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16 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

do país só podem estar confiados a um português de sangue, assim o garantiu bem.

Pela primeira vez apparece no seio da vida politica portuguesa um facto que tanto attenta contra o brio nacional.

Apregoa-se o cumprimento severo da lei; e entretanto, essa vestal, que quer collocar-se acima de todas as paixões e interesses partidarios, o primeiro acto que pratica, no momento da composição do Gabinete, é offender gravissimamente não uma qualquer ]ei, mas a constituição politica do Estado; não num artigo qualquer, mas precisamente naquelle que mais intimamente contende com o brio nacional.

Não foi só, porem, na chamada do Sr. Sohroter aos Conselhos da Coroa que o actual Governo offendeu a constituição politica do Estado. Offendeu-a, tambem, com esse tristissimo remendo do decreto de 30 de julho de 1906, no qual foram feridas as principaes prerogativas do poder judicial; e, entretanto, o chefe do Governo, para procurar attrahir umas certas sympathias sobre o seu programma, levantou nos seus escudos essa instituição, por quem diz que tem muito respeito!

No Ministerio da fazenda, procedendo á arrecadação de todos os impostos da nação portuguesa, encontra-se um homem que, pela propria confissão dos Deputados da maioria, não pagou o mais rudimentar, o mais sagrado, o mais interessante dos impostos - o imposto de sangue, aquelle que mais intimamente contende com o brio nacional.

Entretanto é o Sr. Ministro da Fazenda, é o estrangeiro Driesel Schrõter, quem ha de ser o severo cumpridor da lei, quem ha de ter a autoridade politica, e de toda a ordem, para obrigar o cidadão português a pagar todos os impostos, quando elle não pagou aquelle que, ainda que não estivesse nas leis, devia estar na consciencia de todos.

Ha annos, quando nesta Camara se discutia uma proposta de lei de receita e despesa, apresentada por um Ministro progressista, o fallecido Deputado Mariano de Carvalho surprehendeu numa alinea de um artigo d'essa proposta uma disposição que, segundo se suppunha, permittiria a entrada de tres estrangeiros na constituição da Junta do Credito Publico. Devem, por certo, lembrar-se todos da tumultuosa tempestade parlamentar que então surgiu, por isso mesmo que eram descobertos os designios do Governo de então, de introduzir estrangeiros na constituição da Junta do Credito Publico.

A Camara inteira protestou contra tal tentativa e o proprio Chefe do Governo declarou, lealmente, que não era intento seu introduzir elementos estrangeiros naquella repartição.

Não estava, então, nos Conselhos na Coroa um Ministério que dizia a toda a hora que se queria impor pela sua austeridade politica, e que apregoava em todos os artigos do seu programma o severo cumprimento da lei; e, entretanto, o Parlamento Português levantou-se indignado contra a supposta tentativa do Governo.

Hoje, a situação é bem diversa, e poder-se-ha, por certo, dizer: - outros tempos, outros costumes.

Não se trata de uma modificação a introduzir na Junta do Credito Publico, que é uma instituição do Estado; trata-se de um estrangeiro, de um austriaco, na constituição de um Gabinete. Não só trata do designio do chefe do Governo, de introduzir elementos estranhos numa instituição do Estado; trata-se de um facto já consummado, de se encontrar á frente da pasta da Fazenda, precisamente aquella por onde correm todos os negocios que intendem com as finanças e economia do país, um individuo que já se provou não ser português.

Que ideia se fará de nos no estrangeiro, quando se souber que, em Portugal, a fallencia de saber, de intelligencia e de patriotismo, nos homens publicos é de tal ordem, que o chefe do Governo precisa de ir buscar o seu Ministro da Fazenda a uma colonia respeitavel, é certo, mas a uma colonia estrangeira?!

É bem de crer que dentro do partido regenerador-liberal houvesse homens competentes para a pasta da Fazenda; mesmo, porem, que assim não fosse, quem pode ir buscar ao partido progressista regedores e outras autoridades, podia igualmente ir buscar um Ministro da Fazenda.

Passando a referir-se ao discurso do illustre Deputado Sr. Martins de Carvalho, nota o orador ter S. Exa. alludido, numa das partes d'esse seu discurso, á projectada reforma do Juizo de Instrucção Criminal.

Desde que o Governo prometteu apresentar ao Parlamento uma proposta a esse respeito, a opposição parlamentar regeneradora aguarda essa proposta, para então manifestar o que pensa a respeito d'ella.

Foram tambem versados ha pouco dois assuntos que entendem com a vida do Governo no intervallo parlamentar: - o adiamento das festas das crianças e do congresso pedagogico.

Adiou-se a festa das crianças porque não havia verba para pagar os livros de premios destinados a essa festa. A prova porem de que existia essa verba está em que dentro do orçamento do mesmo anno ella appareceu, para que a festa fosse feita em outubro.

Existia portanto verba; mas quando não existisse adoptava-se para esse facto, que estava contendendo tão singularmente com o sentimento nacional, a mesma disposição que se adoptou para se abrir credito que cobrisse despesas que não estavam legalmente autorizadas.

Adiou-se portanto a festa das crianças; mas tal adiamento representa uma arbitrariedade e não o cumprimento da lei.

Adiou-se tambem o congresso pedagogico sob pretexto de não ter sido ouvido o Conselho Superior de Instrucção Publica. Ora se o chefe do Governo quisesse cumprir a lei tinha o meio simples de dentro de dois dias ouvir aquelle conselho.

Portanto ainda sobre estas duas questões não houve o severo cumprimento da lei, mas sim unica e simplesmente um capricho.

Referiu-se em seguida o Sr. Martins de Carvalho ao Tribunal de Verificação de Poderes, sustentando que o logar onde a questão que se debate devia ser posta era ali e não no Parlamento, e allegando que a validade do caso Schrõter era um caso julgado.

Na opinião d'elle, orador, a questão do Sr. Ministro da Fazenda devia ser levantada no seio da representação nacional e não no Tribunal de Verificação de Poderes, e a oppnsição parlamentar regeneradora desviando-se d'aquelle Tribunal, aliás muito respeitavel, e collocando-a no Parlamento, cumpriu o seu dever.

O artigo 139.° da Carta Constitucional, que o orador lê á Camara, é bem expresso a esse respeito.

A seu ver, a nomeação do Sr. Ministro da Fazenda para esse cargo, não sendo cidadão português, representa uma infracção da disposição legal e, como já disse, contende, singularmente, com o sentimento patrio, com o pundonor do Parlamento e com o brio de todos os portugueses.

Embora exista a presumpção da nacionalidade do Sr. Schrõter, desde o momento em que foi proferido o accordão validando a sua eleição, esse acordão nada vale, logo que se faça a prova em contrario; e essa prova foi feita pela opposição regeneradora.

E isto tanto vale para o facto de S. Exa. ser Ministro, como de ser Deputado.

Conseguintemente, no mesmo dia em que S. Exa. deve abandonar o poder, deve, igualmente, abandonar o Parlamento Português.

Pelo que se vê, pois, não ha incoherencia alguma no