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SESSÃO DE 30 DE MARÇO.

(Presidencia do Sr. Dias d'Oliveira.)

ABERTA a sessão pelas onze horas da manhã, estavam presentes oitenta e cinco Srs. Deputados.

Lida a acta da sessão precedente, pelo Sr. Secretario Prado Pereira, foi approvada.

O Sr. Secretario Vellozo da Cruz deu conta da seguinte correspondencia.

1.° Uum officio do Ministerio dos negocios do reino, accusando a recepção d'um officio expedido pela secretaria d'este Congresso, em que se participava a eleição de Presidente, e Vice-Presidente, para o mez seguinte. O Congresso ficou inteirado.

2.º Do mesmo Ministerio, participando, que em virtude da proposta da Commissão d'administração publica, que exige esclarecimentos ácerca das representações da Camara municipal da villa de Santarem, e do concelho de Mourão, se officiou aos administradores gentes de Santarem, e Evora, pedindo as necessarias informações para satisfazer á referida proposta. O Congresso ficou inteirado.

3.° Remettendo um officio do administrador geral do districto do Porto, com a representação da Camara municipal da mesma cidade, pedindo o terreno chamado do Prado do Bispo, para n'elle formar um cemitério publico: e igualmente outro officio do Ministerio da fazenda, com as respectivas informações sobre a mencionada representação. Foi á Commissão de administração publica, e fazenda.

4.º Acompanhando os esclarecimentos, que se houveram da administração geral de Lisboa, e do concelho de saude publica, em satisfação á proposta do Sr. Macario de Castro, que exige saber a lei que obriga os viajantes a pagar seis centos réis na entrada da barra de Lisboa. Foi remettido á secretaria.

5.° Acompanhando varios papeis relativos á divisão do territorio, recebidos n'aquella repartição. Foi á Commissão d'estatistica.

Um officio do Ministerio da fazenda, accusando a recepção d'outro expedido pela secretaria deste Congresso, em virtude da indicação do Sr. Deputado Pereira Brandão, a respeito dos ordenados e pensõs concedidas a diversas classes; partecipa que se expediram as ordens necessarias para se poder convenientemente satisfazer ao que se exige na dita indicação. O Congresso ficou inteirado.

Uma representação dos povos do logar do Crucifixo, que fazem parte da freguesia de Santa Margarida da constata do concelho da villa de Abrantes, sobre divisão administrativa. Foi á Commissão d'estatistica.

Uma representação da Camara municipal de Abrantes, a pedir que o decreto de 5 de Setembro de 1835 seja derogado, ou se permitta que n'aquelle concelho fique elle tem effeito; podendo a Camara, por via de arrematação exclusiva poder fornecer as carnes frescas. Foi á Commissão de administração publica.

Uma carta do Sr. José Maria O'Neill, como director da companhia da navegação do Téjo e Sado, por barcos movidos a vapor, acompanhando oitenta e cinco memorias, para serem distribuidas pelos Srs. Deputados. Mandaram-se distribuir.

O Sr. Presidente deu para ordem do dia da seguinte sessão: 1.º pareceres de commissões, que estão sobre a mesa: 2.° discussão da substituição do Sr. Garrett ao projecto n.° 11: 3.º discussão do parecer da Commissão de legislação n.° 12; e levantou a sessão sendo onze horas e tres quartos; dividindo-se o Congresso em commissões.

SESSÃO DE 21 DE MARÇO.

(Presidencia do Sr. Dias d'oliveira.)

ABRIU-SE a sessão pelas onze horas da manhã, estando presentes noventa e nove Srs. Deputados.
Leu-se, e approvou-se a acta da sessão antecedente.
Mencionou-se a seguinte correspondencia.

1.° Um officio do Ministerio do reino, acompanhando outro do administrador geral interino da Guarda, com a acta original da Assembléa d'Aguiar da Beira, o livro do recenseamento da mesma Assembléa, e uma certidão da referida acta para satisfazer á requisição da Commissão de poderes. Foi remettida a esta Commissão.

2.º Um officio do Ministerio da fazenda, acompanhando a informação da Commissão, encarregada de liquidar as dividas activas, e passivas do estado, na província central dos Açores, a respeito dos emprestimos contrahidos na ilha Terceira no anno de 1831, e participando que ficam expedidas novas ordens adita Commissão, para declarar o estado actual da amortisação dos mesmos emprestimos, a fim de satisfazer-se plenamente á indicação do Sr. Deputado Cezar da Vasconcellos. Foi remettido á secretaria.

3.° Uma representação da Camara municipal d'Arouca, sobre a reforma judiciaria. Foi remettida á Commissão da legislação.

4.° Uma representação da Camara municipal da villa de Campo Maior, sobre divisão judiciaria. Foi remettida á Commissão d'estatistica.

5.º Uma carta do excellentissimo visconde de Villarinho de S. Romão, acompanhando certos impressos ácerca do papel sellado, para serem distribuidos pelos Srs. Deputados.
Mandaram-se distribuir.

Teve segunda leitura o seguinte requerimento.
Requeiro que a Camara municipal d'Abrantes, seja authorisada a pagar provisoriamente; ou mesmo a titulo da emprestimo, às amas dos expostos, que se acham nas freguezias d'aquelle concelho, que delle foram desannexadas, até que se decidam á final as representações dirigidas a este Soberano Congresso, por aquella Camara municipal, e freguezias, sobre a divisão de territorio a ellas respectivas.

Sala das Cortes, em 28 de Março de 1837. = O Deputado por Thomar, Bernardo Gorjão Henriques.

O Sr. Leonel: - A materia do requerimento é muito grave, e a sollicitude do Sr. Deputado, que o apresentou, é muito justa ; mas para nós entrarmos agora n'essa matéria pelos meios legislativos, ordinarios, onde nos levaria Isso? Eu estou mesmo persuadido que isso estará nas attribuições do Governo. Por consequencia pediria eu, que esse requerimento tosse mandado ao Governo, recommendando-lhe que pelos meios ordinarios fizesse a diligencia para remediar essa mal.

O Sr. Silva Pereira: - O requerimento é justo, e necessario; mas é tambem justo, e necessario, que uma igual medida se adopte para todas as camaras de Portugal. Eu penso, que no mez de Março ou Abril acaba a medida votada para as mesmas imporem nos seus districtos os tributos, que julgarem necessários; por tanto é preciso darmos alguma providencia a esse respeito, se é que as do codigo administrativo não estão em execução em toda a parte.

O Sr. Presidente: - Aqui não se pede uma providencia para habilitar as Camaras a pagar às amas dos expostos; pede-se uma authorisação, para que uma Camara continue a pagar as de certas terras, que eram do seu concelho, e estão desannexadas delle; mas sobre cuja desannexação pendem representações. - Eu tomo a ler o requerimento (leu).

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O Sr Leonel: - Eu julguei necessario, pedir a palavra sobre a ordem, mesmo para accrescentar alguma cousa ao que V. Exca. disse. Isso e um remedio que talvez se possa fazer extensivo a algumas outras Camaras do reino, mas não a todas: - não se pede remedio para um mal ordinario, nem para um mal, que abranja todos os concelhos de Portugal. Ora o que me parece natural para remediar esse mal e dizer o Governo á Camara de Abrantes - paga tu provisoriamente, e se depois se decidir que esse concelho, para que pagas, se não pertence, aquelle que te pertencer será obrigado a pagar-te a ti.

O Sr. Rebello de Carvalho: - Eu pedi a palavra, para explicar o que disse o Sr. Silva Pereira, dizendo que a authorisação concedida às Camaras acabou no dia 4 de Fevereiro, mas a falta da continuação daquella lei está providenciada no codigo administrativo, que dá às Camaras a authorisação para lançarem contribuições directas, indirectas ou mixtas, segundo o entenderam mais conveniente.

O Sr. Gorjão Henriques: - Os Srs. Deputados, que me procederam emittiram as mesmas idéas, que, eu poderia, emittir. O requerimento é justamente nos termos que indicou o Sr. Leonel, e a objecção sobre os meios de depois se prover á sustentação dos expostos estão designados, como disse o Sr. Rebello de Carvalho. Ora neste requerimento ha uma circumstancia particular, não podendo affirmar de que os rendimentos da Camara de Abrantes, ou esses impostos, que a Camara de Abrantes estabeleceu para as suas despezas municipaes, fôssem recebidos em Fevereiro, ou Março, o cazo é que ella quer pagar. Accresce de mais a mais, que a divida não está em dia, e aquelles a quem se deve vem a receber do mez de Novembro, ou Dezembro, ou não sei que mezes ao certo. Ora com similhante atraso parece-me que e justo não se retardar uma providencia. Com effeito a authorisação dada às Camaras em Fevereiro de 1836 finda diversamente em differentes concelhos. Mas ou o novo codigo administrativo subsiste, ou não, se subsiste está tudo remediado, senão, é de facil intuição que se ha de fazer uma lei, que tal providencia sobre as despezas a cargo das municipalidades, porque não havemos estar sem ella certamente.

O Sr. Barjona: - Parece-me que o melhor seria que isto fôsse á Commissão de administração publica para dar o seu parecer com urgencia, porque 2 ou 3 dias de demora, não farão grande mal, e se decidirá o negocio melhor.

O Sr. M. A. de Vasconcellos: - Eu pedi a palavra sobre a ordem para me oppôr a que o requerimento fôsse remettido ao Governo, parece-me que deveria ir á Commissão respectiva, porque nós temos um decreto, que estabelece uma nova divisão de territorio. Se esse decreto ha de subsistir não julgo, que possamos fazer mais alguma cousa relativamente á porção de territorio em questão: pois que há, se fará um inventario, e se repartirá pro rata o direito de receber, e obrigação de pagar. Mas sendo questionavel a divisão do territorio não temos senão resolver primeiro essa questão.

O Sr. José Estevão: - Creio que se não discute o principio da necessidade de alimentar os expostos, porque essa discussão seria até escandalosa. Agora a respeito do requerimento creio que o que se questiona, á o caminho que elle deve seguir, e sobre isto direi, que não dependendo a sua materia de medidas legislativas, não póde tomar outro caminho, que não seja o de ir ao Governo. Nós não temos motivo algum para demorar qualquer negocio que aqui se se apresenta, senão para o levar pelos tramites regulares, e os tramites regulares neste caso pedem, que o requerimento vá ao Governo. Ha um decreto, não sei de que data, em virtude de qual se diz, que o alimentar os expostos e um negocio de interesse departamental, de districto, por tanto os expostos devem ser alimentados por todas as Camaras dos districtos. Agora o negocio de que se trata, é um abono, é uma passagem de fundos de uma Camara para outra: mas se o total das despezas ha de sahir dos fundos reunidos de todas as municipalidades, depois faz-se um ajuste de contas, e quem deu de mais, paga menos para a outra vez insisto pois que é ao Governo que se deve encommendar a decisão deste negocio, porque o Governo segundo as attribuições, que lhe conferem as leis administrativas em vigor, póde definir, e ha de faze-lo.

O Sr. José Caetano de Campos: - Eu pedi a palavra sobre a ordem para dar explicações ao Congresso pouco mais ou menos no sentido em que fallou o Sr. José Estevão. Isto está providenciado na lei de 19 de Setembro de 1836, que determina que as despezas das rodas, e creação dos expostos, seja feita por districtos administrativos. A difficuldade está em saber se, se os decretos du Dictadura são, ou não são leis; porque se o são, tudo está providenciado, e então se ha alguma cousa a fazer é remetter o requerimento ao Governo.

O Sr. Costa Cabral: - A discussão tem-me convencido de que a opinião mais segura é mandar o requerimento á Commissão, para dar o seu parecer, porque a respeito das leis da Dictadura não é possivel termos todos um exacto conhecimento, e então indo á Commissão ella examinará as leis da Dictadura relativamente a este negocio, e nesse intervallo os Srs. Deputados tem tempo de as examinarem tambem, e poder-se-ha tomar uma resolução mais segura.

O Sr. Barjona: - Eu já depois emitti a minha opinião conforme com a do Sr. Costa Cabral. Vá o requerimento á Commissão, até porque me está parecendo, que muitos dos membros deste Congresso não tem comprehendido bem, qual é o verdadeiro objecto do mesmo requerimento.

O Sr. Presidente: - Acabou do dizer um Sr. Deputado que o requerimento não tinha sido bem entendido; realmente a questão tem ido fóra do ponto que se devia tractar. A Camara da Abrantes deseja uma authorisação para dispôr de certas quantias um pagamento às amas dos expostos de certas freguezias, que hoje estão desannexadas do seu Concelho. É o que se acha no requerimento que eu torno a ler, para que se fixe bem a idéa que elle comprehende (Leu-o).

O Sr. Costa Cabral: - Quando alguns, Deputados disseram, que este negocio fosse mandado a Commissão de administração publica, para dar sobre elle o seu parecer com urgencia, entendemos que era um requerimento do Sr. Deputado, e não uma representação da Camara de Abrantes, que podia ser tomada em consideração. Nós não sabemos se a Camara fará opposição ao que se pede neste requerimento, e para o decidir é necessario fixar bem a idéa, se é proprio do Sr. Deputado, ou se é promovido por essa municipalidade.

O Sr. Barjona: - Ainda nessa hypothese, é melhor que o requerimento vá á Commissão d'admimstração publica. Sr Presidente, a experiencia tem mostrado constantemente, depois que eu tómo assento nesta Casa, que se economisa muito tempo em mandar os papeis às Commissões; ainda os requerimentos á primeira vista, mui simples, desejo eu que vão ás Commissões, mesmo por brevidade; quatro ou cinco dias, que ahi póde durar o seu exame, em rarissimas casos póde causar transtorno. - Peço por tanto a V. Exa. que, não obstante o que se tem dito sobre o requerimento, queira propôr ao Congresso se elle há de ser remettido á Commissão d'administração publica.

O Sr. M. A. de Vasconcellos: - Quando ouvi Ter o requerimento pela primeira vez, logo entendi o que se pretendia: pela leitura feita por V. Exca. vejo que me não tinha enganado. Pede-se uma authorisação para fazer certa despeza até que se decidam reclamações, que há sobre a divisão do territorio. Parece-me a mim que o meio mais prompto de resolver esta questão, é decidir de prompto as reclamações sobre a divisão de territorio, porque assim ficará deferido o requerimento. Se esse territorio ficar pertencende

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ao Concelho de Abrantes, continua elle a fazer essa despeza, senão, ficará a cargo do outro a quem elle haja de pertencer. Se se mandar o requerimento ao Governo, está claro que ahi se ha de proceder segundo o Decreto da divisão do territorio, que não está ainda, alterado, e por tanto nada se remediará por consequencia entendo que o requerimento, com as respectivas reclamações sobre divisão de territorio, deve tudo ser mandado á Commissão respectiva, por ser a unica maneira de sahir deste negocio promptamente.

O Sr. Presidente: - É verdade que o Sr. Deputado tinha entendido perfeitamente o requerimento, porque faltou exactamente em relação aos termos em que elle se achava concebido, mas quando eu disse que esse requerimento não tinha sido bem entendido, disse tambem uma verdade, porque depois se tem tractado delle diversamente.

O Sr. Garjão Henriques: - Não posso comprehender como seja coherente dizer-se que o Congresso esta inteiramente persuadido da justiça do requerimento e dos seus fins, e ao mesmo tempo dizer-se qoe é preciso seguir certos tramites, que não dão os mais promptos. Tracta-se de dar uma providenciar a favor dos desgraçados expostos, cujas amas, vendo pagar a outras, e que se lhes não paga a ellas, os abandonarão logo mas esta providencia deve ser immediata. Penso que esta nas attribuições do Governo tomar a medida que se pede no requerimento, e parece-me que o caminho mais breve para a effectuar é essa remessa, porque se o Governo entender que lhe falta authorisação legislativa, elle a exigirá: (apoiado) e se isto fôr a Commissão levará muito mais tempo. A Commissão entulhada de trabalhos, não poderá ainda dar o seu parecer, e entretanto morrem trinta ou quarenta daquelles innocentes. O requerimento foi perfeitamente entendido por V. Exca.; é uma authorisação que se pede para pagar certa quantia de dinheiro que se deve, mas que (a não haver essa authorisação) alguem póde depois dizer que se não devia, é em que consiste o requerimento, e nas faculdades do Governo está detento, ou por si em pedindo providencia legislativa, mas se se manda á Commissão haverá uma demora que, por mais pequena que seja, será muito inconveniente, porque este negocio carece de ser decidido com brevidade. (Apoiado.)

O Sr. Silva Sanches: - Apoio o requerimento, e o julgo tão simples, que até me admira tenha sido tão disentido. - Ou está ou não está em vigor o decreto citado de 19 de Setembro de 1836, pelo qual se ordena, que as despesas dos expostos sejam pagas por todas as Camaras dos respectivos districtos. Se está em vigôr, não ha duvida nenhuma, que nem precisa é determinação, porque a Camara de Abrantes tinha uma restricta obrigação de alimentar os expostos do seu municipio. E se não está era vigor, ou havemos de deixar morrer os expostos á necessidade, ou convêm que o requerimento seja decidido já. As Camaras, que devem constituir-se em consequencia da nova divisão do territorio, e às quaes devem pertencer essas freguezias desannexadas de Abrantes, não podem agora ter meios para: sustentar os expostos, que lhe pertencem. Talvez que nem ainda estejam constituidas, e se o não estão, está claro que nem te quer podem ter entrado- na administração dos conselhos, mas ainda que se tenham constituido, certamente não podem ter tido tempo para cobrar os meios necessarios para fazer face às suas despezas. Então, ou as amas hão de alimentar os expostos sem nada receberem, e arriscam-se estes a morrer de fome, ou a Camara de Abrantes ha de fornecer estes alimentos. Nesta collisão, qual das cousas será mais justa que se authorise a Camara de Abrantes para continuar essa despeza, ou que se deixem perecer os expostas? As amas andam atrasadas em pagamento, segundo informa a Sr. Deputado, author do requerimento, e eu a acredito, porque tendo vinda ha alguns mezes da provincia, sei dos arrasamentos desta especie; que por lá vão. Ora póde acontecer que algumas Camaras tenham recebido do municipio os meios necessarios para satisfazer esta despeza atrasada, e que o não tenham feito. Se assim fôr, são essas Camaras, o não as novas, que tem obrigação de pagar às amas. Ainda porém que assim não seja, em quanto as novas Camaras não tiverem fundos, poderão as antigas fazer estas despezas por um emprestimo. (Apoiado.) Todas às rasões são pois para que o requerimento vá ao Governo, a fim d'elle providenciar, e nenhuma para que vá á Commissão, porque se não pede medida legislatura. Voto por conseguinte pelo reuerimento.

O Sr. Ferreira de Castro: - O objecto deste requerimento deve excitar a sympathia deste Congresso, elle excita a minha tanto, que desejava poder occorrer á subsistencia dos expostos neste momento mesmo, mas por quanto se tenha dito ainda não estou convencido que se possa dar outra direcção ao requerimento, que não seja manda-lo a uma Commissão, para nos apresentar umas medida legislativa ácerca deste negocio. - Ha uma lei que regulou os concelhos do Reino, segundo ella ao antigo dê Abrantes foram tiradas certas freguesias, que actualmente pertencem a outro; por consequencia a estes, e não áquelles pertence pagar às amas de seus expostos; de outro modo seria alterar essa divisão feita, que se acha estabelecida por uma lei. Mas se o concelho de Abrantes tem meios com que lhe pague, convenho, porém isto poderia trazer não sei que opinião a este Congresso; porque seria muito irregular, e até anomalo em administração, que tres ou quatro freguezias pertencessem a um concelho para o que diz respeito a expostos, e no resto pertencem a outro! A lei que se apontou não está em execução, e nós hoje mesmo temos a discutir o parecer de uma Commissão, que diz respeito ao modo de rever essas, e outras disposições da dictadura, mas quem sabe a sorte que ella terá? Entendo portanto que o requerimento vá á Commissão, para que ella proponha uma medida legislativa, se tanto parecer necessario para ocorrer aos inconvenientes ponderados, e concluirei dizendo ainda, que tenho muita pena de que não possamos remediar os males destes desgraçados neste mesmo momento, e com a generalidade que elle merece.

O Sr. José Estevão: - Os expostos d'algumas freguezias junto ao conselho de Abrantes, não tem com que se alimentar; mas a Camara deste mesmo conselho faz-lhe um adiantamento de fundos para esse fim, e os expostos de todo o paiz estão nas mesmas circunstancias de penuria, e miseria. Quando se trata do alimento especial para aquelles, que não demanda factura da lei, devemos nós demorar-nos em tomar uma medida legislativa para todos? Qual seria o resultado deste nosso procedimento? Deixar morrer uns poucos a fome, porque desde já se podem sustentar para lhes dar de comer, só quando se der a todos. Isto é o que resulta, é o que encerra em si o ir o requerimento a uma Commissão.

É preciso que comprehendamos está questão no seu verdadeiro ponto de vista. Os expostos são, ou devem ser, sustentados á custa dos districtos a que pertencem, todas as Camaras de cada um desses diitrictos hão de concorrer para isso em proporção das suas rendas, mas se uma concorrer mais do que outra no rateio geral das despezas dos expostos levar-se-ha em conta á Camara, que pagou demais o excesso, que lhe não pertencia pagar, e tudo se remediará. A caso o Governo não poderá mandar passar dinheiro de umas porá outras recebedorias, do banco em que tenha fundos para o thesouro etc. etc. Pode sem duvida, e o mesmo direito tem as Camaras sobre a sua fazenda, e o Governo até na fazenda dellas dentro dos limites das leis administrativas. Neste requerimento não se trata mais que duma missão de fundos. Mas então, diz-se, não precisada o negocio vir aqui, assim é, mas já agora; como cá veio sempre

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queremos entreter-nos com elle. Parece que não temos que fazer. O Governo, diz-se, não póde tratar deste nogocio sem saber se a Camara d'Abrantes dá, ou não o seu concentimento. Então digo eu, que tambem se não póde tratar n'uma Commissão: se o saber o consentimento da Camara de Abrantes é um elemento necessario para decidir este caso, tanto o será para a decisão do Governo, como para a da Commissão. Diz-se tambem, que as medidas sobro expostos estão dependentes do destino da legislação da ultima dictadura; mas por ventura o destino dessa legislação, qualquer que elle seja, impede a intervenção do Governo sobre este negocio, intervenção filha das leis que já estão em execução, e que se não mandaram suspender? O estado em que se acha o negocio da revisão, é tal, que não poderemos tratar de rever as leis sobre expostos senão depois de ter tratado o parecer da Commissão de legislação, que indica o modo de fazer a revisão em geral. Esse parecer promette ser longamente discutido; ainda depois dessa discussão se ha de passar á revisão da lei; depois ha de apparecer o projecto da respectiva Commissão; depois leituras; intervallos, preferencias, de outras materias, e discussão: quando estará feita uma nova lei sobre expostos? E quer-se prohibir que os de Abrantes, que podem já ser alimentados, esperem pela medida geral. Concluo por consequencia que se mande o requerimento ao Governo, porque o negocio é simplicissimo; tome-se depois o objecto geral na consideração que merecer; mas mande-se este requerimento, ainda que não seja por outro principio, senão por não estar nas nossas attribuições. Ainda digo mais; este caso nem é da attribuição do Governo, é mesmo da attribuição da municipalidade; porque se qualquer Camara emprestar os seus fundos a outra para despezas communs a todas, duvido que haja alguem que a possa increpar disso; em fim, mande se o requerimento ao Governo, ou porque está nas attribuições delle, não está nas nossas.

(Votos, votos.)

O Sr. Rebello de Carvalho: - Eu tinha pedido a palavra

(Votos, votos.)

O Sr. Barjona: - Duas palavras....

(Interrupção.)

(Votos, votos.)

O Sr. Barjona: - Se a questão continua por muito tempo, embrulha-se mais... (Rumor.) Eu entendo, que de se demorar este negocio dous dias na Commissão, nenhum mal póde resultar á creação dos expostos: entretanto como vejo que a questão se confunde mais á medida que a discussão se prolonga, receio que desta prolongação resulte não só perda de tempo, mas até uma peior decisão. Em consequencia o mais necessario é acabar com isto immediatamente: peço pois a V. Exca. queira propôr se a materia está discutida. O Congresso decidiu conforme a proposta do Sr. Barjona.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Gorjão para uma explicação.

O Sr. Gorjão Henriques: - Versa unicamente sobre um facto. Alguns Senhores Deputados entenderam, que este requerimento era particularmente meu, não é assim: eu não fiz mais que redigilo. Vendo que a Camara de Abrantes estava prompta a pagar a despeza desses expostos, apresentei este requerimento para levar a effeito os seus desejos. - Em similhantes materias não tenho opinião minha, essa é a dos meus constituintes: fiquemos pois de accôrdo que o requerimento pertence á Camara de Abrarues, que me encarregou da sua redacção; e que eu nunca farei requerimentos desta natureza senão quando fôr conveniente authorisado para isso.

Posto á votação o Congresso decidio que o requerimento apresentado pelo Sr. Gorjão, fosse remettido ao Governo para o tomar na devida consideração.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Vasconcellos para ler um projecto de lei muito urgente.

O Sr. M. A. de Vasconcellos: - Sr. Presidente, quando n'uma das sessões passadas se tractou aqui de um projecto de lei relativamente á Madeira sobre pautas da alfandega, eu não estava ainda ao facto do que se tinha passado nas ilhas dos Açores relativamente a este objecto; mas depois disso tenho tido esse conhecimento, e soube que não tinha havido noticia nas ilhas dos Açôres da existencia das pautas até a 8 de Março; e por consequencia aquella determinação vai apanhar de surpreza o commercio daquellas ilhas, e em resultado disso vai fazer um mal muitissimo grande ás suas transacções commerciaes. Para obviar a este mal tenho a honra de propor o seguinte projecto de lei (leu). Requeiro
a urgencia desta materia; e se elle fôr admittido á discussão pedirei a palavra para o sustentar.

O Sr. Presidente propoz a urgecia deste projecto, a qual o Congresso approvou. - Como está julgado urgente passa desde já á Commissão do ultramar, para dar com a maior brevidade o seu parecer.

O Sr. M. A. de Vasconcellos: - Eu requeri que esse projecto se declarasse como urgente.

O Sr. Presidente: - E' exactamente o que se fez: porque senão fosse declarado urgente, só d'aqui a oito dias é que havia de ter segunda leitura: agora passa immediatamente á Commissão.

O Sr. Manoel Antonio de Vasconcellos: - A Constituição no art. 107 diz (leu), portanto requeiro, que este objecto seja hoje mesmo discutido; o Congresso póde decidir que não; mas eu tenho direito a requerer isso; porque este art. da Constituição assim o permitte. A razão porque eu peço esta urgencia, é por estar a sair um navio para os Açores; e se não fôr contra ordem a tempo, o commercio cahe na surpreza, e soffre um mal terrivel.

O Sr. Silva Sanches: - O Sr. Deputado, quando pertende que hoje mesmo se discuta este objecto, funda-se no art. 107 da Constituição; mas todas as leis se devem entender pela sua possivel execução. Quando a sua execução na prática se demonstra impossivel, ou muito prejudicial, parece que então se deve sujeitar ás regras da boa razão: ora o projecto que acaba de ser apresentado, por nenhum dos Srs. Deputados, excepto os poucos que o assignaram; e mais algum a quem o Sr. Deputado o mostrasse; póde ter sido visto e examinado; e sem ao menos a maioria do Congresso o ter visto e examinado, como póde votar pela sua utilidade e necessidade? Então conviria que elle passasse a uma Commissão; que esta Commissão o ponderasse, e que depois dessa Comunhão o ter visto, e apresentado aqui como vantajoso, se discutisse então; porque já então se dava a seu favor o ponderoso voto de uma Commissão de 7 membros. Foi isto mesmo o que se seguio a respeito de um outro projecto, apresentado pelo Sr. Lourenço José Moniz, relativamente á Madeira. Porque pois, acabando nós ha muito pouco tempo de declarar um projecto urgente, e de o remettermos apezar disso a uma Commissão, e discutindo-o só depois dessa Commissão nos apresentar o seu parecer; porque pois, digo, não havemos de fazer o mesmo a respeito deste? (apoiado.) Por tanto, além da incongruencia, não seria muito conveniente, que um projecto passasse
sem ir a uma Commissão, e não seria mesmo muito proprio de dignidade do Congresso passar uma lei, ou um projecto de lei apenas o ouvisse ler. Eu votaria por um art. que ahi vem, e o aprovaria já sem difficuldade; mas ha alguns outros, que eu não sei ainda se aprovarei; nem se poderei aprovar; e aquilo que a mim me acontece, póde acontecer a muitos outros Srs. Faça-se aquillo mesmo, que se fez com o projecto do Sr. L. J. Moniz: amanhã ou hoje mesmo, a Commissão nos apresentará o seu parecer; discute-se segunda feira, e consegue-se o mesmo fim, que deseja o Sr. Deputado, isto é, que o projecto vá pelo navio que está a sair. Concluo por tanto, que vá a uma Commissão.

O Sr. Manoel Antonio de Vasconcellos: - Eu, Sr. Pre-

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sidente, nem me opponho que o projecto vá á Commissão, nem requeri que elle lá não fôsse: requeri unicamente que se consultasse o Congresso sobre se elle podia entrar hoje mesmo em discussão: argumenta-se que muitos Srs. Deputados não estavão prevenidos sobre esta matéria. Não havia melhor meio de o declararem, do que na votação; votarem que não entrasse hoje em discussão, e então estava acabada toda a questão.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado estava no seu direito quando fez o seu requerimento; para que o Congresso resolvesse se hoje mesmo podia entrar em discussão.

O Sr. Silva Sanches: - E eu no meu direito de lhe responder.

O Sr. Presidente:- Sem dúvida nenhuma: agora o que é verdade tambem, é que a ordem que se costuma seguir nestes objectos declarados urgentes, é remette-los a uma Commissão; e esta ordem não é arbitraria, porque assim o dispõe o Regimento, que nesta parte não está em opposição á Constituição: tem a palavra ainda alguns Srs.; quem agora se segue é o Sr. Franzini.

O Sr. Franzini: - O desejo de poupar o tempp a este Congresso faz com que eu ceda da palavra; e porque o Sr. Deputado Julio Sanches disso tudo, que eu teria a dizer.

O Sr. Costa Cabral: - Ainda que eu tenha muita cousa a dizer sobre esta materia, com tudo nada direi por agora, e limitar-me-hei somente a fazer um requerimento: associação commercial de Ponta Delgada, por via de seu presidente, dirigiu sobre este objecto uma representação ao Governo: o parece-me que ella deverá servir de grande proveito á Commissão; por consequencia parece-me que deverá ser pedida ao Governo, a fim de ser submettida á attenção da Commissão (apoiado, apoiado); se fôr necessario eu faço este meu requerimento por escripto.

O Sr. Presidente: - Seria melhor mandar por escripto; como é cousa que tem de se pedir ao Governo.

O Sr. Costa Cabral: - Como as Commissões estão authorisadas a exigir do Governo aquillo, que julgarem conveniente; eu peço á Commissão que queira exigir delle esta representação, porque decerto que lhe será muito proveitosa.

O Sr. Presidente propoz se o projecto havia de entrar hoje em discussão, e o Congresso votou que não.

Vai á Commissão do ultramar, para ella dar o seu parecer com urgencia.

O Sr. Barãa do Casal: - Sr. Presidenta, como Deputado da nação portugueza, tenho uma restricta obrigação de advogar a causa de todos os portuguezes, e este dever me porá a cuberto sem duvida de que se possa dizer, que eu sou parcial em tratar duma classe, que corresponde á minha profissão, esta é a dos reformados; seguramente uma das mais infelizes da sociedade portugueza: estes veteranos, e honrados militares, depois que dão á patria tudo quanto lhes podem dar; depois de terem esgotado as suas forças fysicas no serviço da patria, recebem uma refórma como recompensa de todos os seus trabalhos, e serviços; mas Sr. Presidente, é esta recompensa tal, que ninguem a deseja, e todos maldizem o dia em que lhe cabe esta recompensa; porque deixam de ter aquella subsistencia mesquinha, que tinham em quanto serviam activamente, ficando sem meios de subsistencia, logo que pastam a reformados; por isso que o pagamento desta classe anda muitissimo atrazado, e hoje mesmo se lhe devem treze mezes ora esta miseria em que vivem os reformados, obriga-os a irem rebater os seus soldos, muitas vezes por metade, e outras vezes por menos da terça parte, augmentando asam a miseria a estes infelizes, ao passo que esses rebatedores se enriquecem á custa da desgraça daquelles individuos; digo se enriquecem os rebatedores, porque elles effectivamente recebem, por inteiro, do Governo aquelles ordenados, que compram a troco de nada; então desejando eu melhorar a sorte futura destes beneméritos veteranos; peço licença a V. Exca. para lêr um projecto de lei: eu não tenho a louca, vaidade de me persuadir, que elle esteja livre de defeitos, ha de ter muitos; no entanto elle ha de ir às mãos da Commissão de guerra; e alli ha talentos e luzes, que possam remediar os defeitos, com que elle sáe da minha mão. Leu o seguinte

PROJECTO DE LEI.

Art. 1. Todos os officiaes reformados serão inscriptos nos corpos, em que serviam quando receberam as suas reformas; ou em outros, que para esse fim escolherem.

Art. 2. Haverá em cada regimento; ou batalhão um livro, aonde serão lançados seus nomes, e por estes, e debaixo da assignatura dos respectivos commandantes, receberão em dia os seus vencimentos, como se estivessem em activo serviço; para cujo fim o Governo passará as ordens competentes.

Art. 3. No caso que algum regimento, ou batalhão mude de local, ou marche para campanha, os respectivos commandantes passarão guias aos officiaes, que as pedirem, com as quaes poderão receber os seus vencimentos pelas pagadorias mais proximas às suas residencias.

Art. 4. Proverá como julgar mais conveniente, attentas as circumstancias do thesouro, ao pagamento em divida a esta classe.

Art. 5. Ficam revogadas todas as disposições em contrario. Sala das Cortes, 28 de Março de 1837. = Barão do Casal.
O Sr. Moniz leu o seguinte.

PROJECTO DE LEI.

Art. 1. Fica livre a todos apanhar, e recolher urzella nas ilhas da Madeira, Porto Santo, e desertas, não offendendo o direito de propriedade dos danos dos terrenos, aonde ella for produzida.

Art. 2. Fica livre d'ora em diante a exportação da urzella das mesmas ilhas, pagando na alfandega da cidade do Funchal o direito de saída de cincoenta réis por arratel.

Art. 3. Fica revogada a legislação em contrario. Sala das Côrtes, 31 de Março de 1837. = Lourenço José Moniz; João d'Oliveira.

O Sr. Moniz: - Muito poderia eu dizer sobre esta materia; porém por ora limitar-me-hei simplesmente a asseverar ao Congresso que este negocio de urzeila actualmente não rende cousa alguma ao estado; e por esta maneira póde render uma somma assaz interessante.

O Sr. Presidente: - O Sr. Ministro do reino tem a palavra para fazer uma communicação ao Congresso.... (propondo silencio).

O Sr. Ministro do Reino: - Sua Magestade manda participar ao Congresso, que receberá a deputação que ha de levar a mensagem do discurso da côroa, no dia 6 ao meio dia no palacio das necessidades.

Agora se V. Exca. me permite que eu leia umas propostas do Governo, fa-lo-hei.

O Sr. Presidente: - Segando a prática adoptada neste Congresso, quando um Sr. Ministro pede a palavra por parte do Governo para propostas, tem logo a palavra (Apoiado apoiado).

O Sr. Ministro do Reino: - (Leu um projecto sobre remissão de foraes.) Agora este outro tende d'alguma maneira indirecta a regular o serviço da fazenda: uma das grandes calamidades de Portugal, é os empregados pão terem uma tal subsistencia, quando elles se impossibilitem no serviço o Governo da dictadura já providenciou isso dalguma maneira a respeito da instrucção publica; agora é preciso providenciar d« mesma maneira a respeito dos empregados de fazenda, para, que estes empregados tenham a certeza, de que no fim da sua vida, tendo servido bem, não hão

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de ficar reduzidos á mendicidade; e pôr isso proponho o seguinte projecto de lei (leu).

O Sr. Almeida garrett: - Eu queria fazer uma pergunta ao Sr. Ministro da fazenda; se é nessa qualidade que elle apresenta esses projectos

O Sr. Presidente: - É melhor primeiro darmos seguimento aos projectos, e depois então concederei a palavra ao Sr. Deputado.

As propostas apresentadas pelo Governo devem ir ás competentes Commissões para as converter em projectos de lei; uma dellas tende á organisação verdadeiramente no pessoal da fazenda; esse creio que não tem duvida nenhuma que deve ir á Commissão do fazenda (apoiado); quanto á outra diz respeito á remissão de fóros; talvez que a mesma Commissão deva sobre ella dar o seu parecer; ou então a Commissão de legislação.

O Sr. Fransini: - Parecia-me mais natural, que fôsse á Commissão de legislação; porque isso trata de foraes...

O Sr. Ministro do Reino: - Parecia-me que devia ir á Commissão de legislação, e depois sobre orneio de effectuar o pagamento, devia passar á Commissão de fazenda.

O Sr. Leonel: - A Commissão de fazenda tambem deve ser ouvida sobre esse objecto; porém a de legislação é que deve, creio eu, tratar primeiro d'elle: agora por esta occasião seja-me permettido dizer, que eu sobre essa materia de remissão de foros apresentei um projecto aqui, que foi tão gabado, e que se disse tanto bem delle, mas a final sumiu-se; tinha todavia copia desse projecto, e trouxe-o em trinta e seis; mas cometti então o erro de não deixar em meu poder outra cópia; o certo é que em trinta e seis tambem se sumiu; tenho-o procurado na secretaria, e por toda a parte, porém não apparece; mas se este negocio for á Commissão de legislação, eu como membro dessa Commissão lá direi o que me parecer; e se não for á Commissão de legislação, peço desde já á Commissão de fazenda que tenha a bondade de me ouvir.

O Sr. Sá Nogueira: - Eu tinha pedido a palavra para dizer pouco mais ou menos o que disse o Sr. Leonel; nada tenho a accrescentar, senão que em consequencia de se terem incorporado nos proprios da nação os bens das ordens religiosas, da casa do infantado, e da casa da Rainha, por tanto parecem e que isto deve ir á Com missão de legislação, e ser ouvida a Commissão de fazenda; pois que este é um dos recursos mais importantes, que hoje tem a fazenda nacional, que talvez não produza menos de quatro mil contos de réis.

O Sr. José Estevão: - Ha uma Commissão, que eu não sei qual è, que está encarregada da lei da organisação para a guarda nacional; este objecto creio que todos reconhecem que é importante, mas além das razões geraes desta importancia, que de todos são sabidas, e preciso que eu lembre ao Congresso alguns particulares. As leis actuaes da guarda nacional, não tem uma execução rigorosa, nem mesmo as pessoas que lhe são subordinadas, lhe prestam uma obediência incontroversa; porque ha uma lei de 1836 que é branda, e suave, e outra da ultima dictatura, que em suavidades, se não assemelha nada á outra, e é natural que os subordinados gostem mais da de 1836, e muitas vezes se queiram encostar a ella, com desprezo da outra. Eu que digo isto, alguma razão tenho para o dizer, e parece-mo necessario, que uma lei da guarda nacional saia quanto antes deste Congresso, a vá com a força precisa para acarear uma obediência universal, e constante, e que leve emendados todos os erros que ha em ambas as leis, que agora existem. Além disto o Congresso approvou um requerimento, que era meu, em que se recommendava ao Governo, que tratasse de regularisar os corpos civicos por todos os modos, ao seu alcance. Ora eu hei de fazer uma intrepelação aos Ministros todos os sabbados a este respeito, e não queria que elles me respondessem, que tem feito tudo quanto podem, e que o defeito está nas leis. Por tanto, mesmo para acabar este jogo de torna culpas, era bom que a Commissão tratasse de apresentar quanto antes, o seu projecto para depois se discutir. Isto é o que eu peço.

O Sr. Leonel: - Não ha duvida, que é preciso regularisar as leis da guarda nacional; mas é preciso, que se saiba que não ha a este respeito senão portarias, e decretos das duas dictaduras, e que não ha leis do corpo legislativo. As Cortes conheceram a necessidade de tratar deste objecto; encarregaram a Commissão de administração deste trabalho; e foram chamados mais três membros da Commissão de legislação, e eu fui um delles; tenho muito desejo de tratar deste negocio, e até agora ainda não pude; os outros dois membros, muitas vezes metem pedido um dia para tratar delle, e eu tenho-lhe respondido, esta noite vou para esta Commissão, a outra vou para aquella, porque é preciso acabar um certo negocio muito importante; por tanto declaro que todos os membros tem instado comigo, para que eu vá trabalhar; mas eu não posso. Agora se algum facto ha, de que alguem se tem recusado a obedecer a essas disposições mais ásperas, tambem ha batalhões inteiros que as tem pedido; e, o que tambem sei é, que pedindo-se-me conselho sobre alguém que recusava obedecer, eu disse, mandem-o para a cadeia , e elle foi.

O Sr. Ministro dos Negocios do Reino: - Eu tenho alguma responsabilidade nessa lei da dictadura; ella produziu grande descontentamento; mas o resultado foi, que a guarda tem dado os maiores exemplos de obediencia: aquella lei foi feita em resultado da que me apresentaram os commandantes, e tive um trabalho immenso para assim o fazer; se os Srs. Deputados quizerem ir á secretaria do reino, poderão comparar o projecto que ali existe, e verão que o Governo não o alterou; o Governo não póde mobilisar aguarda, porque não tem meios para isso; em consequência eu renovo as minhas supplicas, como os Srs. Deputados, para que a Commissão apresente quanto antes um projecto a este respeito, o que é muito importante.

O Sr. Franzini: - Eu levanto-me para pedir ao Congresso, e á Commissão, para que se faça alguma cousa a este respeito; porque actualmente em Lisboa se estão fazendo grandes violencias: eu sei de um barbeiro com cincoenta e quatro annos, e cinco filhos, que o querem alistar; eu posso dizer alguma cousa, porque quando aqui se organisou a guarda nacional em Lisboa, eu fui um dos membros da Commissão; tive muito trabalho; o meu projecto era seguir-se o mesmo que se segue em França; alli ha guardas moveis, e sedentárias; mas querer fazer de todos os cidadãos soldados effectivos era serviço, é a cousa mais extraordinaria: eu insisti por aquella organisação, e fiz por isso que houvesse em cada batalhão uma companhia de caçadores, e outra de granadeiros, porque é facil achar gente para ambas as companhias; mas como é possivel em um districto uniformisar quatrocentos homens em caçadores; isto é o maior absurdo, e que tem causado um grande desgosto, que está crescendo de una dia para outro, e que depende unicamente do gosto do seu chefe. Por tanto julgo de necessidade que o Congresso haja de fazer uma lei, que não possa ser alterada para o futuro.

O Sr. Costa Cabral: - Parece-me, que não póde progredir a discussão; porque não ha nada que esteja em discussão ; fez-se uma pergunta, e deu-se a resposta , está tudo acabado; peço por tanto que se ponha ponto na discussão.

O Sr. Soares Caldeira: - E preciso que eu dê uma explicação, e V. Exca. não deixará de me dar a palavra.

O Sr. Garrett: - Eu sou o primeiro que desejo poupar o tempo, e que o não gastemos mal; mas agora não posso deixar de me oppôr á opinião do Sr. Costa Cabral, porque ha certas conversas, que tuna vez suscitadas é mister continua Ias. Bem ou mal trazida, esta questão veio aqui e esta questão é umas delias; e neste ponto protesto que não dese-

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jaria ver fechada a discussão sem imittir a minha opinião. Tudo quanto se observa na guarda nacional provém da pessima organisação.... Provém da pessima organisação, que desde o seu principio lhe foi dada, a pesar de terem sido remediados alguns de seus defeitos, não o foram outros, que são capitaes. Pezar-me-ha muito se a Commissão, que vai organisar esse novo projecto, não tiver em vista os unicos principios verdadeiros, fóra dos quaes não ha salvação. Eu quero descarregar a minha consciencia e dizer o que sei. A lei foi feita por homens leigos na materia, leigos digo em materia de serviço militar, do civil e administrativo; por que a guarda nacional participa destas duas cousas. O primeiro erro da guarda nacional é que todos os cidadãos de toda a classe e de toda a idade estão sujeitos ao mesmissimo serviço. Eu sou por certo de opinião que todos os cidadãos, seja qual for o seu encargo, ou posição na sociedade, devem pertencer á guarda nacional; mas não que todo o cidadão seja obrigado ao mesmo serviço. Deve haver duas classes pelo menos: na minha opinião devem ser tres. Escuso do serviço da guarda, a titulo de emprego, não deve ser ninguem, as escusas são impossiveis quando a obrigação é geral para todos, mas graduada para cada um. Se porém indistinctamente se requer que todos os homens façam um mesmo serviço, serviço por exemplo como dez; aquelle que só como o poderia prestar, não presta nenhum. Allega razões attendiveis, e a authoridade não póde deitar de as attender; e porque se exigiu, muito de mais e não se obteve o possivel. Cito a auctotidade do illustre administrador geral de Lisboa, que presente está, que diga-se isto não é assim. Mas quando se classificarem os cidadãos para os differentes serviços, isto é, quando se exigir de um como dez, - de outro como 20, de outro como tres, não ha dispensa a dar a ninguem. Estou convencido que não póde haver guarda nacional organisada regularmente, senão dividida em classes. O que levo dito é quanto ao alistamento e organisação geral; mas por esta occasião quero tambem apoiar a censura feita, pelo o Sr. Franzini á transformação de batalhões inteiros de infantaria para caçadores, arma em que se precisa certa agilidade e conformação especial. Concluo tornando a dizer os motivos porque prolonguei esta conversação. Ha pontos de tal susceptibilidade, importancia, e gravidade, que ou n'elles se não hade tocar, ou se ha de dizer tudo claro, explicito, e desenganado.

O Sr. C. Cabral: - Pergunto a V. Exa. qual é a questão, que occupa o Congresso, por que quero fallar sobre ella.

O Sr. Presidente: - Nenhuma.

O Sr. S. Caldeira: - Sr. Presidente, é preciso que eu responda no que se disse a respeito dos 4 batalhões de caçadores, não é exacto o que se disse, elles ao contrario levaram em muito gosto, e até o requereram ao Sr. Ministro do reino, que póde testemunhar isto mesmo; e facil será conhecer a exactidão com que fallo, considerando que aquelles cidadãos se não tivessem vontade de se organisarem á caçadora, a lei lhes faculta as suas passagens para outros batalhões; mas bem poucos se tem aproveitado desta concessão; creio que não ha prova mais convincente da boa vontade com que se prestão a esse primeiro ponto; quanto ao mais não digo nada, além de que se apresente a lei quanto antes; por que ella é a maio urgente possivel, como aqui por varias vezes tenho ponderado.

O Sr. Presidente: - Foi uma pergunta, que um Sr. Deputado fez a uma commissão; a commissão já respondeu, agora a questão deve ficar aqui.

O Sr. S. Pereira: - Sobre a ordem a com missão tem muito a peito tratar do objecto; porém as idéas do Sr. Garret foram tão luminosas, apesar de que com algumas eu não concórdo, que eu peço ao Congresso consinta que elle nos vê coadjuvar naquelles trabalhos.

O Sr. Presidente propoz o Sr. Garret para ser addicionado á commissão, e o Congresso apoiou.

O Sr. Barjona: - Sr. Presidente, inculpou-se a Commissão de administração publica por uma falta, e verdade é que já se respondeu; mas eu tambem quero dizer alguma cousa em resposta a essa arguição, que se lhe fez. A verdadeira com missão para aguarda nacional são os 3 Srs., que se reuniram á primitiva commissão, eu já perguntei a algum dos 3 Srs. pelos seus trabalhos, disseram-me, que a razão porque não estavão prontos é, por que o Sr. Leonel queria uma lei geral de reforma da guarda nacional, quando os outros queriam ir reformando parcialmente eu instei que apresentassem alguma cousa; mas não obstante nada tem aparecido: como se arguiu a Commissão devo dizer, que ella tem tido os desejos de os apromptar as providencias mais importantes, que à demora tem sido em consequencia da differença de opiniões dos 3 Srs.; é pois preciso que o Congresso resolva, se a reforma ha de ser geral, se parcial mandarei para a mesa o meu requerimento pura este fim.

O Sr. Presidente: - Sobre isto não póde haver discussão senão amanhã.

O Sr. Vasconcellos Pereira: - O outro dia alterou-se a ordem do dia das Côrtes para se tratar do estado das nossas provincias no continente eu desde terça feira de trevas tenho pedido a palavra para chamar a attencão dos Srs. Ministros sobre a anarchia que reina nas provincias do ultramar; ellas são tão provincias de Portugal como as do reino, por isso pedia a V. Exca. hoje, ou amanhã sem falta me desse a palavra.

O Sr. Presidente: - Isso não depende de mim, é do tempo que se gaste, mas o Sr. Deputado está no seu direito pedindo a alteração da ordem do dia para o objecto de interpelação aos ministros era Corôa; mas até agora não a pude dar, e não a tenho dado a mais ninguem para esse fim; o Sr. Leonel tem a palavra para um requerimento.

O Sr. Leonel: - Quando a Commissão de fazenda apresentou aqui um projecto sobre a formação da junta do credito publico, eu pedi que fossem mandados imprimir os decretos, ou portarias, que serviam de regulamento á actual commissão interina; as Côrtes assim o resolveram, houve porém uma fatalidade, e é; que ou não fui bem entendido, e que alguem se persuadio, que aquelle requerimento teve por fim embaraçar o negocio: não teve, Sr. Presidente, porque eu não quero embaraçar cousa alguma: em segundo logar, aquelle objecto quero eu, que se conclua com brevidade, pois que delle espero bem ao meu paiz. Sr. Presidente ha um artigo no projecto apresentado na Commissão, que diz (leu); quem é que sabe, Sr. Presidente, quaes são as attribuições da actual commissão? Eu, Sr. Presidente, para o saber, corri todas as collecções, que haviam impressas dos decretos da primeira dictadura: não achando nada a este respeito, mandei pedir ao Ministerio uma cópia do decreto que tinha abolido a junta dos juros, mandaram-me essa cópia, e tenho-a em manuscripto, impresso não existe; além disto consta-me, que houve attribuições, marcadas não sei por onde, que está exercendo a actual commissão; essas cousas, são sabidas; dizendo-se na mesma lei, que servem de regulamento á nova junta as attribuições da actual commissão, e não se sabendo quaes ellas são, vota-se sem conhecimento de causa: em consequencia disto é que eu pedi que tosse impresso, tudo que servio de regulamento á commissão; se isto não é possivel, não se imprima; imprima se o projecto, e na discussão verem se que se ha de fazer; mas será conveniente que se dêem attribuições a uma cousa que se vai crear de novo, sem que sejam conhecidas de ninguém? Será isto espirito de embaraçar? Eu não quero embaraçar cousa alguma -, principalmente um negocio em que tenho mostrado tanto empenho,- pelas razões que já apontei; tenho mais patriotismo do que isso.

O Sr. Presidente: - Em consequencia da proposta do Sr. Deputado, na occasião do projecto da Commissão, mandou-

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se pedir ao Governo tudo quanto havia a esse respeito para ser impresso conjunctamente com este projecto.

O Sr. Leonel: - Dahi vem o eu dizer, que não fui bem entendido; o que eu pedi não é anterior á abolição da junta dos juros, é posterior, é depois dessa abolição; porque isso está nas collecções, que cada um de nós póde ir ver; é só o que diz respeito á commissão do credito que não está impreco, sendo possível; não fendo paciencia, cá nos remediaremos como poder ser.

O Sr. Alves do Rio: - Se eu soubesse o explicação que o Sr. Deputado acaba de dar, eu não faria nota nenhuma, porque vejo que elle quer uma cousa, que não existe; tudo quanto ha, é anterior ao decreto de 13 de Março de 1834; depois disto não ha nada; o Sr. Deputado tem este decreto, não sei que mais póde querer; pois que tudo quanto ha é anterior d dissolução da junta, por consequencia nada tenho mais a dizer.

O Sr. Leonel: - Sr. Presidente, se não ha mais do que o decreto de 13 de Março, tracte-se só de imprimir esse decreto, e em quanto às instrucções e decretos do tempo da junta dos juros, existem nas collecções: lá poderemos ir estudadas; agora basta imprimir-se só o decreto de 13 de Março.

O Sr. Ministro dos negocios do Reino: - Eu queria pedir lambem a V. Exa., porque esta é uma materia muito grave, e como nella se involve o projecto da venda dos bens nacionaes, a cujo respeito e Governo emittio uma opinião, desejava eu, que V. Exa. mandasse tambem imprimir a proposta do Governo, para que na discussão do projecto da Commissão o Congresso possa approvar o que julgar mais conveniente.

O Sr. Presidente: - Tudo foi para a imprensa para vir prompto; e eu avisei para que viessem todos os decretos, ou instrucções que houvessem sobre as attribuições da junta interina do credito publico desde a sua creação, afim de se entrar depois na discussão do projecto. Se acaso não vierem, claro está que as não ha.

O Sr. Sá Nogueira: - Sr. Presidente, a materia de que se trata, é de muita importância, e por isso é conveniente, é necessário, que venham todos os esclarecimentos tendentes a tomar-se, uma melhor resolução; entre tanto deve observar-se que as attribuições da Commissão interina da junta do credito publico, que se dão á nova junta, que se pertende crear, devem-se considerar provisorias, e por consequencia parecia-me que para se adiantar trabalho, e para se poder chegar de prompto a um resultado, seria conveniente que o projecto da Commissão de fazenda se imprimisse, e desde já que elle entrasse em discussão, ficando por ora por se discutir o artigo, que dá essas attribuições provisorias á nova junta do credito publico. No mesmo projecto da Commissão vem tambem declarado o modo, porque se hade fazer o Regimento da junta; parecia-me conveniente como já disse, que este projecto fôsse impresso já sem dependencia dos esclarecimentos, que se pediram no Governo; e que entrave immediatamente em discussão, e que esse artigo que confere essas attribuições á junta do credito publico, ficassem para se discutir, quando chegarem os esclarecimentos pelos quaes se haja de dar, ou tirar á junta do credito publico qualquer attribuição; e como eu vejo que qualquer resolução que haja de se tomar a este respeito, não prejudica o rosto do projecto; eu faço um requerimento para que o projecto seja impresso já, para ser discutido quanto antes.

O Sr. Presidente: - Queira mandar o seu requerimento para a mêsa.

O Sr. Ministro do Reino: - Sr. Presidente, eu tenho a fazer uma unica observação; ainda que seja provisoria a lei que se fizer paia a junta, do credito publico; o Governo nunca póde ser responsavel pelas suas operações; porque os meus empregados não são nomeados pelo Governo. Todos sabem a responsabilidade que pésa sobre todos os empregados das repartições de fazenda, e eu estou certo que o Congresso não ha de querer que um Ministro da fazenda fique responsavel por uma repartição, em que não tem nenhuma ingerencia.

O Sr. Alves do Rio: - Sr. Presidente, o Sr. Ministro da fazenda não póde ser responsavel; porque não entrevém nas attribuições da junta do credito publico; a fallar a verdade isto é uma delicadeza que se usa nestes actos; pois quem ha de fazer responsavel uma pessoa, que não entrevem naquelles negocios? A junta do credito publico é uma necessidade no estado actual, em que nos achamos, como muitas vezes tenho dito. Esta junta é inteiramente separada dos negócios correntes da fazenda, nada tem com a marcha dos negocios do Thesouro; convem para o interesse publico, que ella seja inteiramente separada do Thesouro, como o era a antiga junta dos juros antes do decreto de 13 do Março de 1834. Aquella junta só era unida á fazenda pelo Ministro, que era o seu Presidente; por tanto não se tem em vista no estabelecimento desta junta, se não em dar ao credito publico a maior força possivel, e não tem com isto o Sr. Ministro da fazenda, se não prestar-lhe os rendimentos que a lei applicar para dotação desta junta; só nesta parte tem responsabilidade; pelo resto elle não póde responder por uma couza em que não tem parte, pois que fel lê não toma nada mais sobre sua responsabilidade, que toda está nos membros da junta, uma vez que não tem nenhuma ingerencia na junta, em lhe fazer aprontar todos os capitães que lhe forem applicados para o pagamento dos juros, e nessa parte ha de elle ser responsavel.

O Sr. Ministro do Reino: - O Sr. Deputado disse, que eu não posso ser responsável pelo procedimento da junta do credito publico; mas o Sr. Deputado sabe, que as repartições que pertencem ao Ministerio da fazenda, não poderá ser destacadas; porque prendem com o systema geral de fazenda; por consequência é necessario saber-se se a junta do credito publico, que tambem agora está encarregada da venda dos bens nacionaes, ha de ser destacada; porque isso prende com o Ministerio da fazenda.

O Sr. Presidente: - Isso ficará reservado para quando se trotar da discussão do projecto; por ora trata-se só do requerimento, que vai mandar para a mesa o Sr. Sá Nogueira.

O Sr. Sá Nogueira leu, e mandou para a mesa o seu requerimento.

O Sr. Presidente: - Este requerimento creio eu, que deve ter o mesmo seguimento, que tem os outros, que é o deferir-se na sessão seguinte; por tanto fica para amanha. Agora o Sr. Manoel de Vasconcellos Pereira pediu, que só alterasse a ordem do dia para interpellar o Sr. Ministro da marinha sobre um objecto urgente.

O Sr. L. J. Moniz: - E para apoiar aquelle pedido; porque esta materia é importantissima, é é da maior urgência tudo quanto nós tivermos a fazer a respeito das provincias ultramarinas; porque cilas existem num estado de anarchia o mais completo. Os Srs. Ministros da Coroa já estavam prevenidos, que hoje se havia de tratar deste objecto; se se transferir para outro dia, poderão occorrer obstaculos, que façam com que os Srs. Ministros tenham occasião de comparecer, e ahi teremos novas demoras; e como ha dous navio; da Corôa, que estão a partir para aquellas provincias, é justo que lá conste, que o Congresso se occupa da sua sorte; não vejo negocio de mais urgencia que este, pela razão desta ultima circumstancia.

O Sr. José Estevão: - Sr. Presidente, eu peço tambem que se altere a ordem do dia para se tratar de outro objecto urgente; porque entendo que lá no ultimo fundo da ordem do dia está uma materia de unto interesse, como a de que se quer tratar, e vem a ser o parecer da Commissão de legislação sobre as leis da dictadura, donde resulta a nova organisação judiciaria, tão necessaria para a manuten-

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ção da ordem publica, e creio eu que d'ahi tambem ha de vir o remedio, no todo, ou em parte; com que se ha de manter a tranquillidade nas provincias ultramarinas...

Vozes: - Esse remedio é para cá.

O Orador: - Pois então se dizem , que é para cá, eu digo tambem, é para lá. Os Srs. Ministros vinham prevenidos para tratar boje desta materia; se se decidir que se trate amanha delia; é preciso que nós sejamos consequentes, e que se não torne aqui, a respeito do nosso estado sobre administração de justiça, a fazer pinturas melancolicas, e monstruosas; por tanto eu concluo pedindo a V. Exca., que inverta a ultima parte da ordem do dia, principiando-se já a sua discussão; e estou persuadido que o Sr. Deputado, que pretende fazer a interpellação, ha de annuir a este voto porque da decisão desta materia hão de resultar, mais rapidamente, providencias para as províncias ultramarinas. Entre tanto se o Congresso decidir o contrario, por entender que assim não é, eu cedo da minha pretenção, mas acho que então não vamos bem.

O Sr. Conde da Taipa: - Sr. Presidente, eu tambem quero que se trate quanto antes da questão das províncias ultramarinas; porque perdem-se por força, se senão tomarem algumas disposições a seu respeito. Ha dous annos e meio que eu pronostiquei, que nós hiamos a perder as províncias ultramarinas com as disposições que então se tomaram; porque quiz-se governar uma terra de pretos, como se governa um paiz civilisado; mas isto é impossível, e por isso é que eu digo, que nós muitas vezes havemos de nos ver na necessidade de ser-mos retrógrados; que vem a ser, que nós havemos de ir para traz por causa de se terem legislado cousas, que eram incompativeis com os costumes e habitos do paiz, e uma dellas eram às provincias ultramarinas; porque as províncias ultramarinas tinham uma administração tal e qual com que se regiam, e de repente quiz-se introduzir alli principios mudemos, e sem attenção ás circumstancias particulares daquelles povos mandaram-se para lá; foi por isso que lá tem havido anarchia, e tem havido sangue; mas quem tem a culpa disto? São elles? Não Senhor; foi quem fez as leis, que não attendeo ao caracter dos povos daquellas províncias. Por tanto eu tomava só uma medida para ser mais curto, e vem a ser, tudo quanto se fez a respeito das províncias ultramarinas acabou, em quanto cá não tivermos informações exactas dó que mais lhe convém; fiquem, governadas da mesma maneira que o eram antigamente com os mesmos capitães generaes; e com as mesmas relações que lá havia (susurro na Camara, e vozes - menos isso, menos isso). Orador: podem dizer o que quizerem, esta é que é a minha opinião; porque eu estou persuadido, que não se póde aqui fazer nada, que satisfaça aos habitantes de Angola, senão o que acabei de dizer, pois que por ora em quanto não tivermos conhecimentos especiaes d'aquellas localidades, não podemos fazer cousas nenhumas novas, que seja melhor do que determinar, que elles continuem a governar-se pelas mesmas leis, com que elles se governaram muitos séculos, sem que tivessem produzido desordens e anarchia.

O Sr. Presidente: - Parece-me inutil toda esta discussão; porque agora o que se questiona, é se se ha de conceder a palavra ao Sr. Deputado Manoel de Vasconcellos Pereira para fazer a interpelação ao Sr. Ministro da Marinha.

O Sr. Vasconcellos Pereira: - Eu o que pertendo é tratar de segurar aquellas provincias, porque legislar para ellas tudo isso é muito bom; mas é que se nós não acudir-mos a ellas de prompto, quando lá chegarem essas medidas legislativas, ellas tem-se ido embora, e já não existem; com tudo se o illustre Deputado entende, que se deve dar preferencia á discussão da ultima parte da ordem do dia de hoje, eu não me opponho, uma vez que amanhã V. Exca. me dê a palavra para eu fazer a interpelação.

(Vozes - Hoje, hoje, falle, falle).

O Sr. Presidente propoz, e decidiu-se, que se dessa à palavra ao Sr. Vasconcellos Pereira.

O Sr. Vasconcellos Pereira: - Constando do relatorio do Sr. Ministro da marinha o estado de anarchia e desordem em que se acham todas as nossas possessões ultramarinas, principiando pelas de Cabo Verde, e seguindo pelas de S. Thomé, e Príncipe, Angola, Moçambique, Damão, Dio, Goa, Macau, Solor, e Timor (e outras mais se seguiriam, se mais colonias tivessemos); eu como representante da Nação Portugueza julgo do meu mais sagrado dever perguntar aos Srs. Ministros - e ficaremos nós pacificos espectadores das desordens e anarchia, que dilaceram as nossas colonias? Veremos nós com indefferença separar-se em pedaços a monarchia portugueza? Não recearemos que nos sós vindouros nos maldigam por termos deixado perder tão ricas e vastas possesões, sem fazermos o mais pequeno esforço para as conservar? Consentiremos nós que os nossos navios de guerra armados, e fazendo a mesma despeza como se navegassem; continuem e estar constantemente fundos no Tejo, em vez de irem tranquilisar aquellas provincias, em vez de irem conduzir cidadãos probos, que vão administrar a justiça com imparcialidade áquelles povos, em vez de irem fazer manter a authoridade da metropole n'aquelles paizes? Eu não o creio, Srs. e confio que os Srs. Ministros da Coroa, tomando na mais séria attenção um objecto tão grave e tão importante, e applicando toda a sua energia e actividade, farão todos os esforços para fazer manter illesa a integridade da Nação Portugueza; mas eu devo ponderar que toda a demora em acudir aquellas provincias pode-nos ser muito e muito prejudicial, e póde ser causa da nós as perdermos para sempre. Permitiam-me os Srs. Ministros que eu diga, o que disse um Sr. Deputado aqui neste lado da Camara: Ministros da corôa acudi, ocorrei; porque senão correis talvez não achareis a quem soccorrer.
Eu estou persuadido, que os Ministros da corôa não tem podido até agora acudir às nossas províncias do ultramar por falta de meios; porém parece-me que houve occasião em que elles não empregaram toda a energia, que pede este objecto; como quando aqui chegaram as noticias de que nas ilhas de Cabo Verde tinham havido desordens: existia uma corveta armada no Tejo, que podia sair em quatro dias para às ilhas para tranquilisar o paiz, e poder conduzir para a capital os authores daquellas desordens; esta corveta devia sair immediatamente isto precisava energia da parte do Governo, porém não saiu o porque? Porque faltavam cinco ou seis coutos de réis para os objectos necessarios. E possivel que se não fizesse um esforço para obter este dinheiro, e que por uma quantia tão modica nos expuzessemos a perder, e abondonar á sua sorte uma provincia tão interessante, que só a urzella, creio quê rende mais de cem contos? Sr. Presidente, estamos chegados ao mez d'Abril, mez em que devem partir os navios, que vão de Portugal para a India: a fragata D. Pedro, e a charrua S. João Magnanimo estão-se preparando para ir a Gôa levar o governador, e tranquilisar aquella provincia. Porém eu vejo tão pouca actividade no preparo destes navios, que receio muito que não saiam para a índia, e que lhe venha a acontecer o mesmo que acconteceu á charrua S. João Magnânimo, que está ha mais de um anno prompta para ir para a India; fazendo uma grande despeza ao estado, e que não tem saido foi carregada pelos negociantes desta praça na supposição que devia partir no mez d'Abril do anno passado; ainda não saiu, talvez que a causa de não ter saido não fosse só a falta do dinheiro necessario para o costeamento da charua; mas a falta de dinheiro necessario para pagar muitos mezes adiantados a uma aluvião de empregados publicos, que deviam ir n'aquella charua para Gôa exercer os empregos, de tabelliães, escrivães, officiaes de justiça, e outros, que sempre foram occupados pelos naturaes do paiz: talvez que o não sair esta charrua fosse uma felicidade, e que a chegada

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desta aluvião de empregados a Gôa desse causa a uma grande revolução (Apoiado). Peço por tanto aos 8rs. Ministros da corôa, que façam todos os esforços para que estes dous navios sáiam infallivelmente pelo mez d'Abril.

Quando ou era major general propoz ao Sr. Ministro da marinha, que seria muito conveniente a nós e ás nossas colonias o estacionar navios de guerra em cada uma d'ellas. Seria muito conveniente a nós, porque d'esta maneira a nossa marinha seria muito menos pesada ao thesouro; pois que os navios depois de sairem para as colonias serão sustentados e pagos por ellas; seria muito vantajoso, porque empregavamos muita gente, e creavamos bons marinheiros, que nos faltam, e porque os nossos officiaes adquiriam conhecimentos praticos, que não podem adquirir sem navegarem; e muito principalmente porque seria o modo de conservar as colonias, porque os navios de guerra são as pontes, que unem as colonias com a metropole; em ellas faltando, a separação se seguirá; tambem seria conveniente às colonias, parque os navios de guerra protegem o commercio, e porque o dinheiro que ellas gastassem com os navios ficava para o paiz, porque os navios de guerra evitavam as desordens e anarchia, é porque davam força e faziam respeitar as authoridades; Sr. Presidente, os navios de guerra nas nossas colonias são mais respeitados do que um regimento; e se em Cabo Verde estivesse estacionada uma pequena escuna de guerra, nunca o batalhão miguelista, que alli estava, teria assasinado os seus officiaes, o se o tivesse feito esses malvados, que cometteram um crime tão atroz, não teriam escapado ao castigo. Eu faltaria á verdade se não dissesse que o Sr. Ministro da marinha desenvolveu a maior energia, e actividade para levar a effeito este projecto; e apesar das circunstancias em que estava e Governo por falta de meios, immediatamente foi um brigue de guerra nandado para a Madeira para proteger aquella ilha de uma invasão miguelista, que se dizia esta vá para a attacar; mandou-se uma escuna de guerra estacionar em ilhas de Cabo Verde; armou-se uma curveta para ir render o brigue, que estava na Madeira a fim de elle ir estacionar-se em Angola; armou-se uma charrua para o mesmo destino, e finalmente principiou-se a armar uma fragata para a India: honra lhe seja feita. Eu não digo isto por lisonjear o Sr. Ministro, nunca, lhe pedi favor nem empregos, o que lhe pedi repetidas vezes foi, que me dispensasse do emprego de major general; porque não queria estar á testa duma corporação, que infelizmente ha muito tempo em Portugal tem sido a menos contemplada, e mais mal paga; e nada prova mais claramente a ignorância, e incapacidade dos que nos tem governado, do que o despreso e abandono em que tem deixado as nossas colonias, e a nossa marinha; esta arma, que em outros tempos pelas suas conquistas elevou a gloria do nome Portuguez ao zenith, pelas suas descobertas, mudou a face política da Europa, e tornou Portugal o paiz mais rico da terra, e que ainda bojo nos póde tornar ricos, e felizes. Sr. Presidente, os Srs. Ministros da corôa não são responsaveis até aqui de não terem soccorrido as nossas províncias ultramarinas, porque estavam na impossibilidade de o fazer por falta de meios; mas é preciso advertir que os Srs. Ministros vieram ha poucos dias pedir ao Congresso meios para occorrer as necessidades publicas, declarando ser uma dellas de soccorrer as nossas colonias; o este Congresso concedeu-lhe sem hesitar todos os meios que elles pediram, por consequência de hoje em diante ficam altamente responsáveis pela pacificação, e conrervação de todas as nossas provincias ultramarinas. Concluo mandando para a mesa a seguinte indicação.

Constando do relatorio do Sr. Ministro da marinha o estado de anarchia o desordem, em que se acham todas as nossas colonias, e sendo preciso promptas providencias para não perdermos tão importantes possessões, requeiro que se recommende com muita especialidade ao Governo lance mão das mais energicas medidas para pacificar aquellas provincias, e manter illesa a integridade da monarchia portugueza.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado mandou um requerimento, que ha de ter o destino na sessão seguinte: entretanto, quando algum Sr. Deputado fui uma interpelação aos Srs. Ministros, é costuma dar-lhes a palavra.

O Sr. Almeida Garrett: - Sobre a ordem. A hora está tão adiantada, que será economia tractar hoje essa questão; e então eu pediria, que este objecto fosse declarado urgente, e se tractasse desde já; porque se o interrompermos hoje, e tractarmos de um bocadinho de cada questão, o resultado é não se tractar nada. Peço pois que se ouça o Sr. Ministro, e todos os que quiserem faltar sobre isto.
Consultado o Congresso, resolveu que se entrasse na questão.

O Sr. Ministro de Marinha: - Eu entendo que não ha necessidade de gastar muito tempo com esta materia. O interesse que o Congresso mostra pelos nossos irmãos de ultramar, é muito louvavel; e na falta de outros remedios, é uma consolação para seus males, quando souberem que nos occupamos delles com tanto empenho; mas o Congresso não póde neste momento fazer mais do que o governo tem feito; para o futuro poderá fazer muito. Quando o Sr. Vasconcellos começou .... eu já tive occasião de fallar no Congresso sobre aquella parte da Monarchia Portuguesa; e ao que então disse tenho a accrescentar, á vista das ultimas noticias, que o socego daquellas ilhas estava grandemente restabelecido pela acclamação da Constituição de 22 em todas as ilhas, sendo de esperar, que o estejam hoje completamente depois das providencias que o Governador tomou.

Agora a respeito de Angola, as correspondencias do governador, Domingos de Saldanha, davam esperanças de que aquella parte da Monarchia Portugueza entrasse numa melhor ordem de cousas: uma companhia d'agricultura creada com sufficientes fundos, varias outras providencias, e uteis reformas, mostram o bom desejo que elle possuiu era regular aquelle Governo; entretanto o desejo de conhecer pessoalmente todos os districtos daquelle vasto territorio, occasionaram, a sua morte, por não estar, acostumado ao clima do paiz; este acontecimento esteve a ponto de produzir grandes calamidades, e algumas tiveram logar, como foi o assasinato de commandante do regimento de linha pelos soldados do mesmo corpo em sublevação; estas desordens acharam novo pretexto de se desenvolver pelas contestações que houve entra este commandante, e a Camara sobre a installação de novo Governo. Depois da morte do commandante, a Camara creou um governo provisorio, e o socego foi restabelecido; entretanto o estado de irritação reina alli como em todas as partes do ultramar: até ao dia 6 vai sahir para Angola a charrua Galateia, vai nella o governador, e outras authoridades, a providencias que o Governo julga necessarias para o restabelecimento da paz naquelle paiz, e para promover o seu bem estar, devendo seguir tambem para o mesmo destino o brigue Andaz, que bom auxilio póde prestar ao governador no desempenho de tão importante commissão. Além do cabo da Boa-Esperança, informarei o Congresso, que depois que eu apresentei o meu relatorio, aonde disse, que constava confusamente que a India se tinha proclamado independente, e que D. Manoel de Portugal, que tinha embarcado a bordo da charrua Princesa Real para este reino, entrando novamente em Gôa ahi fôra acclamado Vice-Rei, informarei, digo, que não é exacto; por um brigue Hespanhol, ha pouco chegado de Mossambique, se sabe que a charrua tinha sahido de Mosaambique nos fins de Outubro, donde se espera em pouco tempo. Para Mossambique, e Gôa estão dadas ordens, e por todo o mez, que vem sahirá a charrua S. João Magnanimo, e a fragata D. Pedro: eu não quero fazer comparações entre as passadas administrações, e a presente; mas é certo que a charrua não póde sahir na prima-

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vera passada, estando prompta provavelmente, porque o Governo de então não teve recursos; a administração presente achou recursos não só para fazer sahir a charrua, mas até para a fazer acompanhar da fragata D. Pedro, cuja promptificação é mais dispendiosa, e por isto já se vê que administração nenhuma tem feito mais do que a actual, a favor de nossas possessões do ultramar, que até agora não tem merecido o maior cuidado: além destas tomou outras providencias, tem-se havido com o maior escrupulo na escolha dos empregados, porque é daqui que particularmente tem vindo o estado desgraçado daquellas possessões; ninguem até aqui, por via de regra, tem sollicitado empregos para o Ultramar, senão com um meio de enriquecer em pouco tempo. Tomaram-se tambem algumas medidas legislativas, como o decreto de 17 de Dezembro, 16 e 17 de Janeiro, pelos quaes se estabeleceu um systema fixo de authoridades, marcando-lhes das attribuições, e prevenindo os inconvenientes que até agora se seguiam, quando alguma authoridade venha a faltar, como aconteceu ha pouco em Angola.

Por outros organisou-se a administração judicial, em harmonia com o systema adoptado no Reino, mas com as modificações que a natureza do paiz, e outras circumstancias aconselhavam. - Estabeleceram-se as antigas juntas da fazenda, com as, mesmas attribuições, e regimento que dantes tinham. (Apoiado.) O novo systema de fazenda, se no Reino tem incontrado difficuldades, será ainda por muito tempo inexequivel nas possessões ultramarinas. (Apoiado.) Tambem ha, um decreto de 17 de Janeiro para animar a nossa navegação, e commercio, e não menos para convidar os nossos officiaes mechanicos a irem para aquelles estados, a fim de melhorar a preparação dos generos, coloniaes: esta medida é um primeiro passo para alcançar este importante objecto, e ao Congresso pertence fazer nella os melhoramentos que julgar convenientes.

Por esta narração simples conhecerão as Côrtes que o Governo, apesar das dificeis circumstancias em que se tem achado, não tem omittido nenhum meio possivel de melhorar o estado das nossas possessões ultramarinas.

O Sr. Vasconcellos disse, que seria de utilidade, que houvesse uma estação naval permanente em cada uma das principaes possessões. Eu sou da mesma opinião. - Ainda que mais feliz fosse o nosso estado financeiro, impossivel seria igualar a nossa marinha á de outras nações mais ricas; e neste sentido nunca, poderemos fazer consistir na marinha a nossa principal força; mas devemos fazer todas as diligencias para que ao menos tenhamos uma marinha capaz para manter o socego das nossas possessões transatlanticas, e fazer respeitar a nossa bandeira: mas isto depende da som ma dos fundos que o Congresso consagrar a esta applicação - antes disso é impossivel que o Governo satisfaça a todas essas necessidades. -- Creio que o Sr. Vasconcellos estará satisfeito com o que acabei de expôr.

O Sr. Vasconcellos Pereira: - Estou satisfeito: o que peço ao Sr. Ministro é, que não haja demora em fazer sahir os navios de que fallou.

O Sr. Ministro da Marinha: - Até ao dia 6 do mez seguinte sahe a charrua ......... e vai ordem para que tambem saia o brigue Audaz, que se acha na Madeira, e está-se promptificando outro que o vá substituir: por todo o mez hade sahir a fragata D. Pedro e a charrua Magnanimo para Gôa.

O Sr. Vasconcellos Pereira: - É nisso mesmo que eu peço, não haja falta, em attenção á monção.

O Sr. Ministro da Marinha: - Se esses navios não sahirem, acabou a minha missão.

O Sr. Presidente: - Eu hia propôr, antes mesmo da indicação do Sr. Vasconcellos, o requerimento do Sr. Garrett; isto é se esta discussão ha de continuar amanhã, segundo a, ordem estabelecida.

O Sr. Barão da Ribeira de Sabrosa: - Creio que o Congresso julgou satisfatoria a resposta do Sr. Ministro da Marinha; ao menos a mim pareceu-me tal por conseguinte creio que este incidente não deve continuar.

O Sr. L. J. Moniz: - Não digo que a resposta do Sr. Ministro não fósse satisfatoria; mas peço a V. Exca. consulte o Congresso sobre se se ha de ainda conceder a palavra aos Deputados, que quiserem fatiar nesta materia; e se assim se resolver, peço desde já que ella me seja concedida, porque tenho alguma cousa importante que dizer.

(Vozes: - Falle, falle).

O Sr. Almeida Garrett: - Não posso convir que já se feixe a discussão sobre materia tão importante. Se o illustre auctor da indicação está satisfeito com a resposta do Sr. Ministro da Marinha, não o estou eu.

Nem como Deputado, nem como portuguez, me basta ainda o que se tem dito, muito menos o que foi resolvido.

Requereu-se que o governo desse o maior cuidado em prover á salvação de nossas províncias e possessões ultramarinas, de cujo ruinoso estado convém todos. Pediu-se que para alli fossem quanto antes enviadas as auctoridades que as sejam e pacifiquem.

Ponderou-se a confusão e anarchia em que algumas d'ellas estão, o abandono em que todas se acham; vituperou-se, e com muita razão, o desacerto que presidiu a todas as medidas que neste ponto tomaram as administrações passadas a pessima escolha de auctoridades, e indigno abuso de patronato com que para satisfazer a interesses privados, o governo passado distribuira por homens ineptos e inimoraes até os mais pequenos officios e empregos em todo o ramo de serviço publico, destituindo assim e condemnando á miseria tantas familias dos habitantes daquellas longiquas e desvalidas provincias; que mais crime não tinham do que estar longe das escadas das nossas secretarias d'estado. Propôz-se em fim que o governo fizesse o ultimo esforço para fazer partir sem demora forças navaes, que segurassem na Corôa, da Rainha de Portugal aquellas antigas joias, que tanto sangue custaram a nossos avós, e que se já hoje não são as mais ricas em proveito, são ainda as mais bellas pelas recordações gloriosas que nos lembram, pelo documento que ainda são do que fomos, o do que podêmos ser.

A resposta do Sr. Ministro da Marinha e Ultramar é digna de um ministro patriota, satisfaz, em parte os meus desejos; e senão se tratasse mais do que de mandar força para sustentar essas reliquias da dominação portugueza na Azia e na Africa, pouco me restaria a pedir.

Mas não basta força, pela menos força physica sómente. Não basta mandar naus, é preciso tambem mandar paz e ordem áquelles irmãos nossos, que abandonámos sem lhes dar mais quinhão na herança da patria do que a desordem a confusão, a incerteza de direito; e uma horrorosa anarchia de legislação, tanto mais horrorosa, quanto b mal de nossas fluctuações politicas todo lá chega, e para o remedio, se algum se dá, tarde o vêem, e quasi sempre se perde.

Todos sabem que ha seculos as nossas possessões d'além do Cabo tem hido em progressiva decadencia. Não tanto assim, as outras; mas todas se achavam em mau estado quando o governo legitimo foi restaurado. Mas as pretendidas e absurdas reformas daquella primeira dictadura acabaram dê as arruinar; e se ou todas, ou alguma se perder, - a essas reformas será devido.

Não contentes de resolver até os fundamentos á desgraçada patria com innovações incoherentes, repugnantes umas às outras, e em quasi tudo absurdas - sem consultar nossos usos, nossas praticas, nenhuma razão de conveniencia, - foram ainda atirar com todo esse montão de absurdos para além mar, onde se tornaram dobrados, onde se multiplicaram ao infinito pela infinita variedade de obstaculos, de repugnancias, de impraticabilidades locaes que encon-

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traram - e que todas em sua vaidosa e doutrinaria cegueira despregaram áquelles orgulhosos Lycurgos!

De muitos destes erros estão isentas as providencias legislativas que a Dictadura de Sua Magestade a Rainha ultimamente foi obrigada a tomar para o regimento daquellas importantes provincias: e tenho muita satisfação de poder dizer que em geral aquelles decretos me parecem bons e previdentes: do que dou sincero parabém e louvou ao Sr. Ministro do Ultramar. Assim como não duvidarei prestar-lhe o humilde testemunho de minha convicção, de que a sua administração tem sido a mais zelosa e diligente que ha muitos annos temos tido naquelle ministerio.

E já que sinceramente louvei o que me parece louvavel, e que ao mesmo tempo tão severamente censurei os actos da primeira dictadura, quero fazer uma distincção necessária e indispensavel, e a qual eu tomara que todo Portugal ouvisse o entendesse.

Não ha um só acto legislativo da Dictadura de Sua Magestade Imperial, que Santa Gloria haja, não ha uma só reforma de todas quantas decretou, que em sua base, em seu principio não seja boa, excellenle, illustrada, e patriotica, como tudo quanto vinha daquella grande alma. Não ha um só tão pouco daquelles grandes e generosos principios, que nas applicações e desenvolvimentos não fosse ou entorpecido pela ignorancia, ou retorcido pela má fé e pessoaes interesses, ou convertido ainda em instrumento de prevaricação e maldade!

O pensamento grande, sublime, magnifico, digno do libertador de Portugal.

A obra, a execussão digna de seus devoradores!

Esta é, que é a verdade sem paixões. (Apoiado, apoiado.) E porque nós a dizemos, e sobre tudo porque Portugal o vê e crê, e á sua custa o sente (apoiado) - diz-se que nós somos ingratos á memoria do libertador que desacatamos o seu nome, que nos esquecemos dos beneficios recebidos, e que nos levantamos agora soberbos contra aquillo mesmo que recebemos humildes e de joelhos. Esta é a mais infame e vil calumnia, que ainda se disse! (Apoiado de todos os lados da sala.) Muitas vezes tenho tocado este ponto; peço perdão às Côrtes se insisto n'elle; porque é grave e importante, porque interessa a honra nacional, porque é uma questão de moral publica, que os deleitosos enredam acintemente com seus sofismas, e que é desairoso á Nação que representamos, senão for bem restituída á sua natural clareza. Ingratos aos generosos desejos e pensamentos do Sr. D. Pedro IV., não o somos. Despreza-los, não os despresamos. Todos os queremos guardar religiosamente, inviolavelmente.

Esse augusto e generoso legado é a mais bella propriedade da Nação.

Mas que tenhamos a mesma religião de respeito pelos absurdos e desvarios, com que foram postos em obra por seus maus conselheiros! Não o quer Portugal, e com indignação os rejeita. Com tanta indignação e despreso, quanta é a gratidão e respeito, com que affincadamente quer manter e conservar os generosos legados de seu libertador.

Não houve um só ramo de serviço publico em que a zelosa solicitude do segundo fundador da Monarchia não intendesse. E podem ser mais luminosos os princípios geraes de seu Codigo Constitucional? Os da lei da reformação das justiças? da que separou a administração publica das funcções de julgar, da administração do fisco, - da que libertou a terra, de todas em fim? E heverá maiores e mais loucos adversarios, que os que fizeram de tudo isto desencontradas alavancas postas á machina social para a deslocarem e rodarem a encontrões por esse abysmo, até chegarmos onde estamos? Até forçarem o paiz a uma revolução que só um povo como este, o modelo de todos os povos civilisados, podia fazer com a generosidade, com a brandura, com a indulgencia, com que tem, sido feita?

Não, Sr. Presidente, Portugal não é ingrato á memoria do seu libertador. O sceptro de D. Pedro IV., a espada do Duque de Bragança, os principios do Duque Regente, na minoridade da Senhora D. Maria II, são ainda hoje o objecto da nossa veneração, e do nosso culto. Assim como nunca nos hão de esquecer os serviços dos seus iilustres companheiros de armas e trabalhos.

Mas a memoria de ceus conselheiros essa já a fulminou o anathema nacional: essa ha de ser execrada em quanto houver um portuguez, que pise este solo desgraçado, que elles votaram á ruina, e entregaram á anarchia. (Applauso vehemente de todas as partos da sala.)

Foram elles, sim, Sr. Presidente, e suas absurdas e falsas reformas que nos trouxeram a este estado. Foram elida que desmoralisaram de todo o paiz, que o deslocaram e revolucionaram. E porque nós viemos agora, e nos cabe sentarmos sobre as ruínas que elles amontoaram, porque foi nossa triste sorte que a Nação vos desse o mandato (tão difficil que toca no impossivel) de vir calmar o abysmo, que elles cavaram, a nós é que nos chamam os revolucionarios, a nós e á Nação é, que querem lançar o cargo dos males que nos fizeram!

Porque nos fadou a desgraça a vir representar um paiz alevantado, desorganisado, e mais exhausto que uma planicie d'Africa depois de devorada por uma nuvem de gafanhotos; porque assim coube aquelles infelizes ministros tomar debaixo de tão furioso temporal o leme desmantellade do Estado; são aquelles, que por sua preversa fatuidade o suscitaram quem os vem accusar da má navegação!

Nós, Sr. Presidente, que ainda no que erramos estamos errando de seus erros, e que nos peccados que comettemos, por seus peccados estamos peccando! (apoiado, apoiado!)

De novo supplico às Côrtes que me perdoem a digressão involuntaria, mas não inútil. Bem economico sou eu do tempo: mas não é este o que se perde, não de certo o que se emprega em rectificar princípios desta magnitude, em desenvolver considerações de tamanha transcendencia.

Eu volto naturalmente ao meu objecto. Assim como 03 reprovamos, aprendamos tambem naquelles desacertos. No projecto de Constituição que vamos prompto discutir, ha uns poucos de artigos de geographia politica, em que seus
illustres auctores descreveram, ou enumeraram miudamente as diversas partes de territorio que pertence á Corôa Portugueza. Ponderem os patrioticos redactores do parecer, considerem todos os que vamos approvar-lho, de que immensa responsabilidade nos não encarregamos para com o paiz, e aos olhos mesmo dos estrangeiros, quando assim declaramos parte integrante de nosso territorio aquellas antigas e quasi abandonadas possessões! Em 1822 sob muito melhores auspicios, de muito menores dificuldades rodeados, com outras forças, e com tantos mais recursos, as Côrtes Constituintes tambem fizeram uma pomposa enumeração dos poderosos estados, que então compunham a vasta monarchia portugueza. Tres annos depois a Constituição de Portugal já continha um mappa modesto e humilde; e bom numero fie capítulos faltavam ao seu tratado de geographia portugueza!

Isto na segunda Constituição. Que ainda a primeira não estava decretada, já aquella geographia era falsa.

Quererá o Congresso constituinte de 1837 que lhe succeda o mesmo? Pois duro é dize-lo; mas o mesmo nos ha de succeder se loucamente nos pozermos a legislar para aquellas remotas regiões, querendo doutrinariamente forçar localidades, circumstancias, habitos, modos de ser que ignoramos; a entrar a martello dentro dos quadros arbitrarios que nossas theorias de cá decretam, como se nós fôramos o creador que disse: Faça-se! Como se nós poderamos, mesquinhas creaturos, fazer mais do que reconhecer os factos como elles são, e modifica-los até onde elles podem ir. Felizes e magnificos legisladores, se ainda isto soubermos fazer!

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Pois o mesmo, repito, nos ha de succeder com esse resto de possessões ultramarinas, se era vez de lhes acudir já, promptamente com remedio nos pozermos descansadamente a esmiuçar e apurar graves delicadesas de principios de governação e regimen, como em 1822 se fez, que em quanto as Côrtes decretavam nas Necessidades, apuradas regras de Governo, os brasileiros faziam na America regras a seu modo, ou acabavam com todas.

Não é, Sr. Presidente, que eu tenha saudades do Braail. Folgo muito com sua independencia. E como portuguez tenho muito desvanecimento de que a minha nação contribuisse tanto para a civilisação do globo, que deixou quasi meio mundo occupado por outra nação filha sua, que falla a sua lingua, que herdou a sua historia, que hade perpetuar o seu nome, e que ainda quando Portugal acabe, ha de ficar na terra dizendo às nações e aos seculos. Houve um pequeno povo no extremo occidente da Europa com tamanhos pensamentos, e com tal esforço, que nós fomos collonia sua, e ioda esta vastidão que possuimos, nos veio delle!

Como procurador de Portugal, estimo muito que o Brazil se separasse de nós de direito, porque de facto o estava já á muito, e porque se nós tivermos juizo, podemos tirar mais vantagens do commercio com uma nação irmã, mas independente, do que nunca tinhamos tinhamos tirado de uma colonia sujeita. Mas digo que se em vez de tanto alambicar de principios doutrinarios, as Côrtes de 22 tivessem attendido aos factos, e concentrado a força metropolitana que ainda era muita e muito decidida, no Norte do Brazil, onde os interesses e as sympathias eram mais fortes pela união, nós teriamos feito como os inglezes no extremo Norte do mesmo continente, (apoiado) e a bandeira das Quinas ainda hoje fluctuaria nas terras de Pedralvres Cabral; não haveria um porto do mundo em que o antigo collosso do imperio Portuguez não tivesse ainda um pé. Não creio que se tivessem com isso feito grandes interesses; mas era de honra e pundonor nacional; e sobre tudo (consideração que muito vale comigo!) tinha se salvado a causa da liberdade do desaire com que seus inimigos tanto se regosijam, de que nas mãos do Governo representativo se perde o que a despotismo mais absurdo não chegara a perder nunca!

Por todas estas considerações pois, é que eu peço em nome de Portugal e da sua gloria, em nome da liberdade e por sua honra, que sem entrarmos em longos e reconditos desenfiamentos de theorias, acudamos já com alguns remedios legaes, e promptos às nossas possessões ultramarinas. Leis definitivas nem as podemos, nem as devemos fazer em quanto aqui não estiverem os Deputados d'aquellas provincias. Mas fixar-lhes um systema geral de regimen podemos, e devemos.

As nossas antigas colonias tinham um systema de legislação antiga, obra dos séculos; e só as ordenações dos Srs. reis D. Manoel, e D. Sebastião para a India tinham quasi tanto que estudar como as vossas ordenações do remo, mais de certo que o livro correspondente d'aquellas, na nossa legislação privativamente continental.

Veio a restauração; e as deslocações da primeira dictadura applicaram indistinctamente a todos aquelles paizes, tão diversos do nosso, tão diversos entre si, o mesmo systema de administração e regimento, que já para nós era inconsiderado. Mas aqui o remedio era possivel (ás vezes), onde o mal bradava muito, porque lá se resolvia o Governo a acudir-lhe, e estava perto. No Ultramar, como inda agora disse, todo o mal chegava, nenhum remedio podia chegar.

Veio a segunda dictadura, remediou em grande parte os absurdos de primeira, retrogradou (como devia) a muitos dos antigos methodos especiaes e da legislação local daquellas terras. Mas todo este direito anda por cá fluctuante e vago, como não será elle por lá! Que fatal não póde ner áquelles estabelecimentos cujo estado inutil é já lamentoso, que fatal lhes não será que agora lhes appareça lá um novo regimen, e systema que ámanhã nós declaremos nullos, e revoguemos! Que será se o governador ido n'esta monção começar a estabelecer o regimento da provincia, e ainda no principio, rodeado ainda das terriveis dificuldades primeiras, na proxima monção lhe arrebentar outro governador como outro systema, ou outras instrucções, e que nada chegue a arraigar, onde similhantes plantas tanto custam sempre a acclimatar?

Disse, e repito, que sem a presença dos Deputados d'aquellas provincias nada podemos fazer nos melhoramentos detalhados, que ellas demandam, e que nós lhes devemos. Além das razões geraes accresce a sensivel falta de um corpo consultivo composto de homens especiaes, qual o teem todos os paizes que possuem colonias, qual o houve sempre em Portugal ate á funesta época do diluvio das chamadas reformas, em que a terra se alagou com leis, e as cataratas sé abriram e despejaram innovações. Mas vagou a enchurrada; e só appareceu perto de corvos!

O conselho de Ultramar era defeituoso, estava degenerado, mas era uma roda essencial da administração n'uma monarchia como esta. Reformadores ignorantes não sabem dizer senão, como os energumenos de Barrere, e Robespierre! Abaixo! Tira-se da máchina velha e ronceira, mas completa, uma roda essencial: o destruidor não sabia manejar se não o machado que arromba, não o instrumento delicado que construa; a máchina não anda. Outro remedio brutal tirar lhe mais rodas. Assim se reformou esta desgraçada terra a machado. E pasmam da revolução! Deviam pasmar, deviam confundir-se, que seja a pobre revolução, a calumniada revolução a que de costas contra o edificio velho e arrombado por elles, o está amparando que não caia de todo, e rebocando pelas mãos populares (não ordinariamente conservadoras) a antiga monarchia de Portugal, que seus pretendidos factores minaram por todos os lados, e lhes descarnaram o alicerce até os fundamentos.

Honra á revolução em quanto assim se despica tão nobremente! Honra a um povo tão generoso, que então se mostra mais monarchico quando o declaram soberano que então é mais conservador quando mais o excitam seus inimigos a excessos que nunca podem justificar-se, mas que ás vezes desculparia o delirio, que provocações tão accintosas estimulam!

Falta-nos pois, de mais amais, auxilio de um bom concelho Ultramarino, como deviamos ter. Mas podemos, digo, e devemos fixar as regras geraes do regimen das provincias Ultramarinas, e neste sentido. vou eu já mandar para a mesa tini additamento á indicação do Sr. Vasconcellos.

Não quero porém, ainda aqui terminar o meu discurso; porque este é o proprio logar de conter um erro vulgar que a ignorancia e desleixo do Governo tem popularizado, e que foi crescendo e medrando, porque á ignorancia é mais facil que o estudo, e crer sem reflectir custa menos do que duvidar parti examinar Tal é a opinião que, sem disputa quasi, se tem estabelecido entre nós de que as nossas colonias são peso, que não proveito, que melhor ora abandona-las, vende-las talvez, já por desgraça ouvi dizer a gente que se cuidava estadista! E que invocar essas recordações de gloria de nossas conquistas era uma aristocracia de nação (formaes palavras de um Ministro de estado dos puros e leaes cartistas}, mais prejudicial que a aristocracia das familias.

Eu não sou aristocrata, nem por nascimento, nem por principios. Mas ai da nação que, como nação, não for aristocrata! Ai da nação que não crê cegamente, e com preconceitos ainda, na sua historia, nas maravilhas dos seus tempos heroicos, nos prodigios e nos milagres das suas épocas fabulosas! Miseravel, e despresivel nação a de desalmados utilitarios, reseguidos em seus cálculos de cyphros que abjuram quanto ha de elevado, e sublime até n'essas memorias vaidosas, até n'esses pergaminhos que lhes dizem; «Nação Portuguesa, tu descendes de Egas Moniz, e de Na-

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«nalvres! O teu Solar está nas ruinas de Gôa, nos muros (ainda que já não tem) de Coulão» - ou: «francezes, vós descendeis dos bravos de Agricourt» - ou:« inglezes, vós sois filhos dos destruidores da invencivel armada!».

Porque, é com este appellar para esta aristocracia das nações, que muitas vezes se tem feito os prodigios maiores, que se defendem cercos como o do Porto; que se ganham batalhas comoa de Austerlitz, victorias como as de Waterloo!

E todavia não é para esses sentimentos tão naturaes de aristocracia popular, que eu hoje appello; não é para outras considerações mais justas ainda do dever, que temos de amparar aquelles nossos irmãos dalém mar, tão portuguezes, e tão cidadãos como nós. Não, Sr. Presidente, appello para o interesse, e para esses cálculos materiaes tão bem quistos deste seculo de usurarios em que vivemos, contando-nos, e avaliando-nos uns aos outros, e mercadejando de tudo, de leis, de costumes, de moral, de governo, e de religião. Conheço infelizmente o meu seculo, e quero fallar-lhe lingua, que elle entenda. É falso, digo, que as nossas possessões ultramarinas sejam essa pobre cousa, que se crêem vulgarmente; é falso que tanto pesem á metropole, como por ahi se diz.

As nossas colonias são ainda hoje, depois dos inglezes, as mais importantes que nenhuma nação europea possua (apoiado). São mais seguras do que as colonias britanicas: porque o Cacada todos os dias ameaça com sua independencia, e a India ingleza não tardará que o faça. Mae as nossas vastas, possessões africanas, que no rigoroso sentido da palavra são colonias, porque sem o amparo da metropoli nunca poderão existir rodeadas de uma população mais, ou menos hostil; mas com a qual nunca podem sympathisar, nem ligar-se; asnossas,possessõe-i africanas só se as abandonarmos de todo, ou no-las roubarem inimigos europeos, as poderemos perder.

Além disso, sem contar os immensos recursos, que com qualquer moderada diligencia podemos tirar delles, ainda como estão, muitos pagam sua despeza, em algumas ha sobras. Goa, por exemplo, que todos nos encarecem como perdida e morta de todo, ainda estragada como anda, dá sobras de seu rendimento. Angola é, depois do estabelecimento inglez do cabo, a primeira de todas às possessões africanas do estreito para fóra.

Não quero fallar na causa da civilisação, cujos primogenitos nós somos, mais exactamente, cujos apóstolos nós somos, e que é o mais nobre titulo da nação portugueza. Causa que nunca deveremos abandonar, porque é um legado de honra de nossos paes! Mas arredarei, ainda que muito me custa, o coração dessa poesia: e voltemos ao utilitario da questão.

Outro grande, e capital interesse se liga á conservação das colonias. Ellas, e a força naval, e os meios, e habitos maritimos, que ellas formam, e conservam, são uma garantia de independência nacional para um pai z como o nosso. Portugal não existo independente senão pelo mar. Em nossos estreitos, e indivisos, e desnaturaes limites de terra, não temos, as barreiras naturaes da independencia de um paiz.

Esta verdade está em todas as paginas da nossa historia, uma a uma. Por nós mesmos não podemos existir independentes senão conservarmos os meios artificiaes de existencia, que nossos, avós formaram ha tantos annos, e que pesa-me, e pesa-me de o dizer, ha tempos se teem ido abandonando, e despresando.

Segurem-nos o mar, e basta o patriotismo, e brio portuguez para nos conservar independentes em terra. Mas reduzidos a nossas forças, e meios terrestes, não as temos para DOS conservar taes.

Sr. Presidente, este nobre pendão das quinas custou sempre muito sangue, e muito sacrifício para se conservar arvorado, e para fluctuar independente.

Esta independencia, este orgulho de vivermos sobre nós, e donos em nossa casa! nobre orgulho, que fez a base do caracter portuguez, ha muito que leria sucumbido às desvantagens locaes, se nossos maiores as não tivessem supprido com outras, creação de suas espadas, de suas; navegações, e de seu génio emprehendedor, e ousado. Na tendencia geral a agglomeração que ha seculos teem tido todos os estados da peninsula iberica, Portugal teria sido absorvido por Castella, assim como o foram maiores, e mais poderosas potencias, de seus visinhos. Maior, e mais possante era Aragão, o reino republicano das Hespanhas, a Lacedemonia dos povos modernos; e foi absorvido. Mais, e muito mais marcados, e defensaveis limites tinham as provincias Vascongadas, e foram obsorvidos. Forte potencia era a potencia arabe de Grauord, sustentada pelos interesses, e simpathias de seus irmãos do outro lado do estreito; e foi absorvida.

Mas os nossos velhos não eram só heroes para cantar em verso, eram cabos de guerra, e homens de estado dos que celebra a prosa da historia, e da politica. Elles viram este perigo, e tendencia. Olharam para a península, viram que na Europa não cabiam mais portuguezes, Viram-se entalados entre as garras do leão de Castella, e foram lançar-se na Africa, e procurar nos Algarves d'além a garantia de independencia, que lhe fallecia na Europa. Sublime, e grandioso pensamento! Grande, e profunda combinação, daquelles verdadeiros homens d'estado, cujos netos pygmeus temos ido degenerando até aos tristes calculadores, que hoje somos!

Se aquella empreza começada pelo Senhor Rei D. João I, não fora imprudentemente abandonada, como depois foi, a trôco da pimenta da India, e da canella de Ceilão, primeiro; pelo páo do Brazil, e por suas minas de ouro, depois; talvez, sim talvez, Portugal seria hoje uma potencia de primeira ordem, postada entre a Europa, e a Africa, de guarda avançada á civilisação, e com as chaves do estreito á cinta, senhora por tanto do coração de todo o mundo antigo. (Apoiado, apoiado.)

Se aquella patriotica em preza, que as desgraças, o imprudencia d'um jovem rei forçosamente fez impopular, não fora abandonada, Portugal poderia hoje proteger independências alheias, em vez de andar á mercê dos que de nós aprenderam a navegar, para que no'la protejam sobre essa mesmo elemento, que nós dominavamos, e que nós ensinamos a domar. (Vivissimos applausos.)

Mas já que o erro da cubica nos damnou tanto então, aproveitemos esse mesmo erro, como tambem o aproveitaram nossos pães.

Hoje ainda, e nessas mesmas colonias longiquas nas pontes de madeira, que (segundo a expressão de um illustre preopinante) precisamos lançar-lhes para as conservar, ahi ainda estão garantias de independência, e esperanças de maiores garantias. Desta estreita courella de terra, que temos na Europa, lancemos anchoras, e amarras para esse mar, que é nosso, unamos pelas pontes dos nossos navios, este pequeno concelho de Portugal às nossas ilhas dos Açores, que ainda hontem nos salvaram; a essa jóia do oceano, e primogenita de nossos filhos, a Madeira, que toda a nação da terra nos inveja, a toda essa estrada triunfal de descobrimentos, e conquistas, que apezar de tanto desmazelo, e abandono, ainda hoje existe, marcada de milha u milha, com os padrões de nossos trabalhos, e navegações desde as primeiras terras do sul da África até aos confins últimos da China, até á quinta parte do globo, que de nós recebeu o nome de Polynesia, que todos os estrangeiros illustrados lhe dão sem saber de que padrinho lhe veio, e que nós nem hoje damos, nem já sabemos que em outro tempo lho haviamos dado! (Applausos.)

Ferve-me a cabeça com pensar em taes cousas, Sr. Presidente; arde-me o sangue, que por isso me custa a por termo a um discurso, que é difficil acabar a quem viva-

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mente sente nó coração o que e patriotismo. E patriotismo é isto que se sente, muito mais, e mais certo do que nada que se pense. (Applauso.)

Mas acabarei um fim, e vou mandar meu additamento á mesa. E só pedirei licença para accrescentar duas palavras, que hão de achar echo nesta sala.

Terei dito erros, póde ser; terei comettido faltas como orador, e como politico talvez. Não receio que m'os notem de Portuguez, e de homem livre que sou.

Julguem-me como quizerem; que nem eu sirvo escravo a opinião de nenhum partido, nem tenho o orgulho estupido de querer ser superior á opinião dos meus concidadãos. Prézo-a, estimo-a, e desejo-a: mas pretendo ser julgado pelo que sinto, e pelo que digo; não pelo que outros acintemente me fazem dizer. Ha aqui um empenho, não me importa agora de quem, era desnaturar, e traduzir na lingua, que a máos fins cumpre; os nossos discursos todos, os de certos Deputados especialmente; eu tenho a honra de ser dos marcados. Prézo-me disso. A'manhã sei o que hão de mentir, e fabricar de imposturas, e aleives os jorna és de opposição traidora, que nada poderiam com a verdade, é coitados! Mentir, e commetter falsos, é por tanto condição de existencia para elles!

A'manhã virão pois sobre mim; porque jurei dizer a verdade, quantos appodos tem o diccionario de sua mascavada gyria. A'manhã me farão, segundo eu os tomo, muitos elogios, que elles chamarão injúrias. Alcunhar-me-hão de doutrinario, porque tenho principios; de retrogrado, porque reprovo seus desvairados movimentos; de poeta em fim; porque appello para os sentimentos de brio, de honra, e de generosidade do povo a quem fallo! (Riso.)

O outro dia fiz, Sr. Presidente, profissão pública de doutrinario, hoje faço-a igualmente de retogrado; e de poeta. (Riso.)

Sou doutrinario a meu modo retrogrado a minha idéa; Sou doutrinario porque no altar dos principios da doutrina; quero queimar as minhas opiniões mais caras, immolar os proprios sentimentos do meu coração, quando a severidade do principio a exige; quando no sacrificio não forem envolvidas considerações de conveniencia pública, que attendidas, modificariam o principio, e o alterariam.

Sou retrogado chronologico, e não methodicamente. Talvez os Srs. encarregados da desfiguração dos nossos discursos não entendam isto, e nesse caso, ou alterem como é seu costume, ou perguntem a quem lh'o explique. Sou pois chronologicamente retrogrado, porque os que tudo deslocaram em Portugal fizeram-me, por um movimento extemporaneo, e antecipado, e eu desejo retrogradar com o paiz ao ponto justo, é rasoavel donde elles o deviam deixar. Não o faço methodicamente porque em tudo quanto sem perigo se póde adiantar, não ponho limites ao movimento, e tomara que chegassemos até á perfectibilidade, em que todavia não creio.

Sou poeta, e duma arguição me honro muito (apoiado). Mas a minha poesia é a que invoca as grandes maiorias nacionaes, não para que o paiz se reja por tradições, e preconceitos affonsinhos; mas para que nessas recordações illustres aprendamos a ser tambem como eram nossos avós, é para que, fieis às necessidades da nossa época, aproveitemos com tudo no exemplo dos passados. Sou poeta. Mas a minha poesia é, a que falla ao coração do patriotismo, e aos sentimentos generosos da philantropia; é a que em Athenas enramou as espadas de Harmodio, e de Aristogiton quando deceparam a cabeça da tyrannia, e restituiram a ordem, e a liberdade ao estado.

Assim é que sou, e me honro de ser, doutrinario, retrogrado e poeta. (Vivos applausos.)

O Sr. L. J. Moniz: - Sr. Presidente: depois das bellas causas que acaba de dizer em seu brilhante discurso o Sr. Deputado que me procedeu, bem pouco me póde restar a dizer sobre esta materia; uma circumstancia porém do discurso do Sr. Ministro dos negocios da marinha e ultramar me induz á accrescentar tambem alguma cousa; disse o Sr. Ministro que com quanto as embarcações que estão a partir não podessem já levar todas as providencias nessarias para restabelecer a ordem legal nas distantes provincias ultramarinas, podiam ao menos com as que ellas já levavam, levar-lhes tambem esperanças de sua melhor sorte, fundadas no conhecimento que tiverem de que o Governo e o Congresso seriamente se occupam em lhes acudir com os remédios, de que necessitam. Desejo pois fazer constar neste Congresso que a Commissão do ultramar se esforça, quanto lhe é possivel, para obter meios de concorrer para tão desejadas reformas. E que entre os seus membros são considerados como bases da organização dos governos das provincias ultramarinas, e até mesmo dos das ilhas adjacentes, os principios seguintes:

1.ª Que o Governo de cada uma daquellas provincias deve ser organisado com toda, attenção às suas peculiares circumstancias.

2.ª Que nesta organisação se deve ter impreterivelmente em vista combinar o elemento dos interesses locaes com o dos interesses da mãi patria.

3.° Que na escolha dos empregados, em igualdade de circumstancias, sejam preferidos os naturaes de cada uma (dellas que estiverem no goso dos direitos politicos, não entrando nesta consideração as primeiras authoridades, principalmente quanto às mais remotas provincias.

4.º Que haja um ministerio ou secretaria, que exclusivamente se possa occupar do bem estar das mesmas províncias, e consagrar ao muito que ha a fazer a favor dellas toda a sua alteração; ou ao menos que deste importante trabalho não seja distrahido, senão por aquelles que tiverem mais analogia com elle.

5.° Que haja um corpo consultivo que recolha todos os esclarecimentos, e informações relativas às referidas províncias. E que sirva para esclarecer é Governo e o Corpo legislativo, ou este corpo forme parte da mesma secretaria, ou exista separadamente como for mais compativel Com o bom serviço, e com os princípios de economia.

6.° Que se enviem commissarios a inquirir sobre o estado das mesmas províncias para informarem com todo o conhecimento de causa, quaes sejam os males que ellas soffrem, quaes os remedios a dar-lhes; quaes os recursos que ellas offerecem, e quaes as providencias mais proprias para o seu desenvolvimento.

Taes são os principies que a Commissão considera como bases para uma boa organisação dos Governos ultramarinas. Eu pela minha parte estou persuadido que; á maior das calamidades que tem vexado os nossos irmãos do ultramar, tem vindo de se não attender na organisação dos Governos a taes principios.

Folguei muito de ouvir algumas reflexões, que fez o Sr. Ministro sobre a escolha dos empregados, e Deos queira que senão esqueçam na primeira occasião de fazer a escolha. Os empregados já por ignorancia, absolutamente fallando; já relativamente ao conhecimento das circunstancias particulares das terras, onde vão servir, já pelos deffeitos moraes que de cá levavam; eram, e ainda hoje são em grande parte o flagello daquelles povos.

Ainda não ha muito que até escrivães Se mandaram de cá para Angola, como se lá não houvesse um homem que fosse capaz de ser escrivão! E qual foi o resultado? Que estas remessas de tal maneira indispozeram os naturaes, e a tal ponto os irritaram, que em bem pouco tempo se viram actos atrozes, e horrorosos; porque desses empregados muitos até foram assassinados: convém pois ter muito em vista attender os naturaes. Estes povos estavam na posse deste direito pela antiga legislação, e em igualdade de merito elle não é incompativel, nem com a Constituição, nem com o

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bem do serviço, antes muito para elle concorre, pelo conhecimento que tem os naturaes dos habitos dos povos, e de muitas outras circumstancias importantes de que depende o bom serviço.

Tambem fólgo muito de ter ouvido as noticias que não communicou o Sr. Ministro sobre o estado dos negocios em Gôa, e estimo muito que hão tenham sido confirmados os sinistros boatos, que ha dias corriam. Quando eu os sobe logo me pareceram, a muitos respeitos, pouco provaveis, como por exemplo no que tocava á parte que attribuiam a D. Manoel de Portugal o Castro, o caracter de cavalheiro se lealdade, que sempre lhe conheci, excluia a possibilidade da parte que lhe attribuia em taes procedimentos, e se neste sentido eu me enganasse com D. Manoel de Portugal, declaro que já não sei no que havia de acreditar em homens. Sinto muito prazer em ter esta occasião de prestar este tributo de respeito a um varão, que venero pelas muitas desgraças que em occasião bem critica soube poupar á minha patria, que era de se haver posto á testa de uma revolução para separar os estados da India da mai patria, e desobediencia ao Governo constitucional da Rainha: póde ser que circumstancias estraordinarias o forçassem a pôr-se á testa da revolução, mas para conservar, e não para separar aquelles estados: tambem será bom dizer desde já que a Commissão tem muito em vista, que se estenda a mão amiga da tolerancia aos cultos religiosos daquelles povos: é esta uma circumstancia que eu sei que tem sido sempre a causa das maiores dissenções, e que pede ser tratada com toda a prudencia e melindre: a Commissão está pois resolvida a fazer tudo aquilo que for mais conveniente para que a tolerancia dos cultos seja alli inteiramente mantida; porque está persuadida, que até no sentido da nossa religião muito se ganhará: peço desculpa ao Congresso por me ter estendido um pouco mais. Agora aproveito esta occasião, visto que os navios vão partir, para pedir ao Sr. Ministro que tenha na sua lembrança os presos da Madeira, que podem ir para os seus destinos nesses mesmos navios e que tenha em vista, prvidenciar em meios necessarios não só para os que devem seguir para Cabo Verde, Angola etc.; mas tambem para os que devem vir para as cadeias da côrte, com toda a brevidade que lhe for possivel, a fim não só de evitar muitos outros males que elles soffrem pela accumulação em uma só, e pessima prisão, como para desvanecer os justos receios habitantes da Madeira de que nessa prisão.

Desde esse tempo tenho repetidas vezes pedido ao Sr. ministro da fazenda, e ao Sr. sub-secretario da mesma repartição, para que se termine este negocio, mas não o tenho conseguido, e do que resulta que esta falta de decisão continúa a alimentar na provincia um foco de descontentamentos, de discordias, e até de intrigas que muito convem extinguir, porque é muito em prejuiso do serviço púbico, do bom espirito da provincia, do credito do Governo, e por ventura até do credito dos seus Deputados. Eu pela minha parte não me accusa consciencia de não ter posto neste negocio o mesmo zelo, e actividade que costumo empregar nos negocios publicos a meu cargo, mas as causas que o Sr. Ministro me tem allegado não podem ser conhecidas ao longe, por isso lhe peço queira hoje mui explicita e claramente communicar ao Congresso, quaes ellas sejam. E além das mais razões que lhe tenho dado para uma prompta decisão, outra vez lhe lembro, que a discussão do orçamento esta á mão, e que sem que o mais esteja, decidido, mal poderemos tratar dos ordenados e outras verbas pecuniarias do se ramo do serviço.

Peço-lhe esta declaração para que ella conste no publico, e se é possivel sirva de remedio ás suspeitas, desconfianças, e receios que naturalmente se suscitam no animo daquelles que, vivendo longe do centro dos negocios publicos, não tem meios de ajuizar com exactidão do actual estado de cousas, e das difficuldades que nelle para tudo se encontram.

O Sr. Ministro da Fazenda: - Estes papeis chegaram ao Governo quasi no fim da dictadura, e não foi possivel tomar delles conhecimento; era preciso ser remettido ao Congresso, por que o Governo não o podia fazer alem disto creio, que são cento e tantos requerimentos, documentados, que pedem empregos, a percieam ser extratados para virem então a despacho havia outra circumstancia que era a reforma das alfandegas, e isto dependia das pautas e da fiscalisação, e então era necessario, que o Governo não tomasse providencias taes, que impedisse o Congresso de poder adoptar quaesquer medidas, o Congresso já approvou as pautas, e então ha de ser posto tambem em execução o systema de fiscalisação: já se apresentou para isto um projecto, e todas as difficuldades estam removidas o Governo passa a nomear a commissão das pautas, que é necessario que seja composta de homens, que interessem em que aquella medida seja levada a effeito, creio que muito ceio o nobre Deputado ficará satisfeito porque se ha de fazer o despacho para a Madeira. Por esta occasião devo dizer, que os Srs. Deputados pela Madeira tem mostrado o maior zelo pelo interesse do seu paiz, no tempo da dictadura tudo quanto para ali se fez, foi solicitado pelo Sr. Deputado, dou-lhe este testemunho, e honra lhe seja feita.

O Sr. B. de R. de Sabroza: - Eu direi pouco, nem mesmo entraria na materia, se um illustre orador não tivesse tido a bondade de alludir a uma reflexão minha; a

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saber, que o Congresso mal poderá legislar para as nossas possessões na Azia, e na Africa, em quanto os seus representantes não tomarem assento neste Congresso. A minha oppinião funda-se em dous motivos; primeiro por ter visto de perto que muitas das medidas precipitadas que se tomaram no Congresso das Necessidades a respeito do Brazil, foram a causa immediata da separação daquelle imperio. A falla d'informações locaes fez-se sentir em todas aquellas medidas; e em segundo logar porque vejo todos os dias, que as leis adoptadas com toda a informação possivel, nem assim mesmo sahem perfeitas, e a cada hora nos vemos obrigados a reforma-las. O mesmo orador o Sr. Garrett disse; que lhe não parecia bem que no projecto da Constituição se enumerassem as nossas possessões ultramarinas: a Commissão tambem assim pensou; mas julgou que se não devia afastar da Constituição de 1822, senão quando á experiencia e o bem estar da Nação altamente o reclamasse. Tendo eu servido no Brazil, desejo desvanecer uma asserção do Sr. Moniz. É certo que por alli se commetteram muitos assassinatos, como o Sr. Moniz affirma haverem sido commettidos em Angola nas pessoas d'alguns europeos; mas tambem é certo que a culpa, ou provocação riem sempre vinha desses europeos.

Em quanto a D. Manoel de Portugal, aproveito esta occasão para declarar, que elle serviu no Brazil, quando eu alli servia: foi capitão-general de Minas-geraes; ganhou alli grande credito de independencia, e probidade. Foi nove annos capitão-general em Minas-geraes, e não trouxe d'alli um vintem. O Imperador do Brazil desejou que elle continuasse a servir naquelle imperio; ao tempo da separação; D. Manoel rejeitou, e recolheu-se a Portugal. É por isto, que só á vista de documentos poderei mudar d'opinião em quanto ao seu caracter e lealdade.

O Sr. L. J. Moniz: - Eu pedi a palavra para observar ao Sr. Ministro da fazenda, e sinto que S. Exca. sahisse da salla, o que já muitas vezes lhe observei. Eu conheço, que S. Exca. tem razão em pensar, que uma parte da reforma da alfandega da Madeira depende do Poder legislativo; esta é aparte relativa aos ordenados, e a algumas pensões de reformas, e outras; mas quanto ao mais, o Governo foi au-thorisado por um voto de confiança dado pelas Côrtes para executar a reforma; e poder approvar, ou reprovar dos trabalhos da Commissão aquillo que entender. A dependencia em que o Sr. Ministro suppõe a reforma das alfandegas, do systema das pautas; e do modo dá sua fiscalização externa, não me parece que possa afectar mui essencialmente a organisação da alfandega do Funchal, e por isso vem embaraçar a decisão do negocio em questão. No entanto, se tal é a impressão que essa idéa lhe faz; a Sua Exca. compete responder por ella.

Quanto a outras circunstancias que tocou o Sr. Barão da Ribeira de Sabroza, de que nem sempre a culpa estava da parte do europeu - convenho, porque em todas as cousas pó1 de haver culpa de um da outro lado; mas na maior parte dos casos a culpa vinha dos maus empregados; e a indignação desses povos nascia da injusta preferencia que se fazia em prejuízo dos naturaes do paíz; porque quando os empregados eram, não digo melhores, mas tão bons como os das terras, poucas eram as queixas. A opinião geral daquelles paizes, é a favor de que as primeiras authoridades lhe vão do reino; mas quanto aos de mais empregados ella é contra essa prática, principalmente porque quasi sempre tem sido maus os quê de cá vão. E já se vê; que o bom senso e os bons sentimentos daquelles povos, não lhe podem com razão ser negados. Além disso, esse espirito não é proprio sómente às nossas colonias; elle é o mesmo que reina nas colonias de todas as nações que tem seguido a mesma marcha. Foi esse enxame de empregados, escória da povoação europêa, que as metropoles arrojavam sobre as colonias, como um bando de arpias, e que não vão lá senão para se nutriram da sustancia dos povos, e voltarem para a Europa bem fartos, e bem gordos, que constituiu uma das principaes causas para a separação das colonias Britanicas, e mais modernamente para á das de Hespanha. Entre os empregados que iam para as nossas colonias, de certo houve um numero de honrosas excepções, e ainda as ha; eu o reconheço; e aquella que ha pouco nomeei de D. Manoel de Portugal, é uma. Outros muitos conheço eu, e até os vejo dentro deste mesmo Congresso; mas em regra geral, nas nossas e em todas as mais colónias do mundo, às cousas tem corrido como aqui se tem exposto.

O Sr. Costa Cabral: - Não é pára fallar dás províncias ultramarinas, porque na verdade tem-se dito tudo que ha a dizer, com tudo o que se tem dito eu me conformo; é para notar uma circumstancia tocada pelo Sr. Moniz: é verdade e hão se póde duvidar que a nomeação de empregados que não são de primeira ordem, para as províncias ultramarinas, tem estes inconvenientes que se notaram; lios Açores tambem existe este mal: eu sou de Portugal, mas sou Deputado dos Açores; e em todo o caso devo fallar conforme a justiça, e por isso aproveito esta occasião para chamar á attenção do Governo sobre este objecto: nas províncias dos Açores ha muitos e muitos individuos capazes de ser empregados de segunda ordem: é Ministério mandando indivíduos de Portugal para occupar estes empregos suscita um motivo de discórdia entre os indivíduos mandados, e os habitantes; nem os empregados podem prestar tão bom serviço como delles se exige; peço pois a attenção do Ministerio sobre este effeito, para que não continue tal. Pela repartição das justiças foi mandado, segundo me consta, ha dias um individuo para escrivão perante o juiz de direito da Ribeira Grande, e vai ser destituido um individuo que estava servindo aquelle logar pôr portaria do presidente da Relação; eu não duvido quê o nomeado tenha muitos serviços e merecimentos, mas vai ser destituído um Individuo que tem servido com perfeito desinteresse, muitissimo capaz, e natural do paiz, e que fez muitos serviços como voluntário; aqui está como se pratica, talvez sem querer, uma injustiça; é preciso que o Ministério por tanto tome isso em consideração, para não fazer similhantes despachos, e preferir em igualdade de circunstancias os indivíduos do paiz.

O Sr. Ministro da fazenda: - Quanto a esse facto não sei, porque pertence ao Ministério das justiças; mas eu nem como Ministro da fazenda, nem como Ministro do Reino, tenho despachado um só indivíduo que não seja natural dó paiz, e declaro que tem servido muito bem.

O Sr. João Victorino: - Sr. Presidente, tocou-se uma especie, que eu desejaria se desenvolvesse alguma cousa mais; e é respectiva ao estado em que se acha à eleição dos Deputados do Ultramar, principalmente da Azia. Vem elles, ou não? Deram-se as ordens para se fazer esta importante eleição, ou não? Eu desejava saber isto; queria que se me respondesse; porquê sei que uma dás primeiras causas que concorreram para a separação do Brazil, foi o negocio que se tractou nas Cortes de 21 a respeito dos 20 milhões da emprestimo que pediu o Sr. D. João 6.° para pagar ao banco do Brazil antes da sua sabida para Portugal; pediu 20 milhões, mas exequiveis logo, cinco. Esta questão foi tractada sem a presença dos Deputados do Brazil; foi agitada com calor, precipitação, e imprudencia; e depois de fazer a loquacidade o que costuma, foi regeitado o emprestimo.
O decreto para se contrahir este, era referendado pelo Sr. Silvestre Pinheiro Ferreira; Secretario de estado dos negócios estrangeiros, me parece, no Brazil; e sem motivo algum, contra o que pedia a decência, foi severamente atacada a pessoa daquelle Ministro, de cuja secretaria havia sabido o dito decreto; dizendo-se que não sabia as formulas constituctonaes o Sr. Silvestre Pinheiro! É Um dos homens sem duvida, que hoje na Europa melhor entende o espirito do governo constitucional, como se vê das suas numerosas,

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e presentes composições; foi imprudentemente accusado por homem que nada sabiam do que era esse espirito. Isto fez-se quando não estavam presentes os deputados do Brazil. Houve, é verdade, naquella áliaz respectabilissima Assembléa quem pedisse, que se esperasse por elles; e deste opinar foram as primeiras capacidades della, e entre estas o Sr. Francisco Manoel Trigoso d'Aragão Morato, e outros Deputados que deviam ser attendidos, mas que o não foram, e foi regeitado o emprestimo.

O Sr. Ministro da justiça: - Quando no reino se derem as instrucções, derem-se igualmente para as diversas ultramarinas; mas como não tem podido haver commemorações regulares, nem ellas foram logo, nem se póde fixar o tempo da vida dos Deputados.

O Sr. Presidente propôs se a materia estava discutida decidiu-se que sim, e foi approvada a moção.

O Sr. Garret: - Sr. Presidente, peço licença para mandar para a mesa um additamento á indicação do Sr. Vasconcellos.

Leu-se o seguinte:

ADDITAMENTO.

Requeiro, que antes de partirem os navios e Governadores que vêm para ultramarinas, se decide, qual é a legislação que está de reger, e que as Côrtes marquem até que ponto, e com que regras, se deve exercer o poder discriminado, que devem Ter os Governadores. - Almeida Garret.

O Sr. Presidente poz em creação o additamento do Sr. Garret.

O Sr. Sá Estevão: - Eu não tenho nada a dizer a este respeito, senão a questão está decidida, ou que se não póde fazer disto questão; porque pergunta-se, que legislação é a que alli governa; a resposta é ... há de ser existente a que está
Em vigor: agora uma das partes das nossas colonias e (disto esteja presente author do additamento; mas como está em discussão, é forçoso fallar sem elle na sua ausencia) para uma das partes das nossas cabines parte um navio no dia 6; pergunto, até ao dia 6, com férias que temos, podemos decidir a legislação, que se há de pôr em vigor? Não póde ser; porque é um trabalho muito que se não resolver em 6 dias, dentro de sair o navio; é que se quer que leve a resolução de legislação que há de vigorar; então entendo que se não póde fazer demorar o navio, e que a legislação que alli vigora, é a que existe.

A legislação que há de vigorar, é aquella que se fez durante a Dictadura, isto não evita que o Congresso as examine e as reafirme; porque apesar de Ter sido feito com as milhares inscrições, o estado e conselho de pessoas intelligentes e conhecedoras do paiz, a que é applicada, póde comtudo não ser isenta de nossos defeitos: um destes navios vai sair daqui a 6 dias, e não deve (me parece) ser demorado por essa carta.

O Sr. Leonel: - Na ausencia do Sr. deputado, arther do requerimento, tinha eu dito que os decretos da ultima Dictadura, tinham estabelecido uma parte da antiga organisação ultramarina, e tinha reformado em outra parte, não só a legislação antiga, mas tambem a da primeira Dictadura; ámanhã espero eu que se ha de decidir a conta, em que se hão de Ter os decretos da ultima Dictadura, e então conforme a resolução, se resolverá o additamento do Sr. Deputado.

O Sr. Almeida Garret: - Sr. Presidente, como author de additamento, não me opponho a que elle fique addiado indeterminadamente, como acabe de dizer o Sr. leonel Tavares, nem eu quando o propuz tive a menor idéa de fazer, dependente de sua decizão, a partida dos navios, que já me parece tão demerada... Tão pouco não pretendi com elle que fôssemos reservada a nossa legislação colonial, ou ultramarina. Além de não ser convencido que esse trabalho se não podia fez seguido; porque entendo que é preciso legislar separadamente para cada um dos nossos estabelecimentos d'ultramar.

Tragamos isto uma hipothese: póde amanhã partia um governador para a India, por exemplo, e levando consigo as leis da Dictadura. No outro dia votamos nós outras, que destroem aquella legislação. O governador que daqui foi não sabe disto, e principia a organisar a sua administração, na conformidade das suas suppostas leis. E o primeiro navio que lá lhe chega seis ou oito mezes depois, leva ordem de desfazer indo outra vez, e de novo. Quem não vê a desordem a que isto que está no fim della!
Paço pois ás Côrtes que quanto antes se decide, qual é pelo menos, da legislação, que para aquelles provincias deve adoptar.

O Sr. João Victorino: - Sr. Presidente, eu digo só uma palavra tem estabelecido aqui, que se deve exercer nas tão provincias de centro da Monatchia a legislação existente; converto nisto; mas qual legislação existente? A de cá, ou de lá. Que legislação existecá? Não sei; por isso digo, que deve ser legislação existente lá. Nós, Sr. Presidente, não conhecemos, principalmente provincias da Asia, está. Sabemos só, que a tentativa para lá metter a legislação da primeira dictadura teve terriveis consequencias, e por isso é indispensavel, mais que em parte alguma, usar nellas de maior prudencia, na introducção das leis; mas principalmente na dos empregados, e com especial em altos empregados.
Eu fortemente apoiarei a lembrança dos Sr., que assentão que está tudo na da primeira authoridade, que para

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lá tem de se mandar. E preciso um homem da cabeça mais capaz, do melhor coração, de muita reputação, e muita força, e firmeza de caracter, d'um grande desinteresse, e com todas estas qualidades uma prudencia a toda a prova. Mas qual legislação deve o governador fazer lá executar? Dizem alguns Srs. a da dictadura. Mas de qual? da 1.ª ou da 2.ª? A da 1.ª, como já disse, e é sabido, achou lá repugnancias terriveis, fez males, de que não podemos ainda saber a magnitude, nem o resultado, a da 2.ª dictadura porém, como podemos ordena-la para lá, quando nós ainda aqui estamos para discutir a sua legitimidade, e podemos hoje manda-la lá executar, e ámanhã ir n'outro navio ordem para ella ser suspensa? Ora neste caso que resta? que leis se hão de sustentar lá? Eis ahi porque eu digo, as que melhor lá tem provado, as que melhor relação mostraram com es costumes, vontades, persuações, em fim com todas as circumstancias em que se acharem as provincias. É necessario que o governador seja um homem, como já disse. Eis aqui as verdadeiras leis da dictadura. Leve elle alguma cousa de discripcionario. Será conveniente, ou não, conservar estas provincias? Se essa não é agora a questão, é necessario que o governador principalissimamente tenha em vista a conservação, e a união dellas ao centro commum; esta a primeira neceessidade, este o primeiro pensamento, a que deve tudo ser subordinado, a isto se deve sacrificar leis da dictadura, instrução, e tudo, este o meu voto.

O Sr. Leonel: - O Sr. Deputado Garrett fez uma moção de ordem, que importa o adiamento desta resolução.

O Sr. Presidente: - Se o Sr. Garret convém, que o que propôz é um addiamento, e se achar cinco Srs. Deputados que o apoiem, eu vou propor o adiamento do negocio.

Agora vou dar a palavra aos Srs. Relatores das Commissões para lerem os pareceres, que tem promptos para apresentaram a este Congresso. Hoje a ordem do dia era a discussão de pareceres de Commissões, mas agora são quasi quatro horas; por tanto vou dar a palavra aos Sra. Relatores de Commissões.

O Sr. Franzini, Relator da Commissão d'estatistica; o Sr. Barão da Ribeira de Sabrosa, como Relator da Commissão de guerra, e o Sr. Faustino da Gama, Relator da Commissão de fazenda, mandaram para a mesa varios pareceres das suas respectivas Commissões para serem discutidos consecutivamente, e continuou a ter a palavra.

O Sr. Faustino da Gama: - Aproveito a ocasião para pedir uns esclarecimentos que são precisos na Commissão de fazenda, para poder continuar a fazer o exame sobre o orçamento.

Leu o seguinte requerimento.

Para que a Commissão de fazenda interponha o seu parecer com conhecimento de causa, sobre o orçamento do anno futuro, precisa que pela secretaria dos negocios da fazenda se lhe remettam, com a maior urgencia, os seguintes documentos.

1.° A conta da receita e despeza do thesouro publico relativa ao anno economico findo em Junho de 1836, com especificação do que ha cobrado e por cobrar, a qual, nos termos que dispõe o artigo 227 da Constituição, deveria acompanhar o orçamento ultimamente apresentado neste Congresso.

2.° Uma conta exacta e circumstanciada da quantia em que importam as letras, escriptos, ou quaesquer outros papeis de credito, que hão de ser admissiveis como dinheiro no rendimento das alfandegas, ou em quaesquer outros, e quaes são as épocas em que devem entrar.

3.° Uma conta exacta (ou o mais aproximada possivel) da divida corrente; e não paga, contrahida desde o 1.º de Agosto de 1833 até ao dia 31 de Dezembro de 1836, com as declarações da sua ordem e classe.

4.º Uma conta exacta e circumstanciada da importancia nominal a que montam os papeis de credito admittidos pelo Governo em cada uma das operações, ou transacções, a que tem procedido desde o dia 10 de Setembro de 1836 em diante, com declaração da sua natureza, épocas a que pertenciam, e em que proporção entraram no thesouro com dinheiro elletivo, declarando-se igualmente qual é a importancia total das obrigações, que o thesouro passou em consequencia d'essas operações, sua naturesa e vencimentos.

Sala da Commissão, em 30 da Março de 1837 = Faustino da Gama.

O Sr. Presidente: - Segundo uma resolução do Congresso, as Commssões estão authorisadas para pedirem todos os esclarecimentos que carecem das diversas repartições do estado.

O Sr. Faustino da Gama: - A Commissão não lhe esqueceu que havia essa resolução, nem este requerimento offende aquella resolução, a Commissão quiz , que isto se pedisse em sessão plena, para que se não diga (quando haja alguma demora na remessa destes esclarecimentos) que ella não cuida no exame do orçamento.

O Sr. Ministro dos Nogocios do Reino: - Sr. Presidente, pelo que toca ás operações feitas por mim durante a Dictadura, já eu mandei todos os decretos ao Congresso, e por consequencia nessa parte, já o requerimento da Commissão está satisfeito pelo que toca á couta corrente do anno economico, já eu aqui declarei os motivos, porque mais cedo não podia apresentar essa conta. Só com a reunião das Côrtes, é que terminou a Dictadura, e foi então necessario organisar o orçamento da receita, e despeza, para o anno financeiro, que ha do correr de 1837 a 1883, seguindo é novo systema decretado, por consequencia, era escusado que a Commissão de fazenda viesse lembrar ao Governo os seus deveres, quando, se mais cedo se não apresentaram esses documentos, é por causa justa, e de todos conhecida, e se o orçamento, conta corrente, relatorio, e projectos, não vem todos n'uma hora; porque os membros da Commissão de fazenda instaram, para que esses fôssem apresentados á proporção que estivessem promptos! Depois desta primeira exigencia da Commissão, a qual só me censura, não tem nenhuma explicação satisfatoria.

O Sr. Sá Nogueira: - Sr. Presidente, a Commissão quando pedio esses esclarecimentos, não teve em vista fazer censura alguma ao Ministerio, mas ha muitos projectos de lei apresentados pelo Governo, que lhe estão affectos, e a que ella não póde dar andamento, sem ter para isso os esclarecimentos necessarios parte delles são aquelles de que se trata: a Commissão sabe que os podia pedir directamente, como já tem feito, todavia como tem havido demora em satisfazer às suas requisições, julgou dever fazer esta, por este modo, para mostrar ao Congresso e ao publico, que ella não se descuida do desempenho de suas obrigações, mas que não póde dar um passo sem ter recebido as informações que pede: basta saber que ellas são indispensaveis, para se conhecer a importancia da divida publica que se pertende capttalisar; porque qual é o resultado da capitalisação da dívida? É um augmento nos juros que a nação tem a pagar, e necessario por consequencia, que a Commissão saiba, os encargos que de novo a fazenda nacional vai ter, para depois poder estabelecer a dotação da junta do credito publico, e não só é necessario para se poder prover convenientemente a esta dotação, conhecer a importancia total na dívida; mas ainda saber qual é a importancia dos juros ella poderá vencer, e para isso é talvez necessario tambem saber-se a sua naturesa e origem eu não avanço agora proposição alguma, mas talvez haja uma especie de dívida que deva ser capitalisada com maior juro, outra com menor: ora daqui se vê que a Commissão não póde dar o seu parecer, sem que tenha os esclarecimentos que pede; que sem elles nada póde concluir, ella o que quer é adiantar os

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seus trabalhos. Mas se não é possivel ao Ministério dar esses esclarecimentos, que diga francamente que os não póde dar, porque assim descarrega-se a si de responsabilidade, e nenhuma fica pesando sobre a Commissão; assim não se poderá dizer que a Commissão não trabalha, por isso que ella não póde dar um parecer, sem ter conhecimento da matéria , sobre que deve dar.

Ora agora a respeito do Orçamento em geral, é necessario saber-se que a Commissão de fazenda se vê na necessidade de examinar a fonte dos rendimentos públicos, e calcular a importancia de cada um ; mas como ha de ella, por exemplo, calcular a do rendimento da decima do anno futuro, se acaso não souber qual foi a dos três ultimos annos, e quanto exactamente rendeu a decima, não em papel, quero dizer, não aquillo que se tinha calculado que ella poderia render ; mas aquillo que efectivamente rendeu.

Ora o que eu tenho dito, creio que é bastante para mostrar, quaes foram as intenções da Commissão, e que ella procedeu com todo o acerto; por isso que se vê na necessidade de dar o seu parecer sobre objectos da primeira importancia, e que não o póde fazer sem que esses esclarecimentos que pede, lhe sejam enviados.

O Sr. Presidente: - Eu creio que este objecto não póde agora entrar em discussão; porque já está decidido que as Commissões pela mêsa, podem pedir ao Governo todos os esclarecimentos de que precizarem.

O Sr. Faustino da Gama: - Se V. Exca. me dá a palavra, eu preciso explicar um tacto, e então paia isso, eu a peço para fazer a leitura do artigo 227 da Constituição: elle diz (leu). Sr. Presidente, a Commissão cumprio aquillo de que estava encarregada por este Congresso, e nisto não sei que haja falta de cortesia da parte da Commissão, para com o Ministerio: Sr. Presidente, eu não acho que a Commissão, mereça ser criticada por ter feito este requerimento; fui eu quem ha dias o lembrei á Commissão, e quem o redigio, e a Commissão toda approvou; eu quero que os Srs. Deputados e toda a nação, saibam que se por isto ha alguma arguição a fazer á Commissão, que ella deve recair só sobre mim.

O Sr. Alves do Rio: -Se ha alguma arguição, todos nós membros da Commissão de fazenda, somos corréos porque nós todos fizemos nosso o requerimento, por entendermos que era necessario.

O Sr. Ministro dos Negocios do Reino: -Sr. Presidente, o Congresso não póde deixar de conhecer, que a Commissão de fazenda está em aberta hostilidade com a administração actual. Sr. Presidente, a commissão redigindo um requerimento em que pede todas as contas correntes, e accrescentando, que em conformidade com a Constituição o Governo as devia já ter apresentado quer nisso indicar, que a administração não tem cumprido da sua parte as obrigações, que a Constituição lhe impõem, quando constantemente eu aqui tenho dito, que a difiiculdade, em que se achava a administração, lhe impedia satisfazer tão promptamente, como devia aquella obrigação. O Congresso viu, que quando eu aqui apresentei o orçamento da receita e despeza do anno economico de 1737 a 1738 logo declarei, que a administração pela multiplicidade dos objectos a seu cargo, não lhe tinha sido possivel apresentar ainda a conta da receita e despeza do actual anno economico, nem o relatório do Ministério da fazenda, em que se trabalha incessantemente. Por consequência eu esperava, que a Commissão de fazenda procedesse com mais cortesia e mais justiça, não vindo por um meio indirecto; fazer uma censura tão injusta e desmerecida. Uma grande parte dos esclarecimentos pedido e agora pela cem missão devem vir expressos no relatório. E a commissão não o póde ignorar.

Eu louvo muito a Commissão de fazenda pela sua actividade, não lhe noto senão uma expressão, uma censura, que exprime, e que certamente me parece o Governo não merecia.

O Sr. Faustino da Gama: - Sr. Presidente, e declaro desde já que da minha parte não houve nenhuma expressão de censura ao Ministério, eu pensei nos deveres da commissão.

O Sr. Ministro dos Negocios do Reino. O Sr. Deputado disse: a cousa que eu denta ter apresentado immediatamente ao Congresso, quando todos sabem muito bem, que essa conta não tem podido ser apresentada pelo motivos, que de todos são conhecidos, - e que não devem imputar esta falta ao Governo.

O Sr. Macario de Castro: - Sr. Presidente, eu regeito a arguição que o Sr. Ministro da fazenda fez á Com missão de fazenda, quando disse: que a Com missão de fazenda, estava em aberta hostilidade com a administração actual. A Commissão de fazenda, actualmente não está em hostilidade, só o estará, quando julgar que a administração marcha actul; por agora não tem sufficiente razão para isso.
A arguição, que o meu illustre amigo, encarregado da pasta dos negócios da fazenda, quando mesmo exacta, não me tocava, porque não concorri para se lavrar o requerimento, que o relator da commissão acabou de ler: este negocio foi tratado liontem , e eu estive toda a manhã na Commissão de estatística. Mas a pezar de não ter tomado parte na deliberação da commissão, devo chamar a questão ao seu verdeiro ponto de vista, para não se attribuir a desejo de censurar esse requerimento da commissão; demais é preciso que o Congresso esteja informado, que uma parte do orçamento, em que vem indicado, quaes são os rendimentos do anno futuro. não offerece as informações necessarias para os trabalhos da Commissão. O Sr. Ministro dos negócios da fazenda teve dados, por exemplo, para apresentar no orçamento a verba do rendimento do lançamento da decima, e a Com missão de fazenda não os tem , para poder apresentar esses mesmos rendimentos taes e quaes o Sr. Ministro da fazenda os apresentou: ora ou a Commissão de fazenda ha de apresentar as mesmas no orçamento sem poder emittir a sua opinião a respeito delias, ou a Commissão de fazenda ha de ter os mesmos dados que o Sr. Ministro da fazenda para os apresentar: et lê é o ponta de vista sobre que deve ser considerado o requerimento da Commissão; e considerada a questão assim, não será iucrepada a com missão. Eu torno a explicar-me; vem no orçamento avaliada a decima, parece-me, em 2 mil contos, o Sr. Ministro da fazenda guando mandou escrever aquella verba, havia deter dados para a mandar assim escrever, e então a Commissão de fazenda, deve ter todos os dados para calcular o rendimento da decima do anno futuro da mesma maneira, que os teve o Sr. Ministro da fazenda ; porque se de futuro vier um ministro de fazenda, e nos disser que a decima não rendeu aquella somma, é preciso que a Commissão de fazenda de hoje não carregue com a responsabilidade, que não póde ter, se lhe não forem dados os esclarecimentos, que lhe são necessários. O trabalho da Commissão torna-se muito mais facil se repetir as verbas como lá estão; mas é preciso saber-se, que ella senão calcula, é porque não póde calcular: é essa a primeira parte do seu requerimento, e então eu convidaria o Congresso para indicar á Commissão de fazenda a marcha, que tem a seguir a similhante respeito; quero dizer, se o Sr. Ministro da fazenda diz, que não póde dar explicações áquelle respeito por ora, então diga-se á Commissão de fazenda, que faça o seu relatorio com essas verbas, conforme ellas lhe são apresentadas; mas então não recaia responsabilidade alguma na Commissão de fazenda pelo modo de orçar as verbas.

O Sr. Rodrigo de Meneses leu um parecer da Commissão ecclesiastica, que mandou para a mesa.

O Sr. Presidente: - Deu a hora; a ordem do dia para amanhã é 1.°: a discussão do parecer da Commissão de legislação n.º 12; 2.º o additamento ao parecer n.º 11 : está fechada a sessão, Eram quatro horas e um quarto da tarde.

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