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Passou-se á ordem do dia, e leu o Sr. Freire o seguinte

Projecto de decreto sobre a extincção da igreja Patriarcal de Lisboa, mandado redigir na sessão de 25 de Outubro passado.

As Cortes Geraes Extraordinarias, e Constituintes da Nação portugueza, considerando quão pezada foi á fazenda nacional, e ás províncias deste Rei no a creação da Igreja Patriarcal de Lisboa, decretão o seguinte:
1.° Fica revogado o beneplácito régio concedido á bulia chamada aurea, ou motu próprio do Papa Clemente XlV, que erigio a collegiada da capella real cm igreja metropolitana Patriarcal; ficando por consequência instaurada assim a dita capella real, como a antiga Sé Metropolitana de Lisboa, na forma que d'antes erão; e ficando também revogados os beneplácitos, que posteriormente sederão a outras quaesquer letras pontifícias, relativas á dita Igreja Patriarcal, bem como os alvarás, decretos, e mais ordens a ella tocantes.
2.º Todos os bens, e rendimenros, que por doações regias, ou outros títulos, forão conferidos á dita Igreja, e ao Patriarca, serão havidos como nacionaes, e como taes arrecadados; porem depois que for extincta a divida publica pretérita ou antes se possível for reverterão os dízimos ás igrejas, e applicações que d'antes tinhão.
3.° Os actuaes Prelados, Conegos, Beneficiados, e Empregados da dita Igreja, em quanto não forem competentemente occupados, terão os vencimentos , que se lhes designarem á vista das relações que se manda ao pedir. - Borges Carneiro,
O Sr. Borges Carneiro: - Para se extinguir a Patriarcal nada mais se requer que revogarem as Cortes o beneplacito regio que D. João V. concedeu á bulla que a fundou; pois segundo as regras de direito, qualquer cousa se desfaz pelo modo porque foi feita. Ora caindo assim aquelia bulla, iustaurava-se ipso facto a antiga sé arcebispal de Lisboa, e as bulias que a regularão. Este principio não ataca em nada a disciplina da Igreja. Sabe-se muito bem que até ao século 11.° erão feitas todas as erecções de bispados por autoridade dos Bispos e de poder temporal; no que a policia externa da Igreja ia seguindo a policia civil. Depois daquelle século a autoridade dos Bispos foi usurpada pelos Papas, com o apoio de falsas decretaes que se inculcarão em nome dos Papas S. Clemente, e Anaclelo; pois se os Papas alguma autoridade tiverão a este respeito naquelles tempos, foi somente quanso ás igrejas suburbicarias existentes dentro da, demarcação da centessima lapide de Roma.
Nisto estão de acordo os canonistas, que foi esta uma usurpação, e que nunca nos bons séculos da Igreja, tiverão os Papas tal faculdade. Sendo pois a erecção ou suppressão dos bispados pertencente ao poder temporal de acordo com o ecclesiastico, isto he, com o acordo do metropolitano, e não do Papa, segue-se que se podia desde já extinguir a Patriarcal sem dependencia de nova bulla; mas se esta opinião não agradar, deve então decretar-se a extincção da Patriarcal desde já, e recommendar-se ao Governo que peça ao Papa a bulla da suppressão, e da instauração da sé metropolitana de Lisboa. Este procedimento he na verdade mais moderado: come porém o seu complemento será certamente demorado, he necessario estabelecer desde já os ordenados que ha de ter toda essa immensa turba de empregados da Patriarcal, assim civis como mesmo ecclesiasticos. Ninguém dirá que isto dependa também do Papa. Os empregos civis, e ordenados dos ecclesiasticos são cousas temporaes, e nestas ninguém dirá que o Papa tenha jurisdicção. O Papa embora poderá decretar que na Patriarcal continue a haver essa innumeravel turba de ecclcsiasticos de diversas denominações; mas não que o nosso Thesouro lhe esteja fornecendo riquíssimos ordenados de doze, seis, cinco mil cruzados etc., só se quizer pagar-lhe á sua custa. Por tanto vote-se desde já a extincção da Patriarcal pelo modo ordinario de impetração de bulla; com tanto porém que os gastos da mesma Patriarcal se reduzão desde já áquella quota que for absolutamente indispensável e compatível com o actual estado da nossa fazenda, deixando-se aos empregados quanto baste para viverem decentemente, até que tenhão alguma occupação ou beneficio, em cujo caso deve cessar aquelle ordenado. Bastava para não tolerarmos mais nem um momento estes excessivos gastos, o lembrarmo-nos das escandalosas despezas que se fizerão com a creação desse sumptuoso e vaidoso estabelecimento: só em bullas levou Roma muitos milhões; essa casa da torre da Ajuda tem-se-me assegurado estar cheia de bullas comprada cada uma por quinhentos mil réis e mais; bulla até para trazer çapatos vermelhos; bulla para meias roxas; bulla para não cantar, etc. etc: só o bom do chapéo cardinalicio tem custado mais de cento e trinta contos, isto só do frete do chapéo a razão de seiscentos mil réis por anno ao portador. E deverá a nação continuar por mais tempo a tolerar gastos tão ridículos? Não vai nisto só o interesse pecuniário de Portugal; vai o seu credito. Nós temos sido com razão objecto de riso e de ridicularia para as nações estrangeiras. Uma nação pobre, que não paga a sua divida, que não paga a seus empregados, que não tem lavoura nem commercio, etc. deverá ella estar dando para Roma milhões e milhões para sustentar a Patriarcal, e as vaidades de seus membros, e por outros muitos pretextos igualmente frivolos? Se he verdade que bem aventurados são os simplices, ninguem mais bem aventurados que os Portuguezes, a quem com capa de religião se lhe tem posto em cima do espinhaço albardas sobre albardas. Não se trata só torno a dizer do interessantissimo objecto de economia; trata-se da honra da nação, que até agora com justa razão tem servido de riso ás outras nações. Por ventura a religião autorisa a que só de frete se dê por um chapéo cento e trinta contos de réis, e que queirão fazer passar estas e outras taes cousas como muito santas, e em nome de Deus? Com o nome de Deus he que os homens tem ousado autorisar as cousas mais injustas; porém Deus he justo, e não póde querer que pereção de fome muitos uteis cidadãos pa-