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cussão, a ajuntar ao que se tem dicto as breves reflexões, que de presente me possão occorrer.

Se a sabedoria das leys não consisto só em procurar o bem, mas da o fazer durarei; se a prosperidade futura dos povos, não menos que a presente, reclama os cuidados do legislador; se este deve não só destruir os males actuaes, mas anua prevenir os que circunstancias extraordinarias poderião occasionar; se a efficacia das leys suppõe huma boa Administração, e a conserva-lo desta boa, Administração depende de se lhe darem os soccorros convenientes: se finalmente não he licito duvidar destas verdades, não he tambem licito duvidar das vantagens da Liberdade da Imprensa, que tão perfeitamente corresponde a todas estas saudaveis intenções.

Existe em todas as Nações hum Tribunal invisivel, sempre em actividade, mais forte que os magistrados, que as leys, que o Rey, o que ninguem póde dominar. Este Tribunal que pelo effeito nos mostra que a soberania reside constantemente em a Nação, e que em certo modo a exercita, he o da Opinião Publica. Elle he o conservador das boas leys, que por elle adquire a huma nova força; he o censor das más, que por elle perdem sua injusta auctoridade: a elle são os Povos devedores da conservação da sua felicidade, e da diminuição de seus males.

Mas como he que este Tribunal póde ser advertido dos bens que tem a promover, e dos males que tem a evitar? A Liberdade da Imprensa he o unico meio: o legislador não a deve poio despresar; o legislador a deve estabelecer o proteger: o intende e a prosperidade publica o pedem, e o que ainda he mais, a justiça o exige. Eu o provo.

Existe hum direito commum a todos os individuos de qualquer sociedade; hum direito que não se póde perder, nem renunciar, porque deponde de hum dever, que obriga a todos, que existe emquanto a sociedade existe, e de que ninguem póde eximir-se, será ser excluido da sociedade, ou ella acabar. Este dever he o de contribuir, quanto cajá hum póde, para o bem da sociedade a que pertence; e o direito que dahi resulta, he o de manifestar á sociedade as ideas que cada hum julga conducentes a multiplicar os seus bens, ou a diminuir os seus males.

Por tanto a Liberdade da Imprensa he fundada sobre hum direito, que não se póde perder, que a violencia sim póde embaraçar, mas que a rasão, e a justiça defendem, e convem em nos mostrar que a legitima auctoridade das leys não póde ter maior interrese sobre o exercicio delle direito que dos outros, e que por consequencia a sua sancção só póde recahir sobre a pessoa daquelle que tem abusado. Se não ha direito tão sagrado de que o malvado não possa abular, e nem por isso as leys prohibem o exercicio de algum, e só castigão o abuso, porque rasão não ha de a mesma regra ter lugar a respeito do direito de que se trata, e que he muito mais precioso que outros para o homem, e para a sociedade, e de que o abuso he mais difficil, e talvez menus prejudicial?

Mas a posar de rasões tão evidentes, que devem todas as materias, observo que huma fatal divisão se tem apoderado da Assemblea. Portende-se distinguir os escriptos sobre maiorias religiosas, para os subjeitar particularmente, a huma censura prévio? com o pretexto de que o veneno espalhado da má doutrina póde ser transcendente a toda a sociedade, e destruir a crença religiosa. Eu julgo esta distincção, e excepção da regra geral, não só inutil, mas prejudicial á mesma religião. Inutil, porque não preenche os fins que se tem em vista, pois em linguas extrangeiras, mas hoje vulgares, correm pelas mãos de todos os mesmos livros que se pertende prohibir, e que talvez por isso sejão lidos com maior
avidez, e interesse. Prejudicial, primeiramente porque a censura previa embaraçaria que se cortassem as superstições, em que o povo faz consistir a Religião, com desprego do dogma e da moral santa, que practicada em toda a sua pureza tantos bens traria á sociedade, até mesmo politicamente faltando, e de que ella por isso se acha privada. Que proveito não poderia tirar a sociedade da moral de huma Religião, que tem por objecto principal unir os homens entre se pelos vinculos de huma charidade reciproca? Esta união he a maior perfeição a que as leys civís podem aspirar, e ellas a conseguirião muito mais facilmente, quando não fossem ajudadas pela observancia dos leys religiosas. Ainda mais, huma Religião que tem por devem huma vida futura, em que os bens hão de ser eternamente premiados, e os máos eternamente castigados, he a mais propria a augmentar a sancção das leys civis, huma vez porém que o fanatismo, e a superstição não substituão á practica das virtudes, unico meio de conseguir a salvação eterna, expiações irrisorias, e o supplemento de indulgencias comprados por dinheiro.

Em segundo lugar me parece prejudicial a censura prévia em materias religiosas, pois convém mais que o erro appareca em toda a sua luz, para ser competentemente refutado, e dahi resultar a convicção intima, de que a Religião tira toda a sua força. Pelo contrario o erro clandestinamente espalhadado minorá surdamente os alicerces da Religião, e quanto mais comprimido for, mais será para temer a reacção, cuja explosão talvez nada respeite na sua torrente. He cousa sabida que quando se quizer dar corpo a huma Seyta, não ha mais que perseguilla: os homens propendem naturalmente para o maravilhoso e extraordinario, e o amor da sua independencia os leva a abraçar aquillo mesmo que se lhe prohibe. Ora pela mesma razão digo eu, que quem quiser fazer cahir em desprezo huma Religião, não tem mais que cercalla do apparato do poder; doado logo ella se torna intolerante, os homens procurarão resistir-lhe, e acabarão por a desprezar. A practica de vinte annos adquirida no serviço de num Tribunal, destinado a conservar a pureza da Religião, me tem mostrado quanto são fracos para isso os meios de coacção.

Alguns Membros deste Congresso tem havido, que inspirados de hum zelo louvavel, tem insistido em dizer que he melhor prevenir os crimes, que ter depois de castigallos. Eu não sei segundo meus principios juridicos o politicos, que haja outro modo de prevenir, a não ser por meios muito indirectos.