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da desta cadêa pesada, que a algemava: e eis-aqui os principios recebidos, para ajuizar das relações externas da Peninsula, no momento em que vai constituir-se. Agora segundo as minhas idéas, direi, que segundo os principios, que acabo de considerar, é muito facil de ver o que é uma Constituição, e o que deve ser. Eu entendo que uma Constituição não é mais do que a convenção tacita, ou expressa, (note-se bem isto) pela qual os homens reunidos em sociedade civil se marcam, quaes são seus direitos; seus desejos, ou faculdades naturaes, que se reservam exercitar livremente; e quaes as regras, e methodos, e formulas de organisação geral, que se prescrevem para assegurar o exercicio desses direitos: estas são pois as duas partes essenciaes de uma Constituição, segundo meu modo de vêr; e disse eu, que ella é uma convenção tacita ou expressa, porque me parece repugnante ao senso intimo do homem o elle imaginar, que outro homem, nascido igualmente como elle, e com as mesmas propenções, tenha direito de o governar, e de o dirigir a seu arbitrio e então só se póde admittir que outro o faça com direito; quando aquelle se sujeita por sua vontade a essa direcção, a esse regulamento; e digo tacita ou expressamente, porque não era facil aos povos; nas posições em que a maior parte das vezes estavam, reunirem-se n'um só ponto, e fazerem um contracto entre si com as clausulas, e estipulações dos contractos particulares; entretanto é necessario reconhecer, que ha um consentimento tacito, e um estado de cousas, em que os homens ainda que ás vezes não estão satisfeitos, com tudo por evitarem maiores incommodos consentem nelle; e tudo que é contra isto, é a violencia do poder, a usurpação, e a oppressão do homem collocado na sociedade! Desde o momento em que um conquistador avassalla um povo, essa direcção, que lhe dá, não é senão oppresaão, em quanto elle forceja para expellir o jugo; mas desde o momento em que se aquieta, e julga conveniente não resistir, começa uma especie de consentimento, que todavia não destróe o direito que esse povo tem de melhorar a sua sorte; e é debaixo destes principios que hoje se conserva a maior parte das monarchias da Europa, que passaram por este estado da conquista; mas chegaram a um ponto, em que os povos continuarão nesse estado para não voltarem á anarchia; e vão aproveitando as melhores occasiões, que se lhes offerecem para melhorarem a sua sorte.

A face das expendidas considerações, e principios, já se vê que é verdade uma cousa, que aqui se tem enunciado; e um orador que se assenta á minha esquerda o tocou, e vem a ser, que em todas as sociedades ha uma Constituição. Sim, eu cuido que em todas as sociedades, qualquer que seja a fórma de governo, ha uma Constituição; este assentimento tacito ou expresso, pelo qual os homens suppõem que seus direitos naturaes estão até certo ponto sujeitos a essas formulas, que lhe garantem o seu exercicio; entretanto não tem duvida que essas Constituições na sua maior parte nunca appareceram escriptas, nem definidas; e não tem outra base real senão no senso intimo dos cidadãos. Tambem direi neste logar, que debaixo deste ponto de vista, em que considero os principios da sociabilidade, é muito facil conhecer qual é a fórma do governo mais vantajosa (e cuido que nenhuma é perfeita, porque no mundo nada haverá que o seja, mas entendo que é preferivel a que menos defeitos tiver).

Disse eu que, a Constituição devia ter duas partes, uma que marque qual é a porção de direitos naturaes, a porção de desejos, e de faculdades naturaes do homem, que elle se reserva para satisfazer independente das formulas sociaes; e outra parte que é aquella em que se prescrevem as formulas, e methodos de firmar o exercicio desses direitos: já se vê pois que aquella fórma de governo, que deixar mais amplitude no exercicio dessas faculdades naturaes, ha de ser a melhor; porque a felicidade do homem consiste na satisfação dos seus desejos, e é tanto maior quanto maior for o numero, e latitude dos desejos satisfeitos; mas é preciso, que aquella tenha ao mesmo tempo reunidas a outra parte, cujas formulas, e cujos methodos affiançarem melhor esse exercicio. Daqui já se deduz, que o filosofo, quando pensa maduramente, e livre das impressões de momento, se horrorisa com a idéa de um despotismo; porque nelle o uso dos direitos essensiaes do homem, de seus direitos naturaes, depende só do capricho de um déspota, e mais nada! E pouco vale, que tal exercicio seja permittido com muita latitude; porque quando elle queira, póde faze-lo cessar por um simples = mando e quero. = No absolutismo não estão as cousas muito longe disso, porque supposto haja algumas leis escriptas (que é a differença entre absolutismo, e despotismo) todavia essas leis não impedem o monarcha de as alterar, e modificar segundo o seu arbitrio, fazendo cessar esse pequeno entrave que se appresenta diante de si; e por consequencia entendo que o dominio de um só homem horrorisa a idéa de quem pensa. Outra fórma de governo, que quanto a mim não dista muito desta, é a democracia pura: ahi as raias do exercicio dos direitos, e garantias individuaes, e as suas formulas, estão confiadas a classes ás vezes pouco sensatas, sujeitas a paixões tumultuosas, e que fazem tão incertos esses direitos, quanto são variaveis as paixões; que de ordinario se suscitam entre essas classes, principalmente no estado d'hoje em que está a Europa; no estado em que a immoralidade tem criado um formigueiro de paixões violentas por toda a parte! Por estás considerações, o estabelecimento de republicas na Europa, parece-me cousa impraticavel; porque tenho muito medo que aquellas paixões degenerassem n'uma confusão extraordinaria! Eu vejo, é verdade, que esse estado existio nas republicas antigas; mas eu lembro-me tambem, que então era um estado de cousas diverso do estado da Europa actual; é que a simplicidade dos costumes, e as virtudes naturaes dos homens davam logar a uma cousa, que hoje é impossivel, a meu vêr! Depois destas que tenho referido, segue-se naturalmente a fórma de governo representativo, que é aquelle que menos inconvenientes appresenta no estado actual; porque nem as cousas ficam dependentes do capricho de um homem, (em quanto as leis circumscrevem esse capricho), nem tambem estão sujeitas á influencia das classes mais apaixonadas; e então nesta parte julgo que os homens tem adiantado muito, porque nada mais sabio que esta maneira de reprimir as paixões; de não dar tudo a uns, e negar tudo a outros; e de procurar nas cousas um meio termo, que é de ordinario onde se encontra o acerto!

E neste estado que eu reconheço a verdade da expressão de um filosofo, quando já neste seculo disse: que o género humano vai em marcha para a civilisação! Eu julgo, que isto é verdade evidente, e que ainda vai a melhorar muito o estado da Europa; porque lançando os olhos pela historia vê-se, que o progresso da sciencia nesta parte é prodigioso; e eu julgo que, quem produzio isto é a imprensa; esta arte divina! Nos seculos antigos um filosofo podia pensar muito bem, e ter excellentes lembranças; mas ellas ficavam no segredo do seu gabinete, e apenas se transmittiam a poucos de seus amigos, e com muito vagar; porém com a invenção da imprensa, todos os póvos que sabem ler, estudam, e se communicam de repente; e então, como as doutrinas que ordinariamente se apresentam, acham assenso no coração do homem, é assim que se vai espalhando esta crença universal, necessaria para a reforma do mundo! Com effeito é este o exercito mais temivel, que o despotismo tem contra si, e que lhe ha de ser tanto mais funesto, quanto menos elle presente sua marcha; porque nem elle póde já recolher os productos da imprensa, já derramados pelo mundo todo; nem descobre o progresso que vão tendo, porque não é uma falange que se avança sobre o occidente com desconcertada vozeria lá do norte da Europa; mas é a força maior do que a de um exercito, que vai escondida na malla de um correio; e que leva a persuação ao coração dos homens. Por tanto estou persuadido que o genero hu-

SESS. EXTRAOR. DE 1837. VOL. II. 16 R