do Sr. Deputado Abel Baptista:
“(…) Foram feitas aqui afirmações por parte de responsáveis e foram entregues documentos dizendo que
os Estaleiros Navais de Viana do Castelo tinham uma organização sobredimensionada. A Comissão de
Trabalhadores concorda ou não com esta afirmação?”28
25
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 11 de março de 2014, Sr. Ministro da Defesa Nacional, Dr. José Pedro Aguiar Branco, págs. 34-
35. 26
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 13 de março de 2014, Presidente do Conselho de Administração da EMPORDEF, Sr. Dr. Rui
Jorge de Carvalho Vicente Ferreira, págs. 75-76. 27
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 13 de março de 2014, Presidente do Conselho de Administração da EMPORDEF, Sr. Dr. Rui
Jorge de Carvalho Vicente Ferreira, pág. 21. 28
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 26 de março de 2014, coordenador e representante da Comissão de Trabalhadores de Viana do
Castelo, Srs. António Costa e Abel Viana, pág. 40.
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Resposta do Sr. António Costa:
“ (…) Isso é uma realidade. Não podemos virar as costas àquilo que é a realidade.
Agora, como os Srs. Deputados devem calcular, não são os trabalhadores, não foi nenhum trabalhador
ligado à empresa até há muito pouco tempo que teve culpa no que respeita à questão estrutural, no que
respeita à massa de trabalhadores. Mas isso sem dúvida que era um dos problemas dos Estaleiros, ou seja, o
equilíbrio que havia em termos de trabalhadores ligados à produção direta e aqueles que eram chamados, em
termos internos, trabalhadores indiretos.”29
Pergunta do Sr. Deputado Abel Baptista:
“(…) Um outro problema que é referido em várias situações é o do absentismo elevado. A Comissão de
Trabalhadores confirma esta situação ou não? Isto corresponde ou não à verdade?”30
Resposta do Sr. António Costa:
“(…) Relativamente ao absentismo, penso que no período desta administração o absentismo não será um
problema tão crucial e importante como o senhor refere, dando-lhe a ênfase que dá ao colocar esta questão.
No que se refere às outras administrações, penso que é do conhecimento minucioso do Sr. Deputado que
nós, trabalhadores dos Estaleiros Navais de Viana do Castelo, no período em que o Sr. Ministro Dr. Paulo
Portas nomeou o Sr. Dr. Fernando Manuel Geraldes, em 2004, para Presidente dos Estaleiros Navais de
Viana do Castelo — esteve lá de 2004 a 2007 —, cientes do quadro económico-financeiro difícil que a
empresa atravessava, em que se falava de insolvência, através do artigo 35.º do Código das Sociedades
Comerciais, acedemos a um acordo ou a um plano de viabilização económico-financeira durante o período de
2004 a 2007.
O Sr. Dr. Fernando Manuel Geraldes tinha visão, como Presidente, na altura em que lá chegou; o
problema, depois, foram os adjuntos. Às vezes, mudam-se os treinadores mas os adjuntos continuam, ou seja,
os diretores continuaram os mesmos e então, passado um tempo, passado um ano ou dois, volta-se à mesma
coisa. As pessoas chegam lá com muitas ideias mas, depois, as coisas acabam por não correr tão bem.
Então, o Sr. Dr. Fernando Geraldes fez um plano de viabilização económico-financeira para a empresa na
base daquilo que o senhor agora afirmou, ou seja, na base do absentismo elevado. A Comissão de
Trabalhadores, na altura, ficou muito alarmada com os dados que o Sr. Presidente Fernando Geraldes citava
nas reuniões. Eu fazia parte da comissão negociadora e, na altura, ficámos alarmados, mas pudemos
constatar que, na realidade, a situação não correspondia na sua plenitude aos valores que o Sr. Presidente
apresentava nas reuniões.
No entanto, o Sr. Presidente Fernando Geraldes aplicou alguns incentivos a nível da assiduidade, com
pequenos prémios, de 10 €. Tratava-se de um coeficiente que dava o que os trabalhadores podiam faltar por
mês, porque se não perdiam aquele montantezinho de 7, 8, 10 € no seu vencimento, mais um prémio
trimestral que ele pagava. Então, o Sr. Presidente chegou à conclusão de que, efetivamente, o absentismo na
empresa não era um problema e não correspondia aos valores que lhe tinham sido dados.
Estávamos a falar de taxas normais, ou bastante residuais até, em termos da atividade de construção
naval. Como compreenderá, a atividade da construção naval é de alto risco, exige muito trabalho físico e,
ainda para mais, a nossa empresa não foi alvo de investimentos tecnológicos ao longo dos últimos 15 anos,
como já afirmei.
Portanto, trabalhadores com 30, 40 anos de empresa, a trabalhar à chuva, a trabalhar ao vento, muitas
vezes em condições precárias, é óbvio que têm mais probabilidades de se magoarem em acidentes de
trabalho ou de aceder a uma baixa médica do que noutras atividades.”31
E ainda:
29
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 26 de março de 2014, coordenador e representante da Comissão de Trabalhadores de Viana do
Castelo, Srs. António Costa e Abel Viana, pág. 41. 30
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 26 de março de 2014, coordenador e representante da Comissão de Trabalhadores de Viana do
Castelo, Srs. António Costa e Abel Viana, pág. 42. 31
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 26 de março de 2014, coordenador e representante da Comissão de Trabalhadores de Viana do
Castelo, Srs. António Costa e Abel Viana, págs. 43-44.
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O Sr. Abel Baptista (CDS-PP): — Sr. Coordenador, julgo, tenho mesmo quase a certeza, que a Comissão
de Trabalhadores conhece o parecer da IGF n.º 444/2009. Nesse parecer, um dos problemas, indicado
também pelos conselhos de administração, é a questão da produtividade dos Estaleiros — cerca de 50% da
média da Europa.
O Sr. Coordenador referiu há bocado o caso concreto dos Estaleiros de Vigo, onde, segundo é referido
também neste parecer, o volume de negócios é superior em 50% ao dos Estaleiros de Viana e com um
número de trabalhadores muito inferior. Os dados concretos são mais 50% de volume de negócios e apenas
170 trabalhadores.
Ora, tem a Comissão de Trabalhadores consciência de que este era mais um problema em termos da
organização dos Estaleiros?
O Sr. António Costa: — Claro que sim, claro que temos consciência.
Efetivamente, quando estamos a falar da nossa empresa e também para que o Sr. Deputado fique com
uma noção mais abrangente dos contratos que eram realizados na nossa empresa, é muito fácil. Ao contratar
um navio, tem um caderno de encargos e, em termos de acabamentos, em termos de grau de exigência de
qualidade, tem vários índices; é óbvio que para cumprir os índices máximos em termos de construção naval o
orçamento cada vez é mais caro.”32
O Sr. Dr. Fernando Geraldes, Presidente do Conselho de Administração dos ENVC, entre abril de 2004 e
março de 2007, ouvido na CPI, falou sobre as dificuldades à altura para suportar os custos salariais, em
resposta ao Sr. Deputado Rui Paulo Figueiredo:
“(…) Houve uma altura em que propus (propus, mas não foi aceite) que x colaboradores da empresa (já
não me recordo da percentagem, pelo que não quero estar aqui a dizer um número qualquer), nomeadamente
da área da mão de obra indireta, fossem para casa com o pagamento de 65% do ordenado. Isto aliviaria o
sistema dos custos fixos, porque o grande problema daquela empresa é que tinha uma rigidez de custos fixos
enorme, independentemente da capacidade ou não capacidade de criação de trabalho, o que numa altura em
que se tem trabalho… É que aquela empresa nem a mão de obra tinha disponível, e nós tínhamos de
subcontratar mão de obra. O problema é a rigidez que existe quando não existe capacidade para contratar,
porque se contrata a perder dinheiro, e sabe-se que se está a contratar a perder dinheiro, para dar
empregabilidade basicamente só às pessoas que estão lá (que até percebo que obviamente é necessária),
mas isso tem a devida consequência.
Portanto, para mudar, acho que este processo tinha de ter continuidade, tinha de haver abertura e alguma
flexibilidade para reduzir especialmente esta rigidez que a empresa tinha. E acho que, se esta rigidez tem sido
alterada — e não sei se o programa dos patrulhões continuou ou parou, se está em vigor ou não —, a
empresa podia continuar a navegar. Mas não faço a mínima ideia se esse programa continua ou não.
Mas a mão-de-obra tinha de ter essa flexibilidade, porque era impossível estar a pagar continuamente 1
milhões de euros, 1,2 milhões de euros ou 1,3 milhões de euros de custos salariais todos os meses,
independentemente de termos embarcações a ser construídas ou não.
Não sei se respondi à pergunta.”33
O Sr. Dr. Carlos Alberto Veiga Anjos, ex-Presidente do Conselho de Administração dos ENVC entre
setembro de 2010 e junho de 2011, em resposta ao Sr. Deputado António Filipe, referiu que havia a tendência
para os trabalhadores passarem “por cima” do Conselho de Administração:
“(…) Posso dizer-lhe o seguinte: com todo o respeito que tenho pelas comissões de trabalhadores das
empresas, a Comissão de Trabalhadores só falava comigo quando eu queria e não quando esta queria,
porque eu tinha três administradores executivos, entre eles um diretor de pessoal, o administrador da área de
pessoal e o presidente executivo da empresa. Portanto, muitas vezes, eram pedidas audiências pela
Comissão de Trabalhadores e eu recusava-me a recebê-la porque os assuntos que eles iam discutir eram
32
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 26 de março de 2014, coordenador e representante da Comissão de Trabalhadores de Viana do
Castelo, Srs. António Costa e Abel Viana, págs. 45-46. 33
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 29 de abril de 2014, Presidente do Conselho de Administração da ENVC de 2004 a 2007, Sr. Dr.
Manuel Fernando Geraldes, págs. 19-20.
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assuntos da comissão executiva e da direção de pessoal e eu não tinha nada a ver com isso e, portanto, não
aceitava recebê-los.
Mas, possivelmente, havia ministros ou secretários de Estado que, pelos mesmos motivos, recebiam a
Comissão de Trabalhadores. Ora, isto, depois, inverte completamente a situação dentro das empresas, inverte
completamente o ciclo das coisas. O senhor vê alguma comissão de trabalhadores ser recebida com a mesma
frequência com que é recebida a Comissão dos Trabalhadores dos Estaleiros em qualquer lado? Eu não vejo.
De maneira que, ali naquela empresa, de facto, começou-se a cultivar…
A empresa perdeu a sua independência económica e financeira, começou a acumular prejuízos, começou
a ter dificuldades de tesouraria e, depois, houve a tendência para passar sempre por cima do conselho de
administração e por privilegiar diálogos diretos, o que mina sempre a confiança em qualquer conselho de
administração. Um conselho de administração que vê que as suas funções na empresa são,
permanentemente, minadas por diálogo entre o acionista e a Comissão de Trabalhadores vê-se numa situação
de gestão completamente insustentável. E isto acontecia com muita frequência.”34
b. Construções dos ENVC e navios cancelados
Desde que iniciou a sua atividade a ENVC já construiu mais de 220 navios de vários tipos: batelões,
rebocadores, ferryboats, navios de pesca, porta-contentores, transportadores de cimento, navios tanques,
LPG, transportadores de produtos químicos e vasos de guerra.
Os três primeiros navios foram construídos em 1948. Eram arrastões para a pesca do bacalhau: o Senhor
dos Mareantes e o Senhor das Candeias para a Empresa de Pesca de Viana e, o São Gonçalinho para a
Empresa de Pesca de Aveiro.
Cumpre mencionar que, de 1944 a 1974 cerca de 90% do total de unidades construídas se destinaram a
armadores nacionais, sendo cerca de 50% destinadas ao reforço e substituição da frota pesqueira. Na
segunda metade da década de 70 e nos anos 80, o principal mercado da Empresa foi a Ex-URSS. Já nos
anos 90, os ENVC passaram a construir fundamentalmente para o mercado alemão.
Ao longo dos anos a ENVC recebeu dezenas de encomendas, podendo o respetivo portefólio ser
consultado no “site” da empresa.35
Construções de 2003 a 2013
Entre 2003 e 2013, das 22 novas construções, apenas 2 deram lucro, 20 deram prejuízo. A partir de 2006,
nunca mais uma construção deu lucro.
Estes dados são sustentados pelo que foi dito na exposição inicial do Presidente do Conselho de
Administração da Empordef, Sr. Dr. Rui Jorge de Carvalho Vicente Ferreira:
“(…) Por que é que a empresa perdia dinheiro? Além da questão da riqueza que produzia, do VAB que
vimos há pouco versus os encargos com pessoal, há outros fatores e esses outros fatores são,
nomeadamente, as construções. O melhor resultado que a empresa teve, de 2003 a 2013, ou seja, nos últimos
10 anos, em 22 navios entregues, foi num navio pequeno, uma construção de meio milhão, um navio-hotel,
com um resultado de 6%. Não tem valor no quadro global das construções, porque é um navio relativamente
pequeno, um trabalho relativamente pequeno. O pior resultado foi em 2004, num navio químico, que, na gíria,
nos Estaleiros, se chama «enxofreiro», porque serve para transportar enxofre, feito para uma empresa
finlandesa, um armador finlandês, em que se perderam 77%. Esta perda de 20 milhões foi o indicador de
alarme, penso que este caso é, de facto, o alarme em relação à situação da gestão dos Estaleiros, em 2004.
Não tenho qualquer dúvida de que esta construção passou a caracterizar a situação. Aliás, vê-se pelos rácios
e pelos indicadores que vimos anteriormente, que mostram uma situação muito complicada. E não conheço
que se tenham extraído consequências desta situação, deste resultado, neste ano, com a construção deste
navio.
O resultado global, nos 22 navios, foi uma perda de 100 milhões, uma margem negativa de 19% (slide 14).
34
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 6 de maio de 2014, Presidente do Conselho de Administração dos ENVC no período de setembro
de 2010 a junho de 2011, Sr. Dr. Carlos Alberto Veiga Anjos, págs. 83-84. 35
Adaptado de relatório DILP, Estaleiros Navais de Viana do Castelo, março de 2014.
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No slide 15, podemos ver o total dos navios, dividido, e as diferentes margens, em que C representa os
navios dos contratos de contrapartidas, M são os navios conquistados no mercado pelos próprios Estaleiros, m
são os navios que resultam de subempreitada, ou seja, os negócios já vinham de outros estaleiros e a
empresa conseguiu absorvê-los e fazer trabalho. E fê-lo! Podemos verificar que os dois M têm a ver com dois
navios em que a empresa perdeu valores muito significativos. Depois, enfim, temos aquilo que é conseguido
pelo Estado português, de caráter militar ou outras construções.”36
37
Pergunta o Sr. Deputado Afonso Oliveira, ao Sr. Presidente do Conselho de Administração da Empordef,
Dr. Rui Jorge de Carvalho Vicente Ferreira:
“ (…) Por que razão há uma dificuldade permanente em rentabilizar as construções.
O estudo demonstrou também que uma série de navios foram construídos com prejuízos incomportáveis.
Qualquer empresa que funcione no mercado não pode ter este tipo de prejuízo, não constrói para ter prejuízo.
Por que razão foi assim?”38
Resposta do Sr. Dr. Rui Jorge de Carvalho Vicente Ferreira:
“(…) Relativamente à estrutura de funcionamento dos Estaleiros e à sua organização — e ficou claro ao
nível de custos com recursos humanos, as margens que cada uma das construções produzia, assim
como aspetos que aqui não foram referidos, porque não teria tempo para o fazer, ao nível da estrutura
de compras, ou seja, ao nível da capacidade e da competitividade para conseguir preços de mercado
interessantes na compra de materiais e equipamentos —, os Estaleiros tinham graves deficiências.
36
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 13 de março de 2014, Presidente do Conselho de Administração da EMPORDEF, Sr. Dr. Rui
Jorge de Carvalho Vicente Ferreira, págs. 11-12. 37
Quadro do Anexo IV– Apresentação em Powerpoint deixada pelo Sr. Presidente da EMPORDEF, Dr. Rui Jorge de Carvalho Vicente
Ferreira na CPI, na audição de 13 de março de 2014. 38
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 13 de março de 2014, Presidente do Conselho de Administração da EMPORDEF, Sr. Dr. Rui
Jorge de Carvalho Vicente Ferreira, pág. 18.
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Hoje, é historicamente fácil ao nível de rácios económicos demonstrá-lo e ao nível técnico, nomeadamente
na área de compras ou na área industrial de organização de trabalho, é difícil ir buscar elementos tão
tardios.”39
Sobre a possibilidade de novas construções para os ENVC, o Sr. Presidente do Conselho de Administração
da Empordef, Dr. Rui Jorge de Carvalho Vicente Ferreira, esclarece ainda o Sr. Deputado Afonso Oliveira:
“(…) Sr. Deputado, aquilo que eu considero é que, primeiro, os Estaleiros tinham uma total incapacidade de
conquistar novas construções no mercado. Viu-se, pelo mapa que mostrei há pouco, que os M mostram que
em 10 anos conquistou duas construções. Os Estaleiros viveram de construções de contrapartidas e de
construções da diplomacia económica do Governo.”40
O Sr Dr. Rui Jorge de Carvalho Vicente Ferreira, esclareceu ainda o Sr. Deputado Jorge Fão, sobre novas
encomendas de construção, nomeadamente as da empresa Douro Azul:
“(…) O Sr. Jorge Fão (PS): — Ainda neste período de tempo, e falando em hipóteses de realização de
contrato, ou seja, de novas encomendas, tenho em minha posse um documento que data de 24 de novembro
de 2011 que teria sido o princípio de um contrato entre a EMPORDEF e a Douro Azul para a construção de
dois navios.
Este documento, que seguramente conhece, chegou a ser um contrato ou foi só a minuta do contrato? E
por que é que não foi contrato?
O Sr. Dr. Rui Jorge de Carvalho Vicente Ferreira: — Preço. Não era interessante para os Estaleiros
continuar a perder dinheiro em construções.”41
Sobre a situação das construções dos ENVC serem maioritariamente com prejuízo, perguntou a Sra
Deputada Mónica Ferro, na audição com os Srs. Branco Viana e Martinho Cerqueira, Representantes da
União dos Sindicatos de Viana do Castelo:
“(…) Já em relação aos prejuízos de construção, os dados que temos referem que, entre 2006 e 2010, em
13 novas construções nenhuma delas deu lucro, o que fez com que tivéssemos prejuízos acumulados de 100
milhões de euros. Qual é a vossa perspetiva e a vossa explicação, se houver alguma, para este assunto?”42
Resposta do Sr. Branco Viana:
“(…) É aquela velha questão: eram navios altamente tecnológicos, eram navios que estes trabalhadores
não estavam habituados a construir, eram navios em que era necessário equipamentos, se calhar, mais
sofisticados e tecnológicos dentro da empresa. Por isso, teria sido necessário dotar a empresa de
investimentos próprios, o que não foi feito e o que também levou à acumulação do valor negativo, superior
àquele que seria previsto.”43
Na audição com a Comissão de Trabalhadores dos Estaleiros Navais de Viana do Castelo, com os Srs.
António Costa e Abel Viana, coordenador e representante da referida Comissão, os mesmos responderam
sobre o prejuízo nos navios construídos.
Pergunta do Sr. Deputado Abel Baptista:
“(…) a Comissão de Trabalhadores foi ou não informada, a sua, coordenada por si, ou as anteriores? A
Comissão de Trabalhadores dos Estaleiros, independentemente de quem fosse o seu titular, foi ou não
39
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 13 de março de 2014, Presidente do Conselho de Administração da EMPORDEF, Sr. Dr. Rui
Jorge de Carvalho Vicente Ferreira, pág. 18. 40
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 13 de março de 2014, Presidente do Conselho de Administração da EMPORDEF, Sr. Dr. Rui
Jorge de Carvalho Vicente Ferreira, pág. 21. 41
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 13 de março de 2014, Presidente do Conselho de Administração da EMPORDEF, Sr. Dr. Rui
Jorge de Carvalho Vicente Ferreira, págs. 42-43. 42
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 18 de março de 2014, representantes da União de Sindicatos de Viana do Castelo, Srs. Branco
Viana e Martinho Cerqueira, pág. 74. 43
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 18 de março de 2014, representantes da União de Sindicatos de Viana do Castelo, Srs. Branco
Viana e Martinho Cerqueira, pág. 74.
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informada pelo Conselho de Administração de que dos 22 navios construídos entre 2003 e 2012, 20 deles
deram prejuízo?”44
Resposta do Sr. António Costa:
“(…) Qualquer comissão de trabalhadores das que passou pelos Estaleiros Navais de Viana do Castelo
sabia analisar um balanço anual ou os resultados operacionais da nossa empresa.
Portanto, todas as comissões de trabalhadores foram devidamente informadas e todas elas alertaram tanto
as administrações como o governo e os Srs. Deputados, nas várias reuniões de trabalho que tiveram (e penso
que o Sr. Deputado foi alertado várias vezes para essa situação) para a situação ruinosa em que a nossa
empresa estava, ano após ano, em termos de passivo e de resultados operacionais negativos.
Penso que isso não é novidade, nem para o Sr. Deputado nem para as comissões de trabalhadores,
porque é uma obrigatoriedade das administrações darem o balanço anual às comissões de trabalhadores,
onde vem mencionado o resultado operacional, e as comissões de trabalhadores sempre consciencializaram
as várias administrações, os vários ministros, os vários governos para a gravidade da situação que é a
construção de navios com prejuízo.
A pior coisa que pode acontecer a um trabalhador, e falo por mim, Sr. Deputado, é, quando lhe entregam o
desenho de um navio ou de um bloco para montar, saber, logo à partida, que temos prejuízo com aquele
navio.
Esta é a pior coisa que pode acontecer a um trabalhador, porque em vez de criar um clima de motivação,
automaticamente, cria um clima de desmotivação.”45
O Sr. Eng.º Arnaldo Figueiroa Machado, Presidente do Conselho de Administração dos ENVC, entre abril
de 2007 e dezembro de 2008, esclareceu a Sr.ª Deputada Carla Cruz sobre as construções nos ENVC:
“(…) O Sr. Eng.º Arnaldo Pedro Figueirôa Navarro Machado: — Não sou capaz de dizer exatamente, mas
tenho a sensação que construímos, que entregámos, salvo erro, seis navios durante esses dois anos; cinco
para um armador alemão e um para um armador açoriano. Entregámos, salvo erro, seis navios, mas
trabalhámos em mais do que seis navios. Trabalhámos nos navios para os Açores, trabalhámos nos famosos
patrulhas oceânicos.
Que me lembre era esta a situação.
Portanto, como disse à Sr.ª Deputada tínhamos uma carteira de encomendas brutal e não tínhamos
pessoas para fazer tudo isso e, nesse ano e meio, fizemos formação de montadores e soldadores de Viana
para os Estaleiros (muitos deles depois não vinham, para os Estaleiros, iam para Vigo, porque nessa altura
havia muito trabalho nos Estaleiros de Vigo) e, salvo erro, ainda tive de trazer montadores e soldadores
romenos, durante uma certa altura, por falta de pessoas.
A Sr.ª Carla Cruz (PCP): — Sr. Engenheiro, o que está a dizer é que os Estaleiros não tinham mão-de-obra
que pudesse fazer face às encomendas?
O Sr. Eng.º Arnaldo Pedro Figueirôa Navarro Machado: — Estou a dizer que havia um desacerto entre as
encomendas que estavam colocadas no Estaleiro e a capacidade que o Estaleiro tinha para as fazer. Tivemos
de fazer imensas horas extra, tivemos de recrutar pessoas onde havia.
Há só um pequeno problema: é que os navios não davam lucro, Esse é que é o problema que aqui
falta. Uma coisa é fazer os navios, outra coisa é fazer os navios com margem positiva. O problema é
que os navios não tinham margem positiva e informei a tutela disso. Pouco tempo depois de lá chegar,
quando olhei para os orçamentos dos navios, vi a realidade dos navios e informei a tutela — a tutela
EMPORDEF — de que aqueles navios não iriam certamente dar margem positiva. Mas,
44
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 26 de março de 2014, coordenador e representante da Comissão de Trabalhadores de Viana do
Castelo, Srs. António Costa e Abel Viana, pág. 37. 45
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 26 de março de 2014, coordenador e representante da Comissão de Trabalhadores de Viana do
Castelo, Srs. António Costa e Abel Viana, págs. 38-39.
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independentemente disso, tínhamos de os entregar e tínhamos de o fazer em tempo porque, senão, pagavam-
se multas por atraso no prazo de entrega.
Portanto, as coisas tinham de ser feitas de qualquer maneira.”46
E ainda, mais à frente, afirma:
“(…) penso que havia uma lógica que, por um lado, é compreensível e, por outro, é perversa, que é esta:
«O que é preciso é encher o estaleiro. Mesmo que os navios não tenham margem positiva, temos trabalho».
Essa situação funciona durante um certo tempo, mas, depois, não pode continuar a funcionar. Essa,
provavelmente foi a razão pela qual eu, ao longo de um ano e meio, só consegui fazer dois contratos e só
consegui encaminhar outros dois.”47
Navios cancelados
Relativamente a este tema, disse o Presidente do Conselho de Administração da Empordef, Sr. Dr. Rui
Jorge de Carvalho Vicente Ferreira:
“(…) Um outro aspeto muito interessante é o dos navios cancelados, ou seja, os navios que não se
entregaram, além do Anticiclone e do Atlântida. Quem olha para estes números até pode pensar que os
Estaleiros ganham dinheiro em não entregar navios, excetuando o Atlântida e o Anticiclone. E, de facto, há
também alguns indicadores, nomeadamente alguns negócios, que mostram uma situação algo difícil de
compreender, designadamente nestes dois contratos de mega-iates, em que, inexplicavelmente, não se tendo
feito um parafuso, a empresa não conseguiu ficar com os valores de adiantamento do cliente. É difícil
compreender como é que se conseguiram constituir custos tão elevados, de 70 a 80% das verbas que se
tinham recebido, tendo o cliente desistido das construções.”48
49
46
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 29 de abril de 2014, Presidente do Conselho de Administração dos ENVC no período de 2007 a
2009, Sr. Eng.º Arnaldo Pedro Figueirôa Navarro Machado, págs. 10-11. 47
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 29 de abril de 2014, Presidente do Conselho de Administração dos ENVC no período de 2007 a
2009, Sr. Eng.º Arnaldo Pedro Figueirôa Navarro Machado, pág. 14. 48
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 13 de março de 2014, Presidente do Conselho de Administração da EMPORDEF, Sr. Dr. Rui
Jorge de Carvalho Vicente Ferreira, pág. 12. 49
Quadro do Anexo IV – Apresentação em Powerpoint deixada pelo Sr. Presidente da EMPORDEF, Dr. Rui Jorge de Carvalho Vicente
Ferreira na CPI, na audição de 13 de março de 2014.
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48
c. Encomendas Marinha aos ENVC
Pelo Despacho conjunto n.º 15/2001, de 11 de janeiro de 2001, o Estado optou por atribuir através de
ajuste direto com a Estaleiros Navais de Viana do Castelo, SA, a construção de um navio-patrulha oceânico
para o combate à poluição marítima. Determinou-se, ainda, no n.º 5 que, nos termos do n.º 3.º do despacho
conjunto MDN/ME n.º 341/99, de 8 de abril, o contrato de aquisição de que trata o presente despacho seja
dispensado da cláusula de contrapartidas.
Assim sendo, e na sequência do procedimento oportunamente aberto, foi celebrado entre o Estado e a
sociedade Estaleiros Navais de Viana do Castelo, SA, em 15 de outubro de 2002, um contrato relativo à
construção de um navio de patrulha oceânico, com direito de opção de aquisição de um segundo navio do
mesmo tipo. Nesse contrato, e em especial no seu anexo R, ficou expressa a possibilidade de ampliar o
fornecimento deste tipo de navios e definidas as condições para esses fornecimentos posteriores.
Dois anos mais tarde, em 19 de maio de 2004, o Estado celebrou com os ENVC, novo contrato de
aquisição que previa, designadamente, a aquisição de dois navios de patrulha oceânico e de combate à
poluição, incluindo o desenvolvimento de um sistema integrado de comando, vigilância, comunicação e gestão
da informação, aos mesmos destinado, de acordo com o contratualmente estabelecido. Pela Resolução n.º
68/2004, de 16 de junho, foi autorizada a realização da despesa inerente ao contrato celebrado, e ratificado a
celebração do respetivo contrato.
No preâmbulo desta Resolução pode ler-se: a sociedade Estaleiros Navais de Viana do Castelo, SA, no
contexto da execução do contrato celebrado em 15 de outubro de 2002, tem revelado estar em condições de
proceder à construção de navios desta natureza, designadamente assegurando as indispensáveis aptidões
técnica e estrutural impostas pelas especificidades da construção naval deste tipo de unidades e dispondo de
adequada capacidade de resposta às exigências do Estado, nomeadamente em termos de projeto e de
construção, o que obviamente se revela determinante na manutenção da linha de continuidade iniciada e
perspetivada no referido contrato.
Por sua vez, a Resolução do Conselho de Ministros n.º 183/2004, de 22 de dezembro, aprovou,
nomeadamente, um programa estruturado e completo de aquisição de navios, denominado Programa Relativo
à Aquisição de Navios Destinados à Marinha Portuguesa (PRAN), a executar por um período de 11 anos, no
qual se compreendem um contrato-quadro, um contrato específico de aquisição de seis navios-patrulha
oceânicos, e um contrato específico de aquisição de cinco lanchas de fiscalização costeira, tendo em vista a
manutenção e reforço da capacidade de vigilância e fiscalização marítima, designadamente nas zonas
económicas exclusivas do continente e das Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira, bem como nas
áreas interiores ribeirinhas.
Em concretização do PRAN, foi celebrado, em 17 de novembro de 2004, o referido contrato-quadro, nos
termos do qual se definia e regulava o enquadramento e o modo de união entre os dois contratos específicos
de aquisição de seis navios-patrulha oceânicos e cinco lanchas de fiscalização costeiras, destinados à
Marinha.
Segundo o preâmbulo, encontrava-se em causa a continuação da linha iniciada com os contratos de 15 de
outubro de 2002 e de 19 de maio de 2004, sendo fundamental assegurar a uniformidade e continuidade não
só dos fornecimentos como também das técnicas aplicadas e das tecnologias implementadas. Tal unidade e
continuidade só se tornam possíveis se a construção dos novos navios for atribuída à mesma entidade
incumbida da construção dos anteriores, isto é, se o ajuste direto contemplar os ENVC, além de que as
eventuais subcontratações a empresas nacionais concorrem, por si só, para a crescente participação e
desenvolvimento da indústria nacional especializada.
Nesta fase, aliás, a adjudicação dos novos navios a uma outra entidade acarretaria especiais dificuldades
financeiras e logísticas para o Estado e, muito especialmente, para a Marinha, relacionadas, desde logo, com
a necessidade de elaboração, de raiz e por uma entidade distinta, de novos projetos para os navios que se
pretende adquirir, que poderiam facilmente gerar incompatibilidades ou dificuldades técnicas significativas na
futura articulação entre esses mesmos navios e os que se encontram em fase de construção, vocacionados
para o desempenho de funções idênticas, incompatibilidades e dificuldades essas que adviriam, justamente,
do seu fornecimento por estaleiros diferentes.
Acrescenta-se que importa ter em conta que os ENVC (…) têm revelado estar em condições de proceder à
construção do tipo de navios objeto do Programa, designadamente assegurando as indispensáveis aptidões
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técnica e estruturalmente impostas pelas especificidades da construção naval deste tipo de unidades e
dispondo de adequada capacidade de resposta às exigências do Estado, nomeadamente em termos de
projeto e de construção.
No n.º 10 estabelece-se que quer o contrato quadro, quer o contrato específico de aquisição dos seis
navios-patrulha oceânicos e o contrato específico de aquisição das cinco lanchas de fiscalização costeira, a
celebrar entre o Estado e os ENVC, ficam isentos de contrapartidas.
Em 19 de dezembro de 2005 foi celebrado o contrato base entre o Ministério da Defesa Nacional e a
ENVC, SA, que estabelecia, de modo vinculativo, as bases do contrato de aquisição de cinco lanchas de
fiscalização costeira em concretização do contrato-quadro, celebrado no âmbito do PRAN, tendo, em 17 de
março de 2009, sido assinado o respetivo contrato de aquisição de cinco lanchas de fiscalização costeira, com
o direito de opção de aquisição de mais três.50
Relativamente a este tema, disse o Presidente do Conselho de Administração da Empordef, Sr. Dr. Rui
Jorge de Carvalho Vicente Ferreira:
“(…) Quanto às construções militares, que são um tema relevante, gostaria só de dar nota de que as
construções dos dois NPO (navio de patrulha oceânica) representaram cerca de 17 milhões de prejuízo, como
se pode ver noslide 18, as penalidades potenciais, aquando da entrega destes navios, situavam-se a este
nível, quando se negociaram as revogações dos restantes contratos, a empresa poderia ter penalidades que,
no mínimo, seriam desta ordem — e posso facultar documentação nesse sentido —, mas podiam atingir
valores de várias dezenas de milhões de euros.
Foi, pois, uma revogação com um saldo muito positivo para os Estaleiros, independentemente da
compreensão que se possa ter noutras perspetivas. Sob o ponto de vista dos contratos, os Estaleiros tinham
também, para além de atrasos de dezenas e dezenas de meses na construção dos NCP (navio de combate à
poluição) e das lanchas, a acrescer aos NPO, responsabilidades contratuais elevadas.”51
52
50
Adaptado de relatório DILP, Estaleiros Navais de Viana do Castelo, março de 2014. 51
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 13 de março de 2014, Presidente do Conselho de Administração da EMPORDEF, Sr. Dr. Rui
Jorge de Carvalho Vicente Ferreira, pág. 13. 52
Quadro do Anexo IV – Apresentação em Powerpoint deixada pelo Sr. Presidente da EMPORDEF, Dr. Rui Jorge de Carvalho Vicente
Ferreira na CPI, na audição de 13 de março de 2014.
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50
Por forma a averiguar o impacto que as encomendas da marinha tiveram no agravamento da situação da
empresa ENVC, recorreu-se às audições havidas em Comissão, começando pela do Sr. Ministro da Defesa
Nacional, Dr. José Pedro Aguiar Branco.
Na audição referida, pergunta o Sr. Deputado Fernando Negrão:
“(…) No que se refere às encomendas da Marinha, pretendo saber se foi salvaguardada a propriedade dos
projetos de construção dos navios para a Marinha. E, havendo atrasos como houve — e sabemos que houve
— na construção, e que resultaram no incumprimento contratual, se foram ou se serão pagas
indemnizações.”53
Resposta do Sr. Ministro da Defesa Nacional, Dr. José Pedro Aguiar Branco:
“(…) Quanto às encomendas da marinha e à salvaguarda dos projetos, sim, foi possível
salvaguardarmos, nomeadamente o projeto de navio polivalente logístico. E o Ministério da Defesa,
como estava em curso o processo de privatização para que precisamente a propriedade intelectual
desse projeto ficasse no Estado, por afetação de verbas próprias do Ministério da Defesa — é hoje o
Ministério da Defesa o titular desse projeto, em compra, que mereceu o visto prévio do Tribunal de
Contas —, comprou aos Estaleiros esse projeto. Portanto, estão salvaguardados os projetos que
viabilizam que se possa construir, no futuro, o mesmo.
Já no que diz respeito às indeminizações, havia lugar para indeminizações por parte de incumprimento dos
Estaleiros Navais de Viana do Castelo e também havia lugar para indeminizações por atrasos. É verdade que
a rescisão de contrato também poderia resultar em indeminizações por parte do Governo aos Estaleiros. E foi
considerado que havia uma compensação entre aquilo que seriam os riscos de indeminização por parte da
Marinha e aquilo que seriam os riscos de indeminização por parte dos Estaleiros nos atrasos na execução das
encomendas.”54
Relativamente a esta matéria, quando questionado pelo Sr. Deputado António Filipe, responde o Sr.
Ministro da Defesa Nacional, Dr. José Pedro Aguiar Branco:
(…) “ Devo também dizer-lhe, já que falou da questão das encomendas da Marinha, que as encomendas
da Marinha só foram executadas no período em que, segundo parecia, Portugal crescia, era moderno e
estava num franco desenvolvimento, entre 2005 e 2011…. Ora, das encomendas da Marinha, que
deveriam ter sido, na sua maior parte, executadas nesse período, só se executaram, desse plano de
construções, 2,5%. Porquê? O plano consistia em dois NPO (navios patrulha oceânicos), que tinham sido
contratualizados em 2002, com prazo de entrega previsto para 2005, tendo sido entregues, um, em 2011, com
seis anos de atraso, e, outro, em novembro de 2013, já com este Governo a disponibilizar verbas para o efeito,
e com oito anos de atraso. O custo previsto era de 95 milhões de euros e foram pagos 111 milhões de euros.
Depois, havia um plano relativo à aquisição de navios, de 2004, que consistia em cinco lanchas de
fiscalização costeira (LFC) e seis NPO, sendo o valor do contrato de 480 milhões de euros. Entre 2005 e 2011
(quando Portugal crescia, tinha dinheiro e, por isso, as questões orçamentais podiam ser tratadas de forma
diferente…!), deveriam ter sido gastos nisto 312 milhões de euros e foram pagos 8 milhões de euros.
Quanto às LFC, que tinham um prazo de entrega para 2008, a sua construção, em 2012, não se tinha
sequer iniciado. E, relativamente aos NPO, nada foi feito, nem sequer foram contratualizados.
Quanto a dois NCP (navios de combate à poluição marítima), o contrato entrou em vigor em 2004, previa o
pagamento de cerca de 75 milhões de euros e foram pagos 22 milhões de euros, mas apenas para compra de
equipamento. Foram executados 30% do valor previsto. Os navios deveriam ter sido entregues em 2008, mas,
em 2012, não se tinha sequer iniciado a sua construção.
Por isso, nós falamos de um plano da Marinha, de encomendas para a Marinha, que deveriam ter sido
concluídas, na sua maior parte, até este Governo ter tomado posse, mas que não o foram.”55
53
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 11 de março de 2014, Sr. Ministro da Defesa Nacional, Dr. José Pedro Aguiar Branco, pág. 7. 54
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 11 de março de 2014, Sr. Ministro da Defesa Nacional, Dr. José Pedro Aguiar Branco, págs. 14-
15, sublinhado do relator. 55
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 11 de março de 2014, Sr. Ministro da Defesa Nacional, Dr. José Pedro Aguiar Branco, págs. 25-
26, sublinhado do relator.
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51
O Sr. Prof. Augusto Santos Silva, ex-Ministro da Defesa Nacional, que tutelou esta área, entre outubro
2009 e junho de 2011, também esclareceu sobre esta temática na sua audição.
Perguntou o Sr. Deputado Abel Baptista:
“(…) O Sr. Professor foi Ministro da Defesa entre 2009 e 2011. Conhece a Lei de Programação Militar —
Lei Orgânica n.º 4/2006, que previa um conjunto de investimentos na Marinha, entre 2006 e 2011, que
ascenderiam a cerca de 270 milhões de euros, incidindo basicamente em construção militar naval, construção
de navios nos Estaleiros Navais de Viana do Castelo, que lhe recordo que eram os seguintes: NPO (navio de
patrulha oceânica) Viana do Castelo, NPO Figueira da Foz, NCP (navio de combate à poluição) Sines, NCP
Ponta Delgada, NPO Funchal, NPO Aveiro.
Em 2009, deveriam ter sido investidos cerca de 34 milhões de euros; em 2010, 74 milhões de euros; em
2011, 79 milhões de euros.
Sr. Professor, no tempo em que foi Ministro da Defesa e não tendo cancelado a Lei de Programação Militar,
por que não cumpriu, enquanto Ministro, esta lei? Esta é a primeira pergunta.”56
Respondeu o Sr. Prof. Augusto Santos Silva:
“(…) Em relação às questões que me colocou, ou seja, porque é que a Lei de Programação Militar não foi
cumprida em 2010 e na primeira metade de 2011, que são os anos sob a minha responsabilidade, do ponto de
vista da execução orçamental, nos termos em que tinha sido aprovada em 2006, a resposta é porque isso foi
determinado pela Lei de Orçamento do Estado para 2010 e para 2011, que introduziu vários cortes em vários
setores, incluindo a definição de outros tetos abaixo dos que legalmente eram permitidos pela própria Lei de
Programação Militar para a sua execução. Isto, aliás, nem começou em 2010, nem acabou em 2011, como o
Sr. Deputado sabe melhor do que ninguém.”57
O Sr. Prof. Augusto Santos Silva ex-Ministro da Defesa Nacional, que tutelou esta área entre outubro 2009
e junho de 2011, na sua audição, respondeu ao Sr. Deputado Fernando Negrão, sobre a situação da empresa
ENVC, na altura em que o plano de reestruturação foi aprovado:
“(…) Na altura em que o plano de reestruturação foi aprovado pelo Estado, a empresa contava com 766
trabalhadores, dos quais grande parte não tinha serviço atribuído nem podia ter. Uma das componentes
essenciais do plano de reestruturação era reduzir o número de trabalhadores para um valor, então, estimado
de 344 postos diretos mais 200 indiretos e, portanto, reduzir em cerca de um terço o volume de força de
trabalho a que os Estaleiros recorriam.
Por que é que era preciso fazer isso? Porque esse era o custo mais importante dos custos fixos da
empresa e os custos fixos da empresa eram de tal forma, em proporção, isto é, o seu rácio sobre o total de
custos era de tal forma que a empresa não era, pura e simplesmente, capaz de gerar cash-flow nem
resultados positivos, fossem eles EBITDA (Earnings Before Interest, Taxes, Depreciation and Amortization),
antes de impostos ou depois de impostos. Portanto, era preciso atacar esse problema.
Era preciso atacar também outro problema que a empresa tinha, que não valia a pena contornar, que era
um problema de produtividade. Por isso, outra das medidas essenciais do programa de reestruturação era a
passagem do horário de trabalho da empresa das 37 horas semanais, que então eram praticadas, para as 40
horas semanais, o que constituía o padrão médio no setor privado, então, em Portugal.
Também se propunha que a resolução da questão financeira nos Estaleiros se pudesse fazer sem suscitar
quaisquer dúvidas de ajudas de Estado ilegítimas, por parte da Direcção-Geral da Concorrência europeia. Por
isso, a proposta era a de que o Estado, isto é, a EMPORDEF e o Tesouro, mas sobretudo a EMPORDEF,
transformassem em capital a dívida que os Estaleiros tinham acumulado face à sua própria holding e ao seu
próprio acionista.
Evidentemente, também estavam previstas medidas importantes, do ponto de vista da gestão de
encomendas por parte dos Estaleiros. E o conjunto destas medidas garantia, dava bases de
56
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 1 de abril de 2014, Ministro da Defesa Nacional do XVIII Governo Constitucional, Sr. Prof. Augusto
Santos Silva, págs. 9-10. 57
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 1 de abril de 2014, Ministro da Defesa Nacional do XVIII Governo Constitucional, Sr. Prof. Augusto
Santos Silva, págs. 14-15.
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sustentabilidade sólidas (a expressão é da Direcção-Geral do Tesouro) para que a empresa pudesse
passar, a breve prazo de dois ou três anos, a resultados anuais positivos e estivesse em condições de
abrir parte do seu capital a privados, estando, aliás, previsto no programa de reestruturação um
encaixe futuro de 100 milhões por via dessa abertura.”58
O Sr. Dr. Fernando Geraldes, Presidente do Conselho de Administração dos ENVC, entre abril de 2004 e
março de 2007, referiu-se quanto à atitude da Marinha ao longo do processo de construção e ao próprio
clausulado dos contratos, esclarecendo as perguntas do Sr. Deputado Rui Paulo Figueiredo:
“(…) no contrato dos NCP (navios de combate à poluição), por exemplo, no qual já participei um
bocadinho… Este contrato está ligeiramente diferente, mas vou dar-lhe um exemplo concreto do contrato dos
patrulhões. Havia uma parte do contrato que dizia, basicamente, o seguinte: «O Estado (…)» — entidade,
Ministério da Defesa —«(…) pagará à empresa Estaleiros Navais de Viana do Castelo contra a apresentação
da fatura (…), com o andamento de (…) obra do projeto, se assim o entender». «Se assim o entender» é um
clausulado que, se calhar, do ponto de vista legal ou de direito, tem toda a lógica, mas para mim é um
absurdo. Não é «se assim o entender», porque, se a empresa que fez o trabalho apresentou uma fatura e se o
trabalho está de acordo com o plano de construção, a entidade, neste caso, o cliente, o Ministério da Defesa,
tem de pagar e ponto final no assunto. Portanto, é um normativo perfeitamente escusado.
(…)
Do que me apercebo da parte de projeto, o que aconteceu, e foi acontecendo, sobremaneira (eu não
estava já lá, mas fui ouvindo), foi que a Marinha quis comprar pelo preço de um Fiat e levou um Ferrari! E foi
repassado para a empresa um custo, extremamente grande e oneroso, da construção de um navio que tinha
determinado tipo de características, as partes técnicas que estavam anexas ao contrato, que foram tratadas
não faço a mínima ideia por quem, tinham lá incorporadas todas as alterações e, portanto, permitia que a
Marinha fosse alterando o contrato sem que a empresa pudesse dizer: «Eh pá, chega, acabou, não passamos
isto». Portanto, isso foi sucessivamente feito e onerando, penso eu, a construção da embarcação, dos NPO,
com as consequências que obviamente trouxe para os resultados da empresa.
(…)
o primeiro navio químico, que foi de um armador finlandês, se não me falha a memória, deu, no ano de
2004, 20 milhões de euros de prejuízo, quando o navio tinha sido contratado pela empresa em 2002, se não
me falha a memória, por 26 milhões de euros. Custou 46 milhões de euros. Sabe porquê? Como deve
imaginar, «saltou-me a tampa» 550 mil vezes, não é?!
É porque havia uma especificação no contrato, não me lembro do nome técnico mas, no fundo, queria dizer
(como aquele navio era para navegar nos mares do Norte, era uma especificação que a soldadura teria de ter)
que se eu passasse a mão na soldadura (suponha que isto é a soldadura de duas chapas) não poderia sentir
nada! Sabe quantas vezes os artífices do Estaleiros fizeram isto? N! Sabe quantas vezes incorporaram isto no
contrato e aumentaram o preço? Zero! Sabe porquê? Porque fazia parte da cultura dos Estaleiros, de um
ponto de vista que acho até positivo: gostavam de fazer bem. Acho que aquela empresa tinha excelentes…
gostavam de fazer bem. Só que o «fazer bem» tem um pouco esta consequência, que é o fazer bem, ser
rigoroso, mas que tem de passar depois para o outro lado, porque costuma-se dizer… Eu até adorava que
fizessem 550 mil alterações, desde que fossem pagas! Não me importava nada que a Marinha fizesse
alterações. Pois que fizessem até mais, desde que fossem pagas!”59
O Sr. Dr. Fernando Geraldes, Presidente do Conselho de Administração dos ENVC, entre abril de 2004 e
março de 2007, esclareceu sobre as encomendas da marinha.
Pergunta do Sr. Deputado Abel Baptista:
“(…) A EMPORDEF forneceu-nos a informação de que os contratos para a construção dos NPO foram
assinados e desenvolvidos nos Estaleiros e que os contratos para a construção dos NPC terão sido assinados
58
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 1 de abril de 2014, Ministro da Defesa Nacional do XVIII Governo Constitucional, Sr. Prof. Augusto
Santos Silva, págs. 34-35, sublinhado do relator. 59
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 29 de abril de 2014, Presidente do Conselho de Administração da ENVC de 2004 a 2007, Sr. Dr.
Manuel Fernando Geraldes, págs. 8-13.
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em maio de 2004 e deveriam ter entrado em vigor em abril de 2005, mas não avançaram. E em 2009,
eventualmente, já haveria a lancha de fiscalização costeira e outras.
Ou seja, o facto de o Estado, entre 2004 e 2011, não ter cumprido os contratos que tinha assinado com os
Estaleiros Navais de Viana do Castelo inviabilizou que os Estaleiros pudessem ter obtido outros contratos que
poderiam, eventualmente, ter trazido trabalho, construção e outro tipo de funcionamento à empresa?”60
Resposta do Sr. Dr. Fernando Geraldes:
“(…) se parto do princípio de que vai haver esse tipo de encomendas de navios militares para a empresa,
no meu tempo, o escalonamento da capacidade, que não era ilimitado, dependia da capacidade de docagem
que a empresa que tinha, o que, obviamente, foi uma condicionante, inclusive mais para a frente, penso eu.
Se tivesse a perspetiva de construir dois navios em 2007 ou em 2008 não ia angariar encomendas novas
quando não tinha capacidade para as construir, porque as docas dos Estaleiros não eram ilimitadas. Portanto,
não era fisicamente fazível.”61
O Sr. Eng.º Arnaldo Figueiroa Machado, Presidente do Conselho de Administração dos ENVC, entre abril
de 2007 e dezembro de 2008, esclareceu a Sr.ª Deputada Carla Cruz sobre as encomendas da marinha,
afirmando que os contratos eram sempre muito favoráveis à marinha:
“(…) Trata-se de os contratos permitirem que a Marinha demorasse meses a aprovar desenhos, que a
Marinha tivesse sempre capacidade de pedir alterações. Era este tipo de coisas que os contratos tinham e que
eram muito favoráveis à Marinha.
A Marinha tinha muito esta capacidade de pedir alterações, de demorar muito tempo, de achar que nunca
nada estava perfeito e o contrato cobria sempre um bocadinho esta situação. Era um contrato, nesse aspeto,
muito favorável à Marinha e pouco favorável para nós.”62
O Sr. Dr. António Jorge Garcia Rolo, Presidente do Conselho de Administração dos ENVC, no período de
2009 a 2010, em resposta ao Dr. Deputado Abel Baptista, sobre a capacidade dos ENVC acompanarem
projectos militares, afirma:
“(…) Por exemplo, tenho comigo uma carta da Navantia — que depois poderei mostrar quando falarmos
das parcerias — onde eles dizem que a nossa incapacidade de acompanhar projetos militares era enorme. E
nós tínhamos de assumir isso.”63
O Sr. Contra-Almirante Víctor Gonçalves de Brito, ex-Presidente do Conselho de Administração dos ENVC,
entre julho e setembro de 2010, esclareceu o Sr. Deputado Jorge Fão, sobre os contratos militares:
“(…) O Sr. Contra-Almirante Victor Manuel Gonçalves de Brito: — Bom, nos contratos militares, como referi,
é claramente um problema do articulado contratual, que não foi devidamente entendido por quem celebrou
esses contratos. Quer dizer, os contratos, em alguns aspetos, têm cláusulas leoninas, noutros aspetos são
muito genéricos. Isto é, eu costumava dizer que, só a título de exemplo (e peço desculpa pelo exemplo),
algures no Caderno de Encargos dizia: «devem ser fornecidos 20 copos», e, provavelmente, quem estava a
orçamentar pensava que eram copos de vidro comprados no Braz & Braz ou… E, não era com este exemplo,
mas só para dar a ideia, do lado do Estado dizia-se: «Não, não, o que nós queremos são copos de cristal,
porque o padrão da Marinha é copos assim, assado…!». Logo aí, se fossem fornecer copos de cristal, havia
um prejuízo.
O que tinha de haver do lado dos Estaleiros era a capacidade, a competência para dizer: «Desculpe lá,
copos de cristal não pode ser!», é o que acontece quando o Estado faz contratos com estaleiros estrangeiros.
60
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 29 de abril de 2014, Presidente do Conselho de Administração da ENVC de 2004 a 2007, Sr. Dr.
Manuel Fernando Geraldes, pág. 33 61
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 29 de abril de 2014, Presidente do Conselho de Administração da ENVC de 2004 a 2007, Sr. Dr.
Manuel Fernando Geraldes, págs. 33-34. 62
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 29 de abril de 2014, Presidente do Conselho de Administração dos ENVC no período de 2007 a
2009, Sr. Eng.º Arnaldo Pedro Figueirôa Navarro Machado, pág. 13. 63
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 30 de abril de 2014, Presidente do Conselho de Administração dos ENVC no período de 2009 a
2010, Sr. Dr. António Jorge Garcia Rolo, pág. 12.
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Quer dizer, mesmo que o Estado adote a mesma forma de fazer os contratos, do lado estrangeiro há
capacidade para explicar que aquilo não está bem, que tem de ser isto ou tem de ser aquilo.
De maneira que, no caso dos navios militares, foi um problema de clausulado dos contratos e é um
problema de deficiente gestão dos contratos; no caso dos navios civis… Julgo que o caso do Atlântida está
mais do que escalpelizado, houve ali erros tremendos com entradas de muitas entidades que não deveriam ter
entrado e com a aceitação pelos Estaleiros de projetos e contas mal feitas, que não deveria ter aceitado como
boas, etc. Portanto, isso está mais do que escalpelizado e é um caso infeliz.”64
O Sr. Dr. Carlos Alberto Veiga Anjos, ex-Presidente do Conselho de Administração dos ENVC, entre
setembro de 2010 e junho de 2011, em resposta ao Sr. Deputado Agostinho Santa, sobre as encomendas da
marinha:
“(…) Agora, o que aconteceu foi o seguinte: essas encomendas caíram, como há bocado dizia, numa
empresa que estava completamente moribunda e, portanto, a empresa, por muita vontade que as pessoas
tivessem, cometeu, na produção dos dois primeiros navios, vários erros. Também a Marinha se mostrou
sempre muito exigente nos critérios de qualidade. E, depois, os projetos não estavam bem definidos e depois
fazia modificações e havia atrasos e não sei quê… E, depois, naqueles Estaleiros não se fazia uma coisa que
era elementar, ou seja, quando um indivíduo está a fazer uma construção qualquer e o cliente pede
alterações, faz-se uma ata em que se põem as alterações que o cliente quer, diz-se ao cliente quanto custa e
fica tudo arrumado: «O senhor quer esta modificação, isto implica estes custos e tal». O cliente assina e diz
que está de acordo e, quando se quer elaborar a fatura final, está tudo feito. Ora, não era assim. Ou porque as
pessoas que dialogavam com os comandantes da Marinha tinham algum constrangimento em falar com
aquelas pessoas, a verdade é que se faziam inúmeras alterações, quer nesse quer noutros navios, e não se
tomava nota das consequências disso em termos de custos. E quando, no final da obra, se queria argumentar
que foi feito isto, isto, isto e isto teve um custo, não tínhamos qualquer documento assinado pelo cliente a dizer
que tinham sido feitas essas alterações. Portanto, os Estaleiros saíam sempre prejudicados nesses litígios de
revisão de preços, no fim da obra.”65
d. Atlântida e Anticiclone
O contrato para a construção dos ferryboats – Atlântida e Anticiclone – foi assinado em abril de 2006. O
destino destes navios era estabelecer a ligação inter-ilhas da Região Autónoma dos Açores.
A empresa pública açoriana Atlânticoline era o armador, sendo a construtora a empresa Estaleiros Navais
de Viana do Castelo.
Por ofício datado de 9 de abril de 2009, o contrato foi rescindido pela Atlânticoline, alegando justa causa e
incumprimento contratual por parte da ENVC.
Pergunta do Sr. Deputado Fernando Negrão:
“(…) Em relação ao Atlântida: em dezembro de 2009, o Governo Regional dos Açores, através de um
acordo arbitral, rejeitou aos Estaleiros a compra do navio Atlântida. Este é um facto. Quais as razões e o
impacto das mesmas? Sr. Ministro, que medidas tem vindo a tomar relativamente a esta questão?”66
Resposta do Sr. Ministro da Defesa Nacional, Dr. José Pedro Aguiar Branco:
“(…) Atlântida, 2009: porque é que foi rejeitado? Só sei aquilo que também consta da documentação que
mandámos para a Procuradoria-Geral da República e na qual se é dito que, como o navio faz menos um nó
naquilo que é a sua velocidade para cumprimento da distância que estava programada no que diz respeito às
razões pelas quais ele foi construído, esse nó era fundamento para a resolução de contrato.
64
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 6 de maio de 2014, Presidente do Conselho de Administração dos ENVC no período de julho a
setembro de 2010, Sr. Contra-Almirante Victor Gonçalves de Brito, págs. 42-43. 65
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 6 de maio de 2014, Presidente do Conselho de Administração dos ENVC no período de setembro
de 2010 a junho de 2011, Sr. Dr. Carlos Alberto Veiga Anjos, pág. 39. 66
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 11 de março de 2014, Sr. Ministro da Defesa Nacional, Dr. José Pedro Aguiar Branco, pág. 6.
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Diga-se que, na auditoria que foi feita na época, foi considerado que era excessiva a resolução do contrato
para aquilo que era a matéria que estava em causa. A verdade é que houve um tribunal arbitral; a verdade
é que foi feito, no âmbito desse tribunal arbitral, um acordo pelo qual os Estaleiros Navais de Viana do
Castelo tiveram de ficar com o navio e devolver aos Açores cerca de 40 milhões de euros, dos quais 32
milhões de euros foram logo pagos por intermédio de um empréstimo que uma empresa que estava
naquelas condições de fragilidade económica não deixou de conseguir por via do aval dado pela
EMPORDEF. Esse empréstimo foi obtido para não ser utilizado na atividade da empresa, mas, sim, para
devolver 32 milhões de euros aos Açores.
Como também tem sido aqui dito, significa que essa foi, digamos, uma «machadada final» para
aniquilar a capacidade de os Estaleiros poderem prosseguir a sua atividade.Nós tentámos, ainda no
âmbito do nosso Governo, fazer um acordo com os Açores, no sentido de esse navio ser utilizado para
aquilo a que se destinava no transporte entre ilhas, mas, infelizmente, verificámos que pelo lado dos
Açores sempre houve um total obstáculo a fazer qualquer espécie de acordo.67
E ainda sobre esta matéria, responde o Sr. Ministro da Defesa Nacional, Dr. José Pedro Aguiar Branco, ao
Sr. Deputado António Filipe:
“(…) Quanto ao navio Atlântida, enviámos para a Procuradoria-Geral da República toda a documentação,
porque para nós é uma situação realmente inadmissível. Como é que é possível não se ter feito um acordo
que acautelasse os interesses dos Estaleiros? Como é que foi possível arranjar para uma empresa que estava
sem financiamento cerca de 32 milhões de euros, para devolver aos Açores, naquela altura, matéria, aliás,
considerada ajuda de Estado ilegal por parte da Direção-Geral da Concorrência Europeia?
Portanto, esta é uma história que espero que a Procuradoria-Geral da República venha a esclarecer.”68
Sobre o processo de venda do Atlântida, pergunta ao Sr. Ministro da Defesa Nacional, Dr. José Pedro
Aguiar Branco, a Sr.ª Deputada Mariana Aiveca:
“(…) A terceira pergunta, também de uma forma rápida e direta, é sobre o Atlântida. Qual é o preço base?
Sabemos que o Atlântida está à venda, que a Administração dos Estaleiros Navais nos diz que terá em
consideração as três melhores propostas e se reserva a possibilidade de não aceitar propostas que não
considere vantajosas, mas tudo isto é muito vago. Sabemos também que, tendo em conta o relatório e contas
dos Estaleiros Navais de Viana do Castelo de 2012, a avaliação é de 29 milhões de euros. Portanto, Sr.
Ministro, o que lhe pergunto é qual é o preço base do Atlântida para esta venda e como é que esta situação
vai contribuir, também, ou não, para o desafogo financeiro dos Estaleiros Navais de Viana do Castelo?”69
Resposta do Sr. Ministro da Defesa Nacional, Dr. José Pedro Aguiar Branco:
“(…) Quanto ao preço, o Atlântida não tem preço base. Também é uma exigência da Direção-Geral de
Concorrência Europeia que, quando se faz uma venda de ativos tendo em vista obter os meios para ajudar a
amortecer o passivo da empresa, estes sejam colocados em concurso público sem preço de base
referenciado. Depois, há a avaliação que a Sr.ª Deputada referiu, sendo que o júri é presidido por um membro
da Inspeção-Geral de Finanças, precisamente para acautelar quer as questões de natureza financeira e fiscal,
quer também as jurídicas.
Sr.ª Deputada, convenhamos que temos ali um ativo em relação ao qual, dado o tempo que está a decorrer
e a situação que tem acontecido, temos de ser bem pragmáticos e cuidadosos naquilo que consideramos ser
bom ou mau. Pior será que, com o andar dos tempos, não se faça nada, como aconteceu no passado, e
67
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 11 de março de 2014, Sr. Ministro da Defesa Nacional, Dr. José Pedro Aguiar Branco, págs. 12-
13. 68
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 11 de março de 2014, Sr. Ministro da Defesa Nacional, Dr. José Pedro Aguiar Branco, págs. 29-
30. 69
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 11 de março de 2014, Sr. Ministro da Defesa Nacional, Dr. José Pedro Aguiar Branco, pág. 58.
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acabemos por ter algo que caminhará para a sua autodestruição e não se consiga — sempre em busca da
solução ótima —nem sequer a boa, nem sequer a sofrível.”70
Sobre a temática do Atlântida, na 2.ª audição, refere o Presidente do Conselho de Administração da
EMPORDEF, Sr. Dr. Rui Jorge de Carvalho Vicente Ferreira, na sua exposição inicial:
“(…) Um dos fatores que aqui vimos que degradou os capitais próprios negativos para valores, digamos,
impossíveis, em termos de remuneração do financiamento, foi o Atlântida. Que consequências é que teve?
Enfim, existe matriz, e nós ou a Administração dos Estaleiros podemos facultar, dos factos mais relevantes na
história da empresa, e isso já tem sido, muitas vezes, comentado. Mas quais foram as consequências? O
custo do Atlântida está cifrado hoje em cerca de 58 milhões; o do Anticiclone em 15,5 milhões. O aumento do
endividamento perante o acionista, de que falámos há pouco, dos tais 32 milhões, que tem juros anuais de 2,5
milhões (e não foi de 37 milhões, que foi aquilo em que a EMPORDEF se endividou, porque houve 5 milhões,
como se recordam, que foram devolvidos ao Tesouro e mais 5 milhões que a empresa cobrou das construções
militares, no total de 10 milhões, no final do ano). Portanto, na realidade, o endividamento do acionista,
relativamente ao Atlântida e ao Anticiclone, é de 32 milhões.
O custo anual da imobilização situa-se em 1 milhão de euros, com toda a degradação técnica e de
manutenção, digamos, que é necessário combater. Há, no entanto, um dano imparável, que é a perda de
validade dos certificados de garantia dos diferentes equipamentos, ou seja, dos motores, dos sistemas de
propulsão, enfim, de toda a parte elétrica nestes anos, o que é dramático em termos de colocação no
mercado.
Os custos de imagem da recusa destes dois navios foram inquantificáveis, numa primeira fase, junto do
mercado internacional, em termos de prestígio dos próprios Estaleiros, e, depois, junto da banca.
A degradação do valor no mercado deste navio é enorme, porque o valor do Anticiclone é sucata, ou seja,
para este, não há solução que não seja a da venda como sucata (slide 12).
Outra consequência do acordo que foi estabelecido, de devolução e recusa da Atlânticoline dos dois
navios, foi o pagamento dos 40 milhões que referi há bocado: 32 milhões foram pagos na altura e 8 milhões
ficaram a dever-se, de que, até à data, se pagaram, em pequenas amortizações, por esta ou aquela razão,
cerca de 2 milhões. Mas os juros vão correndo e, portanto, nesta altura, estamos a falar outra vez de cerca de
7,6 milhões de dívida, que a empresa tem de respeitar, porque isso foi sancionado no tribunal arbitral (slide
13).”71
Na 2.ª audição perguntou o Sr. Deputado Afonso Oliveira, ao Sr. Presidente do Conselho de Administração
da Empordef, Dr. Rui Jorge de Carvalho Vicente Ferreira:
“(…) O Sr. Dr. Vicente Ferreira fez a seguinte afirmação na Comissão de Defesa Nacional: «A recusa do
navio Atlântida pelos Açores correspondeu à certidão de óbito dos Estaleiros». Quer explicar porquê nesta
Comissão?”72
Resposta do sr. Dr. Rui Jorge de Carvalho Vicente Ferreira:
“(…) Para além do impacto de setenta e tal milhões de prejuízo potencial, pelo menos instantaneamente
imobilização financeira, mais o serviço da dívida que daí decorria e todos os problemas técnicos de
degradação, pelo menos, do Atlântida, para além da perda do Anticiclone, eu diria que, ao nível da reputação
para os Estaleiros, foi a certidão de óbito. Muito pior do que os valores de perda foram os valores de imagem.
Definitivamente, os Estaleiros nunca mais conseguiram equilibrar a sua fórmula de gestão do que lhe
faltava fazer, e naquela altura eram essencialmente construções militares e passados uns meses passou a ter
o contrato dos navios asfalteiros, que é muito relevante na vida da empresa e da responsabilidade do Estado
português e da EMPORDEF. A partir dessa altura, não conseguiu desenvolver a conclusão rápida e em prazo
70
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 11 de março de 2014, Sr. Ministro da Defesa Nacional, Dr. José Pedro Aguiar Branco, pág. 60. 71
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 13 de março de 2014, Presidente do Conselho de Administração da EMPORDEF, Sr. Dr. Rui
Jorge de Carvalho Vicente Ferreira, págs. 10-11. 72
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 13 de março de 2014, Presidente do Conselho de Administração da EMPORDEF, Sr. Dr. Rui
Jorge de Carvalho Vicente Ferreira, pág. 22.
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dos NPO, não conseguiu arrancar com a construção dos NCP, não conseguiu realizar o projeto das lanchas.
Há diferentes razões, mas a financeira foi também violentíssima. Apesar de ter adiantamentos que eram
superiores aos valores dos contratos em qualquer destas construções — e o mesmo se veio a repetir em
relação aos navios asfalteiros —, os Estaleiros não tiveram condições internas orgânicas para cumprir esses
contratos.”73
Perguntou ainda o Sr. Deputado Afonso Oliveira, ao Sr. Dr. Rui Jorge de Carvalho Vicente Ferreira:
“(…) Chegaram, ontem, a esta Comissão Parlamentar de Inquérito, enviados pela EMPORDEF, dois
pareceres sobre a questão que opõe os Estaleiros Navais à Atlânticoline a propósito do fornecimento do navio
Atlântida, um deles elaborado pelo Sr. Dr. António Pinto Monteiro e o outro pelo Sr. Dr. Menezes Cordeiro.
Pode dizer-nos quais foram as principais conclusões desses pareceres e o que é que os mesmos
representaram nesse período?”74
Resposta do Sr. Dr. Rui Jorge de Carvalho Vicente Ferreira:
“(…) Sr. Deputado, esses pareceres datam do último trimestre de 2009, ou seja, estamos a falar de um
período relativamente remoto para mim, mas vou tentar interpretá-los, dado que foi importante perceber qual o
parecer, qual a mensagem que esses juristas catedráticos tinham passado à empresa, eu diria até como
orientação estratégica ao conselho de administração.
Eles comentam que a medida é, de facto, inusitada, é desproporcionada. Ou seja, a atuação da
Atlânticoline, e a atitude de recusa dos navios, é desproporcionada face às responsabilidades que cada
uma das partes tem. Esta é a primeira grande conclusão.
A segunda conclusão é que esses juristas recomendam que haja uma reanálise, uma discussão, o
que, para mim, não é mais do que a recomendação para, não sendo isso possível, litigar.
A terceira conclusão é a de que há sempre a hipótese de fazer funcionar o mercado, e que é o hábito
internacional, ou seja, é haver alguma condescendência no preço para que os navios sejam entregues e para
que o Anticiclone seja construído.
Portanto, são estas as recomendações que percebo.
No que se refere àquilo que o acordo representou, um dos elementos que me cria mais reserva é o facto de
esse acordo, no meu entender e por aquilo li — admito que não tenha lido tudo —, estar em contradição com
os pareceres que os Professores catedráticos Pinto Monteiro e Menezes Cordeiro emitiram. Não entendo o
acordo arbitral, que, no meu entendimento, foi a capitulação dos Estaleiros face ao armador, aceitando
praticamente todas as condições que lhe eram exigidas. Não entendo. Acho que há uma contradição que não
consigo explicar.
(…)
Já agora, permitam-me referir que, para além desses pareceres, existem as avaliações — que trouxe
comigo, na dúvida sobre se existiriam na Comissão, ou não — que resultaram de uma inspeção da Inspeção-
Geral de Finanças, e cuja leitura recomendo, a qual chega à mesma conclusão, ou seja, que são inexplicáveis
os termos do acordo. Eu tenho as maiores reservas.”75
O Sr. Presidente do Conselho de Administração da Empordef, Dr. Rui Jorge de Carvalho Vicente Ferreira,
esclareceu também o Sr. Deputado Afonso Oliveira, sobre a fiscalização da obra do ferry boat Atlântida:
“(…) Vou só referir um exemplo do historial do Atlântida e do Anticiclone. Numa construção nova, o
armador tem sempre uma equipa de fiscalização, como existe em qualquer obra pública. A equipa de
fiscalização apareceu nos Estaleiros sete meses depois de a construção começar. Basta este dado para se
perceber que a envolvência do armador no processo surge muito tardiamente.
73
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 13 de março de 2014, Presidente do Conselho de Administração da EMPORDEF, Sr. Dr. Rui
Jorge de Carvalho Vicente Ferreira, págs. 22-23. 74
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 13 de março de 2014, Presidente do Conselho de Administração da EMPORDEF, Sr. Dr. Rui
Jorge de Carvalho Vicente Ferreira, págs. 23-24. 75
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 13 de março de 2014, Presidente do Conselho de Administração da EMPORDEF, Sr. Dr. Rui
Jorge de Carvalho Vicente Ferreira, págs. 23-25, sublinhado do relator.
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Nessa altura, já os Estaleiros tinham encontrado graves dificuldades na concretização do anteprojeto —
estou a referir aquilo que li no histórico da evolução do processo —, já tinham feito testes com o Gabinete de
Projeto em laboratórios internacionais, neste caso russos, que mostravam deficiências no projeto que
obrigaram a reformulá-lo e que alteravam definitivamente, ou o comprimento, ou a tonelagem, ou o calado dos
navios.
Tudo isto pode ser documentado à Comissão, todas as alterações técnicas que foram feitas decorrentes
desse anteprojeto, o qual fazia parte, na realidade, do caderno de encargos, portanto, era uma especificação
que tinha de ser realizada e que não tinha viabilidade, ou seja, havia graves deficiência nesse projeto.
Só estes primeiros meses documentam a dita inexistência de colaboração e, para mim, representam
essencialmente um défice de partilha de responsabilidade. A partir dessa altura, tudo o que acontecesse em
termos de alterações dos navios, e foram imensas, inevitavelmente conduziria a uma partilha de
responsabilidade. Os pareceres apontam exatamente nesse sentido.”76
O Sr Dr. Rui Jorge de Carvalho Vicente Ferreira, esclareceu ainda o Sr. Deputado Jorge Fão, no que toca
ao apuramento e responsabilidades neste caso do Atlântida:
“(…) Relativamente à atividade de umas empresas, há entidades reguladoras, entidades auditoras e
entidades de supervisão. Não compete a uma administração que chega, na minha perspetiva, admito que
possa haver outras, andar a julgar os atos anteriores e muito menos a questioná-los.
No entanto, dada a relevância deste dossier, a EMPORDEF fez uma exposição à Procuradoria-Geral da
República no sentido de juntar factos, todos eles componentes completamente públicas, como é o caso deste
documento que há pouco entreguei da Inspeção-Geral de Finanças sobre o tema, as auditorias do Tribunal de
Contas, que foram duas, à Atlânticoline e, enfim, mais alguns conjuntos de documentos existentes. Juntando
todos esses elementos, considerámos que era útil, perante a Procuradoria, fazer uma sequência e dar alguma
consistência para a compreensão, dado que nos revíamos nas posições de alguns dos documentos,
nomeadamente o da Inspeção-Geral de Finanças.
Portanto, entregámos a exposição, aguardamos que essa autoridade nos dê continuidade e esperamos
que tire conclusões.”77
Sobre esta questão, pergunta mais à frente o Sr. Deputado Rui Paulo Figueiredo:
“(…) O Sr. Doutor referiu a falta de colaboração do cliente, da empresa dos Açores.
Gostava que aprofundasse um bocadinho mais essa falta de colaboração neste caso específico.”78
Resposta do Sr. Dr. Rui Jorge de Carvalho Vicente Ferreira:
“(…) Referi um exemplo da dificuldade que o armador teve em colocar no terreno, logo desde o início, a
equipa de fiscalização da obra.
Também houve dificuldades ao nível do anteprojeto, para que ele passasse o teste laboratorial, e, portanto,
houve elementos desse projeto que tiveram de ser modificados profundamente. Deduzo que, a partir dessa
altura, porque estamos a falar do anteprojeto, muitas das modificações operadas — houve alterações da
tonelagem dos navios e, no que respeita ao Anticiclone, teve de alterar-se até o comprimento, salvo erro —
fizeram com que as características dos navios mudassem profundamente. Se mudaram e se, para ter
estabilidade, tiveram de aumentar o lastro do Atlântida… É a mesma coisa que acontece neste caso: eu ando
a pé a uma determinada velocidade; se me puserem em cima 50 kg de batatas, vou andar muito mais
devagar!
Para mim, foi isso que aconteceu no Atlântida, ou seja, para responder às necessidades de
navegabilidade e às condições técnicas de segurança requeridas, os Estaleiros tiveram de provocar
76
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 13 de março de 2014, Presidente do Conselho de Administração da EMPORDEF, Sr. Dr. Rui
Jorge de Carvalho Vicente Ferreira, págs. 25-26. 77
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 13 de março de 2014, Presidente do Conselho de Administração da EMPORDEF, Sr. Dr. Rui
Jorge de Carvalho Vicente Ferreira, págs. 43-44. 78
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 13 de março de 2014, Presidente do Conselho de Administração da EMPORDEF, Sr. Dr. Rui
Jorge de Carvalho Vicente Ferreira, pág. 97.
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modificações, colocaram toneladas e toneladas de lastro no navio. Como é evidente, o navio foi mais
para o fundo e passou a andar mais devagar, porque estava mais enterrado dentro de água. Isto é
básico, não é preciso ser engenheiro naval para perceber! Até deixo estas questões para a
administração dos Estaleiros.
Portanto, estávamos numa circunstância em que estas multitudes de modificações levaram a uma
responsabilidade partilhada. No mínimo, partilhada! Daí, na minha opinião, todo o processo,
principalmente a atitude que a Atlânticoline teve de recusa dos navios, não tem qualquer sentido de equilíbrio
ou de cooperação, a que o armador estava obrigado, como diz o Professor Pinto Monteiro ou o Professor
Menezes Cordeiro no seu parecer. Não tem! Há um dimensionamento muito desequilibrado entre a solução
que a Atlânticoline queria e a sua responsabilidade no projeto.”79
Na audição com a Comissão de Trabalhadores dos Estaleiros Navais de Viana do Castelo, com os Srs.
António Costa e Abel Viana, coordenador e representante da referida Comissão, também responderam sobre
o ferry-boat Atlântida, ao Sr. Deputado Abel Baptista:
“(…) Sr. Deputado, relativamente à questão que colocou em termos de inspeção ou, como queira chamar,
do acompanhamento em termos de fiscalização na construção naval, o armador coloca lá um fiscal, que é o
fiscal dele, depois há uma companhia, que pode ser a Lloyds, que pode ser a GL ou outras empresas, que faz
esse acompanhamento, que são companhias externas, que, em termos de normas de construção naval,
acompanham minuciosamente todo o processo.
O que lhe posso dizer é que comecei a trabalhar nos blocos da Atlânticoline para o navio Atlântida e, desde
a primeira hora, começámos a introduzir alterações. Como saberá, o projeto daquele navio foi concebido num
escritório na Rússia que não tinha credibilidade, ou não tinha o tal ADN suficiente para fazer um projeto
daquele envergadura, e quando aquele projeto chegou aos Estaleiros Navais de Viana do Castelo, e porque
temos um departamento onde fazem umas maquetas, umas miniaturas do navio, e onde se vê se o navio tem
estabilidade ou não, atendendo ao tipo de navio que era, atendendo à sua conceção, atendendo ao tipo de
trabalho que iria fazer e à tonelagem de aço que tinha, o nosso técnico, com 41 anos de empresa, disse à
administração da altura que aqueles navios não tinham estabilidade suficiente e alertou, mais do que uma vez,
para essa situação, penso eu, produzindo o seu relatório e entregando-o à administração.
A administração perante esses factos, é óbvio — penso eu, não tive acesso a essa documentação —, disse
ao armador o que se passava e foram introduzidas gradualmente todas as alterações que o nosso
departamento de projeto achou por bem introduzir em acordo — volto a referi-lo — e em consonância com o
fiscal da Atlânticoline e, provavelmente, com o armador.
O que está aqui em causa, Sr. Deputado, e acho que já fui muito claro relativamente a este processo da
Atlânticoline, é que só por capricho próprio… É que as mesmas pessoas que estavam na altura a governar o
Governo dos Açores… E aqui é que acho que há o esbanjar de dinheiros públicos.
(…)
E digo-lhe, muito sinceramente: o que lamento é que a administração, naquela altura, tenha entrado em
acordo no tribunal arbitral para resolver aquela situação da forma como a resolveu, porque deveriam deixar
isto correr em tribunal. Todos nós erramos, mas, provavelmente, a nossa empresa, hoje, não estaria na
situação em que está se, efetivamente, na altura própria, as pessoas tivessem dado um murro na mesa.”80
O Sr. Prof. Augusto Santos Silva ex Ministro da Defesa Nacional, entre outubro 2009 e junho de 2011, na
sua audição, respondeu ao Sr. Deputado António Filipe, sobre o Atlântida.
Pergunta do Sr. Deputado António Filipe:
“(…) A questão do Atlântida é, de facto, a magna questão que o trouxe a esta Comissão de Inquérito. Já foi
aqui considerado, não pela administração, que ainda não veio aqui, mas pelo Presidente da EMPORDEF, que
o caso Atlântida foi a machadada final nos Estaleiros e este processo suscita-me muitas dúvidas.
79
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 13 de março de 2014, Presidente do Conselho de Administração da EMPORDEF, Sr. Dr. Rui
Jorge de Carvalho Vicente Ferreira, págs. 97-98, sublinhado do relator. 80
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 26 de março de 2014, coordenador e representante da Comissão de Trabalhadores de Viana do
Castelo, Srs. António Costa e Abel Viana, págs. 59-61.
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Fomos informados de que a empresa possuía pareceres jurídicos que retiram razão à solução dada, ou
seja, com base naqueles pareceres jurídicos, a empresa nunca devia ter aceitado o acordo que aceitou.
Mas a questão que se coloca é esta: tínhamos, de um lado, uma empresa estratégica, que são os
Estaleiros Navais de Viana do Castelo, tínhamos, do outro lado, uma empresa na dependência ou sob a
superintendência da Região Autónoma dos Açores, do Governo Regional dos Açores, ou seja, tínhamos duas
entidades públicas, duas entidades com grande relevância pública.
A questão que se me coloca é a de saber se nunca se conversou sobre este assunto, não numa perspetiva
conflitual — de um lado, os interesses do Governo Regional dos Açores, do outro, os interesses dos Estaleiros
de Viana do Castelo —, mas numa perspetiva de concertação, que pudesse conciliar os interesses de ambas
as partes. Se houve alguma conversa dessas, nós não o sabemos.
O Governo não considerou que, perante as consequências catastróficas que este processo poderia ter para
os Estaleiros Navais de Viana do Castelo, se procurasse encontrar, com o Governo Regional dos Açores, uma
perspetiva de resolução amigável deste assunto? Ou seja, aquela questão da velocidade era assim tão
decisiva que implicasse uma denúncia do contrato, por parte da Atlânticoline? Para já, há algumas dúvidas
sobre os tais testes de velocidade, que tornam até incompreensível que os advogados, os representantes dos
Estaleiros Navais de Viana do Castelo, pudessem ter aceitado aquele acordo no âmbito do tribunal arbitral —
já foi aqui questionada essa posição —, mas, de facto, a questão que se nos coloca é a de saber se o
Governo, na altura, que até teria um diálogo fácil com o Governo Regional dos Açores (pelo menos, em
princípio), não equacionou a hipótese, tendo em conta as consequências para os Estaleiros, de procurar
encontrar uma solução que não fosse tão catastrófica, se isso lesaria, de forma assim tão grave, os interesses
da Região Autónoma dos Açores, que, pelos vistos, até está a alugar, de uma forma muito dispendiosa, o
serviço que poderia ser feito precisamente pelo Atlântida.
Uma última questão, relacionada com esta, é a seguinte: bom, então, se houve um incumprimento, por
parte da empresa, que teve consequências gravíssimas, pergunto se não foram apuradas responsabilidades.
É possível que isto aconteça assim? Por facto imputável à empresa, porque, de outra maneira, ela não seria
sancionada como foi, por facto que é da responsabilidade da empresa foi dada uma machadada final. Bom,
então, e fica tudo na mesma? Não há administrações que sejam responsabilizadas? Não se procurou apurar
por que é que isto aconteceu? É que isto não pode acontecer! Não é possível que o Estado português admita
que os contribuintes portugueses tenham de suportar situações como esta, em que uma empresa sofre
consequências que podem ter levado ao seu desmantelamento a prazo e não aconteça nada, fiquemos assim.
Portanto, pergunto se isto não foi uma preocupação para o Governo de que fez parte.”81
Resposta do Sr. Prof. Augusto Santos Silva:
“(…) Quanto à questão do Atlântida, é muito interessante que o Sr. Deputado António Filipe, por duas
vezes, a tenha considerado como a questão magna do meu mandato. É muito interessante! Não posso dizer
absolutamente nada ao Sr. Deputado sobre o processo de construção do Atlântida — o contrato, os termos do
contrato, incluindo aquela cláusula contratual que permite denunciar ou cancelar o contrato, podendo pedir
indemnização, por causa da diferença de um nó de velocidade —, não posso pronunciar-me sobre isso,
porque não estava na EMPORDEF em 2006. Posso pronunciar-me, e foi sobre isso que me pronunciei, sobre
a conclusão dessa questão através de um acordo extrajudicial.
Se falei com o Governo Regional dos Açores, a propósito do processo de construção do Atlântida, já
respondi ao Sr. Deputado Abel Baptista: não e seria uma enormidade se o fizesse! O que é que o Ministro dos
Assuntos Parlamentares tinha a ver com isso? Certamente, houve contactos, mas, sobretudo, entre as
empresas.
(…)
Mas, pela minha parte, nunca agi, no exercício das funções públicas, por critérios de maior proximidade ou
de maior facilidade, fosse relativamente a quem fosse. Aliás, julgo que um membro do Governo que proceda
assim não merece ser membro do Governo.
81
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 1 de abril de 2014, Ministro da Defesa Nacional do XVIII Governo Constitucional, Sr. Prof. Augusto
Santos Silva, págs. 74-76.
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O Governo Regional dos Açores tinha por obrigação defender o interesse público dos Açores e o Governo
da República tem a obrigação de defender o interesse da República. E as empresas públicas — empresas,
porque o contrato não foi estabelecido entre Governos — tinham ambas a obrigação, de, primeiro, ter
trabalhado conjuntamente de forma a que o navio tivesse sido construído em condições e, segundo, resolver o
litígio. Foi, aliás, essa orientação que o XVII Governo deu à empresa que estava sob sua tutela.
Agora, se me pede outra vez uma avaliação política, eu sei fazer essa avaliação política. Evidentemente
que sei que uma situação política em que há um Governo e o principal partido da oposição usa um contrato
como a pedra de toque para o ataque ao Governo, é uma situação política que, nos seus termos, não torna
esse diálogo fácil.
(…)
Agora, o acordo não é um acordo decidido pelo tribunal arbitral. Foi constituído um tribunal arbitral e, como
estava constituído um tribunal arbitral, o acordo entre as partes teve de ser submetido a homologação do
tribunal arbitral, que fez uma homologação formal, como lhe competia, dizendo algo do género: não
verificámos aqui nenhuma ilegalidade e, portanto, homologamos o acordo.
E chamo a atenção para que a lógica do acordo, os termos do acordo são estes: os Estaleiros devolveram
as verbas que tinham sido adiantadas. Repito, nos termos do acordo, os Estaleiros devolveram as verbas que
tinham sido adiantadas, isto é, 32 milhões de euros (isto, em número redondos, mas, depois, se houver mais
algum episódio parlamentar, poderei dar os números certos) relativos ao Atlântida e 7 milhões de euros
relativos ao Anticiclone — é que o Atlântida era o protótipo e, a partir daí, o processo era replicável.
Os Estaleiros ficaram com a disponibilidade plena do navio construído e do navio em construção. A
expectativa dos Estaleiros, tal como comunicada ao Tesouro, é que a de havia interessados no Atlântida
(aliás, já tinham visitado o Atlântida). A venda não era concretizável no imediato e daí ser preciso contrair o
empréstimo, e daí ser preciso a autorização do acionista para a contração desse empréstimo.
O armador renunciava aos direitos contratuais, incluindo a execução da garantia bancária…”82
O Sr. Dr. Fernando Geraldes, Presidente do Conselho de Administração dos ENVC, entre abril de 2004 e
março de 2007, ouvido na CPI, falou sobre o Atlântida, em resposta ao Sr. Deputado Rui Paulo Figueiredo:
“(…) Quanto ao contrato, acho que a pessoa mais indicada para responder, porque ele tinha a área
financeira e a área comercial (foi o pelouro que lhe foi distribuído, na altura, pela EMPORDEF), era um colega
meu que estava na administração, o Adriano Telles de Menezes, e que se encarregou basicamente da
negociação desse contrato dos Açores. Tenho a ideia de que ele nunca chegou a levar esse contrato a
conselho de administração, quando eu estava lá, porque dizia que havia umas alterações. Penso que até o
levou posteriormente a conselho de administração, mas eu já não estava lá.”83
Consubstanciado pela resposta dada ao Sr. Deputado Abel Baptista:
“(…) Quem tinha o pelouro da área comercial era o meu colega de administração, o Adriano. Ele teve um
mandato porque eram precisas duas assinaturas para que se pudesse fechar contrato com essa empresa dos
Açores.
Depois de o meu colega ter fechado o contrato, eu disse-lhe: «Eh pá, traz o contrato ao conselho de
administração» e ele respondeu «Eu trago o contrato, mas como há várias alterações que vão ser efetuadas,
levo tudo no fim». E eu disse: «Muito bem, não tem problema absolutamente nenhum». Mas, tanto quanto me
lembro, ele não o levou, pelo menos até março — eu saí em março —, a conselho de administração, aliás, não
só o contrato, como as alterações que foram efetuadas com a entidade dos Açores.”84
82
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 1 de abril de 2014, Ministro da Defesa Nacional do XVIII Governo Constitucional, Sr. Prof. Augusto
Santos Silva, págs. 80-83. 83
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 29 de abril de 2014, Presidente do Conselho de Administração da ENVC de 2004 a 2007, Sr. Dr.
Manuel Fernando Geraldes, pág. 23. 84
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 29 de abril de 2014, Presidente do Conselho de Administração da ENVC de 2004 a 2007, Sr. Dr.
Manuel Fernando Geraldes, pág. 34.
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Relativamente ao acordo arbitral, o Sr. Dr. Fernando Geraldes, afirma em resposta ao Sr. Deputado Abel
Baptista:
“(…) Não percebo mesmo como é que neste caso de que me falou, o dos Açores, se pagam 40 milhões de
euros. Pergunto honestamente e por curiosidade minha: existia alguma garantia bancária? Uma first demand
que obrigava a que o armador pudesse pôr no banco e o banco pagava? É que não sei, não percebo como é
que se paga 30 ou 40 milhões sem — passe a expressão, porque não sou especialista em Direito — litigar. É
que há formas de desvalorizar o navio. Qual era o incómodo da velocidade? Era porque perdia 10 minutos?
Quanto é que isso desvalorizava em termos de tempo, 5, 8, 15 minutos? Qual era o tempo? Quanto é que o
armador perdia se a embarcação chegasse atrasada 5 minutos à ilha do Pico? Perdia quanto? Isso é
mensurável e há entidades que o fazem.
Portanto, se isso é mensurado e identificado, por que é que, obviamente discordando, não se litigou?
Podia-se ter litigado.
Sr. Deputado, para lhe responder, não sei se foi a «machadada final». Honestamente, não sei se foi… Mas
40 milhões numa empresa daquelas que era deficitária… Honestamente, não sei se foi a «machadada final»,
não sei mesmo se foi!… Mas, digo-lhe uma coisa: bem não fez!
O Sr. Abel Baptista (CDS-PP): — Sr. Doutor, só para corrigir, não são 40 milhões no caso do Atlântida e do
Anticiclone mas, sim, um total de 70,811 milhões de euros. São 56,234 milhões no caso do Atlântida e 14,577
milhões no caso do Anticiclone.”85
Ainda sobre a assinatura do contrato do Atlântida e a sua aprovação em Conselho de Administração, o Sr.
Eng.º Arnaldo Figueiroa Machado, Presidente do Conselho de Administração dos ENVC, entre abril de 2007 e
dezembro de 2008, esclareceu o Sr. Deputado Carlos Abreu Amorim:
“(…) O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — Muito obrigado, Sr.ª Presidente.
Sr. Engenheiro, estive a ouvir com muita atenção o que disse aos meus colegas que o interpelaram
anteriormente e queria começar por falar do navio Atlântida.
O contrato do navio Atlântida foi aprovado em conselho de administração presidido pelo Sr. Engenheiro…
O Sr. Eng.º Arnaldo Pedro Figueirôa Navarro Machado: — Não.
O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — Então?
O Sr. Eng.º Arnaldo Pedro Figueirôa Navarro Machado: — Eu entrei em abril de 2007 e o contrato do navio
Atlântida foi assinado em setembro de 2006.
O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — Foi assinado, mas foi assinado, segundo julgamos saber, por um
administrador que tinha plenos poderes para isso, de seu nome Adriano Telles de Menezes, mas não foi
levado, nessa data nem durante o mandato do anterior conselho de administração, a conselho de
administração.
Portanto, agora, a pergunta é quase outra no seguimento da sua resposta: qual foi o conselho de
administração que aprovou o contrato do navio Atlântida?
O Sr. Eng.º Arnaldo Pedro Figueirôa Navarro Machado: — O Sr. Deputado faz-me uma pergunta horrível.
Não faço ideia!… Eu não tenho nenhuma noção de ter aprovado esse contrato, portanto deve ter sido no
mandato anterior, imagino eu…”86
E ainda sobre o Atlântida:
“(…) O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — Muito bem.
Durante o mandato do conselho de administração a que V. Ex.ª presidiu, tem conhecimento de terem sido
feitas alterações – e já aqui descreveu com muita minúcia o facto da necessidade de se ter de encomendar a
projetistas russos todo o desenho do navio Atlântida, porque não havia possibilidade de o fazer nos Estaleiros,
porque estavam com as mãos cheias, digamos assim.
85
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 29 de abril de 2014, Presidente do Conselho de Administração da ENVC de 2004 a 2007, Sr. Dr.
Manuel Fernando Geraldes, pág. 36. 86
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 29 de abril de 2014, Presidente do Conselho de Administração dos ENVC no período de 2007 a
2009, Sr. Eng.º Arnaldo Pedro Figueirôa Navarro Machado, págs. 31-32.
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Esse projeto nunca foi alterado a pedido da Atlânticoline durante o tempo em que presidiu ao conselho de
administração?
O Sr. Eng.º Arnaldo Pedro Figueirôa Navarro Machado: — Sr. Deputado, penso que as grandes alterações
feitas a pedido da Atlânticoline foram feitas em aditamentos anteriores à minha chegada. Este navio tem uma
coisa um bocadinho estranha e penso que o que foi assinado foram duas minutas, duas especificações: uma
que foi anexa ao contrato e outra que foi aberta uns meses depois, mas que tinha sido acordada anteriormente
já na altura da assinatura do contrato.
O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — Mas que não era do conhecimento do conselho de administração
quando o contrato foi iniciado? A segunda parte de que me está a falar era secreta?
O Sr. Eng.º Arnaldo Pedro Figueirôa Navarro Machado: — Acho que não era secreta, mas era…
O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): —Era, pelo menos, estranha…
(…)
O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — Daquilo que é a sua memória dos acontecimentos, e de todos os
problemas que existiram durante a construção do navio Atlântida, tem consciência se essas alterações tiveram
relevância em relação ao resultado final que todos conhecemos?
O Sr. Eng.º Arnaldo Pedro Figueirôa Navarro Machado: — Julgo que sim e aqui vem a segunda parte
daquilo que eu disse há bocado.
Penso que o prazo de entrega muito curto levou a que as pessoas não tivessem tempo para tomar
decisões que não fossem ultra rápidas e os resultados do tanque de testes de kyrlov que levavam à situação
de haver uma folga muito razoável na velocidade do navio levaram a que as pessoas tomassem algumas
decisões…
Vou dar-lhe uma decisão que, provavelmente, terá sido a mais marcante de todas: a troca dos motores
principais que eram para ter 3400 kw cada um e foram comprados com 3000 kw cada um e porquê? Porque
não havia no mercado, nessa altura, motores com 3400 kw com um prazo de entrega que servisse ao navio.
Como havia no mercado um motor mais pequeno que servia o navio e como, aparentemente, havia muita folga
na velocidade do navio, tomaram a decisão de baixar a potência dos motores.
O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — Mas essa decisão é anterior à sua entrada nos Estaleiros ou é
ulterior?
O Sr. Eng.º Arnaldo Pedro Figueirôa Navarro Machado: — É anterior.
O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — Essa da compra do motor do navio?
O Sr. Eng.º Arnaldo Pedro Figueirôa Navarro Machado: — Sim, sim, é anterior.
A conjugação destes dois factos, de não haver tempo para nada e haver folga teórica na velocidade, levou
a que as pessoas tomassem decisões que pareciam ser exequíveis e depois não eram.
O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — Gostaria de chamar a atenção da Sr.ª Presidente, para que ficasse
registado em ata, que existe uma contradição factual, não direi insanável como agora está na moda, entre os
depoimentos do Sr. Eng.º Figueirôa Machado e do Dr. Fernando Geraldes, que ouvimos na parte da manhã,
em relação ao contrato do navio Atlântida.”87
O Sr. Dr. António Jorge Garcia Rolo, Presidente do Conselho de Administração dos ENVC, no período de
2009 a 2010, esclarece o Sr. Deputado Abel Baptista sobre o Atlântida:
“O Sr. Abel Baptista (CDS-PP): —(…)
Quanto ao navio Atlântida, o Sr. Doutor disse uma frase que desperta ainda mais a minha curiosidade.
Disse que, quando tinha o dossier do navio Atlântida, pensava que era só um problema de atraso.
O atual Presidente da EMPORDEF disse aqui que não compreendia, como gestor, por razões
empresariais, como é que se firma um acordo relativamente ao Atlântida e ao Anticiclone de rescisão do
contrato e de acionamento da garantia, que estava em vigor, de trinta e tal milhões de euros.
87
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 29 de abril de 2014, Presidente do Conselho de Administração dos ENVC no período de 2007 a
2009, Sr. Eng.º Arnaldo Pedro Figueirôa Navarro Machado, págs. 33-37.
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O Sr. Doutor era, na altura, o presidente do conselho de administração da empresa. O que é que se
passou?
O Sr. Dr. António Jorge Garcia Rolo: —(…) este contrato que foi feito não nos deu qualquer margem de
manobra. Quando assumi o cargo de presidente dos Estaleiros Navais de Viana do Castelo tive a
preocupação de pressionar o senhor que fazia os interiores por causa do plano de entrega. Ele entregou-o em
fevereiro. Quando foi das provas de mar, como nós as fazemos em março e o navio teria de ser entregue em
maio, não houve qualquer margem.
Ora, o que é que acontece? Havia uma coisa chamada «garantias bancárias first demand», e isso foi um
cutelo que tivemos em cima do pescoço.
Posso dizer que tenho de agradecer ao meu colega jurista Marco Capitão Ferreira que, muito bem, se
lembrou de levar este assunto das garantias bancárias para a área do direito administrativo. E conseguimos
uma coisa única: uma providência cautelar. Se não tivéssemos conseguido uma providência cautelar, a Caixa
Geral de Depósitos tinha sido obrigada a pagar os 33 milhões das garantias bancárias. Não havia hipótese
nenhuma. O que é que podíamos fazer? Se os Açores tivessem conseguido receber os 33 milhões das
garantias bancárias… Nós não tínhamos nenhum poder de negociação. Nenhum!
O Sr. Deputado pergunta-me: «Mas por que é que fez o acordo?». Conforme se pode ver no mapa, (slide
7), fomos andando de tribunal em tribunal. Começámos em Braga, que disse que, afinal, não era o tribunal
competente, que tinha de ser em Lisboa e chegou a uma certa altura, como podem ver pelo último quadrado
da direita em cima… Peço desculpa, Srs. Deputados, mas não sei se a EMPORDEF entregou o dossier
completo, porque há um dossier completo com todos estes documentos. Para mim, o documento que mais me
complicou a vida foi esse acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, que transferiu o processo para
Ponta Delgada.
Não quero fazer mais comentários, não vou dizer que o juiz de Ponta Delgada seria ou não imparcial.
Mas o nosso poder de negociação junto da Atlânticoline… Se as garantias bancárias tivessem sido pagas
pelo banco, estávamos trucidados, não tínhamos qualquer hipótese. Isso era certo. E nós conseguimos reter.
A partir do momento em que há o despacho conjunto das tutelas, a 12 de agosto, a dizer para tentarmos
fazer um acordo extrajudicial, fomos gerindo esta informação, como também fomos avançando com o tribunal
arbitral.
A certa altura, estava a jogar em três tabuleiros, três, para saber até que ponto é que tinha algum poder
negocial, porque tenho a certeza absoluta de que seria trucidado pela Atlânticoline.
Os Srs. Deputados já tiveram a confirmação de que era impossível cumprir o prazo, que não se ligou…
Aliás, está no relatório do técnico, como no relatório do Almirante Cabrita, como no relatório da Inspeção-Geral
de Defesa Nacional que houve situações que podiam ter sido ultrapassadas e não foram. As pessoas
pensavam que se ia resolver o assunto, mas, infelizmente, no momento de ir às provas de mar, tendo em
conta que o prazo de entrega era curtíssimo, não foi possível.
Se eu deixasse que o banco pagasse os 33 milhões de garantias bancárias, no dia seguinte perguntava
qual era o meu poder de negociação. Zero! Não tinha nenhum! A sério, não tinha nenhum.
(…)
Se me perguntasse — e é isso que também tenho na minha apresentação — se a Atlânticoline, em algum
caso, ficaria com o navio (essa é que é a questão), diria que, nessa altura, tinha várias propostas, e algumas
com alguma credibilidade, de pessoas que queriam comprar o Atlântida. Se me perguntasse o que é que
decidiria hoje, responderia: «Não sei se iria para o tribunal arbitral», mas não foram essas as orientações que
tive da tutela, como os Srs. Deputados sabem.
Como se pode ver aqui (slide 8), no relatório da Inspeção-Geral de Defesa Nacional, em 28 de abril —
portanto, o «corpo» ainda não tinha arrefecido, ainda estava quente —, já a Atlânticoline tinha cancelado todas
as candidaturas a fundos. Todas! Esta é uma das notícias que tinha.
Portanto, a Atlânticoline havia de fazer todos os possíveis para não ficar com o navio.
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Como também poderão ver (slide 9), no comunicado do dia 21 de abril de 2009 está escrito que a postura
anterior não revestia da «solidez jurídica desejável». Não tenho dúvida: a Atlânticoline, já há uns tempos,
estava muito desejosa que as coisas corressem mal para que não entregássemos o navio.”88
E mais, sobre o Atlântida:
“(…) Aquele navio foi feito à medida! Se me perguntarem a minha opinião, digo que aquele navio foi feito à
medida, foi feito por alguém que idealizou aquele navio. Não sei se se recordam, mas estava prevista uma
lareira no restaurante de luxo. Se me perguntarem se o navio ia viajar de inverno, penso que não. Mas ele foi
feito e alguém — julgo que o Dr. Vasco Cordeiro, mas não posso dizer isso porque que ele nunca mo disse —
terá descoberto que aquele navio não interessava à Atlânticoline.
Alguma vez aquele navio iria transportar 750 passageiros?! Porque aquela velocidade a 85% de carga era
se transportasse 750 passageiros. Não sei se com todos os emigrantes açorianos que viessem cá às Festas
Joaninas — penso que é assim que se chama — encheriam o navio!? Sei que o navio foi feito à medida e que
alguém, bem ou mal… E eu não fui enganado, digamos assim, mas, quando peguei no processo e me
disseram que era um problema de prazo, com certeza que se eu soubesse que tinha havido problemas graves
de velocidade, eles deviam ter sido antecipadamente… E eu julgo que, ainda ontem, o meu colega Eng.º
Navarro Machado ou o Dr. Geraldes perceberam que alguém fez mal o contrato. E, para mim, a cláusula de
«alguma coisa corre mal, pode denunciar e acabou» é uma cláusula muito má, muito má, e ele reconheceu
que o contrato tinha sido muito mal feito.
Eu não tinha outra hipótese, Sr. Deputado.”89
E ainda, oSr. Dr. António Jorge Garcia Rolo, em resposta ao Sr. Deputado Nuno Sá Costa:
“O Sr. Nuno Sá Costa (PSD): — Mas, então, volto a fazer-lhe a pergunta, e o Sr. Doutor vai ter de me
responder.
O Sr. Doutor estava preocupado com a devolução imediata de 37 milhões de euros. Então, por que é que
assinou um acordo que dá a devolução imediata de 40 milhões de euros?
O Sr. Dr. António Jorge Garcia Rolo: — Sr. Deputado, os 40 milhões de euros são 37 milhões de euros dos
adiantamentos e mais 2,7 milhões de euros equivalentes aos juros.
Então, por que é que eu assinei? Eu já disse! Porque tenho um despacho conjunto que me dá orientações
nesse sentido.
O Sr. Nuno Sá Costa (PSD): — Então, foi pressionado pela tutela para assinar?
O Sr. Dr. António Jorge Garcia Rolo: — Eu não fui pressionado. Eu tenho aqui o despacho.
O Sr. Nuno Sá Costa (PSD): — Importa-se de ler o despacho? É muito curto. O Sr. Doutor até o mostrou
num slide (slide 39). E, já agora, diga de quem era o despacho.
O Sr. Dr. António Jorge Garcia Rolo: — O despacho diz: «Estabelecer como orientação que qualquer
eventual solução que envolva uma transação judicial tenha em conta as conclusões da presente Auditoria, não
devendo da mencionada transação resultar perdas adicionais para as entidades do setor empresarial do
Estado». Para mim, como não ultrapassei os juros…
O Sr. Nuno Sá Costa (PSD): — Peço desculpa de o interromper. É esse o despacho que acabou de ler? De
quem é o despacho?
O Sr. Dr. António Jorge Garcia Rolo: —É das duas tutelas, da Defesa e do…
O Sr. Nuno Sá Costa (PSD): — Mas diga-me de quem, por favor.
O Sr. Dr. António Jorge Garcia Rolo: — Do Ministro das Finanças e do Ministro da Defesa Nacional. É um
despacho conjunto de 12 de agosto de 2009.”90
88
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 30 de abril de 2014, Presidente do Conselho de Administração dos ENVC no período de 2009 a
2010, Sr. Dr. António Jorge Garcia Rolo, págs. 16-19. 89
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 30 de abril de 2014, Presidente do Conselho de Administração dos ENVC no período de 2009 a
2010, Sr. Dr. António Jorge Garcia Rolo, págs. 23-24.
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(…)
“O Sr. Nuno Sá Costa (PSD): — Sr. Presidente, mesmo para terminar, podemos concluir que, de facto, isto
foi mesmo a «certidão de óbito» dos Estaleiros e que, ao contrário daquilo que o Sr. Doutor disse há pouco,
não foi um bom negócio.
Faço-lhe uma pergunta muito concreta que tem a ver com o seguinte: o Sr. Doutor disse aqui que não quis
deixar acionar garantias no valor de 37 milhões de euros, sendo certo que tinha uma providência cautelar, que
até tinha ganho, tal como foi decretado pelo tribunal, mas, mesmo tendo ou não argumentação, o Sr. Doutor,
seis meses depois, deixa cair toda esta ideia de que iria litigar contra a Atlânticoline e entrega-lhes 40 milhões.
Para mim, isto está mais do que esclarecido. O que pergunto ao Sr. Doutor, e peço desculpa pela pergunta,
mas gostava que me esclarecesse, é o seguinte: se o Sr. Dr. Rolo fosse o maior acionista da empresa
Estaleiros Navais de Viana do Castelo, se ela fosse sua, o Sr. Doutor assinava um acordo destes?
O Sr. Dr. António Jorge Garcia Rolo: — Se eu assinava um acordo destes? Não tinha era assinado o
acordo que o Sr. Dr. Geraldes assinou uns anos antes nem tinha aceitado fazer um contrato cujo tempo de
construção era impossível de cumprir. Sr. Doutor, esse é que é o problema! O problema não está em eu limpar
a porcaria que os outros fizeram, eles é que assinaram esse contrato. Como é que assinam um contrato em
que o tempo, de 19 meses, era igual ao da entrega dos motores?!”91
O Sr. Contra-Almirante Víctor Gonçalves de Brito, ex-Presidente do Conselho de Administração dos ENVC,
entre julho e setembro de 2010, respondeu ao Sr. Deputado Jorge Fão sobre o Atlântida:
“(…) E, portanto, não foi um problema de construção, foi, de facto, um problema de entrada de
intermediários que traziam projetistas, de envolvência de eventuais acordos particulares, que, depois,
deveriam ser reduzidos a escrito, etc. Portanto, houve um problema contratual! Houve um problema contratual
e, depois, na fase final (como todos sabem, apanhei já a fase em que era preciso vender o Atlântida e também
o Anticiclone), tentámos vender o Anticiclone, como o Dr. Rolo mencionou, alterando-o para navio hidrográfico
e também se tentou vender para Cabo Verde, o que poderia ter sido uma boa solução, mas acabou por não se
realizar.
No caso do Atlântida, assinei, fartei-me de assinar procurações e contratos de intermediação para pessoas
em todo o mundo para intermediarem a venda do navio, mas não aconteceu, infelizmente. Houve,
efetivamente, defeitos no articulado do contrato e, no final, houve aquilo que o Dr. Rolo também referiu e que
eu, inclusivamente, ouvi uma vez a um Comandante da Marinha Mercante: numa determinada altura, as
entidades dos Açores devem ter chegado à conclusão que aquele navio não servia os interesses dos Açores.
Porquê? Porque, como foi referido, apenas na semana das Festas do Senhor Santo Cristo é que aquele navio
conseguia encher. Depois, andar um navio de um sítio para o outro consome, e aquele navio consumia muito.
Aquele sistema, de que o Dr. Rolo também falou, de propulsores azipod, ou propulsão azimutal, é muito bom,
mas tem um rendimento mais baixo.
Portanto, na altura, nos Açores, devem ter começado a chegar à conclusão de que aquele navio não
servia. Não servia porque ia ser muito oneroso de operar, pois ia estar sempre com uma taxa de ocupação
muito baixa, e a prova vai ser os dois navios que foram construídos. Os dois navios que, julgo, vão ser
construídos vão ser mais pequenos do que aquele navio. Portanto, eu também estou convencido de que,
numa determinada altura, os Estaleiros também deram o álibi para as entidades dos Açores se verem livres
daquela situação.
(…)
Aquele navio está fora do mercado. Quer dizer, os ferries, os chamados «row all packs», navios que
transportam pessoas e que são day boats, isto é, que só têm condições para que as pessoas possam estar
durante o dia, não têm condições para os passageiros dormirem. São por exemplo os que fazem a passagem
de Algeciras para Tânger, do País de Gales para a Irlanda, da Suécia para a Dinamarca, etc., Trânsitos
relativamente curtos exigem navios com mais velocidade.
90
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 30 de abril de 2014, Presidente do Conselho de Administração dos ENVC no período de 2009 a
2010, Sr. Dr. António Jorge Garcia Rolo, págs. 78-79. 91
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 30 de abril de 2014, Presidente do Conselho de Administração dos ENVC no período de 2009 a
2010, Sr. Dr. António Jorge Garcia Rolo, págs. 90-91.
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Portanto, este navio, por essa razão, está fora do mercado e, como também foi referido, foi um navio feito
muito de propósito para os portos que iriam ser usados nos Açores, o que significa que todo o aspeto de
aberturas, entradas e saída, etc., não é standard. Logo, este navio, não sendo standard, só por sorte…”92
O Sr. Dr. Carlos Alberto Veiga Anjos, ex-Presidente do Conselho de Administração dos ENVC, entre
setembro de 2010 e junho de 2011, respondeu ao Sr. Deputado Eduardo Teixeira, sobre a tentativa de venda
do Atlântida para a Venezuela:
“(…) O Presidente Chávez veio cá, creio que em novembro de 2010, veio assinar o contrato dos asfalteiros
e, nessa data, visitou o navio e mostrou muito interesse no mesmo.
A partir daí decorreram negociações com a PDVSA, que é a empresa de petróleos e era ela que iria
comprar o navio para o pôr ao serviço do turismo na Venezuela.
Portanto, o Presidente Chávez queria ter um navio que viajasse, digamos assim, interilhas a tarifas baixas
e onde os venezuelanos mais carenciados pudessem viajar. Queria dar-lhes esse presente.
De maneira que decorreram conversações e, em fevereiro, fui à Venezuela, a Caracas, para assinarmos o
contrato. Levei comigo o jurista, levei comigo o homem responsável pela área comercial, levei comigo o
mandato dos Estaleiros, delegando em mim a assinatura do contrato. Depois, os juristas estiveram todo um
dia a tratar das formalidades do contrato, tendo ficado apenas o preço para decidir.
Portanto, trataram das formalidades e, depois, estivemos uma manhã inteira a negociar o preço que, creio,
foi de 42 milhões de euros, sendo 35 milhões, que era o valor do navio, e 7 milhões eram para modificações
que o navio tinha que sofrer. Celebrámos esse contrato na sede da PDVSA, com o vice-presidente desta
empresa, onde nos cumprimentámos, bebemos champanhe, convidaram-nos para almoçar e ficámos de
assinar o contrato – estava lá, na altura, o Secretário de Estado da Economia português – no dia seguinte, às
4 horas da tarde, um sábado, no Palácio dos Negócios Estrangeiros de Caracas.
Qual não é o nosso espanto quando, cerca do meio-dia, estávamos no hotel, recebemos a indicação de
que não se podia formalizar a assinatura, porque o presidente da PDVSA tinha que ver aquilo, pois não estava
lá e só vinha na terça-feira seguinte.
Bom, fiquei até à terça-feira seguinte em Caracas à espera que o Sr. Presidente pudesse assinar o contrato
e o Sr. Presidente, ao fim do dia, mandou dizer que tinha muitas coisas para ver e que ainda não tinha
chegado a altura de autorizar a compra do navio.
De maneira que fiquei mais três dias com o diretor comercial e, chegados ao sábado seguinte, o Sr.
Presidente continuava sem ter tido tempo de assinar. Regressei e deixei lá o diretor comercial com mandato
para assinar o contrato, em nome da empresa.
Depois, as coisas começaram a enrolar-se. A certa altura, já em abril princípios de maio, comunicaram-nos
que viria cá o Ministro do turismo para ver o navio – isto já em fins de abril, princípios de maio. Em maio, veio
cá o Ministro do turismo para ver o navio, gostou muito dele, achou-o talvez até bom demais para as viagens
que queriam fazer com ele.
Visitou o navio, ficou encantado, esteve em Viana connosco, recebemo-lo muito bem e, depois, regressou
e acho que fez um relatório para o seu Governo a dizer que o navio era demasiado luxuoso e que não o
queriam. Isto já foi para aí em maio e eu saí dos Estaleiros em junho.
Portanto, para os nossos padrões, o barco Atlântida estava vendido e não passava pela cabeça, nem de
nós nem de ninguém da delegação, que, depois disto tudo, depois de ternos cumprimentado, negociado o
preço e feito contrato, este não viesse a ser assinado.
Portanto, foi isto que fiz pelo Atlântida.”93
O Sr. Dr. Carlos Alberto Veiga Anjos, ex-Presidente do Conselho de Administração dos ENVC, entre
setembro de 2010 e junho de 2011, esclareceu o Sr. Deputado Altino Bessa sobre o Atlântida:
“ O Sr. Dr. Carlos Alberto Veiga Anjos: — Tratando-se de uma empresa pública portuguesa dos Açores e
tendo em conta os motivos que foram invocados para não receber o navio, acho isso inacreditável. Acho
inacreditável e revolta-me, como cidadão e como gestor, que uma empresa tenha rejeitado um navio daquela
92
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 6 de maio de 2014, Presidente do Conselho de Administração dos ENVC no período de julho a
setembro de 2010, Sr. Contra-Almirante Victor Gonçalves de Brito, págs. 45-47. 93
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 6 de maio de 2014, Presidente do Conselho de Administração dos ENVC no período de setembro
de 2010 a junho de 2011, Sr. Dr. Carlos Alberto Veiga Anjos, págs. 9-11.
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qualidade por uma questão de um nó. No mar dos Açores, um nó de diferença de velocidade não significa
rigorosamente nada.
Portanto, pode haver outros motivos que eu não conheço, mas para rejeitar um navio por um nó de
velocidade, acho isso… até porque, repare o seguinte: não foi só o prejuízo no navio, era também o nome dos
Estaleiros que estava em causa. Não se faz uma coisa dessas. Histórias de rejeições de navios no mundo há
muito poucas e entre duas empresas portuguesas, ainda por cima com participações do Estado, acontecer
uma coisa dessas, acho surrealista.”94
O Sr. Eng.º Jorge Camões, atual Presidente do Conselho de Administração da ENVC, respondeu às
perguntas do Sr. Deputado Altino Bessa, sobre o Atlântida:
“ O Sr. Altino Bessa (CDS-PP): — Sr. Presidente, gostava de lhe fazer uma última pergunta, que está
relacionada com o acordo da Atlânticoline e dos Estaleiros Navais de Viana do Castelo: o senhor, se fosse
Presidente à época em que este acordo foi assinado, assinava-o?
O Sr. Eng.º Jorge Camões: — Não!
O Sr. Altino Bessa (CDS-PP): — Acha que este acordo foi altamente lesivo para os interesses dos
Estaleiros Navais de Viana do Castelo e para o Estado português?
O Sr. Eng.º Jorge Camões: — Eu tenho ouvido, com muita atenção, um conjunto de intervenções feitas
aqui e tenho ficado boquiaberto. Completamente boquiaberto!
Portanto, eu não aceitava, tinha litigado. Primeiro, não aceitava de todo, até porque, realmente, no mundo
não são conhecidos casos destes. Aliás, posteriormente, soubemos que tinha havido pareceres jurídicos de
professores e que não foram seguidos, infelizmente, como aqui foi dito e assumido estranhamente.
Portanto, não! Não, de todo! Teríamos, no mínimo, questionado, sabido porquê. Teríamos defendido os
interesses dos Estaleiros. Portanto, nós, e o conselho está solidário comigo, não tínhamos, de todo!”95
O Sr. Eng.º Jorge Camões e outros vogais Conselho de Administração da ENVC, responderam às
perguntas do Sr. Deputado António Filipe, sobre várias “anormalias” relacionadas com o Atlântida:
“O Sr. Eng.º Jorge Camões: — Nós temos listadas as alterações. De facto, de acordo com os pareceres
técnicos que foram solicitados ao IST (Instituto Superior Técnico) e ao assessor Almirante Cabrita,
engenheiro naval, de facto houve, identificadamente, alterações listadas.
Essas alterações não foram quantificadas nos contratos, em termos de valores, de euros. Houve
vários factos anómalos para mim, e esse foi um deles; um outro (e já ouviram falar dele certamente) foi
o facto de o fiscal, por parte do armador, ter sido colocado tardiamente nos Estaleiros, chegou seis ou
sete meses depois e, quando chegou, solicitou mais alterações, por várias razões e, depois, ainda
houve novas alterações devido a problemas técnicos de deficiência do projeto. Portanto, houve um
conjunto de coisas que não foram relevadas para o orçamento inicial. Ponto assente!
Além disso, parece que também houve pedidos e análises jurídicas do por que é que teria sido
assim. Quer dizer, havendo um armador e um fornecedor, não houve entendimento, nem diálogo, entre
as partes, o que leva a pensar que haveria um desentendimento. Lendo os documentos, parece que
houve premeditação de que teria de ser assim. Parece que houve, mas não sei.
Ou seja, por um lado, os custos não foram levados para o projeto, não foram contabilizados, como deveria
ter sido. Por outro lado, houve um parecer jurídico que levou a que não se conseguisse entendimento, o que
conduziu para aquela situação final, em que ambas as partes ficaram muito prejudicadas, sobretudo os
Estaleiros, quer em imagem quer financeiramente. Portanto, foi, de facto, algo estranho.
Para mim, quando, passados cinco anos, a posteriori leio os documentos, acho muito estranho. Eu nunca
tinha tido um caso destes. O Francisco Gallardo dizia-me «quantos casos no mundo existem em que um
armador rejeita um navio?!» No mínimo, se o problema é um nó de velocidade, pois reduz-se; se o
94
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 6 de maio de 2014, Presidente do Conselho de Administração dos ENVC no período de setembro
de 2010 a junho de 2011, Sr. Dr. Carlos Alberto Veiga Anjos, pág. 76. 95
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 7 de maio de 2014, atual Presidente do Conselho de Administração dos ENVC, Sr. Eng.º Jorge
Camões, e restantes vogais do Conselho de Administração, Sr. Dr. José Luís Serra, Sr. Eng.º Francisco Gallardo e Sr. Almirante Conde Baguinho, págs. 53-54.
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problema é o aumento do consumo, reduz-se; se o prazo… reduz-se. Quer dizer, haveria um acerto de
contas ou algo assim, mas, para mim, nunca daquela maneira.
O Sr. Eng.º Francisco Gallardo: — Gostaria de acrescentar algo sobre este tema porque trata-se de um
modelo de navio que não é um navio qualquer, não é um navio mercante como os que há aí às centenas.
Trata-se de um navio feito à medida para um armador, tendo em conta as condições dos portos da área do
tráfego, as condições dos passageiros, dos carros, enfim. Este é um navio feito tipo alfaiate.
As dificuldades que um construtor de um navio como este tem para pôr este navio no mercado, uma
vez que o armador rejeita aceitar o navio, é muito forte. Ninguém vai aceitar. Porquê? Porque este
navio seguramente não está a cumprir os regulamentos de outros portos, nem a necessidade de outro
tráfico e de outros armadores.
Portanto, vai necessitar de uma remodelação muito profunda e, nos navios de passageiros, as
regulamentações são tão estritas que, mexer no navio, é tremendamente complicado e ainda se corre o
risco de ficar «com o morto na caixa».
Por isso, do meu ponto de vista, o pior que pode acontecer a um estaleiro é o armador cancelar o
navio. Porquê? Porque estamos a falar de um buraco e, neste caso, de uma quantia de setenta e tantos
milhões de euros. Ora, isto afunda qualquer empresa, tendo em conta os fundos próprios e tendo em
conta as condições de…
Portanto, os Estaleiros têm necessidade de negociar, tentando minorar o máximo possível o dano que isto
pode causar, e o armador, mesmo que não compreenda, tem de fazer algum esforço para chegar a um
entendimento quanto ao preço. Tudo bem que esse preço vá diminuir e que ocasione algum dano, mas não é
deste montante. Pior! O pior disto é, primeiro, a fama com que se fica no mercado de construção, de que você
não é capaz de entregar um navio que cumpra as condições requeridas pelo armador. Segundo, você tem um
navio em exposição que não pode vender e cada ano que passa o navio está a perder valor, mais ainda no
mercado de transporte de passageiros, porque as normas no transporte de passageiros, que regulam a
segurança, etc., mudam e cada vez são mais estritas, e há o caso do navio coreano. E seguramente, nos
próximos meses, iremos ter novos regulamentos para os navios de transporte de passageiros, com a
consequência de serem as causas que provocaram o «afundamento» deste navio, e seguramente vêm limitar
e exigir mais automatismos.
Os novos navios ferry em construção rapidamente ficam obsoletos se não estiverem no mercado. Portanto,
o risco que estamos a correr com este navio é o de ele ficar para sucata.
Se o navio é bom, se o navio é… não interessa, o navio não pode ser…
O Sr. Jorge Fão (PS): — É desmantelá-lo!
O Sr. Eng.º Francisco Gallardo: — Por isso, tem de ser feito o maior dos esforços por ambas as partes na
negociação, depois de ser comprovado que o navio não cumpre, para se chegar a um acordo o menos lesivo
possível para ambas as partes. E, do que tenho visto ao longo de todos estes anos, nunca vi que um navio
ferry fosse definitivamente cancelado. Poderia haver a ameaça de cancelamento por incumprimento de prazo
ou por incumprimento de performance do navio, mas, depois, chega-se a algum tipo de entendimento.”96
O Presidente do Conselho de Administração da AtlânticoLine, desde outubro de 2010, Sr. Dr. Carlos
Alberto Viveiros dos Reis, argumentou que era impossível aceitar o Atlântida pois não cumpria os requisitos
contratuais de velocidade.
Nas respostas às perguntas dos Srs Deputados na CPI, destaca-se:
“O Sr. Dr. Carlos Alberto Viveiros dos Reis: — Foram introduzidas várias alterações no projeto inicial a
pedido da Atlânticoline.
A Atlânticoline esteve presente no acompanhamento da obra através, primeiro, de um técnico e, depois,
mais tarde, de outro técnico.
96
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 7 de maio de 2014, atual Presidente do Conselho de Administração dos ENVC, Sr. Eng.º Jorge
Camões, e restantes vogais do Conselho de Administração, Sr. Dr. José Luís Serra, Sr. Eng.º Francisco Gallardo e Sr. Almirante Conde Baguinho, págs. 65-68.
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O Sr. Altino Bessa (CDS-PP): — Então, todas as alterações foram validadas pela Atlânticoline.
O Sr. Dr. Carlos Alberto Viveiros dos Reis: — Eu diria o contrário: todas as alterações foram validadas
pelos Estaleiros de Viana, porque, enquanto cliente, a Atlânticoline solicita e os Estaleiros de Viana validam e
dão o seu agrément, acertam um acréscimo de preço, portanto validam as solicitações da Atlânticoline. Diria,
pois, que é exatamente ao contrário.”97
Em resposta ainda ao Sr. Deputado Altino Bessa, sobre a rejeição do navio Atlântida:
“ O Sr. Dr. Carlos Alberto Viveiros dos Reis: — O navio foi rejeitado porque, no desempenho, não cumpriu
com o que era exigido em termos de caderno de encargos, que eram 19 nós. O navio só tinha um
desempenho de 16,5 nós.
O Sr. Altino Bessa (CDS-PP): — Isso, entre ilhas, em tempo, mesmo na maior distância, representa um
acréscimo de quanto? Sabe dizer-me?
O Sr. Dr. Carlos Alberto Viveiros dos Reis: — Sei perfeitamente, Sr. Deputado.
Assumindo que tínhamos o navio dentro dos parâmetros exigidos, ou seja, com um desempenho de 19
nós, assumindo a redução de velocidade entre entradas e saídas dos portos e, portanto, assumindo uma
velocidade média de 18,5 nós, uma ligação entre o Faial e Santa Maria, que é uma ligação normal da
Atlânticoline, demoraria 16 horas e 15 minutos, com as diversas paragens nos diferentes portos. Isso significa
que as pessoas sairiam, sensivelmente, à 8 horas da manhã, que é uma ligação que fazemos normalmente, e
chegariam por volta da meia-meia-noite a Santa Maria.
Com a passagem para os 16,5 nós, fazendo o mesmo raciocínio de deduzir 0,5 nó entre entradas e saídas,
aceitando uma velocidade média de 16 nós, essa viagem passaria a ter 19 horas e 31 minutos, o que, na
prática, dá 3 horas e 15 minutos de diferença, o que significaria sair do Faial às 5 horas da manhã e dizer às
pessoas para estarem no cais às 4 horas da manhã. Do nosso ponto de vista, é uma diferença significativa.”98
E sobre a questão da candidatura da Atlânticoline a fundos comunitários para financiar o investimento com
o Atlântida:
“O Sr. Altino Bessa (CDS-PP): — A determinada altura, a Atlânticoline retira a candidatura ao programa
comunitário PROCONVERGÊNCIA, com o qual pretendia financiar o investimento em 80%, de 57, 8 milhões
de euros nos dois navios.
A minha pergunta é a seguinte: estes dois navios que agora estão a lançar a concurso têm também
financiamento? Qual o financiamento? Exatamente quais são as razões… Porque há uma afirmação do Dr.
António Jorge Rolo, dos Estaleiros Navais de Viana do Castelo, que é a seguinte: «Açores tudo fariam para
não ficarem com o Atlântida. Antigo gestor diz que o armador açoriano, ao retirar a candidatura aos fundos
comunitários, se desinteressou do ferry».
O Sr. Dr. Carlos Alberto Viveiros dos Reis: — Não consigo retroagir no tempo e não consigo dar-lhe uma
resposta clara e objetiva quanto à primeira parte da sua pergunta — o porquê da desistência.
O que lhe consigo dizer é que, neste momento, e com o concurso lançado, temos, efetivamente, o objetivo
de nos candidatarmos ao próximo quadro comunitário de apoio.
Quanto ao passado, honestamente não lhe consigo responder.
(…)
O Sr. Altino Bessa (CDS-PP): — Sim, mas o relatório do Tribunal de Contas diz que a partir da
correspondência trocada entre armador e construtor o Tribunal descreve que foi, efetivamente, considerada a
97
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 13 de maio de 2014, atual Presidente do Conselho de Administração da Atlânticoline, S.A., Sr. Dr.
Carlos Alberto Viveiros dos Reis, pág. 8. 98
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 13 de maio de 2014, atual Presidente do Conselho de Administração da Atlânticoline, S.A., Sr. Dr.
Carlos Alberto Viveiros dos Reis, pág. 11.
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mudança de classificação deste navio de short international voyage para normal international voyage, o que
permitiria ao navio operar para fora dos circuitos interilhas, ideia que foi posta de parte em finais de janeiro de
2009.
Com esta alteração da classificação punham em causa o financiamento, porque estes fundos deixavam de
poder ser utilizados para uma zona ultraperiférica.
Não tem conhecimento daquilo que diz o relatório do Tribunal de Contas?
O Sr. Dr. Carlos Alberto Viveiros dos Reis: — Sr. Deputado, eu li o relatório do Tribunal de Contas, não
consigo é fazer uma relação tão direta entre esta mudança de classificação e a retirada da candidatura aos
fundos.
Não sei, não consigo fazer essa relação.
O Sr. Altino Bessa (CDS-PP): — A questão era esta, a mudança não era financiável.
Mas também há um parecer do Prof. António Pinto Monteiro que diz: «As penalidades que a Atlânticoline
procurou impor aos Estaleiros Navais são de origem puramente compulsória e, fundamentalmente, estão
sujeitas a boa parte das considerações expendidas sobre a violação das regras da boa fé no tocante à
resolução do contrato». Ou seja, aquilo que o Professor diz neste relatório é que houve quebra de regras de
boa fé. E o atual presidente do conselho de administração dos Estaleiros Navais de Viana do Castelo diz que
nunca assinaria este acordo.
E a minha pergunta também é essa: como é que é possível não terem deixado ir isto a tribunal arbitral?
Como é que é possível que tenha existido este acordo entre as duas partes? E pergunto se não houve aqui
interferência quer do poder dos Açores à época, do Presidente dos Açores Carlos César, quer do Primeiro-
Ministro José Sócrates.
Pergunto se não houve influência, se não houve conversas…
A Sr.ª Presidente: — Sr. Deputado, esgotou o seu tempo.
O Sr. Altino Bessa (CDS-PP): — (…) e se o senhor nunca teve contacto com estes dois políticos na
resolução do problema ou se tem conhecimento de alguma matéria em relação a isto que tenha sido
conversada entre os dois.
O Sr. Dr. Carlos Alberto Viveiros dos Reis: — Sr. Deputado, só lhe posso ler duas cláusulas do acordo de
rescisão.
A cláusula 15.ª diz: «Recentemente, as partes encontraram-se e ambas manifestaram abertura para
encontrar uma solução amigável que permitisse extinguir todas as suas divergências e litígios quanto aos
contratos 258 e 259 referidos nos considerandos supra, através de um acordo global satisfatório para ambas e
para o superior interesse público, nacional e regional, de forma a evitar consequências económicas e sociais
mais gravosas.»
E lia-lhe uma outra cláusula, a 23.ª, que diz: «Aliás, nesse sentido se pronunciaram as Inspeções-Gerais
das Finanças e da Defesa Nacional no seu relatório conjunto de inspeção ao procedimento pré-contratual…»,
etc… E depois diz: «No parecer final dos Srs. Inspetores-Gerais, que expressamente afirmam, considerando
os resultados desta inspeção extraordinária, as inúmeras vicissitudes que marcaram o processo pré-contratual
e contratual em apreço, e tendo em conta a indispensável tutela dos interesses públicos em presença, é nosso
entendimento que a solução para o diferendo em análise passa por um acordo entre as entidades envolvidas
por forma a evitar consequências económicas e sociais mais gravosas.»
Mais claro do que isto acho que é difícil.”99
O Sr. Dr. Carlos Alberto Viveiros dos Reis, ainda responde à Sr.ª Deputada Carla Cruz, sobre tentativas
que houve para se encontrar uma solução com ENVC, que não foram correspondidas pela Atlânticoline:
99
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 13 de maio de 2014, atual Presidente do Conselho de Administração da Atlânticoline, S.A., Sr. Dr.
Carlos Alberto Viveiros dos Reis, págs. 12-17.
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“ O Sr. Dr. Carlos Aberto Viveiros dos Reis: — Dos documentos que encontro não vejo qualquer referência
a essa possibilidade.
Efetivamente, o que encontro são tentativas e hipóteses de se tentar resolver o incumprimento verificado.
Essa possibilidade não a encontrei.
A Sr.ª Carla Cruz (PCP): — Então, é capaz de nos dizer quais são essas tentativas de encontrar uma
solução que encontrou nos documentos que consultou?
O Sr. Dr. Carlos Aberto Viveiros dos Reis: — Sr.ª Deputada, não consigo reproduzir fielmente mas passaria
por incluir mais um motor no navio. Basicamente, esta era a maior alteração, o que obviamente implicaria
muito mais consumo, porque era mais um motor e na prática, seria mais 50%, e ainda assim não havia
qualquer garantia de que o desempenho do navio ficaria nos limites exigidos pelo contrato assinado pelos
Estaleiros de Viana.
A Sr.ª Carla Cruz (PCP): — Nos documentos que encontrou relativamente a essa proposta de colocação de
mais um motor, qual era a visão da Atlânticoline? Julgo que a colocação de mais um motor foi uma proposta
dos Estaleiros.
O Sr. Dr. Carlos Aberto Viveiros dos Reis: — A resposta da Atlânticoline foi que não poderia aceitar essa
possibilidade uma vez que o consumo iria aumentar substancialmente e não havia qualquer garantia, nem com
as alterações propostas, de que os limites mínimos de aceitação do navio fossem cumpridos.”100
Relativamente ao segundo contrato, o do navio Anticiclone, o Sr. Dr. Carlos Alberto Viveiros dos Reis,
responde à Sr.ª Deputada Mónica Ferro:
“ A Sr.ª Mónica Ferro (PSD): — Bom, não vou comentar essa suposta teoria da conspiração.
Mesmo assim, Sr. Presidente da Atlânticoline, gostava de lhe perguntar, tendo em consideração este
acordo, se tem alguma informação sobre se não poderia ter sido salvaguardado o segundo contrato, para o
navio Anticiclone? Tem alguma informação sobre isto?
O Sr. Dr. Carlos Alberto Viveiros dos Reis: — Desde cedo se percebeu que o segundo navio ia ter
problemas muito semelhantes ao primeiro e, portanto, um dos aditamentos já o transforma, na prática, quase
num navio completamente diferente.
E, na prática, a construção do segundo navio mal começou. Portanto, não se chegou a analisar
desempenhos, cumprimentos e incumprimentos, como daí resulta. A resolução do contrato do segundo navio,
do que percebi, foi entendida como melhor solução, uma vez que se estava a antever que desse de novo
litigância, ou seja, os prazos já estavam mais do que ultrapassados e ainda não tinha começado. Também não
consigo precisar efetivamente, mas percebo que já estava a caminho de resultar em nova litigância e,
portanto, como não tinha começado praticamente a construção, entendeu-se por bem encerrar os dois
processos de uma vez só e evitar um futuro processo de litigância que se estava a adivinhar.
A Sr.ª Mónica Ferro (PSD): — Portanto, se percebi bem, enquanto a recusa do Atlântida se baseou em
provas de mar, em que verificaram que não era cumprido o que estava contratualizado, a renúncia do
Anticiclone baseou-se numa suposição que partia do princípio que os Estaleiros seriam incompetentes…”101
Por último o Sr. Dr. Carlos Alberto Viveiros dos Reis, esclarece o Sr. Deputado Jorge Fão:
“O Sr. Jorge Fão (PS): — Entretanto, não havendo Anticiclone, nem Atlântida, foi necessário fretar navios
para fazerem esse serviço.
Que capacidade e características tinham esses navios, em termos de lotação e de transporte de viaturas?
100
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 13 de maio de 2014, atual Presidente do Conselho de Administração da Atlânticoline, S.A., Sr. Dr.
Carlos Alberto Viveiros dos Reis, págs. 26-27. 101
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 13 de maio de 2014, atual Presidente do Conselho de Administração da Atlânticoline, S.A., Sr. Dr.
Carlos Alberto Viveiros dos Reis, pág. 45.
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O Sr. Dr. Carlos Alberto Viveiros dos Reis: — Neste momento, os navios que fazem a operação, e já a
fazem desde 2009, aliás, um já faz desde 2007, têm uma capacidade, respetivamente, de 630 e 660
passageiros e, quanto a viaturas, têm capacidade para, um, 125 viaturas e, o outro, 180 viaturas.
O Sr. Jorge Fão (PS): — Tem ideia de quanto já custou à Atlânticoline, até este momento, o fretamento
destes navios para fazer esse transporte?
O Sr. Dr. Carlos Alberto Viveiros dos Reis: — Dos contratos autónomos, digamos que navio a navio, não
tenho noção. Dos contratos via concurso público internacional, sim. Cerca de 20 milhões, 9, 10 e 11 mais
cerca de… Neste momento, de 2009 a 2013, foram cerca de 35 milhões de euros.
Não consigo ir mais atrás, porque são contratos independentes, uns por pouco tempo… não são
comparáveis.
O Sr. Jorge Fão (PS): — Criámos um problema a nível nacional, prejudicámos, provavelmente, o erário
público e ainda sobrecarregamos com contratação, fretando transportes alternativos. Não acha que tudo isto
redundou num enorme prejuízo quer para a administração regional quer para o País?
O Sr. Dr. Carlos Alberto Viveiros dos Reis: — Sr. Deputado, volto um pouco atrás. A Atlânticoline queria
estes dois navios na sua operação de 2008. Foi prejudicada. Teve de encontrar uma solução para 2008;
depois, na operação de 2009, também foi prejudicada e teve de arranjar uma solução para a operação desse
ano. Portanto, se os Estaleiros Navais foram prejudicados, se o erário público foi prejudicado, a Atlânticoline
também foi prejudicada.”102
Um ex-Técnico da ENVC, o Sr. Eng.º António Martins Iglésias, que esteve 23 anos ao serviço da ENVC, foi
chamado para depor na CPI. Respondeu às perguntas dos Srs. Deputados, tendo abordado mais a questão
de Atlântida.
Sobre esta temática, responde à Sr.ª Deputada Carla Cruz:
“ O Sr. Eng.º António Martins Iglésias: — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados, vamos, então, começar por falar
um pouco sobre o Atlântida.
Tenho de dizer aos Srs. Deputados que, como chefe de máquinas e engenheiro de máquinas da Marinha
mercante, estou nos Estaleiros desde 1988, depois de estar 16 anos ao serviço da Sociedade Portuguesa de
Navios Tanques, Soponata.
Tenho trabalhado como coordenador de provas, isto é, responsável por uma equipa de lançamento de
equipamentos e, nas provas de mar, era chefe de máquinas. Até 1999, altura em que construímos o último
porta-contentores, estava em trabalho nos porta-contentores que eram para a empresa alemã Jungerhans,
cujo porta-contentores são os melhores do mundo. Entretanto, deixei os porta-contentores e passei a trabalhar
— também me tocou — no Atlântida.
Falar do Atlântida é falar de um projeto, cujo tempo não era muito — acho que eram 560 dias para a
construção do navio —, e penso que o projeto não tinha amadurecimento suficiente para avançar neste
curto espaço de tempo. As coisas evoluíram de tal maneira que pensávamos que tinha de haver uma
parceria entre a Atlânticoline e os Estaleiros, pela maneira que aquilo estava a andar, porque os
Estaleiros não tinham condições de construção e tiveram de recorrer a outras empresas.
Qual não é o meu espanto quando, depois de conversar com os colegas acerca de uma parceria, não se
tendo levantado problemas, as coisas iam decorrendo, no dia 27 de abril deste ano, o Público publica uma
notícia que me ajuda a compreender que, de facto, a parceria existia ou teria de existir forçosamente por
intermédio de uma empresa chamada SCMA (Sociedade de Consultores Marítimos, Lda.).
As coisas desenrolaram-se, mas não eram fáceis; o tempo foi pouco e penso que se cometeram muitas
asneiras, que não podiam ser evitadas. Asneiras no sentido em que, sendo o navio de dupla propulsão, com
dois sistemas de propulsão, um arquiteto jamais escolheria uma propulsão cujos sentidos de rotação são os
102
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 13 de maio de 2014, atual Presidente do Conselho de Administração da Atlânticoline, S.A., Sr. Dr.
Carlos Alberto Viveiros dos Reis, págs. 70-71.
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mesmos, isto é, rodar da esquerda para direita ou de bombordo, rodar da esquerda para a direita ou de
estibordo. O que é que isto implica? Os efeitos não se anulam e implica uma derivação do navio para
bombordo ou para estibordo, sendo que, depois, na prática, uma das máquinas tem de ser sacrificada para
andar a corrigir a rota que o navio tem.
Ora, para chegar onde chegaram, à escolha dos equipamentos com 3000 kW de potência, não acredito
que a Atlânticoline não soubesse que o propulsor tinha 3000 kW de potência e o motor elétrico que iam
instalar para dar a potência dos 3000 kW também tivesse 3000 kW. Não acredito que a Atlânticoline não
tivesse lá gente que dissesse: «Por amor de Deus, a montante, tens de ter mais de 3000 kW, porque na
transmissão há sempre 2%, 3% ou 4% de perdas — depende! — e jamais traremos a potência à propulsão.
Estou convencido de que as pessoas que estão envolvidas nisto tinham todos os conhecimentos, que são
pessoas que sabem, efetivamente, de navios, mas a Atlânticoline estaria a pensar: «Vamos para esses
propulsores de 3000 kW, porque, para termos a certeza de que o navio vai dar as 18 milhas, temos de montar
uma propulsão de 3500 kW ou 4000 kW e, nesse caso, estamos ‘tramados’ com o projeto, se este se alterar
todo e, se calhar, já nem temos navios para instalar o equipamento que é necessário».
O processo foi-se desenrolando. Estava tudo bem com o navio. Se não houvesse o problema da
estabilidade em avaria, ainda hoje os Estaleiros não tinham problemas, porque estávamos a construir navios
daqueles para todo o mundo.
O problema é que o navio era grande demais e os Estaleiros, com todas as suas deficiências, foram
certamente incapazes de passar para o papel aquilo que deviam ter feito — e veremos mais tarde onde quero
chegar — e quando se vem a verificar (com todas a pressas por causa do tal prazo, cometeram-se erros),
quando se vai fazer a prova de estabilidade, verificam que o navio, em condições de estabilidade em avaria,
não cumpre as regras.
Aí é que foi o desastre. O navio começa a aumentar de peso, para satisfazer todas as regras, e, quando
vamos a provas de mar, jamais o navio dava as 18 milhas. Mas eu continuo na mesma: as 18 milhas era uma
questão sobre a qual os Estaleiros, certamente — ou os Estaleiros ou a SCMA ou alguém —, se deviam
entender, porque se chegaram ali… E, mais, isto era uma construção que ia dar dinheiro aos Estaleiros e à
Atlânticoline, porque, à partida, isto era uma construção garantida que ia dar muito dinheiro — viu-se o
dinheiro que deu!
Então, o navio não dá a velocidade. Entretanto, há o problema de o navio não ter sido pensado, mas temos
gente para pensar muito bem nisto, e, quando a Atlânticoline, nos Estaleiros, mete no navio a futura tripulação,
surge efetivamente a verdadeira história do navio. A tripulação interroga-se: «Será que o meu patrão vai ter
dinheiro para o combustível? Então, um navio destes, para 750 passageiros, vai andar nos Açores a
transportar 5 ou 10 pessoas? Onde é que o meu patrão vai ganhar dinheiro? Este navio só queima gasóleo.»
E pergunta o chefe: «Mas, então, isto nem queima fuel?», ou nafta, como se chama na gíria. «Não, só queima
gasóleo». «Ainda é pior a emenda que o soneto, estamos desgraçados!».
Isto deve ter chegado, de certeza, à Atlânticoline. E quando eles perceberam que tinham um «elefante
branco», porque aquilo era navio de mais para os Açores, e vem as provas de mar e o navio não dá a
velocidade, os Estaleiros, não sei se por ingenuidade ou não… É porque, no passado, nos Estaleiros, já
tivemos problemas com velocidades e nunca os navios foram excluídos e rejeitados, embora haja sempre uma
causa que penaliza o construtor, mas nunca a rejeição. Não sei por que é que ela lá estava metida! Mas, se lá
estava, era por alguma razão.
Como eles viram que tinha de ser sempre dia de Santo Cristo — o que, acho, não acontece, infelizmente,
nos Açores — e como eles não ganhavam para pagar à tripulação, serviram-se daquela e rejeitaram o navio,
pura e simplesmente. Mas a história é muito grande, não vou contá-la toda porque senão perco-me; penso já
chega.
A respeito do fiscal, não sei se chegou sete meses mais tarde ou mais cedo. A partir da altura em que o
conheci, sei que, e para colaborar na parceria, o fiscal acabou por desaparecer dos Estaleiros com o acordo
da Atlânticoline. E uma coisa lhes garanto: os Estaleiros não ganharam com a saída deste fiscal, que, depois,
acabou por desaparecer e, na fase final do navio, já lá não estava.
Penso que respondi às perguntas. Haveria mais coisas para dizer, mas acho que já chega.”103
103
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 27 de maio de 2014, ex Técnico da ENVC, Sr. Eng.º António Martins Iglésias, págs. 5-8,
sublinhado do relator.
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Já o antigo consultor da Atlânticoline e da ENVC, o Sr. Eng.º João Moita afirmou em audição na CPI em
resposta a perguntas formuladas pelos Srs. Deputados, que a perda de velocidade do ferry Atlântida face aos
requisitos iniciais implicava apenas um atraso de 25 minutos num percurso 10 horas.
O Sr. Eng.º João Moita, começa por explicar ao Sr. Deputado Nuno Sá Costa a sua relação com a
Atlânticoline e a ENVC:
“O Sr. Nuno Sá Costa (PSD): — Sr. Engenheiro, explique-nos, se puder, de forma relativamente sucinta, a
relação que a empresa da qual o Sr. Engenheiro era sócio-gerente, a SCMA, teve inicialmente, e reporto-me
em concreto à construção e contratação da construção de dois navios por parte da Atlânticoline, com os
Estaleiros Navais de Viana do Castelo, em relação ao Atlântida e ao Anticiclone. Qual a relação que a SCMA
tinha quer com a Atlânticoline quer, depois, com os Estaleiros Navais de Viana do Castelo?
O Sr. Eng.º João Moita: — Antes, tinha feito outra pergunta à qual eu não respondi, mas, em função das
notícias que aparecem nos jornais e das coisas que se dizem que não estão corretas, talvez fosse melhor
começar por aí. Eu já respondo a essa pergunta.
Por que é que aparece uma empresa irlandesa, a Portbridge aqui no processo? A empresa aparece no
processo porque a Petrobalt, que era a empresa de projeto russa com quem começámos a trabalhar no final
da década de 90, já tinha uma tradição grande de cooperação com os Estaleiros Navais de Viana do Castelo,
na altura em que estes construíram uma série de vinte e tal navios para a Rússia. A partir de 1975, quando foi
a Revolução de Abril, passados uns tempos, os Estaleiros de Viana do Castelo construíram esses navios e as
pessoas russas que colaboraram nesse projeto e que estiveram inclusivamente a trabalhar em Portugal para
os Estaleiros de Viana do Castelo…
O Sr. Nuno Sá Costa (PSD): — Sr. Engenheiro, peço desculpa por interromper, não me leve a mal. Mas,
antes de isso, para percebermos o encadeamento total, a SCMA foi contratada pela Atlânticoline, com quem
realizou dois contratos em 2005, tendo o segundo sido renovado em 2007. Esse contrato era para a
elaboração dos desenhos e do projeto do navio para o concurso público que a Atlânticoline ia fazer para a
construção desses dois navios. Já aqui a SCMA contratou a Petrobalt, ou não?
O Sr. Eng.º João Moita: — Sim. Nós fizemos um primeiro contrato com a Atlânticoline no sentido de dar
apoio à empresa como consultores para o desenvolvimento do projeto de construção dos navios que a
Atlânticoline ia pôr a concurso. Fizemos este primeiro acordo no sentido de dar, como consultores técnicos,
apoio à Atlânticoline. Entretanto, nós sugerimos à Atlânticoline que, para se construir um navio (que era um
projeto específico para o cliente Atlânticoline), em vez de fazerem apenas os documentos do concurso e uma
especificação técnica com um simples desenho indicativo do navio, para evitar os grandes riscos que se
correm quando se constrói um protótipo, se contratasse uma empresa de projeto, uma vez que a nossa
empresa não tinha essa capacidade, para fazer um pré-projeto do navio, incluindo testes em tanque do
modelo do navio, para que o navio, quando fosse posto a concurso, fosse um navio concreto e não apenas um
navio com uma descrição técnica. E isto exatamente para quê? Para evitar que cada estaleiro concorrente ao
concurso apresentasse um navio diferente. E foram explicadas à Atlânticoline as vantagens, incluindo as da
eliminação de riscos que esta situação comportava, e a Atlânticoline perguntou: «Você tem algum projetista
que conheça, que tenha capacidade para fazer esse trabalho?». Ao que eu disse: «Temos, nós trabalhamos
com um projetista russo, que, inclusivamente, esteve envolvido na construção de um ferry para a Madeira, foi
o último trabalho que se fez. E, portanto, nós conhecemos bem o projetista. É uma empresa de projeto com
cerca de 70 trabalhadores, trabalha dentro de um dos maiores estaleiros russos, tem estado envolvida em n
projetos de grande complexidade, desde navios atómicos a outros. E, portanto, essa empresa, com que temos
uma colaboração já há bastante tempo, é, do nosso ponto de vista, uma empresa possível. Os senhores falem
com eles e façam um contrato para eles executarem este trabalho.» E a Atlânticoline, nesta conversa, diz-me:
«Mas sabe, para nós, é um problema fazer um contrato com uma empresa russa. Não temos nada contra os
russos, mas, sendo nós uma empresa pública, contratar uma empresa russa para fazer isto, o senhor
compreende… O senhor não se importa, seria melhor para nós, que seja a vossa empresa a contratar os
russos a nosso pedido? O senhor tem algum inconveniente sobre isso?». E eu respondi: «Não! Não temos
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nenhum inconveniente em contratar a Petrobalt para fazer este trabalho, em função do pedido que a
Atlânticoline nos está a fazer. Não tem problema nenhum!»
O Sr. Nuno Sá Costa (PSD): — Ó Sr. Engenheiro, mas a Administração da Atlânticoline concretizou esse
temor que tinha em contratar uma empresa russa, ou ficou-se por essa afirmação genérica que o Sr.
Engenheiro aqui fez?
O Sr. Eng.º João Moita: — É informação genérica dizer que fazer um contrato com a empresa russa era
uma situação um pouco complicada… «Era melhor… Se a SCMA não vê inconveniente, nós pedíamos que
seja a SCMA a contratar os russos, a nosso pedido», e nós dissemos que não havia problema nenhum.
O Sr. Nuno Sá Costa (PSD): — E o Sr. Engenheiro contratou a Petrobalt. Correto?
O Sr. Eng.º João Moita: — Exatamente!
O Sr. Nuno Sá Costa (PSD): — E esse trabalho custou 322 900 euros. Confirma?
O Sr. Eng.º João Moita: — Exatamente!
O Sr. Nuno Sá Costa (PSD): — Sr. Engenheiro, entretanto, é feito um segundo contrato, também uma
espécie de assessoria para a construção dos navios, em que a SCMA recebia 2800 euros/mês e, depois, mais
tarde, em 2007, este valor foi atualizado para 3000 euros/mês. Este contrato dizia respeito apenas ao Atlântida
e ao Anticiclone, ou era para outro tipo de atividade da Atlânticoline?
O Sr. Eng.º João Moita: — Esse contrato dizia respeito a todo o apoio a dar à Atlânticoline, não só nos
navios que estavam, já na fase seguinte, contratados aos Estaleiros de Viana mas também no projeto que a
Atlânticoline tinha de alugar navios, de fazer inspeções a navios, etc. Portanto, era um apoio abrangente
relativamente a todas as necessidades técnicas da Atlânticoline.
O Sr. Nuno Sá Costa (PSD): — Sr. Engenheiro, por que razão então, mais tarde, depois de os Estaleiros
terem ganhado o concurso para a construção destes dois navios, a Portbridge — e se eu estiver a dizer mal,
Sr. Engenheiro, corrija-me por favor —, da qual a SCMA era agente em Portugal, contrata novamente a
Petrobalt, agora para os desenhos de execução dos navios, cuja contratação envolveu a quantia 1 690 000
euros para o Atlântida e 350 000 euros para o Anticiclone? Confirma?
O Sr. Eng.º João Moita: — Confirmo, mas a situação é um pouco diferente.
A Petrobalt desenvolveu o pré-projeto, incluindo os testes em tanque, para se fazer o concurso, e o
trabalho da Petrobalt acabou. Foi um trabalho prestado à Atlânticoline. Entretanto, há o concurso público, e os
Estaleiros Navais de Viana do Castelo, por decisão da Atlânticoline, é o estaleiro vencedor. A partir dessa
altura, os Estaleiros Navais de Viana do Castelo, em função do conhecimento que a Petrobalt já tinha do
projeto, uma vez que tinha feito o pré-projeto, e também da prática que existia de cooperação entre os
Estaleiros de Viana e a Petrobalt, os Estaleiros de Viana decidem fazer uma espécie de um miniconcurso, por
contacto direto, com algumas empresas de projeto, incluindo as de Espanha, para ter ofertas de elaboração e
desenvolvimento do projeto dos ferries Atlântida e Anticiclone. Quando os Estaleiros de Viana recebem as
propostas das empresas que consultaram, verificam que a proposta da Petrobalt é cerca de 1 milhão a menos
do que a melhor proposta que tinham de Espanha. E é em função desse valor, dessa diferença de custo e da
experiência de trabalho da Petrobalt que os Estaleiros de Viana decidem contratar a Petrobalt. Portanto, isso
nada tem a ver com a Atlânticoline.”104
104
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 3 de junho de 2014, ex Consultor da Atlânticoline e da ENVC, Sr. Eng.º João Moita, págs. 5-11.
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Para depois falar das alterações ao contrato pedidas pela Atlânticoline:
“ O Sr. Eng.º João Moita: — A Atlânticoline introduziu muitas alterações, relativamente ao projeto que foi
discutido, e posso dizer isto com toda a… porque participei em todas as reuniões.
O navio foi concebido estritamente de acordo com as condições que as pessoas da Atlânticoline, que
participaram em todas as reuniões, decidiram. O projeto do navio foi feito, em termos do layout do navio, foi
desenhado 100% à medida. Tudo o que a Atlânticoline pediu foi incluído no navio. Simplesmente, numa fase
posterior, aparecem outras pessoas ligadas à Atlânticoline que acham que as decisões da primeira fase não
estavam corretas e começam a fazer alterações e os Estaleiros de Viana do Castelo aceitam as alterações, é
um entendimento entre as duas partes.
O Sr. Nuno Sá Costa (PSD): — Sr.ª Presidente, peço uma tolerância muito breve.
Então, qual foi, no seu entender, a razão? Foi essa mudança de pessoas na Atlânticoline? Qual foi a razão
para a Atlânticoline ter rejeitado o navio, uma vez que, segundo o Sr. Engenheiro, tudo foi acordado e aceite
desde o início?
O Sr. Eng.º João Moita: — Olhe, na minha opinião, não posso contestar um acordo feito entre duas partes
que acordaram que o navio fosse rejeitado. Portanto, eu não sei quais foram as discussões entre as partes,
por que é que eles aceitaram, mas há um acordo entre as partes. Primeiro, litigaram e, depois, acordaram; se
acordaram, chegaram à conclusão de que o contrato deveria ser cancelado e que os Estaleiros devolveriam o
dinheiro.
Agora, há uma coisa que vou dizer: em termos da boa prática do shipping no mundo, uma situação
destas, que eu conheça, nunca aconteceu em nenhum país do mundo. Rejeitar um navio, de acordo
com aquilo que está dito oficialmente, porque o navio, nas provas de mar, deu 0,7 nós abaixo do valor
considerado mínimo, a partir do qual era possível rejeitar o navio, é uma situação de que não tenho
notícia que tenha acontecido em qualquer outra construção do mundo, e eu já participei na construção
de mais de 30 ou 40 navios e conheço os estaleiros praticamente todos, pois tive de construir navios
em todo o mundo. Nunca vi isso em lado algum, porque a questão de fundo é esta: qual era o prejuízo
para a Atlânticoline o facto de o navio ter uma velocidade de 0,7 nós abaixo da velocidade mínima
exigida? O normal seria a Atlânticoline, contabilizando o prejuízo e influência que isso possa ter,
promover uma discussão com o estaleiro para obter uma indemnização sobre essa matéria. Agora,
rejeitar um navio por esta circunstância é uma situação completamente nova. Mas as duas partes
acordaram, o que é que eu posso dizer?! Se as duas partes acordaram é porque chegaram a acordo,
tudo bem!”105
E em resposta ao Sr. Deputado Rui Paulo Figueiredo:
“O Sr. Rui Paulo Figueiredo (PS): — Na mesma linha do que tenho dito, pedindo-lhe para dar nomes às
pessoas, pergunto quem é que decidiu estas especificações algo excessivas, em termos de luxo, dos
camarotes, de casino, de infantário, de salão com pista de dança. Quem é que tomou essas decisões?
O Sr. Eng.º João Moita: — Olhe, vou dizer aquilo que eu acho, em função daquilo que fui assistindo.
Essas alterações são introduzidas a partir da altura, principalmente, que o Sr. Eng.º Nuno Lima é
designado como fiscal da construção. E, segundo a minha opinião, o Eng.º Nuno Lima não fazia nada sem,
obviamente, contactar, primeiro, a Administração da Atlânticoline e, segundo, o Sr. Secretário de Estado,
porque o Sr. Secretário de Estado era de facto a figura número um de todo este processo. Penso que as
decisões, as sugestões, podem ser do Eng.º Nuno Lima, mas as decisões que foram tomadas para fazer as
alterações aos navios são da Administração da Atlânticoline e do Secretário de Estado.
O Sr. Rui Paulo Figueiredo (PS): — Só para precisar, o Secretário Regional Duarte Ponte?
105
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 3 de junho de 2014, ex Consultor da Atlânticoline e da ENVC, Sr. Eng.º João Moita, págs. 24-25.
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O Sr. Eng.º João Moita: — Sim, o Secretário Regional Duarte Ponte era a pessoa de topo de todo o
processo. Quando tivemos as primeiras reuniões, o Sr. Secretário de Estado era de facto a pessoa que estava
no topo da gestão deste processo.
O Sr. Rui Paulo Figueiredo (PS): — O Sr. Secretário Regional Duarte Ponte, do que conhece dele, tem
alguma competência específica na matéria para fazer todas essas decisões? Ele tinha a noção das
implicações que isto tinha no cumprimento do contrato? Era alertado para isso por si, ou pelo Eng.º Nuno
Lima, ou pela Administração da Atlânticoline?
O Sr. Eng.º João Moita: — Nas reuniões que tínhamos com o Sr. Secretário de Estado, era em função das
decisões que eles tomavam. Quando íamos aos Açores, o Sr. Secretário de Estado estava, ou não, presente,
nós não reportávamos para o Sr. Secretário de Estado. E, portanto, eu não sei a competência do Sr.
Secretário de Estado, mas o Sr. Secretário de Estado tinha uma envolvente de pessoas. Eu penso que, para
ele tomar as decisões, não era necessário ser um especialista em shipping, ele tinha uma envolvente de
pessoas que lhe davam sugestões, e ele dizia «sim» ou «não». Digo eu, mas isto nunca se passou comigo. O
Sr. Secretário de Estado nunca me contactou a perguntar se tínhamos opinião neste ou naquele sentido, se se
podia fazer ou não se podia fazer.
O Sr. Rui Paulo Figueiredo (PS): — Isso eu já não sei! Mas tivemos aqui o Presidente do Conselho de
Administração da Atlânticoline que nos disse que o tinha contratado, a si, porque não tinha envolvente
nenhuma para tomar decisões, e que não eles eram especialistas.
Os Estaleiros Navais de Viana do Castelo, que também foram fazendo todas estas alterações, tinham a
noção de que, depois, com estas alterações, não iriam cumprir tudo o que estava contratualmente exigido?
O Sr. Eng.º João Moita: — Eu diria que deveriam ter. Deveriam ter! Se me está a perguntar, a mim, se eu,
como estaleiro, aceitei as alterações todas, tenho de assumir as minhas responsabilidades. Agora, se eu fosse
os Estaleiros, não aceitava. Porém, os Estaleiros aceitaram e, presumivelmente, assumem as suas
responsabilidades em função de terem aceitado todas essas alterações sem qualquer problema. Mas isso é
um problema dos Estaleiros e do armador.”106
E por último, em resposta ao Sr. Deputado António Filipe:
“ O Sr. António Filipe (PCP): — Sempre por acordo entre ambas as partes.
A certa altura referiu-nos que a Atlânticoline começou a introduzir possíveis alterações ao projeto (presumo
também que estas alterações já não fossem da sua responsabilidade, que não tenha tido envolvimento direto)
e que essas alterações foram aceites, presumimos, pelos Estaleiros.
Pergunto: tendo em conta a sua experiência no setor, é concebível que se possam introduzir alterações de
monta, e tanto foram de monta que vieram a estar na base da denúncia do contrato, sem que tudo isso fique
contratualmente assumido ou documentado?! É possível neste setor, a nível internacional, pela experiência
que tem, introduzir alterações que alterem substancialmente o contrato inicial sem que isso fique «preto no
branco», contratualmente assumido e com as responsabilidades, direitos e deveres de ambas as partes?!
O Sr. Eng.º João Moita: — Eu respondo de duas formas: primeiro, em teoria, não é possível. Ou seja,
qualquer estaleiro, em qualquer parte do mundo, que tenha um navio em construção e que o armador peça
alterações há duas coisas que são feitas: primeiro, é logo traduzido a escrito, é feita uma avaliação da
alteração e do respetivo custo, é informado o armador; depois, se essa alteração tem implicações técnicas,
essa informação é feita e pode ser registada pelo estaleiro, independentemente de o armador querer fazer
essa alteração. Portanto, esta é a situação normal.
Agora, no caso da construção do Atlântida, há, de facto, muitas alterações, que são feitas ao navio,
em que não há nada traduzido a escrito, nem há análise dos Estaleiros. Quer dizer, as situações são
discutidas e são decididas no dia-a-dia, como sendo coisas que não têm importância. E isto tem a ver
106
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 3 de junho de 2014, ex-Consultor da Atlânticoline e da ENVC, Sr. Eng.º João Moita, págs. 40-41.
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com as duas entidades, com os Estaleiros e com o armador. Quer dizer, eu não posso dizer se eles
fizeram bem ou se fizeram mal, porque é uma relação entre as duas partes. Se as duas partes acharam que
estava tudo bem, o que é que posso dizer?! Que estava mal!?
O Sr. António Filipe (PCP): — Nessa altura, qual era a sua relação com qualquer uma das partes neste
processo?
O Sr. Eng.º João Moita: — Como lhe disse, nós, em relação à Atlânticoline, fomos consultores deles para
dar opiniões técnicas até um determinado momento; em relação aos Estaleiros, não tínhamos relação direta
com os Estaleiros como prestador de serviços. Portanto, a Atlânticoline, a seguir, põe uma entidade, uma
pessoa a fiscalizar a construção e é essa pessoa que faz a relação direta com os Estaleiros, é quem discute
com os Estaleiros tudo e decide tudo, em nome da Atlânticoline, que é o superintendente que está responsável
pela fiscalização da construção.
O Sr. António Filipe (PCP): — Estava a par das alterações propostas pela Atlânticoline aos Estaleiros?
O Sr. Eng.º João Moita: — Eu estava a par e vou dizer porquê. Porque, durante todo este processo, houve,
em permanência, sempre protestos de todos os lados, e uma das questões que estava sempre em cima da
mesa (eu tinha uma relação não de prestação de serviços mas de apoio com a Petrobalt) era o atraso na
entrega dos desenhos, da construção… Havia um pressão muito grande, porque, como sabe, o concurso sai
com 565 dias, se não estou em erro, para construir o navio. Isto não é realista! Possível é, mas, para um
projeto de raiz, é uma situação muito complicada. E é também uma situação que os Estaleiros invocaram em
determinada altura, em função de o prazo de entrega ser extremamente apertado, para alterar os motores do
navio para os de diesel, porque para os motores que estavam inicialmente previstos, segundo dizem os
Estaleiros, não havia prazo de entrega para o navio poder ser acabado naquela data. Então, propôs ao
armador alterar os motores, entre outras coisas, em função do prazo de entrega, porque, de facto, o prazo de
entrega, para um navio que é um protótipo, é extremamente apertado.
Bom, havia sempre um claim relativamente aos desenhos, era o atraso, o atraso, o atraso, e, muitas vezes,
era-me pedido para interferir junto da Petrobalt, no sentido de pôr mais gente a trabalhar no processo, para
que os desenhos fossem entregues na hora.
Fui muitas vezes à Rússia com o armador, com os representantes do armador da Atlânticoline e
com os Estaleiros, etc., e, em todas as reuniões, o projetista dizia sempre: «Nós temos 80 pessoas a
trabalhar na empresa. Eu posso contratar mais pessoas para trabalhar na empresa. Agora, eu não
consigo responder em tempo ao meu cliente Estaleiros Navais de Viana do Castelo, porque todos os
dias me chegam alterações ao projeto. E os senhores percebam que uma pequena alteração ao projeto
obriga-me a mexer em não sei quantos desenhos, e os desenhos têm de ser aprovados pela sociedade
classificadora. Eu não posso aprovar desenhos! Se faço alterações, tenho de os submeter novamente
a aprovação, e isso demora semanas!», e este processo continuou até ao final.
Esta foi uma das questões importantíssimas pelos atrasos e por todo este processo, e não precisamos de
estar a falar em alterações de grande significado, como foi o caso, logo no início, de alterar o navio para, em
vez de queimar combustível pesado, passar a queimar diesel, que é uma alteração muito significativa em todo
o projeto. Obviamente que, em relação à conceção inicial, o projeto, quando os Estaleiros de Viana fazem esta
proposta e o armador aceita, muda completamente todo o layout da casa da máquina do navio, é outro navio.
Bom, isto foi logo no início, mas o problema foi tudo o que foi acontecendo ao longo da construção, mesmo a
nível de pequenas coisas.
O Sr. António Filipe (PCP): — O armador impunha alterações que, tanto quanto é do seu conhecimento, os
Estaleiros Navais de Viana aceitaram.
O Sr. Eng.º João Moita: —Tanto quanto é do meu conhecimento…
O Sr. António Filipe (PCP): — Aceitaram sem pestanejar.
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Como se sabe, a pedra de toque para a denúncia do contrato foi a alteração da velocidade. Essas
alterações foram suscetíveis de alterar a velocidade do navio?
Já agora faço a pergunta seguinte: em termos de navegação, qual é a relevância que atribui à alteração de
velocidade que foi invocada para a denúncia do contrato?
O Sr. Eng.º João Moita: — Começo a responder pelo fim, porque fiz aqui uma pequena análise em função
disso, uma vez que a única razão da rejeição do navio é a velocidade. Não há outra! Pelo menos, oficialmente,
é só essa.
Eu tenho aqui, e posso mostrar, a prova de mar do navio, a 2.ª prova de mar, segundo a qual o navio
dá (isto é um documento oficial da sociedade classificadora Germanischer Lloyd) 17,3 nós.
Considerando que o navio deu esta velocidade a 85% da potência, conforme era requerido (isto não foi
a 100% da potência mas, sim, a 85%), quer isto dizer que, se o armador aumentasse a potência de 85%
para 95%, eventualmente, o navio cumpriria a velocidade dos 18 nós, independentemente de aumentar
o consumo (esta já era uma questão de custo e era para discussão com os Estaleiros).
Neste contexto, que está aqui na prova de mar, para uma viagem de 10 horas, que eram viagens que
na altura praticamente não existiam nos Açores para este navio, o navio atrasava-se 7 milhas. Ou seja,
entre 18 e 17,3 o navio ficava a 7 milhas do destino, o que, em tempo, são 25 minutos.
A pergunta que eu faço é a seguinte: para um passageiro que vai fazer uma viagem de 10 horas
mais 25 minutos de demora na viagem é, de facto, uma grande inconveniência?!… Portanto, eu percebo
os passageiros…! Rejeitaram o navio, porque mais 25 minutos é muito tempo numa viagem de 10 horas! Vinte
e cinco minutos era uma coisa…! Portanto, o navio não podia ser aceite.
O Sr. António Filipe (PCP): — Retomo a pergunta inicial.
Em todo o caso, mesmo considerando a irrelevância prática dessa diferença de velocidades, as alterações
que foram introduzidas pela Atlânticoline foram suscetíveis de alterar a velocidade, influenciar a velocidade?
O Sr. Eng.º João Moita: — Olhe, foram muitas as alterações introduzidas ao navio, mas, principalmente (e
isto já foi dito aqui por alguém na Comissão de Inquérito), a diminuição de velocidade do navio tem
basicamente a ver com o aumento do peso. Não tem a ver com as formas, tem a ver com o aumento do peso,
porque o navio, no final, em relação ao projeto original, tem um calado (acho que sabe o que é o calado de um
navio) de cerca de 0,5 m a mais do que tinha na origem. Ou seja, na imersão, o navio foi para baixo mais 0,5
metro, e isto, obviamente, aumenta a resistência da água, porque a superfície é maior. E, portanto, esta
diminuição de velocidade tem, fundamentalmente, a ver com o aumento de peso. E é o aumento de calado do
navio que faz o aumento de peso e que dá origem a isso, e o aumento de peso, em relação ao cálculo original,
situa-se, mais ou menos, à volta de 250 t, é disto que estamos a falar mais ou menos, de duzentas e tal
toneladas.
Portanto, isto tem a ver com muitas coisas, e, quando digo que tem a ver com muitas coisas, refiro-me não
só ao armador, não só à Atlânticoline, não só ao projetista, não só às sociedades classificadoras mas também
à Autoridade Marítima Portuguesa. Porquê? Porque, quando o projeto é aprovado, há exigências da
Autoridade Marítima que obrigam a mexer substancialmente no projeto, em relação à compartimentação do
navio. E da parte da Autoridade Marítima Portuguesa existiu até determinado momento alguma indefinição nas
condições requeridas para o navio, em função da estabilidade e dos critérios de estabilidade, o que obrigou a
fazer alterações substanciais ao projeto. Portanto, este é um assunto que tem uma envolvência grande. Quer
dizer, é extraordinariamente difícil dizer «isto aconteceu objetivamente por esta razão», porque não há um
conjunto de circunstâncias na envolvente que deram origem a esta situação.
Agora, aquilo que não me parece razoável é rejeitar-se um navio (compensar é uma coisa, mas rejeitar-
se…) porque dá 0,7 nós a menos do que a velocidade mínima requerida no contrato. Isto é que não faz
sentido, aparentemente, mas, como as duas partes chegaram a acordo, eu não tenho nada a dizer.
O Sr. António Filipe (PCP): — Tenho de insistir na pergunta: encontra alguma explicação para que os
Estaleiros Navais de Viana tenham aceitado todas essas alterações e, depois, vejam a Atlânticoline denunciar
o contrato? E também não pestanejou, porque a informação que temos aqui é que achou que não tinha razão.
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Enfim, contra todas as evidências, contra pareceres de gabinetes jurídicos, técnicos, pareceres de toda a
natureza, a Administração dos Estaleiros Navais achou que a Atlânticoline tinha razão e, portanto, aceitou ficar
com o navio e ainda devolver 40 milhões, o que, enfim, obrigou a que houvesse, inclusivamente, um despacho
ministerial das Finanças e da Defesa, para que a empresa se pudesse endividar para pagar os 40 milhões.
Encontra alguma explicação razoável para esta atitude da parte dos Estaleiros, dos Estaleiros e de quem
os tutela, claro?
O Sr. Eng.º João Moita: — Eu não conhecendo o processo pelo lado de dentro, só vendo-o pelo lado de
fora e em função das notícias que vieram a público e das decisões que foram tomadas, é uma situação que,
eu diria, só pode acontecer num país chamado Portugal, porque é absolutamente fora de contexto que, para
um navio deste género e num negócio entre duas empresas públicas, não se chegue a um acordo para utilizar
o navio. Isto é uma coisa que ninguém no mundo consegue entender — e eu já falei com pessoas do mundo
inteiro. Ninguém consegue entender uma situação destas! Se o negócio fosse entre uma empresa privada e
uma empresa pública, ou entre duas empresas privadas, ainda se perceberia!”107
Na última audição na CPI, o Sr. Prof. Duarte José Botelho da Ponte, que foi Secretário Regional da
Economia do Governo Regional dos Açores, no período de 1996 a 2008, respondeu às perguntas efetuadas
pelos Srs. Deputados.
Na sua intervenção inicial explicou:
“(…) Na altura a que nos reportamos, eu tinha a tutela de um conjunto muito vasto de empresas, uma tutela
conjunta com a Secretaria das Finanças, entre as quais estava o Grupo EDA, o Grupo SATA, os Portos, a
Atlânticoline, a Ilhas de Valor (Sociedade Ilhas de Valor, SA), enfim, um conjunto muito vasto de empresas
com um volume de negócios muito elevado. Longe de mim conhecer os detalhes dos contratos, das adendas
aos contratos, dos trabalhos a mais, dos trabalhos a menos… Essa não era a minha missão, a minha missão
era saber o que ia ocorrendo, resolvendo o que era complicado, mas, basicamente, saber o que se estava a
passar, porque, quando era necessário, quando havia um problema concreto para resolver, falavam
comigo.”108
O Sr. Prof. Duarte José Botelho da Ponte, em resposta ao Sr. Deputado Agostinho Santa:
“ O Sr. Agostinho Santa (PS): —(…)
O problema que levanto é o seguinte: parece que, com o passar do tempo, os próprios Estaleiros Navais de
Viana do Castelo se foram apercebendo — aliás, há registos escritos nesse sentido — de que, afinal de
contas, a Petrobalt não estaria assim tão apetrechada tecnicamente e com recursos humanos que
permitissem, em tempo, no prazo, e com a qualidade que se pretendia, a execução desse anteprojeto, o que
depois pode ter «poluído» — passe a expressão — toda a restante construção.
O Sr. Prof. Dr. Duarte José Botelho da Ponte: — Exatamente, isto foi o nó górdio dos problemas do navio
Atlântida.
Há relatos, escritos em ata, de que a equipa projetista não respondia aos telefones, há relatos em ata de
que, em maio, o navio estava atrasado três meses. O projeto do navio Atlântida devia ficar pronto em abril,
segundo a proposta dos Estaleiros Navais de Viana do Castelo, e era possível.
Já agora, se me dão licença, acho que seria muito importante perceber bem esta situação. Estamos a
avançar, mas isto é importante
Depois da adjudicação, que ocorreu no dia 21 de setembro de 2006, foi acordado entre a Atlânticoline e os
Estaleiros Navais de Viana do Castelo que, no mais curto espaço de tempo, no máximo até ao final do ano de
2006, fossem acordadas as principais alterações ao projeto. Houve reuniões intensas de parte a parte para
perceber quais as modificações que ambas as partes aconselhariam para melhorar o projeto. Isso foi feito! Se
107
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 3 de junho de 2014, ex-Consultor da Atlânticoline e da ENVC, Sr. Eng.º João Moita, págs. 72-78. 108
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 4 de junho de 2014, ex-Secretário Regional da Economia do Governo Regional dos Açores, Sr.
Prof. Duarte José Botelho da Ponte, págs. 3-4.
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repararem bem, em 29 de dezembro de 2006, tanto para o navio maior, o Atlântida, como para o navio mais
pequeno, foi definido um conjunto de alterações, que foram completadas a 7 e 8 de janeiro com os segundos
aditamentos. Aí foi mostrada a nossa vontade de estabilizar o projeto, de dar à equipa projetista as principais
alterações e, depois, só houve alterações no final, em vinte e tal de agosto de 2008.
Portanto, as alterações pararam, não estivemos em constantes alterações, pelo menos da nossa parte isso
não aconteceu, o projeto foi estabilizado em 8 ou 9 de janeiro e, depois, houve a demora que houve.
A grande questão que se colocou aqui foi a seguinte: em abril, o projeto devia estar pronto e não estava;
em maio, em relatos da ata do Conselho de Administração da ENVC, diz-se que eles estavam atrasados três
meses — maio, junho, julho, agosto; eles tinham de mandar os documentos todos para o IPTM e para a
Lloyd’s Register e, no fundo, tudo se passava com se a culpa não fosse dos Estaleiros. Era sempre de
alguém… Era do projetista, que não respondia a tempo; era do IPTM, que não respondia a tempo; era da
Lloyd’s Register, que não respondia a tempo… Isto foi-se protelando, protelando.
E repare-se bem: quando é que começou a cortar o aço? No dia 27 de abril de 2007. Portanto, os
Estaleiros Navais de Viana do Castelo começaram a cortar o aço antes de terem o projeto estabilizado, antes
de terem o projeto aprovado. Isto é que foi o problema.
A Atlânticoline avisou com a devida antecedência dos perigos que eles estavam a correr, ao começarem a
cortar o aço sem terem a certeza de que o projeto era aprovado, se havia alterações propostas, por exemplo,
pelo IPTM, se a Lloyd’s Register aprovaria todos os projetos. E começaram a dilatar-se os prazos, atrasos
sobre atrasos, e aconteceu o que aconteceu.”109
E ainda sobres as alterações ao Atlântida:
“O Sr. Agostinho Santa (PS): — Esse é outro problema que queria suscitar-lhe. É que têm passado por
aqui pessoas que dizem que houve alterações, para além das que estão nos aditamentos, alterações de
monta, importantes, e que não foram passadas a escrito. Alguma vez soube de alguma situação destas?
O Sr. Prof. Dr. Duarte José Botelho da Ponte: — Não conheço nenhuma delas, Sr. Deputado, e acho que
nem deviam ter sido feitas. Se elas implicaram despesa, tinham de ir ao Tribunal de Contas, não há volta a
dar! Se não implicaram despesa, foram feitas pro bono pelos Estaleiros Navais de Viana do Castelo. Porquê?
Provavelmente, porque acharam que teriam cometido qualquer erro.”110
Sobre a questão da velocidade, principal argumento para a empresa pública açoriana Atlânticoline ter
recusado o navio, o Sr. Prof. Duarte Botelho da Ponte referiu que a administração dos ENVC foi avisada por
ele próprio que o ferry seria recusado caso a velocidade ficasse "abaixo da linha vermelha" definida
contratualmente, 19 nós:
“O Sr. Prof. Dr. Duarte José Botelho da Ponte: — Espere, porque é muito importante dizer isto.
Diz-se: «Ah, foram só 565 dias!» Mas 565 dias são 19 meses!
Havia uma cláusula no contrato que permitia prorrogar o prazo por um motivo devidamente justificado. E os
Estaleiros Navais, sempre que o pediram de uma forma cabal e competente… Não podiam era dizer: «O
projetista do Petrobalt não me responde aos telefonemas» — isso não podia ser considerado uma razão; «o
IPTM está a demorar muito tempo na aprovação dos projetos» também não podia ser, tinha de haver razões
objetivas. E nós, no navio maior, passámos de 565 dias para 740 dias. O navio maior deveria ter sido
construído em 2 anos e 10 dias. O prazo terminava no dia 30 de setembro de 2008, mas ele não foi concluído
no dia 30 de setembro de 2008. Passou-se outubro, novembro, dezembro, janeiro, fevereiro e só em março é
que foram feitas as provas de mar. Portanto, o navio teve, efetivamente, 2 anos e 6 meses.
Em relação ao prazo, os Estaleiros Navais de Viana do Castelo eram sempre assim: se lhes dávamos dois,
eles queriam três; se lhes dávamos três eles queriam quatro… Os Estaleiros Navais de Viana do Castelo
109
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 4 de junho de 2014, ex-Secretário Regional da Economia do Governo Regional dos Açores, Sr.
Prof. Duarte José Botelho da Ponte, págs. 11-13. 110
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 4 de junho de 2014, ex-Secretário Regional da Economia do Governo Regional dos Açores, Sr.
Prof. Duarte José Botelho da Ponte, pág. 26.
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gostavam de construir um navio sem prazo, se possível, e, se possível, sem velocidade limite, era o que
desse… No fim ver-se-ia e o cliente haveria de aceitar.
Temos de passar a ter, em todas as empresas, um regime de rigor. É para cumprir, cumpra-se! Assinaram
o contrato desta forma, têm de o cumprir!
Fomos tolerantes ao máximo! Os presidentes da Atlânticoline pagaram multas por terem permitido esses
adiamentos sem justificação objetiva. Só para ter uma ideia, o navio mais pequeno deveria ter sido construído
em 19 meses — nesse caso, houve, de facto, uma razão objetiva, que só foi detetada muito tarde e toda a
gente sabe por que é que só foi detetada muito tarde, ou seja, porque os Estaleiros Navais nem sequer tinham
equipa projetista para o navio mais pequeno —, mas os problemas que eles tiveram com a Petrobalt foram
tantos e tais que resolveram desistir do projeto do navio mais pequeno na Petrobalt e fazê-lo noutra empresa.
E, repare-se bem que o navio, que era para ser construído em 565 dias, viu o prazo prorrogado para 983 dias.
E, quando chegou o dia 31 de maio de 2009 — o prazo, os tais 983 dias, acabavam no dia 9 de junho de 2009
—, o navio nem sequer estava a meio, estava a 38% da sua construção.
Portanto, para os Estaleiros Navais de Viana do Castelo, os prazos não eram questão. Se era para ser feito
em três, podia fazer-se em quatro; se era para fazer em quatro, podia fazer-se em cinco; assinava-se o
contrato e, depois, se veria… Aquilo era Estado e o Estado, depois, entender-se-ia com a situação.
Quanto à razão da velocidade, alguém aqui falou da questão da velocidade e isto é extremamente
importante, pelo que gostaria que todos os Srs. Deputados prestassem um pouco de atenção.
Eu não sou especialista, mas percebo alguma coisa de engenharia, porque sou engenheiro. Há uma curva
da potência em relação à velocidade, ou seja, um navio, que dá 19 nós a 85%, se for a 100%, vai aos 21, 22
nós. Ele consegue dar mais, está na zona da linearidade, dou mais potência, ele aumenta a velocidade. Mas
um navio que está a dar 16,6 nós a 85%, quando se lhe aumenta a potência, já dá pouco mais, dá 17 e
qualquer coisa.
(…)
Qual é a implicação que isto tem no transporte interilhas? O transporte interilhas é um transporte em
cascata. Quando alguém sai de Santa Maria, vai para São Miguel e, depois, para a Terceira e, depois, para o
Faial e, depois, para a Graciosa, o atraso que o navio tenha num porto, porque entrou uma maca ou entrou
algo imprevisto e ele tem de demorar mais um quarto de hora ou meia hora, não consegue ser recuperado
durante a viagem, o navio já não tem capacidade de o recuperar. Mas, se eu tiver uma máquina com
capacidade de ir até aos 22 nós, dou 22 nós e ele chega ao porto a tempo e horas. E, no transporte marítimo
de passageiros, o cumprimento de horários é fundamental. Não é só o facto de dar uns minutos a mais ou a
menos — não vou entrar aqui em cálculos —, mas há, de facto, uma linha vermelha: até aos 18 nós,
aceitaríamos; abaixo disto não aceitaríamos.
E devo dizer aqui, de uma forma muito clara e muito objetiva, que, na semana anterior a ir-me embora,
tinha dúvidas em relação ao que estava a acontecer na Atlânticoline. A Atlânticoline dizia que o navio ia dar
18,6 nós e eu perguntava: «Os senhores têm a certeza?». Eles respondiam: «Temos! Foram feitos vários
estudos, o navio vai dar 18,6 nós». E eu perguntava: «O que é que eles estão a fazer?». E eles diziam: «Estão
a colocar 130 t no fundo do casco». E eu dizia: «Sr. Presidente da Atlânticoline, isto é o mesmo que carregar o
navio com 1300 passageiros e mantê-lo a navegar sempre com 1300 passageiros a bordo. Isto vai gastar
muito mais combustível». Telefonei para o Eng.º Navarro Machado para me certificar disto, para não ouvir de
uma só voz, porque eu tinha de fazer a transferência disto para o meu colega que viria a seguir, e disse-lhe:
«Sr. Engenheiro, tenho muitas dúvidas sobre o que o senhor está aí a fazer». E ele disse: «Estamos com
estudos, isto está certo, é seguro». Respondi-lhe: «Olhe, se isto vier abaixo dos 18 nós, o senhor corre o risco
de nós rejeitarmos o navio. Eu, se fosse a si, por medida de previdência, pegava no primeiro e segundo
andares e substituía o aço por alumínio, porque, assim, evitaria, de forma clara, colocar as tais 130 t no fundo
do casco. Assim, o senhor vai gastar mais 1 ou 2 milhões, mas vai ter a certeza de que nós aceitaremos o
navio, caso contrário, o senhor corre o risco extremo de esse navio não ser aceite e a razão, basicamente, é a
de que isto é como amarrar o peito de um corredor, um atleta, retirar-lhe um pulmão e dizer-lhe: ‘Agora tu vais
andar, mas não tens capacidade de respirar’». Não é só a velocidade em si, de cruzeiro, mas a capacidade de
recuperação. Eu posso ir aos 21, 22 nós, mas com aquele navio só posso ir aos 17 e qualquer coisa.
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Portanto, tínhamos traçado esta linha — esta linha vermelha estava traçada e estava no caderno de
encargos. O Tribunal de Contas iria logo dizer que não — «Como é que vocês alteraram isso?» — e, depois,
andaríamos a discutir a questão. Seria preferível vender esse navio a alguém que o pudesse comprar e para
quem a velocidade não fosse importante, como o era para nós, do que entregar isso aos Açores, com todas as
indemnizações que iam cair em cima. Se este navio fosse entregue aos Açores, iriam cair tantas
indemnizações que, se calhar, seria vendido por 20 milhões de euros. E, na altura, seria fácil vendê-lo por
esse preço cá fora, se tivessem sido rápidos neste processo.
Basicamente, é esta a minha opinião, mas isto ultrapassa o dia 17 de novembro. Esta é a minha opinião,
mas o que o Governo Regional, o meu sucessor fez, no meu entender, teve toda a razão.”111
e. Asfalteiros
Tendo sido divulgado pela comunicação social que se encontrava em curso a construção de dois navios
asfalteiros para a Venezuela, o Ministério da Defesa Nacional emitiu, em 2 de fevereiro de 2014, o seguinte
comunicado:
Na sequência das notícias publicadas sobre o contrato entre os ENVC, S.A. e a PDVSA para a construção
de dois navios asfalteiros, o Ministério da Defesa Nacional esclarece:
1. Neste momento, conforme definido durante a Comissão Mista de Acompanhamento Bilateral, decorrem
reuniões entre a EMPORDEF, ENVC e a PDVSA;
2. Qualquer cenário publicado na Comunicação Social sobre o desfecho destas reuniões é prematuro,
carece de análise e avaliação de todas as partes;
3. A construção dos dois navios asfalteiros não está diretamente relacionada com o futuro da empresa
ENVC, SA, que, como se sabe, encontra-se em processo de encerramento. 112
Sobre a temática dos asfalteiros, começa por se destacar a pergunta do Sr. Deputado Fernando Negrão ao
Sr. Ministro da Defesa Nacional:
“(…) Quanto aos asfalteiros, pergunto-lhe se no cumprimento do contrato para a construção dos asfalteiros
para a Venezuela, em fevereiro de 2011, foi feito um primeiro pagamento de cerca de 12 milhões de euros —
isto é um facto — e se esse montante foi todo ele utilizado na execução desse contrato. Qual o ponto da
situação, designadamente que diligências têm sido feitas pelo Sr. Ministro relativamente a este assunto?”113
Resposta do Sr. Ministro da Defesa Nacional, Dr. José Pedro Aguiar Branco:
“(…) Quanto aos asfalteiros, sim, houve um primeiro pagamento de 12 milhões de euros; sim, não foi
utilizado para o fim a que se destinava — só cerca de 3 milhões de euros é que foram despendidos para o fim
a que se destinavam e que era a compra de materiais para a execução, o resto foi utilizado noutros destinos.
Ponto da situação: foi possível, durante dois anos de negociação do contrato, recolocá-lo em cumprimento,
porque a partir do momento em que esse down payment foi feito e não foi usado para o fim a que destinava,
passou a estar numa situação de incumprimento e, como é óbvio, quando se está numa situação de
incumprimento, fica-se numa situação mais frágil do ponto de vista da renegociação. Mas foi possível
renegociar, foi possível recolocar em cumprimento, foi possível, por intermédio de verbas do Ministério da
Defesa Nacional, fazer a compra do fim dos objetos a que se destinava esse dinheiro, que era um dinheiro da
Venezuela — não é um dinheiro do erário público português, é um dinheiro da Venezuela! — e, neste
momento, o contrato está numa situação em que já há acordo com a PDVSA (Petróleos de Venezuela) no
sentido de haver a possibilidade de ceder a posição contratual para a EMPORDEF (Empresa Portuguesa de
Defesa) e de a EMPORDEF poder vir a subcontratar a execução do contrato nos termos que terão de ser
oportunamente indicados.
111
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 4 de junho de 2014, ex-Secretário Regional da Economia do Governo Regional dos Açores, Sr.
Prof. Duarte José Botelho da Ponte, págs. 28-32. 112
Extraído relatório DILP, Estaleiros Navais de Viana do Castelo, março de 2014. 113
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 11 de março de 2014, Sr. Ministro da Defesa Nacional, Dr. José Pedro Aguiar Branco, pág. 6,
sublinhado do relator.
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Portanto, foram feitas diligências no sentido de colocar em cumprimento um contrato que estava
incumprido na época em que este Governo tomou posse.114
Pergunta do Sr. Deputado António Filipe:
“(…) o Sr. Ministro acabou de reconhecer aquilo que já todos sabemos, ou seja, que os Estaleiros
receberam um adiantamento para construírem os asfalteiros, mas não construíram os asfalteiros. Que
responsabilidades é que foram apuradas por isso?
A administração dos Estaleiros foi nomeada por V. Ex.ª, pelo que lhe pergunto que atitude é que o Sr.
Ministro tomou quando se apercebeu de que os Estaleiros tinham recebido o dinheiro para construir os
asfalteiros e não construíram os asfalteiros. Responsabilizou alguém ou não?
Resposta do Sr. Ministro da Defesa Nacional, Dr. José Pedro Aguiar Branco:
“(…) Quanto ao adiantamento relativo aos asfalteiros, Sr. Deputado, a responsabilidade é a anteriori — e
daí esta Comissão, até para poder apurar essas responsabilidades —, ou seja, o adiantamento que foi feito foi
gasto antes de este Governo tomar posse, em situações que poderão ser apuradas. Ora, o que nós
pretendemos foi recolocar em cumprimento a situação contratual. Convenhamos, Sr. Deputado, que, para gerir
o erário público de uma forma mais cautelar em relação ao mesmo, antes de irmos apurar as
responsabilidades de quem gastou mal, temos é de tentar evitar que haja mais agravamento por essa decisão.
Por isso, a nossa preocupação foi, num campo muito exigente do ponto de vista financeiro, encontrar os
meios para devolver os 12 milhões de euros — e devolver, porque não é dinheiro nosso, é dinheiro da
Venezuela, e não foi fácil, num quadro que era muito exigente do ponto de vista financeiro. E, por via disso,
podemos estar em condições, como estamos hoje, de poder considerar esse contrato, porque, de outra forma,
nem sequer poderíamos a esta hora estar a tratar de eventual cessão da posição contratual, pois, pura e
simplesmente, já estaríamos em incumprimento e o Estado português não só teria de pagar a indemnização
como não teria condições para poder assegurar a execução do contrato.”115
Ainda sobre este assunto, perguntou a Sr. Deputada Otília Ferreira Gomes, ao Sr. Ministro da Defesa
Nacional, Dr. José Pedro Aguiar Branco:
“(…) porque é que a compra de aço relativa aos asfalteiros só foi feita muito recentemente e não logo à
data? Porque é que estes montantes para a compra de aço só agora foram «injetados» nos Estaleiros?
Porque é que isto só foi feito agora?”116
Resposta do Sr. Ministro da Defesa Nacional, Dr. José Pedro Aguiar Branco:
“(…) Refere a compra do aço para os asfalteiros e pergunta porque é que só aconteceu mais tarde. A
compra aconteceu e não foi, como disse, com injeção de capital; foi através de uma compra que o Ministério
da Defesa Nacional fez relativamente ao projeto do navio polivalente logístico, para que pudesse ficar na
posse do Estado um ativo importante, quando estava em curso a privatização ou, melhor, a reprivatização dos
Estaleiros. Ou seja, acontecendo (e se se coroasse com êxito) a reprivatização, o Estado quis assegurar que
esse projeto importante ficava na sua posse e não era um ativo que acompanhava a própria reprivatização.
Isto significa que, ao termos comprado — como lhe digo, com visto prévio do Tribunal de Contas, que
sancionou esta operação —, não injetámos dinheiro, mas comprámos, fizemos uma transação. Por via desse
dinheiro que entrou nos Estaleiros, foi possível, entre outras coisas, acabar o NPO (navio patrulha oceânico)
que estava em atraso há não sei quantos anos e, também, comprar o aço que era necessário para dar prova à
Venezuela, à PDVSA (Petróleos de Venezuela, S.A.), da boa-fé do Governo na devolução do dinheiro que era
deles —não é de um adiantamento feito por parte do Estado português.”117
114
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 11 de março de 2014, Sr. Ministro da Defesa Nacional, Dr. José Pedro Aguiar Branco, págs. 12-13. 115
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 11 de março de 2014, Sr. Ministro da Defesa Nacional, Dr. José Pedro Aguiar Branco, págs. 28-29. 116
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 11 de março de 2014, Sr. Ministro da Defesa Nacional, Dr. José Pedro Aguiar Branco, pág. 52. 117
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 11 de março de 2014, Sr. Ministro da Defesa Nacional, Dr. José Pedro Aguiar Branco, págs. 54-55.
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O Sr. Ministro da Defesa Nacional, Dr. José Pedro Aguiar Branco, esclareceu ainda a Sr.ª Deputada Carla
Cruz, sobre onde é que vão ser construídos os asfalteiros:
“(…) Onde é que vão ser construídos os asfalteiros? Ainda não sei, por uma simples razão: num primeiro
momento, o contrato que era preciso assegurar com a PDVSA é assegurar a posição da cessão contratual
para a empresa EMPORDEF (ou do seu universo) para que depois se possa subcontratar, e que isso se faça
em condições de essa situação ser, também ela, respeitável, no que diz respeito às obrigações da União
Europeia.
Portanto, Sr.ª Deputada, neste momento, é esta a situação que temos de assegurar.”118
Na 2.ª audição o Sr. Presidente do Conselho de Administração da Empordef, Dr. Rui Jorge de Carvalho
Vicente Ferreira, esclareceu o Sr. Deputado Jorge Fão, sobre as razões da impossibilidade de se arrancar
logo com a construção dos asfalteiros:
“(…) Completa falta de meios financeiros para o fazer. Tinha-se gasto o valor inicial da primeira prestação,
que correspondia a 10% dos dois navios, no valor de 12,9 milhões de euros. Não estou aqui a classificar se foi
boa ou má, porque com certeza que a administração que estava na época tinha dificuldades e tinha de
responder a muitas responsabilidades, mas no início da minha intervenção mostrei algumas delas e isso
passou-se poucos meses antes.
Portanto, com certeza que utilizou esses meios nas necessidades mais prementes e, provavelmente, se eu
lá estivesse teria acontecido o mesmo. Não me refiro a isso como crítica, apenas não existiam esses meios.
Portanto, não foi possível arrancar com a construção dos asfalteiros durante o ano de 2011 e 2012 por falta de
meios financeiros. Não.
O Sr. Jorge Fão (PS): — Não, porquê?
O Sr. Dr. Rui Jorge de Carvalho Vicente Ferreira: — A partir de janeiro de 2013, e com a regulação que
tinha sido feita no trimestre anterior dos contratos militares, tínhamos conseguido libertar-nos das multas e
penalidades das construções que estavam em atraso, tínhamos conseguido reequilibrar a relação com o
Estado e tivemos o privilégio nesse conjunto… E estou a falar numa perspetiva transversal de todos os
contratos, ou que foram concluídos (concluídos significa entregues), ou que foram revogados, ou ainda,
digamos, de todas as responsabilidades que nós tínhamos ou oportunidades de transacionar ativos.
Tivemos acesso, a vender ao Estado português, um ativo, que foi o projeto NPL — desculpem utilizar siglas
—, pelo valor de 25,5 milhões de euros. Essa circunstância possibilitou, no final do ano, portanto em janeiro de
2013, desbloquear diversas situações de grande dificuldade financeira que tínhamos e, por outro lado, iniciar a
recuperação do segundo NPO. Recordam-se de eu ter referido que este era até um dos objetivos pessoais, ou
seja, entregar à Marinha portuguesa essa construção militar que muita falta fazia, assim como aquelas que
não foram construídas.
Portanto, conseguimos, num prazo relativamente curto, concluir esse navio. Ao concluir o NPO, isto depois
são vasos comunicantes, enfim, conseguimos libertar garantias bancárias de um valor bastante relevante,
assim como com as revogações dos contratos existentes libertámos, no conjunto, muitos milhões de euros de
garantias bancárias. A partir de janeiro de 2013, quer com esses meios financeiros, quer com a libertação de
garantias bancárias, sem dúvida que passámos a ter uma outra capacidade de negociação de financiamento
junto da banca.
O Sr. Jorge Fão (PS): — Mas, mesmo assim, Sr. Presidente, não decidiram avançar com o início da
construção dos navios, tendo reunido, em princípio, algumas condições para o efeito. Porquê?
O Sr. Dr. Rui Jorge de Carvalho Vicente Ferreira: — Arrancámos imediatamente. Ou seja, o primeiro
processo, que implicava e que está no cronograma dos asfalteiros, dado que nos encontrávamos em completo
incumprimento e em risco de cancelamento do contrato, foi realizar as encomendas que correspondiam às
primeiras fases, às três fases subsequentes ao down payment, que era a segunda, a terceira e a quarta fases 118
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 11 de março de 2014, Sr. Ministro da Defesa Nacional, Dr. José Pedro Aguiar Branco, pág. 79.
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para encomendar a totalidade do aço para a construção dos navios e a totalidade dos sistemas de propulsão.
E assim fizemos.
Essas responsabilidades globais orçam muito próximo de 30 milhões de euros. Não responsabilidades
totalmente pagas, mas parcialmente pagas através de adiantamentos. Ou seja, na sua maturidade, quando os
motores, que são a última componente, forem fornecidos, atingirão cerca desse montante. Mas nós
conseguimos, na realidade, disponibilidades equivalentes ao adiantamento que nos permitiram arrancar com
esta atividade.
Por outro lado, para concluir a responsabilidade contratual, teríamos de cortar um mínimo de 10% do aço
do primeiro navio, o que realizámos. Recebemos o aço, a encomenda foi feita em 25 de abril de 2013 e foi
concluído o corte de 10% do aço por volta de setembro. Temos de concluir, em relação às últimas partidas de
aço que recebemos, os 10% correspondentes ao segundo navio, o que penso que realizaremos
proximamente.
Portanto, as atividades necessárias que conduzissem a cumprir e a colocar o contrato em cumprimento —
isso é que era fundamental perante a PDVSA, que tem sido um armador com uma grande paciência e uma
grande compreensão dos nossos problemas — foram de imediato iniciadas.
O Sr. Jorge Fão (PS): — Mas os Estaleiros Navais de Viana do Castelo vão ser encerrados… Aliás, já
estão encerrados; de direito, sê-lo-ão, seguramente, a curto prazo.
Tendo esse compromisso da construção, tendo comprado aço, tendo encomendado sistemas propulsores,
quem vai construir os navios? Ainda acredita que os navios vão ser construídos?
O Sr. Dr. Rui Jorge de Carvalho Vicente Ferreira: — A construção destes dois navios diz respeito a um
contrato no âmbito bilateral, ou seja, é um contrato que está na umbrela das relações Estado a Estado e o
Governo português tem sucessivamente, em todas as reuniões bilaterais — a última foi em meados de janeiro,
em Caracas, onde estive presente e com o privilégio de estar com o Sr. Vice-Primeiro-Ministro, que liderava a
comitiva —, reiterado o objetivo de cumprir esse contrato.
Portanto, a EMPORDEF e a administração dos Estaleiros têm feito tudo aquilo que está ao seu alcance, e
fizeram-no, nomeadamente desde janeiro de 2013 até esta altura, para colocar sempre o contrato em
cumprimento, independentemente das dificuldades que foram surgindo e utilizando todos os meios que
tiveram ao seu alcance.
É nesta linha que nos encontramos, sendo que temos alguns constrangimentos, nomeadamente a
liquidação da sociedade, mas isso não impedirá que, nos termos globais da operação, não seja colocada no
mercado, através da contratação pública, por aquilo que é a legislação portuguesa, a construção.
Portanto, perspetivamos, nesta altura, que o contrato passe dos Estaleiros de Viana do Castelo para uma
sociedade, ou para a EMPORDEF, ou para uma sociedade da EMPORDDEF, para o gerir. A partir dessa
sociedade, iremos dar continuidade à execução do mesmo, através de empreitadas e através dos
fornecimentos que são necessários para o cumprimento desse contrato.”119
E ainda sobre este assunto, pergunta o Sr. Deputado Abel Baptista:
“(…) Deixando de existir a empresa, esta não poderia continuar com a construção. Confirma que o Estado
português e a empresa PDVSA (Petróleos da Venezuela, SA) estão a trabalhar no sentido de que a
construção seja adjudicada, sendo a sua concretização transferida para a EMPORDEF, podendo depois esta
subcontratar essa construção?”120
Resposta do Sr. Presidente do Conselho de Administração da Empordef, Dr. Rui Jorge de Carvalho Vicente
Ferreira:
“(…) Esse é o estado do diálogo e da negociação que tem existido com a PDVSA Naval. Neste processo,
temos tido, para além do apoio do Governo português, também o apoio do Governo venezuelano e,
119
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 13 de março de 2014, Presidente do Conselho de Administração da EMPORDEF, Sr. Dr. Rui
Jorge de Carvalho Vicente Ferreira, págs. 39-42. 120
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 13 de março de 2014, Presidente do Conselho de Administração da EMPORDEF, Sr. Dr. Rui
Jorge de Carvalho Vicente Ferreira, pág. 56.
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nomeadamente, do Sr. Embaixador da Venezuela em Portugal, o Sr. General Lucas Rincón, que tem tido um
papel fundamental de facilitador, a desbloquear algumas dificuldades que têm surgido.”121
O Sr. Dr. Carlos Alberto Veiga Anjos, ex-Presidente do Conselho de Administração dos ENVC, entre
setembro de 2010 e junho de 2011, esclareceu o Sr. Deputado Eduardo Teixeira, sobre os asfalteiros.
O valor global do contrato dos asfalteiros, era de 128.9 milhões de euros, verificando-se em fevereiro de
2011 o pagamento da primeira tranche de 10%. Desse valor, só 3 milhões de euros, foram utilizados na
execução do contrato, tendo a Adminstração utilizado o restante valor para outras necessidades da empresa:
“ O Sr. Eduardo Teixeira (PSD): — São muitos meses, mas ouvimos aqui todos os ex-presidentes dizer que
muitos deles se foram embora porque não conseguiam ter previsão de entrega de navios.
Portanto, ao receber, depois de assinar o contrato, e o contrato foi assinado seis meses antes, foi-nos dito
que deveria começar-se a construir.
A pergunta que lhe faço é: para onde foram e onde foram gastos esses 13 milhões de euros, partindo do
princípio de que o custo do contrato é de 3 milhões e, portanto, onde foi gasto o resto do dinheiro e por que é
que não havia dinheiro para começar a construir o navio?
O Sr. Dr. Carlos Alberto Veiga Anjos: — Esse dinheiro deu entrada na empresa e lembro-me que, na
primeira vez que falei com o diretor financeiro sobre esse pagamento, foram dadas indicações para que esse
dinheiro pudesse ser posto numa conta e não ser gasto, a não ser para aquisições relacionadas com o navio.
Passados uns dias, o administrador dessa área veio dizer-me que era muito difícil pôr isso numa conta,
porque a empresa estava em mora com muitos pagamentos junto da banca e corria-se o risco de os bancos
ficarem com o dinheiro, pelo que até se pôs a hipótese de criar uma conta no estrangeiro para os bancos
nacionais não serem tentados a ficar com esse dinheiro.
Portanto, na impossibilidade de fazer isso, ficaram os Estaleiros com o dinheiro e depois, a seguir,
começaram a aparecer os salários para pagar, começaram a aparecer dívidas a fornecedores…
(…)
Portanto, depois, o dinheiro ficou nas contas da empresa e o dinheiro nas empresas entra e sai e
não há cofrezinhos particulares onde se ponha o dinheiro. Este é para as necessidades que a empresa
tem. Havia algumas aquisições que estavam definidas e que eventualmente…
Mas isso é muito fácil: é ir à tesouraria da empresa e os senhores mandarem fazer uma análise sobre onde
foi gasto o dinheiro, porque eu não lhe posso dizer nem sei como é que esse dinheiro foi gasto.”122
O Sr. Eng.º Jorge Camões, atual Presidente do Conselho de Administração da Estaleiros Navais de Viana
do Castelo e os restantes vogais do Conselho de Administração, responderam às perguntas do Sr. Deputado
Jorge Fão, sobre a temática dos asfalteiros:
“(…) O Sr. Dr. José Luís Serra (Vogal do Conselho de Administração dos Estaleiros Navais de Viana do
Castelo): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados, boa tarde.
É público e notório que a administração, nomeadamente a nossa diplomacia, tem conseguido, em
diversas ocasiões, com bastante esforço, manter um contrato em vigor como um ato absolutamente
atípico em mercado de construção naval. Para que ninguém fique com qualquer dúvida nesta sala,
numa ótica de mercado, este contrato, obviamente, já teria caído há muito tempo, e com
consequências significativas em matérias indemnizatórias, de credibilidade e de outra natureza.
Por essa situação característica, que é claramente atípica, foram várias as tentativas — e, até à data,
com sucesso — que evitaram o cancelamento do contrato.
Por isso, o que o Sr. Deputado refere quanto à coincidência de dois processos, nomeadamente do
processo de concessão e da aquisição de equipamentos e materiais principais do contrato, com
relativa proximidade, é mesmo isso: coincidência. E isso é fácil de explicar.
121
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 13 de março de 2014, Presidente do Conselho de Administração da EMPORDEF, Sr. Dr. Rui
Jorge de Carvalho Vicente Ferreira, pág. 56. 122
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 6 de maio de 2014, Presidente do Conselho de Administração dos ENVC no período de setembro
de 2010 a junho de 2011, Sr. Dr. Carlos Alberto Veiga Anjos, págs. 17-18.
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Nós, a dada altura, e apesar das dificuldades, não tínhamos outra opção. É que, após a justificação
e as reuniões diversas que fizemos com o cliente, chegou-se a um ponto em que teríamos de dar um
sinal claro e inequívoco de que o processo se iniciava. Esse sinal foi dado no mês de abril de 2013,
com a aquisição de uma percentagem do aço — cerca de 10% —, para dar cumprimento a um item
contratual, que era precisamente o corte de 10% de aço do primeiro navio.
E isso permitiu concretamente o quê? Cumprir um momento contratual (estamos a falar de um marco
físico) que permitia, perante o cliente, demonstrar que se tinha dado início ao cumprimento do contrato quanto
à produção.
Mas nós não poderíamos parar aí. E, quando refere essas datas, provavelmente o Sr. Deputado
compreenderá que, para a formalização, para os atos formais que refere, obviamente, há um período bastante
anterior em que é preciso negociar com os fornecedores em causa. Ora, essa negociação iniciou-se, se a
memória não me falha, algures pelo mês de agosto, e houve dois processos que, pelo valor de 5 milhões de
euros, tiveram de ser submetidos a visto prévio do Tribunal de Contas, o que veio a ocorrer, creio, no mês de
setembro.
Portanto, nesse momento, esses atos — em primeiro lugar, no mês de abril, o início do processo da
aquisição de 10% do aço para o primeiro navio e, posteriormente, a aquisição dos principais equipamentos e
materiais — permitiram demonstrar, como depois o viemos a fazer, junto do cliente, que o contrato estava,
como está, cumprido até ao quarto item, o que repõe a nossa responsabilidade como contraente naquele
contrato em cumprimento.
Depois, há outros factos supervenientes que nos obrigam obviamente a voltar às mesas de negociação
para tentar, outra vez e mais uma vez, renegociar o enquadramento do contrato — e refiro-me concretamente
a um dado importante, um dado estruturante, que foi exatamente esse processo, que o Sr. Deputado refere,
do concurso público para a subconcessão do estabelecimento que é hoje e que, como sabem, já foi entregue
ao vencedor desse concurso.”123
E ainda relativamente a este assunto:
“ O Sr. Dr. José Luís Serra: — Sr. Deputado, eu posso fornecer os dados globais, mas tenho alguma
dificuldade em situar-me quanto ao tempo. Neste momento, temos um valor total contratualizado — e refiro-me
concretamente aos materiais e aos equipamentos principais (e, repito, estes foram os procedimentos que
levámos a cabo, que pusemos no mercado e que encerrámos) — de 30,88 milhões de euros. Desses 31
milhões de euros (em números redondos), que acabo de referir, encontram-se pagos, à data, cerca de 12,8
milhões de euros. Está previsto para as próximas etapas, e dando cumprimento precisamente a estes
contratos… Como imaginam, comprar o sistema de propulsão e a máquina principal para dois navios desta
dimensão é um contrato negociado com um operador internacional, que também é conhecido, que é a MAN, e
o processo de pagamento está absolutamente diferido no tempo (refiro-me concretamente a cerca de ano e
meio). Portanto, foi feito o primeiro pagamento, mas estaremos, diria, nas próximas semanas, na iminência de
ter de continuar a fazer o programa de pagamentos previsto nesse contrato.
O Sr. Jorge Fão (PS): — Embora percebendo uma parte da questão, ou seja, a necessidade de
cumprimento dos itens para manter o contrato, a outra parte não se percebe. Quando se desenvolve este
processo, em termos de ata, em novembro de 2013, já estava adjudicada a subconcessão, ou seja, os
Estaleiros Navais de Viana do Castelo estavam em vias de liquidação e já não tinham terreno nem instalações
para fazer a construção. Ou seja, há aqui qualquer coisa que não entendo. Quer tecer alguma consideração
sobre o assunto?
O Sr. Dr. José Luís Serra: — Com certeza, Sr. Deputado, porque esta questão, para a administração do
Estaleiro, para além das orientações que recebia diretamente da holding EMPORDEF, SGPS, estava muito
clara. Era um contrato que o Estado português assumiu em 2010, no âmbito de relações bilaterais com um
123
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 7 de maio de 2014, atual Presidente do Conselho de Administração dos ENVC, Sr. Eng.º Jorge
Camões, e restantes vogais do Conselho de Administração, Sr. Dr. José Luís Serra, Sr. Eng.º Francisco Gallardo e Sr. Almirante Conde Baguinho, págs. 18-20, sublinhado do relator.
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país, que é a Venezuela, com o qual reconhecidamente existem interesses económicos e de outra natureza,
mas concretamente, neste caso, estamos a falar de matéria económica.
Relativamente a esse compromisso, a orientação que recebemos e à qual nos limitámos a dar
cumprimento foi a de que este contrato era para manter em vigor e todas as ações que a administração
entendesse tomar, quer do ponto de vista contratual quer do ponto de vista das negociações, eram no sentido
de dar cumprimento a este contrato.
O Sr. Deputado poderá perguntar-me: mas como é que conseguiram, em três anos, manter um contrato em
vigor? E relembro que o primeiro navio deveria ter sido entregue em fevereiro. Sr. Deputado, às vezes,
também faço essa pergunta a mim próprio. O facto é que ele se mantém em vigor.
Mas obviamente não queria deixar de manifestar aqui alguma preocupação que temos — e, nesta fase,
estamos em fase final de negociar a transferência do contrato —, porque, obviamente, o cliente, perante a
situação que o Sr. Deputado descreveu — e queria relembrar que isso não inviabiliza o cumprimento das
responsabilidades contratuais ao nível da representatividade de uma relação bilateral —, o que quer são dois
navios para transporte de asfalto. A forma como se construírem os navios, que naturalmente tem de ser no
território português, compete ao Estado português, compete ao instrumento, neste caso, às empresas ou à
empresa que o Estado português indicar (e já foi indicada), que deve materializar e concretizar a construção
desses navios e entregá-los.
Portanto, neste caso, e referi isso há pouco, o último elemento de negociação foi redefinir o enquadramento
em que esse contrato teria execução ao nível das responsabilidades de ambas as partes.
Foi possível, há cerca de um mês e meio, na última reunião que tivemos em Caracas, definir e
aprovar uma promessa de cedência do contrato, num quadro que não foi fácil, mas em que foi possível
alcançar esse acordo — acordo, esse, que está assinado por ambas as partes —, o qual define uma
série de condições impostas pelo cliente, para que esse contrato possa ser cedido e executado, sendo
uma das condições a de que essa empresa seja detida a 100% pelo Estado português, e acabou por ser
uma empresa detida a 100% pela EMPORDEF, SGPS.”124
E para finalizar:
“O Sr. Dr. José Luís Serra: — A informação é recente: foi autorizada a cedência do contrato a uma
empresa do grupo EMPORDEF que terá de alterar os seus estatutos, o seu objeto e, eventualmente, a
designação (mas isso, repito, não depende de nós), cuja designação é OGMA — Imobiliária e pertence, a
100%, à EMPORDEF, SGPS.”125
f. Programa de Contrapartidas
O Decreto-Lei n.º 154/2006, de 7 de agosto, aprovou o Regime Jurídico das Contrapartidas, definindo estas
como compensações acordadas entre o Estado Português e um fornecedor de material de defesa, suscetíveis
de contribuir para o desenvolvimento industrial da economia portuguesa e para o consequente aumento da
participação nacional na cadeia de valor associada aos equipamentos e tecnologias de defesa.
Com a transposição para o ordenamento jurídico nacional da Diretiva 2009/81/CE, do Parlamento Europeu
e do Conselho, de 13 de julho, e que alterou as Diretivas 2004/17/CE e 2004/18/CE, ambas do Parlamento
Europeu e do Conselho, de 31 de março, deixou de ser possível associar contratos de contrapartidas, diretas
ou indiretas, a contratos de aquisição de material de defesa.
O Regime Jurídico das Contrapartidas tornou-se assim incompatível com a disciplina jurídica aplicável à
contratação pública nos domínios da defesa e da segurança, razão pela qual se procede à revogação do
Decreto – Lei n.º 154/2006, de 7 de agosto.
124
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 7 de maio de 2014, atual Presidente do Conselho de Administração dos ENVC, Sr. Eng.º Jorge
Camões, e restantes vogais do Conselho de Administração, Sr. Dr. José Luís Serra, Sr. Eng.º Francisco Gallardo e Sr. Almirante Conde Baguinho, págs. 21-23. 125
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 7 de maio de 2014, atual Presidente do Conselho de Administração dos ENVC, Sr. Eng.º Jorge
Camões, e restantes vogais do Conselho de Administração, Sr. Dr. José Luís Serra, Sr. Eng.º Francisco Gallardo e Sr. Almirante Conde Baguinho, pág. 27.
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O Decreto – Lei 105/2011, de 6 de Outubro, aprovou ainda um regime transitório aplicável aos contratos de
contrapartidas já celebrados, e em execução, entre o Estado Português e os vários fornecedores de material
de defesa, cujos efeitos se extinguem com a cessação do último contrato.
No âmbito da aquisição de dois submarinos pela Marinha Portuguesa a um consórcio Alemão, este
assumiu a obrigação de prestar um determinado programa de contrapartidas, nomedamente para a ENVC,
que envolviam a colocação de encomendas de construção naval, a transferência de tecnologia de projeto e a
transferência de equipamentos de um estaleiro Alemão.
Pergunta o Sr. Deputado António Filipe, ao Sr. Ministro da Defesa Nacional:
“(…) Pela aquisição dos submarinos, por parte do Estado português, os Estaleiros Navais de Viana do
Castelo beneficiariam de contrapartidas no valor de 632 milhões de euros. Beneficiaram de alguns
equipamentos, considerados sobreavaliados, no valor de 232 milhões, salvo erro, mas posso precisar; em todo
o caso, o que se sabe é que pelo menos 400 milhões de euros de contrapartidas nunca foram prestados.
Pergunto: o que é que o Governo fez para recuperar essas contrapartidas, para além de uma trapalhada
que envolveria um suposto hotel no Algarve, que, depois, enfim, também ficou em nada?! Gostaria de saber o
que o Governo fez, para além de extinguir a Comissão Permanente de Contrapartidas, para que os Estaleiros
beneficiassem daquilo que tinha sido contratualmente assumido pelo Estado português?”126
Resposta do Sr. Ministro da Defesa Nacional, Dr. José Pedro Aguiar Branco:
“(…) Relativamente às contrapartidas pela aquisição dos submarinos, Sr. Deputado, quando este Governo
tomou posse, as contrapartidas não tinham sido executadas durante o período em que poderiam ter sido
executadas. É porque não podemos esquecer que, entre 2005 e 2011, poderia ter sido exigida a execução das
contrapartidas, de modo a que não se chegasse a 2011 num quadro em que, em relação às contrapartidas dos
submarinos, estavam executados, salvo erro, cerca de 30% do mesmo.
Ora, Sr. Deputado, não era num momento em que estávamos com um programa de ajustamento financeiro
e em que estávamos numa situação de terminus relativamente às contrapartidas — porque, salvo erro, até
dezembro de 2012, estaria para terminar a possibilidade de execução das contrapartidas, e era impossível
negociar, numa situação que ainda por cima tinha uma natureza de litígio, como se sabe, com a Ferrostaal —
que seria possível — aliás, foi impossível — negociar contrapartidas relativamente àquilo que poderia ser
afetado aos Estaleiros Navais de Viana do Castelo.”127
Na 2.ª audição, o Sr. Presidente do Conselho de Administração da Empordef, Dr. Rui Jorge de Carvalho
Vicente Ferreira, respondeu ainda à Sr.ª Deputada Carla Cruz, sobre o programa de contrapartidas:
“(…) A Sr.ª Carla Cruz (PCP): — Relativamente às contrapartidas aos Estaleiros Navais de Viana do
Castelo pela compra dos submarinos, o que é que o acionista fez no sentido de conseguir que as
contrapartidas, que estavam estabelecidas aquando da compra dos submarinos, fossem cumpridas?
O Sr. Dr. Rui Jorge de Carvalho Vicente Ferreira: — Como respondi numa reunião da Comissão de Defesa
Nacional, o tema de contrapartidas não é matéria que eu conheça aprofundadamente e essas questões de
contrapartidas, para mim, são muito remotas.
Portanto, estamos a falar de atos de gestão de 2004/2005, sobre contrapartidas vindas com origem no
Estaleiro Flender, que faliu, na Alemanha, de 14 construções, que aqui estão referidas no mapa, no valor de
306 milhões… Mas, para mim, isso é tudo histórico. Esta administração não teve qualquer intervenção nesses
aspetos de benefícios de contrapartidas, nem lhe competia intervir em relação às situações anteriores. Aquilo
que posso dizer é o que está neste resumo, ou seja, que os Estaleiros tiveram no passado muitos milhões de
euros de prejuízos na construção dos navios que faziam parte das contrapartidas. Essa é a realidade que
encontrámos e que é histórica.
Por outro lado, vemos também uma outra realidade: é que, em 2010, a administração foi obrigada a, para
sanear as suas contas e para, digamos, aplicar os bons critérios valorimétricos, corrigir a avaliação dos seus
126
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 11 de março de 2014, Sr. Ministro da Defesa Nacional, Dr. José Pedro Aguiar Branco, pág. 22. 127
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 11 de março de 2014, Sr. Ministro da Defesa Nacional, Dr. José Pedro Aguiar Branco, págs. 27-28.
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ativos, e daí a perda de capitais próprios que tem. Recordo que existiram 250 milhões de contrapartidas de
equipamentos que entraram nos Estaleiros valorizados pela Comissão Permanente de Contrapartidas e que,
depois, sofreram imparidades, vamos dizer assim, cortes no seu valor, que a administração em 2010 teve de
fazer, e, com certeza, justificadamente, para ter umas contas completamente saneadas que preparassem
medidas.”128
E ainda acrescenta:
“(…) Aquilo que conheço de contrapartidas eram 14 construções que foram realizadas, o que deu um
prejuízo tremendo. Queríamos nós mais? Creio que há muito tempo, há vários anos, que as administrações
anteriores abandonaram essa metodologia, ou seja, afundar a situação económica dos Estaleiros construindo
com mais prejuízo. Já não se faziam há muito tempo e era completamente contra os nossos princípios
contratualizar benefícios, fossem eles quais fossem, que representassem ónus e encargos para os Estaleiros.
Portanto, relativamente a construções, o assunto estava encerrado há muito tempo e a Comissão
Permanente de Contrapartidas tem no seu relatório o que havia de fazer.”129
Na audição com a Comissão de Trabalhadores dos Estaleiros Navais de Viana do Castelo, com os Srs.
António Costa e Abel Viana, coordenador e representante da referida Comissão, também responderam sobre
contrapartidas ao Sr. Deputado Abel Baptista:
“(…) Refere o Sr. Inspetor-Geral das Finanças, Dr. José Leite Martins, na folha 43/79, que, no âmbito das
contrapartidas da aquisição dos dois submarinos, adquiridos pelo Ministro Paulo Portas, os Estaleiros teriam
direito a 638 milhões de euros, nesse pacote, repito, 638 milhões de euros. E isto da seguinte forma: uma
parte seria a transferência dos estaleiros navais da Flender, da Alemanha, para Viana do Castelo, que veio a
concretizar-se e está lá em Viana do Castelo muita sucata. Realmente, foi montada uma nave que é uma
mais-valia para a empresa, mas, infelizmente, temos lá muita sucata para deitar fora e volto a referir um
pormenor muito importante.
Esse material que chegou aos Estaleiros Navais de Viana do Castelo a partir de 2003 ou 2004 foi avaliado
em 250 milhões de euros. Em 2009, ou 2008, não posso precisar, a administração da altura — não sei se foi a
presidida pelo Dr. Jorge Rolo —, através de uma consultora externa, mandou fazer uma auditoria a esse
material que chegou e foi-lhe dado o valor de 48 milhões de euros. Estamos a falar de uma contrapartida que
devia funcionar no bom sentido para os Estaleiros e que ainda veio agravar mais a nossa situação. Porquê?
Porque entrou lá pelo valor de 250 milhões e, depois, passados uns anos, veio a verificar-se que valia 48
milhões de euros.
Mas há aqui outra coisa ainda mais importante, que faz parte desse relatório da Inspeção-Geral de
Finanças, que é a seguinte: aí diz-se que, em termos de encomendas pelo consórcio alemão a realizar nos
Estaleiros Navais de Viana do Castelo, teriam de ser feitas um total de 383 milhões de euros. Não posso
precisar, mas penso que é isso.
A Comissão de Acompanhamento de Contrapartidas que existia apenas validou, em termos de
encomendas de construções que foram realizadas aos estaleiros, 118 milhões. Faltam realizar encomendas
aos Estaleiros Navais de Viana do Castelo, pelo consórcio alemão, no valor de 200 milhões de euros. Sr.
Deputado, com 200 milhões de euros em navios tínhamos muito trabalho!”130
O Sr. Dr. Fernando Geraldes, Presidente do Conselho de Administração dos ENVC, entre abril de 2004 e
março de 2007, respondeu sobre a temática das contrapartidas ao Sr. Deputado Abel Baptista:
“(…) Sei que, concretamente ao abrigo do programa de contrapartidas, que o Sr. Deputado mencionou, a
empresa teve encomendas de embarcações de porta-contentores. Não sei quantos é que fez, mas terá feito
128
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 13 de março de 2014, Presidente do Conselho de Administração da EMPORDEF, Sr. Dr. Rui
Jorge de Carvalho Vicente Ferreira, págs. 84-85. 129
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 13 de março de 2014, Presidente do Conselho de Administração da EMPORDEF, Sr. Dr. Rui
Jorge de Carvalho Vicente Ferreira, págs. 86-87. 130
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 26 de março de 2014, coordenador e representante da Comissão de Trabalhadores de Viana do
Castelo, Srs. António Costa e Abel Viana, págs. 49-50.
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seguramente uns 4 ou 6. Não sei qual foi o valor que isso importou, não me recordo. Sei que cada porta-
contentor devia rondar os 20 milhões de euros e, portanto, honestamente, não sei quantos fez.
Quanto ao estaleiro Flender, foi o que acabei de mencionar quando há pouco respondi ao Sr. Deputado.
Quanto à transferência de tecnologia, penso que o Sr. Deputado devia estar a referir-se ao desenho básico
do navio polivalente logístico — penso que era isso. Eram os desenhos básicos do navio polivalente logístico.
Aliás, durante algum tempo, tivemos um engenheiro deslocado de Viana do Castelo a tratar exatamente desse
assunto. Mas, se não me falha a memória, eram os desenhos básicos, ou o projeto básico, melhor dito, penso
que é assim, do navio polivalente logístico.
Quanto ao estaleiro Flender, a empresa comprou-o por 1 €, mandou que ele fosse avaliado pela American
Appraisal, o que permitiu incorporar isso e retirar a empresa da falência técnica, como acabei de mencionar, e
não foram só esses ativos, mas outros. Estamos a falar de — 48 milhões mais 20 milhões — 68 milhões. Os
ativos deviam valer uns setenta e qualquer coisa milhões de euros. Portanto, o capital próprio deve ter ficado
positivo em muito pouco.
Quanto às encomendas dos porta-contentores, não me recordo quantos é que foram. Celebrei para aí
quatro contratos desses. Mas se houve mais, francamente não sei. Se esse valor foi cumprido ou não
francamente, também não tenho essa informação.”131
O Sr. Eng.º Arnaldo Figueiroa Machado, Presidente do Conselho de Administração dos ENVC, entre abril
de 2007 e dezembro de 2008, esclareceu a Sr.ª Deputada Carla Cruz, sobre as contrapartidas:
“ (…) No período em que esteve nos Estaleiros, o que é que nos pode dizer relativamente a esses
equipamentos e a esses materiais das contrapartidas dos Estaleiros Navais de Viana do Castelo?
O Sr. Eng.º Arnaldo Pedro Figueirôa Navarro Machado: — Tentámos aproveitar, com pouco dinheiro, o que
havia no estaleiro. Havia, salvo erro, dois guindastes para montar e montámos dois guindastes e, depois,
montámos uma oficina enorme, que julgo que ainda lá está, e que, quando eu saí, estaria para aí a 70%.
Montámos essa oficina com pessoal nosso. Ou seja, sempre que havia pessoal no desemprego, era esse
pessoal que ia montar a oficina, não contratámos ninguém para montar uma oficina.
A oficina é muito grande. Era uma oficina que, na altura, eu imaginava que podia fazer muto jeito ao
estaleiro exatamente por causa da pluviosidade e de haver muitos espaços não cobertos. A oficina era, e é,
muito grande e, pelo menos durante esse ano e meio, construímos praticamente a oficina toda. Faltava,
depois, penso, montar caminhos de rolamento e pontes rolantes, que também faziam parte do pacote que
tinha vindo do estaleiro. Penso que essa oficina poderia fazer muito jeito ao estaleiro.
Portanto, fizemos tudo o que pudemos fazer sem gastar dinheiro porque não havia dinheiro para gastar.
Montámos dois guindastes — estes não foi com a «prata da casa», mas eram duas coisas relativamente mais
baratas de fazer e o guindaste é uma coisa que faz sempre muito jeito aos estaleiros —, pois por mais
guindastes que tenham, têm sempre falta de guindastes.”132
O Sr. Dr. António Jorge Garcia Rolo, Presidente do Conselho de Administração dos ENVC, no período de
2009 a 2010, esclarece o Sr. Deputado Rui Paulo Figueiredo, sobre o programa de contrapartidas:
“(…) Quanto ao problema das contrapartidas, gostaria de dizer o seguinte: como reparou, eu trouxe aqui a
história da nave coberta, não houve mais ninguém. O Eng.º Navarro Machado começou-a, mas quem pegou a
sério nisso fui eu e disse: «Não, nós temos de aumentar a competitividade. Se temos aqui o equipamento da
Flender, não vai ficar armazenado», e havia também uma parte que estava na Alemanha e que mandámos vir,
porque estarmos a pagar aluguer, não! Sabíamos perfeitamente que a nave coberta ia aumentar as condições
de competitividade da empresa. A mim, fez-me confusão mais ninguém, depois de mim, se ter preocupado em
completar essa obra, a não ser que já estivessem a pensar fechar a empresa, porque a nave coberta e a linha
de painéis eram importantíssimos.
131
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 29 de abril de 2014, Presidente do Conselho de Administração da ENVC de 2004 a 2007, Sr. Dr.
Manuel Fernando Geraldes, págs. 30-31. 132
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 29 de abril de 2014, Presidente do Conselho de Administração dos ENVC no período de 2007 a
2009, Sr. Eng.º Arnaldo Pedro Figueirôa Navarro Machado, págs. 8-9.
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Acho estranho que o Dr. Portas, na altura, tivesse trazido este equipamento, para estar não sei quantos
anos para alguém pegar nele a sério. Ou, então, não acreditavam… O Dr. Paulo Portas, ou alguém que o
sugeriu, mandou para lá o equipamento só para estar estacionado? Havia, realmente, capacidade para isso.
Eu fui o primeiro a pegar nele a sério, depois, não sei o que é que fizeram, mas faltava a linha de painéis. Isto,
em relação a uma das partes.
Em relação aos navios (slide 48), são muitos e foram muito importantes. Tinham a vantagem de ser aquele
segmento em que a empresa nem tinha grande dificuldade técnica. Começaram a fazer aquilo e era como
«entrar o porco e sair a salsicha». Foi pena não terem completado os três navios que faltavam, mas, se não
fosse este contrato de contrapartidas, os Estaleiros Navais de Viana do Castelo tinham fechado em
2005/2006, não tenho qualquer dúvida. Este contrato foi muito importante, a perder dinheiro, com certeza, mas
esse é outro problema. Então, por que é que aceitaram? Como é que podiam reduzir os custos?”133
7. Averiguação do modo como o Governo tem acompanhado junto da Comissão Europeia o
desenvolvimento do processo relativo ao procedimento pendente relativo à execução da política de
concorrência – auxílio estatal a favor dos ENVC, SA, e das circunstâncias e os termos em que foi
decidida a subconcessão da empresa ENVC.
a. Planos de reestruturação
A recorrente deficitária situação financeira da ENVC, conduziu a que sistematicamente se elaborassem
planos de reestruturação, para viabilização da empresa. Dá-se particular ênfase aos planos de reestruturação
elaborados em 2005 e 2010, por terem sido os mais focados nas audições.
Plano de reestruturação de 2005
O Sr. Ministro da Defesa Nacional, Dr. José Pedro Aguiar Branco, responde sobre este tema ao Sr.
Deputado Fernando Negrão:
“(…) Pergunta-me o Sr. Deputado se em 2005 houve um processo de restruturação da empresa. Aquilo de
que nós temos conhecimento é que, por intermédio de uma auditoria que foi feita pela Inspeção-Geral de
Finanças em 2009, foi referido que houve, efetivamente, esse projeto ou esse plano de restruturação, mas que
não foi concluído, ou seja, era uma matéria que, concluída teoricamente, poderia justificar as ajudas que
tinham sido concedidas. Mas não foi concluída, como resulta da auditoria feita pela Inspeção-Geral de
Finanças”.134
Na 2.ª audição, o Sr. Presidente do Conselho de Administração da Empordef, Dr. Rui Jorge de Carvalho
Vicente Ferreira, em resposta ao Sr. Deputado Afonso Oliveira, afirma:
“(…) Portanto, foram preconizadas diferentes medidas, principalmente nos anos de 2005 e de 2009, a
realidade é que não foram aplicadas ou, portanto, não houve oportunidade… Não consigo dizer quais as
razões, mas não vi medidas de gestão, naquilo que li, e admito que não tenha lido tudo, porque são muitos
anos, portanto não houve condições ou, pelo menos, não foram tomadas medidas visíveis na estrutura da
empresa.”135
O Sr. Dr. Fernando Geraldes, Presidente do Conselho de Administração dos ENVC, entre abril de 2004 e
março de 2007, ouvido na CPI, esclareceu as perguntas efetuadas pelos Srs. Deputados, relativas à
reestruturação definida em 2005:
133
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 30 de abril de 2014, Presidente do Conselho de Administração dos ENVC no período de 2009 a
2010, Sr. Dr. António Jorge Garcia Rolo, págs. 112-113. 134
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 11 de março de 2014, Sr. Ministro da Defesa Nacional, Dr. José Pedro Aguiar Branco, pág. 11. 135
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 13 de março de 2014, Presidente do Conselho de Administração da EMPORDEF, Sr. Dr. Rui
Jorge de Carvalho Vicente Ferreira, pág. 16.
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“O Sr. Abel Baptista (CDS-PP): — Uma das críticas constantes da Inspeção-Geral de Finanças no âmbito
da auditoria financeira que fez aos Estaleiros Navais de Viana do Castelo foi pelo facto de não ter avançado ou
de não ter sido completada a reestruturação, definida em 2005, dos Estaleiros Navais de Viana do Castelo,
com base no estudo elaborado pelo conselho de administração a que o Sr. Doutor estava ligado, com o apoio
de uma consultora do BPI. São apontadas várias questões do estudo, que depois não foram implementadas.
O Sr. Doutor é capaz de nos recordar os motivos pelos quais essa reestruturação acabou por não ser
implementada?
O Sr. Dr. Fernando Manuel Geraldes: — O único motivo por que esse plano não foi apresentado foi pela
alteração estratégica que o acionista EMPORDEF decidiu tomar. Decidiu seguir uma estratégia no sentido de
tentar financiar a empresa diretamente através do Ministério das Finanças e não através do que estava
estabelecido, com o apoio do BPI, nesse programa de reestruturação. Por acaso, esse programa estava muito
bem feito. A empresa era financiada, como eu há pouco disse, com as obras que estavam na Lei de
Programação Militar, nomeadamente os patrulhões, que permitam que a empresa foi financiada por essa via.
Portanto, fugia a qualquer tipo de questão mais melindrosa de financiamentos à empresa e era sustentável.
Por que é que, depois, a EMPORDEF decidiu mudar de estratégia — e esse foi um aspeto que levou à
saída do Meira Fernandes —, Sr. Deputado, é uma pergunta a que sinceramente não lhe sei responder. Eu
próprio perguntei, disseram-me que a melhor forma era assim e, portanto, foi a forma que se entendeu
seguir.”136
Plano de reestruturação de 2010 –Projeto “icebreaker”
O Sr. Ministro da Defesa Nacional, Dr. José Pedro Aguiar Branco, responde sobre este tema ao Sr.
Deputado Fernando Negrão:
“(…) Em 2010, havia um plano de restruturação — expresso num documento de 2011, que esteve no
Ministério da Defesa e guardado entre fevereiro de 2011 até à altura das eleições — que tinha sido feito por
uma empresa de consultoria, solicitada para o efeito. Esse plano de restruturação, conhecido já depois do
resultado das eleições, apontava para uma necessidade de se rever o plano ou, melhor, quero dizer que o
plano de restruturação apontava para a necessidade de injeção de capital suplementar. Por parte do Ministério
das Finanças da época foi pedido para se refazer o plano, na medida em que ele sobrestimava as receitas e
subestimava as despesas, por isso não dava fiabilidade para que pudesse ser considerado pelo Governo. Isto
consta de um despacho do Secretário de Estado Costa Pina elaborado à época e sufragado também pelo
Secretário de Estado da Defesa Marcos Perestrello. Por isso, desse plano de restruturação, a única coisa que
restava era o despedimento dos 420 trabalhadores e não algo que tivesse a ver com a própria restruturação
da empresa.”137
Em relação à situação do plano de reestruturação ter sido suspenso, o Sr. Ministro da Defesa Nacional, Dr.
José Pedro Aguiar Branco, responde ao Sr. Deputado Jorge Fão:
“(…) Sobre suspender o plano de reestruturação de 2011, Sr. Deputado, quero dizer-lhe que esse plano
esteve na gaveta do anterior ministro entre janeiro ou fevereiro de 2011 e o momento das eleições, ou seja,
esteve seis meses na gaveta do Sr. Ministro sem lhe dar andamento e só se lembraram dele depois de terem
perdido as eleições.
Aliás, o despacho do Sr. Secretário de Estado também só veio depois de sabido o resultado eleitoral… ou
na véspera, mas foi por aí…
(…)
Para além de o próprio Governo reconhecer por despacho que havia sobrestimação dos custos e
subestimação das receitas, ou seja, não havia sustentabilidade no plano, as próprias linhas gerais do plano
136
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 29 de abril de 2014, Presidente do Conselho de Administração da ENVC de 2004 a 2007, Sr. Dr.
Manuel Fernando Geraldes, págs. 26-27. 137
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 11 de março de 2014, Sr. Ministro da Defesa Nacional, Dr. José Pedro Aguiar Branco, pág. 12
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mostram que esse plano era impossível no quadro, inclusivamente, de o programa de ajustamento financeiro
ser executado. Porquê?
Vou relembrar as linhas gerais do plano: despedimento de mais de 50% dos trabalhadores; construção
integral da carteira de encomendas, nomeadamente as militares, mais de 300 milhões de euros; e injeção de
capital — 100 milhões de euros.
Sr. Deputado, estas são as linhas gerais do plano de reestruturação. Se o senhor fosse Ministro da Defesa
em julho de 2011 com o programa de ajustamento financeiro e com o País na pré-bancarrota e se tivesse na
frente um plano de reestruturação para avaliar, programa esse que o próprio Governo anterior dizia que não
era sustentável e tem como linhas mestras as que eu acabei de referir,…”138
Na 2.ª audição, o Sr. Presidente do Conselho de Administração da Empordef, Dr. Rui Jorge de Carvalho
Vicente Ferreira, em resposta ao Sr. Deputado Afonso Oliveira, sobre o plano de reestruturação de 2011,
esclarece:
“(…) Como referi, o rumo não era aplicável porque a carteira militar de encomendas não podia ser
construída. Mas ao nível do modelo — e o modelo que foi adotado na altura, tanto quanto eu entendo, porque
só foi aplicado a primeira fase… Aquilo que o Sr. Deputado acabou de dizer é a primeira fase de um processo.
O processo de refundação previa reestruturações sucessivas e até a criação de uma nova empresa, para onde
seriam transferidos os trabalhadores em novas condições — é para aí que o estudo aponta, e o suporte LCA
Advogados vai nesse sentido —, o que visava a privatização dessa nova empresa onde se apontava que
seriam necessários cerca de 100 milhões de euros de fundos públicos para financiar todo o processo.
A primeira fase foi, de facto, a dos recursos humanos e referia o estudo que havia uma expetativa de uma
receita de cerca de 90 milhões no final. Daí o equilíbrio daria cerca de 10 milhões na operação. Mas, no
contexto económico, 10 milhões não são relevantes. O que era preciso era atingir esse objetivo.
Porém, o principal problema é que os pressupostos do estudo não eram executáveis, apesar da
bondade do mesmo, que reconheço.”139
O Sr. Presidente do Conselho de Administração da Empordef, Dr. Rui Jorge de Carvalho Vicente Ferreira,
esclareceu o Sr. Deputado Jorge Fão, relativamente ao estudo que serviu de base ao plano de reestruturação
pensado em 2011:
“(…) Já tivemos este comentário em sede de Comissão de Defesa Nacional e aquilo que eu direi é que o
estudo de per si é um trabalho profissional rigoroso, capaz, mas completamente impossível de implementar
pelos pressupostos que tinha, porque tinha uma carteira de encomendas de centenas de milhões de euros
baseada em construções militares que não poderiam vir a ser realizadas no contexto económico e no período
que estava referido no estudo.”140
O Sr. Dr. Carlos Alberto Veiga Anjos, ex-Presidente do Conselho de Administração dos ENVC entre
setembro de 2010 e junho de 2011, esclareceu o Sr. Deputado Agostinho Santa, sobre o plano de
reestruturação de 2011 para a recuperação dos ENVC:
“ O Sr. Dr. Carlos Alberto Veiga Anjos: — Sr. Deputado, fizemos um estudo que contemplava três
situações: a situação de os Estaleiros continuarem como estavam; a situação do encerramento dos Estaleiros;
e a situação de prosseguimento, mas com uma profunda reestruturação.
Se o Sr. Deputado quiser, explico-lhe depois o que é isto de uma profunda reestruturação, que é uma coisa
em que os Estaleiros, de facto, não voltariam a ser os mesmos.
138
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 11 de março de 2014, Sr. Ministro da Defesa Nacional, Dr. José Pedro Aguiar Branco, págs. 83-
84. 139
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 13 de março de 2014, Presidente do Conselho de Administração da EMPORDEF, Sr. Dr. Rui
Jorge de Carvalho Vicente Ferreira, pág. 20. 140
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 13 de março de 2014, Presidente do Conselho de Administração da EMPORDEF, Sr. Dr. Rui
Jorge de Carvalho Vicente Ferreira, pág. 32.
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Portanto, desse estudo chegou-se à conclusão de que a melhor solução era a continuidade, mas com uma
reestruturação. Creio que os meios envolvidos nessa reestruturação eram noventa e tal milhões de euros —
não sei se eram 97 —, mas grande parte era para conversão de créditos em capital da empresa ou, então, em
créditos não exigíveis imediatamente.
Depois, tínhamos a solução do encerramento, que custaria cerca de 200 milhões de euros.
E tínhamos a solução de continuidade, que era um saco sem fundo e que, portanto, nem sei quanto era –
era o infinito, não é? –, porque a empresa dava prejuízos enormes todos os anos. De maneira que era
impossível e, por isso, teria de continuar, sem fim, uma injeção de dinheiro na empresa.
Então, como a solução mais económica era a reestruturação e essa solução implicava a continuidade dos
Estaleiros, nós, obviamente, escolhemos essa.”141
E ainda sobre este plano de reestruturação de 2010, expresso em documento em 2011:
“(…) concluímos o estudo em final de dezembro, mas porque tivemos que fazer umas correções só o
apresentámos ao Governo em final de janeiro. Esperei até abril. Entretanto, porque as relações com o
Governo era eu que as tinha na qualidade de presidente não executivo, fui tendo algumas conversas com a
tutela, com a EMPORDEF, e também a nível da Secretaria de Estado da Defesa Nacional.
Nós, no final de fevereiro, fizemos uma apresentação no Ministério da Defesa. Fizemos a apresentação do
plano de reestruturação, estando presentes o Sr. Ministro da Defesa, o Sr. Secretário de Estado da Defesa e o
Sr. Secretário de Estado das Finanças. Fizemos a apresentação e as pessoas limitaram-se a ouvir aquilo que
tínhamos a dizer e o estudo continuou em apreciação.
Chegámos a abril e eu, enfim, ia ouvindo umas respostas, mas o problema era que as necessidades
financeiras, económicas e sociais dos Estaleiros eram tão grandes… Repare nisto: nessa altura, 80% das
pessoas estavam desocupadas. Eu entendi que a empresa estava em falência técnica e, portanto, que devia
convocar uma assembleia geral. Eu entendi, porque não pedi autorização a ninguém para a fazer, baseei-me
na lei comercial. O artigo 35.º do Código das Sociedades Comerciais diz que uma empresa que esteja na
situação dos Estaleiros ou é viabilizada ou é encerrada.
Pedi, então, ao presidente da assembleia geral para convocar a assembleia geral creio que no dia 24 de
abril. E, meu amigo, aí já não havia mais nada. Havia uma assembleia geral e tinha que se decidir sobre se se
fazia a reestruturação, se encerrava os Estaleiros ou se fazia aquilo que tinha de ser feito. Agora, não venham
responsabilizar os gestores por terem uma empresa em situação irregular, como tem estado até agora. A
empresa tem estado até agora numa situação irregular, porque não foi feito nada em termos de reestruturação
financeira. Portanto, a empresa tem continuado em falência técnica, o que também pode ser muito perigoso
para os próprios gestores porque, perante terceiros, os gestores são solidariamente responsáveis com a
empresa por não terem acionado o artigo 35.º. E há muitas empresas públicas que estão nessa situação, e os
Estaleiros também estavam.
De maneira que convoquei a assembleia geral e essa assembleia geral, depois, seguiu os trâmites
normais. Creio que a assembleia geral foi no princípio de junho – não tenho agora os números. Houve duas
sessões da assembleia geral: uma primeira ainda em maio, que depois ficou suspensa porque o Secretário de
Estado ainda não tinha feito o despacho de aprovação do plano, e uma segunda, depois.
Foi assim que forcei, se quiser, o Governo de então a tomar uma decisão sobre a empresa. E se não a
tivesse tomado, eu não tinha vindo embora pelos motivos que enunciei há bocado, mas tinha vindo embora
porque eu próprio não estava disposto a continuar na empresa naquela situação.”142
O Sr. Eng.º Jorge Camões, atual Presidente do Conselho de Administração da ENVC, respondeu ao Sr.
Deputado Jorge Fão, sobre o plano de reestruturação de 2010, realizado pela AT Kearney:
“(…) O plano da ATK, enfim, era conhecido, achei que era um bom plano, mas, ao analisá-lo (naturalmente,
eu não participei na sua feitura, vi-o e li-o), achei que tinha alguns pressupostos que não eram realizáveis,
como, por exemplo, a necessidade de injeção de dinheiro — à volta de 100 milhões de euros —, além do
141
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 6 de maio de 2014, Presidente do Conselho de Administração dos ENVC no período de setembro
de 2010 a junho de 2011, Sr. Dr. Carlos Alberto Veiga Anjos, págs. 29-30. 142
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 6 de maio de 2014, Presidente do Conselho de Administração dos ENVC no período de setembro
de 2010 a junho de 2011, Sr. Dr. Carlos Alberto Veiga Anjos, págs. 47-48.
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despedimento de trabalhadores que implicava. Partia, também, do pressuposto de que a carteira de
encomendas seria aquela, mas, depois, verificou-se que, à data, não havia dinheiro para as executar. Aliás,
nós, depois, através da EMPORDEF, solicitámos à ATK que revisse aquele plano, à luz dos novos
conhecimentos.
Portanto, eu conhecia o plano e acho que era um bom plano, que estava bem feito, mas partia de alguns
pressupostos que, à data, já não estavam válidos. Mas era um plano…
O Sr. Jorge Fão (PS): — Muito bem.
Portanto, conhecia o plano, achava-o bem feito, tinha limitações ou alguns aspetos que, porventura,
apresentavam fragilidades…
Sr. Engenheiro, se lhe tivessem permitido, o senhor teria dado sequência àquele plano?
O Sr. Eng.º Jorge Camões: — Primeiro, teria de acertar que os pressupostos eram aqueles. Eu não posso
partir de um plano de viabilidade ou de racionalização que se baseia num pressuposto errado, que não é
factível. O pressuposto não era factível. Portanto, não posso seguir um plano que, embora esteja bem feito,
parte de bases que não estão corretas.
O Sr. Jorge Fão (PS): — Sim, mas aproveitaria o plano, embora reavaliando alguns aspetos que
considerava como fragilidades. Mas considera-o bom, conhecia-o, portanto, aproveitaria o plano.
O Sr. Eng.º Jorge Camões: —Era bom, mas não era realizável. Portanto, um plano que é bom, mas
não se pode implementar, é um plano… Como houve muitos, anteriormente.”143
E ainda a seguir:
“(…) O Sr. Eng.º Jorge Camões: —Nós tomámos posse com o objetivo de tentar… Para já, vimos como
estava a empresa, «tirámos a foto» à empresa. Aliás, a foto que foi tirada foi esta: o plano vai ficar suspenso,
não é anulado, é suspenso. E, como sabe, nós, Conselho de Administração, em coordenação com a
EMPORDEF, começámos a trabalhar cenários vários e chegámos a uma conclusão que apresentámos ao
acionista, não o plano, mas, do nosso ponto de vista, com trabalho em casa, como é que nós víamos a
situação: as is, impossível; com pequenas melhorias, zero; com algumas melhorias, talvez. Foi exatamente
assim que apresentámos as coisas, no fim de novembro, mas, de facto, não era aquele plano. E por que é
que não era aquele plano? Porque não queríamos, à data, partir de um plano que assentava num
pressuposto errado, que era, fundamentalmente, o das encomendas, e que, ainda por cima, pretendia
injetar dinheiro que não existia —100 milhões de euros.”144
Para finalizar, pergunta ainda o Sr. Deputado Fernando Negrão, ao Sr. Ministro da Defesa Nacional:
“(…) Por fim, Sr.ª Presidente e Sr. Ministro, pergunto se ainda seria possível apresentar um plano de
reestruturação para os Estaleiros ou se houve alguma razão que impedisse que tal fosse feito.”145
Resposta do Sr. Ministro da Defesa Nacional, Dr. José Pedro Aguiar Branco:
“(…) Seria possível apresentar um plano de restruturação para os Estaleiros e seria possível relativamente
a qualquer coisa que se quisesse fazer hoje em relação à situação de restruturação. No entanto, isso tinha um
pressuposto: ser possível ter explicado aquilo que tinha acontecido entre 2006 e 2011 e, como é óbvio, não é
possível explicarmos hoje um processo de restruturação que não ocorreu entre 2006 e 2011 e que poderia ser
a justificação para que as ajudas dadas não fossem consideradas ilegais. Mas não só essa realidade não
143
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 7 de maio de 2014, atual Presidente do Conselho de Administração dos ENVC, Sr. Eng.º Jorge
Camões, e restantes vogais do Conselho de Administração, Sr. Dr. José Luís Serra, Sr. Eng.º Francisco Gallardo e Sr. Almirante Conde Baguinho, págs. 10-11. 144
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 7 de maio de 2014, atual Presidente do Conselho de Administração dos ENVC, Sr. Eng.º Jorge
Camões, e restantes vogais do Conselho de Administração, Sr. Dr. José Luís Serra, Sr. Eng.º Francisco Gallardo e Sr. Almirante Conde Baguinho, págs. 12-13. 145
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 11 de março de 2014, Sr. Ministro da Defesa Nacional, Dr. José Pedro Aguiar Branco, pág. 7.
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ocorreu, porque não se restruturou coisa alguma, como também não se havia cumprido nunca, o que seria
impossível, a não ser que fabricássemos hoje as notificações relativamente às ajudas que tinham sido dadas
na época. Portanto, não era possível apresentarmos hoje um plano de restruturação de uma coisa que
aconteceu no passado.
b. Auxílios de Estado 2006-2011
Em 7 de fevereiro de 2006, a Comissão recebeu uma notificação das Autoridades portuguesas
expressando a sua intenção de conceder um auxílio aos Estaleiros Navais de Viana do Castelo relativamente
a um contrato concluído por estes estaleiros em 14 de novembro de 2003.
O auxílio proposto foi notificado ao abrigo do Regulamento (CE) n.º 1177/2002 do Conselho, de 27 de
junho de 2002, relativo a um mecanismo temporário de defesa do sector da construção naval, com a última
redação que lhe foi dada pelo Regulamento (CE) n.º 502/2004 do Conselho, de 11 de março de 2004. A
vigência deste regulamento chegou ao seu termo em 31 de março de 2005, não se encontrando por
conseguinte em vigor no momento em que as Autoridades portuguesas notificaram o auxílio.
Com base no atrás exposto, a Comissão adotou, em 22 de junho de 2006, uma decisão de dar início ao
procedimento formal de investigação relativamente a este caso, uma vez que tinha dúvidas quanto ao facto de
a medida notificada poder ser considerada compatível com o mercado comum. As Autoridades portuguesas
foram informadas em conformidade. Foi assim desencadeado o Processo C 26/2006 (ex N 110/2006).
Em 24 de abril de 2007, a Comissão adotou uma decisão final, considerando o auxílio projetado
incompatível com o mercado comum.
Em 2012, foi desencadeado junto da Comissão Europeia, o Processo Auxílio Estatal SA.35546 (2013/C)
(ex 2012/NN) – Portugal – Medidas anteriores em favor dos Estaleiros Navais de Viana do Castelo S.A.
De acordo com o ponto 1, por correio eletrónico de 3 de outubro de 2012, as autoridades portuguesas
apresentaram informalmente à Comissão um breve memorando sobre as medidas estatais que procuram
maximizar as receitas provenientes da privatização da empresa Estaleiros Navais de Viana do Castelo S.A. (a
seguir designada «ENVC»). Com base nas informações fornecidas, a Comissão decidiu dar início a um
processo ex officio em 5 de outubro de 2012, registado com o número SA.35546 (2012/CP). Portugal foi
informado do início do processo por carta de 11 de outubro de 2012.
Relativamente à apreciação que é feita, adianta-se que como ponto preliminar, a presente decisão analisa
se a ENVC tem de ser considerada como uma empresa em dificuldade (ver secção 5.1). Subsequentemente, a
Comissão examinará se as medidas acima descritas na secção 3 constituem um auxílio estatal à ENVC, na
aceção do artigo 107.º, n.º 1, do TFUE (ver secção 5.2). Atendendo ao facto de as medidas terem sido
tomadas sem nunca terem sido notificadas à Comissão, a Comissão nota que essas medidas têm de ser
consideradas como auxílio ilegal (secção 5.3), pelo que irá proceder a uma apreciação preliminar da
compatibilidade das medidas com o mercado interno (secção 5.4).
A decisão tomada foi a seguinte: à luz das considerações supra, a Comissão, no âmbito do procedimento
previsto no artigo 108.°, n.º 2, do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia, convida a República
Portuguesa a apresentar as suas observações e a prestar todas as informações que possam ajudar a avaliar
as medidas anteriores em favor da ENVC, no prazo de um mês a contar da data de receção da presente carta.
Relativamente às medidas planeadas de acompanhamento da privatização da ENVC, a Comissão recorda
a Portugal o efeito suspensivo do artigo 108.º, n.º 3, do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia.
A Comissão chamaria também a atenção para o artigo 14.º do Regulamento (CE) n.º 659/1999 do
Conselho, segundo o qual qualquer auxílio concedido ilegalmente pode ser objeto de recuperação junto do
beneficiário.
Segundo o comunicado de imprensa da Comissão Europeia de 23 de janeiro de 2013, a Comissão
Europeia abriu uma investigação aprofundada para verificar se as numerosas medidas de apoio público
concedidas por Portugal em favor dos Estaleiros Navais de Viana do Castelo, S.A. («ENVC») estão em
conformidade com as regras em matéria de auxílios estatais da UE. Na presente fase, a Comissão duvida que
essas medidas tenham sido tomadas em moldes que um ator privado que opera em condições de mercado
teria aceite. A abertura de uma investigação aprofundada dá às partes terceiras interessadas a oportunidade
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de apresentarem as suas observações sobre as medidas em apreço, sem prejudicar o resultado da
investigação.
Os ENVC encontram-se inseridos num mercado complexo, que é o sector da construção naval e que é
caracterizado pela ausência de auxílios de Estado, determinado pela Comissão Europeia, por via de
regulamentação comunitária.
Nesta secção, mediante recurso às audições realizadas pela CPI, às diversas entidades convocadas,
procurou-se averiguar que auxílios foram concedidos pelo Estado aos ENVC e a legalidade dos mesmos,
assim como o modo como o atual Governo acompanhou junto da Comissão Europeia este processo.
Sobre esta questão, começou por prestar esclarecimento o Sr. Ministro da Defesa Nacional, Dr. José Pedro
Aguiar Branco, ao Sr. Deputado Fernando Negrão:
“(…) A questão da violação das regras da Comunidade resulta do próprio procedimento instaurado, ou seja,
entre 2006 e 2011 houve benefícios concedidos aos Estaleiros Navais de Viana do Castelo, entre os
quais auxílios pela parte da Direção Geral do Tesouro e Finanças, os quais não foram previamente
comunicados à Comunidade Europeia. Portanto, significa que não só eles foram qualificados como
distorsores da concorrência, como, desde logo, pelo simples facto de não ter havido a comunicação prévia,
não poderiam ser considerados para efeitos de justificação.
Daí essa totalidade que, para além dos que referiu, atingir cerca de 181 milhões de euros que não foi
possível justificar, determinou que o processo de privatização em curso também não pudesse ser
concluído, na medida em que inquinou toda a avaliação de risco que estava associado ao projeto de
privatização.
O procedimento instaurado na sequência dessa deteção por parte da Direção-Geral da Concorrência
Europeia foi, em primeiro lugar, uma notificação oficiosa, digamos assim, ao Ministério das Finanças para
prestar informação relativamente a essas ajudas concedidas, num primeiro momento, de cerca de 400 milhões
de euros, que foram as referências dadas. Aliás, já foi disponibilizada toda a documentação a esse propósito,
salvo erro, no mês de outubro de 2012, e, entre essa data e janeiro de 2013, há toda uma interação entre o
Governo e a Direção-Geral da Concorrência Europeia no sentido de evitar a instauração de um procedimento
de averiguação aprofundada. Porquê? Porque a partir do momento em que esse procedimento fosse
instaurado, sabendo nós que quer pelo tempo que demora, quer pela instabilidade que resulta quanto às suas
consequências, impede não só a privatização, como impedia também, como é óbvio, qualquer entrega ou
injeção de dinheiro por parte do Estado e, portanto, aquela empresa morreria por si: por um lado, não haveria
um parceiro que fosse injetar capital necessário para que aquela empresa pudesse continuar a sua atividade,
e o próprio Estado estava também impedido de o fazer. Portanto, a consequência era aquela empresa ter de
encerrar.
Por isso, o Governo desenvolveu todos os esforços de interação com a Direção Geral da
Concorrência Europeia, no sentido de evitar esse procedimento. Para isso, instruiu tudo o que podia
para justificar a legalidade dessas ajudas concedidas. Infelizmente, não foi possível justificar aqueles
181 milhões de euros e a Direção Geral da Concorrência Europeia abriu um processo de averiguação
aprofundada, que, aliás, ainda está pendente.
Uma questão que se coloca e que julgo que o Sr. Deputado tinha implícita na sua pergunta: saber se, no
momento em que foi instaurado esse processo e com a publicitação dessa notificação, o Governo atuou ou
não atuou como devia para a salvaguarda dos interesses do Estado português.
Ouço e vejo que, muitas vezes, fazem essa confusão — foi dado um prazo de 30 dias depois dessa
publicitação —, ou seja, a de que o Governo não teria atuado e exercido esse direito de poder esclarecer,
ainda aí, a Direção-Geral da Concorrência da União Europeia.
O que se passa é que a resposta que o Governo dá é anterior a essa publicitação — é, salvo erro, de 22 de
janeiro — e instrui nesse momento tudo aquilo que poderia instruir para obstar à publicitação dessa notificação
por parte da Direção-Geral da Concorrência da União Europeia. O prazo que foi concedido é um prazo para
que qualquer interessado — qualquer, e qualquer é mesmo qualquer! —, isto é, quer a parte interessada, quer
a parte que seja contrária e que, portanto, deseje ainda reforçar os argumentos relativos àquelas ajudas
ilegais, possa, durante esse período de tempo, carrear para o processo tudo aquilo que deseja carrear para o
bom esclarecimento. O Governo já não podia apresentar mais, porque já tinha apresentado tudo.
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Portanto, da documentação que foi distribuída aos Srs. Deputados, pode verificar-se que, contrariamente à
ideia que se quis criar de que o Governo nada fez, o Governo fez muito e tudo o que era possível, quer do
ponto de vista de interlocução pessoal, quer do ponto de vista de conferências telefónicas, quer do ponto de
vista da pura lógica instrumental, no sentido do uso do processo para o efeito.
Posso até dar aqui uma indicação sobre quais foram as interações que a esse propósito se fizeram
com a DGCom (Directorate General for Competition da União Europeia): houve três reuniões em
Bruxelas, em 11 de dezembro, em 5 de fevereiro e em 11 de março de 2013; houve 30 contactos
escritos, trocas de informações entre o Governo, o Ministério das Finanças e a Direção-Geral da
Concorrência da União Europeia; houve 5 conferências telefónicas, em 16 de outubro, em 5 de
dezembro, em 27 de maio, em 29 de julho e em 13 de novembro; houve reuniões de membros do
Governo com o Comissário Almunia desde 2 de outubro de 2012, sendo que a última ocorreu já depois,
em 20 de junho de 2013.
A pergunta que se costuma colocar é se o Ministro da Defesa esteve em algumas dessas reuniões. Não
esteve! O Governo esteve representado pelo Sr. Ministro de Estado e das Finanças, Vítor Gaspar, à época, e
também pela Sr.ª Secretária de Estado Maria Luís Albuquerque, hoje Ministra de Estado e das Finanças, que
tem a cotutela desta matéria com o Ministério da Defesa, no que diz respeito à interação com a Direção-Geral
da Concorrência da União Europeia.
Por isso, foi feito tudo aquilo que era possível fazer para justificar que as ajudas tinham sido legais.
Infelizmente, a Direção-Geral da Concorrência da União Europeia não entende isso, pelo que ficámos na
impossibilidade de explicar os 181 milhões de euros relativos a essa matéria entre 2005 e 2011.146
Ainda relativamente a esta matéria, o Sr. Ministro da Defesa Nacional, Dr. José Pedro Aguiar Branco,
responde à Sr.ª Deputada Mónica Ferro:
“(…) É porque também vozes de cá vão à Europa e, depois, dizem: «Isto é um processo clandestino!», «A
Comissão Europeia não sabe de nada!», «Portugal esconde informação!» — parece que descobriram a
pólvora, quando a comunicação social vai ouvir essas declarações e prestam-se a dizer isso, como se o
Governo… E o Comissário Almunia, por declaração escrita, indo, aliás, ao encontro do que nós sempre
dissemos, disse que está a acompanhar, regularmente, a par e passo, e que o Governo português tem
informado sistematicamente o Comissário e a Direção-Geral da Concorrência da União Europeia.
Portanto, quando se quer escamotear parte das coisas, e construir coisas diferentes, é que depois se foge
à verdade. E, sobre essa matéria, creio que já não restam dúvidas pela clarificação dada pelo próprio
Comissário Almunia.”147
O Sr. Ministro da Defesa Nacional, Dr. José Pedro Aguiar Branco, esclareceu ainda o Sr. Deputado António
Gameiro:
O Governo, na articulação que fez com a DGCom, tentou explicar, pela pena de um advogado especialista
em Direito da Concorrência da União Europeia, que aqueles 400 milhões de euros não deveriam ser
considerados ajudas de Estado ilegais. Não aceitámos isso, ser notificados quanto aos 400 milhões de euros e
dizer: «Pronto, são 400 milhões de euros. Vamos tentar que seja menos um bocado…». Não! Nós tentámos
explicar, com argumentos uns mais convincentes, outros mais trabalhados e outros mais esforçados, que
aqueles 400 milhões de euros não deviam ser considerados ajudas de Estado ilegais, só que, a dada altura,
esbarrámos com este montante que, quer do ponto de vista de conteúdo e de natureza, quer por não terem
ocorrido as notificações legais devidas, não foi possível justificar.
Portanto, Sr. Deputado, sobre essa matéria o Governo fez o que podia, fez aquilo que era possível.148
146
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 11 de março de 2014, Sr. Ministro da Defesa Nacional, Dr. José Pedro Aguiar Branco, págs. 8-11,
sublinhado do relator. 147
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 11 de março de 2014, Sr. Ministro da Defesa Nacional, Dr. José Pedro Aguiar Branco, pág. 76. 148
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 11 de março de 2014, Sr. Ministro da Defesa Nacional, Dr. José Pedro Aguiar Branco, págs. 45-46.
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Perguntou também o Deputado António Filipe, ao Sr. Ministro da Defesa Nacional, Dr. José Pedro Aguiar
Branco:
(…) “vou dizer sobre o que gostaríamos de obter respostas concretas, da parte do Sr. Ministro.
Primeiro: gostaríamos de saber qual foi a decisão concreta tomada pela Comissão Europeia. O Sr. Ministro
disse aqui que havia um risco de condenação e gostaríamos de saber se houve ou não alguma decisão. Tanto
quanto sabemos, não houve ou, se houve, pelo menos o Sr. Comissário Almunia não sabe e, portanto,
presumimos que o Governo atuou com base numa presunção de algo que poderia acontecer. Portanto,
gostaria que o Sr. Ministro confirmasse isto: há alguma decisão concreta da União Europeia, no sentido de
considerar ilegítimas as ajudas de Estado? Sim ou não? É porque, enfim, o Sr. Ministro falou em várias
conversas telefónicas, mas dados concretos, decisões concretas, nenhuma! O que sabemos é que o tratado
de financiamento da União Europeia considera que a proibição das ajudas de Estado às empresas não é
absoluta, designadamente, numa questão decisiva, prevista, aliás, no artigo 346.º desse tratado, onde se
refere que «Qualquer Estado-Membro pode tomar as medidas que considere necessárias à proteção dos
interesses essenciais da sua segurança e que estejam relacionadas com a produção ou o comércio de armas,
munições e material de guerra». Ora, é precisamente o caso dos Estaleiros Navais de Viana do Castelo!149
Resposta do Sr. Ministro da Defesa Nacional, Dr. José Pedro Aguiar Branco:
(…) “ Quanto à decisão concreta tomada pela DGCom, ainda não há uma decisão concreta tomada pela
DGCom, mas isso é facto público e notório, dito, explicado e constante do processo. Portanto, o Sr. Deputado,
aliás, como ilustre jurista que é, já sabia a resposta a essa pergunta. E, como brilhante jurista que é, também
tenho a certeza de que leu aquilo que é a notificação e sabe que, a partir do momento em que já foi feita toda
a prova antes daquilo que era a própria notificação, nada pode ser dito após aquela notificação que impeça a
condenação que nela está ínsita, exceto se, por acaso, houver a descontinuidade da atividade económica da
empresa. Aliás, há várias manifestações públicas declarativas do porta-voz do próprio Comissário
Almunia a indiciar isso mesmo. Ou seja, o Estado português apresentou tudo o que podia ter
apresentado para explicar as ajudas de Estado, fê-lo, do ponto de vista procedimental, de acordo com
as regras do Direito da Concorrência da União Europeia, e está a tentar impedir que haja uma
condenação. É porque, Sr. Deputado, no dia em que houver a condenação, a condenação, se
entretanto a solução não tivesse sido encontrada, seria de aquela empresa ter de pagar os 181 milhões
de euros. E nós não acompanhamos um sentido de irresponsabilidade, que só serviria para termos um
argumento formal, político para explicar qualquer coisa, mas que nos levaria a sermos os coveiros de uma
situação que, à partida, sabemos que é a que vai acontecer.”150
E acrescenta ainda:
“(…) pela própria natureza das construções que lá foram feitas, não era possível explicar que aqueles
Estaleiros tinham sido utilizados sobretudo para construções de natureza de defesa.
E devo dizer-lhe que a percentagem das construções militares, relativamente ao total de todas as
atividades dos Estaleiros, foram as seguintes: em 2005, 33%; em 2006, 11%; em 2007, 7%; em 2008, 5%; em
2009, 15%; em 2010, 21%; e, em 2011, 9%.
E agora, Sr. Deputado, como ilustre jurista que é, se quiser, posso dar-lhe estes elementos e o senhor vai à
DGCom explicar que estes Estaleiros foram utilizados estrategicamente para a construção de material de
armamento, que, por isso, eram estratégicos para as Forças Armadas Portuguesas e que, por isso, não
estavam sujeitos à concorrência europeia no mercado interno da construção de estaleiros.
Esta é, Sr. Deputado, a realidade dos factos; não é discurso, são factos! «E, contra os factos, não há
argumentos»”151
149
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 11 de março de 2014, Sr. Ministro da Defesa Nacional, Dr. José Pedro Aguiar Branco, pág. 21. 150
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 11 de março de 2014, Sr. Ministro da Defesa Nacional, Dr. José Pedro Aguiar Branco, pág. 25,
sublinhado do relator. 151
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 11 de março de 2014, Sr. Ministro da Defesa Nacional, Dr. José Pedro Aguiar Branco, pág. 27.
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No que concerne à questão sobre a possibilidade do atual Governo fazer um acordo de pagamento com os
ENVC referente aos 181 milhões de euros, responde o Sr. Ministro da Defesa Nacional, Dr. José Pedro Aguiar
Branco, ao Sr. Deputado António Gameiro:
“(…) O Sr. Deputado diz que nós podíamos ter feito um acordo de pagamento, «a la longue», com os
Estaleiros, para pagar 181 milhões de euros, no caso de ser condenado. Os 20 anos de história dos Estaleiros
mostram que não têm sequer lucro — sequer lucro!-, e o Sr. Deputado diz, com essa naturalidade e com essa
facilidade, à luz de todos e para fazer acreditar ao mais distraído fiscalizador desta operação, que nós iríamos
fazer um acordo para os Estaleiros devolverem ao Estado 181 milhões de euros! A não ser que o Sr.
Deputado ache razoável que nós fizéssemos um acordo por 150 ou 200 anos, porque a história dos Estaleiros
mostra que, em circunstância alguma, eles teriam condições de o fazer de uma forma séria. Se for para
mascarar contas… Mas isso não é forma de este Governo trabalhar; não mascaramos contas e, como não é
possível fazê-lo, é evidente que não seria sério, nem crível, nem possível fazer de forma rigorosa qualquer
acordo, nesses termos.”152
Relativamente à questão sobre os 102 milhões de euros que são contabilizados para a EMPORDEF em
2012, responde o Sr. Ministro da Defesa Nacional, Dr. José Pedro Aguiar Branco, ao Sr. Deputado António
Gameiro:
“(…) Disse o Sr. Deputado que só falamos das entregas e não falamos dos 102 milhões de euros dados
por este Governo. Sr. Deputado, o senhor acredita mesmo que este Governo meteu 102 milhões de euros nos
Estaleiros Navais de Viana do Castelo? Acredita mesmo?
O Sr. António Gameiro (PS): — Acredito!
O Sr. Ministro da Defesa Nacional: — Acha que nós tínhamos 102 milhões de euros para injetar naquela
sociedade?! Coisa diferente é o tratamento contabilístico dado a operações de natureza jurídica que são
praticadas, o que o Sr. Deputado, como jurista, também sabe.
O senhor acredita que tivemos 102 milhões de euros?! Tomara eu tê-los!… O Sr. Deputado ainda não
percebeu que o Governo não tinha dinheiro sequer para mandar construir os asfalteiros!…
Mas eu vou explicar-lhe, porque é fácil, os 101 milhões de euros que são contabilizados para a
EMPORDEF em 2012: houve 56 milhões de euros que foram contraídos pelos Estaleiros junto da banca em
anos anteriores com cartas de conforto da EMPORDEF, sendo que os bancos cobrariam logo os respetivos
créditos se não houvesse a transferência desse passivo para a EMPORDEF. Portanto, trata-se de uma
transferência da entidade devedora, mas é uma transferência com base, inclusivamente, em cartas de conforto
que já tinham sido dadas e que juridicamente obrigavam a isso. Não houve uma injeção de dinheiro, porque
não havia, foi uma situação pretérita que, do ponto de vista contabilístico, tem de ser considerada na
contabilidade da EMPORDEF no ano em que essa transmissão é feita.
Depois, temos 54 milhões de euros na EMPORDEF que correspondem a situações anteriores do Atlântida.
Dos 54 milhões de euros que a EMPORDEF emprestou aos Estaleiros, 37 milhões de euros foram devidos
pelo empréstimo obtido na Caixa Geral de Depósitos para pagar à Atlânticoline o acordo sobre o Atlântida.
Portanto, a EMPORDEF contraiu esse empréstimo antes e entregou o dinheiro nos Estaleiros para devolver
aos Açores; 17 milhões de euros correspondem também a financiamentos que a EMPORDEF deu aos
Estaleiros, que foi retirar ao Alfeite, descapitalizando o Alfeite, para colocar na EMPORDEF.
Portanto, contabilisticamente, essa situação teve de ser reportada em 2012 na EMPORDEF, mas não foi
porque tivesse havido a injeção de 102 milhões de euros de capital, porque, infelizmente, nem sequer
tínhamos dinheiro para o fazer.
Espero que a situação tenha sido clarificada…”153
152
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 11 de março de 2014, Sr. Ministro da Defesa Nacional, Dr. José Pedro Aguiar Branco, pág. 43. 153
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 11 de março de 2014, Sr. Ministro da Defesa Nacional, Dr. José Pedro Aguiar Branco, págs. 43-45.
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O Sr. Ministro da Defesa Nacional, Dr. José Pedro Aguiar Branco, quando questionado pelo Sr. Deputado
António Gameiro, no que concerne à questão da comparação dos auxílios de Estado dos ENVC, com os
auxílios de Estado dos Estaleiros Navantia da Galiza [que contestaram a decisão da DGCOM], responde:
“O Sr. Deputado falou da Galiza. Sr. Deputado, os Estaleiros Navais da Galiza, em junho do ano passado,
foram condenados a devolver 2000 milhões de euros ao Estado. Não sei se o Sr. Deputado está atualizado
nessa informação, mas posso atualizá-lo, aliás, já dei nota disso numa reunião da Comissão de Defesa
Nacional.
A decisão da Comissão Europeia no que diz respeito à condenação dos Estaleiros Navais da Galiza, num
caso que remonta a 2002 e que durou até 2011, foi a de devolver — aliás, até houve manifestações públicas
de que a imprensa deu nota — 2000 milhões de euros. Os Estaleiros Navais da Galiza foram condenados!154
Na 2.ª audição o Sr. Presidente do Conselho de Administração da Empordef, Dr. Rui Jorge de Carvalho
Vicente Ferreira, esclareceu o Sr. Deputado Afonso Oliveira, relativamente a esta matéria:
“(…) Não tendo sido cumpridas as regras comunitárias e o regulamento comunitário do mercado interno, ou
seja, aviso prévio, notificação prévia à Comissão desses auxílios e a correspondente apresentação de um
plano de reestruturação que viabilizasse os mesmos e os justificasse, estávamos confrontados com uma
inviabilidade: de forma alguma conseguiríamos prosseguir porque o investidor que viesse a adquirir o negócio
teria obrigatoriamente de responder pelos benefícios passados. Esse era, sem dúvida, um fator
inultrapassável.
No diálogo com a DGCom (Direção-Geral de Concorrência), estive a acompanhar as tutelas, a Secretaria
de Estado do Tesouro, do Ministério das Finanças, e o Ministério da Defesa, em três reuniões, no final de 2012
e no início de 2013, assim como assisti, posteriormente, a uma teleconferência. Existiram outras
teleconferências, existiram muitas outras reuniões, mas eu não estive presente; estive presente nas três
reuniões que referi e na teleconferência em Portugal, todas elas no final de 2012 e no princípio de 2013.
Ficou claro que a DGCom transformou o inquérito preliminar que fez num inquérito definitivo porque tinha
elementos, evidências, que conduziam, que demonstravam que havia 181 milhões de euros de auxílios que os
Estaleiros teriam de repor, e se privatizasse, com continuidade económica, o futuro investidor seria beneficiário
e responderia por isso. Portanto, a única solução que a DGCom aceitou foi a descontinuidade económica.
Para criar a descontinuidade económica teríamos de criar uma solução de liquidação da sociedade e criar uma
colocação no mercado de todos os ativos da empresa, inclusive da subconcessão.
Portanto, foram estas as principais orientações e remédios que a DGCom aceitou e que o Governo
português, não tendo alternativa, propôs, em cujo modelo de solução eu também participei.
Neste contexto, considero, como já referi na Comissão Parlamentar de Defesa Nacional, que não era a
solução ótima, não era a que gostaríamos, mas foi a possível. E considero que, apesar de tudo, face a uma
adversidade, se conseguiu encontrar uma oportunidade.”155
O Sr. Presidente do Conselho de Administração da Empordef, Dr. Rui Jorge de Carvalho Vicente Ferreira,
esclareceu a Sr.ª Deputada Carla Cruz, sobre os 102 milhões de euros que são contabilizados para a
EMPORDEF em 2012:
“(…) Em dezembro de 2011, estávamos completamente incapacitados de obter financiamentos na banca.
Durante 2012 foi muito difícil não só renovar as linhas de financiamento existentes do endividamento dos
Estaleiros como procurar arranjar dinheiro para pagar salários, penhoras, injunções, etc. Além disso, há uma
verba de que se faz sempre alarde, dizendo que nós colocámos 102 milhões de euros nos Estaleiros. Quem
me dera!…
Valia a pena olharem para o relatório e contas dos Estaleiros de Viana no final de 2012, porque irão
verificar que os 55 milhões de euros de financiamentos bancários de 2011 estão em 350 000 € de
financiamento bancário no final de 2012. Porquê? Porque a EMPORDEF foi obrigada a recontratualizar tudo.
Ou seja, em relação a esses financiamentos, não colocou mais 1 tostão. Aliás, basta lerem o relatório e contas
154
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 11 de março de 2014, Sr. Ministro da Defesa Nacional, Dr. José Pedro Aguiar Branco, pág. 46. 155
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 13 de março de 2014, Presidente do Conselho de Administração da EMPORDEF, Sr. Dr. Rui
Jorge de Carvalho Vicente Ferreira, pág. 28-29.
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dos Estaleiros, que é público, está no site, e vão verificar que no final de 2012 havia apenas 350 000 €, o que
prova a recontratualização, o rollover de todos os financiamentos que os Estaleiros tinham para conseguir
pagar os salários, penhoras e injunções.
Portanto, sob o ponto de vista da atividade, diria que fomos confrontados, durante 2012, com essa
circunstância. Como já aqui expliquei, em 2013 tivemos a possibilidade de vender ao Estado português o
projeto do Navio Polivalente Logístico por 25,5 milhões, o que permitiu desbloquear verba para concluir o
navio-patrulha oceânico — porque em 2011 faltavam 16 milhões de euros para o concluir e os Estaleiros já
tinham recebido tudo o que tinham a receber relativamente a esses contratos, ou seja, era prejuízo direto — e
possibilitou também realizar as aquisições, que aqui referimos, de equipamentos ou matéria-prima.”156
O Sr. Presidente do Conselho de Administração da Empordef, esclareceu também as perguntas da Sr.ª
Deputada Otília Ferreira Gomes:
“(…) Sr. Presidente, também já aqui referiu que participou em três reuniões com a DGCom relativamente a
esta questão e, se a memória não me falha, em mais uma teleconferência. Destas reuniões a que o Sr.
Presidente assistiu e em todos os outros contactos, documentos ou o que for, ficou convicto, porque o
Governo tem transmitido esta convicção, de que, efetivamente, se a solução a encontrar para os Estaleiros
Navais de Viana do Castelo fosse uma solução de continuidade, quer a atual, quer a título de reprivatização,
isto implicaria sempre a devolução destes 181 milhões de euros? Está convicto disso, em resultado dessas
reuniões, ou não participou nesta parte das questões?”157
Resposta do Sr. Dr. Rui Jorge de Carvalho Vicente Ferreira:
“(…) Sr.ª Deputada, o meu conhecimento sobre esses mecanismos comunitários é restrito. Por isso é que
temos uma assessoria e por isso é que até já cá esteve o Dr. Nuno Ruiz, na Comissão de Defesa Nacional, a
dar, e muito bem, algumas explicações. O meu conhecimento é, pois, limitado.
Aquilo que entendo é o seguinte: a continuidade implicava a devolução, pelos Estaleiros, ao Estado
português, dos 181 milhões, o que era completamente inviável, porque os Estaleiros não tinham esses meios,
não conseguiam obter financiamento na banca de tais montantes para fazer essa devolução, nem tinham
atividade económica que o justificasse, porque a banca só financiaria se houvesse, de facto, atividade
económica que o justificasse; se fizéssemos uma privatização e existisse um investidor privado que desse
continuidade à sociedade, que era isso que estávamos a reprivatizar, seria responsável pelos benefícios
anteriores, pelos auxílios, e não havia ninguém que lhe pudesse valer, porque não era o Estado que ia
responder, nem a EMPORDEF. Portanto, a circunstância tornou-se completamente inviável.
Neste novo cenário, se há penalização ou multa, não sei responder, a única questão que aguardo é a de
que, num dado momento, imagino, ou os remédios que aplicámos foram a completo contento daquelas que
foram as exigências comunitárias, da DGCom e da Comissão, que abriram o inquérito aprofundado e, nesta
situação, o processo será arquivado, porque houve uma boa aplicação das medidas propostas pelo Governo
português — foi o Governo português que propôs as medidas, como soluções, uma vez que compete, nestas
circunstâncias, ao Governo português, apresentar alternativas e soluções que, depois, são negociadas, aliás,
foi a isto que assisti, em finais de 2012 e início de 2013 —, ou não há aceitação, da parte da DGCom, por
alguma razão, relativamente à boa aplicação dos remédios, das medidas de contingência, o que espero que
não aconteça, porque, neste caso, será aplicada aos Estaleiros a penalidade de ter de devolver os 181
milhões. Se isto vier a acontecer, por qualquer razão, aquilo que imagino é que os Estaleiros ou já estão
liquidados ou caminham para a liquidação e não têm condições para devolver. Portanto, acho que é uma
medida materialmente impossível de aplicar. Os Estaleiros, perante essa circunstância, estariam
definitivamente falidos. Mas, daquilo que conheço e entendo, não passa sempre de uma transação entre os
Estaleiros e o Estado português.
156
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 13 de março de 2014, Presidente do Conselho de Administração da EMPORDEF, Sr. Dr. Rui
Jorge de Carvalho Vicente Ferreira, págs. 73-74. 157
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 13 de março de 2014, Presidente do Conselho de Administração da EMPORDEF, Sr. Dr. Rui
Jorge de Carvalho Vicente Ferreira, pág. 117.
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Peço desculpa se não fui suficientemente claro, mas, em termos de mecanismos comunitários, mais do que
isto não conheço.”158
c. Parecer Cruz Vilaça
Sobre esta questão prestou esclarecimento o Sr. Ministro da Defesa Nacional, Dr. José Pedro Aguiar
Branco, ao Sr. Deputado Fernando Negrão:
“(…) existe um parecer do Prof. Cruz Vilaça, também pedido e solicitado à época, que indicava que, se não
houvesse a notificação oficial dessa ajudas à Comissão Europeia, se ficava impedido de, no futuro, se poder
justificar as ajudas dadas como legais”.159
O Sr. Dr. Fernando Manuel Geraldes, Presidente do Conselho de Administração da ENVC, de 2004 a 2007,
esclarece sobre este assunto, o Sr. Deputado Carlos Abreu Amorim:
“(…) O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — Entre 2005 e 2006, isto é, até essa determinação da
EMPORDEF acontecer, o plano de reestruturação também não foi seguido, foi considerado. Porque o plano de
reestruturação tem mais do que as guidelines, tem, inclusivamente, um conjunto de recomendações de gestão
que, provavelmente (digo eu, mas especificaremos isto um pouco mais à frente), se tivessem sido seguidas,
talvez tivessem evitado alguns problemas que vieram a desenrolar-se no futuro.
O Sr. Dr. Fernando Manuel Geraldes: — Sr. Deputado, o plano de reestruturação tinha várias guidelines,
que tinham que ver, eventualmente (não estou a recordar-me com precisão), com mão de obra, com
reequipamento, tudo com montantes e com verbas, e necessitava basicamente de investimento —
investimento que era escasso, para não dizer inexistente.
O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — Refiro-me expressamente a recomendações que, por várias vezes,
são suscitadas no plano de reestruturação de 2005 e ao parecer do Dr. Cruz Vilaça160, que é um conhecido
especialista em Direito Europeu.
Referindo-se à questão do risco devido aos apoios do Estado, o Dr. Cruz Vilaça, na última página do seu
parecer, que com a licença da Sr.ª Presidente passo a ler, escreve o seguinte: «À luz das derrogações gerais
ao regime da proibição de auxílios do Estado, devem ser notificadas para eventual aprovação pela Comissão
Europeia todas as ações que sejam suscetíveis de serem consideradas auxílios públicos ou auxílios do
Estado». Ora, isto não foi feito, e não tem a ver com uma mudança apenas de estratégia em relação ao
financiamento da empresa, tem a ver com uma recomendação muito específica e muito direta em relação ao
modo correto, legal, de uma determinada empresa ser gerida.
O facto de estas notificações não terem sido feitas à DGCom e à Comissão Europeia veio a redundar na
ilegalidade de praticamente todos os auxílios públicos prestados à empresa, antes de 2005 mas,
designadamente, a partir de 2005 e até ao final da empresa.”161
d. Reprivatização
Embora a questão da reprivatização da ENVC só tenha sido efetivamente colocada e regulada em 2012,
importa mencionar que já na Resolução do Conselho de Ministros n.º 21/96, de 5 de março, que aprovou o
programa de privatizações, se vinha prever a privatização dos Estaleiros Navais de Viana do Castelo, por
venda direta, configurando-se, contudo, a manutenção de uma golden share nas mãos do Estado.
158
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 13 de março de 2014, Presidente do Conselho de Administração da EMPORDEF, Sr. Dr. Rui
Jorge de Carvalho Vicente Ferreira, págs. 117-118. 159
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 11 de março de 2014, Sr. Ministro da Defesa Nacional, Dr. José Pedro Aguiar Branco, pág. 11. 160
Anexo V – Parecer de José Luís da Cruz Vilaça – Relativo à compatibilidade com o regime jurídico dos auxílios de Estado e das
concentrações de empresas de contrato de compra de bens enquadrado em acordo de contrapartidas, de transferência de ações e de outras operações envolvendo os ENVC. 161
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 29 de abril de 2014, Presidente do Conselho de Administração da ENVC de 2004 a 2007, Sr. Dr.
Manuel Fernando Geraldes, págs. 61-62.
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Tal menção foi mesmo reforçada na Resolução do Conselho de Ministros n.º 65/97, de 21 de abril, que
aprovou o programa de privatizações para o biénio de 1998-1999. Aqui pode-se ler que com a privatização da
SETENAVE, por venda direta, no âmbito da reestruturação da LISNAVE, e dos Estaleiros Navais de Viana do
Castelo será concluída a abertura à iniciativa privada do sector da construção e reparação naval.
Pelo Decreto-Lei n.º 186/2012, de 13 de agosto, foi aprovado o processo de reprivatização do capital social
da Estaleiros Navais de Viana do Castelo, SA.
De acordo com o preâmbulo, a ENVC, SA, em Portugal, a indústria da construção e reparação naval é uma
indústria de base, com uma longa tradição. Todavia, a referida indústria necessita de flexibilização e de
investimento diversificado, que permitam a modernização adequada ao quadro da livre concorrência do
mercado em que se insere, no sentido de ser promovida a manutenção da atividade de construção e
reparação naval bem como de outras atividades económicas conexas ou relacionadas com aquelas, em
regime de auto sustentação económico-financeira.
Para cumprimento dos aludidos objetivos, e atendendo à urgência imperiosa decorrente da necessidade de
viabilização económico-financeira da ENVC, SA, e do cumprimento dos compromissos assumidos, o Governo,
com o presente diploma, pretende aprovar o processo de reprivatização do capital social da ENVC, SA.
É objetivo do Governo que o Estado deixe de ter qualquer participação direta ou indireta no capital social
da ENVC, SA, deixando esta, em consequência, de integrar o Sector Empresarial do Estado. Com a
concretização desta operação de reprivatização pretende-se que o capital social da ENVC, SA, seja alienado
por venda direta, porque se considera que, atentas as atuais dificuldades do mercado da construção e
reparação naval e atividades económicas conexas ou relacionadas, aliadas à deficitária situação económico e
financeira da ENVC, SA, esta modalidade é a que melhor salvaguarda o interesse nacional na realização
deste processo, em condições consideradas apropriadas para o valor do ativo a alienar.
Com efeito, o modelo de reprivatização consagrado no presente diploma permite não só ir ao encontro dos
compromissos assumidos no âmbito do Programa de Assistência Financeira, na medida em que a realização
de reprivatizações no Sector Empresarial do Estado contribui para o esforço de consolidação orçamental,
como ainda promover a flexibilização necessária à sustentabilidade e ao potencial desenvolvimento da ENVC,
SA, incrementando a presença de investidores de diversa natureza no mercado português permitindo, assim, a
diversificação das fontes de financiamento das empresas nacionais, o que justifica amplamente a sua adoção.
Nos termos previstos no n.º 1 do artigo 2.º e no 1 do artigo 6.º do Decreto-Lei n.º 186/2012, de 13 de
agosto, o processo de reprivatização do capital social da ENVC, SA, integra uma operação de venda direta a
um investidor que venha a tornar-se acionista de referência da ENVC, SA, de um bloco indivisível de ações
representativas do capital social da referida sociedade, e uma oferta pública de venda dirigida aos
trabalhadores da ENVC, SA, cuja dimensão e regime são definidos por resolução do Conselho de Ministros,
podendo atender-se, para o efeito, ao tempo de serviço efetivo por eles prestado na ENVC, SA.
Este processo de reprivatização incide sobre ações representativas do capital social da ENVC, SA, até ao
montante de 100 % do respetivo capital social, podendo as mencionadas operações ser efetuadas total ou
parcialmente, simultaneamente ou em momento anterior ou posterior entre si (n.os
2 e 3 do artigo 2.º). Já a
EMPORDEF deverá proceder às alienações das ações da ENVC, SA, de acordo com as regras estabelecidas
no referido diploma (n.º 4 do artigo 2.º).
O n.º 1 do artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 186/2012, de 13 de agosto, estipula que as ações a alienar por
venda direta de referência são objeto de operação de venda junto de investidor, nacional ou estrangeiro, que
pode concorrer individualmente ou em agrupamento, com perfil de investidor e com uma perspetiva de
investimento estável e de longo prazo, com vista ao desenvolvimento estratégico da ENVC, SA.
Relativamente ao processo de alienação, o n.º 1 do artigo 4.º prevê que o processo destinado à alienação
das ações objeto da venda direta de referência possa ser organizado em diferentes fases, incluindo uma fase
preliminar de recolha de intenções de aquisição junto de potenciais investidores de referência. A seleção dos
interessados que integrem as subsequentes fases do processo de alienação é realizada mediante resolução
do Conselho de Ministros (n.º 1 do artigo 4.º).
De acordo com o n.º 2 do artigo 4.º do supracitado diploma, constituem critérios de seleção das intenções
de aquisição para integração dos potenciais investidores de referência em subsequentes fases do processo de
alienação:
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a) A percentagem das ações representativas do capital social da ENVC, SA, a adquirir objeto da venda
direta de referência, sendo que se privilegia na presente operação de reprivatização, a alienação integral do
capital social da ENVC, SA;
b) O preço indicativo apresentado para a aquisição das ações representativas do capital social da ENVC,
SA, objeto da venda direta de referência;
c) A apresentação de um adequado projeto estratégico para a ENVC, SA, tendo em vista o
desenvolvimento das suas atividades nos mercados nacional e internacional, que maximize a manutenção dos
atuais recursos humanos da ENVC, SA, bem como a promoção da concorrência e competitividade do sector
da construção e reparação naval e de atividades económicas conexas ou relacionadas, e o desenvolvimento
da economia nacional;
d) A contribuição para a sustentabilidade económico-financeira da ENVC, SA;
e) A ausência ou mitigação de condicionantes jurídicas, laborais ou económico -financeiras do interessado
para a concretização da venda direta de referência em prazo, condições de pagamento e demais termos que
sejam adequados para a salvaguarda dos interesses patrimoniais do Estado ou para o funcionamento e
desenvolvimento do sector naval nacional;
f) A respetiva idoneidade, capacidade financeira, técnica e de execução, assim como as garantias
eventualmente prestadas para cumprimento dos critérios constantes das alíneas anteriores.
Por último, importa referir que o Governo consagrou o direito de, em qualquer momento e mediante
resolução do Conselho de Ministros, suspender ou dar sem efeito o processo de reprivatização, desde que
razões de interesse público o justifiquem (n.º1 do artigo 8.º). Neste caso os potenciais interessados e ou
proponentes não teriam direito, por algum desses factos, a qualquer indemnização ou compensação,
independentemente da sua natureza (n.º 2 do artigo 8.º).
Na sequência do Decreto-Lei n.º 186/2012, de 13 de agosto, e pela Resolução do Conselho de Ministros
n.º 73/2012, de 29 de agosto, procedeu-se à aprovação do processo e condições concretas aplicáveis à
realização da venda direta de referência. Com esse fim estabeleceu-se que a venda direta de referência tinha
por objeto ações representativas de uma percentagem máxima de 95% do capital social da Estaleiros Navais
de Viana do Castelo, SA (ENVC, SA), reservando-se um lote de ações representativas de 5% do capital social
da ENVC, SA, para disponibilização aos trabalhadores mediante oferta pública de venda, a efetuar em
simultâneo ou em momento posterior ao da aludida venda direta de referência. A referida Resolução aprova,
ainda, o respetivo caderno de encargos do processo de reprivatização do capital social da Estaleiros Navais
de Viana do Castelo, SA, (n.º 1 do artigo 1.º).
A operação de reprivatização é contratada com o proponente que venha a ser selecionado como
adquirente das ações objeto da venda direta de referência (n.º 2 do artigo 1.º), sendo a alienação das ações
efetuada pela EMPORDEF – Empresa Portuguesa de Defesa (SGPS), SA, [EMPORDEF (SGPS), SA] (n.º 3
do artigo 1.º).
Determina, ainda, o n.º 4 do artigo 1.º que no decurso da operação de reprivatização, a ENVC, SA, pode
ser objeto de atos e medidas com vista à sua reestruturação económico-financeira que se destinem a
responder aos objetivos da reprivatização e a consubstanciar a venda direta de referência, em cumprimento
dos termos e condições definidos no Decreto-Lei n.º 186/2012, de 13 de agosto, e no respetivo caderno de
encargos.
A Resolução do Conselho de Ministros n.º 75/2012, de 5 de setembro, veio determinar a admissão ou a
não admissão dos potenciais investidores de referência que procederam à apresentação de intenções de
aquisição, a participar nas subsequentes fases do processo de alienação das ações objeto de venda direta de
referência, no âmbito do processo de reprivatização do capital social da empresa Estaleiros Navais de Viana
de Castelo, SA.
Cumpre mencionar que pelo Despacho n.º 11459-A/2012, de 20 de agosto, dos Ministros de Estado e das
Finanças e da Defesa Nacional, a EMPORDEF procedeu à apresentação de um relatório com a apreciação
das intenções de aquisição do lote de ações que foram por si recebidas.
Assim sendo, e em conformidade com o artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 186/2012, de 13 de agosto, de entre
um conjunto vasto de potenciais investidores de referência que o Estado, através da EMPORDEF, convidou
para procederem à apresentação de intenções de aquisição, foram confirmadas seis intenções de aquisição
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das ações objeto da venda direta de referência. Foram admitidos, de acordo com o previsto no n.º 1 da
Resolução do Conselho de Ministros n.º 75/2012, de 5 de setembro, a participar nas subsequentes fases do
processo de alienação das ações objeto da venda direta de referência os seguintes potenciais investidores de
referência: Atlanticeagle Shipbuilding, Lda.; JSC River Sea Industrial Trading; Rio Nave Serviços Navais Ltda.;
e VolstadMaritimeAS.
A Resolução do Conselho de Ministros n.º 79/2012, de 20 de setembro, veio revogar a Resolução do
Conselho de Ministros n.º 183/2004, de 22 de dezembro, sobre o Programa Relativo à Aquisição de Navios
Destinados à Marinha Portuguesa, autorizando o Ministro da Defesa Nacional a proceder à revogação de
contratos entre o Estado Português e os Estaleiros Navais de Viana do Castelo, SA.
Na base desta decisão e de acordo com o preâmbulo, encontravam-se as graves dificuldades económico-
financeiras da ENVC, dificuldades estas que se agravaram nos últimos anos, e que conduziram à aprovação
pelo Governo do Decreto-Lei n.º 186/2012, de 13 de agosto, que consagrou o processo de reprivatização do
capital social da ENVC, SA.
Assim, considerando que i) todos os bens objeto dos contratos de fornecimento e de aquisição celebrados
entre o Estado e a ENVC, SA, constituem navios de guerra abrangidos pela lista a que se refere a alínea b) do
n.º 2 do artigo 296.º do Tratado de Amesterdão, correspondente à alínea b) do n.º 2 do artigo 223.º do Tratado
de Roma, ii) a sua construção exige um acompanhamento especial por razões essenciais de segurança,
relacionadas com a especificidade e sensibilidade do material instalado e com a prudência requerida para a
respetiva instalação e manuseamento, sendo os documentos de suporte aos contratos celebrados, na sua
maioria, classificados, iii) a evolução do estatuto jurídico da ENVC, SA, que culminará na reprivatização do seu
capital social, passando a integrar o sector privado, é interesse do Estado salvaguardar que todos os
documentos, projetos e bens adquiridos ou produzidos no âmbito dos contratos de aquisição e fornecimento
celebrados com a ENVC, SA, permaneçam na propriedade do Estado, de forma a proteger o interesse público;
Por último, no âmbito de um contrato de contrapartidas celebrado com o German Submarine Consortium, a
ENVC, SA, foi beneficiária de um projeto de construção de um navio polivalente logístico, que é, atualmente,
propriedade da ENVC, SA, tendo o Estado um interesse crucial e estratégico na aquisição do referido projeto
de forma a salvaguardar que as suas especificidades e características únicas permanecem na propriedade do
Estado, tendo em vista a sua potencial construção futura e a sua utilização como um elemento importante nas
relações na área da defesa com outros países.
Pelo Despacho n.º 13366/2012, de 28 de setembro, e pelo Despacho n.º 15993/2012, de 17 de dezembro,
foram nomeados os membros que integram a comissão especial de acompanhamento do processo de
reprivatização dos ENVC.
A criação da comissão especial para o acompanhamento de reprivatização da ENVC, SA, tem em vista
apoiar tecnicamente o processo de reprivatização e garantir a plena observância dos princípios da
transparência, do rigor, da isenção, da imparcialidade e da melhor defesa do interesse público, contribuindo,
assim, para o sucesso desta operação.
A Resolução do Conselho de Ministros n.º 96/2012, de 15 de novembro, veio estabelecer o prazo de
indisponibilidade das ações objeto da venda direta de referência, no âmbito do processo de reprivatização dos
ENVC.
Segundo o preâmbulo, atendendo a que, nos termos do despacho n.º 13950-A/2012, dos Ministros de
Estado e das Finanças e da Defesa Nacional, publicado no Diário da República, 2.ª série, de 25 de outubro de
2012, o prazo para apresentação das referidas propostas vinculativas termina às 10 horas do próximo dia 5 de
novembro de 2012, importa regular as situações em que as ações objeto da venda direta de referência ficam
sujeitas ao regime de indisponibilidade e o respetivo período de aplicação.
Determina-se, deste modo, que o regime de indisponibilidade previsto no artigo 5.º do Decreto-Lei n.º
186/2012, de 13 de agosto, que aprova o processo de reprivatização do capital social da Estaleiros Navais de
Viana do Castelo, S. A. (ENVC, S. A.), se aplica à totalidade das ações objeto da venda direta de referência
quanto a quaisquer situações relativas à sua transmissão ou oneração, parcial ou total, de forma direta ou
indireta, bem como no caso de celebração de negócios jurídicos relativos às ações a alienar na venda direta
de referência que tenham por objeto a obrigação de exercício dos respetivos direitos de votos num certo
sentido ou por interposta pessoa, com exceção das situações que venham a ser definidas nos instrumentos
jurídicos, cujas minutas são aprovadas pelo Conselho de Ministros nos termos do n.º 1 do artigo 16.º do
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caderno de encargos anexo à Resolução do Conselho de Ministros n.º 73/2012, de 29 de agosto. Também as
ações a alienar por venda direta de referência no âmbito do processo de reprivatização do capital social da
ENVC, SA, ficam sujeitas ao regime de indisponibilidade previsto no artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 186/2012, de
13 de agosto, por um prazo de cinco anos.
A Resolução do Conselho de Ministros n.º 27/2013, de 24 de abril, veio determinar a conclusão do
processo de venda direta de referência no âmbito do processo de reprivatização da empresa Estaleiros
Navais de Viana do Castelo, SA.
Segundo o preâmbulo da mencionada Resolução, após conclusão das diligências informativas prevista no
artigo 6.º do caderno de encargos, foram rececionadas três propostas vinculativas de aquisição: (i) da Rio
Nave Serviços Navais Ltda. (Rio Nave), (ii) da JSC – RiverSea Industrial Trading (RSI Trading), e (iii) da
VolstadMaritime AS (Volstad), tendo apenas sido admitidas as propostas vinculativas da Rio Nave e da RSI
Trading. A proposta vinculativa da Volstad foi rececionada após o término do prazo limite de recebimento das
propostas vinculativas de aquisição.
Em cumprimento do disposto no n.º 1 do artigo 13.º do caderno de encargos, a EMPORDEF, em 8 de
novembro de 2012, emitiu um relatório de apreciação das ofertas vinculativas admitidas, onde concluiu que da
informação constante das mesmas não era possível apreciar o mérito das propostas, tendo sido solicitados
esclarecimentos com respeito a cada uma das propostas apresentadas. Foram entretanto prestados pela Rio
Nave e pela RSITrading, diversos esclarecimentos adicionais solicitados e relativos a cada uma das respetivas
propostas, e a EMPORDEF em 17 de abril de 2013 emitiu e entregou ao Governo, o seu relatório final
fundamentado.
Na proposta vinculativa que apresentou, a Rio Nave determinou a validade da mesma pelo prazo de
noventa dias a contar da respetiva entrega ocorrida em 5 de novembro de 2012, tendo assim a mesma já
caducado. Por sua vez, a RSI Trading fixou o prazo de validade da sua proposta vinculativa até 5 de janeiro de
2013, e mediante as comunicações apresentadas em 21 de dezembro de 2012 e 1 de março de 2013 foi o
mesmo prorrogado sucessivamente, até 6 de maio de 2013.
Assim, o Conselho de Ministros apreciou o mérito da proposta vinculativa apresentada pela RSITrading em
conformidade com o disposto no artigo 14.º do caderno de encargos, tendo considerado que as condições
constantes da proposta vinculativa apresentada, nomeadamente o preço, os termos e as garantias exigidos
pela RSITrading, refletidos nomeadamente nas propostas de alterações à minuta dos instrumentos jurídicos
integrantes da respetiva proposta vinculativa, constituem compromissos demasiado onerosos e insuscetíveis
de serem assumidos pelo Governo Português, na medida em que representam a assunção de passivos
avultados, responsabilidades e contingências excessivas que extravasam o mero impacto no fluxo financeiro
decorrente da venda da ENVC, SA, não permitindo assim, acautelar os interesses patrimoniais do Estado e a
concretização dos objetivos subjacentes ao processo de alienação das ações da ENVC, SA.
Em conformidade com o disposto no n.º 2 do artigo 13.º do caderno de encargos, a comissão especial de
acompanhamento do processo de reprivatização, constituída pelo Despacho n.º 13366/2012, de 28 de
setembro e pelo Despacho n.º 15993/2012, de 17 de dezembro de 2012, ambos do Primeiro-Ministro, emitiu,
em 14 de novembro de 2012, atualizado em 17 de abril de 2013, parecer sobre a regularidade, a
imparcialidade e a transparência do processo, tendo a este respeito concluído pelo cumprimento das regras e
procedimentos legais aplicáveis.
Salienta-se, contudo, que o Governo, não obstante o presente desfecho do processo de alienação das
ações objeto da venda direta de referência no âmbito do processo de reprivatização da ENVC, SA, entende
ser oportuno referir que está a promover alternativas que permitam potenciar a utilização dos terrenos
concessionados à ENVC, SA, bem como o conjunto das infraestruturas afetas, eventualmente aliadas ao
reforço das áreas existentes, com vista à dinamização e viabilização da instalação de novas entidades que
possam contribuir de forma positiva e sustentável para o desenvolvimento económico e social e que não se
traduzam em compromissos insuscetíveis de serem assumidos pelo Governo Português.
Das audições havidas em Comissão, destaca-se:
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No que concerne ao tempo que o atual Governo demorou até tomar a decisão de privatização, responde o
Sr. Ministro da Defesa Nacional, Dr. José Pedro Aguiar Branco, ao Sr. Deputado António Gameiro:
“(…) Sr. Deputado, quando faz referência a que demorámos um ano e dois meses a tomar a decisão da
privatização, isso não é verdade! A decisão foi tomada em março e foi por mim próprio anunciada. Depois, há
todo um conjunto de procedimentos legais que têm de ser executados e, como sabe, temos de fazer uma de
duas escolhas: ou somos transparentes, e temos que seguir a lógica dos concursos públicos, nomeadamente
dos internacionais, e isso implica que esse procedimento é menos amigo da celeridade, ou somos muito
céleres, mas temos de ser menos transparentes, tendo que fazer ajustes diretos e negociações diretas que
são amigas da celeridade, mas inimigas da transparência.
Como é óbvio, não podemos querer as duas coisas ao mesmo tempo, porque é impossível. O Governo
anunciou, cerca de cinco meses depois de ter tomado posse e de ter constatado que não havia possibilidades
financeiras do Estado para injetar capital naquela empresa, o modelo da reprivatização, e depois instaurou os
procedimentos legais com vista a essa reprivatização.”162
O Sr. Ministro da Defesa Nacional, Dr. José Pedro Aguiar Branco, responde sobre o que impediu a
reprivatização dos ENVC ao Sr. Deputado Fernando Negrão:
“(…) À pergunta «o que é que impediu a privatização dos estaleiros?» respondo que o que impediu a
privatização dos estaleiros… Aliás, deva-se dizer que, quando o Governo lançou a privatização, ainda não
havia conhecimento dos 181 milhões de euros de ajuda dadas. Ou seja, o Governo, por não haver condições
de assegurar a viabilidade daquela empresa que estava numa situação de praticamente falência, procurou
encontrar um parceiro que pudesse injetar capital e, por isso, lançou o modelo da privatização, que, aliás, o
próprio Partido Socialista já tinha considerado antes, nomeadamente na altura do PEC III em que também
achava que era um modelo que poderia ser viável para os Estaleiros. Lançámos o modelo de privatização, no
âmbito do qual a privatização poderia ocorrer pela aquisição da totalidade das ações, porque, no modelo,
dissemos que era até 95%, o que significava que, se aparecesse alguém que pudesse fazer, em relação aos
Estaleiros, como foi feito em relação às OGMA, que era dizer que estava interessado em comprar 65%, 70%
ou 72%, isso teria de ser considerado no âmbito da avaliação da proposta que fosse apresentada. Portanto, o
modelo OGMA também podia vir a ser considerado, só que não houve ninguém que apresentasse a proposta
nesses termos.
Ora, dado que, quando estávamos para decidir, surge a notificação da DGCom e estavam sobre a mesa
duas propostas — uma, de uns brasileiros que acabaram por desistir, e outra, que, pelas condições que queria
assegurar na negociação, ia contra o interesse público, como é óbvio —, tínhamos de garantir o risco da
eventual condenação dos 181 milhões de euros, o que era uma situação que inquinaria, e inquinou, qualquer
hipótese de o Estado poder concluir a reprivatização. E foi essa situação que determinou que a mesma não
ocorresse.”163
Ainda relativamente ao procedimento com a DGCOM e o fim da reprivatização, o Sr. Ministro da Defesa
Nacional, Dr. José Pedro Aguiar Branco, responde à Sr.ª Deputada Mónica Ferro:
“(…) Sr.ª Presidente, começo por responder à Sr.a Deputada Mónica Ferro, relativamente ao procedimento
com a Direção-Geral da Concorrência da União Europeia, processo de privatização, análise de casos
semelhantes: nós queríamos a reprivatização.
Às vezes, parece que paira por aí a ideia de que queríamos um pretexto para não concluirmos o processo
de privatização. Nós queríamos a reprivatização, porque achávamos que era o único modelo que permitiria
injetar capital para se poder dar continuidade àquela empresa; e à época, se essa reprivatização fosse
conseguida com êxito, isso permitiria também assegurar os postos de trabalho naquela empresa, porque
juridicamente isso era exequível, como referi na Comissão de Defesa Nacional.
162
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 11 de março de 2014, Sr. Ministro da Defesa Nacional, Dr. José Pedro Aguiar Branco, págs. 41-42. 163
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 11 de março de 2014, Sr. Ministro da Defesa Nacional, Dr. José Pedro Aguiar Branco, págs. 15-16.
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Portanto, o nosso objetivo inicial era ter a reprivatização, ter um novo parceiro que injetasse capital e que,
por via disso, continuasse a atividade daquela empresa num modelo diferente, no que diz respeito à sua
participação acionista —isto decidido em março de 2012.”164
Ouvido na comissão de inquérito, o Sr. Eng.º José Manuel Fernandes, Presidente da Comissão Especial
para o Acompanhamento de Reprivatização da ENVC, SA, elogiou o bom trabalho da EMPORDEF e centrou-
se nos "aspetos da legalidade".
Afirmou que durante todo o processo foram respeitados os princípios da transparência, isenção,
imparcialidade e melhor defesa do interesse público, pese embora, não ter tido qualquer intervenção no
próprio conteúdo do processo.
Deputado Rui Paulo Figueiredo (PS): — (…) Fiz-lhe uma pergunta precisa, que gostava de recordar: para
revisão dos procedimentos efetuados na fase preliminar de concurso — definição de procedimentos e de
planeamento —, o que é que a Comissão fez?
Em resposta, o Sr. Eng.º José Manuel Fernandes: — Acompanhámos tudo ao mais pequeno pormenor.
Temos isso exarado no nosso índex das reuniões — dos temas tratados e com quem. De maneira que o «par
e passo» era o desenvolvimento de todo o acompanhamento, sobretudo daquilo que estava a acontecer ou iria
acontecer. De maneira que isso era um trabalho que estávamos a fazer, simultaneamente à medida que se
desenvolvia o processo (…)
Deputado Rui Paulo Figueiredo (PS): — Agradeço-lhe a resposta, mas, se me permite e com toda a
simpatia, ela foi um pouco vaga. E isso traduziu-se em quê? Leu documentos, deu pareceres, sugeriu
alterações, ou concordou com tudo aquilo que lhe era apresentado?
Sr. Eng.º José Manuel Fernandes: —(…) De facto, vimos aí um trabalho muito profissional, muito
qualificado. Tudo era feito sempre com uma cautela muito grande da parte da EMPORDEF junto de nós, no
sentido de nos dar conhecimento de todos os passos que estavam a dar. Nós retocávamos um ou outro ponto
relativamente ao qual entendíamos que se devia seguir uma determinada orientação de clareza e de rigor
quanto à apresentação de dados. (…)
Deputado Rui Paulo Figueiredo (PS): — Então, já agora, pode dar-nos exemplos de retoques ou de
mudanças de rumo (expressões que utilizou), que tenham sido efetuados por intervenção da Comissão de
Acompanhamento?
Sr. Eng.º José Manuel Fernandes: — Referi «retoques» no sentido de, por exemplo, querermos uma
reunião com o advogado tal, ou querermos uma reunião com o BESI. Portanto, quando falei em «retoques»,
queria referir-me não a alterações mas, sobretudo, a conhecimento de detalhes que nos permitissem estar
integrados no acompanhamento de todo o processo.
Ainda o Deputado Rui Paulo Figueiredo (PS): — Portanto, foi um bom trabalho da EMPORDEF e a
Comissão acompanhou o trabalho da EMPORDEF.
Sr. Eng.º José Manuel Fernandes: — Acho que, no contexto em que o trabalho foi realizado e nos foi
apresentado, o trabalho foi bem realizado. Eu, como engenheiro e como empresário e também como alguém
outrora ligado à metalomecânica pesada, tenho uma opinião em relação à abordagem. Mas não era a minha
missão, nem nunca quis — nem quisemos nós, na Comissão —, intervir em aspetos de conteúdo em relação
àquilo que estava em andamento e à regulamentação, ao próprio despoletar da forma como o concurso estava
realizado. Não quer dizer que fosse pior, mas nunca quisemos intervir nessa área.
164
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 11 de março de 2014, Sr. Ministro da Defesa Nacional, Dr. José Pedro Aguiar Branco, págs. 74-75.
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Em resposta a perguntas do Sr. Deputado Jorge Paulo Oliveira, esclarece:
“(…) Começo por dizer que a criação desta Comissão está estruturada, em termos de regulamentação, em
decreto-lei, portanto no Diário da República, e em termos de necessidade, num processo destes, era
imprescindível, pois ele não poderia desencadear-se sem que esta Comissão estivesse a operar e tivesse
plenos poderes para acompanhar todo o processo.
Inicialmente, não fui eu o convidado para presidir a esta Comissão — foi o Eng.º Van Zeller. Passado um
período de tempo, após a demissão deste, houve um convite que nos foi feito pela Sr.ª Secretária de Estado
do Tesouro, atual Sr.ª Ministra das Finanças, e que nós aceitámos.
Hoje, o que posso dizer, e foi sempre a nossa sensibilidade e visão, é que — seria a missão desta
Comissão — devíamos cumprir exatamente aquilo que estava no Diário da República e que tinha sido
publicado em 13 de setembro de 2011 (a lei de 2011), que era, de facto, a incumbência de «apoiar
tecnicamente o processo de reprivatização, de modo a garantir plena observância dos princípios da
transparência, do rigor, da isenção, da imparcialidade e da melhor defesa do interesse público.» Esta foi
sempre a visão que tivemos diante de nós e, ao mesmo tempo, muito preocupados com a componente,
sobretudo, do processo — de fiscalização do processo, da defesa do interesse do Estado e defesa dos
interesses públicos.
O Sr. Jorge Paulo Oliveira (PSD): — Sr. Engenheiro, acabou agora mesmo de afirmar que a primeira
preocupação foi, de facto, a de cumprir escrupulosamente aquilo que estava plasmado no respetivo diploma
legal e publicado em Diário da República.
Sem embargo, gostaríamos que pudesse densificar um pouco mais o constante desse diploma e aquilo que
foi a atividade da Comissão. Nomeadamente, gostaríamos de saber se seria possível fazer uma descrição
daquilo que foi verdadeiramente a vossa intervenção e quais foram as principais atividades que a Comissão
desempenhou, no cumprimento daquilo que era a missão que lhe estava confiada.
Gostaríamos também de saber se existiram condicionalismos e princípios fixados pelo Estado e que
tenham, de alguma forma, limitado o que supostamente foi a liberdade de atuação da Comissão, no exercício
das suas funções.
O Sr. Eng.º José Manuel Fernandes: — De forma alguma. Nós tivemos 100% de liberdade de atuação e de
marcação da nossa agenda em relação a todas as outras partes em que interviemos com o pedido de
reuniões, de esclarecimento de documentos, legalidade de processos… Atuámos de uma forma sempre de
acordo com aquilo que era o nosso parecer.
Aproveito para dizer que a Comissão foi constituída por três elementos e, sobretudo, os meus dois colegas
eram pessoas de alta especialização, um deles até em relação ao setor: o Dr. Poças Esteves com uma
experiência no âmbito do rating internacional, da SaeR — Sociedade de Avaliação Estratégica e Risco, e o
Eng.º Ventura de Sousa, um expert na área da construção naval e Secretário-Geral da Associação das
Indústrias Navais.
De maneira que estávamos absolutamente à vontade para identificar toda e qualquer questão que era
necessário certificar, pedir elementos ou esclarecimentos. Nunca tivemos nenhum obstáculo a que a nossa
missão fosse levada até ao fim, com o empenho e a responsabilidade que nós assumíamos.
O Sr. Jorge Paulo Oliveira (PSD): — Sr. Engenheiro, uma das preocupações, como também já aqui referiu,
foi no exercício de funções de fiscalização para a defesa do interesse público e para a defesa da legalidade.
Assim, pergunto se teve conhecimento, ou se a Comissão teve conhecimento, de alguma situação que
possa ser tida como anormal, por um lado, e, por outro, se foi detetada alguma irregularidade, no exercício
dessa função de fiscalização, no decurso deste processo.
O Sr. Eng.º José Manuel Fernandes: — Posso responder perentoriamente que não foi detetada nenhuma
irregularidade durante este processo e ele terminou conforme todos nós temos conhecimento e está, também
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em Diário da República. De maneira que isso nunca aconteceu.”165
O Sr. Eng.º Jorge Camões, atual Presidente do Conselho de Administração da Estaleiros Navais de Viana
do Castelo e os restantes vogais do Conselho de Administração, responderam às perguntas do Sr. Deputado
Abel Baptista, sobre a suspensão da reestruturação e a tentativa de reprivatização da ENVC:
“ O Sr. Dr. José Luís Serra: —(…)
Desde o plano de reestruturação — e devo relembrar que nós, os quatro, fazíamos parte da administração
que propôs o plano de reestruturação que, depois, foi suspenso —, tínhamos assumido que algo de muito
radical, não no pior sentido desta palavra, mas algo muito profundo era preciso fazer.
A alienação da participação de 95% do capital, porque, como se recordam, 5% ficariam com a faculdade de
serem adquiridos pelos trabalhadores, era uma solução que, na nossa opinião, tinha uma vantagem principal:
permitia tentar que o Estado, na sua responsabilidade como acionista final, pudesse, com esta venda, ver
transferidas todas as contingências patrimoniais e fora do balanço. Este parecia-me, claramente, com esta
estratégia, o melhor resultado.
E nós defendemos, e eu recordo que o plano de reestruturação também o previa numa fase seguinte, a
privatização daquela empresa. Portanto, nunca houve nenhuma mudança quanto ao objetivo final, que era o
de que a construção naval se mantivesse naquela zona, mas que o operador fosse privado, porque o Estado
português, como acionista, tinha provado, através daqueles resultados, que aquela situação se configurava
como absolutamente insustentável, desde logo, até por falta de financiamento no mercado. Não é possível
construir e executar contratos de milhões de euros sem ter a banca, e quando digo a banca digo no sentido
mais lato, pois não estamos a falar de um ou dois bancos, porque, na maior parte das vezes, essas
operações, pela sua dimensão, são sindicadas.
Portanto, foi a melhor decisão no momento em que foi tomada, como também consideramos que a
reestruturação, no momento em que foi decidida, era uma boa decisão. Objetivo final: privatização!”166
e. Subconcessão West Sea
A Resolução do Conselho de Ministros n.º 86/2013, de 10 de dezembro, declarou a empresa
Estaleiros Navais de Viana do Castelo, SA (ENVC, SA) em situação económica difícil.
Na base desta decisão e segundo o preâmbulo encontra-se, em primeiro lugar, a situação económico-
financeira da empresa. Afirma-se que a ENVC, SA, não procedeu às adaptações que a crise no sector
justificava, revelando uma situação económico-financeira deficitária, em que os prejuízos acumulados em anos
sucessivos e até junho de 2013 ascendem a 264 094 000,00 EUR, não se antecipando a possibilidade de
reversão dos mesmos, num período de médio prazo.
Acrescenta-se que atendendo à urgência imperiosa decorrente da necessidade de viabilização da ENVC,
SA, e do cumprimento dos compromissos de ajustamento económico-financeiros assumidos, o Governo
lançou um processo de reprivatização da ENVC, SA, mediante a venda direta de referência da participação
social de uma percentagem máxima de 95 % do capital social da referida sociedade. Este processo foi
concluído pela rejeição da única proposta vinculativa válida, determinada pela Resolução do Conselho de
Ministros n.º 27/2013, de 17 de abril, em resultado de as condições apresentadas naquela proposta se
traduzirem em passivos avultados, responsabilidades e contingências excessivas que extravasavam o mero
impacto no fluxo financeiro decorrente da venda da ENVC, SA, não permitindo, assim, acautelar os interesses
patrimoniais do Estado e a concretização dos objetivos subjacentes ao processo de venda direta das ações da
referida sociedade.
165
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 3 de abril de 2014, Presidente da Comissão Especial para o Acompanhamento de Reprivatização
da ENVC, SA, Sr. Eng.º José Manuel Fernandes, págs. 3-6. 166
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 7 de maio de 2014, atual Presidente do Conselho de Administração dos ENVC, Sr. Eng.º Jorge
Camões, e restantes vogais do Conselho de Administração, Sr. Dr. José Luís Serra, Sr. Eng.º Francisco Gallardo e Sr. Almirante Conde Baguinho, págs. 40-42.
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Não obstante, o Governo promoveu alternativas que permitem potenciar quer a utilização dos terrenos
concessionados, quer o conjunto das infraestruturas afetas à referida concessão, com vista à dinamização e
viabilização da instalação de novas entidades que contribuam de forma positiva e sustentável para o
desenvolvimento económico e social e que não se traduzam em compromissos insuscetíveis de serem
assumidos pelo Governo Português.
No primeiro semestre do corrente exercício de 2013, a ENVC, SA, acumulou um passivo total de 264 094
000,00 EUR onde se inclui um passivo financeiro no valor de 168 815 000,00 EUR. A ENVC, SA, encontra-se,
desde 2012, sem financiamento próprio por recurso ao sistema financeiro, permanecendo, bastante limitada
no exercício da sua atividade, com uma exploração fortemente deficitária, que se traduz numa situação
económica difícil.
A Resolução do Conselho de Ministros n.º 86/2013, de 10 de dezembro, veio também determinar a adoção
de medidas de gestão que se revelem necessárias e indispensáveis, atendendo à situação económica e
financeira da ENVC, SA, designadamente no que respeita a organização dos recursos humanos e eventual
redução de efetivos, bem como a restruturação da organização dos recursos materiais e produtivos da
empresa.
Estabeleceu, também, que a ENVC, SA, deveria iniciar de imediato a implementação de ações adicionais
conducentes à minimização dos efeitos da sua atual situação económico-financeira deficitária,
designadamente, mediante ações de desinvestimento, traduzidas na alienação de alguns dos seus bens
móveis, não incluídos ou afetos à «Subconcessão da Utilização Privativa do Domínio Público e das Áreas
Afetas à Concessão Dominial atribuída à Sociedade Estaleiros Navais de Viana do Castelo, S. A.», de forma a
maximizar a valorização dos mesmos no mercado, através de procedimentos de venda transparentes e
concorrenciais.
Estabeleceu, por último, que as necessidades financeiras associadas ao cumprimento da medida referida
no n.º 2 seriam asseguradas mediante financiamento bancário concedido à Empordef, SGPS, SA, acionista
única da ENVC, SA, até ao montante máximo de 31 000 000,00 EUR.
Sobre esta matéria pode ser consultado o comunicado do Conselho de Ministros de 5 de dezembro de
2013.167
Pelo Despacho n.º 11029/2013, da Ministra de Estado e das Finanças e do Ministro da Defesa Nacional, de
27 de agosto, foi nomeado o júri do procedimento relativo à «Subconcessão da Utilização Privativa do Domínio
Público e das Áreas Afetas à Concessão Dominial atribuída à Sociedade Estaleiros Navais de Viana do
Castelo, SA»., o qual, após análise das propostas apresentadas e atendendo aos termos e condições
previstos no programa do procedimento, admitiu apenas a proposta apresentada pelo agrupamento composto
pelas empresas Martifer – Energy Systems SGPS, SA, e Navalria – Docas, Construções e Reparações
Navais, SA. Subsequentemente, por decisão do Conselho de Administração da ENVC, SA, de 11 de outubro
de 2013, foi adjudicada ao referido agrupamento a subconcessão objeto do referido procedimento.
Segundo informação disponibilizada no Portal do Governo datada de 18 de outubro de 2013, a
administração dos Estaleiros Navais de Viana do Castelo decidiu adjudicar a subconcessão dos terrenos e
infraestruturas da empresa ao grupo português Martifer, garantindo a continuação da atividade.
«Hoje os ENVC renascem com uma perspetiva otimista nas mãos e por via de uma empresa portuguesa e
que vai, com certeza, contribuir para que naquela região se mantenha o maior número de postos de trabalho»,
afirmou José Pedro Aguiar-Branco. O Ministro da Defesa Nacional acrescentou que «só podemos todos ficar
satisfeitos por uma situação que há dois anos era de despedimento de todos os trabalhadores e de
encerramento da atividade construção naval».
O Ministro – que falava em Vila Nova de Famalicão, após uma visita à fábrica têxtil Riopele, que fecha um
conjunto de visitas a empresas e entidades integrantes da Base Tecnológica e Industrial para a Defesa –
referiu que o objetivo desde o início deste processo foi assegurar a manutenção do maior número de postos
de trabalho.
Aguiar-Branco referiu também que nas próximas semanas será feito um trabalho em conjunto com a
Martifer, para definir os termos da concessão em concreto e o número de trabalhadores que serão necessários
para satisfazer as encomendas dos ENVC, entre as quais uma da Venezuela.
167
Adaptado de relatório DILP, Estaleiros Navais de Viana do Castelo, março de 2014.
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Também de acordo com informação disponibilizada no site da Martifer, a subconcessão terá o valor de 415
mil euros anuais, vigorará até 2031 e o seu objeto constitui, única e exclusivamente, a utilização das áreas de
terreno que integram a concessão dominial concessionada aos ENVC, dos edifícios, infraestruturas e alguns
equipamentos afetos à concessão dos ENVC.
O grupo Martifer, através da sociedade a constituir para o efeito, pretende desenvolver a sua atividade no
mercado nacional e internacional e implementar, nas áreas afetas à aludida Subconcessão dos ENVC, um
projeto de construção e reparação naval, no âmbito do qual se prevê a criação de cerca de 400 novos postos
de trabalho ao longo dos próximos 3 anos.
Com esta subconcessão, o Grupo Martifer aumenta a sua capacidade de construção e reparação naval,
setor onde já opera desde 2008 através da sua subsidiária Navalria.
O grupo Martifer, através da sua nova subsidiária West Sea, pretende desenvolver a sua atividade no
mercado nacional e internacional e implementar um projeto de construção e reparação naval, no âmbito do
qual se prevê a criação de cerca de 400 novos postos de trabalho ao longo dos próximos 3 anos. Com esta
subconcessão, o Grupo aumenta a sua capacidade de construção e reparação naval.
A assinatura do contrato decorreu numa cerimónia oficial que contou com a presença do Presidente do
Conselho de Administração do grupo Martifer, Carlos Martins, do Ministro da Defesa Nacional, José Pedro
Aguiar-Branco e da Ministra de Estado e das Finanças, Maria Luís Albuquerque.168
Relativamente à situação dos auxílios Estatais e à abertura de um procedimento de investigação Europeu,
O Sr. Ministro da Defesa Nacional, Dr. José Pedro Aguiar Branco, responde ao Sr. Deputado Fernando
Negrão, sobre as consequências deste procedimento de investigação Europeu, que levaram à Subconcessão
dos ENVC:
(…) “a partir do momento em que é aberto o procedimento de investigação, pelo tempo que demora a
resolução deste procedimento, que nunca é inferior a 6 meses e seria sempre, em termos médios, entre 1 e 2
anos — é a experiência de todos os procedimentos desta natureza —, e em face do risco de condenação,
porque já todo o processo estava instruído relativamente à justificação, pelo Estado português, das ajudas
dadas, por um lado, fica-se impossibilitado de injetar qualquer dinheiro, porque isso poderá ser considerado
uma ajuda ilegal — embora os Estaleiros não pudessem viver sem injeção de capital, o Estado não podia
meter lá dinheiro, em linguagem mais banal —, mas, por outro, não há ninguém que lá queira meter dinheiro,
dado que há o risco de condenação e de se ser obrigado a devolver ao Estado os 181 milhões de euros.
Portanto, na prática, isto significou uma machadada final na possibilidade de viabilização daquela empresa.
Mas isto significou também que ou se fazia a liquidação e a cessação da atividade económica da empresa e,
por via dessa circunstância superveniente, não havia necessidade de restituição ao Estado, por parte da
empresa, das verbas que entregou, porque deixava de estar no mercado e, portanto, não era beneficiária da
distorção da concorrência ou, então, se assim não fosse, tinha de devolver ao Estado os 181 milhões de
euros, mas não tinha condições financeiras para o fazer. A condenação dessa matéria, a verificar-se, também
hoje, segundo a experiência do Tribunal de Justiça, implica uma condenação em multa per diem, ou seja, por
cada dia que passe sem que o Estado português faça a execução da respetiva decisão em relação aos
Estaleiros.
Portanto, a partir do momento em que foi instaurado esse procedimento de averiguação aprofundada, a
consequência foi muito simples: os Estaleiros não tinham condições para continuar a laborar e, portanto,
tinham de encerrar.”169
O Sr. Ministro da Defesa Nacional, Dr. José Pedro Aguiar Branco, responde sobre o a Subconcessão dos
ENVC ao Sr. Deputado Fernando Negrão:
“(…) Perguntou-me, ainda, sobre a subconcessão — e vou tentar ser ainda mais rápido, Sr.ª Presidente —,
no sentido de saber se era a única saída que podia garantir a atividade. Digo que sim! Porquê? Porque a partir
do momento em que a situação se coloca na necessidade de encerrar a empresa e proceder à liquidação dos
168
Adaptado de relatório DILP, Estaleiros Navais de Viana do Castelo, março de 2014. 169
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 11 de março de 2014, Sr. Ministro da Defesa Nacional, Dr. José Pedro Aguiar Branco, págs. 18-19.
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ativos, porque isto era uma exigência decorrente das interlocuções com a DGCom, a venda dos ativos é uma
venda em concurso público e mercado livre, ou seja, como em qualquer falência, quem der mais leva o
respetivo ativo. Ora, a preocupação do Governo, desde o início, como o Sr. Deputado referiu, foi a de tentar
preservar duas coisas: a situação social e laboral dos trabalhadores e a continuidade da construção e
reparação naval em Viana do Castelo. Daí surge a hipótese, que foi concertada e aceite pela DGCom, de se
colocar em concurso público a própria concessão, no sentido de a mesma ser objeto de uma subconcessão.
Com isto, o que é que acontece? Acontece que se limita, nos termos do concurso, o objeto a que se podem
destinar aquelas infraestruturas. A partir do momento em que é uma subconcessão que é colocada em
concurso público, limita-se o objeto da própria concessão. (…) Com a subconcessão condicionou-se o objeto
e, por arrastamento, que é uma palavra muito cara ao Ministério da Defesa, quando alguém concorre para a
subconcessão, para continuar a explorar a construção e a reparação navais, precisa de trabalhadores. Como
sempre disse aqui, quando me perguntavam se podia garantir os postos de trabalho, era normal que quem
precisasse de explorar e exercer aquela atividade, contratasse trabalhadores e o fizesse prioritariamente no
âmbito dos que estavam naquela região. E, por via de um vaso comunicante que desejávamos que
acontecesse de forma transparente, mas que, juridicamente, não podíamos garantir, acreditámos que a
estratégia podia resultar, no sentido de conseguirmos o melhor para Viana do Castelo.
O concurso foi um concurso público internacional, foi público, foi transparente, o júri foi presidido por um
magistrado do Ministério Público e várias entidades se apresentaram ou levantaram cadernos de encargos.
Posso dizer — e vou terminar com isto, Sr.ª Presidente —, porque me parece importante, já que também se
quis lançar lama, de uma forma ignóbil, sobre essa realidade, que o processo de subconcessão foi público, foi
anunciado em três jornais diários nacionais, houve um contacto direto a 57 entidades de todos os cantos do
mundo, 16 entidades demonstraram interesse, 8 entidades levantaram peças de procedimento (não contando
com o Sr. Presidente da Câmara Municipal de Viana do Castelo, que também o fez), 4 entidades visitaram os
Estaleiros, 2 apresentaram propostas e o processo foi conduzido por um júri independente e presidido por um
magistrado do Ministério Público, o qual, depois, classificou a proposta apresentada pela Martifer. Se o tivesse
feito em relação aos russos, hoje, estávamos a falar dos russos e não da Martifer.170
No que diz respeito à legalidade e transparência deste processo de Subconcessão, o Sr. Ministro da
Defesa Nacional, Dr. José Pedro Aguiar Branco, esclareceu o Sr. Deputado António Gameiro:
“(…) Quanto à legalidade, a legalidade é reconhecida pelo júri e pelo presidente, tendo em consideração
aquilo que entendem ser as leis a que, naquele momento, aqueles atos devem obedecer. Se alguém quiser
pôr em causa a legalidade tem à sua disposição os meios, os mecanismos para o efeito. Ou seja, estamos
aqui a falar nas questões da transparência; quanto à legalidade, existem os tribunais, caso alguém queira
impugnar esses atos como sendo ilegais. E isto foi sustentado, inclusivamente, por pareceres de pessoas com
reputação inquestionável e que nada têm a ver com o Governo, como o Prof. Mário Esteves de Oliveira171, que
é talvez das pessoas que mais sabe de Direito Administrativo em Portugal e que sustenta, num parecer, que
este procedimento e desta forma está disponível.”172
Relativamente ao preço/ m2 que a Martifer vai pagar aos ENVC pelas suas instalações, esclareceu o Sr.
Ministro da Defesa Nacional, Dr. José Pedro Aguiar Branco, o Sr. Deputado António Filipe:
“(…) O preço por que foi fixado o metro quadrado foi alcançado em mercado livre, por concurso público! O
preço da concessão foi naquilo que se chama mercado livre e pela oferta mais vantajosa. Portanto, as coisas
valem o que valem no mercado livre… Ainda assim, esta concessão vai pagar mais do que aquela que era a
concessão dos Estaleiros Navais de Viana do Castelo SA, mais cerca de 130% do que aquilo que era pago.
Isto porque o preço por m2 que vai ser pago pela West Sea é superior àquele que era pago pela anterior
170
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 11 de março de 2014, Sr. Ministro da Defesa Nacional, Dr. José Pedro Aguiar Branco, págs. 16-18. 171
Anexo III – Parecer do Dr. Prof. Mário Esteves de Oliveira – In(aplicabilidade) dos regimes de contratação pública à formação do
contrato de Subconcessão da utilização privativa do domínio público e áreas afetas à concessão dominial da “Estaleiros Navais de Viana do Castelo, S.A.” – Vieira de Almeida & Associados. 172
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 11 de março de 2014, Sr. Ministro da Defesa Nacional, Dr. José Pedro Aguiar Branco, págs. 47
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empresa que, aliás, não pagava porque não tinha condições para pagar. Portanto, esta vai mesmo pagar,
enquanto a outra nem isso fazia.”173
Na 2.ª audição, o Sr. Presidente do Conselho de Administração da Empordef, Dr. Rui Jorge de Carvalho
Vicente Ferreira, afirmou o seguinte quanto ao custo do encerramento da empresa:
“Como estamos numa fase de alienação de ativos, é difícil, nesta altura, dizer qual vai ser o saldo. Mas
será sempre, eu diria, num intervalo entre 250 milhões e 300 milhões de euros. Portanto, é algo que ficará
dentro destes parâmetros, na nossa perspetiva, e que dependerá do preço pelo qual se vai vender o Atlântida,
dos valores em que se vai vender, por concurso público, os diferentes ativos — um processo que já começou
há algumas semanas. Ou seja, é um processo em contínuo, que vamos construindo, mas julgo que, no final,
serão entre estes valores e estes parâmetros com que nós ficaremos.”
E questionou o Sr. Deputado Abel Baptista, o seguinte:
“(…) O Sr. Abel Baptista (CDS-PP): — Sr. Presidente, dito isso, também questiono se nunca houve, da
parte da tutela, qualquer indicação para que houvesse a abertura normal de um processo de insolvência dos
Estaleiros. Ou seja, houve sempre, por parte do acionista Estado, no que diz respeito aos Estaleiros Navais de
Viana do Castelo, a opção de reprivatizar, mantendo a atividade de construção naval, tal como ela já era
praticada pelos Estaleiros Navais de Viana do Castelo, ou de haver um processo de subconcessão do espaço,
dentro dos parâmetros da concessão, que inclui, entre outros aspetos, a questão da construção naval. Foi
sempre essa a indicação do acionista Estado para a empresa?
O Sr. Dr. Rui Jorge de Carvalho Vicente Ferreira: — Confirmo, Sr. Dr. Abel Baptista. Sem dúvida, Sr.
Deputado, foi sempre essa a orientação.
O princípio da nossa dinâmica — quer nas administrações, quer no diálogo com as tutelas — foi
sempre a busca de uma solução diferente da liquidação e do encerramento da empresa, ou seja, uma
solução que criasse continuidade económica e que, para nós, assentava sempre em três pilares
fundamentais: no plano social, a criação de emprego para o futuro; no plano tecnológico, a
salvaguarda das tecnologias que foram desenvolvidas pelo Estaleiro, as competências que tinha no
projeto mercante das diferentes construções e a longa experiência no projeto de construções militares,
salvaguardando essa tecnologia; no plano económico, ao nível regional, ter um impacto
microeconómico na região que desse, de facto, possibilidade de criação múltipla e de alavancagem de
outras atividades através dos fornecedores e dos seus subempreiteiros.
Nunca encarámos qualquer solução que fosse o encerramento puro e simples do Estaleiro ou a sua
liquidação, foi sempre uma busca de uma solução diferente.”174
Sobre esta temática, na audição com os Srs. Branco Viana e Martinho Cerqueira, Representantes da União
dos Sindicatos de Viana do Castelo, o Sr. Branco Viana responde ao Sr. Deputado Jorge Fão:
“(…) Já agora, queria dizer-lhe que, quando tivemos a reunião com a Martifer, com o Sr. Eng.º Carlos
Martins — de momento não há nada escrito, não há garantias, como deve calcular —, foi dito e está escrito na
imprensa, na comunicação social, que iriam privilegiar a contratação, caso viessem a ter carteira de
encomendas, e tudo apontava para que os asfalteiros se viessem a fazer, ou tudo aponta ainda — sabemos
que há ainda algumas complicações —, para que a construção naval, inclusivamente, se continue a realizar
em Viana do Castelo, caso em que eles assumiriam — isto dito verbalmente, claro! — que a prioridade era
contratar cerca de 400 trabalhadores da empresa. Ora isto, não sendo bom, foi aquilo que privilegiámos, e
173
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 11 de março de 2014, Sr. Ministro da Defesa Nacional, Dr. José Pedro Aguiar Branco, pág. 31. 174
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 13 de março de 2014, Presidente do Conselho de Administração da EMPORDEF, Sr. Dr. Rui
Jorge de Carvalho Vicente Ferreira, págs. 53-54, sublinhado do relator.
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lutaremos para que assim seja em termos de futuro. Penso que, neste momento, as coisas estão a caminhar
para lá, vamos esperar que o futuro nos diga se foi uma boa ou má aposta”175.
A CPI ouviu o Sr. Presidente do Júri do concurso público para a subconcessão dos ENVC, Dr. João Cabral
Tavares.
O Sr. Procurador reiterou o que já tinha defendido numa anterior audição, na comissão de Defesa Nacional,
sobre o enquadramento jurídico da subconcessão.
Na leitura que fez da lei, o concurso não tinha que estar sujeito às regras do Código dos contratos públicos,
pelo que foram aplicadas as normas do código de procedimento administrativo.
Achou-se conveniente, extraír algumas perguntas e respostas do princípio da audição:
A Sr.ª Carla Cruz (PCP): — Sr.ª Presidente, começo por cumprimentar o Sr. Dr. João Cabral Tavares.
A primeira pergunta que faço é relativa à opção pela contratação por procedimento administrativo no caso
da subconcessão, porque o Sr. Procurador, na audição que fez na Comissão de Defesa Nacional, referiu que
as formalidades seriam mais apertadas se se obedecesse ao Código dos Contratos Públicos.
Assim, pergunto se foi deliberada a opção da contratação ao abrigo do Código do Procedimento
Administrativo, para evitar a transferência de trabalhadores, para evitar que os trabalhadores fossem
transferidos para a nova concessionária.
O Sr. Dr. João Cabral Tavares (Presidente do Júri do Concurso Público para a Subconcessão dos
Estaleiros Navais de Viana do Castelo): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Deputada, a questão do Código dos Contratos
Públicos tem mais a ver com os procedimentos e não com o objeto. O objeto mantem-se inalterado.
A questão que estava em causa, o objeto do concurso público, era a subconcessão, entendida esta
concessão no sentido da utilização do domínio público. Era apenas isto que estava em causa.
A Sr.ª Deputada diz que se poderia ter outra conceção, mas era apenas isto que estava em causa. O
que interessava aqui era garantir a transparência, a publicidade, a imparcialidade, todos esses valores
que devem nortear e que também estão consagrados em qualquer procedimento administrativo.
É curioso que a Parte II do Código do Procedimento Administrativo, relativa aos contratos públicos, tenha
sido revogada pelo diploma que aprovou o Código dos Contratos Públicos. Na altura, era contrato
administrativo. Este sistema é posterior e resulta, nomeadamente, de diretivas. E aí previa-se, entre os
contratos administrativos, o contrato de utilização de domínio público. Isso foi introduzido, aliás, em 1984,
talvez, com o ETAF (Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais).
Indo ao que interessa substancialmente, não é só por se optar por um tipo de procedimento que se altera o
objeto do concurso. Isso é previamente definido.
A Sr.ª Carla Cruz (PCP): — Assim, pergunto: quem definiu este procedimento? Quem optou por esta forma
de concurso, não pela obediência à contratação pública mas, sim, pelo Código do Procedimento
Administrativo? Quem fez essa opção?
O Sr. Dr. João Cabral Tavares: — Em todo o concurso, quem define os termos é a entidade adjudicante, a
entidade contratante. Esta é a regra em todos os concursos.
A Sr.ª Carla Cruz (PCP): — Portanto, confirma que foi o Ministério da Defesa Nacional que fez esta opção.
O Sr. Dr. João Cabral Tavares: — Sr.ª Deputada, no contrato de subconcessão, quem aparece
formalmente como entidade adjudicante é o concessionário, os Estaleiros Navais de Viana do Castelo.
Se for ver, depois, o diploma de 2013 — isto resulta da lei — previu esta possibilidade de concessão;
decreto-lei que, como sabe, veio ao Parlamento e aqui se consolidou. Aí previa-se, nomeadamente — Sr.ª
Deputada, veja os termos da lei —, a intervenção dos ministros da tutela, quanto à definição do próprio
175
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 18 de março de 2014, representantes da União de Sindicatos de Viana do Castelo, Srs. Branco
Viana e Martinho Cerqueira, págs. 20-21.
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caderno de encargos ou quanto ao tipo de contrato. É o Decreto-Lei n.º 98/2013.
A Sr.ª Carla Cruz (PCP): — Mas admite que o Código dos Contratos Públicos abrange a transferência de
trabalhadores.
O Sr. Dr. João Cabral Tavares: — Sr.ª Deputada, deixe-me ver o que diz o Código dos Contratos… Não há
nada como ver a lei.
Por um lado, temos a questão subjetiva, das entidades públicas contratantes, mas deixemos isto, vamos
focar-nos no objeto.
Há outros artigos mas, nuclearmente, é o artigo 6.º (Restrição do campo de aplicação), onde se diz: «À
formação de contratos a celebrar entre quaisquer entidades adjudicantes (…)» — que são as entidades
públicas do artigo 2.º —«(…) só é aplicável quando o objeto de tais contratos abranja prestações típicas dos
seguintes contratos: a) Empreitada de obras públicas; b) Concessão de obras públicas; c) Concessão de
serviços públicos; d) Locação ou aquisição de bens móveis; e) Aquisição de serviços.».
Aqui entrou-se num sistema taxativo, que se foi buscar ao Código Administrativo. Com o ETAF deixou de
haver um sistema taxativo e foi-se para… A lei falava em «designadamente», em termos exemplificativos e
agora é em termos taxativos.
Portanto, quando a Sr.ª Deputada fala em trabalhadores, não sei em que tipo de contrato se poderiam
inserir. Agora, digo-lhe é que teríamos de aplicar o Código dos Contratos Públicos se inserido em algumas
destas alíneas do n.º 1 do artigo 6.º, que acabei de ler.
A Sr.ª Carla Cruz (PCP): — Mas quando referiu na audição que fez na Comissão de Defesa Nacional que
as formalidades eram mais apertadas, a que formalidades se estava a referir?
O Sr. Dr. João Cabral Tavares: — Sr.ª Deputada, é uma questão de vermos o Código. Estou a ver em
termos de Código. É necessário pormos as questões na plataforma… Recordo-me de contratos que tive de
seguir… aquilo é burocraticamente mais pesado, mais demorado, tudo isso. São essencialmente estes factos.
Estou a falar de concurso público normal. Pode ser por ajuste direto, mas não é disso que estamos a falar.
Estamos a falar de concurso público e, neste caso, até foi um concurso público internacional. Portanto, se
fosse internacional, teria de haver a publicação no diário das comunidades, o que obriga a haver prazos, o que
dilataria, seguramente, todo o procedimento.
A Sr.ª Carla Cruz (PCP): — Então, esta opção foi para diminuir o tempo e para mais facilmente e mais
rapidamente encerrar os Estaleiros Navais de Viana do Castelo?
O Sr. Dr. João Cabral Tavares: — Não, Sr.ª Deputada. Peço desculpa, mas não pode inferir isso.
Estou a responder com o que diz a lei e digo-lhe mais: é a própria lei que afasta a aplicação a este tipo de
contrato, a este tipo concurso. É a própria lei que afasta, nos termos do artigo 6.º.
Portanto, a partir daí, são tudo quadros hipotéticos. O que a lei diz é isto, é o que está no artigo 6.º que eu
li. Aplica-se o Código dando como assente — e agora não vamos entrar em discussões jurídicas — que os
Estaleiros devem ser considerados entidades públicas. Isso é duvidoso, há um parecer da Procuradoria-Geral,
que, aliás, é referido no tal parecer jurídico, e acho que esse parecer teve um voto de vencido, mas isso não
nos interessa.
Em matéria de objeto, é a própria lei que arreda para este tipo de contrato a aplicação do Código dos
Contratos Públicos.
A Sr.ª Carla Cruz (PCP): — Reportando-me ainda à audição feita na Comissão de Defesa Nacional, referiu
que quando contactou com o Procedimento teve algumas dúvidas e que foi pedido um parecer jurídico176 sobre
176
ANEXO III – Parecer do Dr. Prof. Mário Esteves de Oliveira – In(aplicabilidade) dos regimes de contratação pública à formação do
contrato de Subconcessão da utilização privativa do domínio público e áreas afetas à concessão dominial da “Estaleiros Navais de Viana do Castelo, SA” – Vieira de Almeida & Associados.
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estas questões. Confirma o pedido de parecer jurídico sobre isto?
O Sr. Dr. João Cabral Tavares: — Sr.ª Deputada, quando vi «concessão», pensei em concessão de
exploração dominial. Se fosse concessão de exploração dominial, teríamos, eventualmente, a aplicação de
contratos públicos, mas não. Como disse na altura, esta é uma mera licença de utilização.
Numa concessão de exploração dominial há, de facto, uma substituição do órgão público por um privado,
na titularidade desse bem dominial. Aqui não. Portanto, isso, para mim, foi claro, Sr.ª Deputada.
Depois, foi-me dito que, à cautela, tinha sido pedido um parecer, e referi esse parecer.
A Sr.ª Carla Cruz (PCP): — Quando leu esse parecer, ele vinha a confirmar esta opção. Sendo jurista e
tendo conhecimento dessa dúvida, que ainda há pouco aqui referiu, por que é que não foi solicitado um outro
parecer que confirmasse, ou infirmasse, esta opção?
O Sr. Dr. João Cabral Tavares: — Sr.ª Deputada, peço desculpa, mas eu não disse que havia dúvida. Olhei
para o termo «concessão» — na altura, não tinha sequer visto o que se pretendia — e isso leva-nos de facto
para uma realidade diferente desta concessão de utilização, que é uma licença.
Como digo, quanto a saber se a entidade adjudicante é, ou não, entidade pública — nomeadamente para
efeitos de compras, seja de parafusos ou do quer que seja, e nesse caso será a aquisição de bens —, tenho
dúvidas. Mas, como lhe digo, o parecer vai nesse sentido, cita um parecer do Conselho Consultivo da
Procuradoria-Geral da República, que também vai nesse sentido (e suponho que tem um voto de vencido, mas
não garanto), e a própria Inspeção-Geral já tinha levantado a questão, dizendo que teria de subordinar… Mas
estamos a falar dos contratos-tipo previstos no artigo 6.º, que li, do Código dos Contratos Públicos, e não é
manifestamente este o caso.”177
Relativamente às entidades que concorreram à Subconcessão, o Sr. Procurador João Cabral Tavares,
esclareceu a Sr.ª Deputada Carla Cruz:
“(…) Estou a olhar para o nosso relatório, onde isso está tudo referido: «Manifestações de interesse no
concurso».
A Sr.ª Deputada tem aí o relatório? No ponto 3.1 diz-se: «Demonstraram interesse no procedimento para
atribuição da Subconcessão 16 entidades.» No ponto 3.2 refere-se: «Foram disponibilizadas Peças de
Procedimento a 8 dessas entidades (…)», a que chamámos «Entidades Interessadas», «(…) após assinatura
da declaração de confidencialidade e realização do pagamento a título de caução, nos termos previstos no
artigo 4.º do Programa do Procedimento.» E, depois, estão aí mencionadas as oito entidades, sendo que
temos também a Câmara Municipal de Viana do Castelo, que não entrou propriamente como concorrente no
concurso. Segue-se a breve descrição das entidades interessadas, através da localização geográfica, da
própria estrutura acionista, do volume de negócios e crescimento anual, do EBITDA, que também era
importante. Enfim, está tudo isso radiografado, e, depois, seguem-se os esclarecimentos prestados, as
consultas aos Procedimentos que elas fizeram — fez-se um gráfico sobre estas matérias.
A Sr.ª Carla Cruz (PCP): — Destas oito que levantaram as peças do procedimento, quantas é que
concorreram?
O Sr. Dr. João Cabral Tavares: — Sr.ª Deputada, é o ponto 9.
Concorreram… Quer dizer, apresentaram propostas duas.
Diz-se no ponto 10 que: «Das 8 entidades (…)» — eram oito e duas apresentaram, portanto —«(…) as
seguintes 6 não apresentaram proposta: (…)», e dizemos quais são. E, destas seis que não apresentaram,
duas justificaram, e vem aqui referido, que «Apenas as entidades Amal/MPC e ASM (…) indicaram as razões
que justificaram a não apresentação…». Estão aqui sumariadas e depois remete-se para os anexos, onde está
o próprio teor.”
177
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 27 de março de 2014, Presidente do Júri do concurso público para a subconcessão dos ENVC,
Sr. Procurador João Cabral Tavares, págs. 2-7, sublinhado do relator.
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(..)
A Sr.ª Carla Cruz (PCP): — No final, ficaram duas empresas, a russa e a Martifer. A empresa russa não
tinha uma garantia bancária que obedecesse aos critérios previamente estabelecidos. Foi solicitada à empresa
russa e dado prazo para entrega dessa garantia bancária?
O Sr. Dr. João Cabral Tavares: — Sr.ª Deputada, essa é uma questão interessante. O Júri facultou a
possibilidade de essa candidata poder apresentar, dentro do quadro das regras do concurso que estavam
previamente definidas, e consta do despacho de aperfeiçoamento do Júri de 24 de setembro, onde se diz — é
um bocado longo e lerei só o último ponto — «Estabelece a alínea b) do n.º 1 do artigo 16.º do Programa que
‘São excluídas as Propostas (…) Que não apresentem os documentos referidos nas alíneas a) e h) (…)’ —
entre eles, precisamente, a declaração da instituição bancária.
No caso, não se está factualmente perante uma omissão de apresentação de documentos, antes perante a
apresentação (repetida apresentação, nos termos justificados pela requerente) de documento, cuja validade
anteriormente havia sido recusada.», porque entendíamos que esse banco não cumpria, ou, melhor, foi
definido um patamar do ranking do banco e esse estava abaixo desse patamar.
«Entende o júri que não deve fazer uma imediata equiparação procedimental entre uma e outra
situação,…» — ou seja, entre esta situação de um documento defeituoso e a total ausência de documento —
«… para os efeitos cominados na alínea b) do n.º 1 do artigo 16.º…», ou seja, ditaria a imediata exclusão.
«Afastada a aplicação ao caso da alínea b) do n.º 1 e convocados os n.os 2 e 3, todos do citado artigo 16.º
do Programa, à luz do princípio pro actione, não se optando por uma interpretação que conduza à imediata
rejeição da possibilidade de ser assegurada a tutela procedimental, num quadro de concorrência, da pretensão
da requerente e no respeito das regras de estabilidade concursal, convida-se (…)» a concorrente no prazo
máximo permitido pelo Programa do Concurso, que eram cinco dias úteis, «(…) a apresentar nova declaração
bancária (…)».
Aliás, fez-se o mesmo quanto à outra concorrente, que também não tinha junto um documento qualquer e à
qual se deu esse prazo máximo.
A Sr.ª Carla Cruz (PCP): — Dado esse prazo máximo, a empresa russa respondeu nesse prazo?
O Sr. Dr. João Cabral Tavares: — É o despacho que o Júri pronuncia em 1 de outubro de 2013, onde se
diz: «Vem a concorrente (…) solicitar que ‘lhe seja concedido novo prazo, não inferior a dez dias úteis (…)’.
Alega que a prorrogação do prazo de cinco dias, que lhe fora concedida (…)» e junta uma declaração
emitida pelo Deutsche Bank.
Transcrevemos o despacho anterior e conclui-se assim: «O júri está vinculado à observância e aplicação
das regras e prazos procedimentalmente estabelecidos, garantindo igual tratamento relativamente a todos os
concorrentes.
Através do seu anterior despacho, de 24 de setembro, com os fundamentos no mesmo indicados, facultou
à requerente a possibilidade de aperfeiçoamento da sua proposta, pelo prazo máximo procedimentalmente
consentido (…)» — a expressão «pelo prazo máximo procedimentalmente consentido» está sublinhada, que é
o tal n.º 3 do artigo 16.º. «Os factos agora alegados pela requerente, para a concessão de novo prazo, são
insuscetíveis de constituir justo impedimento, antes traduzirão, com o devido respeito, conhecidos que foram,
na matéria e desde a sua abertura, as regras e os trâmites do procedimento, quebra do normal esforço de
diligência e antecipação, por igual exigível a todos os concorrentes.» Tínhamos de confrontar também com
uma questão de igualdade, e indeferiu-se. É indeferido por falta de fundamento, de suporte legal e
procedimental, o novo prazo requerido.”178
Relativamente à questão da transparência em todo este processo de Subconcessão, pergunta o Sr.
Deputado Nuno Sá Costa:
178
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 27 de março de 2014, Presidente do Júri do concurso público para a subconcessão dos ENVC,
Sr. Procurador João Cabral Tavares, págs. 11-16.
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“(…) Mas a pergunta concreta que quero fazer é a seguinte: a opção jurídica pela não aplicabilidade do
Código dos Contratos Públicos veio retirar a este procedimento concursal alguma regra de transparência, de
objetividade, de concorrência efetiva?”179
Resposta do Sr. Procurador João Cabral Tavares:
“(…) Não creio, Sr. Deputado.
Pelo contrário, já foi acentuado, na anterior exposição, que houve aqui uma ampla publicidade, publicidade
internacional, e a publicidade é a maior garantia da transparência e, depois, essa transparência foi
conseguida. Seguiram-se, aliás, depois, as regras do Código do Procedimento Administrativo.”180
O Sr. Eng.º Jorge Camões, atual Presidente do Conselho de Administração da ENVC, disse que a
subconcessão da ENVC foi uma solução que garantiu "empregabilidade" e que o caderno de encargos
assegura a construção e reparação naval, em resposta às perguntas do Sr. Deputado Abel Baptista:
“O Sr. Eng.º Jorge Camões: — Não é emprego, é empregabilidade, o que é diferente.
Conseguiu-se que, de facto, no caderno de encargos, no programa do procedimento, se incluísse que os
concorrentes à subconcessão tivessem uma atividade económica, no seu CAE, de construção
metalomecânica e reparação naval.
Portanto, conseguiu incluir-se essa atividade: quem concorria tinha de ter no seu objeto social essa
atividade. Foi assim e estava dito que era assim.
(…)
A nossa ideia era, por um lado, garantir… Face ao que havia com a DGCom não poderia haver
transferência de atividade, tinha de haver corte. Mas queríamos manter competências, queríamos manter
empregabilidade e, ao ceder aquele espaço, colocando-lhe um subconcessionário, era preciso que ele
desenvolvesse naquele espaço, pelo qual iria pagar uma renda até 2031, aquelas atividades.
Portanto, o conceito foi este: por um lado, eu tenho competências, não as posso transferir, tenho de cortar
a atividade económica, e, por outro, tenho de permitir que alguém entre neste espaço, pagando-me uma
renda, a mim, que sou senhorio, e desenvolva a mesma atividade. Foi esse o conceito!”181
E ainda, sobre o processo de Subconcessão, o Sr. Eng.º Jorge Camões respondeu às perguntas do Sr.
Deputado Eduardo Teixeira:
“O Sr. Eng.º Jorge Camões: — Quando se seguiu primeiro para a reprivatização, que não foi possível por
razões que são conhecidas, e sucessivamente se passou para a subconcessão, estamos convencidos de que,
de facto, através deste modelo bem gerido… É evidente que o subconcessionário tem de gerir bem. Vai-me
perguntar: mas, então, onde está o know-how? Ele poderá ter dificuldades de know-how. Ele está nas pessoas
que lá estavam. É a ideia! As pessoas saíram e estão disponíveis. As pessoas estão no mercado, estão
disponíveis, essa é a nossa ideia. Pessoalmente, estamos convencidos de que esse know-how está
disponível, não pertence juridicamente aos ENVC porque os contratos foram cancelados. As pessoas estão
disponíveis para trabalhar e querem trabalhar.
Portanto, há atividade do mesmo tipo, atividade de reparação e construção naval. O que tem sido
anunciado é que há trabalho, há encomendas. Então, parece realmente que se cria e se mantém a
empregabilidade. Então, o que é que aconteceu? O que aconteceu foi que um conjunto de pessoas
saíram ou estão a sair, há um mínimo residual que não quis sair, e muito bem, e as pessoas que, de
facto, desejarem trabalhar serão admitidas para trabalhar naquilo que sabem, que é fazer e reparar
navios. É evidente!
179
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 27 de março de 2014, Presidente do Júri do concurso público para a subconcessão dos ENVC,
Sr. Procurador João Cabral Tavares, pág. 26. 180
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 27 de março de 2014, Presidente do Júri do concurso público para a subconcessão dos ENVC,
Sr. Procurador João Cabral Tavares, pág. 26. 181
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 7 de maio de 2014, atual Presidente do Conselho de Administração dos ENVC, Sr. Eng.º Jorge
Camões, e restantes vogais do Conselho de Administração, Sr. Dr. José Luís Serra, Sr. Eng.º Francisco Gallardo e Sr. Almirante Conde Baguinho, págs. 42-44.
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Agora, em termos de região, penso que, quer a montante quer a jusante, o que normalmente acontece é
isso propiciar que as pessoas criem um conjunto de empresas fornecedoras dos estaleiros, que é o habitual,
nas várias especialidades. Foi o que aconteceu na Lisnave, na península de Setúbal. Ou seja, as pessoas
saíram, criaram emprego, montaram os seus próprios modelos e forneceram serviços. É isto que vai
acontecer, penso eu. As competências mantêm-se.182
f. Acordo social trabalhadores
O Sr. Ministro da Defesa Nacional, Dr. José Pedro Aguiar Branco, responde sobre o acordo social
conseguido com os trabalhadores dos ENVC, ao Sr. Deputado Fernando Negrão:
(…)” No que diz respeito à questão laboral, foi possível assegurar, numa situação de negociação, de
consenso com a União de Sindicatos de Viana do Castelo, ou seja, com os sindicatos afetos à CGTP, e numa
demonstração de grande sentido de interesse em relação àquelas pessoas, a aprovação de um plano social.
Diante de uma situação que era dramática para os trabalhadores, acaba por ser possível chegar a um
consenso para a aprovação de um plano social que não creio que exista outro, na memória da
democracia, com esta expressão tão significativa, pois só 11 trabalhadores, em 609, é que não
assinaram o acordo de rescisão. Pergunto-me o que seria a expressão mediática se fosse ao contrário?! Se
só 11 trabalhadores tivessem assinado, tínhamos as primeiras páginas de todos os jornais, mas, como foi ao
contrário, como se conseguiu uma coisa boa, como foi positivo, como foi possível consensualizar com os
sindicatos da CGTP, numa grande manifestação de sentido de responsabilidade relativamente ao que é
melhor para Viana do Castelo, não teve expressão mediática. De qualquer forma, soube-nos muito bem a
sensação de dever cumprido, também em relação a essa matéria.”183
E ainda sobre esta temática responde o Sr. Ministro da Defesa Nacional, Dr. José Pedro Aguiar Branco, ao
Sr. Deputado António Filipe:
“(…) Ocorreu, ainda, a liquidação e o encerramento de uma empresa. Ora, a resolução dos contratos de
trabalho podia ter sido por despedimento coletivo, mas, felizmente, foi possível consensualizar de modo a
assegurar uma situação positiva para aqueles trabalhadores e assim houve rescisão dos contratos de
trabalho. Vai ainda existir uma nova empresa que por concurso público vai explorar aquelas infraestruturas e
que tem toda a liberdade de contratar ou não. Portanto, estas são as situações, de facto, que apontam para
que essa contratação possa acontecer onde há mão-de-obra qualificada e disponível para o efeito.
Juridicamente faz toda a diferença! Juridicamente é esta a situação que, do ponto de vista da DGCom, é
aceitável (…)”184
Sobre este assunto, na audição com os Srs. Branco Viana e Martinho Cerqueira, Representantes da União
dos Sindicatos de Viana do Castelo, o Sr. Branco Viana esclarece o Sr. Deputado Jorge Fão:
“(…) Nesta parte final, como o Sr. Deputado sabe, o que estava em jogo era a vida das famílias daqueles
609 trabalhadores. Quando é anunciada a subconcessão e é assinado um contrato com a Martifer, a partir
dali, há um virar de página em que é necessário acautelar a vida dos trabalhadores. E aqui, por vezes, temos
de ter a sensibilidade de ver que estamos a lidar com a vida das pessoas; essa parte não pode ser dissociada
da parte laboral.
É evidente que, a partir dali, houve uma preocupação constante no sentido de que deveriam ser feitos
todos esforços. Considerando que a posição do Governo que tinha sido assumida não era a melhor, no nosso
entender, tínhamos de encontrar a melhor saída para o problema dos trabalhadores, quer em termos
182
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 7 de maio de 2014, atual Presidente do Conselho de Administração dos ENVC, Sr. Eng.º Jorge
Camões, e restantes vogais do Conselho de Administração, Sr. Dr. José Luís Serra, Sr. Eng.º Francisco Gallardo e Sr. Almirante Conde Baguinho, págs. 92-93. 183
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 11 de março de 2014, Sr. Ministro da Defesa Nacional, Dr. José Pedro Aguiar Branco, pág. 20,
sublinhado do relator. 184
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 11 de março de 2014, Sr. Ministro da Defesa Nacional, Dr. José Pedro Aguiar Branco, págs. 30-
31.
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profissionais, quer em termos de garantias de futuro, quer também para aqueles que poderiam vir a sair da
empresa.
Devo dizer, Sr. Deputado, e sabe-o tão bem como eu, que, efetivamente, a Lei n.º 9/99 dava o direito aos
trabalhadores mais velhos, acima dos 55 anos, de pedirem a reforma antecipada, o que poderia ter
minimizado a situação, porque sabíamos à partida — e o Sr. Deputado também sabe, porque é da região —
que mais de 200 trabalhadores estavam na altura em condições de pedir a aposentação antecipada. Através
da suspensão dessa mesma lei, inviabilizaram essa possibilidade e esses trabalhadores permaneceram na
empresa, tendo estado ao serviço da empresa.
No momento em que discutimos com a Comissão de Trabalhadores esta saída — uma Comissão de
Trabalhadores jovem, com outras perspetivas de futuro, com a sua irreverência —, ela não olhava muito para
o fator humano, para as pessoas mais velhas.
Como deve calcular, a União dos Sindicatos e, sobretudo, o Sindicato dos Metalúrgicos têm aqui grande
importância. Aliás, foi esse Sindicato que deu aqui a tónica mais importante, porque foi sondado pela grande
maioria dos trabalhadores no sentido de serem defendidos naquela fase difícil da sua vida, depois da decisão
e assinatura da subconcessão, e estava muita coisa em jogo.
Além das situações de indemnização, que com certeza não estariam em causa, até porque estávamos a
tratar com o Estado, que consideramos ser uma pessoa de bem, havia também o cenário do Fundo de
Pensões que tinha de ser acautelado para os trabalhadores com mais de 15 anos de antiguidade, e estamos a
falar de mais de 90% dos trabalhadores. Isto representava muito dinheiro. Em média, estamos aqui a falar
entre 20 e 30 000 € por trabalhador e esta situação podia estar em causa em termos de futuro.
Daí a preocupação dos trabalhadores, que não viam o apoio fundamental na Comissão de Trabalhadores,
porque esta, com toda a legitimidade, tinha uma interpretação diferente, que respeitávamos e continuamos a
respeitar. Assim, era aos sindicatos que os trabalhadores se dirigiam, porque é para os sindicatos que
descontam, é aos sindicatos que pedem apoio jurídico, é deles que querem uma opinião, querem a sua
defesa; a partir do dia 22 de janeiro, porque se estava a aproximar o término da primeira comunicação por
parte da administração, que era 31 de janeiro, o medo e o receio era que pudessem cair num vazio e os
direitos dos trabalhadores não fossem acautelados.
Daí que, no 22 de janeiro, o Sindicato dos Metalúrgicos tenha reunido, por vontade expressa dos
trabalhadores, e no dia 23 tenha reunido com a Comissão de Trabalhadores, para acertar os pormenores para
realizarmos um plenário, que teve lugar a 27, com todos os trabalhadores da empresa, onde foi exigida uma
reunião com o Sr. Ministro da Defesa, uma reunião com o Sr. Embaixador da Venezuela, para saber como
estava o processo da construção dos navios asfalteiros, e uma reunião com o subconcessionário, a Martifer,
também para saber quais eram as suas pretensões em termos de futuro.
Como há pouco disse, isto foi votado por esmagadora maioria dos trabalhadores, com dois votos contra e
quatro abstenções. Essa foi a vontade dos trabalhadores e foi nesse sentido que o Sindicato dos Metalúrgicos,
acompanhado pelo Coordenador da União dos Sindicatos, teve essas reuniões, à exceção da reunião com o
Sr. Embaixador da Venezuela, porque o processo da Venezuela ainda não estava concluído e, como não
havia nada de novo para nos comunicarem, não realizámos essa reunião.
No dia 29 de janeiro, tivemos uma reunião com o Sr. Ministro da Defesa onde, efetivamente, chamámos a
atenção do Sr. Ministro para as complicações e o que podia ser uma situação de calamidade social para os
trabalhadores, tendo em conta que estava a terminar o prazo que tinha sido dado. Na altura, demos algumas
sugestões, não fomos lá negociar coisíssima nenhuma; depois, acabámos por verificar que houve uma
proposta feita à Comissão de Trabalhadores, que nós não conhecíamos, para tentar negociar uma proposta
global para as rescisões dos trabalhadores. Naquela altura, soubemos que o Governo tinha feito essa
proposta. Até aí não tínhamos conhecimento disso e já não tivemos tempo para negociar coisíssima nenhuma.
Demos algumas sugestões, nomeadamente para minorar alguns aspetos relativos a familiares
deficientes, para minorar situações de trabalhadores que tinham menos anos de casa, para minorar
situações de casais que estavam na empresa e também em relação à penalização que os trabalhados
mais velhos viessem a ter pela antecipação da reforma, de modo a que ela fosse minorada com um
valor que viesse a cobrir essa situação. Deixámos estas sugestões ao Sr. Ministro da Defesa, que na
altura não deu garantias nenhumas mas ficou de pensar nelas.
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Passados alguns dias, mais concretamente no dia 1 de fevereiro, cerca das 18 horas, acabou por
dar algumas informações que vieram ao encontro dessas mesmas sugestões referidas por nós.
No dia 3 de fevereiro, essa situação foi comunicada aos trabalhadores, em plenário geral de
trabalhadores.”185
8. CONCLUSÕES
1- A constituição desta CPI assenta nos pressupostos inscritos no requerimento apresentado pelos
proponentes, nomeadamente para “apurar as circunstâncias e as responsabilidades que levaram à decisão de
extinção dos Estaleiros Navais de Viana do Castelo e a concessão das suas instalações a uma empresa
privada”.
2- O ambiente que rodeou a constituição desta CPI foi o de falta de transparência, ilegalidades e mesmo,
de negócios nebulosos. Ao longo das audições em Comissão, nada resultou como provado.
3- As audições em Comissão demonstraram que as referidas acusações eram infundadas e claramente
despropositadas, porquanto, de nenhum depoimento resultou suporte para tal.
4- Ficou demonstrada a existência de muita instabilidade nos diversos Conselhos de Administração da
ENVC e da EMPORDEF, sendo que, em todos os mandatos, houve alterações na sua composição.
5- O endividamento da empresa foi uma constante, salientando-se contudo o ano de 2009 como um ano
francamente nefasto para a situação económico-financeira da empresa.
6- A partir de 2011 a empresa ENVC, encontrava-se numa situação de descrédito e deixou de ter
capacidade de se financiar na banca.
7- Já a auditoria financeira aos ENVC efetuada pela Inspeção-Geral das Finanças, concluía em 2009,
que: “na ausência do desenvolvimento de medidas de saneamento económico-financeiro, os ENVC deverão
encontrar-se novamente numa situação de falência técnica”.
8- Esta auditoria, tendo sido realizada por solicitação da Assembleia da República, não foi
atempadamente remetida ao Parlamento.
9- Relativamente às construções efetuadas pela ENVC, constata-se que a partir de 2006, todas deram
prejuízo. Entre 2003 e 2013, das 22 novas construções, só duas (em 2004 e em 2005) não deram prejuízos,
sendo que o pior resultado verificou-se em 2004 com um navio químico que constituiu um prejuízo de 22M€.
10- As novas construções tiveram prejuízos acumulados de 103.082.528,20€, com custos realizados
sempre superiores aos custos orçamentados.
11- Conclui-se pelas audições havidas na CPI que a ENVC tinha graves deficiências na estrutura
comercial e de orçamentação, no controlo financeiro dos projetos e no processo de aquisição de materiais e
equipamentos.
12- Conclui-se também que os contratos eram elaborados de forma deficiente em termos de garantias
jurídicas e havia sérias dificuldades na gestão dos mesmos. As estruturas intermédias da ENVC evidenciavam
falta de competências.
13- O objetivo da empresa era conseguir novas encomendas para suportar os custos fixos que tinha,
designadamente, com trabalhadores, em detrimento da rentabilidade das construções.
14- A empresa, em determinados períodos, apresentou excesso de mão-de-obra, relativamente às suas
necessidades. O elevado absentismo e a baixa produtividade, são abordados por muitos depoentes como
difíceis de contornar.
15- Resultou demonstrado que tanto os Conselhos de Administração (C.A.) da ENVC, os C.A. da
EMPORDEF, como a tutela sectorial tinham conhecimento que a empresa trabalhava reiteradamente gerando
prejuízos, o que não se considera aceitável.
16- Relativamente ao Plano de Construções da Marinha, constata-se um diminuto grau de execução
desde 2005.
17- Das audições efetuadas conclui-se também, que existia um relacionamento difícil entre a Marinha e a
ENVC, sendo que a supervisão da Marinha era muito crítica e pouco colaborante.
185
Cfr. Ata da audição da CPIENVC, de 18 de março de 2014, representantes da União de Sindicatos de Viana do Castelo, Srs. Branco
Viana e Martinho Cerqueira, págs. 14-17, sublinhado do relator.
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18- Existia também na ENVC uma cultura de pouca colaboração com organizações nacionais afins, para
se resolverem as suas debilidades.
19- O contrato do navio Atlântida com a Atlânticoline foi o tema dominante desta CPI.
20- A rejeição deste navio por parte da Atlânticoline foi mesmo designada por inúmeras entidades
ouvidas como “a Certidão de Óbito” da ENVC.
21- Este negócio importou num prejuízo superior a 70 milhões de euros para a empresa ENVC.
22- Pese embora, das audições tenham resultado inúmeras contradições entre os vários depoentes,
ficou claro que este é um exemplo paradigmático da incapacidade de gestão que a empresa teve ao longo de
muitos anos, bem como dos efeitos nefastos da partidarização de assuntos empresariais pelos mais diversos
agentes políticos, nomeadamente regionais e locais.
23- Logo na fase pré-contratual, não fica esclarecido qual o interesse económico na relação contratual
da ENVC com a Portbridge Engineering, cujo grau de intervenção foi apenas a subcontratação da Petrobalt,
devendo porventura este assunto merecer uma investigação judicial mais aprofundada.
24- O contrato assinado em 2006 entre a ENVC e a Atlânticoline, não foi levado a reunião do Conselho
de Administração, tendo sido assinado apenas por um Vogal do Conselho de Administração mandatado para
esse efeito.
25- Esta forma de contratar e validar os respetivos contratos, onde dinheiros públicos estão envolvidos,
suscita inúmeras dúvidas e reservas.
26- Em sede de execução contratual, a ENVC cedeu a todas as exigências da Atlânticoline, não tendo
refletido, nem quantificado jurídica, formal e financeiramente e, de forma cabal, no contrato, as alterações
solicitadas.
27- O acordo arbitral alcançado em fase posterior à resolução do contrato acabou por servir apenas os
interesses da Atlânticoline.
28- Na perspetiva da boa gestão da ENVC, a grande maioria das entidades ouvidas não defendeu este
acordo arbitral.
29- Não ficou claro das audições havidas, porque é que havendo vários pareceres jurídicos,
nomeadamente do Professor Doutor Pinto Monteiro e do Professor Doutor Menezes Cordeiro, que indicavam
que a ENVC tinha uma posição contratual a sustentar, que não fosse ceder em toda a linha aos interesses da
Atlânticoline, se tivesse abdicado da possibilidade de litigar judicialmente e defender os seus direitos.
30- Assim como, não fica claro porque não se seguiu a recomendação da Auditoria conjunta da
IGF/IGDN, de meados de 2009, que considera que a “resolução não se mostra adequada e proporcional ao
incumprimento em causa” e defende que as partes cheguem a “um acordo que minimize todas as implicações
económicas e sociais que possam daí advir”.
31- Das audições, conclui-se que este foi um processo com uma clara intervenção política.
32- Não ficou, de igual modo, demonstrado das audições, o porquê, da resolução do contrato do
segundo navio, Anticiclone, igualmente encomendado pela Atlânticoline.
33- Ficou demonstrado que o atual Governo tentou renegociar com a Atlânticoline e colocar o navio nos
Açores, por forma a minimizar os impactos do acordo assinado.
34- Da parte do Governo Regional dos Açores e da Atlânticoline não existiu qualquer disponibilidade
para esta solução.
35- No que respeita aos asfalteiros, este contrato, que entrou em vigor no início de 2011, tinha uma
componente diplomática muito forte.
36- Foi efetuado à ENVC um pagamento inicial de 10% do valor do contrato, no montante de 12,8
milhões de euros, sendo que este valor não foi utilizado para a execução do contrato mas para outras
necessidades da ENVC,alegadamente para o pagamento de vencimentos devidos aos trabalhadores.
37- Em junho de 2011 o contrato estava em incumprimento pela ENVC, pelo que, no sentido de colocar
este contrato em cumprimento, foram efetuadas inúmeras negociações com a empresa PDVSA.
38- No final de 2012, a ENVC, obteve capacidade financeira própria para avançar com a execução deste
contrato, adquirindo o material necessário (aço), através dos fundos obtidos com a venda do projeto do NPL.
39- Relativamente ao programa de contrapartidas, a sua execução foi entre 2005 e 2010.
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40- Existiram 250 milhões de euros de contrapartidas de equipamentos que entraram na ENVC,
valorizados pela Comissão Permanente de Contrapartidas, e que vieram a sofrer imparidades, sendo
considerados no ativo dos ENVC num valor muito inferior.
41- Todas as construções executadas ao abrigo do programa das contrapartidas deram prejuízo.
42- Reconhecendo as dificuldades económicas, estruturais e até funcionais da ENVC, os inúmeros
Conselhos de Administração, que, pela empresa passaram, apresentaram ao longo dos anos, vários planos de
restruturação.
43- Estes planos de restruturação nunca foram concretizados na sua globalidade.
44- O plano de restruturação de 2005, alertava o Governo da altura e a empresa para o facto de a
Comissão Europeia ter decretado o fim dos auxílios de Estado à construção naval.
45- Este plano que previa um investimento de cerca de 70 milhões de euros, para repor o equilíbrio
financeiro da ENVC, além de alterações ao modelo de gestão da empresa e redução de número de
trabalhadores, nunca foi apresentado à Comissão Europeia, conforme referido na abertura de processo pela
CE.
46- Em 2010, é elaborado um novo plano de restruturação para a viabilização da empresa ENVC, com
forte reação negativa por parte dos trabalhadores e seus representantes.
47- Estas entidades sempre estiveram contra qualquer mudança na empresa, no sentido de reduzir os
seus trabalhadores inviabilizando, consequentemente, medidas com vista a tornar a empresa mais viável e
sustentável.
48- Das audições conclui-se que este plano de reestruturação sobrestimava as receitas e submestimava
as despesas.
49- Conclui-se também que este plano de reestruturação previa o despedimento de 420 trabalhadores e
assentava em pressupostos não executáveis a partir de meados de 2011, altura em que Portugal se
encontrava sujeito a um Programa de Assistência Económica e Financeira.
50- Em junho de 2011 a situação era a seguinte: a EMPORDEF não tinha Presidente, a ENVC não tinha
Presidente e apresentava um passivo de mais de 250 milhões de euros, os seus capitais próprios eram
negativos e superiores a 100 milhões de euros, a dívida bancária era de mais de 160 milhões de euros, os
contratos estavam particamente todos em situação de incumprimento, existiam dívidas de fornecedores de
muitos milhões de euros com penhoras em curso, as rendas dos terrenos e edifícios estavam por pagar há
muitos anos e o Fundo de Pensões tinha um défice de 14 milhões de euros.
51- Não se considera razoável que o fundo de pensões, para o qual os trabalhadores não tinham
qualquer contribuição, tivesse ainda uma gestão bancária que custava cerca de 500.000 euros por ano.
52- A primeira opção do atual Governo foi o processo de reprivatização pela venda de uma percentagem
máxima de 95% do capital social, sendo que, os restantes 5% ficavam reservados aos trabalhadores.
53- Resulta claro, do caderno de encargos, a valorização de propostas que: “(…) maximize a
manutenção dos atuais recursos humanos dos ENVC (…), relevando a importância dada à vertente laboral.
54- Na fase de promoção do processo de reprivatização foram contactadas 74 entidades, 10
manifestaram interesse em obter mais informação, 6 apresentaram ofertas não vinculativas e 4 passaram à
fase final.
55- Pese embora a pouca intervenção que teve no processo, o presidente da comissão especial de
acompanhamento da reprivatização, Senhor Dr. José Manuel Fernandes, diz ter garantido a plena observância
dos princípios da transparência, do rigor, da isenção, da imparcialidade e da melhor defesa do interesse
público, ao longo de todo o processo.
56- Face ao memorando enviado à DGCOM pela Secretaria de Estado do Tesouro e das Finanças, a 3
de outubro de 2012, a explicitar as medidas estatais que visam maximizar as receitas decorrentes da
privatização, no cumprimento de procedimentos habituais nestas operações,foi o Governo notificado, ainda
nesse mês, pela DGCOM, solicitando elementos adicionais sobre as condições de reprivatização, suscitando
reservas e pedindo elementos sobre alegados auxílios no passado, no valor de cerca de 400 milhões de
euros.
57- Esta informação relacionava-se quer com o processo de reprivatização, quer com o facto de haver
dúvidas sobre eventuais auxílios ilegais prestados no passado à ENVC.
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58- Não tendo sido possível evitar a abertura desse processo, conseguiu-se, atendendo a toda a
informação prestada pelo Governo português, reabrir o processo relativamente a mais de 181 milhões de
euros e não os 400 milhões de euros iniciais.
59- O Governo foi notificado da abertura desse processo e respetiva fundamentação a 21 de janeiro de
2013, sendo que antes dessa data já tinham existido vários contactos entre o Governo e a DGCOM, bem
como troca de documentação.
60- Manteve nas semanas seguintes vários contactos escritos e reuniões com a DGCOM, no sentido de
tentar evitar a publicação oficial da mesma, pois, isso traduzir-se-ia na formalização final do processo.
61- A decisão de abertura de investigação aprofundada refere-se a auxílios de estado prestados entre
2006 e 2011 (sendo que os valores referentes a 2012 se referem a empréstimos do acionista EMPORDEF,
para refinanciamento dos empréstimos bancários anteriores, pois, em 2012 os bancos já não emprestavam
dinheiro à ENVC).
62- Resulta claro da decisão publicada, que, o facto de esses mesmos auxílios nunca terem sido
previamente notificados à Comissão Europeia os torna, ilegais.
63- No que respeita à compatibilidade de tais medidas com o mercado interno, a Comissão Europeia,
concluiu, que, no momento em que foram concedidos, os apoios dados à ENVC, não respeitaram as regras
em matéria de auxílios à construção naval e, que, no caso de serem considerados como auxílios, só poderiam
ter sido aceites ao abrigo do regime dos auxílios de emergência e à restruturação.
64- A Comissão Europeia não sugere, que, tais apoios poderiam agora ser autorizados mediante a
elaboração de um plano de reestruturação, garantias de contribuição própria, e apresentação de medidas
compensatórias. Essa via não tem aplicabilidade para os auxílios passados.
65- A posição da Comissão Europeia não deixou ao Governo qualquer alternativa quanto à forma de
lidar com a questão dos auxílios passados.
66- Da documentação entregue na Comissão Europeia, e pelos depoimentos dos intervenientes diretos,
constata-se, que, desde janeiro de 2013, o Governo e DGCOM trabalhavam numa solução que, sendo
aceitável do ponto de vista do direito comunitário, permitisse encontrar uma solução alternativa.
67- Só uma solução que representasse um evidente corte e descontinuidade entre o passado e o futuro
seria aceite pela DGCOM.
68- Da documentação recebida na Comissão Europeia e dos depoimentos prestados, resulta evidente
que esta participou na criação da solução alternativa, e foi mantida informada de todos os passos e
desenvolvimentos que essa solução teve.
69- A 3 de abril de 2013 é publicada no Jornal Oficial da União Europeia, a decisão (que o Governo
conhecia desde 21 de janeiro), de abertura de processo de investigação aprofundada.
70- A solução da reprivatização ficou comprometida a partir do conhecimento da eventual necessidade
de a ENVC e/ou o futuro adquirente serem obrigados a restituir os auxílios.
71- O processo de reprivatização é encerrado através da Resolução do Conselho de Ministros de
27/2013, de 17 de abril.
72- Destaca-se que já em 2005, no âmbito do plano de restruturação, o Governo da altura, tinha
solicitado um parecer jurídico, ao Doutor Cruz Vilaça, para aferir da possibilidade de tomar um conjunto de
medidas e, qual a sua adequação às regras comunitárias, nomeadamente, as relativas ao Estado na área da
construção naval.
73- Com este parecer tinha ficado claramente demonstrada a absoluta necessidade da comunicação
prévia à Comissão Europeia dos projetos de auxílio, sob pena de, o seu não cumprimento, originar a sua
imediata “ilegalidade”.
74- Atendendo à impossibilidade de continuar este processo de reprivatização, num quadro em que a
DGCOM, entendeu, não ser possível a manutenção da atividade económica de uma empresa benificiária de
auxílios ilegais, encontrou-se uma solução alternativa.
75- Assim, a solução alternativa teria de passar obrigatoriamente pela não continuidade da atividade
económica da ENVC, com valorização dos respetivos ativos, de forma concorrencial e aberta.
76- O procedimento concursal com vista à Subconcessão foi dirigido por um júri, presidido por um
magistrado do Ministério Público, o Sr. Procurador João Cabral Tavares, que tomou as decisões ao longo do
procedimento e no final classificou as propostas.
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77- Das 16 entidades que manifestaram interesse, 8 levantaram peças concursais e 4 visitaram os
terrenos, no final 2 apresentaram propostas.
78- A subconcessão ao primeiro classificado, West Sea, empresa do Grupo Martifer, permitiu
salvaguardar todos os constrangimentos legais, bem como, a atividade da construção e reparação naval.
79- Segundo as palavras do Sr. Procurador João Cabral Tavares, foi garantida a transparência, a
publicidade, a imparcialidade e todos os valores consagrados em qualquer procedimento administrativo.
80- O enquadramento jurídico do processo de subconcessão, foi sustentado por parecer do Prof. Doutor
Mário Esteves de Oliveira, denominado “In(aplicabilidade) dos regimes de contratação pública à formação do
contrato de Subconcessão da utilização privativa do domínio público e áreas afetas à concessão dominial da
“Estaleiros Navais de Viana do Castelo, SA.”
81- Paralelamente foi possível chegar a um consenso com os trabalhadores da ENVC, com aprovação
de um plano social, com uma expressão muito significativa, pois só 11 trabalhadores, em 609, não assinaram
o acordo de rescisão.
9. RECOMENDAÇÔES
As audições efetuadas e as conclusões obtidas com o presente relatório, aconselham a que a Comissão
Parlamentar de Inquérito, recomende a todos os agentes envolvidos um conjunto de orientações para evitar a
repetição dos erros do passado.
Apesar do âmbito da presente Comissão se reportar em concreto a uma empresa, a ENVC, foi possível
apreciar e aprofundar a realidade transversal ao Sector Empresarial do Estado, pelo que não se pode deixar
de efetuar uma análise mais geral dessa realidade.
Nestes moldes, recomenda esta Comissão que:
1. Atendendo à forte limitação de possibilidade de Auxílios de Estado, num crescendo de sectores da
atividade económica, deve o Governo analisar de forma mais cuidada e ponderada a concessão desses
Auxílios, devendo trabalhar com as instituições da União Europeia de forma preventiva.
2. Quando estejam em causa contratos que se inserem nas relações diplomáticas da República Portuguesa
com Estados terceiros, deverá existir um maior rigor na gestão financeira e na execução atempada dos
mesmos, por forma a evitar a possibilidade de afetar negativamente as relações entre os Estados.
3. O Governo deverá assegurar que a gestão das empresas públicas seja cada vez mais empresarial e
com menor ingerência política.
4. As empresas públicas e o Governo, quando destinatários de relatórios de Auditoria, devem, nas suas
decisões e dentro do possível, atender de forma mais exigente às conclusões e recomendações neles
efetuadas.
5. A constituição de uma Comissão Parlamentar de Inquérito insere-se num poder relevante do Parlamento,
que deve ter uma utilização exigente e criteriosa, prestigiando o mesmo.
6. O Parlamento deve ter um maior acompanhamento das Auditorias que solicita e das
Recomendações/Conclusões que essas Auditorias apontem.
7. Seja, o presente relatório, enviado à Procuradoria-Geral da República para os devidos efeitos legais.
A Deputada Relatora, Ângela Guerra — A Presidente da Comissão, Maria de Belém Roseira.
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ANEXO I – Lista da documentação solicitada e enviada à CPI com a respetiva classificação quanto
ao acesso/divulgação
Documentação solicitada
A Comissão, no âmbito do processo de inquérito, solicitou cópias de elementos procedimentais e
processuais a diversas entidades, a saber:
À Comissão de Defesa Nacional e à Comissão de Economia e Obras Públicas
Ofícios n.os
4 e 5/CPIENVC/2014, de 14 de fevereiro de 2014, respetivamente
Pedido de acesso às audições realizadas a propósito dos Estaleiros Navais de Viana do Castelo, bem
como à respetiva documentação rececionada e produzida.
Ao Sr. Primeiro-Ministro
Ofício n.º 11/ CPIENVC/2014, de 3 de março de 2014
Procedimento aberto pela Comissão Europeia sobre os auxílios estatais ao ENVC e toda a documentação
entregue pelo Governo Português.
Aos Estaleiros Navais de Viana do Castelo
Ofício n.º 9/ CPIENVC/2014, de 28 de fevereiro de 2014:
1. Contrato-quadro, de novembro de 2004, celebrado entre o Governo e a ENVC;
2. Relatório e Contas dos ENVC, SA, desde 2005 até à presente data;
3. Processo atinente ao contrato celebrado entre a ENVC e a Venezuela para construção de dois navios
asfalteiros, nomeadamente, o contrato inicial e adicionais;
4. No tocante ao concurso para a subconcessão, a documentação seguinte:
4.1.Parecer que determina a não submissão às regras da contratação pública;
4.2.Pareceres técnico-jurídicos que coadjuvaram a celebração do contrato.
Ofício n.º 13/ CPIENVC/2014, de 11 de março de 2014
Cópia do contrato de subconcessão, devidamente assinado pelas partes a 10 de janeiro de 2014.
Ofício n.º 20/ CPIENVC/2014, de 27 de março de 2014
Cópia de todas as deliberações do Conselho de Administração dos Estaleiros Navais de Viana do Castelo
desde o ano de 2000 até à presente data.
Ofício n.º 32/CPIENVC/2014, de 15 de maio de 2014
1. Aditamentos aos contratos de fornecimento de 2 barcos (n.os
258 e 259), celebrados entre esses
Estaleiros e a Atlânticoline, S.A.;
2. Atas das reuniões do Conselho de Administração dos Estaleiros em que foram aprovadas as minutas
dos respetivos contratos iniciais de fornecimento, bem como dos seus aditamentos e informação sobre o
processo adotado para aprovação desses contratos;
3. Documentos através dos quais se conferiram poderes aos representantes dos Estaleiros que
outorgaram os contratos respetivos (iniciais e aditamentos);
4. Provas de mar e seus resultados em relação ao navio a que respeita o contrato de fornecimento n.º 258
e indicação da velocidade contratada, bem como da que resultou das referidas provas.
À EMPORDEF
Ofício n.º 10/CPIENVC/2014, de 28 de fevereiro de 2014
1. Relatório da Auditoria da Inspeção Geral de Finanças aos ENVC, datada de 2009;
2. Relatório de avaliação produzido pela classificadora Germanischer Lloyd acerca do processo atinente
ao contrato celebrado entre a ENVC e a Atlânticoline e pareceres técnico-jurídicos que coadjuvaram a
celebração do referido contrato.
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À Comissão Especial de Acompanhamento do Processo de Privatização
Ofício n.º 7/CPIENVC/2014, de 28 de fevereiro de 2014
Toda a documentação relativa ao Processo de reprivatização dos ENVC, nomeadamente:
Abertura do procedimento concursal;
Eventuais candidatos;
Caderno de Encargos;
Atas e demais documentação do júri;
Pareceres técnico-jurídicos e financeiros que coadjuvaram a celebração do contrato;
Decisão e motivação do encerramento
Relatório da Comissão de Acompanhamento do processo de reprivatização
À Divisão de Informação Legislativa e Parlamentar
Resenha histórica dos ENVC e levantamento principais diplomas sobre o regime jurídico dos Estaleiros
Navais de Viana do Castelo, assim como de todos os documentos publicados em Diário da República que,
direta ou indiretamente, influenciaram o destino daquela empresa.
Documentação enviada à CPI
DA COMISSÃO DE DEFESA NACIONAL
1. Respeitante aos Navios “Atlântida” e “Anticiclone”
Contratos de fornecimento 258 e 259, de navios tipo “RO-RO DAY CAR & PASSENGERS FERRY”,
celebrados entre a Atlânticoline, SA, e a sociedade Estaleiros Navais de Viana do Castelo, SA;
Sentença Arbitral;
Relatório n.º 9/2009 – FS/SRATC do Tribunal de Contas, Auditoria à Atlânticoline, SA.
Relatório n.º 930/2009 da Inspeção-Geral de Finanças (Confidencial)
2. Concurso para a “Subconcessão da Utilização Privativa do Domínio Público e das áreas afetas à
Concessão Dominial atribuída à Sociedade Estaleiros Navais de Viana do Castelo, SA.
Despacho de nomeação do Júri – Despacho n.º 11029/2013 (DR 2.ª série, n.º 164, de 27 de agosto);
Anúncio referente à abertura do procedimento
Teaser sobre o procedimento
Programa do Procedimento
Caderno de Encargos
Esclarecimento n.º 1
Esclarecimento n.º 2
Esclarecimento n.os
3 a 11
Esclarecimento n.os
12 a 41
Esclarecimento n.os
42 a 54
Esclarecimento n.º 55
Comunicação de não aceitação de caução a emitir pelo JSC Russian Standard Bank
Comunicação de aceitação de caução a emitir pelo Montepio Geral
Proposta subscrita pelo agrupamento Navalria/Martifer Energy
Proposta subscrita pela AK Portugal
Despacho de aperfeiçoamento sobre a Proposta subscrita pelo agrupamento Navalria/Martifer Energy
Despacho de aperfeiçoamento sobre a Proposta subscrita pela AK Portugal
Documentos em falta – Navalria/Martifer Energy
Requerimento de prorrogação de prazo AK Portugal
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Despacho sobre o Requerimento de prorrogação de prazo AK Portugal
Despacho de admissão da Navalria/Martifer Energy
Despacho de exclusão da AK Portugal – Consultoria de Gestão, S.A.
Requerimento para concessão de novo prazo abreviado pela AK Portugal
Despacho sobre Requerimento para concessão de novo prazo abreviado pela AK Portugal
Procedimento Concursal – Guião de Visita ao local (setembro 2013)
Ata n.º 1 do Júri
Ata n.º 2 do Júri
Ata n.º 3 do Júri
Ata n.º 4 do Júri
Relatório do Júri – outubro 2013
3. Sociedade Estaleiros Navais de Viana do Castelo, SA.
Antecedentes
– Contrato entre a Junta Autónoma dos Portos do Norte e Estaleiros Navais de Viana do Castelo, Limitada
– 02 de maio de 1946;
– Projeto do contrato de concessão Junta Autónoma dos Portos do Norte e Estaleiros Navais de Viana do
Castelo, EP – s/data
– Protocolo para a concessão de novos terrenos da Junta Autónoma dos Portos do Norte e Estaleiros
Navais de Viana do Castelo, EP – 23 de janeiro de 1988
– Contrato entre a Junta Autónoma dos Portos do Norte e Estaleiros Navais de Viana do Castelo, EP –
revisão do prazo de concessão de uso privativo e integração de mais área (DL n.º 11/89, 6 janeiro) – 24 de
maio de 1989
– Aditamento ao contrato de concessão celebrado a 2 de maio de 1946 com a Sociedade Estaleiros Navais
de Viana do Castelo, SA, relativo ao direito de uso privativo de uma parcela de domínio público marítimo no
Porto de Viana do Castelo – Parte: Instituto Portuário e dos Transportes Marítimos, IP – outubro 2006
– Segundo Aditamento ao contrato de concessão celebrado a 2 de maio de 1946 com a Sociedade
Estaleiros Navais de Viana do Castelo, SA, relativo ao direito de uso privativo de uma parcela de domínio
público marítimo no Porto de Viana do Castelo – 22 de novembro de 2007
– Concessão dominial
– Informação considerada relevante para efeitos do Procedimento de subconcessão da utilização privativa
do domínio público e das áreas afetas à concessão dominial atribuída à ENVC, SA, e a ENERCONPOR
(versão consolidada)
– Contrato de concessão entre a APVC – Administração do Porto de Viana do Castelo, SA, e os Estaleiros
Navais de Viana do Castelo, SA – 30 de julho de 2013
Plantas e Ativos da Subconcessão
– Plantas dos terrenos
– Edifícios, infraestruturas e demais equipamentos instalados na área afeta à concessão
– Edifícios, infraestruturas e demais equipamentos instalados na área do domínio público
– Cadernetas prediais (caderneta predial urbana, descrições prediais e outras)
– Fichas Técnicas dos Ativos
– Planta Batimétrica
– Esquemas das redes
Licenciamentos
– Processos de licenciamento municipal e industrial
Planta do percurso; Percurso – Pontos Notáveis
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Projeto Icebreaker – Plano de viabilidade empresarial dos Estaleiros Navais de Viana do Castelo – A.T.
Kearney
– Relatório final de 21 de janeiro de 2011
– Apresentação final de fevereiro de 2011, atualizada em 29 de junho de 2011
Relatório referente à reestruturação para posterior privatização dos ENVC – Sociedade de Advogados,
LCA, junho de 2011
Evolução do passivo financeiro dos ENVC
4. Navalria/Martifer Energy
Relatório e Contas de 2010, 2011 e 2012
5. Procedimento no âmbito do processo instaurado pela Comissão Europeia – Auxílio estatal SA. 35546
(2013)
Jornal Oficial da União Europeia, C 95/118, de 03 de abril de 2013, nas versões em língua portuguesa e
inglesa
6. Documentação entregue pela Senhora Eurodeputada Ana Gomes em audição na Comissão de Defesa
no dia 8-01-2014
Carta da Sr.ª Eurodeputada Ana Gomes dirigida, em 20-12-2013, ao Sr. Joaquín Almunia, Vice-
Presidente da Comissão Europeia e Comissário para a Concorrência
Queixa-crime contra incertos, apresentada pela Senhora Deputada ao Parlamento Europeu Ana Gomes
à Procuradora-Geral da República, por considerar que, na atribuição da subconcessão, por parte do Estado
Português, dos terrenos e infra-estruturas da empresa pública Estaleiros Navais de Viana do Castelo (ENVC)
ao agrupamento empresarial Navalria/Martifer Energy, anunciada pela Administração dos ENVC em 18
Outubro de 2013, terá havido violação de normas que, nos termos do Código Penal, punem a corrupção, o
tráfico de influência, o abuso de poder, o favorecimento de interesses privados
Anexos:
– Auditoria Financeira aos ENVC da Inspeção-Geral de Finanças
– Correspondência com o Ministério da Economia sobre contrapartidas dos submarinos
– Carta de 30-09-2013, dirigida pela German Submarine Consortium ao Diretor Geral das Atividades
Económicas respeitante ao Programa relativo à aquisição de submarinos destinados à Marinha Portuguesa –
Contrato de Contrapartidas
– Comunicação da Comissão Europeia a Portugal, em 23.01.2013 (C(2013) 102 final)
– Jornal Oficial da União Europeia, C 95/118, de 03 de abril de 2013,
– Caderno de Encargos atinente ao procedimento de Subconcessão da utilização privativa do domínio
público e das áreas afetas à concessão dominial atribuída à Sociedade “Estaleiros Navais de Viana do
Castelo, SA”, julho 2013
– Programa do Procedimento Subconcessão da utilização privativa do domínio público e das áreas afetas à
concessão dominial atribuída à Sociedade “Estaleiros Navais de Viana do Castelo, SA”, julho 2013
– Notícia do World Investment News sobre o grupo angolano GEFI – Sociedade de Gestão e Participações
Financeiras SARL.
E-mail de 21-12-2013 dirigido pela Eurodeputada Ana Gomes à Senhora Presidente da Assembleia da
República
DA COMISSÃO DE ECONOMIA E OBRAS PÚBLICAS
Ofício n.º 16/CEOP, de 19 de fevereiro de 2014, indicando a ligação para a audiência concedida no GT –
Audiências à Comissão de Trabalhadores dos Estaleiros Navais e juntando dois documentos entregues
aquando da deslocação da Comissão aos ENVC (Comissão de Trabalhadores e Navios mais representativos),
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bem como um memorando elaborado pelo Presidente da Câmara Municipal de Viana do Castelo que aborda a
questão dos Estaleiros Navais.
DO PRIMEIRO-MINISTRO
Ofício n.º 1017, de 10.03.2014, dando satisfação ao solicitado com o envio de documentos coligidos (2
volumes) a respeito do Procedimento aberto pela Comissão Europeia sobre os auxílios estatais ao ENVC e
toda a documentação entregue pelo Governo Português, a saber:
– G-SET, Privatisation of ENVC, 03-10-2012
– European Commission, DG Competion, 11-10-2012
– G-SET, DGCOM, de 09.11.2012
-European Commission Competion, DG, SA 35546 – Privatisation ENVC, 22-11-2012
– European Commission Competion, DG, SA 35546 – Privatisation ENVC, 07-12-2012
– G-SET, DGCOM State Aid SA 35546, de 28.12.2012
– G-SET, DGCOM State Aid SA 35546 – Addicional Inf. From PT Authorities, de 28.12.2012
– G-SET, DGCOM State Aid SA 35546 – Addicional Inf. From PT Authorities, de 28.12.2012
– European Commission Secrétariat Général, State Aid SA 35546 (2012/Nn), de 22-01-2013
– G-SET, DGCOM State Aid SA 35546 – Addicional Inf. From PT Authorities, de 08.02.2013
– Comissão Europeia Concorrência, 2013/014377 – SA 35546 Addicional Inf. From PT Authorities, de 11-
02-2013
– Commission Européenne Secreériat Général, State Aid SA 35546 – Portugal, de 22-01-2013
– G-SET, DGCOM State Aid SA 35546 – PT – Privatisation of ENVC Confidentialities, de 13-02-2013
– GPEARI – MF, Auxilios de Estado SA 35546 – PT Medidas Anteriores em Benefício dos ENVC, de 21-02-
2013
– G-SET, DGCOM State Aid SA 35546 – PT – Privatisation of ENVC Confidentialities, de 05-03-2013
– Comissão Europeia Concorrência, SA 35546 (2013/C) (Ex 2012/NN) – Medidas Anteriores a Favor dos
ENVC, de 26-02-2013
– Conselho Europeu, ENVC Alternatives Being Envisaged, de 07-03-2013
– G-SET, ENVC Alternatives Being Envisaged, de 07-03-2013
– G-SET, DGCOM State Aid 35546 PT – Privatisation of ENVC – Addicional Information from PT
authorities, de 12-03-2013
– Official Journal of the European Union, Procedures Relating to the Implementation of – Competition Policy
– G-SET, DGCOM State Aid 35546 (2012/CPP) PT – Privatisation of ENVC, de 13-03-2013
– G-SET, DGCOM State Aid 35546 (2012/CPP) PT – Privatisation of ENVC, de 13-04-2013
– G-SET Additional Questions ENVC, de 16-05-2013
– G-SET Additional Question ENVC, de 27-05-2013
– G-SET, Requests, de 31-05-2013
– G-SET, Additional Questions ENVC, de 27-06-2013
– G-SET, Additional Questions ENVC, de 01-07-2013
– G-SET, ENVC Discontinuing Activities, de 02-07-2013
– G-SET, Conference Call – ENVC – Finalisation of Subconcession Documentation, de 27-07-2013
– Conselho Europeu, Conference Call – ENVC – Finalisation of Subconcession Documentation, de 29-07-
2013
– G-SET, ENVC Addicional Information, de 27-09-2013
– G-SET, ENVC Addicional Information, de 24-10-2013
– G-SET, ENVC Addicional Information, de 20-11-2013
– G-SET, ENVC Addicional Information, de 12-12-2013
– Conselho Europeu, Request from DCIAP, de 20-01-2014
– G-SET, Request from DCIAP, de 31-01-2014
– G-SET, SA 35546 Past Measures in Favour of ENVC (CD), de 13-02-2014
– GPEARI – MF, SA 35546 (2013/C) – PT – Medidas Anteriores a favor dos ENVC, de 14-02-2014
– G-SET, SA 35546 Past Measures in Favour of ENVC, de 27-02-2014
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DOS ESTALEIROS NAVAIS DE VIANA DO CASTELO
Ofício CADM 31/14, de 11 de março de 2014 – Envio de toda a documentação solicitada pela CPIENVC
através do ofício n.º 9/CPIENVC/2014, de 28 de fevereiro de 2014, com exceção do referente ao ponto 4.2. –
Pareceres técnico-jurídicos que coadjuvaram a celebração do contrato, na medida em que os mesmos não
foram solicitados pelos ENVC. Estes apenas se socorreram do Consultor Jurídico PBBR.A – Sociedade de
Advogados, RL para a elaboração das peças concursais.
Ofício CADM 33/14, de 13 de março de 2014 – Envio da documentação solicitada pela CPIENVC
através do ofício n.º 13/CPIENVC/2014, de 11 de março de 2014.
Ofício CADM 50/14, de 27 de março de 2014 – Envio adicional e por iniciativa dos ENVC do Relatório
elaborado em 30 de abril de 2009, pelo assessor do Conselho de Administração da EMPORDEF, Almirante
Luís Filipe Xavier Cabrita e a Análise do processo de projeto das construções C258 e C259 nos Estaleiros
Navais de Viana do Castelo, elaborada em 14 de agosto de 2009, pelo Centro de Engenharia e Tecnologia
Naval do Instituto Superior Técnico. Estes documentos reportam-se às construções C258 (navio “Atlântida) e
C259 (navio “Anti Ciclone”).
Ofício CADM 53/14, de 2 de abril de 2014 – Envio da documentação solicitada pela CPIENVC através
do ofício n.º 20/CPIENVC/2014, de 27 de março de 2014.
Ofício CADM 101/14, de 28 de maio de 2014 – Envio da documentação solicitada pela CPIENVC
através do ofício n.º 32/CPIENVC/2014, de 15 de maio de 2014.
DA EMPORDEF
Ofício n.º 160/PRCA, de 10 de março de 2014 – Envio de toda a documentação solicitada
DA COMISSÃO ESPECIAL DE ACOMPANHAMENTO DO PROCESSO DE PRIVATIZAÇÃO
Ofício de 10 de março de 2014 – Envio de toda a documentação solicitada
À Divisão de Informação Legislativa e Parlamentar
Solicitação satisfeita
DECLARAÇÃO DE VOTO
Integrando, como membro efetivo, os eleitos do Grupo Parlamentar do Partido Socialista na Comissão de
Inquérito para Apuramento das Responsabilidades pelas Decisões que Conduziram ao Processo de
Subconcessão dos Estaleiros Navais de Viana do Castelo voto contra o relatório apresentado.
Apresento esta declaração de voto individual para explicitar as razões desse voto contra.
Assento a minha posição nos seguintes pressupostos e considerações:
– Aquando da apresentação do projeto de relatório pela Deputada relatora, e mais uma vez deve condenar-
se a prática de este ser apresentado uns dias antes à comunicação social e só depois no local formal e
institucional adequado, o que desprestigia, na minha opinião, a Comissão de Inquérito, os Deputados do
Partido Socialista tiveram a oportunidade de salientar que, embora não personalizado, o que é louvável, o
relatório merecia um conjunto de reparos que, a seu tempo, seriam transcritos para as propostas de alteração
a apresentar, por forma a construir um documento que explicitasse a totalidade dos factos exarados nas
diversas audições e nos documentos remetidos a esta comissão;
– Salientámos, ainda, que as nossas divergências assentavam, essencialmente, em sete temáticas
deficitariamente vertidas no relatório, nomeadamente:
i. A abordagem desvirtuada aos auxílios estatais e a perceção errónea de que já teria sido emitida uma
decisão final condenatória por parte da DGCOM, quando, na realidade, ainda se encontra em apreciação o
processo de investigação levantado contra a empresa ENVC por alegados auxílios de estado;
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ii. A limitação temporal das dificuldades económico-financeiras da empresa ao período entre 2004 e
2011, quando é percetível dos documentos remetidos a esta comissão que a sustentabilidade financeira
dos ENVC nunca foi devidamente materializada nos exercícios anteriores a 2004, agravando-se inclusive a
partir de 2011;
iii. A abordagem ao contrato entre a Atlânticoline e a ENVC como o grande problema da empresa que
levou a este desfecho, quando a empresa continuou a laborar e a receber e construir encomendas, tendo-
se a sua “certidão de óbito” materializado apenas com a decisão de subconcessão tomada pelo atual
executivo;
iv. A consideração de que o desfecho do processo de privatização assenta na inevitabilidade da decisão
condenatória da DGCOM de contornos financeiros insustentáveis para a empresa, omitindo por completo o
conteúdo da Resolução do Conselho de Ministros que dita o encerramento deste procedimento sustentado
na falta de cumprimento dos requisitos necessários por parte dos candidatos a concurso;
v. A análise ao processo de subconcessão que suprime por completo a querela existente quanto à
aplicabilidade do Código dos Contratos Públicos (a sua inaplicabilidade assenta exclusivamente num
parecer extemporâneo à abertura do concurso), sublinhando-se ainda a falta de transparência no
desenvolvimento do processo (a grande maioria das deliberações do júri não constar das atas) e a não
garantia de continuidade da atividade da construção naval na região;
vi. O papel das entidades sindicais na dinâmica laboral dos ENVC que também não fica claro neste
relatório, inclusive se for tido em conta o absentismo na empresa nos últimos dois anos e meio e o facto
destes sindicalistas terem recebido, através do plano social da empresa, as indemnizações mais elevadas
com a respetiva rescisão contratual;
vii. O futuro da empresa ficar por esclarecer no relatório apresentado, depois de evidenciadas fragilidades
do ponto de vista legal, nomeadamente o facto de não estarem salvaguardados os contratos nos quais a
ENVC é parte e que, num futuro de extinção da mesma, ficam por acautelar.
Sete temáticas em que me revejo integralmente.
– Face a estas premissas, os Deputados do Grupo Parlamentar do Partido Socialista apresentaram as
seguintes propostas de alteração que subscrevi:
NOVO PONTO – A constituição desta CPI assenta nos pressupostos inscritos no requerimento
apresentado pelos proponentes, nomeadamente para “apurar as circunstâncias e as responsabilidades
que levaram à decisão de extinção dos Estaleiros Navais de Viana do Castelo e a concessão das suas
instalações a uma empresa privada”;
2 (Junção dos pontos 1 e 2) – As suspeitas de falta de transparência, de ilegalidades e, mesmo, de
negócios nebulosos, pese embora ainda se encontrem em aberto processos judiciais sobre a matéria, não
resultaram provadas em qualquer dos depoimentos, parecendo por isso acusações infundadas e claramente
despropositadas;
3 – Ficou demonstrada a existência de muita instabilidade nos diversos Conselhos de Administração da
ENVC e da EMPORDEF, sendo que, em muitos desses mandatos, houve alterações na sua composição.
4 – O endividamento da empresa foi uma constante, salientando-se contudo o ano de 2009 como um
ano francamente nefasto para a situação económico-financeira da empresa.
5 – (…).
6 – (…).
7 – Esta auditoria, tendo sido realizada por solicitação da Assembleia da República, não foi
atempadamente remetida ao Parlamento.
8 – Entre 2003 e 2013, das 22 novas construções, só duas (em 2004 e em 2005) não deram prejuízos,
sendo que o pior resultado verificou-se em 2004 com um navio químico que constituiu um prejuízo de
22M€;
9 – Essas novas construções tiveram prejuízos acumulados de 103.082.528,20€, com custos
realizados sempre superiores aos custos orçamentais.
10 – (…).
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11 – (…).
12 –Eliminar
13 – A empresa, em determinados períodos, apresentou excesso de mão-de-obra, relativamente às suas
necessidades, com o elevado absentismo e baixa produtividade, abordados por muitos depoentes como difícil
de contornar, a decorrer, muitas vezes, da ação das próprias estruturas sindicais e, nos últimos dois
anos e meio, da total inatividade da empresa.
14 – (…).
15 – Relativamente ao Plano de Construções da Marinha, constata-se um grau muito diminuto de
execução desde 2005, não sendo possível quantificá-lo devidamente em função das alterações
entretanto sofridas e que diminuíram o seu objeto.
NOVO – No Conselho de Ministros de 13 de setembro de 2012, o Governo optou, atendendo ao
processo de reprivatização da ENVC, por revogar a resolução do Conselho de Ministros sobre o
programa relativo à aquisição de navios destinados à Marinha Portuguesa e autorizar o Ministro da
Defesa Nacional a proceder à revogação dos contratos entre o Estado Português e os Estaleiros
Navais de Viana do Castelo.
16 – (…).
17 – Existia também nos ENVC uma cultura de pouca colaboração com organizações nacionais afins para
se resolverem as debilidades internas.
18 – O contrato com a Atlânticoline foi o tema dominante desta CPI.
19 – A rejeição deste navio por parte da Atlânticoline foi mesmo designada por inúmeras entidades ouvidas
como a “Certidão de Óbito” da ENVC, embora se verifique que, após essa rejeição, os ENVC conseguiram
concluir dois Patrulhas Oceânicos para a Marinha Portuguesa e celebrar um novo contrato de
fornecimento com a PDVSA.
20 – Este negócio importou prejuízos inquantificáveis para a empresa ENVC.
21 – Pese embora, das audições tenham resultado inúmeras contradições entre os vários depoentes, ficou
claro que este é um exemplo paradigmático da incapacidade de gestão que a empresa teve ao longo de
muitos anos, bem como dos efeitos nefastos da partidarização de assuntos empresariais pelos agentes
político.
22 – Logo na fase pré-contratual, não fica esclarecido qual o interesse económico na relação contratual da
ENVC com a Portbridge Engineering, cujo grau de intervenção foi apenas a subcontratação da Petrobalt,
devendo porventura este assunto merecer uma investigação judicial mais aprofundada.
23 – (…).
24 – (…).
25 – (…).
26 – O acordo arbitral alcançado em fase posterior à resolução do contrato acabou por servir apenas os
interesses da Atlânticoline, pois a ENVC não conseguiu, entretanto, vender o navio Atlântida.
27 – Na perspetiva da boa gestão da ENVC, a grande maioria das entidades ouvidas não defendeu
este acordo arbitral.
28 – (…).
29 – (…).
30 – Das audições, conclui-se que este foi um processo com uma clara intervenção política de vários
quadrantes políticos.
31 – (…).
32 – (…).
33 – (…).
34 – (…).
35 – Foi efetuado à ENVC um pagamento inicial de 10% do valor do contrato, no montante de 12,8M€,
sendo que este valor não foi utilizado para a execução do contrato mas para outras necessidades da ENVC,
designadamente para o pagamento de vencimentos devidos aos trabalhadores.
36 – (…).
37 – (…).
38 – (…).
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NOVO PONTO – Até à subconcessão dos ENVC não foi iniciada a construção dos asfalteiros, sendo
certo que os incumprimentos contratuais, no que respeita aos prazos, continuam a ser um problema
jurídico e diplomático inerente a este contrato.
39 – Existiram 250 milhões de euros de contrapartidas de equipamentos que entraram na ENVC,
valorizados pela Comissão Permanente de Contrapartidas, e que vieram a sofrer imparidades, sendo
considerados no ativo dos ENVC em menos de 50 milhões de euros.
40 – (…).
41 – (…).
42 – (…).
43 – (…).
44 – Este plano que previa um investimento de cerca de 70 milhões de euros, para repor o equilíbrio
financeiro da ENVC, além de alterações ao modelo de gestão da empresa e redução de número de
trabalhadores, nunca foi apresentado à Comissão Europeia, donde se constata que houve violação de normas
comunitárias.
45 – (…).
46 – Estas entidades sempre estiveram contra qualquer mudança na empresa no sentido de reduzir os
seus trabalhadores, inviabilizando, consequentemente, medidas com vista a tornar a empresa mais
viável e sustentável.
47 – (…).
48 – Conclui-se também que este plano de reestruturação que previa o despedimento de 420 trabalhadores
assentava em pressupostos não executáveis em 2011.
49 - Em junho de 2011 a situação era a seguinte: a EMPORDEF não tinha Presidente, a ENVC não tinha
Presidente e apresentava um passivo de mais de 250 milhões de euros, os seus capitais próprios eram
negativos e superiores a 100 milhões de euros, a dívida bancária era de mais de 160 milhões de euros, os
contratos estavam particamente todos em situação de incumprimento, não havia encomendas para fazer,
operar e executar, existiam dívidas de fornecedores de muitos milhões de euros com penhoras em curso, as
rendas dos terrenos e edifícios estavam por pagar há muitos anos e o Fundo de Pensões tinha um défice de
14 milhões de euros.
50 – (…).
51 – (…).
52 – (…).
53 – (…).
54 – Pese embora a pouca intervenção que teve no processo, o presidente da comissão especial de
acompanhamento da reprivatização, Senhor Dr. José Manuel Fernandes, diz ter procurado garantir a plena
observância dos princípios da transparência, do rigor, da isenção, da imparcialidade e da melhor defesa do
interesse público, ao longo de todo o processo.
55 – Face ao memorando enviado à DGCOM pela Secretaria de Estado do Tesouro e das Finanças, a
3 de outubro de 2012, a explicitar as medidas estatais que visam maximizar as receitas decorrentes da
privatização, foi o Governo notificado, ainda nesse mês, pela DGCOM, solicitando elementos adicionais sobre
as condições de reprivatização, suscitando reservas e pedindo elementos sobre alegados auxílios no passado,
no valor de cerca de 400 milhões de euros.
56 – (…).
57 – (…).
58 – (…).
59 – (…).
60 – A decisão de abertura de investigação aprofundada refere-se a eventuais auxílios de estado prestados
entre 2006 e 2012, tal como consta da decisão de abertura do processo de investigação aprofundada
pela DGCOM.
61 – Resulta claro da decisão publicada que, o facto de esses eventuais auxílios nunca terem sido
previamente notificados à Comissão Europeias, torná-los-ia ilegais, a confirmarem-se.
62 – No que respeita à compatibilidade de tais medidas com o mercado interno, a Comissão Europeia
considera que se afigura que, no momento em que foram concedidos, os apoios à ENVC não respeitaram as
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regras em matéria de auxílios à construção naval e que, no caso de serem considerados como auxílios, só
poderiam ter sido aceites ao abrigo do regime dos auxílios de emergência e à reestruturação.
63 – (…).
64 – A convicção do Sr. Ministro da Defesa Nacional, que nunca reuniu pessoalmente com o
Comissário Joaquín Almunia, era a de que a posição da Comissão Europeia não deixava ao Governo
qualquer alternativa quanto à forma de lidar com a questão dos auxílios estatais.
65 – (…).
66 – (…).
67 – (…).
68 – (…).
69 – ELIMINAR.
70 – (…).
71 – O processo de reprivatização é encerrado através da Resolução do Conselho de Ministros de 27/2013
de 17 de abril que determina “a conclusão do processo de venda direta de referência no âmbito do
processo de reprivatização da empresa Estaleiros Navais de Viana do Castelo, S.A. (ENVC, S.A.), com a
rejeição da proposta vinculativa apresentada pela JSC - RiverSea Industrial Trading (RSITrading), por
se entender que as condições constantes da referida proposta apresentada, nomeadamente o preço,
os termos e as garantias exigidos pela RSI Trading, constituem compromissos excessivos e
insuscetíveis de serem assumidos (…)”.
72 – (…).
73 – (…).
74 – Atendendo à impossibilidade de continuar este processos de reprivatização, num eventual quadro em
que a DGCOM entenda não ser possível a manutenção da atividade económica de uma empresa beneficiária
de auxílios ilegais, encontrou-se uma alternativa.
75 – Assim, a solução alternativa teria de passar, na hipótese de uma decisão condenatória por parte
da DGCOM, pela não continuidade da atividade económica da ENVC, com valorização dos respetivos ativos,
de forma concorrencial e aberta.
76 – (…).
77 – (…).
78 – A subconcessão ao único concorrente admitido a concurso, West Sea, empresa do Grupo Martifer,
procurou salvaguardar todos os constrangimentos legais, bem como a atividade a construção e reparação
naval, não obstante o objeto da mesma abranger ainda a instalação de indústria de fabricação de
componentes para aerogeradores eólicos ou o exercício da indústria metalomecânica e de atividades
complementares ou conexas a todas estas.
79 – (…).
NOVO PONTO – Fica demonstrado que das atas não há qualquer referência às diversas
deliberações formuladas pelo júri após a abertura das propostas, com exceção da deliberação que
admite apenas uma das duas propostas apresentadas.
80 – O enquadramento jurídico do processo de subconcessão foi sustentado por parecer, extemporâneo
em relação à abertura do concurso, do Prof. Doutor Mário Esteves de Oliveira, denominado
“In(aplicabilidade) dos regimes de contratação pública à formação do contrato de Subconcessão da utilização
privativa do domínio público e áreas afetas à concessão dominial da “Estaleiros Navais de Viana do Castelo,
S.A.”
81 – (…).
NOVO PONTO – A ENVC, S.A. continua por liquidar, ficando por esclarecer o futuro dos contratos
em que a mesma consta como parte bem como do material que continua por alienar, inclusive do
material adquirido após a concretização do processo de subconcessão.
NOVO PONTO – O encerramento dos ENVC, embora difícil de quantificar segundo o Presidente do
CA da Empordef, custa entre 250 e 300 milhões de euros.
Propostas em que, subscrevendo-as, como já afirmei anteriormente, me revi integralmente.
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Participei, até, numa reunião de trabalho entre os eleitos do PS e a Deputada relatora no sentido de
procurar aproximar posições e melhorar o relatório.
Essencialmente através da adoção de propostas fatuais, fundadas nas audições e documentação recebida,
que não traduzissem uma mera lógica partidária de branqueamento a qualquer Governo por parte de maiorias
parlamentares conjunturais. Passadas ou atuais.
Concluída essa reunião de trabalho e após reflexão posterior da Deputada relatora registo, e registaram os
Deputados do Partido Socialista, que a relatora, pese embora ter aceitado um conjunto de alterações
propostas pelo Partido Socialista, ainda que muito parcial, menos de metade das propostas apresentadas,
escusou-se a um entendimento no que respeita às matérias respeitante ao atual Governo, nomeadamente no
que concerne aos processos de reprivatização e de subconcessão e à investigação da DGCOM.
Tal fato, só por si, justifica o nosso voto contra e justifica o meu em particular.
O Partido Socialista refutou a apresentação de um relatório assente numa visão parcial dos factos e que
não só subverte a efetiva realidade (nomeadamente no que respeita à investigação que está a ser produzida
pela DGCOM) mas também limita temporalmente aquele que era o objeto desta comissão, não fazendo
grandes considerações de fundo quanto ao desfecho final da empresa e aos efeito nefastos a ela associados,
como os custos do encerramento da ENVC e as consequências para a atividade económica nacional mas
sobretudo local.
O Partido Socialista sempre defendeu a continuidade dos ENVC e nunca contestou a continuidade do
Estado na sua gestão, seja mediante a sua reestruturação, seja mediante a reprivatização de parte da
empresa.
O Partido Socialista não concorda com o cenário atual dos ENVC. Um cenário de perda de capital humano
muito qualificado. Um cenário de perda de um setor estratégico nacional como é a construção naval. Um
cenário de destruição de uma empresa que, ao longo dos anos, foi-se afirmando nacional e
internacionalmente.
E, no essencial, revejo-me nessas posições.
Pelo que acompanho, também no essencial, nesta Declaração de Voto, as posições expressas na
Declaração de Voto dos meus colegas.
No entanto, não acompanho a visão parcelar da votação conclusão a conclusão. Prévia a uma votação final
global.
Visão que conduziu a uma multiplicidade de votos diferenciados nas conclusões por parte de diferentes
Partidos e, também, por parte dos Deputados do Partido Socialista: umas a favor, outras abstenção e a
maioria contra.
E quis deixar isso expresso.
Para mim, o relatório é um todo interdependente na sua parte expositiva, nas suas conclusões e nas suas
recomendações.
Em especial, nas conclusões. A própria Deputada relatora não se cansou de afirmar que as conclusões
eram sequenciais, tinham uma lógica global e estavam interligadas.
Logo, uma vez que o relatório, configura, na minha opinião, um branqueamento a toda e qualquer
conclusão que possa beliscar, ainda que ao de leve, o atual Governo, não poderia votar, globalmente, de outra
maneira, que não contra.
E votando contra globalmente fazia, para mim, mais sentido votar contra toda e qualquer parte do relatório.
Pois este é um todo.
Ainda que concordando com algumas conclusões estas não fazem sentido por si só.
Fariam sentido integradas num todo que fosse, também, fatual e correto.
O que não acontece em muitas situações pois apresenta, este relatório, conclusões que, parcial ou
totalmente, não têm adesão à realidade.
Não obstante esta minha posição acompanhei o voto diferenciado do Partido Socialista. E quis explicitar,
também, nesta declaração de voto, porquê.
Acompanhei porque me pauto por valores de lealdade e solidariedade politica na tomada de decisões. E a
aceitação de votação diferenciada conclusão a conclusão foi tomada na minha ausência momentânea da
reunião. Ausência motivada pela exigência da minha presença na reunião da Comissão Parlamentar de
Economia e Obras Públicas, onde sou o Coordenador do GPPS, que decorria ao mesmo tempo.
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Não estando presente entendi não dever contrariar, a posteriori, uma decisão dos meus colegas. E decidi
acompanhar as suas decisões.
Mas a bem da transparência e da coerência de posições penso que deveria registar para memória futura
esta diferença de opinião que teria expresso se estivesse presente no momento exato em que a decisão foi
tomada.
Por fim, gostava de deixar uma nota sobre as Comissões de Inquérito. É lamentável esta tendência de
maiorias parlamentares conjunturais procurarem branquear nos seus relatórios aquilo que possa afetar os
Governos que suportam.
Isso não prestigia o Parlamento, o mandato dos Deputados e as Comissões de Inquérito.
É tempo de mudar as regras do seu funcionamento na lamentável impossibilidade de mudar a atitude da
maioria.
Assembleia da República, 9 de julho de 2014.
O Deputado do PS, Rui Paulo Figueiredo.
DECLARAÇÃO DE VOTO
Perante as conclusões aprovadas unilateralmente pelos Deputados da maioria PSD/CDS na Comissão
Parlamentar de Inquérito ao processo que culminou na extinção dos Estaleiros Navais de Viana do Castelo, os
Deputados do Grupo Parlamentar do PCP, entendem dever lavrar em ata as razões do seu voto contra e
publicitar as propostas que apresentaram e que foram rejeitadas liminarmente pelos Deputados do PSD, do
CDS e do PS.
1. O relatório aprovado e as conclusões dele constantes, não refletem os factos apurados ao longo dos
trabalhos da Comissão, ocultando aspetos fundamentais que se prendem com a matéria objeto da Resolução
da Assembleia da República n.9/2014, de 30 de janeiro.
Importa aliás recordar que a maioria PSD/CDS, gorada a tentativa de impedir a realização do Inquérito
parlamentar (que só teve lugar por via de um requerimento potestativo) logo no início dos trabalhos reservou
unilateralmente para si a elaboração do relatório e das respetivas conclusões, revelando um claro propósito de
instrumentalização política do inquérito parlamentar. As conclusões políticas da Comissão de Inquérito são
parciais, refletem a visão governamentalizada dos acontecimentos que rodearam a decisão de liquidar os
ENVC, branqueiam a atuação do Governo PSD/CDS-PP e assumem o claro propósito de proteger o
desempenho do Ministro da Defesa Nacional neste processo.
A imposição de uma visão parcelar e redutora do processo de liquidação dos ENVC é inaceitável. Afirmar
como inevitável a liquidação de uma empresa e de um setor económico estratégico a partir de um facto que
não existe – a decisão da DGCOM relativa às ajudas de Estado - é politicamente desonesto e só entendível
como uma forma de branquear e ilibar o Governo das suas responsabilidades.
Esconder que o Governo não usou todos os meios, nomeadamente a construção dos navios para a
Marinha de Guerra Portuguesa, para justificar os 181 milhões de euros tidos como ajudas de Estado é
branquear a inação e a demissão de responsabilidades que o Governo deveria assumir na defesa dos
interesses nacionais junto da União Europeia.
Colocar os trabalhadores ao mesmo nível das sucessivas administrações e dos decisores políticos
atribuindo-lhes responsabilidades pelas condições que levaram à liquidação dos ENVC não é só absurdo
como revelador da visão política e ideológica dos partidos da direita, ou seja, branquear a ação dos sucessivos
Governo e Administrações e culpar os trabalhadores pelos erros e omissões destes últimos.
2. Dos trabalhos da CPI fica claro que sucessivos governos e administrações tiveram responsabilidades no
processo de esvaziar, descredibilizar e destruir os Estaleiros Navais de Viana do Castelo mediante o
desinvestimento continuado, a celebração de contratos desvantajosos, a inexistência de mecanismos de
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controlo e aprovisionamento e gastos desnecessários em estudos de reestruturação que nada de positivo
trouxeram aos ENVC.
Do decurso dos trabalhos ficou claro que a decisão do atual Governo de cancelar as encomendas para a
Marinha Portuguesa (seis NPO e cinco lanchas de fiscalização costeira) que constituíam a maior encomenda
que os ENVC dispunham, foi deliberada e foi determinante para a decisão de encerramento dos ENVC.
No final dos trabalhos da Comissão de Inquérito fica claro que a entrega dos ENVC à empresa Martifer não
dá garantias que a atividade de construção naval seja preservada. Porém, as conclusões aprovadas
escamoteiam tal realidade e optam de uma forma deliberada por branquear a decisão do Governo PSD-
CDS/PP.
Resultou claramente das audições que o processo de subconcessionar os ENVC assenta em opções
políticas e ideológicas, sendo uma decisão intencional e que visa omitir os reais objetivos da decisão
governamental – liquidar os setores estratégicos da economia portuguesa e entrega-los aos privados.
Ficou claro nas audições que a decisão de extinguir os ENVC e concessionar os respetivos terrenos não
era uma inevitabilidade, antes decorre e é inseparável das opções de sucessivos governos e das ações e
omissões das sucessivas administrações por eles nomeados, cujas responsabilidades não podem ser ilibadas.
3. Para o PCP a decisão do Governo de encerrar os Estaleiros Navais de Viana do Castelo constituiu um
dos exemplos mais escandalosos de abdicação dos interesses nacionais.
Os factos apurados demonstram que, ao contrário do que o Governo e as conclusões da maioria
parlamentar pretendem fazer crer, não existia qualquer obrigação nem era uma inevitabilidade encerrar os
Estaleiros Navais de Viana do Castelo nem despedir a totalidade dos trabalhadores. O processo de
investigação da Comissão Europeia em torno de alegadas ajudas de Estado nunca o determinou.
A opção do Governo de liquidar a empresa, é uma escolha que reflete uma posição ideológica que apenas
serve os interesses dos grupos privados que pretendem apropriar-se de um património público determinante e
estratégico na construção naval em Portugal.
O PCP entende que sempre existiu e que existe um outro caminho: a defesa da capacidade do país em
matéria de construção naval em que os ENVC assumiam um papel decisivo.
4. O Grupo Parlamentar do PCP apresentou um conjunto significativo de propostas de alteração e de
aditamento às conclusões propostas com base em factos objetivos e em informações recolhidas ao longo do
inquérito.
As propostas apresentadas pelos Deputados do PCP e rejeitadas em bloco pelos Deputados do PSD, do
CDS e do PS foram as seguintes:
Enquanto unidade industrial no Alto Minho com efetiva capacidade instalada e saber fazer, o interesse
dos Estaleiros Navais de Viana do Castelo não se circunscreve num âmbito local ou regional. Com cerca de
700 trabalhadores, constituíram o único estaleiro, civil, com efetiva capacidade de projeto e construção em
Portugal, razão pela qual se lhes reconhece um enorme prestígio nacional e internacional. A sua importância
está relacionada com a criação de uma parte substancial da riqueza produzida na região, constituindo uma
empresa de referência no desenvolvimento do distrito de Viana do Castelo.
Em lugar do aproveitamento de toda a capacidade produtiva da indústria naval, através da promoção da
inovação tecnológica, da procura de encomendas e diversificação de mercados e produtos, os ENVC
conheceram o desinvestimento continuado de sucessivos governos, a ineficácia e ausência de capacidade das
administrações, a celebração de contratos desvantajosos, a inexistência de adequados mecanismos de
controlo e aprovisionamento, gastos desnecessários em estudos de reestruturação que nada de positivo
trouxe à empresa. Tudo isto traduzindo o que incontornavelmente prefigura uma deliberada opção de esvaziar,
descredibilizar e destruir os Estaleiros Navais de Viana do Castelo.
Conclui-se os contratos [celebrados pelos ENVC] eram elaborados de forma deficiente em termos de
garantias jurídicas e havia sérias dificuldades na gestão dos mesmos.
Para a execução do conjunto de navios ao longo dos anos, foi sempre necessário recorrer, para além da
ocupação total dos trabalhadores dos ENVC, a mão-de-obra externa. Para a execução do caderno de
encomendas existente quando o atual Governo tomou posse (mais de 600 milhões de euros) seria necessário
manter essa prática e o trabalho estaria garantido por vários anos.
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Resultou demonstrado que tanto os conselhos de administração dos ENVC e da EMPORDEF, como a
tutela setorial tinham conhecimento que a empresa trabalhava reiteradamente gerando prejuízos.
No âmbito da Lei de Programação Militar, e com o objetivo de dotar a Marinha de Guerra com os meios
indispensáveis para a defesa e patrulhamento das águas territoriais nacionais e da vasta zona económica
exclusiva portuguesa, foi encomendada aos ENVC a construção de oito navios de patrulha oceânica (NPO),
sendo dois deles de combate à poluição, com opção por mais três, bem como de cinco lanchas de fiscalização
costeira.
O contrato foi assinado em 2009, sendo Ministro da Defesa Nacional o Prof. Nuno Severiano Teixeira, e
ascendia ao montante de 500 milhões de euros. Porém, a decisão constava de Resolução do Conselho de
Ministros aprovada em 2004.
Por dificuldades relacionadas com a execução do projeto, os prazos de entrega dos primeiros NPO não
foram cumpridos e o custo da respetiva construção foi largamente excedido, sem que os ENVC tenham sido
ressarcidos desse aumento de custos.
A construção dos navios Viana do Castelo e Figueira da Foz foi deficitária para os ENVC. Porém, existe
o reconhecimento unânime da excelência desses navios e de que, passadas as dificuldades da construção do
protótipo, a empresa ficou em condições de construir os navios seguintes em termos lucrativos.
Foi também reconhecida a forte possibilidade de construir NPO para outros países, dada a reconhecida
excelência dos navios construídos.
Aliás, haviam sido adquiridos materiais para prosseguir com a construção de mais NPO, e também de
navios de combate à poluição.
Porém, em setembro de 2012, o Governo PSD/CDS, sendo Ministro da Defesa o Dr. Aguiar Branco,
decidiu cancelar a encomenda dos seis NPO em falta (e também dos NPC, os navios de combate à poluição)
e das cinco lanchas de fiscalização costeira, que implicariam pagamentos aos Estaleiros da ordem de 57
milhões de euros em 2013 e de 38 milhões em 2014.
Esta decisão constituiu um rude golpe para os ENVC, na medida em que correspondeu ao
cancelamento da maior encomenda de que a empresa dispunha.
E constituiu um duro golpe para o país, na medida em que as vastas águas territoriais e zona
económica exclusiva carecem de uma fiscalização que os atuais meios da Marinha não estão em condições
de assegurar, sendo reconhecido o défice de fiscalização da vasta área adjacente às regiões autónomas.
Não existindo os ENVC, o país não está em condições de construir novos NPO, satisfazendo eventuais
encomendas de outros países, nem está em condições de assegurar a construção em Portugal de mais NPO
tão necessários para a Marinha de Guerra Portuguesa.
A Defesa Nacional, a fiscalização dos espaços marítimos sob jurisdição e salvaguarda da vida humana
constitui parte da missão da Marinha. A necessidade de navios capazes para o desempenho de tais
atribuições poderia constituir uma oportunidade para revitalizar os ENVC e alcançar o indispensável
reequilíbrio financeiro.
Além do significado financeiro, os ENVC veriam reforçada a sua posição na construção de navios
militares contribuindo para elevar os índices de industrialização do País. Podia inclusive favorecer a entrada no
mercado de exportação deste tipo de navios, a que se ligaria o indispensável esforço de modernização em
toda a estrutura dos ENVC.
A empresa Atlânticoline, empresa de capitais públicos na titularidade do Governo Regional dos Açores,
celebrou com os ENVC um contrato destinado à construção de dois ferry-boat para deslocações entre as ilhas
nessa Região.
O caderno de encargos para o respetivo concurso foi elaborado pela empresa SCMA, pertencente ao
Eng.º João Moita, que recorreu aos serviços da empresa russa Petrobalt.
Para a respetiva construção, a empresa dos ENVC recorreu aos serviços da mesma empresa Petrobalt,
também por sugestão do Eng.º João Moita. Porém, foi reconhecido que esta opção se revelou errada e
dificultou a execução do projeto.
Foi reconhecido por vários depoentes que o prazo previsto no contrato para a execução dos navios era
impraticável.
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Ao longo da execução do projeto foram sugeridas várias alterações por parte dos ENVC, que foram
aceites pela Atlânticoline, através do seu fiscal residente.
Por outro lado, foram exigidas pela Atlânticoline diversas alterações ao projeto, que os ENVC aceitaram
sem alterar as condições contratuais e sem aumentar o preço dos navios.
Em consequência de opções assumidas e de erros cometidos na execução do projeto, verificou-se que
o navio Atlântida não conseguiu atingir a velocidade contratualmente exigida.
Em consequência, e dado que o incumprimento da velocidade exigida era uma cláusula contratual
suscetível de conduzir à rescisão do contrato, a Atlânticoline procedeu a essa rescisão.
Apesar de haver pareceres técnicos que contestam a posição da Atlânticoline e que consideram
injustificável a rescisão do contrato, a Administração dos ENVC liderada pelo Eng.º José Manuel Rolo
entendeu que não deveria contestar essa rescisão e aceitou que a empresa ficasse com o navio Atlântida já
construído e com o Anticiclone em construção, sem quaisquer garantias quanto à sua venda, e aceitou
devolver à Atlânticoline, a título indemnizatório, a quantia de 40 milhões de euros.
Vários depoentes consideraram inexplicável e incompreensível que os ENVC não tenham litigado em
defesa dos seus interesses, e tenham aceite, por acordo, a exigência da Atlânticoline.
Segundo tais depoimentos, a situação criada seria suscetível de conduzir a uma redução do preço do
navio, mas nunca à rescisão do contrato, nos termos lesivos em que foi efetuada para os ENVC. Foi referido
não haver memória de um caso semelhante.
No seu depoimento, o ex-ministro Augusto Santos Silva aludiu ao ambiente político criado nos Açores
em torno do Atlântida, que não permitiu uma solução mais favorável aos ENVC.
No âmbito de um acordo bilateral entre Portugal e a Venezuela, foi encomendada aos ENVC pela
Empresa Pública PDVSA, a construção de dois navios asfalteiros, cujo contrato ascende a 130 milhões de
euros.
Foi efetuada aos ENVC um pagamento inicial de 10% do valor do contrato, no montante de 12,8 milhões
de euros, sendo que este valor não foi utilizado para a execução do contrato mas para outras necessidades da
empresa, o que não se considera razoável.
Porém, sem que tenham sido dadas explicações plausíveis para esse facto, a encomenda não foi
executada, de modo a que a empresa pudesse honrar os seus compromissos contratuais.
Extinta a empresa sem que a construção tenha sido efetuada, o Estado português fica numa situação
contratual delicada e inteiramente nas mãos da boa vontade das autoridades venezuelanas.
De facto, não existe qualquer garantia de que a empresa concessionária das instalações dos ENVC
(Martifer) esteja em condições, ou esteja na disposição de construir os navios asfalteiros.
Consequentemente, o Estado português pode ser responsabilizado pelo incumprimento contratual dos
navios asfalteiros, com as consequências daí decorrentes para o erário público.
Na audição efetuada ao Eng.º Jorge Camões, foi informado que o contrato dos asfalteiros seria
assumido por uma empresa a criar no âmbito do Grupo Empordef. Sucede que, entretanto, em reunião da
Comissão de Defesa Nacional em 25 junho de 2014, o Ministro da Defesa Nacional anunciou a decisão do
Governo de extinguir o Grupo Empordef.
Sobre o Programa de Contrapartidas não ficou claro quais os reais motivos da sua não concretização,
devendo a questão ser remetida para a Comissão Parlamentar de Inquérito já constituída quanto aos
Programas Relativos à aquisição de Equipamentos Militares.
O plano [de reestruturação da empresa] que previa um investimento de cerca de 70 milhões de euros
para repor o equilíbrio financeiro dos ENVC, além de alterações ao modelo de gestão da empresa e redução
do número de trabalhadores, nunca foi apresentado à Comissão Europeia.
Concluiu-se também que este plano de reestruturação previa o despedimento de 420 trabalhadores.
Em junho de 2011, a Empordef e os ENVC não tinham presidentes e os ENVC, embora com u m
passivo com mais de 250 milhões de euros detinham uma carteira de encomendas superiores a 600 milhões
de euros, incluindo as encomendas da Marinha de Guerra Portuguesa, os asfalteiros para a Venezuela e as
contrapartidas dos submarinos.
Vários Governos, entre 2006 e 2012, adiantaram, sob a forma de suprimentos, empréstimos, ou outras
formas verbas que, no entendimento da Comissão Europeia, totalizavam 180 milhões de euros.
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II SÉRIE-B — NÚMERO 58
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Por iniciativa do Governo português e no quadro de um processo de privatização foi suscitada junto da
Comissão Europeia a questão de saber se essas transferências financeiras para a empresa podiam ou não ser
consideradas ajudas de Estado.
Vários Governos assumiram o entendimento que os financiamentos aos ENVC não configuram ajudas
de Estado.
Conforme referido por vários depoentes, o processo de averiguações realizado pela Comissão Europeia
relativo a ajudas de estado à indústria da construção naval é um procedimento comum.
Até 3 de abril de 2013 houve 7 procedimentos abertos pela União Europeia para situações similares de
construção naval em diversos Estados-membros tendo-se confirmado que há processos de ajuda de Estado
que foram concluídos sem consequências gravosas para os Estados-membros.
No caso dos ENVC não há, até hoje, qualquer decisão da DGCOM relativos aos 181 milhões de euros
tidos como ajudas de Estado, sendo que o Estado Português podia ter justificado a ajudas de Estado com a
construção dos navios para a marinha.
Desde que o XIX Governo tomou posse que foi assumida a intenção de liquidar os ENVC, tal como é
comprovado pelas afirmações do Dr. Vicente Ferreira, “ou encontrávamos alguém que estivesse disponível
para investir e desenvolver a atividade económica de construção e reparação naval, fosse na privatização,
fosse na subconcessão, ou, com o encargo do contribuinte, não era possível manter aquela situação. Era a
nossa perspetiva.”
O Governo para prosseguir o objetivo de liquidar os Estaleiros de Viana do Castelo e, uma vez
fracassado o processo de reprivatização, optou pela ”Subconcessão da Utilização Privativa do Domínio
Público e das Áreas Afetas à Concessão Dominial atribuída à Sociedade Estaleiros Navais de Viana do
Castelo, SA».
O XIX Governo usou sempre a posição da Comissão Europeia, que, sublinhe-se, ainda não está
tomada, como pretexto e justificação para as suas opções políticas e ideológicas.
O júri do concurso do processo de subconcessão teve dúvidas quanto ao facto de o concurso dever ser
ao abrigo do Código dos Contratos Públicos.
No entanto, o concurso de subconcessão decorreu ao abrigo do Código de Procedimento Administrativo
para facilitar todo o procedimento, segundo as afirmações do Presidente do Júri do concurso de
subconcessão.
Tal como foi afirmado pelo Ministro da Defesa Nacional, Dr. José Pedro Aguiar Branco, a opção de
subconcessionar os ENVC assenta em opções políticas e ideológicas.
O valor da subconcessão pago pela West Sea é manifestamente exíguo tendo em conta quaisquer
valores de mercado que se possam considerar. De facto uma renda mensal de 37500€ pela utilização dos
terrenos, edifícios, infraestruturas e alguns equipamentos afetos é contra qualquer lógica de mercado.
Segundo vários depoimentos, a entrega dos Estaleiros Navais de Viana do Castelo à Empresa Martifer
não dá garantias que a atividade de construção naval seja preservada.
O processo de subconcessão dos ENVC abre a porta a outras atividades industriais que não as da
construção e da reparação naval.
A subconcessionária a quem foi concessionado os ENVC possui conhecimentos insuficientes na área
da construção naval e não garante os mesmos níveis de contratação dos ENVC, reconhecidas pelo último
Presidente do Conselho de Administração dos ENVC. Acresce que tem uma situação financeira que não é
melhor que a dos ENVC, com um passivo superior a 300 milhões de euros.
O encerramento dos Estaleiros Navais de Viana do Castelo constitui uma perda para a região, para a
economia da região e do país, sendo um golpe muito duro para os trabalhadores, para as suas famílias e para
o tecido social de Viana do Castelo.
Para além das perdas para a região e para a construção naval, há perdas no que diz respeito ao
equipamento militar do Estado português na vertente de navios necessários ao serviço de busca e salvação e
ao serviço de fiscalização.
A decisão de extinguir a empresa ENVC e concessionar os respetivos terrenos não era uma
inevitabilidade que decorresse da inviabilidade da indústria naval mas uma opção política do atual Governo.
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A difícil situação económica e financeira que serviu de pretexto para a sua extinção, é inseparável das
opções de sucessivos governos e das ações e omissões de sucessivas administrações por eles nomeadas,
cujas responsabilidades não podem ser ilibadas.
5. Finalmente, os Deputados da PCP na Comissão Parlamentar de Inquérito aos ENVC salientam a pesada
responsabilidade dos Governos e das sucessivas administrações dos ENVC por eles nomeadas, no processo
que conduziu ao desmantelamento da empresa, e salientam, por ter resultado claramente dos trabalhos, o
peso que a decisão de cancelamento das encomendas para a Marinha, o arrastamento sem execução dos
navios asfalteiros para a Venezuela e o inacreditável processo dos navios Atlântida e Anticiclone tiveram como
motivos justificadores da decisão final de encerramento que o Governo entendeu levar por diante.
Em todo este processo, com graves consequências para a economia nacional, para a região de Viana do
Castelo, para a indústria naval e para o necessário esforço de modernazação da Marinha Portuguesa, existem
pesadas responsabilidades repartidas por Governos envolvendo o PS, o PSD e o CDS, que não podem ser
escamoteadas e que resultam evidentes dos trabalhos da Comissão, embora não sejam refletidas nas
conclusões propostas unilateralmente pela maioria e das quais os Deputados do Grupo Parlamentar do PCP
se demarcam claramente em aspetos essenciais, tendo votado contra a sua adoção na globalidade.
Assembleia da República, 10 de julho de 2014.
Os Deputados do PCP, António Filipe — Carla Cruz.
A DIVISÃO DE REDAÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL.