O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

SEPARATA — NÚMERO 54

4

entidade de empregadora esteja, não raras vezes, relacionada com outros comportamentos que configuram

formas de assédio moral sobre os trabalhadores, mas que se têm tornado mais difíceis de fiscalizar e de

combater. De facto, sob o pretexto da desburocratização da fiscalização, facilitou-se o abuso patronal.

Para além das formas clássicas de abuso sobre os horários de trabalho, o desenvolvimento das tecnologias

de informação e comunicação tem vindo a criar novas modalidades de prolongamento dos horários, de diluição

das fronteiras entre tempo de trabalho e não trabalho e formas de prestação de trabalho associadas a uma

espécie de “nomadismo laboral”, no qual o trabalho pode ser levado para qualquer local e realizado a qualquer

hora, sem limite. Não por acaso, alguns investigadores falam mesmo da emergência de novos fenómenos de

“servidão voluntária” e de um tipo de escravatura própria do “homo connectus”, isto é, dos trabalhadores que

são vítimas da ausência de desconexão profissional.

Segundo o relatório da Organização Internacional do Trabalho (OIT) e do Eurofund, ”Trabalhar a qualquer

hora, em qualquer lugar: os efeitos no mundo do trabalho”, de fevereiro de 2017, resultado de uma pesquisa

realizada pelas duas organizações em 15 países, há um risco efetivo do uso das novas tecnologias de

comunicação diminuir as fronteiras entre trabalho e casa, alertando aquelas organizações para o facto do uso

das tecnologias estar associado a uma tendência para se trabalhar mais horas e para a sobreposição entre o

trabalho remunerado e a vida pessoal, facto associado a elevados níveis de stress. Segundo Oscar Vargas, da

Eurofound, “É particularmente importante abordar a questão do trabalho suplementar realizado através das

tecnologias modernas de comunicação, como por exemplo o trabalho adicional feito em casa, que pode ser visto

como horas extras não remuneradas. Nesse caso, também é importante garantir que os períodos mínimos de

descanso sejam respeitados, a fim de evitar efeitos negativos sobre a saúde e o bem-estar dos trabalhadores”.

A União Europeia possui um acordo para regular a mudança digital relacionada ao trabalho a distância

(European Framework Agreement on Telework). No entanto, o enfoque é o trabalho no domicílio, ou seja, o

trabalho a distância formal, baseado no domicílio, sendo que a matéria mais preocupante é a que respeito ao

trabalho a distância informal e prestado ocasionalmente.

Ora, é neste contexto de hiperconectividade de alguns grupos de trabalhadores particularmente envolvidos

na economia digital e de generalização do trabalho suplementar informal e não remunerado, que a questão da

garantia do tempo de descanso, da capacidade de fiscalização por parte das entidades públicas e da garantia

do “direito a desligar” deve ser equacionada. A função tuitiva do Direito do Trabalho tem aqui uma relevância

particular. Importa não esquecer que o trabalhador, ainda que tal não lhe seja expressamente solicitado, vê-se

instigado, num quadro de forte competitividade, a mostrar a sua total disponibilidade para ser contactado,

anuindo muitas vezes por força da sua situação de dependência em relação à entidade empregadora. Por outro

lado, é frequente e consentida a falta de pagamento da correspondente retribuição pelo trabalho prestado fora

do horário de trabalho mediante solicitação da entidade empregadora. Apesar da consagração legal sobre o

tempo de descanso, institui-se nas relações de trabalho uma permissividade face a um tempo de trabalho, sem

direitos, depois do trabalho.

No quadro do combate à já designada “coleira eletrónica” que constrange e limita a liberdade individual do

trabalhador, resultaram medidas concretas introduzidas nos instrumentos de regulamentação coletiva. Nessas

medidas encontramos, por exemplo em empresas como a Volkswagen na Alemanha, a obrigatoriedade de

desligar servidores de computadores fora do horário de trabalho para evitar e-mails durante os períodos de

descanso e feriados.

Em alguns países, como França e a Alemanha, iniciou-se uma análise dos instrumentos de regulamentação

coletiva e da legislação, com vista a dar resposta a este problema. Lançado pela central sindical francesa

Confédération Générale du Travail (CGT), na sequência da preocupação com os números alarmantes do “burn

out”, síndrome de esgotamento no trabalho, o debate sobre a desconexão profissional teve como consequência

uma revisão recente do Código de Trabalho francês que consagra este “direito à desconexão”, por via de

"instrumentos de regulação das ferramentas digitais" que devem assegurar "o respeito pelos tempos de

descanso" e o equilíbrio entre a vida profissional e pessoal e familiar. A consagração deste direito à desconexão

mereceu consenso no parlamento francês e o apoio da CGT, sendo que Jean-Luc Molins, presidente do