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cio, tem obstado a que a massa da Nação se haja adiantado até aquelle ponto de cultura de espirito, que se observa em o commum da Europa. Daqui provem que hebetadas as faculdades d'alma do nosso Povo lhe seja mui difficil distinguir a verdade do erro, a demonstração do sophisma, a doutrina solida, da especiosa em pontos tão delicados, e de consequencias tão transcendentes quaes os que compõe a substancia dos Dogmas, e da Moral. Conseguintemente se huma Censura legalmente bem regulada não prevenir os perigos, exporemos os nossos Constituintes a males de tanta monta, como são os que infallivelmente se seguem da falta de discernimento, de cautela, e de prudencia era os negocios delicados, e de summa responsabilidade.

Mas nem he mais avultado o cabedal de conhecimentos, ou de instrucção particular em materias religiosas, que se descobre em os nossos Concidadãos. A Sciencia do Clero póde servir-nos de thermometro seguro para calcularmos a este respeito o atrazamento, ou adiantamento das outras classes tomadas em massa. Reconheço naquelle Corpo respeitavel Varões benemeritos da Religião, da Patria, de seus Contemporaneos, e até da Posteridade por seu saber são, profundo, e vasto. Mas por poucos Ecclesiasticos, que se distinguem por aquellas brilhantissimas qualidades, que innumeraveis se nos apresentão, que lhe servem para assim dizer de sombras, e, de sombras, mui densas! Hum Breviario, hum Compendio de Moral, e huma Cartilha de doutrina ornão de ordinario a estante dos que estão incumbidos de ensinar toda a verdade da revelação aos que lhe forão confiados pelo Espirito Santo debaixo do regime dos primeiros Pastores para o alimento da fé. Reyno logo a Ignorancia, o erro, e a superstição; ignora-se mui geralmente o espirito da Religião; e poucos dos fieis sabem manejar a pedra preciosa de toque, em que se apure a verdade do erro. Cahindo em taes mãos obras, que não estejão expurgadas pelo criterio da Censura previa, a que riscos, e talvez irremediaveis se não aventurão os infelizes, que incautamente se enredarão em o laço da tentação!

Tomão estas considerações maior interesse, e importancia, quando se pondera o caracter da Religião Catholica Romana, que nós todos jurámos como a Religião do Estado. Huma Religião, que nos communica toda a verdade em a ordem sobrenatural, e que proscreve, e anathematiza as novidades em materia de fé como erros profanos incompativeis com a salvarão: huma Religião, que huma vez abraçada não permite limitação, nem duvida em os sagrados artigos com que captiva o nosso entendimento: huma Religião, que nos manda zelar o bem dos nossos irmãos como proprio, que troveja contra os escandalos, e nos obriga para evitallos aos mais penosos sacrificios: huma Religião, que nos ordena escutar a Igreja como unico, e indispensavel orgão da verdade, e que creado huma vez conserva perpetuamente hum corpo de Pastores, he quem nos cumpre receber a doutrina, huma Religião de tão delicada natureza paroco ter direito a que se conciliem com o seu genio as outras instituições parallelas, que se decretarem; e que se tomem medidas mais convenientes a fim de se lhe conservar entre nós a pureza, e a perpetuidade.

E estas medidas nunca as julguei de mais urgente necessidade, do que em os nossos tempos. Vós sabeis, Senhores que desde o meado do Seculo passado se reforçou o Pendor, que desde o principio do Seculo decimo sexto tende para a ruina do Christianismo. Em os nossos dias poucos se interessão por Luthero: Calvino, Zuinglio, e por outros Chefes das erradas Religiões positivas. As Seytas philosophicas de data moderna apurando suas sagazes especulações, e ambicionando mais solidas conquistas derão-se a propagar o deismo, o atheismo, e o materialismo. Lavra furiosamente o incendio, incendio que não se limitando a arruinar a Igreja, revolve os alicerses mais seguros da sociedade civil. Consultai a experiencia, calculai os factos, de que sois contemporaneos, e decidi se á vista de taes doutrinas tem ganhado terreno, ou perdido a Religião de Jesus Christo; e conseguintemente se pertence á vossa sabedoria, e prudencia atalhar com arbitrios bem ponderados, perigos, que tão iminentemente ameação entre nós, essa Religião, que todo o Povo Portuguez tem proclamado pela sua Religião.

Tem-se aqui dicto, que os perigos por mim apontados, facilmente se acautelão, e previnem por outros meios, que não são os de Censura provia. Quaes são os indicados? Mencionão-se tres. 1.° A mesma Liberdade de Imprensa. 2.° A censura posterior dos Ordinarios. 3.° A protecção do Governo. Em quanto ao primeiro allega-se, que havendo Liberdade de Imprensa facilmente se refutarão os erros, que da mesma Imprensa sahirem. Mas não me parece seguro, e Infallivel este remedio. Em materias de Religião convennce-nos a experiencia, que os erros, principalmente os erros philosophicos se insinuão com mais facilidade do que se curão. Acommodão-se tão docilmente com as nossas paixões! Affagão com tanta meiguice, a isempção da nossa Liberdade! Jnculcão-se com tanta eloquencia, e unção ao nosso debil entendimento! Tem o cunho, ou antes o traje da moda, tão feiticeira para a mocidade, para as almas vulgares. Talvez, que Voltaire cause maiores males em hum dia, do que cem apologistas fazem bem n'hum anno.

Insiste-se, em que a Censura posterior dos Ordinarios destruirá os males propagados pelos livros impios, e licenciosos. Mas os inales já estão propagados, e males em materia de salvação. Mas esses livros por mais vigilancia que haja por parte na policia em recolhellos, continuarão infalivelmente a circular. Mas a Censura dos Ordinarios limitando-se a penas espirituaes, quaes as Censuras, que tomão como penas coercivas a sua efficacia da opinião, pouco ou nenhum effeito produzirão nos animos, que estiverem indispostos, contra a sua auctoridade, e sagradas prerogativas. Accrescenta-se que o Governo empregará remedios mais fortes, quaes os da sua competencia temporal. Mas os Auctores mais vulgarizados das theorias criminaes considerão os erros theologicos como opiniões, e quando muito como peccados, e não como crimes. Pertendem, que ideas mysteriosas não merecem que os governos se occupem dellas como indifferentes para o bem da sociedade civil. Insistem, que o desprezo, a indifferença, e a tolerancia em taes pontos são o partido mais sisudo, e menos arriscado, que convenha abraçar ás auctoridades seculares. E he com estas theorias, que o Governo protegia os Bispos para que se tornem mais efficazes as suas censuras posteriores.

Affirmão, que a Censura previa reprimindo a liberdade de pensar, e deixando o largo campo do