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Quarta-feira, 14 de Novembro de 2001 II Série-C - GOP-OE - Número 2

VIII LEGISLATURA 3.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2001-2002)

COMISSÃO DE ECONOMIA, FINANÇAS E PLANO

Reunião de 13 de Novembro de 2001

S U M Á R I O


A Sr.ª Presidente (Manuela Ferreira Leite) abriu a reunião às 10 horas e 30 minutos.
Em continuação do debate, na especialidade, das propostas de lei n.os 104/VIII - Grandes Opções do Plano para 2002 e 105/VIII - Orçamento do Estado para 2002, usaram da palavra, sobre o orçamento do Ministério do Planeamento, além da Sr.ª Ministra (Elisa Ferreira) e do Sr. Secretário do Planeamento (João Carvalho Mendes), os Srs. Deputados Machado Rodrigues (PSD), Afonso Candal (PS), Agostinho Lopes (PCP), António Pires de Lima (CDS-PP) e António Nazaré Pereira (PSD).
Sobre o orçamento do Ministério da Saúde, usaram da palavra, a diverso título, além do Sr. Ministro (Correia de Campos) e dos Srs. Secretários de Estado da Saúde (Francisco Ramos), do Orçamento (Rui Coimbra) e Adjunta do Ministro da Saúde (Carmen Pignatelli), os Srs. Deputados Patinha Antão (PSD), Vítor Baptista (PS), António Pires de Lima (CDS-PP), Francisco Louçã (BE), Bernardino Soares (PCP), Vieira de Castro (PSD), Paulo Pisco (PS), Lino de Carvalho (PCP), Carlos Martins (PSD), Luísa Portugal (PS), Natália Filipe (PCP), Manuel Moreira (PSD), José Miguel Boquinhas (PS) e Agostinho Lopes (PCP).
A Sr.ª Presidente encerrou a reunião eram 19 horas e 30 minutos.

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A Sr.ª Presidente (Manuela Ferreira Leite): - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a reunião.

Eram 10 horas e 30 minutos.

Começo por cumprimentar a Sr.ª Ministra do Planeamento e o Sr. Secretário de Estado aqui presentes, agradecendo, desde já, a vossa presença.
Srs. Deputados, tal como tem sucedido nas outras reuniões, gostaria que tivessem presente que estamos no debate, na especialidade, do Orçamento do Estado para 2002, pelo que agradeço que as questões colocadas sejam de natureza orçamental. É claro que também estamos com as Grandes Opções do Plano Nacional, pelo que poderão existir outro tipo de questões a ser colocadas à Sr.ª Ministra.
Em face disto, começo por dar a palavra aos Srs. Deputados que se queiram inscrever.

Pausa.

Tem a palavra o Sr. Deputado Machado Rodrigues.

O Sr. Machado Rodrigues (PSD): - Sr.ª Presidente, Sr.ª Ministra do Planeamento, Sr. Secretário de Estado, tenho algumas questões para colocar, e irei começar precisamente pelas Grandes Opções do Plano.
A questão que quero focar, em primeiro lugar, tem a ver com a visão espacializada de base territorial.
Para tal, irei socorrer-me da informação que consta da página C128, segundo a qual é reconhecida a dificuldade de coordenação resultante da existência de mais de três dezenas de modelos de organização territorial, tal como está referido no capítulo do processo de desconcentração administrativa.
Depois, no mesmo documento, é ainda reconhecido que a fixação de uma base territorial comum para a desconcentração constitui um dos requisitos fundamentais para a modernização e eficácia da Administração do Estado; matéria que a todos preocupa, uma vez que tem grande influência em vários domínios, nomeadamente no que diz respeito à consecução de uma adequada produtividade nacional, embora não seja o factor único.
Mas a questão que quero colocar-lhe, Sr.ª Ministra, centra-se numa outra afirmação que depois é feita, neste mesmo capítulo, que diz que a desconcentração territorial da Administração adopta como bases territoriais as NUT II e os distritos, devendo ser perspectivada a convergência gradual entre as NUT II e os distritos, que, tendo em conta as restrições impostas pelo QCA III, não terá lugar antes de 2006.
Para facilitar esta visão espacialiazada, era bom que esta convergência, ainda que não em termos formais e salvaguardando a utilização do QCA III, fosse sendo feita. Isto porque, confesso, tenho grande dificuldade em avaliar as posições que são tomadas quando os indicadores se referem a realidades como as NUT II, nomeadamente no que diz respeito às NUT Norte e Centro.
Nas NUT Norte e Centro, no seu conjunto, os índices de desenvolvimento são extremamente díspares. Nalguns casos são integradas por NUT III que têm situações cujo índice de riqueza ou de poder de compra é de 60%; algumas NUT perdem 7% da população, em 10 anos, e outras ganham 12% da população; por vezes, a estruturação, como é o caso, por exemplo, do peso da actividade agrícola, e a evolução desse mesmo peso é extremamente díspar, sendo muito elucidativo, neste caso, o quadro que consta da página C34 do referido documento, que mostra, por exemplo, que as zonas em que o peso agrícola é maior, são aquelas em que a população sai da actividade agrícola em menor número.
Por tudo isto, estamos perante um leque de situações que parecem requerer um conjunto de actuações e medidas que não são compagináveis com medidas de carácter global.
Parece-me que relativamente a esta matéria deverá haver alguma preocupação, pelo que gostaria de ter indicação a respeito do assunto que vou mencionar, e que está contemplado numa carta que o Sr. Michel Barnier - Comissário responsável da política regional e da reforma das instituições - dirigiu aos Deputados, na qual são mencionados aquilo que seriam os índices de desenvolvimento das várias regiões da Europa após o alargamento.
Através dos índices apresentados neste documento verifico que em Portugal nenhuma região estaria abaixo da média dos 75%, enquanto que, na vizinha Espanha, a Galiza, a Estremadura e a Andaluzia estariam abaixo dessa média.
Portanto, algum processo terá de haver para se equacionar esta transição, não perdendo de vista (e estou consciente disso) que os futuros fundos que venham a existir não podem ser independentes das populações a que se dirigem, designadamente quanto ao seu número.
Deixo-lhe esta questão, Sr.ª Ministra, uma vez que, nesta carta que acabo de mencionar, os parlamentos são convidados a participar na discussão desta matéria. Julgo que se trata de uma matéria em que deve procurar atingir-se uma visão coordenada e consensual, porque se trata de um assunto que interessa a todos, uma vez que a consecução do objectivo de que continue a haver acesso suficiente aos Fundos Estruturais é, com certeza, um interesse comum.
Posto isto, gostaria de colocar mais algumas questões em sede de PIDDAC.
Em primeiro lugar, quero referir que verifico que o Ministério do Planeamento (entre os vários Ministérios) é dos poucos em que a programação financeira do PIDDAC para 2003 é muito inferior à programação financeira do PIDDAC para 2002, sendo que essa diminuição se apoia, principalmente, no sector Apoio e Desenvolvimento Regional - pelo menos, é este sector que apresenta a maior diminuição de verbas. E, mesmo tendo em conta que deste sector constam alguns projectos com bastante peso, como é o caso do evento cultural "Porto - Capital Europeia da Cultura 2001" (que em 2003 já não existe), a diminuição continua a ser grande.
Como a Sr.ª Ministra sabe, a área de Apoio e Desenvolvimento Regional é uma matéria que me preocupa por razões da minha ligação a uma área pouco desenvolvida, pelo que gostaria que fosse feito um comentário sobre esta matéria.
Ao mesmo tempo, quero mencionar que me parece limitado que, na situação actual, as chamadas intervenções especiais de desenvolvimento territorial se limitem ao Empreendimento de Fins Múltiplos do Alqueva.
Ora, uma vez que o Alqueva está para fechar as portas - julgo que em Janeiro -, estando, portanto, muito próxima a sua concretização total, a minha questão, Sr. Ministra, é a de saber se não será altura de lançar uma outra

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intervenção noutra zona igualmente carenciada que possa dar continuidade a esta política de intervenções de elementos territoriais localizados.
Gostaria de fazer um parêntesis, embora admita que esta não seja a melhor sede para o fazer, mas como ontem não tive ocasião de colocar a questão quando da reunião com o Sr. Ministro das Finanças, iria formulá-la agora.
Na minha opinião, os incentivos fiscais à interioridade são uma medida claramente positiva. Devo dizer, aliás, que há dois aspectos com os quais estou de acordo, ou sejam o regime simplificado e estes incentivos que cumulam com o regime simplificado. Mas, voltando à questão que quero colocar, a pergunta que gostaria de colocar-lhe é a seguinte: agora que o assunto está regulamentado, por que não aplicar o regime deste incentivo já ao IRC de 2001?
Lembro que estamos a falar do Orçamento do Estado para 2002 e que as receitas do Orçamento para 2002, em termos do IRC, são as relativas ao exercício de 2001. Deste modo, por que não aplicar neste exercício de 2001, esta bonificação, quando há decisões que implicam retroactividade noutras matérias?
Finalmente, Sr.ª Ministra, não posso deixar passar esta ocasião sem focar uma questão que a Sr.ª Ministra abordou na resposta que me deu na reunião Plenária quando a questionei sobre o PIDDAC. Nessa altura, V. Ex.ª disse que eu já não lhe colocava questões relativas às acessibilidades, porque no distrito de Bragança elas já existiam todas.
Neste sentido, quero chamar a sua atenção para os Mapas que constam das Grandes Opções do Plano Nacional, que mostram as redes de auto-estradas e redes de IP e de IC nos anos de 1995, 2000 e 2002. Ora, no que diz respeito ao distrito de Bragança, comparando os anos de 1995, 2000 e 2003 (portanto, oito anos), a execução a nível de acessibilidades é de 34 km de IP, ou seja, uma média de 4 km/ano, o que significa que se o IP4 tivesse sido feito a este ritmo, teria demorado 50 anos…!
Esta situação revela, pois, a manutenção de todas as inacessibilidades e dificuldades que vieram do passado!
Posso dizer-lhe, aliás, que esta situação é confirmada pelos elementos constantes de um livro que a Sr.ª Ministra fez publicar relativamente ao investimento público em infra-estruturas de transportes. De acordo com esta publicação, e no diz respeito a infra-estruturas rodoviárias, se compararmos os anos de 1996, 1997 e 1998 (de Governo do PS) com os anos de 1993 a 1995, verificamos que, a preços constantes em infra-estruturas rodoviárias, o investimento feito no País aumentou 24,2%, sendo que o da região Norte aumentou 22% e o do distrito de Bragança, 0%. Ora isto mostra, de facto, o que tem sido a política de desenvolvimento do interior feita pelo Governo do Partido Socialista!
Sendo assim, Sr.ª Ministra, pergunto-lhe se, perante estas duas constatações, estará a Sr.ª Ministra disponível para aceitar ou promover uma alteração do PIDDAC. E digo promover porque, pela minha parte, as propostas que tenho feito em anos anteriores, aliás como todos os outros grupos parlamentares da oposição, são sistematicamente chumbadas pelo Partido Socialista, de maneira que cumpriremos a nossa obrigação, mas já sei qual é o resultado, porque nunca passa nada do que propomos.

O Sr. Fernando Serrasqueiro (PS): - Vote o Orçamento!

O Orador: - De facto, não entendo esta posição de "vote o Orçamento". É surpreendente! Mas não é disso que estamos a falar!
A minha pergunta, Sr.ª Ministra, é se V. Ex.ª está disponível para introduzir uma correcção de ajustamento, que me parece completamente justa e necessária, decorrente destas observações que fiz.
A última pergunta, Sr.ª Ministra, é muito localizada e diz respeito ao INTERREG. Havendo notícia de já ter sido nomeado um gestor para o INTERREG, pergunto-lhe se ele foi ou não aprovado.

A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Afonso Candal.

O Sr. Afonso Candal (PS): - Sr.ª Presidente, Sr.ª Ministra do Planeamento, Sr. Secretário de Estado, antes de mais, quero deixar aqui um apontamento, que é o seguinte: o Partido Socialista, ao longo destes anos, sempre, em sede de especialidade, viabilizou propostas dos diversos partidos da oposição, e, portanto, aquilo que, há pouco, foi dito não corresponde à verdade. Isso tem mais a ver com os tempos da maioria absoluta do PSD,…

Vozes do PS: - Bem lembrado!

Vozes do PSD: - Não é verdade!

O Orador: - … que, pura e simplesmente, votava contra o pacote de propostas de alteração, sem qualquer análise relativamente ao seu conteúdo.
Portanto, esse não deve ser um temor do Sr. Deputado, desde que a sua proposta seja devidamente fundamentada e, de facto, se revista de importante relevância. E, nessa altura, já agora, penso que o Sr. Deputado também poderá ponderar a possibilidade de viabilizar o Orçamento do Estado em votação final global.
Mas, passando às questões em concreto, direi, Sr.ª Ministra, que circulou levemente uma notícia sobre a possibilidade de adiamento dos pagamentos do III QCA, tendo em conta problemas do orçamento comunitário. Em relação a isto, gostava de saber se há alguma novidade ou se, por outro lado, não tem qualquer fundamento essa indicação que surgiu na comunicação social.
Um segunda questão tem a ver com matéria de interioridade, que, ainda há pouco, foi aqui colocada, e relaciona-se com a questão das infra-estruturas rodoviárias. Como se sabe, este ano, em sede de PIDDAC, não se têm a totalidade da dimensão daquilo que são as obras em fase de avanço, nomeadamente por causa das diversas concessões que não têm uma expressão concreta em PIDDAC e que também são fundamentais para o desenvolvimento do País, situando-se muitas delas em zonas fora da faixa litoral.
Por isso, pergunto também à Sr.ª Ministra, relativamente à questão da inversão do fenómeno geral, global e prolongado de desertificação do interior, em que medida e com que prazo é que se pode esperar que algumas medidas que já foram tomadas, nomeadamente a de a rede de gás natural ser estendida também ao interior (contrariamente àquilo que inicialmente era previsto pelos mais recentes defensores da questão da interioridade e que, nessa altura, pouco para ela olharam) e a de aumento da rede rodoviária participem com força numa inversão desse fenómeno, porque, normalmente, a inversão destes fenómenos não é

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instantânea. Portanto, gostaria de saber se existe alguma estimativa sobre os efeitos positivos de uma série de medidas do passado recente e também já previstas para o presente e para o futuro.
Ainda em relação à questão da interioridade, gostava de saber como é que a Sr.ª Ministra enquadra este problema, que é um problema de desenvolvimento desequilibrado do País, que, por sua vez, tem também os efeitos-sombra ao nível da faixa litoral, à luz de duas novas centralidades. Uma, pelo menos, é, efectivamente, uma centralidade, porque tem a ver com uma lógica que presentemente começa a surgir, que é uma lógica de mercado ibérico, e que, manifestamente, favorece as zonas do interior de Portugal, porque as torna muito mais próximas do centro desta nova dimensão além fronteiras; outra, é a questão das novas tecnologias, porque, não criando qualquer centralidade, passa a haver uma realidade sem espaço, e, portanto, todos estão em pé de igualdade.
Gostava, portanto, de saber até que ponto é que estas duas novas realidades - o mercado ibérico e as novas tecnologias - podem também dar um impulso decisivo para que o desenvolvimento do País se reequilibre.
Finalmente, neste Orçamento do Estado e nas Grandes Opções do Plano é evidente que há uma nova aposta ao nível da ferrovia. Não havendo uma diminuição dos investimentos e do criar condições para o desenvolvimento de infra-estruturas rodoviárias, há, manifestamente, uma aposta deliberada na questão da ferrovia.
Pergunto à Sr.ª Ministra, quer em termos de despesa para o Orçamento do Estado e, portanto, para todos nós, quer, principalmente, em termos do benefício para as populações, como relativiza a questão da rodovia e da ferrovia e quais são as vantagens e as desvantagens de cada uma delas.

A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Agostinho Lopes.

O Sr. Agostinho Lopes (PCP): - Sr.ª Presidente, Sr.ª Ministra do Planeamento, tenho para colocar-lhe algumas questões novas e outras que vêm da discussão, já longa, das Grandes Opções do Plano e do Orçamento do Estado.
Uma primeira questão que gostaria de colocar-lhe, não tanto, certamente, com influência directa na abordagem do presente orçamento, mas mais com influência em relação ao futuro, tem a ver com problema da elaboração e, simultaneamente, da credibilidade do PIDDAC regionalizado, distrital, que nos é distribuído.
Penso que este documento é de grande importância na abordagem com os eleitores de cada distrito, na celebrada ligação do Deputado aos seus eleitores, mas devo dizer-lhe, com a minha experiência de alguns anos nesta matéria - não muita -, que sinto uma clara dificuldade na abordagem destes documentos e no seu tratamento em concreto.
Em primeiro lugar, penso que há uma questão que precisaria, certamente, de ser esclarecida, que é a do problema da distribuição das verbas de programas nacionais por distritos. Nos últimos anos, e de uma forma crescente, deparámos, numa rubrica dos chamados vários concelhos de cada distrito, com uma distribuição de verbas, sobretudo ligadas ao Quadro Comunitário de Apoio, em particular dos Ministérios da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas, da Economia, do Equipamento Social e do Ambiente, umas vezes demasiado concentradas e outras multiplicadas ao infinito, como acontece no presente ano.
Mas, do meu ponto de vista, o mais grave é que algumas destas verbas acabam por distorcer completamente, inclusive, a comparabilidade que se vai fazendo em torno do chamado PIDDAC distrital. Dou-lhe o exemplo, que, aliás, a Sr.ª Ministra referiu na sua intervenção no Plenário, da subida do distrito de Braga a 4.º lugar do ranking dos distritos com direito a um PIDDAC elevado.
Ora, o PIDDAC do distrito de Braga sobe, se não me enganei nos números na passagem de euros para escudos - e o PIDDAC deste distrito é um exemplo, mas eu, certamente, poderia mostrar-lhe outros - e pelos cálculos que fiz, 14,7 milhões de contos. Esta subida é, no fundamental, sustentada numa subida de pouco mais de 7 milhões de contos nas chamadas verbas conjuntas dos vários concelhos e mais cerca de 7 milhões de contos na verba distribuída por outros concelhos.
O problema é este: é que, subindo globalmente 14,7 milhões de contos, há uma rubrica aqui que, depois, distorce completamente a avaliação relativa do valor do PIDDAC. Qual é? É a subida da verba do Plano Operacional da Economia. O Plano Operacional da Economia, só por si, sobe 16,5 milhões de contos e isto distorce a avaliação que pode fazer-se relativamente a este PIDDAC, porque é evidente que, mesmo que haja descidas substanciais relativamente a investimentos fundamentais do distrito, tudo isso é coberto pela subida de uma verba, sobre a qual, aliás, o Estado tem um controlo muito relativo e que está dependente de iniciativas privadas, com tudo o que isso significa.
Aliás, eu gostaria de saber, porque é um número que nunca conhecemos, qual é o grau de execução anual do plano operacional que vem colocado no PIDDAC regionalizado.
Depois, aparecem verbas muito mais reduzidas, como, por exemplo, as verbas ligadas às pescas… Penso que a Sr.ª Ministra, que esteve ali a trabalhar, conhece o peso, apesar de tudo muito reduzido, das pescas no distrito de Braga. No entanto, se aparece uma rubrica Plano Operacional da Economia com 27,6 milhões, aparecem depois 18 projectos para as pescas com projectos tão esquisitos como este: projectos ligados ao abate ou à sustentação social derivada dos problemas com a pesca de Marrocos. Mas, que eu saiba, em Esposende e na Apúlia, não há pescadores em Marrocos! Nem barcos em Marrocos!
Portanto, isto é, de facto, uma baralhada que torna completamente não transparente, pouco clara, digamos assim, esta distribuição.
Uma das questões que quero colocar-lhe é esta: com que critérios são distribuídas estas verbas? Isto é, se alguém que semeia tem um valor global de não sei quanto e, depois, distrito a distrito, vai dando os valores até se atingirem os valores necessários para que o valor global do distrito suba.
A leitura dos projectos para o sector das pescas no distrito de Braga, do meu ponto de vista, sendo apenas cerca de 500 000 contos, descredibiliza completamente a distribuição de verbas que é feita neste PIDDAC.
Uma outra questão tem a ver com o nível de execução dos projectos. Anteriormente, e penso que durante alguns anos, o PIDDAC trazia habitualmente os níveis de execução

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de projectos que se prolongam de uma forma plurianual, o que deixou de acontecer de há dois anos a esta parte.
Não consigo entender, porque outro dos problemas de leitura difícil é saber perante o que é que estamos, se estamos perante obras novas, etc… Por exemplo, no que se refere ao distrito de Braga, no fundamental - e estou a referir-lhe este exemplo, porque foi sobre que mais me debrucei -, nunca sei se estou perante uma obra nova, se perante o pagamento de uma obra, e, em grande parte, do que estamos a tratar é de pagamento de obras já executadas.
Uma outra questão tem ainda a ver com o problema do aparecimento de projectos que têm um prazo de execução de um ano, e são variadíssimos os projectos que vão ser executados durante o ano de 2002, e alguns deles ainda bem, pelas respostas que trazem à população do distrito, mas, depois, aparecem distribuídos no PIDDAC durante três anos, indo, portanto, até ao PIDDAC de 2003. Gostava de perceber por que razão é que é feita esta distribuição. Fica a pagar-se aos bochechos este tipo de obras?
Um outra questão, Sr.ª Ministra - e, desde já, lhe digo que também a iremos colocar ao Sr. Ministro da Saúde -, que também gostaríamos de colocar-lhe, dada a pasta que tutela, tem a ver com o problema da prospectiva e planificação dos recursos humanos no sector da saúde.
Nós temos a ideia (penso que é consensual - aliás, esta Assembleia aprovou uma resolução nesse sentido) de que um dos problemas maiores do País é o deficit de técnicos de saúde - médicos, enfermeiros e outros técnicos diversos - sendo a carência de médicos de família algo que começa a assustar o País todos e, em particular, naturalmente, as regiões do interior, apesar de todo o recurso a médicos espanhóis.
Ora, o problema que coloco é o seguinte: como é que uma questão desta dimensão não tem qualquer avaliação prospectiva, planificada, nas GOP nem tem qualquer tradução, depois, ao nível do Orçamento do Estado? Isto é, de que técnicos é que o País vai precisar, a curto e a médio prazo, e que solução é que o Governo está a preparar para responder? E falo dos médicos de família, porque há uma geração que está a caminhar para a reforma, que vai agudizar em breve, dramaticamente, uma situação já hoje dramática. Claramente, não vejo que este problema esteja a ser abordado com os cuidados devidos e até face a uma resolução aprovada nesta Assembleia.
Uma terceira questão, Sr.ª Ministra, refere-se ao problema das áreas territoriais de planeamento. Sei que a situação de chumbo da regionalização trouxe dificuldades inquestionáveis à abordagem deste problema, mas penso que a situação actual também não é boa. É tal a "baralhada" de áreas de abordagem deste problema, de organização, de coordenação e de planificação dos investimentos, em particular do III QCA, que, a certa altura, já ninguém sabe exactamente quais são as áreas e quais são os investimentos correspondentes.
Para começar, penso que a existência, por exemplo, das áreas-plano na abordagem dos problemas do desenvolvimento regional - é uma questão que já lhe coloquei no debate na generalidade - dificulta e escurece, não se conseguindo ver a grande diferença que existe entre o interior e o litoral deste país.
E penso que a "baralhada" é tão grande que, depois da criação das chamadas AIBT (Acções Integradas de Base Territorial), fiz uma pergunta à Sr.ª Ministra, em determinada altura, ainda em 2000, sobre a razão da exclusão de regiões que, do meu ponto de vista, deveriam ter este tipo de abordagem e a Sr.ª Ministra respondeu-me desvalorizando a criação destas áreas; mas, entretanto, já neste Orçamento do Estado, criou uma nova figura, os chamados pactos de desenvolvimento, que acaba por dizer que substitui as AIBT, que é a mesma coisa e que, do meu ponto de vista, estão ligados, de facto, a esta dificuldade de começar por ver com clareza áreas e comandos políticos e administrativos para essas áreas no sentido do acompanhamento dos investimentos.
Uma quarta questão, Sr.ª Ministra, muito simples: eu gostava de ter uma ideia, e ao longo do orçamento isso vem discriminado, de qual o conjunto das verbas que, anualmente, são absorvidas pela administração pública, pela estrutura do Estado, na chamada assistência técnica e gestão do III QCA. Que valor global dos fundos comunitários do III QCA é absorvido pelo Estado nesta sua função?
Uma quinta questão, que é apenas um problema de interpretação: custa-me um pouco a ler aquilo que li na abordagem das GOP em torno das Áreas Metropolitanas de Lisboa e do Porto. Em determinada altura, fala-se em amenidades para a fixação de recursos humanos superiores e qualificados e gestores de topo. Ora, eu gostaria de saber se estou a ler bem, isto é, se a ideia de que, na Área Metropolitana do Porto e na de Lisboa, devem ser criadas amenidades para a fixação deste tipo de quadros. Eu percebo que os quadros se fixem onde seja mais ameno, mas tenho dificuldades em aceitar que um documento governamental aborde este problema desta forma.
Finalmente, Sr.ª Ministra, ainda o problema do alargamento e da manutenção dos fundos comunitários. Já referi que considero extremamente grave que o Governo venha agora dizer, nas GOP, que vai propor aos órgãos da União Europeia a realização de um estudo para ver as consequências do alargamento sobre a economia portuguesa.
De facto, do meu ponto de vista, é altamente criticável que o Governo esteja a acordar tão tarde, quando já há um conjunto de estudos realizados, muito significativos, que mostram a gravidade e Portugal prepara-se para ser o país mais prejudicado com todo este processo.
Mas, para lá dessa questão, coloco a seguinte: vai manter-se o Governo impassível, concretamente com este tipo de áreas de planificação para os investimentos comunitários, não tentando, de qualquer das formas, anular aquilo que é dito, e bem, que vão ser as consequências da subida média da riqueza estatística de algumas regiões?

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A Sr.ª Presidente: - Srs. Deputados, a Sr.ª Ministra precisa de se ausentar por uns momentos. No entanto, se não houver objecções, eu continuaria a dar a palavra aos Srs. Deputados, o Sr. Secretário de Estado tomará nota das questões colocadas e, entretanto, a Sr.ª Ministra regressará.
Tem a palavra o Sr. Deputado António Pires de Lima.

O Sr. António Pires de Lima (CDS-PP): - Sr.ª Presidente, Sr. Secretário de Estado, quero colocar uma questão de âmbito mais geral - penso que, apesar de tudo, ainda tem cabimento nesta discussão na especialidade - que tem a ver ainda com o cenário macroeconómico, que está a ser considerado para a execução deste orçamento, e depois dois ou três pedidos de esclarecimento muito técnicos relativamente à distribuição dos investimentos, concretamente do PIDDAC, por diferentes regiões.
Relativamente à questão geral, das premissas macroeconómicas, gostaria - agora que passou quase um mês desde que começámos a discutir este orçamento, concretamente, desde que este orçamento, como documento, foi apresentado - de saber a opinião do vosso Ministério relativamente à bondade das premissas que continuam a figurar neste orçamento, do ponto de vista macroeconómico, nomeadamente em relação àquilo que é o crescimento projectado para a economia no próximo ano.
Esta é uma questão absolutamente fundamental, porque, a partir desta questão, se este crescimento estiver empolado, aquilo que vai verificar-se é a descredibilização completa deste orçamento, com uma sobreavaliação das receitas e, depois, com a existência permanente (como, aliás, já se verificou este ano) de orçamentos rectificativos para corrigir o erro inicial do Governo.
Este orçamento foi entregue nesta Assembleia no princípio de Outubro, pouco tempo depois daquela catástrofe que se verificou em Setembro; entretanto, já depois da entrega deste orçamento, houve um conjunto de relatórios, do ponto de vista internacional, que claramente dão a entender que a economia mundial, no próximo ano, vai crescer muito menos do que aquilo que foi o cenário apresentado pelo Governo - estou a referir-me a relatórios do FMI, do Banco Mundial que, por exemplo, projecta que o crescimento, tanto da zona europeia, como da zona americana, como do Japão, seja ou negativo ou, nos casos em que é positivo, cerca de metade daquele que estava implícito nas vossas previsões; e eu vi, da parte do Ministro Oliveira Martins, uma certa atitude de rever as premissas macroeconómicas em função das circunstâncias, isto é, em função dos novos dados que fossem sendo postos ao dispor do mercado, concretamente dos agentes económicos.
Ora bem, parece-me que há evidência clara, neste momento, de que os Estados Unidos da América, o Japão e a Alemanha - as três maiores economias mundiais - estão já praticamente em fase recessiva. Isto é, hoje já ninguém tem dúvidas de que (há dois meses, talvez ainda fosse possível alimentar algumas dúvidas mas, neste momento, sabe-se de fonte segura) estas três potências económicas, Estados Unidos da América, Japão e Alemanha, estão já praticamente em recessão.
É evidente que os senhores jogam aqui com os dados do segundo trimestre mas há indicadores claros, do ponto de vista da confiança económica, ao nível europeu e ao nível de Portugal, que apontam, claramente, para um abrandamento muito forte tanto das exportações como do consumo privado, que são as alavancas do crescimento do mercado nacional.
Perante todas estas incertezas e um conjunto de elementos que adensam, no fundo, um mau clima económico, o que eu gostaria de saber é o seguinte: que sentido faz, por parte deste Governo, continuar a insistir num conjunto de objectivos de crescimento, que influenciam depois toda a composição do orçamento e que vão levar, necessariamente, a que este orçamento tenha de ser rectificado muito rapidamente?
Pergunto-lhe, Sr. Secretário de Estado e Sr.ª Ministra, se não faria muito mais sentido fazer, ao nível da economia nacional, ao nível do Governo, aquilo que as empresas estão a fazer. Isto é, postas perante uma incerteza muito grande, as empresas preferem não dar como certo grandes crescimentos, preferem concentrar as suas baterias na contenção de custos, aprovando e fazendo executar um conjunto de medidas que lhes permitam controlar aquilo que elas podem controlar directamente, e jogando em taxas de crescimento muito mais moderadas.
No fundo, se houver alguma surpresa, que seja pela positiva e não pela negativa, pois essa surpresa, se vier pela negativa, vai mais uma vez contribuir para a descredibilização do Governo e para nós, pois, apesar de sermos oposição, é sempre mau ver um governo ser tão descredibilizado, porque isso afecta a credibilidade do próprio País, da própria Nação.
Então, a questão que eu queria voltar a pôr é a seguinte: não seria preferível, face às circunstâncias, face a todos os dados que, entretanto, lhe chegaram, refazer o cenário de crescimento económico por forma a termos uma gestão orçamental muito mais sensata, muito mais cautelosa e que acautelasse a credibilidade do Estado perante as entidades externas? Esta é uma primeira questão.
A segunda questão tem a ver com a distribuição dos investimentos. Gostaria de ser esclarecido relativamente a duas ou três coisas: primeiro, foi referido, como grande feito por parte deste Governo, o facto de, neste momento, termos o III QCA praticamente em total execução.
Ora, aquilo que eu gostaria de saber é qual é o tempo que, neste momento, está a distar entre a assinatura formal dos programas e o pagamento das respectivas verbas às empresas ou às entidades que viram os seus programas aprovados. É que são questões completamente diferentes: uma coisa é dizer-se que, teoricamente, o III QCA está todo em execução - nós assistimos, inclusive, a algumas manobras, por parte do Sr. Primeiro-Ministro, assinando dezenas e até centenas de contratos perante empresários, em grandes acções mediáticas - mas depois as empresas não vêem esse dinheiro entrar na sua tesouraria. Isto é, fazem os projectos, eles começam em execução e nós temos conhecimento de algumas empresas que levam dois e três anos até disporem da verba, depois de os projectos estarem praticamente finalizados, porque foram "apanhadas" no processo de transição entre o QCA II e o QCA III.
Portanto, quero que me diga qual é o tempo médio de demora, neste momento, de recebimento do dinheiro por parte das empresas, depois de terem os contratos assinados.
Finalmente, gostaria de colocar mais duas questões relativamente aos PIDDAC, tendo a primeiro que ver com a orientação que está a ser dada por este Orçamento relativamente ao mundo rural.
Tive oportunidade de ler atentamente um trecho muito interessante que faz a apologia do ruralismo - uma coisa que eu já não lia praticamente desde os compêndios dos anos 50, altura em que eu ainda não era nascido, mas apesar de tudo o meu avô ainda me fez ler alguns - e que aponta para um conjunto de orientações muito gerais. Esse trecho, que está escrito no Orçamento do Estado, é tão genérico que precisa de ser esclarecido, por isso o que eu gostaria de saber em concreto é o seguinte: como é que o Governo, agora que resolveu ceder ou apostar no mundo rural, define exactamente aquilo que é mundo rural?
Por exemplo, Alcácer do Sal, que está a 30 Km do mar, e Óbidos, que tem uma lagoa e está a 10 Km do mar, são concelhos que têm um nível de vida 50% abaixo da média nacional, são considerados rurais? A Chamusca, Benavente e Vagos são mundo rural ou mundo urbano? Que tipo de prioridade é que esse tipo de conceitos tem neste Orçamento?

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Já agora, gostaria de saber qual é a evolução, em termos de investimento público, que o distrito de Viana do Castelo - com o qual, hoje em dia, praticamente se confunde o mundo rural - tem desde que os senhores são Governo. Isto é, gostaria de saber qual é a evolução do investimento público no distrito de Viana de Castelo desde que os senhores estão Governo (desde 1996/1997, ou pelo menos nos últimos dois ou três anos) face àquilo que está a verificar-se no ano 2001.
A última questão tem que ver com a distribuição de verbas, em termos do PIDDAC, no distrito de Santarém, pelo qual fui eleito.
O distrito de Santarém faz parte da região de Lisboa e Vale do Tejo, que é considerada a zona mais rica do País, inclusive com um nível de vida que, de acordo com as estatísticas, está praticamente acima da média europeia, mas é um distrito com enormes assimetrias.
No que respeita à Região de Lisboa e Vale do Tejo, praticamente só Lisboa e Setúbal têm índices de desenvolvimento adequados, todo o resto, portanto, tudo aquilo que é o Ribatejo e, concretamente, o distrito de Santarém, tem níveis de desenvolvimento que rondam 50% e 75% da média nacional.
De facto, no distrito de Santarém existem, por exemplo, os concelhos de Santarém, da Chamusca, de Coruche, de Ferreira do Zêzere, de Mação, de Sardoal, alguns deles são concelhos do interior, que têm estado praticamente votados ao abandono por parte do investimento público, nomeadamente Mação, Sardoal e Ferreira do Zêzere.
Assim, gostaria de saber como é que estas realidades tão assimétricas que existem no distrito de Santarém, concretamente estes concelhos, que, em termos do índice de desenvolvimento, estão mais distantes da média nacional, são protegidos, em termos da política de investimento público que está a ser seguida, nomeadamente face à destrinça que, neste momento, tem de ser feita entre regiões de Objectivo 1 e regiões de Objectivo 2, dado que Lisboa e Vale do Tejo é para todo o efeito considerada uma e só uma região em termos de apoio comunitário.
São estas as questões que queria colocar e fi-lo da forma mais sintética possível.

A Sr.ª Presidente: - Para responder às questões colocadas, tem a palavra a Sr.ª Ministra do Planeamento.

A Sr.ª Ministra do Planeamento (Elisa Ferreira): - Sr.ª Presidente, Srs. Deputados, tentarei responder às questões que foram colocadas com a máximo de precisão.
O Sr. Deputado Machado Rodrigues, falou de questões de desconcentração, da articulação entre NUT II e distritos e disse que teria alguma dificuldade em perceber o País por outra "chave" que não fosse a distrital.
Aquilo que me parece, no que diz respeito à análise que fez, isto é, à análise de processos de desenvolvimento, é que a "chave" distrital não é mais fácil, nem a mais preparada para isso, em termos de leitura.
Como deve perceber, quando nós repartimos o País em NUT II e depois, dentro destas, em NUT III, o critério que faz com que haja a definição das NUT III - e estão definidas desde a nossa adesão à União Europeia, inclusivamente por um governo que era apoiado pela sua bancada - é que elas são repartições regionais funcionais em que uma determinada área funciona, em termos de bacias de emprego, de circuitos de mercadoria, de acesso a bens de índole superior, etc., dentro de um determinado espaço geográfico; e é assim que estão definidas as NUT III.
De facto, não há dúvida, nomeadamente no que diz respeito à organização dos partidos políticos, que o distrito é o referencial básico, mas trata-se de um referencial de ordem política, que, aliás, também é coincidente com a tradição da organização administrativa do País, no que diz respeito à forças de soberania, segurança e à proximidade do cidadão.
Portanto, aqui há a coincidência entre duas lógicas distintas: primeiro, uma lógica de funcionamento da economia e das relações das pessoas e das mercadorias no terreno (isto está muito mais reflectido nas NUT III do que propriamente dos distritos); depois, uma lógica de funcionamento de funções ligadas à soberania, à organização do Estado nas suas funções mais típicas e mais nobres, e esta está estruturada em termos de distrito.
Penso que a convergência terá de fazer-se ao longo dos anos de modo a que não haja uma grande disparidade entre estas duas dinâmicas, mas não há dúvida de que, neste momento, em termos de Quadro Comunitário de Apoio e de organização do Estado para os fins de desenvolvimento, há uma centralização nas NUT II. Isto porque é nessa base que o País, em termos de desenvolvimento, tem sido trabalhado, preparado e organizado e também é a esse nível que se faz a gestão dos fundos comunitários. De facto, a NUT II é bastante mais importante nestas funções do que a NUT III.
Ao nível da NUT II há processos de desconcentração que estão associados a este quadro, para os quais me permitia chamar a vossa atenção, porque me parecem muito importantes.
Um desses processos de desconcentração resulta de haver, ao nível das NUT II, um espaço de consensualização das estratégias entre os vários ministérios (e, pela primeira vez, há verbas desconcentradas de todos os ministérios) através da existência, nomeadamente nas unidades de gestão e de acompanhamento do Eixo 3 dos programas regionais, de uma unidade de gestão em que o director, ou o representante desconcentrado de acessibilidades, dialoga com, por exemplo, o representante do Ministério da Saúde, do Ministério da Educação, com o presidente da Comissão de Coordenação Regional (CCR), que, de algum modo, faz a síntese e articula a dimensão camarária de acesso aos fundos comunitários, envolvendo também representantes das próprias autarquias.
Portanto, há um espaço completamente novo - e começa a ser extraordinariamente interessante - de articulação e consensualização de investimentos, de modo a dar maior coerência a este processo. E esta dimensão será reforçada no momento em que (e isso acontecerá a curto prazo) se criarem os chamados fóruns regionais, que estão previstos na lei, onde haverá algum acompanhamento externo relativamente à estratégia da região NUT II, à sua estratégia de desenvolvimento, aos principais investimentos que são necessários, e onde serão dados alguns pareceres, opiniões, sugestões, com uma leitura mais sistémica daquilo que são os investimentos associados ao PIDDAC.
Por conseguinte, ao nível da NUT II, penso que o processo é de consolidação adicional desta leitura mais estruturada do desenvolvimento regional; abaixo da NUT II, penso que há um trabalho que tem de fazer-se entre os espaços das associações de municípios, os espaços relativos aos distritos, e os espaços relativos às NUT III.

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No que diz respeito às NUT II é preciso fazer alguns acertos, nomeadamente, como sabe, no distrito de Lamego e em zonas de confluência de NUT, mas são casos muito pontuais e considero que pode caminhar-se razoavelmente no sentido de algum reacerto entre o conjunto de distritos que são abrangidos por uma NUT e os limites dessa própria NUT.
O Sr. Deputado Machado Rodrigues falou ainda - aliás, houve dois Deputados que falaram nisso - na questão da evolução pós-alargamento da União Europeia.
De facto, no que respeita à carta que recebeu, o que percebi do mapa que mostrou, à distância, é que é exactamente o mesmo que está publicado no Segundo Relatório da Comissão Europeia sobre a Coesão Económica e Social, que foi apresentado e discutido na Comissão de Assuntos Europeus, precisamente numa reunião preparatória do debate, na generalidade, na qual tivemos oportunidade de discutir com os Srs. Deputados, que fazem parte dessa Comissão, o futuro da União Europeia, o papel de Portugal nesse contexto e algumas das linhas orientadoras do nosso posicionamento nessa matéria.
A propósito disto, também gostava de dizer ao Sr. Deputado Agostinho Lopes que agora não se vai fazer nenhum estudo especial. Neste momento, há várias estudos, está a trabalhar-se permanentemente esta questão do processo de alargamento e das suas consequências para Portugal, por isso temos um manancial muito importante de material disponível, que está a ser permanentemente trabalhado, e algumas posições portuguesas nessa matéria já foram tomadas junto da União Europeia.
Portanto, digamos, não há um antes, de afastamento total desta dimensão, e um depois, em que há um salto para um estudo completamente inovador; estamos constantemente a trabalhar nessa dimensão e já temos um manancial bastante robusto de estudos, bem como algumas posições - que vão sendo progressivamente consolidadas - de negociação e defesa dos nossos interesses junto de Bruxelas.
No entanto, como tive oportunidade de dizer-lhe aquando do debate na generalidade, a nível da Comissão, creio que algumas leituras mais violentas sobre as vantagens da repartição interior/litoral precisam de alguma reflexão adicional. Isto porque, se pensarmos, por exemplo, em dividir o Norte do País - que é a zona que mais o preocupa - em litoral e interior e se excluirmos do apoio comunitário toda a zona de Braga, a área metropolitana do Porto, etc., considerando que são zonas que prejudicam a defesa dos interesses da interioridade em sentido estrito, o senhor fica com 500 000 habitantes no interior. Por isso, por muito apoio que tenha para o desenvolvimento por habitante, quando multiplica por uma base 0,5 milhões de habitantes tem um resultado final que tem de comparar de uma forma muito séria com uma leitura que englobe 3,7 milhões de habitantes.
Isto não significa que na distribuição interna de verbas não haja uma preocupação adicional em reafectar um maior apoio às áreas mais pobres, mas uma coisa é a reafectação interna dentro do país, outra é excluir dos apoios que estão disponíveis, de uma forma voluntária, uma parte importante do País.
Agora volto a responder ao Sr. Deputado Machado Rodrigues, para lhe dizer que, quanto à questão da quebra do PIDDAC para 2001 dos valores atribuídos ao Ministério do Planeamento, na nossa óptica, o Ministério do Planeamento é a ilustração mais viva de que não há qualquer interesse em apresentar todos os anos um PIDDAC superior ao do ano anterior, por muito que isto depois seja lido na imprensa como "estes perderam e aqueles ganharam".
Considero que o País merece um pouco mais do que isso, e sendo o Ministério do Planeamento aquele que está encarregue de fazer a proposta de distribuição de verbas interministérios, ao cortarmos do nosso próprio PIDDAC a fatia maior de perda estamos precisamente a dar a ilustração prática de que não interessa estar todos os anos a ganhar em termos de afectação de recursos.
Quais são as razões? São basicamente de três tipos. Em primeiro lugar, o fecho do II QCA. No ano passado, tivemos de reservar verbas adicionais para suportar o fecho do II QCA mas, neste momento, uma vez que este está praticamente fechado e estamos a arrancar com o III QCA já não nos exigem esse acréscimo de verbas.
Em segundo lugar, o RIME (Regime de Incentivo às Microempresas). O RIME, que é um apoio ao desenvolvimento regional, sendo um prolongamento do II QCA, foi em grande substância pago com o PIDDAC, pelo que tivemos de reservar essas verbas no ano passado. Neste momento, felizmente, estamos a chegar ao fim do saldo de contas com os cidadãos que tinham candidaturas aprovadas e, portanto, as verbas vão ser reduzidas em cerca de 7 milhões de contos, porque já não tivemos de registar o RIME.
Em terceiro lugar, o Censos 2001. Trata-se de uma operação que só ocorre, como sabe, de 10 em 10 anos, sendo o ano um o do censo. Esta operação - sublinho - correu muitíssimo bem e, neste momento, já temos os aferidores de qualidade a mostrarem que, de facto, foi uma operação de altíssima qualidade. Refiro ainda que tivemos resultados antes de todas as programações feitas (faço notar que o momento censitário foi em 12 de Março e que em Junho tínhamos os primeiros resultados, que nesta altura estão praticamente consolidados). Ora, o censo significou 5,6 milhões de contos.
Portanto, tudo somado, isto é, RIME, fecho do II QCA e Censos, o Ministério do Planeamento dispensou relativamente ao ano passado 16 milhões de contos, só nestas três dimensões.
Relativamente às outras questões colocadas por vários Srs. Deputados, passo a referir-me às Acções Integradas de Base Territorial.
Foi dito que era bom que houvesse outras acções do género da Barragem do Alqueva. Sr. Deputado, essas acções estão perfeitamente em curso, embora nenhum desses sítios tenha uma barragem da dimensão da do Alqueva, mas a estratégia de desenvolvimento para o resto do País não passa necessariamente por fazer investimentos ou barragens daquela dimensão em todos os sítios.
Gostava de sublinhar, no que diz respeito, sobretudo, à área transmontana, que o preocupa sempre, e muito bem, que essa zona tem neste momento três AIBT, pelos menos. Há uma AIBT que em termos de visibilidade e de aposta é, eventualmente, tão importante como a barragem do Alqueva, que é toda a intervenção que está a ser feita no Douro - já agora, devo referir que esperamos que antes do fim do ano o Douro seja registado como património mundial.
Esta intervenção vem na sequência e consolida intervenções anteriores. Nomeadamente, todo o projecto de navegabilidade do Douro tinha subjacente a abertura do Douro em termos turísticos e uma estratégia mais

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sustentada de desenvolvimento. Para além disso, o Douro tem, neste momento, reservados cerca de 13 milhões de contos extra relativamente ao acesso das câmaras municipais aos fundos comunitários e às intervenções normais dos ministérios.
É ao abrigo disso que estão em curso ou foram financiadas várias zonas de "atracagem" ligadas ainda à navegabilidade do Douro, há um projecto em parceria com os Caminhos-de-Ferro Portugueses sobre os comboios históricos do Douro e foi dado um apoio às rotas turísticas das vindimas do Douro (neste momento, está em curso uma intervenção em Salzedas e numa série de aldeia vinhateiras). Tudo isto são intervenções precisamente nessa dimensão.
Há ainda que referir o pacto criado precisamente para preencher uma lacuna que não se justificava, o Pacto da Terra Fria Transmontana, que só para dois anos tem 3 milhões de contos previstos de investimento apoiado e o investimento no Vale do Côa, que é um processo que parece estar totalmente consolidado em termos da estrutura do museu e de toda a dinâmica envolvente mas que tem registado 13 milhões de contos.
Portanto, referi intervenções específicas e, Sr. Deputado, garanto-lhe que se for necessário não mais dinheiro mas, sim, mais projectos coerentes com estes e que desenvolvam a zona é evidente que estaremos totalmente disponíveis, pois as nossas preocupações são precisamente de apoio ao desenvolvimento, porque o País só é desenvolvido se não tiver áreas excluídas em termos desse mesmo desenvolvimento.
Ainda a propósito deste aspecto, o Sr. Deputado este ano concentrou-se nas questões relativas às estradas, esquecendo-se que o PIDDAC deve preencher as lacunas existentes. Com certeza que o Sr. Deputado far-me-á a justiça de reconhecer, por muito que falte à área a ou b - e o País ainda tem muitas lacunas por preencher - que o PIDDAC para Bragança era da ordem dos 8 milhões de contos em 1995 e, neste momento, é da ordem dos 25 milhões de contos. Portanto, o PIDDAC de Bragança foi multiplicado por três vezes.
Por outro lado, fora PIDDAC, pedia-lhe que fizesse a justiça de reconhecer que os projectos ligados ao Fundo de Coesão no que diz respeito à área de ambiente, que ascenderão, em 2002, a perto de 3 milhões de contos, são projectos de discriminação positiva importantíssimos. Nomeadamente, o Projecto Polis teve 2,1 milhões de contos registado e no próximo ano vai ter 2,2 milhões de contos.
Portanto, só extra PIDDAC, para o ano de 2002, há mais 5,1 milhões de contos afectos às intervenções em Bragança, para além de esta área ter uma fortíssima dinâmica de candidatura aos programas operacionais regionais, que é reconhecida pelo próprio Presidente da Câmara Municipal, com quem tive oportunidade de trocar impressões há muito pouco tempo, aquando da inauguração da Catedral de Bragança, outra peça também importante neste processo.
De qualquer modo, somando tudo isto, verifica-se um crescimento entre 2001 e 2002 da ordem dos 21%, o que é de facto, a meu ver, bastante interessante, não incluindo os montantes relativos às candidaturas aos programas operacionais nem pactos e outras intervenções, como as que referi do Fundo de Coesão, portanto, extra PIDDAC. Assim sendo, penso que há uma mudança muito grande que interessava reconhecer.
Relativamente às questões colocadas pelo Sr. Deputado Afonso Candal, quero dizer que não temos qualquer indicação de adiamento de pagamentos de verbas no que diz respeito a Portugal, esse é um cenário que, neste momento, não se nos coloca por parte da União Europeia.
No que diz respeito às outras questões que colocou, gostava de sublinhar aspectos muito concretos. Começando pela questão da ferrovia, parece-nos que se trata de uma matéria da maior importância no modo como Portugal estrutura a sua rede que suporta a actividade económica. Nessa matéria há, de facto, investimentos que, em termos da tradição de repartição entre vários meios de produzir acessibilidades, significam uma inversão quase total nas verbas registadas em PIDDAC.
De facto, pela primeira vez na nossa história, o investimento na ferrovia em termos de PIDDAC acresce a 47% de todo o investimento previsto nesta área. Naturalmente, isto não significa uma falta de aposta relativamente à rodovia, reflecte o facto de esta, entretanto, precisamente porque é uma área dinâmica já estruturada e consolidada, ter conseguido captar investimento privado, o qual, junto ao investimento público, alivia a carga de esforço que está nas mãos do Estado utilizando dinheiro dos contribuintes. Assim, de algum modo, consolida uma estratégia sem exigir um esforço tão grande a nível nacional e mobilizando, tal como deve ser feito, para finalidades públicas também capitais privados.
Esta é uma mudança importantíssima e que, penso, também tem um significado especial quando se olha para projectos como a ligação por ferrovia ao Algarve ou, dentro das áreas metropolitanas, a consolidação de uma rede de metro, quer na Área Metropolitana do Porto quer na Área Metropolitana de Lisboa, ou ainda criando os embriões de novas redes de metropolitano, quer na zona de Coimbra quer na zona sul do Tejo.
De facto, um dos grandes problemas das áreas metropolitanas relaciona-se com o que elas contribuem em termos de ineficácia nacional pelo facto de não terem circulações fáceis, nem de pessoas nem de mercadorias. É absolutamente essencial que o País convirja naquilo que ainda é necessário fazer em termos de áreas metropolitanas no sentido de atacar essa dimensão.
É que, de facto, sendo estas áreas motores de desenvolvimento do País, têm fragilidades em termos de funcionamento que lhes criam "deseconomias" próprias de cidades com 14 milhões de habitantes e não com 1,2 ou 1,3 milhões de habitantes. Portanto, há aqui uma desorganização no funcionamento dessas áreas metropolitanas que é um dos grandes "calcanhares de Aquiles" do próprio desenvolvimento do País, precisamente porque gera uma ineficácia brutal, para além de outras questões envolvidas, nomeadamente a qualidade de vida de quem aqui habita.
A qualidade de vida nestas cidades passa muito por estas intervenções, por isso penso que o esforço no metro de Lisboa e no metro do Porto merecem aqui um sublinhado especial.
Passo à questão da interioridade, que o Sr. Deputado Afonso Candal também abordou. Penso que é importante a maneira como coloca a questão, porque a refere, por um lado, como uma estratégia no contexto do mercado ibérico. Isto é, por vezes falamos do interior do País porque toda a nossa tradição de desenvolvimento foi virada para o litoral, mas o interior é a zona mais próxima do resto da

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Europa, até porque sabemos que muitas das nossas exportações continuam a ser feitas através de camião.
Portanto, a proximidade com o resto da Europa existe no interior, o que não existia até agora era capacidade de infra-estruturação, de acolhimento, no fundo, de retenção, quer de empresas quer de pessoal mais qualificado, no interior do País por ausência clara de condições de acolhimento e de qualidade de vida.
Neste momento o Censo reflecte essa dinâmica totalmente, e, de facto, penso que é muito importante que comece a haver soluções de urbanidade no interior. Trata-se de um interior com problemas de desenvolvimento, mas já não carenciado, esquecido, "desinfra-estruturado".
Assim, em termos de uma lógica europeia e de uma lógica ibérica, o esforço que está a fazer-se relativamente à criação de condições de acolhimento no interior, o que começa a notar-se claramente em Viseu, na Guarda, em Bragança, em Vila Real, em Évora, portanto, o facto de todos estes concelhos crescerem claramente mais do que a média nacional, significa a inversão do processo de perda contínua para o interior do País.
O que referi, juntamente com as acessibilidades, a rede de gás e as ligações fáceis ao mercado espanhol, acaba por ser uma pré-condição para os incentivos à localização no interior, nomeadamente a competitividade fiscal em termos de IRC, as vantagens para a criação líquida de postos de trabalho, que ficam isentos de uma série de custos de funcionamento para as empresas, o apoio que vem junto com o "pacote da interioridade", como seja o apoio às câmaras municipais para que façam parques e zonas de acolhimento empresarial de qualidade.
Estes são factores que, em conjugação uns com outros, podem criar dinâmicas absolutamente excepcionais para o acolhimento de empresas no interior, o que começa a ser sentido, às vezes, mais por empresas estrangeiras porque têm uma liberdade de opção muito grande, uma vez que à partida não estão presas à posse de determinados terrenos ou à extensão relativamente a empresas que já existiam.
No interior do País começa a notar-se uma dinâmica completamente nova, sobretudo para aquelas empresas que têm uma opção efectiva de localização, isto é, que olham para o território europeu e procuram o melhor sítio para se instalarem. Aí, de facto, o preço dos terrenos, a existência de universidades ou de politécnicos onde há mão-de-obra altamente qualificada, o facto de haver acessibilidade e uma qualidade urbana que já permite a retenção de gestores, de quadros técnicos que conseguem aí criar os seus filhos, viver bem e, portanto, instalar-se de uma maneira confortável, viver bem, o facto de haver já nestes pólos funções terciárias e urbanas razoáveis, constituem um "pacote" que começa a ser altamente interessante, sobretudo no contexto europeu.
E aí gostaria de sublinhar que não é necessário, relativamente ao interior, seguir toda a trajectória que foi adoptada para o litoral, isto é, não há que aguardar, por exemplo, para introduzir vectores ao nível da ciência e tecnologia, da utilização de novas tecnologias, não tem de se seguir um processo gradualista, digamos, como o que se seguiu no litoral.
Aliás, isto começa a acontecer e eu posso dizer-vos que, neste momento, numa dessas AIBT, nas aldeias históricas, se uma pessoa se instalar em Linhares da Beira dispõe de Internet em banda larga e pode consultar tudo o que quiser a nível internacional sem estar num grande pólo urbano.
Neste momento isto começa a acontecer em todas as zonas do interior, onde se dá, de facto, um salto, e só esperamos que as políticas urbanas tenham preocupações de qualidade e evitem o crescimento desordenado que às vezes acompanham estes surtos rápidos. Foi isso o que aconteceu no litoral e é importante que no interior não ocorra nada de semelhante, porque não teremos fundos posteriormente para fazer a correcção dos erros que neste momento cometermos.
Sobre essa dimensão penso que há, de facto, alguma coisa a mudar no País e aproveito para responder já ao Sr. Deputado sobre o que é isso de interioridade e de ruralidade.
Sr. Deputado, relativamente à posição do Governo, não há posições recentes nesta matéria. O discurso do Governo tem-se mantido consistente e, sobretudo desde que eu ocupo esta pasta, tem havido uma constância de intervenção, de apoio e de política coerente no interior do País, o que vem na linha daquilo que o colega que me antecedeu, o ministro João Cravinho, tinha já definido - e lembro que as AIBT foram definidas por ele.
Houve alguns ajustamentos, alguns preenchimentos de lacuna etc., precisamente virados para a interioridade, tais como as opções sobre as redes de ligação ao interior, que são uma pré-condição de desenvolvimento, já que sem isso não há política que se ajuste, porque a fluidez dos contactos é uma pré-condição.
O Plano Nacional Rodoviário existe de uma forma substantiva desde essa altura, o mapa das redes de gás para o interior foi definido pelo Governo anterior, também ele do Partido Socialista e, portanto, desde o início isto tudo e a dinâmica do desenvolvimento vêm junto com opções instrumentais que acabaram por ser rejeitadas pelo povo português, nomeadamente o processo de regionalização.
Portanto, a preocupação com o interior, com a aproximação das políticas dos cidadãos é algo que vem de trás, quer dizer, é uma maneira de estar, assa, é outra maneira de ler a política de coesão, que não é só uma coesão social é também uma coesão territorial, mas que, para além disso, não tem, no que diz respeito à coesão territorial, nenhuma lógica assistencialista, porque isso é, no fundo, não resolver um problema. Logo, o que se pretende é intervir, de uma forma sistemática, em cima de dinâmicas emergentes e estimulando aquilo que estes territórios podem produzir e não dando para lá dinheiro com a ideia de que atirando dinheiro para cima dos problemas eles se resolvem.
Portanto, toda esta política convergente é uma política de desenvolvimento do interior e o rural tem de vir, a meu ver, em torno de dinâmicas onde se vão fixando algumas funções de índole urbana, mas de urbana no interior. Por isso o mapa que nos preocupa, o nosso mapa de referência, é o da interioridade, que o Sr. Deputado com certeza conhece. Como sabe, há legislação relativa ao apoio à interioridade, isto é, às zonas que foram seleccionadas para nelas se fazerem as intervenções preferenciais de taxa de benefício fiscal em relação ao IRC, que vem junto com um conjunto de outras intervenções.
Portanto, o nosso mapa é o da interioridade e fizemos questão de dele não excluirmos pólos - e referi vários - que, estando numa zona de interioridade, têm até em si, isoladamente, indicadores de desenvolvimento bastante razoáveis. Se olharmos para os indicadores de Viseu ou de Castelo Branco, o normal seria excluí-los e nós incluímo-los

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voluntariamente, porque percebemos que o desenvolvimento da área envolvente requer que funções de maior nível e de maior índole sejam exercidas numa área de influência relativamente próxima daquelas dinâmicas rurais que precisam de ser desenvolvidas mas que não podem sê-lo nem de uma forma excessivamente voluntarista nem de forma atomizada, através de intervenções muito instintivas, desconexas, do tecido que as envolve.
Portanto, sobre as nossas leituras de ruralidade era isto o que eu gostava de dizer-lhe.
É evidente que algumas das zonas que referiu, na área de Lisboa e Vale do Tejo, são espaços que apresentam características de ruralidade, embora podendo ser áreas que, de algum modo, são catalisadas facilmente, seja pela própria dinâmica de Lisboa e da sua envolvente seja por pólos, digamos, distribuídos também na sua envolvente e que precisam de começar a funcionar em rede.
Perguntou-me o que é que o Governo tem relativamente a essa problemática e eu quero dizer-lhe que para além de, no que diz respeito a Santarém, eu chamar a sua atenção para os investimentos que, neste momento, estão previstos em termos de complementaridade relativamente ao PIDDAC, isto é, intervenções ao nível das acessibilidades e das concessões que fazem com que o PIDDAC seja crescido de cerca de 49 milhões de contos em intervenções que rompem e, no fundo, criam acessibilidades também nesses espaços, a AIBT do Tejo é, de facto, uma AIBT que, eventualmente, não faria sentido se lêssemos o País tal qual ele existe. Isto é, mesmo os índices baixos que existem em zonas como Benavente, Chamusca, etc., são espaços que têm índices relativamente baixos de desenvolvimento, mas que na lógica global do País dificilmente apareceriam como áreas de grande preocupação.
Agora não há dúvida que, mesmo assim, são áreas que se destacam pela negativa, digamos assim, numa zona que, em si, está relativamente penalizada por ter entrado em phasing out. Por isso mesmo essas áreas estão contempladas e intervencionadas através de dois instrumentos fundamentais, sendo um deles, precisamente, a AIBT que trata toda a zona do Vale do Tejo, ou seja, toda a zona envolvente de Lisboa, onde há, digamos, essas características de ruralidade, tentando que a ruralidade se associe a melhor qualidade de vida e a turismo, que pega, por exemplo, nas intervenções em torno da zona de Almorol, da vala real e, portanto, da requalificação ambiental, cruzando ambiente com urbanismo de qualidade, reconversão dos núcleos urbanos históricos e requalificação das margens do Tejo e seus afluentes.
Logo, há aí um "pacote" de intervenção especial, precisamente virado para essa compensação, e tem havido a preocupação de fazer contratos-programa que reduzam o esforço requerido a essas câmaras municipais para beneficiarem destes fundos comunitários e também dos fundos comunitários "normais" do programa regional. Isto é, há uma preocupação de acrescer aí a apetência para celebrar contratos-programa e, portanto, comparticipações de PIDDAC com competências de câmaras municipais e verbas adicionais ligadas a esta AIBT.
Para além disso, nesta mesma linha de criar redes estruturadas de desenvolvimento, há um trabalho em curso de intervenção em pequenos núcleos urbanos e aí estamos a incluir Torres Vedras, Torres Novas, Tomar e Abrantes, ou seja, todo um conjunto de pequenos núcleos que têm de ganhar competências adicionais relativamente àquela que era a sua função tradicional, para trabalharem como uma rede de desenvolvimento que liberte Lisboa da pressão urbanística, da pressão demográfica, sendo, neste momento, perfeitamente óbvio que neles existem condições de localização para empresas, por vezes bastante mais benéficas, o que evita que elas venham para zonas urbanas, como tradicionalmente vinham.
Consequentemente, há aí uma política de acolhimento empresarial, que passa pela valorização desses núcleos mas também pela criação - e esse é um processo que está, neste momento em curso, que ainda não está totalmente consolidado - de uma rede de áreas de acolhimento industrial que, ligadas à logística, consolidem, nesta coroa em volta de Lisboa, capacidade tanto de acolhimento empresarial de boa qualidade como de interface logística que permita que essas zonas sejam áreas tampão, que sejam uma coroa de desenvolvimento em torno do pólo hiperconcentrado de Lisboa.
Quanto à revisão dos cenários, Sr. Deputado, pensámos seriamente em nem sequer - e chegámos a passar por essa fase - apresentar números concretos relativamente ao cenário macroeconómico. Depois apresentámo-los na primeira versão que foi entregue ao Parlamento e dissemos que os cenários que existiam antes dos acontecimentos do dia 11 de Setembro tinham alguma falibilidade, nomeadamente porque a economia americana estava em dúvida.
Mas, por exemplo, no cenário macroeconómico que diz respeito ao cenário global mundial são esses valores que ainda aparecem, porque, a nível do próprio Fundo Monetário Internacional, a taxa de crescimento de 3,5% a que fez referência o Sr. Deputado Francisco Louçã, está lá mas em pé-de-página, pois era essa a taxa publicada pelo Fundo Monetário Internacional antes de 13 de Setembro. Ora, como ainda não há outra taxa estimada de crescimento da economia mundial posterior a essa data, temos de viver com isso.
Neste momento, temos a sensação que os nossos cenários são perfeitamente compatíveis com as revisões dos vários organismos internacionais no que se refere a taxas de crescimento. Aliás, são compatíveis com aquilo que foi publicado pela própria União Europeia, pela OCDE. Portanto, estamos todos a trabalhar basicamente nas mesmas zonas.

O Sr. António Pires de Lima (CDS-PP): - Posso interrompê-la, Sr.ª Ministra?

A Sr.ª Ministra do Planeamento: - Por mim pode, Sr. Deputado.

O Sr. António Pires de Lima (CDS-PP): - Sr.ª Ministra, se, na prática, a economia, em vez de crescer os 2%, que todos desejamos, crescer só 0,5% ou 1%, o que é que irá passar-se com o Orçamento? Qual é a margem de manobra que o senhores têm, em termos orçamentais, para lidar com uma realidade como essa, que é, infelizmente, a que eu julgo mais provável? Apresentam um orçamento rectificativo? Aumentam o défice? Cortam nas despesas de investimento?

A Oradora: - Sr. Deputado, isso não significa que devamos fazer um cenário no qual não acreditamos.
Não temos, neste momento, qualquer indicador que nos leve a trabalhar com um cenário de 0,5% e, portanto,

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quando acontece - e é isso o que acontece actualmente - haver uma guerra instalada, com características totalmente imprevisíveis, estamos a fazer o mesmo que os outros organismos internacionais, isto é, nas projecções de crescimento da União Europeia ou nas projecções de crescimento dos Estados Unidos também não encontra 0,5% em lado algum.

O Sr. António Pires de Lima (CDS-PP): - Essa agora!…

A Oradora: - Peço desculpa, mas não encontra. Encontra 1,5% e 2,5%. Aliás, as últimas revisões que foram feitas da projecção de crescimento para Espanha foram publicadas pelo Economist e são de 2%, Sr. Deputado.

O Sr. António Pires de Lima (CDS-PP): - Mas os outros países têm, provavelmente, em termos de margem de manobra orçamental, condições que este Governo não tem.
Portanto, estou perguntar concretamente a este Governo: se a economia crescer só 1%, o que é que os senhores fazem? Apresentam um orçamento rectificativo, aumentam o défice ou cortam nas despesas de investimento? Porque eu não vejo outra alternativa!…

A Oradora: - Sr. Deputado, então não está a discutir a valia das nossas projecções; está a dizer uma coisa que diria de qualquer maneira, ou seja, se o crescimento não for este, o que é que, nesse caso, iremos fazer.
Bem, Sr. Deputado, face a isso estaremos aqui para, em conjunto e da forma mais transparente, mais aberta e o mais inteligente possível, organizarmos os nossos mecanismos de defesa.
Agora, não vamos viver no momento actual, em que temos para o primeiro semestre de 2001 uma taxa de crescimento da ordem dos 2,4%, com um cenário de crescimento de 0,5%, até porque isso é muito mais irrealista, Sr. Deputado, do que vermos como é que as coisas vão evoluir e, nessa altura, encontrarmos todos as soluções que nos pareçam mais adequadas.

O Sr. António Pires de Lima (CDS-PP): - Sr.ª Ministra, eu ainda a questionei sobre o tempo que leva a pagar os programas.

A Oradora: - Sim, Sr. Deputado, eu estava a deixar algumas perguntas para o meu colega responder, para que não se torne excessivamente monótona a minha intervenção.
O Sr. Deputado Agostinho Lopes faz alguns comentários com os quais não posso estar, de todo, de acordo, nomeadamente quando classifica de "baralhadas" as coisas. Não penso que haja qualquer baralhada no que diz respeito às AIBT, que estão claras e definidas. De facto, havia algumas lacunas, que, ao contrário do que refere, estão perfeitamente preenchidas (como o próprio Parlamento tinha sublinhado) e os presidentes de câmara das zonas e as associações de desenvolvimento regional conhecem bem as dinâmicas que, neste momento, estão criadas em torno das AIBT.
Dizendo melhor, essas lacunas eram áreas que precisavam de AIBT e que foram preenchidas com outro nome, que são foi: pactos territoriais. Em particular, isto preenche áreas do Tâmega (que, penso, também estão próximos da sua zona de preocupações), Alto Tâmega, Baixo Tâmega, Trás-os-Montes, e algumas intervenções na região centro, onde, de facto, havia lacunas relativamente a este extra, a esta discriminação positiva dos sistemas que estão ligados ao III QCA.
Portanto, quer nessa dimensão quer no funcionamento e gestão do III QCA, se há característica que existe é a de ser bastante organizado e, aliás, Bruxelas obriga-nos a ser bastante organizados.
No que diz respeito à assistência técnica, é um programa específico do próprio QCA que funciona para todos os países - é o programa operacional n.º 19 -, onde estão registadas as verbas comunitárias. Na sua maioria, como são verbas comunitárias, apenas é preciso a contrapartida nacional, pelo que não arrasta dinheiro nacional directo. Basicamente, a maior parte do dinheiro que está a ser aplicado na gestão do QCA é financiado por Bruxelas e associado ao próprio lançamento dos programas operacionais.
Portanto, essa assistência técnica é um programa específico, também controlado por Bruxelas. E é através dessas verbas que são pagos grande parte dos gestores e das equipas técnicas que fazem a gestão do QCA, tal como nos restantes países da União Europeia que têm acesso ao QCA. Repito, trata-se do programa específico n.º 19.
Relativamente às questões que colocou quanto às áreas da saúde e das pescas, penso, Sr. Deputado, que terá oportunidade de colocá-las aos meus colegas, que lhe poderão responder de uma forma mais clara.
No entanto, parece-me, permita-me que lhe diga, um pouco excessivo que, por não perceber a que título é que são financiados os abates e a substituição de frota em Esposende e na Apúlia - que vale, como referi, 500 000 contos -, mesmo que isso seja uma linha de financiamento comunitário que nos é atribuída ao abrigo do facto de muitos dos nossos bancos pesqueiros, neste momento, estarem inacessíveis, isso seja razão para descredibilizar totalmente o PIDDAC.

O Sr. Agostinho Lopes (PCP): - O problema é que não há pescadores desta zona em Marrocos!

A Oradora: - Isso não!… Sr. Deputado, não fale muito nisso. Deixe lá…
Sr. Deputado, se há uma linha de financiamento de Bruxelas que é justificada pelo facto de as frotas portuguesas precisarem de ser renovadas… Sr. Deputado, enfim, pode ser que não haja pescadores, mas terá oportunidade, de facto, de colocar essa questão ao meu colega das pescas.
Sr. Deputado, peço desculpa, mas não me parece muito importante que seja ao abrigo dessa linha de financiamento que os pescadores da Apúlia e de Esposende conseguem renovar as suas frotas, porque acredite que a renovação daquelas frotas é mesmo necessária. Se é ao abrigo das linhas de compensação de Marrocos ou de outra linha qualquer, Sr. Deputado, parece-me que não é, propriamente, o argumento mais necessário aqui, para este debate. Aliás, espero que isso não crie qualquer tipo de problema adicional.

O Sr. Agostinho Lopes (PCP): - Eu gostava era de perceber!

A Oradora: - Sr. Deputado, penso que não faz sentido nenhum vir argumentar, ainda, relativamente ao distrito de

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Braga. Porque pode dar-lhe as voltas que quiser, tirar-lhe os sistemas de incentivos, mas o que é certo é que, no caso, Braga tem tido uma performance, no que diz respeito aos sistemas de incentivos, que me faz pensar que os valores que estão aí registados estão sub e não sobreavaliados. Aliás, neste momento, o norte apresenta uma dinâmica brutal, no que diz respeito ao acesso aos sistemas de incentivos, e, nessa dinâmica, o distrito de Braga, de facto, tem uma pujança que é absolutamente marcante.
Por outro lado, Sr. Deputado, faço notar, apenas, o que tem sido o PIDDAC para Braga desde 1995: em 1995, o PIDDAC era de 6 milhões de contos; em 1996, de 11 milhões de contos; em 1997, de 13 milhões de contos; em 1998, de 23 milhões de contos; em 1999, de 27 milhões de contos; em 2000, de 50 milhões de contos; em 2001, de 57 milhões de contos; e, agora, é de 61 milhões de contos.
Sr. Deputado, isto pode estar muito "massajado", mas, vai desculpar-me, não fale em Braga, em termos de discriminação, a não ser de uma grande discriminação positiva, que, aliás, é justa, na medida em que, de facto, o distrito de Braga é daqueles que mais cresce e, por outro lado, era daqueles que mais problemas tinha para resolver.
Por outro lado, também gostava de dizer-lhe que, relativamente ao distrito de Braga, se lhe tirar - e faz mal, porque isso é errado - os 16 milhões de contos de incentivos (admitindo que os empresários de Braga são apáticos, relativamente aos sistemas de incentivos), mas se somar ao PIDDAC o investimento das concessionárias das auto-estradas da Brisa e da Aenor, que vale (e não está em PIDDAC) 45,4 milhões de contos, o investimento do Fundo de Coesão, que vale 13,6 milhões de contos, verá que, neste momento, os investimentos públicos ascendem a 121 milhões de contos, o que significa um aumento de 30% relativamente a 2001.
Portanto, Sr. Deputado, admito essa discussão relativamente a todos os distritos, mas quanto a Braga não, porque, neste momento, há que reconhecer o esforço que tem sido feito, que não é um esforço, mais uma vez, assistencialista, mas um esforço justo, que Braga merecia e requeria. "A César o que é de César", nos momentos em que isso se justifica.
Sr.ª Presidente, se me permite, passo a palavra ao meu colega para que complete alguns aspectos, os quais tenho a noção que não desenvolvi suficientemente.

A Sr.ª Presidente: - Com certeza.
Tem, então, a palavra o Sr. Secretário de Estado do Planeamento.

O Sr. Secretário de Estado do Planeamento (João Carvalho Mendes): - Sr.ª Presidente, gostava de completar alguns aspectos relativamente à questão, levantada pelo Sr. Deputado António Pires de Lima, dos incentivos às empresas, entroncando isto com a questão do próprio cenário macroeconómico.
Para nós, é decisivo, no próximo ano - porque é, precisamente, quando a economia está a abrandar -, que tenhamos boas condições de investimento público para favorecer o investimento privado, daí que os sistemas de incentivos às empresas sejam uma prioridade, para nós, no próximo ano.
A este propósito, estamos muito mais descansados este ano do que estávamos há um ano e há dois anos a esta parte, porque, neste momento, temos o edifício legislativo completo, todas as negociações completas com a Comissão Europeia. Portanto, estamos muito mais seguros e muito mais descansados, relativamente ao ritmo cruzeiro de investimento que esperamos no sector privado impulsionado pelos sistemas de incentivos.
O Sr. Deputado referiu que o comportamento do Estado deve ser tal qual o comportamento de uma empresa. Pois digo-lhe que, relativamente ao investimento, deve ser exactamente o oposto, ou seja as empresas tendem a ter um comportamento de adiamento das decisões de investimento quando a economia abranda.
Ora, esse é o comportamento, precisamente, que o Estado não pode ter, isto é não podemos adiar as nossas decisões de investimento, porque a economia abranda; temos de acelerar o investimento para impulsionar o sector privado a investir e não adiar as suas decisões no próximo ano.
Daí que é importante que tenhamos números fortes de investimento para o próximo ano, o que temos. E também não podemos ter um Orçamento, do ponto de vista das nossas projecções, que seja recessivo.
A sua sugestão é que apresentemos projecções macroeconómicas recessivas para a economia portuguesa, quando, precisamente, todos os organismos internacionais e as revistas especializadas apresentam, para a Europa e para os Estados Unidos, um intervalo de crescimento na casa do 1%, 1,5%. Para a Espanha, onde a Economist apresenta 2%, nós apresentamos um intervalo com valor médio de 2% e um valor mínimo de 1,75%.
Aquilo que lhe pergunto é se considera que esta é a questão central do Orçamento e se, face ao momento de abrandamento económico, não é mais importante discutir quais são as grandes orientações do investimento público e a necessidade absolutamente imperativa de o Estado não fazer aquilo que as empresas tendencialmente fazem em momentos de abrandamento, que é adiar as suas decisões de investimento.
Gostava também de sublinhar um aspecto que tem que ver com o tal mapa que o Sr. Deputado Machado Rodrigues mostrou, completando um pouco aquilo que a Sr.ª Ministra disse e lembrando-lhe que o que nesse mapa está a vermelho é o que corresponde ao Objectivo 1, que são as regiões mais apoiadas.
A esse respeito, eu gostaria de dizer que somos contra o princípio que esteve na base da concepção desse mapa, que é o princípio da aceitação de que as estatísticas a 27 países fazem a base do novo limiar de riqueza para aceitação de regiões Objectivo 1.
Na verdade, consideramos que a adesão à União Europeia representa um contrato com a Europa desenvolvida e que a ambição deste contrato não deve ser diminuída pelo facto de entrarem países mais pobres na média europeia, porque isso também irá prejudicar esses mesmos países.
Portanto, essa é uma questão de princípio, sobre a qual nos deveríamos entender em Portugal e ter uma posição de grande força na União Europeia, porque é uma questão a priori da questão que levanta sobre a eventual repartição das nossas NUT II.
Gostava ainda de sublinhar, em relação à própria portaria de interioridade e a propósito das questões que colocou, que se deve reconhecer ao Governo a coragem de ter

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apresentado uma portaria em que diz "sim" a uns e "não" a outros, com critérios objectivos, e que define quais os concelhos beneficiados - aliás, esta portaria está publicada desde o início deste ano e foi muitíssimo pouco contestada, pelo que julgo que é largamente consensual.
Portanto, julgo que se deve fazer justiça ao Governo, reconhecendo que tivemos a coragem de dizer "sim" a uns e "não" a outros. Haveria sempre oportunidade para qualquer grupo parlamentar de, através de lei, caso entendessem, fixar áreas beneficiárias.
O Sr. Deputado referiu-se aos critérios e eu devo dizer-lhe que eles são os seguintes: critérios de poder de compra, critérios de PIB per capita, critérios de densidade populacional. Portanto, foram utilizados critérios objectivos, bem como o próprio mapa das áreas integradas de base territorial.

A Sr.ª Presidente: - A Sr.ª Ministra quer ainda dar um esclarecimento quanto a um ponto. Tem a palavra, Sr.ª Ministra.

A Sr.ª Ministra do Planeamento: - Sr.ª Presidente, quero apenas fazer duas rectificações. Referi de memória um valor para o distrito de Santarém extra PIDDAC, que não estava totalmente correcto.
Portanto, em termos de concessionárias das auto-estradas, Brisa e SCUT da Beira Interior, o valor extra PIDDAC, para o distrito de Santarém, é de 36,4 milhões de contos, ao qual acresce Ambiente/Fundo de Coesão no valor de 1,5 milhões de contos, perfazendo um valor total de 37,9 milhões de contos, o que significa que o investimento global previsto é de 77,8 milhões de contos.
No que diz respeito, também, a um aspecto que ficou por responder, o investimento no distrito de Viana do Castelo cresce, em termos de PIDDAC, 7,7% (o que é muito próximo do valor de 7,2%) e a sequência, nos três últimos anos, é de 19 milhões de contos, 22 milhões de contos e 23 milhões de contos.

A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado António Nazaré Pereira.

O Sr. António Nazaré Pereira (PSD): - Sr.ª Presidente, não irei questionar a Sr.ª Ministra, retomando uma velha discussão que temos vindo a ter em sede de Comissão de Assuntos Europeus, sobre taxas de execução e taxas de aprovação, embora, a certa altura, vá abordar esse assunto.
No entanto, não quero deixar de colocar, por um lado, algumas questões de natureza pontual e, por outro, uma questão mais de fundo que deixarei para a parte final. Também não quero deixar de notar o distanciamento em que a Sr.ª Ministra aqui se colocou relativamente aos discursos de um Sr. Deputado independente nesta Câmara a propósito do mundo rural. Não quero, pois, deixar de referir essas posições.
Começo por solicitar-lhe a explicitação de como é que alguém pode ver este Orçamento como beneficiando o mundo rural e, simultaneamente, a Sr.ª Ministra afirma que essa é uma matéria que, desde há longo tempo, tem vindo a ser uma preocupação do Governo, enquanto o PIDDAC do Ministério da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas para 2002 apresenta uma redução, em plena execução do II QCA, portanto, em plena fase em que os investimentos no sector agrícola também deveriam atingir um máximo pelo menos em relação ao ano anterior.
Sr.ª Ministra, permita-me, ainda, abordar alguns outros assuntos de natureza pontual.
Em particular, queria solicitar-lhe um favor no sentido de que a Sr.ª Ministra não retomasse o argumento, já aqui utilizado hoje pelo menos duas vezes, de comparar PIDDAC para 2001 com PIDDAC para 1995. É que a Sr.ª Ministra sabe perfeitamente que o PIDDAC para 1995 não incluía inúmeras verbas que hoje aí estão incluídas por decisão desta própria Assembleia, pelo que comparar os valores brutos de ambos não é sério.
Ora, tenho uma imagem de pessoas sérias, tanto em relação à Sr.ª Ministra como ao Sr. Secretário de Estado, pelo que gostaria que não voltasse a fazer tal tipo de comparação. Já assim fez a propósito de Santarém, bem como de Braga, pelo que gostaria que não a fizesse ao responder às questões que vou colocar-lhe.
Além disso, permita-me solicitar uma informação que o meu colega Machado Rodrigues acabou de pedir-lhe mas a que a Sr.ª Ministra não respondeu.
Temos informação - e a Sr.ª Ministra certamente confirmará - de que o Programa INTERREG III ainda não terá sido aprovado pela Comissão ou, pelo menos, assim nos informou o Sr. Ministro da Agricultura aquando da discussão na generalidade deste Orçamento.
A ser assim, pergunto-lhe como explica que, no dia 28 de Outubro, o Conselho de Ministros tenha nomeado o Licenciado José Santos Soeiro para gestor do INTERREG III e tenha criado a respectiva estrutura de apoio técnico, nomeadamente, sabendo que o Sr. Eng.º Soeiro - pessoa de quem, aliás, há as melhores referências quanto a seriedade e competência -, ainda há bem pouco tempo, esteve profundamente envolvido na não entrega a tempo e horas da candidatura portuguesa à chamada "destilação de crise" na União Europeia e que o referido programa ainda não está aprovado.
Uma outra questão tem a ver com as verbas extra PIDDAC que estão incluídas como total do investimento público viabilizado pelo Orçamento do Estado.
Segundo informação transmitida pela Sr.ª Ministra em sede da Comissão de Assuntos Europeus, essas verbas rondarão os 9100 milhões de euros, distribuídas pelo valor das concessões, pelas empresas públicas, pelo Programa Polis e pelo saneamento básico.
De entre o total de 2465 milhões de euros extra PIDDAC, gostaria que identificasse o que corresponde a fontes comunitárias e a fontes nacionais.
Além disso, como, há pouco, a Sr.ª Ministra explicitou para dois concelhos, Braga e Santarém, os valores das concessões para cada um, embora tais elementos não se encontrem disponíveis em PIDDAC, solicito-lhe que disponibilize essa informação, por distrito, para podermos dispor de um mapa de informação mais completo em relação ao País.
Permita-me agora que volte a um assunto que já tive oportunidade de discutir com a Sr.ª Ministra, aquando da discussão na generalidade em Comissão de Assuntos Europeus, que é relativo às transferências de fundos entre Portugal e a União Europeia. Na altura, creio que a Sr.ª Ministra não tinha disponível a informação que lhe solicitei e, portanto, adiou para esta ocasião a análise do que considero ser uma falha no Quadro II.30 do Orçamento do Estado que, em meu entender, não inclui o FEOGA - Garantia e, pelos vistos, confirma-se agora isso mesmo.
Em 1999, os apoios financeiros concedidos no âmbito do FEOGA - Garantia foram da ordem de 650 milhões de

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euros, em 2000, deverão totalizar cerca de 700 milhões de euros. Ora, gostaria de saber quanto é que é previsto para 2001 e para 2002.
Tendo quase a convicção de que não é a da responsabilidade nem da Sr.ª Ministra nem do Sr. Secretário de Estado o facto de aqueles valores não terem sido fornecidos no Orçamento, queria perguntar se a não inclusão neste quadro dos valores relativos ao FEOGA não tem em vista esconder nada.
É que, de facto, se olharmos para a evolução das transferências do FEOGA - Garantia, que, em 1992 e 1993, totalizavam cerca de 400 milhões de euros e que, em 1994, aumentaram para cerca de 650 a 700 milhões de euros, teremos de concluir que, afinal, uma muito proclamada discussão da Agenda 2000, particularmente para o sector agrícola, com o reconhecimento da especificidade de Portugal, não se traduziu de modo algum no aumento das verbas do FEOGA - Garantia nas negociações de 1999. Na verdade, em 1993/1994, houve uma duplicação de verbas, mas não vejo sequer os respectivos valores neste Orçamento e nem sequer um aumento no que diz respeito a 1999/2000/2001.
Por outro lado, não deixo de notar que, nos últimos três anos, tem-se assistido a uma sobreestima crescente nos valores das transferências da União Europeia para Portugal que, depois, se não confirmam.
Em 1999, o desvio entre o previsto e o realmente observado, de acordo com dados do próprio Orçamento do Estado, foi da ordem de 280 milhões de euros; em 2000, o desvio já foi da ordem de 580 milhões de euros; e, em 2001, mesmo contando com o valor de FEOGA da ordem de 700 milhões de euros, o desvio é da ordem de 1900 milhões de euros, ou seja 400 milhões de contos.
Na altura, o Sr. Secretário de Estado afirmou que tal desvio poderia dever-se a uma antecipação, para o ano 2000, das transferências do II QCA da ordem de 1400 milhões de euros. Mas, se assim é, Sr. Secretário de Estado, pergunto onde é que se verifica o grande desvio, o grande "buraco". É no ano 2000 ou em 2001?
É que se for a verba resultante desta antecipação, então, haverá que acrescentar ao valor de 580 milhões de euros do desvio, em 2000, os tais 1300 a 1400 milhões de euros. Se, pelo contrário, o desvio não está em 2000, então, está em 2001 e aí temos os 1900 milhões de euros de desvio.
Porquê estes desvios, sejam em 2000 ou em 2001? Não haverá aqui, claramente, um valor inflacionado das previsões relativamente às transferências? Com que base foram calculados esses valores? Por que é que foram utilizados?
Passo a uma questão associada a esta última - e aqui, sim, vou debruçar-me sobre a taxa de execução e a taxa de aprovação.
Claramente, o Orçamento do Estado para 2002 tem, relativamente ao FEDER e ao Fundo Social Europeu, um valor orçamentado superior a anos anteriores. Basta ver que para 2000 estavam orçamentados para o FEDER 2,400 milhões de euros, para 2001, 1,100 milhões de euros e, para 2002, a fasquia salta para 3 milhões de euros.
No que respeita ao Fundo Social Europeu, para 2000 e 2001, as verbas orçamentadas eram da ordem de 450 ou 500 e, para 2002, aumentam para 1 milhão de euros.
Sr.ª Ministra e Sr. Secretário de Estado, nada mais nem nada melhor do que estes valores que estão contidos no próprio Orçamento para confirmar a crítica que temos vindo a fazer, ao fim e ao cabo, reconfortantemente confirmada pelas palavras do Sr. Secretário de Estado, há bem pouco tempo, quando disse que, "agora, já temos completo o quadro legislativo do III QCA". Como dizia, fica confirmada a crítica que temos vindo a fazer de que há um claro atraso na execução do QCA III que, recordo, Sr.ª Ministra e Sr. Secretário de Estado, está a entrar no terceiro ano de execução - e ambos sabem bem o quero dizer com isto!
Por fim, permitam-me que faça um pedido relativamente a uma afirmação que aqui foi feita.
Peço que me informe, Sr.ª Ministra, se é verdade o que ouvi e que me faça o ponto de situação - e, lá fora, é negro - relativamente ao RIME (Regime de Incentivos às Microempresas).
A Sr.ª Ministra disse-me que está a encerrar o RIME, mas o que é conhecido pelos agentes económicos, nomeadamente em algumas zonas mas não em todas, é que há claros e graves atrasos de pagamento do RIME.
Pergunto-lhe, pois, Sr.ª Ministra, se é assim, e, estando a acabar a execução do RIME, quais foram as taxas de execução e quais são, neste momento, as taxas de pagamento relativamente aos valores que estão comprometidos.
De momento, é tudo, Sr.ª Ministra.

A Sr.ª Presidente: - O Sr. Deputado Agostinho Lopes fez-me saber que pretende mais uns esclarecimentos.
Tem, pois, a palavra.

O Sr. Agostinho Lopes (PCP): - Sr.ª Presidente, de facto, queria colocar mais algumas questões ainda suscitadas pela intervenção da Sr.ª Ministra.
Relativamente ao problema das áreas planas, dos recursos comunitários de alargamento, estimo e desejo que, de facto, sejam feitos os estudos de forma a que o País, e, em particular, estas regiões, não veja o seu nível de apoio diminuído por motivos meramente estatísticos.
No entanto, penso que há uma outra questão que o Governo português tem tido dificuldade em enfrentar na Comunidade, que é o problema das regiões ditas ricas dos países pobres, como são as Áreas Metropolitanas do Porto ou de Lisboa, relativamente às áreas ricas de outros países.
Ora, este problema vai sendo resolvido, no nosso país, à custa das suas áreas pobres e através das médias que são conhecidas. Espero, porém, que os estudos que o Ministério, pelos vistos, tem em curso respondam a este problema, de forma a que, com a batalha necessária na União Europeia, o País, e em particular algumas regiões, não perca verbas.
Quanto às questões do apoio ao interior e ao mundo rural, não vou avançar muito mais, até porque estamos claramente em desacordo, quer relativamente aos impactos do Orçamento que está em cima da mesa, quer em relação a algumas das linhas que foram referidas pela Sr.ª Ministra.
No entanto, gostaria de dizer-lhe que algumas destas ideias - e a Sr.ª Ministra conhece-as certamente - que são novamente desenvolvidas, por exemplo na região norte, há muito tempo que foram colocadas em acção pela Comissão de Coordenação da Região Norte, dirigida pelo Prof. Valente de Oliveira, nos anos 80, através das chamadas linhas de estratégia de desenvolvimento da região norte, e até, infelizmente, com apoios suplementares.
Por exemplo, a região de Trás-os-Montes teve um apoio específico do Banco Mundial e, infelizmente, de lá até agora,

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as desigualdades não diminuíram, pelo contrário, até aumentaram. E não utilizem os índices per capita, pois já referi que este índice vale o que vale, repito, vale o que vale, porque senão chegamos à conclusão que quando as regiões forem um deserto os seus problemas estarão resolvidos.
Quanto à comparação dos PIDDAC, que a Sr.ª Ministra mais uma vez aqui trouxe e que o Sr. Deputado Nazaré Fernandes acabou também agora de referir, já me pronunciei sobre isso mas volto novamente a insistir: em 1995, o orçamento regionalizado do distrito de Braga tinha, de verbas não distribuídas, portanto, verbas ligadas ao fundo comunitário, 4%, e, neste momento, tem 71%.
Ora, isto não é comparável, porque, em 1995, não estavam distribuídas por distrito um conjunto de verbas do então Quadro Comunitário de Apoio e, portanto, do meu ponto de vista, não é possível comparar porque faltavam lá as verbas referentes à agricultura, à economia, com excepção das do FEDER, pelo que há aqui um problema de comparação que, repito, do meu ponto de vista, não é aceitável.
A Sr.ª Ministra falou ainda das verbas das SCUT e das auto-estradas no distrito de Braga e eu devo dizer-lhe que, para comparar a situação, precisava, de facto, de ter o valor do investimento relativamente a estas rubricas distribuído por distritos e penso que isso não é dado nos documentos que nos são fornecidos.
Acerca da questão da grande aposta do Governo na ferrovia, penso que há uma parte significativa do orçamento do Ministério do Equipamento Social virado para a ferrovia, mas se simultaneamente não for dito que o Governo, a par disso, se prepara para liquidar 800Km de via férrea - que é isso que está em cima da mesa -, em grande parte no interior do País, penso que estamos a dizer apenas uma parte da verdade.
Mas faço-lhe ainda uma pergunta, que continua sem resposta: quem vai suportar os custos de funcionamento das empresas que se pretendem desenvolver concretamente para a linha do Tua? Porque, na verdade, essas linhas vão dar despesa e, repito, quem é que vai suportar a despesa? Vão ser as autarquias locais? Os privados? Naturalmente que não acredito que sejam os privados a suportar esses custos!
Na verdade, esta situação é também extensível ao litoral, porque o Governo continua sem dar uma resposta cabal a dois problemas ferroviários, do meu ponto de vista decisivos, sobretudo, na área do Vale do Ave. Um é o problema de se manter desactivada a linha férrea da Póvoa, claramente com a impossibilidade de fechar a malha do metro do Porto, entre a Trofa e a Póvoa, por Famalicão, e o problema da ligação ferroviária entre Braga e Guimarães.
Porém, a questão "grossa" que queria colocar tem que ver com o problema do PIDDAC. A Sr.ª Ministra deve ter percebido mal, porque devo dizer-lhe que considero insuficientes as verbas para o distrito de Braga, como as considero para a generalidade do País e dos distritos.
Sr.ª Ministra, eu não disse que o distrito de Braga foi discriminado, o que eu disse foi que, do meu ponto de vista, os PIDDAC regionais continuam a enfermar de um problema, tornando-se não transparentes, não comparáveis e dificultando a abordagem destes documentos, isto é, o problema é dos critérios de distribuição das verbas do III Quadro Comunitário de Apoio na chamada rubrica não distribuída.
Portanto, gostaria de saber em que base é que o Governo distribui programas nacionais, investimentos que estão programados ao nível nacional, por distritos. É apenas isto! Já fiz esta pergunta ao Sr. Ministro da Agricultura, que não me responde, e pelos vistos vou continuar sem uma resposta nesta matéria.
Em teoria, podemos dizer que nenhum PIDDAC regional, nenhum PIDDAC distrital, pode descer, porque o Governo tem sempre a possibilidade de juntar-lhe uns milhões de contos do Plano Operacional de Economia e resolve o problema, isto é, sobe!
A Sr.ª Ministra falou no distrito de Braga, pelo que lhe digo o seguinte: para o distrito de Braga, estão previstos 14,7 milhões de contos de aumento; destes, mais de 7 milhões são do Plano Operacional de Economia, cuja verba global, do meu ponto de vista, distorce, completamente a visibilidade deste e de outros PIDDAC regionais.
Mas, depois, se formos às verbas distribuídas, não se diga que o distrito de Braga tem um grande investimento, pois, Sr.ª Ministra, os 7 milhões de contos a mais são para pagar obras em desenvolvimento: duas variantes em Braga, uma variante em Famalicão e a acessibilidade ao EURO 2004, que é a única obra nova no distrito.
O Governo, aparentemente, dá estes 7 milhões - que, aliás, já vêm de orçamentos anteriores não concretizados -, no entanto, retira 5 milhões de contos, que estavam previstos para o Hospital Distrital de Braga e mais 2 milhões de contos para a Escola de Ciências da Saúde, o que perfaz 7 milhões de contos, pelo que ficamos a zero!

A Sr.ª Presidente: - Para um pedido de esclarecimento adicional, tem a palavra o Sr. Deputado Machado Rodrigues.

O Sr. Machado Rodrigues (PSD): - Sr.ª Presidente, Sr.ª Ministra, rapidamente, depois de ter ouvido o que foi dito, nomeadamente por si, agora que se fala nas virtualidades da interioridade - e penso que tem algumas e tem também condições para serem aproveitadas -, e na sequência de um pedido que já lhe fiz anteriormente, a que a Sr.ª Ministra não respondeu, peço-lhe, de novo, que "apadrinhe" um pedido de alteração ao PIDDAC que consiste na previsão da ligação de Bragança à auto-estrada das Rias Baixas, isto é, até à fronteira.
Esta matéria vem já de há muito tempo e o Sr. Presidente da Comissão de Coordenação da Região Norte, que agora é membro do Governo, em Janeiro passado, disse que todos os estudos estavam feitos, que só faltava a posição política e que, provavelmente, se houvesse mais eleitores, era capaz de ser mais fácil a decisão precipitar-se.
Ora, isto disse um actual membro do Governo, que, na altura, repito, era o Presidente da Comissão de Coordenação da Região Norte, e como o que lhe estou a pedir, Sr.ª Ministra, tem inteiro cabimento na lógica que defendeu - e com alguns aspectos dos quais estou de acordo -, então, vamos lá concretizar essa lógica e tirar as ilações práticas que daí decorrem.

A Sr.ª Presidente: - Srs. Deputados, uma vez que estão findas as inscrições, tem a palavra a Sr.ª Ministra do Planeamento, para responder.

A Sr.ª Ministra do Planeamento: - Sr.ª Presidente, Srs. Deputados, responderei a algumas questões, passando, depois, a palavra ao Sr. Secretário de Estado, para completar.

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Sr. Deputado, tomei nota e sei da sua preocupação relativamente a esta ligação, a qual não é só sua, é também nossa. O Sr. Deputado sabe que há uma série de complexidades relativamente ao atravessamento de uma zona que é também, em termos ambientais, bastante complexa. De qualquer modo, repito, tomo boa nota dessa preocupação e penso que não será por falta de PIDDAC, ou de investimento, que isso se fará ou não, será, eventualmente, por outras razões que tornem o assunto mais complexo de resolver.
No entanto, penso que ainda estará prevista a reunião com o Sr. Ministro do Equipamento Social e penso que, nesse quadro, também terá respostas mais precisas.
Sr. Deputado Agostinho Lopes, quanto às questões que colocou, se o senhor pensa que Braga está mal tratada, o que é que lhe hei-de fazer?! Mas essa é uma posição ideológica e já não tem solução!

O Sr. Agostinho Lopes (PCP): - Estão todos os distritos, está todo o País!

A Oradora: - Sr. Deputado, aí estamos todos de acordo, pois todos gostávamos de ter condições para investir e para estimular mais o nosso desenvolvimento. Portanto, penso que sobre isso haverá, estranhamente ou não, uma unanimidade parlamentar.
Só para registo, gostaria ainda de referir o seguinte: relativamente aos investimentos homologados no norte, no que respeita aos apoios URBCOM, SIPIE, SIME, que estão agora em curso, a quota que, neste momento, o norte tem de projectos homologados é de 40% do total nacional e aí - se bem que não tenha esta discriminação feita por distrito -, posso dizer-lhe que entre os distritos com maior capacidade de apresentação de projectos figura, claramente, o distrito de Braga, como, aliás, o Sr. Deputado sabe.
Gostaria também de esclarecer uma matéria relativa às comparações entre 1995 e 2002. Não é, nem nunca foi, intenção do Governo, nesta matéria, fazer qualquer tipo de malabarismo relativamente às comparações do que era o PIDDAC regionalizado em 1995 com o que é o PIDDAC regionalizado em 2002. Todos nós sabemos e é público - aliás, o valor aparece nas próprias folhas do Orçamento - quanto é que estava regionalizado em 1995 e quanto é que está regionalizado em 2002, e passou-se de ordens de grandeza de 33 ou 34% para ordens de grandeza dos 70%, a partir, nomeadamente, de 1998, e agora andamos na ordem de grandeza dos 81 a 83%.
Na verdade, havia mais regionalização, por exemplo, no Orçamento de 2000 do que há em 2001 ou 2002, e naturalmente que se acresceu.
Aliás, isto foi pedido pelo Parlamento, porque se considerava que, quando não havia regionalização, havia um menor controlo sobre os investimentos. Na verdade, também nos parece mais importante ser mais transparente quanto aos investimentos, porque isso é que é importante, do que propriamente quanto ao "sobe e desce" anual, que me parece um exercício perfeitamente básico - excessivamente básico, se me permitem - para uma análise de quais são os projectos estruturantes para o desenvolvimento do País.
Portanto, não foi para mostrar que se crescia muito mas, antes, para se dar maior transparência e para também haver uma identificação maior dos políticos, de quem tem a opção política, com os projectos, em concreto, que se fez este exercício, e não por outra razão, de mostrar sempre um "sobe e desce", que penso ser quase uma desvalorização das funções parlamentares.
Volto a reafirmar que foi no meu próprio Ministério que tivemos a maior baixa de todos os ministérios e para o ano, se for necessário, faremos um reforço, ou não, conforme o País necessitar.
Assim, nesse tipo de exercício não há, digamos, qualquer tipo de ilusão estatística que queiramos veicular, desvalorizando a qualidade do debate.
Por isso mesmo, independentemente de dizermos que eram 6 milhões de contos e agora são 20 ou 30 milhões, o que é um facto absoluto, tal significa que 6 milhões de contos era a quantidade de investimento sobre o qual os Srs. Deputados, na altura, tinham controle e agora têm um controlo sobre um investimento discriminado de 20 milhões ou 30 milhões, o que lhes permite conhecer e identificar, de entre o que lá está, o que é ou não importante.
Dito isto, não deixa de fazer sentido - e foi nessa perspectiva, Sr. Deputado António Nazaré Pereira, que apresentámos gráficos, que continuam a ter validade - que, em matéria de taxa de desconcentração ou de regionalização para 2002, discriminemos quanto será investido no interior e quanto será investido no litoral, uma vez que para o regionalizado, digamos assim, de 1995 apresentámos os montantes para o interior e para o litoral. Quando se compara interior e litoral, em 1995, está a comparar-se valores que tinham subjacente a mesma taxa de regionalização para o interior e para o litoral, como o Sr. Deputado sabe.

O Sr. António Nazaré Pereira (PSD): - Olhe que não!

A Oradora: - A não ser que esteja a dizer que, na altura, se regionalizava menos o investimento que era para o interior, o que, de facto, é um pressuposto de que ainda precisa de fazer prova!
Portanto, admitindo que a taxa de regionalização era a mesma e não estava imbuída… - os senhores é que sabem, porque em 1995 eram os senhores que faziam as contas e, às tantas, havia aí alguma discriminação ao contrário...
Mas, dizia, admitindo que a taxa de não regionalização afecta tanto o interior como o litoral, a comparação que se fazia em 1995, em termos do que se destinava ao interior versus litoral (e que depois se compara com outra taxa, mas nessa taxa consistente interior versus litoral), permite-nos dizer que, de facto, esta ratio foi completamente invertida a partir de 1995, ano em que começou uma mudança que se consolida, nomeadamente a partir de 1998. Actualmente, a ratio é totalmente invertida, uma vez que temos 33% de investimento por habitante a mais para o interior, se compararmos com o litoral. É um facto, Sr. Deputado!
Assim, a comparação não apresenta qualquer descredibilidade se for feita com base na taxa de regionalização em 1995 e com base na taxa de regionalização que vigora em 2002, para o ano de 2002. Só assim é possível fazer esse tipo de comparações.
Por outro lado, se isso é verdade quando se compara 1995 com 2002, já não é verdade quando se compara 2001 com 2002, ou 2000 com 2002. Isto é, quando digo que em 1999 o investimento era x e em 2000 era y, as taxas de regionalização (até pelos níveis altos com que estamos a trabalhar) já não permitem a regionalização de muito mais,

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a não ser que se entre em níveis já um pouco filosóficos, porque há muitos projectos que, de facto são nacionais.
Senão, vejamos: a taxa de regionalização foi da ordem dos 80% em 1999, dos 84% em 2000, dos 82% em 2001 e dos 82% em 2002. Ou seja, as comparações interanuais a partir de 1999, ou até a partir de 1998, são perfeitamente compatíveis porque já não há mais oscilações dessa taxa de regionalização. Aliás, a sua elasticidade está superiormente limitada em virtude dos altos níveis que já atingiu.
Portanto, sobre esta matéria, gostava que ficasse absolutamente claro que a taxa é pública e, nesse sentido, não se pretende, de maneira alguma, passar um atestado de menor capacidade no que diz respeito à leitura destes números.
Relativamente a uma série de outras considerações que o Sr. Deputado teceu, designadamente no que refere ao meu aparente distanciamento em relação ao mundo rural, devo dizer-lhe que não há distanciamento algum da minha parte em relação ao mundo rural, Sr. Deputado.
O Sr. Deputado falou ainda da agricultura e do respectivo orçamento. Ora, o orçamento da agricultura reflectiu, como muito bem sabe, o fecho do II Quadro Comunitário de Apoio, o que exigiu, no ano passado, um acréscimo de 15 milhões de contos só para esse efeito. Ora, quando se entra em velocidade de cruzeiro, é evidente que há uma quebra, quebra que também se verificou no Ministério do Planeamento e no Ministério da Economia, ligada aos sistemas de incentivos e, portanto, ao fecho desses mesmos quadros.
Também gostaria de sublinhar que, para o Governo, o mundo rural é uma peça do apoio à interioridade. O problema da interioridade não é apenas um problema rural no sentido de política agrícola ou de instrumentos de intervenção agrícolas, é uma convergência de instrumentos nos quais se cruzam as acessibilidades, a disponibilidade de fontes energéticas alternativas, como é o caso do gás, de redes digitais, do acesso das câmaras municipais a fundos próprios e comunitários (que são hoje absolutamente incomparáveis com aquilo que foram durante muitos anos), incluindo também os sistemas de apoio à interioridade e o acesso a programas que discriminam positivamente as suas condições de desenvolvimento, como é o caso das AIBT e dos pactos territoriais.
É este conjunto que faz o apoio e a nossa preocupação com a interioridade e não, propriamente, a limitação sobre a agricultura enquanto tal, embora esta seja, como é óbvio, uma peça fundamental para esse desenvolvimento.
No entanto, sobre esta matéria, também gostava de dizer ao Sr. Deputado Agostinho Lopes que não tenho qualquer interesse, neste fórum (teria, eventualmente, se estivesse na carreira académica, que é a minha), em apresentar originalidades de desenvolvimento. Aliás, se quer que lhe diga, em termos destas dinâmicas, o que é preciso é persistência; às vezes, as originalidades têm-nos custado muitíssimo caro!
Se o Sr. Deputado entende que, finalmente, se começam a consolidar, e é isso que acontece nomeadamente com as cidades médias, alguns trabalhos feitos pela CCR Norte e que, na altura, o Engenheiro Valente de Oliveira trabalhou em termos de perspectiva e de desenvolvimento, ainda bem que assim é para todos nós, porque o processo de desenvolvimento mais equilibrado do País não se faz por saltos nem por inspirações momentâneas. Aliás, há toda uma vastíssima literatura nessa área, a nível europeu e não só. Portanto, não tenho qualquer interesse em ser original, tenho interesse, sim, em ser eficaz e em perceber que o País tinha dado saltos importantes neste esforço colectivo de desenvolvimento.
Portanto, quanto a originalidades, Sr. Deputado, será no foro da academia que terei de contribuir para "empurrar" as fronteiras do conhecimento. O que eu queria era contribuir para "empurrar" a qualidade de vida dos meus concidadãos.
Quanto às questões que me foram colocadas pelos Srs. Deputados sobre o INTERREG, peço desculpa por não me ter referido a elas, mas não as inclui no registo que fiz na altura.
Naturalmente, o INTERREG ainda não está aprovado e encontra-se numa fase intensíssima de negociação. É por isso - e não passa pela cabeça dos portugueses que não tenhamos acesso ao INTERREG quando estamos nas fases últimas de negociação - que é absolutamente essencial ter uma equipa permanente a trabalhar no fecho deste processo de negociação, até pela complexidade que caracteriza o próprio INTERREG. E, se quer que lhe diga, Sr. Deputado, ter-me-ia feito muito jeito, em termos de organização do Ministério, ter nomeado a equipa antes, porque os trabalhos preparatórios para fecho do INTERREG são brutalmente complexos na sua nova modalidade, exigindo negociações do lado espanhol e do lado português, identificação de projectos (há o INTERREG A, B e C).
Em suma, a lógica do INTERREG, com a necessidade de partirmos de projectos muito concretos e de articulações claras dos dois lados da fronteira, envolve, de facto, uma carga de trabalho absolutamente incomportável para ser inserida na máquina normal do Ministério. Aliás, vinha de trás a tradição de haver uma equipa INTERREG. Essa equipa foi mudada e, portanto, é preciso constituir uma equipa nova que dê, desde já, suporte técnico à última fase de negociação, que é, de facto, de uma intensidade brutal.
Quanto ao RIME, gostava de dizer que, neste momento, as CCR têm dentro dos seus cofres verbas suficientes para pagarem todos os projectos à medida que eles vão chegando. Portanto, se há atrasos… Em todo o caso, irei fazer um ponto de situação e terei todo o prazer em lho enviar. Mas, neste momento, os atrasos não podem ser imputados a faltas de dinheiro disponível para fazer os pagamentos, porque nas CCR não há atrasos de pagamento. Mas não posso dizer-lhe qual é o ponto de situação hoje, porque não vinha preparada para essa questão.
Poderá haver atrasos, talvez, na longa rede que foi montada para gestão do RIME, uma vez que entre a CCR, as entidades bancárias e as associações empresariais que foram envolvidas no processo poderão ocorrer atrasos no fluxo e no circuito, mas que não são atrasos de pagamento porque, neste momento, como lhe digo, não temos registo de qualquer incapacidade de pagamento, desde que o projecto esteja finalizado e em todas as condições para ser reembolsado. Pelo contrário, temos disponibilidades financeiras reservadas para esse efeito e que "bateram" bastante certo com aquelas que são as necessidades de financiamento. Em todo o caso, irei investigar também esse processo, para lhe dar uma resposta mais firme.
Quanto às questões sobrantes, era capaz de pedir ao Sr. Secretário de Estado do Planeamento para responder.

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O Sr. Secretário de Estado do Planeamento: - Sr.ª Presidente, julgo que ainda falta responder a algumas questões colocadas pelo Sr. Deputado Nazaré Pereira.
Em primeiro lugar, relativamente à questão das estimativas e da diferença dos valores, devo dizer que tal tem a ver com o seguinte: era difícil fazer uma previsão rigorosa das verbas a receber do QCA III quando o Orçamento do Estado para 2001 foi submetido à Assembleia da República, porque, julgo, na altura, ainda nem sequer tínhamos recebido a totalidade do pagamento por conta. E mesmo no que se refere à estimativa para o ano seguinte, e independentemente deste facto, tínhamos alguma incerteza, porque o método de reembolso que a Comissão pratica é inteiramente diferente do passado.
Por outro lado, há aqui uma variável que não está espelhada nestes quadros e também tem muita importância. Refiro-me ao reembolso dos saldos relativos ao QCA II. Portanto, posso dizer-lhe que a estimativa para o próximo ano, para 2002, que vos foi apresentada, não inclui apenas o QCA III mas também uma estimativa de reembolsos do QCA II, estimativa essa que depende, também, do próprio processo administrativo na Comissão Europeia e dos timings de reembolso dessas verbas que conseguirem. Ou seja, estamos perante um conjunto de factores de incerteza que faz com que seja impossível acertar exactamente, sendo que há aqui um facto, o pagamento por conta que nós recebemos nos três últimos meses do ano passado, que corresponde a um valor na casa dos 254 milhões de contos.
Devo dizer que não temos interesse algum em não ser absolutamente rigorosos nos números que apresentamos. Portanto, por vezes também há um factor de distorção que resulta de partirmos do valor que está na programação. Ora, nós sabemos, pela experiência que temos de Quadro Comunitário de Apoio, que raramente se atinge o valor da programação previsto para o ano. Aliás, como sabe, aquilo que é o perfil de Berlim foi imposto a todos os Estados-membros e nós preferíamos ter, naturalmente, um perfil crescente, que não temos, o que faz com que a nossa execução face à programação vá criando um catching up progressivo, à medida que o Quadro Comunitário de Apoio for avançado.
Mas, como digo, esta não é uma questão essencial, julgo eu, até porque temos usado, no Ministério do Planeamento, toda a transparência. Estivemos na Assembleia da República em Junho, apresentámos todos os documentos e as execuções de todos os programas.
É importante ter presente este aspecto porque o Quadro Comunitário de Apoio não tem uma taxa de execução; o Quadro Comunitário de Apoio tem 19 taxas de execução e, portanto, há programas que estão adiantados, outros que apresentam uma execução a decorrer com normalidade e outros ainda que precisam de recuperar essa execução. E nós, desse ponto de vista, temos sido absolutamente transparentes convosco, e faremos - a Sr.ª Ministra do Planeamento já o referiu publicamente - uma avaliação do primeiro ano de aplicação do Quadro Comunitário de Apoio, sensivelmente, no mês de Fevereiro.
Questionou-se ainda quanto tempo de aplicação temos de QCA III. Não me parece rigoroso dizer que estamos no terceiro ano, ou em vias de entrar no terceiro ano de aplicação do QCA III, quando a Comissão Europeia pagou a Portugal no último trimestre do ano passado. Portanto, as minhas contas apontam para pouco mais de um ano de aplicação do QCA III, e creio que o facto de, em apenas um ano, termos conseguido comprometer 1/3 das verbas que serão gastas até ao ano de 2008 é um feito importante, tal como já termos conseguido, até Setembro, executar praticamente metade do primeiro ano de programação que poderemos executar até ao final do ano de 2002. Até porque, nestas questões de execução, é importante que não se pague depois um preço em termos de qualidade, e nós queremos execução com qualidade, cumprindo com folga o que está previsto nos regulamentos comunitários.
Relativamente à questão dos próprios pagamentos, repare também que nós fomos um País que, durante o primeiro semestre, reclamou da Comissão Europeia o pagamento a tempo e horas. Ou seja, a Comissão Europeia não esperava que país algum fizesse tão rapidamente pedidos de reembolso em função da execução, situação que, graças à intervenção do Ministério do Planeamento, da Sr.ª Ministra, pôde ser regularizada, o que fez com que, nos últimos meses, ficássemos relativamente em dia.
Dir-lhe-ia também - e não gosto de ir lá muito atrás, pelo que não faço isto em jeito de crítica-, apesar de já lhe ter mostrado um gráfico na Comissão dos Assuntos Europeus, mas volto a fazê-lo porque estão aqui outros Srs. Deputados, que isto demonstra que, no ano de 1999, tivemos um ano de despesa pública a executar de 850 milhões de contos; o valor que estava programado nas perspectivas financeiras, em 1994-1999, era de cerca de 500 milhões de contos. A maior parte deste diferencial são verbas não executadas em 1994 e 1995; isto não tem da minha parte qualquer crítica a este respeito, mas nessa altura já o perfil era ascendente e não linear como é agora.
Ora, isto só demonstra que é perfeitamente razoável que a execução nos primeiros anos ande mais devagar que a programação, até porque agora temos uma programação que é linear, com phasing out em Lisboa e Vale do Tejo e mais 50% per capita para todas as regiões, quando no passado Lisboa e Vale do Tejo, que tem uma enorme capacidade de execução, não estava restringida e tínhamos um perfil ascendente.
Por último, gostaria de dizer que, face ao interesse que têm demonstrado - um interesse que põe o Quadro Comunitário de Apoio como a grande prioridade de investimento para o próximo ano -, penso que deveriam a reflectir a este propósito na vossa posição relativamente ao Orçamento. Se não tivermos Orçamento no dia 1 de Janeiro de 2002, corremos sérios riscos de perder fundos comunitários em 2002 e é fundamental para o investimento e para o Quadro Comunitário de Apoio ter Orçamento a tempo e horas. Já que têm essa preocupação, penso que essa reflexão devia pesar na vossa posição face ao Orçamento.

A Sr.ª Presidente: - Sr. Secretário de Estado, não vou comentar esta sua última frase.

Risos.

Srs. Deputados, dou por terminada esta sessão, agradecendo a presença da Sr.ª Ministra e do Sr. Secretário de Estado. Reiniciaremos os trabalhos às 15 horas, com a audição do Sr. Ministro da Saúde.
Está suspensa a reunião.

Eram 12 horas e 55 minutos.

Após o intervalo, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente Fernando Serrasqueiro.

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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos reiniciar os trabalhos coma a audição da equipa do Ministério da Saúde.

Eram 15 horas e 15 minutos.

Tenho já alguns Srs. Deputados inscritos, pelo que iniciaremos uma primeira ronda de perguntas, como é habitual, por um Deputado de cada grupo parlamentar e, posteriormente, o Sr. Ministro responderá em conjunto às questões colocadas.
Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Patinha Antão.

O Sr. Patinha Antão (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Ministro da Saúde, o Orçamento foi aprovado na generalidade, estamos em sede de debate na especialidade e o que nos parece fundamental é verificar, em termos gerais, se as políticas anunciadas pelo Sr. Ministro da Saúde, e que foram aprovadas no debate na generalidade, têm suficiente cabimento orçamental, isto é, se estão orçamentadas, ao nível das despesas, pelos valores que parecem razoáveis em função das tendências passadas e das novas políticas de saúde, que, necessariamente, têm de ter um reflexo orçamental, nomeadamente ao nível do crescimento da despesa.
Por outro lado, é também pertinente saber se, relativamente às políticas que foram aprovadas, a equipa governamental está disponível para considerar algumas alterações que possam ser tidas em conta - no nosso caso, há algumas políticas em que nos parece que deve ser considerada uma alteração da tónica ou da intensidade com que elas vão ser prosseguidas - e saber se há disponibilidade para que essas políticas sejam alteradas em função daquilo que nos parece ser essa intensidade desejável. Assim, admitindo que há essa disponibilidade, cabe-me também perguntar quais são os impactos orçamentais.
Relativamente aos elementos sobre a execução do Orçamento até ao final do ano de 2001 e a sua projecção para 2002, há também matérias que têm que ver com os elementos recentemente fornecidos pelo Sr. Ministro da Saúde.
Sr. Ministro, dentro deste enquadramento, em primeiro lugar, cabe-me fazer uma afirmação de ordem geral e, depois, prosseguir na sua fundamentação e no desenvolvimento dos pontos que referi na minha intervenção.
A observação de natureza geral que gostaria de fazer é que nos parece que as políticas que foram anunciadas por V. Ex.ª para o ano 2002 e o seu reflexo orçamental, bem como a projecção das tendências das políticas que estão em curso - e V. Ex.ª não disse que iria inflecti-las num sentido que implicasse a redução dos meios, nomeadamente correntes, que estão disponíveis para o Ministério -, cria, para nós, uma verdade factual indesmentível que é de que o orçamento da saúde, e em particular do Serviço Nacional de Saúde, que é o fundamental desse orçamento, mostra uma nítida desorçamentação.
Ora, este problema da desorçamentação pode e deve fundamentar-se, em termos objectivos, de várias maneiras, em particular recorrendo objectivamente aos elementos que V. Ex.ª recentemente nos facultou, já que ao fazermos esta apreciação podemos levantar questões pontuais sobre algumas rubricas fundamentais que estão nesses dados e sobre as quais não temos explicação bastante.
A desorçamentação é fundamentalmente uma situação em que, ao nível dos compromissos firmados em cada exercício, a reflexão na contabilidade nacional não está devidamente relevada. A contabilidade nacional processa-se numa lógica de compromissos, isto é, quando as decisões, nomeadamente de despesas, são tomadas elas devem ter reflexo nesse exercício. A contabilidade pública, como é sabido, é a reflexão da contabilidade por compromisso e da contabilidade nacional numa óptica de fluxos de caixa. Isto é, como não existe coincidência temporal entre o momento em que se tomam compromissos de despesa ou se relevam receitas que se pensa cobrar, os fluxos de caixa de uma e outra realidade, quando têm a sua previsão orçamental de recebimento ou pagamento, reflectem-se na contabilidade pública.
Ora bem, chamo a atenção de V. Ex.ª, com a devida vénia, para o conteúdo da Lei de Enquadramento do Orçamento do Estado, que foi aprovada nesta Câmara no passado mês de Agosto, cujo artigo 34.º obriga o Governo a apresentar uma memória descritiva que permita evidenciar todas as alterações numéricas de importância que expliquem a disparidade de números entre a contabilidade nacional e a contabilidade pública.
Nesse sentido, à falta da produção desses elementos adicionais - diga-se de passagem que, este ano, uma parte dessa obrigação está melhorada relativamente à prestação de elementos de anos anteriores - que VV. Ex.as entendam por bem apresentar-nos, verifica-se, objectivamente, uma desorçamentação, que é fácil de calcular.
O ponto de partida para esta apreciação genérica é o seguinte: VV. Ex.as apresentam-nos uma informação sobre a formação de défices de exercício, na óptica da contabilidade pública, nos anos de 1999, 2000 e 2001, que são da ordem dos 200 milhões de contos nestes 3 anos. Pergunto: qual será o valor desse mesmo défice de exercício para 2002, se não houver uma correcção dessas tendências? Bem, só poderá haver uma correcção dessas tendências se as principais despesas, que são despesas correntes, tiverem uma contenção muito pronunciada, para além dos ritmos de acréscimo que têm evidenciado nos últimos anos, nomeadamente no último ano de execução para o qual temos hoje elementos disponíveis. Ora, esses elementos dizem que as despesas de pessoal, grosso modo, aumentaram cerca de 11%.
No que diz respeito a despesas com aquisição de bens e serviços, que são fundamentalmente medicamentos adquiridos quer à indústria quer ao sector de distribuição - a APIFARMA e a Associação Nacional de Farmácias são as entidades fundamentais de relevo nesta matéria -, de acordo com os números do Ministério, houve um crescimento, no ano de 2001, de cerca de 9%. Pergunto: no Orçamento de 2002, existem explicações que nos permitam pensar que estas despesas se poderão conter num acréscimo de cerca de 4%, que é o previsto, globalmente, para o exercício de 2002?
A verdade é que, de acordo com explicações já apresentadas nesta Comissão, designadamente pelo Sr. Ministro das Finanças e pelo Sr. Secretário de Estado do Orçamento, o Governo pretende realizar esta contenção da despesa com pessoal, em termos globais, para as administrações públicas, através daquilo que foi referido como a decomposição no efeito volume. Isto é, a admissão líquida de funcionários que, segundo o Governo, será cerca de 0%, através do congelamento ou do esgotamento de todos os fenómenos anteriores de promoção de carreiras

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ou do congelamento ou esgotamento de reestruturações em curso, de tal sorte que, na decomposição destas despesas com o pessoal, o efeito líquido seja 0%.
Mais: o Governo disse, através do Sr. Ministro das Finanças e do Sr. Secretário de Estado do Orçamento, que, relativamente às chamadas despesas ou abonos variáveis - leia-se, fundamentalmente, horas extraordinárias -, tenciona fazer uma forte contenção ou, eventualmente, uma fortíssima contenção - creio que foi um destes adjectivos a ser utilizado.
Relativamente à área da saúde, parece-nos, salvo evidência em contrário - e agora pedimos uma explicação convincente e detalhada ao Sr. Ministro da Saúde e à sua equipa de Secretários de Estado -, que o efeito volume no sector da saúde, e em particular no Serviço Nacional de Saúde, será significativamente superior a 0%. Isto é, haverá uma admissão líquida de funcionários, seja qual for o seu vínculo, que prestem serviço no Serviço Nacional de Saúde, de tal sorte que haverá um volume significativo.
Ora, aqui entroncam as políticas que o Sr. Ministro da Saúde disse que eram fundamentais para 2002. Elas têm que ver, no que agora nos interessa, em matéria de reflexo orçamental, na circunstância de estarem previstas, por um lado, com a criação e dotação em pessoal de vários centros de saúde com reflexos importantes e, por outro, com dotações reforçadas ao nível de pessoal, nomeadamente nos hospitais que estão integrados no Serviço Nacional de Saúde. Pergunto: qual é o efeito volume que suporta a execução das políticas de saúde que o Sr. Ministro viu aprovadas no Orçamento na generalidade? Diga-nos também, relativamente aos funcionários, onde vai haver um aumento líquido, se possível decompondo em categorias profissionais, nomeadamente no que respeita a médicos, enfermeiros e agentes em saúde.
Por outro lado, pode dar-nos a garantia de que não haverá qualquer efeito orçamental em matéria de promoções e que não haverá também qualquer outro efeito em matéria de reestruturações? Mas faço aqui uma ressalva: o Sr. Ministro da Saúde disse, por exemplo, que uma medida que tomará, no ano 2002, será a de resolver e executar compromissos anteriores ainda não executados. Refiro-me, por exemplo, à dotação, em pessoal, das farmácias hospitalares, uma das medidas que foi e é sublinhada como sendo indispensável cumprir - refiro esta a título de exemplo, mas outras haverá.
Assim, pergunto quais são os efeitos das reestruturações, nomeadamente neste caso, e pergunto se ele vai avante ou não, bem como se haverá outros que não irão.
Finalmente, quanto às horas extraordinárias, sendo que, de acordo com os números referidos pelo Ministério, salvo erro cerca de 36% das despesas com pessoal, em termos globais, são relativos a horas extraordinárias…

O Sr. Ministro da Saúde (Correia de Campos): - De médicos e enfermeiros!

O Orador: - Agradeço-lhe, Sr. Ministro, e V. Ex.ª far-me-á o favor de me corrigir, na sua resposta. Em todo o caso, parto com a convicção de que é um número muito significativo.
Gostaria de saber se também nesta matéria o Ministério está em condições de nos dizer qual vai ser o acréscimo ou decréscimo na rubrica das horas extraordinárias, já que nenhum de nós ignora que esta é uma componente importantíssima e indispensável (pelo menos até agora e a não ser que haja qualquer reestruturação profunda) para um funcionamento minimamente satisfatório dos principais serviços de natureza hospitalar, para não me referir a outros.
Pelo contrário, e referindo agora um aspecto fundamental, a expectativa da generalidade dos utentes é a de que a melhoria generalizada e ansiada pela população em geral dos cuidados de saúde obrigará (a não ser que haja fortíssimas medidas de redução de desperdícios que possam compensar) a um acréscimo muito significativo das dotações, nomeadamente em recursos humanos, pelo menos ao nível das horas efectivamente trabalhadas, em benefício dos utentes.
Encerrada esta matéria do pessoal, gostaria de colocar…

O Sr. Presidente (Fernando Serrasqueiro): - Sr. Deputado, tínhamos combinado um limite de 5 minutos para a primeira intervenção…

O Orador: - Sr. Presidente, peço desculpa, mas não ouvi essa combinação. Em todo o caso, vou terminar logo que possível.
Quanto à matéria das despesas com medicamentos, gostaria de referir que ainda hoje, em sede da Comissão de Saúde e Toxicodependência, ouvimos a Associação Nacional de Farmácias referir-nos que o Ministério da Saúde tem vindo a pagar, ao longo da execução do ano 2001, a facturação corrente em cerca de 50%. Também sabemos da conclusão, anunciada por V. Ex.ª, de um protocolo com a APIFARMA, segundo o qual, no próximo ano, se os medicamentos à porta da fábrica aumentarem acima dos 6,5%, a indústria devolverá esses aumentos ao Ministério.
Como tal, parece-nos lógico assumir que, a não ser que haja alguma medida de fundo não incluída nas políticas que anunciou, haverá a expectativa de um crescimento das despesas com medicamentos muito acima dos 4% globais do aumento. Gostaríamos, pois, de saber qual é esse valor.
Por outro lado, e passando rapidamente à conclusão, nos números orçamentados para o ano 2002, na óptica da contabilidade nacional, verificamos que há, nomeadamente ao nível dos subcontratos para produtos farmacêuticos, a previsão de uma verba da ordem dos 227 milhões de contos de compromissos, sendo que, na óptica da contabilidade pública, verificamos a existência de uma verba de 150 milhões de contos. Isto é, pretende-se pagar 150 milhões de contos, sendo que os compromissos serão de 227 milhões de contos. Sr. Ministro da Saúde, se isto não evidencia uma desorçamentação nesta matéria, não consigo encontrar outra explicação!
Quero ainda sublinhar, nesta intervenção sucinta, que, a nosso ver, esta desorçamentação que aqui explicitei (e poderia continuar a explicitar, sobre outras rubricas) incorre na violação do artigo 22.º da lei do enquadramento orçamental, que obriga a que os saldos de exercício sejam nulos ou positivos para os fundos e serviços autónomos, como é o caso do Serviço Nacional de Saúde. De facto, a não ser que V. Ex.ª nos informe de que não haverá produção de défice de exercício no ano 2002, o Governo incorre, a nosso ver, na violação deste artigo 22.º.
Quanto às políticas em concreto sobre as quais gostaríamos de saber se existe disponibilidade por parte de V. Ex.ª para corrigir a tónica ou a intensidade daquilo

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que pretende realizar, gostaria de chamar à colação, apenas como exemplo, a política relativa à redução das listas de espera em consultas e cirurgias.
V. Ex.ª teve oportunidade de informar a Comissão que actualmente essa lista de espera ronda, grosso modo, as 100 000 situações (ou 80 000, ou 90 000, V. Ex.ª dirá) e também teve ocasião de nos informar que tem havido algum progresso ao nível da execução dessa mesma política. Verificamos que V. Ex.ª orçamentou, para o ano 2002, para o Programa Acesso, relativamente às listas de espera, uma verba da ordem dos 10,5 milhões de contos e gostaríamos de perguntar o seguinte: sendo certo que a verba que V. Ex.ª diz que vai executar em 2001 é de 9,9 milhões de contos (são números fornecidos por V. Ex.ª), podemos deduzir que, na prática, não há uma intensificação da resolução deste problema?
Sr. Ministro da Saúde, no interesse da generalidade dos utentes - e digo-o sem demagogia -, que V. Ex.ª ouve, diariamente, nas televisões, na imprensa, sabendo-se perfeitamente que este é um dos problemas mais gritantes em matéria de anseios pela melhoria da saúde, pergunto se V. Ex.ª não é capaz de produzir ou de nos acompanhar num pedido que insistentemente temos feito a quem governa, desde 1998, quando apresentámos, nesta Assembleia, uma proposta para resolução urgente e drástica das listas de espera, dotadas, em 1998, com a verba de 12 milhões de contos, o que hoje significa, pelo menos, 15 ou 16 milhões de contos. V. Ex.ª não nos acompanha no reforço imediato e urgente, em sede de especialidade, pelo menos em 50% da verba que orçamentou, para ir, repito, ao encontro desta necessidade urgentíssima e que, aliás, a sua antecessora tinha definido como a primeiríssima prioridade da sua política? E peço desculpa a V. Ex.ª por sublinhar que não o ouvi referir que, para si e para a sua equipa, essa seria, este ano, a primeiríssima prioridade!

O Sr. Presidente (Fernando Serrasqueiro): - Tem agora a palavra o Sr. Deputado Victor Baptista.

O Sr. Victor Baptista (PS): - Sr. Presidente, Sr. Ministro da Saúde, V. Ex.ª tem um orçamento para 2002 que, ao contrário do que se possa pensar e é referenciado, me parece de grande contenção. E de grande contenção desde logo porque, ao nível da afectação de recursos, em termos do seu relacionamento com o PIB, mantêm-se os 5% que já estavam previstos em 1995, sendo que, de resto, esta afectação tem sido desenvolvida desde 1995 para cá.
Por outro lado, é certo que já foram abertas, só em 2001, mais 595 camas, sendo certo que há, desde 1997, 2583 novas camas. Temos tido mais consultas, o Sr. Ministro anuncia investimentos, nomeadamente de melhoria, reconversão e beneficiação de 200 instalações de centros de saúde, a construção de novos hospitais, alguns já em curso e outros a lançar (10 novos hospitais), e a melhoria das condições em 82 hospitais.
Há, portanto, um grande investimento ao nível da melhoria dos cuidados de saúde a prestar, e isso teria, porventura, pressuposta a necessidade de mais recursos financeiros, mas o certo é que me parece que o Sr. Ministro tem, e bem, uma clara estratégia, em termos de futuro do funcionamento do Ministério de Saúde e, em particular, do Serviço Nacional de Saúde, dizendo, nomeadamente nas linhas estratégicas, que é preciso preparar o futuro e começar a descentralizar.
Ao nível de preparar o futuro, o Sr. Ministro é, de forma significativa e relativamente aos últimos anos, inovador, dado que fala, por exemplo, da perspectiva de parcerias públicas/públicas ou públicas/privadas. Há já alguns exemplos dessas parcerias e a primeira questão que lhe colocaria é a de saber se está convicto de que elas irão contribuir, ou não, para uma maior contenção da despesa pública com os gastos da saúde ou, por outras palavras, se admite que isso poderá levar à resolução de um défice crónico que existe desde 1991 (se formos verificar, desde 1991, veremos que temos sempre tido défice na saúde) e se isso poderá ou não levar à inversão de tudo o que se passava na saúde, em termos de défice orçamental.
Outra questão que lhe queria colocar prende-se com o seguinte: temos vindo a assistir a um conjunto de intervenções em que me parece que, de sessão para sessão, ou de reunião para reunião, quer seja na discussão na generalidade, quer seja na especialidade, se levanta sempre o problema do não cumprimento da lei de enquadramento orçamental e, porventura, até do não cumprimento da lei orçamental, particularmente quanto ao artigo 57.º.
É preciso, desde logo, clarificar que estamos na discussão, na especialidade, do Orçamento para 2002 e parece-me que, neste Orçamento, não há absolutamente nada relativamente ao artigo 57.º, sobretudo, e em particular, a violação do princípio da anualidade. O princípio da anualidade relaciona-se com a despesa e a receita efectivas (ou geradas, se assim o quisermos dizer) do ano 2002, pelo que nada tem a ver com o ano 2001.
Ora, o artigo 57.º define um conjunto de 444 milhões de euros (qualquer coisa próxima dos 86 milhões de contos) para resolver encargos assumidos e não pagos durante 2001. Este artigo 57.º remete depois, através do artigo 66.º, ainda não referido, para o endividamento líquido, e remete bem, dado que há duas formas de endividamento líquido: por um lado, o endividamento líquido e o financiamento necessário para o Orçamento do Estado para 2002 e, por outro, aquele que, claramente, está previsto no artigo 65.º, sendo que, depois, o artigo 66.º fala nos encargos assumidos e não pagos não só do ano 2001 como também - lá está - relacionados com um conjunto de pagamentos referentes ao ano 2000.
Não há, pois, aqui, nenhuma violação do princípio da anualidade do Orçamento, sobretudo e em particular, pois é isso que estamos a discutir, do Orçamento para 2002.
Sobre a lei de enquadramento, não vejo onde é que ela possa estar afectada. O Sr. Ministro distribuiu um mapa onde apresenta, sobretudo em termos de contabilidade pública, um orçamento equilibrado. Como tal, também não vejo aqui nenhuma violação ao princípio do equilíbrio ou de qualquer outro, em termos da lei orçamental.
Julgo que o Sr. Ministro tem, de facto, um grande desafio pela frente, no ano 2002, sobretudo numa questão que me parece fundamental, da qual tem vindo alguma ideia à opinião pública e à qual o Sr. Ministro tem feito algumas referências, ficando-se, contudo, na dúvida se são ou não para executar.
A segunda pergunta que faço é, pois, a de saber se o Sr. Ministro está disponível para, no ano 2002, e com que timing, começar a "mexer" num aspecto fundamental como é o dos conselhos de administração e, a meu ver, bem, porque isso poderá ter consequências ao nível orçamental. De resto, é fácil ser gestor ou responsável de um serviço quando se pede, sempre que há necessidades financeiras,

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ao Ministério da Saúde e ao Governo que resolvam! É que, de facto, não há o princípio da responsabilização desses gestores em função do orçamento que lhe foi aprovado. Como tal, pergunto qual é o timing que o Sr. Ministro tem, porventura, equacionado para "mexer" numa questão que me parece que pode ser uma boa contribuição, em termos orçamentais, para o ano 2002.
Para já, faço-lhe estas duas perguntas.

O Sr. Presidente (Fernando Serrasqueiro): - Tem a agora a palavra o Sr. Deputado António Pires de Lima.

O Sr. António Pires de Lima (CDS-PP): - Sr. Ministro, Sr. Secretário de Estado, tenho algumas questões para colocar.
Penso que é a vigésima vez que se faz este protesto na discussão deste Orçamento, mas começo por manifestar, mais uma vez, a minha estranheza pelo facto de continuarmos sem elementos que nos permitam atestar as contas do Serviço Nacional de Saúde, nomeadamente, o seu défice e o seu financiamento para o próximo ano.
Portanto, fez-se um orçamento do Ministério da Saúde para o ano de 2002, mas aquilo que era implícito estar no Orçamento, o Serviço Nacional de Saúde e a forma como ele é financiado, ao nível das receitas e das despesas, não existe, não está disponível para o ano 2002.
Portanto, os elementos que continuo a ter dizem única e exclusivamente respeito ao ano 2001.

O Sr. Presidente (Fernando Serrasqueiro): - Sr. Deputado, posso precisar melhor. Houve uma distribuição, aquando da discussão na generalidade, de uns documentos relativos à conta de exploração de 2002. Por isso, não sei quais os elementos a que se está a referir.

O Orador: - Tenho os elementos referentes ao último trimestre de 2001. Pode ser que a falta seja minha e, nesse caso, penitencio-me.

O Sr. Presidente (Fernando Serrasqueiro): - Foram distribuídos, Sr. Deputado, pelo que, se quiser, a Mesa fá-los-á chegar.

O Orador: - Agradeço que os elementos relativos ao Serviço Nacional de Saúde do próximo ano me sejam enviados, se é que eles existem, pedindo desculpa pelo meu comentário, que, provavelmente, terá sido "destemperado".
Tenho ainda mais algumas questões relativas ao Serviço Nacional de Saúde e, nomeadamente, gostaria de ver esclarecida uma questão, que coloquei no debate na generalidade, relativa à discussão do mito da gratuitidade do Serviço Nacional de Saúde.
Temos vindo a defender que, de forma a que se possa caminhar para um Serviço Nacional de Saúde mais equilibrado e racional do ponto de vista da gestão, se devia pôr em causa esse mito, o princípio da gratuitidade, ao qual a Esquerda tem estado supervinculada, nomeadamente porque nos parece que, para aqueles agregados que auferem rendimentos mais altos, ainda que pagando taxas moderadoras, deveria ser instituído um princípio de selectividade que permitisse a estas pessoas irem pagando parte das despesas que fazem. Isto permitiria, seguramente, a existência de uma maior racionalização da utilização do Serviço Nacional de Saúde, nomeadamente ao nível dos gastos com medicamentos, que têm vindo a crescer de uma forma exponencial.
Constatámos, no debate na generalidade, que o Sr. Ministro se mostrou disponível e aberto a considerar pôr em causa o princípio da gratuitidade, tendo-se refugiado (é este o melhor termo que encontro), no entanto, num pretexto prático para não o executar. Disse concretamente que seria muito difícil avançar para um princípio de selectividade, no que diz respeito ao pagamento das despesas do Serviço Nacional de Saúde, porque isso implicaria ter um sistema de controlo diferente para os vários tipos de rendimento.
Quero aproveitar esta oportunidade para saber se, na prática, é esta a única dúvida que tem relativamente ao fim do princípio da gratuitidade, porque me parece que se é esta a questão, ela é, ou será, ultrapassável, e parece-me até que existem exemplos noutros países que poderão, obviamente, ser aplicados em Portugal.
Portanto, quanto à gratuitidade, pergunto: sim ou não? E gostaríamos ainda de saber se está eventualmente disponível para pôr em causa este princípio, se está a aberto a estudar possibilidades que nós próprios gostaríamos até de estudar e de lhe apresentar no sentido de este princípio da selectividade passar a ser implementado nos próximos anos.
Uma segunda questão que quero colocar tem que ver com o Serviço Nacional de Saúde e com o recurso a este serviço por parte dos imigrantes.
Portugal tem tido uma política - que, aliás, o CDS-PP tem criticado - de portas muito abertas relativamente à imigração. Só este ano, segundo consta, entraram em Portugal mais de 100 000 imigrantes e tem vindo a ser constituída uma bolsa sem grandes direitos, com muito pouco controlo e que tem servido de mão-de-obra barata para uma série de actividades, nomeadamente na área da construção civil, às vezes cumprindo regras extremamente complicadas em termos de trabalho e sem haver grande controlo por parte das autoridades oficiais.
Ao que parece, pelos dados de que dispomos, estes imigrantes, apesar de pagarem as taxas que lhes correspondem pelos salários que recebem, não têm acesso a nenhum tipo de apoio ao nível do sistema nacional de saúde. Assim, gostaria, por um lado, que o Sr. Ministro me confirmasse este dado e, por outro, que nos dissesse se lhe parece legítimo que se arrecadem cerca de 30 milhões de contos por ano, através das comparticipações que estes imigrantes fazem, nomeadamente para a segurança social e para o Serviço Nacional de Saúde, e que se continue a negar, no Orçamento para 2002, o apoio a esta força de trabalho que nós próprios decidimos deixar entrar no País.
Uma outra questão que gostaria de colocar tem que ver com o realismo deste Orçamento para 2002.
Estive a ler algumas intervenções e declarações de administradores de hospitais, que é suposto, obviamente, merecerem a confiança do Ministério, e refiro, por exemplo, algumas entrevistas do Dr. Caldeira Pinto, que é o administrador-delegado do Hospital de Santa Maria, que disse, suponho que de uma forma bastante realista, que o Orçamento para 2002, no que diz respeito a esse hospital, é tecnicamente impossível de cumprir. E depois explica porquê, dizendo que, se não forem mudadas as regras que modifiquem os comportamentos e os hábitos instituídos no funcionamento do hospital, não é possível fazer decrescer as despesas do mesmo e explica ainda que o Estado sabe

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que, ao nível do Orçamento para 2002, estão subfinanciadas as actividades deste hospital. E até dá um exemplo, que contradiz aquilo que o Sr. Ministro disse, na discussão na generalidade, relativamente ao controlo dos gastos com pessoal.
O Sr. Ministro disse que, no próximo ano, iríamos assistir a um forte controlo dos gastos com pessoal na área da saúde, que não cresceriam mais do que 5%, mas o administrador-delegado do Hospital de Santa Maria disse que as despesas de pessoal, no próximo ano, no Hospital de Santa Maria, vão crescer 11,5%, só por efeito automático, que é exactamente o valor de crescimento neste ano.
Em primeiro lugar, quero saber se o Sr. Ministro partilha do conjunto de opiniões manifestadas nesta entrevista feita ao Diário Económico por um administrador-delegado do Hospital de Santa Maria, que tem grandes responsabilidades.
Caso não partilhe das suas opiniões, gostaria de saber que medidas é que vai tomar, porque não nos parece muito razoável que, nesta matéria, haja uma discrepância de fundo entre o Ministério da Saúde e os administradores que são responsáveis pela gestão dos hospitais, nomeadamente o de um hospital com esta importância e que se expôs a manifestar, de uma forma pública, a sua discordância e a impossibilidade técnica de cumprir com um orçamento que lhe acabava de ser comunicado.
Finalmente, gostaria de colocar uma última questão, ainda relativa aos gastos com pessoal.
Tivemos a confirmação, aquando da discussão na generalidade, de que as horas extraordinárias (e este ponto já foi abordado anteriormente) têm um peso enorme nas despesas com o pessoal do Ministério da Saúde. O Sr. Ministro referiu um número absolutamente extraordinário, referiu que mais de 36%, salvo erro, das horas trabalhadas na área da saúde são extraordinárias. Gostaria de saber o que é que isto significa em termos de números.
A previsão das despesas com pessoal, para este ano, é de 573 milhões de contos (é o último número referido pelo Ministério da Saúde para este ano). Destes 573 milhões de contos, quantas dezenas de milhões de contos - aliás, creio que são centenas - é que são afectas ao pagamento de horas extraordinárias e qual é o montante de pagamento de horas extraordinárias que o Sr. Ministro tem como objectivo para o ano 2002? Isto é, que tipo de objectivo, em termos de percentagem e de valor absoluto de gasto, está implícito neste orçamento para a saúde quanto às horas extraordinárias para o ano 2002?

O Sr. Presidente (Fernando Serrasqueiro): - Tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Louçã.

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Sr. Presidente, até agora tem havido uma insistência importante no risco de desorçamentação nas contas que o Ministério apresenta. Creio, em contrapartida, que é fundamental insistir no risco - esse, sim, muito mais importante - de suborçamentação deste Ministério e, em particular, do Serviço Nacional de Saúde.
Aliás, como se viu pelos mapas distribuídos pelo Ministério no debate na generalidade, há um cálculo aproximado em função de despesas ainda não completamente contabilizadas deste ano, como é natural, e, como é mais surpreendente, do ano anterior. Os Srs. e as Sr.as Deputadas terão verificado que as contas desses mapas referentes ainda ao ano de 2000 continuavam a ser provisórias.
Mas creio que, face aos problemas existentes ao longo deste ano, o problema mais importante em relação ao qual nos arriscamos a sofrer no próximo ano é não tanto o da desorçamentação, mas, muito mais grave do que este, o da suborçamentação. Tanto mais que este Ministério herda, do mesmo Governo, uma situação difícil.
Há cerca de seis meses, foi apresentado um plano de redução da despesa pública que previa que, num prazo curto, fossem poupados 65 milhões de contos de despesas previstas no âmbito da saúde sem que, no entanto, na altura, tivéssemos tido conhecimento - e não o temos ainda hoje - da forma como eram obtidos esses ganhos. Uma parte referia-se, por exemplo, à "empresarialização" de alguns hospitais, se bem que não nos tivesse sido dito (e ainda não nos foi dito neste debate na generalidade) de que modo é que essa "empresarialização" afectaria as contas do sistema de saúde.
E as dificuldades são tanto maiores quanto se agravam noutras matérias. O Governo deu alguns sinais positivos no sentido de retomar políticas de contratualização, de avançar com a renovação do pessoal nas farmácias hospitalares, de avançar com projectos de centros de saúde da terceira geração, o que terá alguns impactos significativos na gestão do sistema e que podem ser muito importantes.
No entanto, no debate na generalidade, na proposta de lei e nos mapas que a acompanham, há pouca definição sobre as matérias que agora, no debate na especialidade, é altura de esclarecer, nomeadamente sobre os planos do Ministério para o próximo ano e sobre os seus efeitos, em termos orçamentais, em todas estas matérias.
Creio, por isso, que tem sentido continuar a insistir na proposta de que o debate sobre a saúde, no âmbito orçamental, seja meramente um preâmbulo para o debate mais geral que é preciso ter sobre aquilo que foi anunciado como uma reforma de fundo a ser desenvolvida por este Governo, que é a reforma do sistema nacional de saúde, da sua organização, da sua gestão, do seu planeamento, das suas formas de contratualização e também das suas formas de controlo do ponto de vista orçamental.
A não existir esse debate, creio que nos arriscamos, com qualquer Ministério que seja e mesmo, porventura, com qualquer governo que seja, a termos sempre uma gestão difícil de contas por pagar, que transitam de um exercício para o outro, e de uma grande instabilidade de políticas.
Queria, no entanto, no âmbito desta discussão, e porque é uma discussão de especialidade e com uma expectativa (pelo menos da nossa bancada, mas, provavelmente, também de outras bancadas da oposição) de que o debate em Plenário e a votação final pouco mais vá ser do que uma repetição do que já houve na especialidade, repetição em que, seja por convicção seja por conveniência, se forma uma maioria suficiente para poder afastar qualquer proposta de detalhe de qualquer partido da oposição, queria aproveitar para insistir num ponto, que é um ponto menor face a estes mas em que penso que o Governo poderia ser sensível a alguma argumentação económica, se ela tiver validade. Esse ponto é o que diz respeito aos impostos especiais de consumo, previsto no artigo 84.º do Código dos Impostos Especiais de Consumo, sobre o tabaco.

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Até agora, o Governo deu-me duas respostas sobre este assunto: uma, muito entusiasmante, do Sr. Ministro da Saúde, dizendo que as coisas estavam a correr bem e que a "adição" do tabaco estava a diminuir, em Portugal. A outra resposta, mais prosaica, do Sr. Ministro das Finanças, é que o objectivo desta medida de redução dos impostos sobre cigarrilhas e charutos tinha como função, não tanto aumentar as receitas fiscais por via do aumento da venda desses produtos, mas substituir, na venda, aquilo que é a parte do mercado ocupada por importação a partir de Espanha para consumo individual.
Ora bem, brevemente, eu queria apreciar estes argumentos, particularmente o segundo, porque a resposta do Sr. Ministro das Finanças remeteria para um âmbito completamente distinto do desta sessão se se admitisse que é verdade que esta política tributária não aumenta o consumo. Se assim fosse, era meramente uma questão de técnica fiscal.
Ora, há três formas de consumir charutos e cigarrilhas: uma é o contrabando, e a isso não se pode responder (suponho que não seja intenção do Governo responder-lhe com alguma política fiscal, porque a única política fiscal efectiva era transformar os impostos em zero, de tal modo que o problema não se colocasse); a segunda traduz-se nas compras para consumo individual feitas em Espanha, com impostos mais baratos do que em Portugal; a terceira é a compra para consumo individual feita em Portugal, com impostos mais caros.
É claro que, havendo este diferencial de impostos, uma parte importante dos consumidores abastece-se mais barato em Espanha e, portanto, paga impostos em Espanha e não paga impostos em Portugal. Isto poderia sugerir - porventura, é esta a razão económica - que, então, se os impostos fossem diminuídos em Portugal, podia haver um aumento da receita fiscal.
O problema é que Espanha está longe de Portugal, alguns quilómetros, o que significa que, além do benefício que o consumidor individual obtém por comprar produtos para o seu consumo privado em Espanha, beneficiando do diferencial do preço, o consumidor tem um custo para obter esse diferencial do preço, que é o custo do transporte. A não ser que se trate, Sr. Deputado Fernando Serrasqueiro, de contrabando! Mas isso também tem custos de transporte.
Portanto, basicamente, o problema é este, a não ser que o Governo diga que fez o cálculo da elasticidade da procura/preço e que ela é totalmente rígida, pois isso quereria dizer que o consumidor consome exactamente os mesmos produtos, a qualquer que seja o preço e a qualquer que seja o imposto, pois, então, neste caso, e só neste caso, será verdade que a diminuição dos impostos não implica a possibilidade do aumento do consumo.
Mas a não ser assim, a política que o Governo propõe não tem justificação confessável porque, além do que diz o Sr. Ministro das Finanças, continua a ser verdade que essa medida, aumentando ligeiramente, porventura, a recolha e a tributação de impostos, também aumenta o consumo e convida ao aumento do consumo. Portanto, é também um problema de saúde pública.
Creio que é sobre isto que o Governo tem de fazer alguma escolha, porque se o seu argumento for o de que é preciso mais receitas tributárias, esse é um argumento duvidoso e, sobretudo, é um argumento incoerente com a restante política tributária do Governo, em muitas outras matérias; mas, em contrapartida, significa também aceitar o custo, que é um custo de saúde, do aumento do consumo desses produtos.

O Sr. Presidente (Fernando Serrasqueiro): - Tem a palavra o Sr. Deputado Bernardino Soares.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Ministro da Saúde, o primeiro grupo de questões tem que ver com os protocolos e os acordos com a indústria farmacêutica.
Na sua intervenção no debate na generalidade, o Sr. Ministro disse-nos que o Governo tinha a expectativa de recuperar, por via deste protocolo, 22 milhões de contos, em três anos. Isto consta na sua intervenção. Ora, a verdade é que temos de apreciar exactamente como é que a indústria consegue compensar estes 22 milhões de contos que, eventualmente, devolverá ao Serviço Nacional de Saúde, por via das próprias regras que estão no protocolo.
A primeira questão prende-se com a simplificação dos processos administrativos de aprovação de autorizações de introdução no mercado e de comparticipações de medicamentos. Eu queria perguntar ao Sr. Ministro e aos demais Membros do Governo se há hoje um incumprimento generalizado ou significativo dos prazos estabelecidos na lei para as autorizações de introdução no mercado e para a avaliação da questão das comparticipações. É que só havendo um incumprimento generalizado no INFARMED é que se justificará alguma revisão, a não ser que a revisão seja para aligeirar processos de avaliação e permitir, assim, quer uma mais rápida introdução no mercado quer uma maior dependência em relação aos dados da indústria no que respeita à avaliação de cada medicamento.
Outra questão refere-se à possibilidade de se deduzirem estas verbas devolvidas ao Serviço Nacional de Saúde em IRC, o que significa que, se elas deixam de ser tributadas, há aqui uma quantia considerável de que a indústria beneficia, por via de não lhe serem tributados estes montantes que devolve ao Serviço Nacional de Saúde em IRC. Portanto, gostava de saber quanto é.
Penso que seja um número à volta dos 6 milhões de contos, no total dos três anos, e que, portanto, temos de diminuir aos 22 milhões de contos, desde logo, estes 6 milhões de contos.
Depois há o problema do aumento de 2,5% para todos os medicamentos, a entrar em vigor em 2002, o que significa que, se tomarmos em consideração um mercado nacional à volta dos 600 milhões de contos - julgo que este número não andará muito longe da verdade, mas pode ser um número de referência, mais adiante ou mais atrás, não é muito significativo -, com este aumento de 2,5%, a indústria vai aumentar os seus proveitos na venda dos medicamentos em 15 milhões de contos, só em 2002.
Portanto, afinal, onde é que está a vantagem para o Serviço Nacional de Saúde? Suponho que o Governo tem essas contas, mas no debate na generalidade não as deu.
Quanto é que vai custar este aumento, nas comparticipações dos medicamentos que o Estado suporta? É que, porventura, estamos aqui aumentados os encargos do Estado, por via das comparticipações, por causa de um aumento geral que o próprio Governo aceitou. Portanto, pergunto: quanto é que isto custa?

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Este protocolo, evidentemente, não tem qualquer perspectiva nem qualquer filosofia de moralização ou de compromisso da indústria, como o Governo afirmou no debate na generalidade, para a contenção do consumo com medicamentos, porque essas boas intenções, mesmo se acreditássemos nelas, são depois desmentidas pelos factos concretos, e um deles é que, prevendo para 2001 o tal acordo, no sentido de que acima dos 10,5% deixe de haver ressarcimento do Serviço Nacional de Saúde, nós sabemos que este ano o crescimento já está acima dos 10,5%, no que diz respeito à despesa com medicamentos. Consequentemente, o Governo fez um acordo com a indústria em que aceitou uma taxa de aumento inferior à que efectivamente já se sabia que ia verificar-se e, a partir daí, permitindo que não houvesse ressarcimento acima desse número.
Na verdade, o que se passa aqui é que a indústria continua a ter na mão o controlo da despesa com medicamentos, quer por via da pressão sobre a prescrição quer mesmo por via do que diz respeito à venda aos próprios hospitais. É que o Governo também ainda não esclareceu por que é que há disparidades enormes - algumas de 1000% e 2000% -, de hospital para hospital, entre os preços que cada hospital consegue para comprar determinados medicamentos.
Pergunto, pois, como é que o Governo admite que haja diferenças brutais em relação ao preço a que cada hospital consegue comprar determinados medicamentos, obviamente com aproveitamento, nalguns sítios, por parte de quem os vende?
Concluindo esta parte relativa ao protocolo, julgo que a verdade é que ele de facto não induz qualquer compromisso de contenção, porque continua a deixar nas mãos da indústria todos os mecanismos que lhe permitem controlar o aumento dos gastos com medicamentos e porque, mesmo na letra do protocolo, há diversos aspectos que implicam uma diminuição muito grande, na realidade, destas verbas que o Serviço Nacional de Saúde venha a receber da parte da indústria.
Queria ainda fazer outras perguntas em relação ao medicamento. Gostava de saber quanto é que custou, em termos de comparticipações, a instituição do escalão D de 20%, de entrada automática, digamos assim, para muitos medicamentos cuja comparticipação ainda não estava devidamente aprovada. Gostava de saber quanto é que isso custou ao Serviço Nacional de Saúde, em 2001, ou quanto se prevê que vai custar.
Dentro daquela possibilidade, que passou a estar instituída na lei, de o INFARMED acordar por ajuste directo determinados preços em relação a determinados medicamentos (e houve alguns acordos com a indústria ou com alguns parceiros da indústria nesta matéria), gostava de saber quanto é que isso custou ao Serviço Nacional de Saúde. Isto é, nos medicamentos que foram alvo de ajustes directos entre o INFARMED e determinadas empresas da indústria farmacêutica, qual é o volume de despesa que foi obtido em 2001? Também gostava de saber quanto é que custaram os juros com a dívida no ano de 2001.
Relativamente a uma outra matéria, relacionada com uma proposta que, há muito, vimos apresentando nas discussões da racionalização da despesa com medicamentos, gostaria de saber a sua opinião acerca da possibilidade de nos hospitais se dispensarem gratuitamente os medicamentos cujo custo, comprovadamente, por via da comparticipação nas farmácias comerciais, é mais elevado do que se eles forem comprados pelos próprios hospitais e dispensados gratuitamente aos utentes, quando eles vão a uma consulta externa, neste caso.
Isto é válido, por exemplo, para os medicamentos que são comparticipados a 100%, porque sou capaz de dizer que, na quase totalidade das situações, eles sairão mais baratos ao hospital, à ARS ou ao próprio Ministério, se os comprar em pacote, do que pagando a comparticipação nas farmácias ao preço comercial, e também certamente noutros medicamentos que estarão no escalão de 70% e, porventura, no escalão de 40%.
Portanto, o que se pergunta aqui é: havendo nesta matéria pelo menos duas experiências realizadas com sucesso - o Ministério da Saúde e o Governo nunca disseram o contrário -, por que é que não se implanta um programa em que esta medida possa ser alargada quer a novos medicamentos, quer a novas unidades, poupando assim muitos milhões de contos ao Orçamento do Estado?
Ou o Governo prefere pagar mais pelos medicamentos e obrigar os utentes a pagar mais pelos medicamentos?! Não compreendo e nunca foi explicada a relutância do Governo em instituir esta medida. E nem se diga que isto provocaria um acréscimo de idas às urgências! A antecessora do Sr. Ministro utilizava este argumento. Não! Aliás, nesse sentido, podemos, por exemplo, deixar já aqui ficar o desafio de restringir esta medida, numa primeira fase, apenas às consultas externas, que são programadas e em que há prescrição, e muita prescrição. Vamos fazê-lo, então, em relação às consultas externas ou em relação às urgências que vêm dos serviços de atendimento permanente ou dos centros de saúde e que, portanto, não são uma ida ao hospital para beneficiar de um regime mais favorável em termos de medicamentos. Por que é que o Governo não aceita avançar nesta matéria?
Uma outra questão que quero colocar tem a ver com…

O Sr. Presidente (Fernando Serrasqueiro): - Sr. Deputado, nesta primeira ronda de perguntas, peço-lhe alguma síntese e, depois, se quiser, numa segunda ronda, poderemos…

O Orador: - Sr. Presidente, vou apenas colocar esta questão, usando um pouco mais tempo, e abdico da segunda ronda, da minha segunda ronda, porque outros, certamente, intervirão.
Em relação à gestão, o Governo tem prevista, no Orçamento, uma verba para dotar com capital inicial os chamados, nas palavras do Sr. Ministro, hospitais-empresa. Bom, nós já expressámos a nossa oposição em relação a essa fórmula e desafiamos o Governo para vir discutir normas, regras e soluções, dentro da gestão pública, que permitam melhorar a gestão, moralizá-la e resolver ou evitar alguns escolhos que, evidentemente, existem no seu desempenho, mas agora a questão que quero colocar é a seguinte: se os hospitais têm um capital inicial por via desta dotação e se são constituídos em empresas públicas, quando essas empresas, por qualquer razão, por exemplo, por má gestão, tiverem prejuízo, o que é que acontece? Quem é que cobre o prejuízo? E se se parte do pressuposto, que me parece que é o que está instituído, de que estes hospitais-empresa vão recorrer à banca, vão endividar-se junto da banca para financiar os seus

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investimentos ou mesmo a sua construção, sendo hospitais novos e ficando, depois, a banca com um crédito perante estas entidades, isso significa que a banca vai necessariamente entrar na sua gestão, por via das dívidas que, eventualmente, venham a existir? O Governo admite, à partida, esta possibilidade ou, se não admite, como é que resolve o problema da eventual dívida? Por transferência do Orçamento do Estado? Qual é a solução para esta questão?

O Sr. Presidente (Fernando Serrasqueiro): - Para pedir esclarecimentos, na qualidade de Presidente da Comissão de Saúde e Toxicodependência, tem a palavra o Sr. Deputado Vieira de Castro.

O Sr. Vieira de Castro (PSD): - Sr. Presidente, antes de mais, cumprimento o Sr. Ministro e os Srs. Secretários de Estado e também os Srs. Deputados.
Vou solicitar uma informação ao Sr. Ministro, no cumprimento de um mandato que esta manhã me foi conferido pelos meus colegas da Comissão de Saúde e Toxicodependência.
A Comissão recebeu uma delegação de alunos do 6.º ano da Faculdade de Medicina de Lisboa, que, há dias, foram também recebidos pela Comissão de Educação, Ciência e Cultura. Esta delegação de alunos veio, perante as duas Comissões, apresentar as razões que estiveram subjacentes à recusa em se submeterem a uma prova de avaliação dos respectivos estágios. Fundamentaram, a nosso ver, de forma bastante, essa recusa e ficámos a saber que a posição dos 135 finalistas da Faculdade de Medicina de Lisboa, que se recusaram a submeter-se a esse processo de avaliação do estágio, e a posição da direcção dessa mesma Faculdade são posições extremadas. E pareceu-nos, de acordo com a informação verbal que nos trouxeram e também com a documentação que nos entregaram, que este processo não foi bem conduzido, pelo contrário, assim como também nos pareceu, a todos, membros da Comissão de Saúde e Toxicodependência, que a razão está do lado dos alunos.
Mas eu diria que esta questão até nem é a mais importante. Importante é que estamos a 17 dias da resolução deste problema. E porquê? Porque, no dia 30 de Novembro, termina o prazo para as candidaturas ao internato geral e, na melhor das hipóteses, estes não licenciados, porque não submetidos a essa prova de avaliação, poderão apresentar uma chamada "candidatura provisória". Nós conhecemos a escassez de recursos humanos do Serviço Nacional de Saúde quer quanto a médicos, quer quanto a enfermeiros e, a não ser dirimido este diferendo nos próximos 17 dias, estes 135 finalistas da Faculdade de Medicina de Lisboa terão de aguardar mais um ano para apresentar a sua candidatura ao internato geral.
Sem prejuízo da autonomia das universidades e, diria eu, em particular da Faculdade de Medicina de Lisboa, tenho a certeza de que o Sr. Ministro conhece esta questão com todo o detalhe, pelo que lhe pergunto, repito, sem prejuízo da autonomia da Faculdade, se o Ministério da Saúde, ainda assim, pensa efectuar alguma diligência, que, direi, não é para resolver o problema destes 135 alunos da Faculdade de Medicina de Lisboa mas para resolver o problema de 135 médicos a mais ou a menos no Serviço Nacional de Saúde.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente (Fernando Serrasqueiro): - Vou, então, dar a palavra ao Sr. Ministro ou aos Srs. Secretários de Estado, conforme o Sr. Ministro entender, e depois dar-se-á início a uma segunda ronda de perguntas.

Neste momento, reassumiu a presidência a Sr.ª Presidente, Manuela Ferreira Leite.

A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra, Sr. Ministro da Saúde.

O Sr. Ministro da Saúde: - Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, em primeiro lugar, gostaria de retomar o compromisso aqui assumido, em Plenário, de disponibilidade de presença da equipa ministerial, todos os trimestres, perante qualquer das comissões parlamentares que o entenda, para prestar informações sobre todas as matérias da saúde e, nomeadamente, sobre as matérias de execução orçamental.
Gostaria de pautar esta minha intervenção inicial pela continuidade do princípio de transparência de que suponho já termos dado abundante exemplo ainda que não prova, devido ao curto espaço de tempo.
Começo por responder, pela ordem em que foram apresentadas, às diferentes perguntas e agradeço-as todas, porque são extremamente úteis.
A primeira pergunta do Sr. Deputado Patinha Antão foi no sentido de saber quanto é que vamos gastar em pessoal e em farmácias, se as dotações para pessoal e farmácias chegarão para as necessidades, quanto é que gastamos em horas extraordinárias, etc., se o efeito-volume será só de 0%, quantos funcionários novos é que entrarão, que efeito de promoções e reestruturações, que efeito com os novos 180 farmacêuticos, etc. A informação que tenho sobre esta matéria permite-me referir alguns pontos essenciais.
Em primeiro lugar, como sabem, vamos ter mais 210 milhões de contos do que o Ministério teve no ano passado.
Em segundo lugar, os famosos 36% de horas extraordinárias aplicam-se apenas ao pessoal médico e ao pessoal de enfermagem, isto é, no total das remunerações de médicos e enfermeiros, 36% são horas extraordinárias.
Por outro lado, devem ter, certamente, compulsado a documentação que foi facultada e, nos pequenos mapas respeitantes a outros programas, há um mapa com seis linhas sobre programas, em que consta uma indicação, sobre descongelamentos e previsões de carreiras, de 6,5 milhões de contos e também uma indicação, sobre a remuneração do trabalho extraordinário em serviço de urgência, de 10 milhões de contos. O que são estes 10 milhões de contos? Estes 10 milhões de contos são uma dotação adicional para cumprimento do decreto-lei sobre pagamento das horas extraordinárias pela tabela de 42 horas em relação aos que estão em 35, desde que cumpram as duas condições da lei, ou seja, intervenção no Programa Acesso e consultas abertas até às 18 horas nos hospitais e das 8 horas às 20 horas nos centros de saúde.
O acréscimo de pessoal que prevemos é de 5%. É evidente que o acréscimo de 11% que estamos a estimar para o fim deste ano, e que é ligeiramente superior ao de 10,1% que ocorreu na transição anterior, tem a ver com 3,71 de acréscimo do aumento das remunerações da função pública.

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Como tem sido anunciado, enfim, não posso, não sei, nem sou capaz de dizer, neste momento, qual vai ser o acréscimo regular da função pública para o próximo ano e, como sabemos, há dotações especiais, as chamadas dotações provisionais, para esse fim, mas pareceu-nos que 5% de acréscimo não seria uma subdotação, tendo em conta que o acréscimo do aumento de vencimentos, no próximo ano, vai ser, certamente, menor do que o do ano anterior, porque se espera uma inflação também menor e porque, conforme tem sido anunciado, estamos em tempos de contenção.
É evidente que vamos ter novos funcionários e não vamos ter tantos como se julgaria. É o efeito da abertura dos novos hospitais este ano. O hospital de Vale do Sousa, por exemplo, já abriu e já está a funcionar e há pessoal que está a ser recrutado ainda este ano. E o hospital do médio Tejo, incluindo Tomar, é outro grande hospital. Mas não se prevê, que eu saiba, no próximo ano, a entrada em funcionamento de nenhum novo grande estabelecimento hospitalar e, portanto, a nossa convicção é a de que este acréscimo de 5%, dentro das restrições que vão ser adoptadas, e todos estamos conscientes disso, vai ser suficiente.
Da mesma forma, os medicamentos vão, certamente, crescer acima dos 4%, como o Sr. Deputado Patinha Antão muito bem salientou, e temos fundadas garantias de que eles vão crescer 7,5%. Tal como este ano vão crescer a 9% e não a 10,5%, como cresceriam se não tivesse havido o acordo com a indústria. Mas, no próximo ano, como o acordo com a indústria passa a 5%, o limite do tecto superior é de 5% - recordo que este ano é de 6,5%, no próximo ano será de 5% e no ano seguinte será de 4% dos tais 64% de vendas, ou seja, do volume global à saída das fábricas -, não nos parece irrealista prever um acréscimo de 7,5%.
Quanto aos medicamentos hospitalares, que estão incluídos na rubrica "Compras", estamos a guiar-nos pela execução estimada para este ano, que é de 5%, e pela execução real do ano anterior, que foi de 4,9%. Como tal, embora todos nós saibamos que esta área do gasto com a farmácia hospitalar precisa de forte disciplina e de forte contenção, não nos parece que a dotação, à qual voltaremos daqui a nada, seja irrealista.
Depois, o Sr. Deputado Patinha Antão procurou saber se os saldos são nulos e, na verdade, no mapa que apresentámos, o mapa de tesouraria, o mapa de contabilidade orçamental, naturalmente, o défice é nulo. Contudo, no mapa da execução para fins de contabilidade orçamental apresentamos a VV. Ex.as a nossa estimativa, com todos os defeitos que têm estas estimativas, como salientei desde o primeiro dia e desde a primeira vez que fui à Comissão de Saúde e Toxicodependência. Ninguém mais do que eu critica a falta de rigor que estas estimativas podem ter, pelas razões que me escuso de voltar a repetir a VV. Ex.as, mas podem ver neste mapa que os 100 000 contos que estão na primeira linha incluem o saldo de gerência e as dotações orçamentais. Por outro lado, podem ainda reparar que os 89 milhões de contos que vão servir para cobrir os compromissos assumidos até certa parte deste ano aparecem deduzidos ao défice do estimado para o exercício deste ano. É por isso que, realisticamente, pensamos que vamos agravar o défice actual, estimado em 245 milhões de contos, de uma forma contível, o que, como disse, permitirá fazer uma gestão tensa. Este défice de 245 milhões de contos, tendo por base os valores deste ano, permite cumprir compromissos até 100 dias, enquanto que o défice de 270 milhões de contos poderá, provavelmente, ultrapassar em mais 5 ou 8 dias esse limite de 100 dias. No entanto, parece-nos que esta não é uma situação impossível de gerir, porque tanto nos 6 anos anteriores como ao longo dos últimos 10 anos vivemos situações com défices e atrasos de pagamentos muito superiores a 100 dias.
Passando à questão seguinte, posso dizer que a dotação para as listas de espera cirúrgicas, como o Sr. Deputado Patinha Antão sabe melhor do que eu, porque provavelmente participou na votação dessa deliberação, está limitada a 1% da dotação orçamental do ano. Ora, se a dotação orçamental para o Ministério da Saúde é de 1035 milhões de contos, a dotação para as listas de espera cirúrgicas, como está nos mapas anexos, será de 10,35 milhões de contos. Diz-me o Sr. Deputado que gostaria que esta dotação fosse maior e que gostaria que nós conseguíssemos fazer mais do que as 22 000 intervenções electivas que vamos levar a cabo este ano. Também eu gostaria que assim fosse, Sr. Deputado, mas devo dizer-lhe que, apesar de tudo, sinto-me muito satisfeito, porque, tendo feito no ano passado 17 000 intervenções electivas, pensamos completar este ano um total de 21 500 intervenções electivas. Aliás, ainda nesta semana que findou tive a informação de que no Norte, onde o Programa Acesso está a intervir com maior força no segundo semestre deste ano, vamos, provavelmente, fazer mais 500 intervenções. Sinto-me, portanto, muito satisfeito com este resultado, desde que - e estamos a garantir que assim seja - não haja decréscimo nas cirurgias regulares, nas cirurgias programadas, porque, como é evidente, nessa altura estaríamos perante uma aplicação da teoria dos vasos comunicantes. Essa é, portanto, uma das nossas maiores preocupações, a de que não haja aqui alguma aplicação da teoria dos vasos comunicantes, mas, sim, um verdadeiro aumento.
Retomo, de novo, a questão dos milhares de pessoas em espera para as cirurgias electivas para dizer que, em primeiro lugar, não nos preocupa muito o mecanismo de "limpeza", o mecanismo administrativo, contabilístico ou estatístico de redução das pessoas das listas de espera para cirurgias electivas. Sinceramente, não é essa a nossa preocupação. A nossa preocupação centra-se em conseguir fazer cirurgias electivas, mas temos de salientar que há muitas pessoas que estão administrativamente inscritas e que estatisticamente figuram nessa lista de 95 000 ou de 96 000 pacientes já tendo sido submetidos à sua cirurgia ou já tendo visto os seus problemas resolvidos de outra forma, seja pelo sistema normal ou não. Como tal, isso, para nós, não é drama nenhum e até tem uma componente positiva. Digo isto porque, no passado, muita gente não aparecia para fazer uma cirurgia electiva a questões relativamente ligeiras, como varizes, hérnias ou cataratas, porque nem sequer sabiam que havia a possibilidade de fazer isso com grande facilidade. Julgavam que era uma operação mais complexa e não sabiam que era possível fazê-la de forma simples e mesmo numa outra cidade diferente daquela em que vivem. No entanto, o sucesso do programa gera maior procura, naturalmente, e descobre a ponta coberta do "iceberg" da procura, fá-la sair para fora, fá-la aparecer, o que, para nós, é muito positivo. Por isso afirmo que não há nada de que nos arrependamos nesta matéria.
Contudo, se os 10,35 milhões de contos não forem suficientes ou se tivermos possibilidade de fazer 30 000

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cirurgias electivas, posso garantir-lhe, Sr. Deputado Patinha Antão, que não vamos hesitar e que vamos mesmo fazê-las!
Passarei agora às duas questões colocadas pelo Sr. Deputado Vítor Baptista, uma, procurando saber se as parcerias trazem ou não contenção, e outra, procurando saber quando é que o Governo pensa fazer as mudanças nos conselhos de administração dos estabelecimentos hospitalares.
Em relação à primeira questão, tenho de dizer que a resposta é francamente positiva, visto que as parcerias trazem contenção não só na construção como no financiamento. Por que é que trazem contenção na construção? Porque partilham o risco. O que se passa é que no momento actual o risco é concentrado num único parceiro, que é o Ministério da Saúde. O Ministério da Saúde é o único parceiro e sofre o risco todo da construção, como, por exemplo, o risco do excesso de volume que os promotores - as câmaras municipais ou quem quer que seja que promove a obra - possam levar a cabo, porque, naturalmente, querem que a obra seja o mais visível possível, tão grande como possível, independentemente da sua eficiência. Depois, os construtores têm interesse em que a obra seja o maior possível, porque os seus ganhos são proporcionais ao tamanho da obra, interesse que é partilhado pelos projectistas, pelos fornecedores de equipamentos e pelos profissionais, sejam eles enfermeiros, médicos, administrativos ou administradores. Para todos estes, quanto maior for o espaço, maior pode ser o seu poder dentro da instituição, o que é absolutamente humano e natural. Ora, se estes são os incentivos à dimensão excessiva, não há ninguém que partilhe este risco.
Como tal, o que as parcerias público-privadas fazem é partilhar este risco, porque quando uma parceria financeira tem a certeza de que vai administrar durante 20 ou 25 anos aquele estabelecimento, o promotor vai olhar rigorosamente para a eficiência energética do estabelecimento, para a sua dimensão, para a forma como as relações funcionais nele se organizam e vai mesmo escrutinar cuidadosamente os possíveis ganhos em proximidades, em localizações, etc. Reparem que temos hoje tantos erros de localização de estabelecimentos, nomeadamente de centros de saúde sobredimensionados e colocados fora das localidades. É que, como o Sr. Deputado sabe, este é um domínio extremamente difícil e, como vê, esta partilha de risco é absolutamente essencial.
Em segundo lugar, há a administração. Ora bem, um estabelecimento que é pago por um custo atribuído à intensidade do serviço que presta tem, naturalmente, interesse ou vantagem em duas coisas. Como agente económico, tem, antes de mais, interesse na especialização produtiva, pelo que tem de se conter dentro dos limites do caderno de encargos e do contrato. Se um estabelecimento quisesse, por hipótese, fazer apenas hérnias e cataratas, estaria a optar por uma especialização produtiva que lhe daria muito dinheiro a ganhar, mas nós não deixaríamos (e aqui está a entidade reguladora a cumprir o seu papel). De qualquer modo, como dizia, o estabelecimento realizado em parceria tem vantagem na especialização produtiva e tem, em segundo lugar, interesse ou vantagem nos ganhos de eficiência geral interna, porque quantos mais ganhos de eficiência tiver, mais pequeno diferencial pode obter em relação àquilo que os Grupos de Diagnóstico Homogéneos (GDH) pagam, que é a média dos hospitais públicos para aquele nível de intensidade e para aquela intervenção.
Em suma, o empresário ou a instituição que vai trabalhar nessa matéria - e a parceria pode ser inteiramente pública ou público-privada - tem estes incentivos directos. Na verdade, é isto que faz com que os novos estabelecimentos já empresarializados, como os de Santa Maria da Feira, de Matosinhos ou do Barlavento algarvio, que são pagos por produção, pelos GDH, não tenham, para 450 urgências - que são quantas tem o hospital de Santa Maria da Feira e um outro grande hospital de Lisboa -, 66 médicos (como tem este grande hospital da capital), mas, sim, 20 ou 25 médicos nas urgências. As coisas são tão simples como isto! Há incentivos económicos construídos no sistema de financiamento e de administração que transformam essa unidade numa unidade mais eficiente.
No entanto, esses incentivos não existem no sistema actual, já que este, com o carácter electivo dos directores clínicos e dos directores de enfermagem, cria uma dupla lógica no órgão dirigente - a lógica do interesse público, representado pelo director e pelo administrador, e a lógica, naturalmente, do respeito por aqueles que os elegeram, o director clínico e o enfermeiro director. Se eu for director clínico, devo respeitar aqueles que me elegeram, sobretudo se fui eleito por uma pequena maioria. Posso dar-vos o exemplo de um grande hospital do norte do País, onde o enfermeiro director, eleito no ano passado, no primeiro semestre deste ano, deixou "derrapar" as horas extraordinárias do pessoal de enfermagem em 40%, tendo permitido uma "derrapagem" de 22% em relação ao pessoal auxiliar! O que é isto?! Se não mudarmos esta dupla lógica e esta confusão total de lógicas, se não tivermos a lógica do interesse público acima da lógica dos interesses electivos sectoriais e profissionais, estamos perdidos. E não tenha dúvidas, Sr. Deputado, de que o mero facto de mudarmos a lei e de passarmos a ter uma única lógica, através de uma unidade de comando nos hospitais, vai trazer ganhos ao nível das horas extraordinárias. Não tenha, sobre isto, a menor dúvida!
Pergunta-me o que vamos fazer quanto à lei das horas extraordinárias. Vamos mudá-la, naturalmente, mas vamos reforçar a componente electiva para fins técnicos. Nós não queremos destruir a vantagem da componente electiva na eleição de um médico chefe, de um director clínico ou de um enfermeiro director. Não queremos destruir essa vantagem, mas queremos limitá-la às função técnicas, não a deixando "contaminar" as funções de gerência, de gestão, de management ou da administração. O decreto-lei que está em preparação tem recebido muitos contributos e, porque os mais importantes e os mais comuns vão neste sentido, é isto que vamos fazer, ou seja, vamos introduzir-lhe algumas alterações, já que aprendemos sempre com a consulta pública. Saliento, no entanto, que estas alterações pretendem definir claramente aquilo que é uma direcção técnica, que não vai gerir meios nem pode administrar a dotação de horas extraordinárias. Vai, todavia, ter toda a capacidade de organização técnica, de direcção técnica, de fixação de protocolos, de regras de orientação sobre como é que se deve organizar-se o trabalho de enfermagem ou o trabalho médico em cada uma das suas diferentes unidades, etc.
O Sr. Deputado Pires de Lima colocou uma questão sobre a gratuitidade e eu recordo que disse no Plenário que não tenho tabus em matéria de diferenciação positiva. Realmente, não os tenho! Todavia, disse também que, pelas

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dificuldades técnicas que há em aplicar um sistema de diferenciação positiva no ponto de encontro do utente com o Serviço Nacional de Saúde, preferia, apesar de tudo, pagar o parto gratuitamente à Rainha de Inglaterra do que instaurar taxas moderadoras ou sistemas muito diferenciados. Este argumento da Rainha de Inglaterra, como calculam, não é meu, é um argumento dos teóricos ingleses da economia da saúde e tem mais de 30 anos, mas, de facto, esta é realmente uma questão técnica. De facto, já hoje fazemos diferenciação positiva. Designadamente, quando temos, por exemplo, diferentes níveis de comparticipação nos medicamentos prescritos, em função do risco do paciente hospitalizado ou quando temos medicamentos life saving, com 100% de comparticipação, estamos a fazer uma diferenciação positiva. Ou seja, quando hoje fazemos uma diferenciação que se traduz numa bonificação para os pacientes que têm mais de 65 anos de idade, através da comparticipação medicamentosa, estamos a fazer diferenciação positiva.
Mas sabe o que é que se passa, Sr. Deputado? O que se passa é que neste momento há 60% de receitas que são apresentadas como vindas de pessoas com mais de 65 anos de idade. E estes casos não acontecem apenas em Portugal. Aconteceu exactamente o mesmo em França, em Espanha e em mais sítios.
Portanto, o problema que se coloca é o seguinte: se os mecanismos de selectividade ou diferenciação positiva não forem rigorosamente controlados, há uma tendência para a usura técnica, para a derrapagem e para entrar em perda.
Vou dar-lhe um exemplo de um caso onde entendo que é possível fazer diferenciação positiva, sem que, de qualquer forma, isso "enrugue" os meus pergaminhos socialistas. Quando tivermos as urgências reorganizadas, através do modelo de Manchester, isto é, com cinco níveis de emergência, o que significa que teremos "à mão" o centro de saúde para onde podemos enviar o doente que não necessita de ser internado nem tem uma situação de emergência mas, sim, uma situação de urgência, posso afirmar que não tenho qualquer prurido em que seja oferecida a este paciente, que não precisa de ser tratado na urgência hospitalar, uma de duas alternativas, desde que seja assistido no próprio dia: ou vai ao seu centro de saúde ou ao centro de saúde que lhe é disponibilizado, e é tratado gratuitamente; ou, então, se quer ser tratado no hospital, paga uma taxa moderadora mais alta.
Este é o exemplo típico de uma situação em que me parece que não há qualquer atentado ao princípio da universalidade e, pelo contrário, onde é possível fazer uma diferenciação positiva de forma perfeita ou, pelo menos, aproximada.
Quanto à questão que o Sr. Deputado suscitou relativamente aos imigrantes, devo dizer-lhe que tem toda a razão. De facto, não é possível ter milhares de imigrantes de países com os quais Portugal não tem acordos de reciprocidade - julgo que temos cerca de 300 000, e vamos ter certamente perto de 1 milhão no final da década, se a economia crescer sustentadamente - e exigir-lhes a cobrança de pagamentos nos serviços de saúde. Por isso, quanto à questão de fundo, não tenho a menor discordância com V. Ex.ª. Todavia, existe a Constituição, que, rigorosamente interpretada, não nos permite fazer isso a residentes em Portugal oriundos de países com os quais não temos acordos de reciprocidade. No entanto, estamos disponíveis… aliás, há um despacho que, suponho, foi para publicação…
Concretamente, em relação a este ponto, os serviços de saúde adoptaram posições diferentes, sendo que a maior parte das administrações regionais seguiram a postura de ignorar o problema, continuando a permitir o acesso livre desses cidadãos estrangeiros. Houve, no entanto, uma administração regional de saúde que foi um pouco mais rigorosa, foi à Constituição, muniu-se de um parecer, e achou que não devia permitir o acesso livre desses cidadãos estrangeiros.
Quanto a esta situação, devo dizer que o despacho que assinei diz mais ou menos o seguinte: "Nas situações em que não haja reciprocidade, desde que o imigrante faça prova de que está a cumprir os seus deveres para com a segurança social, não há a menor razão para lhe recusar a gratuitidade na assistência. Todavia, mantemos o pagamento para aqueles que não fazem prova da sua integração na segurança social."
Mesmo que isto me custe muito, penso que temos de manter um incentivo para que os trabalhadores clandestinos sejam motivados no sentido de ter uma intervenção forte, exigindo das entidades patronais a sua inscrição na segurança social. Esta é a nossa intervenção sobre esta matéria.
Quanto ao "realismo do Orçamento para 2002", segundo as palavras do Sr. Administrador do Hospital de Santa Maria, é evidente que não partilho dessa opinião nem me parece, sequer, muito avisado que o Sr. Administrador do Hospital de Santa Maria faça declarações públicas desse tipo. Simplesmente, nós não praticamos a "lei da rolha", no Ministério da Saúde. Eu limitei-me a chamar o Sr. Director do Hospital de Santa Maria, a ter com ele uma conversa e a recomendar que não me parecia curial que um alto funcionário do Ministério fizesse aquelas declarações. Foi tudo o que fiz sobre esta matéria.
Mas vamos ao fundo da questão.
E o fundo da questão é que Santa Maria é um hospital geneticamente doente, do ponto de vista gestionário. É um hospital que tem uma faculdade, é um hospital com cerca de 1250 camas, 6000 utentes, profissionais, com mais de 10 000 visitantes, por dia, é um hospital que tem, neste momento, 20 milhões de contos de défice acumulado. Repito, 20 milhões de contos. Não é, pois, como é natural, um hospital candidato à empresarialização! Porque, então, pegávamos em meia dúzia de "hospitais de Santa Maria", e aí, sim, iam os 80 milhões contos!…
Santa Maria é um hospital "patológico", como, de certa forma, são patológicos outros hospitais. E os casos patológicos têm de ser tratados de forma específica. Não podemos fazer de outra forma.
O que queremos fazer com os 80 milhões de contos da empresarialização? Vamos definir os termos de referência para que os hospitais se candidatem, sendo que só aceitaremos como empresas públicas os hospitais que tenham possibilidade de, com esse investimento, obter dois tipos de ganhos: ganhos de eficiência e ganhos de qualidade. Se os hospitais estiverem nessas condições, então, aceitamos passá-los ao estatuto de empresa pública. O que significa que não se trata de uma passagem automática, nem administrativa. Não é nada disso.
No que diz respeito à questão das horas extraordinárias, penso que, há pouco, já respondi.
Sr. Deputado Francisco Louçã…

O Sr. António Pires de Lima (CDS-PP): - Peço desculpa por interromper, Sr. Ministro, mas gostaria que me

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dissesse qual é o montante - não em percentagem mas em valor absoluto - que está nas contas de 2001 e no Orçamento para 2002, relativamente ao pagamento de horas extraordinárias a enfermeiros e a médicos.

O Orador: - Diz-me o Sr. Secretário de Estado que é qualquer coisa entre 40 a 50 milhões de contos, antes da aplicação do decreto-lei publicado em Março. É uma verba considerável! VV. Ex.as podem prever já o que é a tensão social no Ministério da Saúde… Com a aplicação acrítica do decreto-lei publicado em Março, isto é, passando a aplicar a tabela das 42 horas a todos aqueles a quem se aplica actualmente a tabela das 35 horas, traduzir-se-á entre 15 a 20 milhões de contos mais. Bom, nós temos 10 milhões de contos de dotação para essa aplicação crítica, aliás crítica e muito exigente! É este o caminho que estamos a seguir, embora com muitas dificuldades, como, de resto, é patente na comunicação social.
Sr. Deputado Francisco Louçã, vamos ao problema da suborçamentação. Diz o Sr. Deputado que as contas de 2000 ainda são provisórias. São! E tenho muito orgulho em ter apresentado, há dias, o relatório relativo a 1999. Ainda me lembro de haver quatro e cinco anos de relatórios e contas do Serviço Nacional de Saúde por publicar. Por conseguinte, tenho muito orgulho em termos entregue o relatório relativo a 1999 e terei muito orgulho se, no próximo ano, conseguirmos entregar o relatório relativo a 2000. Espero conseguir!
De que modo a empresarialização afecta as contas da saúde? Além dos exemplos que dei há pouco sobre as urgências e sobre as horas extraordinárias, há uma informação extremamente importante sobre as compras. É que, quando um hospital tem um passivo (e não é preciso irmos para os 20 milhões de contos do Hospital de Santa Maria) de 5 ou 6 milhões de contos, como é o caso do Hospital Garcia de Horta, como é que este hospital compra os produtos de que necessita? Não há ninguém que se recuse vender-lhe, porque sabe que lhe pagam sempre. No entanto, a carne de frango ou os legumes deste hospital são os mais caros da margem sul do Tejo, porque vão ser pagos com semanas ou meses de atraso, devido a esse défice. Por conseguinte, a simples absorção de défice ou a redução significativa de défice em alguns hospitais é um salto absolutamente fantástico em termos da qualidade da gestão
Mais: a possibilidade de se fazer aquisições através de concursos públicos, mais flexíveis, mais rápidos e sem ser capturado pelo formalismo dos concursos públicos (e já lhe explico porquê) pode traduzir-se, como aconteceu em Santa Maria da Feira, em poupança nas aquisições de medicamentos da ordem dos 30%.
Por que é que o formalismo das contas públicas, desenhado para defender a igualdade de condições e a competição, as distorce muitas vezes? Vou dar-lhe um exemplo, Sr. Deputado.
Relativamente à aquisição de medicamentos, há 400 posições do concurso centralizado do IGIF, sendo que cada uma destas posições corresponde a um medicamento. A cada uma destas posições concorrem quatro ou cinco laboratórios e ganha o que apresenta o melhor preço. Os laboratórios estão inscritos, têm a sua situação actualizada perante as finanças, têm as contribuições para a segurança social pagas, têm a garantia bancária apresentada, enfim, têm tudo em ordem.
Acontece que um determinado laboratório, a quem foi adjudicado o fornecimento de 1 milhão de unidades, fornece as primeiras 50 000 unidades no primeiro mês e, depois, cala-se. Passados dois meses, os clientes perguntam: então, e o resto? E o laboratório responde: comunicamos a VV. Ex.as que não nos é possível fornecer mais! Porque o mercado mudou, porque houve flutuações no mercado, não nos é possível fornecer mais! Bom, o laboratório informa que não é possível fornecer mais.
Então, vai-se ao segundo laboratório da lista, que custa 15% ou 20% mais.
Estas são as regras! Como é que VV. Ex.as lutam contra esta situação? Vou dar sugestões. Vamos penalizar! Temos um sistema de notação de fornecedores e penalizamos este fornecedor, que não mais se pode candidatar. Muito bem! No ano seguinte, esse fornecedor não se candidata, mas candidata-se o mesmo fornecedor com outra empresa.
Realmente, quem quiser "furar" os esquemas da Administração Pública, desde que tenha uma grande imaginação, consegue fazê-lo! Agora, não é tão fácil fazê-lo a um gestor que tenha mais flexibilidade privada, pelas razões que apresentei.
Quanto à questão das cigarrilhas e dos charutos, penso que o argumento da receita fiscal é importante e crescente, porque, como o Sr. Deputado sabe, há uma tendência crescente para ser politicamente correcto e, até, do ponto de vista de saúde fumar, em vez de cigarros, cigarrilhas e charutos. Não é que seja bom para a saúde fumar cigarrilhas e charutos, certamente que não é, mas é menos mau do que fumar cigarros. Isto porque o cigarro tem alcatrão no papel que o envolve. E tem alcatrão porque tem de ter aquela combustão lenta, não se pode apagar. Ora, é esse aditivo que se coloca no papel que é tremendo.
E o que é que tem o cigarro a mais que não tenham, porventura, as cigarrilhas e os charutos? Tem adição forçada da nicotina no momento da preparação do cigarro, como se demonstra hoje através do enorme debate que há nos Estados Unidos entre as autoridades de saúde, as autoridade federais e as grandes tabaqueiras.
Ora bem, desse ponto de vista, não é um ganho absoluto, mas é um ganho relativo. E se pudermos evitar alguma evasão fiscal ou alguma transferência fiscal para o estrangeiro, não tenho qualquer objecção em relação a isso.
Sr. Deputado Bernardino Soares, colocou um conjunto de questões em relação às quais o Sr. Secretário de Estado, Dr. Francisco Ramos, vai responder.
Sobre a última pergunta que fez no sentido de saber quem cobra se os Projects Finance Initiative tiverem prejuízo pela má gestão, direi ao Sr. Deputado que temos de distinguir o Project Finance, que é a iniciativa de construção, desde a raiz, de um hospital, incluindo o desenho, a construção e a sua administração durante 20 ou 25 anos - é uma modalidade - da empresarialização de hospitais - outra modalidade.
Todos estes hospitais são públicos! Mesmo o hospital que foi construído pelo sector privado, por uma parceria pública e privada ou por uma parceria privada regressa à esfera jurídica do sector público ao fim dos 20 ou 25 anos. E, portanto, são hospitais do Serviço Nacional de Saúde, que são pagos da mesma forma que os hospitais públicos e que atendem todos os doentes como os hospitais públicos. Este ano já temos 50% do financiamento hospitalar pago pela produção. E vamos avançar! No próximo ano, teremos muito mais!

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Portanto, o que queremos é pagar todo o funcionamento dos hospitais pela produção, e pagar igualmente, porque, pagando igualmente, podemos pôr os hospitais a competir, que é outra grande vantagem de ter vários modelos, que têm de ser avaliados, regulados e controlados.
Nós não mitificamos, como eu disse na minha intervenção, a empresarialização nem achamos que isto é o melhor do mundo. Estamos convencidos de que vamos ter algumas vantagens com isso, mas temos de estar de olho muito aberto, temos de estar com o nosso mecanismo de regulação modernizado, temos de ser capazes de perceber como é este novo mercado, no qual a Administração, até aqui, não se tinha introduzido. E não é estigma nenhum termos este tipo de intervenção! Não é tabu nenhum! Antes pelo contrário, vamos pôr hospitais públicos e privados a competir ou, mesmo, os públicos a competir entre si.
Tenho muito apreço pelas sugestões do Partido Comunista em matéria de gestão de hospitais, devo dizer-lhe, e não excluo a possibilidade de termos uma experiência feita como o Partido Comunista propõe, através de um concurso de gestão. Até me parece que era capaz de ser interessante. Não tenho qualquer tabu nesta matéria. Agora, o que quero fazer é avaliar cada uma destas experiências, chegar ao fim e, então, decidirmos.
Passo agora a palavra ao Sr. Secretário de Estado da Saúde, Francisco Ramos, e, depois, retomarei a palavra para responder ao Sr. Deputado Vieira de Castro.

O Sr. Secretário de Estado da Saúde (Francisco Ramos): - Srs. Presidentes da Comissão de Economia, Finanças e Plano e da Comissão Saúde e Toxicodependência, Srs. Deputados, Sr. Deputado Bernardino Soares, agradeço a pergunta que colocou sobre a questão do protocolo com a APIFARMA e, em geral, sobre a questão do consumo de medicamentos em Portugal.
A questão do aumento do consumo de medicamentos e dos gastos em medicamentos é, de facto, recorrente, é habitual e não é caso exclusivo em Portugal. É habitual, nomeadamente, em todos os países europeus, porque, de facto, os medicamentos têm um peso cada vez maior na vida das pessoas, na linha, aliás, das despesas com a saúde, mas, provavelmente, neste caso específico, ainda de uma forma mais agravada.
Por isso fizemos um desafio à indústria farmacêutica no sentido de encontrarmos um protocolo, uma fórmula ou um instrumento que também desse às empresas farmacêuticas um incentivo de contenção no esforço de vendas e no esforço de aumento da factura farmacêutica.
Conforme o Sr. Deputado disse - e bem -, muitas das alavancas para determinar o gasto com medicamentos estão nas mãos das empresas farmacêuticas, estão no seu esforço de marketing, estão no seu esforço de divulgação dos produtos. Por isso, nos pareceu importante criar um instrumento que também desse às empresas um incentivo para colaborarem no esforço de contenção do crescimento da factura.
Não inventámos nada de novo, aperfeiçoámos apenas um modelo já usado em 1996 ou 1997, estabelecendo tectos de crescimento, mas com um aperfeiçoamento. Ou seja, fixámos tectos de referência, sendo de 6,5% em 2001, portanto já para este ano - ainda não tenho os números de Outubro, mas, em Setembro, tínhamos um nível de crescimento de 9,2% ou 9,4%, não consigo precisar de memória, mas conseguimos já para 2001 um tecto de crescimento de 6,5% -, de 5% em 2002 e de 4% em 2003, existindo, portanto, uma tendência decrescente, e acoplámos-lhe também limiares máximos.
Portanto, o protocolo tem uma filosofia de enquadramento, em que o crescimento da factura farmacêutica tem de ser controlado, tem de ser contido. Por isso, se o crescimento real ultrapassar 10,5% em 2001, 10% em 2002 e 9,5% em 2003, o Ministério da Saúde pode imediatamente fazer cessar o protocolo, tendo de recorrer a outras medidas mais complexas, de descomparticipação ou outra qualquer, que, naturalmente, terão impacto sobre as empresas farmacêuticas, mas que podem também ter impactos sobre a população. Estas medidas só deverão ser tomadas em situação de crise. A ideia fundamental é a de criar um mecanismo que as próprias empresas possam sentir e possam usar internamente como limitação à sua actuação de expansão de gastos.
Quanto às questões um pouco mais concretas, designadamente quanto à simplificação administrativa dos processos de aprovação, Sr. Deputado Bernardino Soares, penso que há alguma confusão da sua parte. A simplificação administrativa de que se fala diz respeito aos processos de aquisição de medicamentos para os hospitais, e a sua concretização faz-se exactamente através dos contratos públicos de aprovisionamento, desenvolvidos a nível central, que têm, ou espera-se que venham a ter, impacto, como o Sr. Deputado disse - e bem -, na grande variação que há, hoje, de preços de aquisição de hospital para hospital.
Os contratos públicos são uma forma mais aligeirada, do ponto de vista administrativo, que o IGIF tem de fazer os velhos concursos públicos centralizados, em que cada hospital, depois, ainda pode e deve negociar, tendo como valor máximo o desses contratos, divulgando publicamente o IGIF, depois, recorrendo à tecnologia da Internet, todos os preços de todos os hospitais que compram aqueles produtos. E este é um mecanismo indutor - espera-se -, por natureza, de uma maior homogeneização dos preços.
No que diz respeito à questão do incumprimento dos prazos de aprovação da comparticipação, penso que não me levarão a mal se vos fizer uma pequena inconfidência. Ou seja, essa foi, de facto, uma exigência da direcção da APIFARMA para com o Ministério da Saúde, uma vez que - e este foi o argumento apresentado ao Sr. Secretário de Estado Francisco Ramos - o processo de autorização de entrada dos medicamentos para comparticipação demorava mais tempo do que o habitual, mais do que na minha anterior passagem por este cargo. Naturalmente que isso se justifica por existir um escrutínio bastante forte no meu gabinete dos processos, e a indústria farmacêutica estaria preocupada que esse trabalho levasse a um não cumprimento dos prazos.
Quanto aos factos, se, em 1998 e 1999, o INFARMED estava muito atrasado, nomeadamente no que dizia respeito à aprovação de processos para introdução no mercado, o que é diferente do processo para a comparticipação, hoje em dia, cumpre os prazos que estão em vigor, pelo que a questão não se põe.
Quanto à tributação em IRC, naturalmente que é diminuída. Era difícil convencer alguém a devolver o proveito e, ainda por cima, a pagar imposto sobre esse proveito que devolveu. Tem toda a razão! Se quiser fazer as contas líquidas para o Estado, à devolução ao Ministério da Saúde deverá ser abatida a quebra de receitas em termos de IRC. Não juro que todas as empresas

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apresentem lucros fiscais, mas, enfim, por aí, como perceberá, não vou meter-me.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Mas isso não é resposta para este problema!

O Orador: - Mas o mecanismo é esse.
No que se refere ao aumento de preços em 2002, devo dizer que ele se verificará - aliás, está previsto um aumento anual do preço dos medicamentos. O último aumento verificou-se em 1999 e o penúltimo foi em 1996, salvo erro. Estava já acordado e decidido um aumento de preços para entrar em vigor em Julho deste ano.
Mas a questão fundamental é a de que o aumento de preços é abaixo da taxa de inflação, num cenário em que a regra é a de um aumento anual de preços, mas em que, nos anos de 2000 e de 2001, não houve qualquer aumento. Portanto, parece-me minimamente justo que possa haver uma actualização do preço, por muito que se diga que a indústria farmacêutica é ainda uma indústria fortemente lucrativa, o que, se, em alguns casos, é verdade, noutros, provavelmente, nem tanto, nomeadamente no que se refere a empresas nacionais, que, naturalmente, também devem beneficiar desse aumento de preços.
Não temos qualquer dúvida de que isso vai ter reflexos, nomeadamente no mercado total dos medicamentos, que vai aumentar cerca 2,5%, fruto desta actualização de preços. Agora, no caso do Serviço Nacional de Saúde, exactamente devido ao protocolo, esse aumento não terá impacto, se a variação da despesa, nomeadamente no próximo ano, variar entre 5% e 10%. Os limites estabelecidos no protocolo incluem o efeito do aumento de preços, por isso o aumento não é para além destes valores.
Quanto à questão do escalão D, Sr. Deputado, que eu saiba, mas não lhe posso jurar a pés juntos, não há nenhum medicamento comparticipado nesse escalão. Julgo que se trata de um escalão que é útil, não para a entrada de medicamentos na lista de medicamentos comparticipados, mas, nomeadamente, para o processo de reavaliação, no sentido de se saber se os medicamentos devem continuar a ser comparticipados.
Este processo, aliás, está em curso e, nesta altura, parece-me, ainda que nada esteja decidido, que, nos casos em que - e isso está previsto na lei -, as empresas se comprometerem a apresentar estudos, durante um determinado período, que possam levar a confirmar ou não a validade terapêutica dos produtos, nesse período, em que se espera pela conclusão dos estudos, os medicamentos possam ser reclassificados nesse escalão D, que, na prática, será um período de transição, enquanto se espera pela decisão. Esta é a minha posição.
No que diz respeito à questão a que o Sr. Deputado chamou "ajustes directos do INFARMED com empresas", devo dizer que não se trata de ajustes directos, trata-se, sim, de um processo de contratualização do INFARMED com empresas farmacêuticas, exactamente no momento da discussão da entrada de cada produto na lista de medicamentos comparticipados. Este é um processo normal. Como sabem, o mecanismo de fixação dos preços dos medicamentos em Portugal é um mecanismo completamente administrativo, de comparação com o preço mais baixo de Espanha, França e Itália, mas vão para além disso. Em muitos casos, há, ainda, um processo de negociação do INFARMED e de avaliação económica, através de mecanismos de avaliação custo/benefício, que conduz, em muitos casos, a uma recomendação de baixa de preço.
O que a legislação também permite é, através de um processo negocial, fazer um contrato, digamos assim, ou seja, admite a entrada da comparticipação desse medicamento a um preço porventura mais alto do que aquele que resultaria da avaliação económica. E isso é justificado por aquilo que é, hoje, provavelmente, um problema sério e que, devo confessar, nem eu nem outros países temos resposta para ele, que são as exportações paralelas.
Diferenças de preços de medicamentos entre países europeus - grandes diferenças de preços, não são pequenas - levam, hoje em dia, ao mecanismo das exportações paralelas, ou seja, importação de um país em que o preço administrativo é mais baixo para um país em que esse preço, também administrativo, é mais alto e em que a única entidade que fica a lucrar com isso é o distribuidor, é quem faz esse comércio, quem compra e quem vende. Nem o Estado, nem o país exportador, nem o país importador, nem o consumidor final lucram com isso. Essa é uma questão importante. Aliás, é uma questão que está em discussão na Comissão Europeia, porque a solução não é fácil no âmbito do livre comércio na União Europeia.
O que os mecanismos dos contratos fazem é, se um medicamento deveria ter um preço mais baixo, permitir um processo de negociação - e isso já aconteceu nalguns casos, nomeadamente baixando o preço de outros medicamentos. Isso já aconteceu. Está a ser avaliado, e continuará a ser avaliado até ao final do ano, se esse é ou não um mecanismo que deve continuar a ser usado.
Não tenho de cabeça o montante dos juros da dívida - penso que se referia à Associação Nacional de Farmácias. Terei todo o gosto em fazer chegar essa informação o mais rapidamente que puder.
Quanto à sugestão de que a dispensa de medicamentos gratuitos seja feita em consulta externa, em vez da urgência hospitalar, é uma sugestão sobre a qual devemos trabalhar e aprofundar. Eu comungo das experiências que foram feitas em dois hospitais, que não correram mal. É evidente que há aqui um risco de indução. É que se se dão medicamentos gratuitos só nas urgências hospitalares, quer queiramos quer não, é um factor indutor da ida à urgência hospitalar - portanto, não se deve ir por aí.
Em relação às consultas, com certeza. Com mais um ponto: a reorganização da farmácia hospitalar, que está em curso. No fundo, estamos a dar continuidade ao que estava feito e que é fundamental para que isso possa ser feito com profundidade.

A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra o Sr. Ministro da Saúde.

O Sr. Ministro da Saúde: - Permita-me, ainda, Sr.ª Presidente, que acrescente duas notas: uma, a meu cargo, e outra, a cargo do Sr. Secretário de Estado do Orçamento.
Em relação à pergunta que o Sr. Deputado Vieira de Castro fez, acerca dos alunos do 6.º ano de Medicina, recebi, ontem, os representantes dos alunos e, de forma diferente da que o Sr. Deputado aqui exprimiu, devo dizer que não pretendo, de forma alguma, que o Ministério da Saúde tenha qualquer intervenção junto da Universidade

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nessa matéria. Eu tenho um respeito total pela autonomia universitária, tenho um respeito total pela forma como cada instituição define as suas provas de avaliação.
O que é facto é que a Faculdade de Medicina de Lisboa definiu provas diferentes de outros sítios do País e isso trouxe desconforto aos alunos. Eu não sou capaz de julgar esse processo e serei a última pessoa, quer individualmente, quer como Ministro da Saúde, a exercer qualquer pressão junto da Universidade nesse sentido.
Eu bem sei que 126 médicos - porque 9 médicos já fizeram exame - nos fazem falta! Eu bem sei! Mas princípios são princípios! E não terei a menor intervenção nessa matéria!
Segunda questão, eu tenho bem a noção do que é uma negociação e tenho bem a noção de que uma negociação só termina bem se não houver perda de face para todas as partes. Ora bem, eles estão num processo negocial, já envolveram o Reitor da Universidade, já envolveram outras entidades. Se, porventura - e eu disse isto aos jovens que me procuraram -, for necessário apenas um bom ofício do Ministério da Saúde no sentido de recomendar que as partes negociais não percam a face e atinjam uma solução final, eu estarei disponível para isso. Porém, não me introduzo no pormenor da questão - de maneira nenhuma! Aí, respeito escrupulosamente o princípio da autonomia universitária.
Quanto ao problema da urgência da resolução, não precisamos, Sr. Deputado Vieira de Castro, de estar tão preocupados. O Ministério da Saúde, a esse respeito, cumpre a sua parte de alguma tolerância. Faltam 17 dias até ao fim do concurso, como V. Ex.ª disse, e muito bem. Mas há mais 27 dias, o que perfaz 44 dias até ao fim do processo de colocação. O que o anúncio, que vai ser publicado na próxima sexta-feira em Diário da República, diz é que os candidatos podem inscrever-se condicionalmente, sem apresentação do diploma de licenciatura, protestando a apresentação do seu certificado de licenciatura até ao final do prazo.
Agora, eu avisei os candidatos que o prazo é o que está na lei e não pode ser prorrogado. E também não pode haver medidas excepcionais. Não se pode dizer que daqui a três meses fazemos não sei o quê… Isto porque isso iria criar uma situação de injustiça relativa em relação aos outros. Ao sermos muito tolerantes numa determinada altura, podemos estar a criar um problema que, depois, poderá cair em cima de todos nós e das gerações vindouras ou do curso imediato. São estas as posições do Ministro da Saúde.
Porém, fui extremamente aberto, incentivei os jovens a encontrarem uma solução negocial. Não posso fazer recomendações em relação à Assembleia nem em relação às forças políticas, mas, se me é permitido dirigir-me à minha bancada apenas, queria pedir-lhe que não procurasse, nesta matéria, uma excessiva tolerância ou uma posição de tolerância conjuntural. É que as tolerâncias conjunturais pagam-se extremamente caras. Estou certo de que os meus amigos de bancada não o fariam, mas esta é a única recomendação que eu faria.
Sr.ª Presidente, se V. Ex.ª permitir, passava a palavra ao Secretário de Estado do Orçamento.

A Sr.ª Presidente: - Com certeza.
Tem a palavra, Sr. Secretário de Estado.

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento (Rui Coimbra): - Sr.ª Presidente, vou tentar responder a uma questão posta não só pelo Sr. Deputado Patinha Antão como por outros Srs. Deputados, uma vez que, de há uns dias para cá, tem sido referido o artigo 57.º, alínea l), da proposta de lei do Orçamento do Estado e a eventualidade, ou não, do incumprimento da Lei de enquadramento orçamental.
Permitam-me que, no sítio certo, aborde esta questão e deixe uma sugestão, embora, como é óbvio, estejamos abertos a outra solução. No entanto, gostaria de, de alguma forma, fazer um resumo deste ponto.
Tem havido dois tipos de críticas.
Uma, que aparece e desaparece (pensei eu, ontem, na Comissão de Economia, Finanças e Plano, que tinha desaparecido, pareceu-me, hoje, que tinha aparecido, de novo), sobre o cumprimento, ou não, do artigo 22.º da Lei de enquadramento orçamental, o que, aliás, é normal, porque o artigo é novo, pelo que pode suscitar alguma confusão.
Mas o que diz o artigo 22.º é que, no momento do orçamento e em contabilidade pública, o saldo desse fundo e serviço autónomo deve ser maior ou igual a zero (neste caso, é igual a zero) e, mais - e isto é dito no número seguinte -, que, ao longo da execução, poderá ser diferente, desde que muito bem justificado.
Ora, isto conjuga-se muito bem com o que o Sr. Ministro da Saúde tem dito. Isto é: logo se verá, não sei qual é a periodicidade mas estarei à disposição da Assembleia para dar esses números sobre a execução e explicar se continua a ser igual a zero, se passa a ser maior que zero ou se é menor que zero. Nessa altura, ouviremos, com certeza, a justificação.
Ontem, já não se falou no artigo 22.º; hoje, voltou-se a falar nele, mas penso que, de alguma forma, este assunto está resolvido.
Passemos à segunda crítica, sobre a regra da anualidade, que, como sabem, foi tratada aquando do debate, na generalidade, do Orçamento do Estado e que, recursivamente, tem aparecido. A minha visão - e permitam-me que fale em meu nome, porque a decisão deste número foi conversada, como é óbvio, com o Ministro da Saúde mas foi uma decisão tomada no Ministério das Finanças - é esta: nós temos invocado que não se percebe este alarido em relação à regra da anualidade, nomeadamente temos referido o orçamento mais próximo a ter um preceito semelhante, que foi o de 1999, e percebi ontem, em conversa com a Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite, que o que estava em causa não era a alínea mas a data que lá consta.
Ontem, não tivemos oportunidade de falar mais sobre o assunto, mas queria partilhar o porquê da data, ou seja, 30 de Setembro. Ora bem, isto resume-se, muito simplesmente, ao orçamento de 1995. No orçamento de 1995, estava um preceito muito semelhante, sem data, que dizia: "Cumprimento de obrigações assumidas pelos organismos dotados de autonomia administrativa e financeira integrados no SNS, até ao limite de 70 milhões de contos". Portanto, era um preceito aparentemente muito parecido com este, mas sem a data. Daí a crítica, se assim podemos chamar, no sentido de que não deveria constar a data.
Porém, a ideia de se pôr a data foi porque, na sequência do orçamento para 1995, foi feito um despacho conjunto, que dizia como é que se aplicavam aqueles 70 milhões de contos. E passo a lê-lo: "Para este efeito, determina-se o seguinte: cada organismo do SNS com débitos em 30/11/94…" - relembro que se tratava do orçamento para

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1995 - "… que ultrapassem os 90 dias…". Estamos a falar de despesa até 30 de Agosto.
Ora, o orçamento para 1995 e este despacho conjunto, que, de alguma forma, ajuda o cumprimento do orçamento, fizeram com que pensássemos que seria útil uma alínea l) do artigo 57.º, que dissesse "Cumprimento de obrigações assumidas até 30 de Setembro de 2001…". Digo isto para explicar o porquê desta data.

A Sr.ª Presidente: - Qual é a data do despacho?

O Orador: - É de 1995. Início de 1995. Não vejo a diferença, mas com certeza que me explicará!
Mas o ponto da situação é este: como podem imaginar, para nós, Ministério das Finanças e Ministério da Saúde, não é crucial ter aquela data de 30 de Setembro. Não é minimamente crucial! Indicámo-la, porque achámos que devíamos ser rigorosos e dar essa informação adicional à Assembleia para que esta, quando está a autorizar-nos esses 89 milhões de contos, soubesse até que data, até que momento. Quisemos deixar isso muito claro.
Porém, depois de ter conversado com o Ministério da Saúde e, obviamente, com o Ministro das Finanças, quero afirmar que, para nós, isto não é crucial. Se os Srs. Deputados entenderem que é útil não constar a data, com certeza que retiraremos a data de 30 de Setembro.

A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Bernardino Soares.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Sr.ª Presidente, queria só lembrar que, certamente por lapso, o Governo não respondeu a uma das questões que era a de saber quem paga o eventual prejuízo na solução hospital-empresa. A resposta pode ficar para uma próxima ronda, mas não queria deixar de a lembrar.

A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra o Sr. Ministro da Saúde.

O Sr. Ministro da Saúde: - Sr. Deputado Bernardino Soares, não é o problema de quem paga. O hospital-empresa tem um preço pelos serviços que vende e o funcionamento do hospital é ressarcido, é financiado, é alimentado pelos serviços que vende. Portanto, quanto mais serviços vender, mais recebe, naturalmente!

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - E se houver má gestão?

O Orador: - Se houver má gestão…! E se um avião cair sobre o Parlamento?! E se, e se…?! Por amor de Deus!

A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Patinha Antão.

O Sr. Patinha Antão (PSD): - Sr.ª Presidente, vou ser muito breve.
Gostava de começar por fazer um comentário em relação ao que o Sr. Ministro referiu, quando falou no enquadramento legal, quanto às listas de espera. O Sr. Ministro sublinhou que, pelo enquadramento legal, a dotação orçamental para as listas de espera deve ser de 1% da dotação global do Ministério. Não é exactamente assim.
Permito-me referir que se trata de uma lei da Assembleia da República que diz que essa dotação não deve ser inferior a 1%. Evidentemente, não estou a sugerir que o Sr. Ministro não citou correctamente, mas isto permite-me represtinar a questão e voltar a dizer que, a nosso ver, seria fundamental que fizesse o reforço da verba, por causa da essencialidade e da importância que nós atribuímos a este objectivo.
Como V. Ex.ª sabe, apresentámos nesta Assembleia uma proposta e teremos todo o gosto em enviá-la, se estiver disponível para seguir a nossa sugestão de intensificação desta verba.
Há uma questão a que V. Ex.ª não respondeu. Na altura, não sinalizei essa situação, porque me parecia importante voltar à questão, visto que eu tinha fornecido apenas um exemplo e era importante colher a sua opinião não só em relação ao exemplo concreto que dei mas também em relação ao conjunto de situações em que essa matéria se enquadra.
A questão a que V. Ex.ª não respondeu foi esta: na previsão das despesas em contabilidade nacional, em matéria de despesas com medicamentos, está previsto que o Ministério assumirá compromissos, no ano de 2002, da ordem de 244 milhões de contos. No mapa que foi fornecido, quanto às despesas sobre medicamentos cujo pagamento está previsto, a verba inscrita é de 150 milhões de contos. Há, portanto, um diferencial da ordem dos cerca de 90 milhões de contos. Este foi o exemplo que dei.
Agora, gostaria de formular uma outra pergunta, agora numa base ampliada.
No entanto, antes de a fazer, permito-me recorrer a um grande especialista em finanças, da área da saúde, que disse, num artigo publicado em 2 de Abril de 2001, a propósito do orçamento para 2001, o seguinte: "Para 2001, o Ministério propõe-se reduzir do défice de 333 milhões de contos para 206 milhões de contos, ampliando em 116% a cobrança de serviços e contendo o gasto de pessoal em 3,3%.".
Diz, ainda, este reputado especialista: "Não é difícil identificar o irrealismo. Não tendo sido adoptadas medidas com demonstrada eficácia de contenção, é muito provável que a despesa de pessoal cresça a 11% e não a 3,3% e que as aquisições continuem a crescer aos 10% da média dos anos anteriores. Tudo junto, atira o deficit do final de 2001 para acima de 400 milhões de contos, em vez dos 206 milhões de contos idealizados."
V. Ex.ª já reconheceu que este reputado especialista é exactamente V. Ex.ª. E permiti-me citá-lo por duas razões: em primeiro lugar, porque concordo inteiramente com esta análise feita sobre o ano de 2001; em segundo lugar, porque me permite solicitar a V. Ex.ª que faça exactamente a aplicação do mesmo método para o orçamento para 2002, bem como elaborar, com base no próprio método e nos números que V. Ex.ª forneceu, a resposta a esta diferença, que vou passar a referir, que existe em 2002. Logo, peço a V. Ex.ª que confirme, ou infirme, ponto por ponto, esta aplicação do método que eu atribuo a V. Ex.ª - e que terá utilizado para o orçamento para 2001 -, que agora me permito utilizar para o orçamento para 2002.
Disse V. Ex.ª que, em sede de contabilidade nacional, o deficit global apresentado para 2002 é da ordem dos 270 milhões de contos.
Disse V. Ex.ª também, em mapas fornecidos à Comissão de Saúde e Toxicodependência, que o deficit de exercício - sublinho a diferença dos conceitos: o deficit de exercício -

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do ano de 1999 foi de 194 milhões de contos, que o deficit de exercício do ano 2000 foi de 206 milhões de contos e que o deficit de exercício estimado para o ano 2001 é de 199 milhões de contos. Retemos, portanto, a ideia de que, segundo V. Ex.ª, há um deficit de exercício estável no Serviço Nacional de Saúde, nos últimos três anos, que ronda os 200 milhões de contos.
Retomemos os elementos do deficit global e comparemos os valores programados ou previstos em contabilidade nacional e em contabilidade pública, que V. Ex.ª inscreveu nos dois mapas que nos forneceu em matéria de despesas.
A despesa que V. Ex.ª prevê, em contabilidade nacional, para o ano de 2002 é da ordem de 1594 milhões de contos; a despesa que V. Ex.ª inscreve para o ano de 2002, em contabilidade pública, é de 1244 milhões de contos. A diferença é de 350 milhões de contos.
Aplicando o método de V. Ex.ª, estes 350 milhões de contos decompõem-se da seguinte maneira: 80 milhões de contos são reforço de dotação para a empresarialização, isto é, para a dotação de capitais destinada aos hospitais, que, segundo a proposta do Governo, serão empresarializados, digamos assim. Retiremos, portanto, esses 80 milhões de contos e ficamos com um saldo a explicar da ordem dos 270 milhões de contos.
Então, notamos o seguinte: o montante de compras totais inscrito em contabilidade pública é de 190 milhões de contos; o mesmo montante de compras inscrito em contabilidade nacional é de 198 milhões de contos. A diferença é de 68 milhões de contos.
Quanto à despesa de subcontratos, está inscrito, em contabilidade pública, o valor de 265 milhões de contos e, em contabilidade nacional, o valor de 406 milhões de contos. A diferença é de 141 milhões de contos.
O somatório destas duas rubricas são 209 milhões de contos.
Tem V. Ex.ª, ainda, uma outra verba importante, que é a de custos extraordinários: em contabilidade pública, inscreveu 143 milhões de contos e, em contabilidade nacional, inscreveu 186 milhões de contos. O diferencial são 45 milhões de contos. Somados aos 209 milhões de contos, temos um total de discrepância entre os dois critérios de 254 milhões de contos.
Atrevo-me a dizer, Sr. Ministro, que este diferencial de 254 milhões de contos é exactamente o défice de exercício que V. Ex.ª encontraria se estivesse a aplicar este método para 2002, sendo que diria que esse défice de exercício para 2002 seria de 254 milhões contos.
Queira V. Ex.ª confirmar, ou infirmar, ponto por ponto, esta minha aplicação do método que V. Ex.ª aplicou para o orçamento para 2001.
Se este elemento for verdadeiro, permito-me reverter para a explicação avançada pelo Secretário de Estado do Orçamento.
V. Ex.ª, Sr. Secretário de Estado, disse: já foi, e voltou a ser, apresentada a argumentação de que este Orçamento violava o artigo 22.º da Lei de enquadramento orçamental. E mais: disse, e muito bem (aliás, nós estamos inteiramente de acordo e, de resto, eu próprio já tive ocasião de o afirmar), que o entendimento inequívoco desse artigo é o de que o deficit de exercício (e agora retorno ao critério) tem de ser nulo ou positivo. Foi isso que V. Ex.ª referiu, penso eu, e é essa a interpretação rigorosa.
E V. Ex.ª disse, ainda, que, no restante desse artigo, se permite ao Ministério das Finanças e ao Governo, em geral, corrigir as estimativas de receitas ou despesas por ocorrência de factos extraordinários, e até aqui estamos de acordo, Sr. Secretário de Estado do Orçamento. Já não consigo descortinar que sejam elementos imprevisíveis, neste momento, para a apresentação rigorosa do Orçamento do Estado, as discrepâncias entre contabilidade pública e contabilidade nacional que estão inscritas nos dois mapas que foram apresentados em sede de Comissão e que eu acabei de citar.
Não consigo compreender como é difícil prever o montante global de compras do próximo ano, não consigo compreender como é difícil prever o montante de despesa que vai realizar-se em medicamentos, como também não consigo compreender como é difícil entender a despesa efectiva real que vai ocorrer no próximo ano de 2002 em matéria de massa salarial.
E tenho também a evidência das estatísticas apresentadas por VV. Ex.as relativamente aos anos anteriores. Não há nenhuma anormalidade na tendência que estas grandes rubricas têm tido ao nível da execução do orçamento quer em 1999, quer em 2000, quer em 2001. Por isso, pressuponho que essas tendências estarão em 2002.
Nesse sentido, permito-me, com a devida vénia, considerar que o Governo, deliberadamente, não está a orçamentar na totalidade as despesas que correspondem aos seus efectivos compromissos para o ano de 2002 e, nesse sentido, está a violar a Lei de enquadramento orçamental.

A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Pisco.

O Sr. Paulo Pisco (PS): - Sr.ª Presidente, Sr. Ministro, muito sinteticamente - e peço antecipadamente desculpa, uma vez que terei de me ausentar, porque tenho uma reunião para a qual já estou um pouco atrasado -, gostaria de dizer que este Orçamento é apresentado sob o signo da contenção orçamental e, mesmo assim, não deixa de haver um acréscimo da ordem dos 5,6% das receitas destinadas à saúde, o que é significativo da prioridade que é dada à saúde, em Portugal, pelo Governo do Partido Socialista, no sentido de melhorar as acessibilidades e de tornar o sistema bastante mais justo.
Além desta preocupação, há uma questão que ressalta, que tem que ver com a necessidade de que esta racionalização seja feita com os meios, os instrumentos e as políticas que já estão no terreno e aquelas que estão previstas.
É neste sentido que existem, nas Grandes Opções do Plano para 2002 - e estão são, obviamente, indissociáveis do próprio Orçamento -, dois capítulos que assumem uma grande importância: um, que é "Melhorar a qualidade da despesa e combater o desperdício", e o outro, que tem que ver com a promoção da modernização administrativa e a melhoria da gestão no Ministério da Saúde, estando previsto um conjunto relativamente alargado de medidas para atingir estes fins.
A pergunta que gostaríamos de deixar ao Sr. Ministro é a de saber quais são os ganhos previsíveis com estas medidas que estão consubstanciadas nas Grandes Opções do Plano.

A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.

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O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr.ª Presidente, Sr. Ministro, também quero pedir-lhe alguns esclarecimentos adicionais em relação aos mapas que, entretanto, nos foram entregues por causa das diferenças existentes entre o que está orçamentado em contabilidade pública e o que está orçamentado em contabilidade nacional, as quais gostaria que fossem explicitadas.
Antes disso, a propósito da explicação dada, há pouco, pelo Sr. Secretário de Estado do Orçamento, sobre a data da regularização de dívidas, penso que o problema não é só o da data, ou não é fundamentalmente o da data.
Tendo presente que, com o Orçamento rectificativo deste ano, as dívidas de anos anteriores ficaram saldadas, tendo em conta que a data de Setembro significa que não é dívida rolante, daqui se conclui que estamos perante um pedido de regularização de dívidas de despesa efectiva de 2001.
Se é verdade - e estou de acordo - que, em matéria de défice, isso não tem repercussão na contabilidade nacional, em sede de contabilidade pública, há um pedido para resolver, por via da dívida, uma despesa efectiva feita entre Janeiro e Setembro de 2001. Logo, é uma despesa deste ano. Nem sequer é dívida rolante, porque é feita até Setembro. Enfim, se fosse feita em Novembro ou em Dezembro ainda poderia ser uma dívida rolante, porque eram encargos a assumir no ano seguinte. Mas trata-se de uma despesa efectiva de 2001.
Portanto, Sr. Secretário de Estado, penso que a data que os senhores puseram no Orçamento foi uma ingenuidade - se me permite esta reflexão, esta confissão em voz alta -, porque ela só serviu para explicitar que, em contabilidade pública, estamos perante uma desorçamentação.
Não há volta a dar, embora saiba que, depois, na óptica da contabilidade nacional está lá, porque é um encargo; na contabilidade pública, não há volta a dar! Penso que esse excesso de "transparência", como o Sr. Secretário de Estado chamou, serve para pôr em relevo que há aqui um processo efectivo de desorçamentação em sede de contabilidade pública.
Passo às questões que quero colocar ao Sr. Ministro ou ao Sr. Secretário de Estado. Sabemos quais são as distinções entre contabilidade pública e contabilidade nacional (não estamos agora a fazer seminários sobre isso), mas há aspectos que valeria a pena o Governo esclarecer - e é mesmo de esclarecimentos que precisamos.
Em relação a despesas com pessoal o Governo prevê, na óptica da contabilidade nacional, segundo os mapas que nos entregou, um aumento de 5%. De facto, na óptica da contabilidade pública, esse aumento é de 3,1%, porque em "Despesas com pessoal" há uma diferença entre os valores inscritos na óptica da contabilidade pública e na óptica da contabilidade nacional de 11,078 milhões de contos.
Portanto, se, em relação a "Outras despesas", percebo que os encargos possam passar para o ano seguinte, no que toca a "Despesas com pessoal" não vejo como isso é possível, a menos que se sejam - adianto desde já esta justificação - relativas a horas extraordinárias realizadas em Novembro ou Dezembro e que só serão pagas no ano de 2003. Não sei se será esta a justificação, uma vez que o pagamento das horas extraordinárias têm vindo a ser atrasado, não sei se por razões voluntárias ou de políticas de gestão, ou se por razões de contabilização efectiva.
Porém, gostava de saber a razão desta passagem para 2003 de um encargo em despesas com pessoal de 11,078 milhões de contos.
Quanto aos consumos e às subcontratações há, de facto, uma enorme redução efectiva em 2002. Já foram referidos alguns números, designadamente, a diminuição, em matéria de consumos, é de cerca de 88 milhões de contos, só em 2002, e, em matéria de subcontratos, anda na ordem dos 112 milhões de contos. É possível que haja uma resposta para esta situação, porque com o Orçamento rectificativo, com a assunção da dívida para este ano e com os recebimentos de anos anteriores previstos é capaz de haver uma margem que permita que, em 2002, as despesas efectivas desse ano não tenham correspondência com o previsto para 2001.
De qualquer modo, gostava de ter sobre isto um esclarecimento, porque, em movimento de Caixa para 2002, há uma redução de despesas de consumos (compras, fornecimentos, vendas às farmácias) que parece impossível de concretizar. De duas uma: ou há uma suborçamentação ou, então, há uma engenharia, legítima, que joga com os valores das dívidas de anos anteriores que foram este ano resolvidas, o que, portanto, permitirá uma margem de manobra para diminuir os encargos efectivos no ano próximo. No entanto, gostaria de obter um esclarecimentos acerca disto.
Sr. Ministro, entre os mapas iniciais que nos tinham sido entregues e os mapas finais há uma alteração de nomenclatura sobre a qual eu também gostaria de ouvir uma explicação.
Nos mapas iniciais que nos tinham sido entregues aparecia uma receita de 60,628 milhões de contos como "Recebimentos de anos anteriores". Estes 60,628 milhões de contos de "Recebimentos de anos anteriores", que tem esta nomenclatura num determinado momento, aparecem agora, nos quadros, na óptica da contabilidade nacional, que nos foram entregues, como "Proveitos extraordinários".
O Governo, na justificação, diz que isto resulta, não só mas em parte, do resultado financeiro do acordo celebrado com a APIFARMA. Mas, se o acordo celebrado com a APIFARMA só agora entra em vigor, esta situação não pode ser resultado dos anos anteriores.

O Sr. Ministro da Saúde: - O acordo é de 2001!

O Orador: - É de 2001. Logo, isto não é de anos anteriores.
Por isso é que não percebo como estes 60,628 milhões de contos, que aparecem agora contabilizados em "Proveitos extraordinários" em resultado do acordo com a APIFARMA, constam do mapa anterior como "Recebimentos de anos anteriores", quando nessa altura o acordo ainda não existia. Portanto, gostaria de saber qual é a justificação para esta diferença, para estes saltos em relação à contabilização e à explicação. Isto porque, se se trata de recebimentos de proveitos deste ano, de 2001, muito bem, mas, se é de anos anteriores, então, a justificação não é a mesma. Os senhores dão para o mesmo valor uma justificação e uma contabilização diferente.

A Sr.ª Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Martins.

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O Sr. Carlos Martins (PSD): - Sr.ª Presidente, Sr. Ministro da Saúde, gostaria de ouvir V. Ex.ª ou a Sr.ª Secretária de Estado Adjunta do Ministro da Saúde sobre algumas questões na área do investimento em saúde. Trata-se de uma questão que ainda não foi abordada esta tarde, e o investimento em saúde tem, como o Sr. Ministro sabe, muito a ver não só com a evolução da quantidade e da qualidade da prestação dos serviços mas também com a evolução da despesa em 2002 e nos anos seguintes.
Há uma nota, que tenho de voltar a colocá-la, no plano da transparência, que é a de continuarmos sem o mapa da execução, ou pelo menos da sua estimativa, do PIDDAC de 2001, o que não nos permite analisar de forma eficaz o PIDDAC para 2002. Independentemente disto, e no plano do rigor, não vou aqui recolocar a questão do helicóptero de Outubro de 1997 mas, sim, a dos hospitais da coroa de Lisboa - nas palavras da Sr.ª Secretária de Estado Adjunta -, ditos da cintura urbana de Lisboa.
De facto, esses hospitais, em 1997 - há alguma analogia com o momento actual, pois decorridos quatro anos também estamos em véspera de eleições autárquicas -, são prometidos e incluídos em PIDDAC, portanto, prevendo-se para eles fundos nacionais e fundos comunitários.
Decorridos dois anos, o Governo descobre que já não há capacidade de financiamento através de fundos comunitários e passa os quatro hospitais - entretanto, mudando já a tutela e nesta nova Legislatura - para aquilo a que chama project finance. Muito se disse ao longo dos últimos dois anos sobre a questão do project finance, mas o facto é que nas discussões de Orçamento do Estado, em sede de especialidade, nunca conseguimos, até hoje, saber, da parte do Governo, a resposta a duas ou três questões que deixo para o fim. E isto porque, durante todo o 1.º semestre de 2001 - pelo menos no início de 2001, o 1.º trimestre seguramente -, sempre que falávamos, em sede de comissão parlamentar ou, em finais de 2000, de discussão do Orçamento do Estado, na situação dos novos hospitais da dita coroa de Lisboa éramos remetidos para os planos directores regionais, que seriam elaborados em 2001. Isto é, na opinião do Governo, porque o Governo é o mesmo, esta e outras situações, que também abordaria de forma breve, estavam todas elas condicionadas a estes instrumentos de ordenamento e de planeamento, e, portanto, sem eles não haveria uma definição muito concreta.
A questão, e já agora vou colocá-la ao Sr. Ministro, é saber se, de facto, o PIDDAC para 2002 está condicionado, no bom sentido, deduzo eu, pelos planos directores regionais, que, ao que sabemos, ainda não estão concluídos, embora a Sr.ª Secretária de Estado, em 20 de Outubro, nesta mesma Sala, tenha afirmado - e, aqui, concordando connosco, daí que, no plano da seriedade, tenha, mais uma vez, de felicitá-la, porque, de facto, pôs o dedo na ferida, em que a maior das inscrições em PIDDAC são fictícias - a necessidade de se ter planos directores nacionais para passarmos a ter de facto um PIDDAC não virtual mas real. Só que esta questão é recolocada decorrido um ano - sinceramente, com o devido respeito, ouvimos aqui exactamente o mesmo há um ano.
Ora, significa isto que a não solução do problema era devido, numa primeira fase, a ausência de verbas em PIDDAC, ou, recuando um pouco mais, a 1997, inícios de 1998, à ausência dos programas funcionais, instrumento por demais evidente como necessário para arrancar com um processo de concurso público internacional. Mas, numa segunda fase, o problema já não era este mas, sim, o da ausência de fundos comunitários; numa terceira fase, já era o da ausência de planos directores regionais. Eis que agora chegamos a uma nova versão, decorridos quatro anos. Isto é, eu diria que de dois em dois anos há uma nova versão para este problema.
Há dois anos atrás, o entrave para a solução era a ausência de fundos comunitários, partia-se para o project finance; e, agora, com o mesmo Governo e o mesmo Primeiro-Ministro, mas com uma equipa ministerial diferente, a solução já é diversa: dois dos hospitais serão financiados por uma parceria público/público e os outros dois por uma parceria público/privado.
Naturalmente, Sr. Ministro, a questão não só daqueles que estão na área de influência destes hospitais mas da esmagadora maioria do Portugal profundo, daqueles que, de uma forma ou de outra, também irão necessitar de continuar a fazer quilómetros em direcção à capital do País, daqueles que ouvem há quatro anos falar nestes hospitais, já não está no plano conceptual, a questão, neste momento, é saber quando é que as obras arrancam e, acima de tudo, quando é que entrarão em funcionamento.
Pensamos que a esmagadora maioria da população (desde os autarcas até aos profissionais de saúde, terminando na população das áreas de influência destes hospitais) não quer saber se os hospitais irão ser financiados em project finance ou em parceria público/público. Sinceramente, penso que, neste momento, a vontade da população é ver cumprido este desiderato.
Por outro lado, para terminar, ainda no plano do PIDDAC, vou colocar uma questão de âmbito regional, pois ficar-me-ia mal se não confrontasse o Sr. Ministro com esta questão, com a devida vénia à comunicação social, mas não consegui perceber bem o alcance da sua eventual afirmação.
Ora, notícias vindas a público diziam que V. Ex.ª já traçou o destino de todos os hospitais - e é com isto que quero confrontá-lo. Não parto do pressuposto de que é verdadeira esta notícia, porque faltam os tais planos directores municipais - daí a minha dúvida -, mas gostaria de saber o que aconteceu com um dossier que existia no Ministério da Saúde referente a 20 pretensões de novos hospitais, novos de raiz ou novos de substituição. Várias vezes, nesta mesma Sala, fomos confrontados com esta questão, de que havia um dossier com 20 pedidos de autarquias ou de administrações hospitalares para a substituição ou construção de novos hospitais.
Sr. Ministro, em concreto, na região por que fui eleito - e, seguramente, estas não são questões novas -, estamos a falar da construção de raiz do hospital do sotavento do Algarve e da relocalização do Hospital Distrital de Lagos, matéria que tem merecido o consenso dos autarcas de vários partidos e dos profissionais de saúde. Estes pedidos estavam no dito dossier, que dependia do plano director regional e também da definição do que seria o parque hospitalar do nosso país.
Portanto, Sr. Ministro, são estas as questões sobre os investimentos que coloco, que, naturalmente, têm a repercussão que têm em matéria de execução orçamental para 2002, mas têm, acima de tudo, muito a ver com as legítimas expectativas das populações e dos profissionais de saúde no que toca à qualidade dos serviços que todos desejam prestar aos nossos concidadãos.

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A Sr.ª Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Luísa Portugal.

A Sr.ª Luísa Portugal (PS): - Sr.ª Presidente, Sr. Ministro da Saúde, apesar de, hoje, aqui já se ter falado muito de recursos humanos, gostava de colocar-lhe mais duas questões, pensando os recursos humanos não tanto como rubrica de despesa orçamental mas, antes, na sua importância estratégica para as várias medidas que nos são apontadas, em termos das Grandes Opções do Plano.
Na verdade, conhecemos as propostas de medidas inovadoras em termos de prestação de cuidados, a vontade da equipa do Ministério em reforçar o sistema de contratualização para a prestação de cuidados, a importância que dá à avaliação e ao pagamento, nomeadamente a alguns profissionais de saúde, pelo seu mérito e produtividade, medidas estas que, certamente, estão enquadradas numa área mais vasta de gestão de recursos humanos. No entanto, vão aparecendo alguns tipo de prestação de cuidados emergentes e que certamente irão consumir muitos recursos humanos - estou a falar, nomeadamente, de áreas como a prevenção e o tratamento da SIDA e outras patologias deste tipo, estou a lembrar-me, por exemplo, dos vários tipos de cuidados na prevenção da luta contra a droga e a toxicodependência, onde, certamente, teremos de reorganizar toda uma oferta de recursos humanos, dos cuidados continuados.
Embora ponha em cima da mesa a grande importância que o Sr. Ministro dá e o grande trabalho que começou a desenvolver na área das parcerias, e provavelmente estará aqui, o Sr. Ministro me dirá, alguma forma de resolver estas questões, gostava que o Sr. Ministro, de uma forma simples - a minha pergunta é simples, a resposta não sei se o será tanto -, nos desse a resposta em duas vertentes diferentes: por um lado, a das várias profissões emergentes na saúde, cuja importância sabemos, já que a saúde sai cada vez mais do âmbito tradicional dos médicos e dos enfermeiros e é uma área cada vez mais complexa, necessitando por isso de outro tipo de profissionais; e, por outro lado, a da falta de profissionais a, praticamente, todos os níveis, que sabemos existir, em relação aos profissionais ditos mais "clássicos", e aqui realço, especialmente, a área da enfermagem, porque na dos médicos realço não tanto a sua falta mas a sua distribuição.
Portanto, gostaria que, nestas duas ópticas, o Sr. Ministro nos dissesse o que achar por bem em relação ao que pretende para 2002.

A Sr.ª Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra, Sr.ª Deputada Natália Filipe.

A Sr.ª Natália Filipe (PCP): - Sr.ª Presidente, Sr. Ministro da Saúde e Srs. Secretários de Estado, há aqui três aspectos que eu gostaria de realçar.
Na sequência da última questão colocada pela Sr.ª Deputada Luísa Portugal, tendo em conta, concordando e subscrevendo, a questão da importância dos profissionais de saúde para o desenvolvimento de medidas estratégicas que se pretendam desenvolver, aquilo que é notório, conhecido, quantificado e objectivado relativamente à carência de recursos humanos nas diferentes áreas, predominantemente e com grande acutilância na área dos cuidados de saúde primários, e aquilo que diz respeito aos recursos humanos para 2002, pergunto, concretamente: qual é a quota de descongelamento prevista para profissionais de saúde no Ministério da Saúde? Ou seja, qual é o número de vagas previstas para enfermeiros, médicos e outros profissionais, tendo em conta que eles são precisos, e relembro que só nas instituições públicas de saúde existem 12 000 vagas nos quadros da função pública para enfermeiros? Eventualmente não haverão novas unidades para abrir, mas, hoje, com as instituições que já existem, há carência objectiva de recursos humanos.
Relativamente à questão aqui abordada sobre o Programa para a Promoção do Acesso, houve uma expressão utilizada pelo Sr. Ministro que tem a ver com os compromissos de honra por parte das instituições no que se refere às cirurgias programadas. Assim, pergunto, muito concretamente: qual é o número de cirurgias contratualizadas, nos diferentes hospitais, no âmbito do Programa para a Promoção do Acesso e qual é o volume de cirurgias já programadas, planeadas, pelas instituições para o ano 2002? Fazemos esta pergunta porque entendemos - e volto à questão - importante termos conhecimento, com objectividade, da actividade normal das instituições, para podermos perceber onde está o sistema de vasos comunicantes entre as cirurgias planeadas e o Programa para a Promoção do Acesso.
Passando ao PIDDAC, no ano passado fizemos aqui uma crítica aos investimentos previstos para 2001; ou seja, nos investimentos previstos para centros de saúde e hospitais, os relativos aos centros de saúde representavam um terço dos destinados aos hospitais, o que efectivamente se veio a concretizar, como se pode verificar, olhando para o PIDDAC global, pela execução prevista para 2001.
Olhando para os investimentos previstos para 2002, verificamos os destinados aos centros de saúde não estão a um terço mas a metade. E a crítica que fazemos ao Sr. Ministro é a de que muito se tem falado, muito se fala, da questão dos ganhos em saúde para as populações, mas a pedra-de-toque importante e determinante para que efectivamente as populações sejam saudáveis são os cuidados de saúde primários. Ora, os cuidados de saúde primários prendem-se com aquilo que falei anteriormente sobre os recursos humanos, com a importância do reforço em recursos humanos nos cuidados de saúde primários, para que, efectivamente, este possa desenvolver o conjunto dos programas que são necessários para a prevenção da doença e a promoção da saúde.
Sr. Ministro, todos os dias há queixas de utentes que não têm médico de família, porque, por exemplo, há profissionais que se reformaram, profissionais que são aliciados para trabalhar no sector privado para o que pedem licenças sem vencimento. Repito, todos os dias ocorrem situações destas e há, por isso, que haver investimento, que também passa pelo PIDDAC, na melhoria das condições de funcionamento dos centros de saúde, na melhoria das instalações e das condições de trabalho dos próprios profissionais.
Mais concretamente sobre aspectos do PIDDAC, gostaria de perceber o que aconteceu a duas ou três situações que identifiquei, nomeadamente em Lisboa, e que, no âmbito do PIDDAC, não consegui ficar devidamente esclarecida.
Uma delas tem a ver com programas que têm estado inscritos em PIDDAC de anos anteriores e que não constam do PIDDAC para 2002. Dou como exemplo a extensão de saúde de São Brás, do Centro de Saúde da Amadora, em relação à qual o Ministério da Saúde, já com

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esta nova equipa, respondeu dizendo que estava em desenvolvimento o concurso público para a empreitada e que a obra seria executada no ano de 2003. O certo é que esta inscrição não consta do PIDDAC para 2002.
No entanto, foi dado o mesmo tipo de resposta em relação a outras extensões de saúde, tais como as da Pontinha, da Ramada, de Sobral de Monte Agraço, e também estes projectos não constam no PIDDAC para 2002, apesar de, na resposta que foi dada, em Outubro, ao PCP, ter sido dito que iriam ser incluídas. Por isso, gostaria de perceber o que aconteceu efectivamente.
Por outro lado, também gostaria de saber qual é a recomendação do Plano Director Regional relativamente a vários hospitais, nomeadamente ao Hospital Curry Cabral, para o qual continuam a constar verbas para investimentos. Relembro que há mais de 10 anos já existia a ideia de que este hospital seria para encerrar - falava-se disto pelos corredores - e, a determinada altura, com a construção do hospital de Loures, parecia que este hospital era para acabar, em definitivo. Porém, o que acontece é que continuam a ser feitos investimentos no Hospital Curry Cabral, estando-se, inclusivamente, a fazer uma obra a meia dúzia de passos da linha de caminho-de-ferro, o que em nada beneficiará certamente o bom funcionamento do equipamento e o bem-estar dos utentes, quer estejam eles internados, quer sejam eles servidos por esse serviço.

A Sr.ª Presidente: - Para responder a este segundo grupo de questões, tem a palavra o Sr. Ministro da Saúde.

O Sr. Ministro da Saúde: - Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Patinha Antão, agradeço muito ter-me ensinado que a verba para o Programa para a Promoção do Acesso pode ser superior a 1%, e conto com a benevolência de V. Ex.ª para, caso hajam recursos no Ministério, podermos realizar essas cirurgias. Mas não nos peçam simultaneamente mais gastos! O Sr. Deputado critica-nos, pelo menos o seu partido, por sermos despesistas, agora também não nos peça… Posso ser tolerante numa ou noutra alínea, mas, se vamos seguir todas as vossas recomendações, chegamos a certa altura e "somos presos por ter cão, e presos por não ter", o que, estou certo, V. Ex.ª não quererá.
Em relação aos medicamentos e à discrepância entre o orçamento de Caixa e o orçamento económico dos medicamentos, lembro que, com a discrepância que aqui temos, estamos a pagar a 110 dias, e devo dizer-lhe que, conhecendo o Ministério como conheço, não me sinto muito desconfortável. É evidente que gostaria de estar a pagar a 90 dias, certamente, mas não me sinto muito desconfortável nessa situação.
Agradeço a sua referência ao tal reputado especialista, e devo dizer-lhe que o reputado especialista não tem rigorosamente nada a alterar aos métodos que apresentou. Aliás, foi até com base nos métodos que utilizou nesse artigo, que V. Ex.ª me honra citando-o, que preparámos o orçamento na óptica da contabilidade nacional. E o Sr. Deputado, que olhou, com certeza, para os números, viu que eles não são irrealistas.
Como o Sr. Deputado pode verificar, temos 5% de aumento em vencimentos quando este ano vamos ter, certamente, um aumento obrigatório da função pública menor do que o do ano passado, porque também vamos ter uma inflação estimada menor; em matéria de compras, os 197 milhões de contos representam até uma décima mais do que a previsão da execução do ano anterior; há, nos "Fornecimentos e Serviços" uma diferença de 1% (de 6% para 5%); nos medicamentos, o acordo com a APIFARMA permite-nos este ano, já em 2001, ter tectos, e é o que aí está fixado, 9%, e o do próximo ano reflecte exactamente os 5% dos 64% do volume global de vendas dos medicamentos saídos.
Nos meios convencionais de diagnóstico, prevemos um ligeiro acréscimo em relação à estimativa de execução para o final deste ano, de 7,2% para 7,5%, e o mesmo ocorre com "Outros", que passa de 7,2% para 7,5%. Não temos qualquer razão para imaginar que haja qualquer espécie de desorçamentação nas nossas previsões. As nossas previsões são muito realistas e implicam uma gestão tensa, como eu disse na minha intervenção parlamentar, que é isso que queremos. O que queremos é uma gestão em que os gestores estejam responsabilizados, tenham a noção de que têm nas suas mãos um orçamento.
Vou dar-lhe um exemplo muito simples, para responder também a algumas das perguntas sobre onde pensamos fazer poupança: se contarmos tudo aquilo que, no ano passado, por exemplo - e também em muitos anos anteriores, não só desde há seis anos como, certamente, antes disso -, foi pago como despesas ordinárias de exploração e que são investimentos, temos um enorme conjunto de obras de equipamentos que foram pagos desta forma. Visitámos hospitais centrais onde 2 milhões de contos de despesa do ano passado foi paga pelo orçamento ordinário. E só nos apercebemos disso ali, no momento!
Sr. Deputado, eu não exagero se lhe estimar que é possível reconverter 10 milhões de contos, que estão a sair pelas dotações de funcionamento, em dotações de capital, naquilo que é, verdadeiramente, a sua origem.
Portanto, há uma enorme possibilidade de reorientarmos o Ministério. É evidente que incluir umas obras da urgência ou um equipamento de 500 000 contos no PIDDAC dá trabalho. Dá trabalho! É preciso falar com a ARS; convencer a ARS; a ARS tem de compatibilizar isso com os cuidados primários, com não sei quantas pessoas, etc.
Portanto, numa certa atitude de laxismo, em que, porventura, se tenha caído, de insensibilidade relativa em relação ao défice, as pessoas admitem acrescentar mais alguma coisa ao défice, colocando lá aquilo que são despesas de capital. Esta é também uma área onde queremos intervir.
O Sr. Secretário de Estado, Dr. Francisco Ramos, vai depois tentar analisar, ponto a ponto, as suas recomendações e as suas críticas em relação ao défice do exercício, que não será exactamente como o Sr. Deputado diz. Mas quero dizer-lhe que não nos podemos esquecer de que há, num mapa que também foi distribuído, 94,2 milhões de contos de créditos do Ministério da Saúde sobre terceiros, o que faz com que haja ainda alguma folga.
O Sr. Deputado Paulo Pisco interrogou-me sobre o problema do desperdício. Ora bem, dissemos, repetidamente, nas Grandes Opções do Plano que não queremos gastar menos, mas queremos gastar melhor. Não queremos acabar com as remunerações líquidas e brutas dos médicos, através das horas extraordinárias. O que queremos é mudar o sistema das horas extraordinárias, porque é um sistema irracional, é um sistema que induz a dispêndio sem ganhos de produtividade. Queremos passar

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as horas extraordinárias para um sistema em que haja uma especialização da urgência: em vez de, nas urgências de um grande hospital, haver 66 pessoas/noite, poderão existir apenas 30 pessoas, as quais podem, com certeza, resolver as situações.
Encontrámos, no sistema actual, um hospital, que tem nove partos por dia, com quatro obstetras de serviço permanente. Toda a gente sabe, não é preciso ser-se médico ou enfermeiro para se perceber que quatro médicos obstetras de serviço permanente para nove partos, em média, por dia é um excesso, um desperdício, porque bastam dois.
Portanto, o que queremos é chamar a atenção do hospital para este gerir esse dinheiro, redistribuindo e criando regimes remuneratórios experimentais, o que já se faz em alguns centros de saúde, adaptados ao sistema hospitalar.
O Sr. Deputado Lino de Carvalho colocou perguntas, o que lhe agradeço, mas, em grande parte, também deu as respostas.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Foi só para lhe facilitar a vida!

O Orador: - Muito obrigado, sei que V. Ex.ª é um "amigo" do Governo.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Seu!

O Orador: - Não tenho outra apreciação sobre o comportamento parlamentar de V. Ex.ª, e conhecemo-nos há muitos, muitos, anos.
Na realidade, devo dizer-lhe que não há atrasos no pagamento das horas extraordinárias, o atraso verifica-se no pagamento das 35 horas para as 42 horas, onde começamos, agora, já, a pagar, de acordo com o Decreto-Lei n.º 92/2001. Portanto, não há, de maneira nenhuma, atrasos, mas é natural que se chegue ao fim do ano e que as horas extraordinárias do mês anterior fiquem por pagar. Daí, como V. Ex.ª muito bem referiu, a discrepância.
Quanto ao acordo com a APIFARMA, designadamente no que diz respeito aos pontos dos proveitos extraordinários e da receita efectiva, dos 89 milhões de contos dos anos anteriores mais os 80 milhões de contos de passivo, quero dizer-lhe o seguinte: os 80 milhões de contos de passivo vão servir não só para dar capacidade empresarial aos hospitais mas também absorver-lhe passivo. E uma boa parte das dívidas que os hospitais têm à indústria farmacêutica também vão ser, possivelmente, amortizadas ou anuladas através deste mecanismo, além dos 89 milhões de contos de que dispomos.
Portanto, não temos, sobre isto, qualquer visão catastrofista. Pensamos que os 89 milhões de contos vão dar-nos uma folga, uma margem, para anular o passivo, que depois nos permite entrar no real de uma outra forma. Quer dizer, um hospital, que tenha um passivo muito reduzido, pode fazer aquisições e gerir pessoal de outra forma completamente diferente; não precisa de estar "com a corda na garganta", como muitos dos nossos estabelecimentos, infelizmente, estão.
O Sr. Deputado Carlos Martins…

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Ministro, peço desculpa, mas só para arrumarmos esta questão, há duas questões a que não respondeu. Uma tem a ver com…

O Orador: - Sr. Deputado, o Sr. Secretário de Estado da Saúde vai responder.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sendo assim, peço desculpa, Sr. Ministro.

O Orador: - Mas se quiser, ele responde já.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Não é preciso, Sr. Ministro. Não tinha percebido.

O Orador: - Sr. Deputado Carlos Martins, em relação ao mapa do PIDDAC para 2001 e a toda a sua teoria sobre se os hospitais na coroa norte de Lisboa, de passarem ou não para PFI, quero dizer-lhe que sou uma pessoa muito prática e muito positiva.
Sr. Deputado, dois meses antes de eu tomar conta da pasta da saúde, a anterior ministra, Sr.ª Professora Manuela Arcanjo, convidou-me a fazer um estudo sobre a aplicação dos PFI na região de Lisboa e apresentei-lhe uns termos de referência desse estudo. Feliz ou infelizmente, tive de assumir esta responsabilidade e, de imediato, dei seguimento a essa iniciativa, constituindo um grupo de missão. Se quiser ter a maçada de aguardar alguns dias, poderá ver, no Diário da República, a constituição do grupo de missão, chamado "Parcerias. Saúde", que está dotado de capacidade e de recursos para poder realizar esta iniciativa.
Deixe ser-lhe totalmente positivo. Não sei de viagens de helicóptero, nem sei de promessas, nem sei de coisas nenhumas dessas. Não me interessam! O que me interessa é ter coisas práticas realizadas.
Sr. Deputado Carlos Martins, os dados do Censos deste ano, que foram revelados a partir de Julho, vieram trazer aos portugueses algo que, porventura, não sabiam, sobretudo aos da região de Lisboa. Lisboa tinha sido uma cidade de 800 000 habitantes, e tem hoje 560 000 habitantes. Ora, os Censos vieram dizer que o concelho de Sintra, que, como toda a gente sabia, tinha crescido muito em 10 anos, mas não sabia quanto, tem agora 115 000 habitantes, e o concelho da Amadora, juntos, têm 530 000 habitantes - é outra Lisboa! Os dados dos Censos também nos vieram dizer que os concelhos de Cascais e Oeiras têm, juntos, 350 000 habitantes, que os concelhos de Odivelas e Loures têm, juntos, 310 000 habitantes e que o concelho de Vila Franca de Xira e os cinco concelhos do seu "hinterland", da sua área de atracção, têm 215 000 habitantes.
Esta é uma realidade, desculpe, que, para mim, foi nova. V. Ex.ª poderia estar dentro do conhecimento da evolução demográfica da Grande Lisboa, eu, confesso-lhe, não estava e suponho que muita gente não estava.
Bom, perante esta situação, não há que hesitar, não há que perder mais tempo. É absolutamente essencial construir os quatro hospitais da coroa de Lisboa. E, quando olhamos para os números da cidade, o que é que vemos? Vemos que na Av.ª Almirante Reis estão situados os hospitais que servem 560 000 habitantes e que os 1,5 milhões habitantes que existem à volta da cidade têm dois ou três hospitais e alguns adaptados, como o antigo Hospital Colonial adaptado a Hospital de Egas Moniz, o antigo Sanatório D. Carlos I adaptado a Hospital de Pulido Valente, uma pequena clínica privada pessimamente adaptada a hospital, primeiro, polivalente e, agora, pediátrico, uma antiga clínica privada adaptada a hospital cardiológico e nefrológico e, agora, com outras valências, etc.

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Tudo isto tem de ter uma volta, e é esta a responsabilidade que o Ministério da Saúde tem neste momento. Portanto, pegámos nos projectos anteriores que havia, no estudo do plano director, que está insuficiente, incompleto… Para lhe dar um exemplo, o plano director não pensava, sequer, na existência do hospital de Loures. Perguntar-me-á o que é que se passou. Não sei. A primeira coisa que fiz, quando vi o plano director, foi chamar a empresa e exigir que refizessem a análise, tendo em conta a informação demográfica. Provavelmente, eles fizeram a análise em Janeiro, altura em que ainda não tinham sido publicados os dados dos Censos 2001. Portanto, há realmente explicações para as dúvidas de V. Ex.ª.
O Sr. Deputado pergunta se estamos à espera dos planos directores regionais (PDR). Não! Não somos como o Bocage que fica à espera da última moda para fazer o fato! Os PDR vão ajudar-nos, mas temos um PIDDAC, como V. Ex.ª sabe muitíssimo bem. Os PDR vão guiar-nos e apoiar-nos depois. E criámos um sistema de tal forma flexível que nos permitirá fazer correcções.
Que mal há em termos quatro parcerias, duas público/privadas e as outras duas público/público?! Que mal há?! A meu ver, só há vantagens em ensaiarmos uma parceria com municípios e com uma empresa privada de capitais públicos, que é a IPE, S. A., ou outras que apareçam interessadas. Aquela apareceu, ofereceu-se e vamos fazer a parceria. Que mal há nisso?! E, para os outros, fazemos parcerias público/privadas através de concurso público. Temos de diversificar as soluções. Também não tenho qualquer objecção a que a solução de gestão do Partido Comunista Português possa ser ensaiada num outro hospital. Por que não?! Não temos qualquer espécie de tabus; estamos dispostos a aprender. A lei até nos permite fazer experiências inovadoras de gestão; temos é de as avaliar depois.
Não conheço essa afirmação, segundo a qual já terei traçado o destino dos hospitais, mas parece-me que, nesta matéria, diz-se tanta coisa que, realmente, há sempre uma diferença entre o que se diz e a realidade.
Sr.ª Deputada Luísa Portugal, vamos ao problema das profissões emergentes e dos recursos humanos. Tem V. Ex.ª toda a razão, quando chama a atenção para as novas tecnologias em saúde e para as profissões que estão a ser formadas nas já existentes três escolas superiores de tecnologia da saúde. Estas escolas estão a sofrer o seu processo de integração nos estudos politécnicos ou no sistema de ensino. Há vários institutos politécnicos, no interior do País, que são candidatos a terem, no seu seio, escolas superiores de tecnologia, desde Aveiro a Faro, a Viseu, à Guarda, a Castelo Branco, como todos sabemos. A decisão sobre a aceitação destas escolas não depende do Ministério da Saúde mas do Ministério da Educação.
Dito isto, poder-se-ia dizer-se: Então, o senhor "lava suas mãos"! Não, não lavo as minhas mãos, porque o estudo do planeamento das profissões de saúde está a ser feito pelo grupo de missão, liderado pelo Professor Alberto Amaral, cujo relatório final está em vias de apresentação, e que analisa, para cada uma destas profissões, não só a sua demografia como a evolução tecnológica respectiva e os recursos e as necessidades que vão ser precisas para as criar.
Portanto, em relação à tecnologia, é tudo.
Quanto à enfermagem, lamento desiludir algumas das pessoas que estão nesta Assembleia. Em 1983/85, aquando do Governo do Bloco Central, o governo entendeu, a certa altura, forçar as escolas de enfermagem a fazerem um duplo curso; elas admitiam 25 alunos/ano e o governo da altura resolveu forçar as escolas a realizarem um segundo curso, logo, mais 25 alunos em cada, obrigatoriamente. Bom, esta medida foi tão positiva que o governo seguinte, em 1987, por despacho de 21 de Maio, o Despacho n.º 1/87, resolveu consagrar a duplicação anual das admissões nas escolas de enfermagem. E este sistema funcionou muito bem até 1994. Chega-se a 1994, não se sabe por que carga de água, houve uma decisão do Ministério da Saúde, através da Direcção-Geral de Recursos Humanos, no sentido de, por se considerar que já se tinha enfermeiros a mais, se reduzir para um único curso a formação de enfermagem.
Bom, VV. Ex.as têm aqui, numa decisão de 1994 - por acaso, de um governo de proximidade ou de integração partidária com V. Ex.ª -, a razão de ser dos problemas que estamos a ter neste momento.
Bom, o que se fez no caso da enfermagem? O que se fez no caso da enfermagem é que, com a integração das escolas de enfermagem nos institutos politécnicos e com a modificação do sistema de incentivos ao financiamento, as escolas de enfermagem são, agora, obrigadas a ter ritmos de produção diferentes. Por exemplo, os ritmos de produção de numerus clausus, que, em 2000/2001, foram de 1546, vão passar, em 2005/2006, para 3059. Porquê? Porque, agora, o sistema de financiamento é o de o pagamento ser efectuado por cada aluno inscrito.
Vamos ao problema médico.
O problema médico é muito mais complexo, porque, no primeiro ano que se seguiu ao governo do Bloco Central, em Outubro de 1986, quando começou o ano escolar, o numerus clausus fixado para as escolas não foi 272, como em 1985, mas, sim, 190 - 190 alunos de medicina foi o numerus clausus fixado para 1986! -, dos quais 40 alunos em Coimbra, Lisboa e na Faculdade de Ciências Médicas do Porto e 30 no Instituto de Ciências Biomédicas de Abel Salazar, do Porto. Em 1987, esse número subiu, felizmente, mas para apenas 240 e foi subindo paulatinamente até ter chegado a 400, em 1990, e a 475, em 1995.
Ora, sabe qual é o numerus clausus para este ano? É 945! Vejam, Srs. Deputados: em 1995, o numerus clausus para entrar em medicina era de 475; em 2000, foi de 735; e, em 2001, o numerus clausus foi 945.
Penso que não é necessário mais demonstração sobre os erros do passado na formação de duas especialidades absolutamente essenciais em saúde e sobre a tentativa, lenta mas persistente, de corrigir esses erros - e não estou a "juntar penas ao meu chapéu", pois nem sequer era ministro nessa altura.
Sr.ª Deputada Natália Filipe, o Sr. Secretário de Estado Dr. Francisco Ramos responderá mais adiante às questões que colocou relativamente à quota de descongelamento. Pela minha parte, vou dar-lhe alguma informação sobre as cirurgias contratualizadas.
Em relação ao Programa para a Promoção do Acesso, V. Ex.ª tem, neste momento, informação tão actual quanto o Ministro da Saúde.
No que toca às cirurgias correntes nos hospitais, como V. Ex.ª deve saber, neste momento estão a decorrer reuniões de contratualização da gestão do ano seguinte, reuniões essas em que cada uma das agências de contratualização planifica quais são as cirurgias para cada hospital em função da dotação que o mesmo vai ter.

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Creio que estarmos em condições de - e esta é uma informação que me prezo de querer facultar à Assembleia -, no próximo encontro que tivermos, provavelmente no final do 1.º trimestre, se não for antes, poder dar a V. Ex.ª a informação sobre as cirurgias contratualizadas.
Em relação ao PIDDAC e ao equilíbrio do mesmo, V. Ex.ª disse que, em 2001, os investimentos a fazer em centros de saúde correspondiam a um terço das verbas previstas para investimentos em hospitais e que, em 2001, já correspondiam a metade. Devo dizer que não preciso mais do que louvar-me nas palavras de V. Ex.ª, sobretudo se se olhar à diferença de custo entre os diferentes níveis de investimento.
O investimento em cuidados primários é muito mais reprodutivo certamente, mas de volume muito inferior ao investimento num hospital. Este último é, naturalmente, um investimento pesado, caro e de reprodutibilidade muito mais baixa.
Significa isto que devemos ser tão fundamentalistas a ponto de deixarmos de investir em hospitais? Por exemplo, significa isto que deixemos de fazer transplantes?

A Sr.ª Natália Filipe (PCP): - Eu não disse isso!

O Orador: - O custo de um transplante corresponde, porventura, ao de uma campanha de vacinação para toda uma região; no entanto, também temos de fazer transplantes, como V. Ex.ª compreende e certamente concorda, e também temos de gastar dinheiro na alta tecnologia e nos hospitais. Ora, isto custa caro.
Agora, dizer-me que há um equilíbrio, penso que é um elogio da parte de V. Ex.ª em relação a este Governo.
Passemos ao Hospital Curry Cabral. Muito se tem dito e escrito sobre o Hospital Curry Cabral. Já esteve votado ao camartelo, porque se situa perto de uma estação ferroviária; todo o seu terreno já esteve para ser dedicado a uma estação ferroviária, como provavelmente sabem. Tenho um colega que costuma dizer que "o Curry Cabral nunca será destruído porque está em frente à Gulbenkian. Portanto, nunca será possível construir ali qualquer coisa de muito pesado… de muito diferente".
É evidente que V. Ex.ª sabe que o Curry Cabral foi um hospital "pavilhonar", construído no dobrar do século XIX para o século XX, no momento do auge das doenças transmissíveis, e, aliás, o seu patrono era um grande especialista em doenças infecciosas. Trata-se, pois, de um hospital "pavilhonar" que está "mordido" por terrenos que, actualmente, pertencem à Universidade Nova, a serviços das Forças Armadas, etc.
Aquele não é um sítio óptimo do ponto de vista hospitalar, mas é extremamente central. Espero que não me acuse de "negocismo" por eu pretender vender o terreno bem vendido…

A Sr.ª Natália Filipe (PCP): - Também já se ouviu falar nisso!

O Orador: - Se eu pudesse vender o terreno, vendia-o, para investir o produto em hospitais na coroa norte de Lisboa. O que sei, Sr.ª Deputada, é que teria de esperar quatro ou cinco anos para ter esses hospitais em pleno funcionamento, e, então, vou deixar cair o Hospital Curry Cabral entretanto?! Vamos fazer lá obras no valor de 4,5 milhões de contos! E ainda bem! Sabe que é no Hospital Curry Cabral que temos um dos mais importantes volumes de transplantes do País? É lá que está localizado o serviço de transplantes; é lá que, agora, está localizado um serviço de cardiologia hemodinâmica de altíssimo nível nacional, como sabe. Foi lá que nasceu o rim artificial, a nefrologia, a diálise.
Então, acha que o Ministério da Saúde, enquanto não tem os outros hospitais construídos, deve deixar de colocar alguns recursos neste tipo de estabelecimentos para que eles cumpram a sua elevadíssima missão de hospital de diferenciação?! De maneira nenhuma!

A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Saúde.

O Sr. Secretário de Estado da Saúde: - Sr.ª Presidente, espero responder de uma forma rápida.
Quanto à questão da diferença entre a óptica de contabilidade pública e a óptica de contabilidade nacional, devo dizer que todos os orçamentos dos serviços integrados no Serviço Nacional de Saúde foram, como é natural, feitos na óptica de contabilidade pública, respeitando, portanto, as regras de equilíbrio.
Respondendo a questões colocadas pelos Srs. Deputados Patinha Antão e Lino de Carvalho, digo que as diferenças traduzem não o défice do exercício mas a dívida final acumulada, ou seja, o défice global, como está nessa melhor estimativa.
Mais: os 270 milhões de contos que são a nossa melhor estimativa neste momento, significam, de facto, não a dívida rolante ideal de três meses mas uma dívida que significa um prazo de pagamento de quatro meses, ou seja, como o Sr. Ministro já disse, um objectivo não perfeito, mas que permite uma gestão difícil, mas possível. Este é, claramente, o objectivo com que estamos a trabalhar e que está transparentemente equacionado e evidenciado nos mapas que tivemos oportunidade de vos apresentar, e onde as mesmas rubricas são apresentadas quer numa óptica quer na outra óptica, para não deixar dúvidas.
O Sr. Deputado Lino de Carvalho colocou questões relacionadas com despesas com pessoal e respondo-lhe que tem toda a razão, que, de facto, há uma dilação; não há em atraso pagamentos de horas extraordinárias mas há uma diferença de tempo - cerca de dois meses - entre a realização das horas extraordinárias e o respectivo pagamento e há outro tipo de abonos cujo pagamento efectivo acontece diferidamente. Portanto, a estimativa que foi feita é, de facto, a diferença que aqui está.
Quanto à questão da APIFARMA, Sr. Deputado, o que aqui consta é relativo a 2002. Portanto, como o acordo com a APIFARMA já faz efeito agora, em 2001, faz todo o sentido a explicação de se incluir em "Proveitos extraordinários", para 2002, o resultado do acordo com a APIFARMA.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Dá-me licença, Sr. Secretário de Estado?

O Orador: - Faça favor.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Secretário de Estado, peço desculpa por interrompê-lo, mas já que estamos a tratar desta questão é melhor resolvê-la no momento em que estamos a falar nela.
Não estou a pôr em causa isso em relação a 2002, só que, no mapa inicial que nos tinha sido entregue - e foi

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esse o pedido de esclarecimento que fiz -, essa verba estava, como previsão para 2001, inscrita em "Recebimentos de anos anteriores". Depois, para 2002, essa verba passou a ser contabilizada em "Proveitos Extraordinários".

A Sr.ª Natália Filipe (PCP): - Exactamente a mesma verba!

O Orador: - Portanto, não pode estar contabilizada em "Recebimentos de anos anteriores", porque o acordo com a APIFARMA não existia, pelo que a minha pergunta é no sentido de saber o que se passou neste intermezzo.

O Orador: - Certamente não expliquei bem.
O ponto 5 da nota explicativa - penso que é a isso que está a referir-se - refere-se ao ano de 2002 e não ao ano de 2001. Ou seja, na linha "Proveitos Extraordinários - Previsão para 2002: 65 milhões de contos" esse valor inclui uma verba que já provém do acordo com a APIFARMA. Na linha "Proveitos Extraordinários - Previsão para 2001: 60,628 milhões de contos" não está dito em sítio nenhum que isso inclui alguma verba proveniente do acordo com a APIFARMA…

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Não é a mesma verba!

O Orador: - Mas, Sr. Deputado, em sítio nenhum é dito que isso inclui qualquer resultado do protocolo com a APIFARMA. O que é dito - isso, sim - é que inclui para 2002.
Suponho que fui suficientemente claro, mas continuo à disposição para esclarecer alguma dúvida que subsista.
Por fim, passo à questão colocada pela Sr.ª Deputada Natália Filipe relativa à quota de descongelamento. Já fizemos uma proposta, isto é, estamos a trabalhar, com os Ministérios das Finanças e da Reforma do Estado e da Administração Pública, no sentido de proceder a um descongelamento para a totalidade das profissões de saúde. Não consigo dizer-lhe os números de cor, mas sei que já foram objecto de descongelamento as vagas para 1800 enfermeiros e 185 farmacêuticos e continuamos a trabalhar no sentido de alargar estes números por forma a cobrir todas as necessidades.
Como digo, de memória, é tudo quanto posso indicar, mas, se assim o entenderem, far-vos-emos chegar o teor da proposta que foi apresentada e que, repito, está a ser trabalhada conjuntamente com o Ministério das Finanças e o Ministério da Reforma do Estado.

A Sr.ª Secretária de Estado Adjunta do Ministro da Saúde (Carmen Pignatelli): - Sr.ª Presidente, se me dá licença, gostaria de completar a informação já fornecida pelo Sr. Ministro da Saúde a propósito da rede hospitalar e da "famosa" viagem de helicóptero, de Outubro de 1997, ao Sr. Deputado Carlos Martins.

A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra, Sr.ª Secretária de Estado.

A Sr.ª Secretária de Estado Adjunta do Ministro da Saúde: - Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Carlos Martins, como esta questão está sempre presente nestas discussões, decidi ir procurar o documento que nessa altura foi distribuído à comunicação social e no qual se falava em 14 unidades hospitalares e num volume de investimentos de 300 milhões de contos, os quais abrangiam não só a construção de novas unidades mas também a ampliação e o apetrechamento de hospitais já existentes.
Como eu disse, fui procurar o documento, encontrei-o - se quiser, posso, no final, posso entregá-lo -, decidi ir ver o que se passava em termos de incumprimento do que ficou estabelecido neste plano e concluí o seguinte: nada está em situação de incumprimento, inclusivamente os quatro hospitais da coroa de Lisboa, que constam deste documento distribuído em 1997, estão indicados, mas não têm estimativa, nem relativamente ao investimento, nem à data de início e de conclusão.
Como eu disse, tenho comigo o documento relativo ao estudo na ARS de Lisboa e Vale do Tejo, e, a este propósito, gostaria de dizer que o que acontece com estas 14 unidades que constam desse programa, que são: Matosinhos, Viseu, Vale do Sousa, Santa Maria da Feira, Cova da Beira, Tomar, Barlavento Algarvio e Torres Novas. São 10 unidades que fazem parte de um ciclo de construção hospitalar, que se iniciou em meados da década de 80 - para Matosinhos a aprovação ministerial é de Junho de 1987 -, e que está terminado.
Acontece que, terminada esta fase de construção hospitalar, iniciou-se uma nova fase, que abrange, e consta dessa lista, Santiago do Cacém, Lamego, o novo Hospital Pediátrico de Coimbra, o Centro Materno-Infantil do Norte, Braga, Póvoa do Varzim e Vila do Conde.
Portanto, Sr. Deputado, se contar, verificará que estão aqui as 14 unidades; e, hoje, o Governo propõe-se investir, e consta do PIDDAC, agora já não são as 14 unidades, porque temos de excluir as que estão terminadas, nos seis hospitais que referi - Santiago do Cacém, Lamego, etc. - e nos quatro hospitais da coroa de Lisboa.
Portanto o Governo, não só cumpriu o que prometeu em 1997 como ainda se propõe construir mais quatro hospitais que não estavam programados e que fazem parte desta 2.ª fase.
Quanto ao facto de o Governo, passados dois anos, ter descoberto que não tinha fundos comunitários e de ter enveredado pelos project finance, o Sr. Deputado concluirá que estas unidades, que fazem parte desta nova fase de construção hospitalar, têm o seu financiamento completamente equacionado, ou com verbas exclusivamente nacionais, ou com fundos comunitários, como é o caso de Santiago do Cacém e do novo Hospital Pediátrico de Coimbra, ou através de project finance. Portanto, as modalidades de financiamento são diferentes, mas o financiamento está a ser assegurado.
Gostaria, ainda, de lembrar o seguinte: fala-se muito em novos hospitais, mas esquece-se de uma realidade que está a acontecer e que é tão importante como a construção de novos hospitais, que é a implementação das redes de referenciação hospitalar, que já está acontecer e que se traduz-se em investimento hospitalar e em equipamento nos hospitais já existentes.
Portanto, estão definidas 13 redes e já estão aprovados mais de 15 milhões de contos de financiamento para a implementação dessas mesmas redes, nomeadamente para os pavilhões de psiquiatria nos hospitais que não tinham a valência de psiquiatria, o que acontece na sequência das decisões, em termos de descentralização, da saúde mental, e que passam pela implementação da rede de saúde mental.
Gostaria ainda de vos dar mais alguns dados, que são interessantes e que têm a ver com a construção de novos

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hospitais. Estivemos a trabalhar números e chegámos à seguinte conclusão: os hospitais construídos entre 1989 e 1993 tiveram encargos adicionais de custos de construção de 18%; a consignação, após 1995, em média, foi de 7%; o custo total médio das unidades do primeiro bloco, até 1993, foi de 12,1 milhões de contos e, após 1995 - e estou a referir-me só à construção, sem equipamento -, 7 milhões de contos; o atraso na construção dos hospitais, 1.ª fase, foi de 23 meses, ou seja quase dois anos, e, após 1995, foi de 274 dias, menos de um ano.
Logo, Sr. Deputado, parece-me que estamos a progredir em termos de derrapagem de custos, de cumprimento dos prazos de execução, e não me parece que, relativamente àquilo que foi adiantado em 1997, ao que iríamos fazer, estejamos em situação de incumprimento.

O Sr. Carlos Martins (PSD): - Peço desculpa, Sr.ª Secretária de Estado, mas, se a Sr.ª Presidente me autorizar, gostaria de pedir uma pequena precisão, que me parece relevante.

A Sr.ª Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Carlos Martins (PSD): - Sr.ª Secretária de Estado, embora não querendo interromper o seu raciocínio, gostaria de fazer uma pequena precisão. V. Ex.a disse que os quatro hospitais, concretamente os de Sintra, Cascais, Loures e Vila Franca de Xira, não estavam no plano de 1997?

A Oradora: - Exactamente, Sr. Deputado! Não estavam.

O Sr. Carlos Martins (PSD): - Mantém esta afirmação?

A Oradora: - Mantenho.

O Sr. Carlos Martins (PSD): - Peço desculpa pela interrupção, mas era só para esclarecer.

A Oradora: - Ou seja, Sr. Deputado, está a designação, mas não há programação.
Relativamente às questões colocadas pela Sr.ª Deputada Natália Filipe, gostaria de complementar a resposta que já foi dada pelo Sr. Ministro, dizendo que, apesar de não poder dar-lhe informações, porque não sou capaz, sobre os Centros de Saúde de São Brás, Pontinha, etc., o Centro de Saúde da Amadora - e disto recordo-me porque ainda hoje de manhã estive a tratar do assunto - vai ser objecto de um contrato-programa com o município da Amadora, o qual vai ser celebrado na próxima semana.
No entanto, o que posso dizer-lhe é um conjunto de contratos-programa, cerca de 15, que envolve sete municípios, Vila Franca de Xira, Loures, Cascais, Oeiras, etc.
Porém, quanto às suas preocupações acerca do PIDDAC para 2002, eu, embora não tenha preocupações, estou atenta a muitas das questões que vão sendo suscitadas, para as quais já estamos a delinear soluções, e uma delas, a principal, é o ajustar as prioridades, em termos de cuidados primários e de construção de centros de saúde, das administrações regionais de saúde às prioridades das diversas autarquias. Ou seja, estamos a conceber soluções e a criar mecanismos que permitam, mesmo durante o ano 2002, aprovado o PIDDAC, uma vez que a nova estrutura do PIDDAC nos permite fazê-lo, aconchegar, digamos, as nossas prioridades às prioridades das autarquias.
Portanto, já está previsto um conjunto de contratos-programa, através do programa humanização, acesso e atendimento no Serviço Nacional de Saúde, onde há uma linha de actuação que permite, ao longo do ano e com as dotações já programadas, celebrar contratos-programa com os municípios, ajustando as prioridades da saúde às prioridades dos municípios. Para além disto, posso informar que já foi adjudicada uma avaliação às instalações de todos os centros de saúde, para melhor definirmos as prioridades, porque pretendemos, nomeadamente, olhar de outra maneira, priorizando, aos centros de saúde dos subúrbios metropolitanos de Lisboa e Porto.
Assim, julgo que a muito curto prazo, provavelmente já no próximo PIDDAC, teremos de reforçar o investimento nestas áreas.
É tudo, Sr.ª Presidente e Srs. Deputados.

A Sr.ª Presidente: - Vamos agora dar início à última ronda de pedidos de esclarecimentos dos Srs. Deputados.
Tem a palavra ao Sr. Deputado Manuel Moreira.

O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Sr.ª Presidente, Sr. Ministro da Saúde, Srs. Secretários de Estado, vou abordar o PIDDAC no que diz respeito a investimentos ou, neste caso, melhor dizendo, à falta de investimentos em alguns municípios do distrito do Porto.
Para além das necessidades de recursos humanos em muitos centros de unidades de saúde, parece-nos que o PIDDAC, em alguns casos, é bastante pobre, diria mesmo, bastante limitado, em matéria de investimentos na construção de novos centros de saúde e de novas instalações para unidades de saúde.
A Sr.ª Secretária de Estado Adjunta do Ministro da Saúde e o Sr. Ministro da Saúde, provavelmente, vão dizer-me que não conhecem a maior parte dos casos que aqui vou colocar, mas penso que, quando se vem discutir, na especialidade, o Orçamento do Estado e o PIDDAC, deve estar-se informado de um conjunto de diligências feitas pelas autarquias locais, pois todos os casos que aqui vou citar já foram alvo de vários ofícios, não só directamente à Sub-Região de Saúde do Porto e à Administração Regional de Saúde do Norte mas também ao Ministério da Saúde - sei que a equipa do Ministério da Saúde é nova, tem poucos meses de exercício, mas, de um modo geral, já tiveram oportunidade de tomar contacto com a situação do País e em particular com a situação do distrito do Porto.
Eu próprio, já aqui, na Assembleia, apresentei, por diversas vezes, não só nas anteriores discussões do Orçamento do Estado, estas questões, bem como propostas, que, infelizmente, foram "chumbadas" pela bancada que suporta o Governo, não as considerando, assim, prioritárias, mas a verdade é que as populações e as autarquias locais, de freguesia e dos municípios em causa, continuam, naturalmente, a insistir para que elas venham a ser contempladas no PIDDAC.
Por isso, sinto-me na obrigação, porque estou aqui, de uma forma responsável, a tentar honrar os compromissos com os nossos concidadãos, aqueles que aqui representamos, neste caso os do distrito do Porto, e faço-o sempre com toda a diligência e com todo o sentido de responsabilidade.
Começo, assim, pelo concelho de Valongo. Actualmente existe, na cidade de Ermesinde, um Centro de Saúde que está completamente sobrelotado, não tem capacidade para

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corresponder aos mais de 60 000 utentes que serve, que são não só da cidade de Ermesinde mas também da freguesia vizinha de Alfena, bem como de outras freguesias de outros concelhos vizinhos, mais concretamente das freguesias de Águas Santas, São Pedro de Fins e Água Longa. São, portanto, 60 000 utentes, pelo que há necessidade de construir um novo centro de saúde na cidade de Ermesinde para dar uma resposta satisfatória aos cuidados de saúde que este centro serve.
Devo dizer que múltiplas diligências têm sido feitos pela Câmara Municipal de Valongo e pela Junta de Freguesia de Ermesinde, esta última até é liderada pelo Partido Socialista, sem qualquer resposta positiva.
Na freguesia de Sobrado existe uma unidade de saúde, que funciona como extensão do Centro de Saúde de Valongo, que também está a funcionar em instalações muito exíguas e degradadas e que são da Casa do Povo, pelo que não usufrui das condições mínimas, diria mesmo, até, em condições higiénico-sanitárias. Por isso, está realmente a necessitar de novas instalações para poder prestar os serviços de saúde condignamente a mais de 8000 utentes que procura servir. A Câmara Municipal de Valongo já disponibilizou um terreno para o efeito e não tem havido reposta positiva neste sentido.
No que respeita a Paços de Ferreira, existe um centro de saúde que está, há muito, carenciado de reforço de recursos humanos, designadamente de médicos, enfermeiros e pessoal administrativo. Este é um centro de saúde que serve mais de 58 000 utentes, pelo menos são os que lá estão inscritos, encontrando-se 5000 sem médico de família e no final deste ano poderão ser 10 000 utentes. Devo dizer que também tem havido diligências, sem sucesso, para que haja reforço dos recursos humanos deste centro de saúde. Este centro de saúde funciona das 8 horas às 20 horas, pelo que se justifica, até, a criação de um serviço de atendimento permanente para funcionar 24 horas/dia, mas também não tem havido resposta positiva.
Em relação a Vila Nova de Gaia - e vamos falar agora de um município que tem neste momento 300 000 habitantes, segundo os últimos censos é o maior município do norte do País, ultrapassou a cidade do Porto -, devo dizer que, durante muitos anos, este concelho foi, de algum modo, ignorado pela Administração Central, em muitas áreas; e há, neste momento, um grande esforço da câmara municipal e das freguesias para tentar suprir um conjunto de carências infra-estruturais desse concelho, designadamente na área da saúde.
O Centro de Saúde de Oliveira do Douro parece "terceiro-mundista", apesar de ser um centro de saúde moderno, ou, pelo menos, construído há poucos anos, porque os utentes têm de ir para lá às 4 horas da manhã para poderem ter uma consulta médica. Devo dizer que este centro de saúde também tem falta de recursos humanos, designadamente de médicos, enfermeiros e pessoal administrativo, e o seu edifício encontra-se já num estado de degradação acelerada. Justifica-se, por isso, uma intervenção no sentido de reabilitar aquele centro de saúde, sob pena de a degradação continuar a ser acelerada. Não tem havido uma resposta positiva, e também aqui, em relação ao Centro de Saúde de Oliveira do Douro, se justificava que houvesse uma resposta positiva.
Na freguesia de Serzedo existe uma unidade de saúde, que é uma extensão do Centro de Saúde de Arcozelo, que está instalada na sede da junta de freguesia - ora, a junta de freguesia precisa das suas instalações livres para poder prestar melhores serviços à comunidade local. Entretanto, conseguiu-se um espaço numa urbanização moderna, que já foi visitado por um técnico da Administração Regional de Saúde do Norte em 1999, segundo a qual aquelas instalações têm condições para serem adaptadas por forma a servirem como unidade de saúde. Acontece que, até hoje, não obtiveram resposta e a junta de freguesia quer que esta unidade de saúde seja transferida da actual sede da junta de freguesia para as novas instalações. Não tem havido resposta, repito, e não se percebe porquê, depois de a própria câmara municipal, com a colaboração da junta de freguesia, ter disponibilizado instalações, bastando só adaptá-las, porque elas têm condições técnicas para o efeito, para servirem como novas instalações da unidade de saúde de Serzedo.
Em relação à freguesia de Canelas, que visitei muito recentemente, devo dizer que tem havido um conjunto de diligências, de ofícios, sem qualquer resposta, nem para reuniões de trabalho, com a Sub-Região de Saúde do Porto - isto foi-me dito pelo responsável desta unidade de saúde -, porque esta unidade de saúde está instalada num edifício que, apesar de ter quatro anos, pois foi inaugurado pela então Sr.ª Ministra Maria de Belém Roseira, está completamente degradado, com paredes rachadas, quer no exterior, quer no interior, com a caixilharia em mau estado, etc., isto para não falar na porta de entrada que está a pôr em causa a segurança do edifício. Não vale a pena especificar mais, porque o estado do edifício está descrito no requerimento que recentemente dirigi ao Ministério da Saúde. Porém, também aqui não tem havido resposta tanto para a beneficiação e manutenção deste edifício como para a ampliação das instalações da unidade de saúde. Isto porque no projecto inicial da construção deste edifício, da unidade de saúde de Canelas, que, também é uma extensão do Centro de Saúde de Arcozelo, estava previsto numa 2.ª fase, a ampliação das instalações; só que no terreno contíguo, que é da junta de freguesia, está, neste momento, segundo parece, destinado à construção de um parque de estacionamento, o que, de algum modo, compromete a ampliação da unidade de saúde. E isto é grave!
Foi, pois, neste sentido que os responsáveis desenvolveram todas as diligências para que o Ministério, através da Sub-Região de Saúde, pudesse corresponder, pelo menos, se mais não fosse, a reuniões de trabalho para equacionar esta situação, bem como ao reforço do pessoal de enfermagem e administrativo daquela unidade de saúde, porque, neste momento, já há uma reacção muito negativa dos profissionais e dos utentes em virtude da falta de pessoal.
Na freguesia de Vilar de Andorinho também há uma unidade de saúde a funcionar na sede da junta de freguesia em condições muito exíguas. Neste momento, a câmara municipal e a junta de freguesia já dispõem de instalações novas, cedidas gratuitamente por um empreendedor, na Vila d'Este, um empreendimento que duplicou a população desta freguesia, que já hoje atinge cerca de 18 000 habitantes, servindo esta unidade de saúde mais de 6000 utentes da freguesia, porque os outros estão a ser servidos pelo centro de saúde de origem, já que esta unidade é uma extensão do Centro de Saúde Soares dos Reis, bem como pelo Centro de Saúde de Oliveira do Douro, que são, no fundo, centros de saúde de freguesias limítrofes.

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Assim, já há instalações próprias para, provisoriamente, instalar de uma forma mais condigna esta unidade de saúde de Vilar de Andorinho. Também já há um projecto pronto - pelo que me foi dito pelo Sr. Presidente da junta de freguesia, já foi apreciado por alguém da Sub-Região de Saúde do Porto e parece ser um bom projecto - para, mais tarde, construir um bom centro de saúde, de raiz, na freguesia de Vilar de Andorinho, uma vez que esta foi das freguesias que mais cresceu, duplicando a população, por causa desse empreendimento de Vila d'Este, que se situa dentro da cidade de Vila Nova de Gaia e que se vê perfeitamente quando se entra na cidade. Justifica-se, por isso, como digo, a construção, a médio prazo, de um centro de saúde de raiz, mas, de imediato, impõe-se a transferência para essas instalações provisórias situadas na Vila d'Este, que estão, realmente, disponíveis para o efeito.
Em relação ao Centro de Saúde de Canidelo, falei ainda muito recentemente nesta Câmara, interpelando a Sr.ª Secretária de Estado Adjunta do Ministro da Saúde, que, na altura, até me deu uma informação, que não era rigorosa mas que, felizmente, há poucos dias, veio a confirmar-se, relativa à transferência do centro médico, que estava mal instalado, para novas instalações, nas quais sei que foram investidos 90 000 contos. Mas isto não resolve, apenas ajuda, as necessidades daquela freguesia, que tem uma população muito carenciada em matéria de saúde, porque a maioria das pessoas já é idosa, com idades acima dos 50 anos, e está a ser servida pelo Centro de Saúde de Barão de Corvo, na freguesia vizinha de Santa Marinha.
Justifica-se, pois, construir, no âmbito do Serviço Nacional de Saúde, um centro de saúde autónomo, de raiz, na freguesia de Canidelo, sem prejuízo, naturalmente, da transferência de instalações desse centro médico, com o que nos congratulamos e que está convencionado, mas que apenas dispõe de quatro médicos quando se justifica a existência de oito! Aliás, como disse a Sr.ª Secretária de Estado Adjunta do Ministro da Saúde, vai ter lugar a celebração dessa convenção nominal para que haja oito médicos efectivos, e não quatro, porque são insuficientes, nessa unidade de saúde que é privada e não pública.
Mais uma vez, apelo para que não se esqueça e não se atire para as calendas gregas a criação e a construção de um centro de saúde, de raiz e autónomo, na freguesia de Canidelo.
Para terminar, no que toca à extensão de saúde de Sandim, que vem contemplada no PIDDAC, que está na dependência do Centro de Saúde dos Carvalhos, devo dizer que a verba que está inscrita no PIDDAC parece-nos, francamente, bastante insuficiente para se poder avançar seriamente no próximo ano. Seria bom que esta verba viesse a ser reforçada.
Também o Centro de Saúde dos Carvalhos, do qual falo há muito tempo e que serve uma população vastíssima (serve várias freguesias, mas, só na sua sede, são mais de 30 000 utentes), está pessimamente instalado; as pessoas têm de esperar na via pública, pondo até em risco a sua integridade física, devido ao elevado tráfego nessa rua; as instalações são completamente exíguas e degradadas, situação que já é denunciada há muitos anos. Ora, a Câmara Municipal de Gaia e a junta de freguesia de Pedroso (Carvalhos faz parte da freguesia de Pedroso) têm vindo a diligenciar no sentido de disponibilizarem terrenos à Sub-Região de Saúde do Porto para construir o novo centro e, até hoje, nada aconteceu.
Por último, vou falar sobre o Centro Hospitalar de Vila Nova de Gaia. Como eu disse há pouco, este é o maior concelho do norte de Portugal e penso que o Centro Hospitalar de Gaia é o terceiro grande hospital, a seguir aos de São João e de Santo António. Há mais de 15 anos que se fala e está em curso um projecto de ampliação e modernização - vai a caminho de duas décadas! -, mas já foi ultrapassado pela construção do novo Hospital Pedro Hispano, em Matosinhos, e do novo hospital de Santa Maria da Feira.
O hospital de Vila Nova de Gaia continua, lentamente, a marcar passo.
Gostaria de saber, da parte do Sr. Ministro da Saúde ou da Sr.ª Secretária de Estado Adjunta do Ministro da Saúde, se, porventura as verbas inscritas em PIDDAC são aquelas que a própria administração do centro hospitalar considera necessárias para se avançar, de uma forma decidida, a fim de concluirmos esta obra de "Santa Engrácia", que é o que ela parece! O hospital de Vila Nova de Gaia nunca mais é concluído, e serve, como sabe, 300 000 habitantes do concelho, para já não falar de muitos outros dos concelhos a sul de Vila Nova de Gaia.
Sr. Ministro, também gostaria de saber por que é que não se acaba com esta história das extensões! Por que é que não se lhes chamam centros de saúde das localidades, ou das freguesias, ou dos concelhos onde estão sediados, em vez de se lhes continuar a chamar extensões? A meu ver, faz muito mais sentido e é mais digno chamar-lhes centros de saúde de cada uma dessas localidades.

A Sr.ª Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado José Miguel Boquinhas.

O Sr. José Miguel Boquinhas (PS): - Sr.ª Presidente, Sr. Ministro da Saúde, Srs. Secretários de Estado, os meus cumprimentos antes de mais.
Creio que, e penso que estaremos todos de acordo nesta matéria, a melhor maneira de controlar as despesas da saúde é, de facto, combater o desperdício, que todos nós reconhecemos que existe, e, a meu ver, este é, certamente, o mecanismo mais eficaz para controlar as referidas despesas. Nesta matéria, entendo que o Governo vai no bom caminho.
Os exemplos são variados: os custos controlados, que ainda agora foram referidos, que têm vindo a ser aplicados nas construções hospitalares; a alteração, que se prevê para muito breve, do modelo de gestão hospitalar, e que irá, certamente, melhorar em muito esse combate ao desperdício, através de uma melhor gestão dos dinheiros públicos, naturalmente; a melhoria da qualidade dos serviços de aprovisionamento, que é um programa que está em curso e que tem precisamente a intenção de combater a má gestão levada a cabo por muitos serviços de aprovisionamento de hospitais; os novos modelos de concurso público de aprovisionamento por parte da IGIF, modelo que é muito interessante e que, de facto, indicia que os consumíveis e certo tipo de equipamentos serão comprados a um preço, pelo menos, controlado e, provavelmente, bastante inferior ao que tem sido praticado até agora; e, finalmente, a política do medicamento, com uma série de vertentes, desde o protocolo da indústria farmacêutica, já aqui citado, ao redimensionamento das embalagens, à política de descomparticipação, à promoção dos genéricos, etc. Enfim, tudo isto são, realmente, vertentes importantíssimas para o controlo das despesas.

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No entanto, existe ainda alguma preocupação, por isso gostaria de formular aqui, ao Sr. Ministro da Saúde, duas ou três perguntas, que se relaciona, precisamente, com esta questão da luta que o Governo tem vindo a encetar relativamente ao combate ao desperdício.
Quanto à questão dos concursos públicos de aprovisionamento, ou, melhor, a este novo modelo iniciado há algum tempo atrás, gostaria de saber se está previsto o seu alargamento a outro tipo de concursos, a outro tipo de consumíveis, porque me parece ser (num pré-concurso feito pela IGIF) um modelo que permite balizar os limites possíveis dos custos dos consumíveis e dos equipamentos, que, depois, ainda podem ser renegociados nos hospitais, dentro dessas balizas. Parece-me, pois, um modelo bastante interessante que poderia ser alargado a muitos outros consumíveis.
A outra preocupação prende-se com a política do medicamento no seu conjunto. Atendendo a que existe uma série de áreas que privilegia, precisamente, o tentar reduzir custos, numa tentativa de recanalizar essas verbas para outras áreas onde elas são mais necessárias, gostaria de saber qual é o ponto da situação relativamente a, pelo menos, três áreas que me parecem muito importantes em termos de controlo das despesas: a da revisão do sistema de comparticipações, a da promoção dos genéricos e a do redimensionamento das embalagens. Também gostaria de saber se é possível ou não prever - não sei se é possível e gostaria de tentar perceber - alguma repercussão, já ao longo do ano de 2002, destes programas diversos, que têm como objectivo central racionalizar custos, e, daí, recanalizar verbas para outras áreas onde elas são mais necessárias.

A Sr.ª Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Agostinho Lopes.

O Sr. Agostinho Lopes (PCP): - Sr.ª Presidente, Sr. Ministro da Saúde, Srs. Secretários de Estado, vou colocar algumas questões mais simples e concretas, depois de todas estas complexidades.
Começo pelas taxas moderadoras. No início da Legislatura de 1991/95, o Governo do PSD implantou as taxas moderadoras. Nessa altura, o Sr. Ministro, que, tal como eu, fazia parte da Comissão de Saúde, foi um dos que apoiou a introdução das taxas moderadoras, com o grande argumento de que isso serviria para travarmos a superpopulação das urgências hospitalares. Passados estes anos, Sr. Ministro, segundo os dados que constam das próprias Grandes Opções do Plano, as presenças nas urgências aumentaram, em média, sempre superior a 100 000, nos últimos anos, este aumento situa-se, provavelmente, na ordem dos 300 000/ano. Pergunto: ainda tem a mesma ideia, de que as taxas moderadoras respondem ao problemas das urgências hospitalares superpovoadas?
Passo a duas questões centrais ao nível de unidades hospitalares do distrito de Braga, e começo pela do hospital central escolar de Braga e respectivo projecto.
Relativamente ao hospital central escolar de Braga e respectivo projecto, o Sr. Ministro anunciou recentemente a alteração do projecto inicial de construção desta importante unidade, não só pelo seu papel desempenhado na saúde do distrito e da região, mas também por ser base para o ensino médico que se iniciou este ano na Universidade do Minho.
Sr. Ministro, não vou questionar a perspectiva da nova empresa do hospital de Braga. Não sei se estes números constavam dos papéis que a Sr.ª Secretária de Estado referiu há pouco, mas o que é certo é que no PIDDAC do ano passado estavam previstos, para o ano de 2002, 5 milhões de contos e o que hoje verificamos é que no PIDDAC estão previstos 0,5 milhões de contos. A minha questão é muito simples: mantemos a garantia de que o hospital ficará pronto em 2004? Esta é a única questão que lhe coloco, porque não quero fazer parte dos políticos citados pelo actual administrador do Hospital de São Marcos, em Braga, que diz que políticos dos mais diversos quadrantes neste processo deram mais primazia a estádios de futebol do que as hospitais. Não quero dar mais primazia aos estádios de futebol e a minha reclamação é muito simples, ou seja, a garantia do Sr. Ministro de que o hospital estará pronto em 2004 para responder às necessidades do distrito e da Universidade do Minho no ensino da saúde.
Ainda no que diz respeito às unidades hospitalares do distrito, gostaria de colocar duas questões muito concretas. Por um lado, gostaria de saber se constam do PIDDAC os investimentos necessários para responder ao escândalo da urgência do Hospital de São Marcos, em Braga. Por outro, gostaria de saber se estão disponíveis as verbas suficientes para responder aos problemas de espaço e do quadro de pessoal do Hospital Nossa Senhora da Oliveira, em Guimarães. O Sr. Ministro visitou recentemente este hospital e penso que tomou conhecimento dos problemas agudos que ali se vivem - o hospital tem 10 anos -, o que mostra que a capacidade de planificar no nosso país não é muito elevada.
Sr. Ministro, após a passagem por este Governo de três Ministros com a pasta da saúde, espero que seja capaz de me dar uma resposta clara e definitiva à seguinte questão: tem a ver com o facto de diversos cidadãos do distrito de Braga pagarem há bastantes anos taxas extraordinárias quando recorrem aos serviços das misericórdias. As misericórdias estão contratualizadas para prestar serviços do Serviço Nacional de Saúde e os cidadãos de Vila Verde, Fão e Riba d'Ave pagam taxas extremamente elevadas. Gostaria que me respondesse porque esta questão foi colocada, aquando do debate do Orçamento do Estado para 2000, à Sr.ª Ministra de então, mas não obtivemos resposta.
Posteriormente, houve um encontro sobre este assunto com o Presidente da Administração Regional de Saúde do Norte na Comissão Parlamentar de Saúde, mas até hoje o problema ficou por resolver. Também posteriormente, o então Sr. Secretário de Estado da Saúde veio a esta Assembleia responder a uma pergunta minha e, como último argumento, disse-me que as populações não protestavam - repito que foi o último argumento do Sr. Secretário de Estado. Devo dizer-lhe que, desde essa data até hoje, as populações já protestaram, já fizeram chegar abaixo-assinados a esta Assembleia, ao Primeiro-Ministro, e já fizeram até uma manifestação em Vila Verde, reclamando direitos idênticos aos outros cidadãos no que respeita a esta matéria.
Relativamente aos centros de saúde e aos cuidados de saúde primários, não vou fazer o percurso que aqui já foi feito em relação a outro distrito, mas, quanto ao distrito de Braga, concentrar-me-ei apenas numa situação aguda que é conhecida do Ministério e que tem a ver com o problema da extensão de saúde do Louro, Vila Nova de

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Famalicão. Penso que uma parte significativa dos portugueses puderam assistir a uma reportagem televisiva sobre o assunto e eu visitei esta extensão de saúde e verifiquei que não tem quaisquer condições para continuar a prestar os serviços que presta. Assim, só há duas soluções: ou o Governo a fecha, e, então, deve fazê-lo rapidamente; ou, caso não entenda fechá-la, deve encontrar solução alternativa, com urgência, para este problema. Como não vejo no PIDDAC qualquer referência a esta questão, gostaria de obter uma informação.
O Sr. Ministro referiu aqui, relativamente a um problema semelhante, que, no Ministério, não praticam a "lei da rolha". Já agora, gostava que, de facto, a "lei da rolha" não fosse praticada, porque alguns dos directores desta extensão foram ameaçados com um processo disciplinar pela subadministração regional de saúde de Braga. Por isso, como já referi, gostava que não fosse aplicada qualquer "lei da rolha" relativamente a profissionais que apenas proporcionaram que a televisão mostrasse a realidade de um centro de saúde.
Gostaria de abordar uma outra questão, que só refiro aqui porque a resposta que me foi dada a uma pergunta que fiz foi manifestamente insuficiente, que diz respeito às dívidas em atraso aos hospitais psiquiátricos do distrito de Braga. Penso que estes hospitais prestam - é a minha convicção, não sei qual é a opinião do Ministério - um serviço de grande importância no distrito, até porque são os únicos, pois não há instalações psiquiátricas no serviço público para acolher doentes. À pergunta que coloquei foi-me respondido que as dívidas de 2000 iam ser pagas - a resposta integral que me foi dada nessa altura foi a de que ascendiam a 400 000 contos.
Posteriormente, visitei uma dessas unidades e o respectivo presidente referiu-me que o atraso dos pagamentos tinha passado de 9 para 15 meses. Estas unidades são ordens religiosas que vivem com carências, pelo que é absolutamente incompreensível que consigam sobreviver com os atrasos de pagamento que foram referidos.
Gostaria de saber se o Governo vai regularizar o pagamento ou quebrar os protocolos que tem com estas unidades, se vai cumprir com outra presteza, diminuindo significativamente os prazos de pagamento a estas unidades, dado que, há já alguns anos, cerca de três ou quatro, promete actualizar as respectivas prestações e até hoje não o fez.
Relativamente aos recursos humanos - já hoje coloquei aqui esta questão à Sr.ª Ministra do Planeamento, pois penso que as GOP deveriam ter abordado esta questão -, gostaria de saber quais são as necessidades do País, a curto e médio prazos, em termos de recursos médicos, enfermeiros, com toda a acuidade que este problema tem, e quais as medidas que o Governo tem em cima da mesa para lhes poder dar resposta, dado, até, o próximo agravamento desta questão, pelo menos ao nível de médicos de família.
Entendo que ao nível dos cuidados primários e de algumas outras unidades faltem médicos, faltem enfermeiros e até determinados técnicos especialistas da saúde, mas não consigo perceber - e é essa a pergunta que faço - por que é que os quadros administrativos também faltam. Por que é que não estão preenchidos os quadros administrativos? Certamente que não é por falta de candidatos a esses lugares!
Em matéria de recursos, gostaria ainda de saber se há algum balanço feito de uma medida anunciada ainda pela anterior Ministra da Saúde que se traduzia no apoio à deslocação de médicos para a periferia. Que balanço existe, por parte do Governo, da adesão a esse programa, já que estamos perante um Orçamento tão marcado pelas questões do interior e pelo apoio à interioridade e ao mundo rural?
Uma última questão, Sr. Ministro: hoje falou-se aqui muito do combate ao despesismo, do controlo das despesas. Pergunto: de que mecanismos dispõe o Governo, concretamente o Sr. Ministro da Saúde, para o controlo de preços de empresas que prestam determinados serviços médicos, em que, praticamente, são monopolistas no País? Isto é, de que forma é que o Governo acompanha esses preços?
Coloco esta questão porque, infelizmente, conheço pessoalmente uma situação destas. Não consigo entender - não é o Ministério que paga directamente, é o Governo e todos nós, através da segurança social ou da ADSE - como é que o País pode aguentar essa despesa se ninguém controla o preço de um aparelho que faz ventilação durante a noite, um pequeno aspirador de mecânica simplicíssima, e que custa a módica quantia ao Estado de 30 000$ ou 35 000$, consoante seja da segurança social ou da ADSE?! Não consigo perceber como é que o Governo não intervém relativamente ao controlo dos preços desses serviços prestados por empresas que se encontram sós, ou praticamente sós, no mercado.

A Sr.ª Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da Saúde.

O Sr. Ministro da Saúde: - Sr.ª Presidente, Srs. Deputados, muito obrigado pelas vossas muitíssimo úteis notas e comentários.
Sr. Deputado Manuel Moreira, tomei na devida conta as suas recomendações em relação a Ermesinde, ao Sobrado, a Paços de Ferreira, a Oliveira do Douro, a Serzedo, a Canelas, a Vilar de Andorinhas, a Canidelo, a Sandim, a Carvalhos e ao grande hospital de Vila Nova de Gaia. V. Ex.ª perdoar-me-á que não lhe dê uma informação específica sobre cada um destes pontos, mas dir-lhe-ei que tomei na devida conta as carências que me indicou.
A dotação inscrita para o hospital de Vila Nova de Gaia, cuja ampliação está prevista, é de 50 000 contos de fundos nacionais. Como sabe, isto pode alavancar 3/4 mais, ou seja, de 50 000 contos podemos passar para 200 000 contos, caso seja possível e necessário gastar esse dinheiro.
De qualquer forma, a intervenção de V. Ex.ª permite-me fazer três comentários, se me dá licença. Em primeiro lugar, em relação aos centros de saúde e à distribuição dos recursos dos centros de saúde, neste momento, os órgãos mais ajustados para fazer a respectiva pressão são as administrações regionais de saúde. O Governo já não tem 48% da gestão central dos fundos. Na chamada gestão desconcentrada de fundos comunitários, os 48% estão a ser directamente geridos a nível regional.
É evidente que sei que V. Ex.ª gostará que o Governo aconselhe, recomende, decida e que sejam tomadas as decisões que aponta.

O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Sr. Ministro, dá-me licença que o interrompa?

O Orador: - Com certeza!

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O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Eu sei disso, mas também sei que - e referi-o, en passant, na minha intervenção - houve várias diligências, vários ofícios em muitas destas situações e, concretamente, a Sub-Região de Saúde do Porto não dá resposta e nem sequer recebe as pessoas responsáveis por esse centro de saúde e por essas unidades de saúde. Daí eu ter tido agora também oportunidade de, junto do Ministério, porque tem a tutela, poder fazer algo para que esta situação se invertesse.

O Sr. Ministro da Saúde: - Agradeço-lhe, Sr. Deputado, e devo dizer que foi exactamente essa a razão pela qual reenunciei todos os dados que V. Ex.ª me apresentou.
Mas devo dizer que temos de sair daqui pela positiva e a modalidade que proponho a V. Ex.ª é a que ensaiámos há cerca de um mês, aqui, nos concelhos da área de Lisboa. As grandes áreas metropolitanas são as mais carenciadas do País, neste momento, como todos concordamos, porque a população cresceu consideravelmente, porque temos nova população imigrante que está desenraizada e tem necessidades novas e porque a estrutura, a malha urbana que suportava essas populações está completamente claudicante.
Assim, há pouco tempo, seguindo, de resto, o exemplo do Ministério da Educação, ensaiámos e vamos celebrar, no dia 21, um conjunto de contratos-programa com sete municípios à volta da Grande Lisboa e estamos totalmente disponíveis para pegar neste método e replicá-lo à volta do Porto, de Braga, de Setúbal e de Coimbra. E por que é que o queremos replicar? Porque já aprendemos, já temos um modelo de contrato-programa, já escrevemos, já temos a experiência da negociação com os municípios.
Trata-se de contratos-programa com municípios segundo os quais programamos, a três ou a cinco anos de distância, a construção do centro de saúde e ficamos com uma noção muito mais correcta, porque é a noção comunitária, das necessidades reais da população, podendo assim orientar os financiamentos de que dispomos de uma forma conjugada com a autoridade municipal para esse fim. Todos estes contratos são diferentes uns dos outros, sendo que, em alguns casos, os municípios chegam a adiantar o dinheiro e nós pagamos em quatro ou cinco anos. Esta é uma modalidade que queremos adoptar para outras regiões do País, ensaiámo-la aqui, vamos aprender com ela e vamos certamente utilizá-la nas áreas de V. Ex.ª.

O Sr. Manuel Moreira (PSD): - De acordo!

O Orador: - Quero fazer um terceiro apelo a V. Ex.ª: é que, como a sua descrição tão vívida fez salientar, temos de abandonar este método de gerir os centros de saúde pela administração central, porque isso não faz qualquer sentido!
Temos de encontrar uma modalidade que permita cumprir a lei de delegação de competências para as autarquias, no sentido de fazer não só os financiamentos, como a própria administração dos centros de saúde, ou de uma boa parte dos mesmos - e devo dizer que estamos de acordo com a tentativa de uniformização de designação. Temos, pois, de fazer um esforço no sentido de conjugar a nossa vontade com a dos municípios. Isso não vai ser fácil, Sr. Deputado, porque, como V. Ex.ª sabe tão bem como todos nós, os municípios são relativamente relutantes a esta ideia, mas, se estivermos, aqui, todos de acordo, será certamente mais fácil fazê-lo.
Sr. Deputado José Miguel Boquinhas, agradeço o seu comentário relativo ao combate ao desperdício, sendo que as sugestões de V. Ex.ª sobre os concursos públicos de aprovisionamento e a possibilidade de alargamento a outros produtos consumíveis são extremamente interessantes. Hoje, são basicamente utilizados para medicamentos e o chamado "material de consumo clínico", mas podemos, com certeza, aplicá-los a pequeno material médico não perecível que tem um custo no limiar daquilo que o Sr. Deputado Agostinho Lopes acabou, e muito bem, de salientar e que, porventura, está até a gerar situações de monopólio ou oligopólio dos fabricantes. Ora, desta forma poderíamos ter uma postura extremamente interessante.
Periodicamente, tem vindo a ser dada à Assembleia informação sobre os genéricos. V. Ex.ª conhece os objectivos nessa matéria, que são, do ponto de vista qualitativo, muito ambiciosos, embora não o sejam em termos quantitativos. É que os genéricos constituem um veículo para a prescrição por denominação comum internacional, pelo que, se conseguirmos convencer o sistema de saúde em Portugal, começando pelas urgências e pelas consultas externas hospitalares, a fazer a prescrição por denominação comum internacional, teremos outras condições para poder levar a aplicação dos genéricos a bom termo.
Há, pois, neste aspecto, um conjunto de sinergias que a aplicação dos genéricos nos trará, e isso é extremamente importante. Creio que já demos o passo mais difícil. A opinião pública até recebe muito positivamente a expressão "genérico", isto é, na opinião pública há a noção, até porventura excessiva, de que os genéricos são uma solução financeira para o problema dos medicamentos, mas temos ainda à nossa frente, não sei se "a passagem do Rubicão", mas a do "Ebro", que consiste em convencer totalmente a população prescritora de que a prescrição por denominação comum internacional ou por nome genérico constitui um avanço científico, um avanço de cidadania e não um ataque às profissões.
Esta é uma área extremamente importante e tudo aquilo que a Assembleia possa fazer, como já fez… Quero publicamente salientar o quanto a lei, aprovada na Assembleia, que fixa até 2003 o prazo para a aplicação de genéricos de denominação comum internacional serve o Ministério da Saúde. Este foi um passo essencial para podermos aplicar esta decisão.
Quanto ao redimensionamento das embalagens, vai sair uma portaria, provavelmente amanhã, segundo me diz o Sr. Secretário de Estado da Saúde. Havia umas ameaças de queixas de que a portaria não estaria bem organizada, pelo que ontem foi feita uma última reunião com as partes interessadas e a portaria sairá, provavelmente, amanhã.
Sr. Deputado Agostinho Lopes, creio que V. Ex.ª não tem razão no comentário que fez quanto às taxas moderadoras. Devo dizer-lhe que a aplicação das taxas moderadoras foi o que nos valeu para contermos a urgência hospitalar, o que já conseguimos fazer nos grandes centros metropolitanos. Se o Sr. Deputado olhar para as estatísticas que estão nas Grandes Opções do Plano, verá… Repare, o banco do Hospital de S. José, em Lisboa, recebia 800 pessoas por dia, há 5, 10 anos, sendo que hoje recebe 450; o próprio Hospital de S. João, que o Sr. Deputado certamente conhece melhor do que nós… Nas grandes áreas metropolitanas, está a dar-se a viragem do volume de atendimentos nas urgências para as consultas externas, e devo dizer-lhe que esta é uma conquista fantástica!

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O Sr. Agostinho Lopes (PCP): - Mas o problema não é das taxas. O problema é outro!

O Orador: - Ao longo das décadas de 70 e 80, crescemos desmesuradamente no acolhimento às urgências. É evidente que, hoje, a taxa moderadora é simbólica. Com certeza que 1000$ é ainda, para muitas pessoas, um sacrifício, não menosprezo esse problema, mas também há muita população que está isenta. Em todo o caso, devo dizer que estamos no bom caminho, a esse respeito, porque estamos a aumentar as consultas e invertemos um pouco o padrão.
Quanto ao hospital de Braga, não há nenhuma alteração - ou, melhor, não há… Permita que precise um conceito: em Braga, não vamos construir um hospital escolar, pois já não se constroem mais hospitais escolares. É muito importante que toda a gente tenha esta ideia bem assente: já não há mais hospitais escolares no mundo inteiro, já não se constroem!
O que vamos construir, em Braga, é um hospital que vai ficar ao lado de uma faculdade de medicina, o que é diferente. O conceito de hospital escolar que tivemos em S. João, em Santa Maria e nos hospitais da Universidade de Coimbra, em que as universidades estavam dentro do hospital, desapareceu, e isso é muito importante. Mas o facto de o conceito ser outro não significa que não tenha de ser correctamente realizado. Por isso, estamos, tão-só, a reprogramar o hospital, tendo em conta uma situação que não existia, há cinco anos, na altura em que o programa do hospital foi feito, que é esta existência do ensino médico ao lado.
Quanto ao escândalo das urgências do Hospital de S. Marcos, acompanho totalmente V. Ex.ª na palavra "escândalo", por muito escandalosa que ela seja. Das muitas visitas que já fiz a hospitais e centros de saúde, devo dizer-lhe que foi a situação mais lamentável que vi até hoje. Não sei se foi do dia, se foi da hora, mas digo-lhe, sinceramente, que não esperava ver uma situação daquelas naquele que é um óptimo hospital, que tem uma qualidade médica muito acima da média dos hospitais distritais, e, por isso, até é um hospital central.
No entanto, também vi, ao lado, o local onde vai ser feita a urgência e sei que temos os recursos financeiros para a construir. Temos uma verba de 343 000 contos para a construir, que pode ir até 1,4 milhões de contos, se lhes adicionarmos os 75% dos fundos comunitários. Aí, creio que estamos no bom caminho. De resto, na carta-resumo de análise das minhas visitas (faço sempre uma carta-resumo quando visito um hospital) esse foi o ponto mais importante - se V. Ex.ª quiser perguntar aos gestores do hospital, verá isso mesmo.
O mesmo se passará quanto ao hospital de Vila Nova de Famalicão. Não há vergonha nenhuma: o hospital foi construído há 10 anos e agora é necessário ampliá-lo e mudar a consulta externa - que mal há nisso? Sr. Deputado, isso não é escândalo nenhum, significando só que Guimarães teve um crescimento e um aumento de procura de cuidados de saúde muitíssimo positivo - também não nos sangremos em saúde! Isso é bom, de certa forma, e temos os recursos para resolver esse problema.
Quanto à questão de Vila Verde e das taxas moderadoras, ou, melhor, das taxas com pagamentos aplicados pelas instituições privadas de solidariedade social, devo dizer-lhe, Sr. Deputado, que tenho um longo dossier sobre essa matéria, com muitas intervenções de V. Ex.ª. Sei que V. Ex.ª tem sido extremamente coerente nessa postura e não posso deixar de demonstrar que estou totalmente ao seu lado - ponto final, parágrafo! A minha intervenção com as instituições envolvidas tem sido, toda ela, pautada no sentido de se cumprir a Constituição.
Quanto à questão da psiquiatria de Braga, há atrasos de 400 000 contos derivados de uma situação de transferência de dependência institucional. Sei que é lamentável, mas estamos a fazer esforços para resolver a situação.
Sobre os recursos humanos, o Sr. Deputado questionou-nos por não lhes fazermos menção no nosso documento das Grandes Opções do Plano. Devo dizer-lhe que se este documento saísse dois meses depois talvez pudéssemos ter essa menção; simplesmente, há o tal relatório do Prof. Alberto Amaral sobre os recursos humanos da saúde, de que tenho uma versão provisória e não me era permitido utilizar essa versão. Sr. Deputado, o que lhe posso dizer sobre os recursos humanos médicos é que este ano abrimos 945 lugares, em todas as faculdades de medicina.
Quanto à questão dos médicos na periferia, tenho muito gosto em lhe dar informação sobre os hospitais carenciados e a colocação dos internos e sua distribuição por vagas nas regiões, distritos e hospitais. Posso dizer-lhe que estamos, realmente, a servir os hospitais carenciados e a periferia. Os hospitais de Lisboa, Porto e Coimbra recebem apenas 28% dos 244 internos, ou seja, 68, sendo que os restantes distritos recebem 176. Os distritos de Braga, Porto, Aveiro, Coimbra e Lisboa recebem 40% - isto na faixa litoral -, sendo que os restantes distritos recebem 60%. Portanto, nesta matéria, estamos, de facto a cumprir os objectivos.
Foi também perguntado qual é o controlo de preço de cuidados médicos. Sr. Deputado, já não há preços administrados em Portugal, pois vivemos em economia de mercado! Temos é de garantir, como grande comprador que o Ministério da Saúde é, que não nos deixaremos ficar na mão de um monopolista ou de um oligopolista. É isso que temos de fazer, e a recomendação do Sr. Deputado José Miguel Boquinhas a esse respeito parece-me totalmente correcta.
Agora, não podemos, nem queremos, nem devemos fixar um preço administrado para um ventilador determinado - isso é coisa que não fazemos! Pode acontecer que o preço seja excessivo, mas a forma de lutar contra essa captura do mercado por um único fornecedor passará, provavelmente, por antecipar as necessidades do mercado, ou seja, dizendo aos diferentes produtores que vamos precisar de 5000 ventiladores e eles que façam o favor de se organizarem para isso. Nessa altura, teremos o mercado a funcionar, em termos competitivos, e teremos o custo unitário mais baixo. A nossa percepção é esta, não é a de administrar preços!

A Sr.ª Presidente: - Sr. Ministro, Srs. Secretários de Estados e Srs. Deputados, agradeço a presença de todos.
Srs. Deputados, recomeçaremos os nossos trabalhos amanhã, às 10 horas.
Está encerrada a reunião.

Eram 19 horas e 30 minutos.

A DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL

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